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APRESENTAÇÃO

Parte 1
1. Identificação do Acórdão- (SLIDE 2 e 3)
O nosso grupo apresenta o Acórdão: Processo nº C-35/20, relativamente
recente, de 6 de outubro de 2021.
O presente acórdão, interpretativo, teve origem por reenvio prejudicial
do Supremo Tribunal de Justiça Finlandês, na sequência a língua do processo é
o Finlandês (é sempre a língua utilizada pelo juiz nacional que submete uma
questão ao Tribunal de Justiça). Estamos perante um caso referente ao direito
dos cidadãos da União de circularem livremente no território dos
Estados-Membros, à obrigação de estar munido de bilhete de identidade ou de
passaporte e ao regime de sanções aplicável em caso de circulação entre
Estados-Membros sem bilhete de identidade ou passaporte.
Este processo está encerrado, o litígio durou de 2016 a 2021 (6 de outubro
de 2021).
As partes intervenientes são A, nacional finlandês e syyttäjä (Ministério
Público, Finlândia).

Mas fazendo um breve enquadramento dos factos em causa:

1. Partes (Slide 3)
Em 25 de agosto de 2015, A, nacional finlandês, efetuou uma viagem de
ida e volta entre a Finlândia e a Estónia a bordo de uma embarcação de recreio.
Tanto o lugar de partida dessa viagem como o de regresso situavam-se na
Finlândia. Durante essa viagem, A atravessou uma zona marítima internacional
situada entre os dois Estados-Membros.
Embora fosse titular de um passaporte finlandês válido, A não estava
munido do mesmo no momento da viagem. Por conseguinte, por ocasião de um
controlo na fronteira efetuado em Helsínquia no momento do seu regresso, A
não pôde apresentar esse passaporte nem nenhum outro documento de viagem.
Todavia, a identidade de A pôde ser determinada com base na carta de
condução de que era portador.

Parte 2
1. Tramitação processual (Slide 4)
O Ministério Público da Finlândia intentou uma ação penal contra A no
Tribunal de Primeira Instância de Helsínquia, por infração pouco grave às regras
em matéria de fronteiras.
Por Decisão de 5 de dezembro de 2016, o Tribunal de Primeira Instância
de Helsínquia declarou que A tinha cometido uma infração ao atravessar a
fronteira finlandesa sem estar munido de um documento de viagem. Todavia,
esse tribunal não aplicou uma pena com o fundamento de que a infração era
pouco grave e que, em caso de condenação no pagamento de uma multa, o
montante desta, calculado segundo o regime penal de multa diária em função do
rendimento mensal médio de A, teria sido excessivo.
O Ministério Público interpôs recurso desta decisão no Tribunal de
Recurso de Helsínquia. Por seu lado, A interpôs recurso subordinado da mesma
decisão.
Por Acórdão de 15 de junho de 2018, o Tribunal de Recurso de
Helsínquia, embora declarando que tinha ficado devidamente demonstrado que
A não estava munido de um documento de viagem aquando da passagem da
fronteira finlandesa, julgou improcedente a acusação. Considerando que os
factos praticados no caso não configuravam uma infração pouco grave às regras
em matéria de fronteiras.
O Ministério Público interpôs recurso desse acórdão para o Supremo
Tribunal, Finlândia, que, por sua vez, considera que o processo deve ser
apreciado na perspetiva do direito da União.

Parte 3
1. Reenvio prejudicial (Slide 5 e 6)
Chegados ao Supremo Tribunal, este estava obrigado a proceder ao reenvio
prejudicial como estamos perante um tribunal cuja decisão é definitiva estamos
perante um reenvio obrigatório. (Nos tribunais de 1ª instância é facultativo o
reenvio).
Neste âmbito o ST, submeteu ao TJUE (art. 267 TFUE), através deste
mecanismo assegura uma interpretação do artigo 21º , nº 1, TFUE, e dos artigos
4º , 5º e 36º da Diretiva 2004/38/CE2 , nunca tendo este último sido objeto de
interpretação pelo Tribunal de Justiça, bem como do anexo VI do Regulamento
(CE) nº 562/2006.
O mecanismo de Contencioso da União Europeia em causa, como já
referido, reenvio prejudicial, uma vez que estamos perante um contencioso de
interpretação.
O Processo de Tramitação Prejudicial Comum inicia-se com o recebimento do pedido de
reenvio prejudicial pela secretaria do Tribunal de Justiça, a qual irá proceder à notificação das
partes no processo principal, de todos os Estados-Membros, da Comissão Europeia (na sua
qualidade de guardiã dos Tratados) e das instituições responsáveis pelo ato a ser interpretado.

