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BARROCO

O termo barroco denomina genericamente todas as manifestações


artísticas dos anos 1600 e
início dos anos 1700. Além da literatura, estende-se à música, pintura,
escultura e arquitetura da época.
A origem da palavra barroco é controversa. Alguns etimologistas
afirmam que está ligada a um processo relativo à memória que designava um
silogismo aristotélico com conclusão falsa. Segundo outros, designaria um tipo
de pérola de forma irregular, ou mesmo um terreno desigual, assimétrico.
Qualquer que seja a hipótese aceita é possível perceber que há relações
com a estética barroca: jogo de ideias, rebuscamento e assimetria.
O Barroco, também chamado de Seiscentismo, tem seu início em 1580,
com a unificação da Península Ibérica, o que acarretou um forte domínio
espanhol em todas as atividades; daí o nome escola Espanhola, também dado
ao Barroco lusitano. O Seiscentismo se estenderá até 1756, com a fundação
da Arcádia Lusitana, já em pleno governo do Marquês de Pombal, aberto aos
novos ares da ideologia liberal burguesa iluminista, que caracteriza a segunda
metade do século XVIII.

Contexto histórico-social

Se o início do século XVI, notadamente seus primeiros 25 anos, pode


ser considerado o período áureo de Portugal, não é menos verdade que os 25
últimos anos desse mesmo século podem ser considerados o período mais
negro de sua história.
O comércio e a expansão do império ultramarino levaram Portugal a
conhecer uma grandeza aparente. Ao mesmo tempo que Lisboa era
considerada a capital mundial da pimenta, a agricultura lusa era abandonada.
As colônias, principalmente o Brasil, não deram a Portugal riquezas imediatas;
com a decadência do comércio das especiarias orientais observa-se o declínio
da economia portuguesa. Paralelamente, Portugal vive uma crise dinástica: em
1578, levando adiante o sonho de transformar Portugal novamente em um
grande Império, D. Sebastião desaparece em Alcácer-Quibir, na África; dois
anos depois, Filipe II da Espanha consolida a unificação da Península Ibérica –
tal situação permaneceria até 1640, quando ocorre a Restauração (Portugal
recupera sua autonomia).
A perda da autonomia e o desaparecimento de D. Sebastião originam
em Portugal o mito do sebastianismo. O mais ilustre sebastianista foi padre
Antônio Vieira, que aproveitou a encrenca surgida na “trovas” de um sapateiro
chamado Gonçalo Anes Bandarra.
A unificação da Península veio favorecer a luta conduzida pela
Companhia de Jesus em nome da contrarreforma: o ensino passa a ser quase
um monopólio dos jesuítas e a censura eclesiástica torna-se um obstáculo a
qualquer avanço no campo científico-cultural.
O estilo barroco nasceu da crise de valores renascentistas ocasionada
pelas lutas religiosas e pela crise econômica, vivida em consequência da
falência do comércio com o Oriente.
O homem seiscentista vivia um estado de tensão e desequilíbrio, do qual
tentou evadir-se pelo culto exagerado da forma, utilizando-se de figuras, como
a metáfora, a antítese e a hipérbole.
O rebuscamento presente na arte barroca é reflexo do dilema, do
conflito entre o terreno e o celestial, o homem e Deus (antropocentrismo e
teocentrismo), o pecado e o perdão, a religiosidade medieval, o material e o
espiritual, que tanto atormenta o homem do século XVII.
Notam-se dois estilos no barroco literário: O cultismo e o conceptismo.
Cultismo: é caracterizado pela linguagem rebuscada, culta,
extravagante; pela valorização dos detalhes mediante jogos de palavras, com
visível influência do poeta espanhol Luís de Gôngora; daí o estilo ser também
conhecido por Gongorismo.
Conceptismo: é marcado pelo jogo de ideias, de conceitos, seguindo
um raciocínio lógico, racionalista, que utiliza uma retórica aprimorada. Um dos
principais cultores do conceptismo foi o espanhol Quevedo, do qual deriva o
termo Quevedismo.
A tendência de conciliar as visões opostas entre teocentrismo e
antropocentrismo toma o Barroco um movimento dualista, caracterizado,
principalmente, pelas oposições.
A literatura barroca caracteriza-se pela eterna existência das
contradições geradas pelo espírito cristão e pelo espírito renascentista. Por
isso, o Barroco literário é, ao mesmo tempo, místico e sensual, religioso e
erótico, espiritual e carnal. Esse eixo dualista aparece em todas as
manifestações barrocas.
Devido à indefinição entre o divino e o terreno, a literatura barroca traduz
os conflitos e o descontentamento do homem em face de sua existência. São
comuns os temas pessimistas, a advertência sobre a brevidade da vida, a
ênfase na dor e na vergonha. E o pessimismo em relação à vida terrena,
amenizado com a crença na vida celeste. É comum o tema da penitência, em
que se enfatiza o martírio da dor.
Há uma confrontação brusca entre temas opostos: o amor e a dor; a
vida e a morte, a juventude e a velhice, a obscenidade e o refinamento. Nas
artes visuais, esse confronto se traduz em choque de cores, exageros de
relevos.
No Barroco, enfatiza-se a constante mudança das coisas no mundo, a
face efêmera das coisas. Nesse sentido, o mundo é visto como algo finito,
estando intimamente ligado a essa ênfase sobre a brevidade das coisas.

