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Por sua vez, o art.

2e;> desta lei declara a) o respectivo contrato houver celebrado,


nulos os atos lesivos ao patrimônio não só sem prévia concorrência pública ou adminis-
mas também das sociedades de economia trativa, sem que essa condição seja estabe-
mista quando ocorre o que chama de "vício lecida em lei, regulamento ou norma geral."
de forma" (art. 29 , alínea b). E esclarece no
É certo que, para a ação popular, não bas·
parágrafo único, alínea b:
ta a "nulidade". B preciso que a ela se acres-
"O vício de formas consiste na omissão ou
cente a "lesividade", o que só o exame caso
na observância incompleta ou irregular de
a caso pode identificar (cf. Meirelles, Hely
formalidades indispensáveis à existência ou
Lopes. Mandado de segurança e ação popular.
seriedade do ato."
5. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais,
Ora, a falta de licitação se enquadra per·
1978. p. 66 e segs.).
feitamente nessa previsão. B "vício de for·
ma" porque envolve a omissão de formali· É o meu parecer.
dade indispensável. São Paulo, 23 de agosto de 1979. - Ma-
Se isso não bastasse, é expressa a lei mais noel Gonçalves Ferreira Filho, Professor Ti-
adiante. Declara nulos atos ou contratos, tular de Direito Constitucional na Faculdade
como: de Direito da Universidade de São Paulo;
"III A empreitada, a tarefa e a con· Doutor em Direito pela Universidade de Pa-
cessão do serviço público quando: ris.

ENSINO SUPERIOR - FUNDAÇÃO - AUTARQUIA ESPECIAL

- A opção entre a forma jurídica de fundação ou autarquia


especial nas universidades oficiais deve se inspirar, dominantemente,
no princípio de garantir a autonomia e a qualidade do ensino superior.
- O regime de autarquia especial deverá ser implantado me-
diante lei própria.
- E indiferente, quanto à gratuidade do ensino, a forma autár-
quica ou fundacional da universidade.

PARECER definição do modelo institucional adequado


ao ensino superior oficial. Contudo, o exame
1. Relatório da forma ou sistema de organização pressu-
põe a avaliação do conteúdo da atividade ou
serviço a ser desempenhado.
De logo, é mister salientar que o conceito
Entre os temas propostos pelo Exmo. Sr.
proposto (ensino oficial), em sentido lato,
Ministro da Educação e Cultura ao pronun-
alcança tanto a universidade como os esta·
ciamento deste Conselho, conforme Aviso
ne;> 288, de 3 de abril último, figura o se- belecimentos isolados de ensino superior e,
guinte, que nos foi distribuído: mais ainda, não distingue entre o ensino su-
perior federal e o propiciado a nível estadual
- Vantagens e desvantagens das formas de
ou municipal.
constituição jurídica autárquica e fundacio-
nal para os estabelecimentos oficiais de en- A toda evidência, as peculiaridades ine·
sino superior no País. rentes a cada um desses sistemas ou tipos
Tal como enunciada, a proposição se con- institucionais repelem a possibilidade de uma
tém no plano formal ou orgânico, isto é, na solução ou um padrão único de estrutura.

