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Você sabe o vizinho gostoso que você foi apaixonada durante toda

a sua adolescência? Imagine vê-lo dez anos depois e ele acabar


sendo um idiota completo. Você vai saber como eu me sinto.

Nosso último encontro foi estranho, já que eu subi na janela de


seu quarto para transformar minha paixão não correspondida em
algo... correspondido. Esse dia já foi ruim o suficiente, mas as
coisas só pioraram.

Noah Griffin se tornou um dos melhores jogadores de futebol do


país e uma transferência para o Washington Wolves – o time para
o qual trabalho – o coloca na minha porta. O momento não poderia
ser pior, porque meu chefe acabou de me dar a oportunidade de
uma vida. E essa promoção se apoia diretamente nos ombros
grandes, musculosos e condescendentes de Noah.

Ele não quer nada comigo, e o sentimento é muito


mútuo. Mas, pelo bem da minha carreira, posso
ignorar todas as coisas sobre ele que me deixam
louca. Os olhos dele. A boca dele. Suas
grandes... mãos. Até que um dia, não podemos
mais nos ignorar.

Entretanto, você sabe o que eles dizem sobre a


linha entre amor e ódio? Eles estão certos.
Isso é dedicado àqueles que já sentiram que precisavam
provar seu valor.

Prometo que as pessoas certas sempre saberão exatamente o


quanto você é valioso.
SE EU SOUBESSE que minha nova chefe era Cruella de Vil,
eu teria coordenado as cores da minha roupa para o trabalho
naquele dia. Ela combinava perfeitamente com as cores dos
Washington Wolves. Ela era toda elegante e reluzente com seu
vestido preto, jaqueta branca, sapatos vermelhos, lábios
vermelhos e um cabelo branco prateado que caía logo abaixo
do queixo afiado como vidro.

— Você é Molly Ward? — Ela perguntou baixinho. Com o


tipo de silêncio em que me senti como se eu respondesse
errado, ela apertaria um botão e eu cairia por uma porta
secreta.

Eu assenti. — Bem-vinda a Washington, Srta. Kelly.


Estou ansiosa para conhecê-la.

Uma sobrancelha perfeitamente cuidada levantou como


se estivesse sendo puxada oh, tão lentamente por alguém
puxando uma corda. Resumidamente, ela olhou para algo em
sua mesa, meu formulário de emprego, presumivelmente. —
Você está aqui há muito tempo.
Eu sorrio. — Toda a minha vida, praticamente. Mas como
funcionária remunerada, há quatro anos.

Esperei Beatrice Kelly, a nova diretora de marketing do


Washington Wolves, sorrir de volta, mas ela não o fez.

Enquanto eu estava na frente da mesa dela, meus dedos


nervosos se contorcendo atrás das costas, ela me avaliou
abertamente, seus olhos cinzentos (porque até os olhos
combinavam) viajando do topo da minha cabeça até as solas
dos meus pés, vestidos de sapatos sensatos de couro marrom.

Pessoalmente, achei o calçado sensato incrivelmente


sexy, porque gostava de andar sem dor no final do dia, quando
meus sapatos caíam.

Por alguma razão, esses sapatos a ofenderam. Eu vi no


momento em que seu olhar tocou a ponta arredondada e o
pequeno laço de couro no meio do meu sapato.

Olhei para baixo, como se eles me explicassem o que


fizeram de errado e por que estávamos com problemas com a
minha nova chefe.

Sinto falta de Ava, pensei pela milésima vez, meu coração


apertando com a perda da minha antiga chefe, Ava Hawkins.
Por que eles tinham que se mudar para o outro lado do país
para ficar mais perto da família de seu marido, estava além de
mim.

— Sente-se. — Disse Beatrice, ainda sem tirar os olhos


dos meus sapatos. Deslizei em uma cadeira preta com encosto
alto e cruzei as mãos no colo, desejando desesperadamente ter
algo para mantê-las ocupadas. Durante toda a minha vida, eu
era a pior inquietação do universo quando estava nervosa. E
esse momento, estava entrando nos dez melhores de todos os
tempos. — Diga-me o que você ama no seu trabalho, Molly
Ward.

Meu cérebro disparou com a pergunta inesperada, porque


me senti como se estivesse sendo testada em alguma escala
invisível. Irracionalmente, eu queria encarar meus sapatos
como se eles tivessem me metido nessa bagunça.

— Eu amo muito o meu trabalho, senhorita Kelly, eu


disse honestamente. Eu provavelmente poderia falar com você
por horas, contando todas as razões.

Ela cantarolou. — Ligações de marketing combinam com


você, então?

— Sim. — Respirei fundo porque sabia que esse era um


daqueles momentos em que a falsa modéstia não me levaria a
lugar algum com minha chefe meio assustadora e fashionista
demais.

— Sou boa com as pessoas. Faço-as sentirem-se


confortáveis e antecipo bem suas necessidades. Então, quando
terminei meu estágio, Ava sabia que seria boa em lidar com
nossos anunciantes e acredito que fui. Nos últimos quatro
anos, construí relacionamentos fortes com nossos anunciantes
e não perdemos um único patrocinador importante desde que
assumi o cargo. Eles confiam em mim e eu ganhei essa
confiança.

Por uma fração de segundo, prendi a respiração,


preocupada por ter ido longe demais, com base no brilho
especulativo em seus olhos. Minhas mãos inquietas coçavam
para alcançar meus cabelos e refazer meu coque pela milésima
vez. Era uma piada entre meus colegas de trabalho que você
poderia dizer que eu estava estressada quando meu cabelo
mudava de posição mais de duas vezes ao longo do dia. Hoje
de manhã, sabendo que eu conheceria minha nova chefe,
ancorei cada fio do meu cabelo escuro com tanta firmeza no
lugar que apenas um operador de guindaste seria capaz de
fazê-lo se mexer.

— Posso ser honesta, Molly Ward?

— Claro. — E também, por que ela continuava dizendo


meu nome completo?

Beatrice se recostou na grande cadeira de couro e me


estudou novamente.

— Eu não estava ansiosa para conhecê-la.

Já ouviu o ar sair de um balão? Aquele lento e triste


assobio de ar até a única coisa que restasse fosse um pedaço
caído de plástico amassado? Sim, agora imagine isso
acontecendo com uma inocente garota de 25 anos, ansiosa
para conhecer sua nova chefe.

— Oh. — Eu exalei.
— Ok?

Assim que as palavras saíram, eu queria levá-las de volta.


Isso não estava bem. Não está bem. Eu conhecia esses salões
e campos de prática e escritórios desde os quatorze anos de
idade. Todo mundo aqui me amava! Eu era Molly maldita
Ward. Eu era boa no meu trabalho. Não, eu arrasava no meu
trabalho.

— Na verdade. — Eu disse devagar, reunindo meus


nervos e levantando o queixo. — Lamento ouvir isso porque
estava ansiosa para conhecê-la. Eu amo essa organização, amo
meu trabalho e sou muito boa nele. Se for algo que eu fiz no
passado que eu possa melhorar, por favor, me diga, para que
eu possa consertar.

Boom. Eu vi a centelha de admiração relutante em seus


olhos, lá e desapareceu como um relâmpago.

— Você não está curiosa por que eu não estava?

Ela perguntou, descansando levemente as mãos sem


joias na mesa à sua frente.

Não particularmente. Ok, tudo bem. Isso era mentira. Se


eu soubesse, eu poderia fazer todas as coisas ao meu alcance
para mudar isso. Mudar a percepção dela de mim. Na
faculdade, eu fui uma estudante 4.0. Qualquer energia fora de
foco que eu desperdiçara no ensino médio se transformou em
um laser vermelho brilhante, treinado direto para entrar na
lista do reitor a cada semestre. Não demorou muito tempo para
perceber que, mesmo que eu não fosse à pessoa mais
inteligente da sala, eu poderia muito bem ser a trabalhadora
mais dura, e que tinha meu nome na lista todas às vezes.

Respirei fundo e assenti.

— Um pouco.

Seus lábios vermelhos escarlates se curvaram com o


menor sorriso, algo que eu conheci como o melhor sinal de
diversão para Beatrice.

— Você provavelmente não luta para pessoas gostarem de


você, não é, Molly? Eu imagino que isso seja muito fácil para
você.

Sim? Suponho que era ingênuo da minha parte pensar


que ela já não tinha respondido a essa pergunta em sua
cabeça.

— Nem sempre é fácil. — Eu me ouvi dizendo.

Agora as bordas de seu sorriso pararam, congeladas em


um rosto que não mostrava rugas, apesar da cor de seus
cabelos.

— Tenho certeza de que é difícil fazer amigos. Você é


linda. Encantadora. Privilegiada. Seu irmão é uma lenda do
futebol e agora é um célebre treinador dentro desses
corredores. Sua cunhada, Paige, é uma ex-supermodelo que
poderia andar na semana de moda de Nova York amanhã, se
ela quisesse. Você conseguiu um emprego recém-saída da
faculdade, e que os veteranos de dez anos matariam.
Obviamente, você está fazendo algo certo, senhorita Ward. —
A ênfase no meu sobrenome me fez sentar na cadeira.

Como se ela estivesse sentada no meu ombro, eu podia


ouvir a voz da minha cunhada, o verdadeiro diabo com cabelos
ruivos flamejantes, aquela que sempre lutava por mim e por
minhas irmãs quando alguém vinha contra nós.

Essa cadela pode se ferrar. Ela não conhece você, e com


certeza não conhece nossa família, Paige sussurrou. Minha
Paige interior não estava errada.

Mas, por outro lado, estava meu irmão, Logan, o homem


que quase criou minhas três irmãs mais novas e eu depois que
nossa mãe fugiu. E eu sabia o que ele me diria para fazer.
Mostrar respeito. Fazer o meu trabalho. Provar que ela está
errada da maneira certa.

Logan interior também não estava errado.

— Eu sei como devo ser para você, disse a Beatrice.

— Como minha vida deve parecer. Mas você acabou de


me conhecer, senhorita Kelly. Sou uma trabalhadora; caso
contrário, eu não teria esse emprego, não importa qual seja
meu sobrenome.

— Vamos ver. — Ela meditou.

Sua atenção voltou para algo em sua mesa, e meus


molares se uniram ao seu tom irreverente. Ela levantou um
arquivo e me entregou sobre a extensão imaculada de sua
mesa. O logotipo preto e vermelho do Wolves estava estampado
na frente e eu o abri quando o tinha firmemente na mão. Meus
olhos deslizaram rapidamente sobre a capa, sobrancelhas
arregaladas de surpresa.

— Amazon? — Eu perguntei.

— Isso é enorme.

— É. Consegui esse emprego porque estou trazendo esse


projeto comigo. — Ela sentou-se e me observou novamente. Por
mais que eu quisesse folhear as páginas para aprender mais,
dei a ela toda a minha atenção.

— Como posso ajudar?

— Você me disse que é boa em desenvolver


relacionamentos. Que antecipa problemas e os faz
desaparecer. Que as pessoas se sentem confortáveis ao seu
redor. Estou lembrando-me de todas essas coisas
corretamente?

Eu assenti lentamente.

— Eu acho que você tem estado atrás de uma mesa por


muito tempo.

Respirei fundo, excitação formigando ao longo dos dedos,


onde agarrei o arquivo.

— Para onde você gostaria de me mudar?


Beatrice apontou para a pasta.

— Tudo isso está descrito na página dois. Estou lhe


oferecendo uma grande chance de apoiar essas palavras,
senhorita Ward, mas estou lhe dando vinte e quatro horas para
me dar uma resposta.

Meus olhos examinaram rapidamente, mas quando eu


abri minha boca, ela interrompeu.

— Não, quero dizer, eu não quero ouvir um sim ou não


por pelo menos um dia. Se você disser sim, esta será sua única
chance de provar para mim que você não está aqui apenas por
causa de seu sobrenome. Entendeu?

Cuidadosamente, forço minha aceitação imediata para


baixo.

— Compreendo. — Seus olhos seguraram os meus sem


vacilar.

— Isso é um grande negócio. Trabalhar com uma empresa


como a Amazon abre portas que não são abertas com
frequência, Molly. Essa descrição do trabalho inclui muitas
letras pequenas que você faria bem em ler, e é por isso que eu
quero que você leve o seu tempo.

Voltando meu olhar para os papéis na minha mão, vi


muitos jargões familiares. Mas havia novas frases também.

Sem confraternização.

Cláusula de moralidade.
Minha atenção voltou para ela.

— Eu não achava que tínhamos uma política de não-


confraternização no manual do Wolves.

— Nós não temos. — Respondeu ela secamente.

— Mas este sim. Eu insisto nisso para quem é designado


para algo desse calibre e se reporta a mim. Vi as carreiras das
pessoas arruinadas por muito menos, e é por isso que eu levo
isso tão a sério. — Beatrice levantou a mão.

— É para sua proteção também, se você concordar.

— Entendi.

Ela procurou meu rosto.

— Apenas diga sim se você souber, inequivocamente, que


pode fazer esse trabalho. Não acredito na regra dos três
strikes1, Molly. Na vida, temos uma chance de impressionar as
pessoas e raramente outra.

Uma hora e meia depois, entrei na entrada de carros de


Logan e Paige, pensando como um trem de carga. Não parei
desde o momento em que eu virei para a segunda página.

Fui a primeira a chegar para o jantar em família, que


dávamos todas as terças-feiras à noite sem falhas. Nós
segurávamos às terças-feiras, porque durante a temporada era
o dia de folga do meu irmão, se você pudesse chamar assim.

1Em uma partida de beisebol, o rebatedor é eliminado quando, depois de três arremessos válidos,
não consegue uma rebatida. Fora do meio esportivo, a expressão é também muito usada para indicar
o limite permitido de falhas ou erros cometidos por pessoas ou instituições.
Como coordenador defensivo dos Wolves, ele ainda trabalhava
o que parecia mil horas por semana durante a temporada, mas
era o dia em uma semana em que ele podia chegar em casa
antes das seis e meia para todos nós comermos juntos.

Antes de entrar na casa, a mesma em que vivi desde os


quatorze anos até me mudar oficialmente depois da faculdade,
levei um segundo para acalmar meus nervos.

Minha família teria reações variadas a isso.

Minhas irmãs pensariam que era legal em diferentes


graus. As gêmeas, Lia e Claire, enlouqueceriam simplesmente
porque era a Amazon. Isabel, minha irmã do meio, gostaria de
me sombrear dia e noite por causa de sua obsessão por tudo
relacionado a documentários esportivos.

Paige ficaria animada por mim, uma vez que superasse a


necessidade de socar minha nova chefe na garganta.

E Logan? Eu gemi. Meu irmão mais velho odiaria isso. De


maneira inequívoca e irracional. Ele quase me mandaria dizer
não. Aguardar outro chefe ou outra chance.

Soltei um suspiro duro antes de abrir a porta da frente.

Gritos me cumprimentaram, assim como o cheiro de alho


e ervas. Os gritos não me perturbaram nem um pouco, e o
cheiro me fez respirar profundamente.

— Estou em casa. — Avisei.


— Escondam os carboidratos porque eu tive um dia
difícil.

No corredor à minha frente, aquele que levava à cozinha


aberta com sala estar e de jantar conjugadas, veio o grito
intensificado.

— Molly! Estamos sob ataque.

— Vai! Vai! Vai!

Achatando-me contra a parede, estendi um braço para


agarrar o pequeno corpo que passava por mim no chão de
madeira.

— Devagar, soldado. — Eu disse no cabelo do meu


sobrinho, dando-lhe um beijo rápido.

— Quem está nos atacando? — Emmett olhou para mim,


seus olhos azuis enormes em seu rosto e suas bochechas
coradas de tanto correr.

— Os zumbis... — Ele sussurrou dramaticamente.

— Eles já pegaram papai. Ele está morto no sofá.

Meu coração apertou com sua entrega séria, do tipo que


apenas um garoto de oito anos poderia reunir para um ataque
de zumbi imaginário.

— Ahh, ok. Bem, eu coloquei meu spray antizumbi antes


de entrar, então estou segura para continuar?
Seus braços magros me apertaram em um abraço
apertado antes de ele decolar novamente.

— Sim! — Ele gritou por cima do ombro, depois virou a


esquina e sumiu de vista.

Meu irmão, Logan, pulou do sofá quando entrei na sala


da família, dando um beijo no topo da minha cabeça, da
mesma maneira que beijei seu filho, que era realmente mais
parecido com meu irmãozinho do que com meu sobrinho.

— Como foi? Como ela é?

Eu fiz uma careta.

— Eu preciso de vinho antes desta história.

— Isso é bom?

— Apenas... inesperado.

Ele me olhou, mais astuto do que eu queria que ele fosse.


Mas isso não foi uma surpresa. Logan tinha sido minha
constante desde o primeiro dia. Quando eu nasci, Logan tinha
dezenove anos de idade. Esse era o tipo de diferença de idade
entre irmãos que você tinha quando nosso pai se casou com
uma mulher, algumas décadas mais nova que ele, mais tarde
na vida.

Avanço rápido de catorze anos, nosso pai havia falecido


de um ataque cardíaco, e minha mãe percebeu que ser uma
jovem viúva de quatro meninas não era a escolha de vida mais
engraçada que ela poderia fazer. Então ela decidiu não fazê-lo.
A opção Eat Pray Love2 era mais adequada para ela do que a
maternidade, então Logan se tornou nossa figura paterna no
sentido legal, mesmo que ele tivesse esse papel por muito mais
tempo.

— Você me diria se eu precisar intervir e conversar com


alguém, certo?

Revirei os olhos, tentando esconder o rubor irritante de


vergonha. Seu comentário era exatamente por que Beatrice
estava desconfiada de mim.

— Sim, treinador.

Ele bateu nos ombros comigo quando entramos na


cozinha.

— Como foi o seu dia? Eu perguntei a ele.

— Eu ouvi conversas sobre algumas mudanças na lista,


mas estava muito ocupada com Beatrice começando para
realmente prestar atenção.

Meu trabalho normalmente estava bem longe de lidar com


os jogadores, então não me afetava muito.

Ou costumava estar muito longe dos jogadores , pensei,


lembrando novamente como Logan ficaria muito infeliz com
isso.

2The Eat Pray Love: Referência ao filme Comer, Amar e Rezar. Onde a protagonista abandona tudo e
vai em busca de si.
Paige, sua esposa por nove anos e a pessoa mais legal do
planeta, mexia uma panela fervendo de macarrão. Ela sorriu
para mim enquanto eu servia um copo de vinho branco.

— Como foi?

— Eu não deveria esperar até as outras três chegarem


aqui para não ter que repetir isso?

— Não. — Eles responderam.

Afundei em um banquinho e tomei um gole lento do meu


vinho.

— Ela é... Diferente de Ava. Muito... — Eu procurei a


palavra certa que não os faria odiá-la imediatamente.

— Ela não tolera bobagens. Lembra-me Meryl Streep em


O Diabo Veste Prada, mas tipo, em setenta e cinco por cento.
Nem toda intimidadora, mas perto.

Paige cantarolou.

— Sim, sim, estou entendendo.

— Eu não estou. — Disse Logan, cruzando os braços


sobre o peito.

— Quem é o diabo?

— Nós fizemos você assistir o filme pelo menos três vezes.


— Eu disse a ele.

— O filme do estágio de moda.


— Absolutamente teria bloqueado isso do meu
subconsciente. Foi apagado pelo Capitão Cueca e
Transformers.

Todos nós rimos das obsessões atuais de Emmett. Em


algum lugar distante, ele rugiu sobre derrotar os mortos-vivos.

— Nós gostamos dela? — Paige perguntou.

— Acho que sim. — Respondi, olhando de um lado para


o outro entre eles.

— Ela está realmente me dando uma promoção. Ou a


chance de uma, se eu quiser.

Promoção. Teste. Tanto faz.

Logan sorriu.

— Isso é ótimo, Mol.

— Sério, ótimo. — Disse Paige.

— O que é?

Engoli mais vinho.

— Ela fez a Amazon concordar em incluir Washington em


um de seus documentários. ‘Tudo ou nada’.

Paige assobiou.

— Merda nenhuma. — Logan empurrou o pote de


palavrões em sua direção, e ela puxou uma nota de cinco da
bolsa e jogou dentro.
— Pronto, eu estou coberta pela noite.

Logan me olhou de novo.

— Não fomos informados sobre isso. Quem eles estão


filmando?

— Eles ainda estão decidindo. Acho que Allie e Cameron


sabiam disso. — Eu disse, me referenciando a proprietária da
equipe, a melhor amiga de Paige, e o COO de longa data.

— O treinador também, mas eles estarão realizando uma


reunião amanhã para contar ao restante da equipe técnica
antes de decidirem quais jogadores filmar.

Meu irmão ficou quieto enquanto processava isso, e Paige


sorriu encorajadora para mim, mesmo sabendo que o marido
ficaria irritado por algo assim interromper a prática.
Estávamos a menos de um mês do início da pré-temporada e,
embora as mudanças de elenco tardias não fossem fora do
comum, ainda era estressante para a equipe técnica.

Os Wolves não venceram um campeonato desde que


Logan jogou, apesar de seu recorde ter permanecido forte. Nós
vencemos nossa divisão, mas fracassamos nos últimos anos
para superar os playoffs, apesar de uma defesa dura e de um
jovem ataque.

— Isso é muito dinheiro para Washington. — Disse Paige,

— Pousar em algo assim.


— É. E uma enorme oportunidade para mais, quando
você considera o merchandising. — Coloquei meu copo no
chão.

— Ajuda em quase todas as facetas, relações com a


comunidade, exposição nas mídias sociais e novas
oportunidades de patrocínio. Os jogadores recebem exposição
para uma nova multidão que pode não saber muito sobre eles
além das estatísticas de campo. É emocionante.

Logan assentiu.

— Entendi. Não preciso gostar, principalmente se as


câmeras estiverem tropeçando nos meus jogadores durante o
treino.

— Eles não vão, eu prometo.

O sorriso dele era pequeno.

— Sim? Você ficará encarregada deles?

— Quase isso? — Eu sorri

— Eu tenho que levar um dia ou dois para pensar sobre


isso, mas você está olhando para a ligação oficial de projetos
especiais. Eu serei a pessoa de contato entre Washington e
Amazon. Eu ficarei encarregada de garantir que tudo corra
bem; que a equipe de filmagem tenha o que precisa e que os
jogadores estejam protegidos, e ninguém fique no caminho um
do outro.
— Molly, isso é incrível. — Paige falou. Ela correu pela
ilha para me dar um abraço apertado.

— Ela não pode ser tão ruim se confiou em você com algo
assim.

Logan parecia pensativo. Não emocionado, mas também


não infeliz.

— E isso é algo que você quer fazer?

Eu assenti.

— Eu quero. E eu sei Logan, que você adora eu nunca


tenha que lidar com os jogadores, mas ficarei bem. Tenho
dezesseis anos de experiência em lidar com atletas teimosos.

Paige riu.

Meu irmão revirou os olhos.

— Gostaria de saber se a mudança na lista influenciou a


decisão da Amazon. — Disse Paige.

Logan olhou para o chão, mas não disse nada.

— É possível. Beatrice me disse que eles estão analisando


algumas narrativas, e uma está seguindo os novos jogadores,
assimilando a cultura estabelecida de uma equipe, faculdade
e profissional. — Dei de ombros.

— Mas essa é apenas uma possibilidade.


Logan murmurou algo baixinho. Paige estreitou os olhos
para ele.

Eu inclinei minha cabeça em sua direção.

— O que é que foi isso?

Ele beliscou a ponta do nariz.

— Eu disse que acho que sei quem eles querem filmar.


Droga.

Paige lentamente empurrou o pote de palavrão de volta


na direção de seu marido, o que ele ignorou quando eu o olhei.

— Quem?

Logan passou a língua sobre os dentes e me olhou de


volta.

— Essa é uma ideia horrível e você deve recusar a


promoção.

— Ummm, não. Por que diabos eu faria isso?

— Molly.

— Logan. — Eu cruzei meus braços.

— Qual é o seu problema?

— Você trabalhou tão duro, garota. — Disse ele, e meus


braços caíram com a repentina seriedade de sua voz.

— Tão difícil, e estou tão orgulhoso de você.


Paige olhou para frente e para trás entre nós e eu dei de
ombros.

— Com quem assinamos, e por que isso te assusta tanto?


— Ela perguntou.

Ele esfregou a parte de trás do pescoço, fechando os olhos


por um longo momento.

Peguei meu telefone.

— Tudo bem, eu vou pesquisar no Google.

— Noah. — Ele disse.

— Contratamos Noah Griffin hoje de manhã. A imprensa


mal sabia disso até o final do dia.

Paige de alguma forma conseguiu um

— Ohhhhhhh merda... — Mesmo que sua boca


entreaberta mal se mexesse.

O telefone caiu da minha mão e afundei de volta no


banquinho.

— Como Noah, Noah? — Apontei para a casa atrás da


nossa, aquela em que ele não morava há anos.

— Aquele Noah.

O olhar de Logan foi suficiente afirmação. Paige cobriu a


boca com uma mão.
Minha irmã mais nova Isabel apareceu na esquina com
uma barra de proteínas pela metade na mão.

— O que tem Noah?

Todos nós olhamos para ela, mas não respondemos.

Eu deixei minha cabeça cair em minhas mãos.

— O que tem Noah? — Isabel repetiu. — Ouvi dizer que


Miami o largou por causa de algum drama no vestiário. O que
é estranho, porque ele é como... homem robô de futebol. Não
acho que o vi sorrir em três temporadas. — Ela assobiou. —
Mas, caramba, o seu recorde de sacos QB3 é bananas. Fora das
paradas.

Isabel saberia. Ela é a nossa especialista de esportes sabe


tudo.

Eu pensei que minha mente estava correndo antes. Que


fofo.

— Molly. — Logan disse calmamente. — Vamos, pense


sobre isso. Se eles estarão aparecendo para filmar ele, então
cuidar dele será o seu trabalho. Você acha isso inteligente?

Eu levantei minha cabeça.

3 Um sack acontece quando um quarterback é tackleado ou quando ele corre para fora dos limites do
campo atrás da linha de scrimmage antes que ele possa efetuar um passe para frente, ou quando um
quarterback sofre um tackle atrás da linha de scrimmage dentro do “pocket” e as intenções do que ele
pretende fazer não estão claras. O sack acontece quando um jogador de linha defensiva, ou um
lineabacker ou um defensive back é capaz de passar pelo boqueio da linha ofensiva cortando a
proteção do quarterback e então o derruba; ou quando um quarterback não consegue encontrar um
recebedor disponível, que pode ser um wide receiver ou um running back ou um tight end, dando
tempo suficiente para que os jogadores de defesa derrubem o quarterback.
— Eu não sou mais criança, Logan.

— O que diabos está acontecendo? — Isabel gritou.

Paige empurrou o frasco em sua direção enquanto Logan


ignorava tudo, menos eu.

— Molly. — Ele disse novamente.

— Não. — Eu interrompi. — Eu não vou recusar. Eu tinha


dezesseis anos da última vez que o vi. Isso foi há muito tempo.
Tenho certeza de que ele esqueceu tudo sobre isso, assim como
eu vou.

Paige pigarreou desagradavelmente porque todos nós


ouvimos a besteira em minhas palavras.

Como se eu fosse capaz de esquecer Noah Griffin.

O ex-vizinho do lado, o universitário por quem eu me


apaixonei por dois anos antes de sair furtivamente, subir na
janela do seu quarto e tentar seduzi-lo antes que seu pai nos
pegasse. O mesmo universitário que eu poderia ter arruinado
se o pai dele tivesse entrado muito mais tarde, e alguém
descobrisse que ele dormia com um menor enquanto estava
em uma bolsa de estudos de futebol.

Sim, esse Noah Griffin.

Olhando ao redor da sala, notei que os três rostos


estavam congelados em variações de é uma ideia horrível.
— Pessoal. — Afirmei. — Eu totalmente tenho isso. Eles
provavelmente nem estão indo filmar ele. Temos mais trinta e
um jogadores para escolher. Vai ficar tudo bem.

Oh, como eu estava muito, muito errada.


QUASE NADA no meu trabalho me intimidava.

Um atacante ofensivo de trezentos quilos poderia me


amaldiçoar antes do estalo da bola, ameaçar minha mãe e
cuspir através de seu capacete de todas as maneiras que ele
iria me triturar no gramado, e eu não sentiria a menor pontada
de apreensão.

Eu não me tornei o melhor na minha posição por me


assustar facilmente. Fiz isso vivendo, comendo, respirando
futebol.

Nada vinha antes disso. Nada estava acima dele.

A prática sempre teve precedência sobre qualquer coisa


que eu achasse divertida, e foi por isso que meus ex-colegas de
equipe em Miami costumavam me chamar de The Machine4.
Era o primeiro na sala de musculação, o último a sair da sala
de cinema, o copioso anotador nas reuniões e, provavelmente,
um dos únicos jogadores de futebol celibatários que não têm
desculpas na liga.

4 A máquina.
Outra coisa que não vinha antes do meu trabalho era as
mulheres, ou o que alguém ao meu redor poderia pensar de
mim.

Mas quando meu agente me ligou dois dias antes e disse:

— Estamos mandando você para Washington. — Senti


algo estranho se esconder atrás do peito, em algum lugar baixo
da caixa torácica.

Apreensão.

Nervosismo.

E o pior de tudo, a menor, mínima pontada de medo.

Porque, quarenta e oito horas depois, eu me vi diante da


porta fechada do meu novo coordenador defensivo, que estava
me esperando para uma reunião, e eu não conseguia abri-la.

Minha mão não levantava para bater e meus pés ficaram


teimosamente estacionados no lugar. Eu tinha atingido
duzentos e oitenta quilos na minha última pesagem, e nenhum
desses quilos, o músculo que eu havia trabalhado em toda a
minha carreira, estava me sentindo particularmente motivado
a me mover para frente naquele escritório.

Minha mandíbula se apertou enquanto eu olhava para a


placa de identificação ao lado da porta, prata inócua com letras
pretas. Logan Ward, Coordenador de Defesa.

Nos últimos dez anos, eu só o vi uma vez desde que fui


para Miami, quando nossos times haviam jogado um contra o
outro dois anos antes. Um aceno após o jogo, que eles
venceram, e foi isso.

Antes disso... eu me recusei a pensar. Meus olhos se


fecharam porque aquele dia me colocou em uma trajetória em
que nada, nem ninguém, jamais me distrairia de meus
objetivos novamente.

A porta se abriu e seu rosto me cumprimentou com uma


careta.

— Você está entrando Griffin, ou devemos gritar um com


o outro através da porta?

Qualquer traço de medo persistente foi instantaneamente


substituído por aborrecimento, e eu dei a ele um olhar de
consternação.

— Prazer em te ver também.

— Vamos acabar com isso porque eu não preciso de


distrações, e já existe o suficiente para a temporada.

— Você é tão acolhedor com todos os caras que você


treina? Eu perguntei enquanto o seguia até o escritório sem
frescuras.

— Não. — Ele respondeu facilmente, sentando-se


pesadamente em sua cadeira e me observou pensativo.

Era o típico escritório de todos os coordenadores em que


eu já estive. Uma mesa com duas cadeiras à frente, um quadro
branco ao fundo e paredes vazias. Seu trabalho ocorria em
campo, suas estratégias mapeadas em pranchetas e nas salas
de filmes. E uma mente defensiva como a de Logan, que havia
sido uma das melhores quando jogou, só foi aprimorada agora
que treinava do lado de fora.

Seu gênio não precisava de um escritório sofisticado. Ele


só precisava de jogadores que ouvissem e soubessem o que
fazer, soubessem o que procurar, e que tivessem o mesmo
senso que ele ao ler uma ofensa.

— Não falo com você há muito tempo, Griffin.

Pouco mais de nove anos desde que trocamos uma única


palavra, mas isso não foi dito, considerando que meu pai
vendeu nossa casa logo após Logan quase ameaçar minha
carreira em sua garagem, se eu olhasse para sua irmã
novamente. Cruzei os braços sobre o peito.

— Eu não pedi para ser enviado aqui.

Ele exalou uma risada calma.

— Dispensando gentilezas, pelo que vejo.

Passei a mão pela boca. Essa era a parte em que eu não


era muito bom.

— Eu acho. Eu só... estou aqui para trabalhar, sabe? Sim,


você e eu costumávamos ser vizinhos, mas não é como se
alguém soubesse disso aqui. Eu não queria deixar minha
equipe, mas aqui estou. Não foi minha escolha, mas eu serei
amaldiçoado se isso me atrapalhar de alguma forma.
A atenção de Logan nunca desviou do meu rosto, e sua
expressão nunca mudou. Era esse foco nítido que todo bom
jogador tinha. Todo bom treinador também.

— Você mudou. — Ele disse calmamente.

— Em dez anos? Espero que sim.

— É justo. — Admitiu Logan. Ele se inclinou para frente,


colocando as mãos cruzadas na superfície da mesa.

— O negócio é o seguinte: você tem mais talento natural


em seu dedo mindinho do que a maioria dos jogadores em toda
a minha defesa. E se você disser a alguém que eu disse isso,
negarei até o meu último suspiro.

Meu rosto permaneceu inalterado, mesmo quando meu


coração acelerou com o elogio dele.

— Mas eu não vou ser fácil com você porque nos


conhecemos. Se alguma coisa, eu ficaria muito satisfeito em
vê-lo levar um soco no seu rabo algumas vezes, simplesmente
porque está ao meu alcance fazer isso acontecer. — Ele disse
com um sorriso sombrio.

Eu me recostei. Esta era a reunião que eu esperava. O


aviso que eu tinha antecipado. Tudo porque sua irmãzinha pé
no saco subiu no colo de um universitário estúpido que
costumava deixar seu pau governar sua vida.

Meus pensamentos devem ter ficado claros no meu rosto,


porque ele assentiu como se pudesse ler cada um.
— Eu não tinha permissão para te dar uma surra naquela
época. — Disse ele.

— Mas eu queria.

Meu queixo levantou uma fração de polegada.

— Eu sei que você queria, senhor.

— Não vou agora. Amadureci na velhice.

Se ele queria que eu abrisse um sorriso e aliviasse o


clima, eu não lhe daria a satisfação. Ninguém me via vacilar.

— Você também sabe que eu vou te bater de volta,


treinador ou não.

O sorriso de Logan foi lento, mas veio mesmo assim,


porque ele pensou que eu estava brincando. Quando meu rosto
ainda não mudou, o sorriso desapareceu. Ele balançou sua
cabeça.

— Você é um filho da puta mal-humorado, não é?

— Eu ouvi isso, sim. — Então eu balancei minha cabeça.

— Não estou mal-humorado. Só não entendo nada disso.


Futebol é a coisa mais importante da minha vida.

— Eu posso respeitar isso. — Ele bateu o lado do polegar


na mesa, desviou o olhar de mim, depois olhou para trás,
parecendo tomar uma decisão sobre algo.

— Ela trabalha aqui, a propósito.


Inclinei minha cabeça.

— Quem?

Uma sirene de aviso começou a tocar baixo, em algum


lugar no fundo do meu cérebro enquanto ele falava, e me
ocorreu, pouco antes de ele responder que talvez fosse esse o
motivo de eu me sentir apreensivo com essa mudança. Esta
era a razão pela qual eu deveria ter medo de vir a Washington.

— Molly. — Ele me olhou, me desafiando a ter qualquer


tipo de reação negativa sobre ela. Qualquer reação.

Nos últimos nove anos, eu comecei a pensar em Molly


com um estranho senso de desapego, partes iguais de
prenúncio de destruição e o símbolo da mudança do meu foco.

— Muitas pessoas trabalham aqui, senhor. O que isso


tem a ver comigo?

As sobrancelhas dele se ergueram.

— Não muito, suponho. Eu só queria te avisar, no caso...

Eu levantei uma mão.

— Ela é uma instrutora?

— Não.

— Uma treinadora? — Eu perguntei desnecessariamente


porque nós dois sabíamos que nenhum dos treinadores da liga
era do sexo feminino.
— Você sabe que ela não é.

— Então isso não me envolve. — Eu me levantei da


cadeira.

— Eu preciso me trocar e ir para a sala de musculação,


se você já terminou.

Ele se recostou na cadeira e eu odiava o olhar de decepção


em seu rosto. Aquele rosto envelheceu desde a última vez que
o vi, mas não muito. Era da cor de seus cabelos e a adição de
algumas linhas ao redor dos olhos. Mas eu também mudei.
Ganhei cerca de dezoito quilos de músculo desde o dia em que
estive na entrada da casa, humilhado e envergonhado e,
francamente, aterrorizado.

Às vezes, mal reconhecia o homem que me olhava no


espelho. Mas prometi a mim mesmo naquele dia que nunca
mais me sentiria assim. Um deslize estúpido que quase
arruinou minha vida. Um erro que nunca teria valido as
consequências se a pessoa errada nos pegasse.

— Mais alguma coisa que você precise de mim, senhor?

Levou um segundo para Logan responder, mas


finalmente ele disse:

— Não, isso é tudo.

Eu balancei a cabeça e saí do escritório muito mais


rapidamente do que eu havia entrado. Enquanto eu caminhava
de volta pelo corredor, tentando lembrar qual levava ao
elevador que me levaria ao vestiário e à sala de musculação,
aproveitei cada grama de disciplina mental do meu corpo para
ignorar o que ele havia me dito.

A última pessoa em absoluto que eu queria ver no


trabalho era ela.

E mais do que provável, eu não precisaria. Os jogadores


raramente viam funcionários do escritório, a menos que
fizessem questão. Respirei fundo e me concentrei novamente.
O elevador ficava no corredor e à direita, e era nisso que eu
precisava pensar.

Alguém da equipe do pessoal da limpeza passou por mim


com um sorriso educado, que retornei apenas o suficiente para
não parecer um idiota furioso. Fazendo a curva, vi as portas de
metal reluzentes. Apertei o botão e esperei. Meus músculos se
contraíram em antecipação a um bom treino. Se eu não
passasse algumas horas por dia, no mínimo, eu sentia um
zumbido desconfortável debaixo da minha pele. A energia que
não tinha gastado começaria a procurar uma forma de sair,
não importando como que fosse.

Para mim, eu escolhia o mais saudável. O que me faria


mais forte. Faria-me mais rápido. Faria-me melhor.

Alguns jogadores bebiam. Davam festas em iates. Carros


de corrida. Usavam drogas. Dormiam por aí.

Mas eles não eram tão bons quanto eu. Para mim, todas
essas coisas eram distrações inúteis.
As portas se abriram e eu entrei no elevador vazio. Apertei
o botão do andar correto e esperei. Assim que as portas se
fecharam, uma mão apareceu pela abertura, interrompendo o
progresso.

Como eu tive alguns momentos antes, ela entrou no


elevador, parando com um grito de surpresa quando me viu
encostado na parede.

Estávamos congelados ali, olhando um para o outro, com


a boca aberta enquanto as portas tentavam fechar sem
sucesso. Ela deu um passo à frente e as portas se fecharam
sem problemas, me trancando no espaço fechado com Molly.

— Oi, Noah. — Ela disse fracamente.


INCLINANDO MEU QUEIXO, respirei lentamente pelo nariz.

— Isso não pode estar acontecendo. — Eu murmurei.

— Prazer em vê-lo também. — Disse ela, a voz não mais


fraca e surpresa.

De má vontade, desviei o olhar e, pela primeira vez em


nove anos, olhei Molly Ward diretamente no rosto. A última vez
que a vi, meu pai nos levou até a casa dela para entregá-la de
volta a Logan e sua esposa.

A última vez que a vi, tirei a blusa e chupei sua língua


entusiasmada enquanto ela se mexia no meu colo. Eu nem
sequer tinha um bom motivo para fazer isso, além de ser um
jogador de futebol universitário idiota que não questionava
coisas como, garotas gostosas querendo estar comigo.

A última vez que a vi, eu era uma idiota de dezenove anos


de idade, completamente inconsciente de que a garota com
peitos fantásticos, aquela que me olhava como se eu fosse feito
de chocolate, a garota que entrou na janela do meu quarto e
tinha gosto de cerejas Rainier5, tinha apenas dezesseis anos.

Graças a Deus meu pai entrou.

Havia muita coisa nela que não havia mudado. Ela ainda
era baixa, ou baixa em comparação a mim, embora
provavelmente tivesse cerca de um metro e oitenta, e seus
olhos eram do mesmo azul brilhante. Seu rosto havia afinado
porque as maçãs do rosto eram novas, enquanto algumas das
outras curvas que ela tinha na adolescência estavam
efetivamente escondidas atrás de sua camisa branca simples
ou se derreteram quando ela se tornou adulta. Seu cabelo
estava mais claro do que costumava ser, mas o movimento
teimoso do queixo me deu flashbacks vívidos da última vez que
a vi.

Cruzei os braços sobre o peito.

— Seu irmão me avisou que você trabalha aqui.

— Eu não sabia que era intimidadora o suficiente para


exigir um aviso— ela sorriu, e eu tive que lhe dar crédito por
mantê-lo no lugar enquanto minha própria boca se achatava
em uma linha.

— Bem-vindo a Washington, Noah. Ouvi falar da


negociação ontem.

5Cereja Rainier tem como principal característica o alto teor de doçura, e incrível sabor, com sua
polpa amarela com um toque avermelhado.
Sua tentativa educada de conversar quase me fez relaxar
minha postura e suavizar meu tom um pouco. Mas enquanto
eu estudava o rosto dela de novo, bonito, de rosto fresco e
docemente sorridente, decidi que era a pior coisa que eu
poderia fazer.

A última vez que fui gentil com a esposa de um


companheiro de equipe, dando-lhe uma carona para casa
porque ela bebeu demais, fui recompensado por ela enfiando a
mão nas minhas calças, um tapa no rosto quando eu disse a
ela para dar o fora do meu carro e a perda da minha posição
no time quando ela disse ao marido que eu bati nela.

Apenas mais um exemplo pelo o qual nenhuma mulher


valia a pena colocar minha carreira em risco.

— Não foi minha escolha estar aqui, confie em mim.

Ela me observou com cuidado, olhando para o painel do


elevador antes de se inclinar e apertar o botão de parada de
emergência.

— O que você está fazendo? — Eu assobiei. Ela bateu na


minha mão quando tentei acionar o botão novamente.

— Acalme-se. Temos cinco minutos sólidos antes que


alguém da segurança seja notificado.

Meu olhar de resposta não foi nada menos que incrédulo.

— Como você sabe disso?


— As gêmeas tentaram uma vez porque estavam curiosas.
— Disse ela calmamente.

— Paige estava grávida e elas se perguntaram o que


aconteceria se ela ficasse presa no elevador. Nós a colocamos
em trabalho de parto. — Molly inclinou a cabeça, o sorriso se
espalhando quando ela me explicou.

— Logan estava tão irritado porque elas desapareceram


do campo de treino com o cronômetro para verificar o tempo.

Esfregando as têmporas, senti o início de uma dor de


cabeça florescendo atrás dos meus olhos. Perguntas, tantas
perguntas surgiram na ponta da minha língua, mas eu as
engoli.

— Aperte o botão, Molly. Eu preciso ir para a sala de


musculação.

Ela olhou para um fino relógio de ouro em seu pulso.

— Temos pouco mais de quatro minutos. — Então ela me


prendeu com aqueles olhos azuis.

— Qual é o seu problema? Você está agindo de forma


estranha.

Eu me afastei da parede.

— Você não me conhece. Você não saberia como eu ajo


sob nenhuma circunstância, muito menos esta.

O rosto dela apertou brevemente.


— Justo, mas eu te conhecia. Você era um cara legal,
Noah.

— Eu era um atleta universitário que deixou seu pau


tomar decisões estúpidas. Eu estraguei tudo e perdi meu
tempo em videogames e festas e mulheres das quais não me
lembro mais. Jogador típico, em mais de uma maneira, e seria
bom você lembrar-se disso.

As palavras tinham a intenção de ferir. E vi o momento


em que elas afundaram tão claramente como se tivessem
tirado sangue de sua pele pálida e macia.

Molly apertou os lábios, as bordas das maçãs do rosto


ficando rosadas, mas ela não respondeu imediatamente. Eu
esperava rendição. Outro pedido gentilmente falado. E pela
segunda vez naquele dia, ela me surpreendeu.

— Eu estava de fraldas quando meu irmão começou a


jogar futebol profissional. Trabalho aqui há quatro anos e fiz
estágio por dois antes disso. Sou a última pessoa que precisa
de uma palestra sobre jogadores de futebol idiotas. Acho que
sei mais deles do que você.

— O que você disser, senhorita Ward. — Passei por ela e


apertei o botão.

O elevador voltou a funcionar e ela balançou a cabeça.

— Não há razão para não sermos amigos.

Uma risada saiu de mim.


— Há muitas razões, e não desejo explicar nenhuma
delas. Você conhece alguns jogadores. Bom para você. Mas
você não entende o tipo de pressão que estou sofrendo ou o
modo como eu opero, então eu vou lhe dizer isso. — Inclinei-
me para ela, satisfeito quando ela engoliu em seco, e seus olhos
se arregalaram.

— Eu não estou aqui para fazer amigos. Você foi um erro


que eu evitei por pouco e não tenho intenção de seguir por esse
caminho novamente.

Por um momento, eu esperei o estalo de outra mão


feminina pequena contra minha bochecha. Mas não foi isso
que Molly fez.

— O que aconteceu com você? — Ela sussurrou


tristemente.

As portas do elevador se separaram para área


abençoadamente vazia. Eu dei a ela um último olhar.

— Eu cresci, Molly. Você deveria fazer o mesmo.

Passei por ela e, antes de ficar fora do alcance da voz,


ouvi-a murmurar:

— Idiota.

A apreensão e os nervos desapareceram há muito tempo,


mas meu queixo se contraiu com a surpreendente pontada de
irritação que senti. Eu fui chamado insultos piores pelas
mulheres. Por companheiros de equipe. Não por alguém como
Molly, no entanto. Alguém gentil e amigável.

Continuei andando, nem uma única pausa nos meus


longos passos, porque estava aqui para fazer um trabalho, e
Molly Ward não tinha nada a ver com isso.
— PRETENSIOSO.

Smack.

— Arrogante.

Smack. Smack.

— Pequeno.

Smack.

— Imbecil.

Isabel levantou uma sobrancelha.

— Pequeno, hein?

— Cale-se. — Eu soquei o saco de pancadas novamente,


sorrindo quando ele se moveu para trás de onde ela estava
apoiando um braço contra ele. Recuei mais uma vez e bati na
frente do saco pesada com um cruzado de direita, depois
sacudi o braço e apoiei as mãos enluvadas nos joelhos.

Isabel me entregou minha garrafa de água e caiu no chão,


dobrando as pernas cuidadosamente debaixo dela. A academia
de kickboxing não tinha aulas durante a hora do almoço, por
isso estava vazia. Paige costumava vir aqui quando se casou
com Logan e, lentamente, toda a nossa família se envolveu de
uma maneira ou de outra. Isabel, a exibida, teve que ajudar
todo mundo assumindo o cargo de gerente alguns anos atrás,
quando o proprietário estava pronto para passar mais tempo
com sua família.

A vantagem de ser irmã da gerente era ter um lugar


privado para resolver minhas frustrações na hora do almoço,
quando minha antiga paixão, por menor que fosse, acabou
sendo um idiota da liga principal. Caindo no chão ao lado dela,
estiquei minhas pernas e assobiei com a queimadura em meus
quadriláteros.

— Se você fizer mais agachamentos hoje à noite na aula,


eu vou embora.

— Não, você não vai. — Disse ela.

— Essa é a razão pela qual sua bunda parece tão


fenomenal.

Suspirei.

— Verdade.

— O que aconteceu?

Desta vez, nenhum suspiro, mas um gemido profundo,


torturado e dramático.

— Eu tenho que falar sobre isso?


Isabel deitou ao meu lado e cruzou os braços calmamente
sobre o meio.

— Sim. Estou entediada e não tenho vida fora do


trabalho, e gostaria de viver indiretamente através do seu
drama. Como sempre.

E era verdade. Eu tinha dois a mais anos que Iz e ela era


dois anos mais velha que nossas irmãs gêmeas, Lia e Claire. A
pequena diferença de idades entre quatro meninas significava
que estávamos no negócio uma da outra o tempo todo.

Eu me mexi, esticando um braço sobre o peito.

— Ele foi tão... mau. E tudo o que fiz foi entrar no


elevador. Como se eu soubesse que ele estava lá!

— E você não o viu nem uma vez desde, você sabe, o


incidente? — Ela perguntou delicadamente. O que deveria ter
sido engraçado, porque era Isabel. Ela não fazia nada
delicadamente.

— Não. — Tirei minhas luvas e as joguei pela minha


bolsa. Sentando, envolvi meus dedos em torno dos dedos dos
pés para esticar as costas das minhas pernas. Isabel sentou-
se também, dobrando os joelhos no peito e passando os braços
em volta deles.

— Quero dizer, eu sabia que ele jogava em Miami porque


ouço o nome dele o tempo todo. Não é como se eu não tivesse
noção do que ele estava fazendo, mas... — eu dei de ombros.
— Ele foi o cara pelo qual eu tive uma paixão. Eu tive
muitas paixões no ensino médio. Ele não era especial.

Isabel apertou os lábios.

— Cale a boca. — Eu disse.

— Eu sei o que você vai dizer.

— Você sabe?

Puxei o velcro em volta do meu pulso e lentamente


desenrolei meus envoltórios suados da minha mão.

— Eu posso dar um excelente palpite.

Iz apoiou o queixo nos joelhos e me observou. Ela


costumava fazer isso quando criança também. Assistia tudo ao
seu redor. Absorvia e processava o que ela observava. Era o
que a fazia uma boa ouvinte, porque ela via tudo.

— Então ele está, o quê? Está chateado com você por nove
anos porque você fez algo monumentalmente estúpido quando
adolescente?

— Jeees6, — eu murmurei.

— Diga-me como você realmente se sente, Iz. — Ela me


deu uma olhada.

— Você subiu pela janela dele, Mol. Não foi o seu


momento mais brilhante.

6 Jees = Jesus.
Dor e vergonha guerrearam por minha reação
instantânea, mas não pude negar. Aos dezesseis anos, eu era
louca por meninos, como todas as minhas amigas. E era
apenas a minha sorte que, como vizinha, recebi o presente
final. Um universitário gostoso que estava em casa muito
durante as férias.

— Eu estava tão convencida de que ele me viu, que me


notou como eu o notei. — Tirei o outro embrulho, jogando-o
em uma pilha com o primeiro, depois flexionei os dedos.

— Eu costumava culpar a mamãe, sabe? Como ela havia


nos deixado, criando esse desejo insaciável de garantir que as
pessoas gostassem de mim o suficiente para querer ficar por
aqui.

Isabel bufou.

— Eu ainda culpo muito a mamãe. Basta perguntar a


minha terapeuta.

Minha cabeça girou em sua direção.

— Você vai a uma terapeuta? Desde quando?

— Eh, eu fui duas vezes antes que me irritasse. Ela era


uma babaca que ficava me fazendo perguntas estúpidas. Se eu
soubesse por que estava tão brava com minha mãe, estaria
pagando a ela cem dólares por hora?

Rindo baixinho, balancei minha cabeça. Isso parecia


certo. O pensamento de minha irmã emocionalmente
reservada derramando suas entranhas em uma cadeira
confortável para um psiquiatra não computava, nenhuma
realidade que eu estivesse ciente. Parecia algo que eu faria.
Permitir que um perfeito estranho desembaraçasse minhas
emoções e descobrisse por que a mulher que nos deu à luz não
nos amava o suficiente para querer ficar por perto.

Nós quatro tínhamos cicatrizes em graus variados e, com


o tempo, elas se curaram de maneira diferente. A minha era
um senso de urgência se eu soubesse que alguém não gostava
de mim, seja por qual motivo for. Tinha um desconforto
incômodo sob a minha pele dizendo para consertar, consertar,
consertar.

Suspirei.

— Tenho certeza de que faz parte disso, mas também era


ele. Eu me convenci completamente se eu apenas... tivesse a
chance de realmente falar com ele, ele se apaixonaria por mim,
e eu teria o namorado mais gostoso de todos os meus amigos,
e que jogava futebol americano universitário.

— Não é surpresa para uma garota de dezesseis anos.

— Não, mas foi uma loucura. Fazer o que eu fiz. — Meu


rosto ficou vermelho quando pensei sobre isso. Algo que eu
realmente não fazia há anos. Nos momentos antes de seu pai
entrar pela porta, eu nunca me senti mais viva. Mais feminina.

Deveria ter sido uma luz de advertência vermelha ardente


que Noah não teve escrúpulos em me beijar como ele fez ou me
tocar como ele fez depois que eu subi pela janela dele, sem nem
uma única conversa significativa entre nós dois.

Cinco minutos depois que minhas pernas abriram o


peitoril da janela, eu estava montando em seu colo. Eu deveria
ter me preocupado que suas mãos grandes e quentes
estivessem debaixo da minha camisa, deslizando pelas minhas
costas e puxando-a pela minha cabeça, quando mal nos
beijamos. Que minhas mãos tremiam onde eu as deitava sobre
seus ombros musculosos, porque quando ele me beijou,
parecia que eu estava me afogando em algo muito maior do que
eu estava preparada.

Se o pai dele não tivesse entrado, eu teria dormido com


Noah Griffin naquele dia. E ele provavelmente nunca teria
falado comigo novamente depois.

Era algo que eu teria que enfrentar depois que tudo


aconteceu.

Depois que o Sr. Griffin me levou de volta para casa para


encarar meu irmão furioso e minha cunhada decepcionada, me
encolhi na minha cama e chorei meu coração de dezesseis
anos. O olhar no rosto de Noah quando ele percebeu quantos
anos eu tinha, cimentava o fato de que qualquer felicidade
depois que eu imaginei com ele ficaria firmemente plantada no
meu cérebro adolescente.

— Você sabe como todas as idades em que você já esteve.


— Eu disse.
— Você sente que esta é a mais madura que já esteve.
Agora, eu já entendi tudo.

Isabel sorriu.

— E depois de alguns anos, você quer dar um tapa no seu


passado por sempre pensar em algo tão estúpido.

Ela riu baixinho.

— Sim. Eu sei exatamente o que você quer dizer.

— Gostaria de poder voltar e me algemar na minha cama,


para nunca mais entrar naquela maldita janela. Gostaria de
voltar e entrar no elevador dois minutos depois, para nunca
perceber o grande burro e idiota que ele é agora. — Eu balancei
minha cabeça.

— Eu realmente, realmente desejo que eu pudesse ter de


volta o momento que eu disse que queria ser amiga dele.

O rosto dela estava triste enquanto ela ouvia.

— Isso não soa como você. Você é amiga de todos.

— Não de Noah Griffin.

Inexplicavelmente, isso fez Isabel sorrir.

— O que? — Eu bati, bem ciente de que parecia o


equivalente humano de um beicinho.

— Como ele estava?

Eu gemi, deixando minha cabeça cair em minhas mãos.


— Isabel.

— Tão bem, hein?

Erguendo a cabeça, olhei para ela por cima do ombro. —


Você sabe como ele é.

— Sim. — Ela suspirou. — Claro que sim. Mas vê-lo


pessoalmente, estar presa em um elevador com ele, é uma
coisa totalmente diferente, e você sabe disso, Molly. Me dê as
boas coisas. Como ele estava?

Oh, minhas estrelas, eu não queria pensar em como ele


estava.

Bravo.

Grande.

Lindo.

Mais do que provável, Noah teria odiado que eu o


chamasse de bonito, mas ele era. A simetria em seus traços, o
corte ousado de seus lábios, o ângulo duro de sua mandíbula,
o choque de cabelos escuros, a cor gelada de seus olhos... tudo
no rosto daquele homem era um dom de genética, e isso me
irritou a princípio.

Um rosto que perfeito deveria estar sorrindo. Gentil.


Caloroso.
E ele tinha sido exatamente o oposto. Ele me levou, me
julgou, depois decidiu que eu não valia nem um pingo de sua
bondade.

Que idiota.

Suspirei. — Era estúpido o quão bom ele estava, Iz.

— O que você vai fazer?