Padre Antônio Vieira

Vieira nasceu em Lisboa, em 1608. Com sete anos vem para a Bahia;
em 1623 entra para a Companhia de Jesus. Após a Restauração (1640),
movimento pelo qual Portugal liberta-se do domínio espanhol, retorna à terra
natal, saudando o rei D. João IV, de quem se tomaria confessor. Politicamente,
Vieira tinha contra si a pequena burguesia cristã, por defender o capitalismo
judaico e os cristãos-novos; os pequenos comerciantes, por defender os índios.
Essas posições, principalmente a defesa dos cristãos-novos, custam a Vieira
uma condenação pela inquisição: fica preso de 1665 a 1667. Falece em 1697,
no colégio da Bahia.

A obra de Vieira pode ser dividida em: profecias, cartas e sermões.


Profecias

Constam de três obras: História do Futuro, Esperanças de Portugal e


Clavis Prophetarum, em que se notam o Sebastianismo, e as esperanças de
Portugal se tornar o Quinto Império do Mundo, pois tal fato estaria escrito na
Bíblia. Isso demonstra seu estilo alegórico de interpretação bíblica, um
nacionalismo exacerbado e uma servidão incomum, própria dos jesuítas.

Cartas

São cerca de quinhentas cartas, que versam sobre o relacionamento


entre Portugal e Holanda, sobre a Inquisição e os cristãos-novos, e sobre a
situação da Colônia. Constituem importantes documentos históricos.

Sermões

São quase duzentos sermões, os melhores da obra de Vieira. De estilo


barroco conceptista, totalmente oposto ao Gongorismo, o pregador português
joga com as ideias e os conceitos, de acordo com os ensinamentos da retórica
dos jesuítas. Segundo alguns críticos, Vieira seria conceptista pelo processo
mental e seria clássico pela expressão, clara e singela; contraria, portanto, a
moda cultista. Os sermões do Padre Antônio Vieira dividiam-se em três partes
distintas:
-Intróito ou exórdio: a parte inicial, de apresentação.
-Desenvolvimento ou argumento: a defesa de uma ideia com base em
argumentação.
-Peroração: a parte final do sermão.