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A fim de que o estudo não se venha a di- ano, 36,7% freqüentaram instituições e 63,3%
luir em especificidades, parece-nos conve- instituições particulares.
niente - ao menos como aproximação ini- Em termos regionais, o ensino público pre-
cial da questão - concentrar a análise do valece fortemente nas regiões Norte e Nor-
tema no plano da Universidade Federal. deste - respectivamente 81,9 e 66,9% em
Ainda que muitos dos pontos assim focali· 1979 - invertendo-se a relação, na região
zados possam coincidir com os problemas de Sudeste - 73,2% para o ensino particular.
regime jurídico tanto a nível estadual ou Comparativamente, o número de estabeleci-
municipal como no plano de estabelecimen- mentos isolados e federações (públicos e pri·
tos isolados oficiais, não devemos nos com- \-ados) representa 92,5% das instituições de
prometer com a generalização das observações ensino superior, abrigando, porém, unica-
a serem feitas. mente 52,3% do alunado, ao passo que os
restantes 47,7% integram o corpo discente
das 65 universidades existentes (7,5% do to-
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tal de instituições).
Qual a forma jurídica ideal para a uni· A alta concentração de alunos nas univer-
versidade brasileira mantida pela União? sidades está em razão direta da maior oferta
de cursos: 43 universidades (66,1 % do to-
A resposta impõe, como premissa necessá-
tal) mantêm mais de 20 cursos, ao passo que
ria, outra indagação:
718 dos estabelecimentos isolados e federações
Que pretende a União ao criar e manter (89,9%) oferecem não mais de cinco cursos.
universidades oficiais? (Fontes: Boletim Informativo SESu, mar.
Em uma sociedade aberta e democrática 1981 e Perfil acadêmico das IES federais,
- como é de nossa tradição e destinação SESu, jun. 1980).
histórica - certamente não está em causa Certo é que, em termos culturais ou de
a difusão de uma doutrina oficial do Estado, liderança educacional, perdura a influência
ou a imposição de padrões educacionais ou predominante do ensino oficial, que é de
culturais. nossa tradição acadêmica.
O ensino superior oficial emana do prin- A Universidade Brasileira esteve sempre
cípio contitucional de que a educação é di- presente nos momentos culminentes da his-
reito de todos e dever do Estado assim como tória nacional. A influência da universidade
o amparo à cultura (Constituição Federal, como caldo de cultura das reformas sociais,
art. 176, caput, e art. 180) e terá como fun· tão nítida na semeadura da Renascença e na
damento o princípio da unidade nacional e difusão do liberalismo, entre nós antecede
os ideais de liberdade e de solidariedade à própria independência política: nas univer-
humana (art 176, caput). sidades da Corte portuguesa é que se pre-
De outra parte, é livre à iniciativa privada param os líderes que comandariam o processo
o ensino em todos os seus graus, respeitados de separação da Coroa, sob a égide do Prín-
os critérios e limitações de lei (art. 176, § 29 ) cipe convertido em Imperador.
e o sistema federal de ensino, em linha de A liderança do processo cultural por parte
princípio, é supletivo em referência aos dos das escolas superiores no Recife como em
Estados e do Distrito Federal (Constituição, São Paulo, na metrópole como nas provín-
art 177). cias, foi uma herança que do Império se
Como é sabido, o ensino superior é mi- transmitiu à República. Os grandes movimen-
nistrado dominantemente em estabelecimentos tos de opinião nacional ressoaram, como ain-
privados. Em termos nacionais, o número de da ressoam, no seio das coletividades aca-
instituições públicas representava, em 1980, dêmicas, embora de maneira informal ou
26,1 % do total contra 73,9% do ensino pri- assistemática.
vado. No total de 1 345000 alunos matri- A universidade não é, nem deve ser, po-
culados, em cursos de graduação, no mesmo lítica no sentido de atividade partidária oU

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de proselitismo. A mlssao universitária não que permita alcançar seus objetivos funda-
lhe permite, contudo, abstrair-se dos proble- mentais, que se concentram em tríplice fi-
mas de sua época e das aspirações da comu- nalidade de:
nidade. a) transmitir o conhecimento adquirido,
f: que, em todos os tempos, não é a uni- formando profissionais e especialistas ou
versidade apenas um organismo voltado à atualizando-lhes a formação (difusão do co·
formação profissional de ensino superior. Se nhecido);
esta é sua missão imediata - porque dela b) criar conhecimento novo ou nova tec·
depende basicamente o acesso a um estádio nologia, mediante pesquisa pura ou aplicada
superior da sociedade (mormente quando am- (conquista do desconhecido);
bicionamos a plenitude de domínio tecno- c) prestação de serviços à comunidade,
lógico como etapa da sociedade industrial tanto no plano técnico como no social (ex-
ou pós-industrial) - não pode ser obscure- tensão universitária).
cido o papel das elites universitárias na di- Como instrumento de promoção sistemá-
fusão e revisão de valores culturais, como tica da cultura e de estímulo ao desenvol-
de parâmetros institucionais. vimento, segundo as necessidades do meio e
Especialmente quando os conceitos tradi- do momento social, o funcionamento das
cionais de vida são contestados em seus fun- universidades deve visar ao seguinte esquema
damentos e em sua expressão é que as uni- de atividades básicas:
versidades se devem projetar como o fórum a) prestação de ensino de 31? grau, ofere-
privilegiado para a identificação de proble- cendo as habilitações necessárias ao exercí-
mas, o debate científico ou artístico sobre cio das profissões e das artes;
teses essenciais, a avaliação de necessidades b) pesquisa científica com o duplo objetivo
e a busca de fórmulas viáveis para a expan- de integração no processo didático e de busca
são sistemática e ordenada da sociedade. e domínio do conhecimento científico (ciên-
Para alcançar tais objetivos, necessitam as cia pura);
universidades atingir o difícil ponto de equi- c) prestação de serviços à comunidade e às
líbrio em que a liberdade de opinião se as- atividades produtivas (ciência aplicada);
socie à superior isenção científica, de forma d) formação de elites dirigentes e ava-
a que, centro por excelência de problemas liação dos problemas nacionais e regionais,
nacionais, não se torne refúgio de sectaris- mediante a difusão e ampliação da cultura.
mos nem mascare processos de conquista do Para o desempenho desse programa, deve
poder. a universidade dispor de uma estrutura or-
O exercício da missão universitária há de ganizacional flexível que, sem prejuízo de
ser desempenhado dentro dos critérios fi· linhas-mestras compatíveis com os princípios
xados como diretrizes e bases da educação da administração pública, possa facultar-lhe
nacional (que à lei federal cabe especificar um nível de planificação e de produtividade
- art. 81?, nl? XVIII, alínea q da Constitui· adequada aos seus deveres fundamentais.
ção), importa dizer, em harmonia com a Po- No plano estrutural, a universidade exerce
lítica Nacional de Educação e Cultura, pro- atividades-meio e atividades-fim (ver Organo-
gramada pelo Ministério da Educação e Cul- grama 1, anexo). O exercício dessas últimas
tura, com a colaboração, nas áreas de sua (que representam a essência da função uni·
competência específica, do Conselho Federal versitária) não poderá ser alcançado em ter·
de Educação, do Conselho Federal de Cul- mos eficientes, se a prática daquelas, ou seja,
tura e dos correspondentes Conselhos esta- as de administração geral ou especial, esti-
duais (ver Organograma 1, anexo). ver divorciada, em sua dinâmica de execução,
Dentro desse balizamento de diretrizes e dos objetivos finais da atividade educacional
de estruturas, as universidades devem, porém, ou cultural.
ter preservada a autonomia, ou seja o poder Quando, portanto, nos defrontamos com a
de autogestão e de auto-ordenamento interno opção pela forma jurídica mais aconselhável,