Eu rolei meu pescoço. — Não tenho certeza. Não quero


recusar o novo emprego de Beatrice por causa disso. Não há
garantia de que Noah esteja envolvido de qualquer maneira.
Mais do que provavelmente, eles seguirão um dos outros caras
novos... talvez o novo running back7.

As sobrancelhas de Isabel se curvaram. — O cara da


equipe de treino da Nova Inglaterra?

Eu assenti. — Não é como se Noah fosse o único novo


contrato que eles assinaram esta semana.

— Ele é apenas o maior nome, — disse ela gentilmente.

— Obrigada.

Ela levantou as mãos. — Apenas dizendo.

— Vai ficar tudo bem, mesmo que ele seja o que eles
querem destacar. — Lambi meus lábios enquanto pensava no
resto do meu dia no trabalho. — Vou me encontrar com

7O Running Back (RB) é uma posição do futebol americano e futebol canadense que normalmente
se alinha no backfield. O principal papel de um running back é correr com a bola que pode ser
passada para ele pelo quarterback ou em um snap direto do center, sendo que ele também pode
receber e também ajudar no bloqueio.
Beatrice antes de conversarmos com a Amazon, e eles
começarão a filmar no treino. Porque não vou deixar que ele
estrague essa chance para mim.

— E se eles o escolherem?

Meu lábio se curvou em um rosnado incomum quando


pensei no que isso significava para mim. Isso significava que
minha única chance de me provar para minha chefe ficaria nas
mãos da única pessoa na organização Wolves que me odiava.

Impressionante.

Eu bati no ombro dela com o meu. — Talvez você possa


vir bater nele por mim se ele for mau de novo.

Isabel se levantou com um sorriso, estendendo a mão


para mim para que pudesse me levantar. — Você entendeu.

Depois de jogar todas as minhas coisas na minha


mochila, joguei-a por cima do ombro. Iz estendeu o punho para
mim, e eu bati quando passei.

— Vá pegá-los, tigre, — disse ela. — Eu apostaria em você


em qualquer dia da semana.

— Pode apostar, — eu murmurei. Noah Griffin também


não me conhecia, mas estava prestes a descobrir exatamente
do que eu era feita.
MINHA REPUTAÇÃO como The Machine me precedeu, isso
era evidente. Os caras foram educados em suas saudações,
mas nada efusivo. Sem abraços violentos, nada além da
felicidade reservada que meus talentos de futebol agora
estavam vestindo preto e vermelho.

Havia muito pouco em qualquer saudação sobre Noah


Griffin como pessoa, e isso me serviu muito bem. Até que eu
saí no campo de treino e vi Kareem Jones, era linebacker8 e
um dos meus ex-colegas de quarto do U Dub9. Antes que ele
abrisse a boca, eu me preparei para a atenção que eu estava
evitando ativamente.

Ele gritou quando eu abri as portas, chamando a atenção


de todas as malditas pessoas no campo. Eu ri baixinho quando
ele correu em minha direção e me levantou em um abraço
enorme com braços tão grandes quanto troncos de árvores. Ele
era duas polegadas mais alto que eu, então meus pés limparam
o chão por um segundo antes de ele me deixar cair.

8 É uma posição do futebol americano e canadense, que foi inventada pelo treinador Fielding Yost da
Universidade de Michigan.
9 Universidade de Washington.
— Droga, garoto, o que eles estavam te dando para comer
em Miami? — Ele disse com um sorriso largo e feliz. — The
Machine engordou.

Eu empurrei seu ombro. — Você está delirando, Jones.


Eu ainda chutaria sua bunda na fila toda vez, e você sabe
disso.

Sua risada estrondosa derreteu um pouco da parede


gelada de distância que eu estava atrás desde que cheguei.
Mas eu ainda me vi olhando em volta para ver se alguém estava
assistindo com suspeita ou desconfiança.

Era ridículo pensar que sim. O drama acontece no


vestiário de todos os times da liga, e o motivo da minha saída
precipitada de Miami, inventado ou não, não havia sido
divulgada pela grande mídia. Que garoto de ouro QB10 queria
admitir que um de seus colegas de equipe – maior, mais forte
e mais estabelecido na equipe – teve uma chance com sua
esposa coelhinha da Playboy? Não é o QB que eu deixei para
trás, com certeza.

Mas, mesmo assim, conhecimento comum ou não, era


irritante que alguém pudesse me olhar e pensar que era
verdade. Isso me fez querer voltar e não lhe oferecer uma
carona, que eu chamasse um Uber ou chamasse seu marido
ou outra das WAGs11 que estiveram no evento. Uma mulher
bêbada não era minha responsabilidade, mesmo que ela

10Quaterback – posição do futebol americano, responsável por iniciar as jogadas de ataque.


11WAGs (ou Wags) é um acrônimo que se refere a Wives And Girlfriends of Sports Stars (Esposas e
Namoradas de Estrelas do Esporte).
estivesse no momento em que eu a vi balançando
perigosamente no estacionamento enquanto tentava encontrar
as chaves.

Kareem acenou para outro companheiro de equipe para


me apresentar e eu respirei fundo. Ninguém estava me
julgando. Ninguém estava olhando com olhos estreitos.

Exceto, talvez Logan, foi o pensei ao avistá-lo na beira do


campo, me observando cuidadosamente por baixo da aba de
seu boné preto bem gasto com o logotipo dos Wolves
estampado na frente.

Voltando minha atenção para os caras que se


aproximaram, eu reconheci alguns, mas não todos. Todos
sorriram, conversaram um pouco e brincaram com Kareem. O
tipo de familiaridade que normalmente crescia entre colegas de
equipe.

Apenas não comigo.

Às vezes, eu mal reconhecia isso sobre mim, mas eu


estava assim há tanto tempo que parecia uma tarefa tola tentar
mudar isso. Me mudar.

— Relaxe, cara, — Kareem disse calmamente enquanto


os outros caras começaram a conversar entre si.

Revirei os olhos. — Sim, é isso que eu faço de melhor.

— Você ainda é virgem? Você sabe que esse é o seu


problema, certo?
Meu corpo inteiro congelou quando ele disse isso muito
alto. Nivelei-o com um olhar, o que o fez rir. — Kareem, seu
imbecil. Eu não sou virgem.

Seu queixo caiu quando ele avistou meu rosto. — Sério?


Você ainda não faz sexo? — A cabeça dele balançava para
frente e para trás, devagar, incrédulo. — Eu pensei que você
estava apenas sendo, tipo, mal-humorado ou alguma merda do
tipo na faculdade.

— Nós não estamos falando sobre isso agora.

Ele gruniu novamente. — Sim, nós estamos. — Um braço


veio ao redor dos meus ombros e nos separamos dos caras. Eu
não tinha vergonha do fato de ter escolhido me abster de
mulheres. Uma mulher era uma distração. O sexo não era
apenas uma distração, mas também vinha com muitas
complicações possíveis. Eu não queria filhos. Não queria nada
na minha vida que lutasse pelo primeiro lugar fora o futebol.
— Cara, vamos lá, você está me matando. Como você... você
não fica com raiva o tempo todo?

Isso me fez sorrir, só um pouco, porque o jeito que ele


disse fez parecer que eu estava tentando uma proeza
impossível. Escalando o Monte Everest nu. Bungee jumping
sobre um canyon cheio de vidro com uma corda desgastada.
Saltando de um avião sem verificar se meu paraquedas estava
preso nas minhas costas.

— E você não acha que isso me ajuda? — Eu perguntei.


Ele parou de andar. — Eu sei que você está brincando
agora. Eu sei que você está.

Estendi meus braços. — Por quê? Você disse que ficaria


com raiva, certo? Onde você acha que eu coloco toda essa
energia? — Eu levantei meu queixo no campo à nossa frente.
— Eu coloco lá fora.

— Você é um filho da puta louco, Griffin. — Ele balançou


a cabeça novamente. — Eu sabia antes, e realmente sei agora.

Logan – treinador, como eu precisava me acostumar a


pensar nele – assobiou bruscamente do lado de fora, e Kareem
me empurrou forte o suficiente para que eu tropeçasse. Eu o
empurrei de volta, o que o fez rir, mas ele era o único. O
treinador Ward olhou para mim.

— Era assim que você prestava atenção aos seus


treinadores em Miami? — Ele perguntou, braços cruzados
sobre o peito. Atrás dele, notei duas pessoas de terno – um
homem, uma mulher – e um cara segurando uma câmera de
aparência cara.

Levantando meu queixo, coloquei minhas mãos atrás das


costas como um soldado encarando seu oficial comandante. —
Não senhor.

— É ruim, treinador, — disse Kareem, rindo. — Noah


acha que— – eu dei a ele um olhar penetrante, e ele sorriu – —
seu estado natural de raiva reprimida significa que ele pode me
dar uma surra.
Os caras ao nosso redor riram e o treinador abriu um
sorriso relutante. — Sim? O que você acha disso, Jones?

Kareem bateu uma mão nas minhas costas. — Eu acho


que esse garoto é louco, e estou pronto para provar isso.

As pessoas de terno e as câmeras direcionaram sua


atenção totalmente em nossa direção agora, e os aplausos e
risadas de meus novos colegas de equipe eram suficientes para
me distrair de me perguntar o que estavam fazendo.

Eu balancei minha cabeça. — Kareem, não se


envergonhe. Vamos apenas trabalhar.

Na verdade, eu não queria me alinhar assim no meu


primeiro treino e transformá-lo em um circo. Por mais que eu
quisesse ser o melhor, não precisava dos holofotes que o
acompanhavam. Eu queria quebrar recordes para provar que
podia. Eu queria levantar mais, correr mais rápido, treinar
mais, porque era bom nisso. Meu corpo ansiava
constantemente por aquela queimadura, a satisfação da dor
que me dizia que eu era o trabalhador mais duro no campo.

Mas Logan acenou para nós fazermos isso, então eu


achataria Kareem sem pensar duas vezes.

Nossos colegas de equipe nos cercaram, deixando espaço


suficiente no meio para Kareem e eu nos encararmos. Alguém
nos entregou capacetes, e eu amarrei o meu enquanto ele fazia
o mesmo. A mulher alta e magra de terno empurrou alguns
jogadores para fora do caminho para que as câmeras
pudessem nos ver claramente, e eu rolei meu pescoço para
ignorá-los e foquei no que eu precisava fazer.

A piada sobre o meu estado natural de raiva alimentou o


aperto da tensão nos meus músculos enquanto eu me
agachava na frente do meu ex-colega de faculdade. Ele era
duas polegadas mais alto que eu e igualmente largo.

Seu corpo possuía todos os mesmos músculos


cuidadosamente trabalhados e conhecimento da mecânica
corporal para quando você estava tentando derrotar um
oponente. Ele manteve os dedos soltos onde eles o
sustentavam na grama, e eu fiz o mesmo, sem nenhuma pista
de onde poderíamos nos mover ou em que direção tomaríamos.

Ele sorriu por trás do capacete, e eu estreitei os olhos,


deixando a chama cheia de poder se desenrolar através dos
meus braços, costas e pernas quando imaginei derrubá-lo.
Nossos colegas de equipe riram e gritaram; a maioria aplaudiu
Kareem, mas algumas vozes estavam dizendo meu nome. O
treinador ficou entre nós, apito prateado na boca, o que seria
o nosso sinal.

O movimento por trás de Kareem afastou meu olhar por


uma fração de segundo.

Molly. No campo de prática.

Seus olhos azuis encontraram os meus e se arregalaram.

O que ela estava fazendo aqui?


O apito soou, agudo e alto, mas Kareem avançou uma
fração de segundo antes de mim. Porque, é claro, eu não estava
prestando atenção. Isso foi o suficiente para eu ter que cavar
minhas chuteiras e empurrar contra ele, nossos ombros
encostados um no outro enquanto lutávamos pela posição
dominante.

Um pulso brilhante de raiva ficou sem controle, porque


eu ainda não o vira por causa dela, e isso foi o suficiente para
eu empurrá-lo de costas.

Os caras aplaudiram, alguns gemeram, e Logan nos


assistiu com um leve sorriso no rosto.

— Nada mal, Griffin, — disse ele.

Estendi a mão e Kareem a pegou. Ele deu um tapa nas


minhas costas em um meio abraço quando estava de pé.

— Idiota, — ele disse, mas estava sorrindo.

— Maricas, — retornei, o que o fez rir.

A multidão se dissipou quando começaram a fazer fila


para treinos, e quando eu estava prestes a fazer o mesmo, o
pessoal de terno e as câmeras – e Molly – se aproximaram do
treinador Ward e de mim.

Ele parecia tão feliz quanto eu na presença deles. A única


coisa que ele não estava era surpreendido. — Posso ajudar?

A mulher, escultural e composta e totalmente deslocada


em um campo de treino, olhou-me de cima a baixo lentamente,
como se estivesse sob os holofotes. Eu lutei para não enrolar
meus lábios para ela.

— Noah Griffin? — Ela perguntou, estendendo a mão. Eu


peguei. — Sou Beatrice Kelly, diretora de marketing de
Washington.

— Prazer em conhecê-la, — eu disse rigidamente. Não era.


Eu queria estar praticando.

Quando Beatrice se apresentou a Logan, Molly agarrou


uma prancheta preta e vermelha ao peito, o rosto em branco e
os olhos fixos na grama verde-clara.

— Se você não se importa, a equipe estará aqui filmando


pelo restante da prática, e então eu gostaria de roubar quinze
minutos com você e Noah quando terminar.

Logan olhou para mim e depois para ela. — E se eu me


importar?

Ela sorriu lentamente, olhos tão quentes quanto um bloco


de gelo. — Então você pode conversar com Cameron depois do
treino, depois que nos encontrarmos com Noah.

Vi Molly respirar devagar, as bochechas assumindo uma


cor rosa suave. Pessoalmente, eu não queria me encontrar com
essa mulher depois do treino, mas já estive jogando o suficiente
para saber que, às vezes, você tinha que fazer merda que não
queria.
O olhar que Logan deu a Beatrice teria feito o maior e
mais assustador linebacker recuar, mas ela estava
completamente destemida. Até fiquei feliz por não ter recebido
nada disso.

— Eu preciso de quinze minutos, treinador Ward, — ela


repetiu. — Nós podemos fazer isso agora, ou podemos fazê-lo
após o treino. Eu darei a você a escolha.

Ele bufou.

Eu derrubei meu queixo no meu peito enquanto ele


refletia sobre sua oferta.

— Griffin, devemos fazer isso agora? — Ele perguntou


baixinho.

Empurrando minha língua na minha bochecha, eu olhei


para todos os rostos na minha frente, olhares rápidos
enquanto tentava descobrir o que diabos isso tinha a ver
comigo. Eu só queria jogar. Aquilo era pedir demais?

O rosto que chamou minha atenção por apenas uma


fração a mais do que todo mundo era o de Molly.

Hoje, ela estava de camisa preta e calça jeans vermelha


brilhante. Ela combinava com sua chefe, combinava com o
campo e, por alguma razão, martelava o quanto mais esse
lugar era mais dela do que meu.

— Vamos fazer isso agora, — eu disse.


Beatrice sorriu de novo, apenas um toque de degelo no
frio de antes. — Excelente. Logan? Suponho que você saiba
onde fica meu escritório.

Sua resposta foi um breve aceno de cabeça.

— Ótimo. Nos vemos em dez minutos.

Eles se afastaram, deixando Logan e eu com as mãos


apoiadas nos quadris e expressões irritadas em nossos rostos.

— Que diabos foi isso? — Eu refleti.

Ele esfregou a parte de trás do pescoço. — Griffin,


acredite em mim quando digo que gostaria que houvesse uma
maneira de evitar isso.

Meu rosto virou bruscamente em sua direção. — Tão ruim


assim?

— Sim, — ele disse firmemente. — Para caras como você


e eu? É tudo o que odiamos sobre jogar.

Depois que ele deu algumas instruções a um assistente


técnico, começamos a caminhar em direção ao escritório de
Beatrice, e pensei no que ele disse.

Tudo o que odiávamos sobre jogar. Ótimo.


— OBRIGADA POR SE JUNTAREM A MIM, CAVALHEIROS, — disse
ela de onde estava sentada em uma mesa enorme e brilhante.
Seus olhos cinza-gelo pousaram no meu rosto e ela sorriu, um
tipo completamente diferente de sorriso, agora que estávamos
em seu território. — Como está indo à transição para
Washington, Noah? Não pode ser fácil mudar de time tão perto
de começar.

O cara segurando a câmera no canto apontou


diretamente para o meu rosto, e o foco, exclusivamente em
mim, fez minha pele formigar.

— Estou animado por estar aqui. — Respondi como se


estivesse encarando a mídia e não alguém internamente. — E
estou animado para começar a trabalhar.

Logan suspirou. — Exatamente. Trabalho. Prática. É


onde deveríamos estar agora.

A rabugice era tão evidente que quase abri um sorriso.


Apenas dois dias em Washington, e encontrei alguém com
menos habilidades com as pessoas do que eu.
Beatrice desviou o olhar para a câmera e assentiu. — Um
momento, por favor. Não vamos precisar disso. E diga a Molly
que estarei pronta em cinco minutos.

Meu queixo apertou involuntariamente.

O silêncio encobriu o escritório quando o cara da câmera


se levantou e nos deu um pouco de privacidade.

— Eu vou direto ao assunto. A Amazon está incluindo


Washington na próxima temporada do documentário ‘Tudo ou
nada’, e você é o jogador que eles gostariam de destacar.

Sentei-me para frente, sobrancelhas dobradas


firmemente sobre os olhos. — O que? Por que?

Logan esfregou a parte de trás do pescoço, mas não disse


nada.

— A narrativa para esta temporada é encontrando e se


encaixando na cultura de uma equipe. Estou trabalhando
neste acordo desde o dia em que disse a Cameron e Allie que
eles deveriam me contratar, e precisávamos do jogador certo.
— O sorriso dela suavizou e mudou os ângulos rígidos do rosto.
— E esse jogador é você.

— Eu não quero ter câmeras comigo a temporada toda.


— Eu balancei minha cabeça. — Não me interpretem mal, elas
fazem um ótimo trabalho. Eu assisti a temporada de Los
Angeles e Michigan, e elas foram ótimas. Mas estar sob os
holofotes é a última coisa que eu quero. Estou aqui para jogar
futebol.
Ela respirou fundo. — Me deixe reformular isso enquanto
somos apenas nós três neste escritório, ok?

Algo na maneira como ela disse me fez sentar novamente


e respirar profundamente para desmontar o tijolo que
apareceu de repente no meu estômago. Logan me deu um olhar
rápido e desconfortável, e tive a sensação de que ele sabia
exatamente o que estava passando pelo meu cérebro.

Isso não era uma negociação. Era uma cortesia.

— Você é o melhor final defensivo da liga. Quando a


temporada terminar, ninguém poderá tocar nos recordes que
você quebrará. — Seus olhos eram tão intensos, palavras tão
frias que quase vi geada saindo de sua boca. Não de uma
maneira maldosa, mas de uma maneira que eu sabia, sem
sombra de dúvida que odiaria o que ela estava prestes a dizer.
— Mas tudo isso será ofuscado se as pessoas acharem que você
foi expulso do seu time porque você bateu na esposa bêbada
do capitão do time, enquanto ela era incapaz de se defender.

Eu estava fora da minha cadeira antes de respirar fundo.


— Essa história é besteira, e você sabe disso.

Logan se levantou, colocando uma mão calmante nas


minhas costas. — Claro que sim. Todos nós sabemos.

Meu coração estava batendo loucamente, cada fragmento


de ferro da minha vontade esfarrapando com a mera sugestão
de que eu me tornaria uma manchete obscena. Lentamente,
eu me abaixei de volta na minha cadeira e lutei abrindo e
fechando as mãos até as juntas ficarem brancas, para ganhar
o controle da minha irritação.

— A história é besteira, — disse ela calmamente. — Eu


nunca duvidei. As pessoas do escritório de Miami sabem disso,
e é por isso que não houve um único sussurro sobre isso para
a mídia.

— No entanto, você sabe disso.

Ela sorriu. — Cortesia profissional de alguém em seus


escritórios para quem eu trabalhava.

— O que isso tem a ver com o documentário, Beatrice? —


Logan perguntou.

Ela observou meu rosto cuidadosamente antes de


responder. — Uma parte do meu trabalho é facilitar o
reconhecimento positivo da marca ‘Washington’. Um
documentário como esse não tem preço pelo que permite que
nossos fãs vejam. Normalmente, eles não teriam acesso a
reuniões, salas de cinema, viagens... o tipo de coisa que nunca
chegaria às mídias sociais. Mas podemos dar a eles, e dessa
forma, estamos controlando a narrativa. Sim, está
documentando a realidade de um jogador estabelecido
entrando em uma nova organização, mas Noah, isso permite
que você mostre às pessoas o tipo de homem que você é. Atrás
do capacete, almofadas e estatísticas.
Minhas mãos, abriram e fecharam entre as minhas coxas,
se apertaram brevemente quando abaixei a cabeça e processei
o que ela estava dizendo.

— A verdade é que não acho que o que aconteceu em


Miami seja um problema. Agora e não no futuro.

Eu levantei minha cabeça. — Você não deveria estar me


convencendo de que é por isso que eu deveria estar fazendo
isso?

— Provavelmente, — ela disse com um sorriso irônico. —


Mas não estou tentando manipulá-lo. Estou apenas afirmando
a verdade. Você é uma pessoa atraente, Noah. Sua reputação
como ‘The Machine’ não veio do nada. Mas os jogadores que
são importantes para as pessoas são os aqueles que inspiram
devoção porque são heróis, não apenas quebradores de
recordes. Veja JJ Watt ou Peyton Manning ou Drew Brees. Sim,
eles quebraram todos os tipos de recordes, mas são amados
por muito mais que isso. Por isso que nos lembraremos de seus
nomes e valorizaremos seus legados muito tempo depois que
eles pararem de jogar.

Logan se mexeu em seu assento. — Você está pedindo


que ele mostre o outro lado.

— Sim, — ela disse. — Mostre aos seus fãs que, mesmo


para o ‘The Machine’, é difícil começar de novo. É desafiador.
Mas você é forte o suficiente para superar esse desafio e
encontrar seu lugar em uma organização conhecida por sua
cultura positiva.
Respirei fundo e fechei os olhos. Eu já podia imaginar
dizer ao meu pai que estava fazendo isso, podia ouvir a
descrença em sua voz rouca.

Mas meu pai não estava aqui. Eu olhei para Logan. — O


que você acha?

Ele levantou as mãos. — Esta não é uma decisão minha.


Honestamente, eu nem sei por que ela precisava de mim aqui.

Beatrice respondeu isso facilmente. — Porque você é o


treinador dele, e isso exigirá seu apoio quando tivermos
câmeras em todos os ângulos da vida dele.

Logan fez uma careta. — Isso parece horrível.

— Útil, obrigado, — murmurei.

Ele me deu um olhar de desculpas.

A pele dos meus dedos ficou branca quando eu apertei


minhas mãos novamente. Ela não estava errada, mas eu
também não acreditava que ela estivesse certa. Eu não
precisava ser adorado por toda a eternidade, mas queria ser o
melhor no que fazia. Eu não deveria precisar de algo assim
para provar isso. Os números provavam isso. Os rankings
provavam isso. Vitórias, derrotas e troféus. O respeito que
ganhei em campo era subjetivo, com base em quem estava me
julgando, mas todas as coisas externas que podiam ser
mapeadas, relatadas e colocadas nos livros de história eram
fatos frios.
Mas se ninguém se lembrasse de mim, ninguém se
importasse com o homem por trás do capacete, os números
importariam?

Não ser capaz de responder a essa pergunta pela primeira


vez na minha carreira me fez sentir como se alguém tivesse me
jogado em uma poça de óleo, viscoso e grosso. Eu não
conseguia avançar, não importa o quanto tentasse.

— Eu vou fazer isso, — eu me ouvi dizendo.

Beatrice sorriu. — Excelente. — Então ela olhou além de


nós para a porta. — Momento perfeito, Molly. Sente-se.

Teria sido cômico – a maneira como Logan e eu


congelamos juntos na entrada de sua irmã. Mas não foi
engraçado... não foi nada engraçado.

— Eu preciso que você fique no modo de treinador, —


disse Beatrice ao homem ao meu lado. Aquele que estava
sentado tão rigidamente quanto eu. — Você pode fazer isso?
Porque sua irmã me garantiu que seu papel nesta organização
não tem nada a ver com o dela.

Meus olhos se estreitaram com o jeito que ela disse isso,


descrença abundante e pesada nas palavras.

Molly sentou-se ao meu lado, e eu peguei a menor


sugestão de pêssego nela.

Bem. Eu não precisava respirar por ela. Sem problemas.


— Molly conseguiu esse emprego por mérito próprio, —
Logan disse firmemente. — E eu estou sempre no modo
treinador.

Olhando rapidamente para Molly, ela estava sentada em


sua cadeira, focada inteiramente em sua chefe. Por uma fração
de segundo, seu queixo se inclinou na minha direção como se
soubesse que eu estava olhando, mas ela se recusou a me
reconhecer.

— Bom, — disse Beatrice. — Molly aceitou o papel de


ligação de projetos especiais para Washington nesta manhã.

A terra se abriu embaixo de mim? Na verdade, olhei para


o chão para ter certeza de que não tinha e que minha cadeira
ainda estava em pé.

Logan exalou devagar, audivelmente. — Ela me contou


um pouco sobre a oportunidade que você deu a ela.

— Estou tão honrada que Beatrice está me dando essa


chance, — disse Molly com um olhar carregado para o irmão.
— Estou animada para trabalhar com a Amazon. — Ela fez
uma pausa e seus olhos se voltaram para mim pela primeira
vez desde que ela se sentou. — E Noah.

Meu pé começou a bater rapidamente. Eu me virei para


Beatrice. — O que faz uma ligação de projetos especiais?

— Ela será sua pessoa de destaque. Ela estará lá todos


os dias para filmar, obter o que a Amazon achar necessário,
finalizar a programação de filmagens com você, garantir que a
marca esteja protegida durante o processo e garantir que tudo
corra o mais suave possível. Para a Amazon, mas o mais
importante, para você, Noah.

Cada palavra era como uma pequena barra sobre minha


pele. Por si só, não abriu muito o ferimento, mas combinou
todos elas e eu sangraria se pensasse demais no que isso
significava para mim.

Eu estaria com Molly constantemente.

Meu rosto estava perfeitamente calmo, mas por dentro,


uma tempestade assolou a ideia, selvagem e imprevisível.
Porque tudo que eu sabia dela era que ela era selvagem e
imprevisível, algo que eu não podia ou nem queria controlar. E
seria ela quem garantiria que tudo ocorra bem.

Ao meu lado, Molly chutou meu pé, um aviso silencioso


que sua chefe não podia ver sobre a extensão de sua mesa.

Logan apoiou os cotovelos nos joelhos e enterrou a cabeça


nas mãos.

Apertei a ponta da minha língua entre os dentes com


tanta força que provei o sabor acobreado do sangue.

— Estamos animados para começar? — Beatrice


perguntou, tão feliz quanto eu a tinha visto.

— Sim, — disse Molly.

Logan soltou um palavrão abafado e depois levantou a


cabeça.
Beatrice se levantou. — Excelente. Senhores, tenho outra
reunião para começar. Molly, por favor, descubra os próximos
dias com Noah antes que ele comece a praticar. — Com um
sorriso modesto em direção à mulher sentada à minha
esquerda, ela assentiu com regência. — Lidar com a Amazon é
oficialmente sua responsabilidade.

Ela saiu e o espesso vácuo do silêncio que sua saída


provocou, praticamente pulsou com todas as coisas não ditas.

— Esta é a pior ideia que eu já ouvi, — Logan disse. —


Molly, você não pode estar falando sério agora.

— Você não tem voz, Logan. Modo treinador, lembra? —


Ela cruzou os braços sobre o peito.

Ele ficou de pé, abrindo os braços. — Quando eu consegui


deixar de ser seu irmão? Nunca. E não vou me desculpar por
isso.

Inclinei-me para a frente com um gemido. Este era o meu


maldito pesadelo.

Molly ficou de pé e encarou-o, mandíbula inchada e olhos


em chamas. — Logan, lá fora, agora. — Então ela apontou um
dedo para mim. — Você, fique aqui. Volto em trinta segundos
e, se você se mudar dessa cadeira, não pense que não vou te
caçar no treino. Esses caras não me assustam.

Os olhos de Logan estavam tão arregalados quanto os


meus antes de agarrá-lo pelo cotovelo, e mesmo sendo quase
um pé mais baixa e uma década mais jovem, ela arrastou meu
treinador do escritório.
ALGUÉM do escritório da frente passou por nós, sorrindo
sem remorso pela maneira como eu arrastei meu irmão mais
velho no corredor.

Logan passou a língua pelos dentes, arrancando o boné


da cabeça com um puxão agitado das mãos. — Essa é uma
péssima ideia, — disse ele novamente. Como se eu não o
tivesse ouvido da primeira vez que ele reclamou.

— O que gostaria que eu fizesse? — Eu perguntei a ele,


nem mesmo tentando esconder o calor da minha voz. —
Beatrice está praticamente me desafiando a estragar tudo.
Você não está me ajudando a pensar que ela está errada.

A boca dele se abriu. — Eu não acho que você vai estragar


tudo, Molly.

— Não é? Se você confiasse em mim para fazer o meu


trabalho, seria capaz de manter todos esses pensamentos
julgadores de irmão mais velho em sua cabeça. — Eu girei meu
dedo em direção ao seu rosto, atualmente congelado em uma
careta.
Logan gemeu, inclinando o queixo até o teto. — Me dê
uma folga, ok? É... é ele. — Ele apontou impotente para o
escritório de Beatrice. — A última vez que Noah esteve por um
período prolongado...

— Eu tinha dezesseis anos, — eu sussurrei ferozmente,


meu rosto quente. Se ele não tivesse baixado os olhos se
desculpando, eu o teria dado um soco nas bolas. — É
categoricamente injusto supor que eu reagiria da mesma
maneira. Você acha que eu não sei o quão estúpido foi o que
eu fiz? Quão sortudos nós dois fomos que o pai dele entrou
quando ele fez isso? Eu entendi, ok? Mas você precisa verificar
seu impulso para me lembrar sua opinião todas as vezes que
algo grande muda na minha vida.

Eu estava respirando com dificuldade, meu peito arfando


e minha garganta apertada.

Já era difícil o suficiente sentar ao lado de Noah, sabendo


que ele me odiava, sabendo que não queria nada comigo, e
sabendo que meu grande plano com a minha chefe agora
estava parcialmente ao seu alcance. O que eu não precisava
era do meu irmão mais velho me tratando como uma
adolescente novamente.

Logan suspirou pesadamente e me puxou para um


abraço apertado. — Sinto muito, — ele disse no topo da minha
cabeça.

Apertei minhas mãos em suas costas largas e me permiti


relaxar em seu abraço por um momento. Logan pode não ter
sido meu pai, mas ele era melhor do que aquele com o qual eu
nasci. E por quase doze anos, ele assumiu o papel legal.

— Eu também sinto muito, — eu disse baixinho.


Recuando, olhei para seu rosto bonito com um sorriso tímido.
— Perigos de trabalhar juntos, hein?

Ele riu e colocou o boné de volta na cabeça. — Eu


suponho.

— Você tem sorte de ter se desculpado, — eu disse a ele.

— Sim?

— Sim. Eu estava pronta para contar a Paige o que


aconteceu com a foto que ela comprou para a sala de jantar
que misteriosamente se despedaçou.

Os olhos dele se estreitaram. — Você prometeu manter


isso em segredo.

— Segredos têm um jeito engraçado de sair quando os


irmãos mais velhos agem como agressores superprotetores no
trabalho, — eu disse inocentemente.

— Essa é a influência de Paige, — ele murmurou. — Vocês


quatro não eram tão selvagens até que ela apareceu.

Eu rio.

Logan colocou as mãos nos quadris e me olhou com


cuidado por alguns segundos. — Às vezes é difícil para mim,
sabia?
— O que?

— Lembrar que você é uma mulher adulta, — ele admitiu


em voz baixa. — Eu tinha dezenove anos quando você nasceu,
Mol. Isso não está muito longe de quantos anos você tem agora
e... — Ele fez uma pausa, parecendo um pouco melancólico. —
Meu mundo mudou quando você nasceu. Por mais que eu
deseje para você e suas irmãs que sua mãe não tivesse saído,
egoisticamente, eu nunca quero ter que devolver vocês quatro.
Mas é difícil para mim esquecer o que senti no dia em que você
nasceu. Mesmo estando aqui, inteligente, capaz e
independente, penso em como você era pequena, todo
enrugada, vermelha e enrolada naquele cobertor feio do
hospital.

— Eu sei, Logan. Você é a melhor coisa que poderia ter


acontecido conosco. — Olhei por cima do ombro para me
certificar de que ainda estávamos sozinhos no corredor. — Mas
você não pode nos proteger para sempre.

Ele assentiu devagar. — Não significa que não vou querer.

Eu sorri para ele. — Eu sei.

— Vou colocá-lo no banco se ele estragar tudo para você,


— prometeu.

Mais uma vez eu ri. — Não, você não vai.

— Não, — ele admitiu de má vontade. — Mas isso não


significa que eu não queira.
Minhas mãos varreram minha camisa e endireitaram as
pontas. — Tudo bem. Eu deveria voltar ao trabalho.

Logan levantou o queixo. — Você tem isso.

A mudança em seu tom e postura, e o puro respeito que


vi em seus olhos foram suficientes para fazer meu nariz
queimar com lágrimas não derramadas. — Eu ficarei tão brava
com você se você me fizer chorar.

— Não se chora no futebol, Ward, — ele retrucou. — Isso


é uma ordem.

Revirei os olhos. — Vá treinar seu time, por favor.

Ele piscou e me deixou sozinha no corredor. Antes de me


juntar a Noah novamente, me afundei na parede para me
recompor.

Noah não era meu chefe, mas era minha responsabilidade


manter esse processo o mais indolor possível para ele.

E eu não era a chefe dele, mas ele precisava respeitar meu


papel, no entanto. Filmar quando eu disser que ele precisa
filmar, cooperar com a equipe da Amazon e confiar que ele será
retratado de maneira positiva. E o mais importante, que ele se
refletisse honestamente.

Essas coisas nem sempre andam de mãos dadas, não em


nossa indústria. O melhor jogador do mundo poderia ser um
imbecil furioso para as pessoas ao seu redor. Mas, por mais
que Noah tivesse me atrapalhado no elevador, ele ainda era
respeitado por seus companheiros de equipe e treinadores.
Talvez ele não fosse universalmente adorado por causa do
exterior estoico, mas mesmo a pessoa mais gelada
descongelava ocasionalmente. E no final do dia, dependia de
mim garantir que o mundo visse isso.

Sentado na cadeira, pequena demais para o seu tamanho,


no escritório da minha chefe estava um homem que dedicara
sua vida ao mesmo jogo que eu amava.

Eles o chamavam de ‘The Machine’ porque o jogo de


futebol – couro marrom e atacantes brancos, chuteiras e
grama, capacetes, almofadas e suor – era pelo o que ele existia.

— O que há por trás do ‘The Machine’, no entanto? — Eu


sussurrei.

Antes de voltar ao escritório de Beatrice, respirei fundo e


soltei o ar lentamente. Podia levar semanas para Noah derreter
na minha presença em sua vida, mas ele derreterá. Ele não
teria escolha porque as câmeras não mentiam, e o motivo pelo
qual concordou foi permitir um raro vislumbre por trás da
cortina. Isso me lembrou dos meus filmes favoritos, O Mágico
de Oz.

Se Noah Griffin era o mago, todo poderoso e grande


demais para compreender tudo o que ele era capaz de realizar,
então eu teria que ser a desavisada Dorothy que descobriu a
verdade, um dia de cada vez, não importa o quão fora de lugar
eu me sentisse.
Com tristeza, olhei para minhas sapatilhas de cor nude e
bati os calcanhares juntos. Não teve o mesmo efeito que os
sapatos vermelhos rubis que brilhavam à luz, mas teria que
servir.

Quando eu abri a porta, ele ficou olhando pela janela no


canto, com vista para os subúrbios em expansão, onde ficavam
as instalações de treinamento e os escritórios administrativos
dos Wolves. Para o sudeste, as linhas irregulares do Monte
Rainier eram visíveis. Seus ombros estavam tão rígidos no
lugar que ele não deu a menor indicação de que ele me ouviu
entrar, mas algo na parte de trás do meu pescoço e com a
maneira como os cabelos se erguiam em meus braços, eu sabia
que ele estava plenamente consciente de que nós estávamos
sozinhos novamente da mesma maneira que eu sabia.

Eu mantive uma pequena abertura na porta e voltei para


o meu lugar. Minha prancheta estava no canto da mesa de
Beatrice, e eu a peguei para que eu pudesse mudar para a
agenda provisória marcada pela Amazon. Coisas que eles
queriam, pedidos de tempo e entrevistas e insights que eles
pensavam que iriam dar certo, mas não poderiam ser forçados.

Colocando a prancheta no meu colo, imaginei brevemente


se deveria deixá-lo assumir a liderança nessa conversa, já que
ele era o único que agia como um rabo de um cavalo gigante
na última vez em que o vi.

Foi contra todas as moléculas, todas as células do meu


corpo, não se importando com o que ele pensava de mim. Não
tentar convencê-lo de que eu era uma pessoa segura para ele
nisso. Que nossa história possa nos beneficiar e não dificultar
a vida.

Mas cheguei a uma decisão enquanto me sentava lá no


silêncio desconfortável. Não importava se Noah gostava de
mim. Eu só precisava dele para fazer o seu trabalho, e
precisava dele para me deixar fazer o meu. Poderíamos
conseguir isso, gostando ou não de mim.

— Beatrice acha que eu consegui esse emprego por causa


do meu irmão, — foi o que saiu da minha boca primeiro. Não
haveria filtro, não para esta conversa. Enquanto ele e eu
estivéssemos sozinhos, honestidade seria a melhor coisa que
eu poderia dar a ele.

Ao som da minha voz, Noah parou ainda mais, o que não


parecia possível. Seu corpo maciço mantinha-se quase
sobrenaturalmente imóvel. A extensão de suas costas era tão
ampla, enfatizando a maneira como seu corpo afunilava na
cintura e nos quadris. Um verdadeiro atleta, ninguém nunca o
olharia e questionaria que ele nasceu para fazer isso.

Eu sabia o tipo de dedicação necessária e os sacrifícios


que pessoas como ele faziam para alcançar esse tipo de força
e resistência. Foi por isso que fiz o que fiz, trabalhei onde
trabalhei e por que deixei de lado sua opinião sobre mim e as
dúvidas de Beatrice para fazer meu o trabalho.

— Ela está certa? — ele perguntou.


Eu sorrio. — Tenho certeza de que isso me ajudou a
conseguir meu estágio na faculdade. Mas eles nunca teriam
me dado um emprego e, definitivamente, não teriam me
mantido por perto se eu ferrasse tudo.

Noah não respondeu, e ele não se virou para mim. Eu


preferi assim.

— A única maneira de provar a minha chefe que ela está


errada sobre mim é mostrando. Não há palavras suficientes no
idioma para convencê-la de que não sou o produto do
nepotismo, e este trabalho, esta oportunidade, é a plataforma
que ela está me permitindo fazer isso. — Eu olhei atentamente
para as costas dele. — Para provar que ganhei meu lugar aqui
por minhas ações.

Seu rosto se inclinou na minha direção, o suficiente para


que a luz da janela atingisse a saliência afiada em sua
mandíbula. Os músculos sob sua pele estalaram, e eu me vi
olhando para aquele pequeno quadrado de pele, maravilhada
com a forma como algo tão pequeno poderia ser tão potente.

— Por que você está me contando isso? — Ele perguntou.

Recostando-me na cadeira, cruzei uma perna sobre a


outra e escolhi minhas palavras cuidadosamente antes de
dizê-las. Noah não estava gritando, ele não estava fazendo uma
cena, mas seu aborrecimento por estar nesta posição era alto
e claro, como um sinal piscando sobre sua cabeça.
— Eu não escolhi você para o documentário, Noah. Isso
foi Beatrice e a Amazon. Não foi minha escolha ficar com você.
Na verdade, tentei dizer a ela que achava que o novato da Nova
Inglaterra seria uma escolha melhor.

Isso o fez se virar. Um giro lento com as mãos entre os


quadris. — Por que isso?

Ah, lá estava, uma explosão brilhante de irritação atrás


de seus olhos, provavelmente porque eu insinuava que alguém
seria mais interessante que ele. Se havia uma verdade nessa
indústria que você poderia levar ao banco, era a natureza
competitiva desses homens. Deus abençoe a previsibilidade
deles nesse aspecto.

— Minhas razões não importam porque elas foram com


você.

Ele deve ter cerrado os dentes porque sua mandíbula fez


aquilo de novo. Eu desviei meus olhos.

— Desculpe desapontá-la, — disse ele.

— Você só vai me decepcionar se ficar no meu caminho.

As sobrancelhas dele se ergueram lentamente. — Então é


isso?

Minhas mãos tremiam um pouco e eu as apertei no meu


colo. Ele não conseguia ver o movimento frenético do meu pé,
mas se o tivesse, teria traído qualquer versão durona de mim
que eu estivesse tentando retratar.
Eu tinha uma chance. Pensei no que Beatrice disse em
nossa primeira reunião. Que raramente tínhamos a chance de
reparar a primeira impressão de alguém sobre nós.

Uma chance de refazer qualquer definição que ele tivesse


em minha mente.

Uma oportunidade nessa conversa que daria o tom para


trabalharmos juntos.

Para provar que Beatrice estava errada.

— Você acha que é a única pessoa que entende a pressão?


— Eu perguntei. Eu me levantei da cadeira e deixei cair a
prancheta sobre a mesa com um tapa agudo. Ele não precisava
se elevar sobre mim como um arrogante... o que ele estava
tentando ser agora. — Esquecerei nossa interação no elevador
ontem porque fomos pegos de surpresa. — Eu levantei meu
queixo. — Mas já faz quase dez anos que você não me vê, Noah.
Eu não sou a mesma garota e você não é tentador o suficiente
para arriscar a oportunidade que me foi dada. Se eu posso
superar o que aconteceu, então você precisa também. Não é
como se eu estivesse rasgando minha camisa e implorando por
outra chance.

Aqueles olhos percorreram meu corpo, um movimento


intencionalmente irônico que me atingiu nada além do que um
único baque de seu pedaço gelado de coração.

— Querida, — ele falou, — não importaria se você


estivesse.
O calor queimou minhas bochechas, mas eu me recusei
a deixar meu olhar cair. — Fico feliz em ouvir isso.

Os olhos de Noah se estreitaram um pouco, mas ele não


disse mais nada.

— Se você estiver livre depois do treino amanhã, meu


escritório fica a duas portas à direita. Vamos nos encontrar
com Rick, ele é o produtor da Amazon, e repassaremos nossa
programação de filmagens pelas próximas duas semanas.
Vamos precisar de acesso no campo e fora dele para você.

Com isso, ele emitiu um som que quase poderia ser


confundido por uma risada, se ele não fosse um robô sem
alma, sem emoções.

Risque isso.

Noah tinha emoções. Eles apenas pareciam ser pequenas


variações de irritação.

— O acesso fora de campo para mim será muito chato, —


ele admitiu. — Mas eles são bem-vindos para filmar da mesma
forma.

— Bom. — Estendi minha mão, mas ele não se


aproximou. Se ele quisesse sacudir, teria que vir até mim e,
com base no brilho perigoso que entrava em seus olhos, ele
sabia disso. — Te vejo amanhã?

Por um segundo, minha mão ficou congelada no ar, e eu


fiquei preocupada que ele deixasse ficar lá. Mas então ele deu
dois passos e envolveu minha mão com a dele. Meu braço
inteiro formigou, calafrios deslizaram pela minha pele com os
calos duros e secos em seus dedos. Fazia um minuto desde
que um homem me tocou, e eu odiava que ele fosse o único a
provocar a reação.

— Não me faça me arrepender de ter concordado com


isso, — Noah disse, ainda segurando minha mão com força na
dele.

Eu sorrio e, por algum motivo, essa visão fez seu rosto


escurecer como uma nuvem em uma tempestade. — Digo o
mesmo.
— ESPERO QUE ISSO NÃO TE MORDA NA bunda.

Eu fiz uma careta, fechando meu aperto na bola de peso


debaixo da palma da minha mão, depois abaixei lentamente
em direção ao chão em uma flexão até meus músculos
tremerem. Quando endireitei meus braços novamente, rolei a
bola e a peguei com a outra mão, colocando-a no topo da
superfície de borracha para outra repetição.

— Não vai, — eu disse a ele com os dentes cerrados


enquanto fazia outra.

— Eu pensei que você queria ser jogador defensivo do ano


novamente. Faz dois anos que você venceu. Por que dividir seu
foco em algo desnecessário?

Esse era o meu pai para você. Eu não conseguia ver o


rosto dele desde que estávamos no telefone, mas eu sabia
muito bem o que sua expressão facial estava fazendo. Conjunto
severo de sua testa enrugada, duro corte de boca que
raramente sorria.
Ele me amava, mas ele não era um homem quente. Mas
em sua preocupação, e da maneira que ele sempre
demonstrou, eu aprendi a recolher as palavras que ele não
estava dizendo.

Eu te amo e estou preocupado com você.

Outra flexão e eu me sentei de costas, revirando os


ombros quando a luz do lado de fora do meu apartamento
começou a diminuir para um roxo azulado.

— Porque os escritórios da frente não consideram


desnecessário, — eu disse a ele.

— Sim, bem, não são eles que precisam se vestir toda


semana, são?

Eu sorrio sem querer, me perguntando se o tom mal-


humorado que ele injetou em sua voz era uma característica
hereditária. Se fosse, eu a herdara.

— Não, não são eles. Mas também não acho que estejam
errados. No final, acho que será uma coisa boa. — Eu não
podia acreditar que tinha dito sem engasgar com as palavras.
Mais do que isso, eu quase podia acreditar que estava falando
sério. — Eu me encontrei com a equipe da Amazon hoje depois
do treino. Gostei do que eles estão tentando fazer. Eles não
estão sendo sensacionalistas em como é a vida dos jogadores
ou criando drama ou histórias falsas. É apenas uma visão mais
clara de como é a vida para nós.

Ele murmurou.
— Você já contou à sua mãe?

Me deitei no chão e estiquei meu corpo o máximo que


pôde. Algo satisfatório apareceu nas minhas costas e eu gemi.
— Ainda não. Não falo com ela há algumas semanas.

Meus pais se divorciaram quando eu estava no ensino


médio, com idade suficiente para decidir que preferia morar
com ele em Seattle a ir morar com ela e seu novo marido na
Alemanha. Meu relacionamento com ela era... bom. Nenhum
dos pais era excessivamente efusivo quando se tratava de suas
emoções, e eu fui o subproduto de uma vida inteira dessa
reserva.

No ensino médio e na faculdade, meu objetivo era ser o


oposto.

Eu seria divertido porque meus pais não eram.

Eu apreciaria a vida porque eles com certeza não o


faziam.

Eu seria capaz de fazer as duas coisas enquanto tivesse


sucesso no futebol, porque meu pai não tinha sido capaz.

Mas, no final, seja por circunstâncias fora de meu


controle ou pela pura força de minha composição genética –
provavelmente um pouco de ambos – eu era filho do meu pai,
completamente.

O que importava era o meu desempenho.


O que importava era que eu fazia as coisas da maneira
certa.

O que importava era que eu era o melhor.

Todo o resto foi fechado atrás de uma porta que eu


preferiria que ficasse fechada.

De alguma forma, porém, a porta se abriu e eu não pude


ignorar o que estava atrás dela tão facilmente quanto antes.

Tudo o que eu pude fazer era esperar que esse


documentário mostrasse que o homem que eu era quando o
capacete e as almofadas se soltassem era igualmente guiado e
focado. Eu não sabia quantos colegas de equipe estavam em
casa sozinhos em uma noite de semana durante a temporada,
trabalhando mais do que as quatro horas de prática que eu
havia feito. Mais do que as três horas de exercícios que eu
havia completado nas instalações. Mas eu estava fazendo
essas coisas.

Meu pai disse alguma coisa, e eu ajustei meus fones nos


ouvidos. — Desculpe, eu perdi o que disso, — eu disse a ele.

— Não era importante, — ele disse com facilidade. —


Apenas perguntando sobre seu novo lugar.

— Tem uma cama e uma cozinha. Isso é tudo o que


preciso por enquanto. — Eu olhei em volta. Meu agente
encontrou para mim assim que recebeu a ligação de
Washington, uma casa alugada de outro jogador que ele
representava. Não era do meu gosto, as linhas dos móveis eram
elegantes, modernas e impessoais. Eu gostava de sofás de
madeira e couro escuros, luminárias escuras e estantes de
livros e cadeiras profundas nas quais eu podia me encaixar. A
vista era incrível, com janelas do chão ao teto com visão para
Seattle, mesmo que eu ainda não tivesse meu telescópio.

Observar as estrelas era meu único hobby de verdade fora


do futebol.

— Bem, — ele disse, — isso é bom. Mais alguma coisa?

Porque eu sabia que seria exatamente uma semana, até


o minuto, antes de conversarmos novamente, tentei pensar em
qualquer coisa com a qual ele realmente pudesse se importar.
Quando cheguei vazio, dei de ombros. — Não, eu posso deixar
você ir.

— Falo com você na próxima semana.

Ele desconectou a ligação quase imediatamente, como se


estivesse aliviado por termos terminado de conversar. Meu pai
era assim com tudo. Se sua vida tranquila e simples o
incomodasse, você nunca saberia porque ele não insistiria
nisso. A porta que guardava tudo isso para ele nunca tinha
sido destrancada, muito menos aberta. Apoiei minhas mãos no
chão atrás de mim e olhei em volta. Eu não era semelhante?
Esta era a minha emocionante vida de jogador de futebol e
nunca parei para me preocupar com o pouco que ela continha.

Malhando mais do que já tinha, porque estava entediado


e já tive minha ligação semanal com meu pai.
A Amazon se cansaria de mim antes que a semana
terminasse.

Com uma sobrancelha franzida, me levantei e estiquei os


braços sobre a cabeça. Foi fácil reconhecer a direção em que
meus pensamentos estavam indo. Concordei em fazer isso.

Portanto, eu faria isso melhor do que qualquer outra


pessoa. Se eles quisessem seguir um jogador tentando se
encaixar em um novo time, eu mostraria a eles qual deveria
ser o protótipo.

Todas as luzes estavam apagadas no meu apartamento,


exceto uma pequena na cozinha, e eu fui até a parede de vidro.
A forma oblonga12 do Space Needle13 brilhava à distância, e eu
desejava ter trazido meu telescópio para poder olhá-lo mais de
perto.

O céu além da cidade estava escuro, mas eu sabia que,


com o equipamento certo, como em Miami, seria capaz de ver
muito mais do que a olho nu. Minha ex-assistente estava
esperando para me enviar meus móveis até encontrar um lugar
para morar, em um lugar que parecesse comigo, mas enquanto
eu estava lá, me vi desejando ter apenas alguns itens para me
sentir mais em casa.

Um pensamento me ocorreu, e antes que eu pudesse


pensar melhor, ou me perguntar o que diabos eu estava

12É uma forma geométrica que possui mais comprimento que largura.
13O Space Needle (Agulha do Espaço) é uma torre de observação localizada em Seattle, no estado
de Washington, nos Estados Unidos.
fazendo, contribuindo para essa loucura, peguei meu telefone
e encontrei o número que havia guardado antes.

Eu: Você acha que eles estariam interessados em “Noah


vai à caça de casas”?

Nem mesmo um batimento cardíaco passou antes que os


pontos cinza saltando aparecessem na tela.

Molly Ward: SIM! Essa é uma ótima ideia. Vou adicioná-


la à agenda de amanhã.

Eu: Quanto mais cedo melhor.

Molly Ward: Entendi. Você não tem um lugar para ficar


agora?

Suspirei, inclinando meu ombro contra o vidro.

Eu: Sim, mas não é o meu estilo. As cadeiras foram feitas


para alguém da metade do meu tamanho.

Molly Ward: Eu não estou rindo de você, eu juro.

Molly Ward: Se ele disser que sim, e eu não consigo


imaginar que não, envie-me uma lista do que você está
procurando. Eu posso ajudar a restringir a pesquisa.

Isso puxou meu rosto para uma careta.

Eu: É seu trabalho me ajudar a procurar um lugar para


morar?
Molly Ward: É meu trabalho facilitar esse processo. Se
você quiser me enviar alguns filtros de pesquisa, compilarei uma
lista e você poderá escolher suas favoritas. Vou entrar em
contato com os corretores.

Algo sobre isso me deixou desconfortável. Não queria


sentir que Molly estava à minha disposição. Eu não queria
trabalhar com ela em primeiro lugar, mas quando eu apertei
sua mão pequena, dedos muito mais frios que os meus, eu
entendi o que o gesto era. Uma trégua.

Eu: Preciso de 3 quartos/3 banheiros, prefiro fora do


centro da cidade, quintal grande com privacidade, espaço para
academia em casa, piscina é uma vantagem, mas não um
requisito. Eu gostaria de permanecer abaixo de 1,5 milhão.

Molly Ward: Pode deixar.

Respirei fundo e enviei outro.

Eu: obrigado. Eu aprecio sua ajuda.

Molly Ward: Cuidado, Noah, confundirei isso por ser


amigável...

Eu balancei minha cabeça lentamente, mas enquanto eu


guardava meu telefone e olhava para as estrelas novamente,
tive que afastar o sorriso que ameaçava sair.
— VOCÊ É UMA DURONA, e você pode fazer isso, — eu
sussurrei ferozmente. Seus lábios eram cor de pétala de rosa.
Seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo trançado, e a
camisa branca fazia seus olhos arregalarem. Ela era eu e
estava prestes a arrasar na sua primeira reunião de
planejamento de produção com a Amazon e o grande e
assustador jogador de futebol que a odiava.

Eu gemi. Não é o tipo de pensamento que eu queria no


meu subconsciente antes de canalizar minha chefe cadela
interior.

Honestamente, era hora de revisar essa declaração de


qualquer maneira. A mensagem de texto no meu telefone
provou que talvez Noah não me odiasse, afinal. Passar algumas
horas da minha noite em casa procurando uma casa para ele
foi bizarro, mas também agradável... de uma maneira
distorcida.

O histórico de pesquisas no meu laptop, agora inundado


por casas de três quartos e três banheiros, o mantinha na
vanguarda da minha mente.
Quando meu alarme disparou, um toque suave de sinos,
eu acordei do meu sonho assustado, procurando na cama o
calor do corpo de outra pessoa, porque estava tão vívido em
minha mente que ele estava deitado ao meu lado na cama.

Não fazendo nada, lembre-se. Apenas ali.

Grande, quente e sólido. Se eu fechasse meus olhos com


força suficiente, fazendo meu próprio reflexo desaparecer,
ainda seria capaz de sentir o que sentia.

A completa ausência dele de uma maneira tangível.

Minha testa enrugou pensativa. Sonhos com um Noah


quente e sonolento não eram o que eu precisava na minha vida,
mas pelo menos tinha sido do lado platônico. Como se eu
estivesse dividindo uma cama com um golden retriever e
conseguido a mesma coisa, se eu pensasse sobre isso de forma
crítica.

Perfeito. Eu assenti resolutamente. Noah era um golden


retriever, e ele precisava de um lar, e eu o estava ajudando
porque, por enquanto, meu navio estava amarrado ao dele.

Então eu comecei a rir.

Noah, como um cachorro fofinho, desgrenhado e doce, foi


a pior comparação em todo o universo de comparações.

Não havia nada despretensioso ou médio nele.

A coisa que eu mais notei, quando ele se ergueu no canto


do escritório de Beatrice e como ele se adiantou nos treinos
anteriores, era que ele nunca relaxava. Nunca permitia que a
tensão deixasse aquele corpo maciço. Seus olhos estavam
atentos e perscrutadores, separando as fraquezas de seus
oponentes, se esse oponente era um companheiro de equipe
contra quem ele estava alinhando ou um pouco de mim.

Um alerta disparou no meu telefone, o lembrete que eu


tinha marcado para a nossa reunião, e respirei fundo.

