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GT 05 –

Educação,
Liberdade, TIC
e Educação do
campo.
- Dr. Melquizedeque Fernandes - UFERSA
- Doutoranda Jeane Tranquelino - UFPB - GEPeeeS




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Sumário

A UTILIZAÇÃO DAS TECNOLOGIAS NO ENSINO DE ARTES: UM ESTUDO


SOBRE OS ARTISTAS LOCAIS NA ESCOLA DO CAMPO EM MULUNGU-PB
...................................................................................................................................... 426

AÇÕES INTERDISCIPLINARES NA ESCOLA DO CAMPO: DIÁLOGOS


ENTRE OS FATORES HISTÓRICOS E BIOLÓGICOS A PARTIR DA
IDENTIDADE DISCENTE QUE RESIDE NO ESPAÇO RURAL ....................... 434

UM ESTUDO DAS SABEDORIAS TRADICIONAIS DOS AGRICULTORES


FAMILIARES NO ALTO SERTÃO DA PARAÍBA – POR UMA EDUCAÇÃO
ANTIESQUECIMENTO ........................................................................................... 442

ESCOLAS RURAIS: COMO OS LIVROS DIDÁTICOS AUXILIAM NO ENSINO


DE REGRAS ESSENCIAIS PARA O RESPEITO ÀS SINGULARIDADES DOS
SUJEITOS? ................................................................................................................ 457

EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM OLHAR SOBRE AS LEGISLAÇÕES .............. 477

EDUCAÇÃO DO CAMPO: TRILHANDO CAMINHOS PARA A


VALORIZAÇÃO DA IDENTIDADE DO CAMPO ................................................ 489

MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO DO CAMPO .................................................... 513

TEATRO DE BONECOS: LEVANDO A EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM


ESCOLA DO CAMPO ............................................................................................... 524

REFLEXÕES E EXPERIÊNCIA DOCENTE NA DISCIPLINA SOCIOLOGIA


RURAL E QUESTÃO AGRÁRIA DA ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO DO
CAMPO E SUSTENTABILIDADE (UNEAL) ........................................................ 531

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A UTILIZAÇÃO DAS TECNOLOGIAS NO ENSINO DE ARTES: UM ESTUDO
SOBRE OS ARTISTAS LOCAIS NA ESCOLA DO CAMPO EM MULUNGU-PB

Adriana Alves Gomes


Licenciada em Pedagogia (UVA) e Artes Visuais (UNIASSELVI).
É Especialista em Psicopedagogia Institucional pela (FIP).
Email: adrianaflorbela6@gmail.com

Francisco Alves Cordeiro Neto


Licenciado em Biologia (UVA), Pedagogia (UFPB), Geografia (UEPB).
É Especialista em Ciências Ambientais (CINTEP), Educação Ambiental e Geografia do
Semiárido (IFRN), Psicopedagogia Institucional (FIP), Supervisão e Orientação
Educacional (FIP). É Mestre em Formação de Professores (UEPB).
E-mail: netoalvescordeiro@hotmail.com

RESUMO:
Este artigo apresenta uma proposta de ensino para a disciplina de Artes da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Manoel Gomes de Souza em Mulungu-PB. Propõe
uma prática de ensino a partir dos meios tecnológicos disponíveis na escola e por aqueles
utilizados pelos alunos do 6° ano para o reconhecimento dos artistas do município. Esta
proposta foi desenvolvida durante o 3° bimestre em 2019 e teve por objetivo reconhecer
a importância do trabalho desenvolvido pelos artistas no resgate da cultura. Além de
promover a participação entre professor e aluno no processo de aprendizagem em sala de
aula. Os procedimentos metodológicos utilizados foram: a televisão, data show e os
celulares dos alunos para efetivação deste trabalho. Por fim, reconhecer a importância
desta proposta para a promoção do desenvolvimento crítico discente no âmbito local a
partir do ensino significativo.

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PALAVRAS-CHAVES: 1. Ensino de Artes. 2. Meios tecnológicos. 3. Prática de ensino
no campo.

INTRODUÇÃO:

Os meios tecnológicos são utilizados cotidianamente pela sociedade em todas as


atividades diárias, porém, é preciso que estes instrumentos sejam utilizados a favor da
aprendizagem no âmbito escolar.
Percebemos que muitos profissionais da educação reclamam sobre o desinteresse
do discente em sala de aula provocado pelo uso do celular. Estas e outras questões
dificultam o desenvolvimento das aulas e o processo de ensino e aprendizagem na escola
do campo.
Diante destas dificuldades é preciso repensar a utilização desses aparelhos na
prática pedagógica, utilizando-os para fins educativos em sala de aula. O educador deve
planejar estratégias que utilize esses meios tecnológicos afim de promover a interação
entre os discentes e construir uma aprendizagem significativa a partir das pesquisas
desenvolvidas em equipe no espaço escolar.
Esta proposta visa inserir os meios tecnológicos disponíveis na escola como forma
de promover o estudo dos artistas locais e conhecer o trabalho desenvolvido por eles na
comunidade.
A utilização das tecnologias para fins didáticos é extremamente importante para o
conhecimento e desenvolvimento crítico discente. Cabe ao educador utilizar estratégias
que despertem o interesse dos alunos durante a proposta, como forma de (re)conhecer a
cultura local.
Inserir nas discussões temas locais é extremamente importante para despertar o
interesse dos discentes. E quando eles percebem que estão sendo discutidos nas aulas de
Artes temas locais com artistas que eles conhecem, aumenta ainda mais a sua
participação.
Esta pesquisa buscou apresentar os trabalhos desenvolvidos pelos artistas do
município e resgatar a cultura local que muitas vezes não é valorizada pela sociedade.

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Conhecer as histórias, a execução deste trabalho e também o seu reconhecimento pelos
membros da comunidade. Refletir sobre o resgate cultural e a valorização das obras no
município.
Esta proposta terá o reconhecimento dos alunos da turma no fortalecimento das
raízes culturais sempre resgatadas por esses artistas, além da valorização da riqueza
cultural presente em nosso município, favorecendo a interação e o reconhecimento da
herança deixada por nossos antepassados.

DESENVOLVIMENTO:

As tecnologias estão presentes em todas as atividades das pessoas, porém,


eventualmente são utilizadas de forma negativa. São diversas denúncias que observamos
diariamente, pessoas utilizando-se de ameaças e outros crimes através de aplicativos e
ligações como forma de extorquir dinheiro de vítimas que foram enganadas por bandidos
que se esconde por traz de um computador ou de um telefone.
Em análise, a partir da observação de algumas atitudes na sociedade, fica
perceptível trazer esses recursos tecnológicos para as atividades escolares de forma
positiva, com o objetivo de favorecer aprendizagem em todas as modalidades da
educação. Com a inserção das tecnologias no currículo escolar, observamos que os
discentes participam mais das atividades escolares, bem como, a sua assiduidade as aulas
e durante a interação com os colegas de turmas. Para Almeida (2000):

Nós, educadores, temos de nos preparar e preparar nossos alunos


para enfrentar exigências desta nova tecnologia, e de todas que
estão a sua volta – A TV, o vídeo, a telefonia celular. A
informática aplicada à educação tem dimensões mais profundas
que não aparecem à primeira vista. (ALMEIDA, 2000, p.78).

A utilização dessas ferramentas na turma do 6° ano do ensino fundamental II ganha


uma proporção ainda maior, porque os adolescentes utilizam as tecnologias

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cotidianamente. É interessante promover atividades ligadas a esse contexto como forma
de inseri-los nas discussões de sala e no desenvolvimento das atividades propostas na
construção do reconhecimento da herança cultura do município. Para Amadeu (2016):

A cultura digital é a cultura em rede, a cibercultura que sintetiza


a relação entre sociedade contemporânea e Tecnologias da
Informação (TI's). Ao mesmo tempo que a cultura digital abriga
pequenas totalidades e seu significados, mantém-se desprovida de
fluxos, de conhecimentos e de criações, que dá corpo e identidade
às organizações que delas se constituem. (AMADEU, 2016,
p.20).

Com a inclusão das tecnologias no currículo escolar, as aulas se tornaram mais


dinâmicas e os discentes percebem as possibilidades de inclusão e aprendizagens
múltiplas durante as aulas de formas participativa.
Quando o professor utiliza em sua prática escolar os meios tecnológicos disponíveis
na turma com trabalhos individuais ou em grupos, o ensino se torna significativo porque
há uma troca de conhecimentos onde os discentes que tem mais habilidades ajuda os
colegas com dificuldades e juntos constroem uma aprendizagem significativas, através
de atividades com jogos e textos variados, diferenciando a linguagem formal (aquela que
utilizamos em documentos oficiais) e na linguagem informal (aquela que utilizamos em
nossas conversas nas redes sociais). Souza (2011) aponta que:

Desse modo, é de se esperar que a escola, tenha que “se


reinventar”, se desejar sobreviver como instituição educacional.
É essencial que o professor se aproprie de gama de saberes
advindos com a presença das tecnologias digitais da informação
e da comunicação para que estes possam ser sistematizadas em
sua prática pedagógica. A aplicação e mediação que o docente faz
em sua prática pedagógica do computador e das ferramentas
multimídia em sala de aula, depende, em parte, de como ele

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entende esse processo de transformação e de como ele se sente
em relação a isso, se ele vê todo esse processo como algo
benéfico, que pode ser favorável ao seu trabalho, ou se ele se
sente ameaçado e acuado por essas mudanças. (SOUZA, et. al.,
2011, p.20).

Dessa forma, os discentes terão diversos incentivos na produção do conhecimento.


É fundamental percebermos que nesta modalidade eles possuem uma faixa etária entre
10 a 13 anos em média e as aulas devem ser instigante para ambos. As atividades devem
privilegiar a cultura local e as atividades exercidas pela maioria das pessoas inseridas
naquele espaço.
Com esses incentivos o professor ganhou a confiança dos discentes a partir da
motivação para prosseguir na pesquisa, porque as aulas passaram a ser mais interessante
para eles. Por mais que o discente tenha dificuldade, insistirá em seu desenvolvimento
porque a aula despertou o interesse da turma. Segundo Moran (2000):

[...] na sociedade da informação, todos estamos reaprendendo a


conhecer, a comunicar-nos, a ensinar; reaprendendo a integrar o
humano e o tecnológico, a integrar o individual, o grupal e o
social. É importante conectar sempre o ensino com a vida do
aluno. Chegar ao aluno por todos os caminhos possíveis: pela
experiência, pela imagem, pelo som, pela representação
(dramatizações, simulações), pela multimídia, pela interação on-
line e off-line. (MORAN, 2000, p.61).

Todos esses incentivos são fundamentais para inserir os discentes desta turma ao
mundo letrado, havendo uma relação entre a perspectiva tradicional com a
contemporânea, assim podendo conhecer um pouco de cada metodologia de ensino e
aproveitando para aprimorar os conhecimentos no contexto atual. Essas novas práticas de
ensino fazem com que os discentes percebam que eles possuem os mesmos direitos que

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os demais, continuamente as possibilidades de aprendizagem são iguais para todos, basta
querer.
Diante desta abordagem percebemos da importância do incentivo para o
desenvolvimento discente, pois eles precisam acreditar que são capazes de aprender e
produzir, a partir de atividades que priorize a utilização dos meios digitais no
desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem.
Esta pesquisa foi realizada na Escola Municipal de Ensino Fundamental Manoel
Gomes de Souza, localizado na zona rural do município de Mulungu-PB. Para efetivação
desta proposta utilizamos atividades que fazem parte da rotina diária dos discentes com
o auxílio das tecnologias disponíveis na escola como: televisão, notebook, data show, os
celulares dos próprios discentes e da educadora.

Ø Pesquisa em grupo com apresentação sobre alguns artistas do município e/ou da


comunidade;
Ø Elaboração da biografia desses artistas;
Ø A contribuição dos artistas para o município;
Ø Principais obras criadas pelos artistas;
Ø Exposição dos trabalhos ao final do bimestre.

Estas atividades propostas foram desenvolvidas durante todo o 3° bimestre do ano


de 2019 como forma de valorizar os artistas da terra. Foram utilizados os meios
tecnológicos disponíveis na escola para a pesquisa, elaboração e confecção dos trabalhos.
Cada discente foi avaliado a partir do seu empenho no trabalho em grupo e no
desenvolvimento nas apresentações em sala junto com os colegas do grupo.
Este trabalho possibilitou resgatar a cultura local e promover a interação entre os
discentes durante cada atividade proposta, fortalecendo a aprendizagem durante a
realização das atividades.
Promoveu a interação entre professor e aluno durante a realização da proposta de
ensino. Foi preciso que eles percebessem que o trabalho é uma construção do grupo e não

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apenas de um membro. Também foi fundamental que eles utilizassem os celulares para
as pesquisas sugeridas pela educadora.
Foi primordial a utilização dos recursos tecnológicos disponibilizados pela escola.
Também precisou dos aparelhos celulares dos alunos para realizassem a pesquisa durante
as aulas de Artes.
A partir da inserção destas atividades os discentes se sentiram motivados em
realiza-las por conhecer alguns artistas do município. Houve a socialização entre os
discentes desta turma, além do fortalecimento de novos aprendizados reconhecidos diante
do estudo.
As aulas ficaram mais dinâmicas e houve uma troca de aprendizados entre professor
e aluno. Os celulares tiveram uma nova perspectiva, pois não foram utilizados apenas nas
redes sociais, e sim também para fins educativos durante as pesquisas realizadas.
Esta prática não foi desenvolvida apenas no espaço escolar, em alguns momentos
ela aconteceu extraclasse com a família, vizinhos e amigos mais próximos e a socialização
dos conhecimentos foi realizado em sala na aula seguinte. E assim, o ensino foi construído
com significados por fazer parte do cotidiano discente a partir da utilização dos meios
tecnológicos a favor da aprendizagem.

CONCLUSÃO

Com a utilização desta prática de ensino na turma do 6° ano do ensino fundamental


II percebemos o envolvimento da turma diante das questões locais e a interação do grupo
durante a pesquisa.
Ficou perceptível durante a realização o ensino que traz significado aos discentes
por trabalhar os artistas do município afim de fortalecer a cultura local, a partir do
desenvolvimento de novas estratégias em sala de aula.
Com a utilização das tecnologias houve a interação entre os discentes durante a
realização das atividades. Todas as crianças e jovens estão conectados aos meios
tecnológicos e sua utilização nas atividades escolares com recurso didático fortalece o
desenvolvimento discente.

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Fica claro que com a utilização das tecnologias, as aulas ficaram mais dinâmicas e
houve a participação dos discentes durante a realização da proposta, fortalecendo o
desenvolvimento crítico em prol do processo de ensino e aprendizagem discente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:

ALMEIDA, M. E. Informática e formação de professores. Brasília: Ministério da


Educação, 2000.

AMADEU, S. Diversidade Digital e Cultura. 2016. Disponível em:


http://www.cultura.gov.br/foruns_de_cultura/cultura_digital/artigos/index.php?p=27418
&m. Acesso em: 21 de março de 2020.

MORAN, José Manuel. A integração das tecnologias na educação. 2000. Disponível em:
http://www.eca.usp.br/prof/moran/site/textos/tecnologias_educacao/integracao.pdf.
Acesso em: 21 de março de 2020.

SOUSA, R. P.; MOITA, F. M. C.; CARVALHO, A. B. G. Tecnologias digitais na


educação. Campina Grande: EDUEPB, 2011.

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AÇÕES INTERDISCIPLINARES NA ESCOLA DO CAMPO: diálogos entre os
fatores históricos e biológicos a partir da identidade discente que reside no espaço
rural

Adriana Alves Gomes


Licenciada em Pedagogia (UVA) e Artes Visuais (UNIASSELVI).
É Especialista em Psicopedagogia Institucional pela (FIP).
Email: adrianaflorbela6@gmail.com

Francisco Alves Cordeiro Neto


Licenciado em Biologia (UVA), Pedagogia (UFPB), Geografia (UEPB).
É Especialista em Ciências Ambientais (CINTEP), Educação Ambiental e Geografia do
Semiárido (IFRN), Psicopedagogia Institucional (FIP), Supervisão e Orientação
Educacional (FIP). É Mestre em Formação de Professores (UEPB).
E-mail: netoalvescordeiro@hotmail.com

RESUMO: Esta pesquisa visa discutir a inserção do homem na sociedade a partir da


reflexão dos fatores históricos e biológicos presentes na cultura local. Reconhecer as
transformações realizadas pelos indivíduos no meio social e as influências dessas
mudanças na identidade das pessoas. Buscou-se refletir sobre as atividades desenvolvidas
na comunidade e a sua relação com as mudanças que vem ocorrendo no momento atual.
A metodologia utilizada se baseou no estudo do espaço local e no resgate da cultura como
forma de valorizar a identidade. Havendo a interação entre professor e aluno na
construção do saber, através da socialização em grupo durante as saídas a campo nas
entrevistas com as pessoas mais idosas da comunidade e nas apresentações em grupo.
Ficou perceptível a participação de todos os envolvidos e o fortalecimento das práticas
culturais herdadas pelos nossos antepassados, como forma de promover o
desenvolvimento crítico discente a partir dos temas locais.

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PALAVRAS-CHAVES: 1. Cultura local. 2. Identidade. 3. Prática docente.

INTRODUÇÃO

Quando criança precisamos dos cuidados de um adulto para sobreviver em meio a


sociedade. Dessa forma, a família ajuda o pequeno a interagir com o meio, pois se isto
não acontecer jamais haverá a existência de um novo ser. Com o passar dos anos vamos
desenvolvendo habilidades que inicialmente se apresenta como frágeis e posteriormente
são aprimoradas de acordo com as necessidades.
Ao se tornar independente, o ser humano passa a interagir com o meio em que está
inerido, desenvolvendo novas habilidades para sobreviver e se manter. Porém, o que
observamos é que o homem nunca está satisfeito com o que tem e vive continuamente
buscando novas relações de inserção social.
É através do trabalho que o homem transforma o ambiente, constituindo e
transformando o espaço de acordo com as suas necessidades. Porém, estas manifestações
tendem a prejudicar a própria sociedade e o espaço passa a apresentar uma característica
mais social e bem menos natural. O ser humano tende a mudar as características
ambientais e transformar a sua realidade por meio de atitudes que façam parte de sua
cultura.
Creio que é por meio da educação que o homem mude sua forma de pensar e agir
no meio, adquirindo habilidades que lhe beneficie em prol do bem-estar comum na
sociedade. O ser humano desde criança passa a construir sua história em meio a sociedade
e esses conhecimentos são aprimorados gradualmente, ou seja, ele nunca para de surgir.
É na escola que ele adquire novas habilidades e transforma a sua visão de mundo,
passando a agir em consonância com o ambiente vivido.
Vale salientar que muitas pessoas não participam do processo educativo e persistem
em empregar práticas arcaica que não se utiliza atualmente, mas é importante frisar que
nem sempre estas pessoas tem a oportunidade de frequentar os espaços escolares.

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Outros tentaram ou tentam se inserir nesses espaços, mas não tem a oportunidade
de participar porque executam alguma atividade, impedindo-o de frequentar a escola. O
espaço escolar tem como objetivo a inserção destas pessoas ao processo de letramento,
fazendo-o enxergar o mundo de uma outra perspectiva.

DESENVOLVIMENTO

O homem ao nascer apresenta características biológicas que estão presentes em


todos o seu material genético, desde o início de sua formação ainda no ventre de sua mãe.
Essas características herdadas dos pais o torna um indivíduo único com comportamentos,
gostos, habilidades, vontades, etc. próprias de seu perfil. Esses traços são extremamente
importantes para o defini-lo como ser vivo com características específicas junto as
pessoas que o rodeiam. Para Jesus (2012):

Cada um (a) de nós é uma pessoa única que, porém, tem


características comuns a toda a humanidade. Elas nos
identificam com alguns e nos tornam diferentes de outros,
como a região em que nascemos e crescemos, nossa raça,
classe social, se temos ou não uma religião, idade, nossas
habilidades físicas, entre outras que marcam a diversidade
humana. (JESUS, 2012, p. 05)

Ao nascer o indivíduo se torna um ser social, por viver em sociedade interagindo


com a família, vizinhos, amigos e pessoas mais próximas. Estas vivências vão influenciar
na dinâmica interacional entre os membros acima especificados, por apresentar uma
influência cotidiana durante as conversas com o grupo e nas atividades diárias com as
pessoas mais próximas.
Strey (2002) aponta que o indivíduo tanto cria como mantém a sua cultura
presente na sociedade. É a partir desta participação junto aos membros, que os indivíduos
vão construindo um vínculo próprio o caracteriza na comunidade. Estas questões

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influenciam na construção de novas habilidades que os tornam ainda mais únicos com
características cada vez mais específicas. De acordo com ALBAGLI, 2004 apud LAGES;
BRAGA; MORELLI, 2004:

O local não deve ser compreendido apenas como o espaço


em que se realizam as práticas diárias, mas também como
aquele no qual se situam as transformações e as
reproduções das relações sociais de longo prazo, bem como
a construção física e material da vida em sociedade. Nele,
realiza-se o cotidiano, o momento, o fugidio, mas também
a história, o permanente, o fixo, correspondendo ao
indenitário, ao relacional e ao histórico, no âmbito da
tríade habitante-identidade-lugar (ALBAGLI, 2004 apud
LAGES; BRAGA; MORELLI, 2004, p. 51).

Acredito que o indivíduo enquanto ser biológico e social esteja intimamente ligado,
por depender um do outro para se tornar sujeitos únicos na sociedade. Nenhum ser
apresenta separadamente estas características, por ela estar intrínseca entre si em todas as
situações do indivíduo na sociedade e esta dinâmica tem uma forte influência no
desenvolvimento do sujeito na sociedade.
Segundo Strey (2002, p. 58), “o homem é também um animal, mas um animal que
difere dos outros por ser cultural”. Pensando nesta perspectiva é fundamental entender o
papel da educação no processo de desenvolvimento do sujeito social. Ela é essencial para
buscarmos novas oportunidades de se inserir na sociedade através de atividades que sejam
satisfatórias a cada sujeito envolvido na busca de melhores condições de vida.
A educação não se resume apenas na busca de oportunidades, ela nos proporciona
um desenvolvimento crítico social diante das mudanças enfrentadas em nosso contexto.
Enxergar a sociedade a partir de uma nova perspectiva é fundamental na construção deste
novo sujeito em perceber não apenas o que as outras pessoas querem que enxerguemos,
mas em perceber outros problemas camuflados na sociedade em que a grande maioria da

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população não consegue ver. Se tornar um verdadeiro sujeito crítico diante das propostas
apresentas por uma pequena minoria que insiste em nos alienar, isso sim se torna um fator
crucial no desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária.
Diante desses impasses o educador tem um significativo trabalho a desenvolver
com essas pessoas, por elas apresentarem um conhecimento de mundo, através de suas
atividades diárias e de suas histórias de lutas durante todo o percurso enfrentado em sua
vida. Conforme Santos (1994, p. 31-52), a construção da identidade não é estável,
surgindo de processos que os indivíduos experimentam ao longo do tempo, sendo às
vezes, reinventada e renegociada. Para isso este profissional deve mediar o processo de
ensino e aprendizagem através dos conhecimentos de mundo trazidos pelos discentes e a
partir dele construir novas habilidades de forma crítica.
É fundamental que cada pessoa perceba que eles têm direitos e que devem utiliza-
los em busca de novas oportunidades e de melhores condições de vida. Cada indivíduo
sendo conhecedor de seus direitos, dificilmente será enganado e assim, participará da
construção de uma sociedade menos perversa e mais fraterna. A mudança está em nossas
atitudes, sendo um dever de todos usufruir com sua família de saúde, moradia, educação
e segurança em todos os âmbitos da sociedade.
A metodologia utilizada nesta pesquisa se baseia no estudo do sujeito integrante na
sociedade atual, a partir de sua inserção diante dos fatores históricos e biológicos.
Observar o espaço em que eles vivem e a sua relação com o meio é parte importante
deste processo. Se reconhecer como sujeito cultural do espaço é importante para o
desenvolvimento de sua identidade que muitas vezes não é reconhecida como integrante
participante da sociedade.
A valorização das histórias vividas no cotidiano é fundamental para nos
reconhecermos como sujeitos inseridos naquele espaço. As vivências na comunidade e a
interação com as pessoas é parte fundamental para construção do sujeito. Para
fortalecimento desta proposta é preciso reconhecer as relações sociais presentes na
comunidade em que eles vivem, a partir das rodas de diálogos desenvolvidas em sala de
aula e durante as apresentações em grupo.

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• Reconhecimento do espaço e o trabalho desenvolvido pelos familiares;
• A relação cultural presente na comunidade e no município em que eles residem;
• Entrevistas na comunidade com as pessoas mais idosas;
• Valorização da cultura e das festividades desenvolvida na comunidade;
• Reconhecimento dos fatores históricos e biológicos inseridos na sociedade;
• Elaboração em grupo de sugestões para o resgate da cultura.

