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NATAL
2008
ALUIZIA DO NASCIMENTO FREIRE
NATAL
2008
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3
4
Esta é a mulher moderna: a autodisciplina, em vez de um
sentimentalismo exagerado, a apreciação da liberdade e da
independência, em vez de submissão e de falta de
personalidade; a afirmação da sua individualidade e não os
estúpidos esforços para se identificar com o homem amado; a
afirmação do direito a gozar dos prazeres terrenos e não a
máscara hipócrita da pureza, e finalmente, a subordinação das
aventuras do amor, a um lugar secundário na vida. Diante de
nós temos não uma fêmea, nem uma sombra do homem, mas
sim uma mulher-individualidade (Alexandra Kollontai)
5
AGRADECIMENTOS
6
LISTAS DE SIGLAS
7
PFL - Partido da Frente Liberal
PHC - Partido Humanista Cristão
PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PPS - Partido Popular Social
PPB - Partido Progressista Brasileiro
PRN - Partido da Renovação Nacional
PSB - Partido Socialista Brasileiro
PSD - Partido Social Democrático
PSDB - Partido do Social Democrático Brasileiro
PT - Partido dos Trabalhadores
PTB - Partido Trabalhista Brasileiro
PTR - Partido Trabalhista Renovador
RN - Rio Grande do Norte
SBPC - Sociedade Brasileira Pelo Progresso da Ciência
TRE - Tribunal Regional Eleitoral
TSE - Tribunal Superior Eleitoral
UFB - União Feminina do Brasil
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
8
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre a inserção das mulheres na Câmara
pesquisa consta ainda de uma análise do perfil das mulheres vereadoras e como
elas eram vistas nesse espaço de poder. Analisamos o nosso objeto de estudo
das entrevistas por sua vez, apontam para a sub-representação das mulheres ao
longo dos anos como fator determinante para que essas mulheres continuem na
9
nossa sociedade e ainda predomina e atinge as mulheres em todos os âmbitos de
sua vida. Isto se torna mais grave na sociedade capitalista na qual predomina os
10
ABSTRACT
This work has as objective to reflect about the insertion of the women in the City
Council of Natal in the period from 1988 to 2004. We focused our discussion in the
context of the politics of quota that has with objective to decrease the frame of
inequalities existent between women and men in the politics, besides of to analyze
research still consists of an analysis of the councilor’s women profile and how they
were seen in that space of power. We analyzed our study object in a gender vision,
since this is related intrinsically the social relationships and the relationships of
power. The women, for a long time, they were excluded of the participation in the
public life, being just seen as mere expectants. This research is informed mainly by
studies which discuss the Gender (Scott, 1990), (Perrot, 1988), (Badinter, 1995),
(Bruschini, 2002). We also analyzed the power, politics in the vision of Marx (1996),
Foucault (1982) and (Arendt, 2001). We tried to analyze the women's presence in
the spaces public and private, showing your conflicts and contradictions faced in the
society, focalizing the political character of the women's inclusion in the spaces in
that are inserted. The instrument of collection of data was the semi-structured
show to the sub-representation of women over the years as a determining factor for
these women continue in the invisibility. The women were interviewed councillora
ex- bounded from 1988 to 2004. The conclusion the one that we arrived is that this
sub-representation has as decisive the patriarchal system that prevailed for a long
time in our society and still dominates and affects women in all areas of your life. This
becomes more serious in the capitalist society in which prevail the interests of those
KEY-WORDS:Gender.Power.Patriarchate.
11
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO.......................................................................................................12
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................103
REFERÊNCIAS........................................................................................................106
APÊNDICES.............................................................................................................114
12
1- INTRODUÇÃO
13
mulheres. Neste sentido, o principal objetivo dessa pesquisa consistiu em analisar
as relações de gênero na Câmara Municipal, situada na cidade do Natal/RN, visando
verificar a submissão feminina nesses espaços de poder.
A escolha do nosso objeto se deu a partir da análise de dados do Tribunal
Regional Eleitoral, através dos requerimentos na Câmara e, principalmente, através
das entrevistas com as ex-vereadoras. Através dos dados do tribunal obtivemos o
número de mulheres eleitas no período de 1988 a 2004. Escolhemos este recorte
porque em 1988, pós - ditadura militar, foi elaborada uma nova Constituição que, em
parte, reconhecia os direitos das mulheres, abolindo o pátrio poder, garantindo a
“igualdade” entre homens e mulheres na sociedade e na família. Este recorte se
estendeu até 2004 porque nesse período nenhuma mulher teve representação
política na Câmara Municipal de Natal.
São vários os questionamentos levantados, entre eles: como se dão as
relações de poder na Câmara? O que falta para que as mulheres participem da vida
política e para que tenham uma maior visibilidade? Quais os determinantes que
obstaculizam as mulheres de uma maior participação na vida política? Como está a
representação política das mulheres na Câmara Municipal de Natal? Qual o perfil
das mulheres que pleiteiam ou ocupam cargos na Câmara de vereadores de Natal?
Que elementos dificultam as mulheres terem uma maior participação na vida
política?
O conceito de política chegou até nós, a partir dos gregos, com a retomada do
pensamento dos autores clássicos da Grécia antiga a partir do Renascimento e do
Iluminismo 1 , no século XVI. Desta forma, as sociedades ocidentais da atualidade
tiveram sua organização política pensada a partir dos autores gregos.
1
Iluminismo ou século das “Luzes” é o projeto racionalista que se inaugura na Polis Grega, caracterizado como
um projeto sócio cultural de largo curso histórico, que visa à emancipação, baseado no conhecimento
racional.(NETTO, 2002).
14
O método de análise da realidade escolhido foi a perspectiva crítico –
dialética, a partir das categorias totalidade, contradição e historicidade. A revisão da
literatura existente na área se fez imprescindível nesse processo, para a melhor
compreensão do objeto de estudo. Para nortear nosso estudo, nos baseamos nas
seguintes categorias centrais: relações de Gênero, Patriarcado e Poder nos
detendo, particularmente, nas discussões acerca da Sub-representação política da
mulher no contexto das políticas de cotas. Para isto, nos aproximamos de autores e
autoras que discutem tais questões, entre eles e elas: Scott (1990), Safiotti (2004),
Santos (2004), Marx (2006), Foucault (1982), Arendt (2001) Toledo (2001). Acerca
da Política de cotas buscamos autores como Miguel e Grossi (2001), Bruschini
(2002), Araújo (2002) e Cfêmea (1998 2004).
Primeiramente, foi feito um levantamento bibliográfico a respeito do tema,
uma análise histórica e uma pesquisa documental no TRE, na Câmara Municipal e
nos Partidos Políticos, buscando resgatar a trajetória das mulheres na vida política
da Câmara. Em seguida, realizaram-se as entrevistas semi-estruturadas 2 com as
mulheres eleitas, para identificar as suas visões políticas e razões de sua entrada na
vida política de Natal. Escolhemos a entrevista semi-estruturada porque nela temos
a liberdade de trabalhar com fontes orais, na qual podemos fazer perguntas de
esclarecimento e teremos a oportunidade de entender a inserção das mulheres na
política, tendo uma compreensão da visão das mulheres candidatas antes das cotas
e após as cotas. Partindo do conceito de Fraga, as fontes orais se mostram,
metodologicamente, essenciais, porque privilegiam a análise das representações
sobre a política, já que as fontes escritas são escassas e repassam, por vezes, a
visão dos grupos dominantes (FRAGA, 2000).
15
citado acima foram eleitas 7 (sete) mulheres à frente da Câmara Municipal de Natal,
foram elas: Lindalva Santos Neo Maia, Gilda Medeiros de Souza, Verônica Maria
dos Santos, Ana Catarina Alves, Sonali Rosado Cascudo Rodrigues, Maria de
Fátima Benetto Fernandes Carrilho e Fernanda Freire.
16
A escolha da observação se deu primeiramente na Câmara Municipal pela
possibilidade entrar em contato com a realidade em estudo, não somente através da
análise dos documentos e requerimentos propostos pelas vereadoras, assim como
as falas das entrevistadas, e também porque tal método permitiu analisar a realidade
em momentos diversos do seu cotidiano de forma assistemática. Assim, através da
observação buscamos analisar como as mulheres estavam inseridas nos espaços
de poder.
Os espaços selecionados para a pesquisa foram o Tribunal Regional Eleitoral
e a Câmara Municipal de Natal. Nossa análise documental tinha como objetivo
conhecer as mulheres, as demandas e daí possibilitar a escolha da amostra da
pesquisa. Usamos como referencial de análise os requerimentos solicitados pelas
mulheres, durante seus mandatos. Os documentos são restritos dificultando o
andamento da pesquisa. Como já assinalamos, entrevistamos 5 (cinco) mulheres
eleitas vereadoras na cidade de Natal, pois não conseguimos contatar com as duas
ex vereadoras, Ana Catarina Alves Wanderley - segundo as informações ainda
reside em Natal - e Fernanda Freire, que reside atualmente no Rio de Janeiro.
Portanto, não foi possível entrevistar todas as ex-vereadoras.
As entrevistas foram realizadas no período de 2008, no segundo semestre,
durante todo o mês de julho e todas foram realizadas de forma individual e em
ambiente reservado.
Apesar das dificuldades encontradas para a realização da pesquisa, como o
receio de algumas ex-vereadoras em conceder as gravações das entrevistas, além
de problemas de ordem estrutural, buscou-se o esforço, no sentido da maior
apreensão possível para o desvelamento do nosso objeto de estudo.
Podemos afirmar, após a realização desse estudo, que as desigualdades
sociais, preconceitos e discriminações ainda predominam na atualidade e apontam
para a continuidade do processo de segregação de gênero, no campo da
sexualidade, seja no campo da política.
17
mulheres. Uma das explicações para a limitada participação da mulher nas esferas
de poder está ligada a questões econômico-sociais. Quanto melhor o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) de um país, mais equilibrada é a participação das
mulheres nos espaços de poder. A lentidão do avanço das mulheres no campo
político também está relacionada com a propriedade da riqueza, uma vez que
apenas 4% (quatro por cento) da riqueza do mundo está nas mãos de mulheres.
(CFEMEA, 2006). A respeito dessa questão as analises apresentadas sobre a sub-
representação das mulheres na política e os dados analisados encontram-se no
corpo do texto.
Ainda no ano de 2004, a média nacional de candidaturas de mulheres para as
câmaras municipais foi de apenas 22,1% (vinte e dois vírgula um por cento). Ou
seja, os partidos não cumpriram mais uma vez, a política de cotas vigente desde as
eleições de 1996. Além disso, voltaram a apresentar candidaturas laranja 3 e a não
apoiar efetivamente as campanhas das mulheres. O resultado efetivo foi que, dos
51.808 (cinqüenta e um mil oitocentos e oito) vereadores(as) eleitos no País, apenas
6.556 (seis mil quinhentos e cinqüenta e seis) são vereadoras, o que significa que a
média nacional de mulheres ocupando o cargo de vereadoras é só de 12,6% (doze
vírgula seis por cento), enquanto os homens chegam a 87,4% (oitenta e sete vírgula
quatro por cento). O Nordeste se coloca acima da média nacional, com 14,63%
(quatorze vírgula sessenta e três por cento) o que corresponde a 2.420 (dois mil
quatrocentos e vinte) vereadoras eleitas na região, em 2004. Isso tem se figurado
em todas as eleições. Dos 5.560 (cinco mil quinhentos e sessenta) municípios
brasileiros, hoje apenas 418 (quatrocentos e dezoito) são governados por mulheres.
Em termos das candidaturas de mulheres ao cargo de prefeita, observou-se uma
grande discrepância, tanto entre os estados quanto entre os diversos partidos
políticos. O percentual de candidatas mulheres distancia-se muito da média
nacional: 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento), variando de 3,70% (três
vírgula setenta por cento) a 17,31% (dezessete vírgula trinta e um por cento) por
Estado. Em termos de partidos políticos, a variação é de 0% (zero por cento) a
18,27% (dezoito vírgula vinte e sete por cento) em todo o país 4 .
3
Candidatura laranja termo utilizado para designar candidaturas de “mentirinha”, ou seja, inscrições que tinham
como objetivo, apenas completar o quadro de candidaturas. Prática corrente nas disputas eleitorais em que os
candidatos(as) emprestam seu nome sem nenhum compromisso político (GROSSI E MIGUEL, 2001).
4
Dados retirados do Boletim do Centro de Informação, Pesquisa e Comunicação da Mulher e Democracia, ano
1, nº 01 abril/julho, 2005.
18
Embora o movimento feminista tenha se destacado no cenário político nos
mais diversos espaços e eventos nacionais e internacionais, a presença das
mulheres ainda é restrita em espaços estratégicos como na política; inclusive nas
três esferas do poder: Legislativo, Executivo e Judiciário. As mulheres estão sub-
representadas nesses espaços, pois ainda permanece a resistência por parte dos
dirigentes em relação as pautas comprometidas com a equidade de gênero,
consideradas de menor importância.
5
A discussão acerca da política de cotas será feita posteriormente.
19
até chegar às transformações por elas protagonizadas durante a modernidade e na
contemporaneidade, através do movimento feminista.