Não importava como eu tentasse diminuir o impacto de


Noah, ele sempre ocuparia mais espaço – físico, mental e
emocional – do que algum homem comum.

Saí do banheiro com um renovado senso de propósito,


porque se ele podia alcançar um ramo de oliveira, meu cérebro
poderia treinar para vê-lo com o necessário senso de desapego.

Ele era apenas um regular jogador de futebol.

Na verdade, eu não o conhecia, não importa o que tivesse


acontecido entre nós.

E por causa disso, eu seria capaz de fazer meu trabalho


sem nenhuma interferência.

A pequena sala de conferências em frente ao meu


escritório estava vazia, então acendi as luzes e coloquei a pilha
de pastas para baixo, uma na frente de cada cadeira vazia.
Beatrice estava fora durante o dia trabalhando em material de
mídia, então eu não precisava me preocupar com ela
espreitando no corredor para julgar o meu desempenho. O que
era bom porque minha conversa estimulante estava
diminuindo um pouco quando os ponteiros do relógio se
aproximavam, e ninguém aparecia ainda.

O relógio no meu pulso mostrava a mesma hora que o


meu telefone, assim como o relógio digital na parede da sala de
conferências.

Esses homens não sabiam que dez minutos mais cedo


que era chegar na hora? Estar no horário era tão bom quanto
chegar atrasado.

Me sentando, eu impacientemente cruzei minhas pernas.


Depois as cruzei novamente. Meus pés já doíam porque eu
decidi que alguns centímetros extras não doeriam por um dia.
Farsa interior e tudo.

Eu olhei para aquelas polegadas, envoltas em uma


patente preta brilhante, inocentemente beliscando e criando
dor e sofrimento ao envolver um pé que nunca tinha feito nada
para merecer tal tratamento.

— Dane-se, — eu murmurei. Enviei uma mensagem para


Paige para me certificar de que não estava louca por querer
jogar meus sapatos do outro lado do corredor até o meu
escritório.

Eu: Uma chefona pode ser uma chefona enquanto usa


sapatilhas de balé, certo?

Paige: Absolutamente.
— Absolutamente, — repeti e permaneci resolutamente.
Os saltos saíram no instante seguinte, e mesmo que eu me
encolhesse, meu corpo inteiro suspirou de alívio.

— Nós vamos ficar descalços aqui?

Eu pulei, segurando os sapatos no meu peito quando vi


Noah na porta. Seus olhos estavam treinados nos meus dedos,
então eles se moveram lentamente, oh, muito lentamente pelas
minhas pernas, passando pela saia cinza lápis e por cima da
camisa branca com decote em V no meu rosto.

— Vocês estão atrasados, — eu disse.

Porque isso explicava tudo perfeitamente.

Uma sobrancelha se levantou lentamente. — Estou três


minutos adiantado. Como é que isso é tarde?

Ele também tomou banho, além de chegar três minutos


mais cedo, o que não era realmente atrasado. Eu podia ver a
umidade de seus cabelos escuros e sentir o cheiro forte e limpo
de sabão que enchia a sala.

Respirando fundo, lutei contra o desejo de abanar minhas


bochechas quentes. Isso já estava indo muito bem, não era? —
É... tanto faz. Eu preciso pegar alguns sapatos diferentes antes
que todo mundo chegue aqui.

— Excelente ideia.

No entanto, ele ficou lá, bloqueando a saída. Noah olhou


para mim com expectativa.
— Você não abre uma porta muito bem, — eu disse a ele.

A cabeça dele inclinou-se.

— Mova-se, por favor, — eu disse lentamente. — Eu


preciso atravessar o corredor.

Isso o tirou de seu estupor. — Oh, desculpe.

Ele se virou para o lado e, quando passei por ele, ouvi sua
inspiração lenta e constante.

Senhor tenha piedade. Se pudéssemos passar por essa


primeira reunião sem mais incidentes, eu seria a garota mais
feliz do mundo. No final do corredor, pude ouvir as conversas
indistintas de Rick e Marty, o principal operador de câmera.
Enfiei meus pés em meus tieks14 e os encontrei do lado de fora
do meu escritório.

Com um sorriso, estendi minha mão em direção à sala de


conferências. — Rick, Marty, prazer em vê-los. Estamos aqui.

Noah estava esperando no canto com as mãos enfiadas


nos bolsos do jeans escuro. Rick e Marty se apresentaram, e
eu observei secretamente como Noah se comportou. Eu ainda
o vi sorrir. Cada vez que nos deparávamos – no elevador, no
campo de treino, no escritório de Beatrice e agora – seu rosto
estava com a mesma expressão determinada e pedregosa.

Era quase como se ele nunca tivesse tirado o capacete,


aquela espessa camada projetada para protegê-lo do mundo

14 Marca de sapatilhas
exterior. Como as câmeras deveriam capturar Noah Griffin,
não apenas o homem de uniforme, mas o homem como ele
realmente era, se isso nunca acontecia?

Nós nos sentamos e Rick olhou para mim com um sorriso.

— Rick, — eu disse, — por que você não começa a falar


um pouco sobre o que você e sua equipe estão procurando de
Noah? Temos algumas ideias, mas seria útil obter orientação
de você primeiro.

Ele assentiu. Eu gostava do Rick. No final dos quarenta


anos, ele tinha cabelos grisalhos desgrenhados, nariz grande e
um sorriso ainda maior. Ele era fácil de conversar, e isso
provavelmente o tornava natural em fazer as pessoas se
sentirem confortáveis, apesar de estarem sendo filmadas
constantemente.

— Minha direção, — disse ele a Noah, e depois com um


aceno diferente para mim, — será normal. — Ele encolheu os
ombros. — Passe o seu dia como faria normalmente. Pratique,
assista a filmes, coma carne e vegetais entediantes e não pizza.

Todos nós rimos. Bem, exceto Noah. Havia um ligeiro


aquecimento atrás de seus olhos, mas maldição, ele ainda não
abriu um sorriso.

— Minha vida não é muito emocionante, — admitiu Noah.


— Ainda não consigo entender como isso vai parecer
convincente na televisão.
Rick assentiu. — Você ficaria surpreso. O negócio do
futebol é tão fascinante para os nossos telespectadores quanto
a peça emocional. Encontramos sucesso com esta série porque
equilibra os dois. Há dinâmicas em jogo em cada arena,
pessoal e profissional, e é meu trabalho, — ele acenou para
Marty, o operador de câmera, que levantou dois dedos em um
gesto descontraído — e o trabalho de Marty, na minha
ausência, de capturar essas dinâmicas, não importa como elas
se desenrolem.

Noah olhou para mim, depois assentiu, pensativo.

Certo. Minha vez. — Se vocês olharem para suas pastas,


tenho um cronograma provisório, baseado em quando a defesa
está praticando e quando Noah tem reuniões nas quais você
pode participar, — eu disse. — Isso abrange as próximas três
semanas e temos algumas lacunas nesse cronograma, porque
acho que o que está faltando é a peça pessoal. — Meu sorriso
era pequeno, porque eu não estava tentando bater na cabeça
de Noah com por que você não tem mais amigos, nos dê algo
para filmar. — Noah teve uma ótima sugestão ontem de que
talvez pudéssemos acompanhá-lo quando ele estiver
procurando casas.

— Absolutamente, — Rick concordou. Seu lápis voou por


cima do papel. — Se você tiver alguém que puder acompanhá-
lo, um pai ou um companheiro de equipe, isso será ainda
melhor.
Noah se mexeu em seu assento, o rosto em branco. — Na
verdade, não.

Pelo canto do olho, notei Marty mudar a câmera no ombro


dele. Ele esteve filmando esse tempo todo? Eu acho que fazia
sentido que ele estivesse. Não há como dizer o que vale a pena
pegar e o que não vale. Era para isso que servia o processo de
edição. Cortar a merda e concentrar-se nas coisas boas.

— Ninguém? — Rick perguntou.

— Kareem Jones e eu jogamos juntos na faculdade, —


respondeu Noah, — mas não estamos perto. Normalmente, eu
não pediria a um colega para me ajudar a escolher uma casa.

Rick bateu no lápis, pensativo, e eu mordi meu lábio


enquanto folheava um Rolodex15 mental.

— Não posso... fazer sozinho? — Noah continuou. — Sem


ofensa, mas não é como se a opinião de outra pessoa
importasse quando se trata de que tipo de casa eu moro.

Com isso, eu sorri.

— O que? — Ele me perguntou. Ele parecia um


adolescente rabugento.

— Nada. — Dei de ombros. — Você tem tanta certeza.


Normalmente, as pessoas gostam de ter outra pessoa para
trocar ideias. Ajudá-las a descobrir o que querem fazer.

15 Tipo de agenda – achei melhor deixar no idioma original por causa do contexto.
Noah parecia genuinamente perplexo. — Por que eu
precisaria de outra pessoa para descobrir o que eu quero fazer?
Eu lhe disse que tipo de casa eu quero, certo? Então, se eu
fosse outra pessoa, eu teria perguntado a você, quantos
quartos você acha que eu deveria ter?

Provavelmente foi a pior coisa que eu poderia ter feito, e


tentei desesperadamente esconder o sorriso largo. Todo o seu
semblante – a mandíbula, a linha dos lábios, o corte para baixo
das sobrancelhas – ficou confuso com a ideia de que algumas
pessoas pediam orientação ou poderiam querer a opinião de
outra pessoa.

A batalha foi oficialmente perdida quando ele estreitou os


olhos na minha boca trêmula.

Meu queixo se levantou e eu ri impotente.

— Não é engraçado, Molly.

Rick passou a mão na boca, escondendo um sorriso.

— É um pouco engraçado, — eu disse entre gargalhadas.


— Parece que eu sugeri que você andasse nu pelo Pike Place16.

— Que bom que minha decisão é tão divertida, — ele


murmurou, cruzando os braços sobre o peito.

Respirei devagar, finalmente me controlando. — Eu sinto


muito.

16 É um dos mais antigos e tradicionais mercados públicos dos EUA.


Ele levantou a mão em um gesto de dispensa. — Está
tudo bem. Contanto que vocês não me façam fingir que sou
amigo de alguém, ficaremos bem.

— Você pode absolutamente filmar sozinho. — Rick


continuou batendo no lápis, agora que o momento havia
terminado. — Nós podemos fazer algumas coisas de dublagem.
Nós vamos ter que fazer isso de qualquer maneira. Enquanto
estivermos recebendo seus pensamentos, seja através do
diálogo com outra pessoa ou através de entrevistas, estaremos
prontos.

Eu estava folheando as impressões das casas que


encontrei para Noah quando algo me ocorreu.

— Seu pai ainda não mora na cidade? — Eu perguntei


antes de pensar melhor. — Eu pensei que ele adorava aqui.

Todos os olhos na sala giraram em minha direção e minha


garganta se transformou em areia pegajosa.

Bem, merda.

O lápis de Rick estava congelado, pairando sobre a


superfície do papel. — Você conhece o pai dele?

Eu me mexi levemente, me recusando a encontrar o olhar


firme e implacável de Noah. — Eu sei que ele tem um pai. Não
sabemos todos?

Que flagrante de não resposta, e Rick sabia disso. Ele não


era bom em seu trabalho por nada.
Quando senti os olhos de Noah penetrando no meu perfil,
me virei e os encontrei de frente.

Desculpe, eu falei. Aqueles olhos se fecharam brevemente


quando ele suspirou, e isso foi tão bom quanto uma permissão
no meu livro.

— Noah e seu pai costumavam ser nossos vizinhos, — eu


disse a Rick e Marty, que de repente pareciam muito
interessados no que eu tinha a dizer.

— Há quanto tempo foi isso?

— Eu estava no ensino médio quando eles se mudaram


para outro lugar, — eu disse.

Ah, e quão complicada era essa explicação. Durante


meses, não vislumbrei Noah ou seu pai e, um dia, um cartaz
de venda apareceu no jardim da frente. Aos dezesseis anos,
tudo parecia muito dramático. Isso me fez sentir como uma
pessoa horrível; que o que eu fiz foi tão ruim que eles se
afastaram. Em retrospecto, eu realmente não podia culpar o
pai dele, mesmo que tivesse causado mais do que algumas
lágrimas dramáticas quando pensei que nunca mais o veria.

— Não gostou dos vizinhos? — Rick perguntou a Noah


com um sorriso.

Ele estava dizendo isso inocentemente, mas fez meu


pescoço esquentou de qualquer maneira. Noah, para seu
crédito, manteve o rosto completamente impassível quando
respondeu. — Os vizinhos eram bons. A casa era grande
demais para nós.

Apontei para Rick e Marty. — Não é grande coisa, então


não faça disso uma.

Rick levantou as mãos. — Eu nunca.

Eu olhei para ele. — Ok, então eu vou agendar alguns


desses corretores e garantir que Marty esteja disponível para
filmar. Você precisa estar lá, Rick?

Ele balançou sua cabeça. — Só estarei em volta pela


metade do tempo. Marty está bem sozinho por quase todo o
tempo, e você entenderá rapidamente o que funciona e o que
não funciona na minha ausência. Vou estar por aqui e em
Tampa. Temos um novato lá em baixo que também estamos
filmando agora.

Eu assenti. — Além da procura às casas, precisamos de


mais alguma coisa fora do campo?

Rick olhou para Noah. — Isso é com ele. O que você gosta
de fazer quando não está aqui?

Noah cruzou as mãos sobre a mesa e deu de ombros. —


Eu malho. Assisto a filmes. Vou correr. Nado se eu puder.

— Então, você trabalha mais, — Rick forneceu.

Eu sorrio de novo.
Noah fez uma careta. — Nada do que faço é tão
interessante, confie em mim.

— Eles te chamam de ‘The Machine’, certo? — Eu


perguntei.

Seus olhos afiaram, pousando quente e rápido no meu


rosto. — Sim.

— Até as máquinas precisam ser reabastecidas. Tem que


haver algo que você faz, em algum lugar que você recarrega. —
Eu mantive meu olhar nele. — Ninguém aqui vai julgá-lo, não
importa o que seja. Mas tem que haver algo que você guarda
para si mesmo, que não é sobre futebol. Todo mundo tem algo
assim.

— Seu irmão tem?

— Claro. Ele tinha a gente. — Dei de ombros. — Minhas


irmãs e eu éramos a vida dele, e fomos uma parte dela que ele
manteve em segredo por muito tempo. Mas assim que as luzes
do estádio estavam apagadas e ele limpava o suor, ele estava
de volta em casa, pegando brinquedos, assistindo filmes da
Disney e aprendendo a trançar os cabelos. Sua família o
reabasteceu.

Noah torceu o queixo. A maneira como ele olhou para


mim, parecia que éramos apenas ele e eu na sala enquanto ele
tentava decidir se este era um lugar que ele poderia ser
honesto. — As estrelas, — ele disse rispidamente.
— O que tem elas? — Eu mantive minha voz suave, como
se ele se assustasse a qualquer segundo.

— Eu gosto de astronomia. Eu teria me formando nisso


se meu pai tivesse concordado. — Ele limpou a garganta. —
Minha ex-assistente em Miami enviará meu telescópio assim
que encontrarmos uma casa.

Agora isso é uma surpresa, pensei agradavelmente. Essa


era a camada que precisávamos remover, mesmo que
levássemos o tempo todo para mostrar o que havia por baixo.
— Onde é o seu lugar favorito? Para olhar as estrelas.

— Aqui?

— Em qualquer lugar. Se você pudesse ir a algum lugar


para olhar as estrelas, onde estaria?

Noah soltou um suspiro lento, seus olhos assumindo o


olhar nebuloso de alguém que tinha acabado de se transportar
mentalmente para outro lugar. Em algum lugar eles queriam
estar muito, muito mal. — A cabana da minha avó em Black
Hills, Dakota do Sul.

Rick acenou para mim, apenas um pequeno


levantamento do queixo. Continue indo.

— Por quê? — Eu perguntei.

— É tão quieto. Tão... aberto. As montanhas são


diferentes lá do que as daqui. Menos pessoas. Menos luzes.
Menos poluição. — Ele fechou os olhos e todas as linhas em
seu rosto desapareceram quando ele imaginou o que estava
vendo em sua cabeça. De repente, eu queria estar lá também,
para ver como era. — O céu é maior lá do que em qualquer
outro lugar. É o único lugar em que me sinto pequeno.

Noah abriu os olhos e senti um estalo estranho no meu


coração. Como se alguém tivesse puxado um elástico,
apertando essa declaração em torno da coisa que empurrava o
sangue através do meu corpo.

Sem desviar o olhar, eu sabia que havia uma janela de


três dias na agenda de treinos, pouco antes do início da pré-
temporada.

— Nosso orçamento inclui um fim de semana em Dakota


do Sul, Rick? — Eu perguntei, os olhos ainda brilhavam em
Noah.

Ele sorriu e vi sua cabeça se mover de mim para Noah e


voltar novamente.

— Inclui agora, — ele respondeu.


— VOCÊ NÃO PODE ESTAR FALANDO SÉRIO.

Quando tentei, sem sucesso, passar a cabeça pela


abertura, sua resposta foi uma gargalhada indefesa. Isso me
lembrou um carrilhão de vento na cabine da minha avó, o leve
som do vento movendo-se através do vidro. Eu adorava aquele
carrilhão de vento. Agora isso me lembraria o riso de Molly
Ward. O pensamento me fez carranca. O que a fez rir ainda
mais.

— Esta casa foi construída para alguém um pé mais baixo


que eu, Molly.

— Pessoas baixas também precisam de lugares para


morar, — me lembrou Marty, com metade do rosto escondido
atrás da câmera sempre presente.

Eu olhei para ele. — Você não deveria ser um observador


silencioso?

Ele sorriu. Ou meio sorriso. — Tudo o que não serve à


narrativa vai acabar no chão da sala de corte de qualquer
maneira. Não se preocupe comigo, Griffin.
Servir a narrativa. Esse tipo de jargão de relações
públicas me fez querer rasgar o drywall com as mãos nuas só
para não ter que enfiar na minha cabeça.

Inclinei-me para Molly. — Se eu começar a dizer coisas


como servir a narrativa, me dê um soco na garganta.

Ela assentiu seriamente. — Por favor, diga agora.


Gostaria de praticar se estiver tudo bem.

— Ei. Nós concordamos em uma trégua.

— Sim, sim, — ela disse levemente. — Nós concordamos,


não é?

Levei um momento para perceber que as câmeras


estavam sobre nós, como faziam desde que chegamos à
primeira casa do dia. Ficava cerca de trinta minutos a leste de
Seattle, perto de Seward Park. Do lado de fora, parecia
promissor. Paisagismo aparado e um estilo arquitetônico de
Frank Lloyd Wright que me atraíram. Um pouco cara, apenas
para mim, mas era perto da água e tinha uma piscina.

Então entramos e percebemos que foi construída para


alguém provavelmente um pé mais baixo que eu. Eu já bati
minha cabeça em três molduras de portas. Cada golpe levou
meu humor de ambivalente, para irritado, para totalmente
irritado.

Ela cruzou os braços e examinou a cozinha. — Eu gosto


disso.
— Você gostaria, — eu disse. — Você pode atravessar
todas as portas sem uma concussão.

Seus lábios, vermelhos hoje, torceram em um sorriso. —


Essa visão não vale a pena?

Eu nem olhei para a parede das janelas. — Não.

Molly revirou os olhos. — Tudo bem. Você quer ir para o


próximo lugar? — Ela me deu um sorriso vencedor e sua
bochecha esquerda mostrou uma covinha oculta que eu não
lembrava. — Tem tetos altos.

Ela estava me gerenciando. Me gerenciando porque eu era


péssimo nisso. Isso fez minha pele ficar muito tensa e minha
cabeça latejar na base do meu crânio.

Ontem, de alguma forma, ela me fez confessar algo que


eu nunca planejei confessar. E eu fiz isso na frente de uma
equipe de filmagem.

Eu subestimei Molly, isso era certo. Porque quando ela


apontou aquele sorriso ensolarado para Marty, que o comeu
com uma colher, eu jurei que não faria isso de novo. Sua
capacidade de me reunir em qualquer direção que ela quisesse
era como um gatinho apoiando um tigre mal-humorado em
uma gaiola.

Eu era o tigre

E essa cozinha baixinha era minha gaiola.


— Eu preciso sair desta casa, — eu murmurei, passando
pelos dois. Marty virou-se para me seguir, e porque eu sabia
da câmera treinada em mim, e não para onde estava indo, a
batida do meu crânio na moldura da porta ecoou pela sala. —
Porra, — eu gritei, esfregando o topo da minha cabeça.

Molly colocou a mão na boca. Desta vez, ela não estava


rindo quando a deixou cair. — Você está bem?

Em vez de responder, saí da casa, apenas respirando


fundo quando estava fora novamente. O céu estava nublado, a
ameaça de chuva pesada no ar.

A mudança repentina no meu humor me surpreendeu,


mas eu não queria analisar o porquê.

Provavelmente começou quando eles perceberam que a


minha vida pessoal, do ponto de vista de alguém de fora, era
tão divertida quanto ver a tinta secar. Isso incomodou a noite
toda. Mesmo se meu pai ainda morasse na cidade, convidá-lo
a procurar casas teria sido uma péssima ideia. Nosso
relacionamento era tão quente quanto o pico mais alto do
Monte Rainier.

Atrás de mim, ouvi Molly se aproximar. Quando ela


caminhava, ela mal fazia barulho. Algo que eu notei em nossa
reunião. Ela sempre usava aqueles sapatos... aqueles que
pareciam chinelos glorificados. E por causa disso, seus passos
estavam um pouco acima de um sussurro de som, o que me
deixou hiper consciente do movimento dela.
— O que é que foi isso? — Ela perguntou.

Hoje, ela usava jeans e uma camisa Wolves de mangas


compridas que se encaixavam muito bem nela.

Eu não queria perceber que ela estava vestindo uma


camisa que se encaixava nela muito bem.

Isso me irritou.

— Nada disso parece natural, — eu rosnei. Eu lancei


minhas mãos no meu cabelo e olhei para a linha de água azul
no som. — E mesmo que eu tenha ouvido todas essas razões,
tudo bem, e por que as pessoas acham isso interessante, eu
não entendo como eu deveria apenas... passear por essas
casas e isso ajudará a equipe. Ou me ajudar a fazer parte da
equipe.

Molly deu outro passo mais perto, suspirando


suavemente enquanto ela fazia. Seu rosto, delicado, doce e
bonito, estava curvado em uma carranca pensativa. — Não é
para ajudar a equipe, Noah. Não se trata de vencer ou de torná-
los melhores, — disse ela, hesitante.

— Então qual é o objetivo?

Os olhos dela procuraram meu rosto. — O ponto é


mostrar a verdade. Essa é a realidade de ser jogador da liga.
Às vezes você muda de time e às vezes é difícil quando o faz.
Apertei minha mandíbula e vi Marty na minha visão
periférica. O merdinha era ainda mais furtivo que Molly,
rastejando sem ninguém perceber.

— Você não deveria estar fora de cena também?

Ela não mordeu minha isca, e senti um momento de


vergonha por ter golpeado nela em primeiro lugar.

— Não, eu não deveria estar fazendo nada além disso, —


disse ela calmamente. — Estou ajudando você a encontrar um
lugar para morar, porque é disso que você precisa. Você
precisa de um lugar para se sentir em casa, de cadeiras que se
encaixem em você e paredes ao redor de você, que fazem com
que você sinta que é aqui que deveria estar. E se você estiver
chateado por não ter mais ninguém para ligar para ajudá-lo,
conserte isso. Se não gostar, faça algo a respeito.

Naquele momento, percebi que você não precisava gritar


ou ser o maior e o mais alto para fazer com que sua força se
mostrasse em um momento importante.

Tão poucas pessoas na minha vida me levaram frente a


frente. Ela era a última pessoa que eu esperava estar disposta
a ter a coragem e fazê-lo, essa mulher pequena que mal
alcançava meu peito com o topo da cabeça, que eu conseguia
levantar com uma mão.

— Você não é minha amiga, Molly, — eu a lembrei. Minha


voz estava baixa, então Marty não podia nos ouvir. — Eu não
preciso disso de você, então pare de tentar me psicanalisar.
As sobrancelhas dela se curvaram. — Não é isso que
estou fazendo.

Inclinei-me para ela. — Sim, é. Você continua tentando


me tornar mais interessante, mais divertido, mais amigável, e
talvez essa seja a minha versão que você deseja que o mundo
veja, mas não é isso que eu sou. Pare de tentar transformar
isso em algo que é não. — Eu me endireitei, ignorando a
mágoa, e o olhar especulativo em seus olhos. — Eu acabei de
procurar hoje. Eu vou cuidar disso sozinho.

Eles queriam filmar The Machine, e era isso que eles


conseguiriam. Começando agora.
— ESSA CASA DEVE TER SIDO PIOR DO que eu pensava, —
murmurei. — É como se o último golpe na cabeça derrubasse
sua personalidade em coma.

Parados na cozinha do apartamento temporário de Noah,


Marty e eu observamos atentamente como Noah fazia sua
melhor impressão de um homem ignorando todos ao seu redor.

Com isso, ele estava sentado no sofá com fones de ouvido


e assistindo filme no iPad, ocasionalmente pausando o filme
para fazer anotações em um caderno enorme.

— Então, nós apenas estamos aqui? — Eu perguntei.

Marty suspirou, verificando a posição do tripé que


segurava sua câmera menor. — Sim.

— Ele não está fazendo nada.

— Não.

Seu tom imperturbável me fez olhar para ele. — Com que


frequência você fica entediado fazendo esse trabalho, Marty?

Ele riu. — Raramente. Mesmo em momentos como este.


— Seriamente?

O que ele não tinha altura, Marty compensou em seu


enorme sorriso. — Sério. Você não entra em um emprego como
esse porque é emocionante o tempo todo. É sobre encontrar
momentos interessantes no mundano, sabe? Eu fiz sessões de
seis meses para rastrear lobos em Yellowstone, e não é como
se você estivesse filmando-os na caça, sabe? Eles estão
dormindo na metade do tempo, mijando na grama, puxando
uma pilha de ossos velhos e secos para encontrar o último
pedaço de uma refeição, alguém briga por uma fêmea e você
consegue pegá-los. Mas na maioria das vezes, fica quieto.

Meus olhos se voltaram para Noah, sentado em silêncio


no sofá que era dolorosamente desproporcional para o seu
corpo grande. Na minha cabeça, eu não conseguia imaginá-lo
como um lobo. Ele era muito grande, seu corpo muito denso e
pesado de músculos. Ele era um urso, alto, largo e ameaçador,
grande o suficiente para apagar o sol se ele estivesse em cima
de você.

— E você nunca é tentado a forçar uma ação? — Eu


perguntei.

— O que você quer dizer?

— Como eles fazem nos reality shows. — Eu levantei


minhas mãos quando seu rosto se contraiu com desgosto. —
Não estou sugerindo, confie em mim. Apenas... tentando
entender o processo e tudo. Como isso serve para a narrativa.
Marty se inclinou para verificar a câmera novamente e
mudou o ângulo para dar conta do sol poente. — As coisas
como hoje estavam perfeitas ou teriam sido se ele não tivesse
tido uma birra na primeira casa. É algo real e verdadeiro, algo
que ele precisa realizar para se estabelecer agora que está aqui.
— Seus olhos, astutos e profundamente observadores,
voltaram para o homem na outra sala. — Mas isso também é
real e verdadeiro. Ele está se retirando para algo que é seguro,
algo em que é bom, e isso é tão importante quanto, para se
capturar.

Eu balancei a cabeça, olhando para o meu relógio. Ainda


tínhamos cerca de uma hora no horário das filmagens, e era
tão divertido quanto ver a tinta secar.

— Mas se você quiser fazer algumas perguntas, — disse


Marty, inclinando-se para mim e falando em voz baixa, — eu
não diria que não deveria. Você tem uma reação dele que
ninguém mais parece fazer. E isso é bom. Enquanto suas
reações forem dele, são verdadeiras, nunca será uma coisa
ruim.

Bufei uma risada com facilidade. — Mas isso não está


forçando a ação?

— Não estará. Você sabe que podemos editá-lo


imediatamente, se é isso que precisa ser feito, mas olhe para
ele, — disse ele. Nós dois fazemos, e meu rosto parecia virado
de cabeça para baixo com a imagem triste que era. — Ele está
sozinho, por opção, neste lugar que claramente não combina
com ele ou o faz se sentir confortável, e ele deveria fazê-lo
parecer em casa.

— Seattle era o lar dele, — eu corrigi. Meus olhos se


concentraram nos meus sapatos quando senti uma onda de
calor subir pelo meu pescoço. — Quero dizer, não é como se
isso fosse novidade para ele.

— Quão bem você o conheceu? — Marty fez a pergunta


com suavidade.

Eu olhei para ele. — Não muito bem. Eu o conhecia. Sabia


que ele jogava futebol. É quase impossível ser uma garota de
dezesseis anos e não estar ciente de alguém assim morando ao
lado. — Eu balancei minha cabeça. — Mas não me lembro dele
sendo assim.

— Isso é difícil para você?

— Difícil como?

Ele encolheu os ombros. — O cara está bem fechado.


Espero que possamos tirar boas cenas do campo, sabe? Vale a
pena manter a história dele no corte final.

Um flash de desconforto revirou meu estômago,


imaginando o rosto de Beatrice se isso acontecesse. Como isso
refletiria em mim se isso acontecesse. — Vai fazer o corte final.
Vi como ele treinou esta manhã. Vocês não vão cortar as
filmagens.
— Já aconteceu antes. — Marty estalou a língua. — Que
pena, já que Washington colocou todos os ovos na cesta dele.
Uma que ele não parece muito motivado para segurar, se você
me perguntar.

— Oh, você é um trapaceiro sujo, — eu murmurei


baixinho, o que o fez sorrir sem arrependimento. — Estou
motivada o suficiente por nós dois, confie em mim.

Ele me cutucou com o ombro e começou a tirar a câmera


do tripé. — Acho que sua chefe também está apostando nisso,
Ward.

Tantas pessoas me chamavam pelo meu sobrenome, um


risco de trabalhar na indústria que eu trabalhava, mas, por
alguma razão, isso reforçou o motivo de eu estar nessa posição
e o que estava nela.

Meu sobrenome pesava nos corredores de Washington e


ainda mais no campo. Quando entrava em uma reunião com
alguém novo, havia uma tendência corrente de respeito
estabelecido. Uma que eu seria tola em ignorar, não importava
o quanto Beatrice achava que eu não tivesse ganhado meu
lugar honestamente.

Eu tinha merecido isso honestamente. Mas também veio


com vantagens inegáveis. E uma dessas vantagens foi o
conhecimento e o respeito pelo jogo de futebol que
prolongaram minha vida inteira. Talvez eu não tivesse morado
com Logan até os quatorze anos, mas cresci assistindo ele
jogar. Algumas das minhas lembranças mais antigas incluem
estar nas arquibancadas e aplaudi-lo quando ele estava na
faculdade, e mais de uma década jogando profissionalmente.

Eu poderia derrubar qualquer homem sobre esse esporte,


não importa o quanto eles fossem fãs durões. Não importa se
eles eram jogadores também. As palavras de Marty ecoaram na
minha cabeça quando me aproximei do sofá. Era longo e preto,
próximo ao chão, com almofadas oblongas17 elegantes
flanqueando cada braço.

Noah fingiu que não estava ciente de que eu me


aproximava, mas eu vi o aperto de sua mandíbula e a maneira
como ele afastou o iPad do meu olhar. Inexplicavelmente, isso
me fez sorrir.

O que ele percebeu porque seus olhos voaram brevemente


da tela, para minha boca e depois para trás. O cenho dele se
intensificou.

Era incrível como, apenas alguns dias depois de vê-lo


novamente, essa carranca havia perdido parte de sua
capacidade de me intimidar. Dobrei minhas pernas debaixo de
mim no sofá e me inclinei perto o suficiente para que ele
suspirasse irritado. Não era filme de Washington.

Era um jogo que ele jogou em Miami contra um adversário


que enfrentaríamos na segunda semana e também na estrada.
O estádio deles era um lugar hostil para se jogar. Alto, aberto
e implacável para qualquer equipe que não o chamava de lar.

17 Alongado; cuja largura é menor


que o comprimento. Prolato; que possui forma arredondada ou em
esfera, sendo mais comprido do que largo
Eu balancei a cabeça quando ele recuou o cursor para assistir
algo pela segunda vez.

— O que? — Ele perdeu a cabeça.

Toquei o espaço sobre meus ouvidos, e ele obedeceu,


empurrando os fones de ouvido. — Essa foi a terceira semana
da última temporada, certo? Não na temporada anterior?

As sobrancelhas dele se curvaram. — Na última


temporada.

Eu assenti. — Eu poderia dizer.

Boom.

Noah não queria se interessar. Foi por isso que sua


mandíbula se apertou e ele fechou a boca depois que ela se
abriu para me fazer uma pergunta. Mas ele estava interessado.
Foi por isso que seus olhos dispararam entre mim e a tela.

— Como?

Eu me arrastei alguns centímetros mais perto,


arrancando os fones de ouvido de sua cabeça para que eu
pudesse desligá-los. O som apareceu instantaneamente e eu
apontei um dedo para a tela.

— Bem, na última temporada, a O-lin18 deles foi melhor,


então o QB19 deles conseguiu segurar a bola cerca de um
segundo e meio a mais do que na temporada anterior.

18 Offensive-line – linha ofensiva


19 Quarterback – posição do jogador
A boca de Noah se abriu antes que ele a fechasse. Por
dentro, eu bati meu punho no ar com tanta violência que seria
desagradável.

— Então aí está você, — eu disse, deixando minha voz


sumir.

Todo a sua estrutura parou novamente, e eu estava


começando a reconhecê-lo pelo que era: um aviso.

Você sabe como é o ar antes que um tornado desça? Em


todo lugar que você olha, há uma imobilidade perfeita e
ameaçadora. Até a cor do céu era diferente, quente e amarelo
rosado.

— O que sobre mim? — Ele perguntou, com a voz baixa,


sombria e deliciosa. Eu senti aquele resmungo na sola dos
meus pés, e isso fez meus dedos se enrolarem nos meus
sapatos.

Respire fundo, respire fundo. — Você mudou a maneira


como girava em torno do tackle20 para chegar ao QB. Antes,
você costumava se esquivar mais, diminuir sua massa
corporal, o que tornava mais difícil se mover tão rápido porque
seu impulso não estava ajudando. — Eu apontei para a tela.
— E veja bem, é assim que eu sei que foi na temporada
passada. Foi quando você começou a girar em torno deles,
como Freeney e Mathis costumavam fazer no início dos anos

20 Em várias formas de football acontece uma jogada chamada tackle. O principal objetivo do tackle é
tirar a bola do controle adversário, impedir o adversário de ganhar terreno até a linha de gol ou
simplesmente de parar a jogada em andamento.
dois mil para Indy. Você quebrou o recorde de uma única
temporada no ano passado por conta dessa mudança. Você
deveria ter ganhado como jogador defensivo do ano. Eu sempre
pensei que você foi roubado.

O dedo de Noah bateu na tela, pausando o vídeo. Ele


levou um segundo para respirar profundamente, e eu arrisquei
um olhar para o rosto dele. Ele estava me encarando com tanta
intensidade que lutei para não me afastar da força disso.

— Você... — Ele parou, depois balançou a cabeça como


se eu tivesse lhe dado um soco.

O que havia nele de tão divertido quando ele estava


desequilibrado? Sorrindo para ele, rindo dele, seria a última
coisa que ele queria de mim, especialmente devido ao seu
humor anterior. E ainda mais surpreendente era que, não foi
difícil combater o impulso. Eu não queria que Noah pensasse
que estava rindo do quão difícil era para ele se ajustar a essa
coisa que estávamos fazendo. Eu não seria aquela a ser filmada
o tempo todo.

— Como você sabe disso? — Ele finalmente conseguiu. —


Sobre Freeney e Mathis. Você não poderia ter mais que... —
Ele parou para fazer alguns cálculos mentais.

— Eu estava no ensino médio. — Eu sorri — Vamos lá,


Noah, meu irmão foi o escolhido do segundo turno no ano em
que comecei o jardim de infância. O que você acha que eu tenho
assistido todo domingo, durante toda a minha vida?
Atrás do sofá, Marty se moveu em silêncio, mas Noah não
se importou. Toda a atenção dele estava em mim, e algo sobre
esse foco inabalável levantou todos os pelos pequenos na parte
de trás do meu pescoço.

Talvez fosse porque eu o chocara, ou talvez porque ele


tivesse que aceitar o fato de ter me subestimado, mas Noah
Griffin estava olhando para mim como se estivesse pensando
em maneiras de me devorar inteira.

— Você vai me dizer como eu posso melhorar agora,


treinadora Ward? Com sua infinita riqueza de conhecimentos
de futebol. — O tom de sua voz não era desagradável, nem um
pouco, e estava me levando algum tempo para perceber que eu
tinha subestimado o quão inconstante era o seu humor.

Se eu pudesse antecipá-los, poderia parecer menos


perigoso de alguma forma, menos como se eu estivesse parada
no meio de uma tempestade com um poste de metal gigante na
mão.

Desta vez, por causa dessa mudança, deixei meus lábios


se curvarem em um sorriso. — Yoga.

— Yoga, — ele repetiu.

— Você é forte e rápido, mas quando perde o equilíbrio,


perde o saque.

Noah se recostou como se eu o tivesse empurrado com as


duas mãos. — Você está falando sério.
— Como um ataque cardíaco.

— Eu treino por horas todos os dias, Molly.

— Eu sei, confie em mim. — Eu deixei meus olhos


vagarem pelas curvas de seus ombros, pela veia que traçava
seus bíceps, os músculos se contraindo como se eu os
estivesse tocando com as pontas dos meus dedos. — Mas pesos
e treinamento de força e as coisas que você pratica não são a
mesma coisa que yoga, e eu apostaria cem dólares que se você
praticasse algo assim regularmente, isso o ajudaria.

Seus olhos brilharam e, pela primeira vez, vi um brilho


provocador nessas profundezas. Isso mudou todos os aspectos
de seu rosto, e era difícil não querer enrolar minha mão em
torno de sua pele e sentir a mudança por mim mesma. — Cem
dólares? Essa é uma aposta exagerada.

Eu exalei uma risada. — Nem todos nós temos contratos


de vários milhões de dólares, não é?

— Combinado.

Meus olhos dispararam. — O que?

— É um acordo. — As bordas dos lábios quase se


curvaram, e eu me peguei prendendo a respiração.

— Você vai fazer yoga comigo?

— Não, — ele disse com firmeza. — Mas eu posso


contratar alguém. Ou se você me enviar algo no YouTube. Vou
tentar em casa, onde Kareem não pode me ver.
Mordi o lábio porque o sorriso ameaçador era tão grande
e tão avassalador que senti meu coração apertar. — Ok.

— Ok. — Ele levantou o iPad. — Posso voltar ao trabalho


agora?
— PROVAVELMENTE É UMA ideia MUITO, muito estúpida.

— Eu não poderia dizer de um jeito ou de outro.

Não importava o que minha irmã dissesse, eu sabia que


era enquanto nós dirigíamos para a casa de Paige e Logan para
o jantar em família na terça à noite. Mas quando saí, não
conseguia parar de pensar em Noah sentado naquele maldito
sofá preto, com as pernas muito longas e o corpo muito
volumoso para ele se sentir confortável. Pensei em sua
geladeira, cheia de comida entediante, cheia de vitaminas e
minerais e zero carboidratos bons.

Bons carboidratos, como o pão, são bons carboidratos.

Pensei no fato de que seu telescópio estava sendo enviado


de Miami e em como ele nunca se sentava à mesa clara da sala
de jantar porque estava sempre comendo sozinho.

— Eu só vou fazer isso.

Isabel olhou para mim do banco do passageiro. — Molly,


se você continuar analisando demais, vou pular deste veículo
em movimento só para não precisar ouvir. Pelo amor de todas
as coisas sagradas, tome uma decisão.

Meu polegar apertou o botão Bluetooth no volante.

— Ligue para Noah Griffin, — eu disse.

Estúpida, estúpida, estúpida.

Iz suspirou e balançou a cabeça.

Mas não havia câmeras a serem encontradas, e talvez


fosse uma boa maneira de ele apenas... relaxar. O telefone
tocou e tocou, e com cada um que ficou sem resposta, me senti
ainda mais decidida que ele precisava de alguém para se
apresentar e assumir esse papel por ele.

Noah precisava de um amigo.

Ele precisava de alguém que pudesse ver além de


qualquer tipo de armadilha em ser o The Machine.

Após um sinal sonoro prolongado, a voz desencarnada do


telefone me disse para deixar uma mensagem após o sinal. Eu
debati em desligar, mas não encerrei a ligação quando ela
passou pelos alto-falantes.

— Noah, é Molly. Umm, eu sei que é de última hora, mas


se você... se estiver com fome, ou entediado, ou o que seja,
sempre jantamos em família na casa do meu irmão às terças-
feiras. Quero dizer, jantamos. Às vezes, membros que não são
da família também aparecem. Não é frequente, mas aparecem.
Lia sempre traz uma amiga. Sei que não é a sua família, mas
você é bem-vindo da mesma forma. — Fechei meus olhos com
força. — Você sabe onde fica se quiser se juntar a nós.

Quando a ligação terminou, soltei um suspiro de nojo.

— Não consigo imaginar por que ele não gostaria de vir,


— meditou Isabel.

— Dane-se. Dirija você da próxima vez.

— Vivemos juntas, Molly. É um mau uso de combustível


gratuito. — Ela colocou os tênis no painel antes de eu derrubá-
los. — Ei, eles estão limpos.

— O meu carro também. Eu gostaria de continuar assim.

— Você não acha que Logan teria problemas com um de


seus jogadores aparecendo sem aviso prévio?

Isso me fez suspirar. — Provavelmente.

— No entanto, aqui estamos nós. Pelo que você sabe,


Noah vai aparecer como um cachorrinho mal-humorado e
perdido na varanda da frente em vinte minutos.

Quando olhei pelo espelho retrovisor, peguei meu olhar,


febril e brilhante de emoção.

Estúpida, estúpida, estúpida.

— Não, não acho que ele iria, — admiti. — Ontem foi


melhor, no entanto. Mais ou menos. Um pequeno problema,
mas é compreensível que ele levasse tempo para se ajustar. Eu
sei que me sentiria desequilibrada em sua posição.
— E como você se sente na sua posição? — Ela perguntou
intencionalmente.

— Eu não sei, Isabel. Acho que este é um trabalho muito


estranho, e está me colocando em uma posição estranha,
porque não importa o que eu faça, Noah ainda pode acordar
amanhã e decidir desistir.

Ela apontou um dedo para mim. — Isso é altamente


improvável, e você sabe disso tão bem quanto eu. Esses caras
são muito competitivos. Eles não podem jogar Scrabble sem
atingir o nível de intensidade do Super Bowl.

Eu rio. — Lembra quando Logan virou o tabuleiro porque


pensou que estávamos trapaceando?

— Eu com certeza lembro.

— Ok, tudo bem, — eu concedi. — Ele não vai desistir.


Mas a Amazon pode decidir que ele não vale o filme que está
desperdiçando com ele. Não sei se Beatrice ficaria chateada
comigo com isso ou não. Não a conheço bem o suficiente.

Ela suspirou. — Não seria bom se pudéssemos ler a


mente de nossos chefes?

O jeito que ela disse me fez olhar para ela duas vezes. —
O que há de errado com Amy?

Mesmo que eu tivesse acabado de estacionar o carro na


entrada, nenhuma de nós fez um movimento para sair. Isabel
soltou o cinto de segurança e encolheu os ombros enquanto
pensava na antiga dona da academia que administrava. —
Nada que eu possa identificar, por si só. Mas ela parece...
dispersa. Como se ela não estivesse tão presente quando está
lá. De certa forma, tudo bem, porque ela definitivamente não
está me gerenciando, mas nossa associação está diminuindo
mais do que o habitual, e não sinto que posso colocar isso no
prato dela.

Eu cantarolei. — Bem, talvez seja apenas uma fase. Todo


mundo passa por elas.

— Verdade. E talvez Noah esteja em uma fase solitária


mal-humorada, que não é sua responsabilidade consertar. —
Seus olhos, tão azuis quanto os meus, olhavam sem piscar em
minha direção.

— Eu sei, — eu disse em um gemido. — Eu sei que não é


meu para consertar.

— Apenas se lembre disso quando essa coisa de babaca


alfa acabar sendo uma ferida emocional que você deseja
desesperadamente cuidar. — Ao meu olhar revirado, ela
estalou a língua. — Nem tente negar. As mulheres são
estúpidas por causa dessa besteira, quando, na realidade... —
ela deu um soco no ar — elas deveriam levar a bunda deles
para a terapia.

— Você não achou que a terapia era uma perda de tempo?

— Sim, mas não sou eu quem assume a responsabilidade


da felicidade de outra pessoa. — Ela colocou a mão no peito.
— Por acaso, acho que se Noah está entediado e sozinho em
seu sofá pequeno demais, ele deve pegar seus milhões de
dólares e comprar um cachorro e um sofá novo. Ele não precisa
que você beije seus machucados.

A lógica de uma irmã era tão descontrolada, praticamente


a qualquer momento. Eu estava prestes a dizer a ela o que ela
poderia fazer com sua opinião quando Lia bateu na janela do
lado do motorista.

Eu rolei para baixo.

Lia sorriu para nós. — O que estamos fazendo?

— Estamos prestes a entrar, — disse Isabel. — Porque


não temos mais nada a ver com o nosso tempo do que comer
em um jantar em família e nos concentrar em nossos próprios
problemas.

O rosto bonito de Lia franziu em confusão. — Um pouco


pesada no subtexto, não é? Sinto como se estivesse perdendo
alguma coisa.

Porque não era algo que eu queria entrar, acenei para


Claire e Finn, o melhor amigo de Lia, que estavam se afastando
enquanto Lia se inclinava ao lado do meu carro. Finn, alto e
magro, e o tipo de nerd bonitinho que sempre me fazia esperar
que ele e Lia se ligassem, acenou de volta.

— Caramba, quando vocês dois vão fazer isso? — Isabel


murmurou.
O rosto de Lia ficou vermelho. — Ele é meu amigo, — ela
sussurrou, apenas com um chiado.

Eu sorri — Ele ficou maior durante o verão, — pensei. —


Não ficou, Iz?

— Alguém está trabalhando em seus braços, com certeza.

O rosto de Lia ficou quieto, o que era irritante, porque se


você perdesse a capacidade de zoar sua irmãzinha, você estava
mesmo vivendo sua vida certo?

— Estou com fome, — gritou Claire da entrada da


garagem. — Podemos entrar, por favor?

— Oh, suas pernas pararam de funcionar quando você


saiu do carro? Ninguém está fazendo você esperar, — disse Lia
por cima do ombro. Finn colocou as mãos nos bolsos, mas eu
vi suas bochechas levantarem em um sorriso largo.

Isabel ignorou a troca entre as gêmeas. — Ele tem aquela


coisa de Clark Kent que eu não estou brava.

— Não pense que não vou fazer você sofrer se ele ouvir
você dizer isso.

Eu abaixei minha cabeça em minhas mãos.


Provavelmente era bom que Noah não viesse. A porta da frente
da casa se abriu e Emmett gritou alto.

— Ei, Finn! Guardei um lugar para mim! Podemos quase


derrotar as meninas em números agora!
Isabel desceu quando Lia, Claire e Finn fizeram o seu
caminho para a porta. Eu levei um segundo para vê-los entrar
em casa. O caos estava tão arraigado no fluxo e refluxo normal
da minha vida de várias maneiras. Era difícil para mim
entender de outra maneira.

Mesmo o apartamento que eu dividia com Iz, pequeno,


fofo e escondido em um prédio acessível no centro da cidade,
nunca ficava quieto. Sempre tínhamos música tocando, a TV
ligada ou um audiolivro enquanto eu cozinhava. Se
estivéssemos em uma casa, mais provavelmente teríamos um
cachorro ou dois com quem eu pudesse passear e me
aconchegar no sofá.

Talvez fosse por isso que pensar em Noah me deixasse


triste por ele, causando uma dor lenta e desenrolada no meu
peito que eu queria esfregar até que desaparecesse.

Eu não queria que ele estivesse sentado sozinho no


escuro, e não era porque eu queria curar feridas emocionais.

Mentirosa, uma voz na parte de trás da minha cabeça


sussurrou.

Eu não queria aquele homem sentado sozinho no escuro


porque gostava dele, e não havia nenhuma razão terrena pela
qual eu deveria gostar. Ele era grosseiro e mal-humorado. Seu
humor mudava mais rápido que o clima e, por alguma razão,
ele se recusava a reconhecer que havia outro lado nele que não
o The Machine.
Estúpida, estúpida, estúpida.

Essa era minha maldição, aparentemente. Algo que me


fazia boa no meu trabalho quando meus sentimentos não
estavam em jogo, mas terrivelmente inconveniente quando
estavam. Sem me esforçar tanto, tinha um sexto sentido que
soava como um sino quando se tratava das pessoas com quem
eu estava formando um relacionamento.

Noah precisava de calor e risos. Ele precisava de um lugar


onde ele não precisava ser perfeito o tempo todo. Onde ele
poderia ser Noah.

Meu telefone, ainda conectado ao Bluetooth, tocou alto


no alto-falante do meu carro, e respirei fundo quando vi o nome
de Beatrice piscar na tela.

— Molly aqui, — eu disse.

— Molly, é Beatrice. — Não era divertido quando todos


começamos nossas ligações como se não tivéssemos o
identificador de chamadas? — Desculpe, eu estou ligando na
hora do jantar. Você tem um minuto?

— Claro vá em frente. — Paige abriu a porta e levantou as


mãos interrogativamente. Eu levantei meu dedo e puxei minha
mão para meu ouvido para sinalizar uma ligação. Ela assentiu
e voltou para casa.

— Acabei de falar com o Rick. Ele está voltando de Tampa.


Meus dedos se apertaram no meu colo. — Sim, ele me
disse que planeja estar lá para filmar amanhã. Temos tudo
preparado para um treino apenas de defesa e algumas coisas
na sala de musculação.

Ela cantarolou. — Sim, ele me disse isso também.

Algo na voz dela tocou desconfortavelmente. — Aconteceu


alguma coisa, Beatrice?

— Ele está emocionado, você sabe, com o que está


acontecendo com Noah.

— Isso é... bom. Certo?

Ela continuou falando como se eu não tivesse dito nada.


— Marty enviou a ele imagens do apartamento de Noah na
noite passada, falando sobre sua capacidade de atraí-lo.
Fazendo com que ele abaixasse a guarda.

Esfreguei meus lábios e lutei contra o impulso irracional


de fugir do carro. — Estávamos conversando sobre futebol. Eu
não fiz nada de especial.

— Molly, eu gostaria que você tivesse sido honesta comigo


sobre conhecê-lo.

Meu corpo inteiro ficou gelado em um instante. —


Beatrice, eu...

— Tanto Rick quanto Marty ficaram emocionados por


você ter tido uma história anterior com Noah. — Ela fez uma
pausa significativa. — Não é algo que eu goste de ouvir deles
em oposição a minha própria funcionária.

— Sinto muito, Beatrice, — eu disse apressadamente. —


Eu deveria ter lhe contado. Eu não sabia que Noah estava
vindo para Washington quando você me ofereceu a promoção.

Porque ela não podia me ver, eu me inclinei para frente e


abaixei minha cabeça em minhas mãos novamente.

— Isso vai ser um problema? — ela perguntou. — Sua


história com Griffin.

— Não, — respondi instantaneamente.

A pergunta era chocante para quase todas as partes do


meu cérebro, como um pano que estava arrancando do centro
da costura principal. O que quer que estivesse sentindo em
relação a Noah, sabia sem dúvida que não seria correspondido.
Ele tinha um relacionamento em sua vida, e isso era o futebol,
e eu faria bem em lembrar disso.

O que importava era fazer o meu trabalho.

O que importava era manter meus olhos treinados nisso,


não importa quais instintos ele estivesse puxando de dentro de
mim.

— Eu sei que estou sendo dura com você, Molly. — Seu


tom de voz suavizou, o que fez meus ombros relaxarem um
pouco e a náusea do meu estômago se acalmar um pouco. —
Sou dura com os funcionários que acho que têm potencial.
Isso me fez sentar. — Obrigada, Beatrice. Eu meio que
pensei que você tivesse me dado a promoção como... não sei...
um teste que você esperasse que eu falhasse.

— Eu não sou tão horrível quanto você pensa, — disse ela


ironicamente. — E se isso fosse verdade, não é um uso muito
bom do meu orçamento, é?

— Provavelmente não.

Isso seria um problema? Não importa a rapidez com que


eu disse a ela que não seria um, eu ainda tinha que ser honesta
comigo mesma. Era Noah. E se eu fechasse os olhos, eu o via
como ele me olhava na noite anterior. Aquele olhar que me
chamou a atenção. Mas esse olhar poderia ter significado
milhares de coisas diferentes. Talvez ele estivesse chateado por
eu ter notado algo que ele tinha feito mal antes de consertar.
Talvez ele estivesse impressionado por eu saber do que diabos
estava falando.

— Você não precisa se preocupar com nada, — disse


Beatrice com firmeza.

— Não?

Isabel estava certa. Os problemas de Noah não eram de


minha responsabilidade. Eu poderia fazer o meu trabalho e
ainda manter um nível profissional de distância. Porque se eu
não pudesse, então que direito eu tinha de sentir frustração
pelas reservas de Beatrice?

— Não, — eu repeti. — Eu ouço você alto e claro.


— Bom. — Ela suspirou. — Agora, tenho mais uma
ligação a fazer, e se bem me lembro, você tem um jantar em
família para chegar.

Minhas sobrancelhas levantaram em surpresa que ela se


lembrava. — Eu faço.

— Aproveite. Obrigada, Molly.

— Obrigada, — eu disse a ela. Eu também quis dizer isso.


A ligação dela foi um lembrete oportuno de que eu precisava.
Noah não era meu para consertar, não importa como ele
olhasse para mim, e eu faria bem em lembrar disso.
NORMALMENTE, não me considerava um pensador lento.
Exatamente o oposto, de fato. Um jogador defensivo deve ter a
capacidade de ver possíveis cenários antes que aconteçam,
como um movimento do dedo, a mudança de posição do corpo
ou o pivô de um pé. Mas quando se tratava de Molly Ward, eu
estava um pouco lento na aceitação.

Levei dois dias para evitá-la ativamente enquanto


filmamos para fazer a conexão de que eu não era, de fato, o
ignorante. Eu fui o ignorado. E porque era eu, tive que quebrar
mentalmente, em detalhes, como diabos isso aconteceu e como
eu perdi.

Três dias depois que ela me ensinou sua história do


futebol, a equipe estava no treino e, nos dois dias anteriores,
mantive meus olhos longe dela o tempo todo. Sim, cataloguei
o que ela estava vestindo quinze segundos depois de andar na
minha visão periférica, mas foi só isso. Eu não dei a ela um
segundo de contato visual total quando ela inclinou a cabeça
na direção de Marty, e eles discutiram as filmagens para o dia
seguinte, e Marty disse algo que a fez rir. Aquela risada sinuosa
do carrilhão de vento que me fez querer fazer algo ridículo,
como enfiar os dedos nos ouvidos para não precisar ouvir. Foi
a última parte do terceiro dia em que as rodas começaram a
cair, e tudo foi culpa de Kareem.

Eles decidiram me embaçar, já que eu tinha mais de uma


semana para me acostumar com o ritmo da prática e baixar
minha guarda um pouco. Foi quando ele começou a enviar os
novatos para mim – um por um – cada um me pedindo uma
selfie, um autógrafo e uma pergunta ridícula: que eles teriam
conhecimento no seu primeiro ano na faculdade.

Sobre chuteiras.

Em seguida, removedor de manchas favorito para as


manchas de grama.

Como evitar o pé de atleta.

Eu também demorei nessa absorção, minha irritação


aumentando exponencialmente com cada um que se
aproximou de mim durante as quatro horas de prática. No
quarto estreante, e sua pergunta sobre qual jock strap21 de
atleta eu preferia manter minhas bolas no lugar, as rédeas do
meu temperamento se romperam.