Essas são algumas atividades sugeridas para o fortalecimento da proposta e o


desenvolvimento crítico discente a partir do reconhecimento da identidade local diante
dos fatores apresentados na comunidade.
Diante das atividades desenvolvidas percebeu-se a interação entre os membros
inseridos na pesquisa, pois se tratava de uma discussão da identidade local a partir do
reconhecimento do meio social.
Os envolvidos participaram dos momentos de interação e diferenciaram os fatores
biológicos dos fatores históricos presentes na comunidade onde foi desenvolvida a
pesquisa. A partir deste estudo percebeu-se as mudanças que o homem vem
desenvolvendo na comunidade e as influências que essas mudanças trazem na vida em
sociedade.
A partir deste reconhecimento, foi proposto novas práticas que resgatem a
identidade das pessoas da comunidade para o reconhecimento do espaço e o
fortalecimento da cultura como sendo parte integrante do sujeito social na
contemporaneidade.
Por último houve a promoção do desenvolvimento crítico discente diante das
discussões apresentadas aos grupos como forma de incentivá-los a valorizar a herança
cultural deixada pelos nossos antepassados.

CONCLUSÃO

Os espaços escolares estão aí para que estas transformações aconteçam na vida das
pessoas que não tiveram oportunidade de frequentar a escola e/ou não concluíram o seu

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processo educativo. Compete aos professores mediadores incentiva-los a voltar a escola
e oferecer um ambiente dinâmico para os envolvidos. Nesta perspectiva, é fundamental
que o educador promova prática onde os jovens possam participar e sentir-se sujeitos
daquele espaço na construção do aprendizado.
Aproveitar os conhecimentos trazidos por eles para a escola é fundamental para
fortalecer o vínculo e aprimorar novas práticas cotidianas. As experiências e o
conhecimento de mundo são essenciais para o desenvolvimento crítico social do
educando e é responsabilidade do educador criar estratégias para que eles se envolvam
nas aulas, participe e crie laços afetivos no âmbito escolar.
Diante da concepção de mundo desenvolvida pelo ser humano desde criança até sua
fase adulta, pode-se dizer que o homem constrói sua própria história a partir de sua
realidade e das experiências adquiridas no desenvolvimento de suas atividades. Mas, é
preciso entender que muitos conhecimentos são construídos na escola através dos
conhecimentos científicos com inserção das habilidades práticas no âmbito escolar.
É fundamental perceber que o homem deve se apropriar de novos conhecimentos,
para a partir dessa inserção se inserir na sociedade atual como forma de valorizar o seu
contexto social, priorizando sua mudança e a utilização de novas práticas para a
construção da identidade como sujeito de direitos integrante na sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

JESUS, J. G de. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. 2. ed.


Brasília: EDA/FBN, 2012. 42p.

LAGES, V.; BRAGA, C.; MORELLI, G. (Org). Territórios em movimento: cultura e


identidade como estratégias de inserção competitiva. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Relume
Dumará / Brasília, DF: SEBRAE, 2004.

STREY, Marlene Neves (Org.). Psicologia Social Contemporânea. 7. ed. Rio de Janeiro:
Vozes, 2002.

440

SANTOS, B. de S. Modernidade, identidade e a cultura de fronteira. Revista Social. São


Paulo: USP, 1994, v. 5, n. 1-2, p. 31-52, 1994.

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UM ESTUDO DAS SABEDORIAS TRADICIONAIS DOS AGRICULTORES


FAMILIARES NO ALTO SERTÃO DA PARAÍBA – POR UMA EDUCAÇÃO
ANTIESQUECIMENTO

Luan Gomes dos Santos de Oliveira


Sociólogo e Antropólogo (UFRN), Doutor em Educação (UFRN), docente da
Universidade Federal de Campina Grande/UFCG.
E-mail: luangomessantos@terra.com.br

Felipe Almeida de Sousa Serafim


Graduando em Direito e Bolsista de PIBIC/CNPq/UFCG.

RESUMO: O Perímetro Irrigado de São Gonçalo tem uma estrutura composta pela sede
da zona rural, onde fica a administração, e um núcleo que oferece toda uma estrutura
urbana, com 1.800 habitantes. As agrovilas são compostas pelos Núcleos Habitacionais
I, II e III. São 500 colonos instalados em 518 lotes em operação, com uma população total
de 7.400 habitantes. Por meio das pesquisas já realizadas em torno do Perímetro Irrigado
de São Gonçalo e dos problemas que o mesmo enfrenta, escolhe-se como horizonte de
pesquisa o eixo agroecologia e sabedorias tradicionais. Um dos motivos da escolha é que
este projeto se identifica com uma agricultura familiar ecológica e sustentável. Observou-
se que a perda da produção familiar reduziu o cultivo, mas não excluiu a prática da
agricultura, que tem sido realizada com um foco maior na subsistência da própria família.
Problematiza-se então, como problema de pesquisa, quais os limites e possibilidades de
os agricultores familiares do Perímetro Irrigado de São Gonçalo se tornaram capazes de
construir a sua autonomia por meio da agricultura em correlação direta com as sabedorias
tradicionais em direção a agroecologia? Este estudo tem como objetivos identificar o
modo como os agricultores familiares pensam a agricultura do Perímetro Irrigado de São
Gonçalo/Sousa/PB, e analisar as histórias e memórias dos agricultores familiares e suas

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sabedorias no contexto da agricultura familiar e da agroecologia no horizonte de uma
educação antiesquecimento.

PALAVRAS-CHAVES: 1. Educação Antiesquecimento; 2. Agroecologia; 3. Saberes


tradicionais.

INTRODUÇÃO:

A questão Socioambiental emerge como uma problemática no cenário da


agricultura, em níveis local e global nos marcos do capitalismo financeiro
contemporâneo. Tal contexto traz consigo a necessidade de reflexões por meio de
pesquisas e estudos sobre fenômenos socioambientais que perpassam por uma
perspectiva de totalidade, baseada na relação sociedade-natureza, como o modo de vida,
de existência e a produção de sociabilidades no rural, no semi-árido brasileiro nordestino,
ou nos “sertões contemporâneos” (expressão politizada por ALBUQUERQUE JÚNIOR,
2014).
Dessa forma, essa questão denominada de socioambiental é acompanhada pelo
contexto de reorganização e recomposição do ambiente rural. Tendo em vista que muitos
pesquisadores têm refletido e problematizado a morte ou o desaparecimento do rural, do
campesinato frente aos processos de urbanização e industrialização global. Isso tem sido
concebido como o processo de modernização da economia que tem por base a dominação
da agricultura sob a condução da lógica do capitalismo. No entanto, a morte do
campesinato, ou do rural está longe de acontecer, e para ampliar e aprofundar tal
afirmação o Antropólogo e Sociólogo Mauro Almeida em seu ensaio teórico “Narrativas
agrárias e a morte do campesinato, traz uma provocação,

A morte do campesinato é assim a morte de um sistema de


pensamento; é o fim de um código. As peças que esse código
organizava no passado, contudo, estão ainda em circulação. A
dissolução nominalista do campesinato e das “sociedades

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agrárias” enquanto categoria mestra é real; mas não menos real é
a reativação da política indígena, nativa, grassroot, étnica. O fim
do campesinato se dá ao mesmo tempo em que se ativam como
nunca discursos e práticas de democratização rural, de
autogoverno ambiental, de políticas de gênero contra-
hegemônica cujos atores são atingidos por barragens, de
indígenas que passaram por movimentos de revivalismo étnico,
caboclos que se redescobriram indígenas, seringueiros que se
transfiguravam em povos da floresta, caiçaras que se tornaram
povos dos mares, marginais que viraram quilombolas, mulheres-
ecólogas, velhos; sem-terra, sem-teto. Se abstraímos a categoria
totalizante do campesinato, vemos que os traços culturais,
econômicos e ecológicos que eram associados a ela, embora
desconjuntados entre si e destacados na grande narrativa teórica
da qual faziam parte, continuam na ordem do dia. A pergunta,
portanto, sobre o que efetuou a dissolução do “fato social total”
camponês esteja mal colocada. A resposta que diz que “a
modernidade matou o campesinato” utiliza o próprio conceito de
campesinato e a própria narrativa da modernização que estão em
questão. Acho que é preciso pensar de outra forma a resposta.
(ALMEIDA, 2007, p. 170).

É nesse sentido, que a provocação epistemológica e política do antropólogo Mauro


Almeida reforça a necessidade de investigar os agricultores familiares do Perímetro
Irrigado de São Gonçalo, zona rural de Sousa/PB, no alto sertão da Paraíba.
O Perímetro Irrigado de São Gonçalo tem uma estrutura composta pela sede da zona
rural, onde fica a administração, e um núcleo que oferece toda uma estrutura urbana, com
1.800 habitantes. As agrovilas são compostas pelos Núcleos Habitacionais I, II e III. São
500 colonos instalados em 518 lotes em operação, com uma população total de 7.400
habitantes. Todo o Perímetro Irrigado tem suprimento d’água através do açude de São

444


Gonçalo cuja capacidade é de 44.600 milhões de m³ (GURJÃO et al., 2009). A agricultura
irrigada é modelo predominante do perímetro que cultiva uma produção de coco e de
banana, mas outras cultivares também são cultivadas ali, como o arroz, o melão, o
mamão, o feijão e o milho. Entretanto, estudos recentes realizados por Siqueira (2018)
houve uma redução na produção da fruticultura irrigada em decorrência da seca que se
expressou em um período longo de 2012 a 2015.
A seca é um fenômeno edafoclimático típico do semi-árido nordestino brasileiro é
uma marca do alto sertão paraibano e especificamente do Perímetro Irrigado de São
Gonçalo. Contemporaneamente ela afetou negativamente a vida de 500 colonos
repercutindo na produção da agricultura familiar, desdobrando-se em prejuízos como
empobrecimento e endividamento (empréstimos a bancos), aumento do desemprego,
saída dos filhos para os centros urbanos (êxodo rural). Outro aspecto relevante que se
destacou em alguns estudos sobre a região é que mesmo com a seca, muitos agricultores
mantiveram uma produção pequena auxiliada pelo uso de agrotóxicos. Essa redução da
produção em consequência da seca, como é defendida por outras pesquisas, revelou de
que é em virtude da escassez de água, provocada pela seca, deixando a agricultura familiar
comprometida em seu desenvolvimento.
Entretanto, o discurso da escassez de água como resultado de seca, enquanto um
problema climático, é perpassado por controvérsias de ordem política e histórica na
formação social e econômica do Brasil. Particularmente na região do Perímetro Irrigado
de São Gonçalo, um problema foi noticiado na imprensa paraibana, referente ao roubo de
água em 122 pontos, em 23 de março de 2016, com relatório gerado pelo Ministério
Público da Paraíba. Por meio disso, pode-se questionar o discurso da escassez e da seca
como uma questão natural, transpondo essa discussão para outro plano de interpretação,
em que a seca é percebida como um problema político.
Mediante esses aspectos introdutórios, sublinha-se que há um certo nível de
escassez, mas se agrava como um problema político e social do sertão da paraíba, pondo
em relevo a ausência de elaborações de políticas públicas para os colonos e da valorização
dos saberes dos agricultores familiares. Porque, segundo Gomes (2002, p. 263)

445


A introdução da irrigação em áreas do semi-árido nordestino
promoveu modificações do ponto de vista técnico, econômico,
ambiental e sóciocultural. A execução dos projetos de irrigação,
via Perímetros Irrigados, implicou na construção de uma
infraestrutura hidráulica, habitações e de equipamentos
comunitários, como também, em desapropriações de terra.
Implicou, ainda, na imposição de técnicas agrícolas com as quais
os colonos não estavam acostumados. Este fato significou por um
lado, o empobrecimento da economia camponesa e a quebra das
tradições rurais.

Por meio das pesquisas já realizadas em torno do Perímetro Irrigado de São


Gonçalo e dos problemas que o mesmo enfrenta, escolhe-se como horizonte de pesquisa
o eixo agroecologia e sabedorias tradicionais. Um dos motivos da escolha é que este
projeto se identifica com uma agricultura familiar ecológica e sustentável. Observou-se
que a perda da produção familiar reduziu o cultivo, mas não excluiu a prática da
agricultura, que tem sido realizada com um foco maior na subsistência da própria família.
Problematiza-se então, como problema de pesquisa, quais os limites e possibilidades de
os agricultores familiares do Perímetro Irrigado de São Gonçalo se tornaram capazes de
construir a sua autonomia por meio da agricultura em correlação direta com as sabedorias
tradicionais em direção a agroecologia?

DESENVOLVIMENTO

Em busca da sabedoria dos agricultores familiares


A sabedoria revelada por esses agricultores está, como diz o poeta Manoel de
Barros (1999), em “esconder-se por traz das palavras para mostrar-se”. E o desafio é
decifrar alguns flashes desse enigma que os agricultores familiares do Perímetro Irrigado
São Gonçalo do Município de Sousa/PB no Alto Sertão Paraibano são mensageiros
(IAMAMOTO, 2012, grifos meus,).

446


Compreender a relação das sabedorias tradicionais dos agricultores familiares do
Perímetro Irrigado de São Gonçalo, zona rural do Município de Sousa/PB, alto sertão
paraibano é o horizonte desta pesquisa. Aliado a esta problemática estão os fundamentos
teóricos, históricos e epistemológicos que se desdobram nas seguintes categorias
conceituais: a modernização agrícola, a ideia de combate à seca e de convivência com a
seca, a Agroecologia, a relação entre sabedorias tradicionais e saberes científicos. Tais
categorias são situadas na historicidade da questão agrária-urbana e ambiental brasileira,
tendo por centralidade a compreensão da relação entre a concentração de terra, o modo
de viver com a natureza e os embates entre a agricultura mecanizada e a agricultura
ecológica e familiar.
O programa nacional dos perímetros irrigados foi uma iniciativa do governo
federal criado em 1986 para a expansão agroindustrial do Norte e do Nordeste. Para
Gomes (2002, p. 263),
Nas áreas ocupadas pelos projetos públicos irrigados estimulou-
se o uso indiscriminado da mecanização, esta, por sua vez,
caracteriza-se por ser poupadora de mão de obra e pelo emprego
sazonal. Além de, inicialmente, ocorrer um processo de ‘expulsão
camuflada’ da população nativa, certamente, porque esta
apresenta algum tipo de resistência aos planos dos órgãos gestores
executores dos programas de irrigação. Por outro, forçou um
distanciamento dos agricultores das suas tradições, embora,
alguns poucos, tenham se transformado em produtores modernos,
verdadeiros agentes da integração do semi-árido nordestino ao
mercado nacional.

O programa do Perímetro Irrigado pode ter se comportado como uma iniciativa


colonizadora, no sentido que impõe o processo de mecanização agrícola no ambiente rural
e não leva em consideração os saberes dos agricultores familiares. Esses saberes são
tratados como atrasados por não representarem os interesses do utilitarismo e do lucro da
agricultura mecanizada. Por isso, essa pesquisa não se opõe a permanência dos perímetros

447


irrigados atuais, mas propõe-se a investigar a recuperação de uma agricultura ecológica
que inclua os saberes ligados a preservação dos ecossistemas, “como elemento
justificador da ética que permeia as relações entre os agricultores e o meio ambiente.
Nesses saberes dos agricultores familiares

[...] está incorporado um conceito de agricultura familiar, como


aquela que combina a propriedade da terra, com uma mão-de-
obra familiar, ambas organizadas por uma lógica que reúne
saberes e valores que asseguram a reprodução da unidade familiar
e de produção e a permanência do patrimônio (GOMES, 2002, p.
264).

A particularidade dos saberes dos agricultores familiares é questionada quando


entra em contato direto com a lógica colonizadora dos perímetros irrigados, que priorizam
o lucro e fragmentam “o ethos camponês” (BRANDÃO, 1999, p 12). Diante desse
contexto, Gomes (2002, 2005) nos permite entender que a relação dos agricultores
familiares com os perímetros irrigados é permeada pela colonização. Um exemplo disso,
é o Perímetro Irrigado de São Gonçalo que diante da seca tem uma redução em sua
produção e nem todos acessam a informações, orientações, direitos de órgãos da parte do
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) da Empresa de Assistência
Técnica e Extensão Rural da Paraíba (EMATER/PB). Esse descaso com os agricultores
familiares do Perímetro de São Gonçalo é evidenciado na pesquisa que foi desenvolvida
por Siqueira (2018).
O processo de modernização agrícola está associado a promoção das
monoculturas, pois esse tipo de cultivo aliado a tecnologias se direciona para fortalecer a
produção em larga escala, agroexportadora e que tem por base o uso de químicos no solo.
Shiva (2001, p. 10) amplia esse contexto, ao afirmar que, esse processo de
mercantilização teve início com o aparecimento dos modelos tecnológicos na agricultura,
ou seja, de formas de agricultura baseadas na mecanização e no uso insumos químicos –
fertilizantes, pesticidas, herbicidas, ect. Tais modelos ganham força com a disseminação

448


das monoculturas, com o emprego de sementes híbridas e, mais recentemente, de
sementes transgênicas. Além disso, a implementação dos métodos da Revolução Verde
levou a extinção da agricultura tradicional de pequena escala, à perda do conhecimento
que a informa, e provocou deslocamentos sociais, os quais por sua vez deram origem à
fome e à violência entre as comunidades afetadas. Por outro lado, o contexto da
modernização agrícola convive com outras experiências de agricultura e nesse projeto de
pesquisa destaca-se o interesse em estudar um desses tipos: a agroecologia. Esse tipo de
pesquisa agroecológica não rejeita o conhecimento da agricultura mecanizada e
bioquímica, mas toma como orientação teórica o contexto ecológico e social da
agricultura em determinado local. Sendo assim, a Ciência nesse contexto não é suficiente
quando aposta no progresso como mola de promoção do bem-estar da sociedade, pois
este enfatiza o lucro em detrimento do bem-estar dos agricultores familiares. Esses têm
um conhecimento prévio na relação com a terra, que dá base a agricultura tradicional, que

[...] informada por tais conhecimentos, desenvolveu práticas


quase sempre ecologicamente adequadas, mantendo por exemplo,
solos férteis por milênios, e incorpora métodos de controle de
pragas e moléstias que funcionam por meio de arranjos e
combinações de diferentes culturas, bem como processos de
seleção que deram origem a um reservatório genético ricamente
diversificado e modos de organização social em harmonia com os
processos naturais. Claramente, ao longo dos séculos, sementes
autóctones, obtidas por meio de polinização em campos abertos,
foram aperfeiçoadas como resultado das práticas de seleção
adotadas pelos lavradores locais. O conhecimento tradicional,
além do mais, é passível de aperfeiçoamento, por meio de
pesquisas visando sua articulação, sistematização e avaliação
empírica, das quais os lavradores locais participaram, ao lado de
“especialistas”, que contribuem com o conhecimento das

449


estruturas, processos e interações subjacentes aos sistemas
agroecológicos (SHIVA, 2001, p. 19).

Dessa maneira, a autonomia dos agricultores familiares pode ser retomada na


organização da produção familiar, desde que se recupere a sabedoria nascida da
experiência de vida. Vale salientar que essa experiência de vida que funda a agricultura
familiar e ecológica se traduz em

[...] uma mensagem ambiental e ecológica em que a relação


homem-natureza é mediada por uma representação diferenciada
do ambiente da agricultura convencional. A natureza não é apenas
entorno, mas representa uma visão de mundo, onde o homem
integra o mundo natural e com ele se identifica. Nesse sentido a
produção agrícola não é apenas orientada por uma racionalidade
instrumental, mas por racionalidades diversas relacionadas com a
natureza do homem e por isso é definidora de um estilo ou de um
modo de vida (BRANDENBURG, 2002, p. 15).

No contexto do Perímetro de Irrigação de São Gonçalo, lócus desta pesquisa, é


relevante situá-lo no contexto das secas, pois as pesquisas desenvolvidas destacam que
os agricultores familiares não produzem como antigamente, pois a seca no alto sertão
paraibano provocara essa perda de produção. No entanto, historicamente as secas são
usadas como um negócio a ser combatido, que segundo Castro (1968, p. 90) o uso político
da seca vem sendo reproduzido até os dias atuais, transformando-a no “cavalo de batalha
em cujos costados se põe toda a culpa da miséria nordestina”. Além disso, o combate à
seca é enraizado numa lógica antropocêntrica, de dominação da natureza como uma
mercadoria. Essa lógica “funciona como uma estratégia perversa de manutenção e
controle de uma região que, a princípio, e com raras exceções, não cabe na lógica do
modelo de desenvolvimento que predomina” (SILVA, 2003, p. 372).

450


O combate à seca pode ser explicado também pela prioridade de um saber somente
técnico, científico, “[...] nascidos de uma cultura dominadora e colonizadora, os sistemas
modernos de saber são, eles próprios, colonizadores” (SHIVA, 2003, p. 21) que
fundamenta a modernidade, pautada no progresso material ilimitado, ou seja na
exploração dos recursos naturais, e na devastação de outros saberes das comunidades
tradicionais. Alternativo a concepção de combate à seca, está a convivência com a seca,
esta como uma característica do semi-árido, concebido como um ecossistema complexo
de limites e potencialidades e que requer a inclusão de seus atores locais na manutenção
de suas riquezas naturais. Essa perspectiva, a da convivência com o semi-árido,

[...] requer e implica um processo cultural, de educação, de uma


nova aprendizagem sobre o meio ambiente, dos seus limites e
potencialidades. Requer a constituição de novas formas de
pensar, sentir e agir de acordo com o ambiente no qual se está
inserido. Ou seja, a convivência envolve a percepção da
complexidade e requer uma abordagem sistêmica do semi-árido
brasileiro possibilitando a compreensão das dimensões geofísica,
social, econômica, política e cultura (SILVA, 2003, p. 378).

Logo, a agricultura camponesa e a agroecologia são as forças sociais de


transformação do semi-árido brasileiro e podem vir a ser um modelo alternativo ao
Perímetro Irrigado de São Gonçalo, reconhecendo-o como um espaço suscetível a
resiliência, a flexibilidade adaptativa. É perceptível pelas pesquisas desenvolvidas que na
região do PISG,

Um verdadeiro memoricídio cultural se processou em


decorrência dessa ruptura histórica que tornou irrelevante a
produção local de conhecimentos, bem como a sua transmissão
entre as gerações de agricultores. No entanto, embora essa
racionalidade procure se impor ao eliminar os espaços de

451


manobra para o exercício da criatividade e da espontaneidade dos
atores locais, sua implantação não se fez sem que diferentes
formas de resistência e de recriação cultural fossem ativadas.
Onde se pretendeu incutir uniformização crescente e irreversível,
assistimos novas expressões de diferenciação cultural e novas
formas de organização do trabalho e da vida social (TOLEDO;
BASSOLS, 2015, p. 12).

CAMINHOS METODOLÓGICOS

Por isso, com essa pesquisa busca-se compreender as memórias e as histórias dos
agricultores familiares do PISG por considerar a urgência de diálogo entre saberes
científicos e saberes tradicionais, numa atitude de diálogo e complementaridade que
inclui a diversidade de vivências e saberes no contexto da agroecologia. “Dessa
perspectiva, todo conhecimento é uma forma de organizar o mundo, de construir ordens
por sobre o aparente caos” (ALMEIDA, 2017, p. 116).
Esta pesquisa terá como lócus o Perímetro Irrigado de São Gonçalo, pertencente
ao Município de Sousa/PB, região do Alto Sertão paraibano, construído pelas histórias e
memórias dos agricultores familiares que o compõem. O PISGA está situado em uma
região de clima semi-árido, com probabilidade de chuvas durante os meses de janeiro a
abril, e alongando-se um período de estiagem ao longo do ano. O PISGA, sede do
acampamento possui cerca de 1.800 habitantes; por volta de 500 habitante distribuídos
territorialmente em agrovilas ou núcleos habitacionais I, II, III, com aproximadamente
518 lotes em atividades, totalizando uma população rural de 7.400 habitantes. A
metodologia dessa pesquisa se configura como qualitativa, pois,

[...]responde a questões muito particulares. Ela se preocupa nas


ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser
quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos
significados, motivações, aspirações, crenças, valores e atitudes,

452


o que corresponde a um espaço a um espaço mais profundo das
relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser
reduzidos à operacionalização de varáveis (MINAYO, 2001, p.
22).
Em virtude do atributo qualitativo dessa pesquisa obetiva-se compreender e
analisar as histórias e memórias dos agricultores familiares do PISGA. Com um
percentual de 20% da amostra aleatória, inicialmente a pesquisa se comporá de 100
agricultores familiares (essa amostra está condicionada a vontade dos sujeitos em
participar da pesquisa, com direito a esclarecimento sobre o estudo e aceitação prévia
com assinatura do Termo de Livre consentimento para a pesquisa. Como estratégia de
pesquisa em termos de metodologia optou-se pela História oral com o objetivo de
“entender os processos históricos vividos pelos sujeitos sociais a partir de sua perspectiva,
trabalhando com o horizonte de memórias possíveis, entendendo-as como expressão dos
enredos históricos pessoais, dotados de dimensão política, como história viva, lembrança
de lutas, processo em andamento” (MARTINELLI, DATA, p. 5)
Além disso, cabe ainda complementar que a história oral inclui uma relação
dialógica entre pesquisador-pesquisando, como num processo de troca de experiências,
vivências e saberes. Isto se associa de maneira relevante a pesquisa com agricultores
familiares, na tentativa de recuperar os seus saberes ligados no respeito a terra, e que
metodologicamente, traz seu depoimento, narrativas, histórias, a partir de uma “história
vista de baixo” (THOMPSON, 1996, p. 279).
Dessa maneira, pode se apresentar como se dará o ciclo desta pesquisa, orientando
por uma lógica de planejamento aberto e pautada na aceitabilidade dos interlocutores. Por
se tratar de um estudo ligado a Sociologia Rural e à Antropologia Rural, o método
etnográfico é uma escolha metodológica adequada para pesquisas qualitativas orientadas
pela história oral, compondo “uma sociologia de um modo de ser e de um modo de viver
mediados por uma maneira singular de inserção nos processos sociais e no processo
histórico” (MARTINS, 2001, p. 32).
Esta etnografia será viabilizada por um contínuo trabalho de campo:

453


1- Aproximação e abordagem com os agricultores familiares;
2- Observação in loco participante e construção de um diário de campo;

3 - Elaboração de roteiros de entrevistas semi-estruturadas e abertas (com


perguntas objetivas e discursivas) gravadas com o consentimento do interlocutor;
4 - Outra fase do ciclo dessa pesquisa, é a análise do material, discursos,
narrativas, depoimentos dos agricultores familiares, em coerência com o problema
dessa investigação.