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o que, em verdade, nos incumbe determinar Assim, o Banco Central do Brasil, criado
é o modelo institucional mais apropriado à na Lei nQ 4595, de 31.12.64, art. 8Q, com
plena eficiência do princípio da autonomia finalidade especial, goza de disciplina pró-
universitária que, como assinalado, é o pro- pria em relação às suas contas, orçamentos
cesso ou meio de ação que visa à plena con- e balanços e no tocante à celebração e exe-
secução de seus fins_ cução de contratos (Decreto-Iei nQ 278, de
28.12.67).
III Também a Comissão Nacional de Energia
Nuclear (CNEN), criada no art. 3Q da Lei
o art. 81 da Lei de Diretrizes e Bases da n Q 4118, de 27.8.62, como partícipe do mo-
Educação Nacional (Lei n Q 4024, de 20 de nopólio estatal em matéria nuclear (art. 1Q
dezembro de 1961) firmou o princípio de da Lei nQ 6189, de 16.12.74), a importar
que "as universidades oficiais serão cons- em competência especial na matéria (Lei n Q
tituídas sob a forma de autarquias e funda- 6189, arts. 2Q, 6Q, 7Q e 10, alterado pelo De-
ções"_ (Não prosperou o veto, que foi rejei- creto-lei nQ 1810/80), ficou excluída do sis-
tado, no sentido de estender-lhes a constitui- tema estatutário de pessoal - aplicável às
ção como associações, tal como previsto para autarquias - passando a ter quadro de pes-
as universidades particulares.) soal regido pela legislação trabalhista e do
A alternativa subsiste na lei atual (Lei Fundo de Garantia do Tempo de Serviço,
nQ 5540, de 28 de novembro de 1968) quan- de modo a permitir o adequado recruta-
do especifica, em seu art. 4Q , que as univer- mento de especialistas (Lei nQ 6571, de 30
sidades e estabelecimentos de ensino supe· de setembro de 1978).
rior isolados, quando oficiais, constituir-se-ão A Lei nQ 5 540/68 limitou-se, porém, quan-
"em autarquias de regime especial ou em to às instituições oficiais de ensino superior,
fundação de direito público". a prever, como um dos termos da alternativa,
Ambas as expressões padecem de impre- a natureza jurídica de autarquias de regime
cisão conceitual. especial, sem, no entanto, ditar-lhes as carac-
terísticas ou regalias em confronto com o
O conceito de autarquia, construído dou-
sistema autárquico geral.
trinariamente à medida que o legislador bra-
Ficou, assim, inócuo - até que outra lei
sileiro, a partir da década de 20 - e acen-
venha a complementá-la - o caráter excep-
tuadamente de 1930 em diante - estimulou
cional que pretendia conferir-lhes um status
essa forma de descentralização, cristalizou-se
peculiar.
na definição legal do art. 5Q do Decreto-Iei
Como outro termo da alternativa, a Lei
nQ 200, de 25 de fevereiro de 1967:
nQ 5 540/68 indica, para as instituições ofi-
"Art. 5Q Para os fins desta lei, conside-
ciais de ensino, a forma das "fundações de
ra-se: direito público".
I - autarquia - o serviço autônomo, cria- São conhecidas as ambigüidades que se
do em lei, com personalidade jurídica, patri- oferecem, no plano doutrinário ou normati-
mônio e receita próprios, para executar ati- vo, quanto à disciplina das fundações insti-
vidades típicas da administração pública, que tuídas pelo Estado.
requeiram, para seu melhor funcionamento, Tal como nas empresas estatais, o legisla-
gestão administrativa e financeira descentra- dor foi buscar o paradigma no direito pri-
lizada." vado, mas a entidade assim criada tem a
Não se qualificou, porém, nessa lei orgâ- substância de um ente público, é uma pessoa
nica da administração pública federal, ou em administrativa, posto que se destina à pres-
qualquer outra, diferenciação entre autar- tação de um serviço pelo qual o Estado res-
quias comuns e autarquias de regime especial. ponde ou passa a responder.
Unicamente leis especiais têm facultado a De outra parte, porém, a recepção de um
certas autarquias um grau mais intenso de instituto jurídico moldado no direito privado,
autonomia operacional. tem por fim alcançar maior liberdade de ope-