Posteriormente, no terceiro capítulo, analisamos as mulheres na sociedade
brasileira enfatizando a situação delas no Brasil Colônia e a influência das
oligarquias do Rio Grande do Norte e Natal, buscando-se analisar a participação
política das mesmas na esfera pública e privada, bem como se davam e se dão as
relações sociais, uma vez que ainda predomina o poder dos homens sobre as
mulheres. Analisaremos ainda neste capítulo, os efeitos das políticas de cotas e
como elas vêm modificando o quadro de desigualdades na política partidária e seus
efeitos na luta pela equidade de gênero. Este capítulo teve como eixo central a
discussão das relações de gênero na sociedade patriarcal brasileira e potiguar e as
suas modificações pós - políticas de cotas.
No quarto e último capítulo, apresentamos um quadro representativo das
mulheres eleitas em Natal/RN, de 1988-2004, a partir de uma reflexão da
participação das mesmas, tendo como parâmetro de discussão o perfil delas.
Apresentamos ainda as falas destas mulheres, enfocando, como elas estavam
inseridas nesse espaço de poder uma vez que predomina a figura masculina. Desta
forma, analisamos a presença feminina na política potiguar, discutindo as relações
de gênero existentes no local pesquisado.
Podemos afirmar, a partir desse estudo, que as desigualdades sociais,
preconceitos e discriminações ainda predominam na atualidade e apontam para a
continuidade do processo de desigualdades e discriminações as mulheres. Neste
sentido, todas as entrevistadas relataram preconceitos e discriminações sofridas
pelo fato de serem mulheres.
20
lugares antes predominantes dos homens, mostrando nas suas ações e suas vidas,
o movimento feminino e feminista de participação das decisões e nos espaços de
poder.
21
Na visão de Lima (2002), todas as abordagens trazem contribuições e
limitações. A abordagem do patriarcado prende-se a uma análise interna ao sistema
de gênero, afirmando a prioridade desse sistema em relação à organização social;
as abordagens marxistas, por vezes, fazem o inverso da anterior: o gênero torna-se
um sub-produto das estruturas econômicas e a última abordagem tende a uma
fixação exclusiva no sujeito e na ênfase ao antagonismo subjetivamente produzido
entre homens e mulheres.
A este respeito, concordamos com a visão analisada por Scott e Lima, por
entender que a opressão da mulher passa por estes três elementos enfatizados
pelas abordagens, ou seja, pelo patriarcado, pelo modo de produção e pela
formação subjetiva, fruto da história de vida e inserção cultural. Contudo,
consideramos importante assinalar, desde já, nossa posição teórica: para nós, a
transformação passa, fundamentalmente, pela modificação das relações econômico-
sociais e o estabelecimento do socialismo 6 . Entretanto, temos a compreensão que,
com a chegada do socialismo e o fim do capitalismo, as mudanças não se darão
automaticamente, já que são frutos de um processo histórico. A questão das
desigualdades sociais, as diferenças, preconceitos e a opressão da mulher, são
construções sociais que levam tempo para serem desconstruídas. Mas, ao nosso
ver, o estabelecimento do socialismo, em condições para a igualdade e liberdade é
o começo desta transformação cultural, podendo ou não se efetivar.
6
Socialismo - entendemos a proposta do socialismo como a construção de uma nova sociedade na qual os
homens e as mulheres tornem-se a medida de todas as coisas. Neste sentido a sociedade socialista deverá ser
justa, mas sempre preservando a liberdade. Portanto, o socialismo em condições para a igualdade e liberdade
acontecer.
22
de agir de acordo com ele. As relações patriarcais, suas hierarquias, sua estrutura
de poder “contaminam” a sociedade e o direito patriarcal perpassa toda a sociedade
civil, mas impregna também o Estado. Para a autora nas relações sociais de gênero
se imbricam, o patriarcado e o racismo e estes não estão indissociados das classes
sociais. Isso faz supor que, existe não apenas uma hierarquia entre as categorias de
sexo, mas também uma contradição de interesses entre as classes e entre as raças.
Desta forma, não basta que uma parte das mulheres ocupe posições
econômicas, políticas, religiosas etc, tradicionalmente reservada aos homens, para
modificar a sociedade, pois estas mulheres também personificam relações de
poderes de classe e de raça e não só de sexo. Deste modo, qualquer discussão
sobre participação política das mulheres não pode ser dissociada da discussão
acerca da classe social e da raça das quais estas mulheres fazem parte.
7
No campo das teorias feministas, muitas autoras se filiam ao pós-estruturalismo e as posturas teóricas que
enfatizam “a desconstrução”. Tal filiação, em parte, se explica pela necessidade que têm, as feministas, de erodir
as certezas, construídas ao longo dos séculos, sempre na perspectiva masculina. Assim, agora, enfatiza-se a
necessidade de “desconstruir” estes saberes e construir um novo saber, mais eqüitativo e feminista (SCOTT,
1990).
23
Se contrapondo ao conceito de Scott que por sua vez, define gênero como
categoria de análise, Saffioti (IBIDEM), afirma que o conceito de gênero pode
representar uma categoria social-histórica, se tomado em sua dimensão meramente
descritiva, ainda que seja preferível voltar a velha expressão categoria de sexo.
Nesse caso, podemos afirmar que a categoria gênero, no sentido defendido por
Saffioti faz entender a construção sócio-histórica que as mulheres tiveram. Por outro
lado, Saffioti questiona a categoria gênero, uma vez que esta não explicita, as
desigualdades nem o poder, nem aponta a parte oprimida, ou seja, o termo gênero é
despolitizado, não diz o que é a opressão, nem quem é o oprimido. Portanto, gênero
diz respeito as representações do masculino e do feminino, a imagem construída
pela sociedade a propósito do masculino e do feminino, estando estas inter-
relacionadas. As construções simbólicas em geral guardam pouca ou nenhuma
relação com a realidade concreta, com as condições materiais de vida e com os
fatos históricos. Desta forma, o conceito de gênero, segundo a autora, nunca pode
ser dissociado das relações patriarcais, das relações de raça/etnia e das relações de
classe, pois estas tornam o sujeito histórico concreto.
Neste sentido Scott, (1990, p.16), define gênero a partir de dois aspectos
fundamentais e intrinsecamente relacionados: as relações sociais e as relações de
poder. “As relações sociais, que são baseadas nas diferenças entre os sexos,
implicam na existência de elementos inter-relacionados, que não operam
necessariamente de modo simultâneos ou dependentes”. Nesse caso, a autora
ressalta a relação existente entre gênero e poder, articulados entre si, que se define
como igualdade e desigualdade no qual divide-se o campo feminista. Gênero assim
é um primeiro modo de dar significado as relações de poder (IBIDEM, 1990 ). Por
isso, as mudanças na organização das relações sociais correspondem sempre a
mudanças nas representações de poder.
24
na qual qualquer explicação acerca da relação de poder deve ser baseada no
conjunto das relações sociais da qual faz parte 8 .
O conceito de política chega até nós, a partir dos gregos, com a retomada do
pensamento dos autores clássicos da Grécia antiga a partir do Renascimento e
Iluminismo, no século XVI. Desta forma, as sociedades ocidentais da atualidade têm
sua organização política pensada a partir dos autores gregos. É lógico que, os
autores da Grécia antiga (Sócrates, Platão, Aristóteles, etc...) juntaram-se os
pensadores modernos (Locke, Rousseau, Montesquieu, Maquiavel, Hobbes, Marx
etc.) que configuraram assim, o pensamento moderno ocidental acerca da política.
8
Sabemos que estes autores partem de perspectivas teóricas diferentes, mas, mesmo assim achamos importante
resgatar suas visões acerca dessas categorias.
25
Para entender a contextualização histórica a partir da política optamos por
conceituá-la a partir do seu sentido original na polis grega.
Nesse sentido, Marx (APUD, 2005), entende política como algo necessário a
condição humana, mas também como algo negativo no sentido de poder fazer com
que o indivíduo veja a política do ponto de vista da classe dominante, ou seja, a
política se dá numa sociedade de classes não possibilita a transformação, nem as
condições necessárias para que a classe subalterna participe das decisões políticas.
Apesar destes limites, por um caráter contraditório, a política também pode contribuir
para o processo de organização das classes trabalhadoras nos seus diversos
movimentos sociais, sindicatos, etc... Desta forma, pode-se contribuir para a
construção de uma cultura política que leve em consideração os interesses da
maioria.
9
O conceito de Democracia vem do grego demos (povo) e Kracia (poder, autoridade), portanto poder do povo.
Ao excluir mulheres, escravos e estrangeiros da participação na vida pública e de quaisquer outras atividades, o
termo Democracia não exprimia seu pleno sentido. Aliás, até hoje, inúmeros estudiosos mostram que o conceito
pleno de Democracia implica participação política da população, e isto significa também socialização da riqueza
produzida (FUNARI, 2001).
27
classe trabalhadora e impõe a troca do seu voto pelo política de favores, ou seja, o
uso da máquina eleitoral usado em beneficio do representado.
Uma vez que para os pensadores gregos, havia uma objetividade no modo
de ser do homem, para estes, tanto o conhecimento como as ações são objetivadas
no mundo real. Arendt (2001) dirá assim, que para os gregos é próprio da condição
humana - ou seja, aquilo que a caracteriza com atributos específicos - são o diálogo
e a ação, ambos situados na esfera do público. Deste modo, participar da esfera do
público na Grécia, significava que tudo poderia ser dito pela persuasão. A esfera de
discussão e do diálogo, o jogo de perguntar e responder, forma parte desse âmbito
da existência que os gregos isolaram como sendo o âmbito do “propriamente
humano”. Este se refere ao modo de existir entre iguais, a dialética e a retórica.
Ainda de acordo com Arendt (2001, p. 36), em linhas gerais era essa a
concepção de política que permitia aos gregos conviver com formas despóticas de
organização como a escravidão ou o patriarcado, que estavam reservadas
exclusivamente ao âmbito do privado. Os escravos, os bárbaros e as mulheres eram
“aneu logou” (sem logos). Porém, isso não significava que estivessem “desprovidos
da faculdade do discurso, mas sim de uma forma de vida em que o discurso, e
somente o discurso, tinha sentido e onde a primeira preocupação entre os cidadãos
era falar entre eles”.
28
Desta forma, o âmbito do privado 10 tinha seu centro no interior da família e do
doméstico. Era ali onde as necessidades vitais básicas deveriam ser satisfeitas
como condição para a realização da vida pública. Esse âmbito das diferenças e
desigualdades era considerado espaços de violência muda e do segredo, na medida
em que implicava estar privado de ser visto e ouvido por outros. Isso demonstra que
o patriarcado e a escravidão, relações eminentemente desiguais, eram tolerados no
âmbito do privado. As pessoas que pertenciam exclusivamente a esse espaço como
mulheres, escravos e bárbaros careciam de significação e de conseqüências para os
outros. Arendt (IBIDEM) mostra no pensamento grego, o que significava estar no
mundo privado e familiar. Ser Mulher na Grécia era viver confinada e afastada das
decisões políticas.
Desta forma, dentro da esfera da família, a liberdade não existia, pois o chefe
da família, seu dominante, só era considerado livre na medida em que tinha a
faculdade de deixar o lar e ingressar na esfera política, onde todos eram iguais.
10
“O lar é a esfera do nascimento e da morte, que devia ser escondida da esfera pública por abrigar coisas ocultas
aos olhos humanos e impenetráveis ao conhecimento humano, ela se refere ao termo oculto porque o homem não
sabe de onde vem, quando nasce, nem tem conhecimento do lugar para onde vai quando morrer” (ARENDT,
2001, p.72).
29
Liberdade, no nosso entendimento, difere, portanto, do conceito de liberdade na
Grécia Antiga. A liberdade passa pela autodeterminação do ser social e, neste
sentido, a plena liberdade não existe para o indivíduo na sociedade capitalista, uma
vez que nela, quem determina é o capital, segundo suas necessidades.
30
Em Roma, a atividade política concentrava-se na disputa pelo poder de tutela
do Estado, como instituição à serviço de interesses privados. Contudo, o povo
romano não sacrificou o privado em benefício do público, mas compreendeu que
estas duas esferas podiam subsistir sob a forma de coexistência.
31
Como já foi visto anteriormente a cultura ocidental tem suas raízes na cultura
grego-romana, mas também na cultura judaico-cristã, todas, eminentemente,
patriarcais. É a partir desse contexto, que nos reportaremos para entender a
influência do cristianismo para nossa formação, e como as construções de gênero
vão sendo tratadas na historiografia e nos discursos religiosos, para justificar as
relações hierárquicas entre homens e mulheres. Assim sendo nos embasaremos na
leitura do mito de Adão, Eva e Lilith, esquecida pela história judaico - cristã.
O homem pôs nome a todas os animais, a todas as aves dos céus, todos os
animais dos campos; mas não se achava para ele uma ajuda que lhe fosse
adequada. Então o Senhor Deus mandou ao homem um profundo sono; e
enquanto dormia, tomou-lhe uma costela e fechou com carne o seu lugar. E
da costela que tinha tomado do homem, o Senhor Deus fez uma Mulher, e
levou-a junto do homem. (Bíblia, Gênesis-As Origens, Cap 2, 1993 p. 50)
32
Neste mito, Lilith 11 se afirmou como um demônio, e é o seu caráter
demoníaco que leva a mulher a contrariar o homem e a questionar o seu poder. Por
isso é vista como força destrutiva. Foi a partir daí que Deus ouvindo os apelos de
Adão decide criar outra companheira que é Eva, moldada exatamente como a
conhecemos hoje. É o modelo feminino permitido ao ser humano pelo padrão ético
judaico-cristão, portanto Eva é construtiva e Mãe de toda Humanidade, contudo,
esta nova companheira não tem individualidade, pois foi criada da costela do homem
como já relatamos anteriormente.