ARCADISMO

No século XVIII, manifestam-se várias tendências ideológicas e estéticas


que dificultam uma cômoda definição do estilo da época. Segue-se ao Barroco
um período de difusão do racionalismo e de valorização da concepção
científica do mundo. Prega-se uma revolução baseada no progresso do
conhecimento humano. É a época dos expoentes de uma sociedade voltada
para a precisão e para a
máquina, e que acredita na melhoria da vida social graças à divulgação
do saber. A essa tendência denomina-se Iluminismo (cabendo ao termo
Neoclassicismo designar a imitação dos clássicos como Virgílio, Teócrito,
Horácio – contrapostos à exuberância barroca) (CADERMATORI, 1985).
A palavra “Arcádia”, raiz de Arcadismo, é de origem grega e designa
uma sociedade literária, típica da última fase do Classicismo, cujos membros
adotam pseudônimos pastoris em homenagem à vida simples dos pastores, em
comunhão com a natureza.
Com a fundação da Arcádia Lusitana, em 1756, iniciou-se uma nova
etapa literária em Portugal, caracterizada pela rebeldia contra o Barroco. Sua
divisa inutilia truncat atestava o desejo de repúdio às coisas inúteis,
característica marcante da poesia barroca.

NEOCLASSICISMO

Seguindo o exemplo da Arcádia Romana, os poetas árcades elegeram


como ideias as condições de criação que supunha ser as dos poetas pastores
que habitavam a legendária Arcádia, região da Grécia antiga, que representava
um verdadeiro paraíso, onde todos se dedicavam a uma vida simples. São,
portanto, neoclássicos na busca da espontaneidade e da simplicidade.

Pseudônimos pastoris

Fingir que eram pastores foi a saída encontrada pelos árcades para
realizarem (na imaginação) o ideal da mediocridade dourada, ou seja, a
louvação à vida equilibrada, espontânea, pobre, em contato com a natureza.

Carpe Diem
Aproveitar o dia, viver o momento presente com grande intensidade, foi
uma atitude assumida pelos poetas-pastores, que guardavam a forte noção de
que o tempo não para, portanto deve ser vivenciado plenamente.

Fugere Urbem

A base material do progresso dava-se nas cidades. Mudava o mundo,


modernizavam-se as cidades e, consequentemente, redobravam os problemas
dos conglomerados urbanos. A natureza acenava com a ordem nos prados e
nos campos. Os indivíduos resgatavam sentimentos corroídos pelo progresso.
Os árcades buscavam vidas simples, bucólicas, longe dos agitos.

NOVA ARCÁDIA

Em 1790 foi fundada a Academia de Belas Artes, logo depois de


denominada Nova Arcádia. Esta, três anos mais tarde, publicava algumas
obras poéticas de seus sócios sob o título Almanaque das Musas. Os membros
mais importantes dessa associação foram o brasileiro Domingos Caldas
Barbosa, famoso nos ambientes aristocráticos por sua obra lírica, o poeta
satírico padre Agostinho de Macedo e o poeta lírico e satírico Bocage.

Manuel Maria Barbosa Du Bocage

Órfão de mãe aos dez anos, viveu com parentes até os dezesseis,
quando fugiu de casa e tornou-se soldado no Regimento de Infantaria em
Setúbal. Em 1783 mudou-se para Lisboa, entrando para a Armada Real
Portuguesa.
A vida boêmia e uma prisão aproximam-no da vida tumultuada de
Camões. Sua obra Rimas, de 1791, valeu-lhe o convite para a Nova Arcádia,
onde usava o pseudônimo Elmano Sadino (Elmano e o anagrama de Manuel;
Sadino em homenagem ao rio Sado, que passa pela terra natal do poeta).
Em 1799 publicou a segunda série das rimas; em 1804 dedicou a
terceira série à marquesa de Alorna, que passou a protegê-lo. Com a saúde
debilitada e uma vida desregrada faleceu no ano de 1805.
Obras: Idílios marítimos, Rimas, Parnaso bocagiano.

