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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL - MESTRADO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SERVIÇO SOCIAL, TRABALHO, PROTEÇÃO
SOCIAL, CULTURA E RELAÇÕES SOCIAIS.

ALUIZIA DO NASCIMENTO FREIRE

A INSERÇÃO DAS MULHERES NA CÂMARA MUNICIPAL DE NATAL


(1988-2004)

NATAL
2008
ALUIZIA DO NASCIMENTO FREIRE

A INSERÇÃO DAS MULHERES NA CÂMARA MUNICIPAL DE NATAL


(1988 - 2004)

Dissertação de Mestrado apresentado ao


programa de pós-graduação em Serviço Social,
área de concentração: Serviço Social, Trabalho
e Proteção Social, Cultura e Relações Sociais
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Sob a orientação da profª Drª Rita de
Lourdes de Lima.

NATAL
2008

2
3
4
Esta é a mulher moderna: a autodisciplina, em vez de um
sentimentalismo exagerado, a apreciação da liberdade e da
independência, em vez de submissão e de falta de
personalidade; a afirmação da sua individualidade e não os
estúpidos esforços para se identificar com o homem amado; a
afirmação do direito a gozar dos prazeres terrenos e não a
máscara hipócrita da pureza, e finalmente, a subordinação das
aventuras do amor, a um lugar secundário na vida. Diante de
nós temos não uma fêmea, nem uma sombra do homem, mas
sim uma mulher-individualidade (Alexandra Kollontai)

Dedico este trabalho a todas as


mulheres que lutam e sonham por
um mundo melhor e àquelas que
continuam adormecidas esperando
serem despertadas para a vida real.

5
AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos a todos que contribuíram para a realização deste


trabalho em especial a minha orientadora profª Drª Rita de Lourdes de Lima pela
orientação, dedicação e competência no desenvolvimento do nosso trabalho.
Agradeço também a Capes pela bolsa concedida para realização da pesquisa
e aos componentes da banca examinadora.
Aos professores em geral do PPGSS - Programa de Pós – Graduação em
Serviço Social.
As professoras Drªs Maria da Conceição Fraga do Departamento de História,
pela paciência e contribuição no decorrer do meu trabalho e a profª Drª Silvana
Mara Santos, pelas valiosas colaborações por ocasião do exame de qualificação.
A profª Drª. Francinete de Oliveira do Depto de Enfermagem e Françoise
Dominique Valery do Depto de Arquitetura, pelo incentivo dado à pesquisa na
temática de gênero ainda na graduação, onde participava como bolsista do NEPAM
(Núcleo Nízia Floresta de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher e Relações Sociais
de Gênero).
Um agradecimento as minhas colegas de sala de aula e a funcionária Lúcia
pela paciência e atenção aos meus questionamentos e aflições no dia-a-dia.
Aos meus amigos e amigas, especial atenção a Neide, Estefânia, Divanice,
Adriana e meus familiares pela contribuição no decorrer do meu trabalho.
Agradeço a todos aqueles (as) que diretamente e indiretamente contribuíram
de alguma forma para o desenvolvimento desta dissertação.
Para finalizar a todos e todas que ainda acreditam nas mudanças e agem no
sentido da busca de transformações sociais.

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LISTAS DE SIGLAS

AI-5 – Ato Institucional Número Cinco


ANL – Aliança Nacional Libertadora
AMB - Articulação das Mulheres Brasileiras
ARENA – Aliança Renovadora Nacional
CAPES- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CMDM - Conselho Municipal dos Direitos da Mulher
CMDMN - Conselho Municipal dos Direitos da Mulher em Natal
CMM - Conferência Mundial das Mulheres
CNMB - Conselho Nacional de Mulheres do Brasil
CFEMEA - Centro Feminista de Estudo da Mulher
CMN - Centro da Mulher Natalense
CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito
DP - Departamento Feminino
ENF - Encontro Nacional Feminino
EUA - Estados Unidos da América
FMB - Federação das Mulheres do Brasil
FMP - Federação da Mulher Potiguar
FMI - Fundo Monetário Internacional
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
INPD - Instituto Nacional de Pesquisa em Domicílio
MDB - Movimento Democrático Brasileiro
MR8 - Movimento Revolucionário Oito de Outubro
NEPAM – Núcleo Nizia Floresta de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher e Relações
Sociais de Gênero.
ONU - Organização das Nações Unidas
PCB - Partido Comunista do Brasil
PCB - Partido Comunista Brasileiro
PCdoB - Partido Comunista do Brasil
PDS - Partido Democrático Social
PDT - Partido Democrático Trabalhista

7
PFL - Partido da Frente Liberal
PHC - Partido Humanista Cristão
PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PPS - Partido Popular Social
PPB - Partido Progressista Brasileiro
PRN - Partido da Renovação Nacional
PSB - Partido Socialista Brasileiro
PSD - Partido Social Democrático
PSDB - Partido do Social Democrático Brasileiro
PT - Partido dos Trabalhadores
PTB - Partido Trabalhista Brasileiro
PTR - Partido Trabalhista Renovador
RN - Rio Grande do Norte
SBPC - Sociedade Brasileira Pelo Progresso da Ciência
TRE - Tribunal Regional Eleitoral
TSE - Tribunal Superior Eleitoral
UFB - União Feminina do Brasil
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

8
RESUMO

Este trabalho tem como objetivo refletir sobre a inserção das mulheres na Câmara

Municipal de Natal no período de 1988 a 2004. Focalizamos nossa discussão no

contexto da política de cotas que tem como objetivo diminuir o quadro de

desigualdades existentes entre mulheres e homens na política, além de analisar

quais os determinantes responsáveis pela sub-representação das mulheres. A

pesquisa consta ainda de uma análise do perfil das mulheres vereadoras e como

elas eram vistas nesse espaço de poder. Analisamos o nosso objeto de estudo

numa visão de gênero, já que este está intrinsecamente relacionado as relações

sociais e as relações de poder. As mulheres, durante muito tempo, estiveram

excluídas da participação na vida pública, sendo vistas apenas como meras

expectadoras. Esta pesquisa esta baseada em autores que discutem a questão de

gênero, como (Scott,1990), (Perrot,1988), (Badinter,1985 (Bruschini, 2002) entre

outros. Analisamos também o poder, e a política na visão de ( Marx, 1996),

(Foucault,1982) e (Arendt, 2001) e outros. Tentamos analisar também a presença

das mulheres nos espaços público e privado, mostrando os seus conflitos e

contradições enfrentados na sociedade, focalizando o caráter político da inclusão

das mulheres nos espaços em que estão inseridas. O instrumento de coleta de

dados foi o questionário semi-estruturado, descritivo e analítico - critico. As análises

das entrevistas por sua vez, apontam para a sub-representação das mulheres ao

longo dos anos como fator determinante para que essas mulheres continuem na

invisibilidade. As mulheres entrevistadas foram ex-vereadoras no período delimitado

de 1988 a 2004. A conclusão a que chegamos é que esta sub-representação tem

como determinante o sistema patriarcal que predominou durante muito tempo em

9
nossa sociedade e ainda predomina e atinge as mulheres em todos os âmbitos de

sua vida. Isto se torna mais grave na sociedade capitalista na qual predomina os

interesses daqueles que detém a riqueza produzida.

Palavras chave: Gênero. Poder. Patriarcado.

10
ABSTRACT
This work has as objective to reflect about the insertion of the women in the City

Council of Natal in the period from 1988 to 2004. We focused our discussion in the

context of the politics of quota that has with objective to decrease the frame of

inequalities existent between women and men in the politics, besides of to analyze

which the determinants responsible for the women's sub-representation. The

research still consists of an analysis of the councilor’s women profile and how they

were seen in that space of power. We analyzed our study object in a gender vision,

since this is related intrinsically the social relationships and the relationships of

power. The women, for a long time, they were excluded of the participation in the

public life, being just seen as mere expectants. This research is informed mainly by

studies which discuss the Gender (Scott, 1990), (Perrot, 1988), (Badinter, 1995),

(Bruschini, 2002). We also analyzed the power, politics in the vision of Marx (1996),

Foucault (1982) and (Arendt, 2001). We tried to analyze the women's presence in

the spaces public and private, showing your conflicts and contradictions faced in the

society, focalizing the political character of the women's inclusion in the spaces in

that are inserted. The instrument of collection of data was the semi-structured

questionnaire, descriptive and analytical - critical. The analyses of the interviews

show to the sub-representation of women over the years as a determining factor for

these women continue in the invisibility. The women were interviewed councillora

ex- bounded from 1988 to 2004. The conclusion the one that we arrived is that this

sub-representation has as decisive the patriarchal system that prevailed for a long

time in our society and still dominates and affects women in all areas of your life. This

becomes more serious in the capitalist society in which prevail the interests of those

that it stops the produced wealth.

KEY-WORDS:Gender.Power.Patriarchate.

11
SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO.......................................................................................................12

2 - O PATRIARCADO E A QUESTÃO DE GÊNERO AO LONGO DA HISTÓRIA...20


2.1 - As Mulheres na Grécia e Roma Antiga..........................................................24
2.2 - O Pensamento Religioso Judaico-Cristão Acerca das Mulheres...................31
2.3 - As Mulheres na Idade Média –Influência da Igreja Católica..........................34
2.4 - As mulheres na Sociedade Moderna e na Contemporaneidade...................39
2.5 - O Movimento Feminista na Modernidade......................................................44

3 – AS MULHERES NA SOCIEDADE BRASILEIRA................................................50


3.1 - A Situação das Mulheres no Brasil Colonial e a Influência das Oligarquias..56
3.2 - O Sistema Oligárquico no Brasil e Rio Grande do Norte...............................59
3.3 - O Movimento Sufragista e Feminista no Brasil..............................................59
3.4 - A Política de Cotas e a Democracia no Brasil...............................................68

4- QUADRO REPRESENTATIVO DAS ELEIÇÕES EM NATAL/RN NO PERÍODO


DE 1988 - 2004 .........................................................................................................82
4.1 - As Mulheres e a Participação Política no Rio Grande do Norte/Natal...........82
4.2 - A Política de Cotas no Rio Grande do Norte.................................................90
4.3 - Refletindo Sobre a Participação das Mulheres Eleitas a Partir do Seu
Perfil.......................................................................................................................95

5- CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................103
REFERÊNCIAS........................................................................................................106
APÊNDICES.............................................................................................................114

12
1- INTRODUÇÃO

A participação das mulheres na vida pública é o tema central da presente


pesquisa, a qual abordará o perfil das mulheres que pleiteiam cargos públicos,
enfatizando a inserção da mulher na política partidária, tendo como enfoque central
a participação das mulheres na Câmara Municipal de Natal e sua sub-representação
no contexto das políticas de cotas. Trata-se de uma pesquisa descritiva e analítica.

O interesse pela temática Gênero e Política partiu da nossa Militância Política


nos Movimentos Sociais, a partir dos anos 1980, período em que o Brasil estava
passando pelo processo de redemocratização, pós-ditadura militar, período marcado
por uma grave crise econômica, repressão e violência aos direitos políticos e civis
daqueles que faziam oposição ao governo.

Além disso, fomos pesquisadoras do Núcleo Nísia Floresta de Estudos e


Pesquisas sobre a Mulher e Relações Sociais de Gênero (NEPAM/ UFRN), no
período de 2001 a 2004, no qual desenvolvemos uma pesquisa sobre a Participação
da Mulher na Insurreição Comunista, em 1935, na cidade de Natal/RN, culminando
na elaboração da monografia de final de curso, em História, no ano de 2004. Assim
desenvolveu-se nossa aproximação e paixão por essa temática.

Em relação à política de cotas também objeto dessa dissertação, observou-se


que, através de dados do Cfêmea (2004), houve um aumento de mulheres
candidatas em relação ao período em que as cotas não tinham sido instituídas, no
entanto percebe-se também que, apesar desse crescimento, o sistema de cotas não
apresentou efeito direto sobre as candidaturas de mulheres. Percebemos que o
crescimento de inserção da mulher na política obteve uma visibilidade até então
inexistente.

Diante disso, optamos por analisar a sub-representação da mulher nos


espaços de poder, especificamente na Câmara Municipal de Natal no contexto da
política de cotas, enfatizando principalmente o perfil das ex-vereadoras. Neste
sentido, este estudo propõe-se a discutir a desigualdade de gênero na Câmara
Municipal de Natal.
Outro elemento que nos levou a esta escolha foi o pequeno número de
pesquisas nesta área, e o fato de não existir estudos traçando o perfil dessas

13
mulheres. Neste sentido, o principal objetivo dessa pesquisa consistiu em analisar
as relações de gênero na Câmara Municipal, situada na cidade do Natal/RN, visando
verificar a submissão feminina nesses espaços de poder.
A escolha do nosso objeto se deu a partir da análise de dados do Tribunal
Regional Eleitoral, através dos requerimentos na Câmara e, principalmente, através
das entrevistas com as ex-vereadoras. Através dos dados do tribunal obtivemos o
número de mulheres eleitas no período de 1988 a 2004. Escolhemos este recorte
porque em 1988, pós - ditadura militar, foi elaborada uma nova Constituição que, em
parte, reconhecia os direitos das mulheres, abolindo o pátrio poder, garantindo a
“igualdade” entre homens e mulheres na sociedade e na família. Este recorte se
estendeu até 2004 porque nesse período nenhuma mulher teve representação
política na Câmara Municipal de Natal.
São vários os questionamentos levantados, entre eles: como se dão as
relações de poder na Câmara? O que falta para que as mulheres participem da vida
política e para que tenham uma maior visibilidade? Quais os determinantes que
obstaculizam as mulheres de uma maior participação na vida política? Como está a
representação política das mulheres na Câmara Municipal de Natal? Qual o perfil
das mulheres que pleiteiam ou ocupam cargos na Câmara de vereadores de Natal?
Que elementos dificultam as mulheres terem uma maior participação na vida
política?

Para entender a contextualização histórica a partir da política partidária


optamos por conceituar a política a partir do significado atribuído na polis grega.
Segundo Aristóteles, a política é a arte do possível, a qual leva em conta como as
coisas estão e não como elas deveriam estar e refere-se a administração da polis
(cidade) (GRUPPI, 1987).

O conceito de política chegou até nós, a partir dos gregos, com a retomada do
pensamento dos autores clássicos da Grécia antiga a partir do Renascimento e do
Iluminismo 1 , no século XVI. Desta forma, as sociedades ocidentais da atualidade
tiveram sua organização política pensada a partir dos autores gregos.

1
Iluminismo ou século das “Luzes” é o projeto racionalista que se inaugura na Polis Grega, caracterizado como
um projeto sócio cultural de largo curso histórico, que visa à emancipação, baseado no conhecimento
racional.(NETTO, 2002).

14
O método de análise da realidade escolhido foi a perspectiva crítico –
dialética, a partir das categorias totalidade, contradição e historicidade. A revisão da
literatura existente na área se fez imprescindível nesse processo, para a melhor
compreensão do objeto de estudo. Para nortear nosso estudo, nos baseamos nas
seguintes categorias centrais: relações de Gênero, Patriarcado e Poder nos
detendo, particularmente, nas discussões acerca da Sub-representação política da
mulher no contexto das políticas de cotas. Para isto, nos aproximamos de autores e
autoras que discutem tais questões, entre eles e elas: Scott (1990), Safiotti (2004),
Santos (2004), Marx (2006), Foucault (1982), Arendt (2001) Toledo (2001). Acerca
da Política de cotas buscamos autores como Miguel e Grossi (2001), Bruschini
(2002), Araújo (2002) e Cfêmea (1998 2004).
Primeiramente, foi feito um levantamento bibliográfico a respeito do tema,
uma análise histórica e uma pesquisa documental no TRE, na Câmara Municipal e
nos Partidos Políticos, buscando resgatar a trajetória das mulheres na vida política
da Câmara. Em seguida, realizaram-se as entrevistas semi-estruturadas 2 com as
mulheres eleitas, para identificar as suas visões políticas e razões de sua entrada na
vida política de Natal. Escolhemos a entrevista semi-estruturada porque nela temos
a liberdade de trabalhar com fontes orais, na qual podemos fazer perguntas de
esclarecimento e teremos a oportunidade de entender a inserção das mulheres na
política, tendo uma compreensão da visão das mulheres candidatas antes das cotas
e após as cotas. Partindo do conceito de Fraga, as fontes orais se mostram,
metodologicamente, essenciais, porque privilegiam a análise das representações
sobre a política, já que as fontes escritas são escassas e repassam, por vezes, a
visão dos grupos dominantes (FRAGA, 2000).

Portanto, o universo da pesquisa foram as mulheres eleitas vereadoras no


município de Natal, delimitando o período histórico compreendido entre 1988 a 2004.
Desse universo foi retirado uma amostra, tendo como critérios entrevistar todas as
mulheres eleitas de cada partido, levando em consideração os partidos
representativos como: Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), Partido
dos Trabalhadores (PT), Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido da Frente Liberal
(PFL), atualmente Democratas (DEM). Portanto, entrevistamos as mulheres eleitas
dos cinco partidos citados anteriormente. É importante, destacar que no período
2
Entrevista semi – estruturada é uma série de perguntas abertas, feitas verbalmente em uma ordem prevista, no
qual os entrevistadores podem acrescentar perguntas de esclarecimentos (LAVILLE, 1999).

15
citado acima foram eleitas 7 (sete) mulheres à frente da Câmara Municipal de Natal,
foram elas: Lindalva Santos Neo Maia, Gilda Medeiros de Souza, Verônica Maria
dos Santos, Ana Catarina Alves, Sonali Rosado Cascudo Rodrigues, Maria de
Fátima Benetto Fernandes Carrilho e Fernanda Freire.

O objetivo geral deste trabalho foi analisar a Representação Política das


mulheres na Câmara Municipal de Natal e teve como objetivos específicos: refletir
sobre as relações de gênero e sua representatividade na esfera pública; analisar os
determinantes da sub-representação feminina na Câmara Municipal de Natal; refletir
sobre a representação política das mulheres no contexto da política de cotas e
analisar a participação das mulheres eleitas à Câmara Municipal de Natal, traçando
o perfil das mulheres que ocuparam cargos de vereadoras na Câmara Municipal de
Natal.

Para alcançar os objetivos propostos, se fez uso de técnicas e instrumentos


(entrevista semi-estruturada, revisão bibliográfica, roteiro de observação) visando
conhecer os processos, dinâmicas e problemáticas das desigualdades de gênero
existentes na Câmara Municipal de Natal.
Deste modo, utilizou-se pesquisa qualitativa com a aplicação de entrevistas
semi-estruturadas que combinaram questões abertas e fechadas, dando a
possibilidade ao informante de discorrer sobre o assunto. Seguimos um roteiro de
entrevista composto de duas partes: na primeira, foram realizadas perguntas com o
intuito de conhecer o perfil das entrevistadas. Na segunda parte, pretendíamos
descobrir como e por que se deu a inserção das mulheres vereadoras na Câmara
Municipal no período de 1988 a 2004 (ver apêndice). Infelizmente apenas uma
entrevista foi gravada. Assim, fomos anotando, de próprio punho as respostas que
as ex-vereadoras davam sobre as questões das entrevistas, tentando ser fiel as
suas falas e mantendo em sigilo a identidade de cada uma. Em cada uma delas,
explicava-se a natureza e os objetivos da pesquisa; confirmava-se a disposição do
entrevistado em participar da pesquisa; solicitava-se autorização para gravar
depoimentos, buscando com essa gravação, fidedignidade no processo de
transcrição das respostas dadas.
As entrevistas contemplam em parte os questionamentos levantados no
decorrer da pesquisa uma vez que nos levam a entender melhor os determinantes
para a sub-representação política das mulheres.

16
A escolha da observação se deu primeiramente na Câmara Municipal pela
possibilidade entrar em contato com a realidade em estudo, não somente através da
análise dos documentos e requerimentos propostos pelas vereadoras, assim como
as falas das entrevistadas, e também porque tal método permitiu analisar a realidade
em momentos diversos do seu cotidiano de forma assistemática. Assim, através da
observação buscamos analisar como as mulheres estavam inseridas nos espaços
de poder.
Os espaços selecionados para a pesquisa foram o Tribunal Regional Eleitoral
e a Câmara Municipal de Natal. Nossa análise documental tinha como objetivo
conhecer as mulheres, as demandas e daí possibilitar a escolha da amostra da
pesquisa. Usamos como referencial de análise os requerimentos solicitados pelas
mulheres, durante seus mandatos. Os documentos são restritos dificultando o
andamento da pesquisa. Como já assinalamos, entrevistamos 5 (cinco) mulheres
eleitas vereadoras na cidade de Natal, pois não conseguimos contatar com as duas
ex vereadoras, Ana Catarina Alves Wanderley - segundo as informações ainda
reside em Natal - e Fernanda Freire, que reside atualmente no Rio de Janeiro.
Portanto, não foi possível entrevistar todas as ex-vereadoras.
As entrevistas foram realizadas no período de 2008, no segundo semestre,
durante todo o mês de julho e todas foram realizadas de forma individual e em
ambiente reservado.
Apesar das dificuldades encontradas para a realização da pesquisa, como o
receio de algumas ex-vereadoras em conceder as gravações das entrevistas, além
de problemas de ordem estrutural, buscou-se o esforço, no sentido da maior
apreensão possível para o desvelamento do nosso objeto de estudo.
Podemos afirmar, após a realização desse estudo, que as desigualdades
sociais, preconceitos e discriminações ainda predominam na atualidade e apontam
para a continuidade do processo de segregação de gênero, no campo da
sexualidade, seja no campo da política.

Assim a participação feminina na política está muito aquém do que as


mulheres representam na sociedade. No Brasil, esta participação encontra-se abaixo
dos padrões internacionais médios. Enquanto a representatividade das mulheres
nas instâncias de poder político do Brasil gira em torno de 10% (dez por cento), os
países nórdicos já têm quase metade das vagas parlamentares ocupadas por

17
mulheres. Uma das explicações para a limitada participação da mulher nas esferas
de poder está ligada a questões econômico-sociais. Quanto melhor o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) de um país, mais equilibrada é a participação das
mulheres nos espaços de poder. A lentidão do avanço das mulheres no campo
político também está relacionada com a propriedade da riqueza, uma vez que
apenas 4% (quatro por cento) da riqueza do mundo está nas mãos de mulheres.
(CFEMEA, 2006). A respeito dessa questão as analises apresentadas sobre a sub-
representação das mulheres na política e os dados analisados encontram-se no
corpo do texto.
Ainda no ano de 2004, a média nacional de candidaturas de mulheres para as
câmaras municipais foi de apenas 22,1% (vinte e dois vírgula um por cento). Ou
seja, os partidos não cumpriram mais uma vez, a política de cotas vigente desde as
eleições de 1996. Além disso, voltaram a apresentar candidaturas laranja 3 e a não
apoiar efetivamente as campanhas das mulheres. O resultado efetivo foi que, dos
51.808 (cinqüenta e um mil oitocentos e oito) vereadores(as) eleitos no País, apenas
6.556 (seis mil quinhentos e cinqüenta e seis) são vereadoras, o que significa que a
média nacional de mulheres ocupando o cargo de vereadoras é só de 12,6% (doze
vírgula seis por cento), enquanto os homens chegam a 87,4% (oitenta e sete vírgula
quatro por cento). O Nordeste se coloca acima da média nacional, com 14,63%
(quatorze vírgula sessenta e três por cento) o que corresponde a 2.420 (dois mil
quatrocentos e vinte) vereadoras eleitas na região, em 2004. Isso tem se figurado
em todas as eleições. Dos 5.560 (cinco mil quinhentos e sessenta) municípios
brasileiros, hoje apenas 418 (quatrocentos e dezoito) são governados por mulheres.
Em termos das candidaturas de mulheres ao cargo de prefeita, observou-se uma
grande discrepância, tanto entre os estados quanto entre os diversos partidos
políticos. O percentual de candidatas mulheres distancia-se muito da média
nacional: 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento), variando de 3,70% (três
vírgula setenta por cento) a 17,31% (dezessete vírgula trinta e um por cento) por
Estado. Em termos de partidos políticos, a variação é de 0% (zero por cento) a
18,27% (dezoito vírgula vinte e sete por cento) em todo o país 4 .

3
Candidatura laranja termo utilizado para designar candidaturas de “mentirinha”, ou seja, inscrições que tinham
como objetivo, apenas completar o quadro de candidaturas. Prática corrente nas disputas eleitorais em que os
candidatos(as) emprestam seu nome sem nenhum compromisso político (GROSSI E MIGUEL, 2001).
4
Dados retirados do Boletim do Centro de Informação, Pesquisa e Comunicação da Mulher e Democracia, ano
1, nº 01 abril/julho, 2005.

18
Embora o movimento feminista tenha se destacado no cenário político nos
mais diversos espaços e eventos nacionais e internacionais, a presença das
mulheres ainda é restrita em espaços estratégicos como na política; inclusive nas
três esferas do poder: Legislativo, Executivo e Judiciário. As mulheres estão sub-
representadas nesses espaços, pois ainda permanece a resistência por parte dos
dirigentes em relação as pautas comprometidas com a equidade de gênero,
consideradas de menor importância.

A participação das mulheres na política tem relevância para a atualidade por


contemplar, em parte, o crescimento delas no cenário político, apesar de sabermos
que nenhuma mulher, no período de realização da pesquisa, ocupa uma cadeira na
Câmara Municipal de Natal no Rio Grande do Norte (RN) e foram poucas as que
ocuparam. Desde a criação da Câmara Municipal, em 1611, aproximadamente, 12
(doze) mulheres ocuparam cadeiras como vereadoras. Percebemos que houve um
aumento significativo de mulheres candidatas e mulheres eleitas, mas ainda
predomina o número de homens candidatos e eleitos em relação ao número de
mulheres. Nesse sentido, não podemos dizer que a política de cotas 5 têm tido efeito
direto sobre as candidaturas das mulheres.

Para apresentarmos os dados, esta dissertação está estruturada em 4


(quatro) capítulos, além das considerações finais, referências bibliográficas e
apêndices.
A introdução apresenta algumas considerações a respeito da inserção das
mulheres na política enfatizando a sub-representação e uma discussão acerca das
políticas de cotas, as motivações e a justificativa para o estudo proposto, questões
da pesquisa, os objetivos da dissertação e a relevância do estudo.
No segundo capítulo fazemos um resgate histórico acerca das relações de
gênero na Grécia e Roma antigas e como se davam as relações sociais nestes
países, tendo como sistema de dominação o patriarcado. Em seguida nos detemos
na influência da Igreja como instituição de dominação a partir da Idade Média. O
estudo a que nos propomos desenvolver neste capítulo, acerca do patriarcado e a
questão de gênero, tem como principal objetivo contextualizar as características, que
determinaram as relações de poder impostas às mulheres pelo sistema capitalista,

5
A discussão acerca da política de cotas será feita posteriormente.

19
até chegar às transformações por elas protagonizadas durante a modernidade e na
contemporaneidade, através do movimento feminista.
Posteriormente, no terceiro capítulo, analisamos as mulheres na sociedade
brasileira enfatizando a situação delas no Brasil Colônia e a influência das
oligarquias do Rio Grande do Norte e Natal, buscando-se analisar a participação
política das mesmas na esfera pública e privada, bem como se davam e se dão as
relações sociais, uma vez que ainda predomina o poder dos homens sobre as
mulheres. Analisaremos ainda neste capítulo, os efeitos das políticas de cotas e
como elas vêm modificando o quadro de desigualdades na política partidária e seus
efeitos na luta pela equidade de gênero. Este capítulo teve como eixo central a
discussão das relações de gênero na sociedade patriarcal brasileira e potiguar e as
suas modificações pós - políticas de cotas.
No quarto e último capítulo, apresentamos um quadro representativo das
mulheres eleitas em Natal/RN, de 1988-2004, a partir de uma reflexão da
participação das mesmas, tendo como parâmetro de discussão o perfil delas.
Apresentamos ainda as falas destas mulheres, enfocando, como elas estavam
inseridas nesse espaço de poder uma vez que predomina a figura masculina. Desta
forma, analisamos a presença feminina na política potiguar, discutindo as relações
de gênero existentes no local pesquisado.
Podemos afirmar, a partir desse estudo, que as desigualdades sociais,
preconceitos e discriminações ainda predominam na atualidade e apontam para a
continuidade do processo de desigualdades e discriminações as mulheres. Neste
sentido, todas as entrevistadas relataram preconceitos e discriminações sofridas
pelo fato de serem mulheres.

A contribuição desse estudo, portanto, se dá na perspectiva de apreender o


processo das relações sociais e das relações de gênero que se passam nesse
universo e visa contribuir também para futuros estudos na área e novas pesquisas,
assim como chamar a atenção para uma problemática que direta ou indiretamente
afeta a todos (as) nós. Neste sentido, esperamos que este estudo possa contribuir
com reflexões que nos auxiliem na busca do enfrentamento das desigualdades
existentes entre homens e mulheres.

