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DESMISTIFICANDO A HIPNOSE

Conceitos e natureza da hipnose.

As manifestações da hipnose ocorrem na vida diária sem que a maioria das


pessoas perceba. Quando assistimos a um filme no cinema ou na televisão e
estamos realmente gostando, nós nos emocionamos com as cenas do filme.
Podemos rir chorar, ficar revoltados ou alegres com determinadas cenas. A
frequência cardíaca pode aumentar em determinadas sequências do filme; em
outras pode ocorrer sudorese nas mãos, redução do ritmo respiratório. Nesses
momentos que nossa atenção está focalizada nas cenas (sugestões visuais,
verbais, extra verbais, subliminares), respondemos a elas segundo nossa
imaginação, segundo o conteúdo das próprias cenas e segundo nossas
experiências passadas (estamos hipnotizados). Durante essas cenas nosso
juízo crítico deixa de analisar se estão passando 24 quadrinhos por segundo na
tela, se a resolução da imagem é de 240, 336, 426, 724, ou 1920 linhas
horizontais no monitor da TV de alta definição, se as cenas foram feitas com
miniaturas dentro de um computador, se outras pessoas estão conversando.
Não ficamos pensando que é apenas um conto, nós nos envolvemos com as
cenas, sentimos as cenas com todos os nossos sentidos, e muitas vezes
deixamos de ouvir ou prestar a atenção no barulho estranho ao filme como o
som da campainha da nossa residência. Quando estamos interessados na
leitura de um determinado livro, reagimos emocionalmente às descrições das
situações interessantes sem estarmos analisando criticamente o tamanho das
letras, a ortografia, falhas na impressão, se uma letra está com a impressão
mais fina do que a outra. Desse modo, limitamos a nossa atenção visual ao
conteúdo do que estamos lendo e somos auto hipnotizados. Quando estamos
ouvindo com entusiasmo uma música de nossa preferência, permanecemos
sem analisar criticamente a afinação do cantor ou a performance da orquestra.
Essencialmente, concentramos a nossa atenção no som musical, permitindo
que a música entre em nossa mente e em nosso corpo, e até podemos ser
hipnotizados pela música, a qual pode nos fazer recordar de um acontecimento
passado, ocorrendo uma relembrança ou mesmo revivificação.
Por outro lado, as manifestações da hipnose apresentam-se como atos não do
consciente, mas sim do funcionamento mental não consciente, como aquelas
experiências que aprendemos no passado e ficaram gravadas no nosso
cérebro, e no presente instante não estão conscientes, mas podem ser
acessadas quando necessitarmos. As manifestações da hipnose podem
também brotar das aferências armazenadas no funcionamento mental não
consciente, mesmo que tenham indo para o funcionamento mental não
consciente aparentemente sem a percepção e o criticismo do consciente.
Quando estamos dirigindo nosso carro de casa para o trabalho, prestamos
atenção consciente no trânsito, contudo, a direção do carro é realizada em
nível do funcionamento mental não consciente, nós não ficamos
conscientemente engatando as marchas e pisando no freio. Assim mesmo,
enquanto dirigimos o veículo prestando atenção ao trânsito, uma série de
estímulos chega ao nosso cérebro sem tornar-se consciente nesse exato
momento e pode ser armazenada em algum lugar do encéfalo.
Quando uma pessoa está aprendendo a dançar, presta atenção ao compasso
musical, presta atenção na sua posição do corpo, olha para os pés para saber
onde posicioná-los, enfim, procura seguir o professor ou o seu par. Essa fase
pode ser comparada às sugestões que o médico formula ao paciente durante o
tratamento pela hipnose. Posteriormente, quando a pessoa já sabe dançar,
simplesmente ouve a música, deixa-a entrar pelo seu corpo e sai dançando
automaticamente.
Analogamente, corresponde ao tratamento bem sucedido pela hipnose quando,