Com a sua notificação abre-se a fase escrita, a estes entes notificados é dado um prazo de 2
meses para se pronunciarem através da apresentação de observações escritas. No entanto, a
não apresentação de observações escritas não contenderá com a possibilidade de intervirem
numa fase posterior do processo.
Seguidamente há a possibilidade de existir uma fase oral. Contudo, saliente-se que a regra é a
da dispensabilidade da fase oral. Para que a fase oral se realize terá de ser submetido um pedido
para o efeito, o qual poderá ou não ser atendido pelo Tribunal de Justiça 23.º ETJ.

Isto ocorre porque o Tribunal de Justiça só avançará para a realização da fase oral quando não
congregue ainda todos os elementos necessários para decidir.

Existindo fase oral, serão ouvidos na audiência os seguintes intervenientes:

 Os advogados das partes no processo principal (as partes em si mesmas


não são permitidas a fazer alegações orais)
 Os demais intervenientes notificados aquando da entrada na secretaria
do pedido de reenvio
 O advogado-geral
 Poderão ser ouvidas testemunhas (o que é raro)
 Poderão ser ouvidos peritos (algo comum) (quanto mais técnica é a
decisão, mais incessantemente são chamados os peritos).

O Tribunal de Justiça pode ainda, em qualquer momento, pedir informações adicionais ao


tribunal nacional 101.º RPTJ

PARTE 4
1. Questões prejudiciais (Slide 8 e 9)
Partindo agora para as questões prejudiciais levantadas por uma questão
de facilidade iremos fazer a interligação de cada uma das questões prejudiciais
com o alegado pelo advogado geral nas suas conclusões bem como do acórdão
em análise proferido pelo TJUE.
Convém aqui fazer apenas um apontamento teórico que as conclusões do
advogado-geral não vinculam a decisão do TJUE.

Quanto às questões prejudiciais questiona o STJ ao TJUE:


1. O direito da União, em especial o artigo 4.o , nº 1, da [Diretiva 2004/38], o
artigo 21º do [Regulamento nº 562/2006] ou o direito de livre circulação
dos cidadãos da União no território da União, opõe-se à aplicação de uma
disposição de direito interno que impõe a uma pessoa
(independentemente de esta ser cidadã da União), sob pena de sanções
penais, a obrigação de estar munida de um passaporte ou outro
documento de viagem válido quando essa pessoa viaje numa
embarcação de recreio de um Estado-Membro para outro Estado-
Membro, atravessando uma zona marítima internacional sem entrar no
território de um Estado terceiro?

2. O direito da União, em especial o artigo 5.o , nº 1, da [Diretiva 2004/38], o


artigo 21º do [Regulamento nº 562/2006] ou o direito de livre circulação
dos cidadãos da União no território da União, opõe-se à aplicação de uma
disposição de direito interno que impõe a uma pessoa
(independentemente de esta ser cidadã da União) sob pena de sanções
penais, a obrigação de estar munida de um passaporte ou outro
documento de viagem válido quando essa pessoa chegue, numa
embarcação de recreio, ao território do Estado-Membro em questão,
proveniente de outro Estado-Membro, atravessando uma zona marítima
internacional sem ter entrado no território de um Estado terceiro?

3. Na medida em que não resulte do direito da União nenhum obstáculo na


aceção [da primeira e segunda questões], a sanção de que é
normalmente passível na Finlândia, em conformidade com o regime da
multa por dia, o facto de atravessar a fronteira do Estado finlandês sem
estar munido de um documento de viagem válido é conforme com o
princípio da proporcionalidade estabelecido no artigo 27º, nº 2, da
[Diretiva 2004/38]?

Quanto às questões prejudiciais apresentadas; o advogado-geral MACIEJ


SZPUNAR considera nem a Diretiva 2004/38/CE, relativa ao direito de livre
circulação e de residência dos cidadãos da União e dos membros das suas
famílias no território dos Estados-Membros, nem o Código das Fronteiras
Schengen, conforme alterado pelo Regulamento (UE) 610/2013; se opõem à
aplicação de uma regulamentação de um Estado-Membro que imponha aos
cidadãos da União Europeia, sob pena de sanções penais, a obrigação de
estarem munidos de um documento de viagem válido quando saem do território
de um Estado-Membro a fim de se deslocarem a outro Estado-Membro
atravessando uma zona marítima internacional a bordo de uma embarcação de
recreio.