Quanto a prática das mulheres que constroem os espaços públicos,


entendemos que estes vão sendo construídos, cotidianamente, na ocupação de

20
lugares antes predominantes dos homens, mostrando nas suas ações e suas vidas,
o movimento feminino e feminista de participação das decisões e nos espaços de
poder.

Desta forma, a temática da inserção feminina na política torna-se significativa,


na medida em que abre espaço para discussão da igualdade de oportunidades para
as mulheres em relação à ocupação de cargos na política.

2 - O PATRIARCADO E A QUESTÃO DE GÊNERO AO LONGO DA HISTÓRIA.

Scott (1990) apresenta o patriarcado como um sistema baseado na figura do


“patriarca” (pai) ao qual todas as mulheres estão submissas. A este respeito, a
autora apresenta três abordagens acerca das relações de gênero: a) a abordagem
do patriarcado - empenha-se em explicar a subordinação das mulheres, a partir da
necessidade masculina de dominar; b) as abordagens marxistas as quais, segundo
Scott, explicam a subordinação da mulher a partir do modo de produção; c) as
abordagens psicanalíticas - divididas em dois sub - grupos: o pós-estruturalismo
francês e as teorias de relação do objeto. Ambas apóiam-se em escolas
psicanalíticas para explicar a produção e a reprodução da identidade do gênero do
sujeito, interessando-se pelas primeiras etapas do desenvolvimento da criança. A
primeira enfatiza a experiência concreta no desenvolvimento da criança, enquanto a
segunda sublinha o papel da linguagem na comunicação, interpretação e
representação do gênero.

Outra explicação a respeito do patriarcado está na visão de Marx. Em Marx,


tal termo era bastante utilizado para definir as sociedades coloniais, estando ligado à
tirania familiar, a uma forma de poder arbitrário que não foi derrubada pela
Revolução Francesa (MARX, 2006), Tal sistema atinge as mulheres no âmbito
econômico, político e social; institucionaliza-se e vai para os partidos dentro dos
quais, muitas vezes, as mulheres não estão nos espaços de decisão. Dessa forma,
a dominação dos homens sobre as mulheres predomina na sociedade capitalista, na
qual as desigualdades entre ambos geram submissão e chega até os dias atuais
com características diferentes. Vejamos uma citação de Louro (1997).

“A segregação social e política a que as mulheres foram historicamente


conduzidas tivera como conseqüência sua ampla invisibilidade como sujeito,
inclusive como sujeito da ciência” Louro (1997 p. 95).

21
Na visão de Lima (2002), todas as abordagens trazem contribuições e
limitações. A abordagem do patriarcado prende-se a uma análise interna ao sistema
de gênero, afirmando a prioridade desse sistema em relação à organização social;
as abordagens marxistas, por vezes, fazem o inverso da anterior: o gênero torna-se
um sub-produto das estruturas econômicas e a última abordagem tende a uma
fixação exclusiva no sujeito e na ênfase ao antagonismo subjetivamente produzido
entre homens e mulheres.

A este respeito, concordamos com a visão analisada por Scott e Lima, por
entender que a opressão da mulher passa por estes três elementos enfatizados
pelas abordagens, ou seja, pelo patriarcado, pelo modo de produção e pela
formação subjetiva, fruto da história de vida e inserção cultural. Contudo,
consideramos importante assinalar, desde já, nossa posição teórica: para nós, a
transformação passa, fundamentalmente, pela modificação das relações econômico-
sociais e o estabelecimento do socialismo 6 . Entretanto, temos a compreensão que,
com a chegada do socialismo e o fim do capitalismo, as mudanças não se darão
automaticamente, já que são frutos de um processo histórico. A questão das
desigualdades sociais, as diferenças, preconceitos e a opressão da mulher, são
construções sociais que levam tempo para serem desconstruídas. Mas, ao nosso
ver, o estabelecimento do socialismo, em condições para a igualdade e liberdade é
o começo desta transformação cultural, podendo ou não se efetivar.

Em se tratando do conceito de patriarcado, Saffioti (2004), faz uma análise


deste, relacionando-o com o conceito de gênero e afirma que no patriarcado as
relações são, necessariamente, hierarquizadas entre seres socialmente desiguais,
enquanto o conceito de gênero compreende tanto relações desiguais quanto
igualitárias. Desta forma, o patriarcado é um caso especifico de relações de gênero.
Neste sentido, podemos analisar que vivemos numa sociedade onde predomina
relações patriarcais de gênero, ou seja, relações de gênero nas quais predomina a
dominação. Assim, o patriarcado serve aos interesses de grupos/classes
dominantes e o sexismo não é meramente um preconceito, sendo também o poder

6
Socialismo - entendemos a proposta do socialismo como a construção de uma nova sociedade na qual os
homens e as mulheres tornem-se a medida de todas as coisas. Neste sentido a sociedade socialista deverá ser
justa, mas sempre preservando a liberdade. Portanto, o socialismo em condições para a igualdade e liberdade
acontecer.

22
de agir de acordo com ele. As relações patriarcais, suas hierarquias, sua estrutura
de poder “contaminam” a sociedade e o direito patriarcal perpassa toda a sociedade
civil, mas impregna também o Estado. Para a autora nas relações sociais de gênero
se imbricam, o patriarcado e o racismo e estes não estão indissociados das classes
sociais. Isso faz supor que, existe não apenas uma hierarquia entre as categorias de
sexo, mas também uma contradição de interesses entre as classes e entre as raças.

Desta forma, não basta que uma parte das mulheres ocupe posições
econômicas, políticas, religiosas etc, tradicionalmente reservada aos homens, para
modificar a sociedade, pois estas mulheres também personificam relações de
poderes de classe e de raça e não só de sexo. Deste modo, qualquer discussão
sobre participação política das mulheres não pode ser dissociada da discussão
acerca da classe social e da raça das quais estas mulheres fazem parte.

Na verdade, o conceito de patriarcado e de gênero, como categoria de análise


utilizado na maioria das pesquisas sobre as relações entre mulheres e homens vem
das concepções teóricas defendidas por cientistas norte-americanas, dentre as
quais Joan Scott, que buscou no pós-estruturalismo, os fundamentos para sua
análise, buscando a desconstrução teorizada por Jacques Derrida como método de
análise 7 .

Dentro deste contexto não podemos deixar de considerar também que ao


contrário do que se pensa, não foi uma mulher a primeira a conceituar gênero. O
primeiro estudioso a mencionar o conceito de gênero foi Robert Stoller, porém só a
partir de 1975, com o famoso artigo da feminista Gayle Rubin, frutificaram estudos
de gênero, dando origem a uma ênfase pleonástica em seu caráter relacional
(SAFFIOTI, IBIDEM). Deste modo, para Saffioti o conceito de sistema de
sexo/gênero é neutro, servindo a objetivos econômicos, políticos distintos daqueles
aos quais originariamente atendia e, neste sentido, deve-se considerar sexo e
gênero uma unidade, uma vez que não existe uma sexualidade biológica
independente do contexto social em que é exercida. A esse respeito concordamos
com as autoras, pois não podemos negar que um depende do outro.

7
No campo das teorias feministas, muitas autoras se filiam ao pós-estruturalismo e as posturas teóricas que
enfatizam “a desconstrução”. Tal filiação, em parte, se explica pela necessidade que têm, as feministas, de erodir
as certezas, construídas ao longo dos séculos, sempre na perspectiva masculina. Assim, agora, enfatiza-se a
necessidade de “desconstruir” estes saberes e construir um novo saber, mais eqüitativo e feminista (SCOTT,
1990).

23
Se contrapondo ao conceito de Scott que por sua vez, define gênero como
categoria de análise, Saffioti (IBIDEM), afirma que o conceito de gênero pode
representar uma categoria social-histórica, se tomado em sua dimensão meramente
descritiva, ainda que seja preferível voltar a velha expressão categoria de sexo.
Nesse caso, podemos afirmar que a categoria gênero, no sentido defendido por
Saffioti faz entender a construção sócio-histórica que as mulheres tiveram. Por outro
lado, Saffioti questiona a categoria gênero, uma vez que esta não explicita, as
desigualdades nem o poder, nem aponta a parte oprimida, ou seja, o termo gênero é
despolitizado, não diz o que é a opressão, nem quem é o oprimido. Portanto, gênero
diz respeito as representações do masculino e do feminino, a imagem construída
pela sociedade a propósito do masculino e do feminino, estando estas inter-
relacionadas. As construções simbólicas em geral guardam pouca ou nenhuma
relação com a realidade concreta, com as condições materiais de vida e com os
fatos históricos. Desta forma, o conceito de gênero, segundo a autora, nunca pode
ser dissociado das relações patriarcais, das relações de raça/etnia e das relações de
classe, pois estas tornam o sujeito histórico concreto.
Neste sentido Scott, (1990, p.16), define gênero a partir de dois aspectos
fundamentais e intrinsecamente relacionados: as relações sociais e as relações de
poder. “As relações sociais, que são baseadas nas diferenças entre os sexos,
implicam na existência de elementos inter-relacionados, que não operam
necessariamente de modo simultâneos ou dependentes”. Nesse caso, a autora
ressalta a relação existente entre gênero e poder, articulados entre si, que se define
como igualdade e desigualdade no qual divide-se o campo feminista. Gênero assim
é um primeiro modo de dar significado as relações de poder (IBIDEM, 1990 ). Por
isso, as mudanças na organização das relações sociais correspondem sempre a
mudanças nas representações de poder.

Contudo, na visão de Foucault (1982), o poder não é algo que se detém


como uma coisa, como uma propriedade, que se possui ou não. O poder não existe;
existem sim práticas ou relações de poder. O que significa dizer que o poder é
sempre algo que se exerce, que se efetua, que funciona como uma máquina que vai
sendo manipulada nos micro-espaços. Por outro lado, Marx (1987) apresenta um
outro conceito e uma outra concepção de poder. Marx entende o poder a partir das
relações sociais que lhe dão sentido, ou seja, visto numa perspectiva de totalidade,

24
na qual qualquer explicação acerca da relação de poder deve ser baseada no
conjunto das relações sociais da qual faz parte 8 .

Partindo dessa compreensão, vê-se que as relações de poder se exercem


nos vários níveis sociais, contudo sua explicação sempre reside no conjunto das
relações histórico-sociais. Por isso, Scott (1990) define gênero a partir de vários
determinantes. Primeiro, dos símbolos culturalmente disponíveis que evocam
representações simbólicas e contraditórias, mostrando Eva e Maria como símbolo da
mulher na tradição cristã do Ocidente, mas também o mito da luz e da escuridão; da
purificação e da poluição, da inocência e da corrupção. Em segundo lugar, define
gênero a partir dos conceitos normativos que põem em evidência as interpretações
dos sentidos dos símbolos, expressos nas doutrinas religiosas, educativas,
científicas, políticas ou jurídicas e toma a forma típica de oposição binária, do
significado do masculino e do feminino. Em terceiro lugar a política, as instituições e
a organização social que reproduzem também os valores dominantes; e por último a
identidade subjetiva que se forma através da aculturação, que transforma a
sexualidade biológica dos indivíduos em identidade de gênero (IBIDEM).

Para Sardenberg e Costa (1991), a subordinação da mulher na sociedade,


além de se manifestar como fenômeno milenar e universal, também se configura
como a primeira forma de opressão na história da humanidade. De fato, a história
nos mostra a opressão e a subordinação das mulheres ao longo dos anos. Vejamos
isto a seguir.

2.1- As Mulheres na Grécia e Roma Antiga

O conceito de política chega até nós, a partir dos gregos, com a retomada do
pensamento dos autores clássicos da Grécia antiga a partir do Renascimento e
Iluminismo, no século XVI. Desta forma, as sociedades ocidentais da atualidade têm
sua organização política pensada a partir dos autores gregos. É lógico que, os
autores da Grécia antiga (Sócrates, Platão, Aristóteles, etc...) juntaram-se os
pensadores modernos (Locke, Rousseau, Montesquieu, Maquiavel, Hobbes, Marx
etc.) que configuraram assim, o pensamento moderno ocidental acerca da política.
8
Sabemos que estes autores partem de perspectivas teóricas diferentes, mas, mesmo assim achamos importante
resgatar suas visões acerca dessas categorias.

25
Para entender a contextualização histórica a partir da política optamos por
conceituá-la a partir do seu sentido original na polis grega.

Segundo Aristóteles, a política é a arte do possível, é a arte da realidade que


pode ser efetivada, a qual leva em conta como as coisas estão e não como elas
deveriam estar. Ou seja, a política leva em consideração a natureza dos homens e
refere-se a administração da polis (cidade) no sentido do bem coletivo (GRUPPI,
1987).

Entretanto, Marx, pensador moderno, se contrapõe ao conceito de política em


Aristóteles, pois para Marx, (apud Tonet, 2005), “a política tem um caráter
essencialmente negativo”. O que isto significa? Para Marx (APUD TONET, 2005), os
fenômenos não são um todo homogêneo. Todos são marcados pela unidade, pela
diferença e pela contradição. Desse modo, um fenômeno pode ser positivo, mas,
contraditoriamente, ser também negativo, ou vice-versa. Assim, o pensamento de
Marx foge das classificações dicotômicas binárias, as quais o pensamento ocidental
está tão acostumado. Para ele, o caráter essencialmente negativo da política,
significa, apenas, que ela é uma expressão da alienação, ao mesmo tempo, ela nem
faz parte da natureza essencial do ser social, nem é uma dimensão insuperável
dele, portanto pode tornar-se um obstáculo à plena autoconstrução humana
(TONET, 2005, p.92).

Nesse sentido, Marx (APUD, 2005), entende política como algo necessário a
condição humana, mas também como algo negativo no sentido de poder fazer com
que o indivíduo veja a política do ponto de vista da classe dominante, ou seja, a
política se dá numa sociedade de classes não possibilita a transformação, nem as
condições necessárias para que a classe subalterna participe das decisões políticas.
Apesar destes limites, por um caráter contraditório, a política também pode contribuir
para o processo de organização das classes trabalhadoras nos seus diversos
movimentos sociais, sindicatos, etc... Desta forma, pode-se contribuir para a
construção de uma cultura política que leve em consideração os interesses da
maioria.

Percebemos, portanto que o pensamento ocidental moderno tem, suas raízes


na Grécia Antiga e para compreendermos a forma de pensar da sociedade hoje,
inclusive na forma como vê as mulheres, é preciso recuar no tempo e buscar nossas
raízes e os valores que formaram a Civilização Ocidental Cristã.
26
Na Grécia Antiga, as mulheres, escravos e estrangeiros eram excluídos (as)
da vida pública, um processo visto então, como natural. Havia muitas diferenças
entre as mulheres e homens. As mulheres abastadas viviam separadas dos homens,
em cômodos diferentes, reservados a elas dentro da casa, chamados gineceus,
onde ficavam confinadas a maior parte do tempo. As mulheres eram responsáveis
pela administração da casa e o cuidado com os filhos, de acordo com as orientações
recebidas pelo marido. Assim, a boa esposa, casta, silenciosa, tinha nas mãos as
rédeas da economia doméstica. Os meninos eram educados para a guerra e para a
vida pública, logo, a educação das crianças tinha um papel fundamental na
transformação dos homens em guerreiros ferozes, e das mulheres em donas de
casa, educadas para o casamento e o lar. Nesse sentido, a cidadania concebida
pelos Gregos era um atributo de homens livres, que seriam as pessoas aptas para
as atividades políticas. As mulheres não podiam ser consideradas cidadãs, pois, as
mulheres e escravos eram relegados a margem dos assuntos de interesse público;
uma vez que não tinham cultura e na Grécia, um atributo fundamental para atividade
política era a cultura, que por sua vez só era “atributo” dos homens abastados e
livres. A partir desta concepção de cidadania já se estabelece a dicotomia entre
esfera pública e privada, na qual caberá aos homens os assuntos públicos.

Assim o conceito de democracia 9 grega nasceu em uma sociedade que não


levava em consideração os direitos das mulheres, já que as mulheres, escravos e
estrangeiros, eram excluídos da participação na vida pública.

De acordo com Pimentel (1987), uma sociedade é democrática quando além


de eleições e da existência de partidos políticos, “todos sem distinção de sexo
podem votar e ser votados”. Contudo, entendemos também que somente este
elemento não define a democracia, pois ela está profundamente marcada pela
estreita correlação de mercado e capitalismo. Neste sentido, só é possível falar em
democracia plena quando se fala também em socialização da riqueza produzida,
caso contrário, a democracia será somente representativa e formal. Uma vez que, o
processo eleitoral permite que os políticos carreiristas se beneficiam da miséria da

9
O conceito de Democracia vem do grego demos (povo) e Kracia (poder, autoridade), portanto poder do povo.
Ao excluir mulheres, escravos e estrangeiros da participação na vida pública e de quaisquer outras atividades, o
termo Democracia não exprimia seu pleno sentido. Aliás, até hoje, inúmeros estudiosos mostram que o conceito
pleno de Democracia implica participação política da população, e isto significa também socialização da riqueza
produzida (FUNARI, 2001).

27
classe trabalhadora e impõe a troca do seu voto pelo política de favores, ou seja, o
uso da máquina eleitoral usado em beneficio do representado.

De acordo com Costa (2007), democracia representativa é mediada entre o


sujeito - indivíduo e um sujeito coletivo, que são os partidos políticos, sindicatos,
igreja, etc... As eleições se constituem num momento importante, votar é a condição
necessária e fundamental de participação política, entretanto para Costa (2007), a
relevância deste ato se expressa, basicamente, porque não há outra forma de
participação política que envolva um maior número de indivíduos. Neste momento
há uma mediação do sujeito que representa. Na Grécia Antiga, a democracia era
direta, ou seja, “todos” os cidadãos podiam participar da assembléia do povo, que
tomava decisões relativas aos assuntos políticos em praça pública. Os cidadãos
tinham direitos essenciais como liberdade, individualidade e igualdade, dentro de
certos limites como já assinalamos anteriormente.

Uma vez que para os pensadores gregos, havia uma objetividade no modo
de ser do homem, para estes, tanto o conhecimento como as ações são objetivadas
no mundo real. Arendt (2001) dirá assim, que para os gregos é próprio da condição
humana - ou seja, aquilo que a caracteriza com atributos específicos - são o diálogo
e a ação, ambos situados na esfera do público. Deste modo, participar da esfera do
público na Grécia, significava que tudo poderia ser dito pela persuasão. A esfera de
discussão e do diálogo, o jogo de perguntar e responder, forma parte desse âmbito
da existência que os gregos isolaram como sendo o âmbito do “propriamente
humano”. Este se refere ao modo de existir entre iguais, a dialética e a retórica.

Ainda de acordo com Arendt (2001, p. 36), em linhas gerais era essa a
concepção de política que permitia aos gregos conviver com formas despóticas de
organização como a escravidão ou o patriarcado, que estavam reservadas
exclusivamente ao âmbito do privado. Os escravos, os bárbaros e as mulheres eram
“aneu logou” (sem logos). Porém, isso não significava que estivessem “desprovidos
da faculdade do discurso, mas sim de uma forma de vida em que o discurso, e
somente o discurso, tinha sentido e onde a primeira preocupação entre os cidadãos
era falar entre eles”.

28
Desta forma, o âmbito do privado 10 tinha seu centro no interior da família e do
doméstico. Era ali onde as necessidades vitais básicas deveriam ser satisfeitas
como condição para a realização da vida pública. Esse âmbito das diferenças e
desigualdades era considerado espaços de violência muda e do segredo, na medida
em que implicava estar privado de ser visto e ouvido por outros. Isso demonstra que
o patriarcado e a escravidão, relações eminentemente desiguais, eram tolerados no
âmbito do privado. As pessoas que pertenciam exclusivamente a esse espaço como
mulheres, escravos e bárbaros careciam de significação e de conseqüências para os
outros. Arendt (IBIDEM) mostra no pensamento grego, o que significava estar no
mundo privado e familiar. Ser Mulher na Grécia era viver confinada e afastada das
decisões políticas.

Para o indivíduo, viver uma vida inteiramente privada significa, acima de


tudo, ser destituído de coisas essenciais a vida verdadeiramente humana:
ser privado da realidade que advém do fato de ser visto e ouvido por outros,
privado de uma relação “objetiva” decorrente do fato de ligar-se e separar-
se deles mediante um mundo comum de coisas e privado da possibilidade
de realizar algo mais permanente que a própria vida. A privatividade reside
na ausência de outros; para estes, o homem privado não se dá a conhecer,
portanto é como se não existisse. (ARENDT, 2001).

Dentre do que foi levantado a respeito do privado podemos observar que as


mulheres e escravos eram recolhidos ao mundo privado, não participavam das
atividades da polis grega e estavam submetidos a esfera da necessidade, lugar
privilegiado da violência, onde se trava a luta pela sobrevivência. Neste sentido,
podemos entender o conceito de liberdade na polis grega, também através de
ARENDT (2001). Liberdade situa-se na esfera política; a necessidade é
primordialmente um fenômeno pré-político, característico da organização do lar
privado; e a força da violência é justificada nesta última esfera, por serem os únicos
meios de vencer a necessidade. Assim, a liberdade é a condição essencial daquilo
que os gregos chamavam de eudaimonia - ventura - estado objetivo dependente da
riqueza e da saúde.

Desta forma, dentro da esfera da família, a liberdade não existia, pois o chefe
da família, seu dominante, só era considerado livre na medida em que tinha a
faculdade de deixar o lar e ingressar na esfera política, onde todos eram iguais.
10
“O lar é a esfera do nascimento e da morte, que devia ser escondida da esfera pública por abrigar coisas ocultas
aos olhos humanos e impenetráveis ao conhecimento humano, ela se refere ao termo oculto porque o homem não
sabe de onde vem, quando nasce, nem tem conhecimento do lugar para onde vai quando morrer” (ARENDT,
2001, p.72).

29
Liberdade, no nosso entendimento, difere, portanto, do conceito de liberdade na
Grécia Antiga. A liberdade passa pela autodeterminação do ser social e, neste
sentido, a plena liberdade não existe para o indivíduo na sociedade capitalista, uma
vez que nela, quem determina é o capital, segundo suas necessidades.

Portanto, o papel reservado às mulheres na Polis Grega era de objeto


sexual e de dar descendência legítima aos homens. Para assegurar essa
legitimidade da descendência, necessário se fazia manter as mulheres submissas,
obedientes e principalmente fiéis. Já ao homem se aconselhava fidelidade somente
para mostrar a sua superioridade sobre seus desejos, como forma de dar provas de
domínio de si. O poder, quase total, exercido pelos homens sobre as mulheres era
socialmente reconhecido e considerado correto. “Para Aristóteles, por exemplo, o
papel do homem era governar a mulher e o poder do marido era aristocrático, ou
seja, proporcional a seu mérito e por isso, era justo” (LIMA, 2002, p.97).

Ainda a esse respeito Badinter (1985), cita Aristóteles como o primeiro a


justificar, do ponto de vista filosófico, a autoridade do marido e do pai. Para
Aristóteles, a mulher é essencialmente inferior ao homem, seja qual for a sua idade.
É desvalorizada do ponto de vista metafísico, pois encarna o principio negativo, a
matéria. Aristóteles pensava que a menstruação era a matéria a que o esperma
dava a forma. A inteligência, virtude da humanidade, só era transmitida, portanto,
pelos homens. Como para ele a mulher era dotada de uma frágil capacidade de
deliberação, o filósofo deduz “logicamente” que sua opinião não é digna de
consideração, uma vez que, a única virtude moral da mulher era de obedecer e
manter-se no silêncio.

É preciso acentuar contudo, que o pensamento grego é adotado de forma


dialética, pela sociedade ocidental contemporânea, ou seja, há incorporação e
superação, destruição e reconstrução a partir do recebido, mas permanece na
cultura ocidental contemporânea, muitos dos elementos da cultura ocidental grega,
que justificam o papel da mulher de submissão aos homens.

Segundo Maar (1994), a política grega se diferenciava da romana. Enquanto


na Grécia a política era vista como algo mais coletivo, em Roma a política estava
voltada a objetivos manifestamente particulares: os interesses das gens originais,
não eram a polis.

30
Em Roma, a atividade política concentrava-se na disputa pelo poder de tutela
do Estado, como instituição à serviço de interesses privados. Contudo, o povo
romano não sacrificou o privado em benefício do público, mas compreendeu que
estas duas esferas podiam subsistir sob a forma de coexistência.

A maioria da população, nos tempos da realeza, era composta pelos


chamado plebeus - pessoas livres, que não tinham prestígio – e pelos patrícios –
grupo privilegiado enriquecido pelas guerras. Os plebeus não podiam participar das
decisões políticas, assim como as mulheres. A subordinação feminina era a base do
sistema social do patriarcado romano, que era fixo e imutável e confirmado na figura
do pater famílias, que tinha total controle sobre as esposas e filhos.

A sexualidade antiga ligava-se de forma direta a vida cotidiana, a procriação e


aos vários estágios da vida, a morte e ao devir. Assim, como em todas as
sociedades, Roma não se diferenciava, na questão da mulher, a finalidade do
casamento era a procriação. Em latim, o casamento chama-se matrimonium:
encontramos aí a raiz da palavra mater, mãe, definindo o casamento como sendo
relacionado com a noção de fecundidade. A etimologia da palavra mostra-nos qual a
concepção da sociedade da época acerca do casamento. O matrimonium era o local
por excelência da mater, portanto, das mulheres.

Segundo Funari (2001), em Roma existia maior interação entre homens e


mulheres, diferentemente do que ocorria na Grécia. As mulheres tinham uma
inserção social ampla, participavam de banquetes e reuniões sociais, chegavam
inclusive a participar de campanhas eleitorais. No que se refere à educação das
mulheres, esta era quase inexistente, apesar de algumas meninas humildes e
abastardas serem alfabetizadas e haver entre elas algumas poetisas e intelectuais
que se destacaram.

Assim, a sociedade romana centrava-se no homem e nos valores tidos como


conexos à virilidade: a guerra, bem como as vantagens que dela decorriam. O
patriarcalismo imperava na Roma assim como na Grécia, e foram estes os dois
berços da civilização ocidental – cristã.

2.2 – O Pensamento Religioso Judaico-Cristão Acerca das Mulheres

31
Como já foi visto anteriormente a cultura ocidental tem suas raízes na cultura
grego-romana, mas também na cultura judaico-cristã, todas, eminentemente,
patriarcais. É a partir desse contexto, que nos reportaremos para entender a
influência do cristianismo para nossa formação, e como as construções de gênero
vão sendo tratadas na historiografia e nos discursos religiosos, para justificar as
relações hierárquicas entre homens e mulheres. Assim sendo nos embasaremos na
leitura do mito de Adão, Eva e Lilith, esquecida pela história judaico - cristã.

De acordo com Badinter (1985, p.33), a Teologia Judaico-Cristã em todo


decorrer da história, em virtude de suas raízes judaicas teve sua cota de
responsabilidade ao justificar a autoridade paterna e marital. No que concerne a
questão da mulher, podemos observar isso nos textos do Gênesis, que mostra
inicialmente a criação do homem do qual veio à humanidade, e como se deu à
criação do homem e mulher. Este é o mito judaico-cristão de Adão e Eva.

O homem pôs nome a todas os animais, a todas as aves dos céus, todos os
animais dos campos; mas não se achava para ele uma ajuda que lhe fosse
adequada. Então o Senhor Deus mandou ao homem um profundo sono; e
enquanto dormia, tomou-lhe uma costela e fechou com carne o seu lugar. E
da costela que tinha tomado do homem, o Senhor Deus fez uma Mulher, e
levou-a junto do homem. (Bíblia, Gênesis-As Origens, Cap 2, 1993 p. 50)

Os escritos do Talmude - livro hebraico de comentários da Bíblia - se


contrapõe a história da Bíblia que mostra que Adão e Eva são o primeiro casal de
humanos e fazem parte do imaginário, na civilização ocidental. O Talmude,
entretanto, nos apresenta uma história diferente a respeito do primeiro casal.
Segundo o mesmo, Deus criou Adão, ele o fez macho e fêmea, depois cortou-o ao
meio, chamando a outra metade de Lilith. Porém, Lilith reivindicando igualdade em
relação a seu companheiro briga, com este. E dizia: “Por que ser sempre dominada
por ti? Eu também fui feita de pó e por isso sou tua igual” Lilith queria liberdade de
agir, de escolher e decidir, ela queria os mesmos direitos do homem, porém Adão se
recusava a inverter as posições. Vendo que o companheiro não atendia a seus
apelos e que não daria condições de igualdade, Lilith se revolta, pronunciando
nervosamente o nome de Deus, faz acusações a Adão e vai embora; é o momento
em que o sol se despede e a noite começa a descer o seu manto de escuridão
soturna, tal como na ocasião em que Jeová –Deus fez vir ao mundo os demônios.

32
Neste mito, Lilith 11 se afirmou como um demônio, e é o seu caráter
demoníaco que leva a mulher a contrariar o homem e a questionar o seu poder. Por
isso é vista como força destrutiva. Foi a partir daí que Deus ouvindo os apelos de
Adão decide criar outra companheira que é Eva, moldada exatamente como a
conhecemos hoje. É o modelo feminino permitido ao ser humano pelo padrão ético
judaico-cristão, portanto Eva é construtiva e Mãe de toda Humanidade, contudo,
esta nova companheira não tem individualidade, pois foi criada da costela do homem
como já relatamos anteriormente.

