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Cadernos PDE
1 INTRODUÇÃO
2 METODOLOGIA
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A partir desta perspectiva deve haver busca de estratégias para que a escola
envolva de fato a vida de seus alunos e as pessoas da comunidade auxiliando na
construção do entendimento de seu lugar, paisagem, região, enfim das categorias
espaço, tempo, sociedade e natureza, que são temas de análise da Geografia (DCE,
2008, p. 54).
Milton Santos (1999), com suas reflexões sobre os usos do espaço
geográfico, contribui para aprofundar a análise sobre como a relação com a técnica
transforma nosso pensamento. O conceito de meio técnico-científico estaria ligado a
estes dois conceitos anteriores e compreende o desenvolvimento da ciência das
técnicas, isto é, da tecnologia, e, desse modo, com a possibilidade de aplicar a
ciência ao processo produtivo. Seria, portanto, a união e a inter-relação entre
desenvolvimento técnico e ciência abrindo caminho para a construção de um novo
espaço, o meio técnico-científico.
Mas, a tecnologia cria contradições e não avança de maneira uniforme em
todos os lugares e espaços por diferentes razões, entre as quais a própria posição
ideológica baseada na maneira de ocupação do espaço de produção no campo,
pois, de acordo com Oliveira (2007), “a força de trabalho familiar tem um papel muito
significativo e vem aumentando numericamente de modo expressivo”. Ele lembra
que no Brasil, mais de 80% da força de trabalho empregada na agricultura é a força
de trabalho familiar.
Estas questões estão presentes, de forma direta ou indireta, na vida da
maioria dos estudantes que convivem em regiões consideradas agrícolas, como é a
região Oeste do Paraná. Assim, se de fato queremos uma escola onde haja uma
leitura crítica da realidade, este trabalho pode contribuir para que haja reflexões
sobre a relação da sociedade com o espaço geográfico, abrindo possibilidade de
fazer com a que a escola seja capaz de, conforme contempla Gasparin (2011, p.
06), “possibilitar aos educandos a compreensão da essência dos conteúdos a serem
estudados, a fim de que sejam estabelecidas as ligações internas específicas
desses conteúdos com a realidade global, com a totalidade da pratica social e
histórica”.
2.1 AS TECNOLOGIAS NA AGRICULTURA
Segundo Silva (2003, p. 15) “há sempre uma ou mais maneiras de se fazer
uma determinada tarefa com mais eficiência, aplicando-se os conhecimentos
disponíveis a respeito”. Para o autor esta forma de utilizarmos os “conhecimentos
disponíveis” para determinada atividade produtiva é o que se denomina tecnologia.
Ainda segundo Silva (2003) “aumentar a capacidade produtiva das pessoas
significa introduzir progressos tecnológicos nas atividades produtivas, especialmente
nos setores de bens necessários à reprodução da classe trabalhadora e no de bens
de produção (SILVA, 2003, p. 16).
Ele define tecnologia como um conjunto de conhecimentos e não apenas
como coisas. Para Silva (2003), tecnologia na agricultura é:
O autor chama nossa atenção para o fato de que a sociedade não pode
viver sem a tecnologia. O aprimoramento das tecnologias é benéfico, entretanto,
deve-se estar atento a seu uso como fator político-ideológico, no qual a imposição
de regras ou poder de um sistema que favorece determinados grupos (SILVA, 2003,
p. 17).
A tecnologia na agricultura tem suas particularidades em relação ao que
acontece na indústria, pois, de acordo com Silva (2003), há especificidades de
processos biológicos, existe o condicionamento da produção aos fatores naturais e o
papel da terra como meio de produção. A tecnologia na agricultura, portanto, não
está relacionada diretamente a quem utiliza maiores recursos técnicos para
promover ganho de produtividade, mas sim ao conjunto de conhecimentos que deve
levar em conta qual o melhor procedimento para ter sucesso em determinado ramo
de atividade, ou seja, para Silva (2003) recurso técnico é apenas um dos elementos
constituintes do processo tecnológico.
Apesar de parte das pesquisas científicas darem ênfase ao uso da
tecnologia de ponta, com a aquisição de maquinários modernos, investimentos em
matrizes (gado de leite, suínos, etc.) e confinamento de frangos, este tipo de
investimento pode ser inviável, uma vez que em pequenas propriedades algumas
destas tecnologias por ser substituídas por outras de menor custo. É neste
momento que o setor público pode, por meio de incentivo a parcerias entre
pequenos proprietários, incluir programas de acesso aos processos tecnológicos das
mais diversas áreas do processo produtivo. Nossa hipótese considera que o acesso
da maior parte dos agricultores de Matelândia a equipamentos e conhecimento
técnico se deu por meio do apoio governamental, bem como por meio de entidades
associativistas (como as cooperativas), contudo buscaremos destacar em que grau
isso realmente ocorre. Portanto é muito perigoso afirmações como a de Balsan
(2006), que lembra que mesmo com todas as experiências do processo de
modernização, ainda hoje parece que temos dois “Brasis” na agricultura, ou seja,
aquele que utiliza tecnologia de ponta e aquele que utiliza tecnologia “inadequada”.
