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Thomas Bvuma, embaixador do Zimbábue no Brasil, em entrevista ao HP afirma:

“Temos um governo revolucionário com profundas raízes no povo”

“E os valores de igualdade e justiça derivam da cultura da luta de libertação nacional”, completa

“A política colonialista britânica negou deliberadamente a democracia e os direitos humanos


básicos aos africanos. A guerra de libertação trouxe a democracia ao Zimbábue em 1980”,
declarou o embaixador do Zimbábue, Thomas Bvuma, em entrevista ao repórter Nathaniel Braia,
dia 30 de maio.

HP - Qual a relação histórica entre o governo atual e a luta de libertação do Zimbábue?

Thomas Bvuma - O atual governo do Zimbábue é formado pelo partido União Nacional Africana - Frente
Patriótica do Zimbábue (ZANU-PF, sigla em inglês). É o partido que resultou da união formada em 1987,
depois da fusão da organização União Nacional Africana do Zimbábue (ZANU), dirigida por Robert Gabriel
Mugabe, e a União dos Povos Africanos do Zimbábue (ZAPU), dirigida pelo Joshua Nkomo (já falecido). ZANU
e ZAPU se formaram no início dos anos 60 para lutar pela reposição das terras roubadas aos africanos sem
compensação e pelo reconhecimento dos direitos humanos e democráticos básicos negados ao povo desde a
ocupação do Zimbábue em 1890. Os dois movimentos de libertação dirigidos pelo povo do Zimbábue
surgiram na luta e na vitória contra as forças coloniais britânica da Rodésia em 1979. O governo do
Zimbábue é, portanto, um governo revolucionário com profundas raízes no povo e cujos valores de igualdade
e justiça derivam da cultura da luta de libertação nacional.

HP - Depois da revolução, qual foi a postura do governo inglês?

Thomas Bvuma - O governo britânico tem tratado o Zimbábue como se este ainda fosse sua colônia
anterior, tentando forçar o governo do Zimbábue a direcionar suas políticas, doméstica e internacional, de
forma a atender aos interesses ingleses. No ano 2000, o governo do Zimbábue adquiriu fazendas comerciais
que pertenciam principalmente a descendentes dos colonos ingleses e redistribuiu suas terras a africanos
sem terra que haviam lutado terra durante a luta de libertação nacional e que esperaram por elas durante 20
anos, depois da independência de 1980. O governo britânico reagiu mobilizando os EUA, a União Européia,
Austrália, Canadá e a Nova Zelândia a se juntarem na tentativa de isolamento do Zimbábue da comunidade
internacional, levando adiante uma campanha internacional suja contra o presidente Mugabe e pela
imposição de sanções sobre o governo do Zimbábue. Os governos dos EUA e da Inglaterra declararam, desde
o ano 2000, que trabalhavam com o partido de oposição, setores da sociedade civil e da imprensa para
conseguir uma ‘mudança de regime’ no Zimbábue. As eleições que ocorreram no país em 2000, 2002 e 2005
foram declaradas livres e justas tanto pela União Africana, como pelos países africanos e pelos países em
desenvolvimento, porém a Inglaterra e os EUA declararam que as eleições não foram livres e justas porque
não levaram a uma ‘mudança de regime’.

HP - Como o governo e o povo do Zimbábue tem enfrentado essas atitudes?

Thomas Bvuma - As sanções inglesas e norte-americanas trouxeram tempos difíceis para o povo do
Zimbábue, que reagiu no mesmo espírito revolucionário que o manteve e o levou à vitória durante a luta de
libertação nacional. Apesar dos tempos difíceis, o povo votou para trazer o ZANU-PF de volta ao poder, nas
eleições parlamentares de 2000, nas eleições presidenciais de 2002 e nas eleições parlamentares de março
de 2005. Diante da hostilidade britânica, o governo do Zimbábue tem buscado desenvolver soluções
nacionais para fazer com que o país cresça.

HP - Como tem sido o programa de reforma agrária?