“Eis agora aqui” disse o homem: o osso de meus ossos, e a carne de minha
carne; ela se chamará mulher, porque foi tomada do homem” Por isso o
homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir á sua mulher; e já não são
mais que uma só carne( Bíblia, Gênesis 2, 1993, p..50).

De acordo com os escritos bíblicos essa mulher, a qual relatamos acima, é


Eva, a mãe de todos os seres humanos, e com ela se dá o pecado original, se
tornando responsável pelo pecado e sofrimento da humanidade e sua submissão.
Segundo a Bíblia, o pecado original ocorre porque Deus havia proibido à Adão e Eva
comerem de um determinado fruto do jardim. Eva foi tentada pela serpente que
prometia a ela ser semelhante a Deus, diz à Eva: “Mas Deus bem sabe que, no dia
em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão, e sereis como deuses,
conhecedores do bem e do mal”. Ela comeu o fruto e ofereceu a Adão, que não
recusou. Vendo a desobediência de suas criaturas, Deus pediu explicações a Adão,
“A mulher que puseste ao meu lado apresentou-me deste fruto, e eu comi” (BIBLÍA,
IDEM).

Para Badinter (1985) um outro texto bíblico que exerce um importante papel
na história ocidental para a determinação da condição feminina foi o de São Paulo,
na Epistola aos Efésios. O apóstolo expõe ali uma teoria que modifica o pensamento
de Jesus.

O homem deve ser o chefe do casal, pois foi criado em primeiro lugar e deu
origem à mulher. E a ele, portanto, que cabe o poder de mandar. Mulheres
sejam submissas a seus maridos, como ao senhor, assim como a igreja
está submissa a Cristo (BIBLÌA, 1993. Carta de São Paulo aos Efesios,
5,23-24).

11
Aqui apresentamos uma síntese com as informações sobre Lilith é um resumo de informações de vários sites
acerca do assunto. Para uma leitura mais detalhada há um clássico do assunto (SICUTERI, 1990).

33
Ainda de acordo com Badinter (1985), é através dos textos de Santo
Agostinho que no século IV, a figura da mulher também é mostrada como maligna, e
endiabrada, e evocava as más condições da mulher: um animal que não é firme,
nem estável, odioso, que alimenta a maldade... Ela é fonte de todas as discussões,
querelas e injustiças. Esse é o imaginário masculino no qual a mulher é responsável
pela discórdia entre homens e mulheres.

É importante lembrar que os pensadores ocidentais medievais e modernos


têm a base de seu pensamento construída a partir da influência grego-romana e
judaico-cristã. Assim, o pensamento medieval cristão é o resultado de uma série de
influências recebidas ao longo dos séculos e estas influências eram sobretudo
patriarcais.

Neste sentido, a figura de Maria, como apresentada pela igreja Católica,


sendo mãe de Deus redentora e protetora, descarta todo o imaginário referenciado a
Eva e Lilith. Maria representação do divino é santificada, como modelo de mulher
acolhedora, exemplo de virtude e bondade. Segundo Boff (In PAIVA, 1990, p.71),
Maria é apresentada pela igreja como uma mulher que vive totalmente à sombra do
varão, Jesus, mulher que tece, cozinha, busca água no poço e vive sepultada no
anonimato familiar. As mulheres, contudo, tiveram um papel significativo na vida de
Jesus, foram elas que estavam no começo, no meio e no fim da vida de Jesus: é
através de Maria que ele entra no mundo e as mulheres são as primeiras
testemunhas da ressurreição de Jesus, segundo a Bíblia.

Fica demonstrado assim, que em todo decorrer do texto o pensamento


Judaico-Cristão se utiliza de teorias para justificar o patriarcalismo e a posição
feminina de subalternidade. Ora, a maioria dos filósofos medievais eram cristãos e
consideravam a mulher como ser acidental e falho, não sendo a realização do
pensamento de Deus.

No que diz respeito a sexualidade, a igreja teve papel nefasto e repressor,


pois além de incultar na mulher comportamentos morais reprimindo sua sexualidade
e anulando a mulher como ser consciente de si mesmo, mostrava a superioridade
masculina como forma de oprimir a mulher. Ao colocar a mulher como mera
reprodutora e com obrigação de ser mãe, pura, casta e obediente, nega ao mesmo

34
tempo, a mulher como ser capaz de reagir aos prazeres da carne, e mostra a
propensão “natural” da mulher para a vida doméstica.

Baseando-se nesses mitos, entendemos que nas sociedades ocidentais, o


mito dos Gênesis que envolvem Adão, Lilith, Eva e Maria é condicionante do papel
da mulher na sociedade. Quando se trata da questão de inferioridade social em
relação ao homem, a mulher é vista sempre como a responsável pelo pecado
original, por isso é banida e relegada a viver no silêncio e na obediência e este é
considerado o seu papel.

2.3 - AS MULHERES NA IDADE MÈDIA – INFLUÊNCIA DA IGREJA CATÓLICA

Durante a Idade Média a Igreja católica, instituição que exerceu o domínio


espiritual e político sobre as mulheres, se dá em função do pecado original em que a
mesma vai ser vista como ser distante de Deus, portanto, propícia a influência do
demônio.
Para entendermos como estava organizada a sociedade na Idade Média,
partimos da visão de Tonet (2005), “o qual afirma que, na Idade Média, o mundo era
possuidor de uma estrutura e de uma ordem hierárquicas definidas e
essencialmente imutáveis”. Estrutura e ordem no interior das quais também a
posição do homem estava claramente definida. O mundo natural, como também o
mundo social, não era visto como históricos e muito menos como resultantes da
atividade do homem. Entre mundo e homem se configurava uma relação de
exterioridade. O poder era teocrático, por isso, todas as ações do homem eram em
nome de um poder divino – Deus. Esse pensamento teocrático predominou durante
todo o decorrer da Idade Média, sendo rompido com a Revolução Francesa em
1789. 12

Como a sociedade na Idade Média estava organizada hierarquicamente,


analisaremos neste contexto, como a mulher era vista e quais os aspectos

12
A Revolução Francesa é somente o marco histórico de uma modificação econômica - política e cultural, na
qual se mesclam diversos determinantes e que culmina com a consolidação do modo de produção capitalista.
Entre estes determinantes citamos: a ilustração, o projeto iluminista, a revolução científica e industrial e a
reforma protestante.

35
relevantes para entendermos a situação das mulheres na instituição familiar e suas
formas de atuação fora dos meios domésticos e sua participação na sociedade.

A Idade Média foi um período marcado pela dominação da Igreja, instituição


dominadora para a qual a sociedade se constituía em nome da fé divina e da
concepção cristã do mundo, e para quem a mulher era um ser inferior. Nesse
período, como em outros já analisados, a sociedade definia os papéis e os lugares
reservados aos sexos, no entanto o controle cabia aos homens, cujos valores
oscilavam entre os princípios éticos cristãos e o ideal da guerra.

Como já mencionamos na Antiguidade, as mulheres estavam restritas ao


domínio privado, o papel da mulher era de exclusão pública, política e administrativa,
suas relações se limitavam ao espaço da casa. Na Idade Média, para Tonet (2005),
tal cultura permanece, ou seja, predomina a visão teológico-machista, na qual a
liberdade não seria um elemento conatural ao homem, mas um dom gratuito
concedido por Deus. O homem, apesar da queda provocada pelo pecado original,
disporia do livre-arbítrio isto é, teria a capacidade de escolher entre o bem e o mal.
Essa capacidade só se dá porque ele participa de algum modo, da mera bondade
divina, da natureza de Deus, isto é, da própria liberdade. Desta forma, nesta visão o
pecado original, provocado pela mulher - Eva, levou à subjugação das mulheres.

Como a sociedade era patriarcal, era também patrilinear, ou seja, as mulheres


eram excluídas da sucessão e da partilha das heranças. Deste modo, na Idade
Média quando o senhor feudal morria, o filho primogênito passava a herdar a maior
parte das posses e as filhas eram totalmente excluídas da sucessão.

Para Macedo (2002), tais regras de transmissão dos bens tinha por finalidade
evitar a divisão do patrimônio, que colocaria em risco a riqueza da família. Antes de
morrer o senhor feudal, caso não tivesse filho varão, obrigava sua única filha a
casar, nesse caso o marido seria o responsável pela herança. As estratégias
matrimoniais organizavam e sustentavam as relações sociais. O casamento antes de
tudo era um pacto entre famílias. Nesse ato, as mulheres serão, ao mesmo tempo,
doadas e recebidas como um ser passivo. Sua principal virtude dentro e fora do
casamento deveria ser a obediência e a submissão. Temos a compreensão de que
toda essa subjugação era justificada pela Igreja, já que a mesma determinava os
papeis sociais entre homens e mulheres.

36
Toda essa discussão nos leva a refletir sobre o poder de comando da Igreja e
a preocupação da mesma em justificar o matrimônio apenas para procriação e a
condenação do prazer físico. Durante esse período, as expressões de afeto não
eram considerados importantes nas uniões, a continuidade da linhagem era o único
objetivo da conjugalidade.

De acordo com Kollontai (1982), a mulher durante muitos séculos, foi


valorizada, não pelas propriedades da sua alma, mas sim pelas virtudes femininas
que exigia a moral da propriedade: a pureza, a virtude sexual, não havendo perdão
para a mulher que pecasse, segundo o código rígido da moral sexual. Em suma, não
existia liberdade para que as mulheres fossem de encontro aos preceitos morais da
época.

Macedo (2002), mostra que, embora juridicamente dependentes, as mulheres


de elite e do povo tiveram distintas experiências de vida e ocuparam variadas
posições na sociedade medieval, dela participando ativamente com menor ou maior
grau de intensidade.

Diante do que foi exposto cabia à mulher a responsabilidade pelo suprimento


de alimentos e vestimentas da família. Elas tinham que administrar o trabalho
doméstico, acompanhar passo a passo a fabricação dos tecidos, controlar e
subvencionar o abastecimento em geral. Contudo, algumas mulheres conseguiram ir
além dos papéis convencionais a que estavam destinadas e romper barreiras
definidas pelo sexo.

A Igreja católica e seus representantes durante todo o seu domínio, definiram


e classificaram, várias categorias para dividir, excluir e perseguir as mulheres
consideradas perniciosas e malignas para a cristandade. Entre essas categorias
havia perseguição: aos hereges, bruxas e feiticeiras e prostitutas 13 . As hereges eram
consideradas pessoas que se rebelavam contra as “verdades” da Igreja ou contra o
seu enriquecimento ilícito e distanciamento dos princípios da vida apostólica. Essas
pessoas apresentavam certo incorfomismo social e político.

Ainda de acordo com Macedo (2002), através dos seus teóricos, a Igreja
justificava seu preconceito em relação às mulheres, consideradas feiticeiras que
rompiam com os preceitos impostos pela sociedade de castas. Dentre estes
13
As feiticeiras, segundo as crenças da época realizam praticas individuais, ao contrário das bruxas (MACEDO,
2002).

37
teóricos, temos São Tomás de Aquino, pensador cristão do século XIII, que afirmava
que os demônios existem e que são capazes de causar danos e impelir ao ato
carnal. Assim, para o imaginário da época, as bruxas em suas reuniões, o sabat,
concebido como uma orgia satânica praticavam atos sexuais abomináveis, e os
faziam para conseguir, malefícios de toda a espécie. Neste sentido, as bruxas e as
feiticeiras eram mulheres que exerciam sua sexualidade livremente, rompendo com
os padrões rígidos da época.

As perseguições às mulheres associadas a figura maligna e perniciosa à


sociedade, ocorreu também com as mulheres que detinham o poder de cura
através da preparação de chás, pois a medicina ainda não estava instituída,
contudo, encontrava-se em processo de institucionalização. A Igreja passou a
considerar bruxas e feiticeiras mulheres que lidavam com o poder da cura através de
chás e ervas. Deste modo, deu-se a criação e o desenvolvimento de órgãos
repressivos no interior da Igreja como a inquisição, para punir e “educar” aqueles
que fossem contrários aos ensinamentos da Igreja.

Segundo Alambert (1986), nesta época, algumas vozes se ergueram contra a


inferioridade social da mulher, um nome que se destacou foi Christiane de Pison,
cuja figura se projetou na historia literária. Nas suas obras ela afirmou que homens e
mulheres são iguais pela própria natureza.

De acordo com Macedo (2002), no imaginário social da época, as crenças


nos poderes mágicos e nos praticantes da magia e nos seus vôos noturnos, em
suas metamorfoses em animais e a crença nos males que causavam as colheitas e
as crianças recém-nascidas, impregnavam a imaginação popular, mas os religiosos
consideravam tudo isso mera superstição.

A ligação das atividades mágicas, próprias da feiticeira, ao culto satânico e a


depravação sexual deram origem a figura da bruxa e ao fenômeno da bruxaria. A
velha feiticeira fruto de ilusões populares, aos poucos desapareceu da imaginação
do povo, cedendo lugar à bruxa – temida por todos. As bruxas, ao contrário dos
magos, eram vistas como adoradoras do Demônio, por isso eram perseguidas.

Ao mostrarmos a perseguição as bruxas e hereges, nos reportaremos


também as prostitutas da época, vistas como pessoas que romperam com o modelo
imposto e desejado, ao qual as mulheres estavam submetidas, contudo não foram

38
perseguidas, desde que se mantivessem no seu lugar. A quebra do padrão de
sexualidade se dá com as prostitutas, que eram vistas como mulheres de vida fácil e
que atuavam em “casas de mulheres”, ou zonas de meretrício. Um paradoxo
presente nesse período é que a prostituição era considerada um mal pela
sociedade, contudo, ao mesmo tempo, era tolerado. A prostituição, uma atividade
oposta aos rígidos padrões morais da época, ao mesmo tempo, recriminada por uma
parte da população, tornou-se uma atividade pública. Segundo Macedo (IBIDEM),
chegavam a existir lugares alugados pelos chefes da comunidade ou pelos
burgueses ricos – os prostíbulos públicos que eram protegidos pelas autoridades,
nos quais a fornicação era exercida livre e oficialmente. Existiam estabelecimentos
para banhos, onde se podiam desfrutar os prazeres carnais, sem falar dos bordeis
particulares.

O papel dos prostíbulos era e continua sendo o de dar sustentação aos


prazeres carnais do sexo masculino, pois era fora do casamento que o homem
encontrava o sexo livre. Assim, a prostituição era discretamente aceita na sociedade
como um mal necessário para garantir a moralidade familiar. Porém, era nesses
espaços que as mulheres assim, como os homens exerciam sua sexualidade de
forma livre. A teoria popular supunha que a sexualidade masculina era ativa e
precisava ser satisfeita, e a feminina passiva: a mulher não teria frustração sexual.
Como o casamento monogâmico era visto como a única base social viável, e este
tipo de casamento restringia a sexualidade, portanto, a válvula de escape
encontrada foi a prostituição.
Ainda de acordo com Macedo (2000), no imaginário da época, a prostituição
colaborava para a sanidade da sociedade, atenuando as tensões e servindo de
válvula de escape para os homens que deviam exercer sua sexualidade livremente
para assim, serem considerados homens. Assim, os teólogos incentivavam a busca
do prazer fora da conjugalidade. Com a esposa, o homem cumpria as obrigações de
marido, já que com as prostitutas buscava-se o deleite. No entanto, as prostitutas
eram mantidas afastadas das “pessoas de bem”, ou seja, isolavam-se as meretrizes
para que as mulheres de bem não fossem “contaminadas”. Os prostíbulos eram
freqüentados principalmente pela nobreza, que aprisionavam suas esposas como
forma de mantê-las afastadas desse “mal necessário”.

39
Contudo, a partir do século XVI uma série de transformações abalam o poder
da Igreja e da sociedade feudal, deflagrando posteriormente o surgimento da
sociedade burguesa moderna. Nesta, convém ressaltar que em pleno século XXI, os
prostíbulos continuam cumprindo o seu papel, de saciar os prazeres e atenuar as
tensões servindo de válvula de escape para os homens exerceram sua sexualidade
livremente, assim como permitindo às mulheres uma opção de sobrevivência. Deste
modo, O capitalismo foi modificando as formas e práticas da prostituição, inserindo-
as na lógica do mercado global. Exemplo disso é o “turismo sexual”, que envolve
hotéis, agências de viagem etc, com a formação de redes de prostituição em todo o
mundo.

2.4 - AS MULHERES NA SOCIEDADE MODERNA E NA CONTEMPORANEIDADE

O contexto de nascimento e consolidação do saber científico – desde o


Renascimento 14 até o século XIX - vai significar o progressivo rompimento com as
explicações teológicas do mundo, que predominou na Idade Média. O que antes era
explicado a partir do poder divino, pouco a pouco, passa a ser explicado através da
racionalidade, experimentação, observação e teorias científicas. Nesse contexto de
nascimento das ciências modernas, percebe-se o jogo de poder entre os sexos,
particularmente entre a medicina e as curadeiras que exerciam a prática de curar,
como já assinalamos.

De acordo com Tonet (2005), a transição do mundo feudal para o mundo


capitalista significou uma ruptura decisiva tanto no plano material como no plano
espiritual. As consideráveis modificações econômicas, políticas sociais e cientificas
acontecidas nesse período evidenciaram um infinito, sem ordem hierárquicas e em
constante movimento, ao mesmo tempo em que acentuaram a importância da
atividade humana tanto no conhecimento como na construção da realidade social.

14
Renascimento - movimento intelectual e cultural, designando um período histórico, intermediário entre a
mentalidade medieval e a mentalidade moderna, que floresceu na Europa, basicamente dos séculos XV a XVI.
O traço mais característico desse período é o humanismo que chega a ser uma característica determinante no
pensamento moderno, marcando a ruptura do indivíduo com a sociedade tradicional e também um novo
começar, a partir da idéia do caráter natural e racional da sociedade, da idéia de pacto social e do Estado secular.
Cria-se o campo de afirmação do individualismo: liberdade, igualdade, propriedade e segurança (MARQUES/
BERUTTI/ FARIA, 2001).

40
Tonet (IBIDEM), mostra que a teoria liberal da cidadania, representada por
Kant, Hobbes, Locke, Rousseau e outros, tem como pressuposto teórico “todos os
homens são iguais e livres por natureza”. Então, as desigualdades sociais existentes
eram consideradas legítimas e constitutivas do mundo humano, portanto
justificáveis. A busca da realização pessoal, conseqüência da própria liberdade faria
com que os indivíduos se chocassem, inevitavelmente, entre si, dando origem a toda
sorte de conflitos e desigualdades. Assim, havia a necessidade dos homens se
organizarem em sociedade e instituírem uma autoridade capaz de garantir que
determinados limites não fossem ultrapassados.

As mudanças sociais que emergem de uma nova força social, a burguesia


ascendente, que crescia atrelada ao processo de desenvolvimento do capitalismo,
acirrava-se cada vez mais, com maior impulso e poder, tendo como idéias centrais a
liberdade, igualdade e fraternidade. Em substituição ao princípio de castas, aparecia
uma severa individualização, os limites da família burguesa, o princípio da livre
concorrência e as leis de mercado.

A valorização do indivíduo ou da subjetividade, como lugar da certeza e da


verdade, a origem dos valores e do saber adquirido estão presentes no humanismo
renascentistas que tem uma influência determinante no pensamento moderno, e
colocou o homem no centro de suas preocupações éticas, estéticas, políticas e na
revolução científica.

A revolução científica pode ser considerada assim, uma grande realização do


espírito crítico humano, com suas formulações e hipóteses ousadas e inovadoras e
com suas buscas de alternativas para a explicação científica, contudo, em nome
dessa cientificidade passa a imperar também a dominação do homem pela ciência, e
durante muito tempo, o papel da mulher na ciência foi sempre ignorado.

De acordo com Salvadore (1991), o pensamento machista da época afirmava


que as parteiras tinham uma formação que não se baseava, certamente, nas últimas
descobertas científicas, ou seja, a mulher não utilizava os métodos científicos para a
sua prática e sim o senso comum, então para a ciência, a mulher parteira tinha que
se valer da cientificidade para fazer algo que sempre foi do seu domínio. Essa
convicção perdurou por muito tempo, contudo, a prática das parteiras permanece até
os dias atuais.

41
É preciso ressaltar que a medicina da época tinha a preocupação em legitimar
e deslegitimar as mulheres, que cuidavam da gestação, parto, alívio de doenças e
sintomas, inclusive através de porções e ervas, já que a medicina não estava
totalmente instituída. Todas essas questões legitimavam o pensamento cristão
acerca das mulheres e da sexualidade. Nesse sentido, a instituição da medicina se
confunde com a história da bruxaria que passou a ver como perigoso o saber da
curandeira. As curandeiras davam ao ritual de cura uma dimensão real que era
diretamente percebida pela vítima, para quem a moléstia, ou mesmo o quebranto,
havia se tornado insuportável. A capacidade das mulheres de prepararem porções e
ervas que aliviassem as doenças e, por vezes propiciassem a cura, passou a ser
associada a sua capacidade natural com o demônio, logo vista como bruxaria
(PRIORE, 2007).

Durante muito tempo o Ocidente conservou no seu imaginário a convicção de


que a prática da feitiçaria, maléfica e demoníaca, estava intimamente ligada a
natureza feminina, e por extensão, que toda mulher era feiticeira em potência. De
acordo com Sallman (1991), este estereótipo surgiu por volta de 1400 e manteve-se,
pelo menos no direito criminal, até o final do século XVII. Os ideólogos burgueses se
esforçaram para explicar “cientificamente” a inferioridade da mulher, e sempre se
recusaram a reconhecer nela um espírito criador. De acordo com
(ALAMBERT,1986), eles afirmaram também que o estado de humilhação da mulher
na sociedade se explica por suas particularidades biológicas, por suas funções na
maternidade que lhe são próprias, por sua inclinação “natural” para se ocupar da
casa e da educação das crianças. Várias teóricas do século XX, entre elas Scott
(1990), se contrapõem a essa teoria, e afirmam: “a diferença sexual não é a causa
originária da qual a organização poderia derivar, ela é antes uma estrutura social
movente, que deve ser analisada nos seus diferentes contextos históricos. Toledo
(2001), complementa mostrando que a exclusão da mulher é um fator cultural, com
uma causa econômica determinada, que assume varias formas, segundo o grau de
desenvolvimento das forças produtivas em cada lugar, e em cada período histórico.

Assim, as transformações sociais, políticas e econômicas decorrentes da


Revolução Industrial e da consolidação da sociedade capitalista teve como
conseqüências: a divisão do trabalho e a alienação, o crescimento das cidades e da
grande massa da população trabalhadora, devido a concentração das indústrias.

42
Desta forma, com o surgimento do capitalismo e da revolução industrial, a
sociedade, modificará o modo de vida das mulheres e isso só foi possível pelo pleno
desenvolvimento do capitalismo que exigia a presença das mulheres para aumentar
a produção e a taxa de mais-valia, conseqüentemente houve a necessidade de
romper com a forma de opressão a que estavam submetidas.
A partir desse período, há uma quebra do isolamento do lar para a rua, ou,
seja, com o advento da grande indústria moderna, com a produção social capitalista,
temos a saída da mulher da esfera privada para a pública (ALAMBERT, 1986).
Como afirma Marx (1987), a Revolução Industrial realizou a potenciação do
trabalho humano, dando origem a uma nova relação de classes. Chegava ao fim à
sociedade de estamentos e surgia uma sociedade de classes. Importante ressaltar
que a relação histórica entre o capital e o trabalho intensifica a exploração. Surgia o
urbano-industrial que substitui o trabalho baseado no artesanato. A passagem da
ferramenta da mão humana para a mecânica, quer na adaptação do implemento a
uma nova fonte de energia, transformou radicalmente o processo de produção,
exigindo que os trabalhadores se concentrassem num só lugar de trabalho, a
fábrica, que antes era a manufatura. Uma característica desse processo de equipe
foi uma extensão da divisão do trabalho.
Sabemos que, com a Revolução Industrial, há uma intensificação da
exploração, e o desenvolvimento das forças produtivas, isto é, o avanço da
capacidade humana de explorar cada vez mais a natureza mediante ferramentas e
tecnologia.
Segundo Engels (1978), nas comunidades primitivas a divisão social do
trabalho se dava da seguinte forma: enquanto a mulher controlava a produção
dentro da esfera doméstica, sendo responsável pela manutenção da subsistência e
reprodução, os homens atuavam fora do ambiente doméstico, controlando os meios
de produção, mas não havia antagonismo entre eles. Posteriormente, com o
surgimento da família patriarcal e a monogamia evidencia-se a conexão entre a
propriedade privada e reprodução nas relações sociais, portanto, a sujeição da
mulher. A primeira opressão de classes, portanto, se dá junto com a opressão do
sexo feminino pelo masculino.
Já a inserção da mulher na grande indústria na sociedade capitalista, impõe-
se pela necessidade do aumento da produção a partir do aparecimento da
maquinaria, no intuito de aumentar o material humano explorável pelo capital

43
mediante apropriação do trabalho de mulheres e crianças. Marx (1987), estabelece
uma ligação entre a extensão do trabalho a toda a família operária, ai incluídas as
mulheres e crianças e conseqüentemente a desvalorização da força de trabalho do
homem adulto. Em decorrência aumenta a mais-valia a ser extraída e, por
conseguinte, verifica-se maior acumulação de capital.
Deste modo, a relação do homem com o trabalho se modifica a partir do
capitalismo. No final do século XIX, acirrou-se a fragmentação do trabalho 15 em
duas esferas distintas: por um lado à unidade doméstica (a esfera Privada), do outro,
as relações de produção, que iriam modificar as relações familiares. Entretanto, essa
separação não se dava em termos tão radicais, pois a tarefa doméstica embora
estivesse restrita à unidade familiar, se dava também ligada as outras atividades
(MARX,1987).
Assim, o capitalismo foi destruindo o caráter patriarcal da sociedade naquilo
que lhe convinha, passando a demandar a contribuição direta dos trabalhadores (as)
na produção social da riqueza. A grande indústria impulsionou seu desenvolvimento,
elevou sua independência, isto é, criou condições de vida que estavam
incomparavelmente acima da imobilidade das relações pré-capitalistas
(LÊNIN,1980). A este respeito, Lênin (1980, p.15) afirma:

A nobre tecelã vai a fabrica atrás do pai e do marido, trabalha com eles e
independente deles. É um sustentáculo da família exatamente igual ao
homem. Na fábrica a mulher é um produto completamente independente,
igual ao homem.

Reforçando o que foi discernido por Lênin (1980), vale destacar as condições
a que homens e mulheres estavam submetidos na indústria. As mulheres chegavam
a trabalhar jornadas diárias de até 17h, em condições insalubres, submetidas a
maus tratos e ameaças sexuais constantes, sem contar com os salários inferiores,
abaixo dos homens, exercendo as mesmas funções. Outra questão é a dupla
jornada de trabalho a que a mulher estava submetida, pois após chegar do trabalho,
ainda lhe cabia as tarefas domésticas. Por isso, não podemos afirmar que a inserção

15 Para Marx “O trabalho é, em primeiro lugar, um processo de que participam igualmente o homem e a
natureza, e no qual o homem espontaneamente inicia, regula e controla as relações materiais entre si próprios e a
natureza. Eles se opõem à natureza como uma de suas próprias forças, pondo em movimento braços e pernas, as
forças naturais de seu corpo, a fim de apoderar-se das produções da natureza, ajustadas as suas necessidades e
condições” (MARX, 1987, p. 202).

44
das mulheres no mercado de trabalho não se traduz em pé de igualdade com os
homens.
Contudo é importante salientarmos que com o ingresso das mulheres no
mercado de trabalho, muitas modificações se deram e essas modificações
trouxeram novas formas de luta.
Desse modo, a classe que vive da venda da força de trabalho, composta por
mulheres, jovens, crianças e homens, foi reduzida a simples condição de força de
trabalho vivo, ou seja, matéria de exploração do capital. Observamos que os
antagonismos e contradições surgidos com a propriedade privada não foram
eliminados. Contudo, a sociedade capitalista estabeleceu novas classes, novas
formas de opressão e contraditoriamente, novas formas de luta.

2.5 - O MOVIMENTO FEMINISTA NA MODERNIDADE

O marco inicial na luta pelos direitos das mulheres foi a Revolução Francesa
em 1789, que marca a emancipação política dos homens e mulheres, o direito de ir
e vir e a supressão dos laços feudais. É o início da luta pelos direitos humanos e
onde surge o primeiro exemplo de um movimento de mulheres.

Segundo Toledo (2001), as primeiras lutas feministas da era burguesa foram


por direitos democráticos como o divórcio, o voto e o direito de receber uma
educação completa nos primórdios da revolução burguesa. A primeira grande
participação das mulheres em uma luta da classe operária foi na Revolução
Francesa, em 1789, quando elas combateram ao lado dos homens e também se
agruparam em clubes e sociedades populares, dando um grande salto em sua
emancipação, já que, naquela época, a mulher era proibida de filiar-se a qualquer
entidade sindical ou política.