Sonetos

Os sonetos de Bocage constituem o ponto alto de sua produção,


comparável a de Camões.
Há momentos em que o lirismo de Bocage revela a orientação do
academicismo do século XVIII: a presença dos pseudônimos pastoris da
mitologia, a ânsia pelo lócus amoenus, que simboliza a fuga para a vida
citadina.
No entanto, a solidão, a desilusão amorosa, o sentimento de desamparo
e a dor de viver contribuíram de tal maneira à sua poesia que ela acabou se
afastando da estética árcade – racional e pouco dramática – para se enveredar
no campo dramático e confessional, que inseriu Bocage em um contexto pré-
romântico.
Leia dois dos seus sonetos:

Meu ser evaporei na lida insana


Do tropel paixões, que me arrastava;
Ah! Cego eu cria, ah, mísero eu sonhava Em mim quase imortal a
essência humana.
De que inúmeros sóis a mente ufana Existência falaz me não doirava!
Mas eis sucumbe a Natureza escrava Ao mal que a vida em sua origem
dana.

Prazeres, sócios meus e meus tiranos! Esta alma, que sedenta em si


não coube, No abismo vos sumiu dos desenganos.

Deus, Oh Deus!... Quando a morte a luz me roube, Ganhe um momento


o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver não soube.

Olha, Marília, as flautas dos pastores,


Que bem que soam, como estão cadentes! Olha o Tejo a sorrir-se! Olha:
não sentes Os Zéfiros brincar por entre as flores?

Vê com ah, beijando-se, Os Amores Incitam nossos ósculos ardentes!


Ei-las de planta em planta as inocentes, As vagas borboletas de mil
cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira; Ora nas folhas a abelhinha para.


Ora nos ares, sussurrando, gira.

Que alegre campo! Que manhã tão clara! Mas ah! Tudo o que vês, se eu
não te vira, Mais tristeza que a morte me causara.

Destacam-se em Bocage dois tipos: o lírico e o satírico.

Quando se fala no Bocage lírico, o Arcadismo interessa apenas


enquanto postula, aparência, pois no fundo o poeta foi um pré-romântico.
Bocage guardou do Neoclassicismo o apuro formal (excelente sonetista), certo
gosto pelo Renascimento, o bucolismo, a postura pastoril. Como poeta pré-
romântico, Bocage é marcado pela luta entre a Razão e o Sentimento, a
cabeça e o coração.
Ao valorizar o sentimento, compõe uma poesia de caráter confessional,
marcada por profundo sofrimento, pelo ciúme, pelo abandono, gerando um
gosto pelo noturno, por formas macabras, e tendo a morte como única solução
para seus problemas, antecipando assim o ultrarromantismo:

Ah! Não me roubou tudo a negra sorte:


Inda tenho este abrigo, inda me resta. O pranto, a queixa, a solidão e a
morte.
Ou ainda:

Ó retrato da Morte, ó Morte amiga Por cuja escuridão suspiro a tanto!

Neste soneto, nota-se o subjetivismo, a confidência da vida interior, mas


não são somente os temas das obras de Bocage, preocupam-se também as
questões que agitaram o século XVIII; em vários poemas percebemos o ideário
iluminista com a defesa das liberdades e das conquistas burguesas.

Aspirações do liberalismo, excitadas pela Revolução Francesa e


consolidação da República em 1797.

Liberdade, onde estás? Quem te demora?


Quem te faz que o teu influxo em nós não caia? Porque (triste de mim)
porque não raia
Já na esfera de Lísia a tua aurora? Da santa redenção é vinda a hora
A esta parte do mundo, que descaia. Despotismo feroz, que nos devora!

Eia! Acode ao mortal que, frio e mudo, Oculta o pátrio amor, torce a
vontade.
E em fingir, por temor, empenha estudo.

Meu fim demando ao Céu, pela certeza


De que só terei paz na sepultura.

Modelo meu tu és... Mas, oh tristeza!... Se te imito nos transes da


ventura, Não te imito nos dons da Natureza.