— Jones, — eu rugi, procurando-o entre os rostos


sorridentes. — Kareem Jones, venha aqui.

21 O Jockstrap originalmente foi criado como suporte genital para proteger os testículos e o pênis de
atletas durante a prática de esportes.
A câmera estava apontada para mim, mas eu não podia
me importar menos.

Quando Kareem veio até mim, com um sorriso largo no


rosto, tive um momento em que me perguntei se Molly entraria
e tentaria me acalmar.

— Quanto você pagou a eles? — Eu perguntei.

— Oh, assistir o olhar em seu rosto não tem preço, Griffin,


— disse ele.

Cruzei os braços sobre o peito. — Então eles não tiram


nada disso?

Ele enxugou sob os olhos. — Não, eu disse a eles que, se


fizessem isso, não os colaríamos no gol de campo após o treino.

— Estou velho demais para essa merda, — eu disse,


apontando um dedo para ele. — Se você quer que eles
obtenham sua liberdade, use outra pessoa. Estou aqui para
trabalhar, não administrar uma creche para novatos.

Ele me conhecia muito bem para ser perturbado pelo meu


temperamento, mas alguns dos caras que não eram e, novatos
e veteranos, se mexeram desconfortavelmente, suas risadas
morrendo até gargantas que de repente precisavam ser limpas.

Kareem assobiou, girando sobre os calcanhares como se


eu o tivesse empurrado. — Ouviram isso, novatos? Acho que
ele disse as palavras mágicas, não disse?

— Que palavras mágicas? — Eu agarrei. — Kareem.


— Não se afaste agora, — disse ele, olhando com cuidado
para os rostos de todos ao nosso redor.

Nosso zagueiro, um rapaz do terceiro ano com um braço


de foguete, sorriu para mim e olhou por cima do ombro. —
Você ouviu Jones. Pegue ele.

Antes que eu pudesse piscar, todos os novatos da lista de


Washington me prendiam, não importa o quanto eu me
debatia, ameaçava ou gritava. Os treinadores riram. Até Logan
tinha um sorriso largo no rosto, e se eu não tivesse sido traído
por toda a minha linha defensiva, que sentava-se rugindo de
tanto rir, eu poderia ter achado engraçado também.

— Você está legal e suado, Griffin? — Kareem perguntou


enquanto se aproximava.

— Seu imbecil. — Tentei afastar meu braço de onde três


estreantes o seguravam. Eu estava preso no gramado, de
joelhos, com as mãos atrás das costas, e finalmente desisti.

— Fecharia os olhos se fosse você. — Esse foi o único


aviso que recebi antes que eles despejassem glitter preto e
vermelho na frente da minha camisa, depois tirassem meu
short da cintura e o jogassem lá também. A equipe de limpeza
os odiaria, e eu estaria planejando uma retribuição pelo resto
da minha vida, mas pelo riso indutor de lágrimas de todas as
pessoas presentes, deve ter valido a pena.

Por trás da câmera, Marty enxugou o rosto e, enquanto


eu me levantava, sacudindo o máximo de brilho que pude do
meu corpo, foi a primeira vez que notei que Molly estava me
evitando.

Se ela assistiu o que tinha acontecido comigo, ela não


estava assistindo as consequências. Ela não estava se
aproximando de mim com aquele sorriso grande e brilhante em
seus lábios rosados, tentando entender como eu me sentia
sobre o que eles haviam feito. Ela não estava me olhando
curiosamente através da minha raiva. Ela não estava me
olhando em tudo.

Quando me limpei da bagunça e vesti roupas limpas após


o treino, passou pela minha cabeça que tinha esquecido de
retornar a ligação dela no dia anterior. Ela me convidou para
jantar na casa de Logan, uma mensagem que eu não recebi até
horas depois, porque muitas vezes não checava meu celular
enquanto ele carregava. No momento em que a vi, no momento
em que a ouvi, já passava das onze e não sabia o que dizer.

Obrigado, mas seu irmão envenenaria mais cedo o meu


jantar assim que eu aparecesse com você.

Eu não sei como fazer jantares em família, então eu me


sentaria lá como uma aberração.

A família deles era grande e barulhenta e provavelmente


só ficou maior e mais alta nos anos desde que eu morei atrás
deles. Não é a minha cena, mesmo que eu quisesse ir.

Molly não fez nenhuma tentativa de esconder que estava


intrigada com a maneira como eu agia com as pessoas ao meu
redor. Que “The Machine” era um apelido que ela não
considerava apropriado, mesmo que todos pensassem que era.
Eu tive brilho na bunda para provar o quão apropriado o resto
da minha equipe pensava que era.

Mas Molly também não estava errada.

Se eu fosse bem e verdadeiramente uma máquina, sem


pulso, batimentos cardíacos ou emoções complexas, não teria
me incomodado que ela não estivesse falando comigo.

Foi por isso que enviei uma mensagem para ela no final
do terceiro dia.

Eu: Peço desculpas por não retornar sua ligação. Já era


tarde quando recebi a mensagem. Obrigado por me convidar, no
entanto.

Mais ou menos uma hora depois, recebi minha resposta.

Molly Ward: Não tem problema, está tudo bem.

Uma resposta como aquela que uma pessoa como ela


estava dando, e ainda não me ocorreu que algo estava errado.

O quarto dia não foi melhor, e esse dia estava livre de


brincadeiras, livre de temperamentos, livre de qualquer coisa
que pudesse tê-la perturbado. Até o fato de eu ainda estar
pensando no que poderia ter feito para inspirar esse tipo de
reação nela, deveria ter sido um sinal de alerta.

Levantei pesos, tive uma reunião com a equipe técnica e


assisti a algum filme. Entre essas coisas, conversei com Rick,
dando a eles algo que eles poderiam usar mais tarde para o
trabalho de narração. E Molly ficou placidamente atrás da
câmera, com o rosto apontado para o telefone ou para a parte
traseira da tela da câmera.

Na verdade, ela estava fazendo um trabalho tão bom em


não me olhar que agora eu era uma especialista no topo da
cabeça de Molly.

Rick pigarreou e eu olhei para ele. Havia um brilho de


conhecimento em seus olhos que me fez querer dar um soco
nele.

— O brilho faz você se sentir parte do time?

— Sim, é realmente mágico.

Ele sorriu. — Você não estava muito feliz, apesar de tudo?

A ponta do lápis de Molly diminuiu a velocidade enquanto


ela escrevia, e algo quente brilhou dentro de mim. Ela ainda
estava ciente; ela simplesmente não queria que eu percebesse.

— Você gostaria de ser pressionado por sete jogadores de


futebol e fazer com que jogassem glitter por todo o seu corpo
encharcado de suor?

— Não.

Esfreguei minha mandíbula. — Não, eu não estava feliz.


— Fiz uma pausa e comecei a pensar no que Molly teria me
perguntado se ela não estivesse fazendo um bom trabalho em
me ignorar. Ela queria que eu abrisse a tampa sobre por que
me sentia assim, por que minha raiva naquele momento era
tão quente e tão alta, em vez de ser capaz de rir disso como
muitos de meus colegas de equipe. — Provavelmente é uma
coisa de controle, — admiti lentamente. — Por que fiquei tão
bravo.

O lápis dela parou de se mover sobre a superfície do


papel. Todo o seu corpo congelou, a ponto de eu nem ter
certeza de que ela estava respirando.

— Tudo sobre a troca de equipes lembra o quão pouco


está sob seu controle nesta liga. — Apoiei minhas mãos nos
quadris. Tentando descobrir as palavras certas para o que isso
me lembrasse de quando eu era pequeno e costumava cavar a
terra ao redor de um arbusto em nosso quintal. Eu encontrava
algo que parecia pequeno, que eu conseguia puxar com
facilidade, mas inevitavelmente, fazia parte de uma raiz maior
e mais teimosa. Eu puxava e puxava, e só um pouquinho cedia
antes que eu precisasse parar. — Não posso controlar meus
colegas de equipe, não importa onde eu esteja. Meus
treinadores. Meus oponentes. Nada disso.

— O que você pode controlar?

Por um segundo, olhei para o topo da cabeça de Molly,


seus cabelos brilhantes, e desejei que ela olhasse para mim.
Mas não olhou, e o lápis na mão tremeu por um segundo antes
de começar a escrever novamente.

— Eu posso controlar o quanto estou preparado, — eu


disse. Meus olhos voltaram para Rick. — Eu posso controlar
como estou em forma. O que como. Como durmo. O que
permito como distração.

— Parece uma lista muito boa, — comentou.

Eu rio sem humor. Normalmente, eu evitaria insistir


nisso, porque até isso parecia desperdício de energia. Energia
que eu poderia aproveitar em outro lugar.

Era uma característica que herdei do meu pai. Se não


servia ao meu objetivo, era um desperdício de energia. Manter
a porta fechada para coisas que eu não podia controlar era a
melhor maneira de me proteger.

Lentamente, dia após dia, desde que eu cheguei aqui,


esse grupo desagradável de pessoas girava a maçaneta, mas
era eu quem tinha que fazer o resto do trabalho. Conversas
como essa eram porque eu estava abrindo aquela porta.

— Se eu tivesse um emprego normal, essa lista iria além.


Nesta liga, fazer o que fazemos, — eu digo, — — é uma fração
de todo o cenário. Há um milhão de coisas que estão fora das
minhas mãos.

— Como seus colegas de equipe derramando glitter em


seus shorts.

— Como isso, — eu concordei secamente. — Mesmo que


seja uma piada, é difícil lembrar o fato de que, no final do dia,
a única coisa que posso controlar sou eu.
— Uma máquina que funciona perfeitamente, — disse ele
em voz baixa.

Eu assenti. — Sim.

— Faz sentido.

— É por isso que quase nunca paro de trabalhar nessas


coisas, — eu disse a ele. — Por que sair é menos importante
para mim do que assistir filmes. Por que comer direito é mais
importante para mim do que beber. — Respirei fundo e soltei
o ar lentamente. — Aperfeiçoar meu ofício é a melhor maneira
de gastar meu tempo.

— Você é bom nisso, então você está fazendo algo certo.

A única maneira de explicar por que mudei de assunto,


com uma câmera voltada para o meu rosto, foi a parte da
minha personalidade que se recusava a desistir de um desafio.
Eu permiti que um lado da minha boca se encaixasse em um
sorriso rápido. — Alguém inteligente me disse recentemente
que eu poderia fazer melhor.

O lápis dela congelou novamente.

Rick olhou para ela, depois de volta para mim.

— Então, eu vou tentar yoga, — anunciei.

O lápis caiu de suas mãos e sua cabeça se levantou.


Pela primeira vez em quatro dias, os olhos de Molly
estavam nos meus. Como era possível que eu já tivesse
esquecido a cor deles?

Sua boca ficou aberta, e eu vi Marty sorrir atrás da


câmera.

— Yoga? — Rick repetiu.

— Sim. Eu gosto de um desafio. — Eu segurei seu olhar


atônito até que ela piscou. — Você acha que poderia me ajudar
a encontrar um instrutor? Você disse que viria comigo, certo?

Molly fechou a boca, só então percebendo que Rick, Marty


e eu estávamos olhando para ela.

Então a coisa mais estranha aconteceu. Eu esperava um


sorriso, uma risada, talvez até uma piada sobre um cara como
eu realmente tentando yoga. Mas enquanto ela estudava meu
rosto, eu a vi puxar as persianas hipotéticas.

Sua expressão estava em branco, e o brilho de seus olhos


azuis escureceu.

— Posso enviar um link de um vídeo do YouTube para


iniciantes. Você ficará bem por conta própria.

Ela assentiu para Marty e murmurou algo sobre uma


reunião, depois Molly fugiu como se os cães do inferno
estivessem beliscando seus calcanhares.

Meus olhos se estreitaram em sua figura em retirada, e


para alguém como eu, ela acabara de jogar o tipo mais
irresistível de desafio. Algo mudou em sua mente quando se
tratava de mim e de qualquer amizade tênue que começamos
a formar, uma que não se intimidava com as mudanças de
humor e a natureza espinhosa.

— Uh-oh, — Rick disse baixinho. — Problemas no


paraíso?

Eu olhei para ele, o que fez Marty rir.

— Apenas... tentando descobrir o que eu fiz para irritá-la.

— Boa sorte, — disse Marty com uma risada.

Eu não precisava de sorte. Ela estava prestes a descobrir


o quão teimoso Noah Griffin era quando ele queria alguma
coisa, e naquele momento eu queria descobrir o que havia de
errado com ela.
FOI PRECISO muito para eu ficar nervoso para fazer uma
ligação. Mas lá estava eu, andando pela extensão do
apartamento enquanto o telefone tocava ameaçadoramente no
meu ouvido. Eu deveria ter feito a ligação assim que Rick
concordou em fazer isso na primeira reunião de produção. Mas
eu esperei até agora.

— Olá? — A voz latiu.

— Oi, vovó.

Silêncio.

— Acho que finalmente enlouqueci.

Um sorriso relutante apareceu nos meus lábios. — Você


não enlouqueceu, eu prometo.

— Eu devo ter. Porque eu costumava ter um neto que me


amava e me ligava regularmente, mas esse neto apenas envia
mensagens agora, como se isso fosse bom o suficiente.

Ao som de sua voz, meu ritmo diminuiu e os nervos se


acalmaram. — Sinto muito. Eu não estou... — Cocei a parte de
trás da minha cabeça. — Eu não sou o melhor em fazer
telefonemas.

— Não brinca, Sherlock.

Uma risada explodiu em mim, e os músculos que


costumava usar emitiram um som tão atrofiado pelo desuso
que quase doeu.

— Como você está, nanico?

— Bem. Ocupado.

— Eh, estar ocupado é usado como um distintivo de


honra nos dias de hoje, — ela resmungou. — Não me
impressiona muito. Quero saber como está o meu neto nessa
coisa que chamamos de vida.

Antes que eu percebesse, eu me jogara no sofá pequeno


demais para absorver o som da voz dela. Minha avó Pearl, mãe
do meu pai, era uma das minhas pessoas favoritas na terra, e
o fato de eu ter passado meses sem conversar com ela me fez
sentir como um saco gigante de merda. Sim, eu estava
ocupado. E daí?

— Estou jogando em Washington novamente, — disse a


ela.

Ela cantarolou. — Eu ouvi isso no SportsCenter na


semana passada, eu acho.

Eu sorri de novo. — Você assiste isso?


— De que outra forma vou descobrir o que está
acontecendo? Meu filho tem as habilidades de conversação de
um ioiô, e você não é muito melhor, nanico.

O apelido que ela tinha me dado aos três anos tinha


ficado por tanto tempo, que mesmo que eu lembrasse
gentilmente que eu era um pé e meio mais alto que ela, ela
ainda o usaria.

— Bem, espero poder compensar minha falta de


telefonemas.

— Sim? Como? Você vai me comprar outra casa?

Foi a primeira coisa que fiz quando recebi meu bônus de


assinatura de Miami. Voei para Dakota do Sul e paguei em
dinheiro pelo lugar em que minha avó esteve de olho por
alguns anos, mas nunca seria capaz de pagar sozinha. Ela
odiava que eu tivesse feito isso. E ela amava a casa. Ela chorou
o tempo todo em que passamos depois que ela pegou as
chaves. Qualquer coisa que eu sacrifiquei por esse jogo valeu
a pena naquele momento. Tudo, porra.

— Se importa se eu for visitar o meu investimento? — Eu


perguntei a ela.

Ela estava quieta, mas ouvi a inspiração rápida e afiada


de surpresa. Quando ela falou, sua voz tremeu apenas o
suficiente para eu saber que ela estava lutando contra as
lágrimas. — Depois da temporada? Ou antes disso?
— Este fim de semana, na verdade. Eu tenho alguns dias
de folga antes da pré-temporada.

Ficou silencioso. Então ela fungou. E fungou novamente.

Eu balancei minha cabeça. — Vamos, vovó, não chore.


Acho que você não quer que eu vá.

— Eu não estou chorando, seu idiota, — disse ela com


uma voz aquosa. — Só peguei um sapo na minha garganta22.

— Isso é um sim?

— Acho que posso ter o quarto de hóspedes pronto, —


respondeu ela.

— Bom. — Eu soltei um suspiro. — Eu vou ter algumas


pessoas comigo, se estiver tudo bem.

— Uma mulher? Oh, Senhor, por favor, diga que é uma


mulher. Ou um homem. Eu não me importo com quem, desde
que termine comigo tendo um bisneto antes de morrer, o que
provavelmente será em breve.

O rosto de Molly passou pela minha cabeça, chegou e saiu


na mesma respiração, e me ocorreu que apresentá-la à minha
avó era um grande negócio. Um grande negócio. Porque a única
conclusão que eu consegui chegar à luz da percepção de que
ela estava me ignorando era que me incomodava que ela
estivesse me ignorando. E isso me incomodava porque, na

22A frase “sapo na garganta” simplesmente significa que a pessoa está tendo problemas para falar
devido a um problema com a garganta, como rouquidão, fleuma, tosse ou dor.
minha cabeça, Molly e eu começamos a formar uma amizade
provisória. Além de Kareem e sua bomba de glitter, eu não
tinha amigos em Seattle. Não queria o silêncio dela nem a
distância profissional. Rapidamente foi além de querer saber
por que ela estava fazendo isso, de querer consertar.

Expliquei o documentário da Amazon para a vovó, que


imediatamente se preocupou com o fato de que sua casa seria
filmada e, simplesmente porque era mais fácil, encaminhei o
papel de Molly no fim de semana.

— Seremos quatro. Eu, o produtor, Rick, o cara da


câmera, Marty, e alguém que trabalha comigo aqui em
Washington. Ela meio que supervisiona tudo.

— Ela é sua chefe?

O sorriso estava lá novamente, imaginando a pequena


Molly mandando em mim por aí. Para o resto do mundo, ela
provavelmente não era tão pequena, mas era para mim. — Não
é minha chefe. Apenas uma colega de trabalho, eu acho.

Vovó cantarolou. — Tudo bem. Vou colocá-lo na sala do


porão, já que não preciso impressionar você. O cara da câmera
e o produtor, você disse? Sim, Marty pode entrar na sala de
beliche em frente à minha, e qual é o nome dela?

— Molly.

— Molly pode dormir no quarto principal.


Isso me fez esfregar minha testa. A cama king naquele
quarto era a que eu sempre dormia. Ela ficaria pequena no
meio da cama sozinha. Sob os lençóis e embaixo do edredom
xadrez que eu adorava, porque era macio e leve, mas me
mantinha aquecido mesmo na noite mais fria do inverno de
Dakota do Sul. — Certo.

Até para meus próprios ouvidos, minha voz soou áspera.

Uma notificação de texto tocou no meu ouvido e eu puxei


o telefone. Inexplicavelmente, meu coração acelerou quando vi
que era de Molly.

Molly Ward: Isso foi enviado por email para mim. Apenas
para sua informação.

Eu cliquei no link e me vi rolando pelas fotos muito


rápido, porque eu amava o que estava vendo. Meu polegar
pairou sobre o mapa, e eu ampliei o zoom. Era no lado leste do
lago Washington, o mesmo lugar em que a dona dos Wolves,
Allie Sutton-Pierson, morava com o marido, QB aposentado
Luke Pierson.

— Vovó, eu tenho algo que acabou de chegar no meu


telefone que eu preciso olhar. Vou enviar um e-mail com meu
itinerário, ok?

— Claro, claro. Você voará em um daqueles elegantes


aviões particulares?

Eu sorri. — Provavelmente. Você sabe que eu preciso de


espaço extra para as pernas.
Ela murmurou. — Tudo o que você diz, nanico.

— Estou animado para vê-la também, vovó.

— Oh, quieto. Você sabe que eu te amo mais.

Revirei os olhos. Eu era o único neto dela — Também te


amo.

Depois que eu desliguei o telefone, Marty se desviou do


canto e eu reprimi uma maldição, enviando-lhe um olhar.

Seu sorriso se alargou atrás da câmera, mas ele não disse


nada.

— Eu realmente esqueci que você estava aqui, seu


esquisito. — Isso o fez rir. — Vou ter problemas se falar com
você?

— Não. Podemos editar em torno de qualquer coisa, você


sabe disso.

Sentei no sofá e peguei meu telefone novamente. A casa


que Molly me enviou era... perfeita. Absolutamente perfeita.

Um pouco mais de dinheiro do que eu queria gastar, mas


marcava todas as outras caixas. Tetos altos, tons quentes,
uma cozinha enorme e vistas amplas sobre o lago e as
montanhas, verdes em todas as alturas nas árvores que o
cercavam. Árvores significava privacidade, e eu também gostei
disso. Estava afastada da estrada, mas a casa em si não era
uma gigante. Quatro quartos e três banheiros com um porão
totalmente acabado e um ginásio em casa já instalado. Uma
piscina para as voltas da manhã antes do treino.

Era um espaço em que eu poderia viver, não apenas


existir.

Eu: Marty já está aqui. Deseja vir conosco se eu puder


contatar a corretora?

O fato de prender a respiração quando ela começou a


digitar era semelhante a um chiado aéreo no meu ouvido.

Perigo! Perigo! Abortar!

Molly Ward: Não posso hoje à noite. As gêmeas estão


aqui. Só queria passar a casa, parecia como você.

Ela começou a digitar e parou. Então mais uma vez.


Nenhum outro texto apareceu e, antes que eu percebesse o que
estava fazendo, minha mandíbula estalou por triturar meus
molares.

— Molly vai nos encontrar? — Marty perguntou


levemente. Muito levemente.

Eu olhei para ele, depois peguei o número da corretora.


Algo sobre tudo isso, nos últimos dias, me deixava nervoso e
inquieto. Havia muitas circunstâncias fora de meu controle, e
minha pele zumbia em um zumbido implacável.

Seria conveniente culpar isso, por como as próximas duas


horas da minha vida se desenrolaram.
A corretora encheu o silêncio enquanto eu caminhava
pelos quatro mil metros quadrados da casa. Cada trecho de
piso de madeira, cada reflexo das luzes no granito que revestia
a imensa ilha da cozinha, todos os cantos dos quartos amplos
e cheios de luz caíam na minha atenção, mesmo que eu não
falasse muito sobre isso.

Ele deve ter tido um sexto sentido pela maneira como


estudei cada centímetro do lugar.

Parecia comigo.

E se sentia como eu também. E Molly sabia disso.

Se a caixa de entrada dela era parecida com a minha, eu


recebi uma dúzia de casas por e-mail, a maioria das quais
ganhou apenas um olhar superficial porque eu estava muito
cansado na maioria das noites para tentar ir ver.

O espaço era grande o suficiente para alguém do meu


tamanho, os móveis da casa grandes e confortáveis, com
pesadas molduras de madeira e espaço para se espalhar.
Alastrando vistas de azuis e verdes e água cintilante. Nos meus
ossos, eu sabia que era para ser minha casa.

Foi um daqueles momentos em que nunca questionei a


rapidez com que tomei uma decisão. Era uma característica
que me servia bem em campo, agindo por instinto, porque eu
sabia que minha intuição não me levaria a nada mal.

Este lugar era meu.


Se Marty estava irritado com a minha falta de
comentários, ele não me levou a dizer algo que serviria à
maldita narrativa. Ele simplesmente me seguiu enquanto nós
dois ignorávamos a conversa sem sentido da mulher que
estava prestes a fazer uma comissão enorme por minha causa.

— Está no mercado há pouco mais de um mês, — disse


ela, arrastando as unhas com pontas vermelhas ao longo da
guarnição personalizada nas janelas, com vista para o quintal
luxuriante. — Eu sei que não devo dizer coisas assim, mas
tenho certeza de que meus clientes estariam... — seus olhos se
arrastaram deliberadamente sobre meu peito e braços —
flexíveis.

Eu segurei seu olhar e vi exatamente o que ela estaria


disposta a me dar.

Nada nela me tentou. Nem as pernas longas ou os quadris


curvilíneos, a cintura cortada e o busto generoso, ou o cabelo
escuro e encaracolado escorrendo pelas costas. A maioria dos
caras da equipe não acreditava em mim, mas é perfeitamente
possível desligar o interruptor quando se trata do desejo de
dormir com uma estranha.

Ela era bonita. Incrivelmente bonita.

E a última coisa que eu queria era ver o olhar dela e do


quanto ela me deixava fazer qualquer coisa com ela. Era todo
clichê que eu odiava em ser atleta profissional. Porque eu fiz o
que fiz, eu era desejável. Como eu usava uma camisa
reconhecível e tinha um rosto familiar, ela me deixaria virá-la
de costas com apenas um aceno de concordância da minha
parte.

Nada disso me atraiu e, portanto, nenhuma parte do meu


corpo reagiu.

Em vez disso, tudo que eu desejava era que ela fosse outra
pessoa. Alguém mais baixo, com cabelos mais claros, olhos
mais brilhantes e um sorriso maior. Alguém que achava meu
temperamento levemente divertido e me ensinava sobre
futebol. Alguém que olhava para mim e queria cavar sob a
superfície, e não adorava a fachada.

— Eu poderia ter alguma privacidade para tomar minha


decisão? — Eu perguntei a ela.

Ela olhou para a câmera e de volta para mim em dúvida,


como se não pudesse dizer se eu queria que ela ou Marty
saíssem da sala.

— Eu gostaria de ficar sozinho, — eu disse com mais


firmeza. Seus olhos se fecharam em um instante e ela me deu
um aceno de deferência.

— Claro, — ela ronronou.

Marty ficou ao meu lado, uma presença estranhamente


reconfortante enquanto eu apoiava meus braços na borda e
olhava para frente.

— Você encontrou uma casa, Griffin?


Toda aquela inquietação do início desenrolou-se
lentamente, afundando em algo confortável. — Eu acho que
sim, Marty.

Ele gesticulou para o chão, logo atrás do sofá. Eu não vi


o que era a princípio até que me agachei e puxei pela borda.
Um sorriso levantou meus lábios quando os vi empilhados um
sobre o outro.

Chamei a agente de volta à sala.

— Eu quero.

Os olhos dela brilharam com um tipo diferente de


excitação. — Excelente. Eu ficaria feliz em apresentar uma
oferta aos meus clientes.

— Oferecerei o preço pedido, mas quero um prazo de duas


semanas para poder me mudar antes do início da temporada.
— E eu levantei minha mão, deixando-a saber que eu não tinha
terminado. — Eu também quero filmar um segmento aqui hoje
à noite se eles tiverem a gentileza de não voltar para casa
ainda.

Ela levantou as sobrancelhas. — Eles estão fora da


cidade, então tudo bem.

— E eu quero isso emprestado. — Eu levantei a outra


mão.

Se eu pensava que suas sobrancelhas estavam altas


antes, elas se ergueram ainda mais.
— Você... — Ela balançou a cabeça. — É isso que você
quer?

— Nós temos um acordo?

— Eu-eu ligo para eles agora, — disse ela cautelosamente.


Aos olhos dela, devo ter perdido um pouco do meu apelo e
substituído por uma saudável dose de insanidade.

Marty riu. — Você está falando sério, cara?

Eu olhei para as minhas mãos. — Como um ataque


cardíaco. Ela não vai dizer não a isso.
— VOCÊ acha que Paige pensaria que é estranho se eu
escrevesse um artigo sobre o impacto materno que ela teve em
crianças mais velhas que não têm vínculo biológico com ela?

Minha mão congelou, a garrafa de vinho suspensa no


meio despejou sobre o meu copo. — Umm, não?

Claire digitou furiosamente em seu laptop antes de fechá-


lo. — Não consigo descobrir o que fazer com este trabalho e
preciso começar.

Isabel desceu o corredor do nosso apartamento e olhou


para o computador de Claire como se a tivesse chutado na
virilha. — Você precisa digitar tão alto? Parece uma galinha
batendo com um martelo nessa coisa.

Claire deu-lhe a volta.

Do meu lugar no sofá, sorri para as duas enquanto


tomava outro gole do meu vinho. Estava mais seco do que eu
normalmente gostava, então fiz uma careta enquanto engolia.
Lia e Claire estavam amontoadas do outro lado.
Seus rostos eram imagens espelhadas um do outro, mas
nossa família conseguia diferenciá-los sem problemas. Estava
no ângulo da mandíbula de Lia e na inclinação do nariz de
Claire. Sem mencionar que, no momento em que abrissem a
boca, seria uma oferta inoperante para quem realmente as
conhecesse.

Nossa mãe – ou como Isabel se referia afetuosamente a


ela, aquela cadela egoísta que nos deu à luz – pode não ter
recebido nenhum prêmio de parentalidade, mas ela passou por
um pool genético infernal porque todas nós quatro tínhamos
uma semelhança impressionante com ela. Eu podia vê-la
facilmente no cabelo escuro e grosso, maçãs do rosto altas e
formato de nossos olhos azuis.

O sorriso de Isabel era mais parecido com o do nosso pai,


mais com o de Logan, e ela tinha a mesma constituição esbelta
e atlética que Emmett prometeu ter enquanto crescia. Minhas
curvas haviam diminuído até a idade adulta, mas as gêmeas
ainda mantinham uma figura curvilínea enquanto
caminhavam tranquilamente aos vinte anos.

— Por que você não escreve seu trabalho sobre Paige? —


Lia perguntou, entregando a Claire uma taça de vinho pela
metade. Claire pegou sem dizer uma palavra e terminou por
ela. — Ela basicamente foi nossa mãe.

Na cozinha ao virar da esquina, Isabel bateu a porta do


armário. — Não existe basicamente sobre isso, — ela chamou.

Eu sorri para Claire. — Para que classe é isso?


Ela estava se formando na faculdade, com especialização
em psicologia do desenvolvimento e especialização em
sociologia, com planos de iniciar seu mestrado na primavera,
depois de se formar no inverno. Abaixando a cabeça no sofá,
ela suspirou. — Sociologia das famílias. Eu deveria ter pegado
antes, mas— – ela encolheu os ombros – — eu estava meio que
temendo essa parte dela.

Lia pegou o copo de vinho vazio de Claire e colocou sobre


a mesa. — Nossa família não é tão disfuncional assim.

— Não, mas tentar discutir a estrutura é um pouco


confuso. — Ela começou a marcar os dedos. — Tivemos pais
heterossexuais com uma diferença de idade não convencional.
Um deles morreu, seguido de alguns anos depois por um
voluntariamente nos abandonar a um parente heterossexual
não casado. Alguns anos depois, ele se casou com uma única
mulher heterossexual para fins legais. Nenhum deles nos
adotou e Paige nunca teve direitos de tutela instalados;
portanto, tecnicamente, ela é apenas uma cunhada legal que
ajudou quando não precisava. — Claire balançou a cabeça
quando Iz bateu outra coisa na cozinha. — Para todos os
efeitos, ela foi a principal figura materna em nossa vida, mas
nossa mãe ainda está por perto. Só não... por perto.

— Ela não está na porra de Bali ou algo assim? — Isabel


murmurou da cozinha. — Foi o que o último e-mail dela disse,
o que? Um ano atrás?
— Índia, eu acho, — eu corrigi. — Ela mora naquele
centro. O estranho guru que escreveu todos esses livros sobre
atenção plena e blá, blá, ou o que for.

O vinho me fez sentir agradavelmente confusa, não


bêbada, nem mesmo zumbindo, mas feliz o suficiente para eu
nem me importar que estávamos falando de Brooke – aquela
cadela egoísta que nos deu à luz. Até ela era uma distração
agradável pelo fato de Noah ter me convidado para ir olhar a
casa. Dizer não foi duro. Muito, muito duro. Como o bíceps de
Noah duro. O traseiro duro de Noah.23

Não que eu soubesse como era a bunda dele, mas eu


podia imaginar. Eu o assisti levantar pesos a semana toda.
Fazendo agachamentos. Dobrando-se no campo quando ele se
alinhava contra o ataque. Eu tinha tocado algumas coisas no
corpo de Noah naquele dia, mas a bunda dele não era uma
delas.

Que tragédia, pensei através da minha névoa de vinho.

Isabel invadiu a sala da família, uma garrafa de tequila


na mão que me fez piscar corajosamente para ela. Estávamos
no nível da tequila? Eu perdi isso. — Paige merece ter um
trabalho escrito sobre ela.

— Ela merece, — disse Claire diplomaticamente.

23 Trocadilho com a palavra hard, que significa duro.


A garrafa de tequila balançava como uma bandeira. — Ela
entrou em cena quando ninguém conseguiu lidar com vocês
duas diabinhas.

Lia revirou os olhos. — Como se você fosse um passeio no


parque, Srta. Angry Girl24.

— Esse é o ponto dessa aula, — Claire interrompeu


quando Iz abriu a boca com o que prometia ser uma resposta
contundente. — A estrutura da família, como a conhecemos,
mudou dramaticamente. Até a frase estrutura da família em si
tem peso diferente do que há vinte anos. O aumento das
famílias monoparentais25, dos pais homossexuais, mesmo
dizendo coisas como não tradicionais implica um viés de que
precisamos tomar cuidado. Nossa história familiar não
encontrou nenhum tipo de definição de — tradicional, —
mesmo quando nossos pais eram casados. Papai era muito
mais velho que ela, mas eles ainda se encaixavam na definição
de uma estrutura familiar tradicional como é definido
historicamente. Isso implica que há algo errado ou não-
tradicional em Paige e Logan nos criando quando eles
cumpriram os papéis dos pais com muito mais sucesso.

Todas nós a encaramos por um instante.

Eu derramei mais vinho.

24 Nervosinha
25 Quando apenas um dos pais se responsabiliza pela criança.
Iz desaparafusou o topo da tequila e desapareceu na
cozinha.

Lia falou primeiro, embora provavelmente fosse capaz de


encarar Claire e comunicar o que estava pensando. — Então,
por que você está questionando sobre o que fazer com o seu
trabalho?

Claire lambeu os lábios e seu olhar correu para a cozinha.


— Porque eu estou pensando se é muito fácil escrever sobre
Paige. Eu poderia argumentar que mamãe e sua ausência em
nossa vida tiveram um impacto maior sobre nós. Sobre como
a estrutura de nossa família mudou, e como isso desenrolou
nosso crescimento emocional e maturidade.

Isabel invadiu de volta. Seus cabelos, soltos e caindo por


cima dos ombros, voaram para trás como uma bandeira e seus
olhos brilhavam em seu rosto rosado. — De jeito nenhum, essa
cadela não recebe o trabalho. Ela não merece trabalhos
escritos sobre ela.

— Isabel, — eu adverti calmamente. — Não é sua decisão.

— Então por que ela está nos pedindo nossa opinião?

Nós quatro ficamos em silêncio. Claire, tão selvagem


quanto ela era quando criança, amadureceu mais rapidamente
do que Lia quando chegaram ao ensino médio. Ela era uma
observadora da vida, das pessoas ao seu redor, como Isabel,
enquanto Lia ainda mantinha aquela energia ilimitada que
havia sido uma marca registrada de sua juventude. Ela era
como um fio elétrico, sempre pulando, sempre batendo no pé,
sempre buscando uma saída para a força ligada atrás de sua
pele. No entanto, apesar disso, ela estava observando
silenciosamente nossa irmã do meio, os olhos brilhando com
lágrimas não derramadas pela rapidez com que ela se
enfureceu com o tópico de Brooke.

— Estou perguntando sua opinião, porque amo e respeito


você, — disse Claire.

Isabel relaxou, seus ombros perdendo um pouco do


aperto deles.

Lia olhou para Claire e sorriu tristemente. — Mas a


opinião é diferente da permissão, não é? Você não precisa da
nossa permissão para fazer isso.

Deixamos as duas. O pensamento fluía de Claire para Lia


sem pular uma batida. Claire assentiu. — Isto é.

Meus olhos se fecharam porque todos sabíamos o que


aquilo significava.

— O que você acha, Mol? — Claire perguntou.

Palavras encheram minha garganta porque, por mais que


eu soubesse que momentos como esse exigiam que eu atuasse
como a primogênita, eu não sentia que era eu. Mas eu era.

Eu sempre me contentava em deixar Logan afirmar seu


papel como primogênito, o irmão mais velho e a figura paterna
de que tanto precisávamos quando éramos mais jovens.
Portanto, mesmo sendo a mais velha das minhas quatro irmãs,
meus pés nunca encheram esses sapatos. Não na verdade.

Eu não queria dizer a Claire o que fazer, porque e se eu a


enganasse? E se concordar que fazer o trabalho sobre o
impacto de Brooke em nossa estrutura familiar fosse
equivalente a detonar uma bomba nuclear em nosso pequeno
círculo fechado? Essa era a última coisa que eu queria. Nossa
família arrasava. Eu amava a nossa família. As noites de terça
eram o destaque de todas as semanas para mim.

A ideia de que o fantasma de Brooke, embora ela ainda


estivesse muito viva, poderia perfurar isso, me encheu de
pavor. Mas não era o meu lugar colocar o manto de minha
opinião na educação da minha irmã mais nova.

Porque era só isso. Minha opinião.

— Acho que tomei vinho demais para essa conversa, —


admiti fracamente.

— Fuja mesmo, — disse Isabel.

Eu olhei para ela. Claire suspirou.

— Você perguntaria a Logan? — Lia perguntou.

— Por que ele recebe uma opinião? — Isabel revidou. —


Brooke é o nosso fardo, não o dele.

Claire se endireitou no sofá. — Você sabe, sua raiva sobre


esse assunto em particular fica realmente irritante depois de
um tempo.
Eu levantei minhas mãos. — Parem com isso, vocês duas.

— Logan é o chefe desta família, — disse Lia. — É por isso


que ele recebe uma opinião.

Esfreguei minhas têmporas, onde o início de uma dor de


cabeça estava começando a florescer. E pensar que, eu poderia
estar vagando por uma casa grande e bonita e ajudando Noah
a gastar todo o seu dinheiro nela. Mas não, eu escolhi minhas
irmãs porque a família vinha primeiro.

Ao meu redor, o barulho aumentou entre as três. Lia e


Claire juntaram forças, como sempre faziam, e Isabel se
encolheu na porta da sala da família, sem se intimidar nem um
pouco pelas chances de duas contra uma, como sempre.

Ninguém nem percebeu que eu estava lá, de olhos


fechados e desejando estar em outro lugar. Eu não queria falar
sobre Brooke. Eu não queria ouvir minhas irmãs discutirem
sobre qual mulher teve maior impacto em nossa vida e por que
o trabalho de Claire mudava a definição desse papel.

— Vocês todas, — eu interrompi. — Vocês podem parar,


por favor?

Ninguém ouviu. Lia se levantou do sofá. — Você sabe, eu


estou tão cansada de você agir como se você carregasse algum
ferimento diferente do que nós. Brooke deixou todas nós, Iz. Só
porque você não trabalhou com sua própria merda não
significa que sua opinião conta mais.
Claire esfregou a testa. — Vamos deixar para lá. Eu tenho
algumas semanas para tomar a decisão.

Elas a ignoraram também. As duas cabeças-quentes


foram para lá, e eu dei um sorriso de lamentação para Claire.

— Eu não acho que minha opinião conta mais, — Iz


gritou. — Estou chateada que essa mulher esteja de alguma
forma recebendo crédito pela forma como acabamos. Não teve
nada a ver com ela.

— Ohhhh sim, — Lia falou demoradamente. — Olhe para


você. Você é a imagem de alguém que não é afetada por sua
infância.

— Ei, — eu bati para ela. — Cuidado.

Seu rosto ficou vermelho, mas ela não desviou o olhar de


Isabel.

Meu telefone tocou e eu suspirei pesadamente antes de


virar a tela para me encarar.

Noah: Minha conta poupança sofreu um grande golpe


graças a você.

O tom do seu texto, e o fato dele ter me enviado uma


mensagem, puxou um sorriso no meu rosto. Eu sentia falta
dele, o que não fazia sentido. Eu poderia falar com ele, ser
amigável com ele, e não seria confraternização, certo? Na
minha névoa de drama sobre vinho e família, mudei minha
lista mental de por que decidi me afastar a semana toda.
Talvez porque quando eu estava perto dele, meu corpo
inteiro puxava em sua direção como se ele estivesse puxando
uma corda. A única maneira que eu sentia que podia combater
era cortar o cordão.

Mas isso também não funcionou.

Durante toda a semana fui forçada a observá-lo, pensar


nele e me perguntar o que ele estava fazendo quando não
estávamos filmando. Durante toda a semana, lutei com a
sensação de que ele notou a minha distância e que isso o
incomodava.

Meus dedos voaram pela tela antes que eu pudesse me


convencer contra isso.

Eu: Você pegou a casa?! Eu sabia que era perfeita para


você.

Noah: Era. Estou feliz que você a enviou para mim.

Noah: Mas há um problema...

Eu: Qual?

Noah: Os tapetes de yoga que vieram com ela são


pequenos demais para mim. Ou isso, ou sou menos flexível do
que percebi e preciso de grandes quantidades de ajuda.

Ele anexou uma foto que me fez rir alto. Marty deve ter
quebrado, o que me fez sorrir tanto que ameaçou abrir minha
pele. Noah estava tentando um cão descendente26, mas seus
pés estavam bem depois do fim do tapete rosa brilhante. Sua
forma era terrível, e eu não podia ver seu rosto, mas era, sem
dúvida, minha nova foto favorita de todos os tempos.

Eu: Oh garoto. Sim, você está com problemas.

Noah: Você vem me ajudar? Acho que Marty sente sua


falta.

Meu rosto ficou quente, feliz e rosado, e meu peito se


expandiu com uma inspiração profunda.

Eu: Ele sente?

Noah: Ele disse que eu era chato para filmar quando estou
sozinho. Pense em como será embaraçoso quando eu fizer
minha primeira sessão de yoga em minha nova casa e, como
não tenho orientação, caio e quebro o quadril, o que me colocará
no banco pelo resto da temporada.

Seu próximo texto incluía o endereço e eu cliquei no


mapa. Se eu solicitasse um Uber agora, poderia estar lá em
vinte minutos. O desejo de ir era tão forte, especialmente
quando eu considerei o estado caótico da minha sala de estar.

Duas irmãs zangadas discutindo sobre Brooke, ou um


jogador de futebol que fazia minha barriga virar de cabeça para
baixo quando ele olhava para mim?

26 Postura do cachorro olhando para baixo. Posição de Yoga.


Ao tocar no meu aplicativo Uber, solicitei a carona antes
que eu pudesse me convencer disso. Essa era a Molly
impulsiva que eu não deixava escapar muitas vezes, mas nessa
situação, eu não ia pensar duas vezes. Por que ele ainda estava
na casa, eu não tinha ideia, mas também não estava pensando
nisso. Tudo que eu sabia era que ignorá-lo era estúpido,
porque ainda tínhamos que passar muito tempo juntos.
Ignorá-lo era inútil na verdade.

Quando um motorista aceitou a viagem, me levantei e


enviei uma mensagem rápida para Noah, dizendo que eu
estaria lá. Em vez de esperar para ver o que ele disse, enfiei o
telefone no bolso lateral da minha calça.

— Eu preciso ir trabalhar, — proclamei para quem


quisesse ouvir.

E assim, a discussão delas parou. Como mágica.

— Agora? — Isabel perguntou. — Você andou bebendo.

— Eu tenho um Uber chegando.

— Por que você precisa trabalhar tão tarde? — Claire


perguntou.

— Eu só preciso.

O rosto de Isabel se suavizou em entendimento.

— Parem de brigar, ok? — Eu disse gentilmente. — Deixe


Claire fazer o trabalho dela sobre o que ela quiser. Não depende
de vocês duas, e não é justo dificultar as coisas para ela mais
do que o necessário.

Claire levantou do sofá para me envolver em um abraço


apertado. Eu beijei sua bochecha quando ela sussurrou seu
agradecimento no meu ouvido.

Isabel passou a mão pelo rosto cansado. — Desculpe,


Claire.

Eu limpei minha garganta.

— E desculpe, Lia, — ela murmurou.

— Eu também sinto muito, — acrescentou Lia.

Belisquei minhas bochechas e olhei para a minha blusa


Wolves e tênis branco. Meu cabelo estava puxado para trás e
preso no lugar com alguns grampos de cabelo. Dei de ombros.

— Tenha cuidado, — Iz me fala.

— Eu só estou indo para algumas filmagens que eles


estão fazendo do seu novo lugar. — Quando ela levantou uma
sobrancelha em descrença, apoiei minhas mãos nos meus
quadris. — Eu vou.

Enquanto eu descia os degraus do lado de fora do nosso


apartamento até o Uber que me esperava, pensei no aviso dela
e tive um momento de pausa.

— Pronta? — Meu motorista perguntou.


Eu soltei um suspiro. Sem pensar duas vezes. — Sim.
Vamos.
UMA ONDA BRILHANTE de nervos estalou e borbulhou como
champanhe quando me aproximei da casa. As fotos não faziam
justiça. Enquanto eu subia a varanda coberta com vigas de
madeira maciça sustentando a linha do telhado pontiagudo,
tive a nítida impressão de que essa casa havia sido construída
para alguém tão forte e intimidador quanto Noah. Alguém alto
e forte, que preencheria o espaço e não ficaria ofuscado por ele.

Olhando para as enormes portas da frente de madeira,


ladeadas por janelas de vidro cortadas personalizadas e luzes
da varanda artisticamente obscurecidas, eu não pude deixar
de me sentir um pouco tonta. Eu levantei meu queixo e bati,
no entanto, porque o ponto principal disso – meu trabalho, a
promoção, aparecendo para provar que eu não poderia ser
afetada por Noah – era provar que essas coisas não podiam e
não iam me sobrecarregar.

Do outro lado da porta, ouvi sua voz profunda me dizer


para entrar, então testei a maçaneta com cuidado. Ela abriu e
eu não pude deixar de ofegar quando entrei na casa.
— Puta merda, — eu respirei. Era impressionante.
Embora o céu lá fora estivesse escuro, o teto alto e as paredes
brancas e nítidas faziam parecer brilhante, arejado e
acolhedor. Os tapetes cobriam o chão ao redor dos móveis
solidamente construídos, e as janelas voltadas para o lago
Washington brilhavam com as luzes das casas e prédios
próximos sobre a água.

— Obrigado por vir.

Eu pulei, passando a mão no peito quando o vi virando


uma esquina. Um sorriso fraco enfeitou seus lábios, e meus
dedos coçaram para empurrá-lo ainda mais, ver como o
movimento transformaria seu rosto já bonito.

— É... — Eu balancei minha cabeça, os olhos ainda


tentando entender o espaço. — É incrível, Noah.

Ele se aproximou lentamente, as mãos pendendo


frouxamente ao lado do corpo. Suas pernas estavam cobertas
por calças pretas com o logotipo vermelho brilhante dos Wolves
perto de um bolso, e estirada sobre o peito havia uma camiseta
branca tão gasta que era praticamente indecente.

Por baixo, pude ver as sombras e as linhas da parte


superior do corpo, e um buraco na gola me deu um vislumbre
extra da pele bronzeada e macia. Meu corpo inteiro balançou
em direção a ele. Esse mesmo puxão que eu sempre senti.

Acho que fiquei um pouco mais empolgada depois de uma


garrafa de vinho.
A testa dele enrugou. — Você andou bebendo?

— Um pouco, — eu me ouvi admitir.

Por que o rosto dele estava fazendo aquilo? A coisa


agitada e ameaçadora de trovoada que o fazia parecer que
relâmpagos estavam prestes a estalar na superfície de sua
pele. A imagem mental me fez sorrir, e seu rosto se apertou
ainda mais.

— Você esteve bebendo e depois dirigiu até aqui? Você é


louca? — Ele disse, a voz baixa e perigosamente profunda
enquanto dava outro passo em frente.

— O que? — Eu pisquei para longe de sua boca. — Não.

— Você poderia ter se matado, Molly. — Seu volume


aumentou, o rosto da nuvem ficou cada vez mais sombrio, e eu
observei com um fascínio abjeto quando ele se aproximou
ainda mais. — O que você estava pensando?

Tudo o que eu teria que fazer era estender a mão, nem


mesmo esticando totalmente os braços, e minhas mãos
pousariam em algum lugar nas proximidades de seu peitoral.
Debaixo daquela camisa branca, eles eram do tamanho de
pratos.

— Você precisa se acalmar, — eu disse. Eu estava falando


com ele? Eu acho que sim Mas talvez eu estivesse falando
comigo mesma. Eu também precisava me acalmar. Meus
dedos, no paraíso da minha mente, rastrearam toda a
topografia do peito dele, memorizando-o para uso futuro.
— Me acalmar? — Ele rugiu.

Minha mão estendeu a mão e quase pousou em seu peito.


Ele pegou meu pulso antes de fazer contato.

Seus dedos eram tão, tão quentes.

— Eu peguei um Uber, seu psicopata, — murmurei. —


Sua mão é muito maior que a minha. Isso não é engraçado?

Noah suspirou, fechando os olhos quando ele soltou


minha mão. Uuuu. — Por que você não disse isso?

— Você estava meio ocupado gritando comigo. — Eu me


virei e cantarolei em apreciação quando vi a cozinha. — E você
estava com a sua nuvem de tempestade, o que dificulta
interrompê-lo.

— Minha o quê?

Caminhando ao longo da ilha, deixei minha palma


deslizar logo acima da superfície do granito. — Quando você
fica bravo, você parece uma nuvem de tempestade.

Noah estava quieto, e senti seus olhos nas minhas costas


quando abri alguns armários.

— Onde está a corretora?

Seus passos começaram a seguir os meus enquanto eu


passeava pela sala de jantar para a sala principal, olhando
através das janelas de vidro de frente para a água, embora eu
não pudesse ver outra coisa senão a lua brilhando do outro
lado da baía.

— Nós a convencemos a nos dar algumas horas para


filmar.

Eu sorri por cima do ombro. — E ela disse que sim?

— Ela estava muito disposta a acomodar, dada a minha


oferta.

Meu sorriso pareceu frágil. — Ahh.

— Ahh o que?

Dei de ombros. — Nada.

Ele deixou passar, e eu fiquei muito agradecida por isso.

— Como foi sair com suas irmãs?

O riso que escapou dos meus lábios foi duro e cansado e


todo tipo de emoções emaranhadas. Incrível o quanto você
poderia embrulhar em um sopro de ar. A discussão sobre o
trabalho de Claire foi mais fácil de ignorar quando eu estava
tentando escapar, quando suas vozes se sobrepunham e eu só
queria que parassem, parassem, parassem.

Mas estava quieto na casa de Noah, e ele não estava


procurando preencher o silêncio com palavras sem sentido.
Atrás de mim, ele era uma presença sólida e constante, e era
exatamente o que eu precisava.
Havia vinho suficiente no meu sistema, afrouxando meu
cérebro e permitindo que palavras honestas rolassem da
minha língua.

— Nós brigamos, — eu disse a ele. — Ou elas fizeram, eu


acho.

— Sobre?

— Estrutura familiar, — respondi com um sorriso triste.


As sobrancelhas dele se curvaram, mas ele não disse nada. O
braço do sofá estava perto o suficiente para que eu pudesse me
sentar e ainda olhar pela janela para a escuridão noturna. —
A nossa não é tradicional, apesar de minha irmã, que faz
especialização em sociologia, me dizer que esse não é um termo
que você deve usar de ânimo leve. E a estrutura que tínhamos
antes dessa era tradicional, mas incrivelmente disfuncional.

Noah se mexeu para que ele pudesse ver meu rosto, seu
grande ombro apoiado na parede do outro lado da janela.

— Claire – a da escola – precisa escrever um artigo sobre


influências maternas em estruturas familiares não
tradicionais, — expliquei.

— A esposa do Logan? — Ele adivinhou.

— Foi aí que começamos a discussão, mas... — Minha voz


parou. Quanto disso ele realmente queria ouvir? — Onde está
o Marty? — Eu perguntei, de repente, muito consciente de que
estávamos sozinhos na grande sala da família.
Ele inclinou a cabeça. — No telefone lá embaixo. Acho que
é Rick, mas não tenho certeza.

Eu assenti.

— O trabalho, — ele solicitou.

— Você está pedindo para evitar sua aula de yoga?

— Absolutamente. — Seu rosto era todo áspero, linhas e


ângulos na sala mal iluminada, e eu rio de sua resposta. Outro
sorriso apareceu, mas desapareceu tão rapidamente.

Eu me afastei do braço do sofá e entrei em uma das


almofadas finais, minhas mãos entrelaçadas levemente no
meu colo. Não parecia o tipo de conversa que você tinha
enquanto estava sentada em um pseudo-assento. — Paige é a
resposta óbvia, — eu disse calmamente. — Ela e Logan se
casaram quando eu tinha dezesseis anos, as gêmeas tinham
doze, Iz tinha quatorze e, desde então, ela é nossa mãe em
todos os aspectos que importam.

Com cada palavra e cada momento de silêncio precioso


que ele me dava para processar, eu sentia o efeito do vinho
escorrer lentamente do meu corpo.

— Lembro quando ela apareceu, — disse ele.

— Eu aposto, — eu disse ironicamente. — Você sabe que


é realmente culpa dela que eu entrei pela sua janela.

Os olhos dele se afiaram. — É?


Eu me perguntei por quanto tempo ficaríamos na ponta
dos pés, e agora parecia um tempo tão bom quanto qualquer
outro.

— É claro que ela não sabia o quanto eu literalmente


aceitaria o conselho dela, mas naquela época eu tinha um
desejo tão desesperado por uma pessoa como ela em minha
vida. Ouvi-la dizer para eu pegar o touro pelos chifres e ir atrás
do que eu queria – alguém que eu considerava inteligente,
forte, atrevida, bem-sucedida e bonita e justa... tudo o que eu
queria ser quando tinha dezesseis anos. As palavras dela eram
tão boas quanto o evangelho, sabia?

Ele respirou lentamente e soltou o ar antes de caminhar


em minha direção e sentar-se à mesa de café na frente do sofá.
De alguma forma, ele não duvidou que pudesse suportar seu
peso, mas segurou, e ele abriu as pernas para que suas mãos
pendessem entre elas.

— Eu sempre me perguntei o que a levou lá. — Seus olhos


nunca vacilaram dos meus.

Eu sorrio — Além de uma paixão furiosa pelo garoto da


casa ao lado?

Ele exalou uma risada. — Essa parte foi clara o suficiente,


— ele forçou a sair. Eu tive que fechar meus olhos ao som de
sua voz, áspera, crua e baixa.

Se eu voltasse para longe, até agora, para minhas


memórias, ainda conseguiam lembrar como era beijá-lo. Eu
beijei dezenas de garotos, até dormi com alguns que pensei que
seriam algo para mim, mas a memória dos lábios de Noah
Griffin ainda me assombrava mais.

Língua lisa. Mãos fortes. Maldições murmuradas


enquanto eu subia em seu colo.

Meus olhos se abriram porque esses pensamentos não me


levariam a nenhum lugar de valor.

— O que levou. — Suspirei. — Isso teria que ter influência


materna em uma estrutura familiar não tradicional.

Sua risada veio instantaneamente, alta e surpreendente,


uma forte explosão de som que me fez sentar ereta. Lá estava.
Seu sorriso indescritível. Dentes e lábios brancos perfeitos se
estendiam por todo o rosto. As linhas entre sua boca faziam
parecer que ele sorria frequentemente, em vez da realidade,
que era rara e rápida e fazia você se sentir feliz por ver uma.

— Então foi por isso que você foi embora? Falando sobre
o papel de Paige?

— Não, — eu disse imediatamente. — Não, foi a discussão


de como nossa própria mãe influenciou nossa estrutura
familiar ao partir.

O sorriso dele desapareceu. — Quantos anos você tinha


quando ela foi embora?

— Tinha acabado de fazer quatorze anos. Éramos tão


jovens, sabe? E tendo três irmãs mais novas para cuidar, além
de um irmão mais velho que estava começando a andar à sua
maneira, era quase como se... Não conseguia pensar no quanto
me machucou ela ter partido porque eu tinha tantas outras
coisas com que me preocupar. Eu tinha minhas irmãs com que
me preocupar, e elas eram muito mais importantes que
Brooke.

As sobrancelhas dele se abriram brevemente. — Eu


nunca... realmente nunca pensei sobre por que vocês moravam
com Logan. Onde seus pais estavam.

— A maioria das pessoas não sabia. Ele fez um bom


trabalho nos protegendo. E porque ele fez, nós podíamos ser
apenas crianças. Adolescentes que se metiam em problemas,
faziam brincadeiras e tinham permissão para cometer erros
normais porque o tínhamos.