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ração sem as limitações peculiares ao regime sumem a gestão de um serviço estatal e se
da administração pública. submetem a um regime administrativo (ver,
A doutrina vacila entre os que situam tais v. g., Pareceres n 9s 4607/78; 6651/78;
fundações entre as entidades paraestatais 7 170/78; 2121/78; 5206/78; 666/79; 1049/
(Hely Lopes Meirelles), qualificam·nas como 79; 1552/79; 917/79; 987/79; 1452/79;
espécie do gênero autarquia (Celso Antonio 128/80; 454/80; 565/80; 573/80 791/80;
Bandeira de Mello, Cotrim Neto, Sergio de 1011/80; 9/81; 54/81).
Andrea Ferreira) admitem a qualificação A designação de fundações de direito pú-
como fundações de direito público (Cretella blico deverá reservar-se a essas últimas, a
Junior, Miguel Reale), negam-lhe essa quali- que o Poder Público concorrente não so-
dade (Manoel de Oliveira Franco Sobrinho) mente pela dotação de bens públicos que lhe
ou as definem como pessoas administrativas vão constituir o patrimônio afetado a um fim
(Homero Senna e Clovis Zobaran Monteiro). específico, mas também para sua manuten-
A lei federal não contribui para pacificar ção e controle, ou seja, visando à persecução
os conceitos. de um fim público.
Primeiramente, o Decreto-lei n 9 200, de Como escrevemos, em outra oportunidade,
1967, equiparou "às empresas públicas, para "instituídas em virtude de lei, tais fundações
os efeitos desta lei, as Fundações instituídas têm as virtualidades do serviço público, em-
em virtude de lei federal e de cujos recursos bora conservem características de direito pri-
participe a União, quaisquer que sejam suas vado" (Revista Forense, v. 205, p. 419).
finalidades" (art. 49 , § 29). O Estado, ao instituí-las, não abdica de
Provavelmente advertido do equívoco de exercer, quanto a elas, os poderes de super-
assemelhar a uma pessoa jurídica de ativi- visão e de organização. A contrário do ins-
dade econômica (empresa pública) outra que tituidor privado, cuja vontade se exaure no
tem por objeto uma atividade não econô- ato institucional (escritura pública ou testa-
mica, o legislador reformulou o enquadra- mento), passando o Ministério Público a ve-
mento. Mediante o Decreto-lei n9 900, de lar pela fundação (Código Civil, arts. 24 e
1969, revogou aquele preceito e editou norma 26), ao Estado fica reservada sempre a com-
nova (art. 39 ) segundo a qual "não consti- petência legislativa sobre a fundação que
tuem entidades da administração indireta as houver instituído, como um serviço público
fundações instituídas na lei federal, aplican- virtual.
do-se-lhes, entretanto, quando recebam sub- O que permite distinguir, em suma, funda·
venções ou transferências à conta do orça- ções criadas pelo Estado, umas de outras, é
mento da União, a supervisão ministerial". a intensidade do grau de atribuição de um
São, em suma, entes administrativos lato serviço público e da conseqüente tutela que
sensu, embora excluídos da administração sobre elas exerce a administração pública,
indireta e, a fortiori, da direta. nos termos que a lei estabelecer. Esse vín-
E, em seu art. 29 , o mesmo Decreto-lei culo ou cordão umbilical não as torna, po-
n9 900/69, limita a criação de novas fun- rém, pessoas jurídicas de direito público, de
dações, pelo Poder Público, à participação, modo a nivelá-las com as autarquias, tal
no patrimônio e nos dispêndios correntes, de, como disciplinadas no direito positivo bra-
pelo menos, 1/3 (um terço) de recursos pri- sileiro.
vados, remetendo à lei civil quanto a outros O regime administrativo das fundações
requisitos. públicas, especificado na lei especial, é a nor-
Em pareceres emitidos neste Conselho, ma primária que lhes comanda a atividade,
com aprovação do Plenário, temos salientado sem embargo de que as normas aplicáveis às
a distinção fundamental entre fundações cuja fundações privadas sirvam-lhe de fonte sub-
criação é autorizada em lei, mas em que o sidiária, ou complementar. O direito público
Estado não tem participação efetiva ou do- e o direito privado - tal como nas empre-
minante (e são assim fundações em regime sas do Estado - se imbricam na medida em
de direito privado) daquelas outras que as- que a lei, em cada caso, estabelecer.