Camões e Bocage. Neste soneto o poeta faz o paralelo das suas vidas.
Na realidade podemos encontrar nelas uma curiosa semelhança: gênio,
infortúnio e miséria. Foram soldados, entraram numa batalha, tiveram nos seus
amores uma Natércia. Sofreram por muito amar. Foram à Índia, a Macau,
conheceram a prisão e o terrível Adamastor. Sofreram um naufrágio, salvaram
a nado os seus versos. Também paralelos podemos encontrar os dois maiores
poetas quanto à sua morte. (AMARAL, 1965, pag.150)

O ROMANTISMO

O Romantismo é o primeiro período literário da chamada Era Romântica


ou Moderna (a literatura portuguesa). Nessa era se
incluem também os movimentos literários que o sucederam até os
nossos dias. Perceba, pois, que o Romantismo representa uma ruptura
bastante sensível entre diferentes momentos da literatura. Essa ruptura não é
de maneira alguma exclusiva da literatura e da arte, mas abrange formas de
pensar e agir, a vida humana como um todo.
Na base dessas transformações sociais se encontram a ascensão das
classes burguesas e o progresso técnico e contemporâneo dela. Assumindo o
controle político e econômico da sociedade, as camadas burguesas
redesenham o sistema de valores vigentes, em detrimento dos privilégios até
em poder da nobreza e do clero.
Palavras como romantismo e romântico apresentam atualmente uma
diversidade de significados que pode produzir erros de interpretação. São
empregadas cotidianamente para denominar o modo de ser e o indivíduo
“sonhador; fantasioso”, “sentimental”, “apaixonado” ou exagerado, “apelativo”.
É importante perceber que não é esse o sentido com que as usamos quando
nos referimos ao movimento literário que estudaremos. O modo de ser
romântico da literatura é mais complexo e contraditório; além disso, está
relacionado com determinada maneira de se sentir e agir própria das condições
históricas do final do século XVIII e da primeira metade do XIX.
Para compreender o sentido do termo Romantismo nos estudos de
literatura, é necessário investigar suas origens. A palavra romance foi
primeiramente utilizada para nomear as formas de língua que sucederam ao
latim e que originaram as línguas neolatinas. Passou, depois, a designar as
novelas de cavalaria e na cultura medieval. Como veremos, a valorização da
Idade Média foi uma das constantes do Romantismo. Em pouco tempo,
Romantismo passou a denominar o conjunto do movimento literário e artístico
que se manifestou no final do século XVIII e início do século XIX, e a palavra
“romântica”, a ser utilizada para indicar valores estéticos opostos aos das
formas clássicas.
Resumindo, Romantismo designa-se um período literário específico.
“Escritor romântico” e “obra romântica” são expressões ligadas a esse período
literário, e não ao sentido cotidiano da palavra.
Em Portugal, o período romântico pode ser dividido em três momentos
principais: o de sua implantação e consolidação, em que se destacam as
figuras de Almeida Garrett e Alexandre Herculano; e o de sua exacerbação e
dissolução, seja na forma do ultrarromantismo, seja no trabalho de Camilo
Castelo Branco, João de Deus e Júlio Dinis, em que já surgem elementos do
Realismo e do Naturalismo. Como veremos, esses autores produziram poesia,
teatro e principalmente prosa de ficção.