— Parece que você protegeu suas irmãs também, — disse


ele. O olhar que ele estava me dando, perspicaz e intenso, me
lembrou a noite no sofá quando ele estava assistindo filme.
Como se eu fosse algo que valesse a pena estudar, como me
separar o ajudasse a entender.

Esse conhecimento era como se alguém pressionasse o pé


no acelerador, mas eu fiquei em ponto morto até poder explicar
algo para ele da maneira certa.

— Acho que o que costumava fazer na época, e ainda faço


agora, — eu disse, inclinando-me para frente, meus joelhos
quase tocando os dele, — é tentar assumir a responsabilidade
pelo que elas sentem. E esse não era o meu trabalho. Eu não
quero impor minha vontade, sabe? Não era como se quisessem
que elas sentissem o que eu sentia. Queria garantir que tudo
ficasse bem, mesmo que fosse em meu prejuízo.

— Mesmo que te machucasse, — ele disse lentamente.

— Talvez. Eu não sei. Eu não era a adolescente que fazia


birras por atenção, mas se eu demorasse demais tentando
manter a paz entre minhas irmãs, eu simplesmente...
estouraria. Faria algo estúpido.

Seus olhos foram para a minha boca. — Eu não consigo


imaginar o que você quer dizer.

— Mentiroso.

Seu sorriso brilhou novamente, e fez minha pele apertar


deliciosamente.

— Eu ainda faço, e isso é uma grande parte do que me


tornou boa no meu trabalho, sim, mas... parte disso não é
inteligente para mim, — admiti, colocando um pedaço de
cabelo atrás da orelha. — Eu estava fazendo isso com você.

Isso o fez se endireitar. — O que você quer dizer?

Era tão difícil para mim dizer coisas assim e arriscar o


que ele poderia pensar de mim, então me levantei
nervosamente do sofá e voltei para a janela. A mesa de café
rangeu quando ele se levantou e me seguiu.
— Eu me vi preocupada com a forma como esse processo,
esse movimento e essa mudança estavam afetando você.
Afetando seu jogo, seu humor, seu estado de espírito.

Noah respirou profundamente atrás de mim, e senti sua


expiração bagunçar os cabelos na parte de trás do meu
pescoço. Em minha mente, imaginei a corda nos conectando,
enrolada nos quadris quando me virei lentamente para encará-
lo.

— Foi por isso que você se afastou esta semana? — Ele


perguntou.

Meus olhos ficaram focados na linha de sua garganta e


mandíbula, afiados como a ponta de uma faca. Ele engoliu em
seco com a minha atenção inabalável. — Sim. Porque eu
precisar me preocupar com isso está me afetando também.

— C-como isso estava afetando você?

Ele se aproximou? Ou fui eu?

Eu não respondi, provavelmente porque minha boca ficou


seca por causa da proximidade dele. Meus olhos se fecharam,
minha cabeça girou vertiginosamente. Nenhum álcool no
mundo poderia ter me afetado tanto como o corpo de Noah
Griffin próximo ao meu.

— Porque eu posso lhe contar o que isso fez comigo, —


continuou ele.
Abrindo meus olhos, eu tive que inclinar meu queixo para
cima para ver seu rosto. — O que? — Eu sussurrei.

— Você se tornou a ofensa mais ilegível que eu já


enfrentei, e sabia que algo assim me deixaria louco. Tudo o que
eu conseguia pensar era no que havia feito de errado ou em
como eu a aborreci por fazer você me desligar dessa maneira.

O protesto estava nos meus lábios instantaneamente. —


Você não fez nada de errado.

— Tão rápida para me defender, — disse ele, sua boca se


curvando em um sorriso. — E eu não fiz nada para merecer
isso de você.

Minhas mãos levantaram, como um mestre de marionetes


invisível as ergueu no ar, e eu as forcei a recuar. Tocá-lo não
ajudaria. Nada disso estava ajudando ele ou eu, mas nenhum
de nós parecia motivado a se mover.

— Por que você me convidou aqui? — Eu perguntei.

Talvez Noah também tivesse uma corda enrolada em sua


pele porque sua mão se levantou e ele a observou como se não
tivesse controle sobre onde estava indo, sua respiração
trêmula atingindo minha testa em uma explosão acentuada.

— Porque você... — Ele parou e engoliu, e com muito,


muito cuidado, ele deslizou a mão ao longo da linha da minha
garganta até que ele estava segurando a parte de trás do meu
pescoço. Meu corpo inteiro vibrou perigosamente ao seu toque,
como os dentes de um diapasão27 atingido com muita força. —
Você foi a primeira pessoa com quem pensei em compartilhar
isso.

Ele abaixou a cabeça e eu respirei fundo rapidamente.


Nós dois congelamos quando meus seios roçaram a frente de
seu peito. Os olhos de Noah procuraram os meus, e eu levantei
minhas mãos, colocando-as levemente em seu peito. Em um
piscar de olhos, pensei em empurrá-lo para longe, mas meus
dedos se curvaram no tecido macio.

Com um puxão e uma inclinação, seus lábios estavam a


poucos centímetros dos meus.

De repente, Noah se afastou de mim e eu balancei para


frente perigosamente. Levei um segundo para perceber o
porquê do pulso estridente nos meus ouvidos.

— Ei, Molly, — disse Marty, subindo as escadas com


passos leves, a câmera no ombro, como sempre. — Lugar legal,
hein?

— Ei. Umm, sim. Eu amo isso.

Noah esfregou a parte de trás do pescoço, uma distância


segura nos separando agora.

Se Marty suspeitava de algo, ele não demonstrou. —


Pronta para um pouco de yoga?

27Diapasão é um instrumento metálico utilizado para auxiliar na afinação de instrumentos musicais


e vozes.
— Pronta como eu sempre estarei, — eu disse fracamente.
ERA raro eu pensar comigo mesmo: era uma péssima
ideia, mas nos primeiros três minutos iniciais de nossa aula
de yoga, pensei pelo menos sete vezes. A primeira foi quando
Molly estendeu o tapete de yoga e começou a se esticar para a
frente, passando os dedos pelo chão. Marty estava instalando
sua câmera principal em um tripé, seu pequeno computador
de mão em seu ombro para que pudesse captar mais de um
ângulo de uma vez, lutei para manter meus olhos longe da
curva arredondada de sua bunda. A maneira como seus olhos
se fecharam enquanto ela respirava profundamente. A maneira
como o peito dela se ergueu ao inspirar e a cintura curvada
dos quadris.

Músculos que eu nunca tinha notado nela antes


apareceram em seus braços enquanto ela se movia através de
seu aquecimento. Quando ela percebeu que eu não estava me
movendo, ela se endireitou com cuidado e me deu um olhar
curioso.

— Você vai participar ou apenas assistir?

Engoli. — Desculpe. Estou participando.


Foi uma péssima ideia, pensei novamente quando ela
colocou a mão nas minhas costas e me guiou a largar as mãos
no chão.

— Vamos fazer uma série básica aqui antes de iniciar o


vídeo que encontrei, para que ela possa nos guiar. É
especificamente para jogadores de futebol, então não acho que
nada será muito desafiador pela primeira vez.

Eu não respondi. Principalmente porque eu não confiava


na minha voz para não trair os pensamentos que caíam na
minha cabeça.

Eu quase a beijei.

Eu quase a beijei.

Se Marty não tivesse subido as escadas quando ele fez,


eu teria pressionado Molly Ward contra as janelas e minha
boca na dela. Tentei me concentrar no que ela estava dizendo,
mas não conseguia silenciar as imagens mentais piscando,
uma após a outra, e outra. Minhas mãos nela. As mãos dela
em mim. Como seus lábios teriam sido macios. O jeito que ela
provava.

Tão facilmente, eu passei de um desejo de entendê-la


para um simples desejo antigo. Exceto que não havia nada
claro ou antigo nisso.

— Noah?

Eu pisquei. — Sim, desculpe-me.


— Dobre o queixo e empurre o peso nos calcanhares.

Depois que segui sua direção, Molly foi para o tapete ao


lado do meu. Suas unhas dos pés estavam roxas, e isso me
irritou que eu notei. Ela exalou lentamente e espelhou minha
pose.

— Coloque as mãos no tapete e mova as pernas de volta


para o cão descendente.

— Foi isso que me causou problemas em primeiro lugar,


— murmurei, mas fiz o que ela pediu.

Ela riu. — Você provavelmente tentou mudar as mãos,


quando sentiu-se desconfortável, mas deve manter a bunda no
ar e mexer os pés. As mãos ficam plantadas.

Huh.

— Melhor, — ela disse.

Seguindo sua liderança e as instruções pacientes que ela


me deu, passamos cerca de cinco minutos fazendo alguns
alongamentos básicos. Algumas coisas ficaram claras nesses
cinco minutos, e só ficaram mais claras quando ela gravou o
vídeo em seu iPad que ela montou na nossa frente.

Molly era muito melhor em yoga do que eu.

Molly era muito mais flexível do que eu.

E Molly parecia sexo nas pernas enquanto se movia por


cada posição.
Toda vez que ela se mexia, eu me via catalogando uma
nova parte do corpo dela, algo que eu nunca havia notado
antes.

As orelhas dela, por exemplo. Embora seu cabelo quase


sempre estivesse puxado para trás, eu nunca havia notado as
orelhas de Molly. Elas eram delicadas e se destacavam um
pouco, o que eu achei estranhamente cativante.

O segundo dedo do pé era apenas um fio mais comprido


que o dedão.

Quando ela arqueava as costas, ela soltava um suspiro a


cada vez. Eu queria ouvi-la sussurrando enquanto ela
afundava as unhas nas minhas costas.

Eu tive que fechar meus olhos quando isso passou pela


minha cabeça porque eu não me permitia entrar naquele
espaço de cabeça por tanto tempo, e parecia que eu estava
fazendo algo errado.

Quando ela riu de mim porque eu não conseguia me


esticar o máximo que podia, a pele ao redor dos olhos dela
enrugou. Era adorável.

Seu pescoço, longo e gracioso e, como eu sei, macio como


cetim, me fez querer arrastar os dentes ao longo da borda
quando ela inclinou o queixo até o teto quando estávamos no
cão ascendente.

— Foda-se, — eu sussurrei.
Ela se sentou e me deu um olhar preocupado. — O quê?
Você se machucou?

Sim. Havia uma parte de mim que estava doendo, e


precisava parar porque eu tinha uma câmera apontada para
mim.

Eu estava suando? Passei a mão pela testa e, com certeza,


alguns minutos de poses simples, eu estava suando.

— Não, eu estou bem, — eu disse entre os dentes


cerrados.

Um sorriso tremeu na borda de seus lábios quando a


mulher na tela nos disse em uma voz suave onde posicionar
nossas pernas. Pose da Deusa ou algo parecido. Tudo que eu
sabia era que as pernas de Molly se arreganharam e ela se
abaixou facilmente.

Ela era forte.

— Você sabia que Dallas começou a trazer um instrutor


de yoga para praticar?

Eu olhei para ela. — Sério?

Molly arqueou os braços e empurrou as pernas para uma


posição diferente, e quando eu segui alguns segundos depois,
ela sorriu com a minha óbvia demora. — Sério. Ajuda a evitar
lesões, porque os jogadores são mais flexíveis. Um dos
atacantes passou por uma cirurgia nas costas e, quando ele
não estava se exercitando durante a temporada, o seu
fisioterapeuta sugeriu yoga para fortalecer as costas e o núcleo
sem correr o risco de sofrer mais lesões. Funcionou tão bem
para ele que o treinador deles trouxe alguém para toda a defesa
tentar. Agora, eles praticam yoga duas vezes por semana como
parte da prática.

Pela primeira vez desde que começamos, minha mente


voltou ao seu padrão natural. Futebol.

— Eu nunca pensei nisso, — eu disse, depois grunhi


quando me pediram para fazer algo totalmente artificial com
minhas pernas. Molly teve um vislumbre do meu rosto e riu,
sua barriga tremendo quando ela se deitou no tapete.

Eu odiava admitir, mas era mais difícil do que eu


pensava. Nós deveríamos deitar lá e manter nossas pernas no
ar por oito minutos.

Oito minutos.

Molly segurou as pernas mais retas do que eu. Seus


dedos balançaram sobre o tapete, e nem um pingo de tensão
existia em seu corpo em qualquer lugar que eu pudesse ver.
Na verdade, parecia que ela poderia ter adormecido por estar
relaxada.

Pressionando firmemente minha região lombar contra o


tapete, tentei respirar através do meu chi28 ou aproveitar meu

28Pelo Tai Chi Pai Lin, a respiração do grou capta a energia da natureza. Sua característica é inspirar
pela boca e expirar pelo nariz, enfatizando a inspiração e emitindo um som específico, característico
do próprio animal na natureza.
nascer do sol interior ou o que a instrutora estava falando no
vídeo.

— Estamos quase terminando? — Eu perguntei.

— Não.

Suspirei.

— Você vê, — disse ela, com os olhos ainda fechados


quando eu virei minha cabeça para olhá-la, — esta será a
estação em que você quebrará o recorde de placagens29 e,
quando o fizer, é melhor me agradecer.

Eu sorri e direcionei meu olhar de volta para o teto. —


Você entendeu.

Meus movimentos eram bruscos quando mudamos de


posição novamente, enquanto Molly parecia que suas
articulações eram feitas de água.

— Você é terrível nisso, Noah.

Na cozinha, tive um vislumbre de Marty sufocando um


sorriso.

Eu estreitei meus olhos para ela. — Eu não sou terrível.

Ela dobrou o corpo ao meio. — Sim, você é.

— Tudo bem, você vem praticar amanhã, e veremos como


você se sai no meu mundo.

29 Jogada onde o resultado é interromper o avanço do jogador adversário.


— Não, obrigada, — ela retrucou. — Boa parte da minha
vida é ocupada pelo futebol. Não preciso adicionar tempo a
campo também.

— Muito futebol, — eu disse calmamente. Eu levantei


meus braços sobre minha cabeça e imitei seus movimentos. —
Existe uma coisa dessas?

— Talvez não quando você está no meio disso. — Ela


exalou lentamente pela boca. — Mas você não pode jogar para
sempre. O que você vai fazer quando terminar?

Um sorriso torto curvou meus lábios quando me


endireitei e apoiei minhas mãos nos meus quadris. Qualquer
que fosse a pose no vídeo, meu corpo grande não se dobra
dessa maneira. — Eles terão que me arrastar chutando e
gritando para fora do campo quando quiserem que eu me
aposente.

— Sério?

— Enquanto meu corpo cooperar, — eu disse, — estarei


lá fora.

— Talvez você possa estabelecer um novo recorde.


Jogador defensivo mais velho do ano.

Ela apontou para minha esteira e eu suspirei, caindo para


fazer o que ela estava fazendo. Gato, vaca ou cobra. Eu não
conseguia lembrar.

— Sim, daqui a dez anos, talvez.


— Você acha que ainda terá uma média de um sack30 e
meio por jogo em dez anos? — Ela brincou. — Sim, certo. Você
estará mancando por esse ponto, a menos que faça um pouco
mais disso.

Eu olhei para ela, mas não escureceu seu sorriso. Ficou


mais brilhante. Tudo o resto ao seu redor desapareceu.

Por que isso não me aterrorizou? Que tudo na sala, exceto


o rosto de Molly, ficou embaçado e sem importância, mas a
maneira como seus lábios se esticaram em um sorriso, como
esse sorriso iluminou seus olhos, era vital e preciosa. Eu não
a intimidei de forma alguma, e de repente senti algo que eu
precisava proteger. Algo que eu deveria abraçar e esconder do
mundo exterior, para que nada e ninguém pudesse mudar isso
nela.

Foi a única razão pela qual eu pude pensar por que não
a vi estender a mão para me derrubar.

Equilibrando como eu estava, caí como um maldito


carvalho.

Ela caiu na gargalhada enquanto eu caí de costas.

— Trapaceira suja, — eu gemi.

Molly enxugou lágrimas de alegria debaixo dos olhos e se


ajoelhou sobre mim. — Você está bem?

30Quando o jogador consegue passar pela linha ofensiva e derrubar o Quarterback ainda com a bola
na mão.
— Ah, claro, finja que se importa agora. Você poderia ter
me machucado.

— Quem sabia que The Machine era um bebê chorão?

Estreitando os olhos, senti meu corpo tenso para atacar,


mas ela recuou, uma risada saindo em pequenos sopros de ar.
Antes de me ajoelhar para decolar atrás dela, eu congelei. O
que eu estava fazendo?

Cada segundo disso estava como em um filme. E se eu


colocasse minhas mãos nela agora, eu estaria perdido. Molly
viu a mudança de humor no meu rosto, e aqueles brilhantes
olhos azuis se suavizaram em entendimento. Como ela poderia
me ler tão bem? Não fazia sentido.

— Isso foi muito bom para a sua primeira lição, — disse


ela calmamente.

De pé, estiquei os braços acima da cabeça e estendi a mão


para ela. Ela deslizou a palma da mão contra a minha e eu a
puxei com facilidade.

Seus dedos não caíram imediatamente, e o impulso de


puxá-la para mais perto era quase esmagador. Recuei e nossas
mãos caíram.

— Obrigado por vir me mostrar. — Eu olhei em volta. —


E por ver a casa. Suponho que deveríamos sair em breve de
qualquer maneira.

Ela assentiu e se inclinou para enrolar o tapete de yoga.


Marty desligou as duas câmeras e gemeu como se tivesse
acabado de gravar o vídeo conosco. — Isso foi ótimo, pessoal.
Rick vai adorar.

O jeito que Molly se mexia ao ficar com o tapete de yoga e


o jeito que ela não fazia contato visual com Marty significava
que ela deve ter se sentido da mesma maneira que eu depois
de conversar com minha avó. Foi desconcertante esquecer que
ele estava lá, mas eu ainda me vi fazendo isso cada vez mais.

— Nós não fizemos isso para mostrar, Marty.

Surpreso, olhei para o tom defensivo em sua voz.

Marty estava lhe dando o mesmo olhar. — Eu sei. Só


estou dizendo que era um bom segmento. Precisamos de mais
coisas assim depois de uma semana de prática de filmagem e
Noah olhando para a tela do iPad enquanto assistia ao filme.

Isso trouxe um sorriso ao rosto dela.

— Eu não encaro minha tela, — argumentei.

Ele apontou para o iPad de Molly. — Posso?

— Vá em frente.

Marty levantou e fez uma careta estranha que Molly riu


alto.

— Eu não sou assim, — eu disse.

— Confie em mim, amigo, você é. — Ele sorriu,


devolvendo o iPad para Molly.
Enquanto ele fazia as malas, os dois conversavam com
facilidade, tentando descobrir se fazia sentido para Marty levá-
la de volta para casa ou se estava fora do caminho dele, eu tive
uma sensação estranhamente estabelecida.

Era triste que essas duas pessoas – o cara que estava


sendo pago para filmar minha vida e a mulher com quem eu
não queria nada – agora eram meus melhores amigos?

Eles não olharam para mim e viram The Machine. Eu era


Noah para eles, e fazia muito tempo que isso não era verdade
para ninguém.

Molly se despediu de Marty quando ele levantou a bolsa


da câmera por cima do ombro, e eu caminhei pela sala de estar
e sala de jantar para garantir que todas as luzes estivessem
apagadas. Nenhum de nós falou enquanto ela me observava
arrumar e devolver os tapetes enrolados de ioga atrás do sofá
onde os encontrei.

Eu me endireitei e a encarei, muito consciente da casa


silenciosa, e como era a primeira vez que estávamos realmente
sozinhos desde o nosso momento no elevador. Ninguém
subindo as escadas. Vindo pelo corredor. Pela porta da frente.

Éramos apenas eu e ela.

A julgar pelo rosa profundo em suas bochechas, ela


também estava ciente disso.
Sua respiração a deixou com pressa, mais trêmula e mais
alta do que quando fizemos o vídeo, e eu a vi apertar alguns
botões na tela quase que freneticamente.

— Posso te levar para casa? — Eu perguntei.

Ela balançou a cabeça e algumas mechas de cabelo que


haviam escapado do penteado caíram em volta do pescoço e
dos ombros. — Acabei de chamar o meu Uber. Estará aqui em
cerca de cinco minutos. — Molly olhou para mim e olhou para
o lago novamente. — Eu acho que isso faz mais sentido.

— Provavelmente sim, — eu concordei.

Eu levá-la para casa era uma ladeira escorregadia. Nós já


estávamos indo passar o fim de semana juntos na minha avó,
e isso era bastante complicado. Em uma noite, senti como se
Molly tivesse pegado uma bola de demolição e derrubado todas
as paredes que foram construídas ao redor da minha vida, e
ela fez isso sem saber.

Oferecer-me para levá-la para casa era uma oposição


direta a tudo o que prometi a mim mesmo depois que deixei
Miami, mas eu não podia nem me importar porque era ela.

Percebi com uma clareza impressionante e simples que


confiava nela. Não era alguém que me trairia. Que me usaria,
me descarrilaria ou minaria minha carreira.

E eu a queria.
Essas duas coisas, verdadeiras, reais e importantes,
foram o motivo pelo qual me mudei para ela.

Admitir que eu a queria era muito mais fácil do que eu


pensava que seria. Durante toda a semana, eu usei uma série
de desculpas sobre o motivo de me fixar tanto nela e por que
sua distância era tão incômoda.

Todas essas desculpas desapareceram silenciosamente,


facilmente. Meu cérebro se encaixou, outra decisão tomada,
uma que eu sabia instintivamente que estava certa.

Eu queria Molly Ward.

Pela primeira vez em anos, o futebol não era a primeira


coisa no meu cérebro. Não era nem a segunda. Não naquele
momento. Naquele momento, a única coisa que me importava
era saber mais sobre essa mulher. Sobre como ela se sentia em
meus braços e como sua pele cheirava debaixo das orelhas que
se destacavam em seu rosto delicado.

Molly, alheia aos pensamentos ininterruptos na minha


cabeça, virou-se para a porta.

Eu peguei seu pulso antes que ela pudesse.

— Espere, — eu disse, virando-a de volta para mim.

Seu rosto estava cheio de pedidos e anseios, do tipo que


eu senti martelando atrás do meu peito no espaço vazio
debaixo das minhas costelas.
— Noah, eu... — Sua voz parou quando minha mão
deslizou pelo comprimento suave de seu braço. Os olhos dela
se fecharam. Eu segurei seu rosto com as duas mãos e soltei
um suspiro quando suas mãos pousaram na minha cintura,
seus dedos se curvando no material da minha camisa. Com
aquele arqueamento dos dedos, ela me ancorou no lugar. Eu
só sairia se ela deixasse ir. Pararia no segundo em que ela me
pedisse. Mas enquanto ela me segurava assim, ela era minha.

Minha boca estava na dela, meu rosto se inclinando para


procurar o gosto que me escapara antes, aquele que fez minha
boca ficar com água na boca e minha pele apertar sobre meu
corpo. Nossos lábios beberam, provaram e provaram, os dela
eram macios, quentes e deliciosos, e eu mordi suavemente toda
a curva do meio do lábio inferior. Então puxei.

Sua inspiração aguda me deu um soco direto no plexo


solar, e meu braço apertou em torno de sua pequena estrutura,
agarrando-a desesperadamente a mim. Foi o primeiro
momento que percebi a magnitude de me permitir esse beijo
com ela.

Durante anos, acorrentei o desejo sexual por alguém.

Até agora, com ela. Minhas mãos tremiam quando eu a


toquei porque, de repente, não era o suficiente.

Mais rápido, mais, mais duro, meu cérebro gritou, e meu


corpo inteiro tremeu com o esforço necessário para não seguir
esse instinto.
Eu não sentira isso com nenhuma mulher, depois de
tanto tempo sem pressionar os seios macios ao meu peito, a
maneira natural como seus quadris me embalavam, o balanço
de sua pélvis contra mim. Foi Molly.

Nós nos beijamos e nos beijamos e nos beijamos antes


que ela se levantasse na ponta dos pés para se aproximar de
mim, e não era suficiente.

Minhas mãos percorreram a linha flexível de suas costas


e agarraram sua bunda para que eu pudesse levantá-la em
meus braços. Suas pernas entrelaçaram em volta da minha
cintura e, com apenas um passo, suas costas estavam contra
a porta.

Nós gememos em uníssono, os sons perdidos na boca um


do outro quando nossos movimentos ficaram mais confusos e
o beijo ficou mais profundo. Minha língua empurrou com mais
força a dela quando ela pegou a ponta com as pontas afiadas
dos dentes.

Suas mãos cravaram nos meus cabelos e me puxaram


com mais força contra ela. Eu não poderia me aproximar mais
dela, não se tentasse. Eu balancei, o prazer se acumulando em
uma bola de chamas na base da minha espinha, então eu
cerrei os dentes e me afastei dela.

Ela choramingou quando eu fiz, e eu sorri contra sua


boca.
— Paciência, — murmurei entre beijos. Tudo o que faltava
em requinte, compensava com puro fervor, porque ela tinha
um gosto tão bom e se sentia tão bem, minhas mãos estavam
sob a blusa dela no próximo batimento cardíaco.

Eu queria sentir o pulsar do seu coração sob a palma da


minha mão, eu queria arrancar suas calças e saber o quanto
ela me queria, eu queria marcar o peito dela com a boca e ficar
com ela assim pelo resto da noite.

Molly congelou completamente, suas mãos empurrando


contra o meu peito.

Eu fiz o mesmo, minha boca pairando sobre a dela


enquanto observava os olhos arregalados suas bochechas
coradas e os cabelos despenteados.

— Noah, — ela sussurrou. — Não devemos fazer isso.

Quatro anos jogando futebol profissional e quatro anos


na faculdade antes disso aprimoraram minha disciplina em
algo afiado como ferro, e eu tive que usar cada grama dessa
disciplina para deixar seus pés caírem com cuidado no chão.

— Certo, — eu disse.

— Não podemos, Noah, — disse ela se desculpando. —


Você sabe que não podemos.

Eu balancei a cabeça, passando a mão sobre a boca. Eu


não tinha certeza de que sabia disso, mas eu a respeitaria da
mesma forma.
— Nós, temos um fim de semana inteiro juntos depois
disso. É importante, — continuou ela. Eu não tinha certeza de
quem ela estava tentando convencer – Eu ou ela mesma. — E
Beatrice me mataria.

Como se eu me importasse com o que sua chefe pensava.


Mas Molly se importava. Fechei meus olhos e me inclinei para
frente para pressionar um beijo em sua testa.

— Está tudo bem, — eu disse a ela. — Está bem.

Por um momento, ela se inclinou para mim, deixando seu


rosto cair no centro do meu peito enquanto eu passava um
braço em volta de suas costas.

— Vai ficar tudo bem.

Molly assentiu trêmula.

— Vai dar tudo certo, — repeti.

Acabei de quebrar uma onda livre de mulheres que durou


anos e estava prestes a passar o fim de semana com ela. E uma
equipe de filmagem. E minha avó. E eu deveria manter minhas
mãos longe dela agora que sabia exatamente como ela provava
e os barulhos que fazia quando chupou minha língua em sua
boca.

Sem problemas.
ALGUMAS COISAS ficaram claras para mim nas próximas
dezoito horas desde que eu andei minhas pernas que mais
pareciam gelatina da nova casa de Noah.

1- Noah ainda podia beijar.

2- Eu era uma idiota.

3- Eu precisava de uma intervenção porque me revirei na


cama a noite inteira depois, repetindo aquele beijo como se ele
tivesse acabado de me servir o melhor sexo da minha vida
inteira.

O número dois era o que eu mais precisava focar. Deveria


ter me dito tudo o que eu precisava saber que não estava no
primeiro lugar. Rick e Marty queriam fazer algumas edições
antes de partirmos para Dakota do Sul, e Noah teve uma
grande prática antes do fim de semana que antecedeu a pré-
temporada, então não filmamos no dia seguinte.

O trabalho proporcionou uma distração escassa, mas não


o suficiente para acalmar meus pensamentos gritantes. O dia
inteiro na minha mesa, meus pensamentos haviam feito essa
dança básica.

O beijo contava como confraternização?

Não.

Sim.

Talvez, porque houve muita ação de língua.

Mas provavelmente não.

A confraternização provavelmente era apenas entre P e V.


Relações sexuais reais, como as que eles nos ensinaram no
ensino médio. Nada mais contava.

Beatrice me desprezaria por estar com ele?

Não.

Sim.

Talvez, porque merda, houve muita ação com a língua.

Liguei para Isabel assim que saí do estacionamento,


porque sabia que ela estava trabalhando e sabia que não havia
aulas programadas naquela noite.

— Posso ir fazer uma sessão de treinamento com você?

Do outro lado do telefone, ouvi o som alto e alto do


microfone de um de seus instrutores, dando aula. Ela deve ter
fechado a porta do escritório, porque se acalmou
consideravelmente. — Claro. Eu preciso estar aqui de qualquer
maneira, porque Amy está fazendo um contra um com um
cliente, e sempre garantimos que nenhum de nós esteja
sozinho quando for alguém novo.

— Bom, — eu exalei com entusiasmo. — Eu preciso que


você coloque os pensamentos na minha cabeça em submissão.

— Vou ver o que posso fazer, — prometeu.

Quando cheguei lá, Claire e Lia decidiram se juntar


também, e eu sorri a caminho do prédio. As portas espelhadas
se abriram e vi minhas irmãs se esticando na praça vazia,
cercada por esquadrias de aço e correntes giratórias,
segurando pesadas sacolas de cento e cinquenta libras.

As mãos de Isabel estavam envoltas em preto, os cabelos


presos em um elegante rabo de cavalo no topo da cabeça, e seu
corpo alto e magro estava coberto por uma legging preta e uma
blusa preta.

Eu fico melhor depois do kickboxing os dizeres da camisa


dela escritas em letras maiúsculas.

Às vezes, era difícil para mim reconhecer exatamente


como minha irmã mais nova se transformou em uma durona.

Amy, a dona do ginásio, ficava no canto de trás das


estantes de pesos livres, bolas de pilates e cordas de pular. Ela
também estava se alongando e acenou para mim quando me
juntei às minhas irmãs.
— O cliente dela se importa por estarmos aqui? —
Perguntei a Iz quando me joguei no chão e comecei a amarrar
meus sapatos.

Ela encolheu os ombros. — Não vejo o porquê. Ele ainda


está recebendo uma sessão de treinamento pessoal.

— Você não acha que Amy poderia lidar com um cara


novo sozinha? — Lia bufou. — Amy poderia vencer Logan em
um dia ruim.

Todos nós rimos.

Isabel sorriu. — Ela poderia, mas esse não é o ponto. É


uma coisa de segurança. Quando não conhecemos o cliente,
homem ou mulher, garantimos que não estamos aqui sozinhos
com eles.

Claire deitou-se no chão de borracha. — Eu vou relaxar


aqui. Alguém me acorda quando vocês terminarem.

Lia a cutucou enquanto se levantava. — Preguiçosa.


Vamos, estamos aqui por Molly.

Quando Lia olhou para mim, eu levantei minhas mãos. —


Não me culpe. Eu não te convidei.

— Você não precisava, — disse Claire. — Em vez de um


golden retriever, as irmãs mais novas devem agir com
capacidade de assistência emocional.

— Nós realmente precisamos de um cachorro, — disse


Isabel. — Porque vocês duas reclamam demais.
Lia chutou a perna para fora, o que Iz se esquivou
agilmente. Então ela enfiou as mãos nas luvas e eu acabaria
socando a merda fora e bati nelas com força. Parecia um tiro
na academia, e Claire pulou. Isabel riu. — Vamos, preguiçosa,
levante-se. Não estamos aqui para perder meu tempo; estamos
aqui para trabalhar. Vamos. Duas voltas ao redor da academia,
depois de volta aos sacos e me dê uma investida de lado. chute.
Cada lado cinco vezes. Se esse calcanhar não for mais alto que
os dedos dos pés quando você chuta a bolsa, você me deve um
burpee31.

Todas nós gememos, mas fizemos o que ela pediu.

Trinta minutos depois, minha mente estava mais clara,


minha camisa estava encharcada de suor e meus braços e
pernas estavam queimando.

Eu adorava como o yoga e melhorava minha flexibilidade


e meu núcleo, mas às vezes eu só queria tirar a merda do saco
de boxe.

Tentar decidir o que fazer depois de dar uns amassos em


Noah e esfregá-lo contra a porta da frente era um daqueles
momentos.

Caí no chão quando deveria estar fazendo flexões e assisti


com um sorriso exausto enquanto Isabel gritava para Lia se
mover mais rápido.

31 É um exercício corporal completo de flexão com salto utilizado em treinamento de força e exercício
aeróbico.
— Eu terminei, — ofegou Claire quando ela se juntou a
mim. — Da próxima vez que precisar de apoio emocional, por
favor, vá a um abrigo para cães ou algo assim, ok?

Isso me fez rir, embora rapidamente se dissolvesse em um


gemido quando isso doeu também.

— Por que estamos apoiando você de novo? — Ela


perguntou.

Eu dei um rápido olhar para o fraseado dela. — Só... é


um grande fim de semana. Eu precisava limpar minha cabeça
antes de ficar presa em uma cabana com Noah.

Presa em uma cabine. Imaginando as mãos dele. E lábios.


E oh, minhas estrelas, quão grande e forte e duro e... grande...
e duro... ele era.

Ainda bem que meu rosto já estava vermelho devido à


surra que Iz estava nos dando.

Isabel se aproximou e franziu a testa para nós duas. —


Você não terminou.

— Sim, — eu disse. — Nós terminamos.

— Eu preciso poder andar amanhã, Iz.

Ela bufou. — Andar com facilidade é superestimado. De


que outra forma você apreciará o corpo que tem se não sentir
todos os... músculos. — Seus olhos ficaram nítidos, e sua voz
sumiu quando alguém entrou na academia. Sentei-me e me
virei, e Claire fez o mesmo. — Puta merda, — Isabel sussurrou.
Puta merda era certo.

O novo cliente era alto, moreno e lindo. O novo cliente


tinha músculos sobre os músculos e uma expressão sombria
e proibitiva que me arrepiou a espinha.

— Eu o conheço, — Lia murmurou quando se aproximou


de Isabel. — Ele era um lutador de MMA. Finn adorava assistir
suas lutas.

Pouco antes de ele se aproximar de Amy, ele olhou para


nós, os olhos parando brevemente em Isabel, antes de nos
desligar completamente.

Eu ouvi Iz respirar fundo. — Sim, ele era. Sua esposa


acabou de morrer, então ele se aposentou para cuidar de sua
filha.

Isso lançou um silêncio sobre nós quatro.

— Você está bem, Iz? — Claire perguntou.

Ela piscou. — Sim. Nós terminamos, certo?

Troquei olhares com Lia e Claire, que me deram de


ombros ao mesmo tempo. — Sim, terminamos. Eu deveria ir
para casa para tomar banho e fazer as malas de qualquer
maneira.

— Quando você sai? — Lia perguntou.


— Eu tenho cerca de três horas. Mas estamos pegando
um avião particular, por isso tenho tempo para que eu possa
chegar à pista de pouso antes de decolarmos.

— Jogadora. — Claire sorriu.

— Hã. Sim, eu sou.

Isabel começou a pegar as sacolas e suas bochechas


estavam rosadas.

— Qual é o negócio dela? — Eu sussurrei.

Lia encolheu os ombros novamente. — Quem sabe. Eu


perguntaria, mas... — A voz dela sumiu, e todas sabíamos o
porquê.

Poderíamos perguntar, mas, a menos que Isabel quisesse


compartilhar, ela não nos contaria nada.

— Talvez ela fosse uma fã dele, — disse Claire, apontando


para o Sr. Alto, Escuro e assustador.

— Talvez. — Suspirei. — Tudo bem. Diga-me que ficarei


bem neste fim de semana.

— Você vai, — disse Claire. — Não importa o que


aconteça, você ficará bem.

Lia agarrou meus ombros, rosto sério no lugar. — Você


pode fazer isso. Ele é apenas um grande jogador de futebol
burro que não se lembrará de você quando partir de
Washington, o que provavelmente acontecerá em breve, já que
os jogadores são negociados o tempo todo.

A boca de Claire se abriu. — Você é péssima nisso, — ela


disse à gêmea.

Minha boca estragou como se eu tivesse chupado um


limão. — Obrigada.

Abracei a todas e fui para casa tomar banho e arrumar


as malas.

Enquanto eu fazia essas coisas, as palavras mal


entregues de Lia bateram em minha cabeça como se fosse uma
caixa vazia.

Ela estava errada. Ele não era burro e não iria me


esquecer.

Mas ela também estava certa. Ele poderia sair a qualquer


momento, dada sua saída abrupta de Miami.

Isso ainda não era justificativa suficiente para colocar


meu trabalho em risco. Mas isso adicionou uma certa
vantagem aos meus pensamentos, uma urgência que eu não
podia negar enquanto fazia as malas.

Minha história com Noah começou com uma decisão mal


pensada, que foi tomada sem prestar atenção a possíveis
consequências e terminou – pelo menos para mim – em
humilhação e lágrimas.
Éramos ambos mais velhos e mais sábios, mas não podia
dizer que éramos menos teimosos, não da maneira que
contava.

Noah era decisivo e autocontrolado. Sua jornada para


fazer uma escolha, não importa quão grande ou pequena, era
rápida e instintiva. Era por isso que ele era um grande jogador.
Todos os grandes jogadores tinham isso em comum. Se você
reservasse um tempo para fazer uma pausa e adivinhar,
alguém passaria por você.

Em sua nova casa, ele decidiu que me beijar era seu


próximo curso de ação, e ele nunca vacilou. Beijá-lo de volta
tinha sido incrível, mas ainda havia uma sensação de
insatisfação na parte de trás da minha cabeça, uma voz que
eu não tinha sido capaz de silenciar.

Fechei a lateral da minha mala lentamente.

Eu poderia entrar neste fim de semana e não permitir que


aquela voz me segurasse?

O que eu não faria era ser uma típica groupie de futebol,


implorando por quaisquer restos que ele me permitisse.

E eu não pediria que ele sacrificasse algo que ele não


estava pronto para sacrificar. Eu respeitava o seu instinto mais
do que isso. Assim como ele me respeitava o suficiente para
parar quando eu pedi.

A escolha foi minha.


Eu poderia aproveitar este fim de semana e ter a
oportunidade do que era. Uma chance, mesmo que fosse
minha única, de finalmente trazer essa história emaranhada
com o círculo completo de Noah. Eu poderia, clara e
deliberadamente, dar um passo em ação e entender o peso do
que estava fazendo, se ele subisse naquele avião e não
estivesse me deixando completamente de fora.

A carreira de Noah, minha carreira, era muito maior do


que qualquer coisa que estivéssemos trabalhando naquele fim
de semana. Eu nem tinha certeza de que este documentário da
Amazon fosse destaque quando ele se aposentasse. O que
também significava que meu tempo com ele era curto no
contexto de sua carreira.

Uma janela para terminar algo que começamos há muito,


muito tempo atrás.

A comparação me fez sorrir, porque uma janela é o que


nos levou a essa confusão em primeiro lugar. Seu
comportamento naquela época havia guiado o meu e, quando
terminei, sabia que trataria este fim de semana de maneira
diferente.

Cheguei ao aeroporto com jeans, um capuz preto com


zíper e meus Chucks32 pretos no lugar. Ele sorriu para eles
quando me aproximei.

32Marca de All-star.
— Vou pegar sua mala, — ele disse e levantou para mim,
para que eu pudesse subir os degraus estreitos desinibidos.

— Obrigada, — eu disse a ele. Ele me deixou subir


primeiro no avião decorado de pelúcia. Uma aeromoça
sorridente parou e perguntou se eu queria uma taça de
champanhe. — Oh, apenas água, por favor.

Chega de vinho para mim, não na presença de câmeras e


Noah Griffin. Marty e Rick estavam com a cabeça inclinada em
direção a uma tela de laptop, e eu acenei para eles antes de me
sentar na ampla cadeira coberta de couro macio e
amanteigado.

— Você está pronta para isso? — Noah perguntou


enquanto se sentava à minha frente. Seus olhos estavam mais
quentes hoje do que eu já os tinha visto, e eu gostei da maneira
como ele estudou meu rosto, como se ele pudesse absorver os
detalhes da minha pele sem um único toque.

— Estou animada para conhecer sua avó, — eu disse a


ele.

A maneira como ele sorriu derreteu algo dentro de mim.


Se o comportamento dele ia ser meu guia, então eu estava
lentamente, afundando em uma poça pegajosa de eu o quero.

— Minha avó é a melhor mulher que eu já conheci. — Ele


balançou sua cabeça. — Só para avisar, ela provavelmente vai
me chamar de apelidos embaraçosos e ser espalhafatosa por
mim.
Eu sorri. — Não há nada de errado nisso.

— Não, — ele admitiu. — Não há.

Ele olhou para Rick e Marty e balançou a cabeça


novamente. — Eu provavelmente deveria interrompê-los para
dizer obrigado.

— Pelo quê?

Quando ele olhou para mim, seus olhos brilhavam. Noah


estava feliz. Era por isso que ele parecia tão familiar. Não era
aquele homem dirigido, hiperfocado, que mantinha as vendas
ocultas para tudo fora do jogo. Não era o homem que franzia a
testa para a tela enquanto assistia filmes. Porque não importa
o que ele disse a Marty, ele fazia isso. Ou que malhava
simplesmente porque estava entediado à noite.

Este era Noah. A versão dele que eu nunca havia


conhecido antes.

Eu queria amarrá-lo na minha cama e montá-lo como um


cowboy em um bronco.

— Por me escolher, — disse ele. — Se nada mais, eu estou


feliz por ter feito essa coisa de documentário, porque está me
fazendo sair para visitá-la novamente. Faz muito tempo. —
Noah encolheu os ombros. — Sinto falta dela, sabe?

Se esse foi meu primeiro vislumbre de um Noah


despreocupado, e estávamos a caminho de seu lugar feliz, livre
das distrações do trabalho, e eu estava completamente ferrada,
e ainda nem tínhamos decolado.
QUANDO SAÍMOS da pequena pista de pouso, a cerca de
quarenta minutos da casa da minha avó, foi difícil para mim
ter uma conversa educada com as três pessoas andando
comigo no carro. Molly cuidara de toda a logística de nos levar
de Seattle a Custer, Dakota do Sul, e o estoico motorista do
grande Escalade preto era tão falador quanto eu.

Nossas razões eram diferentes, sem dúvida, mas ninguém


andando no veículo questionou qualquer um de nós.

Enquanto ele manobrava o carro pelas estradas sinuosas


em direção à minha avó, olhei pela janela e senti uma pontada
estranha de melancolia. E culpa.

Pela segunda vez na semana que passou, não pude deixar


de sentir que havia feito uma curva acentuada na direção
errada da minha vida. Era inquietante, e eu não gostava de me
sentir inquieto neste lugar que eu tanto amava.

Eu queria plantar meus pés e saber que onde eu estava


indo estava certo, estava correto, porque era assim que eu fazia
as coisas.
Se você não tinha certeza do que estava fazendo,
provavelmente tomou a decisão errada. E aos meus olhos,
tomar a decisão errada era o mesmo que falhar.

Mas o problema com isso era que me fazia pensar demais


nas coisas ultimamente, voltando a oferecer uma carona para
a esposa bêbada do meu companheiro de equipe porque era a
coisa certa a fazer. Isso foi menor, apesar de ter grandes
consequências.

O que não era tão menor foi beijar Molly. Pior ainda era
que eu estava lutando para sentir algum tipo de culpa ou
arrependimento por isso, exceto pelo fato de não saber como
ela se sentia a respeito.

Foi isso que tornou seu impacto muito maior do que o


ímpeto da minha presença em Washington. Um beijo com ela
não era apenas um beijo. Era mais do que saber como ela
provava ou quão macios eram seus lábios. Foi um movimento
simples que não teve consequências, tão simples porque
poderia minar tudo o que eu havia cultivado.

Acordei mais cedo naquele dia em Seattle, e o primeiro


pensamento que me passou pela cabeça não foi sobre
exercícios, prática ou pré-temporada. Eu me perguntei se
Molly bebia café. Se ela era uma pessoa da manhã ou uma
coruja da noite. Se ela dormiria esparramada na cama dela
como eu na minha. E como hoje à noite eu iria dormir sob o
mesmo teto que ela.

Por isso esse beijo importava.


Mas por mais difícil que seja, eu tive que tirar isso da
minha cabeça. Pelo menos por um dia.

As colinas verdes e as montanhas negras cobertas de


árvores cresciam por toda parte, um tipo de paisagem
totalmente diferente de Seattle, mas para mim, era igualmente
bonito. E eu não estive aqui há anos.

Grandes cabanas de madeira afastadas da estrada em


terrenos generosos me deram algo em que focar, pois a vista
ficava turva devido à velocidade do nosso carro. O GPS do
motorista disse a ele quando virar, o que era bom, porque havia
mudado o suficiente nos três anos desde que eu a visitei e teria
perdido a curva se estivesse dirigindo.

Inclinei a cabeça quando vi o telhado de metal verde


aparecer. Ela estava na base das colinas, de modo que as
delicadas ondas de fumaça que saíam da chaminé tivessem um
fundo verde exuberante enquanto as montanhas empurravam
suas bordas no horizonte.

Molly disse algo baixinho para Marty, e ele riu, cortando


o silêncio pensativo em que eu havia mergulhado.

— Há quanto tempo sua avó mora aqui? — Rick


perguntou.

Meus olhos se fecharam brevemente porque eu sabia que


precisaria mudar a minha cabeça. Não era apenas um neto que
fazia uma visita muito atrasada à avó. Isso era intencional,
mostrar um lado de mim que ninguém acreditava existir.
Pensando na invasão do público nesse momento, quando eu já
me sentia culpado o suficiente por não ter vindo vê-la mais,
tive que me lembrar por que essa era uma boa ideia. Por que
eu concordei com isso.

— A vida toda, — eu respondi. — Mas esta casa


especificamente, nos últimos quatro anos.

— Quando você começou no campeonato. — Sua


declaração não deixou espaço para sutileza.

Eu olhei de volta para ele. — Se você vai perguntar uma


coisa, Rick, é só perguntar.

Ele sorriu.

Os olhos de Molly estavam cobertos com óculos de sol


espelhados em azul, e eu queria arrancá-los do rosto porque
não sabia o que ela estava pensando ou se ela estava ouvindo.
Instantaneamente, voltei minha atenção para Rick quando nos
aproximamos da casa da minha avó, porque eu nem deveria
estar preocupado se ela estava prestando atenção.

— É um lugar bonito, — ele meditou quando a entrada da


garagem apareceu, assim como a ampla cabine com uma
enorme varanda envolvente. Dois cavalos preto e branco
pastavam na área cercada ao norte da casa. Quem sabia onde
estavam as cabras, provavelmente no celeiro parcialmente
obscurecido pela casa. — Grande, só para uma mulher.

— Ela não queria se sentir apertada, — eu disse, as


bordas de um sorriso começando na minha boca quando o
carro parou na entrada de cascalho. A varanda estava coberta
de todas as formas e tamanhos de vasos de flores e plantas. Ao
longo da borda leste do telhado, uma linha de sinos de vento
balançava na brisa.

O motorista estacionou o carro e, quando me desdobrei,


ouvi a porta da tela bater.

— É você, nanico? — Ela chamou.

Cada cabeça girou na minha direção.

— Estou tão feliz por ter filmado isso, — Marty sussurrou,


e Molly se dissolveu em risadinhas.

Quando contornei a frente do carro, minha avó estava


como uma sentinela no degrau mais alto do convés. Seus
cabelos grisalhos encaracolados estavam presos ao redor do
rosto por um chapéu de palha e a fita vermelha desfiada me
dizia que era o mesmo que ela sempre usara. Ao me ver, seu
rosto se abriu em um enorme sorriso. Eu senti aquele sorriso
até os dedos dos pés, de uma maneira que eu provavelmente
deveria ter vergonha de admitir.

Eu a encontrei no meio do caminho quando ela desceu as


escadas, e sua risada encantada quando a envolvi em um
abraço de urso e levantei sua pequena estrutura do chão me
fez sentir como o Grinch no dia de Natal.

Dois, três, quatro fragmentos irregulares do meu coração,


que quadruplicaram de tamanho.
— Meu Deus, você está grande, — disse ela, apertando os
braços em volta do meu pescoço. — Agora me coloque no chão.
Vou quebrar o quadril se você me deixar cair dessa altura.

Rindo, eu a coloquei no chão, me certificando de que seus


pés estavam firmemente plantados antes de me afastar da
inevitável inspeção de avó. Os olhos dela se estreitaram
pensativamente.

— Eles certamente estão alimentando você o suficiente,


não estão?

— Sim, senhora.

Ela assentiu, e seus olhos estavam suspeitosamente


brilhantes quando ela gentilmente deu um tapinha no meu
peito. — Bem, bem. Agora, quem são seus amigos?

Rick e Marty apertaram sua mão e, quando Molly


apareceu de trás do carro com sua pequena mala de prata, vi
minha avó estudando-a da cabeça aos pés. Seu olhar nunca
voltou para mim, mas é como se tivesse voltado.

Não deveria ter sido tão importante apresentar Molly a


essa mulher, a que mais significava para mim no mundo, mas
foi o que aconteceu.

— Eu sou uma abraçadora, — Molly disse com um sorriso


largo, — se estiver tudo bem por você.

Minha avó riu e abriu os braços. — Eu também, querida.


Quando elas se abraçaram, senti meu coração recém-
aumentado fazer algo estranho, e sem perceber o que estava
fazendo, minha mão esfregou meu peito, onde estava batendo
um pouco mais rápido que o necessário.

— Entrem, entrem, — vovó disse, acenando para a casa.


— Eu tenho o jantar pronto para servir. Imaginei que vocês
estariam com fome.

— Faminto, — eu disse. — O que você fez?

Ela piscou para mim. — Assado do vovô e meu purê de


batatas.

Meu gemido de felicidade fez todo mundo rir novamente.

A cabana não havia mudado desde a última vez que estive


lá, e me confortei nisso. Os sofás e cadeiras, todos de couro
marrom desbotado, ainda tinham os mesmos cobertores
dobrados nas costas. A lareira de pedra e o manto comprido de
carvalho continham as mesmas fotos em molduras prateadas
brilhantes de formas e tamanhos variados. Essa era a minha
avó para você. Se encontrasse uma coisa de que gostasse,
fossem vasos de flores, cobertores de malha ou molduras,
preencheria todo o espaço até a borda com todas as variações.

As janelas do chão ao teto do outro lado da casa


inauguravam um silêncio silencioso quando nossos
convidados viram a vista do pôr do sol sobre a colina.

— É tão bonito aqui, — disse Molly. — Eu posso ver


porque você ama isso.
Olhei para ela porque não sabia dizer se ela estava
falando comigo ou com a vovó. Minha avó foi quem respondeu,
e isso foi provavelmente o melhor. — Eu vou ficar aqui até
morrer, com certeza. Não consigo imaginar assistir o pôr do sol
em outro lugar que não seja aqui, mesmo quando há neve tão
alta quanto minha cabeça e o vento atravesse seus ossos. —
Ela deu um tapinha no meu braço. — Foi o que eu disse a Noah
quando a vi pela primeira vez. É essa, e se você não se importa,
me enterre nas costas do bosque de pinheiros. Mantenha seus
custos de funeral baixos.

Eu balancei minha cabeça quando Molly riu.

— Onde devemos colocar nossas coisas, senhorita


Griffin? — Rick perguntou.

Vovó mostrou a Rick e a Marty os quartos no andar de


cima, deixando Molly e eu sozinhos na sala.

— Você comprou isso para ela, não comprou?

Minha expiração foi lenta e constante. Não havia sentido


em negar, e pelo menos eu poderia estar feliz por ela não
perguntar quando Marty estava por perto com a câmera dele.
Quando virei minha cabeça para ela, porém, ela não estava
olhando para mim. Ela estava estudando as fotos na parede,
sorrindo para as várias fases de minha juventude.

— Sim, eu comprei. — Me aproximei da lareira e passei


por Molly, a parte interna do meu braço roçando seu ombro
enquanto puxava uma das molduras menores. Era do meu avô
e de mim, e eu não podia ter mais de seis anos. Alguns anos
antes de ele morrer, ele tinha acabado de me levar para pescar.
Foi a primeira vez que peguei um smallmouth bass33 sozinho.
Era pequeno, e eu quase não o mantive na linha por tempo
suficiente para minha avó tirar uma foto, mas meu avô sorriu
com tanto orgulho que você pensaria que eu tinha pegado um
espadim de um metro e oitenta.

— Quando recebi meu bônus de assinatura em Miami,


vim direto para cá e paguei em dinheiro por isso. Durante toda
a minha vida, ouvi minha avó dizer que queria um pequeno
pedaço de terra na base da colina, com dois cavalos e algumas
cabras para lhe fazer companhia. A casa não precisava ser
chique, grande o suficiente para abrigar sua família quando
eles viessem nos visitar. — Minha voz ficou rouca quando eu
forcei a última frase.

Quando Molly se virou, seus grandes olhos azuis estavam


cheios de tanta compreensão, que eu tive que desviar o olhar.

Como ela já me conhecia tão bem, que podia ver


instantaneamente minha culpa no que eu acabei de admitir?

Eu estava colocando a foto de volta quando seus dedos


frios e firmes envolveram os meus e entrelaçaram nossas
mãos.

— Você está aqui agora, Noah, — disse ela calmamente.


— É isso que importa.

33 Tipo de peixe.
Minha mandíbula apertou com força que me vi
assentindo. Por um breve momento, permiti que meus dedos
apertassem os dela, uma âncora que eu não pedi e nem
esperava, mas ainda tinha dificuldade em abrir mão.

Enquanto eu soltava meus dedos dos dela, o toque de pele


em pele me fez respirar de maneira desigual.

Ridículo.

Esse era o problema de escolher uma vida celibatária, não


era? Um pequeno toque de sua pele na minha me fez
desesperadamente tentar controlar cada impulso de homem
das cavernas galopando por minhas frágeis veias.

Carregando sua mala para ela, mostrei a ela o quarto


principal em frente ao quarto da família, mas era inteligente o
suficiente para não segui-la. Meus olhos pousaram
brevemente na cama king size enquanto ela colocava a mala
nela.

E ainda assim, fechei a porta para lhe dar um pouco de


privacidade enquanto levava minhas próprias coisas escada
abaixo para a cama que minha avó me designara pelas
próximas duas noites. Não era tão grande nem tão confortável,
mas não pude deixar de sentir uma pequena sensação de alívio
por haver um lance inteiro de escadas me separando de Molly.

Quando voltei para o andar de cima, todos estavam


sentados à longa mesa de madeira, enquanto minha avó servia
colheres perfumadas de carne assada e molho. Era o tipo de
refeição caseira que eu nunca recebia, a menos que eu
dedicasse algum tempo para fazer eu mesmo.

Mediante sua firme instrução, Marty colocou a câmera de


lado para a nossa primeira refeição. Não há aparelhos
permitidos na mesa, ela disse. Do jeito que Rick sorriu, eu
sabia que eles já tinham planejado nos dar essa refeição de
interação não filmada, mas pelo menos eles tiveram a gentileza
de fazê-la acreditar que era ideia dela.

A noite passou rapidamente, apesar de quão tarde o sol


começou a se pôr no verão. Nós cinco conversamos e rimos
facilmente, minha avó contando histórias de como eu era
quando criança quando eu visitei nos verões e nas férias de
primavera com meu pai.

Rick fez perguntas, e mesmo sabendo que ele estava


fazendo isso com o objetivo do documentário, se a câmera
estava rodando ou não, nada parecia forçado ou
desconfortável.

Toda a refeição e a limpeza depois, quando Molly insistiu


que minha avó relaxasse no sofá para que os homens
pudessem puxar seu peso na cozinha, tínhamos uma sensação
quente e constante. Como se estivéssemos sentados em um
barco ancorado em um lago calmo.

Houve um vai e vem suave na conversa, incutindo uma


sensação de conforto tão sonolenta que senti minhas
pálpebras pesarem uma vez que a cozinha estava limpa e eu
pude me espalhar na poltrona reclinável que costumava
pertencer ao meu avô.