De acordo com Saffioti (1976), à francesa Olympe de Gouges foi uma das
dirigentes políticas que mais se destacou nesse período, tendo escrito a Declaração
dos Direitos das Mulheres e da Cidadã, em 1791, como réplica a Declaração dos
Direitos do Homem, no início da Revolução Francesa. A Declaração dos Direitos da
Mulher era análoga a Declaração dos Direitos do Homem e foi votada pela
Assembléia Constituinte francesa no mesmo ano. Todavia, a Revolução foi dirigida
pela burguesia em ascensão, cujos interesses residiam, de um lado, na eliminação

45
dos privilégios feudais, e de outro, na manutenção das regalias masculinas,
principalmente dos homens burgueses.

Assim, para Goldenberg (1992, p.18), “dentre as reivindicações de Gouges


estavam o direito ao voto feminino, o direito de exercer uma profissão, o
reconhecimento pela lei e pelo Estado das uniões de fato, a abolição da escravidão
negra, da pena de morte e por maior atenção a maternidade”.

De acordo com Goldenberg (1992), Olympe de Gouges foi guilhotinada, no


dia 07 de novembro de 1793, sob a acusação de ter querido ser homem e ter
esquecido as virtudes próprias a seu sexo. Além dela, há registro de pelo menos
outras 374 (trezentos e setenta e quatro) execuções de mulheres, no período do
terror na Revolução Francesa.

Goldenberg (IBIDEM), enfatiza também a luta de Mary Wollstone Crafd (1759-


1797), na Inglaterra. Para a autora, a luta de Crafd não se diferenciava da luta das
mulheres na Revolução Francesa, pois ela foi considerada uma das precursoras do
feminismo contemporâneo, lançando, em 1792, “um manifesto com a Reivindicação
do Direito da Mulher; obra na qual defendia o direito da mulher à educação, ao
trabalho e à vida pública, negadas pela sociedade burguesa.

No campo marxista, a questão da mulher vem sendo discutida há mais de 150


anos, desde a I lnternacional Comunista, em 1864, como afirma Toledo (2005,
p.120): “o marxismo sempre se preocupou com a questão da mulher e buscou
encontrar a política mais justa para o problema, no marco da divisão da sociedade
em classes”, e é justamente isto que o diferencia das correntes reformistas e
burguesas. Ainda de acordo com a autora, a questão da opressão da mulher sempre
foi polêmica dentro do movimento socialista, com os marxistas enfrentando os mais
diversos matizes de reformismos, justamente porque é uma das correntes de
pensamento que mais coloca em evidencia a divisão da sociedade em classes.

No século XIX, o pensador francês Proudhon (apud Toledo, 2005), já


demonstrava preconceito em relação à mulher, quando dizia que lugar de mulher era
no lar, que a função da mulher era a procriação e a tarefa doméstica; aquela que
trabalhava (fora de casa) estava roubando o trabalho do homem (IBIDEM). Por outro
lado, Engels no mesmo período, afirmava:

46
Parece que a emancipação da mulher, sua igualdade de condição com
homem é e continua sendo impossível enquanto a mulher permanecer
excluída do trabalho social produtivo e dever limitar-se ao trabalho privado
doméstico... a liberação da mulher tem como condição primeira à
incorporação de todo o sexo na indústria pública (ENGELS, 1978, p. 81).

Entre os fatos que marcaram a saída da mulher do espaço privado, para o


espaço público, têm-se a I Guerra Mundial, (1914- 1918) e a II Guerra (1939-1945),
nas quais milhões de pessoas morreram. Na verdade, estas duas grandes guerras
foram guerras de rapina entre os monopólios imperialistas para controlar o mercado
mundial, foi a disputa imperialista entre burgueses competindo entre si num mesmo
ramo de produção.

A entrada da mulher no mercado de trabalho na esfera pública e na


sociedade se deu, massivamente, em substituição aos homens que estavam indo
para a guerra e isso ocorreu impulsionado pelo capitalismo. Para Thebaud (1991), a
grande guerra alterou as relações entre os sexos e contribuiu muito mais para a
emancipação das mulheres. Não podemos esquecer que no pós-guerra as mulheres
engrossaram as fileiras dos demitidos, primeiro porque dá-se a volta do homem com
o fim da guerra e depois, dá-se as sucessivas crises econômicas, políticas e sociais
causados pela guerra na qual os países estavam envolvidos. Nesse sentido não
podemos considerar que a inserção no mercado de trabalho trouxe à emancipação
das mulheres, já que as mesmas além do trabalho fora de casa, na maioria das
vezes, se vêem também obrigadas a assumir as tarefas domésticas sozinha. Deste
modo, o desenvolvimento do capitalismo foi criando as condições para emancipação
da mulher, através do direito ao voto, ao mercado de trabalho e do aumento de nível
de escolaridade 16 , porém acirrou a opressão ao combiná-la com a exploração, seja
no direito da mulher ao mercado de trabalho, seja na utilização do trabalho feminino
doméstico na reprodução da força de trabalho.

Como já assinalamos anteriormente, a crise instaurada na Europa, no início


do século XX, exigiu os corte dos gastos públicos e conseqüentemente a entrada
das mulheres no mercado de trabalho. Ainda de acordo com Thebaud (1991), em
dezembro de 1917, o governo publicou o decreto nº 1596 regulamentando pela
primeira vez na história, o trabalho feminino e proibindo o trabalho de crianças

16
Vale ressaltar que todos estes elementos foram conquistas das lutas feministas, mas foram apropriadas pelo
sistema capitalista e inseridas na lógica de mercado, como forma de aumentar mais ainda a extração de mais-
valia.

47
menores de 12 anos. A guerra permitiu que as mulheres penetrassem em novas
áreas de trabalho, principalmente na indústria e nos campos de batalha, no cuidado
dos feridos em hospitais e alimentação dos refugiados. A realidade da guerra
condizia com a realidade da mulher pobre, muitas delas precisavam trabalhar para
sobreviver e encontraram oportunidade de ter um emprego, mesmo quando a guerra
se constituiu a partir da lógica do capital.

A Guerra para as mulheres, na visão de Thebaud (1991), constituiu-se numa


experiência de liberdade e de responsabilidade sem precedentes. Em primeiro lugar,
pela valorização do trabalho feminino, pelo serviço a pátria e pela abertura de novas
oportunidades profissionais, em que as mulheres descobrem geralmente com
prazer, o manuseio de utensílios e técnicas que desconheciam. Porém, essa
liberdade é momentânea. Com o fim da guerra as mulheres são obrigadas a
retornarem aos lares, incentivadas e estimuladas pelo poder público e
principalmente pela pressão dos maridos que, ao voltarem da guerra, querem
encontrar as mulheres, no lugar onde as tinham deixado.

Contudo, ainda de acordo com (THEBAUD, 1991), neste período, houve


mudanças e a quebra de barreiras sociais. Modificou-se o modo de vestir, inclusive
com o abandono do espartilho e o encurtamento das saias. Tais mudanças vieram
facilitar os movimentos do corpo das mulheres na indústria. Todos esses avanços
sofreram alguns retrocessos, quando se deu à volta das mulheres aos lares no pós-
guerra. As mudanças ocorridas com a guerra foram limitadas, objetivas e
subjetivamente, pela manutenção e mesmo pelo reforço dos papeis sexuais
tradicionais, e por toda uma simbologia que concede a prioridade econômica, social
e cultural aos homens.

São várias as discussões e propostas levantadas no pós-guerra, entre elas


uma maior ênfase a necessidade da heterossexualidade e a procriação, decorrentes
da necessidade de suprir as perdas humanas da guerra, desde que fossem dentro
do casamento, pois a família era considerada a célula fundamental da sociedade.
Nesse sentido, o capitalismo mostrava preocupação para substituir as perdas
humanas, mas não se importava em como as mulheres estavam psicologicamente,
já que o fascismo apoiado pela doutrina da igreja incentivava a natalidade, ou seja,
forçava as mulheres à maternidade, através da proibição do aborto, da proibição da
venda de contraceptivos e da educação sexual, favorecendo mais uma vez a

48
estrutura familiar de subordinação das mulheres. O argumento para os que
desejavam a volta das mulheres ao lar partia da crise econômica e a situação de
desemprego constantemente agravada pelas crises econômicas (THEBAUD, 1991).

Dentro desse contexto como já assinalamos todos esses fatores são


determinantes para entender a lógica do capital. Por outro lado, por mais que a
mulher adentre no mercado de trabalho, o Estado e o capital continuam a exercer
sobre ela uma autoridade patriarcal, impedindo-a de abandonar as atividades
domésticas e o controle da sua sexualidade. Isso ocorre porque o trabalho
doméstico faz parte do capitalismo, apesar de ocorrer “fora” das relações capitalistas
de produção e não produzir mercadoria que venha produzir lucro diretamente.

Segundo Lênin (1980), uma revolução que modificou a situação da mulher no


mundo inteiro foi a Revolução Socialista Russa em 1917 que, pela primeira vez,
tomou medidas concretas para alcançar a plena igualdade entre homens e
mulheres.

Segundo Lênin (IBIDEM), naquele período, os primeiros decretos do governo


operário tinham dois objetivos centrais: abolir as velhas leis que colocavam as
mulheres em situação de desigualdade em relação ao homem e liberar as mulheres
das atividades domésticas, o que exigia uma economia coletiva, na qual ela
participasse em igualdade de condições com o homem. Foram criadas escolas,
jardins de infância, refeitórios e creches por todo o país, colônias infantis,
lavanderias públicas, infra-estrutura que liberassem as mulheres do trabalho
doméstico, e trouxesse possibilidades ao aperfeiçoamento pessoal. No entanto, para
que se desse a plena emancipação da mulher, para tornar possível a sua igualdade
efetiva em relação ao homem, era necessária uma economia que a livrasse do
trabalho doméstico e na qual ela participasse de forma igualitária ao homem.

Ainda de acordo com Lênin (IDEM), a emancipação da mulher só foi possível


pelo menos em um curto espaço de tempo - porque a revolução transformou as
bases materiais, econômicas e estruturais que mantinham a opressão da mulher
como parte indissolúvel do processo de exploração, a que está sujeita a classe
trabalhadora no mundo inteiro, dentro do modo de produção capitalista. Contudo,
como ocorreu na maioria dos países da Europa, durante a revolução industrial, as
mulheres: foram confiscadas pelo capital para trabalhar nas fábricas, para aumentar
a produção das máquinas e a taxa de mais-valia do capitalismo, ou seja, as
49
mulheres saíram do lar impulsionadas pela necessidade do mercado, que exige
cada vez mais o aumento da mão-de-obra assalariada para aumentar o lucro do
capital. Conseqüentemente ela foi reduzida a condição de simples força de trabalho
vivo, ou seja, forca de trabalho do capital produtivo.

Naquele tempo, a Rússia tinha uma economia atrasada - em muitas regiões


ainda subsistia fortes resquícios do feudalismo e do modo de produção asiático, com
uma estrutura primitiva e um baixo nível cultural, contudo, a Revolução conseguiu
modificar, em parte, a relação entre homens e mulheres. Tais modificações,
contudo, sofreram forte retrocesso, por ocasião da burocratização e endurecimento
da experiência socialista na antiga União Soviética, a partir da administração de
Josef Stálin, que conseguiu, com uma contra-revolução violenta, liquidar o regime
lenilista. Para isso prendeu, torturou e, sobretudo assassinou centenas de milhares
de operários, camponeses e revolucionários. De 1929 a 1953 os stalinistas
assumem uma “ditadura democrática” para apoiar os governos burgueses.

Lagrave (1991), assinala que, no pós-guerra, várias medidas repressivas


foram tomadas para incentivar as mulheres a voltarem aos seus lares, tanto nos
paises desenvolvidos como não desenvolvidos. Em Portugal, em 1935, foi proibida
a contratação de mulheres em qualquer setor onde estivesse um homem inscrito na
lista de desempregados; na Alemanha, ainda em 1935, concederam-se empréstimos
matrimoniais as noivas que deixassem seu emprego e, em 1937, proibiu-se
mulheres casadas nos empregos administrativos; na Holanda, as professoras
primárias casadas foram convidadas a deixarem a escola; na França, Alemanha,
Inglaterra e Holanda cortaram-se os subsídios de desemprego às mulheres casadas
que estavam sem trabalho, com o argumento que elas podiam ser sustentadas pelos
seus maridos.

Apesar dos avanços trazidos pela inserção das mulheres no Mercado de


Trabalho isto não significou a emancipação da mulher.Toledo (2001), demonstra as
contradições deste processo: o trabalho fora de casa, se, por um lado, significou o
início da libertação das mulheres, já que unificou a mulher à classe operária e lhe
deu assim as ferramentas para lutar contra o capital e por sua emancipação, por
outro lado, impôs à ela a duplicação da jornada de trabalho e, com isso a duplicação
de sua alienação enquanto trabalhadora, já que a mulher não é uma na fábrica, e

50
outra em casa; ela é um ser único que exerce essas duas funções sociais, na
maioria das vezes sozinha, sem a colaboração do companheiro.

É importante sinalizar que, na Segunda Guerra, dá-se um novo impulso ao


Movimento Feminista. De acordo com Hobsbawm (1995) a “Revolução Social” revela
as transformações que as mulheres protagonizaram a partir de 1945, levando-as a
práticas e a construção de uma nova mentalidade acerca do sexo feminino, inclusive
no modo de vestir. Porém, convém ressaltar que a inserção da mulher no mercado
formal de trabalho capitalista, em sua fase inicial, coincidiu com o processo de
industrialização. Portanto, com o crescimento da industrialização houve
necessidade de uma mão-de-obra qualificada, decorrente da expansão do mercado
de trabalho, por isso houve também incentivo à entrada da mulher no ensino
superior.

É importante contextualizar que após a Segunda Guerra Mundial, decorrente


da crise econômica e social dos países imperialistas europeus, os Estados Unidos
EUA) e a União Soviética (URSS), tornaram-se potências mundiais. Os EUA
liderando o bloco dos países capitalistas imperialistas e a URSS liderando o bloco
dos países socialistas. Disputando áreas de influências em todo o mundo, o bloco
capitalista e o bloco socialista viveram um período de constantes rivalidades
hegemônicas de poder, conhecida como Guerra Fria (MAZOWER, 2001).

Na década de 1960, um novo impulso ocorreu no movimento feminista,


contudo, acerca disto falaremos posteriormente, quando adentrarmos a discussão
do movimento feminista no Brasil.

3 – AS MULHERES NA SOCIEDADE BRASILEIRA

3.1 - A Situação das Mulheres no Brasil Colonial e a influência das Oligarquias.

A situação das mulheres no Brasil também está relacionada a nossa


formação econômico-social e ao tipo de colonização instalada no Brasil. No período
da colonização, de acordo com Prado (2006), a sociedade era agrária baseada na
mão-de obra-escrava e no latifúndio que assentavam a economia brasileira, com
uma população composta de índios, mestiços e negros. A maioria da população
concentrava-se na zona rural e mesmos as principais cidades da colônia não eram

51
senão entrepostos comerciais, o que favoreceu o aparecimento da família patriarcal,
herdada desde a Grécia.
Segundo Prado (2006), senhor de terras e escravos tinha poderes sobre
todos, considerando tudo como sua propriedade, inclusive sua família. A esposa era,
sobretudo, sua escrava e vivia para realizar-lhe o seu desejo. A função da mulher
era a obediência ao marido e cuidar da casa e filhos, ficando sua vida restrita ao
espaço do lar, poucas tinham liberdade de participar de reuniões entre amigo e
políticos; principalmente do processo eleitoral. Porém, não podemos esquecer que,
durante esse período, não só as mulheres eram excluídas da participação política de
votar e ser votada. Havia os negros e estrangeiros e também a população pobre e
analfabeta que era a maioria da população brasileira.

A preferência por filhos varões era marcante no Brasil colonial, o filho homem
era considerado o sucessor após a morte do patriarca. As meninas, por sua vez,
eram criadas para as atividades de bordar, costurar e fazer rendas, já que eram
preparadas para o casamento e a procriação. A esse respeito Saffioti (2004), mostra
que a paternidade impõe a maternidade. O poder político do homem assenta-se no
direito sexual ou conjugal. Assim, a autoridade política do homem já está garantida
bem antes de ele se transformar em pai.
De acordo com Priore (1995), o casamento se dava na Colônia por razões de
Estado, pois nesse período, temos a presença daqueles que vinham explorar as
terras e se apoderar da cultura dos que aqui viviam, com o objetivo de povoar para
melhor explorar. Por essa razão, o casamento tinha como objetivo unir grandes
fortunas e agregar terras. A estratégia para impor o casamento partia da Igreja,
através dos sermões e pastorais, os quais serviam para justificar a instalação de um
aparelho burocrático e afirmar o poder da Igreja no novo mundo.
Apesar da Igreja, nos seus sermões dominicais, defender o casamento, era
através das missas que as mulheres viam uma possibilidade de liberdade, já que
tiravam -nas da monotonia da Casa Grande. Ao saírem para ir a missa, oferecia-se a
possibilidade de desenvolvimento de novas relações sociais. As Igrejas eram locais
de namoro, encontros e reuniões. Já os casamentos eram feitos, na maioria das
vezes, por conveniência econômica ou em outros casos, para garantir paz entre dois
clãs. O papel reservado a mulher era de subalternidade. Priore (1995), apresenta o
casamento, neste período, como mecanismo de ordenamento social, e a família

52
como palco para uma domesticação silenciosa do comportamento das mulheres
impondo lentamente o papel de mãe devotada e recolhida, pois seu papel era
destinado apenas para procriação.
Um outro ponto a ser discutido é a questão da sexualidade. Nesse período, as
mulheres eram confinadas no interior do lar e tabus, como a virgindade, estavam
arraigadas na cultura brasileira, ou seja, a preservação da virgindade das moças era
defendida a qualquer custo pelo patriarca e pelos irmãos, por representar a honra da
família. Logo, o crime de desonra era a maior injúria que poderia se cometer 17 . Caso
a moça fosse deflorada, o casamento era a resolução do problema.
Quando um casamento era indesejado, na maioria das vezes inter-racial, a
moça era mandada para o convento, lugar de refúgio de muitas mulheres. O
convento representava então, uma vida livre e independente dos homens, uma
possibilidade de viver intensamente numa mini – sociedade, apesar das restrições
que se tinha (PRIORE, 2000).
Assim, o sistema patriarcal instalado no Brasil colonial, encontrou grande
reforço na Igreja Católica, que educava as mulheres para serem pessoas submissas
e inferiores. Contudo, tanto na sua vida familiar quanto no mundo do trabalho, as
mulheres souberam estabelecer formas de sociabilidade e solidariedade que
funcionavam, em diversas situações, como uma rede de conexões capazes de
reforçar seu poder de grupo, pessoal ou comunitário.

Neste sentido, entendemos que nem todas as mulheres se submeteram às


regras de submissão imposta por esta sociedade patriarcal e machista. Algumas se
rebelaram como a guerrilheira Anita Garibaldi e Dona Josefa Carneiro Mendonça 18 e
outras tantas desconhecidas que desempenharam funções exclusivamente
masculinas numa época em que a mulher não tinha poder de decisão. Mas as
exceções não invalidam as regras dominantes de que o poder patriarcal, investido
pelo pai ou pelo marido, permaneceu indiscutível por toda a era colonial e poucas
vezes foi questionada.

A este respeito, Priore (1995), enfatiza a ausência dos maridos que saiam em
busca de trabalho, eram os companheiros ambulantes e as mulheres chefiavam
17
Lembremos como já assinalamos que a fidelidade feminina era a única forma de assegurar que os filhos
gerados fossem, de fato, “legítimos”.
18
Anita Garibaldi, guerrilheira da Revolução Farroupilha ou guerra dos farrapos de 1835, que tinha como
objetivo a luta, contra os altos impostos. Dona Josefa Carneiro de Mendonça, uma das líderes da Revolução
Liberal de 1842, em Minas Gerais (SAFFIOTI, 1976).

53
seus lares. As crianças viviam circulando entre outras casas e sendo criadas por
comadres, vizinhas e familiares. A imigração interna, que ocorreu entre o fim do
século XVII e início do XVIII, abalou fortemente a estrutura familiar de muitas
mulheres nas regiões Sudeste e Nordeste. Isto se deu em função da descoberta do
ouro nas Minas Gerais e em Goiás, o que obrigou muitos companheiros e maridos a
partirem. Neste período, a vida cotidiana das mulheres era ritmada pelas atividades
em torno da igreja: festas, confissões, procissões; as práticas domésticas e a
fabricação caseira de objetos de uso diário como panos, sabão, conservas e peças
para banho e para cozinha.

Contudo, o século XIX foi marcado por uma série de mudanças consideráveis
de ordem econômica, política, social e ideológica, inerente ao processo de
tramitação de um passado colonial. Esse processo tem como ponto de referência à
vinda da família real portuguesa ao Brasil.

A vinda da família real ao Brasil, em 1808, marca mudanças significativas na


vida econômica e política do país, promovendo o continuado crescimento dos
centros urbanos. Com essas mudanças cresce o sentimento de identidade nacional
aliado as idéias liberais burguesas que fomentaram uma nova ordem econômica e
política no país. Aliado a isso, a situação feminina melhorou em parte.Vale salientar
que estas mudanças se deram nas famílias burguesas, pois a classe pobre não
tinha acesso a essas mudanças que ocorriam na mentalidade e sociedade
burguesa. O Brasil passou aos poucos, a absorver a cultura européia. Assim, os
bailes tidos antes como vergonhosos, tornaram-se comuns e a instrução feminina
passou a ser de fundamental importância para a elite. Por instrução feminina
entendia-se saber dançar, tocar piano, escrever e ler. Existiam livros especialmente
escritos para o público feminino: romances que não exigiam muita reflexão por parte
da leitora, para que não incentivasse idéias que viessem contra a moral e os bons
costumes impostos na época (ROCHA-COUTINHO, 1994).

As mulheres de família rica, as jovens de posse tinham instrução feita em


casa através de preceptoras européias, enquanto a classe menos privilegiada
mantinha-se na ignorância ou matriculavam-se nas poucas escolas normais, nas
quais o ensino se voltava para as prendas do lar, sem contar que eram de péssimas
qualidades. A primeira legislação relativa à educação feminina surgiu em 1827, e
permitia apenas a criação de escolas elementares, voltados para as meninas.

54
Porém, tais escolas deixavam a desejar, tanto pelo número insuficiente de
estabelecimentos de ensino como pela qualidade do ensino ministrado (PRIORE,
2000).

Várias teorias eram utilizadas para justificar as diferenças entre o ensino


ministrado aos meninos e as meninas, entre elas as diferenças biológicas. Dizia-se
que o cérebro feminino era atrofiado e por isso elas eram menos inteligentes,
enquanto as meninas aprendiam a bordar, os meninos aprendiam geometria. Tais
teorias são hoje, bastante combatidas pelas estudiosas de gênero. Louro (1997),
afirma que é necessário demonstrar que não são propriamente as características
sexuais, que vai constituir efetivamente o que é feminino ou masculino em uma dada
sociedade e em um dado momento histórico, mas é a forma como essas
características são representadas ou valorizadas, aquilo que se diz ou se pensa
sobre elas.

De acordo com Nicolau (2004), com a Proclamação da República e a


promulgação de uma “nova” Constituição, em 1891, elaborada segundo os moldes
da ideologia liberal burguesa, estabelecia-se o sufrágio universal para todos os
cidadãos brasileiros, no gozo dos seus direitos civis e políticos, que soubessem ler e
escrever (decreto nº 6 de 19 de novembro de 1889). Percebemos que esta lei não
faz nenhuma referência explícita aos direitos das mulheres. Na prática esses direitos
só estariam garantidos para os homens alfabetizados, excluindo a maioria da
população como: as mulheres, excluídas da participação política de votar e ser
votada, os negros, estrangeiros e também a camada pobre, pois a grande maioria
da população era analfabeta. O processo de votação durante as quatros primeiras
décadas da Primeira República praticamente não foi alterado.

Ainda de acordo com Priore (2000), o período colonial nos deixou amargas e
duradouras heranças culturais. Apesar da mulher estar presente desde o início do
processo de colonização, de ocupar grande variedade de posições em diferentes
grupos sociais, raciais, religiosos, elas não eram visíveis. Sua quase invisibilidade as
identificava aos de baixo. Isso porque a maioria das mulheres era analfabeta,
subordinadas juridicamente aos homens e politicamente inexistentes. Suas
condições as excluíam de qualquer exercício de função nas Câmaras Municipais ou
na administração que lhes garantissem reconhecimento social. Porém, entendemos
que essa invisibilidade estava ligado ao patriarcado, e por uma questão cultural, e

55
não por que as mulheres eram analfabetas, apesar da educação ser voltada para os
homens, e elas não serem consideradas cidadãs, não era esse analfabetismo que
determinava a não participação política.

Na visão de Santos (2004), a explicação para essa não-representação é “a


construção cultural que fortalece e determina o lugar da mulher restrito ao espaço
privado. Esse pensamento está fundamentado no Patriarcado, ou seja, o princípio
do pai, do pátrio poder”. Conforme Whitaker (2001. p. 62):

É preciso iniciar então recordando que a mulher nunca foi, no Brasil, e na


maioria dos países do Ocidente, um ser passivo e masoquista proclamado
por Freud. Se considerarmos a Nova História, aquela que se preocupa em
colocar seu foco sobre os excluídos, verá que as mulheres sempre
desempenharam papéis históricos fundamentais, e exerceram funções, ora
individuais, ora coletivos de alta relevância social para o momento que
estava sendo considerado ( WHITAKER, p.62).

A condição de inferioridade, a qual a mulher já vinha sendo submetida desde


o início da civilização, será um dos principais objetos de interesse da burguesia que
havia se constituído ávido em acumular riquezas, como já referido no capítulo
anterior. A consciência dessa situação de inferioridade deu origem ao surgimento do
movimento feminista em fins do século XVIII, que se consolidará no século XIX, na
maioria dos países europeus e Estados Unidos. Já as mulheres no Brasil sofreram
influências deste movimento somente no início do século XX.

Diante do que foi exposto a respeito do Brasil colonial e a situação de


submissão das mulheres, veremos como a influência das oligarquias para manter a
situação de submissão, foi importante para as mesmas romperem barreiras e
desafiarem o sistema vigente.

3.2 – O Sistema Oligárquico no Brasil e Rio Grande do Norte.

56
O sistema oligárquico 19 que imperou no Brasil e Rio Grande do Norte/ Natal
durante todo o decorrer do final do século XIX até o século XX, foi assentado na
“política dos governadores” sob a hegemonia do eixo São Paulo/Minas. Na época,
existia o voto a descoberto, que na prática violava o principio do sigilo, nas suas atas
falsas, confeccionadas a bico-de–pena que consistia na adulteração das atas feitas
pela mesa eleitora (que também apurava os votos), e na exclusão de mulheres e
analfabetos do direito de voto.

Através das eleições – máquina eleitoral de caráter autoritário personificado


no chefe político local e líderes econômicos – legitimava-se o exercício do poder
privado na ordem pública, através do coronelismo 20 . Os coronéis eram homens
ricos, ostentando, vaidosamente, seus bens de fortuna que possibilitavam a compra
de voto, o voto de cabresto 21 . De acordo com Faoro “a eleição será o argumento
para legitimar o poder, não a expressão sincera da vontade nacional, a obscura,
caótica e submersa soberania popular. O essencial é vencer, a qualquer preço”
(FAORO, 1985, p.620).

Segundo Spinelli (2000), esse sistema ao ser montado, no início da


República, respondeu as necessidades de uma economia agroexportadora com
frágeis vinculações internas, aos anseios de autonomia regional das oligarquias
estaduais, sob a hegemonia da cafeicultura. Este sistema era fortalecido por grupos
dominantes tradicionais associados à burguesia industrial, preocupados com o
protecionismo e a contenção de movimentos operários ainda incipientes, pois surgiu,
neste período, um movimento operário de contestação que tinha a greve como
instrumento de luta, contra a dominação e as eleições fraudentas dos poderosos.

Já no Rio Grande do Norte e em Natal, as primeiras oligarquias que se


formaram desde a Primeira República, se deu no governo de Pedro Velho de
Albuquerque Maranhão, ligado a produção algodoeira pecuarista, que se sustentará
no poder, a partir de 1913, através dos oligarcas José Augusto e Juvenal Lamartine
19
Por oligarquia se entende o sistema político em que predomina pequenos grupos de poder, muitas vezes
grupos familiares. (SPINELLI, 2000).
20
O coronelismo é , sobretudo, um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público progressivamente
fortalecido e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras. São
características secundárias do sistema “coronelista”: o mandonismo, o filhotismo, o falseamento do voto, a
desorganização dos serviços locais (LEAL 1975).
21
O voto de cabresto é baseado na estima e confiança que inspira correligionários e amigos. Era o voto forçado
no qual o eleitor era obrigado a votar na pessoa do coronel ou naquele indicado por este. Isso se dava, muitas
vezes, através da troca de favores, entre o coronel e os seus agregados.