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o confronto, no plano normativo, entre Campo especial em que se diferenciam as
autarquias e fundações deve ter, como ponto autarquias e as fundações do regime jurídico
de partida, o tratamento constitucional. de pessoal.
Ao contrário das fundações, que estão au- Os servidores autárquicos, assemelhados
sentes do texto da Constituição, as autarquias aos funcionários públicos, obedecem ao re-
nele aparecem, de forma explícita, em razão gime estatutário, tanto no que se refere a
da personalidade de direito público, que as direitos e deveres como quanto à criação de
aproxima do regime da administração pública cargos e ao sistema de remuneração, salvo
direta. nos casos em que foi prevista a aplicação da
lei trabalhista (art. 14 da Lei n9 6 182/74 e
Assim, o art. 19, § 19 concede-lhes a fran-
art. 29 da Lei n9 6 185/74).
quia da imunidade tributária; o art. 34, n9s I
Ao contrário, os servidores de fundações
e 11 veda a deputados e senadores celebrar
estatais se enquadram plenamente no regime
contratos ou ocupar cargos e empregos em
trabalhista, salvo normas especiais, como a
autarquias, regulando, no art. 104, o afasta-
do art. 176, § 39, n9 VI, da Constituição,
mento de tais cargos durante os mandatos
qu~ obriga a concurso público de provas e
eletivos; impõe-se a incorporação ao orça·
títulos o provimento de cargos iniciais e fi-
mento geral da União, sob a forma de dota-
nais do magistério oficial. A Lei n9 8 836
ções globais, da receita e despesa das autar-
de 9. 12.76, permite a sindicalização de seu;
quias; como órgãos de administração indireta
servidores, aos quais também se aplica a
as normas de fiscalização financeira e orça-
norma de reajustes semestrais de salários.
mentária e a previsão orçamentária de verba
A rigidez do sistema de pessoal docente
para atender a condenações judiciais apli-
nas autarquias levou a deformações signi-
cam-se às autarquias, conforme o comando
do art. 70, § 59 e art. 117, § 19; a proibição ficativas, com a admissão de professores-
de acumular cargos públicos alcança o pessoal colaboradores, que somente com o advento
do Decreto-lei n9 1 820/80 (art. 99 ) passam
das autarquias (art. 99, § 29 ) e a responsa-
bilidade civil da administração perante ter- a ser absorvidos na carreira do magistério.
Segundo dados do segundo semestre de
ceiros, com base na teoria do risco, a elas
1979, as universidades federais autárquicas
se estende, por força do art. 107; os litígios
mantinham 10248 professores-colaboradores
de trabalho como, em geral, as causas de
contra 21 893 outros membros do corpo do-
interesse de autarquias sujeitam-se à jurisdi-
ção dos juízes federais (arts. 110 e 125, n9 1), cente (Titulares, Adjuntos, Assistentes e Au-
xiliares de Ensino) ou seja, na proporção
assim como a ação popular prevista no art.
153, § 31. praticamente de 1 para 2.
t significativa a informação oficial de que,
Certos privilégios favorecem as autarquias,
nas autarquias, a partir da implantação do
nos termos da lei ordinária, tais como: pres-
Plano de Classificação de Cargos, "os dados
crição qüinqüenal de dívidas passivas (De-
absolutos de Professores do Grupo Magis-
creto-Iei n9 4 597/42); execução fiscal de
tério evidenciam um decréscimo de 23 678
créditos (Código de Processo Civil, art. 585);
em 1974 para 21893 em 1979 e, simulta-
regalias processuais em juízo (CPC, art. 27,
neamente, o crescimento do número de co-
188 e 475); prisão administrativa de servi-
laboradores que em 1979 totalizam 10248"
dores (Decreto-lei n9 3415/41).
e eram inexistentes em 1974, quando a lei
As fundações criadas pelo Estado apenas passou a facultar-lhes a admissão (Perfil aca-
implicitamente ingressam no âmbito constituo dêmico das IES federais, SESu, p. 25 e qua-
cional em razão de sua atividade como "ins- dro 6).
tituições de educação ou de assistência so- Nas universidades federais constituídas
cial", favorecidas com isenção fiscal (art. 19, como fundações a relação entre colaborado-
111, c). Estão, nesse particular, em plano de res e professores do Grupo Magistério é ou-
igualdade com entidades privadas que pra- tra. Em 1974, o total do corpo docente era
ticam a mesma atividade não-econômica. de 4803, não havendo colaboradores. Em