Por fim, produção do Relatório final em conjunto com o bolsista do projeto e


possível divulgação dos resultados a comunidade estudada.

CONCLUSÃO

Esse artigo é fruto de um projeto de pesquisa de Iniciação Científica da


Universidade Federal de Campina Grande. A centralidade desta pesquisa é identificar o
atual estado das sabedorias dos agricultores familiares do Perímetro Irrigado de São
Gonçalo e o papel dessas na configuração da agricultura de base ecológica, produtora de
modos de existência e saberes antropológicos, ecológicos diversos e complexos. A fase
atual da pesquisa se encontra na realização de uma entrevista ao representante do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais, com o objetivo de identificar ou mapear a situação
da agricultura familiar no PISGA em Sousa/PB.
No entrecruzamento das dimensões que formam uma educação do campo
orientada numa perspectiva de totalidade, o que significa pôr em comunicação as
categorias de sabedorias tradicionais-educação para o antiesquecimento-organização
política dos trabalhadores e das trabalhadoras rurais. Há que se entender que nessa
interrelação o saber camponês permite a construção de práticas pedagógicas
transdisciplinares e dialógicas. No contexto do capitalismo financeiro que altera e mata
diversos conhecimentos do campo, é urgente o imperativo ético e político de uma
educação para à vida, para uma vida que aponte caminhos para à emancipação humana.

454


Dessa forma, o diálogo entre saberes tradicionais e saberes científicos
acompanham a formação político-pedagógica do povo do campo e também do povo da
cidade, tendo em vista que essa dialogicidade, propõe um universo de costuras
epistemológicas, pautadas na curiosidade como afirmava o grande educador Paulo Freire,
Nesse sentido, escutar os agricultores e agricultoras é um ato educativo, de ampliação de
horizontes que inclui a academia para propor e também para aprender a pensar outros
mundos possíveis.

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA:

ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz. Distante e/ou do instante: “sertões


contemporâneos”, as antinomias de um enunciado. In: Culturas nos Sertões. Bahia:
EDUFBA, 2014.

ALMEIDA, Maria da Conceição de. Complexidade, saberes científicos, saberes da


tradição. 2 ed. Revista e Ampliada. São Paulo: Livraria da Física, 2017.
ALMEIDA, Mauro. Narrativas agrárias e morte do campesinato. Ruris, v.1. N. 2. São
Paulo, 2007.

BASSOLS, Narciso; TOLEDO, Víctor. A memória biocultural: a importância ecológica


das sabedorias tradicionais. São Paulo: Expressão Popular, 2015.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O afeto da terra. Campinas: Editora da Unicamp, 1999.

BRANDENBURG, Alfio. Movimento agroecológico: trajetória, contradições e


perspectivas. Revista Desenvolvimento e Meio Ambiente, UFPR, 2002.

455


GOMES, Ramonildes Alves. A qualidade de vida das famílias no Perímetro Irrigado
de São Gonçalo: Ética e racionalidade. Recife: UFPE, 2005. Tese de doutoramento em
Sociologia.

456


ESCOLAS RURAIS: como os livros didáticos auxiliam no ensino de regras
essenciais para o respeito às singularidades dos sujeitos?


Denise D´arc dos Santos Reis
Graduanda de Pedagogia do Campus III da UFPB
E-mail: reisdenise64@gmail.com

Nilvania dos Santos Silva


Professora Associada da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
nilufpb@gmail.com

RESUMO: O presente trabalho analisou os livros da “Coleção Novo Pitanguá”, sendo
parte das ações do projeto de pesquisa intitulado “Turmas multisseriadas de escolas
rurais: das singularidades do Sujeito do Campo ao uso de material didático favorável ao
respeito à diversidade”, vinculado ao Núcleo de Extensão Multidisciplinar de
Desenvolvimento Rural (NEMDR), cuja efetivação culminou neste ensaio. Buscou-se um
estudo ligado ao material didático, investigando de que forma auxilia a contribuir para o
ensino de comportamento de posturas calcadas no respeito mútuo, valorizando as
singularidades dos povos do mundo rural. Para isso, foi realizada a análise documental
dos livros do 5º ano de Artes, 3º ano de Artes e 5º ano de Ciências. Como também,
reuniões com os integrantes do NEMDR. Depois da análise, notou-se que esse material
traz poucos subsídios para que o educador de turmas multisseriadas utilize-o para
valorizar as singularidades do sujeito camponês, tendo que fazer algumas modificações
em seu plano de ensino, adequando-o àquela realidade, não sendo neste sentido, parte de
uma proposta pedagógica calcada na Educação do Campo.

PALAVRAS-CHAVES: 1. Livro didático; 2. Educação Rural; 3. Regras.

INTRODUÇÃO

457


Este trabalho resultou de parte das atividades desenvolvidas durante a execução do
projeto de pesquisa intitulado “Turmas multisseriadas de escolas rurais: das
singularidades do Sujeito do Campo ao uso de material didático favorável ao respeito à
diversidade”, desenvolvido em agosto de 2019 a julho de 2020, que busca fazer uma
análise documental dos livros da “Coleção Novo Pitanguá”, tem como título do plano
“Ensino de regras em escolas rurais com turmas multisseriadas: como as
imagens/textos/atividades de livros didáticos favorecem o respeito às singularidades dos
Sujeitos do Rural?”. O plano está ligado ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIPIC) da Universidade Federal da Paraíba. Este trabalho foi desenvolvido
por meio de análises documentais realizadas individualmente e, como também,
envolvendo participação em grupos de estudos, com os integrantes do Núcleo de
Extensão Multidisciplinar para o Desenvolvimento Rural – NEMDR, localizado no
Campus III da Universidade Federal da Paraíba (UFPB-CCHSA).
Realizaram-se estudos teóricos sobre as singularidades dos sujeitos do mundo rural,
enfatizando temas como os ligados ao respeito aos estágios de desenvolvimento moral e
os livros didáticos, analisando se/como proporcionam ao professor subsídios para o
ensino de comportamentos de posturas que levem ao respeito mútuo e que valorize às
singularidades do sujeito do campo. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais
(BRASIL, 2000 p. 97), o respeito mútuo é “adotar atitudes de respeito pelas diferenças
entre as pessoas, respeito esse necessário ao convívio numa sociedade democrática”.
Diante da execução de ações ligadas a um dos planos de trabalho executado durante
a investigação que culminou neste ensaio houve pesquisa documental, a qual será descrita
adiante. Percebemos que esses livros didáticos na maioria das atividades/textos/imagens
não são destinados aos alunos das escolas do campo, sendo um grande desafio para os
profissionais de educação ter que adaptá-lo a realidade desses alunos onde as salas
geralmente são multisseriadas.
As Diretrizes Operacionais da Educação do Campo em seu Art. 7º destaca que “§
1º A organização e o funcionamento das escolas do campo respeitarão as diferenças entre
as populações atendidas quanto à sua atividade econômica, seu estilo de vida, sua cultura
e suas tradições” (MEC, 2008).

458


Diante disso, os livros didáticos devem ser feitos pensados nas realidades dos
alunos campesinos, respeitando sua identidade. A escola tem uma grande importância na
construção de um cidadão, trazendo para os alunos o ensino de regras que favoreçam um
bom convívio na coletividade, construindo sua moral.

Chamamos de moral os sistemas e princípios que respondem à


pergunta ‘como devo agir?’. Como todos os sistemas morais
pressupõem, por parte do indivíduo que os legitima, a
experiência subjetiva de um sentimento de obrigatoriedade (...)
identificamos esse sentimento como invariante psicológico do
plano moral (LA TAILLE, 2006, p. 46).

Compreendemos que a moral é um conjunto de regras, valores e princípios os quais


embasam nossas decisões e, em parte, nossas ações, em sociedade. Com isso, é
fundamental que os educadores mostrem aos alunos às regras adotadas para construção
da moralidade por meio do desenvolvimento moral das crianças campesinas. Segundo
Piaget (1994), o desenvolvimento moral da criança é dividido em três fases: anomia,
heteronomia e autonomia. Na anomia (de 0 a 2 anos), há ausência de obediência às regras,
pois, seu pensamento ainda é difuso, passando a agir por impulso. Já na heteronomia (de
3 a 7 anos), segue às regras porque foram ordenadas pelo adulto com base no respeito
unilateral. Por fim, na autonomia,

Por volta dos 8, 9 anos, as concepções infantis a respeito da moral


começam a mudar: a criança torna-se moralmente autônoma ou,
como seria mais prudente dizer, ela começa a apresentar sinais
de autonomia. Do ponto de vista da compreensão das regras e de
seu equacionamento, a criança passa a poder julgar a partir de
princípios e, assim, liberta-se da obediência estrita às regras (LA
TAILLE, 2006, p. 98).

459


O livro didático pode ser muito importante para proporcionar momentos de diálogo,
podendo levantar e esclarecer questionamentos sobre a realidade do aluno. Os livros da
“Coleção Novo Pitanguá”, tem que passar por algumas adaptações para se adequar ao
contexto rural? Esta foi uma das questões que norteou nosso estudo descrito a seguir.

DESENVOLVIMENTO:

Nosso estudo foi de natureza qualitativa e com uso de análise documental. Para
Minayo,

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se


preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode
ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo de significados,
motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um
espaço mais profundo das relações dos processos e dos fenômenos que
não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (2001, p.21-
22).

Segundo GIL “A pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica


[…] a pesquisa documental vale-se de materiais que não receberam ainda um tratamento
analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa”
(2002. p.45). A pesquisa documental em livro didático é fundamental para sabermos se o
conteúdo analisado proporciona ações que favoreçam o ensino e a aprendizagem do aluno
ou se necessita de ser reformulado adaptando-o ao contexto onde está inserido.
Iniciamos a análise com a ilustração encontrada na unidade 1 no capítulo 2 (LOPES,
2017) onde o livro aborda a questão da paisagem que na arte nasce com a pintura e pode
remeter a espaços naturais como florestas, montanhas, rios, ou aspectos construídos pelos
humanos que podem revelar a identidade de um povo. Mas também, artistas e fotógrafos
que voltam seus olhos para esse cenário para registrarem em suas obras/fotografias.

Uma área composta por associação distinta de formas, ao mesmo tempo


físicas e culturais, onde sua estrutura e função são determinadas por
formas integrantes e dependentes, ou seja, a paisagem corresponde a um
organismo complexo, feito pela associação específica de formas e

460


apreendido pela análise morfológica, ressaltando que se trata de uma
interdependência entre esses diversos constituintes, e não de uma simples
adição, e que se torna conveniente considerar o papel do tempo (SAUER,
1998, p.13).

Ilustração 1 – Paisagens registradas

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 5º ano (LOPES, 2017, p. 19)

O livro não propõe atividades que visam o respeito às singularidades do mundo


rural. Por exemplo, não traz, neste trecho, dicas para os discentes e o professor
executarem uma atividade, como a de uma roda de conversa, sobre diversas paisagens
que os alunos veem do caminho de casa até a escola, sendo naturais ou construídas pelo
ser humano, focando mais no respeito e preservação das paisagens da natureza que é parte
do contexto daqueles que utilizam o respectivo material didático.

Ilustração 2: Um caipira no cinema

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 5º ano (LOPES, 2017, p. 90)

Estas imagens da ilustração 2 estão localizadas na unidade 5 do capítulo 1 (LOPES,


2017) e abordam um pouco a questão de um caipira no cinema, como também, outras

461


obras de alguns artistas que retratam o homem da roça. A primeira imagem mostra o DVD
do filme Jeca Tatu que também era o nome do personagem principal interpretado por
Mazzaropi, resultado da obra adaptada de Monteiro Lobato sobre o homem da roça. A
segunda imagem é um quadro do pintor brasileiro José Ferraz de Almeida Júnior que
representou um caipira, no ano de 1893. Por fim, a terceira figura é a do personagem
Chico Bento do quadrinista Maurício de Souza que é um garoto que vive na zona rural.
Mas também, no livro há uma questão para ser interrogada aos alunos, “O que há em
comum entre as três personagens apresentadas nas imagens desta página?”.
Diante do exposto, conclui-se que ficará nas mãos das habilidades do professor
trabalhar em sala de aula a questão das singularidades e o respeito aos sujeitos do mundo
rural considerando, por exemplo, a valorização de seus saberes na roça, sua cultura, sua
identidade. No livro isso não é feito diretamente, não se propõe que as crianças
interpretem as figuras e que seja aberto momento para discussões e para responder as
possíveis dúvidas da turma.
A ilustração abaixo é encontrada no capítulo 1 da unidade 5 da coleção do livro de
Artes do 5º ano (LOPES, 2017) que aborda a questão da música caipira no rádio que teve
espaço nas rádios de todo Brasil no início de 1930, época em que o país se encontrava em
um processo de urbanização, onde muitas pessoas estavam trocando o campo pela cidade.
A música caipira aborda diversos temas do cotidiano, inclusive, a vida na roça.

Ilustração 3: O homem do campo e sua cultura regional

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 5º ano (LOPES, 2017, p. 92)

462


Melon (2013) afirma que na década de 1930 a 1950 ocorreu a chamada “Era do
Ouro” nas rádios do Brasil, transformando-se no principal meio de divulgação de
informações de artistas de vários gêneros. No livro não há proposta de nenhuma atividade
para a questão dos ritmos que atualmente são mais ouvidos no mundo rural. Por exemplo,
não remete a necessidade de o professor trabalhar com seus alunos os ritmos que são mais
ouvidos por eles e seus familiares para a valorização da cultura regional.
Em outra parte do livro, (LOPES, 2017, p. 93) houve a análise de uma atividade
que propõe assistir o filme Jeca Tatu produzido por Mazzaropi em 1959 e em seguida, os
alunos com a ajuda da professora devem montar um vídeo com uma paródia da música
“Jeca Tatu”, de Mazzaropi. Deve ser providenciado elementos de caracterização (celular
para gravação, maquiagem, roupas velhas, objetos de trabalho do homem do campo).
Diante disso, mesmo não sendo proposta da atividade, a professora pode propor que os
alunos recolham em casa ou com seus parentes que vivem na zona rural esses elementos
de caracterização do homem do campo, pois é uma característica própria desses
camponeses, diferente da realidade urbana, resultado de sua raiz cultural. Do ponto de
vista (de valorização calcada no respeito aos sujeitos do campo), fica o desafio de não
fazer desta atividade comportamentos que desvalorizem o campo e consequentemente
dos sujeitos campesinos. Desta forma a atividade é um ponto de partida significativo.

Ilustração 4: O campo e suas particularidades

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 5º ano (LOPES, 2017, p. 93)

463


A ilustração 4 está localizada na unidade 5 mais precisamente no capítulo 1
(LOPES, 2017) em que mostra uma comunidade na zona rural com 4 casas um pouco
distante umas das outras, com árvores próximas, várias serras e um pasto, bem verdinho
com gado. O livro não traz informações a respeito da imagem, sendo assim, o educador
pode proporcionar um espaço de diálogo a respeito dela, sobre como é a vida de cada
aluno no lugar em que vive, também a respeito da convivência com os vizinhos, se
preservam a natureza do lugar.
Nessa perspectiva, o professor pode trabalhar o respeito com a natureza, à
valorização do espaço onde mora e a união entre as pessoas de um mesmo local,
mostrando as regras, princípios e valores para a formação moral na perspectiva das
singularidades do estudante camponês.

Ilustração 5: Cultura popular

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 5º ano (LOPES, 2017, p. 95)

Esta imagem da ilustração 5 está presente na unidade 5, especificamente no capítulo


2 (LOPES, 2017) que mostra a imagem do escritor, dramaturgo, roteirista, Ariano
Suassuna, autor de diversas obras como, por exemplo, “O Auto da Compadecida”. Suas
obras têm uma grande influência cultural nordestina além de ressaltar a identidade do
povo sertanejo, na década de 1970, por meio de um movimento Armorial, com o objetivo

464


de construir um conjunto de obras artísticas, em que o elemento erudito fosse fundido ao
elemento cultural popular produzida no Nordeste.
A atividade proposta na página seguinte mostra um trecho da obra “O Auto da
Compadecida” em que deva criar uma história em quadrinhos ilustrando a cena com um
final inventado pelos alunos,

JOÃO GRILO: Quem não tem cão caça com gato e eu


arranjei um gato que é uma beleza para a senhora.
MULHER: Um gato?
JOÃO GRILO: Um gato.
MULHER: E é bonito?
JOÃO GRILO: Uma beleza!
[...]
JOÃO GRILO: É que o gato que eu lhe trouxe descome
dinheiro.
MULHER: Descome dinheiro?
JOÃO GRILO: Descome, sim.
MULHER: Essa, eu só acredito vendo!
[...]

Diante disso, visto que o material não aborda mais atividades em relação ao exposto
e percebendo a necessidade de tornar mais rica e prazerosa a discussão o educador pode
trabalhar a biografia do autor, como também, análise e discussão de sua obra
anteriormente falada, sobretudo o local utilizado para a gravação cinematográfica, a
cidade de Cabaceiras mais conhecida como Roliúde Nordestina e em particular o Sítio
Arqueológico Lajedo de Pai Mateus.

Ilustração 6: Ciclo hidrológico

465

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAVALLI, 2017, p.


94)

Na ilustração 6 do capítulo 8 (PESSÔA; FAIVALL, 2017) da unidade 2 vemos um


rio com a vegetação ao seu redor preservada, onde o texto tem o foco para a preservação
do ciclo hidrológico. Um fator importante que pode contribuir com isso é a preservação
da vegetação às margens dos rios que é fundamental para evitar a erosão, pois várias
atividades podem destruí-las, como o desmatamento, atividades agrícolas.
Segundo Bigarella (2003), o não escoamento da água que não se infiltra transporta
as partículas ou agregados desprendidos do maciço pelo impacto das gotas das chuvas,
seja pelas partículas ou agregados arrancados pela ação humana, causando a erosão
superficial.
Quando esses rios estão em áreas agrícolas é importante que o proprietário
mantenha uma faixa de vegetação, que recebe o nome de reserva legal. Ela pode até se
ligar a outras áreas nativas, ajudando a proteger a fauna, ampliando a área de
sobrevivência dos animais porque se ocorrer partículas podem ser levadas para dentro dos
rios, prejudicando-os. Isso mostra que as vegetações de modo geral ajudam a proteger o
solo.
Bertoni e Lombardi Neto (1995), afirmam que a cobertura vegetal protege o solo
contra: o impacto das chuvas, a dispersão da água antes que atinja o solo, a maior

466


qualidade do solo pela maior retenção de matéria orgânica, o aumento da decomposição
das raízes das plantas que aumentam a taxa de infiltração da água, e a diminuição do
escoamento da água através do atrito na superfície.
Por isso o desmatamento e as queimadas afetam o solo, deixando-o sujeito às ações
do tempo e do clima. Ou seja, solo protegido pela vegetação retém mais água, com isso,
menos solo é arrastado. A partir da imagem e do texto trabalhado, mesmo não estando
presente no livro o professor pode fazer uma roda de conversa onde as crianças comentem
sobre a importância de manter a vegetação ao redor dos rios e as consequências de não
preservá-la que pode afetar a vida das pessoas, do solo, a água, dos animais que vivem
naquele local, como também, que eles deem propostas para que isso não ocorra. Além
disso, pode ser trabalhada a importância dessa vegetação para o meio ambiente e
perguntar se nas localidades das crianças ou próximos a elas têm rios com essa proteção
e descrevê-la.

Ilustração 7: A chuva

467


Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAVALLI, 2017, p. 70
e 71)

A ilustração 7 tem 4 imagens que estão localizadas na unidade 2 no capítulo 6 do


livro de Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAIVALL, 2017) em que podemos observar o que
a presença de muita chuva ou a falta dela pode fazer com o meio ambiente, juntamente
com um texto que mostra a importância do ciclo da água na vida dos seres humanos. Ele
influencia o clima, a agricultura e a geração de energia elétrica. Sem a água compromete
a sobrevivência das plantas e sua presença regula a temperatura na terra. O ciclo da água
também está relacionado ao equilíbrio do ecossistema, influenciando a vegetação e a
fauna do local, podendo causar queimadas em tempo de estiagem. Como também, é
responsável pela formação dos lençóis freáticos. Há uma atividade relacionada ao texto
que é voltada para os alunos da cidade onde fala das enxurradas nas grandes cidades e
uma questão que pergunta, “Como a construção das cidades pode interferir no ciclo da
água?”.
Nesta mesma atividade outras questões trabalham de forma indireta a valorização
dos sujeitos do campo com a adoção de regras que considera o respeito a nascente de um
rio que forma um percurso de água e pesquisar como se acumula as águas subterrâneas e
outra que trabalha a importância da chuva para os seres humanos em que se espera que
os alunos respondam que contribua para o desenvolvimento das plantas, além disso,
abastecer lagos, rios, entre outros importantes. Seria importante que o livro permitisse,
mas não faz isso, que o profissional de educação pudesse trabalhar questões da mesma
atividade considerando o respeito e às singularidades dos sujeitos do mundo rural, mas
também, trabalhar com as crianças sobre o ciclo da água na natureza e o que a ação
humana pode fazer para alterá-lo.

Ilustração 8: A água e o ser humano

468

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAVALLI, 2017, p.


61)

Na unidade 2, no capítulo 5 (PESSÔA; FAIVALL, 2017), aborda uma temática


importante para ser trabalhada em sala “A água e o ser humano”, ver ilustração 8, que
trata da questão de como é utilizada essa água em atividades humanas, plantações, criação
de animais, gerar energia remetendo a políticas de projetos de valorização dos sujeitos e
demais seres vivos que fazem parte do mundo rural.
Tundisi (2003) ressalta que para usar a água de forma consciente necessita da
colaboração dos grupos que fazem parte da localidade, por exemplo, comunidades de
bairros, funcionários de empresa, grupos religiosos, alunos e as famílias que podem
buscar um novo consumo da água e dos outros recursos naturais, proporcionando um
modo de vida diferente aos habitantes e que oriente o consumo e a produção para um
nível sustentável.
Na ilustração 8 há algumas perguntas como, “Observando os encanamentos
mostrados na foto, de onde você acha que provém a água que abastece a cisterna?” “Em
sua opinião, por que as pessoas coletam essa água?” “Você já regou alguma planta?”.