57
até a década de 1930. A disputa se dava entre as oligarquias que detinham a
economia como sustentação de dominação. Muitas vezes, os conflitos que
envolveram os Maranhão e os políticos do Seridó nos momentos que marcaram as
sucessões governamentais de 1913, 1923, 1927, eram formas de garantir a
acomodação entre as várias facções. Nestes conflitos, as oligarquias locais sofriam,
algumas vezes, intervenções do governo federal.

Ainda de acordo com Spinelli (2000), os conflitos existentes entre as


oligarquias, envolviam fundamentalmente as chefias políticas dos municípios das
regiões do Estado, os famosos “coronéis” com seus currais eleitorais. Neste sentido,
o papel desempenhado pelos coronéis do Seridó seria decisivo, pois era através dos
mesmos que as oligarquias se fortaleciam. Como exemplo podemos citar o caso do
coronel José Bernardo, eleito Senador da República por várias legislaturas e um dos
principais braços políticos de Pedro Velho de Albuquerque Maranhão. Com a morte
de José Bernardo, dando continuidade a política oligárquica do seridó, assume o
poder oligarca, José Augusto, neto materno de José Bernardo e Juvenal Lamartine,
parentes afins.

É preciso acentuar que o poder político que predominou durante toda a


República Velha se dava através da política Coronelista. Na República Nova há
modificações nas relações de poder, no qual o Populismo 22 vem se constituir com o
avanço da industrialização e urbanização, principalmente no governo de Getúlio
Dorneles Vargas 23 , predominando, também no Rio Grande do Norte, na figura
carismática de Aluízio Alves, na década de 1960.

Durante a década de 1920 não podemos esquecer que algumas mulheres no


Rio Grande do Norte se destacaram na política apoiadas por oligarquias. Entre elas
podemos citar a primeira prefeita, eleita no RN Alzira Soriano de Souza eleita pelo
Partido Republicano na cidade de Lajes, apoiada pelos oligarcas José Augusto e
Juvenal Lamartine e seu pai, líder político da região, Cel. Miguel Teixeira de
Vasconcelos, que influenciara a sua entrada na política. A primeira eleitora, em

22
Populismo é um fenômeno político de massas ligado à dinâmica da urbanização e industrialização, passando a
expressar um modo particular de relação entre o governante e os contingentes populacionais periféricos recém
chegados do interior, ou seja, da área rural impulsionado por promessas de uma vida melhor (PEREIRA, 1996).
23
Getulio Dorneles Vargas foi presidente do Brasil de 1930 a 1945 e depois de 1951 a 1954, segunda
presidência, no qual diante de uma crise, em 1954, chega ao fim o populismo de Vargas quando suicidou - se. De
1930 a 1937 esteve no poder através de eleição, de 1937 a 1945, governou como Ditador, voltando novamente
em 1950 através de eleições (MENDONÇA, 1990).

58
Mossoró-RN, Celina Guimarães Viana, era esposa do bacharel Elizeu Nunes Viana
e a primeira Deputada Estadual, Maria do Céu Fernandes também era de família
influente. Não queremos menosprezar a conquista dessas mulheres, mas mostrar
que chegaram ao poder por pertencer a determinados grupos políticos. A respeito da
primeira vereadora de Natal, Júlia Alves Barbosa, era professora catedrática da
Escola normal de Natal e não consta ligação de Julia Alves com nenhuma oligarquia
do Rio Grande do Norte.

Neste sentido, a história política do RN está marcada por um traço


profundamente oligárquico que também influenciou nas conquistas das mulheres no
campo da participação política. Esta história oligárquica vai se mesclar ao fenômeno
do populismo na figura de Aluizio Alves.

Aluízio Alves foi eleito pelo Partido Social Democrático (PSD), governador do
Estado do Rio Grande do Norte, em 1960, utilizando um discurso populista que
prometia acabar com a miséria e a fome e trazer o progresso e a modernização para
o povo potiguar. Promoveu uma campanha que ficou conhecida como a “Cruzada da
Esperança” lhe rendendo o título de líder populista. O populismo permitiu a Aluízio
Alves despontar como liderança tanto junto à população de baixa renda como aos
setores sociais organizados, da elite local. A relação paternalista entre o líder político
e o povo marcavam cada vez mais o clientelismo, tornando-o um personagem ímpar
na história política do Rio Grande do Norte.

Podemos considerá-lo uma figura amada e odiada, um estrategista político


inteligente que se manteve no poder no Rio Grande do Norte até 1998 24 , e
continuou fazendo política a frente da presidência do Partido do Movimento
Democrático Brasileiro (PMDB) até 2005.

Outros grupos oligarcas se formaram no Rio Grande do Norte decorrentes de


influências políticas na década de 1960, e permanecem até os dias atuais. Dentre
esses grupos podemos citar os grupos políticos ligados à família Maia. A família
Maia era considerada latifundiária, com grande concentração de terras, e, na década
de 1980 tem início as disputas políticas entre os Alves e os Maias. Em 1982, Aluízio
24
Lembrando que Aluízio Alves foi governador do RN no período de 1961 a 1966 pelo PSD (Partido Social
Democrático), continuou na política em 1985 -1989 assumiu como Ministro da administração durante o governo
do Presidente da Republica José Sarney, foi Ministro do Interior no governo de Itamar Franco no ano de 1992
ate 1994, em 1995 reelegeu-se como Deputado Federal permanecendo até 1998, quando decide, nesse período,
parar de disputar mandatos. Porém, permaneceu a frente da presidência do PMDB até 2005, quando é afastado
pela saúde fragilizada.

59
Alves foi derrotado na disputa ao governo do Estado do RN, por José Agripino Maia,
obtendo, portanto, sua primeira derrota na carreira política. Esses grupos vem se
perpetuando no poder até os dias atuais 25 . Na cidade de Mossoró/RN temos a
família Rosado que vem se perpetuando no poder desde a década de 1950 no
governo de Dix-Sept- Rosado e atualmente domina o cenário político mossoroense.

3.3– O MOVIMENTO SUFRAGISTA E FEMINISTA NO BRASIL

De acordo com Goldenberg (1992), no Brasil, o movimento sufragista -


movimento organizado que tinha como objetivo a conquista do direito ao voto
feminino - começa a aparecer na segunda década do século XX. De início, a luta
pelo voto era uma bandeira típica da classe média e da burguesia, levantada por
mulheres mais cultas, que tinham acesso ao noticiário internacional, para quem essa
luta era uma demonstração de modernidade e progresso. No entanto, neste período,
mesmo com essa luta, não se observou avanço significativo na representatividade
política das mulheres.

No século XX, a mulher alcançou algumas conquistas, dentre estas um maior


espaço no mercado de trabalho e o direito de votar e ser votada. Contudo, apesar de
todas as conquistas das mulheres e do movimento feminista, ainda percebem-se
resquícios de nossa formação social e histórica nos dias atuais. A mulher, hoje,
participa do mercado informal ou formal com o objetivo do sustento da família e, ao
mesmo tempo, é obrigada a dupla jornada de trabalho; sendo responsável pela
educação dos filhos, pelos afazeres domésticos e, muitas vezes, assumindo o
trabalho doméstico sozinha, sem divisão de tarefas. Neste sentido, os estudos
mostram que houve avanços, mas o poder que predomina ainda é o masculino, pois
apesar de sermos maioria na população brasileira (51%), temos uma baixa

25
Os Alves estão presentes na Prefeitura Municipal de Natal na figura do atual prefeito Carlos Eduardo Alves,
no legislativo, através do deputado estadual Walter Pereira Alves filho do então Senador Garibaldi Alves Filho.
Os Maias têm representação no legislativo através da deputada estadual, Márcia Faria Maia Mendes, do
deputado estadual, Lavoisier Maia, e o deputado federal, Felipe Catalão Maia e no Senado através de José
Agripino Maia. Além disso, a atual governadora do Estado, Vilma de Farias, apesar de ter rompido com os
Maias, já carrega este sobrenome, quando foi casada com o deputado estadual, Lavoisier Maia. Outro grupo
político que se destaca é a família Rosado na cidade de Mossoró-RN, através da prefeita, Fátima Rosado, da
deputada estadual, Larissa Daniela da Escossia Rosado e da senadora, Rosalba Ciarline Rosado.

60
representatividade nos cargos públicos, nos serviços públicos e na política, nos
quais os homens ocupam a maioria das cadeiras nos 3 (três) poderes.

Contudo, percebemos que uma das formas dos homens perpetuarem a


exclusão das mulheres da vida política é a eliminação da evidência de sua
participação no passado e de suas contribuições no presente. Porém, não podemos
esquecer que muitas exerceram grandes influências e contribuíram para o
conhecimento e bem-estar humano e o seu papel na história foi reconstruído pelo
movimento feminista. Segundo Soares, (2004), feminismo é a ação política das
mulheres e engloba, portanto, teoria, prática e ética.
Como já assinalamos, as primeiras lutas femininas da era burguesa foram por direitos democráticos como o divórcio,
o voto e o direito de receber uma educação completa nos primórdios da revolução burguesa.

Percebe-se, portanto, que as reivindicações das mulheres no Brasil não se diferenciavam da luta das mulheres na
Europa e dos Estados Unidos, países capitalistas desenvolvidos. Podemos observar isto, quando analisamos a história da
participação da mulher brasileira no parlamento, tendo como líder do movimento sufragista, Bertha Lutz, uma bióloga que
retornou ao Brasil em 1918, graduada pela Sorbonne. A história da participação da mulher brasileira no parlamento, segundo
Borba (1999 p.54):

Tem marco inicial na conquista do direito ao voto, em 1932, após longa


batalha. Já na primeira constituinte republicana, o debate a este respeito se
impõe tendo, entretanto, como tônica a posição conservadora de que a sua
participação para além deste domínio era perniciosa à família, em especial
se estivesse em questão o mundo da política (BORBA, 1999, p.54).

Representando o pensamento dominante, citamos a declaração do Senador Muniz Freire:

Estender o direito de voto à mulher é uma idéia imoral e anárquica, porque


no dia em que for convertida em lei, ficará decretada a dissolução da família
brasileira. A concorrência dos sexos nas relações da vida anula os laços
sagrados da família (BORBA, 1998, p.15).

Declarações como essas refletiam a ideologia patriarcal dominante, na qual,


ser mulher era sinônimo de maternidade, lar e trabalhos domésticos. Nesse sentido,
o direito ao voto era visto como destruidor da família e da sociedade.
No entanto, a Constituição de 1934, em seu art.109, afirmava: “O alistamento e voto são obrigatórios para homens e
mulheres, quando estes exerçam funções públicas remuneradas, sob as sanções e salvas as exceções para a lei determinar”
(PIMENTEL, 1987.p.24).

Na mesma Constituição, o artigo abaixo relata que:

Art. 113, § 1º: Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem
distinções por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos
pais, classe social, riqueza, crenças religiosas, ou idéias políticas.

61
Observa-se que, pela primeira vez, em 1934, a legislação brasileira
demonstra sua preocupação pela situação jurídica da mulher, proibindo
expressamente quaisquer privilégios ou distinções por motivos de sexo. Apesar
dessa conquista, as mulheres permaneceram ainda à margem da sociedade, os
seus direitos continuaram sendo esquecidos e isso demonstrava a contradição entre
o artigo citado da Constituição e a prática existente. A obrigatoriedade plena do voto
para todas as mulheres só foi instituída com a Constituição de 1946.

Por outro lado, percebe-se que, o papel da burguesia, que estava


ascendendo socialmente na luta pelo sufrágio feminino era decorrente de todo um
interesse político, econômico e social, já que o número de mulheres aptas a votar
era equivalente ao número de homens. Existia, portanto um interesse dessa classe
pelo sufrágio feminino, não esquecendo, porém, que já existia também, toda uma
luta das mulheres por igualdade de direitos.

Neste período, no Brasil, a luta do movimento feminista se dava em torno do


sufrágio universal. O país viveu amplas mudanças políticas, econômicas e sociais
decorrentes da “Revolução de 1930”. Segundo Capelato (1988, p.189), o crack da
bolsa de Nova York, em 1929, afetara as economias latino-americanas, no entanto a
conjuntura da crise favoreceu as mudanças políticas em alguns países como no
Brasil. Nessa nova conjuntura, busca - se a integração das massas, apresentando-
se uma nova forma de identidade nacional Essas mudanças ocasionadas pela crise
da superprodução do café, no qual o Brasil ficou sem mercado consumidor,
abalaram as próprias estruturas políticas da República Velha 26 . Estes elementos
abriram caminho para a “Revolução de 1930”, que levaria Getúlio Vargas ao poder.
Em 1930,como já assinalamos, assume o poder no Brasil, Getulio Dorneles
Vargas, inaugurando no Brasil um novo tipo de dominação política e de legitimação
do poder: o populismo, caracterizado pelo aliciamento e manipulação das massas
pelos líderes políticos. Assim, entre 1930 e 1945, o Estado brasileiro avançou no seu
processo de constituição, enquanto Estado nacional capitalista, inscrevendo na
materialidade de sua ossatura – pela multiplicação de órgãos e instituições - os

26
República Velha foi o período marcado pela da Política do Café –com –Leite, que significava o revezamento
no poder, ou seja, o domínio de duas oligarquias: a mineira e a paulista, que dominavam a política partidária:
São Paulo com a produção do café e Minas Gerais com a tradição pecuarista. Assim, em cada eleição
presidencial alternavam -se no poder um presidente de São Paulo, ou de Minas gerais (CAPELATO, 1988).

62
diversos interesses sociais em jogo, metamorfoseados em “interesses nacionais”
(MENDONÇA, 1990).
Diante dos fatos e práticas analisados, observa-se que a “Revolução de 1930”
foi o marco inicial para as mudanças sociais que, na visão de Capelato (1988),
preparou o terreno para o advento de uma nova cultura política, que se definiu a
partir do redimensionamento do conceito de democracia, norteada por uma
concepção particular de representação política e de cidadania. A partir de então, dá-
se a revisão do papel do Estado que se complementa com a proposta inovadora do
papel do líder político na integração das massas e a apresentação de uma nova
forma de identidade nacional.

As instituições criadas com a Constituição do Estado nacional capitalista


possibilitam também a formação de órgãos que se contrapõem a esse Estado, como
o PCB (Partido Comunista do Brasil) 27 fundado em 1922, determinante para a luta
da classe trabalhadora, que tinha como objetivo organizar os operários nos diversos
sindicatos contra a exploração do país e a sua liberdade do jugo imperialista e a luta
por uma sociedade mais justa.

Assim, a década de 1930 foi um período marcado por muitas greves e da


criação da Aliança Nacional Libertadora (ANL) considerado movimento de massa no
país, no qual o Partido Comunista teve influência decisiva. O programa da ANL tinha
como objetivo a reforma agrária, a expropriação dos meios de comunicação, a
supressão da dívida externa, a derrubada do governo e a instalação de um governo
democrático e popular.

Deste modo, em novembro de 1935, eclode nas cidades do Rio de Janeiro,


Recife e Natal, o Movimento Insurrecional conhecido como Intentona Comunista ou
Insurreição Comunista 28 . Ainda em 1935 e 1936 e 1938, com o fim do movimento
insurrecional temos a caça aos comunistas no qual várias pessoas foram presas,
como mostra os autos do tribunal de Segurança Nacional, em sessão de 26 de
setembro de 1938. Entre elas foi condenada, Amélia Gomes Reginaldo, a pena de

27
No ano da sua fundação em 1922, o PCB (Partido Comunista do Brasil) foi registrado com essa nomenclatura,
posteriormente, em 1961, foi alterado para Partido Comunista Brasileiro. Um ano mais tarde, a dissidência
liderada por João Amazonas, Mauricio Grabois e Pedro Pomar, adotou o nome original e (re)fundou o PC do B
(Partido Comunista do Brasil), que existe até os dias atuais. (MAZZEO, 2003).
28
Intentona significa ato insano, louco, motim insensato; enquanto, Insurreição significa conjunto de ações e
movimentos, armados ou não, de classes e massas populares para derrubar um governo, para pôr fim a um modo
de governo contraditório aos interesses dos insurretos; rebelião levante popular (DOMICH, 2008).

63
cinco anos de reclusão, grau mínimo do art. 1º, da lei de nº 38, de 1935, conforme
ofício nº 1266 (FREIRE, 2004).

Frente a esta conjuntura conturbada, em 1937, Vargas tomou o poder,


dissolveu o congresso e instalou um Estado ditatorial, conhecido como Estado Novo,
período marcado pela extrema repressão política e controle social dos sindicatos e
dos meios de comunicação, que representou o fim dos partidos políticos, das
eleições e fechamento do Congresso Nacional. Com o fim do Estado Novo (1945), o
segundo governo Vargas (1951), desta vez, através de eleições diretas, representou
o crescimento econômico do capital nacional e, ao mesmo tempo, foi marcado por
contradições que ameaçavam um regime baseado na difícil conciliação entre a
satisfação das camadas populares, a manutenção do ritmo acelerado do
crescimento e as contraditórias alianças integrantes da cúpula do pacto político. Por
fim, todas essas questões não conseguem evitar a crise, em todo o Brasil, que
acaba no suicídio de Vargas, em 1954.
No Brasil, o período do pós-guerra foi marcado pelo aumento de atividades
relacionadas a conquistas de liberdades democráticas e as mulheres engajaram-se
nestes movimentos e em movimentos feministas. Em 1949, é fundada a Federação
de Mulheres do Brasil, que organizou várias assembléias inclusive, a Conferência
Latino-Americana, a qual compareceram delegações femininas de quase todos os
países da América Latina. Fundou-se filiais em todos os Estados do Brasil. Em
1954, aconteceu na Organização das Nações Unidas (ONU) a Convenção sobre os
Direitos Políticos da Mulher; a Convenção sobre a Nacionalidade da Mulher, em
1958; a Convenção sobre Consentimento, Idade Mínima e Registro de Casamento,
em 1964. Assim, gradativamente as mulheres vão conquistando postos no mercado
de trabalho feminino, nas escolas e universidades e nos movimentos sociais
organizados.

As décadas de 1960/1970 são marcadas por ditaduras militares na América


Latina, caracterizados pela repressão, cassação dos direitos políticos, censura e
violência, ou seja, pelo autoritarismo exacerbado. Período conturbado pelo aumento
da inflação, crescimento da pobreza, e a dificuldade agrária, que tem como fator
principal a inversão da relação campo/ cidade. Diante desse quadro, surgem e
evoluem fortes movimentos sociais contestatórios dos trabalhadores urbanos e
rurais, nas universidades, profissionais liberais, além de outros movimentos como de

64
mulheres, jovens, negros e imigrantes. São movimentos que se colocavam
questionando a racionalidade do Estado burguês, suas instituições e, no limite,
negavam a ordem burguesa e seu estilo de vida.
De acordo com Sardenberg e Costa (1991), com o golpe de 1964, tanto o
feminismo burguês como os movimentos feministas liderados pelas organizações de
esquerda serão igualmente silenciados, senão massacrados, juntamente com os
demais movimentos populares no país.
Contudo, no início dos anos de 1970, o capitalismo entra numa situação de
instabilidade, de aumento da concorrência e dos atritos entre países imperialistas
devido a abertura de mercados e fronteiras. Isto leva a superexploração da classe
trabalhadora, e os mais atingidos pela crise do capital, são as mulheres, os jovens, e
os considerados idosos, dos países periféricos.
A primeira conseqüência para a classe trabalhadora é o desemprego
estrutural, a partir do desaparecimento de milhões de postos de trabalho. Por outro
lado, há uma ampliação do setor de serviços, setor de terceirizados e trabalhados
informais e temporários, sem vínculo empregatício definidos. O avanço da política
neoliberal 29 “globalizante” teve reflexos na vida da classe trabalhadora, como o
rebaixamento dos salários diretos, os ataques à política de bem-estar-social 30 , corte
de investimentos em setores essenciais como: educação, saúde e previdência.
Para Goldenberg (1992), nesse leque de acontecimentos surge uma nova
organização de mulheres feministas que marca um momento de questionamento e
de uma postura mais crítica, que explodirá pela voz de militantes mais
comprometidas com posições de esquerda, como é o caso do Conselho Nacional de
Mulheres do Brasil, o qual tinha a frente, Romy Medeiros da Fonseca, que já tinha
participado da luta por um novo estatuto da Mulher Casada, que culminou com a
aprovação da lei nº 4.121/62. Foram eliminadas com essa lei, as discriminações que
limitavam, os direitos da mulher casada, considerada relativamente incapaz, no
mesmo nível do indígena, do menor e do pródigo. Segundo Rodrigues (2001), o
29
A política neoliberal é a exigência de um Estado mínimo para o trabalho máximo, inclui compromissos com o
livre-comércio; retirada da responsabilidade do governo em relação aos direitos do trabalhador, por isso a
flexibilização das relações trabalhistas e retiradas dos direitos - precarização dos laços empregatícios,
terceirização e baixos salários, e privatização de todos os recursos econômicos, conseqüentemente o aumento do
desemprego, além da competitividade que prevê a individualidade das relações de trabalho. O objetivo á atender
a demanda do capital financeiro internacional e das grandes empresas, impostas pelas políticas implementadas
pelo Fundo Monetário Internacional ( FMI) e Banco Mundial.(ANTUNES, 1995).
30
Política de Bem –Estar - Social conhecida como Welfare State, é o conjunto de medidas de proteção social,
ou políticas públicas compensatórias como forma de amenizar a pobreza e miséria da classe subalterna (
GUERRA, 2000).

65
feminismo dos anos de 1970, no Brasil, encontra motivações nos movimentos
feministas americano e europeu – que emergem desde os anos 1970, na realização
da I Conferência Mundial sobre a Mulher (México/1975) e na Década da Mulher
(1976-1985), ambas promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Em 1975, em comemoração ao Ano Internacional da Mulher promovido pela
ONU, é realizado no Rio de Janeiro um seminário, reunindo mulheres interessadas
em discutir a condição feminina em nossa sociedade, na qual a pauta de discussão
foi o papel e comportamento da mulher brasileira. Os principais problemas
levantados foram: mudanças no Código Civil, com o objetivo de eliminar as
discriminações contra a mulher, luta pela implementação de creches e centros de
atendimento a criança, para facilitar a integração da mãe de família ao mercado de
trabalho; mudanças na legislação trabalhista, que era repleta de restrições à mulher
trabalhadora, tais quais o artigo que impedia o trabalho noturno da mulher sem a
autorização prévia do marido. Para Pinto (2003), esse período é considerado como o
momento inaugural do feminismo brasileiro.
No segundo semestre de 1975, foi criado o Movimento Feminino pela Anistia.
O movimento foi fundado por Terezinha Zerbini, esposa de um general que sofrera
repressão com o golpe militar. O movimento tinha como proposta mobilizar a opinião
pública, a partir da ação organizada de mulheres contra as arbitrariedades do
governo militar, prisões, torturas, assassinatos, cassações de mandatos e
aposentadorias compulsórias. As esposas, mães e companheiras dos atingidos pela
repressão militar decidiram lutar pelo fim do regime de exceção. Esse movimento
cresceu por todo o Brasil e foi fundamental na campanha pela anistia, que veio a ser
realizada no ano de 1979 31 (PINTO, 2003).
A partir de 1975, marco do movimento feminista, no mundo e no Brasil, até
1979 - quando o país dá os primeiros passos em direção à democratização, com a
anistia e a reforma partidária que terminou com o bipartidarismo - o movimento
feminista no Brasil, esteve associado, muito de perto, à luta pelo fim da ditadura
militar. Pinto (IBIDEM) mostra o paradoxo em que o movimento feminista não
socialista estava situado: por um lado, o regime militar e repressivo não via com
bons olhos qualquer tipo de organização da sociedade civil, ainda mais quando se

31
A anistia foi um movimento organizado por familiares de pessoas que haviam sido exiladas, presas ou estavam
desaparecidas e objetivava pedir anistia para todos os presos políticos (PINTO, 2003).

66
tratava de mulheres, que inspiradas nas norte-americanas, ameaçavam a tradição e
a família brasileira. Por outro lado, estas mulheres não encontravam guarida entre
os grupos que lutavam contra a ditadura e professavam ideologias do tipo libertário e
apresentavam resistência a essa organização por não ser comunista.
Desta forma, em fins da década de 1970 e durante a década de 1980, o
feminismo no Brasil teve importância na resistência contra a Ditadura Militar e na
defesa da redemocratização do país, através da participação decisiva na anistia, na
Campanha pelas “Diretas Já”, além da criação dos Conselhos de bairros,
organização em Sindicatos e Clubes de mães, no processo da Constituinte e na
Constituição em 1988.

Nesse sentido, o feminismo conseguiu, em parte, expressar suas


reivindicações na Constituição de 1988, que garante a igualdade entre homens e
mulheres na sociedade e na família, abolindo o pátrio poder e a figura do chefe de
família. Neste sentido, a Constituição atual reconhece também a união estável como
entidade familiar, incorpora novos direitos como o acesso ao planejamento familiar,
a proteção contra a violência nas relações familiares e a não discriminação dos
filhos tidos fora do casamento.

O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), criado em 1985, e os


Conselhos Estaduais e Municipais expressam, portanto, o reconhecimento, por parte
do Estado, da situação de discriminação das mulheres e da necessidade de novas
políticas públicas para o enfrentamento e superação dessa situação, bem como são
resultado deste processo crescente de mobilização e organização das mulheres.
Neste mesmo ano, em Natal/RN, dá-se na fundação do Conselho Municipal dos
Direitos da Mulher que visava discutir o papel da mulher na sociedade. O objetivo
desses conselhos era fortalecer a presença da mulher contra a opressão, sua
presença na política partidária e sua inserção nas Câmaras Municipais. Temas
polêmicos faziam parte das discussões, que até então, não eram discutidos nos
movimentos feministas. Dentre os temas estão o lesbianismo e o aborto. Para
Fernandes, a bandeira de luta do CMDM era uma campanha contra a violência
contra a mulher, contra a discriminação e a favor do resgate de seu papel na
sociedade (FERNANDES, 2004).

Deste modo, após o processo de redemocratização do país e a criação de


uma bancada feminina ocorreu pela primeira vez, a necessidade de uma discussão

67
sobre a política de cotas, partindo da necessidade de uma maior participação das
mulheres na política. Todas estas questões se deram a partir de um encontro em
maio de 1995, no qual parlamentares do sexo feminino da América Latina reuniram-
se em São Paulo para discutir a experiência Argentina com cotas e as políticas de
cotas no restante do mundo. A política de cotas 32 é medida que visa alterar o
quadro de desigualdades – racial, étnica, sexual e social. Neste sentido, as ações
afirmativas reconhecem as discriminações existentes e agem no sentido de impedir
que as mesmas se perpetuem (GROSSI E MIGUEL, 2001).
A plataforma de ações adotadas pelos governos, a partir da Conferência de
33
Beijing, (China) , endossou o compromisso de assegurar acesso igualitário a
participação das mulheres, tanto nas estruturas de poder quanto nos cargos de
tomada de decisões. A plataforma de Beijing legitimou o uso da política de cotas em
âmbito mundial. Assim, a política de cotas é resultado também da luta das mulheres
em todo o mundo pelo acesso igualitário e participação das mulheres na política 34 .

3.4 – A POLÍTICA DE COTAS E A DEMOCRACIA NO BRASIL

A questão central que se coloca na discussão sobre as cotas é o resultado


efetivo destas. De acordo com o Cfemea (1998), após várias discussões no
legislativo brasileiro e aprovação do Parágrafo 3º do artigo 11 da lei 9.100/95
assegurando a cota mínima de 20% para as mulheres, nos cargos do legislativo, já
transpareciam resistências a essa política. Para aprovação das cotas, os partidos
exigiram ampliação em 20% do número de vagas para candidaturas, percentual
equivalente ao estabelecido pela própria cota.

32
A cota é uma das medidas que compõem a chamada, política de discriminação positiva, isto é, que combate a
discriminação das mulheres de forma clara, pela imposição de medidas legais (BRUSCHINI IN: ARAÚJO,
2002).
33
A Conferencia de Beijing ocorreu em 1995 e foi um encontro que reuniu mulheres de todo o mundo para
discutir sua situação de vida e pensar ações estratégicas com vistas a transformação desta situação.
34
Em 1996, no Brasil, houve o lançamento nacional da Campanha “Mulheres Sem Medo do Poder”, objetivando
estimular as mulheres a se filiarem a partidos políticos e aumentar o número de candidaturas femininas às
eleições de 1996 (COSTA, 2001).

68
No ano seguinte, discutiu-se e foi instituída a lei de cotas – lei 9.504/1997,
não mais uma cota somente para as mulheres, mas uma cota que estabeleceu o
número mínimo de 30% (trinta por cento) e uma cota máxima de 70% (setenta por
cento), para qualquer um dos sexos, essa lei não determina a quem vai beneficiar.