Esta inadequação é muito subjetiva, já que nem todas as técnicas podem ser
utilizadas em todos os setores e cada propriedade pode apresentar graus distintos
de usos da tecnologia. Isso significa que nem sempre as tecnologias utilizadas
devem ser as mesmas para todo tipo de espaço, sejam pequenas, médias ou
grandes propriedades. É neste ponto que a pesquisa ganha maior significância, visto
que, a exemplo de outras partes do país, não há como incentivar apenas um tipo de
tecnologia para agricultura, pois enquanto a agricultura de precisão pretende
manejar solos e culturas buscando maior produtividade, outras atividades, como a
agroecologia, por exemplo, centra esforços no uso de tecnologias que proporcionem
produção adequada ao tipo de solo e depreciem o mínimo possível o meio ambiente.
3
LORENZÃO, José R. Z. Entrevista. Acervo do Município de Matelândia.
geadas, investimentos em benfeitorias, maquinários, fertilizantes e defensivos,
contudo a maior parte dos custos estava relacionado ao pagamento da mão-de-
obra. Algo parecido pode ser relacionado à produção de rami e hortelã, cujas
produções também tiveram proeminência na economia de Matelândia, destacando a
setor agrícola como grande gerador empregos e divisas para o município, como
podemos observar na Tabela 1.
Com o final do ciclo do café, que até metade da década de 1970 era o
principal agente da economia de Matelândia, o município passou a ter o seu esteio
na produção de soja, trigo e milho, na pecuária com a criação do gado de corte e de
leite e na avicultura, fomentando a criação e ampliação de agroindústrias a partir da
década de 1980. Os valores acumulados no setor primário e no setor industrial
chegam, respectivamente a R$ 106.106.955 e R$ 108.403.503 em 2010, segundo
informações do IPARDES – Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e
Social (2010) . Em seguida aparece o setor de comércio e serviços, com um valor de
R$ 42.868.883, ou seja, bem inferior a setor primário e a indústria.
O que fica evidente é que nas primeiras décadas de fundação do município,
fato confirmado pelos relatos e documentos históricos que fazem referência aquele
período, a economia de Matelândia não perdeu sua característica básica de
utilização de seu potencial do setor primário para a transformação de produtos
industrializados. Se naquele momento as agroindústrias ou empresas de comércio
utilizavam a produção de café, rami, hortelã e madeira para movimentar a economia
do município, atualmente a produção de grãos, leite e carnes mantem este perfil.
Com este novo perfil as tecnologias utilizadas estão relacionadas ao uso de
maquinários, sementes, irrigação, inseminação artificial e utilização de
equipamentos de proteção para aplicação de fertilizantes e defensivos. Constata-se
nesta nova realidade que ao contrário das décadas de 1950, 1960 e 1970 houve um
aparente aumento da utilização das técnicas, o que forçou a redução drástica do
número de empregos no setor agrícola. O que se destaca deste levantamento é que
atualmente este processo está aprimorado e extremamente profissionalizado pela
utilização de recursos tecnológicos com o uso de máquinas sofisticadas que
executam desde o plantio, até o tratamento aves confinadas em aviários
climatizados. Este processo faz com que o setor primário recorra a um pequeno
número de pessoas para mão-de-obra se comparado com a década de 1970,
quando o setor primário utilizou mais de 87% dos economicamente ativos. Hoje,
segundo dados do IPARDES, mais de 72% das pessoas de Matelândia estão no
setor urbano, o que significa dizer que os economicamente ativos também estão, em
sua maioria, no perímetro urbano.
Ao analisar as informações verifica-se que as tecnologias desde o lançamento
da semente à terra, passando pela adubação e colheita ou desde a inseminação,
criação e corte ou produção de leite, houveram interferências e acabaram
influenciadas pelos modos de produção. De acordo com os dados do IPARDES
(2010), a riqueza econômica do setor primário e do setor industrial, que somados
ultrapassaram em 2010 os valores de 215 milhões de reais, ficam bem a frente da
riqueza gerada pelo setor de comércio e serviços, que atingiu em 2010 a faixa de
aproximadamente 43 milhões de reais.