Ilustração 9: Povos ribeirinhos

469


Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAVALLI, 2017, p.
63)

Na unidade 2 no capítulo 5 (PESSÔA; FAIVALL, 2017) se encontra a ilustração 9


que traz residências de povos ribeirinhos do rio Amazonas que são conhecidos como
povos das águas, são feitos de madeiras, com roupas no varal e algumas pessoas em sua
varanda. No texto há um trecho que informa que em muitos casos não têm saneamento
básico adequado, sendo a água imprópria para consumo. No livro não há nenhuma
atividade que dê, por exemplo, a oportunidade de quem está lendo aprender sobre a
valorização desses sujeitos, apenas fala que a falta de um saneamento básico leva a
contaminação da água, podendo causar doenças. Seria importante que nas
atividades/imagens informassem mais das singularidades desses povos e que conduzisse
o professor a poder orientar atividades de diálogo que proporcionam a valorização dos
sujeitos e porque não há saneamento.
Sua relação com a natureza, a dinâmica desse espaço norteia e produz os
acontecimentos cotidianos na vida deles. Eles têm uma rica diversidade cultural e que é
vista de forma natural pelas pessoas de outras regiões e que não foi modificada pela
globalização. Utilizam a natureza apenas para sua sobrevivência e de suas famílias, sem
causar danos ao meio ambiente. Leff afirma que “a construção de uma racionalidade
ambiental implica o resgate destas práticas tradicionais, como um princípio ético para a
conservação de suas identidades culturais” (2002, p. 94-95).
Esses povos embora sofrerem influência da sociedade moderna preservam a
tradição por praticarem e valorizarem ainda as atividades e experiências de seus
descendentes. Como isso,

Decerto, as identidades não são absolutas, prontas e acabadas.


Elas se estabelecem no convívio social, no qual se cria e recria
constantemente o sistema de valores e crenças, a compreensão
do sentido de objetos, ações e relações interpessoais em um
determinado grupo, caracterizando-o perante os demais
(RIBEIRO, 2007, p.04).

470

Na unidade 2, especificamente o capítulo 9, aborda a temática Reutilização e


Reciclagem (PESSÔA; FAIVALL, 2017) que irá tratar sobre os resíduos produzidos nas
atividades humanas, e os diversos lixos. Várias vezes, jogamos no lixo materiais que
podem ser reciclados, por exemplo, o vidro, o plástico, o metal. O texto traz uma imagem
que aponta a forma correta de descartá-lo.

Ilustração 10: Coleta seletiva e suas contribuições ao meio ambiente

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Ciências do 5º ano (PESSÔA; FAVALLI, 2017, p.


104)

A ilustração 10, do mesmo capítulo, mostra uma criança descartando o lixo


orgânico por meio da coleta seletiva para serem levadas a locais de reciclagem onde passa
por processos para serem reutilizados. Alguns questionamentos são feitos aos alunos
como, se na escola onde estudam tem lixeiras, como o processo de reciclagem contribui
para o meio ambiente, entre outros.
Por meio dessa imagem o professor pode utilizá-la como referência para trabalhar
a importância de separar adequadamente o lixo e o que a falta de um descarte correto
causa no meio ambiente. Porém, o livro não ensina nenhuma conduta específica para
respeitar as singularidades do mundo rural. Juntamente com as crianças o educador pode
trabalhar as várias possibilidades de reutilização e reciclagem do lixo.
A partir desta parte do livro se remete a políticas públicas de reciclagem como a
coleta seletiva sendo recolhida por alguém de porta a porta ou coletados por veículos
especiais que tem o objetivo de diminuir o lixo nos aterros sanitários, como também a

471


utilização de lixeiras para a coleta. Para João Bosco Ladislau de Andrade e Valdir Schalch
“O planejamento e/ou a organização de um sistema de limpeza urbana requer como
primeira medida a determinação de vários indicadores tanto na produção quanto nas
características dos resíduos gerados” (1997, p. 27).
Sendo assim, neste momento o livro foca a perspectiva de políticas voltadas para
áreas urbanas e não do campo e que visam o melhoramento das condições de vida das
pessoas, proporcionando-lhes direito e acesso a investimentos e posturas calcadas no
respeito mútuo em uma cidade limpa e que respeite o meio ambiente.
Uma sugestão que poderia haver no livro seria a de um profissional explicar que o
lixo orgânico consegue ser transformado em adubo e que pode ser utilizado nas plantas
de suas residências, por elas ou pelos pais. Diante disso, fazer uma atividade em que as
crianças criem brinquedos com coisas recicláveis como, papel, vidro, plástico, trazidos
de casa por elas, deixando livres para fazerem individualmente ou com seus colegas que
proporcione um trabalho coletivo e o respeito mútuo, inclusive, considerando o
conhecimento dos sujeitos do mundo rural podendo valorizá-lo.

Ilustração 11: Festa junina

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 3º ano (LOPES, 2017, p. 58)

Na unidade 3, especificamente nos capítulos 2 e 3 do livro de Artes do 3º ano


(LOPES, 2017), cujos textos abordam como costumam ser as festas juninas que
geralmente as músicas dessas comemorações falam do modo de vida na roça, que seus
ritmos são, forró, xote, xaxado. Depois é proposta uma atividade de dança de quadrilha e
para isso os alunos terão que ensaiar e depois se caracterizar com roupas caipiras. Porém,

472


a partir da imagem percebe-se que não aborda a questão da vida do caipira e se até hoje
– época e contexto, macro e micro – o modo de vida continua o mesmo, com os mesmos
costumes, podendo causar para quem não é do campo a ideia de que o campo continua
sendo, assim, estereotipado.
O livro propõe que o local deve ter barracas de brincadeiras e comidas típicas,
balões, fogueira de papelão, entre outros. Para prestigiar a dança deve ser convidado
amigos e familiares. Além disso, mesmo o material não abordando seria relevante que o
educador propusesse que as comidas típicas sejam feitas pelos pais dos alunos, visto que
muitos ingredientes, alimentos típicos das comidas de festa junina são produzidos no
campo, por exemplo, o milho que é o principal. Como também, recomendar que algumas
roupas caipiras, ou objetos para a dança e de decoração sejam trazidos de casa. Com isso,
mesmo não sendo trazido no livro, irá ser despertado o respeito e o valor pela cultura do
campo, tanto pelos alunos, como pela comunidade.

Ilustração 12: Identidade do Sujeito Rural

Fonte: “Coleção Novo Pitanguá”, Artes do 3º ano (LOPES, 2017, p. 28)

Na unidade 2 no capítulo 1 do livro de Artes do 3º ano (LOPES, 2017), irá falar


sobre “Identidade”, como mostra a ilustração 12, obra do artista Alexandre Serqueira,
retratando um momento específico local. O menino retratado na imagem chama-se Lucas
e faz parte da comunidade de pescadores de uma pequena ilha do Pará onde foi feita a
obra. Na figura mostra um lençol que tem o menino retratado e que fica dentro de sua
casa. Mostra também um fogão e paredes velhas da residência. Entende-se por casa que:

473

outro fator preponderante na hora de construir uma residência é


a cultura local. Deste modo, a casa de alguém vai dizer muito
sobre os elementos culturais aos quais a pessoa está ligada, bem
como suas tradições e, até mesmo, o desenvolvimento
econômico da região ou país (A REDAÇÃO, 2019).

Essas evidências mostram a identidade do garoto que é o seu conjunto de


características próprias. O livro não aborda as singularidades dos povos do mundo rural,
mas o educador tem autonomia e pode alargar a discussão e trabalhar em uma roda de
conversa a identidade desses camponeses, questionando os alunos sobre o que eles acham
que é essa identidade. O que eles acham de diferente na realidade do campo com a
realidade da cidade. O professor pode falar um pouco de como é a vida na cidade para
que eles possam diferenciar mais precisamente essa questão. Com isso, instigá-los a
falarem suas vivências na comunidade em que vivem, e a reconhecerem essa realidade
para que respeitem sua identidade, sua cultura, seu espaço na sociedade.

CONCLUSÃO

Perante o exposto pode-se concluir que a “Coleção Novo Pitanguá” não é
diretamente um material didático elaborado para trazer contribuições para que o
profissional da educação de escolas do mundo rural possa trabalhar com a formação de
regras que levem ao respeito mútuo e o respeito às singularidades dos camponeses. Diante
disso, o professor precisa adequá-lo procurando alternativas para vencer essa lacuna.
Conclui-se, daí a importância da escolha de outros livros didáticos destinado à
escola do mundo rural enquanto parte de um processo de educação contextualizada. Em
que seu conteúdo necessita ser totalmente pensado/voltado a realidade campesina,
valorizando as singularidades regionais e das pessoas.

REFERÊNCIAS

474

ANDRADE, João Bosco Ladislau de. SCHALCH, Valdi. Determinação da composição


gravimétrica, peso específico e teor de umidade dos resíduos sólidos produzidos na cidade
de Manaus. Revista Limpeza Pública – n° 44 – Abril – 1997.

BERTONI, J.; LOMBARDI NETO, F. A. (1995). Conservação do solo. 3ed. São Paulo,
1995. 355p.

BIGARELLA, J.J. Estrutura e origem das paisagens tropicais e subtropicais.


Florianópolis: UFSC, v. 3, 2003.

BRASIL Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:


Educação Física, 2000.

BRASIL, Diretrizes complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de


políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo. Resolução no 2
CNE/CEB, de 28 de abril de 2008.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas,
2008.

LA TAILLE, Yves de. Moral e ética: dimensões intelectuais e afetivas. Porto Alegre:
Artmed, 2006

LEFF, Enrique. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez, 2002. 239p.

LOPES. A. ARTES. Coleção Novo Pitanguá. 1 edição. São Paulo Editora Moderna,
2017.

475


MELON, C. A. Transformação da música sertaneja do século XX: o jogo da contenção e
absorção. In: XXVII Simpósio Nacional de História. Natal – RN, 2013.

MINAYO, M. C. S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 18 ed.


Petrópolis: Vozes, 2001.

PESSÔA. K; FAVALLI. F. et al. CIÊNCIAS. Coleção Novo Pitanguá. 1 edição. São


Paulo: Editora Moderna, 2017.

PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.

RIBEIRO, Adilton Pereira. Do Rio à Cidade: A (Re) Produção de uma Identidade


Territorial Ribeirinha no Bairro do Jurunas, em Belém-Pa. In: XII Encontro da
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e
Regional. Belém, Pa, 21 a 25 de maio de 2007.

SAUER, C. O. A morfologia da paisagem. 1925. In: ROSENDAHL, Z.; CORRÊA,


Roberto Lobato. Paisagem, tempo e cultura. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 1998. pa.12-74.

Tipos de moradia - Quais as mais comuns, definições e características. A Redação, 2019.


Disponível em https://conhecimentocientifico.r7.com/tipos-de-moradia/. Acesso em: 02
jul. 2020

TUNDISI, J.G. Água no século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: Rima, IIE,
2003.




476

EDUCAÇÃO DO CAMPO: Um olhar sobre as legislações

Aline Maria Batista Machado


Universidade Federal da Paraíba,
Departamento de Fundamentação da Educação,
Programa de Pós-Graduação em Educação

Jeane Tranquelino da Silva


Professora da Rede pública de Educação Básica
Doutoranda em Educação no Programa de Pós - Graduação- UFPB

José Fábio Vieira Gomes


Especialista em Educação do Campo - UFPB
fabiogomes3333@gmail.com

Paulo Benício Vicente


Professor da rede pública da Educação Básica
Especialista em Economia Política - UFES/Escola Nacional Florestan Fernandes
Especialista em Educação do Campo - UFPB
niciovicente@gmail.coml

RESUMO: O presente artigo pretende apontar os principais dispositivos legais que


regulamentam a educação do campo, os quais precisam ser aplicados no contexto escolar
camponês, para que de fato se tenha uma educação do campo e no campo com qualidade.
Queremos com esse artigo compartilhar nossas reflexões acerca dessa modalidade de
ensino e os desafios que ainda persistem, por isso a importância de se discutir esse tema,
na perspectiva legal. Diante deste fato, trabalhamos os aspectos legais e as normativas da
Educação do campo verificando que a educação do campo ao longo da história foi deixada
em segundo plano pelos representantes governamentais, e no que tange aos aspectos
legais percebe-se que não houve legislações específicas que regulamenta essa modalidade
de ensino, mas foi executada por força de decreto, o que fragiliza a sua permanência.
Sendo que tais regulamentações resultaram da mobilização e da luta dos povos do campo,
dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada.

477


PALAVRAS-CHAVES: 1. Educação do campo; 2. Ordenamento jurídico; 3.
Política pública

INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetivo geral fazer uma análise da Educação do Campo, na
perspectiva do seu ordenamento jurídico e como objetivos específicos, identificar os
avanços políticos da educação do Campo como resultado da luta dos povos do campo e
dos movimentos sociais; identificar os pontos frágeis da política de educação do Campo,
no que se refere ao seu ordenamento jurídico.
Partindo destes pressupostos de significação destes objetivos se justifica a
relevância deste trabalho em problematizar o alcance e a eficácia da normatização da
política de Educação do Campo que tem como base a Lei de Diretrizes de Base da
educação e todo o ordenamento jurídico como as diretrizes operacionais da Educação do
Campo definidas na resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002 e o decreto
presidencial nº 7.352, de 4 de novembro de 2010 ainda em produzir subsídios que possam
nortear a discussão em torno da regulamentação dessa modalidade da educação e
contribuir teoricamente na luta para o fortalecimento da educação do campo, diante do
contexto atual de retrocesso e de desmonte da política de educação de forma geral por
esse governo que se opõe a qualquer política que tenha a finalidade de transformar a
realidade e que conduza à emancipação das classes populares e oprimidas.
Como proposta metodológica de nossa pesquisa, ancoramos na abordagem
qualitativa, segundo Richardson (1999, p. 23):

A pesquisa qualitativa consiste na escolha adequada de


métodos e teorias convenientes; no reconhecimento e análise
de diferentes perspectivas; nas reflexões dos pesquisadores
a respeito de suas pesquisas como parte do processo de
produção do conhecimento; e na variedade de abordagens e
métodos.

Esse tipo de pesquisa não se baseia em critério numérico. Contudo podemos


combinar métodos quantitativos e qualitativos, na perspectiva de compreender o

478


fenômeno investigado em suas várias dimensões no contexto natural, buscando
compreender a totalidade do processo. Recorremos, ainda, à pesquisa documental, que,
de acordo com Gil (2006, p. 66), “vale-se de materiais que não receberam tratamento
analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa”.
Os documentos analisados foram os dispositivos legais, resoluções e decretos que
normatizam a política de educação do campo. Este recurso de coleta de dados nos
possibilita um panorama do objeto pesquisado a partir dos dispositivos legais, e da
literatura existente, conhecendo melhor e de forma aprofundada a temática da presente
pesquisa.
Tomando como base os referenciais teóricos que debatem acerca da temática,
elencamos, Freire, Batista, Caldart, entre outros.

DESENVOLVIMENTO

O movimento e a articulação nacional “Por uma Educação do Campo”, gestado na


I Conferência de educação do Campo e fortalecido no Seminário Nacional de 2002, de
acordo com Batista (2014), alcançou conquistas importantes no que se refere ao
fortalecimento da sociedade quanto aos princípios e fundamentos da Educação do
Campo, assim como a inclusão das pautas da Educação do Campo na agenda dos
governos, criando-se um ordenamento jurídico que possibilitou a execução de uma
política de Educação do Campo como um direito universal, respeitando suas
particularidades.
Esse ordenamento jurídico passou a fazer parte da política pública de educação
brasileira, através de pareceres, resoluções e diretrizes e decretos para a Educação do
Campo, a partir do início dos anos 2000 e também na criação de programas que visam a
formação dos povos do campo desde a educação básica até a educação superior, incluindo
o ensino técnico, e políticas de apoio aos órgãos administrativos para implementação da
política de Educação do Campo nos estados e municípios.
A primeira referência legal que aborda a Educação do Campo, mesmo que de forma
restrita, sem aprofundar a forma como essa política deve ser executada foi a Lei de

479


Diretrizes de Base da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394/96, na seção sobre a
organização da educação básica, em seu art. 28, define que os “sistemas de ensino
promoverão adaptações necessárias às peculiaridades da vida rural”, considerando no
Inciso primeiro a adequação dos “conteúdos curriculares e da metodologia às reais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural”. No Inciso II aborda a “organização
própria e adequação do calendário letivo ao calendário agrícola e climático” e no Inciso
III, a “adequação ao trabalho rural”, (BRASIL, 1996, p. 10).
A LDB apesar de representar um passo importante na garantia do direito à educação
e da adequação necessária para a população do campo, ainda, conserva em seu conteúdo
o conceito do “rural”, que na luta por uma educação emancipadora dos povos do campo,
o termo representa a ampliação da oferta, a garantia do acesso sem modificar as relações
da escola do campo com a estruturas sociais estabelecidas, entende-se que os dispositivos
disponíveis na LDB não são suficientes para a superação do modelo de educação rural. É
um instrumento importante para a ampliação do acesso, porém sem romper com a lógica
de extensão do projeto político de educação do mundo urbano.
Conforme Batista (2014, p.3), a força das organizações que empreendem as lutas e
interesses dos camponeses em pautar a educação em suas lutas, a ponto de conseguir a
inclusão da Educação do Campo nas pautas dos governos, foi fundamental para o avanço
na construção da política pública, como a inserção dos princípios da Educação do Campo
na resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002, que instituiu as Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, 2002).
Trataremos de alguns aspectos relevantes desta resolução.
Essa resolução representa um dos mais importantes instrumentos jurídicos para a
instituição de uma política pública de Educação do Campo. Inaugura na estrutura
governamental novo arranjo jurídico de modo a incorporar os anseios dos povos do
campo na política de educação do país. Na seção de abertura do parecer, o Presidente da
Câmara de Educação Básica reconhece o modo próprio de vida da população que vive no
campo e a utilização do espaço do campo para a constituição da identidade da população
rural, e logo em seguida, no Art. 2º define princípios e procedimentos de adequação do
projeto das escolas do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais, e no Parágrafo único

480


desse artigo, define a identidade da escola do campo pela sua “vinculação à realidade,
ancorada na temporalidade, nos saberes próprios dos estudantes e na memória coletiva e
ainda nos saberes da sociedade e nos movimentos sociais”(BRASIL. 2002, p. 1).
Considerando a educação como um direito universal, contido no artigo 205 da
Constituição Federal (BRASIL, 1988), o Artigo 3º da resolução, propõe a universalização
do acesso da população do campo à educação básica e à Educação profissional e de nível
técnico, em seguida caracteriza o projeto da escola do campo como um instrumento de
articulação das experiências, visando o desenvolvimento economicamente justo e
ecologicamente sustentável e segue, afirmando que as propostas pedagógicas das escolas
devem contemplar a diversidade do campo em todos os aspectos: “sociais, culturais,
políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia” (BRASIL. 2002, p. 1).
No artigo 7º que se refere à adequação do projeto das escolas do campo à realidade
local, um dos pontos que contempla essa realidade é a necessidade de adequação do
calendário letivo e a sua organização independente do calendário civil e a execução das
atividades pedagógicas nos “diferentes espaços pedagógicos”, o que possibilita uma
interação da escola com outras experiências educativas da comunidade, com isso,
ampliam-se as possibilidades de aprendizagem e de valorização dos diferentes saberes
locais. Ainda no artigo 8º orienta as parceiras, visando o desenvolvimento de experiências
de escolarização básica e educação profissional, tendo como referência para essas
parcerias, entre outros aspectos, o “Controle social da qualidade da educação escolar,
mediante a efetiva participação da comunidade do campo” (BRASIL. 2002, P. 2).
O controle social é um instrumento essencial para que a política pública em
qualquer área cumpra seu papel social, para que não sofra desvio de função. Na Educação
do Campo esse controle é ainda mais necessário para que a educação não seja tratada
como uma política compensatória, mas como um direito que cumpre o papel de
emancipação do sujeito, que deve ter uma participação ativa.
Um avanço significativo, diz respeito ao que dispõe o artigo 9º da Resolução, ao
estabelecer as demandas dos movimentos sociais na composição da política educacional.
Os movimentos sociais, pela sua articulação com o local e inserção na vida das
pessoas e da comunidade, conhecem a fundo a realidade e as necessidades do povo,

481


podendo contribuir na elaboração da proposta pedagógica. Além do papel propositivo que
os movimentos sociais representam para uma educação, articulado com o projeto de
desenvolvimento local, também tem um papel importante no controle social.
Esse princípio é reforçado no Artigo 10, ao garantir, no projeto institucional da
escola do campo, a Gestão democrática como um mecanismo que possibilita a relação
com a comunidade, os movimentos sociais, os órgãos normativos e demais setores.”.
(BRASIL, 2002, p. 2), contribuindo para a autonomia das escolas e o fortalecimento dos
conselhos. O artigo 12 define a formação inicial do professor da escola do campo em
curso de licenciatura, com formação complementar tendo como componentes o estudo da
diversidade e o protagonismo da criança, do jovem e do adulto do campo na construção
da qualidade de vida e as propostas pedagógicas que valorizem na organização do ensino,
visando a melhoria das condições de vida. A formação de professores é melhor detalhada
no artigo 7º, § 2º da resolução complementar nº 2 de 28 de abril de 2008, ao especificar a
formação inicial com elementos da Educação do Campo, direcionada para preparar o
professor para a atuação específica na escola do campo.

A admissão e a formação inicial e continuada dos professores e


do pessoal de magistério de apoio ao trabalho docente deverão
considerar sempre a formação pedagógica apropriada à Educação
do Campo e às oportunidades de atualização e aperfeiçoamento
com os profissionais comprometidos com suas especificidades
(BRASIL, 2008, p. 3).

Por último, no artigo 15 define a forma de financiamento da educação escolar do


campo como um instrumento de garantia da execução da política de educação e a
valorização do professor através da “remuneração digna, da inclusão nos planos de
carreira e a institucionalização de programas de formação continuada” (BRASIL, 2002,
p. 3).
A política de Educação do Campo avança, pelo menos no âmbito jurídico, com o
decreto presidencial nº 7.352, de 4 de novembro de 2010, que dispõe sobre a política de
Educação do Campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
(PRONERA). O referido programa atuou em projetos com diversificados “níveis e
modalidades de ensino, metas, duração, instituição de ensino promovente, movimento

482


social demandante, recursos investidos, números de alunos atendidos, etc.” (Costa; Silva,
2016, p. 163). Os autores acrescentam que essa política pública obteve avanços “não só
do ponto de vista quantitativo (em relação a número de cursos realizados, de alunos
atendidos etc.) mas, sobretudo, do ponto de vista qualitativo”, (p.164) trazendo novas
possibilidades no processo formativo de educadores no contexto do campo. Pela primeira
vez na história uma política de educação vincula a educação a um programa de reforma
agrária, numa perspectiva de atendimento às demandas nascidas das lutas sociais por
direitos e pela terra.
O Decreto avança ao incluir no artigo 1º, a oferta da Educação Superior na política
de educação destinada às populações do campo. Reafirma a resolução nº 1 de 2002, ao
definir o conceito de educação e escola do campo, tornando mais abrangente o que
significa que nessa nova concepção, a Educação do Campo agrega as escolas situadas em
áreas urbanas, mas que atendem prioritariamente a população do campo, ou mesmo as
turmas anexas das escolas situadas em áreas urbanas, mas que atendem os alunos do
campo, e ainda garante a autonomia para essas turmas elaborarem seu próprio Projeto
Político pedagógico (BRASIL, 2010).
Com a finalidade de garantir a qualidade da educação ofertada nas escolas do
campo, o decreto define a formação inicial e continuada de profissionais da educação e a
infraestrutura adequada como elementos essenciais para caracterização da Educação do
Campo. Todos os princípios da Educação do Campo são reafirmados no art. 2º, com
destaque para o “controle social da qualidade da educação escolar, mediante a efetiva
participação da comunidade e dos movimentos sociais do campo” (BRASIL 2010, p. 2).
No artigo 8º da resolução 1/2002, o controle social é mencionado, apenas, com a
participação da comunidade e no decreto nº 7.352 de 4 de novembro de 2010 o controle
social é fortalecido ao especificar os movimentos sociais como um agente de participação
ativa para a garantia da qualidade da educação.
A articulação da Educação do Campo com a política agrária é reforçada nos
artigos 11, 12 e 13, (BRASIL, 2010) ao definir que o PRONERA integra a Educação do
Campo e seus objetivos dialogam com os da Educação do Campo no sentido de oferecer
educação formal aos beneficiários da Reforma Agrária; melhorar as condições de acesso

483


à Educação Pública e proporcionar melhoria e desenvolvimento dos assentamentos por
meio da qualificação dos assentados e dos educadores.
Ainda com a finalidade de apoio a projetos que eleve a escolaridade da população
do campo, as ações se estendem por todas as modalidade e etapa da educação, como
escolarização e alfabetização de jovens e adultos, formação profissional, conjugada aos
níveis médio superior e pós-graduação, visando a qualificação da prática pedagógica.
Numa conjuntura em que o governo dialoga com os setores populares da sociedade
e acolhe as pautas dos movimentos sociais, assim como abre espaço para que esses atores
sociais participem da elaboração da política pública de educação, pode-se afirmar que a
política de Educação do Campo estabelecida no decreto nº 7.352 de 4 de novembro de
2010, traz uma sustentabilidade do ponto de vista do seu financiamento, pois articulam
dois ministérios, o da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Agrário para
alocação de recursos com vista a garantir uma ampla política de educação para os povos
do campo a quem sempre foi renegado o direito à educação pelo poder público, porém o
que se percebe que ainda há uma fragilidade do aparato jurídico instituiu a política de
Educação do Campo no período de governo popular entre 2003 e 2016, por se tratar de
uma política de Estado, mas refém de interesses de governos.
A fragilidade dessa política pública se concretiza no fato de ter sido regulamentada
através de decretos e não de lei que garantisse a sua permanência para além de governos.
Essa fragilidade se concretiza com a mudança de governo a partir de 2016, sob o
comando de Michel Temer, que direciona toda a estrutura governamental para atender os
interesses das classes dominantes, e começa a desarticular a estrutura construída
anteriormente. O desmonte se aprofunda a partir de 2019, com o governo Bolsonaro que
teve como uma das primeiras medidas para a educação, a extinção da Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), através do
decreto nº 9.465, de 2 de janeiro de 2019.
Criada em 2004 no governo Lula, a SECADI tinha como finalidade desenvolver e
fortalecer a atenção especial a grupos que historicamente foram excluídos do processo de
escolarização e de políticas de educação para segmentos específicos como Educação
Especial, Educação Indígena, Quilombola, Educação do Campo. Além das mudanças na

484


estrutura, o governo passou a atacar a educação com o corte de verbas, comprometendo
a execução das atividades pedagógicas, planejando uma política de vigilância sobre os
profissionais de educação, alegando o combate ao doutrinamento ideológico e
priorizando a implantação das escolas cívico-militares.