— Quem está acordando comigo de manhã para


alimentar os cavalos? — Vovó perguntou.

Molly sorriu. — Eu vou!

Meu olhar afiou em seu rosto, algo que eu mal me permiti


fazer a noite toda. — Sério?

— Eu amo cavalos, — disse ela sinceramente.

— Você ama acordar ao nascer do sol?

Ela fez uma careta e todos rimos.

Vovó se levantou da cadeira e beijou Molly no topo da


cabeça. — Se você acordar, acordou, mas eu te perdoarei se
você decidir dormir, querida.

A demonstração fácil de afeto me surpreendeu, e


claramente surpreendeu Molly porque suas bochechas
coraram quando ela olhou para minha avó. — Ok.

Me levantei e envolvi a vovó em outro abraço. — Boa noite.

Ela deu um tapinha no meu peito novamente,


provavelmente porque era muito pequena para alcançar meu
rosto. — Boa noite, nanico.

Marty riu baixinho e eu o reprimi com um olhar.

Rick também foi para a cama, deixando eu, Molly e Marty.


Molly se levantou e caminhou até as janelas, onde meu
primeiro telescópio ainda estava posicionado. Ela olhou para
mim por cima do ombro. — Seu?

Assentindo, me juntei a ela, embora mantivesse uma


distância segura entre nós, devido à presença de Marty e à
minha própria sanidade. Principalmente minha sanidade
mental, pensei ao sentir seu cheiro de xampu frutado. Eu
queria enterrar meu rosto inteiro nesse cabelo.

— Ela comprou para mim quando eu tinha doze anos. —


Inclinei-me e alinhei com a ocular, depois me afastei para
ajustar alguns botões laterais para fixar o foco. Mais do que
provável, ele permaneceu intocado por anos. Quando olhei
novamente, eu cantarolava. — Venha ver. Você pode ver a
Virgo34.

— Realmente? — Ela correu e se inclinou. — Como sei o


que estou vendo?

— A estrela mais brilhante, Spica35, é o ponto de partida


na parte inferior. Então você segue mais uma estrela até
Porrima36. Essa é outra fácil de detectar.

Ela cantarolou. — Elas todos parecem muito brilhantes


para mim.

34 Virgo, a Virgem, é uma constelação do zodíaco. O genitivo, usado para formar nomes de estrelas, é
Virginis. As constelações vizinhas, segundo as fronteiras modernas, são o Boieiro, a Cabeleira de
Berenice, o Leão, a Taça, o Corvo, a Hidra, a Balança e a Serpente.
35 Espica é uma estrela binária e a mais brilhante da constelação de Virgem.
36 Faz parte da constelação de Virgo.
Eu rio. — Vou mostrar como é a aparência de um
diagrama. Depois de conhecer as formas, é mais fácil
selecioná-las.

Molly se endireitou e me deu um olhar curioso. Um


pedaço sedoso de seu cabelo deslizou para fora do seu rabo de
cavalo e enrolou-se pelo pescoço. Antes que eu soubesse o que
estava fazendo, peguei com dois dedos e esfreguei a ponta do
meu polegar contra o cabelo dela. Sua boca se abriu com uma
inspiração irregular e seus olhos passaram de mim para Marty.

Certo.

Larguei o cabelo dela e dei um passo para trás.

— Estou muito cansada, — disse ela com cuidado. — E


eu realmente quero ajudar sua avó amanhã com os cavalos.

Minhas mãos se fecharam em punhos para não alcançá-


la. Minha mente nem se permitia processar o que eu fiz.
Enquanto ela dizia boa noite, voltei para a janela.

Em um curto tempo, parecia que esse lugar havia


desmantelado implacavelmente todas as barreiras mentais que
eu mantinha amarradas firmemente a mim mesmo.

— Parece que estamos em outro universo, não é? — Marty


perguntou. Ele não sabia o que estava passando pela minha
cabeça.

— Sim, — eu concordei. — Eu precisava disso mais do


que percebi.
Ele saiu do sofá e me deu um tapinha nas costas. — Bom.

Marty também me deu boa noite, e eu fiquei de pé junto


à janela, observando as estrelas cada vez mais brilhantes
enquanto tudo ao seu redor continuava a escurecer.

Exceto que eu não estava tentando colocar as estrelas,


seguir as linhas ou encontrar os padrões que eu conhecia, bem
como as linhas na minha mão. Tudo o que pude fazer foi
pensar em Molly no quarto à minha esquerda.

A água ligou no banheiro, e eu apertei meus olhos com


força enquanto a imaginava lavando o rosto, depois mudando
para o que quer que ela dormisse antes de deslizar entre os
lençóis da cama que normalmente eram meus.

Nada aqui parecia normal.

E o mais desconcertante de tudo foi o quanto eu não me


incomodei com isso.

Não havia lista de verificação nem cronograma.

Nenhuma regra a seguir, além das autoimpostas. Essa


falta de estrutura deveria ter me deixado desconfortável. Mas,
em vez de desconforto correndo por mim, era inquietação.

Um tipo nervoso de energia que não tinha saída. Era


como eu me sentia antes de um jogo. Naqueles dias, eu podia
prender as almofadas e a camisa, prender os dedos e amarrar
as chuteiras, sabendo que me esforçaria até a exaustão no
gramado. Eu atacava, corria, batia e encontrava um lugar
seguro para colocar tudo o que mantinha trancado tão
apertado durante a semana. E aquelas rajadas afiadas, como
um tiro disparado, me mantiveram calmo e firme quando
terminava.

Mas isso... isso era tortura.

Pelo menos trinta minutos se passaram antes que eu


ouvisse a lenta rotação da maçaneta da porta.

Meu coração disparou e eu me mantive o mais imóvel


possível. Talvez ela não me visse de pé no escuro, dado que
apenas uma pequena lâmpada ainda estava acesa sobre o
fogão.

Eu tentei não respirar, tentei meditar, acalmar minha


energia ou o que quer que aquele vídeo de yoga tentasse me
ensinar a fazer para relaxar. Porque se Molly me visse, ela
falaria comigo. Se ela falasse comigo, se eu falasse com ela, eu
poderia tocá-la.

E se eu a tocasse, perderia o domínio minúsculo e frágil


que tinha sobre o meu controle.

Quando ela desgastou tudo?

Eu estava por perto em tudo isso, todas as interações, e


eu mal tinha notado ela cortando cada fio individualmente.

Seus passos macios andaram em direção à cozinha


quando ela inalou bruscamente.

— Noah, — ela sussurrou. — Eu não te vi aí.


Eu deixei meu queixo no meu peito e respirei fundo. —
Desculpe.

Volte para a cama, volte para a cama, volte para a cama,


desejei febrilmente em minha cabeça. Eu não podia me virar.
Eu não conseguia olhar para ela. Nem mesmo por um segundo.

Meu corpo inteiro ficou tenso quando o som de seus pés


descalços se aproximou.

— Eu não consegui dormir.

Que estranha intimidade era criada em momentos como


esse. Algo sobre um quarto escuro e sussurros. Sabendo que
ninguém poderia nos ver, sabendo que ela já havia se
despojado dos limites do dia, aumentava a tensão que
percorria meu corpo cada vez mais alto, algo brilhante e feroz.

Meus olhos estavam fechados com tanta força quando ela


parou ao meu lado que eu vi rajadas de branco atrás das
minhas pálpebras.

Eu provavelmente parecia ridículo.

— Você não quer saber o porquê? — Ela sussurrou. — Eu


mal conseguia ficar parada pensando se você estava aqui fora,
se estava sozinho.

— Molly, — implorei. Eu nem sabia o que estava


implorando.

Toque-me.
Não me toque.

Me dê permissão para fazer isso.

Tranque a porta do seu quarto para que não fique tentado


a rasgar em pedaços por ficar entre nós.

— Olhe para mim, — ela implorou de volta.

Lentamente, eu abri minhas pálpebras e olhei para ela.


Seu rosto estava nu, e seu cabelo, aquele cabelo glorioso que
eu tanto amava, estava em cachos bagunçados ao redor de
seus ombros. Nua, exceto as tiras finas de uma camiseta
branca. Suas pernas, cobertas apenas por shorts em tons de
branco e rosa, impossivelmente pequenos.

Ela não estava usando sutiã.

Meus pulmões, eles pararam de funcionar corretamente


ao vê-la.

— Não parece que... — Ela parou para lamber os lábios.


— Como se isso fosse inevitável?

— O que? — Eu murmurei. Ela era tão bonita na


penumbra que minhas cordas vocais pararam de funcionar
também. Eu queria devorá-la.

— Você e eu, — ela respondeu calmamente. Seus olhos


estavam enormes em seu rosto, e eles procuraram os meus tão
profundamente que eu senti isso no lento movimento do meu
coração. — Mesmo que seja apenas... aqui.
Eu pisquei. — Aqui?

Ela riu baixinho. — Essa pode ser a ideia mais idiota que
eu já tive, mas estava me revirando naquela cama, tentando
descobrir uma maneira disso fazer sentido na minha cabeça.
Você e eu, jogados juntos assim. E agora, neste lugar que está
tão longe de qualquer complicação. Eu não consigo parar de
pensar naquele beijo, Noah, e sempre que você olha para mim,
eu sei que você também não pode. Não vejo como é possível
deixá-lo em apenas isso. Não com o quanto foi bom.

Minha mão levantou lentamente, e eu a deslizei contra a


pele sedosa de seu pescoço, permitindo que meus dedos
emaranhassem em seus cabelos enquanto eu segurava a parte
de trás de seu pescoço esbelto.

— O que você está dizendo, Molly?

Molly ergueu o queixo e me bateu com toda a força do seu


olhar, toda a força de qualquer decisão que ela tivesse tomado
antes de sair pela porta.

— Eu quero que você volte para o quarto comigo. Quero


que tenhamos essas duas noites, para tirar o que quer que isso
esteja entre nós do nosso sistema. Sinto como... como se
tivéssemos colocado uma roda em movimento dez anos atrás,
e precisamos disso para fazê-la parar.

Se eu tivesse agarrado a ponta desgastada de um fio vivo,


ele não teria um efeito tão poderoso em mim. Meu corpo inteiro
estremeceu com a força dele.
— Essas duas noites, — repeti.

Ela assentiu devagar. — O que acontece em Dakota do


Sul, fica em Dakota do Sul.

Que ela pudesse me fazer sorrir naquele momento deveria


ter me aterrorizado, mas não o fez. Parecia certo. E como ela
disse, parecia inevitável.

Molly inclinou o queixo, convidando meu beijo, mas


balancei minha cabeça. Meu polegar puxou a generosa curva
de seu lábio inferior.

— Se eu beijar você aqui, não poderei parar tempo


suficiente para ir para a cama, e se eu ficar uma noite inteira
com você... — Eu deixei minha testa contra a dela e respirei
estremecendo. — Então eu preciso de espaço para trabalhar.

Molly choramingou.

Foi o último fragmento, o cordão final se partindo com um


estalo audível.

Lentamente, sem pressa, com uma medida de controle


que eu não sabia que me restava, deslizei minha mão por seu
ombro, seu braço, seu pulso e passei meus dedos pelos dela.
Então eu a levei de volta para o quarto.
TUDO ASSUMIU UMA QUALIDADE NEBULOSA, obscura e
decadente quando a porta se fechou atrás de mim. Como se
alguém mudasse o filtro através do qual eu vi tudo, e isso
desligou meu cérebro no mesmo movimento. Minhas mãos
nem pareciam pertencer a mim quando eu girei e empurrei
Noah contra a porta.

Sua expressão estava proibindo o movimento, e eu tremi.

— Tire sua camisa, — eu pedi.

Ele levantou o queixo. — Você primeiro.

Houve um momento em que nós dois congelamos desse


jeito, não querendo abrir mão do controle para a outra pessoa.
Então nós colidimos. Sua boca pegou a minha, áspera, dura e
profunda. Suas mãos subiram por baixo da minha bunda, e eu
envolvi minhas pernas em volta de sua cintura.

Lábios, dentes e língua, escorregadios e bagunçados. Eu


estava esperando por isso, pensei, desde o momento em que o
vi no elevador. Esperando a força de seu corpo contra o meu,
me dominando da melhor maneira possível.
Ele tinha gosto mentolado e fresco, e sua língua se
enrolou na minha enquanto seus dedos cavavam minha carne
até doer.

Isso não foi doce, e não foi lento quando eu puxei sua
camisa.

Eu queria minhas mãos nele, agora que ele tinha me dado


permissão para isso. Nada seria suficiente até que
estivéssemos ofegantes, exaustos e suados no meio daquela
cama excepcionalmente grande. Ele me jogou de volta e eu
pulei com uma risada.

Mas minha risada morreu ao olhar em seu rosto.

Este era um homem empurrado para o limite de sua


sanidade. Por mim.

Eu tinha feito isso com ele, e isso enviou uma onda de


poder tão molhada e quente através do meu corpo. Algo me
dominou com essa realização, e eu me sentei de joelhos
quando ele rasgou a camisa e a jogou no chão. Minha camisa
foi junto, e seus olhos escureceram ainda mais quando eu me
deitei e comecei a empurrar meu short para baixo em
movimentos lentos e revirados dos meus quadris.

— Pare, — ele rosnou.

Minhas mãos congelaram. Um dedo brincava com a borda


elástica.
Noah empurrou a bermuda, sua cueca boxer com ela, e
eu lambi meus lábios ao ver sua gloriosa nudez.

Esta foi a minha melhor ideia de sempre.

Eu nem percebi que tinha dito isso em voz alta até que
um sorriso largo e brilhante surgiu em seu rosto. Essa breve
pausa da versão áspera e perigosa de Noah, a que parecia
pronta para me comer inteira, teve um efeito totalmente
diferente em mim. Um que era tão potente.

— Já faz um tempo para mim, — ele admitiu, deslizando


as mãos pelas minhas pernas quando elas se abriram para ele.

— Faz? — Eu engasguei, inclinando meu queixo quando


ele pegou a borda do meu short com dedos segurando
firmemente. — P-para mim também.

— É por isso que esta primeira vez será rápida e dura. —


Ele se inclinou sobre mim e tomou minha boca novamente em
um beijo tão sujo que eu comecei a me contorcer de alívio.

— Sim, por favor, — implorei.

Ele sorriu de novo. Meu short foi tirado e ele se inclinou


para trás para me encarar descaradamente.

— Da próxima vez, — ele disse com uma voz áspera e


desigual. Suas mãos agarraram meus quadris e me
pressionaram na cama. — Da próxima vez, vou levar o meu
tempo. — Ele segurou um seio e rolou o polegar. — Aqui. — A
mão dele deslizou entre as minhas pernas. — Aqui. — Ele
mordeu meu lábio inferior. — Em toda parte.

— Noah, — eu gemi.

Ele rondou entre as minhas pernas, e quando eu registrei


a sensação de cada pedaço de músculo em seu peito
pressionando contra minha pele macia, minhas costas
arquearam para que eu pudesse sentir mais, mais e mais.

Houve uma pausa antes que ele cumprisse sua promessa


de rápido e duro, ambos os adjetivos igualmente emocionantes
para mim e, naquele momento, seus olhos estavam nos meus.

Isso importa.

Era difícil lembrar nossa promessa de duas noites, desse


espaço protegido para exorcizar o que estava se formando entre
nós quando compartilhamos um olhar, um momento, uma
respiração tão pesada e comovente. Mas então ele se moveu
para frente, em um deslizamento longo e lento, e com um
gemido profundo de seu peito enorme, eu esqueci tudo, menos
ele.

Ele não parou até estar apertado contra mim, e seus


braços se curvaram sob meus ombros e me aconchegaram
firmemente contra seu peito. Eu tive que engolir um soluço alto
de alívio pela maneira como ele estava enrolado em torno de
mim, em mim, me enchendo.
Por outro momento, ele ficou impossivelmente imóvel, e
isso me fez mover meus quadris em um movimento inquieto e
ansioso. Ele respirou fundo entre os dentes.

— Molly, — ele gemeu. — Eu não posso... eu não posso...

Segurei seu rosto e chupei seus lábios. — Se você parar


agora, eu vou te matar enquanto dorme.

Noah encostou sua testa na minha. — Depois que me


mexer, não vou me segurar. Não quero te machucar.

Eu escovei meu nariz contra o dele. — Me dê tudo, — eu


sussurrei. — Eu aguento.

E ele fez.

Com uma forte respiração contra a minha pele que


parecia que ele estava me marcando com golpes quentes, Noah
se afastou e, fiel à sua palavra, me deu tudo o que tinha.

Era tudo o que eu podia fazer para segurar quando ele se


moveu com investidas implacáveis de seus quadris, liberando
sua força nos músculos que me prenderam na cama. Eu bati
a mão em sua boca quando ele gemeu alto, e eu tive que
morder meus próprios lábios quando senti a onda de prazer, a
explosão brilhante de êxtase que me separou.

Por trás dos meus dedos, ele gritou bruscamente e depois


diminuiu seus movimentos. Inclinei minha pélvis para puxar
cada último pulso de prazer e finalmente abri minha boca para
beijá-lo profundamente. Ele enroscou os dedos nos meus
cabelos e deixou todo o peso de seu corpo colapsar no meu.
Coloquei meus braços em volta de suas costas e segurei com
respirações profundas e trêmulas.

Quando ele tentou sair de mim, eu apertei meus braços e


ele riu. Sua pele cheirava a sabão masculino, e eu queria ficar
chapada. Eu praticamente já estava. Nesta cama, neste quarto,
eu poderia facilmente fingir que nada existia além de mim e
Noah.

— Você não tem permissão para sair ainda, — eu o


informei altivamente.

Noah se afastou surpreso. — Não?

Eu balancei minha cabeça. — Isso faz parte do acordo de


Dakota do Sul. Se tivermos apenas duas noites, eu tenho o
máximo de compartilhamento de cama.

Seus olhos traçaram meu rosto, e o sorriso satisfeito que


ele usava fez coisas engraçadas no meu interior. Eu nunca o
tinha visto tão em paz. Tão feliz. — Apenas correndo para o
banheiro, garota gananciosa.

Gananciosa. Um termo tão apropriado, pensei enquanto o


observava passear nu da cama para o banheiro adjacente. Ele
soltou um gemido satisfeito, que me fez enterrar meu sorriso
idiota no travesseiro embaixo da minha cabeça. Sim,
gananciosa estava certo. A luz fraca do banheiro refletia nos
ângulos e linhas de seus músculos quando ele voltou.
Eu queria guardá-lo. Agarrá-lo a mim e impacientemente
exigir mais de seus lábios, língua e mãos. Se eu pudesse
coletar um punhado dessas lembranças obscenas de Noah
Griffin, eu precisaria que elas fossem boas.

Ele deve ter se sentido da mesma maneira, porque


durante as próximas duas horas ele ficou insaciável. Muito
provavelmente o subproduto da retenção por tanto tempo
quanto ele ficou. Se os rumores eram verdadeiros, Noah tinha
anos de tensão sexual não gasta que precisava ser
desencadeada em algum lugar, e oh doce misericórdia, fiquei
feliz por ser eu quem estava me beneficiando. Novamente. E de
novo. E de novo.

No momento em que perdi a conta de quantas vezes ele


me levou ao clímax, eu estava tão exausta que meus olhos mal
conseguiam ficar abertos, e ainda assim suas mãos não
pararam de correr pelas pontas apertadas dos meus seios ou
pela curva da minha bunda... ele realmente gostava de lá. O
buraco do meu umbigo. Noah estava guardando suas próprias
lembranças, e eram duas e meia antes de cairmos em um sono
profundo, seus braços enrolados em volta de mim enquanto eu
deitava encostada ao seu lado.

Acordei brevemente quando ele desceu, e ainda estava


escuro lá fora.

— Que horas são? — Eu murmurei quando ele beijou


minha testa.
— Cedo. Eu só preciso descer as escadas antes que
alguém acorde, — ele sussurrou. — Volte a dormir.

Como uma boa garota que havia sido fodida ao


esquecimento a noite toda, fiz o que me disseram.

Quando acordei, estava claro, e os sons da pequena


fazenda ecoaram no meu quarto. Eu me estiquei e não
consegui parar o feliz estremecimento em todos os lugares em
que senti evidência da minha noite com Noah.

Deliciosamente dolorida, como eu havia lido em quase


todos os romances que eu tanto amava.

Era muito usado porque era preciso.

Tomei banho e saí da sala com meu rosto de jogo.

Não haveria olhares drogados pelo sexo em sua direção.

Sem sonhar acordada com o quão firme suas mãos


seguravam meus quadris durante a terceira ou foi a segunda?
rodada.

Sem olhar para ele e lembrar como ele era quando ele
pressionava meus joelhos e os apoiou em seu peito.

E fizemos bem.

Alimentar os cavalos com a avó dele foi tão emocionante


quanto eu pensava, e ela riu de mim quando eu pulei na ponta
dos pés ao pensar em escová-los para ela. Ocasionalmente,
senti olhos em mim enquanto trabalhávamos no celeiro, mas
nunca peguei Noah olhando em minha direção.

Quando Rick sugeriu que eles passassem pela


propriedade, eu os segui. E mesmo que eu pensasse que minha
presença era completamente supérflua em todo esse processo,
ninguém parecia questionar.

Noah não precisava de nada de mim, especialmente


porque sua reação honesta a todo esse ajuste foi o ponto do
documentário em primeiro lugar. Rick e Marty também não
precisavam de mim. Eles já haviam feito isso antes e sabiam
que qualquer coisa negativa capturada no filme seria removida
durante a edição, provavelmente a pedido de Beatrice.

Por que ela achou necessário eu estar aqui?

Era estranho chegar a essa conclusão agora, de todos os


lugares. O lugar onde eu me sentia mais livre do que em muito
tempo. Onde Noah claramente também se sentia. Mas era a
verdade. Eu assisti por trás de Marty enquanto eles filmavam
Noah e sua avó pescando em um lago que estava escondido da
vista atrás do celeiro. Não pude deixar de agradecer por estar
aqui, mas a verdade era que não havia razão para isso. Minhas
irmãs questionaram, mas agora eu me perguntava se não
havia outra razão.

Rick veio até mim e encontrou um assento na grama. —


Você está quieta hoje.

Eu sorri para ele. — Apenas aproveitando o dia.


Ele assentiu. Sua boca se abriu como se ele fosse dizer
alguma coisa, mas ele balançou a cabeça e parou.

— O que? — Eu perguntei a ele.

— Só... curioso sobre uma coisa, — disse ele com


cuidado, vendo Noah e sua avó rindo. Estávamos sentados
longe o suficiente para ficar fora do alcance da voz, e eu gostei
mais dessa maneira. Dar a eles privacidade onde eles poderiam
levá-la. — Por que você acha que ele ficou longe por tanto
tempo?

Minhas sobrancelhas se levantaram com sua pergunta.


Era a primeira vez que Rick pediu minha opinião sobre algo
dessa magnitude. Mas eu supunha que era seu trabalho
investigar as camadas ocultas de seus súditos. Era o que o
fazia bom em seu trabalho.

— E você quer saber o que eu acho?

Ele assentiu. — Eu quero. Você é intuitiva. Você tem bons


instintos quando se trata de lidar com alguém como ele, que
estava claramente hesitante sobre isso. Agora olhe para ele.
Ele mal percebe quando estamos por perto.

Eu ri. — Eu não sei sobre isso. — Não estava perdido para


mim que eu tinha ignorado seu elogio, me concentrando em
suas observações sobre Noah. — Mas obrigada, — eu disse
cuidadosamente. — Gosto do meu trabalho. Sempre gostei.
— Você é boa nisso. — Ele me cutucou com o ombro. —
É por isso que estou curioso sobre o que você vê quando olha
para ele.

Meu rosto ficou quente, e eu estava tão incrivelmente


agradecida que Rick não estava olhando para mim. Eu pensei
que sim, tantas coisas inapropriadas quando olhei para Noah,
nenhuma das quais Rick precisava saber. Limpei minha
cabeça das maneiras mais escandalosas em que eu poderia
responder a essa pergunta e foquei na cena à nossa frente.

— Eu acho, — comecei devagar, — que é mais fácil para


alguém como Noah manter o foco quando ele mantém os olhos
vendados para todo o resto, além do futebol. Provavelmente em
detrimento dele. Passando o tempo com a avó dessa maneira,
provavelmente parece que, eu não sei, uma intrusão no
processo dele, se ocorrer na hora errada. Então ele o ignora.
Não acho que significa que ele a ame menos, mas acho que ele
é tão bom em compartimentar sua vida que se separou de tudo
fora do futebol que importa. — Suspirei. — E isso é triste.

O olhar de Rick estava pesado em mim, mas eu não me


virei para encontrá-lo. Eu não queria saber o que ele veria nos
meus olhos, na minha cara, na minha resposta.

— Eu acho que você foi certeira, — disse ele depois de um


minuto.

Eu olhei para ele quando senti que meu rosto estava em


uma máscara mais controlada. — Sim?
— Mas é mais do que triste, — continuou ele. — É de
partir o coração. Quando você observa as pessoas como eu,
como Marty, você vê para onde elas estão indo. Às vezes, antes
disso. E alguém como Noah deixará sua vida passar
despercebida quando se aposentar. Ele terminará de jogar e
não terá mais nada, exceto alguns troféus que não significam
nada. Registros que não têm peso, exceto alguma importância
arbitrária que um único grupo pequeno de pessoas coloca nele.
Registros que podem e serão quebrados por outra pessoa
algum dia.

Meus olhos se encheram de lágrimas e pisquei


rapidamente para empurrá-las de volta.

— E não há nada que eu possa dizer que possa mudar


isso para ele, — Rick disse tristemente. — Ele tem que
descobrir isso por si mesmo. — Ele parou e olhou para mim
novamente. — Eu apenas rezo para que ele não... — Ele parou
e exalou pesadamente. — Merda, eu não sei.

— O que?

Rick me perfurou com um olhar sério. — Rezo para que


ele não machuque alguém incrível no processo.

Minha boca se abriu.

Ele sabia.

— Rick, — eu sussurrei.
Ele levantou a mão. — Apenas divagações de um homem
que já viu muitas coisas. Ok? Isso é tudo.

Mesmo que meu coração estivesse batendo forte no meu


peito, balancei a cabeça lentamente.

Suas palavras viraram e giraram e caíram na minha


cabeça pelo resto do dia. Fiz questão de ficar atrás de Marty
porque tinha tanto medo do que ele poderia pegar no meu rosto
se a câmera girasse em minha direção.

Fiquei quieta durante o jantar, outro delicioso caso de


carboidratos e carne, feito com óbvio amor. Noah ficou olhando
na minha direção, mas eu mantive meus olhos longe dele,
porque eu estava com medo de que estivesse escrito em todo o
meu rosto.

Eu poderia me apaixonar por você tão facilmente.

E você partiria meu coração se não pudesse me amar de


volta do jeito que eu mereço.

Porque Rick estava certo.

Não era meu trabalho fixar as prioridades de Noah. Não


era meu trabalho mostrar a ele que ele poderia ter as duas
coisas. Ele poderia ter uma vida cheia de amor e família e ser
o melhor em seu trabalho enquanto tivesse a sorte de fazê-lo.

Eu fingi ler um livro enquanto os caras jogavam um jogo


de cartas com a avó de Noah e todos lentamente marchavam
para a cama.
Antes de Marty subir as escadas, eu disse boa noite e
mantive meu rosto enquanto batia a porta atrás de mim. Uma
única lágrima escorreu quando eu lavei meu rosto, eu girei a
torneira para ficar fria e me tirar disso.

Cerca de uma hora depois, enquanto olhava sem pensar


para a tela do meu telefone, onde estava encolhida debaixo das
cobertas, ouvi Noah se aproximar da porta. Prendi a respiração
e, quando ele bateu suavemente, saí de debaixo do cobertor e
abri para ele.

Seus olhos procuraram meu rosto enquanto ele entrava.


— Você está bem? Você esteve tão quieta hoje.

Se uma palavra escapasse dos meus lábios sobre como


eu estava me sentindo, eu cobriria as paredes com meu estado
emocional confuso. Então eu balancei a cabeça, minhas mãos
alcançando a barra da camisa para puxá-la sobre sua cabeça.
Ele obedeceu, mas pareceu preocupado quando o jogou no
chão.

— Molly, — disse ele, deslizando as mãos em volta da


minha cintura. — Está claro que algo está errado. Fale comigo.

Eu respirei fundo. — Temos uma noite, Noah. Você quer


gastar conversando? Porque eu não.

A indecisão guerreava nos belos traços cinzelados de seu


rosto. — Eu faço se houver algo importante em sua mente.

Com um autocontrole que eu não sabia que possuía,


deslizei minhas mãos pelo meu peito e puxei seu rosto para o
meu. Um gemido veio de seus pulmões quando eu puxei seu
lábio com os dentes. Arrepios irromperam sobre a minha pele
ao som disso.

Empurrei tudo, exceto a maneira como ele se sentia sob


meus dedos errantes, toda preocupação, dúvida, todo instinto
que me dizia que essa última vez só seria mais difícil para mim
quando voltássemos para Seattle.

Mas eu não ignoraria a oportunidade quando ela me foi


dada.

Fazer essa escolha foi importante.

Me inclinei na ponta dos pés e o beijei, enfiando as mãos


nos cabelos exuberantes e sedosos, puxando-o. Ele mudou o
ângulo do beijo, e eu senti o momento em que seu cérebro se
desligou e seu desejo assumiu.

Pelo resto da noite, esse impulso reinou sobre nós, e nós


o permitimos com cada toque e beijo e sussurrando um apelo
na pele um do outro.

Quando ele queria me ver toda, eu montei em seus


quadris e subi acima dele, mãos apoiadas em seu peito, por
uma rodada lenta e doce que deixou meu corpo brilhando com
suor por satisfação atrasada.

Quando eu queria que ele soltasse toda a sua força, ele


me virou de bruços, onde os travesseiros abafaram meus
soluços de gratificação quando finalmente se abriu.
E quando soubemos que ele deveria estar saindo do
quarto, nos permitimos uma última vez. Nenhuma palavra
passou entre nós, mas ele me tocou em todos os lugares, me
provou em todos os lugares, e eu fiz o mesmo. Ele se moveu
tão devagar e com tanto objetivo, deixando o desejo crescer e
crescer até que eu engoli um grito quando terminamos ao
mesmo tempo. Uma lágrima rolou pela minha têmpora
enquanto eu estava debaixo dele, tentando recuperar o fôlego,
e ele a pegou com os lábios.

Eu assisti silenciosamente enquanto Noah vestia seu


short e camiseta, seu rosto uma máscara ilegível.

As máscaras estavam voltando.

Assim como a minha.

Ele ficou em cima da cama e olhou para mim, e quando


pensei que ele se viraria para sair, saí da cama. Ele me pegou,
passando os braços em volta de mim e pegando minha boca
em um beijo ardente.

Desceu devagar até que ele não fez nada além de me


abraçar enquanto eu o respirava.

— Eu sei que isso é a coisa certa a fazer, — disse ele no


alto da minha cabeça.

Meus olhos se fecharam quando aconcheguei meu rosto


em seu peito. — Eu também.
Eu não sabia, no entanto. Eu não tinha certeza absoluta
de acreditar nisso. Certo. Errado. Eles eram tão subjetivos com
base em quem você estava perguntando, não eram?

Talvez a afirmação em que eu pudesse concordar fosse


que essa era a coisa mais inteligente a se fazer. O mais provável
é permitir o sucesso que ele ainda estava perseguindo com as
duas mãos e me dar o mesmo resultado.

— Mas eu vou pensar sobre isso, — ele admitiu com uma


voz áspera. — Vou pensar em você, Molly, e quero que saiba
disso.

Eu tive que revirar os lábios para não dizer a ele que


estava me apaixonando por ele. Porque ele não tinha espaço
para algo assim em sua vida, e eu não tinha espaço para esse
tipo de complicação na minha. Então tudo que eu pude fazer,
sabendo que estávamos saindo no dia seguinte, de volta a um
mundo onde fingiríamos que isso não tinha acontecido, fui dar
a ele outro beijo suave e mentir sobre o que ele significava para
mim.

— Eu vou pensar em você também, Noah.

Ele se afastou do meu abraço e, em alguns passos de suas


longas pernas, ele se foi.
A PARTE MAIS ESTRANHA de retornar a Seattle foi o fato de
ninguém parecer notar que havia algo diferente. Quando
cheguei em casa, Isabel me cumprimentou com um sorriso,
querendo saber como foi o fim de semana.

Quando Paige parou algumas horas depois porque


Emmett queria nos mostrar algo, não havia olhares curiosos e
persistentes no meu rosto, e ninguém perguntou se algo tinha
acontecido.

E, por mais protetora que eu me sentisse sobre aquelas


duas noites e no que aconteceu naquela cama grande, fiquei
aliviada.

Pela primeira vez desde que me lembrava, aconteceu algo


na minha vida que não queria compartilhar com minha família.
Minhas irmãs eram minhas melhores amigas, e Paige era tão
próxima como uma mãe para mim, mas eu não queria
confidenciar, discutir ou separar nada sobre meu tempo em
Dakota do Sul.

Normalmente, nós faríamos.


Mas o resto do meu domingo em Seattle foi... normal.

Cheguei ao trabalho, me sentindo rejuvenescida depois


de uma boa noite de sono, algo que não tive em Dakota do Sul
devido a um Noah Griffin. E a falta de sono daquele fim de
semana não era nada que não pudesse ser ocultada por um
bom corretivo, que apliquei generosamente ao me arrumar
naquela manhã.

Meu escritório estava quieto e arrumado quando entrei, e


eu mal tinha lido os itens que estavam na minha caixa de
entrada antes que uma mensagem de Beatrice aparecesse no
meu telefone.

Beatrice: Adoraria ouvir como foi o fim de semana. Estou


livre depois do almoço.

Não era uma sugestão, era como uma convocação. E


fiquei com uma coceira no estômago ao pensar em encará-la
através da extensão de sua mesa. Beatrice esteve muito, muito
longe da minha mente naquela cabana nas montanhas. Seu
pedido de não confraternização também foi algo que eu havia
quebrado. Algumas vezes. Mas não havia realmente sentido em
contar quantas vezes, honestamente.

Ignorando as ramificações do que aconteceria se ela


descobrisse, eu já começara a formular a opinião de que toda
essa proximidade forçada com Noah não ajudava nenhum de
nós. Especialmente agora. Eu era uma garota de recados
glorificada, andando pela equipe de filmagem do jeito que eu
estava fazendo. Talvez essa tenha sido a vantagem
desagradável da promoção de Beatrice.

Colocar batom em um porco37, por assim dizer.

Ela agiu como se estivesse me fazendo um favor, mas, na


realidade, o trabalho que eu havia feito antes era mais
desafiador, me mantinha mais ocupada e, no geral, poderia
gerar a mesma receita para Washington se eu fizesse esse
trabalho bem.

Olhando para a agenda de filmagens pregada no quadro


atrás da minha mesa, eu sabia que Marty e Rick não estariam
por perto hoje. Provavelmente em seus próprios escritórios
passando por tudo o que pegaram no fim de semana. Quando
bati a caneta sobre a mesa, pensei nas últimas semanas. Eu
pensei em Marty. E Rick. A caneta diminuiu a velocidade;
minha frequência cardíaca acelerou. E pensei em Noah.

De frente para ele.

Estar perto dele.

Tentando fingir que nada havia acontecido e vendo-o


fazer o mesmo.

Era uma receita para o desastre, e eu não podia nem me


importar com o que dizia sobre mim, porque não achava que
poderia empurrá-lo para baixo e fazer o meu trabalho. Não

37 Um termo usado por muitos, geralmente em referência a alguém que pode estar tentando fazer
algo ou alguém olhar atraente ou atraente quando ele claramente não vai funcionar, ou só vai enganar
o mais burro das pessoas.
havia nada de sexy sobre nós tentando esgueirar-nos agora
que estávamos de volta à realidade em Seattle.

Mesmo se tivéssemos concordado em tentar, não via nada


de divertido ou emocionante em tentar esconder um
relacionamento com ele. Nós dois éramos muito pragmáticos
para isso.

Puxei um bloco de papel da gaveta superior da minha


mesa e comecei a rabiscar as coisas. Passando de um lado para
o outro entre o meu computador e sempre que surgia alguma
coisa, eu me sentia pronta para me encontrar com Beatrice
quando pegava algumas sobras frias no almoço. Estar longe de
Noah significava que minha cabeça estava mais clara, e isso
era difícil de admitir.

Algo nele embaralhava minhas ondas cerebrais, e se eu


fosse honesta comigo mesma, isso sempre fora verdade. Minha
carreira de iniciante começou aos dezesseis anos por causa do
efeito Noah. E veja onde isso chegou a todos nós.

Agora eu perderia algo ainda mais precioso se não


tomasse cuidado. Eu ia perder meu coração. Duas noites em
Dakota do Sul eram uma coisa, mas vê-lo na minha frente, dia
após dia, era outra.

Afastei-me da mesa e enfiei meus pés de volta nas minhas


sapatilhas antes de fazer o meu caminho pelo corredor para o
escritório de Beatrice.
Por respeito, bati minhas juntas levemente contra a
porta, mesmo que estivesse escancarada, e eu podia vê-la
digitando no computador.

Ela se virou na cadeira e me deu um pequeno sorriso. —


Entre, Molly. Momento perfeito.

— Sim?

Seu rosto suavizou-se naquela expressão agradável e


plácida que a favorecia, embora eu pudesse senti-la me
estudando com cuidado. Desde que cheguei em casa, ninguém
tinha me olhado assim, e lutei para não me mexer enquanto
me sentava em frente a ela. — Eu tenho tentado falar com Rick,
e ele parece estar... como eu digo isso... me evitando?

Minhas sobrancelhas se curvaram. — Sério? Isso não


parece com ele.

— Não. Ainda pedi mais imagens brutas, atualizações


sobre como está indo, e ele ignorou todos os pedidos nas
últimas duas semanas. Ou ele me ilude com uma atualização
branda ou evita responder às minhas perguntas. — Ela
colocou os dedos na frente dela. — Tem alguma ideia do
porquê?

— Não, — eu respondi honestamente. — As filmagens


estão indo muito bem. Eles receberam muitas coisas ótimas no
fim de semana, então não consigo imaginar por que ele não
gostaria de mostrar a você.
Quando ela não respondeu imediatamente, tive a
sensação distinta de que ela estava avaliando a sinceridade da
minha resposta. Mas não importa quais conversas eu possa ter
tido com Rick, eu estava sendo sincera com Beatrice sobre
isso. Eu não conseguia entender por que ele não queria
mostrar a ela nenhuma das imagens que eles gravaram.

— Tudo bem, — ela disse. — Fico feliz em ouvir você dizer


isso. Isso me faz sentir melhor, pois sei que você está presente
sempre que eles estão filmando.

— Bom. — Eu respirei fundo. — Mas é sobre isso que eu


queria falar com você, na verdade.

Ela inclinou a cabeça, erguendo uma sobrancelha em


questão.

— Eu estive lá todos os dias desde que começaram. Muito


pouco foi filmado sem que eu estivesse lá.

— Eu sei. Isso faz parte do seu trabalho.

— Estou questionando o quanto isso é necessário, — eu


disse uniformemente.

O rosto dela não se mexeu. Nem um único músculo. No


entanto, senti uma reação atordoada dela como uma onda
pulsando pela sala. — Por que isso?

Eu me mexi no meu lugar antes de responder. — Rick não


está tentando nos prejudicar. Ele não está tentando fabricar
drama ou instigar algo falso. Ele claramente se preocupa com
Noah e quer capturar a verdade crua de como isso é para ele.
E Noah... — Minha voz vacilou em seu nome, apenas o menor
engate, mas eu a cobri limpando a garganta. — Noah está
muito mais confortável na frente da câmera do que quando ele
começou. Eles não precisam de mim, Beatrice. Sinto que estou
perdendo meu tempo e o dinheiro de Washington, pendurada
no fundo para me certificar que tudo está indo bem. E eu... —
soltei um suspiro lento — gostaria de saber se isso é algo que
você sabia que aconteceria quando me desse essa
oportunidade. Que eu me sentiria desnecessária. Como se eu
pudesse estar fazendo mais ou fazendo um maior impacto em
outro lugar.

Os olhos dela se estreitaram. — Você acha que eu te


enganaria?

Lambi meus lábios. — Não, enganar não. Mas você foi


muito honesta comigo sobre o motivo de estar fazendo isso.
Você sentiu como se eu não tivesse ganho meu emprego, que
meu sobrenome significava que eu não trabalhava tanto
quanto alguém poderia estar na minha posição. E mesmo
sabendo que isso não é verdade, não totalmente, você me disse
para provar isso a você. Mas continuando com essa
configuração, nunca poderei fazer isso.

— Por que isso?

Porque eu vou me apaixonar por Noah se você continuar


empurrando ele debaixo do meu nariz e inevitavelmente tomar
decisões mais horríveis quando eu sei que não posso ficar longe
dele. Eu pisquei o pensamento de volta.

— Porque esse papel é um desperdício do meu talento. Eu


posso fazer as duas coisas, mas não preciso estar com eles
todos os dias em que filmam. Posso me encontrar com Rick e
Marty uma vez por semana para garantir que eles tenham todo
o acesso que eles precisam dentro da organização e, se Noah
não estiver trabalhando com eles como deveria, então posso
intervir conforme necessário. Eu já provei ser capaz de me
comunicar com ele de forma eficaz.

As palavras saíam da minha boca quando eu fui golpeada


com uma lembrança vívida de quão eficaz era a nossa
comunicação naquelas duas noites.

Sim, assim mesmo. Você se sente tão bem, Molly. Tão, Tão
bem.

Meu rosto estava quente e eu mantive meu olhar firme


em minha chefe.

Beatrice se recostou na cadeira e colocou as mãos no colo.


— Você está certa, — disse ela após um longo momento de
consideração silenciosa. Eu não disse nada, mas por dentro,
eu estava esvaziando com alívio inebriante. — Um bom
funcionário fará o que for necessário. Um ótimo funcionário
encontrará maneiras de beneficiar a empresa para a qual
trabalha além do que é pedido a eles. E você admitir isso é um
sinal de que você é uma ótima funcionária.
— Obrigada, — eu respondi significativamente.

Eu já sentia o peso sair dos meus ombros, o que eu estava


tentando descobrir como carregar desde que Noah saiu do meu
quarto nas primeiras horas da manhã.

— É por isso que eu odeio que minha mente tente


imediatamente conectar seu pedido ao momento em que Rick
me ignora.

Meu cérebro parou enquanto eu processava suas


palavras.

— O-o que você quer dizer?

— Vou perguntar uma vez, Molly. Aconteceu algo


inapropriado que Rick não quer que eu saiba? Que você não
quer que eu saiba, e é por isso que você não quer estar presente
para as filmagens mais? Se alguém tentou algo ou fez você se
sentir desconfortável, então eu quero saber sobre isso.

Eu balancei minha cabeça, atordoada com a virada da


conversa. — Eu prometo a você, não estou perguntando porque
alguém está me deixando desconfortável.

— Então o contrato não foi violado?

Minha boca se abriu. Fechei. Se eu admitisse o que


aconteceu entre mim e Noah, tudo pelo que eu havia
trabalhado, o que ele começou a criar aqui, desapareceria em
um instante. — Não, Beatrice.
Ah, Merda. Estava fora da minha boca. Meu estômago se
contraiu perigosamente, mas ela parecia acreditar em mim.

Seu rosto estava duro, mas seus olhos eram gentis


quando seus ombros relaxaram. — Sinto muito ter que
perguntar isso, e que essa é a cultura em que vivemos, mas
entendo como é ser uma jovem mulher cercada por homens
poderosos e influentes. A última coisa absoluta que irei tolerar
é alguém tirando vantagem do seu desejo de obter minha
aprovação.

E isso só me fez sentir pior.

A culpa era muito mais insidiosa do que você imaginava


antes que a mentira escapasse da sua boca. Prometendo que
tudo ficaria bem. Ela nunca descobriria, e tudo estava melhor
assim.

Mas, em vez disso, me deparei com a percepção de que


ela não estava insistindo porque não acreditava em mim. Ela
queria ter certeza de que eu estava segura.

Eu levantei uma mão. — Beatrice, por favor, prometo que


nunca toleraria o tipo de tratamento que você está falando. Se
alguém sob esse teto me olhasse de maneira desrespeitosa,
meu irmão arrancaria a cabeça deles.

Pelo abrandamento da sua boca, talvez essa não fosse a


melhor resposta, dada a opinião inicial dela sobre mim, mas
era a verdade.
— E eu sei que isso não me favorece, mas também não
vou negar. Muitos jogadores veteranos me conhecem há dez
anos. Eles eram novatos quando Logan se aposentou e agora
ele é o treinador deles. Todos me amam como se eu fosse parte
da família deles. E Allie Sutton-Pierson é a melhor amiga da
minha cunhada. Confie em mim, não apenas eu tenho um
sistema de apoio tão bom neste lugar que qualquer um poderia
pedir, mas eu sei como colocar minha rótula entre as pernas
de um cara de uma maneira que o faça cantar soprano por um
mês.

Beatrice soltou uma risada contida e relaxou um pouco


enquanto deixava seu sorriso cair. — Eu entendi. E você está
certa, é difícil para mim superar o fato de que você está tão
entrincheirada no tecido deste lugar, mas... — Ela balançou a
cabeça. — Mas agora eu sei que você não o usa como muleta.
Você trabalha duro, Molly. E tenho orgulho de ser sua chefe.

Meus olhos ardiam, minha garganta inchada de emoção.


— Obrigada.

— Por favor, não chore, — disse ela secamente.

Eu rio. — Sim, senhora.

— Eu posso ter lidado com você errado desde o início,


Molly, e não posso prometer que não vou cometer mais erros.

— Você não me interpretou mal, — argumentei. — Você


tinha todo o direito de ser cautelosa.
— Não, não foi profissional da minha parte começar com
esse pé, e ainda pior quando te embosquei sobre seu passado
com Noah.

Uma pedra afundou pesado em meu intestino, cortando


ordenadamente o orgulho e a calorosa felicidade que eu sentia
apenas momentos antes, minha pele ficando fria e espinhosa.

Ela continuou. — Obviamente, certas situações


justificam um forte aviso, mas esta não é uma delas.

Meus lábios se esticaram em um sorriso tenso. —


Obviamente.

— Se você está me dizendo que esse pedido para mudar


sua agenda não nasceu disso, de alguma situação que você
não quer que ninguém saiba, então eu confio em você. Porque
você ganhou isso.

Eu me senti com cinco centímetros.

Não era assim que eu queria que ela acreditasse em mim.


Acreditasse que eu era digna de seu respeito e confiança.

— Então, — continuou ela, — se você aceitar minhas


desculpas, então tomemos isso como um novo começo, não é?

Eu me vi balançando a cabeça fracamente. — Desculpas


aceitas, — eu disse calmamente.

Beatrice assentiu de volta. — Bom. Deixe-me saber se


Rick tiver algum problema com a mudança no seu papel, sim?
— Eu vou.

No piloto automático, voltei para o meu escritório e


afundei pesadamente na cadeira. Enviei um e-mail
cuidadosamente redigido para descrever as alterações com
Rick e liguei para Marty. E pouco antes de enviá-lo, adicionei
Noah também.

Depois de apertar o botão, li novamente, tentando


conciliar, mais uma vez, todo o conceito de inteligência versus
certo.

Dormir com Noah não era inteligente. Mas parecia tão


certo.

Me separar dele agora que estávamos de volta era


inteligente. Mas parecia errado.

Me apaixonar por ele... o júri ainda não sabia se era


inteligente ou certo.

Todas as células do meu corpo estavam chorando


perigosamente pela injustiça. Meu desejo era procurá-lo em
algum lugar nesses corredores pretos e vermelhos.

Meu celular tocou na minha mão, o nome de Noah


aparecendo como se eu o tivesse chamado. Respirei trêmula e
depois respirei fundo antes de atender a ligação.

— Esta é Molly.

— Que diabos de email é esse?


Me recostei na minha cadeira. — Desculpe?

— Você me ouviu. Que diabos de e-mail é esse?

Me levantei rapidamente da cadeira e fui fechar a porta


do escritório. — Você pode ler muito bem, Noah. Eu não preciso
explicar isso para você.

Ele emitiu um som de frustração silenciosa. — Eu


simplesmente não... eu entendo que será difícil ficar um com o
outro agora que estamos em casa, mas isso vai desaparecer.
Isso não significa que você precisa se esconder.

— Eu não estou me escondendo, — eu disse ferozmente.

Mentirosa, mentirosa, calças em chamas.38

— Besteira.

— Este foi um bate-papo muito divertido, Noah. Obrigada


por ligar.

Ele suspirou. — Eu sinto muito. — Ele suavizou sua voz.


O som disso, oh, eu tive que pressionar minha mão no meu
peito pelo que fazia no meu interior. — Estou frustrado, ok?
Não achei que você fosse desaparecer depois do que aconteceu.
Treinarbhoje foi uma merda, e seu irmão amaldiçoou minha
bunda por não prestar atenção tão perto da pré-temporada, e
tudo que eu podia fazer era continuar assistindo as portas para
ver se você apareceria. E não é sua culpa que eu não pude

38 LiarLiar Pants On Fire é uma frase que as crianças gostam de gritar uns com os outros sempre que
pensam que o outro está mentindo. Também gostam de gritar aos adultos que lhes contam histórias
sobre fadas.
prestar atenção, mas, caramba, Molly, eu não esperava sair do
vestiário para ler o e-mail dizendo que você não estaria por aí.

Afundei-me na cadeira enquanto processava o que ele


estava dizendo. E o que ele não estava.

No período de um dia, eu tinha conseguido tudo o que


achava que queria.

Aprovação de Beatrice e Noah me notando.

E tudo parecia errado.

Eu não queria dificultar a vida dele. Eu não queria que


ele estragasse os treinos por minha causa. Eu não queria que
ele ficasse frustrado com isso, chateado porque sua atenção
estava dividida dessa maneira, porque ele nunca tentou
equilibrar seu foco antes. A única coisa que faria era ele
ressentir-se de mim.

— Eu deveria ter lhe contado separadamente, Noah.


Desculpe-me, que eu coloquei isso em você assim. — Passei a
mão pelos cabelos, puxando a faixa e enrolando-a no meu
pulso. — Mas esta é a melhor opção. A escolha mais
inteligente. — Fechei os olhos e lutei contra as lágrimas que
teimavam se formava na ponte do meu nariz. — E eu acho que
você sabe disso.

Ele estava quieto do outro lado do telefone. E mesmo que


doesse, oh, ainda queria ver seu rosto para me ajudar a
decifrar o que ele poderia estar pensando, eu sabia que se ele
estivesse aqui, se ele estivesse no meu escritório, eu o
alcançaria.

— Eu aceito, — ele finalmente admitiu em voz baixa.

Seu acordo não foi bom.

Parecia que ele enfiou uma espada enferrujada no meu


intestino. Irracionalmente, eu queria que ele discutisse. Para
me dizer que valeria a frustração de poder me ver, mas a dor
serviu como um bom lembrete.

Ele sempre escolheria futebol.

E, por sua vez, tive que me escolher.

— E agora o que? — Ele perguntou.

Me recostei na cadeira e olhei para o teto. — Agora nós


dois fazemos o nosso trabalho. Se você estiver tendo um
problema com Rick ou Marty, me envie um e-mail, e eu
cuidarei disso. E você começa a trabalhar em campo neste fim
de semana.

O som áspero de Noah, soltando uma respiração pesada,


teve uma lágrima escorrendo pela minha bochecha. Afastei-o
com a palma da minha mão.

— Tudo bem, Molly, — disse ele. — Eu posso fazer isso,


se é isso que você quer.
— É isso que eu quero, — eu disse com uma voz
extraordinariamente e miraculosamente firme. Se ele pudesse
ver meu rosto, ele teria visto a mentira imediatamente.

Mas ele não conseguia. Então ele não fez.

E começamos a temporada assim. Ele de olhos vendados.


E eu, a mentirosa com o coração partido.
HAVIA um momento no início de cada temporada em que
você fica de pé antes do apito soar e a bola ser chutada do
suporte de plástico. Antes que tudo terminasse no ar, e a
multidão rugisse, os telefones brilhando nas arquibancadas
enquanto eles capturavam outro jogo, outro estalo, outro
começo para suas dezesseis semanas favoritas do ano.

Esse momento era geralmente de esperança e


antecipação. Era uma energia indisciplinada que finalmente
teve uma saída após meses de prática e preparação. Foi para
isso que treinamos, sofremos e arriscamos lesões.

E pela primeira vez, não senti nada naquele momento.

Nas semanas de pré-temporada que levaram a isso, não


senti nada. Eu apareci e joguei alguns snaps39, depois
encontrei o banco pelo resto do jogo, enquanto os novatos e a
segunda sequência tinham tempo no campo.

39SNAP é o lance inicial de cada jogada, quando o Center passa a bola ao Quarterback, por entre as
pernas, ou a atira para trás quando a formação ofensiva é o SHOTGUN.
Não senti nada quando me sentei à mesa com os
microfones na minha cara e falei sobre o que jogaríamos a
seguir.

Não senti nada quando vencemos o primeiro jogo da


temporada regular e terminei com três sacadas do QB.

Nenhuma satisfação visceral quando vencemos o


segundo jogo também, desta vez com duas sacadas
adicionados à minha conta.

Nenhuma comemoração de pancada no peito quando


conquistamos uma vitória de um ponto durante o terceiro,
graças a uma jogada de 49 jardas em linha reta através da
vertical enquanto o relógio se esgotava.

Oh, eu consegui fingir bem o suficiente. Eu bati no


capacete e bati nas almofadas dos meus colegas de equipe que
tiveram um bom desempenho. Assenti meus agradecimentos
quando eles chegaram ao meu rosto e rugi sua apreciação
quando eu derrubei o zagueiro adversário e rasguei a bola de
suas mãos.

Apenas três pessoas me observaram com um pouco mais


de interesse com o passar das semanas. Logan, Rick e Marty.
Eu vi isso na maneira como o olhar deles permaneceu em mim
depois de uma grande jogada. Quando eu me mantinha no
vestiário e durante as reuniões e exercícios da equipe. Quando
fui para a cama ainda mais cedo do que o habitual, o que
significava que as equipes de filmagem tinham que sair da
minha linda casa com uma bela vista que dificilmente percebi.
A cada dia que passava, sentia cada vez menos satisfação
ao saber que, enquanto conseguia tudo o que queria no campo,
ele se dissolvia como cinzas na boca. Não apenas insatisfatório
ou impossível de me sustentar, mas deixou um sabor amargo
que eu não esperava.

Em vez de rasgar a tampa do por que, me enterrei no


trabalho. Meu corpo estava em melhor forma do que nunca em
toda a minha carreira. Meu desempenho no jogo cinco foi um
que entraria para os livros de recordes.

E eu não conseguia me importar.

O ciclo em que me encontrei, com apatia ao volante,


começou a se manifestar de maneiras estranhas. Quanto mais
eu não sentia nada sobre esse trabalho que adorava como uma
divindade a vida inteira, mais isso me irritava.

Se a irritação era o único sentimento que eu conseguia


controlar, então eu canalizaria cada grama dela durante os
minutos em que me encontrava no campo. E quando o relógio
acabou no nosso quinto jogo da temporada, pouco antes de
nossa semana de despedida, não apenas tivemos mais uma
vitória, mas meus colegas de equipe também me sacudiram
com violentos parabéns.

Kareem riu de mim quando viu a confusão no meu rosto.

— Do que eles estão falando? — Eu perguntei.

— Você seriamente não estava acompanhando?


Eu balancei minha cabeça enquanto jogadores
circulavam ao nosso redor no campo. Eu nem precisei olhar
para sentir Marty aproximar sua câmera de efeito no meu
rosto.

— Cara, — ele disse, batendo a mão no meu peito, — você


acabou de quebrar o recorde de um único jogo. Sete sacadas e
meia, Griffin.

Pela primeira vez em toda a temporada, senti uma


pequena onda de emoção cintilar atrás do meu peito. — Eu não
fazia ideia.