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1979, o Grupo Magistério elevou-se a 7452 A formação histórica e os contornos da
contra 902 colaboradores, ou seja, na pro- autonomia universitária foram excelente-
porção de 0,12 para 1. Note-se que cerca mente determinados no Parecer n9 76/62,
de 1/3 desses colaboradores está vinculado da lavra do ilustre Conselheiro Newton Su-
à Universidade de Brasília, na qual o cola- cupira (Documenta, n9 4, p. 45-53).
borador tem características específicas (mes- A autonomia não é um fim em si mesmo,
ma fonte supra). mas um meio de dotar a universidade de ins-
A escolha de dirigentes de universidades trumentos capazes de possibilitar-lhe o fle-
federais apresenta substancial diferença. xível mecanismo funcional que permita o
Constituídas como autarquias, permanecem eficiente alcance de seus objetivos.
vinculadas ao sistema de mandatos fixos e Em termos reais, não é excessivo dizer-se
à escolha mediante listas sêxtuplas elabora- que, na atualidade, a universidade oficial
das pelos Conselhos superiores (art. 16 da brasileira se acha burocratizada, tolhida em
Lei n Q 5 540, conforme a Lei nQ 6420/77). sua criatividade pela exagerada padronização
Assumindo a forma de fundação, passam a administrativa e financeira a que está sub-
reger-se pela Lei n Q 6 733/79, que prevê a metida.
livre escolha pelo Presidente da República Na gestão universitária, o administrador,
no provimento dos cargos. Convém recordar, não obstante a permanência do princípio da
na matéria, que, em conformidade com a autonomia (art. 89 da Lei n Q 4024/61 e art.
ementa 25 da Súmula do STF, "a nomeação 39 da Lei n9 5540/68), sofre limitações de-
a termo não impede a livre demissão, pelo correntes da política geral de administra-
Presidente da República, de ocupante de car- ção, seja pelo planejamento econômico-finan·
go dirigente de autarquia", porém a Súmula ceiro - no que toca à disponibilidade real
47 ressalvou que "Reitor de Universidade de recursos orçamentários - seja pelos cri-
não é livremente demissível pelo Presidente térios de administração de pessoal, ainda que
da República durante o prazo de sua inves- o regime do magistério superior atenda, ou
tidura". deva atender, a legislação própria (art. 31
A universidade, como recordado, deve da Lei n 9 5540/68).
nascer, viver e conviver sob o signo da au- Entre seus objetivos, deve a universidade
tonomia, que é um conceito multilateral. contemplar a prestação de serviços que é a
Primordialmente, autonomia científica e um tempo meio de integração com a comu-
didático-pedagógica porque é da essência da nidade e forma de captação de recursos pró-
instituição universitária a liberdade de criar, prios para investimento e custeio. A esse tí-
pesquisar, ordenar e transmitir o conheci- tulo, a forma jurídica de fundação oferece
mento, como elemento fundamental para di- inegável vantagem na medida em que a su-
fundir a educação e fomentar a cultura. pervisão do órgão de tutela administrativa
Esta missão básica da universidade pres- não venha a interferir com a liberdade de
supõe, no entanto, a disponibilidade de meios contratar e a execução de tais fontes extraor·
flexíveis e satisfatórios à plenitude de con- dinárias de receita e despesa.
secução de seus fins. A premência de tempo não nos permitiu
Daí a necessidade de estender-se o princí- aprofundar o exame das fontes de receita
pio da autonomia aos meios de operação, das instituições federais de ensino. Alguns
consistentes na autonomia patrimonial, au- dados podem, contudo, ser extraídos da pu-
tonomia orçamentária e financeira, autono- blicação oficial da SESu, a que antes nos
mia administrativa e autonomia disciplinar. reportamos.
Certamente este não é somente um direito Os indicadores de dotações do Tesouro
concedido às universidades, senão também até 1980 (inclusive solicitações extrateto para
um dever que lhes é imposto e uma respon- 1981) apontam a distribuição da ordem de
sabilidade a que ficam sujeitas no sentido 75% para as autarquias e de 25% para as
do uso adequado, que não importe desvio fundações. Não temos dados de suas receitas
de finalidade. extra-orçamentárias.