Thomas Bvuma - O programa de reforma agrária do presidente Robert Gabriel Mugabe se completou e a
terra foi transferida com sucesso da minoria para a maioria dos africanos sem terra. A tarefa que se coloca
agora diante do Zimbábue é conquistar o aumento da produtividade rural. Para alcançar isso, estamos
criando fundos, a juros muito baixos, aos novos agricultores para que eles possam ter acesso a tratores,
sementes e fertilizantes.
O governo do presidente Mugabe dirigiu um programa acelerado de reforma agrária a partir do ano 2000,
vinte anos depois da independência. A demora em iniciar este programa foi provocada pela Constituição da
Casa de Lancaster, imposta sobre o Zimbábue durante as negociações de paz de 1979, na Casa de Lancaster.
Foram negociações que levaram às eleições e à independência do Zimbábue. A Constituição continha
cláusulas que proibiam a aquisição e redistribuição de terras nos dez primeiros anos depois da
independência. Após expirar as cláusulas restritivas nos anos 90, as tentativas do governo de adquirir e
redistribuir terra se depararam com uma intransigência dos fazendeiros e do governo inglês, que se recusou
a liberar recursos de acordo com seus compromissos firmados após as negociações da Casa de Lancaster. Em
1997 o governo de Tony Blair decidiu declarar a renúncia a toda a responsabilidade diante dos compromissos
firmados pelo governo de Margaret Thatcher e se recusou a liberar os fundos para a redistribuição. Em 1998,
camponeses sem terra e veteranos da guerra de libertação deram início à ocupação das terras dos
fazendeiros em todo o país. O governo respondeu aos anseios do povo lançando um programa de reforma
agrária acelerado, através do qual adquiriu fazendas comerciais e as redistribuiu aos africanos sem terra. O
governo pagou apenas pelas melhorias realizadas pelos fazendeiros em suas terras, declarando que era dos
ingleses a responsabilidade de pagar aos fazendeiros pela terra adquirida.

HP - Que outras medidas tem tomado o governo do Zimbábue para melhorar as condições de vida da
população e aumentar a inclusão social, principalmente da população africana atingida pelos séculos de
colonialismo?

Thomas Bvuma - O governo do presidente Mugabe tomou muitas outras medidas para promover qualidade
de vida da maioria africana. Uma política interna que busca redistribuir a riqueza para o povo africano, não
apenas na agricultura mas em outros setores da economia. Como resultado disso, o Zimbábue tem agora
empreendedores africanos que possuem bancos e outras instituições financeiras, minas e indústrias, hotéis e
operadoras de safáris. O governo encoraja pequenas e médias empresas a ampliar a participação de
africanos na economia nacional. O governo tornou a educação um direito humano básico, construiu muitas
escolas nas áreas rurais e bairros pobres urbanos e, hoje, o Zimbábue é a nação com mais alto índice de
educação de toda a África, com o maior nível de alfabetização que atinge cerca de 95%. Hospitais e clínicas,
água encanada, esgoto, estradas e eletricidade foram benefícios estendidos à maioria que vive na zona
rural.

HP - Como funciona o sistema político do Zimbábue?

Thomas Bvuma - A democracia funciona muito bem. De fato, o Zimbábue é mais antigo dos países
democráticos na África. Os que hoje se dizem ‘campeões da democracia’, os ingleses e norte-americanos,
não foram os que trouxeram a democracia para o Zimbábue. A política colonialista britânica negou
deliberadamente a democracia e os direitos humanos básicos aos africanos. A guerra de libertação trouxe a
democracia em 1980, quando o país passou pelas primeiras eleições democráticas. Desde então, o Zimbábue
teve cinco eleições parlamentares multipartidárias. Eleições que ocorrem a cada cinco anos. Três eleições
presidenciais, a cada seis anos e diversas eleições locais, que ocorrem a cada quatro anos. Durante os anos
das décadas de 80 e 90, as eleições no Zimbábue eram consideradas livres e justas e o país era visto como o
líder em eleições multipartidárias. Depois que o governo do presidente Mugabe lançou o programa de
reforma agrária, os governos inglês e americano, insatisfeitos, passaram a conspirar por uma ‘mudança de
regime’, e as declararam antidemocráticas. Os países africanos, os países em desenvolvimento, que
percebem as maquinações inglesas declararam que as eleições são livres e justas, apesar da imensa pressão
que têm sofrido.

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