Ele sorriu. — O que quer que você esteja fazendo, cara,


continue fazendo isso. — Ele inclinou a cabeça para trás e
berrou com o barulho pós-jogo, — Modo Besta, pessoal!

Suas palavras tiveram o mesmo efeito de jogar um balde


de água gelada naquela pequena chama. Eu queria continuar
fazendo o que estava fazendo? Não assim.

Eu encontrei meus olhos vagando pelas multidões de


pessoas permitidas em campo após o jogo, enquanto eu
distraidamente cumprimentava o time que acabamos de
derrotar com acenos de cabeça e apertos de mão e socos fracos.

Um jovem jogador magro do outro time se aproximou com


um sorriso cheio de nervos. — Ei Griffin, jogo incrível, cara.

Eu assenti. — Obrigado. Você também.


Eu não tinha ideia de quem ele era, mas minha resposta
inflou seu peito da mesma forma. — Você é, uh, você é meio
que meu ídolo. Desde que você jogou no U Dub40. Eu disse à
minha esposa que, se tivesse a chance, eu... — Ele inalou
bruscamente. — Eu veria se você estaria disposto a trocar de
camisa.

Enquanto Marty se movia ao redor de nós para filmar, eu


apoiei minhas mãos nos quadris e realmente estudei o garoto
pela primeira vez.

Ele parecia um adolescente e estava falando comigo sobre


meus dias de faculdade e sobre sua esposa. E a conversa
imediatamente teve dois efeitos incrivelmente estranhos e
incrivelmente humildes em mim.

A apatia caiu de cabeça no vazio. Tudo sobre este jogo


parecia vazio.

A vitória.

O recorde.

E o fato de eu ter investido minha vida inteira na busca


de ambas as coisas acima de qualquer outra coisa.

Sem responder, comecei a tirar minha camisa e seu rosto


se abriu em um sorriso aliviado. Foi tudo o que pude fazer para
encontrar seu olhar agradecido.

40 Universidade de Washington.
Ele perdeu o jogo, não quebrou nenhum recorde, inferno,
ele provavelmente não ficou naquele gramado por um único
segundo do jogo, e aqui estava ele, mais feliz do que eu me
sentia desde... Desde Dakota do Sul.

O pensamento entrou na minha cabeça, deslizando


facilmente por baixo dos suportes de ferro que eu mantinha
em volta do meu coração desde o dia em que conversei com ela
no telefone.

Esse deveria ter sido o meu aviso, que eu não conseguia


nem pensar no nome dela sem sentir que tudo ao meu redor
desmoronaria, desprotegido e vulnerável a cada segundo vivido
com ela. Cada beijo. Cada toque. Cada gemido que eu soltei
nela. Todo momento quieto em que tudo que eu fazia era
segurá-la em meus braços enquanto ela dormia.

Ele disse alguma coisa, e eu pisquei de volta para o


presente a tempo de pegar sua camisa quando ele a entregou
para mim. Era intocada – sem suor, sem sujeira, sem manchas
de grama – diferente da minha.

— Diga-me o seu nome novamente, — eu disse


lentamente, colocando a camisa cuidadosamente debaixo do
braço para não deixá-la cair.

— Michaelson, — ele disse apressadamente. — Eric


Michaelson.

Estendi minha mão. — É uma honra ter sua camisa, Eric.


— A honra é toda minha. Mal posso esperar para contar
à minha esposa sobre isso. — O retorno da minha mão foi tão
vigoroso, tão entusiasmado, que me vi sorrindo pela primeira
vez em semanas.

— Ela veio ao jogo hoje?

Ele balançou a cabeça, ainda sorrindo. — Não, ela ficou


em casa. Tivemos nosso primeiro bebê há algumas semanas.
— Na respiração seguinte, ele pegou o telefone e me mostrou a
foto de um bebê enrugado e de rosto vermelho. — O nome dela
é Molly.

Uma viga de aço na minha têmpora teria tido menos


impacto. Isso tirou o fôlego dos meus pulmões por um
segundo. Eu dei um tapinha nas costas dele e dei um sorriso
educado. — Ela é linda. Parabéns para vocês dois.

Ele partiu e eu consegui sair do campo e entrar no


vestiário sem inibições enquanto Marty me seguia
silenciosamente.

As filmagens eram assim toda semana.

Quietas. Sem intercorrências.

Chatas como o inferno, se eu tentasse imaginá-las da


perspectiva dele.

Antes de tomar banho, conversei com algumas pessoas


da imprensa no vestiário sobre o registro, respostas que eu dei
de maneira rotineira sobre a honra que era, o trabalho que eu
colocara e o jogo sólido de nossos concorrentes. Quando Rick
se aproximou de mim quando eu estava vestido, limpo e
arrumando minha mala, eu não conseguia nem lembrar uma
única palavra que eu tinha dito.

— Ótimo jogo, como sempre. — O sorriso dele foi


moderado.

— Obrigado. — Enfiei minhas chuteiras na minha


mochila. — Posso fazer algo por você?

— Você tem alguns minutos para conversar?

Suspirei. — O que é isso, Rick? Eu gostaria de chegar em


casa.

— Por quê? Precisa se exercitar mais? Assistir filme?


Olhar fixamente para a parede? — Minha mandíbula apertou
e me endireitei até a minha altura total. Ele sorriu,
completamente sem medo. — Eu tenho uma coisa que gostaria
de discutir com você antes de levar a Beatrice para a aprovação
dela. Nós temos... — Ele fez uma pausa, pigarreando um pouco
antes de continuar. — Eu tenho uma ideia para o
documentário. Um novo ângulo, gostaria de explorar.

Eu o estudei. — Vou ter que estar lá quando você se


encontrar com Beatrice?

— Eu acho que você deveria estar, sim. Apenas dando a


você a oportunidade de falar sobre isso antes.
— Quando vamos fazer isso? Porque eu prefiro não
participar da mesma reunião duas vezes, se conseguirmos tirar
isso do caminho.

Ao me ouvir falar, não era de admirar que todos tivessem


me deixado em paz. Eu praticamente podia ver pessoas na
ponta dos pés ao redor do campo de força invisível que eu
estava projetando. Mas Rick, aquele idiota, não se intimidou.
Ela teria sido assim também, se não tivesse criado seu próprio
campo de força. Foi uma jogada que foi mais impressionante,
mas eu tinha a sensação de que perderia se eu fosse enfrentar
a dela.

— Se você tem certeza, — disse ele, me olhando com


cuidado.

— Quanto mais cedo fizermos isso, mais cedo eu posso ir


para casa.

Ele levantou as mãos. — Você entendeu. Se você estiver


pronto, vamos para o escritório vazio, passando pela sala de
imprensa. Ela disse que teria tempo de conversar conosco
quando você terminasse com a mídia.

Como a sede dos Wolves estava alojada nas instalações


de treinamento nos arredores de Seattle, eu não precisava me
preocupar em passar pelo escritório de Molly a caminho de ver
Beatrice. Minha mente apenas tropeçou um pouco quando
pensei no nome dela, e tive o distinto descontentamento de
reconhecer que meu coração fazia a mesma coisa.
Os corredores eram um borrão de vermelho e preto
brilhante, o logotipo dos Wolves em todos os lugares que
virávamos. Era estranho como, mesmo agora, meses depois da
minha chegada, não o reconheci imediatamente como meu
time em casa. A sala de imprensa ainda estava fervilhando de
atividade, nosso QB subia à mesa e eu mantinha meus olhos
no espaço de escritório vazio para onde estávamos indo,
porque eu já dera um som suficiente sobre o jogo. Eu não
queria o centro do palco.

Meu rosto se enrugou quando eu percebi. O pensamento


estava lá, claro como um sino e tão alto, e eu não conseguia
descobrir quando isso havia mudado.

Mas não pude mais puxar a linha, até mais tarde, quando
Beatrice nos acenou para a sala com o telefone colado no
ouvido.

— Parece ótimo, obrigada. Me envie um rascunho do


comunicado de imprensa antes que algo entre no ar, ok? —
Seus olhos dispararam entre mim e Rick. — Sim, tchau.

Nós sentamos em frente a ela quando ela desligou. Marty


tomou sua posição no canto da sala, ainda filmando. Sempre
filmando.

Beatrice sorriu em minha direção primeiro. — Parabéns


pelo seu jogo, Noah.

Eu assenti. — Obrigado.
— Só para você saber, temos um comunicado de
imprensa divulgado sobre o recorde, e podemos querer gravar
um trecho que podemos publicar no Instagram agradecendo
aos fãs de Washington por todo o apoio até agora nesta
temporada. Já estamos editando algumas imagens do
treinador dando-lhe a bola do jogo no vestiário.

Mais uma vez, assenti.

Beatrice cruzou as mãos e voltou sua atenção para Rick.


— Fiquei feliz em saber de você, Rick. Como você sabe, eu
tenho salivado por um gosto do que vocês três estão
trabalhando, mas você tem sido uma provocação.

Minha atenção afiou, mas eu mantive meu rosto para a


frente.

Rick pegou o laptop e colocou-o sobre a mesa, dobrando-


o para que eu e Beatrice pudéssemos ver a tela. — Há uma
razão para isso, como você pode imaginar.

— Eu certamente esperava que fosse esse o caso. — Seu


rosto era agradável, mas o tom da sua voz era claro. — Molly
deveria estar presente para isso? Ela me garantiu que você
mantém linhas de comunicação abertas e não houve nenhum
problema desde o início da temporada.

Meu estômago apertou e lutei para respirar


uniformemente. Eu não estive no mesmo quarto que ela desde
que ela deixou o avião ao voltar para Seattle.
— Ainda não, — disse Rick. Quando ele se recostou,
respirou fundo e deu a Beatrice e eu um olhar prolongado. —
Gostaria de fazer uma mudança na direção que estamos
tomando com a história de Noah.

Os olhos dela se estreitaram. Os meus não.


Provavelmente porque eu não poderia me importar muito com
o documentário de qualquer maneira. A mudança que ele
provavelmente queria fazer era demitir minha bunda de
imagens completamente chatas.

— Que tipo de mudança estamos falando?

— Uma narrativa totalmente nova, — disse Rick. — E a


temporada se concentraria apenas nele.

Beatrice respirou fundo. — Estou interessada.

Revirei meus lábios, mas fiquei em silêncio.

— Marty e eu nos encontramos editando imagens toda


semana, e ficou claro para nós – praticamente desde o começo
– que a razão pela qual viemos filmar Noah não era a história
que deveríamos contar. — Ele me deu um olhar inescrutável.
— O apelido de Noah é ‘The Machine’. Ao longo de sua jovem
carreira na liga, ele rapidamente se estabeleceu como algo
mais do que humano. Suas estatísticas são impressionantes.
Sua disciplina é bem conhecida e ele é respeitado por colegas
de equipe e adversários pela maneira como ele desmantela
metodicamente a competição com seu corpo e seu cérebro.

— Tudo o que sabíamos, — Beatrice forneceu.


— Sim, — Rick concordou. — Mas ninguém conhece o
lado humano dele. Ele criou sua carreira para mascará-lo.
Ninguém questiona o que há embaixo do ‘The Machine’ porque
a fachada é impressionante. E desde o primeiro dia, Marty e
eu percebemos algo. Algo que nós dois tivemos colado nas telas
enquanto passávamos pelas horas e horas de filmagens do seu
dia-a-dia, Noah.

Eu levantei meu queixo, a mente acelerada, mas o rosto


implacável. — E o que é isso?

Seu rosto se suavizou, e havia um brilho de desculpas em


seus olhos que me fez querer bater uma mão sobre sua boca
antes mesmo que as palavras saíssem. — Nós assistimos ela
desmontar ‘The Machine’ com quase nenhum esforço. Nós
assistimos você se apaixonar por ela. E ela por você.

O fundo caiu, e tudo que eu estava tão cuidadosamente


fazendo malabarismos no ar desabou com suas simples
declarações. Mal registrei o modo como Beatrice se recostou na
cadeira.

Eu estava balançando a cabeça imediatamente, meu


coração batendo forte, meu estômago um bloco de ferro gelado
de negação. Eu senti como se alguém tivesse aberto um
alçapão escondido, aquele com o qual me preocupei no
primeiro dia de todo esse projeto, e agora meus pés
balançavam impotentes sobre um poço preto sem fim. Era tudo
que eu podia fazer para não despencar dentro dele. — Você não
sabe do que diabos está falando.
— Molly? Estamos falando de Molly? — Beatrice
perguntou calmamente.

Rick assentiu. Então ele voltou sua atenção para mim. —


Noah, não me engane agora. É meu trabalho ver as histórias e
como elas se desenrolam na vida das pessoas. Você não pode
me dizer que não é verdade. Vimos como ela estava com você e
como você era. Todos os dias, aquela mulher, sozinha, trazia à
tona o seu lado humano. Não fui eu e não foi Marty, mesmo
que sejamos bons em trabalhar com as pessoas que filmamos.
E foi uma coisa linda de se assistir. Foi real, comovente e
convincente.

Apoiando os cotovelos nas pernas, agarrei os lados da


minha cabeça. Sobre o som estridente do meu pulso, registrei
o som de Beatrice perguntando o que ele captou no filme. Eu
levantei minha cabeça.

— Você nos filmou sem o nosso consentimento? — Eu


perguntei em um tom baixo e perigoso. — Você conseguiu
imagens dela sem o conhecimento dela?

Rick começou a falar, e eu fiquei de pé, virando-me para


Marty. — Desligue a câmera. — Ele não se moveu tão
rapidamente quanto eu queria. — Desligue ou eu vou quebrá-
la com minhas próprias mãos, — eu gritei.

Marty clicou em um botão e largou a câmera. Seu rosto


estava muito pálido. — Eu nunca filmei nada quando você não
sabia que eu estava lá. Juro pra você, Noah. Eu nunca faria
isso com nenhum de vocês.
Meu peito arfava com respirações irregulares enquanto
eu lutava para controlar meu temperamento.

— Você dormiu com a minha empregada? — Beatrice


exigiu.

Eu olhei para ela. — Me lembre por que isso é da sua


conta.

Seu rosto ficou glacial, mas ela era o menor dos meus
problemas. — Rick, — eu disse, — é melhor você começar a
falar agora.

— Beatrice, — ele disse calmamente, — posso ter cinco


minutos com Noah, por favor? Eu deveria ter insistido em falar
com ele em particular primeiro, e isso é por minha conta.

— Não tenho certeza se devo ficar fora do circuito, — ela


retrucou. — Isso é inaceitável.

Ele a encarou com um olhar mortal. — O que é inaceitável


sobre isso? Que Washington ganha mais dinheiro se ele
conseguir sua própria temporada? Que descobrimos uma
história real e verdadeira e é o tipo de televisão que sonhamos
em fazer? Não cabe a você decidir se é inaceitável ou não. Estou
falando sobre isso como cortesia, mas a decisão será tomada
por Noah e Molly. — Ele apontou um dedo para mim. — E você
vai me ouvir antes de fazer isso.

Eu não pude dedicar nenhuma atenção desagradável a


Beatrice, mas o fato de ela se levantar e sair rapidamente do
escritório era resposta suficiente. O silêncio desceu quando ela
bateu a porta atrás de si. Fechando os olhos, tentei lembrar
como havia sido apenas uma hora antes.

Apatia parecia o paraíso.

Não me importar parecia o melhor tipo de fuga que eu


poderia ter imaginado.

E nisso reconheci o que tinha sido: proteção. Eu me isolei


de dormência porque, sem ela, teria que admitir o que Rick
estava me dizendo agora. Que Molly deslizou por uma fenda
invisível na minha armadura e se plantou ali, bem ao lado do
meu coração. Um buraco na minha caixa torácica que eu não
conhecia antes dela aparecer naquele elevador. Esse espaço
dentro de mim pertencia a ela agora.

Eu queria gritar.

Eu queria derrubar as paredes.

Eu queria encontrá-la.

— Você me odeia agora, — Rick disse calmamente. — E


eu não culpo você.

Lentamente, levantei minha cabeça e olhei para ele. O


lado da minha mandíbula se contraiu, e eu sabia que não
podia deixar uma única palavra escapar da minha boca até que
a raiva diminuísse. Mas tudo que eu conseguia pensar era
nela. Como ela se sentiria quando soubesse disso.

— Se eu descobrir que você conseguiu um único segundo


de imagens de Molly sem o consentimento dela, ou um único
momento que pensávamos ser privado... se houver uma fração
naquele filme que a faça parecer desrespeitada, eu farei sua
vida é um inferno na terra, — jurei.

Nos segundos depois que falei, levei um momento para


perceber que ele começou a sorrir.

— O que? — Eu agarrei.

— E você ainda não vê, — ele meditou.

Enfiei minhas mãos no meu cabelo e puxei os fios. — Pare


de falar em círculos, Rick.

Ele se inclinou em minha direção. — Pense no que você


acabou de me dizer. Não era sobre a sua aparência, se você se
saía mal ou se isso manchava sua reputação. Você destruiria
minha vida se eu fizesse algo com ela.

Minhas mãos caíram entorpecidas no meu colo.

— Ela deu um passo atrás porque se importava mais com


o fato de você estar focado em entrar nessa temporada. Ela deu
um passo atrás porque a machucou demais estar perto de
você. E você deixou. Não estou dizendo que você se importa
menos com ela, mas santo inferno, Noah, para um homem tão
esperto, você é um idiota quando se trata do que sente.

Engoli em seco.

Ele virou o laptop e apertou alguns botões. — Pronto,


estou lhe enviando nosso trailer conceitual. Eu pretendia
mostrar a você hoje antes que você e Beatrice perdessem suas
mentes sempre amorosas e loucas por controle, — ele
murmurou. Depois que ele fechou o laptop, ele me encarou
novamente.

— C-como você sabia? — Minha voz soou como se alguém


tivesse levado uma serra elétrica enferrujada e mastigada à
minha garganta.

— Por favor, — disse Marty. — No dia em que ela parou


de filmar conosco, você ligou o interruptor no modo
exterminador. Foi como assistir a um ciborgue fingir ser
humano.

Eu dei a ele um olhar sem graça.

Ele bateu na câmera. — Não pode discutir comigo sobre


isso, amigo. Eu tenho isso no filme.

Rick levantou a mão. — No filme ou não, você


concordando ou não, eu gosto de você e de Molly. Acho que
vocês são ótimos juntos. — Ele se inclinou. — Mas se você não
pode puxar sua cabeça da bunda por tempo suficiente para
perceber o que encontrou nela, então não a merece.

Mastigar suas palavras era lento e desconfortável, porque


o grão da verdade era tão grande que era inevitável. Eu olhei
para ele por um minuto antes de falar.

— Eu pensei que você não deveria forçar a ação.

Ele riu. — Você sabe, minha esposa estava filmando um


documentário sobre a natureza há alguns anos e um bando de
pinguins ficou preso em um barranco. A equipe teve que
assistir, completamente desamparada, enquanto dezenas de
pássaros tentavam e tentavam em vão. E se eles não fizessem
nada, todo aquele rebanho teria morrido, então eles quebraram
a regra de intervir e esculpiram escadas no gelo e na neve, e os
pinguins saíram do barranco assim que tiveram a chance.

Eu balancei minha cabeça. — Não tenho certeza se é uma


comparação lisonjeira se você for eu.

Ele me deu um tapa nas costas. — Eles foram espertos o


suficiente para subir as escadas, Griffin. Tudo o que estou
pedindo é para você abrir seus olhos. Quando o fizer, sua vida
nunca mais será a mesma.
MEU ESCRITÓRIO ESTAVA silencioso enquanto digitava uma
resposta a um e-mail que estava na minha caixa de entrada
por dois minutos. O lado positivo de ter absolutamente
nenhuma vida social nas últimas oito semanas era que eu
estava no topo do meu jogo no trabalho.

Claro, as olheiras sob meus olhos eram tão escuras


quanto os filmes que eu estava vendo, e eu acidentalmente
olhei para fora assistindo a um filme de romance de férias na
Netflix quando estava com preguiça de levantar e encontrar o
controle remoto, mas no trabalho, eu estava matando.

Acontece que ter seu coração machucado era excelente


para sua vida profissional.

Eu era uma rápida replicadora de e-mails, e Noah estava


quebrando recordes de sacks41 a torto e a direito.

41No futebol americano um sack acontece quando um quarterback é tackleado ou quando ele corre
para fora dos limites do campo atrás da linha de scrimmage antes que ele possa efetuar um passe
para frente, ou quando um quarterback sofre um tackle atrás da linha de scrimmage dentro do
"pocket" e as intenções do que ele pretende fazer não estão claras. O sack acontece quando um
jogador de linha defensiva, ou um linebacker ou um defensive back é capaz de passar pelo bloqueio
da linha ofensiva, cortando a proteção do quarterback e então o derruba; ou quando um quarterback
não consegue encontrar um recebedor disponível, que pode ser um wide receiver, ou um running back
ou um tight end, dando tempo suficiente para que os jogadores de defesa derrubem o quarterback.[1]
Ok, tudo bem, minha conquista não soou tão
impressionante quanto a dele, mas eu levaria minhas vitórias
onde as conseguia.

Digitei com mais força, ignorando o impulso de puxar


meu telefone e assistir as imagens dele recebendo a bola no
vestiário do dia anterior. Ele parecia... entediado.

Nas sete vezes em que assisti na noite anterior, escondida


debaixo das cobertas para que Isabel não pudesse me ouvir e
esconder meu telefone, estudei seu rosto. Ele estava sorrindo,
mas por trás dos olhos, não vi faísca. Absolutamente nada. E
rasgou buracos irregulares no meu coração.

Alguém bateu na porta do meu escritório e eu gritei por


cima do ombro: — Entre.

— Espero não estar interrompendo, — minha chefe disse


calmamente.

Algo em seu tom me fez parar antes de girar minha


cadeira para encará-la.

— Nem um pouco, — eu disse, observando-a


cautelosamente enquanto ela entrava no meu escritório e
fechava a porta silenciosamente atrás dela. — Como foi o seu
final de semana?

Ela não se sentou, simplesmente enrolou os dedos ao


redor do encosto da cadeira de frente para mim no lado oposto
da minha mesa.
— Esclarecedor, — ela respondeu enigmaticamente.

— O que aconteceu?

— Eu preciso que você responda uma pergunta para mim,


e responda honestamente, Molly.

Sua formalidade, reminiscente de quando ela começou,


me fez ficar ereta. — O que foi?

— Há quanto tempo você mantém um relacionamento


sexual com Noah Griffin?

Minha pele formigou quente, depois gelo, gelo frio,


varrendo entre os dois extremos em uma corrida do topo da
minha cabeça até os dedos dos pés. — Eu não estou em um,
— eu disse instantaneamente. — Eu não falo com ele há
semanas.

Oito semanas e três dias e seis horas. Não que eu


estivesse contando com cada batida miserável do meu coração.

Beatrice exalou lentamente. — Então eu vou esclarecer.


Você já teve um relacionamento sexual com ele?

A respiração parou dolorosamente em meus pulmões


quando eu abri minha boca, mas nenhuma palavra saiu. Com
a pergunta dela, todas as lembranças que eu tinha trancado
em uma caixa preta em minha mente saíram, uma após a
outra, e após a outra. Os pedaços do meu tempo com ele que
eu sentia tanta falta. E isso apareceu no meu rosto, eu sabia
disso como se soubesse meu próprio nome.
— Droga, Molly, — ela disse baixinho. — Você mentiu
para mim. Você mentiu para mim.

Fiquei parada, com a mão no meu peito. — Beatrice, me


desculpe.

— Eu gostaria que você não tivesse feito isso. — Ela


balançou a cabeça, segurando as costas da cadeira ainda mais
forte. — Eu não posso fazer uma exceção para você, Molly. Eu
tinha uma regra e você a violou.

A realidade do que ela estava dizendo fez minha pele


esquentar de novo, sangue escorrendo sob a superfície de uma
maneira que fez meu rosto arder de vergonha. — Beatrice, por
favor.

Ela levantou a mão. — Eu havia estabelecido


especificamente as regras naquele contrato de trabalho que
discutimos e que você assinou. A primeira delas era de não
confraternização com a equipe ou qualquer assunto do
documentário. E a segunda eram as discussões que tivemos
sobre honestidade. Sobre confiança. — Ela fez uma pausa e
seus olhos ficaram suspeitosamente brilhantes. — Você sabe
o quão furiosa fiquei quando pensei que alguém havia se
aproveitado de você? Eu olhei nos seus olhos e aceitei sua
palavra quando você me disse que nada havia acontecido.
Confiei em você.

Minha voz falhou quando eu interrompi, uma verdade


bagunçada e inconveniente caindo dos meus lábios. — Eu me
apaixonei por ele, Beatrice. Não foi um caso sem sentido.
Foi a primeira vez que eu admiti isso em voz alta, e meu
coração apertou dolorosamente.

— E no processo, você quebrou a confiança que eu tinha


em você, — ela retrucou. — Agora, eu olho para você
solicitando a mudança em seu papel, e eu questiono. Eu
questiono sua capacidade de deixar seu estado emocional de
lado e fazer seu trabalho. Eu questiono sua capacidade de
pensar em suas escolhas antes de fazê-las.

Afastando uma lágrima da minha bochecha, amaldiçoei a


facilidade com que parecia chorar quando se tratava de algo
em torno daquele homem gigante e bruto. — Eu tenho feito o
meu trabalho, — disse a ela. — E eu tenho feito bem. Você sabe
que sim.

— Foi sobre Noah? Seu pedido?

Lentamente, assenti.

Beatrice abaixou a cabeça e suspirou profundamente. —


Obrigada por ser honesta, Molly. — Então ela voltou a olhar
para mim, e eu me senti muito como alguém prestes a
enfrentar um esquadrão de tiro de uma mulher.

Pronta.

Alvo.

E o dedo dela apertou.

Fogo.
— Você tem até o meio dia para limpar sua mesa. Seu
emprego no Washington Wolves foi encerrado. Alguém do RH
estará aqui em breve para cuidar da papelada.

Eu afundei de volta no meu lugar e deixei minha cabeça


cair em minhas mãos, lágrimas caindo livremente agora
enquanto ela saía rapidamente do meu escritório. Durante
toda a minha vida, esse lugar fora um centro, uma figura
central para minha família. Mesmo antes de meu pai morrer,
antes de minha mãe se afastar. Eu não conseguia me lembrar
de uma época em que eu não corria pelos corredores como se
os tivesse. E agora, eu sairia com uma caixa nas mãos. O fato
de ela ter me deixado sozinha deveria ter me feito sentir um
pouco melhor, porque mesmo que eu tivesse mentido, mesmo
que tivesse quebrado suas regras, ela confiou em mim o
suficiente para me dar um pouco de privacidade.

Em um momento como esse, uma garota normalmente


chamava sua mãe. Minhas mãos tremiam quando peguei meu
telefone da minha mesa e toquei nos meus contatos favoritos.
O telefone tocou uma vez antes que a esposa de Logan, Paige,
atendesse.

— E aí, gatinha?

Ao som de sua voz, eu desmoronei, choramingando e


chorando, e não consegui pronunciar sequer algumas palavras
inteligíveis.
— Molly, Molly, acalme-se, — ela instruiu. — Estou
dirigindo, e espere, estou encostando, mas preciso que você me
diga se está ferida. Você está bem?

— Beatrice acabou de me demitir, — saiu.

— O quê? — Paige gritou. — Oooh, eu vou queimar a casa


daquela cadela.

Uma risada aquosa me escapou. — Eu errei, Paige.

— Oh, querida, você não poderia ter estragado tanto. Você


é tão boa no seu trabalho, — disse ela. — Espere, me deixe
mandar uma mensagem para seu irmão.

— Não, Paige, não interrompa sua prática. — Inalei,


lentamente controlando minhas lágrimas. — Eu vou depois
que eu sair daqui. Eu tenho até o meio dia para limpar minhas
coisas.

Ela estava quieta e, conhecendo minha cunhada,


quietude era perigosa.

— Paige, — eu disse novamente.

— Hmm?

— O que você está fazendo?

— Nada. Apenas... imaginando você tendo que arrumar


sua mesa e como isso me faz querer arrancar o cabelo dela.
Eu ri de novo. — Espero que Emmett não esteja no carro
com você. Você está com muita sede de estar no modo mãe
agora.

— Oi, Mol, — ele falou ao fundo. — Mamãe parece


assustadora agora. Ela tem olhos zangados.

— Aposto. — Esfreguei minha testa. — Eu preciso


começar a analisar minhas coisas. E, ugh, alguém do RH
estará aqui em breve.

— Besteira, isso é besteira completa e absoluta, — ela


murmurou. — O que aconteceu? Qual o motivo dela demiti-la?

— Podemos conversar sobre isso quando eu aparecer? —


Eu perguntei cansada.

— Sim, querida, nós podemos. — Ela ficou quieta por um


segundo. — Eu amo você. Vai ficar tudo bem.

— Também te amo, Paige.

A ligação foi desconectada e eu arranquei um lenço de


papel da caixa atrás do monitor do meu computador, assoando
meu nariz ruidosamente. Levei alguns minutos para fazer
minha melhor impressão de zumbi antes de começar a abrir as
gavetas e encarar inexpressivamente o que precisava ficar e o
que eu deveria levar comigo quando ouvi duas coisas ao
mesmo tempo.

O pisar dos pés de um homem.

O clique dos saltos vindo na direção oposta.


— Paige, — eu sussurrei. — O que você fez?

Logan chegou à minha porta logo antes de Allie Sutton-


Pierson.

— O que aconteceu? — Eles perguntaram em conjunto.

Logan arrancou o boné e correu para mim, me envolvendo


em um abraço que me fez lutar para não ficar chorando de
novo. — Sinto muito, Mol. Isso é besteira.

Eu estava limpando meu rosto quando Allie fechou a


porta do meu escritório.

Allie tinha passado dos quarenta e, quando se levantou,


braços cruzados, expressão preocupada estampada em seu
rosto deslumbrante, ela parecia ter pouco mais de 35 anos. —
Ela não estava em seu escritório quando desci, mas vou ter
uma conversa com ela assim que a vir.

— Está tudo bem, Allie, — eu disse. — Você não precisa


fazer isso.

Como proprietária de uma das franquias de futebol com


maior sucesso financeiro da década passada, Allie não estava
acostumada a dizer o que ela podia ou não fazer. — Eu sei que
não preciso, — disse ela calmamente. Debaixo daquela calma
havia aço. — Mas você, suas irmãs, Emmett, vocês fazem parte
da minha família. E eu não gosto de pessoas mexendo com a
minha família.
Logan esfregou uma mão nas minhas costas. — Deixe-a
ajudar, Molly. Você não merece que isso aconteça com você.

Eu dei um sorriso triste para ele. — Você nem sabe o que


eu fiz.

— Porque isso não importa, — ele respondeu


instantaneamente.

Revirei os olhos. — Sim, sim. E se eu a socasse?

— Você fez? — Allie perguntou.

— Não.

— Você a assediou sexualmente?

— Claro que não.

Logan balançou a cabeça. — Eu sabia que não gostava


dela. Não desde a primeira reunião.

— Vamos lá, pessoal, as pessoas são demitidas o tempo


todo. É chato, mas eu vou ficar bem.

Allie apoiou as mãos nos quadris, embrulhados em uma


elegante saia preta. — Pessoas fenomenais no trabalho não são
demitidas o tempo todo.

Logan entrou na conversa. — Exatamente. E você é boa


no seu trabalho.

Os dois começaram a se unir, lançando ideias para frente


e para trás. Palavras como assédio. Rescisão ilegal. Plano de
melhoria de desempenho. Demitindo Beatrice. Fechei os olhos
e tentei ajustá-los, mas finalmente levantei as mãos e gritei: —
Parem, por favor!

Eles ficaram quietos.

— Eu estraguei tudo, ok? — Eu olhei para os dois. — Eu


dormi com Noah em um fim de semana de filmagem e depois
menti para ela quando ela perguntou se eu havia violado seu
contrato, que incluía uma política de não-confraternização.

O rosto de Logan ficou vermelho, o queixo cerrado, e ele


olhou para o chão como se contivesse os segredos do mundo.

Allie esvaziou como um balão cortado. — Oh, — ela disse


fracamente.

— Eu fiquei longe dele desde então. — Continuei, com


lágrimas no fundo da garganta. — Mas isso não importa. Ela
sabe. Eu pensei que eu tinha pensado nisso o tempo todo. Que
eu sabia no que estava me metendo. Esse sempre foi o meu
problema, certo? — Limpei meu rosto, desafiando Logan a
discutir com o olhar no meu rosto. — Quantas vezes você teve
que intervir ao longo dos anos quando eu não pensei em algo?
Quando fiz algo porque me apetecia ou porque era divertido ou
bobo ou... me senti bem na hora.

— Molly, — ele disse ao exalar. — Você é jovem. Cometer


erros faz parte da vida.

— Eu sei. Mas isso também acontece, Logan. — Eu


balancei minha cabeça. — Não me arrependo do tempo que
passei com Noah, mas sabia que era um risco quando o fiz. Se
esse é o resultado do fim de semana que tive com ele, então
aceito.

Allie suspirou. — Ainda parece errado, Molly. Não há


nenhuma regra no manual do Wolves que proíba um
relacionamento com um jogador e outro funcionário.

— Não, mas o contrato de Beatrice é diferente. É separado


disso. — Engoli. — Foi uma estipulação que Beatrice adicionou
especificamente à minha descrição de cargo, que depende do
relacionamento com a Amazon.

Logan olhou para Allie. — Então ela está certa?

Allie deu de ombros. — Eu não estou envolvida o


suficiente quando se trata desses tipos de situações, mas... —
ela assentiu — eu acho que ela está certa. E não apenas isso,
desde que Beatrice não a esteja demitindo por motivos
discriminatórios, Washington é um estado de emprego
voluntário. Ela pode demiti-la a qualquer momento sem
fornecer um motivo.

— Isso é idiota, — disse ele, sombrio.

— Você parece com Emmett. — Eu disse a ele com um


sorriso relutante.

Meu irmão passou o braço em volta de mim. — Vou tomar


isso como um elogio, garota.
Allie nos assistiu com um sorriso triste. — Você quer
ajuda com sua mesa?

Eu balancei minha cabeça. — Prefiro fazer isso sozinha,


se estiver tudo bem com vocês.

— Claro. — Ela me encontrou no meio do meu escritório


e me apertou com força. — Você é uma estrela do rock, Molly.
Se houver algo que eu possa fazer daqui para frente, me avise,
ok? Estamos sempre procurando ajuda na Team Sutton
Foundation.

Outro trabalho que eu conseguiria sem piscar por causa


do meu sobrenome. Eu sorri para ela da mesma forma. —
Obrigada, Allie. Eu vou.

Logan demorou mais para se convencer, mas depois de


mais três abraços e mais cinco ofertas para ficar do lado de
fora do meu escritório enquanto eu limpava para garantir que
quem viesse do RH fosse legal comigo, eu praticamente o
empurrei para fora da sala que não seria meu escritório mais.

Ele estava logo depois da esquina quando eu chamei o


nome dele. A cabeça dele voltou para a porta aberta. — Sim?

— Nem uma palavra para Noah.

Logan abriu a boca para discutir.

— Não. — Eu apontei um dedo para ele. — Isso aconteceu


semanas atrás. Eu sou uma adulta, e ele também. Você não
pode interferir dessa vez.
Ele estreitou os olhos. — Defina interferir.

Depois de um segundo, marquei as respostas mais óbvias


em meus dedos. — Sem gritar, sem contar a ele o que
aconteceu, sem ameaçar, sem vergonha para ele ou para mim
na frente dos caras, porque Logan Ward, se você voltar à
prática e ficar na cara dele com isso, sou eu quem estará com
vergonha... você me entende?

Paige tinha esses olhos assustadores que ela usava no


meu irmão quando ela passava de Falo sério para eu vou
acabar com você, se você me atravessar. Eu os tinha visto
frequentemente nos últimos dez anos, e fiz a minha melhor
tentativa. Deve ter funcionado porque ele fez uma careta. —
Bem.

— Estou falando sério.

Ele levantou as mãos. — Eu prometo! Nossa. Você é tão


ruim quanto Paige, — ele murmurou antes de sair.

Eu estava sorrindo quando ele voltou para a prática. E,


dada a situação atual, isso foi bastante impressionante. Tudo
depois disso foi o mais tranquilo possível.

Eu assinei alguns papéis. Preenchi duas caixas de


arquivo. E o segurança que me acompanhou começou a chorar
porque eu o conhecia desde os cinco anos.

— Não está certo, — ele disse baixinho.


Envolvi meu braço em volta de sua cintura fina e dei-lhe
um aperto. — Eu vou ficar bem, Rod, eu prometo.

Ele me abraçou de volta, limpando o rosto com as mangas


da camisa depois que ele tirou meu crachá de segurança. Antes
de sair pela porta do estacionamento, meus olhos
lacrimejaram novamente enquanto eu olhava para o logotipo
vermelho e preto do lobo jogando a cabeça para trás em um
uivo.

Soltei um suspiro lento e saí do prédio.

Tudo tinha uma qualidade surreal enquanto eu


caminhava entorpecida para o meu carro. Como quando você
está resfriada e sente a cabeça desconectada do corpo. Ou
todos ao seu redor estão se movendo a uma velocidade
diferente. Havia caixas em minhas mãos, mas eu quase não as
senti, como se os braços de alguém as estivessem segurando.

Meu carro estava exatamente onde eu o deixei, e coloquei


as caixas no capô para que eu pudesse tirar minhas chaves da
bolsa. Com o porta-malas aberto e as caixas colocadas
cuidadosamente dentro, não consegui superar a estranha
sensação de desapego que sentia.

Mais tarde, provavelmente choraria de novo pela perda de


um emprego que amava.

Eu provavelmente choraria ao saber que não veria mais


Noah. Então eu bufei. Por favor, eu não o via há oito semanas,
a menos que estivesse na tela da TV.
Foi quando eu o ouvi. — Molly?

O som da voz de Noah enviou calafrios ao longo da minha


espinha, um após o outro, caindo em cima um do outro para
ver o que poderia ir mais rápido. Eles eram poderosos o
suficiente, aqueles calafrios correndo, que eu tremi. Só uma
vez.

Nas últimas oito semanas, eu lutei contra todo impulso


de aparecer à sua porta alguma noite. Vislumbrá-lo após um
jogo ou quando estava suado após o treino. Mas eu tinha razão
em ficar longe. Porque eu sabia, sabia tão profundamente na
parte mais escura e vulnerável do meu coração que não podia
ir até ele. Não dessa vez.

Com as mãos ainda apoiadas na tampa do meu tronco,


respirei fundo, baixando os braços lentamente quando me virei
para ver Noah, me olhando com uma expressão cuidadosa em
seu rosto.

Se a voz dele me dava calafrios, então o rosto dele me


derreteu no meu âmago.

— Oi, Noah, — eu disse, mantendo minha própria


expressão igualmente neutra.

Sua mandíbula apertou. E prendi a respiração para ver o


que ele diria a seguir.
ELA PARECIA TERRÍVEL.

E bonita.

Seu nariz estava vermelho e seus olhos estavam


arregalados, como se estivesse resfriada ou chorando. Hoje não
havia emaranhado, do tipo que eu estava acostumado, o que
ela sem dúvida fez e refeito uma dúzia de vezes, e seu cabelo
estava preso em ondas bagunçadas.

Era mais curto, logo abaixo dos ombros.

Os olhos de Molly me examinaram da mesma maneira


que eu a ela, e me ocorreu, depois de alguns momentos de
silêncio constrangedor, que era a minha vez de falar.

— Como você está?

Se eu quisesse encontrar uma situação na vida onde eu


era mais ruim, era essa, bem aqui. Eu não poderia ter soado
mais dolorosamente educado. Mais desinteressado. Mas
inexplicavelmente, seus olhos se suavizaram com o meu tom
robótico.
— Foi um dia difícil, — ela respondeu calmamente. — Ou
não tão bom quanto o seu foi ontem, pelo menos.

Eu fiz uma careta. — Sim. — Meus olhos procuraram seu


rosto. — O que aconteceu? Você está bem?

Quando ela sorriu tristemente, eu sabia que ela não iria


me responder. — Parabéns por quebrar o recorde. — Ela
balançou a cabeça. — Você parecia ótimo lá.

Meus olhos seguraram os dela e ela corou.

— Ou jogou muito bem, — ela gaguejou. — Não parecia


ótimo. Não que eu possa ver seu rosto sob o capacete.

— Eu sei o que você quis dizer. — Eu suavizei meu tom.


— E obrigado.

Molly olhou para longe, olhando fixamente para a


instalação atrás de mim. Eu tive que fechar os olhos por um
segundo e tentar formular um plano. Andando até o meu carro,
eu não esperava vê-la ou ter essa conversa com a única pessoa
com quem nunca tive dificuldade para conversar. As palavras
de Rick e Marty sobre ela ecoaram na minha cabeça, cada vez
mais alto, até que eu quis bater na minha têmpora e desalojá-
las. Esvaziei meus ouvidos como se fossem água que eu permiti
enquanto nadava.

— Você ainda está gostando da casa?


Eu assenti. Bom plano, Griffin. Fique sem jeito até que
ela se sinta obrigada a falar porque você não consegue sair da
cabeça dela.

— Sim, umm, ainda estou lento em comprar móveis e


coisas assim. Não faço muito além de dormir e comer lá.

Isso fez parecer triste. Para mim.

— Você pegou seu telescópio pelo menos?

— Sim. — Esfreguei a parte de trás do meu pescoço. —


Ainda está na caixa em que foi enviado.

Isso estava ficando cada vez melhor.

Ela me deu um pequeno sorriso. — Encontrei uma


constelação outro dia.

— Sim? Qual?

— A Ursa Maior.

Eu sorri largamente, e parecia que aquele simples


movimento quebrou uma máscara de concreto do meu rosto.

Até que ponto estenderam meus olhos? Eu estava tão


focado no trabalho – comendo, respirando, dormindo – de bom
grado, permitindo que ele afogasse todas as outras coisas na
minha cabeça, para que eu não tivesse que dissecar o que
restava. E em uma conversa desconfortável, ela cortou-os com
os clipes de uma lâmina.
Não é à toa que nunca mergulhei meus dedos no oceano
de encontros e mulheres. Eu era péssimo nisso. Eu soltaria
uma pergunta estúpida, do tipo que você faria a um estranho.

Mas essa era Molly. A mesma mulher que me fez rir,


quando rir era a última coisa que eu queria fazer. Que me fez
sorrir e me surpreendeu quando pensei que estava além da
surpresa. A mesma mulher que, sozinha, aniquilou meu
controle lendário, porque eu não podia imaginar não beijá-la
ou prová-la. A única coisa que eu podia fazer era ser honesto.

Mas ela falou primeiro. — Eu devo ir.

— Espere. — Eu andei para frente, parando apenas de tê-


la tocado. — Por que isso é tão difícil? — Eu perguntei.

Molly caiu contra o carro e me deu um olhar infeliz. —


Vamos lá, Noah. Você sabe o porquê.

— Não, eu não, — eu disse. Corri minhas mãos pelos


meus cabelos, um gesto impotente quando o que eu queria
fazer era puxá-la em meus braços e sentir minha alma se
acalmar novamente. — Me ajude a entender por que é tão
difícil vê-la, por que não podemos conversar como de costume.

— Qual é o nosso normal? — Ela perguntou baixinho,


balançando a cabeça enquanto fazia isso. — Nós nos odiamos
até não o fazermos. Dormimos juntos, depois paramos de
conversar. E aqui estamos nós.

Eu levantei uma sobrancelha. — Isso é uma simplificação


maciça do que aconteceu entre nós.
— Eu sei que é.

— Nem foi minha ideia parar de falar. — Eu a lembrei


gentilmente.

Isso fez seus olhos brilharem perigosamente. — Você


pode me culpar por me afastar? Teria sido mais fácil tentar
fingir que o fim de semana não aconteceu? Filmar, trabalhar,
estar juntos todos os dias e apenas... fingir. — Sua voz soou
grossa. — Isso me pareceu um inferno.

— Não, não teria sido mais fácil. Eu odeio fingir. Eu não...


eu acho que não poderia fazer. — Eu dei um passo mais perto.
— Mas isso também não tem sido fácil, não é?

Ela deixou cair a cabeça nas mãos e exalou trêmula. Tive


a nítida impressão de que a única coisa que lhe permitia
manter suas emoções era se ela fisicamente bloqueasse a
minha presença assim. Eu dei um passo para trás.

— O que você quer que eu diga Noah? — Ela perguntou,


a voz abafada atrás das mãos. — Eu tive um dia de merda, e
estou cansada, e não sei o que você quer que eu diga agora.

— Eu quero que você seja honesta comigo. — Enrolando


minhas mãos em torno de seus pulsos, eu gentilmente puxei
suas mãos para longe de seu rosto. — Eu sei que você disse
que nunca tivemos um normal... mas... eu não sei o que fazer
com isso. Você era minha amiga, Molly. Eu conversava com
você mais do que com qualquer outro. Sinto sua falta. — Eu
disse a ela ferozmente. — Era fácil ignorar quanto você não
estava por perto, mas eu faço. E eu odeio como as coisas estão
estranhas agora. Você não?

Eu não podia acreditar no que tinha acabado de sair da


minha boca.

Sem prática.

Sem ensaio.

Inferno, eu mal havia registrado como me sentia, mas em


pé na frente dela, era como se alguém levasse um picador de
madeira para o que quer que eu estivesse usando para
bloquear tudo o que suprimi nas últimas oito semanas.

Era impossível acreditar que apenas um dia antes eu era


capaz de recuar e monitorar o pouco que sentia sobre minha
vida. Como alguém que perdeu a capacidade de sentir dor.
Você pode colocar a mão em um fogão e não registrar a
sensação de bolhas na pele. E agora, vendo seu rosto
expressivo trabalhar com o que eu havia deixado escapar, senti
tudo.

Cada pitada de seus lábios e cada mudança de seus


olhos. Quando eles se encheram de lágrimas, eu queria fazer
qualquer coisa, qualquer coisa humanamente possível para
fazê-la parar. Apenas a ameaça de lágrimas da parte dela, e eu
as senti como um maçarico no meu estômago. Mas se resistir
ao calor, se pressionando ainda mais era o que ela precisava
de mim, eu me aproximaria e seguraria as chamas contra mim
pelo tempo que ela precisasse.
Oh inferno.

Rick estava certo, aquele idiota.

Eu... eu me apaixonei por ela, e aconteceu sem eu


perceber.

— Noah, — ela começou, completamente alheia ao fato de


meu coração ter acabado de cair no chão a seus pés. — Claro
que sim. Mas... — Ela parou, os olhos estalando além do meu
ombro. — Merda. Eu preciso ir. Não posso estar diante das
câmeras agora. Não depois do meu dia de hoje.

Olhei para trás e vi Marty correndo em nossa direção


como se estivesse prestes a me pegar montando Molly no capô
de seu carro. Eu o prendi com um olhar e levantei minha mão,
mas ele apenas continuou correndo em nossa direção. Graças
a Deus ele estava tão fora de forma. Ele parou a cerca de
quarenta metros e apoiou a mão no joelho para respirar por
um segundo.

— Molly, — implorei. — Não vá.

— Por favor, não me faça fazer isso agora. Não na frente


da câmera. — Seus olhos eram enormes e suplicantes. Eu
assenti e dei um passo para trás.

Eu soube naquele instante que faria qualquer coisa que


ela me pedisse. Qualquer coisa, mesmo que isso significasse
deixá-la ir embora.
— Tenha um bom resto de temporada, Noah. — Disse ela,
pouco antes de fechar a porta com força.

— O que? — Fui pegar a maçaneta da porta e perguntar


a ela por que diabos isso parecia um adeus, mas dei um passo
para trás quando ouvi os passos de Marty e a respiração
desagradável atrás de mim. — Seu idiota podre. — Eu disse a
ele.

— Você a deixou sair?

Eu girei. — Sim. Ela não queria estar na câmera, seu


idiota. Você acha que eu a forçaria?

Marty suspirou, vendo o carro de Molly sair do


estacionamento quando o segurança levantou o portão. — Não.

Eu dei a ele um olhar seco. — Seu timing deixa muito a


desejar.

— Molly foi demitida, — ele deixou escapar.

— O que? — Eu gritei.

— É por isso que eu estava correndo aqui. Ouvi o irmão


dela dizer algo sobre isso quando eu estava arrumando minhas
coisas depois do treino. Você parecia uma merda hoje, a
propósito.

— Por que ela foi demitida?

— Por que você acha? — Ele balançou sua cabeça. — Ela


mentiu para a chefe sobre o que aconteceu em Dakota do Sul.
Acho que Beatrice havia acrescentado uma estipulação de não-
confraternização no contrato de Molly para este projeto que
cobria o elenco e a equipe. — Ele apontou para o peito. — E ela
não está dormindo com a equipe.

Passei as mãos pelo rosto. — Merda, merda, merda. Ela


disse que teve um dia difícil. — Minhas mãos se fecharam em
punhos. — Merda, — eu gritei. — Eu realmente quero dar um
soco em alguma coisa.

Marty me deu um olhar de aviso. — Nem pense nisso.

Com mãos trêmulas, peguei meu telefone celular e tentei


ligar para ela. Foi direto para o correio de voz.

— O telefone dela está desligado, — eu murmurei.

— Provavelmente um celular de trabalho. Aposto que ela


teve que deixar.

— Você sabe o quanto estou chateado com você e Rick?

— Nós?

— Sim. — Eu olhei para ele. — Minha vida estava


perfeitamente bem antes que vocês dois aparecessem. E agora
eu tenho um velho me informando que me apaixonei sem
saber, e outro velho que não pode correr por merda alguma
interrompendo a primeira chance que tive de falar com ela. Eu
odeio vocês.

Marty sorriu. — Nós amamos você também.


— Não acredito que ela foi demitida. — Meu peito apertou
com força. E depois mais apertado novamente. O amor era
horrível. Mesmo imaginando o que ela deve estar sentindo, me
fez querer arremessar um veículo inocente pelo
estacionamento.

Eu sabia como ela se sentia, porque eu passei por isso.


Adorei jogar em Miami. Uma escolha estúpida em uma noite
estúpida, e uma carreira que eu vinha construindo há anos foi
derrubada.

Abalada, mas não arruinada.

Eu gostava de Washington.

A equipe era forte.

O treinamento era excelente, mesmo que um desses


treinadores provavelmente estivesse planejando minha morte
sabendo que eu dormi com a irmã dele.

A cultura era acolhedora e calorosa. Estável. Isso era


mais difícil de encontrar do que você esperaria.

Mas não havia como eu saber disso quando fui enviado


para cá pouco antes do início da temporada. E não havia como
Molly saber agora, presa na lama e de se sentir abandonada
por um lugar que era tão importante para ela.

— Ela é uma garota inteligente, — disse Marty,


interrompendo meus pensamentos. — Esta é uma escolha
difícil, mas eu colocaria meu dinheiro nela qualquer dia. — Ele
cutucou meu ombro. — Quero dizer, se ela pode ficar cara a
cara com você sem recuar...

Eu sorri. Ela tinha. Pensando em todos esses momentos


agora, eu fui tão tolo que não tinha visto a rapidez com que ela
infiltrou-se na minha pele. Mas ela estava lá agora, e eu não
queria que ela desaparecesse.

— Eu preciso da sua ajuda, Marty, — eu disse, ainda


olhando para a estrada onde o carro dela havia desaparecido.

— Qualquer coisa.

— Antes de prometer isso, pode ser que você esteja


acorrentado ao computador por um dia ou dois.

Ele me olhou. — O que você precisa?

Coloquei meu braço em volta do ombro dele e voltamos


para o prédio. — Do jeito que eu vejo, você e Rick me devem,
certo? Por me emboscarem na frente de Beatrice. Mas acho que
devo também a você, por trazê-lo à tona em primeiro lugar. Eu
posso ter ficado um pouco...

— Cego? — Ele forneceu prestativamente. — Sem noção?

— Hiperfocado. — Eu emendei. — Quando estou no modo


futebol. Então aquele pequeno trailer que ele me enviou? Vou
precisar de mais de você.

— Eu tinha medo que você dissesse isso. — Ele suspirou.


— Se ela não tem telefone, como você vai entrar em contato
com ela?
Olhei de volta para as instalações do Wolves. — Eu
conheço um cara.

— Apenas... deixe-me filmar quando você perguntar, ok?

Eu rio. — Vamos acabar com isso agora?

O rosto de Marty empalideceu quando ele olhou para o


prédio comigo. — Agora?

— Por que você parece tão nervoso?

Seus olhos nunca vacilaram. — Porque estou


preocupado, estou prestes a pegar a sua morte no filme. E Rick
nunca vai me perdoar.

Eu soltei um suspiro profundo. — Logan não vai me


matar.

Marty olhou para mim.

— Ok, — eu cobri. — Não vai ser agradável. É por isso


que prefiro arrancar o curativo agora.

Ele estendeu a mão para a frente. — Lidere o caminho.


BATI na porta de Logan. Marty mudou para trás de mim,
provavelmente certificando-se de que ele tinha o ângulo ideal
para captar o que acontecesse a seguir.

— Entre, — disse Logan.

Minha expiração foi lenta e constante antes de abrir a


porta. A cabeça dele estava inclinada sobre o computador, o
rosto escondido pela aba do boné preto.

— Você tem um minuto, treinador?

O corpo de Logan congelou imperceptivelmente ao som da


minha voz. Quando ele levantou a cabeça, eu me preparei para
o que veria em seu rosto.

Não era bonito.

Ele cruzou os braços sobre o peito e recostou-se na


cadeira. A expressão de Logan era proibitiva, esculpida em
granito por tão pouco quanto ele doou.

Certo. Outro membro da família Ward que me esperaria e


me forçaria a falar hoje.

— Estou assumindo que você sabe o que aconteceu, —


comecei.

Sua mandíbula apertou.

— E eu também estou assumindo que você não está


muito feliz comigo agora.

Suas narinas dilataram. Eu tomaria isso como acordo.


— Mas mesmo que isso seja verdade, — eu disse,
mantendo o olhar aterrador o mais firmemente possível, — não
tenho como entrar em contato com ela, e espero que você me
ajude com isso.

Seus olhos se estreitaram perigosamente e, atrás de mim,


Marty se mexeu desconfortavelmente.

— Ela? — Ele falou devagar. — Por ela, você quer dizer a


minha irmãzinha? Aquela com quem você dormiu depois que
eu disse para você ficar longe dela?

— Sim. — Eu levantei meu queixo uma fração. — É dela


que eu estou falando.

A linha de sua boca se achatou.

— Logan, — eu disse a ele, mãos levantadas ao meu lado,


— posso encontrar outra maneira de alcançá-la, se você não
me ajudar.

Ele inclinou a cabeça. — Você acha que esse é o melhor


ângulo para tentar me convencer de que é uma boa ideia?

— Eu estou sendo honesto, porque eu respeito você o


suficiente para não mentir para você.

Uma sobrancelha ergueu-se na testa, lenta, incrédula.


Senti meu rosto ficar quente, porque a descrença irradiava dele
em fortes ondas.

— Sua irmã é importante para mim. Demorei um pouco


para perceber o quanto. — Engoli em seco. — E eu poderia
ficar aqui o dia todo tentando convencê-lo disso, mas sem
ofensa, não vou admitir nada que não tenha dito a ela primeiro.

Seu rosto ficou frouxo com compreensão.

Eu me apaixonei por Molly, e agora ele sabia disso.

Lentamente, Logan abriu os braços, seu olhar


procurando no meu rosto por... alguma coisa. Provas. Eu não
tinha certeza. Então ele passou a mão cansada pelo rosto e
assentiu. — Vou te ajudar. Apenas me diga o que você precisa.

Olhei de volta para Marty, que estava sorrindo atrás da


câmera. — No momento, só preciso de um tempinho para
reunir algo.
QUANDO SAÍ, sabia que poderia ter voltado para casa no
meu apartamento com Isabel. Mas a única coisa que me
esperava era a tentação de beber o dia todo e o inevitável choro
no meu travesseiro.

Então, mantive-me fiel à minha palavra e dirigi direto das


instalações dos Wolves para a casa de Paige e Logan a cerca de
trinta minutos. O bairro tinha árvores e arbustos altos e
maduros, e as casas estavam afastadas da estrada. Eles eram
grandes, mas não desagradáveis. E egoisticamente,
especialmente em momentos como este, quando me sentia
mais vulnerável, queria voltar ao lugar que me sentia em casa.