208
f. mister ter presente, no entanto, a dife- IV
rença de escala conforme dados de 1979,
entre as duas categorias, quanto ao número Clue vantagens e desvantagens oferecem os
(27 autarquias e 15 fundações), corpo do- modelos de autarquia e de fundação, quando
cente (33020 para 8429), corpo discente aplicados ao ensino superior oficial?
(255293 para 71 703) e cursos ministrados Conclusivamente, tentaremos enunciá-las,
(1 007 para 347). com remissão às observações até aqui feitas.
Fundamenta-se, assim, a conclusão do O modelo autárquico - a ser adotado -
mencionado documento no sentido de que deixa ao legislador um razoável elastério,
"os indicadores que caracterizam esforço e porque a lei básica do ensino superior de
carga de trabalho como corpo discente, nú- logo se refere a autarquias de regime espe-
mero e diversidade de cursos são sistema- cial.
ticamente mais altos nas autarquias do que Respeitadas as disposições constitucionais
nas fundações, enquanto os indicadores que que, por sua hierarquia, são inalteráveis, a
caracterizam disponibilidades como recursos lei ordinária especial pode, e de certo modo
financeiros são relativamente mais altos nas deve, distinguir as autarquias educacionais
fundações", pelo que "pode-se afirmar, em das autarquias de outra natureza.
princípio, que as fundações dispõem propor- Há, todavia, características próprias da per-
cionalmente de mais recursos do que as au- sonalidade de direito público do ente autár-
tarquias, para desenvolver um esforço acadê- quico que devem subsistir, inclusive pelo
mico proporcionalmente menor" (doc. cit. vínculo à Constituição, tais como:
p. 115 e 117). 1. imunidade tributária;
2. privilégios processuais em juízo;
t oportuno realçar, em termos históricos, 3. relativa indisponibilidade patrimonial;
que, a partir da Universidade Federal de 4. responsabilidade civil objetiva (teoria
Brasília, todas as que vieram a ser consti- do risco administrativo);
tuídas pela União assumiram a forma de 5. jurisdição especial, inclusive nos lití-
fundações. gios trabalhistas;
A opção pela forma jurídica da universi- 6. regime estatutário de pessoal (com a
dade oficial - autarquia ou fundação - conseqüente não sindicalização e in aplicação
embora relevante, não supera em importância da lei de reajustes semestrais. A não-percep-
a tomada de posição do Estado, em termos ção do chamado 13Q salário deverá desapa-
de planejamento e execução, quanto à dire- recer com a projetada extensão da vantagem
triz de preservar - e em que limites - a ao pessoal estatutário da União).
autonomia de gestão das universidades, so- f. de se concluir, assim, pela necessidade
bretudo no tocante a três aspectos funda- de elaboração de lei própria que venha a re-
mentais: gular, quanto às instituições federais de en-
1 . autonomia da gestão econômico-finan- sino superior (ou, pelo menos, a respeito das
ceira e garantia de transferência oportuna de universidades) o regime especial a que obede-
dotações globais a elas destinadas no orça- cem, como autarquias. São subsídios valiosos,
mento geral da União; nesse particular, os estudos já elaborados
pelo MEC e em nível interministerial.
2. autonomia da criação de cargos e fun-
As atuais limitações administrativas, orça·
ções, seu provimento e regime de remunera-
mentárias e financeiras que, notoriamente,
ção;
constrangem a autonomia das universidades
3. liberdade de contratar serviços e ad- têm como causa a sujeição delas ao sistema
ministrar os recursos decorrentes. geral das autarquias federais.
Dentro de diretrizes e bases fixadas na for- Na medida em que, mediante lei especial,
ma da lei, a observância desses princípios é possam adquirir maior liberdade de funcio-
a condicionante máxima do êxito na missão namento (tal como ocorreu nas autarquias
universitária. que já alcançaram, como acima referido, o