De acordo com Inácio (2002), as ações afirmativas 35 já vinham sendo


discutidas desde a década de 1960 nos Estados Unidos, impulsionados pela
constatação de enormes desigualdades entre os sexos e entre raças, além da
discriminação dispensada aos negros e as mulheres em todas as esferas da vida
social: no trabalho, na educação, na política etc.

Em se tratando da questão racial convém ressaltar que, nos Estados Unidos,


existia uma segregação racial visível em todos os espaços. Ao contrário, do Brasil,
tivemos ao longo da história uma discriminação velada, sem uma segregação racial
visível. As desigualdades sociais estão presentes entre negros(as), mulheres,
homossexuais e pobres em geral, sendo perceptível no mercado de trabalho, na
questão do desemprego, nos postos de trabalho diferenciados, na questão salarial,
na inserção escolar, na participação política etc.

Para fazer frente a esta situação de desigualdades criou-se medidas ou ações


afirmativas que objetivam garantir a igualdade, priorizando os setores discriminados
da sociedade, entre elas as mulheres. Um questionamento levantado é se essas
políticas de ação destinadas às mulheres podem ser consideradas eticamente
aceitáveis para construir a igualdade numa sociedade, quando as desigualdades
sociais imperam entre o próprio sexo feminino, e em todos os demais campos da
sociedade.

Parece contraditório pensarmos que estas medidas poderiam adquirir um


alcance imediato no aumento do número de mulheres no parlamento, já que
vivemos numa sociedade capitalista e, que durante muito tempo, imperou o sistema
patriarcal, de forma arbitrária em que a mulher não tinha o direito de se deslocar de
casa para a rua, e as expressões do patriarcalismo, na esfera da política,
predomina, mas de forma velada. Neste sentido, a opressão da mulher na sociedade
de classe assume uma dupla dimensão quando esta mulher pertence às classes

35
Ações afirmativas e políticas de cotas são termos utilizados por vários autoras e autores que visam objetivar a
igualdade e evitar as discriminações sexuais, raciais e de gênero, étnicas ou com deficientes físicos (INACIO,
2002).

69
populares, pois a discriminação/dominação aumenta por serem mulheres, pobres e
negras, mas estas mesmas mulheres não percebem a
dominação/opressão/exploração.

Segundo Santos e Lobato (2003), as medidas de ação afirmativa, justificam-


se com o argumento de que esse tipo de política social seria apto a atingir uma série
de objetivos que seriam normalmente inalcançáveis, caso a estratégia de combate à
discriminação se limitasse à adoção, no campo normativo, de regras meramente
proibitivas de discriminação. Ou seja, de um lado, essa política simbolizaria o
reconhecimento oficial da persistência e da perenidade de práticas discriminatórias e
da necessidade de sua eliminação. De outro, elas teriam também por meta atingir
objetivos de natureza cultural, ou seja, visavam também incentivar a aceitação do
pluralismo e da diversidade.

A inferioridade da mulher em relação ao homem era materializada


expressamente na nossa legislação civil. Para Santos e Lobato (2003, p. 43), a
Constituição de 1988 (art. 5º) não apenas aboliu essa discriminação chancelada
pelas leis, mas também, através dos diversos dispositivos antidiscriminatórios,
permitiu-se que se buscassem mecanismos aptos a promover a igualdade entre
homens e mulheres. Convém ressaltar que, os dados levantados mostram um
aumento significativo das mulheres nos parlamentos, mas não promoveu a
igualdade entre mulheres e homens. Como destaca Araújo (2002), o Brasil ocupa
um dos últimos lugares na América Latina em termos de presença feminina no
parlamento.

As ações afirmativas e as cotas ainda na visão de Araújo (2002), emergem


num contexto de enfraquecimento de projetos políticos alternativos, quando as
atenções se voltam para pensar o aprimoramento da democracia representativa 36 .
Os partidos, objeto de maior atenção, buscam responder as demandas que lhe são
36
Nas Democracias representativas, as eleições se constituem num momento importante, e votar é uma condição
necessária e fundamental de participação política. A relevância deste ato se expressa, basicamente, porque não
há outra forma de participação política que envolva um maior número de indivíduos. No entanto, nem todos (as)
exercem o direito ao voto, pois há um aumento de abstenções eleitorais nas democracias representativas. Dessa
forma, se numa democracia votar é condição necessária e fundamental de participação política, o aumento da
não participação eleitoral, expresso tanto nas taxas de abstenção quanto nos votos em branco e nulo, pode por em
dúvida a própria legitimidade da mesma (Costa, 2007). De acordo com o senso comum, o voto é a arma que o
eleitor tem para exercer sua cidadania, mas que cidadania é esta, quando não temos liberdade de opinar e nem de
participar diretamente das discussões políticas no parlamento, já que, na maioria das vezes, o político é eleito
pela compra de voto? Não temos confiança, nem credibilidade nos políticos que nos representam e muito menos
nos partidos políticos. Portanto, a crise de representação política representa todos esses fatores presentes numa
sociedade capitalista contraditória, assim como questiona a legalidade da democracia em que vivemos.

70
dirigidas, inclusive as das mulheres, não apenas por razões éticas ou ideológicas,
mas, também ou principalmente por interesses pragmáticos. Interesses gerados por
necessidades de ampliar e absorver a pressão desses segmentos, em razão de seu
peso perante a opinião pública. Nesse sentido, um número crescente de partidos
políticos, em dezenas de países, vem assumindo políticas de ação afirmativa e cotas
destinadas as mulheres e a outros segmentos. No Brasil, os partidos a qual a autora
se refere são os Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Democrático Trabalhista
(PDT). Ambos responsáveis pela implementação das cotas na década de 1980.

Segundo Araújo (2002), o processo de redemocratização e, particularmente, o


processo de construção da Constituinte foram momentos que contribuíram para
fortalecer a participação e ampliar a representação das mulheres. A maior alteração
no percentual de eleitas para a Câmara Federal, na história do país ocorreu entre
1982 e 1986; neste último, primeira eleição após a redemocratização, o percentual
de candidatas passou de 1,67% (Hum virgula dezesseis por cento) para 5,33%.
(cinco virgula trinta e três por cento). Contudo, se as formas de participação se
diversificaram, no que tange a representação política os índices cresceram muito
pouco desde então, especialmente em se tratando da representação no legislativo
federal.

Para Araújo (2002), os resultados das cotas no Brasil podem ser analisados
em relação aos seus dois tipos de objetivos: a ocupação numérica de espaços e as
alterações simbólicas nas percepções sobre a relação mulher e política. Em relação
a este último objetivo, em médio prazo está sendo possível avaliar os seus
desdobramentos. Já em relação ao objetivo mais imediato e perceptível, relacionado
com a ampliação da presença de mulheres como candidatas e eleitas, é possível
afirmar com base em análise dos dados eleitorais, que as cotas tem sido pouco
eficazes.
Os resultados das duas eleições para a Câmara de vereadores de Natal nas
quais as cotas foram adotadas foi cerca de 18% (dezoito por cento) de candidaturas
e de 11,2% (onze vírgula dois por cento) de eleitas em 1996 e cerca de 20% (vinte
por cento) de candidaturas em 2000, com 11,7% (onze vírgula sete por cento) de
eleitas. Os resultados para a Câmara dos Deputados Federais em 1998 mostram
que houve elevação do percentual de candidaturas, passando de 6,6% (seis vírgula
seis por cento) em 1994 para 10,2% (dez vírgula dois por cento) em 1998. Tais

71
números mostram que se ficou longe de alcançar a meta de 25% (vinte e cinco por
cento) e os índices de eleitas chegaram a ser negativos – 6,3% (menos seis vírgula
três por cento) em 1994 e 5,6% (cinco vírgula seis por cento) em 1998.
De acordo com o jornal Cfêmea (1998), o que parece ter acontecido em
vários estados é que, apesar do número de mulheres candidatas ter aumentado, os
homens tiveram melhores condições de preencher as novas vagas estipuladas pela
lei. Entretanto, é importante destacar que não há uma regra geral para o país. Nos
diferentes estados a situação oscila e pudemos observar ou o aumento do número
de candidaturas de mulheres ou a apresentação de um número igual ou a redução
de candidaturas femininas.
De acordo com Miguel e Queiroz (2006), um dado surpreendente é que as
mulheres tiveram maiores chances nas disputas pelas Prefeituras e Câmara de
Vereadores, em regiões menos desenvolvidas, como na região Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. A explicação se baseia em três hipóteses a primeira é a hipótese da
política tradicional, a segunda hipótese é da hiperqualificação feminina e por último a
da hipótese demográfica.
A primeira hipótese da política tradicional, afirma que nas regiões mais
atrasadas do país, ainda predominam os padrões da política tradicional, baseada na
formação clientelista e no familiarismo. As mulheres seriam eleitas não por sua
trajetória pessoal ou vinculação com movimentos da sociedade civil, mas na
qualidade de representantes de seus clãs familiares. A predileção feminina pelos
partidos mais conservadores é um dos fatores responsáveis pelo crescimento das
mulheres nos espaços de poder.
A segunda hipótese da hiperqualificação feminina – mulheres com nível
médio de escolaridade superior aos dos homens em posição similar – é detectada
em diferentes espaços sociais, entre eles o da política. Em todo o Brasil há mais
mulheres matriculadas no ensino médio e superior do que os homens. De acordo
com os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) em
2003, para o ensino superior, a diferença de matrículas em favor das mulheres
chegava a 10,7%(dez vírgula sete pontos percentuais) no Sul, 11% (onze por cento)
no Sudeste, 13,6%(treze vírgula seis por cento) no Nordeste, 19,9% (dezenove
vírgula nove por cento) e no Centro-Oeste e 21,2% (vinte e um vírgula dois por
cento) no Norte. Isso reforça a hipótese de que a maior qualificação credencia as
candidatas aos olhos do eleitorado, nessas regiões.

72
Por último, a terceira hipótese, que é a demográfica. Esta afirma que há maior
migração entre o sexo masculino em busca de maiores oportunidades de trabalho,
por isso há maior eleitorado feminino. A hipótese afirma que as mulheres teriam
maior facilidade para vencer as eleições nesses municípios menores 37 . Todos esses
fatos são importantes para se entender o crescimento de candidaturas de mulheres
bem como a sua persistente sub-representação.
Dentre as hipóteses levantas acima concordamos em parte com a autora,
uma vez que, presenciamos no nosso estado que a maioria das mulheres eleitas
vem de partidos conservadores e foram eleitas com a política de base clientelistas.
No tocante a hiperqualificação feminina de fato, as mulheres têm superado os
homens como já assinalamos anteriormente, e quanto a hipótese demográfica, não
acreditamos que seja determinante, pois as mulheres já são maioria da população,
portanto a migração interna dos homens não interfere nas eleições, contudo deve-se
considerar este dado como importante, qual seja, o eleitorado feminino é majoritário
em todas as cidades. Contudo, cabe frisar que nessas regiões onde as mulheres
foram eleitas não percebemos que elas tenham sido reeleitas, ou seja, não se repete
o sucesso dos anos anteriores.

È preciso entender que, os interesses políticos vão além dessa discussão,


pois as limitações da legislação brasileira e as cotas eleitorais para as mulheres são
determinantes nessa sociedade capitalista em que predomina os interesses de
classe, principalmente em um país no qual tivemos um processo eleitoral tardio em
decorrência de um sistema marcado pela exclusão social. Porém, não podemos
negar a importância do movimento feminista nas lutas pela igualdade entre mulheres
e homens, nas sociedades de classe.
Ainda de acordo com os dados registrados pelo jornal Cfêmea (2004), sobre
as candidaturas de mulheres para vereadora nas eleições de 2004, entre eles, os do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), destaca-se o crescimento de candidaturas de
mulheres, particularmente, para o cargo de prefeita. No entanto, as candidatas à
prefeita e a vereadora ainda são poucas. Considerando-se os dados agregados por
partido político para todo o país, nenhuma das 27 (vinte e sete) legendas atingiu o
patamar mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas para

37
Essa pesquisa foi realizada no período de 1996 a 2004, ver dados nos Estudos Feministas da Universidade
federal de Santa Catarina, 2006 ( MIGUEL E QUEIROZ, 2006).

73
vereadora. Contudo, a participação das mulheres nas eleições proporcionais (para
vereadora) é bem mais expressiva do que a participação nas eleições majoritárias
(prefeitas). Em termos percentuais, a candidatura das mulheres a vereadora é mais
que o dobro da candidatura à prefeita em todo o país, 22,14% (vinte e dois vírgula
quatorze por cento) do total de candidatas, 75.948 (setenta e cinco mil novecentos e
quarenta e oito) em um total de 343.027 (trezentos e quarenta e três mil e vinte e
sete) candidatas. Para o cargo de prefeita, nas eleições de 2004, as mulheres
representam 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento) das candidaturas, ou
seja, 1.463 (Hum mil quatrocentos e sessenta e três) candidatas em um total de
15.510 (quinze mil quinhentos e dez) da população. Comparativamente as eleições
de 2000- quando as candidatas representavam 7,59% (sete vírgula cinqüenta e nove
por cento), totalizando 1.139 (Hum mil cento e trinta e nove) – o crescimento
absoluto foi de 324 (trezentos e vinte e quatro) candidatas.
Em termos das candidaturas de mulheres ao cargo de prefeita, observa-se
uma grande discrepância, tanto entre os estados quanto entre os diversos partidos
políticos. O percentual de candidatas mulheres distancia-se muito da média nacional
que é 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento), variando de 3,70% (três
vírgula setenta por cento) a 17,31% (dezessete vírgula trinta e um por cento) por
Estado. Em termos de partidos políticos, a variação é de 0% (zero por cento) a
18,27% (dezoito vírgula vinte e sete por cento) em todo o país (CFÊMEA, 2004).

Ainda conforme o Cfêmea (agosto de 2004), o crescimento das candidaturas


entre 2000 e 2004 para o cargo de prefeita foi superior a três vezes o crescimento
ocorrido para o de vereadora, 28,44% (vinte e oito vírgula quarenta e quatro por
cento) e 8% (oito por cento) respectivamente. Segundo Grossi e Miguel (2001) 38 , no
Brasil, em 2000, as mulheres candidatas a vereadora somaram 70.321 (setenta mil,
trezentos e vinte e um), 19,14% (dezenove vírgula quatorze por cento) do total e as
mulheres eleitas totalizaram 7001 (sete mil e uma), 11,61% (onze vírgula sessenta e
um por cento) do total. Nesse mesmo ano, as mulheres candidatas à prefeita
somaram 1.139 (Hum mil cento e trinta e nove), o que representa 7,59% (sete
vírgula cinqüenta e nove por cento) do total e as eleitas atingiram 317 (trezentos e
dezessete), 5,7% (cinco vírgula sete por cento) do total. Em 2002, as mulheres
candidatas a deputada estadual/ distrital totalizaram 1908 (mil novecentos e oito),

38
A candidatura á prefeita não é contemplada pelo sistema de cotas (GROSSI e MIGUEL, 2001).

74
14,84% (quatorze vírgula oitenta e quatro por cento) do total e as mulheres eleitas
foram 133 (cento e trinta e três), 12,5% (doze vírgula cinco por cento) do total. O
crescimento das mulheres eleitas deputadas/ distritais foi de 25,5% (vinte e cinco
vírgula cinco por cento) em relação à 1998. Em 2002, as candidatas a deputada
federal totalizaram 509 (quinhentos e nove), 11,52% (onze vírgula cinqüenta e dois
por cento) do total e as mulheres eleitas somaram 42 (quarenta e dois), 8,2% (oito
vírgula dois por cento). O crescimento das mulheres eleitas como deputadas
federais foi de 45% (quarenta e cinco por cento) em relação à 1998. Pode-se
observar, assim, que a participação das mulheres nas eleições proporcionais é
crescente do nível federal para o municipal.

No entanto, apesar deste crescimento, percebe-se que o sistema de cotas


não apresenta efeitos diretos sobre as candidaturas de mulheres e se faz necessário
a ampliação da participação política das mulheres em todos os espaços públicos,
para um maior aprofundamento da “democracia”, como valor universal como o
define Coutinho (1999, p.34), “a democracia é hoje não apenas o terreno no qual o
adversário de classe é obrigado a retroceder, mas é também o valor historicamente
universal sobre o qual fundar uma original sociedade socialista” A democracia assim
analisada não teria apenas um caráter de classe mas se constituiria em um valor
universal, base a partir da qual é possível construir uma sociedade socialista.
Entretanto temos a compreensão que essa democracia na qual vivemos é uma
falácia, não vai ser ocupando cargos na política nessa sociedade de classe que as
mulheres vão está em pé de igualdade com os homens, na questão dos direitos e
as mudanças nas relações vão se concretizar, não basta ser mulher para participar
de cargos eletivos, já que os espaços de poder se revestem da figura masculina na
qual o domínio exercido sobre as mulheres se constituem em todos os níveis da
sociedade.

Contudo, atualmente, os trabalhadores e o povo são chamados a votar, mas


não decidem nada. O poder econômico da burguesia condiciona o próprio voto, pelo
controle dos meios de comunicação; pelo financiamento das campanhas eleitorais
caríssimas; pela compra direta de votos. A burguesia ganha quase sempre, porque
seus candidatos e partidos são vitoriosos, ou porque os partidos se comprometem
em alianças e projetos voltados para os interesses dessa mesma burguesia.

75
Para Netto (1990), a democracia encontra no ordenamento capitalista, a
fronteira da propriedade privada dos meios de produção e a decisão acerca da
destinação do excedente econômico. De um lado a burguesia assume
compromissos com os projetos burgueses e de outro com a proposta democrática,
que permite garantias individuais, a livre expressão de opiniões e opções políticas e
sociais.

“A Democracia” – diz Marx - é o enigma resolvido de todas as constituições


(...). A Constituição aparece como o que é: como livre produto do homem (...). A
democracia é a essência de toda constituição política: é o homem socializado numa
particular constituição política”. (In, Coutinho, 1987, p. 93). Quando diz “que todos
são cidadãos” isso quer dizer que todos podem participar na formação do poder,
contudo, a critica marxiana mostrou sempre o caráter formal desta igualdade
política quando esta se dá na sociedade capitalista, pois atravessada pelos
interesses de classe.

A política de cotas visa mudar esta igualdade apenas formal. Contudo, no


Brasil, não é obrigatória, ou seja, diz-se que os partidos têm que reservar 30% (trinta
por cento) das vagas para as candidatas femininas, mas os partidos não têm que
preencher essas vagas por mulheres, quer dizer, o partido pode se registrar com a
lista com menos candidatas do que estabelece a lei ou até mesmo com nenhuma
candidata.

Para Araújo (IN, BRUSCHINI, 2002), inserir as mulheres em um contexto mais


amplo das ações afirmativas de cotas é uma medida que visa alterar variados
quadros de desigualdade. A inclusão dessa proposta política possibilitou que o
problema da participação das mulheres e do seu acesso aos canais decisórios,
obtivesse uma visibilidade até então inexistente e fosse colocado como problema da
cidadania e da democracia brasileira.

O que vem a ser essa cidadania? Segundo o discurso político vigente, a


cidadania seria a conquista dos direitos civis, políticos e sociais mínimos por parte
dos indivíduos, mas tal concepção esconde que a sociedade é dividida em classes
sociais. Existem os cidadãos que possuem bens, propriedades, empregos e os
cidadãos “despossuídos”, aqueles que vendem a sua força de trabalho em troca de
um salário. Neste sentido, considerando o fato de que a composição da democracia
representativa é por natureza uma composição da elite, de um grupo minoritário que
76
detêm a riqueza do país, no nosso caso, essa elite é marcadamente branca,
masculina e excessivamente abastada (ARAÚJO, IN BRUSCHINI, 2002).

Os direitos civis e políticos, durante muito tempo foram negados


principalmente às mulheres, negros (as) e pobres, pois suas conquistas só se deram
através de muitas lutas. Ora, não há democracia sem igualdade e já que vivemos
em um país onde se apresentam grandes desigualdades sociais, não se pode
afirmar que vivemos uma democracia em seu sentido pleno.

Segundo Araújo (iBIDEM), a política de ações afirmativas e cotas interessam


principalmente aos Partidos Políticos, motivados por interesses pragmáticos gerados
por necessidades de ampliar e absorver a pressão desses segmentos (nesse caso
as mulheres, em razão de seu peso perante a opinião pública, e por serem maioria
da população brasileira). Na prática não é o que demonstram os dados analisados.
As bases eleitorais construídas estão longe de atingir um patamar mais elevado
quando se trata da presença das mulheres nos partidos políticos.

Para Costa (2007), os partidos, enquanto veículo entre a sociedade civil e as


instâncias governamentais, articulando e canalizando demandas capazes de
sustentar a estabilidade e a legitimidade dos regimes políticos, são fundamentais
para o funcionamento e a manutenção das democracias representativas. Os
partidos, contudo, não estão cumprindo essa função, como já foi analisado acima.

A eficácia das cotas para Araújo (IDEM), está associada ao sistema eleitoral e
o caráter da lista: aberta ou fechada. Listas fechadas e bloqueadas – aquelas em
que o eleitorado não tem nenhuma possibilidade de alterar a ordem dos candidatos
– são aquelas nas quais, os eleitores votam nos partidos e não nos candidatos.
Estas tendem a produzir uma transferência mecânica da proporção de candidaturas
femininas para a proporção de mulheres no parlamento.

Para Araújo (2006), no caso do Brasil onde as listas são abertas, a legislação
é capaz de forçar a superação apenas na barreira inicial, aquela que, dentro dos
partidos, impedia ou dificultava o lançamento de candidatas mulheres às eleições.
Os eleitores escolhem seus candidatos votando nestes e não no partido. Desta
forma, o fator que determina quem são os eleitos é a quantidade de voto recebida
por cada candidato individualmente.Vencer o preconceito, disseminado entre
eleitores e eleitoras, que faz com que a mulher seja vista como estando deslocado

77
no campo político, fora do seu meio natural, e, portanto tenha menos chance de ser
votada, é a grande dificuldade encontrada pelas mulheres. No caso do Brasil, as
dificuldades próprias do sistema de listas abertas somaram-se a outras, advindas da
fragilidade da legislação que instituiu as cotas.

Podemos perceber que o sistema eleitoral, não mudou pelo fato de que as
vagas destinadas às mulheres são apenas facultativas, isto é, os partidos tanto
podem preenchê-las com candidatas (do sexo feminino) quanto deixá-las em aberto.
Nas quatro eleições sob a vigência das políticas de cotas o percentual efetivo das
mulheres concorrentes era inferior ao estabelecido em lei.

Temos a clareza de que, as políticas de cotas, não acabariam com a


discriminação, nem tampouco acreditamos, que os problemas que afetam a
sociedade seriam resolvidos quando elas chegassem ao poder, pois não basta ser
mulher para defender e propor soluções para os problemas da saúde, educação, da
moradia, da igualdade entre os sexos.

Existem vários elementos que devem ser analisados quando se defende o


aumento da representatividade feminina. O problema da fidelidade e disciplina
partidária o qual impede uma maior participação, é só um desses elementos. Neste
sentido, a existência da disciplina partidária muitas vezes impede que as mulheres
de diferentes partidos se unam para pressionar por mudanças quando se tratam de
projetos políticos de interesse das mulheres. Há muito preconceito quando se trata
de discutir projetos específicos voltados para os interesses das mulheres. Na visão
dos homens isso pode enfraquecer sua candidatura e fortalecer as mulheres.

Historicamente há exemplos de mulheres de grupos oligárquicas que, ao


chegarem ao poder, somente reproduziram o discurso e a prática conservadora e
burguesa de cujos valores eram participantes. Apesar disto, a presença destas
mulheres na política foi importante para derrubar preconceitos e assim abrir espaço
para a participação política de outras mulheres. Neste sentido, defendemos a
necessidade de ampliação da participação das mulheres nos espaços políticos como
forma de vencer preconceitos históricos e como possibilidade de criação de espaços
para mulheres que defendem projetos democráticos e igualitários.

Analisando um trecho da entrevista de uma candidata, segundo Grossi (2001,


p.176), várias parlamentares denunciavam a resistência dos partidos em apoiar suas

78
candidaturas, mesmo que estas fossem as que mais tivessem chances eleitorais.
Neste caso percebe-se que predomina a lógica sexista.

“A política de cotas discutida pela esquerda democrática 39 na década de


1990, diante do que já foi analisado, nos traz o questionamento de em que medida
essa “esquerda democrática” está contribuindo para elaboração de um projeto
político emancipatório ou, dito de outro modo, em que medida tem sido por seu
intermédio que se instituiu e se fortaleceu uma cultura política particularista favorável
à fragmentação, no limite funcional ao capital, dada a sua incapacidade de articular
demandas específicas a um projeto societário anticapitalista, para o enfrentamento
das formas de opressão”.

O argumento da esquerda democrática para a sustentação da continuidade


da cidadania para além do capitalismo é o fato dela ter sido o resultado das lutas da
classe trabalhadora. Contudo, a cidadania tem sua origem no ato fundante da
sociabilidade capitalista. Portanto esta se dá a partir do ato da compra e venda da
força de trabalho e que resulta na produção de mercadoria.

As formas de dominação do sistema capitalista impõem modo de vida, define


formas de sociabilidade de dominação. Nela, os direitos civis, econômicos e sociais
não são reconhecidos para diversos segmentos da sociedade, mulheres, pobres,
negros, homossexuais e índios.

Um questionamento levantado por Tonet (2005), qual o papel do Estado


diante da emancipação política. Na sociedade atual nós temos um Estado, não
apenas um instrumento de defesa do interesses particulares da burguesia, mas
também uma expressão invertida da desigualdade social. Invertida porque o
interesse particular que reina soberano na sociedade civil apresenta-se, na
sociedade política sob forma de interesse geral. O Estado é, portanto, o aparelho de
dominação de uma classe sobre a outra.

Ainda sobre o conceito de Estado, Gramsci, os define a partir de duas esferas


no interior das superestruturas, o que ele chama de “sociedade civil” e “sociedade
política”. Essa última expressão designa precisamente o conjunto de aparelhos
através dos quais a classe dominante detém e exerce o monopólio legal ou de fato
da violência: trata-se assim dos aparelhos coercitivos do Estado, encarnados nos

39
A esquerda democrática a qual nos referimos é PT, PCdoB, PCB e o PDT.

79
grupos burocráticos ligados as forças armadas e policiais e a aplicação das leis. Já a
“Sociedade civil” designa um momento ou esfera da “superestrutura”. De acordo
com Coutinho (1987) superestrutura significa:

O conjunto das instituições responsáveis pela elaboração e ou difusão de


valores simbólicos, de ideologias, compreendendo o sistema escolar, as
Igrejas, os partidos políticos, as organizações profissionais, os sindicatos,
os meios de comunicação, etc.

Deste modo, em conjunto, ambas as esferas formam o Estado que na visão


de Gramsci é “sociedade política mais “sociedade civil”, isto é hegemonia revestida
de coerção (IBIDEM,1987).

A esfera pública é por sua própria natureza, essencialmente limitada, quer


dizer, ela não está aberta a um aperfeiçoamento indefinido, porque sua origem e sua
função social não advêm dela própria, mas do antagonismo existente na sociedade
civil. Por isso, a ação do Estado diante das desigualdades sociais jamais poderá
deixar de ser meramente paliativa.

Nesse sentido, pode-se reconhecer que as políticas de cotas como ação


reparadora na sociedade capitalista, não é a solução ideal para diminuir a opressão
e exploração da mulher e em geral da classe trabalhadora, mas no momento, torna-
se necessária para possibilitar uma maior participação das mulheres na política
partidária.

Todas estas discussões levantadas a respeito da participação feminina na


política nos trazem subsídios para entender melhor como as mulheres vêm
conquistando seu espaço na sociedade capitalista e nos ajuda a nos aproximar de
nosso objeto de estudo.