“Eis agora aqui” disse o homem: o osso de meus ossos, e a carne de minha
carne; ela se chamará mulher, porque foi tomada do homem” Por isso o
homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir á sua mulher; e já não são
mais que uma só carne( Bíblia, Gênesis 2, 1993, p..50).
Para Badinter (1985) um outro texto bíblico que exerce um importante papel
na história ocidental para a determinação da condição feminina foi o de São Paulo,
na Epistola aos Efésios. O apóstolo expõe ali uma teoria que modifica o pensamento
de Jesus.
O homem deve ser o chefe do casal, pois foi criado em primeiro lugar e deu
origem à mulher. E a ele, portanto, que cabe o poder de mandar. Mulheres
sejam submissas a seus maridos, como ao senhor, assim como a igreja
está submissa a Cristo (BIBLÌA, 1993. Carta de São Paulo aos Efesios,
5,23-24).
11
Aqui apresentamos uma síntese com as informações sobre Lilith é um resumo de informações de vários sites
acerca do assunto. Para uma leitura mais detalhada há um clássico do assunto (SICUTERI, 1990).
33
Ainda de acordo com Badinter (1985), é através dos textos de Santo
Agostinho que no século IV, a figura da mulher também é mostrada como maligna, e
endiabrada, e evocava as más condições da mulher: um animal que não é firme,
nem estável, odioso, que alimenta a maldade... Ela é fonte de todas as discussões,
querelas e injustiças. Esse é o imaginário masculino no qual a mulher é responsável
pela discórdia entre homens e mulheres.
34
tempo, a mulher como ser capaz de reagir aos prazeres da carne, e mostra a
propensão “natural” da mulher para a vida doméstica.
12
A Revolução Francesa é somente o marco histórico de uma modificação econômica - política e cultural, na
qual se mesclam diversos determinantes e que culmina com a consolidação do modo de produção capitalista.
Entre estes determinantes citamos: a ilustração, o projeto iluminista, a revolução científica e industrial e a
reforma protestante.
35
relevantes para entendermos a situação das mulheres na instituição familiar e suas
formas de atuação fora dos meios domésticos e sua participação na sociedade.
Para Macedo (2002), tais regras de transmissão dos bens tinha por finalidade
evitar a divisão do patrimônio, que colocaria em risco a riqueza da família. Antes de
morrer o senhor feudal, caso não tivesse filho varão, obrigava sua única filha a
casar, nesse caso o marido seria o responsável pela herança. As estratégias
matrimoniais organizavam e sustentavam as relações sociais. O casamento antes de
tudo era um pacto entre famílias. Nesse ato, as mulheres serão, ao mesmo tempo,
doadas e recebidas como um ser passivo. Sua principal virtude dentro e fora do
casamento deveria ser a obediência e a submissão. Temos a compreensão de que
toda essa subjugação era justificada pela Igreja, já que a mesma determinava os
papeis sociais entre homens e mulheres.
36
Toda essa discussão nos leva a refletir sobre o poder de comando da Igreja e
a preocupação da mesma em justificar o matrimônio apenas para procriação e a
condenação do prazer físico. Durante esse período, as expressões de afeto não
eram considerados importantes nas uniões, a continuidade da linhagem era o único
objetivo da conjugalidade.
Ainda de acordo com Macedo (2002), através dos seus teóricos, a Igreja
justificava seu preconceito em relação às mulheres, consideradas feiticeiras que
rompiam com os preceitos impostos pela sociedade de castas. Dentre estes
13
As feiticeiras, segundo as crenças da época realizam praticas individuais, ao contrário das bruxas (MACEDO,
2002).
37
teóricos, temos São Tomás de Aquino, pensador cristão do século XIII, que afirmava
que os demônios existem e que são capazes de causar danos e impelir ao ato
carnal. Assim, para o imaginário da época, as bruxas em suas reuniões, o sabat,
concebido como uma orgia satânica praticavam atos sexuais abomináveis, e os
faziam para conseguir, malefícios de toda a espécie. Neste sentido, as bruxas e as
feiticeiras eram mulheres que exerciam sua sexualidade livremente, rompendo com
os padrões rígidos da época.
38
perseguidas, desde que se mantivessem no seu lugar. A quebra do padrão de
sexualidade se dá com as prostitutas, que eram vistas como mulheres de vida fácil e
que atuavam em “casas de mulheres”, ou zonas de meretrício. Um paradoxo
presente nesse período é que a prostituição era considerada um mal pela
sociedade, contudo, ao mesmo tempo, era tolerado. A prostituição, uma atividade
oposta aos rígidos padrões morais da época, ao mesmo tempo, recriminada por uma
parte da população, tornou-se uma atividade pública. Segundo Macedo (IBIDEM),
chegavam a existir lugares alugados pelos chefes da comunidade ou pelos
burgueses ricos – os prostíbulos públicos que eram protegidos pelas autoridades,
nos quais a fornicação era exercida livre e oficialmente. Existiam estabelecimentos
para banhos, onde se podiam desfrutar os prazeres carnais, sem falar dos bordeis
particulares.
39
Contudo, a partir do século XVI uma série de transformações abalam o poder
da Igreja e da sociedade feudal, deflagrando posteriormente o surgimento da
sociedade burguesa moderna. Nesta, convém ressaltar que em pleno século XXI, os
prostíbulos continuam cumprindo o seu papel, de saciar os prazeres e atenuar as
tensões servindo de válvula de escape para os homens exerceram sua sexualidade
livremente, assim como permitindo às mulheres uma opção de sobrevivência. Deste
modo, O capitalismo foi modificando as formas e práticas da prostituição, inserindo-
as na lógica do mercado global. Exemplo disso é o “turismo sexual”, que envolve
hotéis, agências de viagem etc, com a formação de redes de prostituição em todo o
mundo.
14
Renascimento - movimento intelectual e cultural, designando um período histórico, intermediário entre a
mentalidade medieval e a mentalidade moderna, que floresceu na Europa, basicamente dos séculos XV a XVI.
O traço mais característico desse período é o humanismo que chega a ser uma característica determinante no
pensamento moderno, marcando a ruptura do indivíduo com a sociedade tradicional e também um novo
começar, a partir da idéia do caráter natural e racional da sociedade, da idéia de pacto social e do Estado secular.
Cria-se o campo de afirmação do individualismo: liberdade, igualdade, propriedade e segurança (MARQUES/
BERUTTI/ FARIA, 2001).
40
Tonet (IBIDEM), mostra que a teoria liberal da cidadania, representada por
Kant, Hobbes, Locke, Rousseau e outros, tem como pressuposto teórico “todos os
homens são iguais e livres por natureza”. Então, as desigualdades sociais existentes
eram consideradas legítimas e constitutivas do mundo humano, portanto
justificáveis. A busca da realização pessoal, conseqüência da própria liberdade faria
com que os indivíduos se chocassem, inevitavelmente, entre si, dando origem a toda
sorte de conflitos e desigualdades. Assim, havia a necessidade dos homens se
organizarem em sociedade e instituírem uma autoridade capaz de garantir que
determinados limites não fossem ultrapassados.
41
É preciso ressaltar que a medicina da época tinha a preocupação em legitimar
e deslegitimar as mulheres, que cuidavam da gestação, parto, alívio de doenças e
sintomas, inclusive através de porções e ervas, já que a medicina não estava
totalmente instituída. Todas essas questões legitimavam o pensamento cristão
acerca das mulheres e da sexualidade. Nesse sentido, a instituição da medicina se
confunde com a história da bruxaria que passou a ver como perigoso o saber da
curandeira. As curandeiras davam ao ritual de cura uma dimensão real que era
diretamente percebida pela vítima, para quem a moléstia, ou mesmo o quebranto,
havia se tornado insuportável. A capacidade das mulheres de prepararem porções e
ervas que aliviassem as doenças e, por vezes propiciassem a cura, passou a ser
associada a sua capacidade natural com o demônio, logo vista como bruxaria
(PRIORE, 2007).
42
Desta forma, com o surgimento do capitalismo e da revolução industrial, a
sociedade, modificará o modo de vida das mulheres e isso só foi possível pelo pleno
desenvolvimento do capitalismo que exigia a presença das mulheres para aumentar
a produção e a taxa de mais-valia, conseqüentemente houve a necessidade de
romper com a forma de opressão a que estavam submetidas.
A partir desse período, há uma quebra do isolamento do lar para a rua, ou,
seja, com o advento da grande indústria moderna, com a produção social capitalista,
temos a saída da mulher da esfera privada para a pública (ALAMBERT, 1986).
Como afirma Marx (1987), a Revolução Industrial realizou a potenciação do
trabalho humano, dando origem a uma nova relação de classes. Chegava ao fim à
sociedade de estamentos e surgia uma sociedade de classes. Importante ressaltar
que a relação histórica entre o capital e o trabalho intensifica a exploração. Surgia o
urbano-industrial que substitui o trabalho baseado no artesanato. A passagem da
ferramenta da mão humana para a mecânica, quer na adaptação do implemento a
uma nova fonte de energia, transformou radicalmente o processo de produção,
exigindo que os trabalhadores se concentrassem num só lugar de trabalho, a
fábrica, que antes era a manufatura. Uma característica desse processo de equipe
foi uma extensão da divisão do trabalho.
Sabemos que, com a Revolução Industrial, há uma intensificação da
exploração, e o desenvolvimento das forças produtivas, isto é, o avanço da
capacidade humana de explorar cada vez mais a natureza mediante ferramentas e
tecnologia.
Segundo Engels (1978), nas comunidades primitivas a divisão social do
trabalho se dava da seguinte forma: enquanto a mulher controlava a produção
dentro da esfera doméstica, sendo responsável pela manutenção da subsistência e
reprodução, os homens atuavam fora do ambiente doméstico, controlando os meios
de produção, mas não havia antagonismo entre eles. Posteriormente, com o
surgimento da família patriarcal e a monogamia evidencia-se a conexão entre a
propriedade privada e reprodução nas relações sociais, portanto, a sujeição da
mulher. A primeira opressão de classes, portanto, se dá junto com a opressão do
sexo feminino pelo masculino.
Já a inserção da mulher na grande indústria na sociedade capitalista, impõe-
se pela necessidade do aumento da produção a partir do aparecimento da
maquinaria, no intuito de aumentar o material humano explorável pelo capital
43
mediante apropriação do trabalho de mulheres e crianças. Marx (1987), estabelece
uma ligação entre a extensão do trabalho a toda a família operária, ai incluídas as
mulheres e crianças e conseqüentemente a desvalorização da força de trabalho do
homem adulto. Em decorrência aumenta a mais-valia a ser extraída e, por
conseguinte, verifica-se maior acumulação de capital.
Deste modo, a relação do homem com o trabalho se modifica a partir do
capitalismo. No final do século XIX, acirrou-se a fragmentação do trabalho 15 em
duas esferas distintas: por um lado à unidade doméstica (a esfera Privada), do outro,
as relações de produção, que iriam modificar as relações familiares. Entretanto, essa
separação não se dava em termos tão radicais, pois a tarefa doméstica embora
estivesse restrita à unidade familiar, se dava também ligada as outras atividades
(MARX,1987).
Assim, o capitalismo foi destruindo o caráter patriarcal da sociedade naquilo
que lhe convinha, passando a demandar a contribuição direta dos trabalhadores (as)
na produção social da riqueza. A grande indústria impulsionou seu desenvolvimento,
elevou sua independência, isto é, criou condições de vida que estavam
incomparavelmente acima da imobilidade das relações pré-capitalistas
(LÊNIN,1980). A este respeito, Lênin (1980, p.15) afirma:
A nobre tecelã vai a fabrica atrás do pai e do marido, trabalha com eles e
independente deles. É um sustentáculo da família exatamente igual ao
homem. Na fábrica a mulher é um produto completamente independente,
igual ao homem.
Reforçando o que foi discernido por Lênin (1980), vale destacar as condições
a que homens e mulheres estavam submetidos na indústria. As mulheres chegavam
a trabalhar jornadas diárias de até 17h, em condições insalubres, submetidas a
maus tratos e ameaças sexuais constantes, sem contar com os salários inferiores,
abaixo dos homens, exercendo as mesmas funções. Outra questão é a dupla
jornada de trabalho a que a mulher estava submetida, pois após chegar do trabalho,
ainda lhe cabia as tarefas domésticas. Por isso, não podemos afirmar que a inserção
15 Para Marx “O trabalho é, em primeiro lugar, um processo de que participam igualmente o homem e a
natureza, e no qual o homem espontaneamente inicia, regula e controla as relações materiais entre si próprios e a
natureza. Eles se opõem à natureza como uma de suas próprias forças, pondo em movimento braços e pernas, as
forças naturais de seu corpo, a fim de apoderar-se das produções da natureza, ajustadas as suas necessidades e
condições” (MARX, 1987, p. 202).
44
das mulheres no mercado de trabalho não se traduz em pé de igualdade com os
homens.
Contudo é importante salientarmos que com o ingresso das mulheres no
mercado de trabalho, muitas modificações se deram e essas modificações
trouxeram novas formas de luta.