Almeida Garrett

João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett nasceu no Porto, em


1799, e faleceu em Lisboa, em 1854. Teve vida muito movimentada, refletindo
o próprio período agitado da história portuguesa em que viveu. Em 1809, foi
com a família para os Açores, a fim de fugir das invasões napoleônicas; lá, foi
educado por um tio que era escritor árcade. Posteriormente, estudou direito em
Coimbra. Em 1825, teve de exilar-se na Inglaterra, onde entrou em contato com
a obra dos românticos ingleses, principalmente Walter Scott e Byron. Daí
passou para a França, onde publicou, mas teve de voltar ao exílio em 1828. Só
voltou ao seu país em 1832, durante o desembarque das tropas liberais que
tomaram o Porto. Com a vitória liberal, passou a ocupar cargos e funções
públicas, dentre as quais se destacam as atividades pela restauração do teatro
português. Foi deputado por várias vezes, chegando a ser ministro dos
Estrangeiros. Recebeu o título de Visconde.
A obra de Almeida Garrett inclui manifestações muito diversas. Escreveu
poesia de feição árcade e romântica: O retrato de Vênus, Camões, D. Branca,
Lírica de João Mínimo, Flores sem fruto, Folhas Caídas. Em prosa, escreveu o
romance histórico O Arco de Sant’Ana e a narrativa Viagens na Minha Terra,
deixando inacabado o romance Helena. No teatro, produziu tragédias de feição
clássica e dramas históricos, dentre os quais sobressaem um Auto de Gil
Vicente, D. Filipa de Vilhena, O Alfageme de Santarém, A Sobrinha do
Marques e Frei Luís de Sousa. Garrett deixou ainda, escritos jornalísticos,
políticos e pedagógicos, ensaios literários e discursos parlamentares. É
considerado o introdutor do Romantismo em Portugal.
A seguir analisaremos o poema do Livro Folhas Caídas:

Os cinco sentidos
São belas – bem o sei essas estrelas, Mil cores – divinas têm essas
flores;
Mas eu não tenho, amor, olhos para elas: Em toda a natureza
Não vejo outra beleza Senão a ti – a ti!

Divina – ai! Sim, será a voz que afina Saudosa – na ramagem densa,
umbrosa, Será; mas eu do rouxinol que trina
Não ouço a melodia, Nem sinto outra harmonia Senão a ti – a ti!

Respira – n’aura que entre as flores gira, Celeste – incenso de perfume


agreste Sei... não sinto: minha alma não aspira, Não percebe, não toma
Senão o doce aroma Que vem de ti – de ti!
Formosos – são os pomos saborosos, E Um mimo – de néctar o racimo:
E eu tenho fome e sede... sequiosos, Famintos meus desejos
Estão... mas é de beijos, E só de ti – de ti!

Macia – deve a relva luzidia


Do leito – ser por certo em que me deito. Mas quem, ao pé de ti, quem
poderia Sentir outras carícias,
Tocar noutras delícias Senão em ti – em ti!
A ti! Ai, a ti só os meus sentidos Todos num confundidos, Sentem,
ouvem, respiram;
Em ti, por ti deliram. Em ti a minha sorte, A minha vida em ti;
E quando venha a morte, Será morrer por ti.
GARRETT, Almeida. Folhas Caídas. Lisboa: Portugalia, 1969. p. 55-6.

Cada uma das cinco estrofes do poema concentra-se em um dos cinco


sentidos. O sujeito lírico repete um mesmo esquema: nega-se a experimentar
as sensações que a natureza lhe oferece, pois deseja concentrar-se nas que
nascem do ser amado. Essa exploração sensorial do amor começa pela visão,
pela audição e pelo olfato, sentidos que podem ser sensibilizados sem contato
físico, e se encaminha para o paladar e o tato – sentidos cuja sensibilização
não pode prescindir desse contato. Caminha-se, assim, para uma realização
concreta e física do amor, sugerida fortemente pelo erotismo de imagens como
“pombos saborosos” que se levam à boca, “famintos meus desejos” e pela
clareza de imagens como “sentir outras carícias” e “tocar noutras delícias”. A
estrofe final demonstra que todas as sensações despertadas pela fruição da
pessoa amada se combinam num delírio único, verdadeiro êxtase sensorial e
sensual.
Há um arrebatamento passional no texto que é claramente romântico.
Lembre-se de que a poesia romântica buscava a expressão de uma
personalidade, sendo valorizada justamente pelo grau de autenticidade que
conseguia transmitir. O sujeito lírico nos contamina com sua paixão, que
assoma como verdadeira e irresistível. A real idade é experimentada por meio
da emoção e dos sentimentos, e o texto produzido não deixa transparecer as
marcas de sua elaboração, comunicando-nos uma forte impressão de
espontaneidade.
A linguagem é simples, beirando a coloquialidade. Os ornamentos
típicos da convenção poética arcádica não aparecem. Pode-se notar certo tom
de fala espontânea, marcado pela abundância de pausas e reticências, que
sugerem alguém a falar consigo mesmo em voz alta. A aparente simplicidade
da linguagem poética de Garrett é, contudo, construída: o texto apresenta um
tecido sonoro trabalhado, quer pela alternância rítmica dos decassílabos e
hexassílabos, quer pelo jogo de rimas, que são também intensas nos dois
primeiros versos de cada uma das cinco estrofes iniciais. O verso “Se não a ti –
a ti!” não rima com nenhum outro das cinco estrofes, o que o destaca aos
nossos ouvidos.