por exemplo, o paciente reprogramou seu modo de alimentar-se para tornar-se
e permanecer esbelto; quando por meio da hipnose ampliou sua capacidade de
aprender e relembrar o aprendido ou eliminou uma fobia.
Desde o nascimento e possivelmente antes mesmo, durante a fase fetal,
vamos acumulando informações e experiências com conteúdo emocional,
algumas poucas estão no nosso consciente no momento presente, mas a
maioria está em partes no disco rígido de nosso computador mental chamado
encéfalo. Isto é, na nossa memória não consciente que se armazena em vários
locais no nosso encéfalo, especialmente nas estruturas do hipocampo
parahipocampo e sistema límbico ou talvez simultaneamente em vários locais e
circuitos neurais do sistema nervoso central. Algumas dessas experiências
armazenadas no FMNC com conteúdo emocional traumático para o consciente
são mantidas no FMNC pelo senso crítico de nosso consciente. Mas mesmo do
FMNC podem causar problemas para a nossa vida consciente. É possível que
durante uma viagem de turismo, uma paisagem visualizada acesse algumas
dessas experiências traumáticas, tornando-as conscientes, facilitando a
resolução de problemas conscientes. Por meio da hipnose podemos ter acesso
direcionado para essas experiências armazenadas no FMNC, e podemos
trazê-las para o consciente com diversas técnicas de hipnoterapia como
análise de sonhos, escrita automática, ponte de afeto, relembrança e
revivificação. Muito embora essas experiências passadas possam brotar
exatamente do mesmo modo como aconteceram, as cargas emocionais
associadas a elas podem facilitar o tratamento.
Durante uma conferência ou uma aula, quando o aluno se interessa pela
matéria e o professor é habilidoso, o aluno permanece com sua atenção tão
focalizada e limitada ao assunto(hipnotizado), que os ensinamentos são
gravados no seu funcionamento mental consciente e mesmo no FMNC. Ao
terminar a conferência ou a aula, o aluno sai satisfeito com os ensinamentos
compreendidos sendo capaz de lembrá-los durante uma prova (respostas
positivas às sugestões de ensino). Alternativamente, quando o professor é
chato, fala baixinho e apenas lê os dispositivos projetados, o aluno não se
interessa pela matéria e se distrai com qualquer coisa (não há focalização da
atenção, nem hipnose), e, consequentemente, não há adequado aprendizado.
Muito provavelmente o aluno será incapaz de lembrar durante uma prova, nem
para o seu proveito durante a sua vida, o que esse professor tentou transmitir.
Na vida cotidiana, uma mãe que ama seu filho, durante a noite dorme um sono
profundo, sem ser despertada pelo som da televisão, por trovões de uma
tempestade, por bater de portas. Contudo, o choro do seu filho acorda a mãe
(há uma ligação emocional entre as características do choro do filho e a mãe).
Comparativamente, durante a hipnose o paciente está atento as sugestões
verbais (palavras) ou não verbais do hipnotista, deixando de se importar pelo
que se passa em torno.
Enquanto o presidente de uma empresa está discursando numa reunião da
diretoria, algumas vezes um diretor embora, aparentemente esteja ouvindo a
exposição do presidente permanece durante todo o tempo batendo
ritmicamente com a ponta do pé direito sobre o tapete sem perceber o que está
fazendo. O diretor está executando um movimento automático. O seu pé e seu
membro inferior direito movimentam-se automaticamente, como que
dissociados do restante do corpo.
Num curso interativo de aperfeiçoamento destinado para funcionários já
especializados de uma firma, algum deles encontra-se rabiscando o papel com
a caneta, embora estejam atentos com o desenvolvimento do curso. A mão
desses funcionários aparentemente escreve automaticamente como se
estivesse dissociada do corpo, como ocorre durante a técnica da escrita
automática durante a hipnoterapia.