Desse modo, a classe que vive da venda da força de trabalho, composta por
mulheres, jovens, crianças e homens, foi reduzida a simples condição de força de
trabalho vivo, ou seja, matéria de exploração do capital. Observamos que os
antagonismos e contradições surgidos com a propriedade privada não foram
eliminados. Contudo, a sociedade capitalista estabeleceu novas classes, novas
formas de opressão e contraditoriamente, novas formas de luta.
O marco inicial na luta pelos direitos das mulheres foi a Revolução Francesa
em 1789, que marca a emancipação política dos homens e mulheres, o direito de ir
e vir e a supressão dos laços feudais. É o início da luta pelos direitos humanos e
onde surge o primeiro exemplo de um movimento de mulheres.
De acordo com Saffioti (1976), à francesa Olympe de Gouges foi uma das
dirigentes políticas que mais se destacou nesse período, tendo escrito a Declaração
dos Direitos das Mulheres e da Cidadã, em 1791, como réplica a Declaração dos
Direitos do Homem, no início da Revolução Francesa. A Declaração dos Direitos da
Mulher era análoga a Declaração dos Direitos do Homem e foi votada pela
Assembléia Constituinte francesa no mesmo ano. Todavia, a Revolução foi dirigida
pela burguesia em ascensão, cujos interesses residiam, de um lado, na eliminação
45
dos privilégios feudais, e de outro, na manutenção das regalias masculinas,
principalmente dos homens burgueses.
46
Parece que a emancipação da mulher, sua igualdade de condição com
homem é e continua sendo impossível enquanto a mulher permanecer
excluída do trabalho social produtivo e dever limitar-se ao trabalho privado
doméstico... a liberação da mulher tem como condição primeira à
incorporação de todo o sexo na indústria pública (ENGELS, 1978, p. 81).
16
Vale ressaltar que todos estes elementos foram conquistas das lutas feministas, mas foram apropriadas pelo
sistema capitalista e inseridas na lógica de mercado, como forma de aumentar mais ainda a extração de mais-
valia.
47
menores de 12 anos. A guerra permitiu que as mulheres penetrassem em novas
áreas de trabalho, principalmente na indústria e nos campos de batalha, no cuidado
dos feridos em hospitais e alimentação dos refugiados. A realidade da guerra
condizia com a realidade da mulher pobre, muitas delas precisavam trabalhar para
sobreviver e encontraram oportunidade de ter um emprego, mesmo quando a guerra
se constituiu a partir da lógica do capital.
48
estrutura familiar de subordinação das mulheres. O argumento para os que
desejavam a volta das mulheres ao lar partia da crise econômica e a situação de
desemprego constantemente agravada pelas crises econômicas (THEBAUD, 1991).
50
outra em casa; ela é um ser único que exerce essas duas funções sociais, na
maioria das vezes sozinha, sem a colaboração do companheiro.
51
senão entrepostos comerciais, o que favoreceu o aparecimento da família patriarcal,
herdada desde a Grécia.
Segundo Prado (2006), senhor de terras e escravos tinha poderes sobre
todos, considerando tudo como sua propriedade, inclusive sua família. A esposa era,
sobretudo, sua escrava e vivia para realizar-lhe o seu desejo. A função da mulher
era a obediência ao marido e cuidar da casa e filhos, ficando sua vida restrita ao
espaço do lar, poucas tinham liberdade de participar de reuniões entre amigo e
políticos; principalmente do processo eleitoral. Porém, não podemos esquecer que,
durante esse período, não só as mulheres eram excluídas da participação política de
votar e ser votada. Havia os negros e estrangeiros e também a população pobre e
analfabeta que era a maioria da população brasileira.
A preferência por filhos varões era marcante no Brasil colonial, o filho homem
era considerado o sucessor após a morte do patriarca. As meninas, por sua vez,
eram criadas para as atividades de bordar, costurar e fazer rendas, já que eram
preparadas para o casamento e a procriação. A esse respeito Saffioti (2004), mostra
que a paternidade impõe a maternidade. O poder político do homem assenta-se no
direito sexual ou conjugal. Assim, a autoridade política do homem já está garantida
bem antes de ele se transformar em pai.
De acordo com Priore (1995), o casamento se dava na Colônia por razões de
Estado, pois nesse período, temos a presença daqueles que vinham explorar as
terras e se apoderar da cultura dos que aqui viviam, com o objetivo de povoar para
melhor explorar. Por essa razão, o casamento tinha como objetivo unir grandes
fortunas e agregar terras. A estratégia para impor o casamento partia da Igreja,
através dos sermões e pastorais, os quais serviam para justificar a instalação de um
aparelho burocrático e afirmar o poder da Igreja no novo mundo.
Apesar da Igreja, nos seus sermões dominicais, defender o casamento, era
através das missas que as mulheres viam uma possibilidade de liberdade, já que
tiravam -nas da monotonia da Casa Grande. Ao saírem para ir a missa, oferecia-se a
possibilidade de desenvolvimento de novas relações sociais. As Igrejas eram locais
de namoro, encontros e reuniões. Já os casamentos eram feitos, na maioria das
vezes, por conveniência econômica ou em outros casos, para garantir paz entre dois
clãs. O papel reservado a mulher era de subalternidade. Priore (1995), apresenta o
casamento, neste período, como mecanismo de ordenamento social, e a família
52
como palco para uma domesticação silenciosa do comportamento das mulheres
impondo lentamente o papel de mãe devotada e recolhida, pois seu papel era
destinado apenas para procriação.
Um outro ponto a ser discutido é a questão da sexualidade. Nesse período, as
mulheres eram confinadas no interior do lar e tabus, como a virgindade, estavam
arraigadas na cultura brasileira, ou seja, a preservação da virgindade das moças era
defendida a qualquer custo pelo patriarca e pelos irmãos, por representar a honra da
família. Logo, o crime de desonra era a maior injúria que poderia se cometer 17 . Caso
a moça fosse deflorada, o casamento era a resolução do problema.
Quando um casamento era indesejado, na maioria das vezes inter-racial, a
moça era mandada para o convento, lugar de refúgio de muitas mulheres. O
convento representava então, uma vida livre e independente dos homens, uma
possibilidade de viver intensamente numa mini – sociedade, apesar das restrições
que se tinha (PRIORE, 2000).
Assim, o sistema patriarcal instalado no Brasil colonial, encontrou grande
reforço na Igreja Católica, que educava as mulheres para serem pessoas submissas
e inferiores. Contudo, tanto na sua vida familiar quanto no mundo do trabalho, as
mulheres souberam estabelecer formas de sociabilidade e solidariedade que
funcionavam, em diversas situações, como uma rede de conexões capazes de
reforçar seu poder de grupo, pessoal ou comunitário.
A este respeito, Priore (1995), enfatiza a ausência dos maridos que saiam em
busca de trabalho, eram os companheiros ambulantes e as mulheres chefiavam
17
Lembremos como já assinalamos que a fidelidade feminina era a única forma de assegurar que os filhos
gerados fossem, de fato, “legítimos”.
18
Anita Garibaldi, guerrilheira da Revolução Farroupilha ou guerra dos farrapos de 1835, que tinha como
objetivo a luta, contra os altos impostos. Dona Josefa Carneiro de Mendonça, uma das líderes da Revolução
Liberal de 1842, em Minas Gerais (SAFFIOTI, 1976).
53
seus lares. As crianças viviam circulando entre outras casas e sendo criadas por
comadres, vizinhas e familiares. A imigração interna, que ocorreu entre o fim do
século XVII e início do XVIII, abalou fortemente a estrutura familiar de muitas
mulheres nas regiões Sudeste e Nordeste. Isto se deu em função da descoberta do
ouro nas Minas Gerais e em Goiás, o que obrigou muitos companheiros e maridos a
partirem. Neste período, a vida cotidiana das mulheres era ritmada pelas atividades
em torno da igreja: festas, confissões, procissões; as práticas domésticas e a
fabricação caseira de objetos de uso diário como panos, sabão, conservas e peças
para banho e para cozinha.
Contudo, o século XIX foi marcado por uma série de mudanças consideráveis
de ordem econômica, política, social e ideológica, inerente ao processo de
tramitação de um passado colonial. Esse processo tem como ponto de referência à
vinda da família real portuguesa ao Brasil.
54
Porém, tais escolas deixavam a desejar, tanto pelo número insuficiente de
estabelecimentos de ensino como pela qualidade do ensino ministrado (PRIORE,
2000).
Ainda de acordo com Priore (2000), o período colonial nos deixou amargas e
duradouras heranças culturais. Apesar da mulher estar presente desde o início do
processo de colonização, de ocupar grande variedade de posições em diferentes
grupos sociais, raciais, religiosos, elas não eram visíveis. Sua quase invisibilidade as
identificava aos de baixo. Isso porque a maioria das mulheres era analfabeta,
subordinadas juridicamente aos homens e politicamente inexistentes. Suas
condições as excluíam de qualquer exercício de função nas Câmaras Municipais ou
na administração que lhes garantissem reconhecimento social. Porém, entendemos
que essa invisibilidade estava ligado ao patriarcado, e por uma questão cultural, e
55
não por que as mulheres eram analfabetas, apesar da educação ser voltada para os
homens, e elas não serem consideradas cidadãs, não era esse analfabetismo que
determinava a não participação política.
56
O sistema oligárquico 19 que imperou no Brasil e Rio Grande do Norte/ Natal
durante todo o decorrer do final do século XIX até o século XX, foi assentado na
“política dos governadores” sob a hegemonia do eixo São Paulo/Minas. Na época,
existia o voto a descoberto, que na prática violava o principio do sigilo, nas suas atas
falsas, confeccionadas a bico-de–pena que consistia na adulteração das atas feitas
pela mesa eleitora (que também apurava os votos), e na exclusão de mulheres e
analfabetos do direito de voto.
57
até a década de 1930. A disputa se dava entre as oligarquias que detinham a
economia como sustentação de dominação. Muitas vezes, os conflitos que
envolveram os Maranhão e os políticos do Seridó nos momentos que marcaram as
sucessões governamentais de 1913, 1923, 1927, eram formas de garantir a
acomodação entre as várias facções. Nestes conflitos, as oligarquias locais sofriam,
algumas vezes, intervenções do governo federal.
22
Populismo é um fenômeno político de massas ligado à dinâmica da urbanização e industrialização, passando a
expressar um modo particular de relação entre o governante e os contingentes populacionais periféricos recém
chegados do interior, ou seja, da área rural impulsionado por promessas de uma vida melhor (PEREIRA, 1996).
23
Getulio Dorneles Vargas foi presidente do Brasil de 1930 a 1945 e depois de 1951 a 1954, segunda
presidência, no qual diante de uma crise, em 1954, chega ao fim o populismo de Vargas quando suicidou - se. De
1930 a 1937 esteve no poder através de eleição, de 1937 a 1945, governou como Ditador, voltando novamente
em 1950 através de eleições (MENDONÇA, 1990).
58
Mossoró-RN, Celina Guimarães Viana, era esposa do bacharel Elizeu Nunes Viana
e a primeira Deputada Estadual, Maria do Céu Fernandes também era de família
influente. Não queremos menosprezar a conquista dessas mulheres, mas mostrar
que chegaram ao poder por pertencer a determinados grupos políticos. A respeito da
primeira vereadora de Natal, Júlia Alves Barbosa, era professora catedrática da
Escola normal de Natal e não consta ligação de Julia Alves com nenhuma oligarquia
do Rio Grande do Norte.
Aluízio Alves foi eleito pelo Partido Social Democrático (PSD), governador do
Estado do Rio Grande do Norte, em 1960, utilizando um discurso populista que
prometia acabar com a miséria e a fome e trazer o progresso e a modernização para
o povo potiguar. Promoveu uma campanha que ficou conhecida como a “Cruzada da
Esperança” lhe rendendo o título de líder populista. O populismo permitiu a Aluízio
Alves despontar como liderança tanto junto à população de baixa renda como aos
setores sociais organizados, da elite local. A relação paternalista entre o líder político
e o povo marcavam cada vez mais o clientelismo, tornando-o um personagem ímpar
na história política do Rio Grande do Norte.
59
Alves foi derrotado na disputa ao governo do Estado do RN, por José Agripino Maia,
obtendo, portanto, sua primeira derrota na carreira política. Esses grupos vem se
perpetuando no poder até os dias atuais 25 . Na cidade de Mossoró/RN temos a
família Rosado que vem se perpetuando no poder desde a década de 1950 no
governo de Dix-Sept- Rosado e atualmente domina o cenário político mossoroense.
25
Os Alves estão presentes na Prefeitura Municipal de Natal na figura do atual prefeito Carlos Eduardo Alves,
no legislativo, através do deputado estadual Walter Pereira Alves filho do então Senador Garibaldi Alves Filho.
Os Maias têm representação no legislativo através da deputada estadual, Márcia Faria Maia Mendes, do
deputado estadual, Lavoisier Maia, e o deputado federal, Felipe Catalão Maia e no Senado através de José
Agripino Maia. Além disso, a atual governadora do Estado, Vilma de Farias, apesar de ter rompido com os
Maias, já carrega este sobrenome, quando foi casada com o deputado estadual, Lavoisier Maia. Outro grupo
político que se destaca é a família Rosado na cidade de Mossoró-RN, através da prefeita, Fátima Rosado, da
deputada estadual, Larissa Daniela da Escossia Rosado e da senadora, Rosalba Ciarline Rosado.