Frei Luís de Sousa

Essa peça é considerada a melhor de Garrett e a obra-prima do teatro


romântico português. Seu enredo baseia-se na vida de Manuel de Sousa
Coutinho (c. 1555-1632), cavaleiro que, depois de um período de cativeiro em
Argel, voltou a Portugal, onde se casou com D. Madalena de Vilhena, viúva de
outro cavaleiro, D. João de Portugal, desaparecido na batalha de Acacer-Quibir
(a mesma em que desapareceu D. Sebastião). Após mais de vinte anos de
casamento e a perda da única filha, D. Manuel e D. Madalena resolveram
ingressar na vida monástica. D. Manuel tornou-se o dominicano Frei Luís de
Sousa, que veio a ser um grande prosador. A separação de D. Manuel e D.
Madalena sempre foi motivo de indagações.
Para transformar esses fatos em trama dramática, Garrett não se
preocupou com o rigor histórico, modificando alguns dados a fim de alcançar
seus objetivos teatrais. A trama é simples, reforçando-se o caráter trágico: o
casamento de C. Manuel e D. Madalena chega ao fim quando D. João de
Portugal ressurge após um longo período de desaparecimento. A filha do casal,
D. Maria, criança inteligente e sensível, morre pouco antes de os pais
professarem.
Esse conflito entre a busca individual de satisfação e os obstáculos
sociais e o tema de caráter nacional são dois dos ingredientes românticos da
peça. No mais, Frei Luís de Sousa aproxima-se muito de uma tragédia
clássica: a ação é sintética, os personagens são poucos e nobres, e a peça
parece apresentar aos espectadores a situação daqueles que brevemente
serão destruídos por um destino austero.
Há críticos que veem em Frei Luís de Sousa questões autobiográficas:
Garret teve uma filha ilegítima, o que o teria levado a criar a personagem de
Maria por quem a plateia sentia forte simpatia e compaixão. Também se
apontam relações com o momento histórico português: Maria, símbolo de um
Portugal novo – o que saia da Revolução Liberal -, não conseguia viver por
causa da persistência de um velho Portugal conservador, personificado em D.
João de Portugal (cuja possível reaparição é relacionada no próprio texto com
o Sebastianismo). Independentemente dessas interpretações e de outras que
sem dúvida proporcionam a peça apresentada méritos indiscutíveis pela
eficiência de sua simplicidade trágica.