CONCLUSÃO

O desafio da efetividade das políticas de Educação do Campo, assim como a


caracterização da escola do campo, no sentido de construção da sua identidade como
descreve Caldart (2004) a identidade da escola camponesa é definida:

pela sua vinculação às questões inerentes à sua realidade,


ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes,
na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e
tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em
defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas
questões à qualidade social da vida coletiva no país. (CALDART,
2004, p.35).

Percebe-se diante desta exposição da autora que um dos fatores a serem levados
em consideração devem ser a realidade de cada comunidade e seus saberes que em muitas
situações isto não é levado em consideração no momento da elaboração de seus
currículos.
Os dispositivos que normatizam a educação do campo precisam ser efetivados
para além dos governos, e esse desafio passa pela mobilização e luta dos povos e dos
movimentos sociais do campo e por uma legislação específica e consistente e não apenas
por decretos de governo, que se tratam através de “ato normativo secundário, abaixo da
Lei” (DIÁRIO OFICIAL- e, 2020) e pode ser originado para regulamentar alguma lei
sobre tema específico.
As resoluções e decretos que regulamentam a educação do Campo têm como
embasamento legal a Lei de Diretrizes de Base da Educação (LDB), que em se tratando

485


da modalidade à qual está em discussão, tem suas fragilidades já mencionadas nesse
trabalho. Apenas o instrumento “Lei” pode fazer com que a política de Educação do
Campo sobreviva às mudanças de governos, podendo garantir a permanência dos avanços
políticos conquistados pela luta dos camponeses e dos movimentos sociais, incluídas na
pauta dos governos democráticos, mas fortemente ameaçados pela política do governo
antidemocrático e antipopular que se estabeleceu a partir de 2016.
Nesse sentido, essas questões devem ser repensadas na perspectiva de exigir dos
poderes públicos o compromisso de dar continuidade às políticas públicas que repercutem
diretamente nas questões pedagógicas e educativas na Educação do Campo,
consolidando-a enquanto política pública de Estado.
Contudo, percebemos alguns avanços no que diz respeito aos dispositivos que
normatizam as políticas públicas para a Educação do Campo, e o impulso dos
movimentos sociais e sindicatos poderão somar esforços para a consolidação desses
instrumentos enquanto lei. Tendo em vista, que, enquanto decretos tais instrumentos
colocam em risco todos os avanços conquistados, uma vez que não têm força de lei.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

BATISTA, Maria do Socorro Xavier. Da luta às políticas de educação do campo:


caracterização da educação e da escola do campo. In: ENCONTRO DE PESQUISA
EDUCACIONAL DO NORTE E NORDESTE (EPENN), 22., 2014. Anais [...]. Natal-
RN, 2014.

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Educação Nacional. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394-
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Institui Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.
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486


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2020.

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13 dez. 2019.

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educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária -
PRONERA. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20072010/2010/decreto-
/d7352.htm#:~:text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20pol%C3%ADtica%20de,que%
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FREIRE, Paulo. A pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro, Paz e Terra,1997.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas,
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RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa Social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas,
1999

487


_____ . Pesquisa Social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1999.

488


EDUCAÇÃO DO CAMPO: Trilhando caminhos para a valorização da identidade
do campo
Santos, Rayane Pereira
Mestranda em educação – UFPB
rayane.leif@gmail.com

Rodrigues, Ana Cláudia da Silva


Doutora em Educação – UFPB
claudiacavn@yahoo.com.br

RESUMO: Este trabalho apresenta uma discussão sobre educação do campo retirada da
monografia intitulada “Currículo Contextualizando: trilhando caminhos para a
valorização da identidade campesina”. O objetivo é analisar a valorização da identidade
campesina que pode acontecer levando-se em consideração a educação do campo como
caminho para que tal contextualização aconteça. O instrumento de coleta de dados foi a
entrevista semiestruturada realizada com 9 (nove) profissionais da educação de uma
instituição escolar da zona rural do município de Bananeiras-PB. A análise dos dados
organizou-se em 4 (quatro) categorias: Currículo, Contextualização, Identidade e
Educação do Campo. Enfatiza-se neste trabalho a categoria Educação do Campo, sendo
considerada como relevante para que a identidade campesina seja valorizada desde o
ambiente escolar, sendo a escola norte para que as crianças possam se perceber em um
ambiente com possibilidade de construção de conhecimento significativo para seu
desenvolvimento enquanto sujeitos de direito.

Palavras-chave: Identidade; Educação do campo; Contextualização.

INTRODUÇÃO

Educação do campo é um tema que vem sendo discutido com mais frequência a
cada dia, é importante perceber nos sujeitos do campo o quanto é necessário instigar
nesses a valorização de sua identidade, estes sujeitos podem retirar de sua realidade
elementos primordiais para construir conhecimento e utilizá-los para valorizar a realidade
em que estão inseridos.

489


Muitos autores como: Ribeiro (2012), Molina (2012), Caldart (2012), Arroyo
(2012) entre outros, vêm discutindo o tema educação do campo e defendendo que esta
temática possui assuntos relevantes a serem discutidos, pois, tal modalidade de ensino
deve ser enfatizada e seus sujeitos possuem o direito de terem uma educação relacionada
ao seu contexto, educação do campo é um direito de todos os sujeitos campesinos.
Este trabalho apresenta as discussões apresentadas em um Trabalho de Conclusão
de Curso intitulado “Currículo Contextualizado: Trilhando Caminhos para a Valorização
da Identidade Campesina”. O trabalho mostra uma discussão a respeito da valorização da
identidade dos sujeitos do campo, reconhecendo que este é um espaço de aprendizado e
que os sujeitos ali inseridos têm o direito de retirar do campo saberes importantes pra sua
formação enquanto sujeitos de direitos.
Os sujeitos do campo na maioria das vezes não possuem escolas com boa estrutura
nem tampouco com boa qualidade de ensino. A situação da educação no Brasil apresenta
situações precárias, mas pode-se afirmar que no campo a situação é ainda pior, esta
modalidade de ensino acaba sendo muito esquecida tanto em estrutura física quanto em
práticas realizadas em sala de aula.
Educação é um direito de todos e para isso é necessário que as instituições
apresentem documentos contextualizados para orientar as práticas a serem desenvolvidas,
as escolas do campo não podem ter um Projeto Pedagógico Curricular - PPC copiado das
escola da cidade, pois, os sujeitos campesinos possuem uma realidade diferente dos
sujeitos urbanos e portanto é necessário uma contextualização de acordo com a realidade
dos que fazem parte do local em que a escola está inserida.
Campo e cidade possuem particularidades, suas características se divergem e por
isso as práticas desenvolvidas em salas de aula devem ser diferentes. Os objetivos dos
sujeitos do campo e dos sujeitos da cidade são diferentes e os mesmos devem ser
atendidos, sendo assim percebe-se que os documentos que norteiam a educação da cidade
não podem nortear as práticas educativas das escolas do campo.
A educação deve partir do campo, considerando-o também como ponto de partida
e de chegada para alcançar uma educação de qualidade para educadores e educandos, que
tudo aconteça de maneira democrática com a participação de todos que formam a escola

490


e que possuem objetivos a serem alcançados para a melhoria da educação e de um
contexto que é formado por sujeitos de direitos que devem valorizar seu espaço atuando
de maneira crítica e reflexiva para conquistar benefícios para tal realidade visando sempre
o bem social de todos os sujeitos que formam e mantém vivo o campo.
Concordamos com Arroyo (2006) quando afirma que:
Temos que defender o direito à educação como direito universal, mas como
direito concreto, histórico, datado, situado num lugar, numa forma de
produção, neste caso da produção familiar no campo. Os movimentos sociais
nomeiam os sujeitos dos direitos. Esses sujeitos têm rosto, tem gênero tem
classe, tem identidade, tem trajetórias de exploração, de opressão. Os
movimentos sociais têm cumprido uma função histórica no avanço dos
direitos: mostrar seus sujeitos, com seus rostos de camponês, trabalhador,
mulher, criança. Sujeitos coletivos concretos, históricos. (p. 128).

Afirma-se que é preciso perceber os sujeitos do campo como sendo de direitos


ressaltando que estes devem reconhecer e reivindicar pelos mesmos. As escolas do campo
necessitam de preparação para contribuir com a formação destes sujeitos partindo da
própria realidade deles dando destaque para tudo aquilo que forma e continua formando
suas histórias enquanto sujeito.
Ter direito a educação não é apenas ter uma escola no campo, é necessário que
esta instituição perceba e valorize a realidade dos sujeitos, seu contexto histórico, as lutas
pelas quais esses sujeitos passaram para terem a escola em que estudam, as terras em que
vivem e que estes elementos não sejam esquecidas. Todo o contexto da escola é
importante para a formação dos alunos que devem discutir a sua realidade em todo o seu
processo de educação.

A concepção de escola do campo nasce e se desenvolve no bojo do movimento


da Educação do Campo, a partir das experiências de formação humana
desenvolvidas no contexto de luta dos movimentos sociais camponeses por
terra e educação. Trata-se, portanto, de uma concepção que emerge das
contradições da luta social e das práticas de educação dos trabalhadores do e
no campo. (MOLINA e SÁ, 2012, p. 326)

As escolas do campo devem ser pensadas a partir das perspectivas de educação


do campo que se defende, sendo assim percebe-se que é necessário pensar em uma
educação que aconteça com estes sujeitos que vivem do e no campo. A partir daí nota-se
a importância de contextualizar o ensino de acordo com a realidade do campo, o que se

491


pretende não é que o campo seja uma cópia da cidade e sim um espaço em que os sujeitos
valorizem e enfatizem a realidade da qual fazem parte.
A abordagem utilizada neste trabalho foi a pesquisa qualitativa do tipo estudo
caso, em que buscou-se analisar um caso específico acontecido na Escola Municipal de
Ensino Fundamental “José Rocha Cirne” uma escola do campo localizada no sítio
Domingos Vieira do município de Bananeiras/PB.
Foi utilizada como instrumento de coleta de dados, uma entrevista semiestruturada
com nove participantes. Os sujeitos da pesquisa foram as educadoras da escola do campo
pesquisada que participaram das reuniões para ressignificação do Projeto Pedagógico
Curricular da Escola. O quadro abaixo apresenta a situação atual dos sujeitos pesquisados.
O objetivo deste trabalho é analisar como o campo pode ser valorizado em sala de
aula, de forma os educadores do campo possam iniciar conscientização de que pode-se
tirar do própria campo elementos para desenvolver as práticas em sala de aula. Realizando
uma contextualização que mostre em prática como valorizar o campo nas escolas
campesinas.

PERSPECTIVAS TEÓRICAS: EDUCAÇÃO DO CAMPO ONTEM E HOJE

A discussão sobre a educação escolar rural no Brasil inicia sua história a partir
dos anos 1920 e 1930 quando se inicia a industrialização que contribui para um intenso
êxodo rural e a população na zona urbana começa a se expandir em função da necessidade
de mão de obra para trabalhar na cidade. Porém nestas décadas as discussões que eram
desenvolvidas a respeito da educação do campo sempre foram fragmentadas e era notada
por sua situação precária em que os sujeitos tinham as menores condições tanto de ensinar
como os educandos de serem ensinados.
A partir dos anos 1950 começa-se a desenvolver campanhas como a Campanha
Nacional de Educação Rural (CNER) que foi pensada com o objetivo de mudar o quadro
de analfabetismo no Brasil sendo que a maior porcentagem dos analfabetos estava nas
zonas rurais em que a educação se encontrava em péssimas condições.

492


A Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), criada em 1952, que se
propunha a levar educação fundamental para recuperação total do homem
rural. Sua ação tinha como objetivo substituir uma cultura por outra, valendo-
se da educação de base como instrumento de aculturação de populações.
(FREITAS, 2011, p. 36)

Nota-se que esta Campanha discutiu educação do campo de forma a moldar os


sujeitos do campo de acordo com os sujeitos da cidade. A educação da zona rural deveria
ser desenvolvida a fim de fazer com que os sujeitos campesinos desvalorizassem sua
cultura considerando certa a cultura urbana. Desta forma compreende-se que os sujeitos
do campo:

Trata-se dos camponeses, ou seja, daqueles que residem e trabalham nas zonas
rurais e recebem os menores rendimentos por seu trabalho. Para estes sujeitos,
quando existe uma escola na área onde vivem, é oferecida uma educação na
mesma modalidade da que é oferecida às populações que residem e trabalham
nas áreas urbanas, não havendo, de acordo com os autores, nenhuma tentativa
de adequar a escola rural às características dos camponeses ou dos seus filhos,
quando estes a frequentam. (RIBEIRO, 2012, p. 295)

Sendo assim percebe-se que esta proposta de educação rural não é uma educação
que seja adequada para o campo porque não atende aos anseios campesinos por apenas
copiar o currículo urbano, os sujeitos do campo devem ter suas características enfatizadas
merecendo por direito uma educação de qualidade que seja no/do campo.
De acordo com Haddad (2012, p. 17):

Conceber a educação como direito humano significa incluí-la entre os direitos


necessários à realização da dignidade humana plena. Assim, dizer que algo é
um direito humano é dizer que ele deve ser garantido a todos os seres humanos,
independentemente de qualquer condição pessoal. Esse é o caso da educação,
reconhecida como direito de todos após diversas lutas sociais, posto que por
muito tempo foi tratada como privilégio de poucos.

A educação é um direito de todos independente de quem seja ou da região/zona


em que habita por isso, que os sujeitos do campo têm direito a uma educação de qualidade
em se defendam os valores do campo e a ideia de uma escola que esteja no campo e que
a educação da mesma seja a favor dos sujeitos que estão na escola e em seu entorno.
Para assegurar os direitos dos sujeitos do campo pela conquista da terra e também
pelo direito a educação de qualidade notou-se uma grande influência dos Movimentos
Sociais que lutam com a educação do campo para que os direitos dos povos campesinos

493


sejam garantidos, é necessário que esta educação seja enfatizada com suas especificidades
e qualidades. A educação do campo não pode ser pensada como algo que pode ser copiado
da cidade, e sim em favor dos seus sujeitos que perceberam além do direito pela terra o
direito a uma educação de qualidade que esteja de acordo com os seus propósitos.

Os movimentos sociais populares estão presentes enquanto sujeitos políticos


coletivos bem concretos no que vemos e interpretamos como educação
contemporânea, principalmente aqueles que são protagonizados pelos
trabalhadores e trabalhadoras da terra, cuja diversidade de manifestações e
organizações pode ser sintetizada na unidade do movimento camponês de luta
pela terra e pela educação. Tais movimentos formulam críticas e colocam
demandas que impõem aos educadores-pesquisadores militantes a necessidade
de repensar a formação de professores e os processos de escolarização
oferecidos e vivenciados pelas classes populares. (RIBEIRO, 2010, p. 24)

Os Movimentos Sociais contribuem de maneira significativa para que a educação


do campo seja pensada de maneira crítica, para que os profissionais da educação atendam
as demandas e necessidades dos sujeitos campesinos. Através desses movimentos é que
se discutem as questões políticas da educação do campo dando oportunidade para que os
sujeitos campesinos reflitam sobre seus direitos e reivindiquem pelos mesmos. A
educação do campo passa a ser discutida dando-se ênfase a uma perspectiva de educação
popular em que a escola do campo esteja no campo e seja direcionada para os sujeitos
daquele contexto, sendo discutidos aspectos políticos, a fim de que se permita que os
camponeses possam se mobilizar em busca de um poder popular como afirma Freire em
entrevista a Torres, (1985, p. 74):

Assim sendo, a educação popular se delineia como um esforço no sentido da


mobilização e da organização das classes populares com vista à criação de
um poder popular. Todavia, isto não significa que afirmemos que a educação
é um instrumento para a transformação radical da sociedade. Afirmar que a
prática educativa é o instrumento para a transformação revolucionária da
sociedade me parece ingênuo.

Com isto a partir da década de 1990, os debates sobre educação do campo foram
ampliando-se, acontecendo então a 1ª Conferência Nacional Por uma Educação Básica
do Campo que ocorreu em julho de 1998, com os debates realizados nesta Conferência
se deu início várias discussões a respeito da educação do campo inclusive a ideia de não

494


se pensar apenas em uma educação básica para os sujeitos campesinos e sim todas as
modalidades de ensino, desde a educação infantil à educação superior.
Nem sempre a educação do campo foi discutida como “Educação do Campo”.
Antes se pensava em ‘Educação Básica do Campo’, mas é a partir de discussões a seu
favor, que passou-se a discutir a Educação do Campo percebendo os sujeitos campesinos
como sujeitos com direito a ter a disponibilidade de estudar todas as modalidades de
educação pública no próprio campo para não terem a necessidade de se deslocar do seu
contexto para estudar.

O surgimento da expressão “Educação do Campo” pode ser datado. Nasceu


primeiro como Educação Básica do Campo no contexto de preparação da I
Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo, realizada em
Luziânia, Goiás, de 27 a 30 de julho 1998. Passou a ser chamada Educação do
Campo a partir das discussões do Seminário Nacional realizado em Brasília de
26 a 29 de novembro 2002, decisão posteriormente reafirmada nos debates da
II Conferência Nacional, realizada em julho de 2004. (CALDART, 2012, p.
259-260 Grifos do autor.)

Percebe-se que a Educação do Campo está em um contexto de luta que mudou a


nomenclatura da mesma forma que se muda a forma de pensar e se organizar, é importante
discutir as Conferências realizadas pela Educação bem como a influência que os
movimentos sociais desempenharam e desempenham para que se pense em políticas
públicas para a educação do campo.
Vale salientar que as discussões para a realização da 1ª Conferência nasceram a
partir de discussões desenvolvidas por Encontros realizados pelo MST (Movimento
Social Sem Terra) que pensa a educação como elemento essencial para a formação dos
sujeitos do campo. A partir dos movimentos sociais notou-se que as conquistas
necessárias para o campo além da terra deveriam ser advindas também da educação e para
isso se faria necessária discutir os direitos para a educação do campo.

A I Conferência Nacional foi realizada em julho de 1998, promovida pelo


MST, UNICEF, pela UNESCO, CNBB e UnB. Teve papel significativo no
retorno da questão da educação da população do campo para a agenda da
sociedade e dos governos, e inaugurou uma nova referência para o debate e a
mobilização popular: Educação do Campo e não mais educação rural ou
educação para o meio rural. (MOLINA, et. al., 2004, p. 01)

495


Assim a partir da 1ª Conferência Por uma Educação Básica do Campo começa-se
a se pensar nas particularidades do campo e por isso a referência para se debater esta
educação passou a se Educação do Campo tendo em vista que os sujeitos campesinos têm
direito a todas as modalidades de educação.
Com as discussões realizadas foi pensada na 2ª Conferência Por uma Educação
do Campo, para que fossem pensadas políticas públicas por esta educação que deve ser
destinada aos sujeitos campesinos que podem ser conhecedores de tais direitos, um dos
qual o que mais se destaca é a educação.

A II Conferência Nacional de Educação do Campo pretende ser uma etapa


significativa na história da construção do direito dos povos do campo à
educação. Nas últimas décadas se acentuou a presença dos movimentos sociais
do campo na cena política e cultural. No conjunto de suas lutas pela terra, pela
agricultura familiar, pelo trabalho, pela vida e dignidade... foram construindo-
se sujeitos coletivos de direitos, entre eles do direito à educação. (MOLINA,
et. al. 2004, p. 02)

A partir de 20021 os Movimentos Sociais ganham espaço no cenário político e


iniciam-se assim várias conquistas para a educação do campo no Brasil, dentre elas foram
estabelecidas Diretrizes para a educação do campo. Em que:

Art. 1º A Educação do Campo compreende a Educação Básica em suas etapas


de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação
Profissional Técnica de nível médio integrada com o Ensino Médio e destina-
se ao atendimento às populações rurais em suas mais variadas formas de
produção da vida – agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais,
ribeirinhos, assentados e acampados da Reforma Agrária, quilombolas,
caiçaras, indígenas e outros. (BRASIL, 2008)

A educação do campo é entendida em variadas formas da produção de vida o que


possibilita o reconhecimento desses sujeitos para que se pense em uma educação de
qualidade em todas as modalidades de ensino para sujeitos que tem o direito de uma
educação contextualizada com a sua realidade que não seja uma educação em uma escola
que está no campo, mas, que a educação não é para os sujeitos que compõem aquele local,
a educação deve estar e ser para o campo.


1
Em 2002 com o Governo Lula vários estudiosos da Educação do campo começam a fazer parte do
contexto político do país e com isto a educação do campo começa a ser refletida, a partir daí políticas
públicas são pensadas para que a educação do campo seja uma educação de qualidade.

496


Entende-se que o campo oferece aos seus sujeitos a própria organização para a
produção de vida, “O campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não urbano, é um
campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria
produção das condições da existência social e com as realizações da sociedade humana.”
(BRASIL, 2002, p. 01). Entende-se através do Parecer das Diretrizes Operacionais para
a Educação Básica nas Escolas do Campo a importância dos sujeitos do campo que devem
conhecer suas diretrizes para reivindicar pelo direito a uma educação que enfatize as
particularidades e especificidades do campo.
O que se almeja é que os sujeitos do campo tenham a seu favor uma escola
destinada aos mesmos que não seja uma educação copiada da cidade, mas que a escola
esteja no e seja para o campo, o que pretende-se por meio da educação do/no campo.
“Trata-se, portanto, de uma concepção que emerge das contradições da luta social e das
práticas de educação dos trabalhadores do e no campo.” (MOLINA e SÁ, 2012, p. 326).
Nota-se que é direito dos sujeitos do campo uma educação em todas as modalidades
destinadas a estes sujeitos e tal educação seja de qualidade.
As escolas do campo devem estar e ser para o campo, as ideias enfatizadas deve
ser pensado para que os sujeitos do campo se reconheçam como sujeitos de direito a ter
uma educação contextualizada para que possam ser reflexivos capazes de reivindicar
pelos direitos que muitas vezes são pensados, mas não são postos em prática, porque
muitas vezes os sujeitos não têm nem mesmo o direito a conhecer e discutir sobre tais
direitos.
“Esta neoconcepção educacional não está sendo construída para os trabalhadores
rurais, mas por eles, com eles, camponeses.” (MOLINA e FERNANDES, 2004, p. 08
grifos da autora.) A educação do campo pretende construir os conhecimentos
contextualizados de acordo com a cultura do campo, uma nova concepção de educação
do campo é preciso para ser discutido pelos sujeitos que formam o campo.
Concorda-se com Molina (et. al.2009, p. 176) quando afirmam que:

É preciso levar em consideração que a escola do campo traz as marcas dos seus
sujeitos: das diferenças convertidas em desigualdades. É intensa a relação entre
as desigualdades econômicas e sociais, historicamente sofridas pelos sujeitos
do campo, e a ausência do direito à educação no território rural. Conhecer as
marcas das desigualdades do sistema escolar do campo é condição

497


fundamental para se compreender os resultados obtidos por suas escolas e,
principalmente, para se construir os caminhos necessários à sua superação.