Em Brasília, durante uma reunião do presidente da república com os seus
ministros convocada para criar diretrizes para aumentar as exportações, o
presidente comunica enfaticamente ao ministro das relações exteriores que
está concentrado nas palavras do chefe da nação, a necessidade de dizer a
todos que o lema é exportar ou morrer. o ministro das relações exteriores
aceita e acredita nessa ideia porque o seu objetivo também é exportar cada
vez mais. Ao sair da reunião, ao ser entrevistado por uma emissora de
televisão, o ministro das relações exteriores comunica a imprensa a frase de
efeito “exportar ou morrer”. O mesmo corre quando um paciente atento às
palavras do hipnotista recebe uma sugestão pós-hipnótica que está de acordo
com as suas ideias. posteriormente, o paciente cumprira a sugestão, muitas
pessoas, a noite ao deitar para dormir, pensam firmemente na hora que
querem acordar de manhã e realmente acordam nessa hora; algumas pessoas
até acertam o alarme do despertados para acordar em determinada hora, e
acordam instantes antes do soar do alarme, estes são exemplos do que
poderíamos chamar de sugestões “pós-hipnóticas em vigília”
O aprendizado das crianças é enormemente influenciado pela maneira como
são ensinadas, especialmente pelos pais e também pelos educadores, frases
repetidas constantemente como “você precisa comer, coma tudo que está no
seu prato”, geralmente associadas as sugestões táteis e a sugestão pela
atitude dos pais, ficam gravadas no subconsciente da criança.na idade adulta
essas ideias podem desencadear uma vontade desenfreada pela alimentação
constante, facilitando o desenvolvimento do excesso de peso e da obesidade.
Muitas dificuldades na vida advêm do FMNC estar armazenando informações
erradas, negativas e experiências de fracasso.
Muitas sugestões indiretas ocorrem no cotidiano e conduzem as respostas
similares às ocorridas durante a hipnose formal. Quantas vezes estamos
passeando num shopping Center com o desejo em adquirir alguma peça para o
vestuário, quando passando pela frente de uma lanchonete, sentimos o odor do
café (sugestão sensorial olfativa indireta) e somos levados a entrar e saborear
um cafezinho. [mensagens subliminares, músicas com vozes de comandos
inaudíveis conscientemente, mas captadas pelo inconsciente, aromas, pizzas,
cafés etc]
Uma sugestão direta aplicada na hora certa com palavras corretas e
poderosas, com tom emocional adequado ao contexto, pode fazer uma
multidão mover-se imediatamente sem que as pessoas parem para raciocinar e
optar pela melhor alternativa de comportamento. “Isso ocorre quando num
cinema durante a exibição de um filme alguém grita “Fogo” Está pegando fogo”!
Quantas vezes ao tirarmos uma roupa descobrimos que nos arranhamos num
braço ou numa extremidade do corpo, sendo que no momento do arranhão
nada sentimos (estávamos com a atenção concentrada em outras coisas),
estávamos anestesiados.
Algumas vezes, quando estamos com muita vontade de comer algum alimento
que apreciamos muito, como uma laranja, simplesmente imaginamos essa fruta
e nos visualizamos descascando a laranja e colocando o pedaço dentro da
boca. Imediatamente começamos a salivar, sentimos na boca o gosto da
laranja, e percebemos o odor desta. Essa percepção sem objeto seriam como
se estivéssemos facilitando o surgimento de alucinações visuais, olfativas e
gustativas.
Na televisão, os anúncios de produtos e serviços são cuidadosamente
preparados e repetidos várias vezes para influenciar as pessoas-alvo. Muitas
vezes deixa de mostrar os aspectos técnicos e operacionais para criar um
clima emocional de sucesso, riqueza e prazer que são anunciados a marca
anunciada. A propaganda escolhe e associa as imagens do que está sendo
anunciado, com pessoas adequadas, com tom de voz adequado, com música
de fundo, e, algumas vezes incluindo sugestões subliminares, de modo em