Alexandre Herculano

Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo nasceu em Lisboa em 1810 e


faleceu nas proximidades de Santarém, em 1877. De família modesta, não
pode fazer estudos universitários: foi um autodidata. Exilou-se em 1831,
fugindo da perseguição dos absolutistas. No ano seguinte participou da tomada
do porto pelos liberais (juntamente com Garrett). Durante sete anos foi diretor
do Panorama, revista de caráter artístico e científico na qual publicou várias de
suas obras. Dedicou-se seriamente à atividade de historiador, pesquisando e
coletando documentos por todo o país.
Herculano foi o responsável pela introdução e pelo desenvolvimento da
narrativa histórica em Portugal. Publicou as Lendas e Narrativas, conjunto de
contos e novelas predominantemente dedicados a temas históricos. Escreveu
poesia (A voz do profeta. A harpa do crente, Poesias) e uma vasta obra
historiográfica, que inclui quatro volumes da História de Portugal, também a
História da Origem e estabelecimento da Inquisição em Portugal.
Destacam-se em suas obras literárias seus textos em prosa, dedicados
principalmente ao gênero conhecido como narrativa histórica. Esse tipo de
narrativa combina a erudição do historiador, necessária para a minuciosa
reconstituição de ambientes e costumes de épocas passadas, com a
imaginação do literato, que cria e amplia tramas para compor seus enredos.
Sua narrativa de caráter histórico foi desenvolvida inicialmente por
Walter Scott (1771 – 1832), poeta e novelista escocês que escreveu A Balada
do Último Menestrel e Ivanhoé, entre outros trabalhos. Também o francês Vitor
Hugo (1802- 1885) serviu de modelo a Herculano: Vitor Hugo escreveu o
romance histórico Nossa Senhora de Paris, em que surge o famoso “Corcunda
de Notre-Dame”. A partir desses modelos, desenvolveu-se a narrativa histórica
de Herculano, que pode ser considerada ponto inicial para o desenvolvimento
da prosa de ficção em Portugal.

Camilo Castelo Branco

Camilo Castelo Branco nasceu em 1825 em Lisboa. Suicidou-se em


1890, em San Miguel de Seide. Filho de uma união ilegítima, ficou órfão muito
cedo, sendo criado por uma tia. Na juventude, levou vida boêmia e teve várias
ligações amorosas. Em 1859, sua amante Ana Plácido abandonou o marido
para viver com ele; ambos foram presos por crime de adultério. Em 1866, já
morto o marido de Ana Plácido, o casal se estabeleceu em San Miguel de
Seide. Camilo passou a sustentar a família com seu trabalho, desenvolvendo
uma atividade profissional intensa. Matou-se ao saber que a cegueira que o
acometia era incurável.
Escreveu aproximadamente trezentos títulos. Na prosa de ficção, em
que produziu novelas passionais, textos satíricos, romances históricos,
narrativas curtas.
Todo o imenso corpo da obra de Camilo Castelo Branco deve-se
destacar seu trabalho de ficcionista, expresso numa grande quantidade de
contos, novelas e romances. Suas primeiras obras falam de galãs de boa
índole que, corrompidos pelo espaço urbano, são aprisionados por um amor
infeliz, de desfecho trágico. Esse amor infeliz e trágico faz parte do esquema
básico da chamada novela passional, em que o sentimento se transforma
numa verdadeira devoção, capaz de levar os amantes a sacrifícios imensos
diante de uma sociedade dominada por interesses materiais.
Camilo depurou a novela passional, conseguindo obter textos de
elevada intensidade dramática, com um ritmo narrativo bastante ágil. A essas
qualidades somam-se as de atento observador das condições sociais
contemporâneas. A obra- prima da novela passional camiliana é Amor de
Perdição.

Júlio Dinis

Júlio Dinis é o pseudônimo de Joaquim Guilherme Gomes Coelho,


nascido no Porto em 1839 e falecido na mesma cidade em 1871. Formou-se
em medicina, mas a saúde frágil impediu-o de assumir o cargo de professor
universitário, levando- o a diversos tratamentos no campo. Morreu de
tuberculose.
Sua obra inclui poesia, teatro, prosa de ficção e textos jornalísticos.
Merecem destaque os contos reunidos em Serões da província e
principalmente os quatro romances: As pupilas do Senhor Reitor, Uma família
inglesa, A Morgadinha dos Canaviais e Os Fidalgos da Casa Mourisca.

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