E nada parecia mais lar para mim do que aqui.

Estacionei meu carro atrás do de Paige e subi os degraus


de concreto até a sólida porta de carvalho, abrindo e fechando-
a rapidamente desde que começara a chover no caminho.

— Aqui atrás, — Paige chamou da cozinha. Senti o cheiro


de alho e carboidratos e aplaudi instantaneamente minha
decisão de vir aqui.
Emmett derrapou na esquina, batendo em mim em um
oof. Seus braços magros me envolveram em um abraço, e eu
me inclinei para beijar o topo de sua cabeça.

— Ei, amigo. Não tem escola hoje?

— Não. Mamãe disse que você precisava do abraço mais


apertado de todos os tempos.

Minha garganta apertou. — Eu preciso. Obrigada.

Ele colocou o queixo no meu estômago e olhou para mim


com olhos enormes. — Você pode me ajudar com meu dever de
matemática? Você é boa nisso, e mamãe disse que não faz essa
besteira.

— Traidor, — Paige gritou sobre o som da minha risada.


— E isso é um dinheirinho no pote de palavrões, sua boquinha
suja.

— Não estou xingando se estou repetindo algo que você


disse.

— Ooh, pegue ela com lógica, — eu sussurrei. — Eu


aprovo.

Ele sorriu. — Isso é um sim?

Eu esfreguei suas costas. — Vou lhe dizer uma coisa, você


me dá trinta minutos de tempo de menina – sem interrupções
– e então eu vou ajudá-lo.
— Combinado! — Ele saiu correndo, com os pés subindo
as escadas em direção ao seu quarto.

Paige encostou o ombro na parede da cozinha e me deu


um pequeno sorriso. Seus cabelos ruivos estavam trançados
por cima do ombro e, como sempre, ela parecia tão bonita que
era difícil olhar por muito tempo. Esse era o problema de ter
uma ex-supermodelo para ser sua mãe de aluguel. — Como
está minha garota?

Dei de ombros. — Eu não sei.

Ela abriu os braços e eu entrei neles sem mais


encorajamento. Paige suspirou, passando as mãos pelos meus
cabelos. — Diga-me o que você precisa de mim, porque às vezes
levo meu apoio violento e irado longe demais, e sou informada
por partes que não devem ser nomeadas que nem sempre é a
coisa mais útil que posso fazer.

Eu sorrio, enterrando meu rosto no ombro dela. — Logan


disse isso?

— Ele é um desmancha-prazeres. — Ela se inclinou para


trás e segurou a lateral do meu rosto. — Você parece mais
triste do que eu pensava depois de falar com você. Quero dizer,
eu sei que você está triste. Você amava o seu trabalho. Mas o
seu coração. — Ela passou o polegar sobre a minha bochecha
e ficou úmida pela lágrima que escapou. — Dói, não é?

A observação astuta – que só poderia ser feita por alguém


que realmente me conhecia – me afundei nos braços dela
novamente. Eu funguei ruidosamente. — Eu vi Noah no
estacionamento, e... — Eu chorei. — Ele disse que sentia
minha falta, e eu também, mas o que isso significa, certo? Ele
é um idiota. Ele não disse uma palavra em semanas. Semanas!
E então ele está me perguntando por que é tão difícil me ver, e
por que é tão difícil falar comigo. Ugh. Por que eu tenho que
responder essas coisas por ele, sabe? — Soluço quando Paige
nos vira, com os braços apertados em volta do meu ombro para
que ela possa me guiar em direção ao sofá na sala de estar. —
Não é como se eu estivesse sentada esperando Noah Griffin me
explicar às coisas agora que fizemos sexo. Tipo, descubra por
conta própria, seu idiota.

— Ohhhhkay, meu marido deixou algumas coisas de fora


quando me mandou uma mensagem, — Paige disse baixinho.
Uma vez que estava enfiada no canto do sofá, puxei meu
travesseiro favorito no meu colo e tirei meus sapatos.

Uma vez que o peso que estava apertado no meu peito, eu


a observei sobre a borda sedosa. — Logan não contou a você
sobre o ‘eu dormi com Noah e foi por isso que me demitiram’?

Suas sobrancelhas levantaram tão lentamente, tão alto


na testa que fiquei preocupada por um momento que elas
ficassem presas. — Não, não, ele não contou.

— Erm, sim. Foi por isso que eu disse que talvez não
devêssemos recorrer à pirotecnia contra Beatrice. Eu meio que
ganhei meu lugar nas fileiras dos desempregados.
Paige soltou um suspiro lento, seus pensamentos
estampados alto no rosto. A preocupação era antes de tudo, a
coisa que eu vi com mais clareza. Deliberadamente, ela girou
no sofá, cruzou as pernas, cruzou as mãos entre elas e me
encarou completamente. — O que devemos resolver primeiro?
O trabalho ou o sexo?

Quando ela colocou dessa maneira, talvez eu estivesse


um pouco de boca fechada com minha família desde que voltei
do meu fim de semana fora. Eu fiz uma careta. Não era meu
costume guardar coisas deles, não coisas grandes assim, mas
eu estava no modo de sobrevivência, me convencendo de que
estava bem com o que aconteceu em Dakota do Sul ficava em
Dakota do Sul.

Eu tinha trabalhado horas extras para manter tampada


a parte de mim que sentia falta dele, sentia falta de conversar
com ele, rir com ele e provocá-lo até que ele permitisse uma
rachadura em sua reserva. Era mais fácil não falar sobre ele
do que encarar a realidade de que tinha sido apenas um fim
de semana, apesar do que isso significava para mim.

Paige mudou inquieta quando eu não respondi


imediatamente.

— Por favor, me dê uma orientação, porque minha mente


está prestes a explodir se eu não receber esclarecimentos... —
sua voz aumentou em tom e volume — sobre o fato de você ter
dormido com o garoto que morava ao lado, e eu não saber, e
isso ter custado o seu emprego. Não sei o que dizer sobre nada
disso, Molly, e você não me dizendo nada está me assustando,
— ela grunhiu.

Eu sorrio, me inclinando para pegar uma das mãos dela.


— Respira fundo, ok?

Era parecido com o que ela havia me dito antes, quando


liguei do meu escritório, e nós duas rimos. — Desculpe. — Ela
disse. — É só que... você está jogando muito em mim, garota.
Com o que lidamos primeiro?

Minha andorinha era áspera, difícil de descer, mas era


Paige, então eu tinha que ser honesta. — Esta pode não ser a
resposta feminina mais poderosa, onde digo que nada importa,
exceto a minha carreira e ele é apenas um cara, e não preciso
que ele se sinta completo ou feliz ou que me ame.

— Há um tempo e um lugar para todas essas coisas, —


ela interveio. — Mas não há um tamanho único para o que faz
as pessoas felizes, ok? Se houvesse, teríamos uma lista de
verificação em preto e branco a seguir.

Eu assenti.

— Vamos falar sobre Beatrice, seu trabalho e o que você


fará a seguir, — prometeu. — Mas se Noah, o que quer que
tenha acontecido com ele, é o que mais pesa sobre você agora,
então vamos começar por aí.

As palavras vieram facilmente, como se eu precisasse da


permissão dela para descarregá-las no espaço seguro que
nosso sofá representava. Todas as quatro meninas choramos
lá entre a escola, ensino médio e faculdade. Se algum dia Logan
se livrasse daquele sofá, haveria um motim dentro da família
Ward. As almofadas afundaram um pouco onde eu estava
sentada, porque era o lugar favorito de todas, mas aquele sofá
era a melhor coisa a se fazer como o consultório de um
terapeuta.

Paige ouviu sem interrupção enquanto eu contava tudo a


ela. Ela sorriu sobre a yoga, suspirou quando cheguei ao nosso
primeiro beijo, corou como apenas uma mãe faria quando
cheguei a Dakota do Sul, e seus olhos ficaram
suspeitosamente vidrados quando lhe contei sobre minha
decisão de me afastar dele, como eu menti para Beatrice e até
o que aconteceu naquela tarde no estacionamento.

Minha garganta estava seca quando finalmente terminei,


mas meus olhos também porque havia algum poder estranho
em contar o que levou à minha situação atual. Eu não estava
brava com Beatrice. Eu estava frustrada comigo mesmo. Eu
não estava brava com Noah por não ter noção, porque o
relacionamento mais longo do homem era com um objeto
inanimado coberto de couro marrom com atacantes brancos e
isso era apenas triste pra caralho, com toda a honestidade. Eu
pedi espaço, e ele me deu. Não era justo segurá-lo contra ele
quando tudo que ele fez foi respeitar meus desejos.

Eu me senti pesada por todas essas coisas combinadas.


Sobrecarregada com os vários componentes do que me fizeram
perder o emprego, mas me fizeram me apaixonar por um
homem que tinha a disponibilidade emocional de uma rocha.
— Droga, garota, — Paige disse quando terminei. Ela
estava caída contra as almofadas do sofá.

— Eu sei. — Prendi a respiração enquanto a assistia


processar tudo. Confie em mim, eu sabia que era muito. Eu
tive por semanas e ainda me sentia um pouco confusa. — Eu
fui estúpida por me afastar?

— Oh Deus, Mol, não é assim tão simples. — Ela soltou


um sopro rápido de ar. — Eu não acho que você foi estúpida,
não. Mas eu acho que você e suas irmãs são quatro dos seis
maiores seres humanos a andar nesta terra, por isso estou
propensa a acreditar que tudo o que você decidir está correto
e assim te defender até a morte.

— Okay, certo. — Eu bufei. — Onde estava essa lógica


quando estávamos no ensino médio?

Ela sorriu. — Eu sei, eu sei. É mais fácil dizer agora que


não é minha responsabilidade decidir como pesar as
consequências de suas ações. Agora, minha filha, esse fardo é
seu. Seu para viver e seu para trabalhar.

— Estou tão feliz por ter vindo até você, porque isso está
me fazendo sentir muito melhor.

Paige riu. — Escute, o que vou dizer é isso: estar em um


relacionamento com um atleta não é fácil. Mas não preciso
dizer isso porque faz parte da sua vida mais do que faz parte
da minha. Entendo, ele é impulsionado, talentoso e está no
topo de seu jogo. Ele nunca colocou nada à frente do futebol e
isso faz dele uma aposta assustadora. Esse não foi o caso para
mim e seu irmão. — Ela sorriu. — Ele tinha vocês, e nada, nem
mesmo futebol, era mais importante que vocês quatro.

— Sinto um, mas...

— Mas, — disse ela lentamente, — não cabe a você tomar


essa decisão por ele quando ele tem uma imagem incompleta,
Molly. E foi isso que você fez. Ele a respeitava o suficiente para
não insistir, e isso foi antes que ele tivesse alguma pista de que
você poderia perder o emprego pelo que fez. O que ele teria feito
se soubesse que você estava se apaixonando por ele? O que
teria acontecido se você conversasse com Beatrice e dissesse a
ela que era um relacionamento sério? Não há como saber, não
agora. Talvez ele tivesse entrado em pânico, mas talvez não.
Talvez Beatrice tivesse demitido você mais cedo, mas talvez
não. — Ela encolheu os ombros.

Era como tentar desembaraçar um nó de fios


multicoloridos no meu colo, um do tamanho da minha cabeça.
Eu não sabia dizer onde começava, onde terminava, ou há
quanto tempo eu estava dando voltas e voltas na direção
errada. Era difícil dizer se a primeira curva errada já estava no
elevador quando vi Noah pela primeira vez. Ou pensando que
eu poderia ser amiga dele, beijá-lo, e dormir com ele sem
envolver meu coração. Que eu poderia provar a Beatrice algo
que ela nunca acreditaria plenamente em primeiro lugar.

Todas essas coisas eram iguais a uma bagunça maciça e


complicada.
— O que está acontecendo nessa sua cabeça? — Ela
perguntou. — Apenas... deixe escapar. Primeira coisa que você
gostaria de entender.

— Noah no estacionamento. — Eu pisquei com a rapidez


com que as palavras saíram. — Fiquei surpresa com o quão
estranho ele foi. Sua confusão de que o constrangimento
estava entre nós.

Emmett virou a esquina e Paige levantou a mão. — Mais


dez minutos, garoto. Afaste-se.

— Mas...

— Dez minutos, a menos que você queira minha ajuda


com a matemática, em vez da de Molly.

Ele desapareceu em um flash de cabelo cor de mogno, e


eu ri.

— Honestamente, — disse Paige, — é um pedaço de bolo.


Às vezes, os homens são incrivelmente ignorantes. E se você
pega um homem assim, que vive de acordo com o x e o manual,
que está no controle completo de quase todas as peças de sua
vida, exceto seu oponente, eles ficam muito bons em ler a
competição. Você tirou isso dele removendo-se da equação.
Não apenas isso, mas você também é uma mulher e, pelo que
parece, Noah teve pouca ou nenhuma experiência com essa
área nos últimos anos. Escolha dele, mas ainda assim. Você
abalou o mundo dele, Molly. — Ela sorriu e eu escondi meu
rosto atrás do travesseiro com um gemido. — E então você
desapareceu. O fato de ele ainda estar intrigado sobre como se
sente sobre isso significa que está tão ruim quanto você.

Recuei, mantendo um aperto firme naquele travesseiro.


— Por que parece tão fácil quando você explica?

— Porque eu sou velha, inteligente e felizmente casada


com um homem incrivelmente teimoso. É o trio de bons
conselhos de relacionamento.

Enrolando-me ao meu lado, sorri para ela. — Você


também é humilde. Não esqueça disso.

— É um fardo terrível de suportar, — Paige anunciou


gravemente. Ela bateu palmas. — Ok. Então agora que
entendemos o homem, o que fazemos sobre isso?

Infelizmente, eu sabia a resposta para isso. — Nós não


nos apressamos em nada.

O rosto dela caiu. — Nós não?

Eu balancei minha cabeça. — Fui de cabeça para tantas


situações sem prestar atenção em nada além dos meus
sentimentos. Noah é um exemplo perfeito disso. Duas vezes
agora, quando se trata dele, deixei meus sentimentos
anularem o bom senso. Concordo com você, Acho que Noah se
importa comigo e acho que poderíamos ter algo incrível. —
Engoli. — Mas não é minha responsabilidade fazê-lo entender
isso. Ou provar a ele que valho um lugar na vida dele. Sei que
valho a pena. Sei que ele vale mais do que aquilo que faz em
campo. Mas acho que... — – respirei instável – — preciso que
ele suba pela minha janela dessa vez. Faça algo que pareça
arriscado e louco por mim. Eu mereço isso.

Paige avançou no sofá e passou os braços em volta de


mim. Fui envolvida por quase um metro e oitenta de um
maravilhoso amor, avassalador e de influência materna.

— Você merece isso vezes um milhão. — Ela jorrou.

Eu dei um tapinha nas costas dela com uma risada.

— Podemos comer carboidratos agora? — Eu perguntei.

Paige se desembaraçou de mim e estendeu a mão para


me ajudar. — Sim. Vamos discutir sua outra questão com pão
de alho.

Eu sorri — Ah, eu já tenho uma ideia para isso. Não


ficarei desempregada por muito tempo.
— NÃO ERA ISSO que eu tinha em mente quando você pediu
minha ajuda, Griffin, — disse Marty. A cabeça dele estava
apoiada nos braços, todo o corpo caído de exaustão. Ou talvez
fosse irritação, eu realmente não sabia. Também não me
importei porque, uma vez que o plano começou a formular na
minha cabeça, eu fiquei como um cachorro faminto em um
pedaço raro de costela.

Cruzei os braços e apontei para a enorme tela que eu


havia montado acima da lareira da minha sala de estar. —
Faça backup de cerca de quarenta segundos e veja. — Estiquei
um braço. — Precisamos cortar logo ali. — Revirei os olhos
quando Marty gemeu: — Se você observar atentamente, poderá
ver do que estou falando ali.

— Se você me fizer assistir esse clipe mais uma vez, — ele


rosnou.

Olhei por cima do ombro. — Você vai o que? Olhar para


mim até a morte? — Minhas mãos se juntaram em um aplauso
afiado, e Marty pulou. — Preciso marcá-lo no diagrama
novamente?
— Não, — Rick e Marty responderam.

O diagrama havia sido uma imensa fonte de alegria para


mim nas últimas quarenta e oito horas. Ele estava sobre a
mesa da minha sala de jantar, espiralado com páginas
laminadas para que eu pudesse assinalá-lo com marcadores.
Meu próprio manual, porque eu podia entender essa estrutura
sobre como seguir em frente.

Campanha Ofensiva: M Ward.

O título precisava de trabalho, mas o que foi encontrado


nas páginas não era nada menos que genialidade. Eu nunca
me imaginei um cineasta, mas nos últimos dois dias, nós três
aprimoramos, cortamos, editamos, aprimoramos e reduzimos
meu relacionamento com Molly para um curta que merecia o
Oscar, se você perguntasse a mim.

Rick e Marty simplesmente não gostaram da minha


abordagem na direção, que parecia um pouco mais com a
minha tentativa de canalizar meu Bill Belichick42 interno. Eu
era implacável, fazendo-os repetir a mesma cena de trinta
segundos repetidas vezes, até que pegamos o momento certo
em que Molly me derrubou quando estávamos fazendo yoga.

A única razão pela qual eles não me amarraram e


enfiaram uma mordaça na minha boca foi porque eu tinha
concordado em deixá-los filmar a coisa toda quando ela

42 William Stephen Belichick é um treinador de futebol americano que é o treinador principal do New

England Patriots da National Football League. Belichick tem ampla autoridade sobre as operações de
futebol dos Patriots, efetivamente tornando-o o gerente geral da equipe.
estivesse aqui. Um cinegrafista do escritório veio depois que
Marty e eu tivemos nosso brainstorm43 no estacionamento,
depois arrumamos tudo com Rick.

O brainstorm do estacionamento estava cheio de emoção,


otimismo e esperança.

Agora, eles estavam planejando ativamente minha morte


com todos os pedidos que eu fazia para reproduzir outra parte
da filmagem.

— Ok, — eu disse, — vamos voltar para Dakota do Sul.


Acho que podemos dar mais impacto.

— Não, — Rick murmurou.

Minhas sobrancelhas se levantaram. — Desculpe?

— Não, não, não. — Ele se levantou do sofá e apertou dois


punhos nas costas enquanto se esticava com um gemido. —
Você é o Hitler de gestos românticos, e se ela não amar isso
exatamente como é, então que merda Griffin, não podemos
ajudá-lo.

Suprimindo minha irritação por eles não levarem isso tão


a sério quanto eu, cruzei os braços sobre o peito e o encarei
com as pernas abertas. — Tem que ser perfeito, Rick.

Minhas palavras ditas de forma tensa, pairaram no ar


enquanto eles me encaravam. Eles não entenderam?

43 Ou tempestade de ideias, mais que uma técnica de dinâmica de grupo, é uma atividade
desenvolvida para explorar a potencialidade criativa de um indivíduo ou de um grupo
Essa era a minha chance. Era assim que eu podia fazê-la
ver.

Vendo Molly assim – quando eu estava despreparado para


falar com ela, despreparado para a sensação de estar ao seu
redor e vendo o modo como todas as emoções se desenrolavam
em seu rosto – isso acendeu todas as luzes que estavam
escuras em sua ausência.

Talvez eu não tivesse visto imediatamente, que cada


segundo que passávamos juntos, cada segundo que ela
passava gentilmente me persuadindo por estar atrás do muro
que eu construí, tinha sido quando nos apaixonamos. Mas eu
vi agora.

Eu não pude deixar de vê-lo, nas horas e horas de filme


que eu tinha na ponta dos dedos.

Assistir ao filme foi uma preparação.

Assistir ao filme me ajudou a entender a mim e ao meu


oponente e, atualmente, o que me opunha era o relógio.
Washington teve uma semana livre, então o tempo para um
grande gesto romântico não poderia ter sido melhor.

Mas o tempo passou do mesmo jeito. Números brilhantes


e variáveis que se aproximavam cada vez mais de uma
campainha imaginária.

E eu estava lutando contra mim mesmo.


Mostrar a Molly que eu era capaz de permitir espaço na
minha vida para algo que não fosse futebol – não apenas algo,
para ela – precisaria ser grande.

Essas eram as páginas quinze a dezoito da cartilha, que


incluíam esboços de luzes no meu deck traseiro, um projetor
de filmes e uma tela gigante esticada entre os galhos das
árvores no meu quintal. E uma vaga ideia de colocar meu
colchão na grama e cobri-lo com travesseiros e cobertores para
que pudéssemos assistir nosso filme sob as estrelas. Meu
telescópio também estava lá fora em algum lugar, já que eu
havia mapeado exatamente o que seria visível no céu noturno.

Era assim que se fazia. Tudo alinhado corretamente, a


melhor defesa contra minha própria ignorância. Minha própria
ambição me cegou para todas as outras coisas que poderiam
importar tanto quanto minha carreira. Se eu pudesse fazer isso
corretamente, se eu pudesse fazer isso direito...

Meus pensamentos começaram a gaguejar no mesmo


lugar todas às vezes. O se...

Rick deve ter percebido a mudança de direção na minha


cabeça, porque eu não conseguia entender que talvez eu
tivesse lido Molly errado em tudo isso.

Ele colocou uma mão gentil no meu ombro. — Noah, está


perfeito.

Eu balancei minha cabeça. — Eu posso melhorar. Só


preciso de um pouco mais de tempo.
Marty e Rick trocaram um olhar.

— Molly não vai precisar da perfeição, — Marty disse


calmamente. — Você conhece essa garota. Mesmo quando você
era uma bunda de cavalo gigante, ela sentia algo por você.
Porque sabia que o verdadeiro você estava lá embaixo em
algum lugar.

Rick assentiu. — Tudo que você precisa fazer é mostrar a


ela que ela não estava errada sobre você. Que o que ela viu, em
que confiou, mesmo naquele fim de semana, valeu a pena.

— Vale o trabalho dela? — Eu perguntei secamente.

— Vale a pena arriscar, — ele corrigiu. — Ela assumiu


um risco porque você valeu a pena para ela. Isso... — Ele
apontou para o nosso pequeno centro de comando — você
também está assumindo um risco. Porque você pode passar
por tudo o que planejou, e ela ainda pode não dizer que sim.

O pânico era uma garra gelada que cavou direto no meu


peito, agarrou minha coluna com força e ameaçou puxar. —
Por favor, nunca seja técnico, porque essa é a pior conversa
que eu já ouvi.

E eu pensei que descobrir como levá-la para casa seria a


parte mais difícil. Eu me convenci até o momento atual em que
convencer Logan a me ajudar era a parte mais difícil. Mas a
parte mais difícil era deixar de lado, um dedo de cada vez, até
que eu pudesse voltar livremente para o que acontecesse a
seguir.
Em meus ouvidos, eu podia ouvir o pulso duro do meu
coração, porque sabia que Rick estava certo.

Antes que eu pudesse me convencer disso, puxei meu


telefone e enviei uma mensagem para o irmão dela.

Eu: Aqui está o meu endereço. Diga a ela o que você


precisar para trazê-la aqui, mas eu estarei pronto às 8 da noite.

Logan: Entendido.

Soltei um suspiro lento.

Rick sorriu. — Tudo pronto?

— Eu tenho oito horas para arrumar tudo.

— Muito tempo, — ele me assegurou. Então ele olhou


para o meu rosto com preocupação. — Você vai tomar banho,
certo? Porque você parece um pouco...

— Sem-teto. — Respondeu Marty. — Ele parece um sem-


teto.

— Vocês dois vão calar a boca? Sim, eu vou tomar banho.


Mas eu tenho coisas mais importantes com que me preocupar
agora.

Os olhos de Marty se arregalaram. — Mais do que o quão


terrível você está? Eu duvido muito.

Rick sufocou um sorriso. — O que você precisa?

— Eu tenho uma tela de projeção?


Ele assentiu. — Nosso cara pode estar aqui em duas
horas com tudo o que você precisa. Ele terá todo o A/V44
configurado para você. Tudo o que você precisa fazer é
pressionar o play.

— A ideia do colchão é estúpida?

Marty deitou a cabeça nos braços cruzados novamente.


— Eu sei agora. Eu sei por que você não transou por anos
porque você tem que questionar se um colchão é uma boa
ideia.

Minha expiração foi lenta e constante. — Tudo bem. O


colchão fica. Eu só não queria ser, você sabe, presunçoso.

— E você estará fazendo a coisa da constelação, certo? —


Marty levantou a cabeça. — Estrelas são uma merda
romântica, Noah. Você pode ficar atrás dela, todos esses
toques, mostrando a ela onde procurar e tudo mais.

Esfreguei minhas têmporas. — Sim, Marty, deveríamos


ver Pégasus45 com muita clareza. Mas pensei, não sei, não
deveria amarrá-lo? Fazer alguma conexão com a nossa história
de amor?

— Isso é com você, amigo. Estou aqui apenas para dirigir


a câmera.

44 Audiovisual.
45 Uma constelação
— Sim, — eu disse secamente, — certifique-se de
aumentar o zoom corretamente, se ela partir meu coração.

— Ela não vai, — disse Rick. — Qual é a história de


Pegasus?

Eu fiz uma careta. — Ele surgiu da cabeça decepada de


Medusa. Foi assim que ele nasceu.

Rick engoliu como se sua boca estivesse cheia de areia.


— Talvez... não use isso. — Ele me deu um tapinha desajeitado
nas costas. — Por que não assistimos a fita desde o início uma
última vez, está bem?

Marty gemeu. — Eu não posso. Eu não posso fazer isso.


Ele nos fez assistir oito mil vezes nos últimos dois dias, Rick.
Se eu os vir quase se beijando mais uma vez, vou perder a
cabeça.

Eu olhei para ele. — E de quem é a culpa de que você tem


isso em filme?

— Como se eu soubesse o que vocês estavam fazendo


quando voltei para cima! Eu nem percebi que peguei nada até
voltar ao escritório.

Rick levantou as mãos. — Tudo bem. Marty, respire.


Noah, você e eu podemos pegá-lo de cima. Mas eu prometo. —
Disse ele. — É perfeito. Ela vai adorar.

— É melhor funcionar, — eu murmurei. Ele começou o


vídeo que havíamos feito novamente e, assim como eu sempre
assistia, havia uma sensação inquietante de retidão a cada
segundo. O fato de eu ter perdido isso, desde o primeiro dia,
parecia impossível agora.

Nós assistimos em silêncio, e me vi sorrindo quando


chegamos aos trechos desde o dia em que fizemos yoga. Marty
lutou com unhas e dentes pela cena em que eu
descaradamente checava a sua bunda, e ele estava certo, foi
engraçado. Uma fenda na armadura, uma quebra no meu
controle, quase como se ela o tivesse roteirizado desde o
começo.

Houve uma batida brusca na porta e eu suspirei,


apertando o botão de pausa no controle remoto.

— Quer que eu atenda? — Rick perguntou.

— Não. Provavelmente é um vizinho ou algo assim. Eu


continuo conseguindo evitar o comitê de saudação.

Abri a porta.

E lá estava ela.

— O que... — eu gaguejei. — Molly?

Seu irmão estava atrás dela, um sorriso astuto


estampado em seu rosto.

Ela olhou por cima do ombro para ele. — Ele apenas...


apareceu aqui e não me disse o porquê.
Quando ela me encarou novamente, suas bochechas
estavam coradas de rosa brilhante, seus olhos brilhavam de
nervosismo.

O fato de que minha casa estava uma bagunça, nada


estava pronto, nenhuma luz estava acesa e nenhuma música
suave tocava sob o céu escuro do pôr-do-sol ou que eu parecia
um sem-teto louco não importava. Havia mil detalhes que
poderiam ter tornado a noite mais perfeita do mundo, mas, de
repente, eles eram completamente irrelevantes.

O excesso reduziu, trazendo o momento até a verdade


nua e crua, os ossos inquebráveis do que eu precisava saber,
em que precisava confiar.

Ela estava aqui. E eu a amava.

— Você vai entrar? — Eu perguntei.

Molly piscou. — Você sabia que eu estava vindo?

Eu dei a Logan um olhar carregado. — Você deveria ser


entregue um pouco mais tarde, — eu disse significativamente.
— Mas sim. Logan concordou em me ajudar.

Os lábios dela se curvaram em um sorriso. — Então me


desculpe, estou adiantada.

— Eu não estou, — respondi.

O sorriso aumentou e soprou através de mim como uma


verdadeira bola de demolição. Isso sempre era o que Molly
tinha sido para mim. Uma arma de destruição em massa,
testando todos os limites que eu já havia me dado. E eu não
queria isso de outra maneira.

Recuando para que ela pudesse entrar na casa, eu olhei


para Logan. — Para que foi isso? — Eu assobiei.

Ele se inclinou para me dar um tapa no ombro. Duro. —


Isso foi por dormir com a minha irmã, idiota. — Então ele
sorriu. — Bem-vindo à família.

Quando ele voltou para a caminhonete, ele assobiou, e eu


não pude deixar de balançar a cabeça com a forma como tudo
isso aconteceu. Dez anos em construção, uma conclusão
inevitável que era impossível para mim evitar.

Fechei a porta e tentei me reagrupar porque bem... eu


tinha acabado de ser bombardeado. Passado para trás. E eu
nunca vi isso acontecer.

Rick estava sorrindo enquanto cumprimentava Molly. —


Ele tem sido um terror absoluto para aguentar desde que você
saiu.

— Essa é a sua maneira de dizer que sentiu minha falta?


— Ela perguntou. Marty subiu correndo as escadas quando
ouviu a voz dela e a envolveu em um abraço enorme que a fez
rir. — Acho que isso responde à minha pergunta.

— Não nos deixe sozinhos com ele, — implorou Marty.

Molly colocou um pedaço de cabelo atrás da orelha e me


deu um olhar tímido que fez meu coração bater – grande,
grande, maior – até que pareceu esticar sobre todo o meu
corpo. — Vou ver o que posso fazer, — disse ela.

Eu sorri.

Era tão certo tê-la aqui. Era isso que fazia me sentir em
casa. Ela.

Seu olhar percorreu o espaço e, mesmo confusa, ela


parecia feliz. Então o sorriso congelou, seus olhos se
arregalaram quando ela avistou a tela da TV. — Somos nós, —
ela disse entorpecida.

Rick e Marty trocaram um olhar. Rick me deu um sinal


de positivo e desapareceu no andar de baixo. Marty pegou sua
pequena câmera e voltou para a cozinha, para poder ficar fora
do caminho e ainda pegar o que precisava ser filmado. Era o
nosso compromisso.

Fora do alcance da voz, se ela e eu falássemos em voz


baixa, eles se esforçariam para nos ouvir. O outro cinegrafista
desligou sua máquina e seguiu Rick escada abaixo. Ele
assentiu me encorajando também. Talvez eu devesse aprender
o nome dele antes que tudo acabasse.

— Somos nós, — eu disse, vindo atrás dela. — É...


inferno, não era assim que eu queria fazer isso.

Ela estendeu a mão para a mesa de café e


cuidadosamente pegou o controle remoto. Antes de apertar o
botão play, ela soltou um suspiro trêmulo.
Mas minha corajosa garota, sem saber o que veria ou o
que eu pretendia, levantou o queixo e começou de novo.

Eu já tinha visto o filme o suficiente, o florescimento do


nosso amor condensado em oito minutos, para que eu pudesse
vê-la descaradamente.

Um minuto depois, ela estava sorrindo para a cena em


que ela me bateu na bunda, dizendo que eu poderia ser
melhor.

No segundo, ela tinha uma mão cobrindo a boca


enquanto soltava uma risada ao me ver saindo da casa
pequena.

No terceiro, e eu peguei o brilho de lágrimas felizes


durante a nossa sessão de yoga.

Aos quatro minutos, percebemos que Marty pegou nosso


quase primeiro beijo. Ela apertou a mão trêmula na boca.

Era impossível ficar tão longe dela, então me aproximei


silenciosamente por trás, deixando escapar um suspiro lento
antes de minhas mãos subirem pelas laterais dos braços dela.
Eu segurei seus ombros, quentes e firmes, e seu cabelo macio
fez cócegas em meus dedos. Ela se recostou em mim, me dando
todo o seu peso, e eu exalei meu alívio, passando os braços em
volta da frente do peito enquanto ela assistia as imagens de
Dakota do Sul.

Isso era sutil para qualquer um que estivesse assistindo,


mas para Molly e eu era brilhante e óbvio, um holofote sobre
tudo o que estávamos negando. A câmera me pegou
constantemente observando-a fora da tela. Tudo o que eu não
conseguia entender estava ali nos meus olhos.

Eu apertei meus braços, e suas mãos subiram para


agarrar meus braços. Com ela dobrada contra o meu peito, eu
poderia colocar meu queixo facilmente no topo de sua cabeça.
Ela abaixou a boca e deu um beijo suave na pele macia do meu
pulso.

— Eu era tão idiota, — eu sussurrei.

Ela me beijou novamente, logo acima do meu polegar. —


Só um pouco.

A risada saiu antes que eu pudesse parar.

— Shhh, eu ainda estou assistindo, — ela repreendeu


gentilmente.

Fechei os olhos e a respirei. Como eu já pensei que


poderia viver uma vida plena, uma vida satisfatória, se eu não
tivesse isso?

Que idiota eu tinha sido.

Ela fungou quando assistiu a minha versão em branco e


robótica depois que ela se afastou. Era a parte que eu mais
odiava – o que eu aceitaria, o que eu aceitava, como uma vida
normal e saudável.
Então ela riu quando viu o fim. A parte que Marty pegou
na minha tentativa fracassada de correr no estacionamento. A
tela ficou preta e Molly girou lentamente em meus braços.

— Você fez isso? Para mim?

Minha mão segurou seu rosto e meus olhos se deleitaram


com os pequenos detalhes que eu tinha perdido. A saliência do
queixo, o nariz delicado, o peso do corpo contra o meu. — Eu
tive uma pequena ajuda, — eu admiti com um sorriso. — E
haveria uma entrega muito melhor.

— Sim?

— Uma tela no quintal. Luzes. Uma cama grande na


grama, onde poderíamos assistir.

Sua sobrancelha se levantou, mas ela estava passando as


mãos sobre o meu peito, então eu pensei que não estava com
muitos problemas.

— E as estrelas, — continuei. — Encontrei Pégasus e


tinha toda a intenção de tentar torná-lo romântico, mas... não
é. Ele veio de uma cabeça decepada, então é provavelmente
melhor que não tenha dado certo de qualquer maneira.

O riso começou baixo em sua garganta, borbulhando


quanto mais eu divagava. Finalmente, ela teve pena de mim e
colocou a mão na minha boca. — Pare.

Eu beijei seus dedos. — Ok.


— Por que você fez isso? — Ela perguntou baixinho. — O
filme.

— Porque precisa haver um disco em algum lugar, — eu


disse a ela. — Deveria haver prova, prova inegável, da melhor
coisa que já consegui em minha vida. — Coloquei meus braços
em volta das costas dela e a levantei em meus braços para que
eu pudesse sussurrar onde ninguém além de nós ouviria. —
Me apaixonar por você foi a melhor coisa que eu já fiz, Molly
Ward.

Seus braços estavam tão apertados em volta do meu


pescoço que eu senti o jeito que seu corpo tremia. Dentro do
círculo dos meus braços, ela soltou um soluço de alívio. — Eu
também te amo. — Ela sussurrou de volta.

No momento seguinte, sua boca estava na minha, dura,


doce e profunda. A feroz plenitude do beijo puxou um gemido
do meu peito, e ela colocou as pernas em volta da minha
cintura para que ela pudesse se segurar mais forte e se mover
com mais firmeza contra mim.

Eu a queria.

Eu a amava.

Ela me amava.

E pensei, quando congelei, estávamos sendo filmados. Eu


me afastei e ela seguiu com um gemido.

— Câmera, — eu disse contra seus lábios.


Molly ficou quieta, outro sorriso brilhante se espalhando
por seu rosto. — Oh, sim.

— Mas assim que os expulsarmos daqui... — prometi com


um grunhido.

Ela pulou dos meus braços e chamou Rick para subir as


escadas.

Olhei para Marty, que estava enxugando lágrimas do


rosto descaradamente.

Rick subiu levemente os degraus. — Você chamou?

— Sim, — ela disse. — Você e eu temos que conversar


amanhã de manhã. Mas agora, você precisa sair.

Seu rosto enrugou em confusão. — Amanhã de manhã?

Molly assentiu, conduzindo-os gentilmente em direção à


porta. — Sim. Eu tenho uma proposta de emprego para você.
Acho que você deveria me contratar.

Minhas sobrancelhas levantaram em surpresa. As dele


fizeram o mesmo.

— Ele diz que sim! — Marty interrompeu quando ele


rapidamente começou a embrulhar os cabos.

Rick olhou para ele. — Amanhã. — Ele prometeu. — Mas


não podemos, eu sei, filmar um pouco de carinho feliz?

— Não, — Molly e eu respondemos.


— Temos outras coisas para discutir, — disse Rick. —
Muita coisa aconteceu nesta semana. Você nem conhece nossa
nova ideia!

— Fora. Ou eu vou começar a me despir, — ela avisou. —


E isso tornará meu futuro emprego estranho. E você violaria a
cláusula de nudez se me filmar em qualquer estado de nudez.

Minha cabeça inclinou-se para uma risada estridente, e


Rick me deu um olhar exasperado.

Em mais dois segundos, ela os colocou do lado de fora da


porta, e as trancas dispararam decisivamente. Eu coloquei
minhas mãos nos meus quadris quando ela se virou, suas
costas contra a superfície da porta.

— Agora. — Ela disse. — Vamos recapitular.

— Ok. — Eu me aproximei dela.

— Sou sua namorada.

— Sim. — Minhas mãos encontraram seus quadris.

— Você é meu namorado.

— Mmmhmm. — Meus lábios encontraram a curva suave


de seu pescoço.

— F-finalmente estamos sozinhos. Sem câmeras. Ou


microfones. Ou familiares sob o mesmo teto. — Seus dedos
empurraram sob o algodão macio da minha camisa, e eu
assobiei quando ela os seguiu pela borda do meu short.
— Está correto. — Mordi a delicada linha da clavícula,
acalmando-a com a língua quando ela gemeu.

— Você me ama. — Disse ela calmamente.

Eu me afastei e segurei seu olhar firmemente. — Eu amo.

— E eu amo você. — Ela terminou.

Minha voz estava rouca quando finalmente consegui


falar. — Sim.

— Isso é bom. Eu gosto de tudo isso.

Eu sorrio. — Como devemos comemorar? Toda grande


vitória precisa de uma grande festa.

— Como... — Ela baixou a voz como uma locutora de


esportes. — Você acabou de ganhar o Super Bowl, o que você
fará em seguida?

— Nós não estamos indo para a Disneylândia, querida. —


Prometi. Mas o fato de que ela poderia me levar à beira do riso
em um momento tão carregado de tensão sexual, tão cheio de
desejo e desespero de pegar, pegar e pegar, foi como eu soube
que Molly era a pessoa certa para mim.

Ela inalou com um sorriso satisfeito, puxando as bordas


dos lábios. — Leve-me para sua cama grande, em seu quarto
grande, porque estamos prestes a quebrá-la, Noah Griffin.

Eu a peguei em meus braços, saboreando o grito feliz que


saiu de sua boca. — Você é quem manda.
Ficamos lá o dia todo e a noite toda, apenas parando
brevemente para comer. Um chuveiro. E conversas sem fim. O
manual provavelmente ainda estava aberto em uma pilha
inútil na mesa da sala de jantar. Mas esse era o ponto.

Eu não poderia ter roteirizado isso, não poderia ter


planejado, não poderia ter controlado.

Porque, às vezes, as melhores coisas da vida vêm


diretamente do seu lado cego.
SEIS MESES DEPOIS

— OH, AMOR, você viu este? — Vovó Griffin jogou o Us


Weekly no meu colo enquanto passava pelo sofá. — Você é
bonita demais para o meu neto.

Noah gemeu quando eu virei para o artigo que ela


brincava. — Outro artigo?

Eu dei uma cotovelada nele. — As pessoas nos amam.


Nós somos fofos.

Era uma menção rápida. Nunca em um milhão de anos


eu teria previsto ter um canto de uma página de revista
dedicada a mim, meu namorado gostoso e nosso estilo de
tapete vermelho.

A Amazon fez de tudo para a temporada do ‘Tudo ou


Nada’, apresentando Noah, e para minha surpresa sem fim,
eu. Em vez de vermelho, tínhamos feito um tapete preto, para
que meu vestido vermelho se destacasse. E destacou.

Era uma foto que eu tinha visto muito. Os usuários do


Instagram pareciam gostar daquela em particular. Noah estava
vestindo smoking, com o braço em volta da minha cintura, a
cabeça inclinada em minha direção e o nariz pressionado
contra a têmpora.

Eu estava sorrindo amplamente, meus ombros inclinados


em direção a ele e uma mão colocada contra seu peito. O
vestido de estilo grego que eu escolhera era um vívido escarlate
que pendia sobre um ombro e era apertado em volta da minha
cintura com um cinto de ouro. O que a câmera não conseguiu
ver porque o comprimento do vestido varreu o chão foram os
saltos dourados espetados que duraram apenas enquanto a
foto foi tirada.

No momento em que estávamos no cinema para a


exibição do primeiro episódio, eu tinha deslizado para
sapatilhas nude.

Foi a nossa primeira noite como casal no centro das


atenções, e as mídias sociais explodiram com o lançamento de
toda a temporada de episódios documentando nossa história
de amor. Desde que Rick me contratou antes mesmo de me
lançar, eu estive envolvida na elaboração do produto final da
nossa história do começo ao fim. E foi muito boa para a
televisão, se eu mesma dissesse.

O último episódio foi o meu favorito, o que filmamos


durante o jogo final dos playoffs, que perdemos de 28-21. Ele
resumiu tudo sobre o que Noah e eu tanto amávamos. Antes
das câmeras se moverem para nos seguir durante o jogo, houve
alguns momentos doces e tranquilos em que ele me ajudava a
desfazer as malas. Eu amava Isabel, mas morar com Noah era
muito mais divertido.

Quando os momentos tranquilos terminaram, e nós o


vimos jogar seu coração por quatro quartos, apenas para que
a defesa adversária nos detivesse cinco metros a menos da end
zone quando o relógio acabou. A devastação e a decepção em
seu rosto ainda me fizeram chorar, como naquele dia. Ainda
era difícil para mim assistir, embora estivéssemos a alguns
meses dele agora. Mas os espectadores adoraram.

Eles adoravam o quão real éramos um com o outro. Eles


adoraram que minhas filmagens no final do jogo fossem tão
emocionantes, que minha tristeza por ele era tão óbvia quando
me sentei nas arquibancadas com os outros fãs decepcionados
de Washington. Foi o que fez a cena final tão comovente.

Eu subindo na barreira e nos braços dele esperando. Ele,


suado, desgrenhado e sujo, me colocando em um abraço
apertado no caótico campo pós-jogo. E ele sorriu.

Não um sorriso triste.

Noah Griffin sorriu como se tivesse acabado de ganhar.

A avó dele, nossa anfitriã da semana, me disse que havia


assistido todos os episódios três vezes. Ela manteve todos os
artigos que nos mencionaram e fez questão de me mostrar cada
um.

— Você está pronto, filho? — O pai de Noah perguntou da


cozinha.
Noah assentiu, dando um beijo suave nos meus lábios
quando ele se levantou do sofá. — Voltaremos para o jantar.

— Ok. — Agarrei a frente de sua camisa e o puxei de volta


para outro beijo. — Divirta-se consertando cercas.

Ele revirou os olhos. A avó dele e eu rimos.

Noah saiu da cabana primeiro, e eu sorri quando peguei


o rubor envergonhado no rosto de seu pai quando ele saiu da
cozinha. Demorou um pouco para ele se acostumar a me ter
por perto e ver o carinho fácil que Noah e eu compartilhamos.

Enquanto eu passava mais tempo com seu pai, ficou tão


claro como Noah se encaixava nos padrões que ele possuía.
Lenta, mas seguramente, seu pai estava relaxando ao meu
redor. Meu objetivo era uma semana em todos os verões em
que Noah, seu pai e eu chegávamos juntos a Dakota do Sul.
Eventualmente, eu o quebraria nos jantares de família de
terça-feira. Ele ainda não sabia disso.

E foi por isso que vovó Griffin proclamou que eu era sua
nova pessoa favorita em todo o mundo.

Ela esfregou meu ombro enquanto passava por trás do


sofá. — Precisa de alguma coisa enquanto eu estiver acordada,
querida?

Eu sorrio para ela. — Estou bem, obrigada. Eu tenho


algum trabalho a fazer por Rick enquanto eles estão lá fora, a
menos que você precise da minha ajuda com qualquer coisa.
— Não, não, apenas um par de mãos é tudo o que preciso
para remover algumas ervas daninhas.

— Vou sair quando terminar, — eu disse a ela. — Não vou


demorar muito.

Ela colocou o chapéu de abas largas na cabeça e parou


antes de sair para a frente. — Na verdade... — Disse ela,
puxando as luvas de jardinagem. — Eu sei como você pode
ajudar.

Eu olhei. — Sim?

Ela levantou as sobrancelhas. — Um bisneto seria


adorável.

Enquanto ela caminhava para fora, eu ainda estava rindo


porque ela encontrou muitas maneiras de lembrar a Noah e a
mim que ela precisava de um bebê para estragar.

A porta se abriu de novo e meu sorriso se suavizou


quando Noah voltou para a cabana.

— Esqueceu algo? — Eu perguntei.

Ele pegou sua garrafa de água do balcão. — É mais


quente que o inferno lá fora.

— Vou dar outro beijo enquanto você estiver aqui.

Ele já estava suado, um dos meus looks favoritos do


homem que eu tanto amava. Quando ele veio ao redor do sofá
para me prender com os braços e tomar minha boca em um
beijo profundo e ardente, senti um desejo desesperado correr
através de mim, como sempre acontecia.

Honestamente, foi um milagre não estar grávida depois


de tantas vezes ele me levou para a cama.

Noah havia provado que o sexo frequente não prejudicava


seu desempenho em campo. O jogador defensivo do ano
também lhe caiu bem.

Lambi meus lábios quando ele se afastou. — Seu pai


notaria se você não voltasse para fora imediatamente, certo?

Noah cantarolou. — Sim.

Eu arrastei meu dedo ao longo da borda de sua


mandíbula. — Ok. Eu posso esperar até hoje à noite. — Seus
olhos procuraram meu rosto e pousaram infalivelmente na
minha boca. — Você pode?

Meu coração começou a bater forte e meus dedos do pé


se enrolaram. — Sim?

— Eu não posso. — Afirmou.

Meus lábios se abriram em um sorriso lento. — Não?

Como sempre, meu grandalhão foi rápido em tomar sua


decisão. — Não.

E ele me pegou, com as duas mãos debaixo da minha


bunda. Minhas pernas enrolaram em sua cintura quando ele
se endireitou, virando-nos em direção ao nosso quarto.
Eu amava a cama naquela cabana. Era a minha segunda
cama favorita no mundo.

— Noah? — Eu disse sem fôlego quando ele chupou ao


longo da minha mandíbula.

Ele rosnou algo ininteligível na minha pele.

Eu agarrei os lados do seu rosto, então eu sabia que ele


estava prestando atenção em mim.

— O que? — Ele disse. Ele já tinha o olhar atordoado que


tinha quando minhas roupas começavam a desaparecer.

— Certifique-se de trancar a porta, — eu disse. — Não


quero interrupções para o que estou prestes a fazer com você.

Ele sorriu. Suas mãos se apertaram no meu corpo


quando ele nos levou para o quarto, seu pé dando um chute
rápido na porta.

Não importa como a nossa história de amor começou,


desde que ela nos trouxe aqui, era perfeita.
Pesquisando na Internet, vislumbres de sua mãe
provocaram estranhas reações emocionais. A menos que você
tenha experimentado essas reações, era difícil colocá-las em
palavras. Ocasionalmente, recebíamos um cartão postal dela
com um endereço atualizado, ou uma imagem sem legendas
aparecia na conta do Facebook normalmente silenciosa, a que
ela ainda tinha acesso. Esses pequenos trechos eram a única
maneira que minhas irmãs e eu sabíamos onde Brooke estava
passando seus dias.

Meu coração e minha cabeça estavam em guerra quando


estudei as últimas fotos que ela postou. Eu não estava furiosa
com o pensamento dela, era difícil ficar quando tínhamos uma
vida tão feliz na ausência dela. Mas também não sentia nada.
Às vezes eu queria dar um soco nela. Às vezes eu queria
abraçá-la. Acima de tudo, eu queria me sentar em frente à
Brooke Ashley Huntington-Ward e separar seu cérebro. Esse
foi o sentimento mais desesperado de todos eles, lutando pelo
primeiro lugar na minha cabeça. Eu queria entender o porquê,
e isso me deixou loucamente louca por nunca ter essa
resposta.

Enquanto eu percorria, contando cinco fotos postadas


nos últimos três anos, o telefone da minha irmã gêmea
acendeu na mesa ao meu lado onde estava carregando. Meus
olhos cortaram para a tela, uma força do hábito, porque muitas
vezes era um texto de grupo de uma de nossas outras irmãs
ou Paige.

Não era de nenhuma delas, no entanto. O que apareceu


foi um texto de Finn, o melhor amigo de minha irmã gêmea Lia,
e como eu havia treinado meu corpo para fazer isso, meu
coração acelerou ao ver seu nome estúpido.

Finn: Lia, POR FAVOR, devo-lhe um milhão de favores se


você me ajudar.

— Eu vou ajudá-lo. — Eu murmurei miseravelmente. Não


importava no que ele precisava de ajuda. Eu faria isso. Eu faria
isso sem um milhão de favores. Se eu fechasse os olhos,
poderia imaginar todos os detalhes de seu rosto. A maneira
como seu sorriso era um pouco torto. A largura de seus ombros
que parecia se expandir a cada ano. O exterior tímido que
escondia uma personalidade que era tão, tão engraçada, seca
e sarcástica. Mas não fechei os olhos porque imaginar o melhor
amigo da minha irmã gêmea era outra coisa que fazia minha
cabeça e meu coração guerrearem poderosamente. E toda vez,
minha cabeça ganhava.

Deixe-o em paz.

Seria muito estranho.

Ele nem olha para você dessa maneira.

Essas foram todas as coisas que eu disse a mim mesma


quando minha paixão por Finn explodiu fora de controle. E
isso ajudou por anos.
— Texto de Finn. — Eu gritei.

— O que ele quer? — Lia chamou da nossa cozinha, logo


na esquina do meu quarto.

Engoli em seco enquanto lia o texto novamente. —


Socorro. Ele lhe deve um milhão de favores.

Lia gemeu. — Ele poderia oferecer dois milhões, e eu


ainda não seria capaz de fazê-lo.

— Com o que ele precisa da sua ajuda?

— Um jantar extravagante e cerimônia de premiação. Ele


precisa de uma convidada, e como ele se recusa a encontrar
uma garota, sua mãe praticamente exigiu que eu fosse com ele.
Eu acho que ela realmente colocou meu nome na lista de
convidados porque ela assumiu que eu não diria não.

Meu coração apertou com ciúmes indesejáveis. — É só


um jantar. Por que não vai?

— Eu não posso. Eu tenho algo naquela noite, e movê-lo


não é uma opção. Ele apenas pensa que estou sendo teimosa.

Revirei os olhos. Lia era fisicamente incapaz de admitir


quando estava sendo teimosa, o que representava cerca de
noventa e dois por cento de sua existência.

Os sons de seus passos se aproximaram da minha porta,


rápido e alto. — Espere. — Disse ela.

Virei minha cadeira para encará-la. — O que?


Um sorriso malicioso se espalhou por seu rosto.

— Não. — Eu disse instantaneamente. Telepatia de


gêmeas, pessoal. Era uma coisa real.

— Ah sim. — Ela esfregou as mãos juntas. — Não fazemos


uma troca dupla há anos, Claire. Vamos lá, não vai ser
divertido?

Enquanto minha cabeça tentava desesperadamente


entender a ideia de fingir ser minha irmã pela primeira vez
desde o colegial, era um sussurro fraco comparado ao que meu
coração estava fazendo.

Aquele órgão em particular enterrado no meu peito estava


rugindo e se debatendo, gritando comigo para fazer uma coisa
que me daria o meu maior desejo não realizado.

Tempo com o Finn.

— Ele saberá. — Argumentei fracamente.

Lia soprou uma framboesa pelos lábios. — Não, ele não


vai. Você sabe ser eu, Claire. É um jantar. Então eu estou fora
do gancho, e sua mãe sai de suas costas.

Um jantar com Finn. Uma noite, para chamar sua


atenção, em vez de tocar a terceira roda para a amizade
claramente não romântica entre ele e minha irmã. Eles nunca
deram a entender que queriam ultrapassar essa linha, que era
a única razão pela qual eu estava considerando essa
insanidade. Porque por uma noite, eu queria saber como era
ter os olhos dele em mim. Usar um vestido bonito e passar a
noite ao lado dele.

— Um jantar. — Eu disse novamente.

Ela saltou animadamente na porta. — Você fará isso?


Seriamente?

Respirei fundo e segurei, silenciando todos os


argumentos que surgiram na minha cabeça. — Eu vou fazer
isso.

Fim
Esta queda foi um borrão completo e total de escrever e
viajar, e estou incrivelmente agradecida por minha pequena
tribo de pessoas (amigos e familiares) entender o que isso
significava para mim.

Foram longos trechos de escrita, vendados e ignorando


textos por dias. Foram listas de tarefas sem espaço de manobra
e praticamente sem socialização por três meses. Nas noites e
fins de semana, passava um tempo com minha família e
guardava meu telefone.

Ser escritor é estranho. É um trabalho que a maioria das


pessoas realmente não entende, e tudo bem. Onde eu sou TÃO
AFORTUNADA que as pessoas na minha vida que não
entendem ainda me amam e me respeitam quando eu tenho
que ignorá-las.

Então, aqui está essa lista:

Para o meu marido. Nós oficialmente sobrevivemos ao


nosso primeiro trecho de nós dois trabalhando em casa. YAY!
Obrigada por respeitar todos os limites loucos que coloquei no
meu próprio 'espaço de escritório', tanto mental quanto físico.
Você nem piscou quando olhei nos seus olhos e disse: — Se
você precisar de QUALQUER COISA DE MIM, pode esperar até
que eu pegue os meninos da escola. Então, por favor, pelo
amor, não me interrompa pelas próximas sete horas, a menos
que esteja sangrando. Eu te amo.

Para os meus filhos, porque eu acho vocês realmente


incríveis, engraçados, inteligentes e gentis.

A Fiona Cole e Kathryn Andrews, por todas as opiniões


sobre este livro, quer eu quisesse ouvi-las ou não. Vocês
melhoram meus livros e eu amo vocês duas.

A Najla Qamber Designs e Regina Wamba por uma capa


impressionante que eu sou obcecada.

A Jenny Sims pela edição.

A Michelle Abascal Monroy, por sua ajuda, me mantendo


sã durante meu último lançamento, e minha incrível equipe do
ARC e grupo de leitores!

À Sedutora Jornada pela ajuda promocional.

A Amy DAWS pela ideia do clarão na capa. Ela queria que


eu dedicasse este livro a ela por causa do quão incrível acabou,
mas eu senti que, se eu cedesse às suas demandas, seu ego
ficaria fora de controle.
Karla Sorensen tem sido uma ávida leitora a vida inteira,
preferindo histórias com um feliz para sempre do que qualquer
outro tipo. E, considerando que ela tem um item de linha
inteiro em seu orçamento para livros, ela percebeu que poderia
ser mais barato escrever suas próprias histórias. Ela ainda
mantém os pés no mundo do marketing de assistência médica,
onde ganhava a vida pré-bebês. Agora ela fica em casa,
escrevendo e mamãe em período integral (isso significa quase
todos os dias ser um 'dia do pijama' na casa dos Sorensen...
não julgue). Ela mora no oeste de Michigan com o marido, dois
filhos excepcionalmente adoráveis e um grande e desgrenhado
cão de resgate.

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