Um dos objetivos deste trabalho é entender quais os determinantes da sub-


representação feminina na política partidária. Nesse caso, a nossa preocupação
também é saber como as mulheres vêm conquistando estes espaços uma vez que
os homens ainda são maioria nos espaços de poder.
Entretanto, são vários os determinantes da sub-representação feminina nos
espaços políticos, entre eles podemos citar: o sistema capitalista responsável pela
divisão entre as classes sociais, a propriedade dos meios de produção que permite a
exploração de uma classe por outra, e principalmente a cultura patriarcal,

80
característica do processo eleitoral e partidário, corrupção, ausência de
financiamentos públicos e controle democrático das campanhas para algumas
mulheres, que tendem a receber menos apoio e sustentação partidárias e, portanto,
menor visibilidade comparativamente as campanhas dos homens e
conseqüentemente a receber menor apoio e voto de eleitores (as), as negociações
conciliatórias para favorecer a classe que detêm os meios de produção,
candidaturas “laranjas”-candidaturas para preencher vagas inexistentes - são
características constantes nesse processo eleitoral, além da discriminação contra as
mulheres e a desigualdade entre os sexos, que leva a dupla jornada de trabalho e
até a tripla jornada de trabalho, dificultando a participação política de muitas
mulheres.
A cultura política também é um elemento importante que influencia o acesso
das mulheres á representação em contextos socioeconômicos idênticos ou
diferentes. Na perspectiva de gênero, ajuda a entender como os valores, os
estereótipos e os referenciais simbólicos sobre os lugares dos homens e das
mulheres interferem e, de certo modo, condicionam atitudes e praticas que reportam
ao campo político, como exemplo as cotas.
Quando discutimos a inserção das mulheres no cenário político, vem a idéia
de entender a concepção de política na atual sociedade de classe. Ora, a política se
constitui como lugar de articulação do social e de suas representações, que compõe
a história. A rigidez das fronteiras entre o público e o privado é construção do século
XIX, quando houve a constituição de um espaço político que se confunde com o
público e do qual as mulheres foram excluídas. A partir de então, foi atribuído às
mulheres apenas o poder informal ou poder social 40 . Assim, o poder político formal
passa a ser identificado com o masculino. Essa representação de poder tende a se
estender pelo século XX de tal maneira que o feminismo será sempre associado ao
poder de bastidores.
Assim, as mulheres, participando do cenário político e sua luta feminista pela
igualdade de gênero demonstra a conquista de um espaço importante no poder
político. Na medida em que as mulheres começam a assumir novos espaços, saem
do mundo restritamente privado para o público, havendo com isso uma troca de

40
Poder informal ou poder social é aquele associado ao poder dos bastidores, no qual é delegada a mulher às
atividades menores nos cargos de direção, enquanto os espaços formais de decisão e discussão política são
ocupados quase exclusivamente por homens. Podemos observar isso dentro dos partidos ditos de esquerda e nos
sindicatos (PERROT, 1988).

81
papéis, no qual alguns homens se vêem obrigado a entrar para o domínio privado,
assumindo, muitas vezes, as atividades do lar, responsabilidades essas que
deveriam também ser inerente a eles. Podemos conferir a partir dos dados do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2007), que essa troca de papeis se
dão em decorrência do aumento do número de homens na posição de chefe de
famílias e por dedicarem 10h05min semanais aos afazeres domésticos, e na posição
de cônjuges, não ultrapassarem 10h44min semanais. Enquanto as mulheres
consideradas chefes de famílias que trabalham fora de casa, quando comparadas a
homens cônjuges desocupados dedicam 9h a mais por semana ao trabalho
doméstico. Levando em consideração que houve um aumento de famílias chefiadas
por mulheres que passou de 24,9%(vinte e quatro vírgula nove por cento) em 1997,
para 33%(trinta e três por cento) em 2008, estes dados revelam um total de 19,5
(dezenove vírgula cinco) milhões de famílias brasileiras que identificam a mulher
como principal responsável pelo sustento da família.

4 - QUADRO REPRESENTATIVO DAS ELEIÇÕES EM NATAL/RN NO PERIODO


DE 1988 A 2004

4.1 - AS Mulheres e a Participação Política no Rio Grande do Norte/Natal

No Rio Grande do Norte e em Natal, a mulher é vista como pioneira na


política partidária desde o início do século XX, em um Estado do Nordeste em que o
patriarcalismo e o poder oligárquico predominavam.
O Rio Grande do Norte (RN) foi pioneiro no sufragismo feminino quando da
elaboração da Lei Estadual nº 660, de 25 de outubro de 1927, que visava ampliar o
voto às mulheres, entretanto só nas eleições municipais em 1928, Alzira Soriano de
Souza, tornou-se a primeira prefeita no Estado, na cidade de Lajes. Foi eleita pelo
Partido Republicano, sendo a primeira mulher a ocupar um cargo que, até então, era
ocupado somente por homens. Nas eleições de 1928, 21 (vinte e uma) mulheres do
Estado já eram portadoras do título, mas apenas quinze (15) votaram. Outros
exemplos se seguem no Rio Grande do Norte: elege-se, nesse mesmo ano, a
primeira vereadora de Natal a professora Júlia Alves Barbosa, natural de Natal, a
mais votada do seu partido, para o período de 1929 a 1931 (NASSER, 2005), Maria
do Céu Fernandes, primeira Deputada Estadual de 1935 a 1939, na cidade de

82
Caicó, e a primeira eleitora Celina Guimarães Vianna, na cidade de Mossoró, tendo
entregue seus documentos para requerimento em 25/11/1927. Naquela época,
poucas mulheres tinham coragem e possibilidades de enfrentar o preconceito e a
discriminação dentro dos partidos políticos e, raramente, chegavam a entrar em um
deles, já que o papel reservado as mulheres era de genitoras e donas do lar.
É importante sinalizar que a luta da mulher potiguar, teve também como figura
de destaque Nízia Floresta Brasileira Augusta, pseudônimo da escritora Dionísia
Gonçalves Pinto (1810-1885). Nascida no município de Papary (RN), hoje, Nizia
Floresta, em homenagem a mesma, cuja história de vida e produção intelectual
colocam -na entre as primeiras escritoras do Brasil e entre as primeiras educadoras
feministas, por defender os direitos das mulheres, índios e escravos. Ela é
reconhecida, sobretudo por ter rompido barreiras e preconceitos no que se refere às
chamadas “minorias”, termo utilizado para definir as classes que são excluídas da
sociedade como mulheres, homossexuais, negros e outros.
A publicação de um dos seus livros, “Direitos das Mulheres e Injustiça dos
Homens” (1832), representou um marco na consciência da mulher brasileira, por ser
o primeiro livro nacional realizado com a intenção de reivindicar e declarar a injustiça
41
social praticada contra as mulheres.
Outra figura que representa a luta das mulheres no Brasil é Bertha Lutz,
nascida em São Paulo, em 1894. Contrariando o modelo tradicional de família
brasileira, o pai estimulou Bertha Lutz a estudar e trabalhar e ela tornou-se líder
feminista a nível nacional (GOLDENBERG, 1992). De acordo com Góis (2000), em
1928, Bertha Lutz veio ao Rio Grande do Norte, discutir com o Governador Juvenal
Lamartine de Farias, a questão da inclusão de uma mulher na disputa de um cargo
eletivo, uma vez que a Lei de nº 660, art.77, de 25 de outubro de 1927, dizia que no
Rio Grande do Norte, poderiam votar e serem votadas, sem distinção de sexo, todos
os cidadãos que reunirem as condições exigidas por essa lei. Assim, neste período,
surgiu a candidatura de Alzira Soriano de Souza.O convite foi feito pelo então
governador à Alzira Soriano de Souza, para disputar a Prefeitura do município de
Lajes/RN, apoiado pelo partido Republicano e por seu pai, líder político da região,

41
Para Mariz (1982), foram panfletos de idéias feministas, acentuadamente popular na Europa e mesmo do
Brasil da época. Não se tem até agora noticia da existência de nenhum exemplar desta edição, publicado em
Recife.

83
Cel. Miguel Teixeira de Vasconcelos. Desta forma, Alzira Soriano foi eleita, como já
assinalamos, em 1928.

Na década de 1930, neste período, o Brasil vivia um período de instabilidade


política e de intervencionismo, levando vários líderes políticos ao afastamento. Entre
elas, a primeira Deputada Federal do Brasil, Carlota Pereira Queiroz, eleita pelo
Estado de São Paulo, em 1934, que fez a voz feminina ser ouvida no Congresso
Nacional. Nesse conjunto de acontecimentos histórico - políticos, Carlota Pereira
Queiroz e Alzira Soriano de Souza são obrigadas a se afastar do cenário político, só
retornando alguns anos depois.
Nesse leque de acontecimentos as mulheres desempenharam papel
fundamental, junto a União Feminina do Brasil (UFB) movimento auxiliar que
ocupava-se de assuntos de interesse das filiadas e tinha como objetivo a
emancipação da mulher. No cenário nacional uma mulher de destaque é Olga
Benário 42 uma comunista que a historiografia oficial do movimento operário
brasileiro, produzida por partidos ou pesquisadores marxistas, relegara o papel
subalterno de mulher de Prestes 43 e nada mais que isto (MORAIS 1986).
Observamos esse mesmo descaso com as mulheres que participaram da
Insurreição Comunista em 1935 em Natal, quando as mulheres são apresentadas de
forma dúbia, de um lado como protagonistas da história e do outro, apenas como
coadjuvante na qualidade de esposa, filha ou amante. Para Freire (2004) em Natal,
de acordo com a pesquisa realizada no Arquivo Público do Estado do Rio Grande do
Norte, trinta mulheres foram indiciadas, dentre elas, quatro mulheres se fardaram e
invadiram o quartel: Amélia Reginaldo, Leonila Felix, Chica Pinote e Chica da
Gaveta, dessas quatro, apenas Amélia Reginaldo foi responsável pela única edição
do jornal revolucionário “A Liberdade”, sendo condenada a cinco anos de reclusão.

O Rio Grande do Norte nas décadas de 1960/1970, assim como o Brasil,


estava passando por graves crises decorrentes das ditaduras militares,
caracterizadas também pela repressão, cassação dos direitos políticos, censura e
violência, ou seja, pelo autoritarismo exacerbado, além de crises políticas
intensificadas pelo conflito ideológico esquerda versus direita. Diante desse quadro
42
Olga Benário ou Maria Berger Vilar, judia comunista e membro do Comitê da Internacional Comunista e do
PCB, presa em 1937, durante a ditadura varguista, entregue a polícia alemã nazista e morta no campo de
concentração na Alemanha em 1942 (MORAIS 1986).
43
Luis Carlos Prestes, militante comunista e membro do Comitê da Internacional Comunista, secretario do PCB,
presidente de honra da ANL, durante a Coluna Prestes ficou conhecido como Cavaleiro da Esperança.

84
destacava-se o antagonismo entre as forças nacionais (comunistas) e as forças
conservadoras defensoras da ditadura.
No RN estabelece-se o fenômeno do populismo na figura do Governador
Aluízio Alves, que posteriormente adere ao regime militar, apoiando e liderando
diversas ações repressivas, contudo mesmo assim, teve seus direitos políticos
cassados em 1969 pelo AI 5 ( Ato Institucional número 5).
Instalada a ditadura militar, a partir de então tem início a fase de
investigações, perseguições e prisões, comandada pela Comissão de investigações,
comissão esta formada por ordem do então Governador Aluízio Alves. As mulheres
não estavam fora desse contexto, uma das primeiras a ser perseguida foi a
funcionária pública Mailde Pinto Galvão, acusada de subversiva.
Ressaltamos também a importância de um movimento ocorrido no cenário
nacional que repercute em Natal. É o movimento de anistia, em 1975, em Natal, que
esteve ligado ao Ano Internacional da Mulher e a própria reunião da ONU
(Organização das Nações Unidas) que estabeleceu a Década da Mulher. Em Natal
registra-se o surgimento do Centro da Mulher Natalense – CMN, as mulheres
trataram de se reorganizar para dar continuidade ao movimento por igualdade de
direitos (FERNANDES, 2004).
Em 1978, o então presidente da República Ernesto Geisel concedeu anistia
aos presos políticos e a todos aqueles que haviam sido punidos pelo regime militar.
Em 1979 acaba o bipartidarismo. São extintos a ARENA (Aliança Nacional
Renovadora) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), criando-se novos
partidos para a disputa das eleições seguintes: O PDS (Partido Democrático social),
PMDB (Partido do movimento Democrático Brasileiro), PTB (Partido Trabalhista
Brasileiro), PDT (Partido Democrático Trabalhista), PT (Partido dos Trabalhadores),
PP (Partido Popular). Em 1982 foram restabelecidas as eleições diretas para
governador.
Na década de 1980 pós - ditadura militar as mulheres e homens estavam
reorganizados nos movimentos sociais, principalmente nos movimentos
universitários 44 e movimentos secundaristas que foram palco de contestação da
juventude aos atos de tortura e perseguições durante o regime militar. Tanto o

44
Esse movimento ficou conhecido como movimento acadêmico, ancorado no Departamento de Pesquisa da
Fundação Carlos Chagas, em São Paulo, e em pesquisas de ciências humanas e educação realizadas nas grandes
universidades do país (PINTO, 2003).

85
movimento universitário como secundarista estavam sendo liderados em sua maioria
pelo Partido dos Trabalhadores (PT) que havia se fortalecido na resistência à
ditadura, assim como o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) que
contava com maioria no parlamento e tinha o apoio do Movimento Revolucionário 8
de Outubro - MR8 - que contava nesta época com um departamento feminino. Surge
nesse mesmo período a fundação da Federação da Mulher Potiguar, que dividiu o
movimento feminista ainda no I Encontro da Mulher Potiguar realizado em Natal no
ano de 1982.
Já no âmbito nacional, a organização das mulheres no movimento feminista
na década de 1980, se deu a partir de um encontro na Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência (SBPC). Em Fortaleza-CE, em 1979, ocorreu o I Encontro
Nacional Feminista e em 1980 foi a vez do II Encontro Nacional Feminista, no Rio de
Janeiro. Esse encontro repercutiu em Natal contribuindo para o I Encontro da Mulher
Natalense em 1981, com o objetivo de “favorecer a discussão sobre os problemas
específicos das mulheres e da sociedade em geral, em um contexto mais
abrangente”. Os grupos de trabalho foram divididos por temas: Mulher e Saúde,
Mulher e Trabalho, Mulher e Sociedade e Organização e Participação da Mulher no
Conselho Municipal de Natal A partir desse encontro oficializa-se o grupo Movimento
de Mulheres em Luta – MML. A partir daí começa-se a comemorar em Natal, no dia
08 de março, o Dia Internacional da Mulher (FERNANDES, IDEM).
Nesse período surgem nas universidades vários núcleos, os Núcleos de
Estudos de Pesquisa sobre as Mulheres, grupos organizados de mulheres que
lutavam contra a opressão e exploração da mulher. Em Natal, na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), cria-se o NEPAM (Núcleo Nizia Floresta de
Estudos e Pesquisas sobre Mulher e Relações de Gênero) em março de 1991.
Ao mesmo tempo temos o crescimento da participação das mulheres nos
clubes de mães e conselhos comunitários, amparados por partidos e políticos,
portanto cabides eleitorais, cujo objetivo eleitoreiro era eleger pessoas como
vereadores em determinados bairros periféricos, cujas historias de vida não
demonstravam nenhum compromisso com a classe trabalhadora e com a camada
pobre. Essas mulheres eram convidadas a participar das atividades promovidas
pelos conselhos das Mulheres, instruídas pelos cabos eleitorais. De acordo com
Fernandes (IBIDEM), as mulheres não tinham a devida noção daquilo para o que
estavam contribuindo com suas presenças, ou seja, discutir e informar corretamente

86
não parecia ser exatamente uma preocupação naquele agrupamento, para eles, o
movimento de mulheres era e continua sendo, até hoje, mero instrumento eleitoral.
De forma geral as mulheres em Natal estavam atentas ao que estava
acontecendo e por sua vez a organização dos movimentos sociais as representavam
em várias instâncias. Em 18 de março de 1986, é entregue uma carta magna com
as reivindicações das mulheres aos Constituintes Estaduais, na Assembléia
Legislativa. O objetivo em assegurar os direitos das mulheres na nova Carta Magna
em processo de discussão. Neste momento, o CMDM coordenava uma ação que
mantinha mobilizado o movimento nacional cujo lema “Constituinte pra valer tem que
ter palavra de mulher”. Um dos pontos discutidos pelas mulheres era garantir os 120
dias de licença maternidade remunerada para gestante (FERNANDES, IDEM).

Nesse sentido, o feminismo conseguiu, em parte, como já assinalamos,


expressar suas reivindicações na Constituição de 1988, que garantiu a “igualdade”
entre homens e mulheres na sociedade e na família. De acordo com (MINUTTI,
2008), as mulheres no mercado de trabalho continuam ganhando salários menores
que os homens fazendo as mesmas funções. No Brasil, de todas as pessoas que
recebem o salário mínimo, 53% (cinqüenta e três por cento) são mulheres. Sua hora
de trabalho custa em media 14,3% (quatorze vírgula três por cento) menos do que
aquela paga a um homem. Segundo Melo (In AMB, 2001), as mulheres negras são
as mais discriminadas, recebem os piores salários comparados aos dos homens
brancos e mulheres brancas. Estando nos serviços mais precarizados, sem carteira
assinada, e sem direitos como férias e 13º salário. Das famílias chefiadas por
mulheres negras 60% (sessenta por cento), tem renda inferior a um salário mínimo
(IBGE, PNDA, pesquisa por amostra de domicílios). Em 1998 em uma pesquisa feita
pela economista Hildete Pereira de Melo, o emprego doméstico concentrava 19%
(dezenove por cento), da população feminina economicamente ativa, o que em
números significa, aproximadamente cinco milhões de mulheres; desse total, 56%
(cinqüenta e seis por cento), eram de mulheres negras.

Como se pôde ver há toda uma luta das mulheres na Constituinte a partir da
criação dos conselhos. Assim em 1988, ocorreram as primeiras eleições municipais
que foram as primeiras após o regime militar. Porém, ressaltamos que as mulheres
eleitas vereadoras nesse período não estavam engajadas nesses movimentos. Pela
primeira vez, em Natal, elegemos quatro vereadoras, dentre estas mulheres:

87
Lindalva Santos Maia Neo, eleita pelo PDT (Partido Democrático Brasileiro)
coligação “Vitória do Povo” (PDT, PRN (Partido da Renovação Nacional), PSD
(Partido Social Democrático), Gilda Medeiros Souza eleita pelo Partido da Frente
Liberal-PFL; Verônica Maria dos Santos Nogueira eleita pelo Partido Democrático
Trabalhista – PDT; coligação “Vitória do Povo”; Ana Catarina Alves Wanderley eleita
pelo Partido Trabalhista Renovador (PTR). Como já mencionamos a maioria das
mulheres eleitas não estavam ligadas a movimentos sociais, ao contrário, estavam
atreladas e foram eleitas por partidos e coligações considerados conservadores, e
muitas mulheres estão na política por interesse destes grupos.

Cumpre frisar que também em 1988 elegemos uma mulher a prefeitura de


Natal, Vilma Maria de Faria Maia, eleita pelo PDT, coligação “Vitória do Povo” (PDT,
PDS, PFL, PCB, PSD) 45 , coligado com os setores mais reacionários, vindo de
oligarquias que vinham predominando no cenário político em Nata/RN desde a
Ditadura Militar. Vilma Maria de Faria destacou-se na política potiguar através do
seu trabalho como primeira dama e como Secretária Estadual do Trabalho e Bem
Estar Social do Governo do Estado, em 1982. Desta forma, neste período podemos
perceber um crescimento das mulheres na política potiguar. Em Natal, no ano de
1985, pós-Ditadura Militar ocorreram às primeiras eleições diretas, para as capitais.
Vilma Maia era candidata a prefeita pelo (PDS), sigla que representava a maior força
política do Estado, respaldada pela Ditadura militar e Garibaldi Alves Filho era
candidato do (PMDB), então um parlamentar que ostentava um perfil político
progressista, Garibaldi é eleito prefeito de Natal. Entretanto só em 1988, ocorreu
uniformemente, para todos os municípios, as eleições, valendo também para os
novos municípios criados. Até 1985 as eleições foram somente para as capitais dos
estados.

No ano de 1992, Ana Catarina Alves Wanderley se candidata a prefeita de


Natal, pelo PFL, rompendo com o partido da família que era o PMDB, sendo
derrotada pelo seu tio, Garibaldi Alves Filho. Mais uma vez Lindalva Maia e Verônica
Maria dos Santos são candidatas e não conseguem se reelegerem a vereadoras.
Portanto, nesse ano Natal não, conseguiu eleger nenhuma mulher.

Em 1992, ocorreu no Brasil o movimento pelo Impeachment do presidente


Fernando Collor de Mello, eleito em 1989 e posteriormente, acusado de esquema de
45
Dados do T.R. E (Tribunal Regional Eleitoral) do ano de 1988.

88
corrupção. A instauração do processo de Impeachment, aprovada pela Câmara
Federal contou com o apoio de cerca de duas centenas de organização de
mulheres, (respaldando o trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI),
entre essas organizações seis eram do Rio Grande do Norte (FERNADES, 2004). A
mobilização pelo Impeachment teve o apoio de amplos segmentos da sociedade civil
organizada, na qual os estudantes se destacaram indo as ruas com suas caras
pintadas de verde e amarelo, ficando conhecido como os caras pintadas, exigindo
punição para Collor e seus comparsas.

No dia da votação houve um grande ato em Natal, no centro da cidade, na


qual a maioria das caras pintadas eram estudantes, porém houve também uma
grande contribuição da esquerda e dos setores civis da sociedade. Nesse mesmo
ano, é eleita uma mulher Eveline Guerra, para assumir a vice-prefeitura de Natal,
pela coligação “Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Social Democrático
(PSB), uma mulher que vinha do movimento feminista e militante do PCdo B. Cabe
salientar que essa coligação foi apoiada pela prefeita Vilma de Faria.

Nas eleições de 1994 é eleita também uma mulher pela coligação “Frente
Popular de Natal” (PT, PCdoB e PCB), para assumir uma cadeira no legislativo
estadual, a professora e militante Fátima Bezerra (PT). Sua plataforma de governo
era o combate a violência e a discriminação praticada contra as mulheres, assim
como direito à saúde e mercado de trabalho. Nesse ano, as mulheres estavam
organizadas na Articulação de Mulheres Brasileiras, e no Fórum de Mulheres do RN
para participar da IV Conferência Mundial da Mulher na China – Beijing. Dentre os
temas a ser discutida estava a política de cotas.

No ano de 1996, temos a primeira eleição realizada com a política de cotas.


Em Natal é eleita Sonali Rosado Cascudo Rodrigues Nelson dos Santos, pelo
PSDB, pela coligação “Unidade Popular” (PPB, PSDB), é eleita também Maria de
Fátima Benetto Fernandes Carrilho pelo PFL, coligação “Frente Democrática pela
Vontade do Povo”( PTB, PCB, PFL, PSB, PV) e Lindalva Maia é eleita primeira
suplente de vereadora pela coligação “Vitória do Povo” (PDT,PRN, PSD). As duas
vereadoras eleitas ficaram no mandato de 1996 a 2000. Além de elegermos mais
uma vez como prefeita, Vilma Maria de Faria Maia, desta vez pelo PSB. Porém,
percebemos que destes partidos citados nenhum cumpriu a política de cotas, o
único partido que cumpriu as cotas neste período, foi o Partido dos Trabalhadores,

89
contudo, não elegeu nenhuma mulher. Mas, foi a partir das discussões do PT que a
política de cotas passou a ser implementadas.

Em 2000, foi eleita a vereadora Fernanda Câmara de Souza Freire com


mandato de 2000 até 2004, pelo PPB (Partido Progressista Brasileiro) coligação
“Unidade Popular” (PPB, PMDB). A prefeitura de Natal estava, nesse período, sendo
disputada por duas mulheres Vilma Maria de Faria e Fátima Bezerra. Foi eleita como
prefeita de Natal Vilma Maria de Faria, pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB),
apoiada mais uma vez pelas forças conservadoras. Sua inserção na política
caracterizou-se pela ocupação em espaços construídos com base na herança
familiar. Enquanto Fátima Bezerra emergiu dos movimentos sociais e assumia o
discurso da esquerda, de independência e ruptura.

Nessas eleições um fato que marcou a mídia local foi os vários boatos que
cercavam as candidatas. De um lado uma candidata petista considerada radical,
vinda de movimentos sociais, taxada de “sapatão”, termo pejorativo e depreciativo
acerca se sua possível orientação sexual, por outro lado temos uma candidata que
já vinha de uma carreira política extensa, desquitada, mas que também não escapou
as agressões e em função de sua separação também foi taxada de “sapatão”. 46
Portanto temos duas mulheres com estilos de vida diferentes, mas que foram alvos
de preconceitos. Por serem pessoas públicas, com poder de governar uma cidade,
eram vistas como mulheres que queriam ser homens. A partir do momento que
mulheres como essas chegam a cargos elevados ou os almejam, a sociedade as
deprecia, ou seja, são discriminadas por esses estereótipos. Por outro lado, as
candidaturas de mulheres são consideradas alternativas, uma vez que as mulheres
são vistas como dóceis e frágeis. Tentando contribuir para modificação deste quadro
de discriminação e preconceitos contra as mulheres é que surgiu a política de cotas.

4.2 – A Política de Cotas no Rio Grande do Norte/Natal

46
No ano de 2008, Fátima Bezerra (PT), pela coligação “União por Natal” (PT, PCdoB, PDT, PRB, PTN,PSB,
PMDB, PCB e PHS) concorreu novamente as eleições majoritárias, desta vez sendo apoiadas pela atual
governadora do Estado, Vilma Faria (PSB) e pelo Senador Garibaldi Alves Filho (PMDB). Sua principal
concorrente é Micarla de Souza, pela coligação “Natal Melhor” (PV, DEM, PP, PMN, PTB). Temos Fátima
Bezerra ligada a grupos considerados conservadores e progressistas contra os grupos considerados mais
conservadores do Estado. O discurso utilizado pela candidata Micarla de Souza marca mais uma vez o
preconceito a sua concorrente, acerca de sua possível orientação sexual, quando ela coloca a importância da
família, de ser mãe, e para ela isso faz a diferença a futura Prefeita de Natal que irá administrar uma cidade.
Apesar disto, Micarla de Souza ganhou as eleições ainda no 1º turno.

90
Em Natal/RN, a primeira experiência com cotas foi em 1996, nas eleições
para a Câmara de vereadores, sendo assegurada uma cota mínima de 20% (vinte
por cento) para as candidaturas de mulheres, e naquele ano, mesmo não
conseguindo preencher a cota estipulada, obtivemos um crescimento de cerca de
111% (cento e onze por cento) das vereadoras eleitas (Cfemea, 1998). Mesmo
tendo crescido o número de candidaturas femininas à Câmara de vereadoras, em
1996, em Natal/RN, como já assinalamos só elegemos 2 (duas) mulheres, Maria de
Fátima Benedetto Fernandes Carrilho eleita pela coligação PTB/ PCB/ PFL/PSB e
Sonali Rosado Cascudo Rodrigues Nelson dos Santos pela coligação PPS, PSDB.
Convém ressaltar que elegemos uma mulher para prefeita, Vilma Maria de Faria
Maia eleita pelo Partido Socialista Brasileiro. Isso mostra que a cota mínima,
portanto não foi alcançada (TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL – T.R.E, 1996).
Embora tenha sido instituída a lei de cotas – lei 9.504/1997, tal lei não mais
estabelecia uma cota somente para as mulheres, mas estabeleceu o número mínimo
de 30% (trinta por cento) e uma cota máxima de 70% (setenta por cento), para
qualquer um dos sexos. Deste modo, esta lei não determina a quem vai beneficiar.
Nas eleições de 1998, para a Câmara Federal e Assembléia Legislativa no
Rio Grande do Norte, houve já uma segunda experiência de cotas, agora
assegurando uma cota mínima de 25% (vinte e cinco por cento) e máxima de 75%
(setenta e cinco por cento) para candidaturas de qualquer um dos sexos.
Pôde-se perceber que mesmo tendo crescido, de maneira expressiva, o
número de candidatas femininas à Câmara Federal e a Assembléia Legislativa nas
eleições de 1998, se comparado com os dados das eleições de 1994, a cota mínima
de 25% (vinte e cinco por cento) não foi alcançada (Cfemea, 1998). Isso se refletiu
nas eleições em Natal/RN, no ano de 2000, em que tivemos 1.216 (Hum mil
duzentos e dezesseis) mulheres candidatas, contra 5.056 (cinco mil e cinqüenta e
seis) homens. Das 1.216 (Hum mil duzentos e dezesseis) candidatas somente uma
vereadora foi eleita: Fernanda Freire, pelo PPB. Natal não conseguiu sequer manter
a situação da eleição de 2000, demonstrando as dificuldades que as mulheres
enfrentam no decorrer da disputas eleitorais, em razão de anos de invisibilidade.
Entretanto, enquanto as mulheres brasileiras comemoravam em 2002, os 70

91
(setenta) anos, do primeiro voto feminino, no RN isto ocorreu em 1928. No Rio
Grande do Norte, as potiguares comemoravam portanto, 74 (setenta e quatro) anos.
No ano de 2004, o Estado do Rio Grande do Norte elegeu 25 (vinte e cinco)
prefeitas, alcançando uma média de 14,97% (quatorze vírgula noventa e sete por
cento) do total de prefeituras, representando o segundo melhor resultado no
Nordeste. Esse percentual torna-se ainda mais significativo se considerarmos que o
Estado recuperou uma queda observada em 2000, quando ficou com apenas 6,6%
(seis vírgula seis por cento), e superou também o índice de 10,8% (dez vírgula oito
por cento) referente a 1996, antes da queda. Tendo conquistado também o maior
percentual de vereadoras do Nordeste, 262 (duzentos e sessenta e duas), ocupando
17,2% (dezessete vírgula dois por cento) das vagas. No entanto, é o RN, único
Estado da Região que não tem vereadoras na capital, mesmo tendo elegido uma
governadora (GARCIA, 2005).