deixar o cliente em potencial com interesse pelo produto (como que
hipnotizado). Vários anúncios na televisão fazem três, quatro ou cinco
afirmações corretas e verificáveis para a imensa maioria dos telespectadores,
associadas com imagens apropriadas, para em seguida apresentar uma
imagem associada a uma frase do que querem vender ou oferecer como
serviço. Comparativamente, o hipnotista habilidoso utiliza um conjunto de
frases apropriadas ao contexto de determinado paciente, com as quais ele
fatalmente concorda, porque são verdades obvias e verificáveis, então a quinta
frase transmite a sugestão terapêutica, que desta forma ultrapassa as barreiras
do consciente, tendo enormes chances de ser aceita pelo paciente.
Quantas vezes uma pessoa que usa óculos fica procurando seus óculos em
vários lugares, e depois de algum tempo percebe que eles estão justamente no
local que deveriam, sobre seus olhos. A pessoa até encontrá-los apresentava
uma ilusão negativa visual e tátil, pois não percebia pela visão nem pela
sensibilidade tátil os óculos.
A sensação ou sentido do tempo pode ser percebido de modo expandido ou
concentrado nos acontecimentos cotidianos. Por exemplo, quando estamos
assistindo a uma partida de futebol entre Atlético e Cruzeiro, dois times que
disputam o campeonato brasileiro. O primeiro está vencendo por 2x1 e
estamos aos 42 minutos do segundo tempo. Os torcedores do Cruzeiro têm a
sensação de que os três minutos finais demoram muito a passar, parecendo
uma eternidade. Isto é, tem sensação de tempo expandido. Por outro lado, os
torcedores do Atlético têm a sensação de que os mesmos três minutos finais
passam muito rápido, parecendo passar num relâmpago, isto é, tem a
sensação de tempo concentrado. Durante a hipnose pode-se utilizar a
sensação de expansão do tempo para permitir que acontecimentos agradáveis
demorem para passar e o paciente possa curtir esse tempo de alegria, sucesso
e felicidade. A sensação de contração do tempo é empregada para fazer
passar mais depressa os acontecimentos desagradáveis
Durante atividades muitas vezes cotidianas, as pessoas podem entrar em
hipnose sem que nenhuma sugestão verbal seja pronunciada: simplesmente
dirigindo um veículo numa estrada com longas retas ou numa autoestrada;
outras vezes simplesmente assistindo a um programa na televisão.
Nos intervalos de um trabalho ou de um estudo, uma pessoa pode perceber e
ouvir nitidamente uma música que aprecia muito, sem nenhum aparente
estimulo externo, ou pode ser estimulada pela imagem da capa de um CD
deixado sobre a mesa, com o nome dessa música visível, começa a escutar
essa música. Outra pessoa, estando em casa descansando, ocasionalmente
ao ver uma fotografia tirada de uma festa que participou durante as férias em
um outro país, pode ser capaz de conseguir perceber vivamente as imagens
dela na festa, dançando com determinada pessoa, como se tudo estivesse
ocorrendo nesse momento. Uma pessoa caminhando na rua ao passar pela
frente de uma banca que vende frutas pode sentir o gosto da fruta de sua
preferência na boca, e inclusive salivar.
A hipnose na vida diária ocorre mais frequentemente do que imaginamos, e
contribui para a compreensão de que não é necessária a indução formal para
obtermos a hipnose. No consultório do profissional hipnotista, médico, dentista
ou psicanálista, faz-se a indução formal da hipnose para obtê-la no momento
desejado e com finalidades especificas. contudo, por meio das técnicas de
indução naturalistas, uma conversa simplesmente orientada para focalizar a
atenção do paciente internamente, deixa-o receptivo para aceitar as sugestões
seguintes que estejam de acordo com esse indivíduo.

Por Dr.Marlus Vinicius


Hipnose na prática Clínica.

FMNC- funcionamento mental não consciente

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