60
representatividade nos cargos públicos, nos serviços públicos e na política, nos
quais os homens ocupam a maioria das cadeiras nos 3 (três) poderes.
Percebe-se, portanto, que as reivindicações das mulheres no Brasil não se diferenciavam da luta das mulheres na
Europa e dos Estados Unidos, países capitalistas desenvolvidos. Podemos observar isto, quando analisamos a história da
participação da mulher brasileira no parlamento, tendo como líder do movimento sufragista, Bertha Lutz, uma bióloga que
retornou ao Brasil em 1918, graduada pela Sorbonne. A história da participação da mulher brasileira no parlamento, segundo
Borba (1999 p.54):
Art. 113, § 1º: Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem
distinções por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos
pais, classe social, riqueza, crenças religiosas, ou idéias políticas.
61
Observa-se que, pela primeira vez, em 1934, a legislação brasileira
demonstra sua preocupação pela situação jurídica da mulher, proibindo
expressamente quaisquer privilégios ou distinções por motivos de sexo. Apesar
dessa conquista, as mulheres permaneceram ainda à margem da sociedade, os
seus direitos continuaram sendo esquecidos e isso demonstrava a contradição entre
o artigo citado da Constituição e a prática existente. A obrigatoriedade plena do voto
para todas as mulheres só foi instituída com a Constituição de 1946.
26
República Velha foi o período marcado pela da Política do Café –com –Leite, que significava o revezamento
no poder, ou seja, o domínio de duas oligarquias: a mineira e a paulista, que dominavam a política partidária:
São Paulo com a produção do café e Minas Gerais com a tradição pecuarista. Assim, em cada eleição
presidencial alternavam -se no poder um presidente de São Paulo, ou de Minas gerais (CAPELATO, 1988).
62
diversos interesses sociais em jogo, metamorfoseados em “interesses nacionais”
(MENDONÇA, 1990).
Diante dos fatos e práticas analisados, observa-se que a “Revolução de 1930”
foi o marco inicial para as mudanças sociais que, na visão de Capelato (1988),
preparou o terreno para o advento de uma nova cultura política, que se definiu a
partir do redimensionamento do conceito de democracia, norteada por uma
concepção particular de representação política e de cidadania. A partir de então, dá-
se a revisão do papel do Estado que se complementa com a proposta inovadora do
papel do líder político na integração das massas e a apresentação de uma nova
forma de identidade nacional.
27
No ano da sua fundação em 1922, o PCB (Partido Comunista do Brasil) foi registrado com essa nomenclatura,
posteriormente, em 1961, foi alterado para Partido Comunista Brasileiro. Um ano mais tarde, a dissidência
liderada por João Amazonas, Mauricio Grabois e Pedro Pomar, adotou o nome original e (re)fundou o PC do B
(Partido Comunista do Brasil), que existe até os dias atuais. (MAZZEO, 2003).
28
Intentona significa ato insano, louco, motim insensato; enquanto, Insurreição significa conjunto de ações e
movimentos, armados ou não, de classes e massas populares para derrubar um governo, para pôr fim a um modo
de governo contraditório aos interesses dos insurretos; rebelião levante popular (DOMICH, 2008).
63
cinco anos de reclusão, grau mínimo do art. 1º, da lei de nº 38, de 1935, conforme
ofício nº 1266 (FREIRE, 2004).
64
mulheres, jovens, negros e imigrantes. São movimentos que se colocavam
questionando a racionalidade do Estado burguês, suas instituições e, no limite,
negavam a ordem burguesa e seu estilo de vida.
De acordo com Sardenberg e Costa (1991), com o golpe de 1964, tanto o
feminismo burguês como os movimentos feministas liderados pelas organizações de
esquerda serão igualmente silenciados, senão massacrados, juntamente com os
demais movimentos populares no país.
Contudo, no início dos anos de 1970, o capitalismo entra numa situação de
instabilidade, de aumento da concorrência e dos atritos entre países imperialistas
devido a abertura de mercados e fronteiras. Isto leva a superexploração da classe
trabalhadora, e os mais atingidos pela crise do capital, são as mulheres, os jovens, e
os considerados idosos, dos países periféricos.
A primeira conseqüência para a classe trabalhadora é o desemprego
estrutural, a partir do desaparecimento de milhões de postos de trabalho. Por outro
lado, há uma ampliação do setor de serviços, setor de terceirizados e trabalhados
informais e temporários, sem vínculo empregatício definidos. O avanço da política
neoliberal 29 “globalizante” teve reflexos na vida da classe trabalhadora, como o
rebaixamento dos salários diretos, os ataques à política de bem-estar-social 30 , corte
de investimentos em setores essenciais como: educação, saúde e previdência.
Para Goldenberg (1992), nesse leque de acontecimentos surge uma nova
organização de mulheres feministas que marca um momento de questionamento e
de uma postura mais crítica, que explodirá pela voz de militantes mais
comprometidas com posições de esquerda, como é o caso do Conselho Nacional de
Mulheres do Brasil, o qual tinha a frente, Romy Medeiros da Fonseca, que já tinha
participado da luta por um novo estatuto da Mulher Casada, que culminou com a
aprovação da lei nº 4.121/62. Foram eliminadas com essa lei, as discriminações que
limitavam, os direitos da mulher casada, considerada relativamente incapaz, no
mesmo nível do indígena, do menor e do pródigo. Segundo Rodrigues (2001), o
29
A política neoliberal é a exigência de um Estado mínimo para o trabalho máximo, inclui compromissos com o
livre-comércio; retirada da responsabilidade do governo em relação aos direitos do trabalhador, por isso a
flexibilização das relações trabalhistas e retiradas dos direitos - precarização dos laços empregatícios,
terceirização e baixos salários, e privatização de todos os recursos econômicos, conseqüentemente o aumento do
desemprego, além da competitividade que prevê a individualidade das relações de trabalho. O objetivo á atender
a demanda do capital financeiro internacional e das grandes empresas, impostas pelas políticas implementadas
pelo Fundo Monetário Internacional ( FMI) e Banco Mundial.(ANTUNES, 1995).
30
Política de Bem –Estar - Social conhecida como Welfare State, é o conjunto de medidas de proteção social,
ou políticas públicas compensatórias como forma de amenizar a pobreza e miséria da classe subalterna (
GUERRA, 2000).
65
feminismo dos anos de 1970, no Brasil, encontra motivações nos movimentos
feministas americano e europeu – que emergem desde os anos 1970, na realização
da I Conferência Mundial sobre a Mulher (México/1975) e na Década da Mulher
(1976-1985), ambas promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Em 1975, em comemoração ao Ano Internacional da Mulher promovido pela
ONU, é realizado no Rio de Janeiro um seminário, reunindo mulheres interessadas
em discutir a condição feminina em nossa sociedade, na qual a pauta de discussão
foi o papel e comportamento da mulher brasileira. Os principais problemas
levantados foram: mudanças no Código Civil, com o objetivo de eliminar as
discriminações contra a mulher, luta pela implementação de creches e centros de
atendimento a criança, para facilitar a integração da mãe de família ao mercado de
trabalho; mudanças na legislação trabalhista, que era repleta de restrições à mulher
trabalhadora, tais quais o artigo que impedia o trabalho noturno da mulher sem a
autorização prévia do marido. Para Pinto (2003), esse período é considerado como o
momento inaugural do feminismo brasileiro.
No segundo semestre de 1975, foi criado o Movimento Feminino pela Anistia.
O movimento foi fundado por Terezinha Zerbini, esposa de um general que sofrera
repressão com o golpe militar. O movimento tinha como proposta mobilizar a opinião
pública, a partir da ação organizada de mulheres contra as arbitrariedades do
governo militar, prisões, torturas, assassinatos, cassações de mandatos e
aposentadorias compulsórias. As esposas, mães e companheiras dos atingidos pela
repressão militar decidiram lutar pelo fim do regime de exceção. Esse movimento
cresceu por todo o Brasil e foi fundamental na campanha pela anistia, que veio a ser
realizada no ano de 1979 31 (PINTO, 2003).
A partir de 1975, marco do movimento feminista, no mundo e no Brasil, até
1979 - quando o país dá os primeiros passos em direção à democratização, com a
anistia e a reforma partidária que terminou com o bipartidarismo - o movimento
feminista no Brasil, esteve associado, muito de perto, à luta pelo fim da ditadura
militar. Pinto (IBIDEM) mostra o paradoxo em que o movimento feminista não
socialista estava situado: por um lado, o regime militar e repressivo não via com
bons olhos qualquer tipo de organização da sociedade civil, ainda mais quando se
31
A anistia foi um movimento organizado por familiares de pessoas que haviam sido exiladas, presas ou estavam
desaparecidas e objetivava pedir anistia para todos os presos políticos (PINTO, 2003).
66
tratava de mulheres, que inspiradas nas norte-americanas, ameaçavam a tradição e
a família brasileira. Por outro lado, estas mulheres não encontravam guarida entre
os grupos que lutavam contra a ditadura e professavam ideologias do tipo libertário e
apresentavam resistência a essa organização por não ser comunista.
Desta forma, em fins da década de 1970 e durante a década de 1980, o
feminismo no Brasil teve importância na resistência contra a Ditadura Militar e na
defesa da redemocratização do país, através da participação decisiva na anistia, na
Campanha pelas “Diretas Já”, além da criação dos Conselhos de bairros,
organização em Sindicatos e Clubes de mães, no processo da Constituinte e na
Constituição em 1988.
67
sobre a política de cotas, partindo da necessidade de uma maior participação das
mulheres na política. Todas estas questões se deram a partir de um encontro em
maio de 1995, no qual parlamentares do sexo feminino da América Latina reuniram-
se em São Paulo para discutir a experiência Argentina com cotas e as políticas de
cotas no restante do mundo. A política de cotas 32 é medida que visa alterar o
quadro de desigualdades – racial, étnica, sexual e social. Neste sentido, as ações
afirmativas reconhecem as discriminações existentes e agem no sentido de impedir
que as mesmas se perpetuem (GROSSI E MIGUEL, 2001).
A plataforma de ações adotadas pelos governos, a partir da Conferência de
33
Beijing, (China) , endossou o compromisso de assegurar acesso igualitário a
participação das mulheres, tanto nas estruturas de poder quanto nos cargos de
tomada de decisões. A plataforma de Beijing legitimou o uso da política de cotas em
âmbito mundial. Assim, a política de cotas é resultado também da luta das mulheres
em todo o mundo pelo acesso igualitário e participação das mulheres na política 34 .
32
A cota é uma das medidas que compõem a chamada, política de discriminação positiva, isto é, que combate a
discriminação das mulheres de forma clara, pela imposição de medidas legais (BRUSCHINI IN: ARAÚJO,
2002).
33
A Conferencia de Beijing ocorreu em 1995 e foi um encontro que reuniu mulheres de todo o mundo para
discutir sua situação de vida e pensar ações estratégicas com vistas a transformação desta situação.
34
Em 1996, no Brasil, houve o lançamento nacional da Campanha “Mulheres Sem Medo do Poder”, objetivando
estimular as mulheres a se filiarem a partidos políticos e aumentar o número de candidaturas femininas às
eleições de 1996 (COSTA, 2001).
68
No ano seguinte, discutiu-se e foi instituída a lei de cotas – lei 9.504/1997,
não mais uma cota somente para as mulheres, mas uma cota que estabeleceu o
número mínimo de 30% (trinta por cento) e uma cota máxima de 70% (setenta por
cento), para qualquer um dos sexos, essa lei não determina a quem vai beneficiar.
35
Ações afirmativas e políticas de cotas são termos utilizados por vários autoras e autores que visam objetivar a
igualdade e evitar as discriminações sexuais, raciais e de gênero, étnicas ou com deficientes físicos (INACIO,
2002).
69
populares, pois a discriminação/dominação aumenta por serem mulheres, pobres e
negras, mas estas mesmas mulheres não percebem a
dominação/opressão/exploração.
70
dirigidas, inclusive as das mulheres, não apenas por razões éticas ou ideológicas,
mas, também ou principalmente por interesses pragmáticos. Interesses gerados por
necessidades de ampliar e absorver a pressão desses segmentos, em razão de seu
peso perante a opinião pública. Nesse sentido, um número crescente de partidos
políticos, em dezenas de países, vem assumindo políticas de ação afirmativa e cotas
destinadas as mulheres e a outros segmentos. No Brasil, os partidos a qual a autora
se refere são os Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Democrático Trabalhista
(PDT). Ambos responsáveis pela implementação das cotas na década de 1980.
Para Araújo (2002), os resultados das cotas no Brasil podem ser analisados
em relação aos seus dois tipos de objetivos: a ocupação numérica de espaços e as
alterações simbólicas nas percepções sobre a relação mulher e política. Em relação
a este último objetivo, em médio prazo está sendo possível avaliar os seus
desdobramentos. Já em relação ao objetivo mais imediato e perceptível, relacionado
com a ampliação da presença de mulheres como candidatas e eleitas, é possível
afirmar com base em análise dos dados eleitorais, que as cotas tem sido pouco
eficazes.