Refere ainda que o artigo 21º, nº1, TFUE, o artigo 5º, nº 1, da Diretiva 2004/38
e o ponto 3.2.5 do anexo VI do Regulamento 562/2006, conforme alterado pelo
Regulamento nº 610/2013, não se opõem a uma regulamentação de um Estado-
Membro que imponha aos cidadãos da União, sob pena de sanções penais, a
obrigação de estarem munidos de um documento de viagem válido quando
regressem a esse Estado-Membro atravessando uma zona marítima
internacional a bordo de uma embarcação de recreio.

Por fim, acrescenta que o artigo 21º , nº 1, TFUE e o artigo 36º da Diretiva
2004/38 devem ser interpretados no sentido de que os requisitos de efetividade
e de proporcionalidade das sanções, previstos nesta última disposição, se
opõem a um regime da multa por dia, como o que está em causa no processo
principal, aplicável em caso de incumprimento da obrigação de estar munido de
um documento de viagem válido no momento da passagem da fronteira, na
medida em que esse regime prevê, para uma infração menor, uma multa que
ascende a 20 % do rendimento mensal médio do infrator.

PARTE 5
1. Questões prejudiciais (Slide 9 e 10)
O TJUE foi também do entendimento do advogado-geral e respondeu que
efetivamente a Diretiva 2004/38, Regulamento 562/2006 e o artigo 21º , nº 1,
TFUE, devem ser interpretados no sentido de que não se opõe a uma
regulamentação nacional pela qual um Estado-Membro obriga, sob pena de
sanções penais, os seus nacionais a estarem munidos de um bilhete de
identidade ou de um passaporte válido quando efetuam, independentemente do
meio de transporte e do itinerário, uma viagem para outro Estado-Membro, desde
que as modalidades dessas sanções sejam conformes com os princípios gerais
do direito da União, incluindo os princípios da proporcionalidade e da não
discriminação.
Também não se opõe a uma regulamentação nacional pela qual um
Estado-Membro obriga, sob pena de sanções penais, os seus nacionais a
estarem munidos de um bilhete de identidade ou de um passaporte válido
quando entrem no seu território provenientes de outro Estado-Membro, desde
que esta obrigação não condicione o direito de entrada e que as modalidades
das sanções previstas em caso de violação da referida obrigação sejam
conformes com os princípios gerais do direito da União, incluindo os princípios
da proporcionalidade e da não discriminação. Uma viagem para o
Estado-Membro em causa a partir de outro Estado-Membro efetuada a bordo de
uma embarcação de recreio e que atravesse uma zona marítima internacional
figura, entre um dos casos em que a apresentação de tal documento pode ser
exigida.
E, finalmente, referiu que o artigo 21º , nº 1, TFUE e os artigos 4º e 36º da
Diretiva 2004/38, lidos à luz do artigo 49º , nº 3, da Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, devem ser interpretados no sentido de que se
opõem a um regime de sanções penais pelo qual um Estado-Membro torna a
passagem da sua fronteira nacional sem bilhete de identidade ou passaporte
válido passível de multa que pode, a título indicativo, ascender a 20 % do
rendimento mensal líquido do infrator, uma vez que essa multa não é
proporcionada à gravidade dessa infração, sendo esta considerada uma infração
pouco grave.

PARTE 6
1. Conclusão (Slide 11)

Por força do acórdão Bosch de 1962 o reenvio prejudicial configura-se como um


verdadeiro incidente processual, que vai determinar que o processo nacional se
considere suspenso, conforme já referimos, até que o acórdão do Tribunal de
Justiça seja notificado ao tribunal nacional. Por sua vez, o acórdão de
interpretação vai obrigar o tribunal nacional, no caso em apreço o ST Finlandês
a seguir a interpretação que foi dada pelo TJUE.
O reenvio prejudicial garante a tutela jurisdicional efetiva dos direitos dos
particulares e dá todas as indicações ao juiz nacional, para aferir da
compatibilidade do direito nacional com o direto da EU.

O Acórdão em análise versa sobre um Reenvio de Interpretação, que tem em


vista obter do TJUE o sentido material das disposições em causa, ou seja, visa
determinar o sentido e o alcance da disposição europeia, quer esta seja de
direito originário, quer seja de direito derivado.

Os reenvios de interpretação só serão obrigatórios, quando da decisão


nacional, não couber recurso para outra instância nacional, ou seja, será
obrigatório quando a instância que decide o caso em concreto atuar na qualidade
última instância, que é o caso no presente Acórdão. Nas demais situações o
reenvio de interpretação é facultativo.

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