Ainda de acordo com Garcia (IDEM) ao comparar o desempenho das


vereadoras eleitas, na região nordeste, especificamente o Rio grande do Norte, nas
eleições de 1992, 1996, 2000 e 2004, temos o seguinte quadro: em 1992 tivemos
10,6% (dez vírgula seis por cento) de mulheres eleitas, 1996 obtivemos 15,0%,
(quinze por cento), em 2000, 15,4%, (quinze vírgula quatro por cento) e em 2004,
17,2% (dezessete vírgula dois por cento). Observamos, portanto um crescimento
positivo em 2004 em relação aos anos anteriores. Positivo em relação ao número
de mulheres eleitas, porém negativo quando em Natal observamos que a maioria
dessas mulheres não foram reeleitas, pois de acordo com as entrevistadas o
preconceito ainda predomina e os homens se sobressaem, quando se trata de
apresentar projetos e ocupar cargos de liderança, como por exemplo, a presidência
da câmara, que até a presente pesquisa não consta que mulheres tenham assumido
tal posição.

Um dado interessante é que foram os municípios pequenos do RN, que


elegeram as mulheres vereadoras. É o caso de Montanhas, um interior com uma
população com menos de 10 mil eleitores/ hab, porém elegeu 7 (sete) mulheres; da
mesma forma, Parau e Senador Georgino Avelino ambos elegeram 5 vereadoras

92
cada. Desta forma o RN é considerado o estado que tem o maior índice de
vereadoras eleitas comparados a todos os Estados brasileiros 47 .

Os partidos que mais elegeram mulheres no RN foram: PFL, PMDB e PSDB.


A hegemonia desses partidos se deve ao fato de todos eles terem ocupado os mais
altos cargos de poder nas últimas décadas – o PFL hoje DEM (Partido Democrático),
o PMDB, no governo de José Sarney ( 1985 a 1989) e Itamar franco (1992 a 1994)
e o PSDB no governo Fernando Henrique Cardoso, no primeiro mandato ( 1995-
1998) e nos anos subseqüentes segundo mandato em (1999-2000). Não podemos
esquecer que o PMDB é o partido com maior representatividade nos governos
anteriores. Isso refletiu uma tendência do eleitorado a um voto tradicionalmente
ligado ao grupo político que estava ocupando o poder de representatividade a médio
ou longo prazo. Portanto, o partido que mais elegeu vereadoras foi o PFL, seguido
do PMDB. Esses dados nos fazem analisar que esses mesmos partidos que
predominam na política local e nacional são transformados em siglas com novas
roupagens, mas, já estavam no poder desde a Ditadura Militar.

Por outro lado Costa (2007), diz que os partidos políticos têm perdido a
importância como canais de mediação entre o Estado e a sociedade. São deficientes
na articulação e agregação dos seus distintos interesses e, nesse sentido, é
compreensível a constatação dos decrescentes níveis de vinculação das pessoas
aos partidos e o crescente descrédito aos mesmos 48 .

Em 2004 o total de candidaturas mulheres e homens somam 6.683 (seis mil


seiscentos e oitenta e três) as candidaturas femininas tem um total de 1.426 ( hum
mil quatrocentos e vinte e seis), e o percentual de eleitas foi de 18,37% ( dezoito
vírgula trinta e sete por cento). Foram eleitas à vereadoras 262 ( duzentos e
sessenta e duas) mulheres no interior do RN, o equivalente a 17,15% (dezessete
vírgula quinze por cento) do total. Lembramos que o RN conta com 167 (cento e
sessenta e sete) municípios e o número de municípios com mulheres eleitas foi de
134 (cento e trinta e quatro), significando 80,24% (oitenta vírgula vinte e quatro), do
total de municípios. Ainda foram eleitas um total de 25 prefeitas, alcançando 14,97%

47
Percentuais de mulheres eleitas prefeitas em 1992 no RN – 7,24% (sete vírgula vinte e quatro por cento); 1996
– 10,84% (dez vírgula oitenta e quatro por cento); em 2000 – 6,59% (seis vírgula cinqüenta e nove por cento);
2004 – 14,97 (quatorze vírgula noventa e sete por cento) (GARCIA, 2005).
48
Sobre a crise de representatividade ver (COSTA, 2007).

93
(quatorze vírgula noventa e sete por cento) de prefeituras (Mulher e Democracia,
2005).

Em linhas gerais podemos considerar positivo o número de mulheres eleitas


no interior do Nordeste, principalmente por essas regiões terem uma cultura política
diferente de alguns estados, na qual sempre predominou grupos políticos, baseados
no poder de mando, diferentemente de outras regiões, como exemplo a região
sudeste, que apresenta uma população urbana escolarizada, industrializada e o
nível de desigualdades sociais é menor comparado ao Nordeste e algumas regiões
menos desenvolvidas. Apesar de Natal contar com número razoável de mulheres à
frente de movimentos sociais, assumindo a direção de sindicatos como dos
servidores municipais, de professores (as), da saúde, etc. não conseguimos eleger
nenhuma destas militantes 49 .

A ampliação da presença feminina nos espaços de poder é necessária e


rompe com barreiras e preconceitos que ainda defendem, que lugar de mulher é em
casa, e que política é lugar público, é coisa de homem. Temos que mostrar que as
mulheres devem ocupar cargos, assumir mandatos seja, de chefia a ministérios e
chegar a Presidência da República. Contudo, devemos compreender que nossa luta
não é contra os homens e sim contra essa forma de sociedade capitalista, desigual,
injusta e patriarcal. As políticas de cotas são somente mais um dispositivo para
corrigir essas desigualdades, são ações reparadoras que não resolvem os
problemas estipulando números. Contudo, apesar disto são necessárias. É
necessário, portanto que nossa luta se dê também por uma sociedade na qual,
homens e mulheres não precisem de cotas para chegar as Universidades, as
Câmaras Municipais, as Assembléias Legislativas, ao Senado e a Presidência.

Ainda de acordo com Garcia (IDEM), o Brasil integra o grupo de 70 países


com o pior desempenho quanto a presença de mulheres nos cargos eletivos.
Segundo estudo sobre desigualdades de gênero, realizado pelo Fórum Econômico
Mundial, divulgado em maio de 2005, o Brasil, na classificação geral, ficou em 51º
lugar, através de países como Bangladesh, (39º), Zimbábue (42º) e Argentina (35º).
A pior colocação do Brasil foi com relação ao índice de presença em cargos

49
Ao contrário de 2004, nas eleições de 2008 o RN elegeu vinte e cinco mulheres prefeitas. Natal elegeu a
prefeita e duas vereadoras, enquanto a segunda maior cidade Mossoró também elegeu três mulheres, equivalente
a 15% (quinze por cento) o total de eleitas. Portanto mais uma vez o Nordeste é a região que mais elegeu
mulheres e o RN obteve o melhor resultado.

94
decisórios (57º), que inclui cargos políticos, ocupando o penúltimo lugar da listas de
países, perdendo apenas para a Jordânia. Observando esse quadro de sub-
representação, fica evidente o nível de desvantagem das mulheres no Brasil em
relação a outros países considerados poucos desenvolvidos. Isso permite afirmar
que, apesar das mulheres terem os mesmos direitos civis, políticos e econômicos
que os homens, de acordo com legislação brasileira, muitos desses direitos não se
concretizam, por diferentes razões culturais, costumes e praticas sociais
discriminatórias em relação as mulheres.

4.3 – REFLETINDO SOBRE A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES ELEITAS A


PARTIR DOS SEUS PERFIS.

A metodologia utilizada na pesquisa permitiu analisar criticamente a inserção


das mulheres na vida pública do Estado do Rio Grande do Norte, especificamente
em Natal, tendo como eixo central à participação das mulheres na Câmara Municipal
do Natal. A pesquisa analisou a inserção das ex vereadoras através da historiografia
Brasileira e de autores locais, baseados nos dados divulgados pelo TRE (Tribunal
Regional Eleitoral), TSE (Tribunal Superior Eleitoral), e nos próprios dados da
Câmara e dos partidos políticos.

Na pesquisa desenvolvida como já assinalamos fizemos uma revisão


bibliográfica a respeito do tema, além de uma analise histórica e pesquisa
documental no TRE, na Câmara e nos Partidos Políticos, buscando resgatar a
trajetória das mulheres na vida política na Câmara. Em seguida, realizaram-se as
entrevistas semi-estruturadas com as mulheres eleitas, para identificar as suas
visões políticas e razões de sua entrada na vida política de Natal. Escolhemos a
entrevista semi-estruturada porque nela temos maior liberdade de trabalhar com
fontes orais, e podemos fazer perguntas de esclarecimento, tendo uma
compreensão da visão das mulheres candidatas antes das cotas e após as cotas.

Dentre as discussões tratadas no decorrer da pesquisa, escolhemos analisar


as mulheres eleitas vereadoras no município de Natal, delimitando o período
histórico compreendido entre 1988 a 2004. Para analise dos dados foi retirada uma
amostra, tendo como critérios entrevistar todas as mulheres candidatas eleitas de

95
cada partido, levando em consideração os partidos representativos como: PMDB,
PSB, PFL, hoje Democratas (DEM). Partindo desse contexto, entrevistamos as
mulheres eleitas dos partidos citados acima. Isso demonstra que, no período citado
acima foram eleitas 7 (sete) mulheres à frente da Câmara Municipal de Natal, foram
elas: Lindalva Santos Neo Maia, Gilda Medeiros de Souza, Verônica Maria dos
Santos, Ana Catarina Alves, Sonali Rosado Cascudo Rodrigues, Maria de Fátima
Benetto Fernandes Carrilho, Fernanda Freire.

Portanto as entrevistas foram realizadas tendo como critério um questionário


contando com doze perguntas no qual gravamos e escrevemos de próprio punho,
permitindo-nos colher assim todo o relato das entrevistas. Esperamos que as
mesmas permitam-nos construir inferências acerca da participação das mulheres na
Câmara Municipal de Natal.

Para a realização desta pesquisa, contamos com a participação de 5 cinco


mulheres (ex - vereadoras) que, se dispuseram a colaborar com o desenvolvimento
da investigação. Como já mostrado anteriormente, o objetivo era entrevistar 7 (sete)
ex-vereadoras, contundo só conseguimos entrevistar cinco, não obtivemos contato
com a ex vereadora Ana Catarina, apesar da mesma residir em Natal, e com a ex
vereadora, Fernanda Freire que, de acordo com as informações obtidas, a mesma
atualmente não reside em Natal. Com base nas informações fornecidas,
apresentamos a seguir, as cinco vereadoras que estão identificas pela abreviação
de ver.1, ver.2, ver.3, ver.4, ver.5. Adotamos essa abreviação para resguardar suas
identidades.

Como já assinalamos só nos foi possível gravar uma entrevista, pois as


demais entrevistadas não permitiram. Apesar de termos tentado anotar as suas
falas, este fato dificultou a transcrição exata do que foi dito.

Outra dificuldade encontrada foi as respostas sucintas das entrevistadas. A


maioria respondia de forma curta e não desenvolvia maiores argumentos acerca das
questões levantadas, mesmo quando tentávamos incentivá-las.

Estas duas dificuldades se refletem no momento de analisar as falas das ex-


vereadoras, que se apresentam muito sintéticas. Este dado, contudo, mostra
também a forma como essas mulheres entraram na política: quase sempre por

96
influência das famílias ou dos maridos sem, contudo, terem um histórico de
participação e vida política mais ativa na sua cidade. Isto se reflete nas suas falas.

A partir dos dados coletados, inicialmente traçamos o perfil sócio-econômico


destas mulheres. Em relação a faixa etária hoje, todas têm acima de quarenta anos,
portanto eram mulheres jovens quando se elegeram vereadoras. Com exceção da
ver.1, que na época tinha aproximadamente cinqüenta anos. No nível de
escolaridade o que em existe em comum entre as mulheres é que a maioria tem
nível superior concluído e algumas pós-graduações, com exceção da ver. 2 que não
tem nível superior e se considerada dona de casa. Portanto, em sua maioria, todas
têm profissão definida. No que se refere ao estado civil com exceção da vereadora 2
que é viúva todas as outras são casadas. Todas as entrevistadas moram em Natal,
e destas, três são naturais do interior do RN, uma natural de Natal, e uma é natural
de outro estado. A faixa salarial gira em torno de dez salários mínimos. Portanto, são
mulheres esclarecidas, independes profissionalmente e fazem parte da maioria das
mulheres que hoje ocupam 51% do mercado de trabalho.

Para apresentar estes dados, construímos o quadro a seguir:

Perfil das mulheres entrevistadas


Vereadora
Vereadora 1 Vereadora 2 3 Vereadora 4 Vereadora 5
+ de 41 + de 41 + de 41 + de 41
Faixa etária anos + de 41 anos anos anos anos
2º grau
Escolaridade superior completo superior superior superior
Estado civil casada viúva casada casada casada
Capital de
Interior do Interior do outro
Naturalidade RN Interior do RN Natal RN estado
Faixa + de 05
salarial + de 10 SM + de 10 SM SM + de 10 SM + de 10 SM
Profissão aposentada dona de casa médica advogada advogada

97
Convém ressaltar que a maioria das mulheres entrevistadas disseram que
sofreram influência familiar para adentrar na política, além da maioria terem laços
familiares com grupos conservadores, ou seja, oligarquias locais. Percebemos isto
quando analisamos quais os partidos e as coligações em que essas mulheres
disputaram as eleições, partidos considerados de direita. No universo dessas
mulheres entrevistadas constatamos que elas sofreram influência política seja de
companheiros ou pais, e algumas tornaram-se candidatas por vontade própria. A
respeito dos motivos que as levaram a ingressar na política partidária, a ver.4
respondeu que o que a motivou foi a “vontade de servir a minha cidade”, a ver.1
afirmou “sempre fui doida por política, entrei por vontade própria, mas a convivência
familiar interferiu.

Não podemos negar dos seus interesses em servir a comunidade, ao povo,


representar os desejos da população. Ao contrário da ver. 2 que entrou na política
por imposição do marido, pois o mesmo não podia sair candidato e como tinha uma
certa popularidade diante da população e o apoio dos políticos conservadores,
resolveu candidatar sua esposa com uma certeza que ela seria eleita. A respeito
disso, esta vereadora, na sua fala afirmou:

A família estranhou minha decisão de entrar na política, uma vez que eu


era uma pessoa calma, tranqüila e achavam que ela não tinha condições de
ser eleita. O jogo de interesses de determinados grupos políticos e a disputa
existente para mostrar o poder que detinha, impõe esse tipo de
comportamento.

Podemos perceber que o poder é exercido principalmente pelos homens.


Segundo Marx, o poder se dá a partir das relações sociais que lhe dão sentido, ou
seja, visto numa perspectiva de totalidade qualquer explicação a respeito de poder
deve ser baseada no conjunto das relações sociais. Neste sentido, no conjunto das
relações sociais, historicamente os homens são sempre os pólos dominantes.

De forma geral, a maioria das mulheres ao serem questionadas sobre a sub-


representação delas na Câmara Municipal de Natal, ou seja, na política partidária
responderam que a mulher é discriminada. A respeito disso a ver.2 respondeu:

98
Há uma rejeição, por ser mulher, os homens não gostam e não aceitam as
mulheres na Câmara, acham que as mulheres atrapalham o seu trabalho,
não gostam pelas suas ações (deles), acredito que seja isso, os homens
são machistas. Eles desestimulam as mulheres no próprio partido, porque o
partido já sabe quem vai ou não se eleger e a mulher fica em segundo
plano.

A vereadora 1, respondeu que a sub-representação se dá pelos obstáculos para que


a mulher chegue na política:

Acho que tudo gira em torno da discriminação, a mulher é tida


como sexo frágil, há avanços com a política de cotas, mas
temos muito a avançar, ainda há submissão.

A esse respeito a ver. 2 e 5 mostram que a mulher tem que conciliar a


questão familiar com a política e a mulher sofre por não se desligar dos laços
familiares. Desta forma, segundo as entrevistadas há uma rejeição da população
quando se é mulher nas campanhas políticas. A vereadora 4 não acha que tenha
sofrido preconceito no seu mandato, talvez pela profissão que exerce - advogada -
entretanto colocou que as dificuldades encontradas pelas mulheres nas campanhas
políticas se dá principalmente pela falta de estrutura financeira. Quando questionei
se a política partidária se constitui obstáculo para que mais mulheres se candidatem
a mesma respondeu que não, mas é preciso maior divulgação para mostrar a
importância da participação feminina na política.

Sobre as dificuldades encontradas pelas mulheres nas campanhas políticas,


foram várias as respostas, mas predominou principalmente o fato de ser mulher.

Por ser mulher ela sofre, por não se desligar dos laços familiares. As
dificuldades enfrentadas pelas mulheres ao adentrar na política partidária
principalmente, por ser mulher, mãe e ser esposa de político. Isso
demonstra a preocupação que a mulher tem com sua vida privada, de ser
mãe e ao mesmo tempo dividir as preocupações de casa, com a sua vida
na política (ver.5).

Nessa fala percebemos uma visão moralista, conservadora que ser mãe
dificulta se desligar dos laços familiares, isto é conciliar a vida familiar com a carreira
política. Nesse sentido todos os fatores relacionados no decorrer da pesquisa sobre
os determinantes da sub-representação das mulheres nos espaços de poder está
sendo demonstrado nas falas das mulheres, principalmente a visão machista e
moralista que predomina até a atualidade.

99
A esse respeito, nas falas das mulheres percebe-se o descaso dos partidos
com os anseios políticos das mulheres.

Deve-se obrigar os partidos a pensar a questão da mulher e dar melhores


oportunidades para que possam participar da política. A falta de uma
estrutura financeira maior é uma das dificuldades, além do descrédito nos
políticos (ver. 5).

Não vejo a política partidária como um obstáculo, o que se constituem são


as determinadas posições impostas pelo partido, eu discordo. O partido
também exige dos homens, uma taxa de cobrança para sustentar o partido.
Porém, em determinadas ocasiões as posições do partido limitam as ações
das mulheres (ver.1).

A política partidária não se constitui como obstáculo, contudo, para que isto
seja implementado definitivamente, é preciso mais divulgação e importância
da participação feminina (ver. 4).

A respeito das políticas de cotas foram várias as opiniões, somente uma acha
que não deveria existir a política de cotas para as mulheres, pois reforça o
preconceito e a discriminação, mas por outro lado obriga os partidos a pensar a
mulher na política e valorizar mais o papel delas nos partidos, as outras acham
importante. Acerca disto, as entrevistadas afirmaram:

Há discriminação à mulher; por isso acho boa, dentro do objetivo que é a


mulher e obriga os partidos a pensar melhor a mulher ( ver.5)

Acho que deveria ser 50%”, entendemos a defesa de direitos iguais entre
mulheres e homens no parlamento ( ver.3).

Se a pessoa é líder comunitária e tem condições deveria ser candidata,


independente de cotas ( ver.2).

Para Miguel e Grossi (2001), a política de cotas é medida que visa alterar o
quadro de Desigualdades-raciais, étnica, sexual e social. Neste sentido, como já
assinalamos, as ações afirmativas reconhecem as discriminações existentes e agem
no sentido de impedir que as mesmas se perpetuem. Desta forma, na nossa opinião

100
há uma visão limitada por parte das vereadoras, acerca da política, talvez por falta
de conhecimento ou posição política.
Portanto, assim como Miguel e Grossi (IIDEM), as entrevistadas corroboraram
com o mesmo pensamento, na defesa de mudar o quadro das desigualdades nos
parlamentos. Ainda sobre essa questão quando indagadas se essa política deveria
ser definitivamente implementada, todas afirmaram que era necessário uma maior
divulgação, apoio e vontade dos partidos para que sejam implementadas.
Além disso, percebemos uma contradição na fala da ver..5 quando diz: Não
acho que seja necessário essa obrigatoriedade, mas precisa mais vontade dos
partidos e melhor espaço da ala masculina”.

Segundo Araújo (2006), como os eleitores votam nos partidos e não nos
candidatos, tende-se a uma transferência mecânica da proporção de candidaturas
femininas para a proporção de mulheres no parlamento. Isto se dá porque as cotas
estão associados ao sistema eleitoral e o caráter da lista aberta ou fechada.

A maioria das mulheres entrevistadas ao serem questionadas a respeito da


sub-representação disseram que havia preconceito, discriminação por parte dos
homens e falta de interesse dos partidos e de divulgação para que as mulheres
cheguem a Câmara. Vejamos a fala da ver. 1 e ver.2:

Acho que tudo gira em torno da discriminação á mulher, a mulher é tida


como frágil na visão dos homens, há muito a avançar, ainda há submissão
poucas mulheres enfrentam a política, há muitos obstáculos para que a
mulher chegue a política ( ver.1).

A parte familiar da mulher, maternal, para ser conciliada é difícil,


principalmente no nordeste, Natal é uma cidade tradicional, votar em mulher
é um passo moderno (ver.5).

A esse respeito Santos (2003), para definir sub-representação, afirma que a


“sub-representação é a construção cultural que fortalece e determina o lugar da
mulher restrito ao espaço privado”, neste caso nos espaços de poder, ou seja, no
parlamento. Isso nos faz supor que o pensamento das mulheres vereadoras e o
conceito de Santos se aproximam e ambas corroboraram com o mesmo
pensamento que a sub-representação passa pela questão cultural, pois cabe a
mulher cuidar da casa, dos filhos e do marido, e, portanto cabem a elas as tarefas
domésticas. Porém, enfatizo que as entrevistadas em nenhum momento colocaram
que vivemos em uma sociedade de classes, onde existem os que exploram e os

101
explorados, e que esse baixo índice das mulheres nos espaços de poder é uma
das conseqüências dessa sociedade capitalista e patriarcal.
A visão das entrevistadas acerca da política ressalta seu aspecto negativo e
também de falta de credibilidade quando acreditam que a política deveria ser
voltada para o povo. Nas falas de algumas das entrevistadas, percebemos isso:

A política é decepção porque os políticos se voltam para os interesses


próprios, são poucos que se preocupam com a questão social, política é
honestidade, é trabalhar pelo social, a política deveria ser voltada para o
povo (ver.1).

Política é a arte de servir ao povo, política é a representação dos desejos da


população, o voto distrital representa os desejos da população (ver.5).
Política é uma arte importante de liderança, lidar com a capacidade de
ajudar ao próximo ( ver.3).

Há também uma confiança na política, quando afirmam que, através dela


resolve-se os problemas existentes na sociedade, entretanto compreendemos que
na sociedade capitalista, a política está a serviço da burguesia e de interesses
próprios dos políticos carreiristas que, contudo, apresentam as eleições e os
políticos como se fossem resolver as discriminações, a pobreza e as desigualdades
sociais.

102
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desta pesquisa surgiu da necessidade de entender quais as


razões da sub-representação das mulheres na política partidária e quais, os
determinantes que obstaculizam as mulheres uma maior participação na vida
política, tendo como enfoque central a inserção das mulheres na Câmara Municipal
de Natal no período de 1988 a 2004. O objetivo desse trabalho foi analisar a
representação política das mulheres e como estavam inseridas nesses espaços.
Realizamos entrevistas semi-estruturadas através de roteiros e gravação em áudio,
a partir da qual apreendemos o entendimento que as ex-vereadoras tinham sobre
política partidária, política de cotas e principalmente buscando entender quais as
dificuldades encontradas durante o exercício político para analisar quais as razões
da sub-representação das mulheres nos espaços de poder. Isso se deu em razão de
entendermos a importância de um pleito eleitoral para a vida dessas mulheres e da
própria população natalense.
A situação atual da representação política feminina no Poder Municipal,
resultante das eleições de 1988 a 2004, apresenta níveis muitos baixos de presença
feminina nas Câmaras e nas prefeituras. Principalmente pelo fato de nenhum partido
cumprir a política de cotas de no máximo 30% (trinta por cento) para cada sexo. A
discriminação das candidatas dentro dos partidos passa fundamentalmente pelos
baixos investimentos, inferiores aos recebidos pelos homens em suas campanhas; a
sobrecarga de atividades da vida privada que recaem sobre as mulheres,
restringindo-lhes o tempo que seria dedicado a vida pública, para articular a
campanha e outras atividades referentes a militância política. Apesar disso, foi
registrado percentual positivo de mulheres eleitas em algumas prefeituras do Rio
Grande do Norte, embora a diferença não seja tão grande e Natal não tenha
nenhuma representação feminina na Câmara Municipal de Natal. Esses percentuais,
em geral demonstram que as mulheres têm muito ainda a conquistar.
A analise das entrevistas evidenciou a identificação entre as práticas
construídas pelas mulheres e o seu entendimento a respeito do que realmente
significa política para elas, mostrando as dificuldades decorrentes de preconceitos

103
e discriminações, além de conciliar a carreira política com o fato de ser mãe,
progenitora e não conseguir se desvencilhar dos laços e obrigações familiares.
Os vários questionamentos levantados a respeito das políticas de cotas na
concepção das mulheres se dão, principalmente, pela falta de interesse dos
partidos, já que não há divulgação e valorização da participação das mulheres na
política. No tocante ao que se refere ao percentual exigido para que as cotas
sejam cumpridas algumas vereadoras concordam que deveria ser de 50%
(cinqüenta por cento), para haver igualdade entre mulheres homens, já que as
cotas vêm no sentido de diminuir as desigualdades e impedir que as mesmas se
perpetuem. No que diz respeito a sub-representação das mulheres nos espaços
de poder pode se observar que as mulheres relacionam esta questão ao
preconceito e a discriminação sofrida por parte dos homens, pois estes não
aceitaram as mulheres disputando os mesmos cargos. Deste modo, entendemos
que esse é dos elementos que influenciam nesta falta de interesse e divulgação
dos partidos da política de cotas.
A nossa última questão dizia respeito ao que essas mulheres entendiam por
política. As respostas mostraram uma visão bastante limitada que se distancia
das idéias de alguns teóricos que vêem a política na sociedade capitalista como
algo negativo, como expressão da alienação e obstáculo a construção humana.
Para elas política é a arte de servir, liderar, voltada para o povo e para a
construção do bem comum. Contudo, questionamos: que democracia é essa que,
muitas vezes, o “povo” não tem opção de escolher em quem votar porque é
obrigado a trocar seu voto por tijolos, remédios, próteses dentárias e dinheiro,
uma vez que os partidos políticos continuam usando o poder para barganhar
votos entre os mais necessitados.
Percebemos que uma das formas dos homens perpetuarem a exclusão das
mulheres da vida política é a eliminação da evidência de sua participação no
passado e suas contribuições no presente. Porém, não podemos esquecer que
muitas dessas mulheres exerceram grandes influências e contribuíram para o
conhecimento e bem-estar humano e o seu papel na história vem sendo
reconstruído pelo movimento feminista.

Assim, com este trabalho esperamos contribuir para a discussão da sub-


representação das mulheres na política e para a percepção de como o sistema

104
patriarcal, ao longo do tempo, contribuiu para a internalização dos valores, regras
e normas de subordinação ao poder masculino.Todas essas discussões
levantadas a respeito da inserção feminina na política, nos trouxeram subsídios
para entender melhor como a mulher vem conquistando seu espaço na sociedade
capitalista, através do movimento feminista, que foi importantíssimo pelas
transformações e lutas na defesa por igualdade de direitos.

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113
APÊNDICES
Entrevista

I - Perfil Sócio –Econômico

1) IDADE:
( ) 15-20 anos
( ) 21-25 anos
( ) 26-30 anos
( ) 31-35 anos
( ) 36-40 anos
( ) 41 ou mais anos.

2) ESTADO CIVIL:
( ) solteira
( ) casada
( ) separada
( ) viúva
( ) divorciada
( ) união estável

3) LOCAL DE NASCIMENTO
( ) Natal
( ) Interior do Rio Grande do Norte
( ) Interior de outros Estados
( ) outras capitais

4) NÍVEL DE ESCOLARIDADE:
( ) 1° grau incompleto
( ) 1° grau completo
( ) 2° grau incompleto
( ) 2° grau completo
( ) 3° grau incompleto
( ) 3º grau completo

114
( ) pós-graduação

5) FAIXA SALARIAL FAMILIAR


( ) até 1 Salário Mínimo.
( ) a partir de 1 Salários Mínimo até 5.
( ) mais de 5 salários mínimos até 10
( ) mais de 10 salários mínimos.

II – Parte (Reflexão)

1) O que a motivou a entrar na Política?


2) Antes de participar da política partidária qual era sua profissão?
3) Você tem ou teve participação nos movimentos sociais?
4) Como sua família reagiu diante da sua decisão?
5) Quais as dificuldades encontradas pelas mulheres nas campanhas políticas?
6) E no próprio exercício político dos movimentos sociais?
7) Qual a sua opinião a respeito da política de cotas?
8) O que falta para que essa política seja definitivamente implementada?
9) De acordo com o seu ponto de vista, quais as razões da sub-representação da
mulher na câmara municipal de Natal?
10) O que entende por política?
11) A política partidária se constitui como um obstáculo para que mais mulheres
se candidatem? Qual sua opinião a este respeito?
12) Qual é a sua ocupação principal hoje?

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