Os resultados das duas eleições para a Câmara de vereadores de Natal nas
quais as cotas foram adotadas foi cerca de 18% (dezoito por cento) de candidaturas
e de 11,2% (onze vírgula dois por cento) de eleitas em 1996 e cerca de 20% (vinte
por cento) de candidaturas em 2000, com 11,7% (onze vírgula sete por cento) de
eleitas. Os resultados para a Câmara dos Deputados Federais em 1998 mostram
que houve elevação do percentual de candidaturas, passando de 6,6% (seis vírgula
seis por cento) em 1994 para 10,2% (dez vírgula dois por cento) em 1998. Tais
71
números mostram que se ficou longe de alcançar a meta de 25% (vinte e cinco por
cento) e os índices de eleitas chegaram a ser negativos – 6,3% (menos seis vírgula
três por cento) em 1994 e 5,6% (cinco vírgula seis por cento) em 1998.
De acordo com o jornal Cfêmea (1998), o que parece ter acontecido em
vários estados é que, apesar do número de mulheres candidatas ter aumentado, os
homens tiveram melhores condições de preencher as novas vagas estipuladas pela
lei. Entretanto, é importante destacar que não há uma regra geral para o país. Nos
diferentes estados a situação oscila e pudemos observar ou o aumento do número
de candidaturas de mulheres ou a apresentação de um número igual ou a redução
de candidaturas femininas.
De acordo com Miguel e Queiroz (2006), um dado surpreendente é que as
mulheres tiveram maiores chances nas disputas pelas Prefeituras e Câmara de
Vereadores, em regiões menos desenvolvidas, como na região Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. A explicação se baseia em três hipóteses a primeira é a hipótese da
política tradicional, a segunda hipótese é da hiperqualificação feminina e por último a
da hipótese demográfica.
A primeira hipótese da política tradicional, afirma que nas regiões mais
atrasadas do país, ainda predominam os padrões da política tradicional, baseada na
formação clientelista e no familiarismo. As mulheres seriam eleitas não por sua
trajetória pessoal ou vinculação com movimentos da sociedade civil, mas na
qualidade de representantes de seus clãs familiares. A predileção feminina pelos
partidos mais conservadores é um dos fatores responsáveis pelo crescimento das
mulheres nos espaços de poder.
A segunda hipótese da hiperqualificação feminina – mulheres com nível
médio de escolaridade superior aos dos homens em posição similar – é detectada
em diferentes espaços sociais, entre eles o da política. Em todo o Brasil há mais
mulheres matriculadas no ensino médio e superior do que os homens. De acordo
com os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) em
2003, para o ensino superior, a diferença de matrículas em favor das mulheres
chegava a 10,7%(dez vírgula sete pontos percentuais) no Sul, 11% (onze por cento)
no Sudeste, 13,6%(treze vírgula seis por cento) no Nordeste, 19,9% (dezenove
vírgula nove por cento) e no Centro-Oeste e 21,2% (vinte e um vírgula dois por
cento) no Norte. Isso reforça a hipótese de que a maior qualificação credencia as
candidatas aos olhos do eleitorado, nessas regiões.
72
Por último, a terceira hipótese, que é a demográfica. Esta afirma que há maior
migração entre o sexo masculino em busca de maiores oportunidades de trabalho,
por isso há maior eleitorado feminino. A hipótese afirma que as mulheres teriam
maior facilidade para vencer as eleições nesses municípios menores 37 . Todos esses
fatos são importantes para se entender o crescimento de candidaturas de mulheres
bem como a sua persistente sub-representação.
Dentre as hipóteses levantas acima concordamos em parte com a autora,
uma vez que, presenciamos no nosso estado que a maioria das mulheres eleitas
vem de partidos conservadores e foram eleitas com a política de base clientelistas.
No tocante a hiperqualificação feminina de fato, as mulheres têm superado os
homens como já assinalamos anteriormente, e quanto a hipótese demográfica, não
acreditamos que seja determinante, pois as mulheres já são maioria da população,
portanto a migração interna dos homens não interfere nas eleições, contudo deve-se
considerar este dado como importante, qual seja, o eleitorado feminino é majoritário
em todas as cidades. Contudo, cabe frisar que nessas regiões onde as mulheres
foram eleitas não percebemos que elas tenham sido reeleitas, ou seja, não se repete
o sucesso dos anos anteriores.
37
Essa pesquisa foi realizada no período de 1996 a 2004, ver dados nos Estudos Feministas da Universidade
federal de Santa Catarina, 2006 ( MIGUEL E QUEIROZ, 2006).
73
vereadora. Contudo, a participação das mulheres nas eleições proporcionais (para
vereadora) é bem mais expressiva do que a participação nas eleições majoritárias
(prefeitas). Em termos percentuais, a candidatura das mulheres a vereadora é mais
que o dobro da candidatura à prefeita em todo o país, 22,14% (vinte e dois vírgula
quatorze por cento) do total de candidatas, 75.948 (setenta e cinco mil novecentos e
quarenta e oito) em um total de 343.027 (trezentos e quarenta e três mil e vinte e
sete) candidatas. Para o cargo de prefeita, nas eleições de 2004, as mulheres
representam 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento) das candidaturas, ou
seja, 1.463 (Hum mil quatrocentos e sessenta e três) candidatas em um total de
15.510 (quinze mil quinhentos e dez) da população. Comparativamente as eleições
de 2000- quando as candidatas representavam 7,59% (sete vírgula cinqüenta e nove
por cento), totalizando 1.139 (Hum mil cento e trinta e nove) – o crescimento
absoluto foi de 324 (trezentos e vinte e quatro) candidatas.
Em termos das candidaturas de mulheres ao cargo de prefeita, observa-se
uma grande discrepância, tanto entre os estados quanto entre os diversos partidos
políticos. O percentual de candidatas mulheres distancia-se muito da média nacional
que é 9,43% (nove vírgula quarenta e três por cento), variando de 3,70% (três
vírgula setenta por cento) a 17,31% (dezessete vírgula trinta e um por cento) por
Estado. Em termos de partidos políticos, a variação é de 0% (zero por cento) a
18,27% (dezoito vírgula vinte e sete por cento) em todo o país (CFÊMEA, 2004).
38
A candidatura á prefeita não é contemplada pelo sistema de cotas (GROSSI e MIGUEL, 2001).
74
14,84% (quatorze vírgula oitenta e quatro por cento) do total e as mulheres eleitas
foram 133 (cento e trinta e três), 12,5% (doze vírgula cinco por cento) do total. O
crescimento das mulheres eleitas deputadas/ distritais foi de 25,5% (vinte e cinco
vírgula cinco por cento) em relação à 1998. Em 2002, as candidatas a deputada
federal totalizaram 509 (quinhentos e nove), 11,52% (onze vírgula cinqüenta e dois
por cento) do total e as mulheres eleitas somaram 42 (quarenta e dois), 8,2% (oito
vírgula dois por cento). O crescimento das mulheres eleitas como deputadas
federais foi de 45% (quarenta e cinco por cento) em relação à 1998. Pode-se
observar, assim, que a participação das mulheres nas eleições proporcionais é
crescente do nível federal para o municipal.
75
Para Netto (1990), a democracia encontra no ordenamento capitalista, a
fronteira da propriedade privada dos meios de produção e a decisão acerca da
destinação do excedente econômico. De um lado a burguesia assume
compromissos com os projetos burgueses e de outro com a proposta democrática,
que permite garantias individuais, a livre expressão de opiniões e opções políticas e
sociais.
A eficácia das cotas para Araújo (IDEM), está associada ao sistema eleitoral e
o caráter da lista: aberta ou fechada. Listas fechadas e bloqueadas – aquelas em
que o eleitorado não tem nenhuma possibilidade de alterar a ordem dos candidatos
– são aquelas nas quais, os eleitores votam nos partidos e não nos candidatos.
Estas tendem a produzir uma transferência mecânica da proporção de candidaturas
femininas para a proporção de mulheres no parlamento.
Para Araújo (2006), no caso do Brasil onde as listas são abertas, a legislação
é capaz de forçar a superação apenas na barreira inicial, aquela que, dentro dos
partidos, impedia ou dificultava o lançamento de candidatas mulheres às eleições.
Os eleitores escolhem seus candidatos votando nestes e não no partido. Desta
forma, o fator que determina quem são os eleitos é a quantidade de voto recebida
por cada candidato individualmente.Vencer o preconceito, disseminado entre
eleitores e eleitoras, que faz com que a mulher seja vista como estando deslocado
77
no campo político, fora do seu meio natural, e, portanto tenha menos chance de ser
votada, é a grande dificuldade encontrada pelas mulheres. No caso do Brasil, as
dificuldades próprias do sistema de listas abertas somaram-se a outras, advindas da
fragilidade da legislação que instituiu as cotas.
Podemos perceber que o sistema eleitoral, não mudou pelo fato de que as
vagas destinadas às mulheres são apenas facultativas, isto é, os partidos tanto
podem preenchê-las com candidatas (do sexo feminino) quanto deixá-las em aberto.
Nas quatro eleições sob a vigência das políticas de cotas o percentual efetivo das
mulheres concorrentes era inferior ao estabelecido em lei.
78
candidaturas, mesmo que estas fossem as que mais tivessem chances eleitorais.
Neste caso percebe-se que predomina a lógica sexista.
39
A esquerda democrática a qual nos referimos é PT, PCdoB, PCB e o PDT.
79
grupos burocráticos ligados as forças armadas e policiais e a aplicação das leis. Já a
“Sociedade civil” designa um momento ou esfera da “superestrutura”. De acordo
com Coutinho (1987) superestrutura significa:
80
característica do processo eleitoral e partidário, corrupção, ausência de
financiamentos públicos e controle democrático das campanhas para algumas
mulheres, que tendem a receber menos apoio e sustentação partidárias e, portanto,
menor visibilidade comparativamente as campanhas dos homens e
conseqüentemente a receber menor apoio e voto de eleitores (as), as negociações
conciliatórias para favorecer a classe que detêm os meios de produção,
candidaturas “laranjas”-candidaturas para preencher vagas inexistentes - são
características constantes nesse processo eleitoral, além da discriminação contra as
mulheres e a desigualdade entre os sexos, que leva a dupla jornada de trabalho e
até a tripla jornada de trabalho, dificultando a participação política de muitas
mulheres.
A cultura política também é um elemento importante que influencia o acesso
das mulheres á representação em contextos socioeconômicos idênticos ou
diferentes. Na perspectiva de gênero, ajuda a entender como os valores, os
estereótipos e os referenciais simbólicos sobre os lugares dos homens e das
mulheres interferem e, de certo modo, condicionam atitudes e praticas que reportam
ao campo político, como exemplo as cotas.
Quando discutimos a inserção das mulheres no cenário político, vem a idéia
de entender a concepção de política na atual sociedade de classe. Ora, a política se
constitui como lugar de articulação do social e de suas representações, que compõe
a história. A rigidez das fronteiras entre o público e o privado é construção do século
XIX, quando houve a constituição de um espaço político que se confunde com o
público e do qual as mulheres foram excluídas. A partir de então, foi atribuído às
mulheres apenas o poder informal ou poder social 40 . Assim, o poder político formal
passa a ser identificado com o masculino. Essa representação de poder tende a se
estender pelo século XX de tal maneira que o feminismo será sempre associado ao
poder de bastidores.
Assim, as mulheres, participando do cenário político e sua luta feminista pela
igualdade de gênero demonstra a conquista de um espaço importante no poder
político. Na medida em que as mulheres começam a assumir novos espaços, saem
do mundo restritamente privado para o público, havendo com isso uma troca de
40
Poder informal ou poder social é aquele associado ao poder dos bastidores, no qual é delegada a mulher às
atividades menores nos cargos de direção, enquanto os espaços formais de decisão e discussão política são
ocupados quase exclusivamente por homens. Podemos observar isso dentro dos partidos ditos de esquerda e nos
sindicatos (PERROT, 1988).
81
papéis, no qual alguns homens se vêem obrigado a entrar para o domínio privado,
assumindo, muitas vezes, as atividades do lar, responsabilidades essas que
deveriam também ser inerente a eles. Podemos conferir a partir dos dados do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2007), que essa troca de papeis se
dão em decorrência do aumento do número de homens na posição de chefe de
famílias e por dedicarem 10h05min semanais aos afazeres domésticos, e na posição
de cônjuges, não ultrapassarem 10h44min semanais. Enquanto as mulheres
consideradas chefes de famílias que trabalham fora de casa, quando comparadas a
homens cônjuges desocupados dedicam 9h a mais por semana ao trabalho
doméstico. Levando em consideração que houve um aumento de famílias chefiadas
por mulheres que passou de 24,9%(vinte e quatro vírgula nove por cento) em 1997,
para 33%(trinta e três por cento) em 2008, estes dados revelam um total de 19,5
(dezenove vírgula cinco) milhões de famílias brasileiras que identificam a mulher
como principal responsável pelo sustento da família.
82
Caicó, e a primeira eleitora Celina Guimarães Vianna, na cidade de Mossoró, tendo
entregue seus documentos para requerimento em 25/11/1927. Naquela época,
poucas mulheres tinham coragem e possibilidades de enfrentar o preconceito e a
discriminação dentro dos partidos políticos e, raramente, chegavam a entrar em um
deles, já que o papel reservado as mulheres era de genitoras e donas do lar.
É importante sinalizar que a luta da mulher potiguar, teve também como figura
de destaque Nízia Floresta Brasileira Augusta, pseudônimo da escritora Dionísia
Gonçalves Pinto (1810-1885). Nascida no município de Papary (RN), hoje, Nizia
Floresta, em homenagem a mesma, cuja história de vida e produção intelectual
colocam -na entre as primeiras escritoras do Brasil e entre as primeiras educadoras
feministas, por defender os direitos das mulheres, índios e escravos. Ela é
reconhecida, sobretudo por ter rompido barreiras e preconceitos no que se refere às
chamadas “minorias”, termo utilizado para definir as classes que são excluídas da
sociedade como mulheres, homossexuais, negros e outros.