Uma educação realizada para os sujeitos do campo em que se levam em


consideração as qualidades dessas pessoas é importante para que as desigualdades
enfatizadas sejam discutidas pelos próprios sujeitos do campo que tem os mesmos direitos
que outras classes e das pessoas da zona urbana. É preciso discutir estas desigualdades
para que a educação do campo prepare os sujeitos para superar as mesmas.
Entende-se que é preciso entender a opressão em que o campo se encontra para se
repensar a educação do campo, o que significa que é necessário que os sujeitos acabem
com a opressão que existe dentro de si a partir daí lutem para acabar com a opressão
existente no campo. “Impossível construir outra escola do campo sem entender e trabalhar
os processos históricos de opressão da diversidade de povos do campo.” (ARROYO,
2012, p. 561).
Os sujeitos do campo passam por uma situação de opressão muito forte que os
deixam muitas vezes com a sensação de que são mais fracos do que outros sujeitos que
podem usufruir de seus direitos, através da educação é possível que esse quadro seja
modificado e estes sujeitos deixem de ter seus direitos negados.
Concorda-se com Caldart (2011, p. 155) quando afirma que: “É por isso que
afirmamos que não há como verdadeiramente educar os sujeitos do campo sem
transformar as circunstâncias sociais desumanizantes e sem prepará-los para ser os
sujeitos dessas transformações.”. É preciso que a educação do campo aconteça no campo
com resultados que ultrapassem os muros das escolas, pois os sujeitos do campo
necessitam de uma transformação da situação de opressão para uma vida emancipatória
em que atuem na sociedade de forma crítica e democrática.
Notou-se que a educação do campo do século passado possui suas diferenças em
comparação com a educação do campo da atualidade, muitas conquistas foram
alcançadas, mas ainda há muito a se discutir e se trabalhar. É necessário que os sujeitos
do campo reconheçam as especificidades campesinas para que o campo continue vivo e
seja valorizado principalmente pelos seus sujeitos que devem defender as especificidades
campesinas.

498


Neste trabalho, buscou-se demonstrar como a concepção de educação do campo
defendida refere-se a uma educação voltada para o sujeito do campo, que possuem
direitos e pode reivindicar pelos mesmos, a educação é direito dos sujeitos campesinos e
estes não precisam se deslocar para a cidade para estudar, mas deve ter a sua disposição
uma escola que discuta conhecimentos relacionados ao campo e para o mesmo.

ANÁLISE DOS DADOS: A IMPORTÂNCIA DA REALIDADE PARA O


PROCESSO DE EDUCAÇÃO NAS ESCOLAS DO CAMPO

A categoria Educação do Campo foi analisada a partir do descritor importância da


realidade dos educandos para o processo de educação realizado na escola campesina.
Destaca-se que todos os entrevistados enfatizam esta importância em suas narrativas
afirmando que suas práticas enquanto educadores se apoiam em uma perspectiva de
interesse pela realidade dos educandos, conforme podemos observar abaixo:

Eu entendo que a gente tem que trabalhar com o que é a realidade dos alunos. (Gestora
da escola, 2015); O que eu acho na educação do campo é porque é muito importante pra
os alunos. (Gestora da escola, 2014); Que não trabalha o assunto que vem simplesmente
no livro trabalha o contexto da realidade do aluno, as vivências que vive com a família.
(Educadora “B”, 2015).

De acordo com a fala dos entrevistados nota-se que a realidade dos sujeitos do
campo deve ser enfatizada no processo de formação dos educandos; a aproximação com
a realidade em que vivem estes sujeitos possibilita tanto a valorização de seu contexto
como facilita o processo de educação, uma vez que percebe-se que o ensinar partirá dos
saberes dos educandos.

A base legal para a instituição de políticas públicas diferenciadas para o


atendimento escolar das pessoas que vivem e trabalham no campo prescreve
[...] a contextualização da organização curricular e das metodologias de ensino
às características e realidades da vida dos povos do campo. (BRASIL, 2007, p.
28)

499


Nota-se a importância de adequar a metodologia da sala de aula a realidade
vivenciada pelos educandos do campo. É interessante que os educadores conheçam as
especificidades da realidade campesina para relacionarem suas metodologias ao contexto
e a partir disto será possível pensar em políticas públicas específicas para a educação do
campo.
Além de pensar na realidade dos educandos é importante também que se pense na
vivência pela qual passam esses sujeitos. Percebe-se que os educadores enfatizam
também o trabalho dos camponeses percebendo que do campo é que se tira o sustento, a
partir daí nota-se que a educação do campo acontece para além dos muros da escola.

A educação do campo é bom a gente trabalhar né com o campo, porque nessa região
aqui todos já moram aqui nessa região aqui os pais já trabalham aqui são agricultores
e eu acho que o bom é a gente trabalhar aqui com essa atividade aqui do campo né
porque todos já conhecem as atividades aqui do campo (Educadora “A”, 2015)

A educação do campo é aqui enfatizada como importante sendo relacionada com


o trabalho que é realizado no campo, ou seja, existe aqui uma socialização entre o trabalho
realizado no campo e a educação dos educandos que são sujeitos em formação, afirma-se
assim que a formação educativa destes sujeitos deve estar relacionada ao trabalho
realizado no campo.

A Educação do campo se coloca em luta pelo acesso dos trabalhadores ao


conhecimento produzido na sociedade e ao mesmo tempo problematiza, faz a
crítica ao modo de conhecimento dominante e à hierarquização epistemológica
própria desta sociedade que deslegitima os protagonistas originários da
Educação do campo como produtores de conhecimento e que resiste a construir
referências próprias para a solução de problemas de uma outra lógica de
produção e de trabalho que não seja a do trabalho produtivo para o capital.
(CALDART, 2009, p. 38)

A escola tem a função de aproximar dos sujeitos do campo o acesso e o


conhecimento dos direitos que lhes são garantidos em relação ao trabalho do campo que
faz parte da sua educação tendo-se em vista que a educação não acontece apenas na
escola. O trabalho que deve ser enfatizado no campo é o que valoriza a identidade destes
sujeitos e que caracteriza sua realidade.

500


Por meio da educação é que é possível a valorização do trabalho campesino que
não prioriza a vivência desses povos que possuem suas particularidades e que não podem
ter sua identidade do campo negada. A educação e o trabalho para e com o campo enfatiza
as especificidades próprias do campo que deve ser lembrada pela escola ao mesmo tempo
em que se pode fazer uma crítica as formas de opressão existentes.
Nota-se a importância de retirar recursos da própria realidade do educando do
campo para aulas, como a entrevistada afirma:

A educação é uma coisa assim voltada para a realidade propriamente dita do aluno,
onde ele está mais perto de sua realidade, então aqueles são o quê? São pessoas onde os
pais são de assentamento né então eles estão mais próximos da realidade deles de onde
a gente tem facilidade entre aspas né de trabalhar com eles, mas a gente tem mais recurso
retirando da própria comunidade para trabalhar com ele. (Educadora “C”, 2015)

Percebe-se aqui que existe por parte da entrevistada uma preocupação em partir
da realidade dos educandos para ensinar enfatizando que a comunidade possui elementos
importantes para serem trabalhados com os educandos, isto possibilita uma ampliação do
conhecimento partindo-se do que os educandos conhecem. Destaca-se que reconhecer,
também, que estes sujeitos são de assentamento e enfatizar isto nas aulas é relevante para
a formação dos educandos.
A importância da conquista pela terra é outro ponto a ser discutido na educação
do campo, pois, sabe-se que foram a partir das conquistas pelas terras que iniciaram-se as
discussões para se conquistar outros direitos para os sujeitos do campo. Dentre eles os
advindos da educação. Por isso é importante lembrar toda a história de conquista pela
qual passaram estes sujeitos.

O território é um trunfo dos povos do campo e da floresta. Trabalhar na


terra, tirar da terra a sua existência, exige conhecimentos que são construídos
nas experiências cotidianas e na escola. Ter o seu território implica em um
modo de pensar a realidade. Para garantir a identidade territorial, a autonomia
e organização política é preciso pensar a realidade desde seu território, de sua
comunidade, de seu município, de seu país, do mundo. Não se pensa o próprio
território a partir do território do outro. Isso é alienação. (FERNANDES e
MOLINA, 2005, p. 07) grifos do autor.

501


Nota-se aqui a importância de partir do território dos educandos para educar
partindo-se de sua realidade. Partir do conhecimento particular dos educandos para o
geral é importante para que os educandos aprendam ao mesmo tempo em que refletem
sobre a sua realidade e se formam como sujeitos que reconhecem sua identidade enquanto
sujeitos do campo.
A valorização da terra pode começar pelos ensinamentos da escola para que os
educandos discutam e reflitam sobre os valores da terra e das conquistas realizadas pelo
campo. Os educadores tem a função na escola de partir destas conquistas para dar as suas
aulas um aspecto político, contribuindo para a formação crítica dos educandos.
Dentre as entrevistadas há uma concluindo o curso de pedagogia que afirma que
a Educação do Campo: “De acordo com o que eu estudei é uma educação que se preocupa
com o sujeito que está inserido ali não apenas se preocupa com aquele sujeito que porque
está inserido ali, mas uma educação que procura atender as necessidades daqueles
sujeitos.” (Educadora “D”, 2015).
Percebe-se que a educadora enfatiza a preocupação que se deve ter com as
necessidades dos sujeitos do campo. A entrevistada nota a preocupação em a educação
do campo, procurar atender as necessidades campesinas, isto é importante no processo de
ressignificação do currículo da escola que deve se preocupar em contribuir para que o
campo não seja esquecido pelos educadores da escola, que devem estar sempre
enfatizando e refletindo sobre as particularidades do campo.

A Educação do Campo nomeia um fenômeno da realidade brasileira atual,


protagonizado pelos trabalhadores do campo e suas organizações, que visa
incidir sobre a política de educação desde os interesses sociais das
comunidades camponesas. Objetivo e sujeitos a remetem às questões do
trabalho, da cultura, do conhecimento e das lutas sociais dos camponeses e ao
embate (de classe) entre projetos de campo e entre lógicas de agricultura que
têm implicações no projeto de país e de sociedade e nas concepções de política
pública, de educação e de formação humana. (CALDART, 2012, p. 259) grifos
do autor

Concorda-se com o autor que afirma a importância da realidade dos sujeitos do


campo, afirma-se também que a educação não acontece apenas na escola, mas em todos
os lugares em que se reflete sobre os acontecimentos que envolvem a vida no campo.

502


Sendo assim entende-se que diversos fatores inclusive a cultura está relacionada com a
educação dos sujeitos do campo e por isso deve ser enfatizada na escola.
Percebe-se que todos os entrevistados enfatizam a realidade como princípio
fundamental a ser discutido na educação não distanciando o ensino da realidade em que
o educando está inserido. Além desse foco na educação não deve-se esquecer que o
campo é um espaço de emancipação em que estes sujeitos devem conhecer seus direitos
para valorizar o espaço em que vivem.

A Educação do Campo nasceu tomando posição no confronto de projetos de


educação contra uma visão instrumentalizadora da educação, colocada a
serviço das demandas de um determinado modelo de desenvolvimento do
campo (que sempre dominou a chamada “educação rural”), a favor da
afirmação da educação como formação humana, omnilateral, que também
pode ser chamada de integral, porque abarca todas as dimensões do ser
humano. Também a Educação do Campo afirma uma educação emancipatória,
vinculada a um projeto histórico, de longo prazo, de superação do modo de
produção capitalista. Projeto histórico deve ser compreendido como o esforço
para transformar, isto é, construir uma nova forma de organização das relações
sociais, econômicas, políticas e culturais para a sociedade, que se contraponha
à forma atual de organização e de relações, que é a capitalista. (UFBA, 2010,
p. 15)

Nota-se uma concepção de educação do campo em que se enfatiza não apenas a


realidade do educando, mas sim toda a história pela qual passaram que deve ser lembrada
e valorizada pelas novas gerações que estão no campo que devem conhecer sua história
de origem para valorizar cada vez mais o campo.
Ainda na Categoria Educação do campo os sujeitos da pesquisa enfatizaram a
diferença que existe entre o ensinar no campo e o ensinar na cidade uma vez que a maioria
dos educadores ensina no campo na escola pesquisada e em outras escolas urbanas no
contraturno da escola campesina.

A gente fala muito em trabalhar a realidade do aluno, então lá teríamos que trabalhar a
realidade de lá. Aqui tem conteúdo que a gente não segue do jeito que tá no livro, tem
que ser a realidade do aluno, porque tem a maioria dos pais são agricultores. Tem coisa
aqui que não se passa para o aluno porque ele nem conhece. (Gestora da escola, 2015).

503


A realidade do jeito de cada um porque a realidade da criança que mora na cidade é
totalmente diferente da que mora no campo as brincadeiras que eles brincam são
diferentes. (Educadora “B”, 2015)

Percebe-se na fala dos entrevistados que a educação do campo possui sua essência
e que não se pode ensinar no campo assuntos que não valorizem a realidade campesina,
nota-se a necessidade de ensinar de acordo com a realidade que a escola apresenta mesmo
que se tenha que trabalhar assuntos que não estejam no livro didático.
Os sujeitos do campo em que a escola está inserida retiram do campo seu sustento
por meio da agricultura, nota-se isto por meio da afirmação da entrevistada e é por isso
que deve se retirar deste trabalho elementos para o ensino, pois, é uma forma de valorizar
o trabalho dos pais e ao mesmo tempo aproximar os conteúdos ensinados de algo que está
próximo da realidade dos educandos.
Concorda-se com Fernandes (1999, p. 52) quando afirma que: “Uma escola do
campo tem uma especificidade que é inerente a histórica luta de resistência camponesa.
Ela têm os seus valores singulares que vão em direção contrária aos valores burgueses.
Esse é um dos elementos importantes de sua essência.”. Esta afirmação é importante para
se discutir os assuntos a serem trabalhados na educação que deve estar de acordo com os
princípios do campo.
A educação do campo não pode ser pensada de forma inferior as escolas da cidade
as duas possuem suas especificidades e em cada uma as singularidades da realidade
devem ser enfatizadas. A escola do campo possui uma vasta riqueza a ser estudada de
forma que tanto educador quanto educandos aprendem ao mesmo tempo no processo de
educar.
No processo de ressignificação do PPC da escola do campo pesquisada nota-se
que os educadores procuram aproximar o ensinar da realidade do campo, é importante
que isto seja percebido para que o projeto seja posto em prática e desta forma sejam
alcançados na escola objetivos desejados pela instituição e pelos sujeitos do campo
inseridos na mesma.

504


Já é diferente aqui no campo, já são tudo próximo a terra e assim já vão construindo já
trabalhando e na cidade já é diferente né, porque daqui já leva pra feira de Bananeiras,
o que consegue aqui na própria terra pode vender até para a prefeitura que nem muitos
pais daqui mesmo vendem para a prefeitura. (Educadora “A”, 2015)
A educação da cidade para quem já mora lá tudo é mais fácil, mas pra quem mora já
aqui na zona rural é mais difícil e principalmente assim no trabalho porque eles
trabalham com agricultura e feijão, roça inhame. (Gestora, 2014)

Percebe-se na fala da educadora “A” que o trabalho dos pais deve ser enfatizado
na escola, pois muitos pais não apenas moram no campo como também tem que tirar do
próprio campo o seu sustento, as escolas do campo precisam estar envolvidas nas
discussões desta realidade. Os educadores precisam compreender esses processos
próprios da realidade campesina.
Respeitar e compreender o trabalho no campo nas escolas campesinas faz parte da
valorização da identidade, pois é uma forma de perceber que o campo possui riquezas
que permitem a seus pais se sustentarem, isto significa que o campo é um espaço de vida
e sustento para aqueles que se encontram no campo o que diminui o pensamento daqueles
que afirmam que o campo é um espaço de atraso.

O perfil de educador do campo exige uma compreensão ampliada de seu papel.


É fundamental formar educadores das próprias comunidades rurais, que não só
as conheçam e valorizem, mas, principalmente, que sejam capazes de
compreender os processos de reprodução social dos sujeitos do campo e que
se coloquem junto às comunidades rurais em seus processos de luta e
resistência para permanência na terra. (SÁ, MOLINA, BARBOSA, 2011, p.
86).

É necessário que o educador do campo perceba seu perfil de quem tem que
conhecer a realidade em que a escola está inserida, o que é preciso ser ensinado no campo
deve ser o que está próximo do campo e o que irá contribuir para que os sujeitos ali
inseridos valorizem aquele espaço. A educação deve acontecer com os sujeitos do campo
e não para eles.
Os educadores do campo devem estar preparados para discutir temas que
fortaleçam as reflexões a respeito do campo para que as especificidades do mesmo não
sejam esquecidas, a escola é o ambiente propício para se pensar as singularidades do

505


campo. Saber que a educação do campo deve ser diferenciada da educação urbana e por
isto em prática significa enxergar o campo como lugar de qualidades próprias que devem
ser enfatizadas nas aulas das instituições escolares do campo.

É preciso levar em consideração que a escola do campo traz as marcas dos seus
sujeitos: das diferenças convertidas em desigualdades. É intensa a relação entre
as desigualdades econômicas e sociais, historicamente sofridas pelos sujeitos
do campo, e a ausência do direito à educação no território rural. Conhecer as
marcas das desigualdades do sistema escolar do campo é condição
fundamental para se compreender os resultados obtidos por suas escolas e,
principalmente, para se construir os caminhos necessários à sua superação.
(MOLINA; MONTENEGRO; SÁ, 2009, p. 06)

Concorda-se com esta afirmação por entender-se que a escola deve refletir a
identidade dos sujeitos que a formam, neste caso os sujeitos do campo. Especificar isto
na educação do campo é uma função dos educadores que estejam preocupados em
contribuir com a valorização da identidade local.
A educação do campo sempre deve estar preocupada não apenas com os
acontecimentos da escola e sim com diversas ações escolares e extraescolares
ultrapassando os muros da escola formando sujeitos críticos que estejam sempre
preparados a refletirem sobre sua realidade e reivindiquem por políticas públicas que
tragam melhorias e conquistas para o campo.
Entende-se que o processo de ressignificação do currículo possui obstáculos e
também é um processo lento em que toda a escola deve passar por momentos de reflexão
sobre o que pensa, uma das entrevistadas afirmou que se deve ensinar:

A realidade deles, os conteúdos, por exemplo, eles têm que se adequar mais a realidade,
lógico eles têm que conhecer também outras realidades porque quando eles crescerem
eles vão sair daqui, a tendência é sair daqui até da vida sofrida que eles levam né, mas,
assim mostrar e adequar os conteúdos tudo o que vai ser trabalhado a realidade deles
isso não deixando de lado outras realidades por quê? Porque os alunos da cidade eles
tem uma visão mais ampla de tudo até pelo contato com as pessoas, tem alunos aqui que
eles não conhecem nem Tabuleiro que é um distrito quando eles veem a pista eles ficam
encantados. A gente tem que trabalhar de acordo com a realidade deles porque se a gente

506


não trabalhar de acordo com a realidade deles fica tudo mais difícil. (Educadora “C”,
2015)

As escolas do campo precisam estar engajadas e despostas a formar os educandos


para a vida, se os sujeitos irão querer sair do campo um dia isso será uma decisão deles,
a escola não pode de maneira nenhuma educar para este fim, isto é um pensamento
contrário aos princípios da educação do campo.
Os educadores do campo precisam ter um perfil de quem valoriza o campo e
precisam reforçar as especificidades do local, a realidade dos sujeitos do campo deve ser
enfatizada ao mesmo tempo em que os sujeitos sejam educados para o campo.

A proposta de uma escola do campo não cuida apenas de mudar conteúdos,


mas traz novos valores e atitudes; constrói-se como uma escola integral, que
lida com todas as dimensões do ser humano. Para tanto, é preciso discutir em
que consiste essa base, que princípios podem garantir que o sujeito do campo
seja o ponto de partida e o ponto de chegada do processo formativo, como
sujeito que sempre traz o seu conhecimento, a construção histórica da sua
cultura, e, com isso, formar pessoas que possam ler o mundo tal como ele se
apresenta hoje à juventude do campo e à da cidade. (SÁ, MOLINA,
BARBOSA, 2011, p. 86).

A ressignificação do currículo nas escolas do campo é um processo que precisa


de mudança dos educadores que necessitam se empenhar em transformar suas práticas. A
educação do campo precisa enfatizar uma educação em que os sujeitos reflitam sobre sua
realidade e queiram sempre o melhor sendo participativos e aptos a participarem de
decisões a serem pensadas com e para o campo.
Os sujeitos do campo tem o direito de conhecer outras realidades além da sua, mas
não de forma a negar suas origens, é necessário conhecer outras realidades para respeitar
as diferenças, mas o campo que é símbolo das origens destes sujeitos traz marcas que
precisam sempre serem lembradas e valorizadas, tal valorização deve começar nas escolas
que devem ter uma educação contextualizada de acordo com a atualidade da instituição.

Das experiências que eu tive com o campo e com os estágios na cidade, não tem tanta
diferença, [....] mas você tem que abrangi o todo não é porque eles estão inseridos ali
que você vai se limitar só aquele espaço só vai diferenciar que você vai começar falando
de uma realidade urbana pra depois ir para o campo para eles entenderem que muita

507


coisa que tem ali vem do campo as origens é tudo o campo, a feira de Bananeiras, por
exemplo, vem toda do campo eles são todos agricultores do município mesmo.
(Educadora “D”, 2015).

Mulher eu acho que não era pra ser diferenciado em nada porque eu acho que são os
mesmos alunos, a mesmas necessidades, não é pra ser diferente que os alunos não são
diferente é como na escola particular eu não entendo porque município é de um jeito e
escola particular é de outro e os alunos não tem o mesmo direito não e o dever não é, eu
por mim eu faço diferença não, eu não diferencio meus alunos não do jeito que eu
trabalho numa escola do campo eu trabalho numa escola urbana pra mim não tem
diferença. (Educadora “E”, 2015)

Percebe-se que ainda existe na escola pensamentos que não notam as


especificidades próprias do campo, a educação do campo possui particularidades próprias
que devem ser enfatizadas e discutidas por educadores com seus educandos, tanto campo
quanto cidade deve conhecer e respeitar um ao outro, mas é necessário perceber as
diferenças das escolas e dos sujeitos que a formam.
Para as escolas do campo a organização dos conteúdos deve estar voltada para os
acontecimentos da realidade, ou seja, pretendendo-se educar para a vida, então a vida dos
educandos deve ser o ponto de partida para que a educação e o ensinar na escola
aconteçam de forma significativa para educandos e educadores.
Está sempre refletindo sobre o campo e o contexto em que os educandos estão
inseridos é função dos educadores da escola, isto faz parte do processo de
contextualização necessário para a ressignificação do currículo que nada mais é do que o
ensinar partindo das práticas próprias do campo e para o campo, ou seja, a educação estará
voltada para que os sujeitos do campo estejam sempre interessados em refletir sobre sua
realidade com seus educadores que precisam sempre visar as particularidades do campo.

[...] se a ligação da escola é com a vida, entendida como atividade humana


criativa, é claro que a vida no campo não é a mesma vida da cidade. Os sujeitos
do campo são diferentes dos sujeitos da cidade. [...] O campo tem sua
singularidade, sua vida, e a educação no campo, portanto, não pode ser a
mesma da educação urbana, ainda que os conteúdos escolares venham a ser os

508


mesmos. A questão aqui (é) reconhecer que há toda uma forma diferente de
viver, a qual produz relações sociais, culturais e econômicas diferenciadas. Se
tomamos o trabalho, ou seja, a vida, como princípio educativo, então,
necessariamente, os processos educativos no campo serão também
diferenciados no sentido de que o conteúdo da vida ao qual se ligará o conteúdo
escolar é outro. [...] Isso também não implica necessariamente técnicas de
ensino diferentes e menos ainda um conteúdo escolar diferenciado em relação
à escola urbana. (FREITAS, 2010, p. 3 apud SÁ; MOLINA; BARBOSA, 2011,
p. 86).

O autor afirma que existem diferenças entre a escola da cidade e a escola do campo
por isso é necessário que os educadores da escola pesquisada concordem com esta
afirmação, pois, para que o PPC contextualizado da escola seja posto em prática
objetivando intuitos positivos para a escola e para o campo é necessário que os educadores
da instituição percebam estas diferenças para partir do campo e dos sujeitos campesinos
no processo de educar.
É necessário ressaltar o trabalho e a vida do campo, respeitando e enfatizando os
princípios nas aulas realizadas, o processo de ressignificar o currículo em uma escola do
campo exige de seus educadores empenho e dedicação para alcançar as metas
estabelecidas pelos mesmos. Os educadores não podem esquecer que eles também fazem
parte da escola e por isso precisam também se fazer do campo para atender as demandas
da instituição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação do campo no país vem ganhando espaço nos debates, mas ainda é
necessário avanço nas práticas desenvolvidas nas escolas. É preciso que educadores com
a comunidade escolar se unam para que a realidade do contexto seja inserida na sala de
aula e possam, assim, contribuir para a formação dos sujeitos inseridos no campo.
Na categoria Educação do Campo percebeu-se que os educadores da escola notam
o quanto a realidade campesina é importante para que a educação seja significativa para
os educandos. A (re) significação do currículo se inicia justamente neste entendimento
dos profissionais da escola de perceberem que o ensinamento na instituição deve partir
da realidade dos educandos.