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status de autarquias de regime especial) mui- Ainda que este seja um conceito difuso,
tos dos óbices que as afligem poderão ser cujos contornos precisos ao legislador incum-
superados. be traçar, certo é que o completo alheia-
De outra parte, a opção do modelo de mento da comunidade universitária na esco-
fundação de direito público excluirá, pelo lha da cúpula da universidade (inclusive com
menos em tese, os privilégios inerentes às a possibilidade de recrutá-la fora de seus
autarquias, importando, porém, provavel· quadros docentes) tende a desestimular o ní-
mente, em maior flexibilidade financeira, vel de representatividade do órgão supremo
patrimonial e certamente no tocante ao re- de comando e de sua natural liderença, de
gime de pessoal. difícil exercício porque praticada entre pares.
O obstáculo oposto no ar!. 29 do Decre- Tanto a escolha entre professores já iden-
to-Iei n9 909/69 (que exige, em novas fun- tificados com os problemas da universidade
dações instituídas pelo Poder Público, a par- como a garantia de mandato determinado
ticipação na proporção mínima de um terço) oferecem virtudes consagradas pela tradição,
poderá ser removido em lei especial que, dis- que merecem ser ponderadas em contraste
pondo em contrário, derrogue a norma an- com os possíveis óbices ou deficiências que
terior de igual hierarquia, mormente se for as limitações ao livre provimento (e, por via
a hipótese de transformação de entidade de conseqüência, à livre demissibilidade)
educacional preexistente. possam apresentar.
Nos paradigmas atuais da estrutura admi- De qualquer modo, a preservação efetiva
nistrativa federal, parece-nos válido concluir da autonomia das universidades, bem como a
que a fundação mais se aproxima, em ter- dinamização de sua produtividade, não são
mos formais, de um sistema econômico-fi- estritamente de estrutura jurídica.
nanceiro empresarial, facilitando a captação Fundamentalmente, exprimem uma opção
de recursos próprios, mediante a intensifica- política de apoio e estímulo à educação e à
ção de contratos ou convênios de prestação cultura, em termos de qualidade (a importar
de serviços, ou de renda patrimonial. Nesse em critérios seletivos prévios e de fiscaliza-
particular, é expressivo o exemplo da Fun- ção permanente) e de financiamento ade-
dação Universidade de Brasília, ainda que quado.
singular.
O regime de pessoal das fundações, inclu- 2. Conclusões
sive quanto aos níveis de remuneração, tam·
bém poderá adquirir maior flexibilidade, A opção entre a forma jurídica de au-
pela aplicação plena da legislação trabalhista, tarquia ou fundação deve-se inspirar domi-
embora de certa forma mais onerosa. nantemente no propósito de assegurar a au-
Importa acentuar, pela atualidade do tema, tonomia das universidades, propiciando-Ihes
que a opção entre a forma autárquica ou condições mais flexíveis de administração,
fundacional é indiferente no tocante à gra- com vistas ao crescente aprimoramento da
tuidade do ensino superior oficial. qualidade do ensino superior.
A norma constitucional do ar!. 176, § 39 , 2. O atual regime das autarquias educa-
n9 s 111 e IV, que regula a matéria (e deverá cionais limita-lhes a eficiência em termos de
ser objeto de outro dos estudos solicitados ensino e pesquisa bem como na prestação
a este Conselho) não varia em sua exegese de serviços à comunidade. As fundações dis-
em função de categoria jurídica do estabe- põem, no plano legal, de condições menos
lecimento público de ensino. rígidas de administração financeira e de
Impõe-se uma observação final sobre o pessoal.
efeito que terá - se mantida inalterada a 3. O regime de autarquias especiais, a
Lei n 9 6 733/79 - o procedimento de livre ser implantado mediante lei especial, permi-
escolha dos dirigentes de fundações educa- tirá o fortalecimento da autonomia univer-
cionais, confrontado com o princípio da au- sitária, tanto pela disciplina própria da ad-
tonomia universitária. ministração financeira e orçamentária (a

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exemplo do Banco Central) como pela adoção recursos financeiros e patrimoniais que for-
do regime trabalhista de pessoal (como na neçam às universidades e estabelecimentos
Comissão Nacional de Energia Nuclear). isolados o alimento essencial ao desempenho
4. O regime de fundações educacionais cabal de suas finalidades.
deve, igualmente, ser objeto de lei especial, 7. É indiferente, quanto à gratuidade do
que estabeleça o modelo próprio de funda· ensino superior oficial, prevista na Constitui-
ção de direito público, a ser aplicado no ção Federal, a forma autárquica ou funda-
sistema federal de ensino superior. cional das instituições universitárias ou iso-
5. É necessário o reexame, a propósito ladas. A questão deverá ser objeto de estudo
da escolha dos dirigentes de fundações edu- especial, em separado.
cacionais, do disposto na Lei n 9 6 733/79, Brasília, 26 de maio de 1981. - Caio Tá-
em atenção ao princípio da autonomia uni- cito, Relator.
versitária. A Comissão Especial aprova o parecer do
6. É recomendável que a União dedique Relator.
especial atenção à crescente destinação de Sala das Sessões, em 3 de junho de 1981.
ORGANOGRAMA 1

Política nacional de Educação e cultura

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