A publicação de um dos seus livros, “Direitos das Mulheres e Injustiça dos
Homens” (1832), representou um marco na consciência da mulher brasileira, por ser
o primeiro livro nacional realizado com a intenção de reivindicar e declarar a injustiça
41
social praticada contra as mulheres.
Outra figura que representa a luta das mulheres no Brasil é Bertha Lutz,
nascida em São Paulo, em 1894. Contrariando o modelo tradicional de família
brasileira, o pai estimulou Bertha Lutz a estudar e trabalhar e ela tornou-se líder
feminista a nível nacional (GOLDENBERG, 1992). De acordo com Góis (2000), em
1928, Bertha Lutz veio ao Rio Grande do Norte, discutir com o Governador Juvenal
Lamartine de Farias, a questão da inclusão de uma mulher na disputa de um cargo
eletivo, uma vez que a Lei de nº 660, art.77, de 25 de outubro de 1927, dizia que no
Rio Grande do Norte, poderiam votar e serem votadas, sem distinção de sexo, todos
os cidadãos que reunirem as condições exigidas por essa lei. Assim, neste período,
surgiu a candidatura de Alzira Soriano de Souza.O convite foi feito pelo então
governador à Alzira Soriano de Souza, para disputar a Prefeitura do município de
Lajes/RN, apoiado pelo partido Republicano e por seu pai, líder político da região,
41
Para Mariz (1982), foram panfletos de idéias feministas, acentuadamente popular na Europa e mesmo do
Brasil da época. Não se tem até agora noticia da existência de nenhum exemplar desta edição, publicado em
Recife.
83
Cel. Miguel Teixeira de Vasconcelos. Desta forma, Alzira Soriano foi eleita, como já
assinalamos, em 1928.
84
destacava-se o antagonismo entre as forças nacionais (comunistas) e as forças
conservadoras defensoras da ditadura.
No RN estabelece-se o fenômeno do populismo na figura do Governador
Aluízio Alves, que posteriormente adere ao regime militar, apoiando e liderando
diversas ações repressivas, contudo mesmo assim, teve seus direitos políticos
cassados em 1969 pelo AI 5 ( Ato Institucional número 5).
Instalada a ditadura militar, a partir de então tem início a fase de
investigações, perseguições e prisões, comandada pela Comissão de investigações,
comissão esta formada por ordem do então Governador Aluízio Alves. As mulheres
não estavam fora desse contexto, uma das primeiras a ser perseguida foi a
funcionária pública Mailde Pinto Galvão, acusada de subversiva.
Ressaltamos também a importância de um movimento ocorrido no cenário
nacional que repercute em Natal. É o movimento de anistia, em 1975, em Natal, que
esteve ligado ao Ano Internacional da Mulher e a própria reunião da ONU
(Organização das Nações Unidas) que estabeleceu a Década da Mulher. Em Natal
registra-se o surgimento do Centro da Mulher Natalense – CMN, as mulheres
trataram de se reorganizar para dar continuidade ao movimento por igualdade de
direitos (FERNANDES, 2004).
Em 1978, o então presidente da República Ernesto Geisel concedeu anistia
aos presos políticos e a todos aqueles que haviam sido punidos pelo regime militar.
Em 1979 acaba o bipartidarismo. São extintos a ARENA (Aliança Nacional
Renovadora) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), criando-se novos
partidos para a disputa das eleições seguintes: O PDS (Partido Democrático social),
PMDB (Partido do movimento Democrático Brasileiro), PTB (Partido Trabalhista
Brasileiro), PDT (Partido Democrático Trabalhista), PT (Partido dos Trabalhadores),
PP (Partido Popular). Em 1982 foram restabelecidas as eleições diretas para
governador.
Na década de 1980 pós - ditadura militar as mulheres e homens estavam
reorganizados nos movimentos sociais, principalmente nos movimentos
universitários 44 e movimentos secundaristas que foram palco de contestação da
juventude aos atos de tortura e perseguições durante o regime militar. Tanto o
44
Esse movimento ficou conhecido como movimento acadêmico, ancorado no Departamento de Pesquisa da
Fundação Carlos Chagas, em São Paulo, e em pesquisas de ciências humanas e educação realizadas nas grandes
universidades do país (PINTO, 2003).
85
movimento universitário como secundarista estavam sendo liderados em sua maioria
pelo Partido dos Trabalhadores (PT) que havia se fortalecido na resistência à
ditadura, assim como o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) que
contava com maioria no parlamento e tinha o apoio do Movimento Revolucionário 8
de Outubro - MR8 - que contava nesta época com um departamento feminino. Surge
nesse mesmo período a fundação da Federação da Mulher Potiguar, que dividiu o
movimento feminista ainda no I Encontro da Mulher Potiguar realizado em Natal no
ano de 1982.
Já no âmbito nacional, a organização das mulheres no movimento feminista
na década de 1980, se deu a partir de um encontro na Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência (SBPC). Em Fortaleza-CE, em 1979, ocorreu o I Encontro
Nacional Feminista e em 1980 foi a vez do II Encontro Nacional Feminista, no Rio de
Janeiro. Esse encontro repercutiu em Natal contribuindo para o I Encontro da Mulher
Natalense em 1981, com o objetivo de “favorecer a discussão sobre os problemas
específicos das mulheres e da sociedade em geral, em um contexto mais
abrangente”. Os grupos de trabalho foram divididos por temas: Mulher e Saúde,
Mulher e Trabalho, Mulher e Sociedade e Organização e Participação da Mulher no
Conselho Municipal de Natal A partir desse encontro oficializa-se o grupo Movimento
de Mulheres em Luta – MML. A partir daí começa-se a comemorar em Natal, no dia
08 de março, o Dia Internacional da Mulher (FERNANDES, IDEM).
Nesse período surgem nas universidades vários núcleos, os Núcleos de
Estudos de Pesquisa sobre as Mulheres, grupos organizados de mulheres que
lutavam contra a opressão e exploração da mulher. Em Natal, na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), cria-se o NEPAM (Núcleo Nizia Floresta de
Estudos e Pesquisas sobre Mulher e Relações de Gênero) em março de 1991.
Ao mesmo tempo temos o crescimento da participação das mulheres nos
clubes de mães e conselhos comunitários, amparados por partidos e políticos,
portanto cabides eleitorais, cujo objetivo eleitoreiro era eleger pessoas como
vereadores em determinados bairros periféricos, cujas historias de vida não
demonstravam nenhum compromisso com a classe trabalhadora e com a camada
pobre. Essas mulheres eram convidadas a participar das atividades promovidas
pelos conselhos das Mulheres, instruídas pelos cabos eleitorais. De acordo com
Fernandes (IBIDEM), as mulheres não tinham a devida noção daquilo para o que
estavam contribuindo com suas presenças, ou seja, discutir e informar corretamente
86
não parecia ser exatamente uma preocupação naquele agrupamento, para eles, o
movimento de mulheres era e continua sendo, até hoje, mero instrumento eleitoral.
De forma geral as mulheres em Natal estavam atentas ao que estava
acontecendo e por sua vez a organização dos movimentos sociais as representavam
em várias instâncias. Em 18 de março de 1986, é entregue uma carta magna com
as reivindicações das mulheres aos Constituintes Estaduais, na Assembléia
Legislativa. O objetivo em assegurar os direitos das mulheres na nova Carta Magna
em processo de discussão. Neste momento, o CMDM coordenava uma ação que
mantinha mobilizado o movimento nacional cujo lema “Constituinte pra valer tem que
ter palavra de mulher”. Um dos pontos discutidos pelas mulheres era garantir os 120
dias de licença maternidade remunerada para gestante (FERNANDES, IDEM).
Como se pôde ver há toda uma luta das mulheres na Constituinte a partir da
criação dos conselhos. Assim em 1988, ocorreram as primeiras eleições municipais
que foram as primeiras após o regime militar. Porém, ressaltamos que as mulheres
eleitas vereadoras nesse período não estavam engajadas nesses movimentos. Pela
primeira vez, em Natal, elegemos quatro vereadoras, dentre estas mulheres:
87
Lindalva Santos Maia Neo, eleita pelo PDT (Partido Democrático Brasileiro)
coligação “Vitória do Povo” (PDT, PRN (Partido da Renovação Nacional), PSD
(Partido Social Democrático), Gilda Medeiros Souza eleita pelo Partido da Frente
Liberal-PFL; Verônica Maria dos Santos Nogueira eleita pelo Partido Democrático
Trabalhista – PDT; coligação “Vitória do Povo”; Ana Catarina Alves Wanderley eleita
pelo Partido Trabalhista Renovador (PTR). Como já mencionamos a maioria das
mulheres eleitas não estavam ligadas a movimentos sociais, ao contrário, estavam
atreladas e foram eleitas por partidos e coligações considerados conservadores, e
muitas mulheres estão na política por interesse destes grupos.
88
corrupção. A instauração do processo de Impeachment, aprovada pela Câmara
Federal contou com o apoio de cerca de duas centenas de organização de
mulheres, (respaldando o trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI),
entre essas organizações seis eram do Rio Grande do Norte (FERNADES, 2004). A
mobilização pelo Impeachment teve o apoio de amplos segmentos da sociedade civil
organizada, na qual os estudantes se destacaram indo as ruas com suas caras
pintadas de verde e amarelo, ficando conhecido como os caras pintadas, exigindo
punição para Collor e seus comparsas.
Nas eleições de 1994 é eleita também uma mulher pela coligação “Frente
Popular de Natal” (PT, PCdoB e PCB), para assumir uma cadeira no legislativo
estadual, a professora e militante Fátima Bezerra (PT). Sua plataforma de governo
era o combate a violência e a discriminação praticada contra as mulheres, assim
como direito à saúde e mercado de trabalho. Nesse ano, as mulheres estavam
organizadas na Articulação de Mulheres Brasileiras, e no Fórum de Mulheres do RN
para participar da IV Conferência Mundial da Mulher na China – Beijing. Dentre os
temas a ser discutida estava a política de cotas.
89
contudo, não elegeu nenhuma mulher. Mas, foi a partir das discussões do PT que a
política de cotas passou a ser implementadas.
Nessas eleições um fato que marcou a mídia local foi os vários boatos que
cercavam as candidatas. De um lado uma candidata petista considerada radical,
vinda de movimentos sociais, taxada de “sapatão”, termo pejorativo e depreciativo
acerca se sua possível orientação sexual, por outro lado temos uma candidata que
já vinha de uma carreira política extensa, desquitada, mas que também não escapou
as agressões e em função de sua separação também foi taxada de “sapatão”. 46
Portanto temos duas mulheres com estilos de vida diferentes, mas que foram alvos
de preconceitos. Por serem pessoas públicas, com poder de governar uma cidade,
eram vistas como mulheres que queriam ser homens. A partir do momento que
mulheres como essas chegam a cargos elevados ou os almejam, a sociedade as
deprecia, ou seja, são discriminadas por esses estereótipos. Por outro lado, as
candidaturas de mulheres são consideradas alternativas, uma vez que as mulheres
são vistas como dóceis e frágeis. Tentando contribuir para modificação deste quadro
de discriminação e preconceitos contra as mulheres é que surgiu a política de cotas.
46
No ano de 2008, Fátima Bezerra (PT), pela coligação “União por Natal” (PT, PCdoB, PDT, PRB, PTN,PSB,
PMDB, PCB e PHS) concorreu novamente as eleições majoritárias, desta vez sendo apoiadas pela atual
governadora do Estado, Vilma Faria (PSB) e pelo Senador Garibaldi Alves Filho (PMDB). Sua principal
concorrente é Micarla de Souza, pela coligação “Natal Melhor” (PV, DEM, PP, PMN, PTB). Temos Fátima
Bezerra ligada a grupos considerados conservadores e progressistas contra os grupos considerados mais
conservadores do Estado. O discurso utilizado pela candidata Micarla de Souza marca mais uma vez o
preconceito a sua concorrente, acerca de sua possível orientação sexual, quando ela coloca a importância da
família, de ser mãe, e para ela isso faz a diferença a futura Prefeita de Natal que irá administrar uma cidade.
Apesar disto, Micarla de Souza ganhou as eleições ainda no 1º turno.
90
Em Natal/RN, a primeira experiência com cotas foi em 1996, nas eleições
para a Câmara de vereadores, sendo assegurada uma cota mínima de 20% (vinte
por cento) para as candidaturas de mulheres, e naquele ano, mesmo não
conseguindo preencher a cota estipulada, obtivemos um crescimento de cerca de
111% (cento e onze por cento) das vereadoras eleitas (Cfemea, 1998). Mesmo
tendo crescido o número de candidaturas femininas à Câmara de vereadoras, em
1996, em Natal/RN, como já assinalamos só elegemos 2 (duas) mulheres, Maria de
Fátima Benedetto Fernandes Carrilho eleita pela coligação PTB/ PCB/ PFL/PSB e
Sonali Rosado Cascudo Rodrigues Nelson dos Santos pela coligação PPS, PSDB.
Convém ressaltar que elegemos uma mulher para prefeita, Vilma Maria de Faria
Maia eleita pelo Partido Socialista Brasileiro. Isso mostra que a cota mínima,
portanto não foi alcançada (TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL – T.R.E, 1996).