509


A escola do campo pesquisada possui particularidades que devem ser enfatizadas
nas aulas, para que a educação seja significativa é necessário que os educadores façam
uma ponte entre a realidade do campo e os conteúdos planejados para serem ensinados
durante o ano letivo.
Os sujeitos do campo precisam discutir sobre sua realidade para que assim o
campo seja visto como espaço de direito. É necessário que as escolas campesinas iniciem
estas discussões nas salas de aula, os educandos precisam conhecer sua realidade do
campo para assim lutar por seus direitos percebendo a importância que o campo possui
nas suas vidas.
Vale ressaltar que as formações para valorização das escolas do campo não podem
parar, é necessário sempre que se reflita a respeito de novas pedagogias para os novos
sujeitos que chegam nas escolas, não se pode pensar na educação como algo estático que
está pronto, é necessária reflexão constantes para que o campo tenha seus direitos
atendidos por meio do reconhecimento e valorização daqueles que o formam.

REFERÊNCIA

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Nível Médio nas áreas de Reforma Agrária. Textos de Estudo. Boletim da Educação, n.
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http://www4.fct.unesp.br/nera/ publicacoes/ArtigoMonicaBernardoEC5.pdf. 05-Jul-
2005

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511


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68-108.

512


Matemática na Educação do Campo

Tatiane Santos da Silva2



Resumo: O presente trabalho tem por objetivo analisar o ensino da matemática na
Educação do Campo3, buscando indícios e métodos a se trabalhar com a matemática
dedutiva e concreta, tendo o contato com a natureza e na resolução de problemas com
situações cotidianas do meio ambiente, calculando área, perímetro e divisão de terras. Em
relação ao ensino da matemática numa escola do campo, D‟Ambrósio (2005, p.42)
quando afirma que: “reconhecer e respeitar as raízes de um indivíduo não significa
ignorar e rejeitar as raízes do outro, mas, num processo de síntese, reforçar suas próprias
raízes”. Portanto, de acordo com o pensamento de D”Ambrosio devemos como
professores mostrar a realidade do campo e unir esse conhecimento trazendo-o para
dentro da sala de aula, contribuindo para o desenvolvimento dos discentes. O artigo da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB nos informa que a escola deve adequar no
seu calendário escolar, práticas de vivência com o campo, buscando a interação dos
discentes com o meio que vivem. O ensino da matemática com essas práticas de vivência
com o campo é imprescindível, pois o aluno começa a enxergar a matemática ao nosso
redor e deixasse de fazer aquela velha pergunta "para que serve a matemática" ou "para
que serve esse assunto da matemática". Diante dessa vivência de práticas metodológicas,
o aluno observa e passa a ter um olhar enriquecedor que irá colaborar para o seu
desenvolvimento humano e cognitivo. Estamos vivendo na era da tecnologia, informação


2
Graduada em Licenciatura Plena em Matemática. Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA); Pós-
Graduanda em Ensino da Matemática. UNIESP Centro Universitário e Docente da Secretaria de Educação
Municipal de Sapé.
E-mail: tatianesanttos18@gmail.com

3
Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação do Campo (2006, p.9), “a Educação do Campo é uma
política pública pensada, mediante a ação conjunta de governo e sociedade civil organizada. Caracterizada
como o resgate de uma dívida histórica do Estado aos sujeitos do campo, que tiveram negado o direito a
uma educação de qualidade, uma vez que os modelos pedagógicos ora marginalizavam os sujeitos do
campo, ora vinculavam-se ao mundo urbano, ignorando a diversidade sociocultural do povo brasileiro,
especialmente aquela expressa na prática social dos diversos sujeitos do campo”.

513


e inovação, diante dessa realidade ainda devemos repensar sobre valores humanos,
educação na construção da cidadania e os princípios agrários que regem a sociedade,
proporcionando oportunidades aos discentes e o contato com a natureza. Esse trabalho
apresenta um relato de experiência na Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino
Fundamental Luíz José Gonçalo, município de Sapé – PB em turmas de 7° e 8° ano do
Ensino Fundamental II, com aulas sobre o tema: A Matemática na natureza. Na vivência
em sala de aula, foi trabalhado sobre o tema onde os alunos tiveram muita curiosidade,
como a matemática era usada no campo, foi contada a história do surgimento dos números
e como era feito a divisão de terras, eles ficaram admirados e começaram a associar aos
dias atuais. Dessa forma, foi possível observar que os alunos criaram um novo olhar para
a matemática, aplicada no meio em que vivemos e de vivência com os elementos que
fazem parte do campo. O trabalho atingiu seu o objetivo, uma vez que tinha como intuito
que os discentes compreendessem a importância e valorização da matemática no dia a dia
e sua aplicação no campo.

Palavras-chave: 1. Natureza, 2. Educação do campo, 3. Ensino da matemática.

Introdução

O presente trabalho tem por objetivo analisar o ensino da matemática na Educação
do Campo, buscando indícios e métodos a se trabalhar com a matemática dedutiva e
concreta, tendo o contato com a natureza e na resolução de problemas com situações
cotidianas do meio ambiente, calculando área, perímetro e divisão de terras.
Em relação ao ensino da matemática numa escola do campo, D’Ambrósio (2005,
p.42) quando afirma que: “reconhecer e respeitar as raízes de um indivíduo não significa
ignorar e rejeitar as raízes do outro, mas, num processo de síntese, reforçar suas próprias
raízes”. Portanto, de acordo com o pensamento de D’Ambrosio devemos como
professores mostrar a realidade do campo e unir esse conhecimento trazendo-o para
dentro da sala de aula, contribuindo para o desenvolvimento dos discentes.

514


O artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB nos informa que a escola
deve adequar no seu calendário escolar, práticas de vivência com o campo, buscando a
interação dos discentes com o meio que vivem.
O ensino da matemática com essas práticas de vivência com o campo é
imprescindível, pois o aluno começa a enxergar a matemática ao nosso redor e deixasse
de fazer aquela velha pergunta "para que serve a matemática" ou "para que serve esse
assunto da matemática".
O estagio presente neste trabalho foi realizado na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Joaquim Inácio da Silva, Cuité de Mamanguape– PB em turmas de 8° ano
do Ensino Fundamental II, com aulas sobre objeto de conhecimento: Geometria, com o
conteúdo de Triângulos integrando a Educação do Campo. Na vivência em sala de aula,
foi trabalhado sobre o tema onde os alunos tiveram muita curiosidade, como a matemática
era usada no campo, foi contada a história do surgimento dos números e como era feito a
divisão de terras, eles ficaram admirados e começaram a associar aos dias atuais.
Diante dessa vivência de práticas metodológicas, o aluno observa e passa a ter um
olhar enriquecedor que irá colaborar para o seu desenvolvimento humano e cognitivo.
Estamos vivendo na era da tecnologia, informação e inovação, diante dessa realidade
ainda devemos repensar sobre valores humanos, educação na construção da cidadania e
os princípios agrários que regem a sociedade, proporcionando oportunidades aos
discentes e o contato com a natureza.
Dessa forma, foi possível observar que os alunos criaram um novo olhar para a
matemática, aplicada no meio em que vivemos e de vivência com os elementos que fazem
parte do campo.
O trabalho atingiu seu o objetivo, uma vez que tinha como intuito que os discentes
compreendessem a importância e valorização da matemática no dia a dia e sua aplicação
no campo.

Referencial Teórico

515


A educação do campo é uma política pública pensada mediante a ação conjunta de
governo e sociedade civil organizada. O processo histórico de organizações e lutas por
direitos básicos, incluindo mais recentemente o direito a uma educação pública, gratuita
e de qualidade, numa pressão incessante dos movimentos sociais do campo sobre o estado
na busca de uma junção do poder público para melhorar a educação nas áreas rurais.
Tendo em vista que ainda há um descaso na educação rural, o intuito principal da
educação do campo é expandir o ensino e preservar a cultura do homem do campo,
merecendo destaque o elevado número de analfabetos. O que caracteriza os povos do
campo é o jeito peculiar de se relacionarem com a natureza, o trabalho na terra, a
organização das atividades produtivas, mediante mão-de-obra dos membros da família,
cultura e valores que enfatizam as relações familiares e de vizinhança, que valorizam as
festas comunitárias e de celebração da colheita, o vínculo com uma rotina de trabalho que
nem sempre segue o relógio mecânico. Em relação ao ensino da matemática numa escola
do campo, D’Ambrósio (2005, p.42) quando afirma que: “reconhecer e respeitar as raízes
de um indivíduo não significa ignorar e rejeitar as raízes do outro, mas, num processo de
síntese, reforçar suas próprias raízes”. Portanto, de acordo com o pensamento de
D’Ambrosio (2005) devemos como professores mostrar a realidade do campo e unir esse
conhecimento trazendo-o para dentro da sala de aula, contribuindo para o
desenvolvimento dos discentes.
Para quem não tem conhecimento sobre a legislação sobre a Educação do Campo
pode ter a falsa impressão de ser apenas uma escola situada no campo. Mas, a Educação
do Campo, além de encontrar-se no campo, segundo Antunes-Rocha e Martins (2009),
também significa aprender com a terra, com o campo, os modos genuínos de olhar para a
vida do homem em sintonia com a natureza. Além disso, significa conhecer diferentes
modos de organização da sociedade e das lutas políticas, e ainda reconhecer o poder dos
gestos, das cores, das imagens próprias do campo como saberes legítimos. Alves (2009),
compreendendo que o campo é a realidade concreta do educando, defende uma escola
especial que leve em consideração o contexto onde ela se instala.
Não podemos pensar a Matemática para a Educação do Campo sem pensar na
Etnomatemática que “é a matemática praticada por grupos culturais, tais como

516


comunidades urbanas e rurais, grupos de trabalhadores, classes profissionais [...], e tantos
outros grupos que se identificam por objetivos e tradições comuns aos grupos”
(D’AMBROSIO, 2002, p.9). A Etnomatemática define-se, como uma postura a ser
adotada do que um método propriamente dito, isto é, adequar a matemática aos temas
transversais e de vivência para cada realidade ou diversidade cultural. A Etnomatemática,
conforme D’Ambrósio (1990; 2002), reconhece e valoriza as regras e formalismos da
matemática acadêmica, mas também considera importantes as reflexões sobre as
situações e os ambientes em que ela acontece, não é necessariamente seguir apenas o livro
didático que tem sua importância significativa na aprendizagem, mas segue um
tradicionalismo que devemos romper essas barreiras de que a matemática é apenas
cálculos.
Em outras palavras, a Etnomatemática é uma metodologia de aplicação da
matemática dentro do contexto cotidiano do indivíduo que estuda essa disciplina. Desse
modo, em nossa prática do ensino da matemática, percebemos o sentido cultural,
reflexivo e crítico, considerando a realidade do campo em que os estudantes estão
vivenciando.
Com a aprovação da Constituição de 1988, a educação se destacou como um direito
de todos. E, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394/96, há o
reconhecimento da diversidade do campo, uma vez que vários artigos estabelecem
orientações para atender a essa realidade, adaptando as suas peculiaridades, como os
artigos 23, 26 e 28, que tratam tanto das questões de organização escolar como de
questões pedagógicas. Contudo, mesmo com esses avanços na legislação educacional, a
realidade das escolas para a população rural continuava precária. Em seu artigo 28, a LDB
estabelece as seguintes normas para a educação do campo: Na oferta da educação básica
para a população rural, os sistemas de ensino proverão as adaptações necessárias à sua
adequação, às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:

I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais


necessidades e interesses dos alunos da zona rural;

517


II - organização escolar própria, incluindo a adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL,
1996).

Portando, o artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB nos informa que
a escola deve adequar no seu calendário escolar, práticas de vivência com o campo,
buscando a interação dos discentes com o meio que vivem. O ensino da matemática com
essas práticas de vivência com o campo é imprescindível, pois o aluno começa a enxergar
a matemática ao nosso redor e deixasse de fazer aquela velha pergunta "para que serve a
matemática" ou "para que serve esse assunto da matemática". Diante dessa vivência de
práticas metodológicas, o aluno observa e passa a ter um olhar enriquecedor que irá
colaborar para o seu desenvolvimento humano e cognitivo. Essa adequação da
matemática à realidade do aluno faz com que o aluno se estimule a estudar e desconstruir
a problemática de que a matemática é um “bicho papão”, pois assim passa a ser
vivenciada em nosso cotidiano rural.

Metodologia

Esse trabalho apresenta um relato de experiência na Escola Municipal de


Educação Infantil e Ensino Fundamental Luíz José Gonçalo, município de Sapé – PB em
turmas de 7° e 8° ano do Ensino Fundamental II, com aulas sobre o tema: A Matemática
na natureza. O método proposto em sala de aula foi à realização de uma roda de conversa,
aula explicativa/expositiva com uso de data show, folhas de árvores e régua (foto 1), onde
foi trabalhado o ensino da geometria envolvendo-o aos elementos da natureza.

Foto 1- Fonte: (Tatiane Santos da Silva) Alunos desenvolvendo a atividade com folhas
de árvores

518

Resultados

Os resultados encontrados no presente estudo sugerem que haja uma junção do
ensino da matemática com os temas transversais proporcionando uma interação dos
discentes com o meio em que vivem e os temas em debates na atualidade. O espaço
comunitário que, através das relações sociais, possibilita o empoderamento dos sujeitos e
a construção de redes sociais. Isso indica que quem participa mais tende a ter um grau de
conhecimento maior, pois a participação permite um olhar crítico da realidade, um saber
pronunciar-se a respeito de questões sociais como, por exemplo, a cultura, a solidariedade
e o respeito. É possível afirmar, nesse sentido, que o empoderamento seria a primeira
condição para que a pessoa se aproprie da importância do viver em sociedade.
Nas aulas, em primeiro momento, foi explicado e exposto a história da evolução
dos números (foto 2) e como era realizada a medição de terras onde cada elemento que
compõe a natureza tem o formato de uma figura geométrica, dessa forma passei a ter
ciência sobre o que os educandos pensam sobre o assunto que será estudado. Tendo uma
noção prévia sobre o pensamento dos discentes, foi dado continuidade ao tema: A
matemática na Natureza, um tema que envolve a nossa realidade adequando-a aos
conteúdos proposto pela Base Nacional comum curricular (BNCC).

519


Foto 1- Fonte (Tatiane Santos da Silva) Professora explicando sobre a história da
matemática e sua aplicação no campo.

No planejamento de aulas o professor encontra-se permanentemente diante de um


problema, que é o de elaborar estratégias que permitam que seus objetivos sejam
atingidos. Deste modo, alternativas didáticas têm sido pesquisadas, como a Modelagem
Matemática, que busca “desenvolver o conteúdo programático a partir de um tema
especifico. A partir desse momento acontece o surgimento do problema. Nosso
conhecimento consiste em no de expectativas que formam como que uma moldura. Este
dirá o que é relevante ou irrelevante observar, os dados que devem ser selecionados. A
quebra desta problemática provoca uma dificuldade: o problema que vai desencadear a
pesquisa. Toda investigação nasce de algum problema teórico/prático sentido. Além
disso, A noção de distância é uma habilidade que as várias espécies que habitam a Terra
necessitam para sua própria sobrevivência. As primeiras unidades de medida criadas pelo
homem estão ligadas ao próprio corpo, como o pé, o palmo, e o côvado. A criação da
agricultura como a conhecemos exigiu dos primeiros agricultores o estabelecimento de
relações que exigiam mais sofisticação, e por consequência, um aprimoramento dos
instrumentos de medição.
Os egípcios antigos mediam suas terras através de cordas com 12 nós, que eram
dispostos no formato de triângulos retângulos, cujos lados eram proporcionais a 3, 4 e 5.

520


Eves (2004) afirma que a civilização egípcia antiga tinha conhecimento das ternas
pitagóricas, e das relações Matemáticas decorrentes dos lados destas figuras,
demonstradas por Pitágoras na célebre fórmula “a medida do quadrado da hipotenusa é
igual a soma do quadrado das medidas dos catetos”. Portando, esse foi um dos conteúdos
adequados ao tema: A matemática na Natureza. Além de noções de números racionais
através de medição com uso da régua e folhas de árvores de diferentes tamanhos.
Os alunos participaram da aula expondo seu ponto de vista e relatando que numa
tinham associado que os elementos da natureza teriam formato de formas geométricas. A
curiosidade foi grande sobre como era a divisão de terras, se um ficaria com terras maiores
que outras e surgiram muitas perguntas. Portanto, eles se motivaram e acharam a aula
muito proveitosa e relataram: “Ah professora, já percebi que a matemática está presente
em tudo”.
Dessa forma, foi gratificante que eles tenham percebido essa importância da junção
da Educação do Campo ao ensino da matemática.

Considerações finais

A modalidade educação do campo passou por um processo de identificação,


organização e indicativos da prática educativa para as políticas públicas. Dentro dessa
modalidade trabalhamos a Etnomatemática que foi abordado: O Ensino de Matemática
na Educação do campo. A Educação do campo tem impulsionado o debate para repensar
novas propostas pedagógicas de organização escolar relativamente a temas geradores,
tempo e espaços escolares, entre outros. Trata-se de uma escola concebida e organizada
em fundamentos políticos e ideológicos do MST (Movimento Sem Terra). Vale destacar
que a escola se intitula ‘itinerante’ em função de que ela acompanha o itinerário das
famílias Sem Terra, garantindo o direito à educação das crianças, jovens e adultos que se
encontram em acampamento, lutando pela reforma agrária. São experiências educativas
que oferecem contribuições ao debate e à formação educacional para o desenvolvimento
local e a emancipação sociocultural dos povos do campo. Todas as iniciativas são
significativas para o acúmulo de experiências pedagógicas e para a demonstração de que

521


a educação do campo é objeto de atenção das organizações sociais, dos sindicatos, dos
movimentos sociais e de muitas comunidades que, de forma pontual, realizam suas
práticas sociais educativas.
A matemática se impõe com forte presença nesse estudo da educação do campo,
pela importante participação em relação ao meio ao qual estamos inseridos. Sua presença
no futuro será intensificada, mas nem tanto na forma que é trabalhada hoje com a
repetição de exercícios e apenas seguindo o livro didático, ela irá se modernizar junto a
tecnologia, com interligação com a sociologia, filosofia e demais áreas do conhecimento.
A Etnomatemática em quebrando essas barreiras, que muitas vezes os professores estão
limitados apenas ao livro didático. Mas para isso, o professor deverá se preparar com
outra dinâmica. Como diz Beatriz D’Ambrosio, “o futuro professor de matemática deve
aprender nas ideias matemáticas de forma alternativa”.
Os estudos abordam que a educação do campo no ensino da matemática, está
tentando solucionar problemas pertinentes à matemática no nosso dia a dia, além disso,
buscando melhorias no ensino-aprendizagem das disciplinas e a passando a abordar a
Etnomatemática nas Instituições de ensino, com o objetivo de levar à educação rural as
escolas e que os educandos tenham conhecimento dessa abordagem de suma importância
para a sociedade em que vivem.
Dessa forma, foi possível observar que os alunos criaram um novo olhar para a
matemática, aplicada no meio em que vivemos e de vivência com os elementos que fazem
parte do campo. O trabalho atingiu seu objetivo, uma vez que tinha como intuito que os
discentes compreendessem a importância e valorização da matemática no dia a dia e sua
aplicação no campo. Essa experiência vivenciada em sala foi de suma importância para
meu crescimento profissional, além de ter despertado a curiosidade dos discentes.

Referências

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comunidade e movimentos sociais/ Maria Isabel Antunes-Rocha, Maria De Fátima

522


Almeida Martins, Aracy Alves Martins, [organizadoras]. 2 ed. Belo horizonte: editora
Gutenberg, 2012. (coleção caminhos da educação do campo; 5).
ARAÚJO, Ismael Xavier de. Educação do Campo e a formação sociopolítica do
educador/Ismael Xavier de Araújo, Severino Bezerra da Silva. – João Pessoa: Editora
Universitária da UFPB 2011.100P.

D'AMBROSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à pratica. São Paulo, Papirus,


1996.

MONTEIRO, Alexandria. A matemática e os temas transversais/ Alexandria Monteiro,
Geraldo Pompeu Junior. -São Paulo: Moderna, 2001. - (Educação em pauta: temas
transversais).

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Souza de Moura, Josinalva Gomes da Silva, Mércia Moura Nogueira. – Sapé: Centro de
Estudos Multidisciplinares, 2017. (Série Repensando a escola, v.1). 210p.

523


TEATRO DE BONECOS: Levando a educação ambiental em escola do campo

Victor Hugo Borba da Silva


Graduando em Artes Visuais - UFPB
victorborbadasilva@gmail.com

Henrique Pereira dos Anjos Castilho


Graduando em Pedagogia do Campo - UFPB
enriquecastilloator@gmail.com

Fillipe Silveira Marini


Orientador - Professor DGEOC/CCEN/UFPB
fsmarini@yahoo.com.br

RESUMO: Este trabalho teve o objetivo de colaborar com os professores atuantes nos
segmentos do ensino fundamental em uma escola do campo na consolidação dos
processos de construção e socialização do conhecimento, nas ações para a conservação
do meio ambiente, e na concretude do sentimento de pertencimento dos estudantes,
possibilitando ao educador provocar e despertar no ambiente escolar a autonomia crítica
do público alvo através do teatro de bonecos. Assim, as ações desse projeto foram
direcionadas aos estudantes do quarto e quinto ano numa escola pública situada na
comunidade quilombola Gurugi/Conde/Paraíba. Foram propostos encontros mensais de
caráter multidisciplinar, participativo e dialógico, conduzidos de maneira lúdica. Todavia,
o processo de confecção dos bonecos, suscitou nos escolares, o protagonismo social, o
sentimento de pertencimento, e a construção de identidade emancipada no contexto da
relação entre meio ambiente e a realidade social. Além de aprimorar o conhecimento dos
mesmos sobre temas da agroecologia, da educação do campo e da educação ambiental.

PALAVRAS-CHAVES: 1. Educação; 2. Agroecologia; 3. Teatro de Bonecos.

524


INTRODUÇÃO

A educação abordada em escolas situadas no campo vem apresentando uma


educação extremamente fragilizada pelo fato de preparar o povo do campo para se adaptar
ao processo de subordinação a forma de produção capitalista imposta pela cultura
dominante, a qual está muito distante da realidade do trabalho e da vida dos povos rurais.
Esta produção busca incentivar a monocultura, onde visa substituir a cobertura vegetal
original (geralmente com várias espécies de plantas) por uma única cultura, tornando-se
uma prática extremamente danosa ao solo, pois, por não ser natural, na maioria dos casos
é produzida com o uso exacerbado de agrotóxicos que poluem o solo e abrem espaço para
doenças e redução de expectativa de vida não só dos camponeses, mas também nos
grandes centros urbanos. Desta forma, possibilita uma redução na força dos movimentos
sociais e culturais, afetando diretamente o econômico, abrindo espaço para o êxodo rural
e a superpopulação em centros urbanos. Nesse contexto, o projeto de extensão “Teatro de
Bonecos: levando a educação ambiental em escolas do campo”, possuiu o objetivo de
colaborar com os professores atuantes nos segmentos do ensino fundamental em escolas
do campo na consolidação dos processos de construção e socialização do conhecimento,
nas ações para a preservação do meio ambiente, e na concretude do sentimento de
pertencimento dos estudantes, possibilitando ao educador provocar no ambiente escolar
e na comunidade o interesse sobre temas que envolvem o meio ambiente e despertem a
autonomia crítica do público alvo através do teatro de bonecos. O teatro de bonecos é
usado como uma ferramenta lúdica, auxiliando na construção da identidade, e no
desenvolvimento cognitivo, através da possibilidade de desempenhar vários papéis
sociais e experimentar diversas emoções, as quais auxiliam e intensificam o processo de
ensino-aprendizagem. Além de ser de fácil acesso, atua como uma ferramenta para a
transmissão de conhecimento, ajudando no conteúdo de ensino formal os conceitos de
sustentabilidade, agroecologia e educação do campo, e assim, provocar na educação do
povo do campo uma forma mais crítica e de visualização do ser dentro de sua perspectiva
de vida. A ludicidade do teatro de bonecos auxilia a criança na construção de sua
identidade e possibilita que a mesma possa desempenhar diversos papéis sociais e

525


experimentar diferentes emoções, as quais auxiliam e intensificam o processo de ensino-
aprendizagem. Desta forma é necessário perceber que “animar é produzir ânima, vida e
simular um complexo autônomo” (BALARDIM, 2004). Assim, ao participar de um teatro
de bonecos, tanto na criação e apresentação quanto na condição de espectador, faz com
que a criança trabalhe a oralidade, a escrita, a inserção social, o senso crítico e a
criatividade, pois todos interagem durante a apresentação, todos possuem falas,
predeterminadas ou não. Segundo ALTIERI (2012), a ideia central da Agroecologia é ir
além das práticas agrícolas alternativas no desenvolvimento de agroecossistemas com
independência de agrotóxicos e energia externa. Os conceitos da Agroecologia só podem
ser introduzidos e praticados no ambiente rural através da educação e da construção do
conhecimento, na qual possuem o objetivo de educar o indivíduo a gerenciar e aprimorar
as relações entre humanos e o meio ambiente. Desta forma tem a intenção de perceber os
danos provocados no manejo da agricultura e produzir alimentos de forma mais cultural
e socioeconomicamente mais sustentável. Assim, a interconexão com a educação
ambiental pode ser aplicada apresentando os conceitos dos três Rs – Reduzir, Reutilizar
e Reciclar – e aplicando eles com as fases de identificação do problema, a ação que pode
ser tomada de imediato e a busca de uma solução para o problema a longo prazo. Por
exemplo: identificar o lixo no ambiente escolar como o problema, fazer o manejo correto
dele e reutilizar determinados materiais como uma ação imediata e utilizar as fábricas de
reciclagem de cada material específico como uma solução para esse problema em longo
prazo. Desta forma podemos passar as informações básicas e assim, despertar a
autonomia crítica do público alvo. Existem profissionais “que sabem transformar suas
aulas em trabalho-jogo, seriedade e prazer” (ALMEIDA, 2003). Portanto, este
profissional da educação abre espaço para introduzir a agroecologia, a educação do
campo e a educação ambiental, tornando-se um professor pesquisador. Aquele que
possibilita instigar nos estudantes a identificação com a comunidade e despertar o
sentimento de pertencimento. Assim, oportunizar aos estudantes a possibilidade de sentir
as emoções causadas pelo uso do teatro de bonecos como um meio para educar possibilita
aos profissionais da educação atuar de forma mais profunda.