Estes dados implicam afirmar que as tecnologias influenciam diretamente no
êxodo rural e também na mudança de praticas agrícolas de quem permanece no
campo, pois com um menor número de pessoas vivendo no interior e trabalhando
diretamente na agricultura a produção atual é infinitamente maior. Entretanto não
significa dizer que uma maior incursão das tecnologias facilitaria o modo de vida das
pessoas, pois o objetivo da inovação técnica não é tornar o trabalho o mais
confortável, mas sim proporcionar aumento da produtividade do trabalho com vistas
a uma maior geração de valor.
É o caso da agricultura de precisão, cuja prática, segundo Balsan (2006) está
relacionada ao uso de tecnologias atuais para o manejo de solo, insumos e culturas,
de modo adequado às variações espaciais e temporais em fatores que afetam a
produtividade das mesmas. Para a autora a agricultura de precisão é a tecnologia
em uso para aumentar a eficiência, com base no manejo diferenciado de áreas na
agricultura. Este conceito, entretanto, segue padrões claramente capitalistas e serve
apenas para fomentar ainda mais um mercado que gira em torno do consumo de
equipamentos, sementes, insumos e fertilizantes.
De acordo com Oliveira (2003) “no Brasil, o desenvolvimento contraditório e
desigual do capitalismo gestou também, contraditoriamente, latifundiários
capitalistas e capitalistas latifundiários”. Para ele o Brasil do campo moderno vai
transformando a agricultura em um negócio rentável regulado pelo lucro e pelo
mercado mundial. Em seus estudos, ao contrário do que se possa imaginar, ele
demonstra que são as pequenas propriedades brasileiras que mantém a maioria dos
produtos do campo. Neste raciocínio, portanto, técnicas como agricultura de
precisão orientam para a manutenção de um mercado que nas palavras de Oliveira
(2003) “mundializa a economia nacional”.
Neste paradoxo entre pequenas e grandes propriedades evidentemente não
há de se aceitar que as mesmas tecnologias sejam utilizadas, pois as
especificidades de manejo e ocupação do espaço, bem como o tipo de produção
podem exigir tecnologias distintas e que sejam facilmente adaptadas a cada
propriedade, levando-se em conta questões geográficas, econômicas e culturais.
Enquanto em grandes propriedades pode haver acesso à sementes produzidas com
alto padrão tecnológico, implementos, equipamentos, maquinários de última geração
para atender sua demanda produtiva, uma pequena propriedade podo contar com
sementes preparadas pelo próprio agricultor a partir da experiência de selecionar os
melhores grãos e armazená-los de uma safra anterior, utilizar animais de tração para
preparo do solo e equipamentos que podem não ser tão sofisticados como
plantadeiras manuais, mas que atendem necessidades imediatas.
Enfim, as tecnologias são acessíveis e estão disponíveis de uma forma díspar
que não atende todos de uma forma equilibrada, pois o acesso às mesmas
independem do conhecimento e da necessidade do agricultor, pois são imposições
culturais e econômicas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Além de refletir sobre como os espaços sofrem interferência direta das ações
do homem o estudo discutiu o uso de tecnologias na agricultura do município de
Matelândia – PR, permitindo analisar como os métodos de trabalho utilizados por
agricultores contribuem para a melhoria da produtividade bem como pode alterar o
modo de vida das pessoas. A partir das informações levantadas apontamos que
existem diferentes artifícios utilizados na agricultura e os motivos da adoção de uma
ou outra técnica de cultivo nem sempre está relacionado a desenvolvimento, mas
sim a dimensão da propriedade, as tradições e o acesso a investimentos e
programas de incentivo agropecuário.
Acreditamos que este tipo de atividade reforça o entendimento da escola
como espaço de debate e ampliação de horizontes sobre temas importantes que nos
afetam cotidianamente. O processo de hominização é uma necessidade presente
diante do constante avanço da técnica sobre as ações humanas. É neste contexto
que os jovens se vêm influenciados pela tecnologia e é papel da escola criar
mecanismos para redirecioná-los para a valorização do homem sobre a máquina e
não contrário. A intenção do projeto foi permitir que os discentes realizassem uma
construção crítica da realidade tecnológica de seu município, e este objetivo foi
alcançado na medida em que os alunos conheceram o seu meio tecnológico
agrícola e refletiram a respeito do mesmo.
Neste sentido a realização do projeto de intervenção foi significativamente
importante para o aprofundamento das experiências pedagógicas em sala de aula.
Elas oportunizaram uma aproximação entre pesquisa acadêmica e a realidade vivida
pelos alunos, permitindo aos mesmos conhecerem melhor o espaço geográfico de
seu município, fortalecendo o relacionamento educador-aluno e ampliando o foco
centralizador do currículo para além da escola.
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