Embora tenha sido instituída a lei de cotas – lei 9.504/1997, tal lei não mais
estabelecia uma cota somente para as mulheres, mas estabeleceu o número mínimo
de 30% (trinta por cento) e uma cota máxima de 70% (setenta por cento), para
qualquer um dos sexos. Deste modo, esta lei não determina a quem vai beneficiar.
Nas eleições de 1998, para a Câmara Federal e Assembléia Legislativa no
Rio Grande do Norte, houve já uma segunda experiência de cotas, agora
assegurando uma cota mínima de 25% (vinte e cinco por cento) e máxima de 75%
(setenta e cinco por cento) para candidaturas de qualquer um dos sexos.
Pôde-se perceber que mesmo tendo crescido, de maneira expressiva, o
número de candidatas femininas à Câmara Federal e a Assembléia Legislativa nas
eleições de 1998, se comparado com os dados das eleições de 1994, a cota mínima
de 25% (vinte e cinco por cento) não foi alcançada (Cfemea, 1998). Isso se refletiu
nas eleições em Natal/RN, no ano de 2000, em que tivemos 1.216 (Hum mil
duzentos e dezesseis) mulheres candidatas, contra 5.056 (cinco mil e cinqüenta e
seis) homens. Das 1.216 (Hum mil duzentos e dezesseis) candidatas somente uma
vereadora foi eleita: Fernanda Freire, pelo PPB. Natal não conseguiu sequer manter
a situação da eleição de 2000, demonstrando as dificuldades que as mulheres
enfrentam no decorrer da disputas eleitorais, em razão de anos de invisibilidade.
Entretanto, enquanto as mulheres brasileiras comemoravam em 2002, os 70
91
(setenta) anos, do primeiro voto feminino, no RN isto ocorreu em 1928. No Rio
Grande do Norte, as potiguares comemoravam portanto, 74 (setenta e quatro) anos.
No ano de 2004, o Estado do Rio Grande do Norte elegeu 25 (vinte e cinco)
prefeitas, alcançando uma média de 14,97% (quatorze vírgula noventa e sete por
cento) do total de prefeituras, representando o segundo melhor resultado no
Nordeste. Esse percentual torna-se ainda mais significativo se considerarmos que o
Estado recuperou uma queda observada em 2000, quando ficou com apenas 6,6%
(seis vírgula seis por cento), e superou também o índice de 10,8% (dez vírgula oito
por cento) referente a 1996, antes da queda. Tendo conquistado também o maior
percentual de vereadoras do Nordeste, 262 (duzentos e sessenta e duas), ocupando
17,2% (dezessete vírgula dois por cento) das vagas. No entanto, é o RN, único
Estado da Região que não tem vereadoras na capital, mesmo tendo elegido uma
governadora (GARCIA, 2005).
92
cada. Desta forma o RN é considerado o estado que tem o maior índice de
vereadoras eleitas comparados a todos os Estados brasileiros 47 .
Por outro lado Costa (2007), diz que os partidos políticos têm perdido a
importância como canais de mediação entre o Estado e a sociedade. São deficientes
na articulação e agregação dos seus distintos interesses e, nesse sentido, é
compreensível a constatação dos decrescentes níveis de vinculação das pessoas
aos partidos e o crescente descrédito aos mesmos 48 .
47
Percentuais de mulheres eleitas prefeitas em 1992 no RN – 7,24% (sete vírgula vinte e quatro por cento); 1996
– 10,84% (dez vírgula oitenta e quatro por cento); em 2000 – 6,59% (seis vírgula cinqüenta e nove por cento);
2004 – 14,97 (quatorze vírgula noventa e sete por cento) (GARCIA, 2005).
48
Sobre a crise de representatividade ver (COSTA, 2007).
93
(quatorze vírgula noventa e sete por cento) de prefeituras (Mulher e Democracia,
2005).
49
Ao contrário de 2004, nas eleições de 2008 o RN elegeu vinte e cinco mulheres prefeitas. Natal elegeu a
prefeita e duas vereadoras, enquanto a segunda maior cidade Mossoró também elegeu três mulheres, equivalente
a 15% (quinze por cento) o total de eleitas. Portanto mais uma vez o Nordeste é a região que mais elegeu
mulheres e o RN obteve o melhor resultado.
94
decisórios (57º), que inclui cargos políticos, ocupando o penúltimo lugar da listas de
países, perdendo apenas para a Jordânia. Observando esse quadro de sub-
representação, fica evidente o nível de desvantagem das mulheres no Brasil em
relação a outros países considerados poucos desenvolvidos. Isso permite afirmar
que, apesar das mulheres terem os mesmos direitos civis, políticos e econômicos
que os homens, de acordo com legislação brasileira, muitos desses direitos não se
concretizam, por diferentes razões culturais, costumes e praticas sociais
discriminatórias em relação as mulheres.
95
cada partido, levando em consideração os partidos representativos como: PMDB,
PSB, PFL, hoje Democratas (DEM). Partindo desse contexto, entrevistamos as
mulheres eleitas dos partidos citados acima. Isso demonstra que, no período citado
acima foram eleitas 7 (sete) mulheres à frente da Câmara Municipal de Natal, foram
elas: Lindalva Santos Neo Maia, Gilda Medeiros de Souza, Verônica Maria dos
Santos, Ana Catarina Alves, Sonali Rosado Cascudo Rodrigues, Maria de Fátima
Benetto Fernandes Carrilho, Fernanda Freire.
96
influência das famílias ou dos maridos sem, contudo, terem um histórico de
participação e vida política mais ativa na sua cidade. Isto se reflete nas suas falas.
97
Convém ressaltar que a maioria das mulheres entrevistadas disseram que
sofreram influência familiar para adentrar na política, além da maioria terem laços
familiares com grupos conservadores, ou seja, oligarquias locais. Percebemos isto
quando analisamos quais os partidos e as coligações em que essas mulheres
disputaram as eleições, partidos considerados de direita. No universo dessas
mulheres entrevistadas constatamos que elas sofreram influência política seja de
companheiros ou pais, e algumas tornaram-se candidatas por vontade própria. A
respeito dos motivos que as levaram a ingressar na política partidária, a ver.4
respondeu que o que a motivou foi a “vontade de servir a minha cidade”, a ver.1
afirmou “sempre fui doida por política, entrei por vontade própria, mas a convivência
familiar interferiu.
98
Há uma rejeição, por ser mulher, os homens não gostam e não aceitam as
mulheres na Câmara, acham que as mulheres atrapalham o seu trabalho,
não gostam pelas suas ações (deles), acredito que seja isso, os homens
são machistas. Eles desestimulam as mulheres no próprio partido, porque o
partido já sabe quem vai ou não se eleger e a mulher fica em segundo
plano.
Por ser mulher ela sofre, por não se desligar dos laços familiares. As
dificuldades enfrentadas pelas mulheres ao adentrar na política partidária
principalmente, por ser mulher, mãe e ser esposa de político. Isso
demonstra a preocupação que a mulher tem com sua vida privada, de ser
mãe e ao mesmo tempo dividir as preocupações de casa, com a sua vida
na política (ver.5).
Nessa fala percebemos uma visão moralista, conservadora que ser mãe
dificulta se desligar dos laços familiares, isto é conciliar a vida familiar com a carreira
política. Nesse sentido todos os fatores relacionados no decorrer da pesquisa sobre
os determinantes da sub-representação das mulheres nos espaços de poder está
sendo demonstrado nas falas das mulheres, principalmente a visão machista e
moralista que predomina até a atualidade.
99
A esse respeito, nas falas das mulheres percebe-se o descaso dos partidos
com os anseios políticos das mulheres.
A política partidária não se constitui como obstáculo, contudo, para que isto
seja implementado definitivamente, é preciso mais divulgação e importância
da participação feminina (ver. 4).
A respeito das políticas de cotas foram várias as opiniões, somente uma acha
que não deveria existir a política de cotas para as mulheres, pois reforça o
preconceito e a discriminação, mas por outro lado obriga os partidos a pensar a
mulher na política e valorizar mais o papel delas nos partidos, as outras acham
importante. Acerca disto, as entrevistadas afirmaram:
Acho que deveria ser 50%”, entendemos a defesa de direitos iguais entre
mulheres e homens no parlamento ( ver.3).
Para Miguel e Grossi (2001), a política de cotas é medida que visa alterar o
quadro de Desigualdades-raciais, étnica, sexual e social. Neste sentido, como já
assinalamos, as ações afirmativas reconhecem as discriminações existentes e agem
no sentido de impedir que as mesmas se perpetuem. Desta forma, na nossa opinião
100
há uma visão limitada por parte das vereadoras, acerca da política, talvez por falta
de conhecimento ou posição política.
Portanto, assim como Miguel e Grossi (IIDEM), as entrevistadas corroboraram
com o mesmo pensamento, na defesa de mudar o quadro das desigualdades nos
parlamentos. Ainda sobre essa questão quando indagadas se essa política deveria
ser definitivamente implementada, todas afirmaram que era necessário uma maior
divulgação, apoio e vontade dos partidos para que sejam implementadas.
Além disso, percebemos uma contradição na fala da ver..5 quando diz: Não
acho que seja necessário essa obrigatoriedade, mas precisa mais vontade dos
partidos e melhor espaço da ala masculina”.
Segundo Araújo (2006), como os eleitores votam nos partidos e não nos
candidatos, tende-se a uma transferência mecânica da proporção de candidaturas
femininas para a proporção de mulheres no parlamento. Isto se dá porque as cotas
estão associados ao sistema eleitoral e o caráter da lista aberta ou fechada.
101
explorados, e que esse baixo índice das mulheres nos espaços de poder é uma
das conseqüências dessa sociedade capitalista e patriarcal.
A visão das entrevistadas acerca da política ressalta seu aspecto negativo e
também de falta de credibilidade quando acreditam que a política deveria ser
voltada para o povo. Nas falas de algumas das entrevistadas, percebemos isso:
102
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
103
e discriminações, além de conciliar a carreira política com o fato de ser mãe,
progenitora e não conseguir se desvencilhar dos laços e obrigações familiares.
Os vários questionamentos levantados a respeito das políticas de cotas na
concepção das mulheres se dão, principalmente, pela falta de interesse dos
partidos, já que não há divulgação e valorização da participação das mulheres na
política. No tocante ao que se refere ao percentual exigido para que as cotas
sejam cumpridas algumas vereadoras concordam que deveria ser de 50%
(cinqüenta por cento), para haver igualdade entre mulheres homens, já que as
cotas vêm no sentido de diminuir as desigualdades e impedir que as mesmas se
perpetuem. No que diz respeito a sub-representação das mulheres nos espaços
de poder pode se observar que as mulheres relacionam esta questão ao
preconceito e a discriminação sofrida por parte dos homens, pois estes não
aceitaram as mulheres disputando os mesmos cargos. Deste modo, entendemos
que esse é dos elementos que influenciam nesta falta de interesse e divulgação
dos partidos da política de cotas.
A nossa última questão dizia respeito ao que essas mulheres entendiam por
política. As respostas mostraram uma visão bastante limitada que se distancia
das idéias de alguns teóricos que vêem a política na sociedade capitalista como
algo negativo, como expressão da alienação e obstáculo a construção humana.
Para elas política é a arte de servir, liderar, voltada para o povo e para a
construção do bem comum. Contudo, questionamos: que democracia é essa que,
muitas vezes, o “povo” não tem opção de escolher em quem votar porque é
obrigado a trocar seu voto por tijolos, remédios, próteses dentárias e dinheiro,
uma vez que os partidos políticos continuam usando o poder para barganhar
votos entre os mais necessitados.
Percebemos que uma das formas dos homens perpetuarem a exclusão das
mulheres da vida política é a eliminação da evidência de sua participação no
passado e suas contribuições no presente. Porém, não podemos esquecer que
muitas dessas mulheres exerceram grandes influências e contribuíram para o
conhecimento e bem-estar humano e o seu papel na história vem sendo
reconstruído pelo movimento feminista.
104
patriarcal, ao longo do tempo, contribuiu para a internalização dos valores, regras
e normas de subordinação ao poder masculino.Todas essas discussões
levantadas a respeito da inserção feminina na política, nos trouxeram subsídios
para entender melhor como a mulher vem conquistando seu espaço na sociedade
capitalista, através do movimento feminista, que foi importantíssimo pelas
transformações e lutas na defesa por igualdade de direitos.
105
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TOLEDO, Cecília. Mulheres: O gênero nos une, a classe nos divide. São Paulo:
Xamã, 2001.
113
APÊNDICES
Entrevista
1) IDADE:
( ) 15-20 anos
( ) 21-25 anos
( ) 26-30 anos
( ) 31-35 anos
( ) 36-40 anos
( ) 41 ou mais anos.
2) ESTADO CIVIL:
( ) solteira
( ) casada
( ) separada
( ) viúva
( ) divorciada
( ) união estável
3) LOCAL DE NASCIMENTO
( ) Natal
( ) Interior do Rio Grande do Norte
( ) Interior de outros Estados
( ) outras capitais
4) NÍVEL DE ESCOLARIDADE:
( ) 1° grau incompleto
( ) 1° grau completo
( ) 2° grau incompleto
( ) 2° grau completo
( ) 3° grau incompleto
( ) 3º grau completo
114
( ) pós-graduação
II – Parte (Reflexão)
115