526


DESENVOLVIMENTO

As metodologias utilizadas neste projeto foram com as realizações de oficinas


direcionadas aos estudantes do quarto e quinto ano da Escola Municipal Ensino Infantil
Fundamental José Albino Pimentel situada na comunidade quilombola Gurugi na cidade
de Conde, no estado da Paraíba, as quais possuíam características multidisciplinar,
participativas e dialógicas, com os encontros periódicos, possibilitando a transmissão de
conteúdo de forma mais dinâmica a fim de despertar a autonomia crítica dos estudantes.
Em um primeiro momento, o projeto foi apresentado à gestão e aos professores da escola
e após os acordos com a Secretaria de Educação do município para a sua ciência e possível
apoio. Algumas reuniões com os professores foram realizadas em reunião de
planejamento e estreitando mais o contato com a escola e seus profissionais. Antes da
montagem do grupo e seleção dos estudantes para participar da extensão foi realizada
uma palestra sobre as temáticas abordadas (Agroecologia, Educação Ambiental e
Educação do Campo) como divulgação e visualização do interesse do público alvo. No
segundo momento coube a escola indicar os estudantes que fariam parte do grupo
atendido. Na primeira oficina foi realizada uma palestra, a qual teve o foco de falar um
pouco mais sobre o projeto e como o teatro de bonecos, através da apresentação do
personagem Tinho, pode ser uma ferramenta para abrir o debate sobre preservação
ambiental e a realidade de vida dos escolares. Durante toda a oficina foram propostos
questionamentos sobre o tema meio ambiente e preservação ambiental estimulando-os
coletivamente a gerar respostas para um desenvolvimento sustentável e despertar a
autonomia crítica. Na segunda oficina continuaram a ser aprofundadas as temáticas, além
de ser apresentada e distribuída a apostila elaborada para o projeto – conhecida como
ZINE do Estudante. O seu conteúdo traz o que é o teatro de bonecos e como pode ser
criado um boneco de baixo custo - com materiais recicláveis; na construção das
personagens nas Zines dos estudantes atendidos pelo projeto foi possível verificar nestes
espaços interativos as características deles refletidas em seus bonecos como, por exemplo,
sabe jogar bola; é humilde; é forte; e não gosta de estudar. Isso possibilitou um interesse
maior dos meninos (as) sobre os assuntos que surgiram e os motivos de determinadas

527


características terem vindo à tona em seus personagens. Depois de decidido o cenário,
sendo a própria escola, foi elaborado o roteiro da peça teatral com característica futurista
de ficção científica. A estória tratou de um futuro da comunidade onde o meio ambiente
estaria poluído, degradado e a escola vira um lixão, assim, muito triste com esse
acontecimento, dois dos personagens iriam retornar ao presente para tentar evitar a
tragédia. Nos momentos de escrever os storylines diversos estudantes apresentaram
dificuldades na escrita, além de extrema vergonha para ler para a turma, sendo necessário
um pouco mais de atenção para estes alunos, auxiliando-os em grupo para expor a ideia
de que caso não consiga sozinho o grupo pode sempre ajudar, facilitando-os em seus
próprios processos de aprendizagem e superação de medos ou timidez que os impedem
de falar em público. No terceiro encontro realizado foi iniciada a confecção dos bonecos,
com os materiais mais diversos, sendo eles: latas, caixas de leite e garrafas PET para a
estrutura básica dos bonecos; barbantes para braços e pernas; e tampas de garrafas para
mãos e pés. Todos foram cobertos com papel de rascunho e as ferramentas para os meios
de produção seguiram um pensamento cooperativista, pois todos foram compartilhados a
fim de suscitar a experiência que eles terão posteriormente, caso realizem novamente a
confecção de bonecos sem a utilização de grandes recursos pelo fato das condições
econômicas do ambiente escolar serem sempre precários. Assim, no momento da
construção e reconstrução dos bonecos os temas sobre o meio ambiente e a realidade de
vida dos escolares foi abordado, provocando sempre o protagonismo social, o sentimento
de pertencimento e a construção das identidades emancipadas dos estudantes. No quarto
encontro foi proposto experimentações cênicas com as passagens do roteiro e a percepção
dos personagens e encontro das vozes adequadas para cada um, sendo ela mais grave e
lenta ou aguda e rápida, abrindo espaço para as potencialidades das vozes e interpretações
dos personagens. Realizamos a matriz FOFA, a qual permite que os próprios alunos
avaliem o projeto em seus pontos fortes, fracos, oportunidades e ameaças, guiando-nos
para a melhor forma realizar o projeto no futuro, a qual contribua para todos os
envolvidos. Durante a FOFA, em Fortalezas surgiram palavras como Interagir e
Materiais, tratando sobre ter contato com outros aluno e materiais comuns do cotidiano,
mas com novos olhares, em Oportunidades surgiram às palavras Reciclar, Plantar e Artes,

528


afirmando sobre as oportunidades de saber a importância da reciclagem e da reutilização
de determinados objetos para plantar ou pintar e usar como decoração, os aproximando
das artes visuais, em Fraquezas surgiram as palavras Faltas, atribuindo a ausência e
inconsistência dos encontros, Comportamentos e Respeito, afirmando a falta destes itens
em determinados participantes, e Comunicação, pois, mesmo com datas marcadas, a
gestão não informava aos participantes dificultando ainda mais a periodicidade,
principalmente com a mudança na gestão (que ocorreu durante a execução do projeto), e
em Ameaça surgiram as palavras Horário, referindo-se ao horário quebrado com o
intervalo, sugerindo o início da oficina após o intervalo, e Porta, referindo-se a porta da
sala em que as atividades são realizadas como uma forma de denunciar a estrutura da
precária da escola. Estas avaliações dos próprios participantes sobre o projeto realizado
nos trazem a tona às palavras que nos instigam a continuar e melhorar cada vez mais este
projeto, almeja mais escolas para implantá-lo, com uma duração maior e preparada para
firmar mais parcerias, as quais superem as dificuldades encontradas nesta jornada.

CONCLUSÃO:

Observamos que apesar dos desafios encontrados, como a mudança da gestão, a


falha na comunicação, a desistência de um número considerável dos participantes, e de
algumas propostas pedagógicas não serem concretizadas, o projeto apresentou um
resultado satisfatório, contextualizado à criação de elos entre os estudantes e o
pensamento crítico sobre os temas que abrangem a educação ambiental, a agroecologia,
a educação do campo e a história da comunidade. Desta forma, a execução do projeto
viabilizou aos estudantes o desenvolvimento dos protagonismos sociais, potencializando
a construção de identidade e o sentimento de pertencimento. Além de aprimorar o
conhecimento dos mesmos sobre temas da agroecologia, da educação do campo e da
educação ambiental.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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ALMEIDA, Paulo Nunes de. Educação Lúdica. Técnicas e Jogos pedagógicos. SP.
Edições Loyola, 2003.

ALTIERI, Miguel. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável.


3.ed. São Paulo, Rio de Janeiro: Expressão Popular, AS-PTA 2012. p 15.

BALARDIM, Paulo. Relações de vida e morte no Teatro de Animação. Porto Alegre.


Edição do Autor, 2004. p 43.

530


REFLEXÕES E EXPERIÊNCIA DOCENTE NA DISCIPLINA SOCIOLOGIA
RURAL E QUESTÃO AGRÁRIA DA ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO DO
CAMPO E SUSTENTABILIDADE (UNEAL)

Ricardo Santos de Almeida


Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Sergipe, Docente do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas Campus Marechal Deodoro
ricardosantosal@gmail.com

RESUMO: Esta reflexão objetiva-se por expor experiências de ensino-aprendizagem sob


a ótica docente no âmbito da disciplina Sociologia Rural e Questão Agrária, componente
curricular obrigatório, na Especialização em Educação do Campo e Sustentabilidade
ofertada pela Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) e ministrada como docente
convidado, em 2019. Neste sentido, destaca-se a disciplina como um amplo espaço para
a compreensão das dinâmicas socioterritoriais a partir da escala global às que se
encontram imbricadas desde a Formação Econômica Territorial brasileira (concentração
de terra e renda, desigualdades socioterritoriais, luta por terra) e ainda existentes na
contemporaneidade. Além disso, enfatiza-se a socialização de experiências individuais e
coletivas estimulando a responsabilidade acadêmica aprimorando os saberes e práticas
aprendidas ao longo da especialização as valorizando a partir de oito eixos temáticos
organizados no módulo didático. Para tal, consubstanciamo-nos do aporte teórico e
metodológico relacionando os conteúdos, conceitos e temas (do planejamento à ação) aos
preceitos da Educação do/no Campo através dos estudos de Almeida (2016), Arroyo,
Caldart e Molina (2011), Furtado (2009), Moreira (2014), dos volumes 1 a 9 da coletânea
A questão agrária no Brasil sob organização de Stedile (2005). Sendo assim, destacamos
que o desafio conduzido pela disciplina analisada proporcionou a valorização dos saberes
e das experiências, dos espaços de vivências e busca de conhecimentos realizados pelos
discentes os estimulando a prática de habilidades fundamentais ao docente da atualidade:
o ser continuamente professor-pesquisador dotados de uma consciência espacial cidadã
compreendendo as dinâmicas socioterritoriais em múltiplas escalas.

531

PALAVRAS-CHAVES: 1. Trabalho docente; 2. Consciência de finalidade; 3.


Dinâmicas Socioterritoriais.

INTRODUÇÃO

Toda disciplina que se encontra inserida no processo formativo em curso de pós-


graduação Lato Senso deve ser planejada e sistematizada observando-se os norteamentos
contidos no Projeto Político Pedagógico. No caso da Especialização em Educação do
Campo e Sustentabilidade da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) cuja oferta é
regular, semipresencial com atividades Tempo-Universidade e Tempo-comunidade
contribui significativamente para a (re)construção e fortalecimento de saberes e
conhecimentos, valores, cultura e identidade de um público que já é docente ou atua em
atividades laborais diretamente relacionada ao campo e em regime de alternância
proporciona uma diversidade de intercâmbio de saberes que são amplamente debatidos e
valorizados ao longo dos encontros em sala de aula na Universidade. Neste sentido, a
oferta do componente curricular Sociologia Rural e Questão Agrária no Brasil busca
contemplar em sua ementa as seguintes discussões:

Estudo dos paradigmas teórico-metodológicos das Ciências Sociais.


Sociologia Rural: concepções e contexto histórico. Agricultura e relação
homem-natureza ao longo da história; A questão agrária e o capitalismo;
Globalização e transformações no espaço rural; Agricultura e
desenvolvimento: ocupação e transformação do espaço brasileiro; revolução
verde; modernização conservadora, reestruturação produtiva e suas
consequências para o mundo rural; força de trabalho na agricultura; Os
movimentos sociais rurais e a reforma agrária no Brasil e no mundo;
Agricultura e reforma agrária em Alagoas. Trabalho de Campo Curricular
(UNEAL, 2017).

532


Nota-se, portanto, que as temáticas orientadoras enunciadas na ementa do
componente curricular sugerem o entendimento de diversos processos sociais, políticos e
econômicos que (re)constroem os territórios do campo e da cidade e também uma
contextualização a respeito das ressonâncias de processos territoriais no espaço rural
brasileiro atual após séculos de transformações estruturais para, posteriormente,
evidenciarmos as teses favoráveis (basilares ao real entendimento da função social e
cultural dos povos e das escolas do/no campo) e as teses contrárias à reforma agrária
compreendendo como estas evidenciam ainda o fortalecimento dicotômico sobre o campo
e a cidade, por exemplo, ou o não entendimento da importância campesina e de outros
povos do campo e seus saberes historicamente acumulados.
Os principais objetivos do componente curricular confluem para a compreensão
das diversas dinâmicas socioterritoriais que ainda prevalecem no campo, e enfatizamos a
importância de se: Discutir aspectos teórico-metodológicos da Sociologia rural e da
Questão Agrária no Brasil; Analisar o desenvolvimento da agricultura; a distinção entre
questão agrária e questão agrícola; compreender a origem e evolução da divisão do
trabalho campo/cidade; observar as prováveis ou não determinações na organização das
atividades agrárias (relação sociedade-natureza, modo de produção, estrutura fundiária,
mão-de-obra, mercado, políticas públicas, etc.); bem como o debate sobre a renda da terra
(diferencial/absoluta/monopólio). Introduzir ao debate atual sobre as tendências sociais
do mundo rural no Brasil, com ênfase nas relações de trabalho e nos movimentos sociais
de luta pela terra fez parte das discussões promovidas.
Observa-se que existe um grupo expressivo de docentes-pesquisadores que
defende a reforma agrária por entende-la como instrumento eficaz de combate à pobreza
e as desigualdades sociais e regionais e, por outro, registra-se a presença dos que avaliam
que o debate ou aplicação prática da reforma agrária encontra-se ultrapassada e não é
mais um instrumento necessário no Brasil no século na contemporaneidade. Buscou-se
no componente curricular apontar e nominar estes pesquisadores, pois se faz necessária a
tomada de consciência dos discentes a qual perspectiva e alinhamento teórico-
metodológico melhor se alinham considerando-se a diversidade dos sujeitos públicos-
discentes matriculados na turma em que fora experienciada a prática docente.

533


No que diz respeito as estratégias metodológicas se consubstanciaram pela Aula
expositiva e dialogada, dinâmicas de grupo e na construção de narrativas sobre
experiências formativas ou práticas didático-pedagógicas a partir da produção do short
paper em grupo que seguiu a seguinte correlação respaldada na linguagem científica: a
identificação dos recortes do espaço geográfico de origem dos discentes da equipe, a
utilização de categorias, temáticas e autores/bibliografia para discutir as identidades de
povos do campo de modo a valorizar todos os recortes do espaço geográfico analisado.
Destacou-se a importância da realização de entrevistas com o intuito de identificar as
origens dos lugares pesquisados, e sobretudo comparar os recortes do espaço geográfico
analisados com o intuito de identificar potencialidades.
Teceremos essa reflexão nos alicerçando no entendimento das múltiplas
dinâmicas sociais, culturais e educativas dos diferentes grupos que formam os povos do
campo (agricultores, artesãos, pescadores, indígenas, quilombolas) público participante
da especialização sob olhar docente tal como nos propõe Arroyo, Caldart e Molina (2011,
p. 12-13) sobre a importância “entender os processos educativos na diversidade de
dimensões que os constituem como processos sociais, políticos e culturais; formadores
do ser humano e da própria sociedade”. Sendo assim, a prática do-discente deve se
perpassar pelo estimulo à prática da leitura e da escrita valorizando-se a leitura de mundo,
as experiências buscando contribuir para que as práticas cotidianas fortaleçam as
identidades dos povos do campo dando-lhes os caminhos que lhes façam compreender
sistematicamente como ao longo da Formação Econômica e Social direitos são usurpados
e amplamente negados como uma das estratégia de fortalecimento de grupos políticos e
econômicos historicamente consolidados.

SOCIOLOGIA RURAL E QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL CONTRIBUTIVA


À FORMAÇÃO DE UMA CONSCIÊNCIA ESPACIAL CIDADÃ

As disciplinas inseridas no processo formativo do futuro especialista em Educação


do Campo e Sustentabilidade perpassam-se pela compreensão de diversas configurações
territoriais em que o Brasil, estados e municípios encontravam-se no passado e no

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presente. Neste sentido, analisou-se a relevância do componente curricular Sociologia
Rural e Questão Agrária no Brasil para a formação de profissionais cujas atividades
relacionam-se direta e indiretamente com o campo alagoano.
A importância de um sistemático planejamento didático-pedagógico permitiu a
socialização e debate sobre temas importantes para que os discentes resgatem a
valorização de suas identidades e pertencimentos às comunidades as quais fazem parte.
Neste sentido, buscou-se selecionar materiais acadêmico-científicos contributivos ao
entendimento dos processos que envolvem a Formação Econômica e Social brasileira
observando-se a relevância do debate sobre as “inter-relações e as cadeias de causalidade
que constituem a urdidura dos processos econômicos” (FURTADO, 2009, p. 45).
Portanto, se faz necessária a compreensão da complexidade da questão agrária no Brasil,
não esquecendo-se que esta encontra-se amplamente relacionada a variadas escalas do
global ao local e do local ao global, tal como afirma Stedie (2005, p. 15-16) ao destacar
a relevância do debate sobre a questão agrária a tendo “como o conjunto de interpretações
e análises da realidade agrária, que procura explicar como se organiza a posse, a
propriedade, o uso e a utilização das terras na sociedade brasileira”.
Enfatizamos que é pelo componente curricular Sociologia Rural e Questão
Agrária no Brasil que o debate é oportunizado e permite analisarmos as diversas
transformações socioterritoriais em curso que culminaram na expansão da flexibilização
e da informalização do trabalho agrícola, fato este que pode ser observado no aumento
do número de agricultores com emprego fora das propriedades, tolhendo suas verdadeiras
identidades campesinas, bem como na combinação de diferentes atividades dentro da
própria propriedade, atividades estas que nem sempre estão diretamente relacionadas à
produção agrícola para a sua própria sobrevivência. Moreira (2014, p. 7) define o trabalho
como “fonte e condição de existência do homem em qualquer contexto de espaço e
tempo” e ao negar ou tolher os seres humanos no campo de seu acesso para sua
sobrevivência através das práticas laborais atende-se a uma política que atende aos
interesses de uma minoria que concentra bens e tornaram-se verdadeiros latifundiários,
tolhe-se dos trabalhadores do campo a luta pela sobrevivência e o subsidiar suas
expectativas de produzir e fazer parte de uma sociedade incluído como pessoa que produz

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e não fazer parte de uma estatística que o excluí sistematicamente. No caso, brasileiro,
por exemplo, Almeida (2016, p. 18)

A busca pela acumulação de capital reflete nas transformações no campo


brasileiro atualmente, que, mesmo recebendo investimentos em tecnologias,
busca uma contínua apropriação da mais-valia dos trabalhadores do campo,
sendo recrutas de repressões e expulsões para as cidades. Esses movimentos
de tensão mobilizam o surgimento dos movimentos sociais que lutam pela
reforma agrária e pelo acesso às melhores condições de trabalho e vida.

É preciso que o debate seja contínuo para além do componente curricular,


estimulando por meio dele a multiplicação de pessoas conscientes sobre os processos
sociais ao qual ainda somos influentes, pois é somente a partir da participação da massa
trabalhadora que a tomada de consciência vai evidenciar a terra como lócus, possibilidade
e realidade para que possamos estabelecer a real inclusão social.
É papel do componente curricular o estabelecimento do debate a respeito da
negação da terra que culmina em uma agricultura que atualmente se traduz pela alta
tecnologia, e que o ser humano de modo geral não atende ao mercado e seus produtos são
desvalorizados. Portanto, se faz necessário que as autoridades políticas se voltem com
mais responsabilidade para a reforma agrária e que os entraves burocráticos e até mesmo
a falta de sensibilidade dos governantes passe a ser mais voltada para a questão da reforma
agrária já que este viés é uma forma de melhorar as condições de vida do homem do
campo e minimizar os problemas sociais dos grandes centros urbanos.
No que diz respeito ao debate centrado na Educação do/no Campo destacamos
que a realidade das escolas do campo possui suas peculiaridades e necessitam de
professores que estejam abertos à realização de um trabalho diferenciado e de qualidade,
frente aos desafios aos quais vivenciam devido às especificidades dos estudantes de uma
dada localidade, como de qualquer outra. O estimulo à compreensão do mundo a nossa
volta se faz necessário baseando-se nos preceitos da Educação Popular pautando-se no
despertar uma visão de mundo mais crítica e cidadã tal como sugere Freire (1967, p. 100)
“de uma educação que levasse o homem a uma nova postura diante dos problemas de seu

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tempo e de seu espaço. A da intimidade com eles”. Desta feita, a Educação do/no Campo
permite-nos repensar a formação dos pós-graduandos centrada na perspectiva da inclusão
e valorização do campo como um espaço rico de construção de saberes e conhecimentos,
culturas, crenças, dos jeitos e modos de ser e viver, de valores, ou seja, na identidade de
um povo.
Foi por meio de debate que identificamos nas narrativas discentes a denúncia
sobre a visão equivocada de cidade como espaço de convivência altamente avançado e
campo um lugar atrasado, defasado. O que não é verdade, pois no campo, existe uma
riqueza de coisas e saberes que são construídos historicamente tal qual na cidade.
Toda escola deve ser parte integrante do campo e suas respectivas comunidades.
O professor, por sua vez, precisa compreender que ele é parte fundamental dentro desse
processo de construção histórica e de pertencimento e que se faz necessária a valorização
também dos saberes previamente adquiridos dos estudantes. Sendo assim, propõem-se
aqui a valorização do sentimento de pertencimento dos professores e professoras das
escolas do campo, suas práticas e discursos diante da desafiadora realidade nos dias atuais
(re)conhecendo os variados processos que envolvem a questão agrária que influenciam
suas vidas até hoje buscando com base neste (re)conhecimento fortalecer a consciência
espacial cidadã dos envolvidos no processo ensino-aprendizado.

CONCLUSÃO

A experiência docente no âmbito de especialização em Educação do Campo e


Sustentabilidade permitiu-me (re)construir saberes e conhecimentos para além do campo
teórico, pois a partir do momento em que se relacionou o teórico às experiências e
realidades diversas dos discentes participantes lhes motivando à tomada de consciência
sobre suas experiências dentro e fora da sala de aula relacionadas a Sociologia Rural e
Questão Agrária no Brasil, considerando-se que boa parte dos estudantes são
representantes de movimentos sociais e professores da rede pública de ensino.
Embora nos centremos de modo mais profundo nos encontros presenciais, a
valorização das experiências e saberes previamente acumulados evidenciou a importância

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da leitura de mundo resgatando-se a real função social e cultural dos grupos sociais cujos
anseios despertam um pensamento educacional cuja valorização está centrada na cultura
escolar docente contributiva à valorização dos saberes e práticas do campo não o
considerando como local de atraso ou que sempre deve possuir um modelo de agricultura
com pouco desenvolvimento tecnológico.
Defende-se, portanto, a ideia de que nossos discentes sejam contínuos aprendizes-
pesquisadores e que se dotem do exercício pleno da pesquisa contributiva à revelação do
que está posto em suas práticas cotidianas como professores, trabalhadores rurais, etc.,
desenvolvendo estratégias a partir de movimentos de ação, intervenções, reflexões,
qualificações, ou seja, a partir da educação, para transformar realidades desiguais
minimizando-se as mazelas socioterritoriais.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Ricardo Santos de. Agronegócio canavieiro em Alagoas: controle do


território e luta por terra. 2016. 183 f. Dissertação (Pós-Graduação em Geografia) -
Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, 2016.

ARROYO, Miguel Gonzales; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna.


Por uma educação do campo. 5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade: a sociedade brasileira em


transição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras,
2009.

MOREIRA, Ruy. Formação Espacial Brasileira: contribuição crítica aos fundamentos


espaciais da Geografia do Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro: Consequência, 2014.

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STÉDILE, João Pedro (org.). A questão agrária no Brasil: o debate tradicional –1500-
1960. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2005.

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