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13 de Maio de 2020

Desmaterialização de títulos de crédito face o princípio da


cartularidade

A desmaterialização de títulos de crédito ao passo que tem sido um assunto


bastante presente quando se trata dos títulos de crédito, tem se tornado não
só uma pauta, mas uma realidade, haja vista que não há mais como
desvincular o direito e seus institutos dos avanços tecnológicos, uma vez
que o casamento entre a tecnologia e o direito tem rendido resultados
bastantes positivos, pragmáticos e eficientes.

Antes de poder adentrar no cerne do assunto, é mister que se saiba o que se


trata um título de crédito. Segundo Gladston Mamede (2009), título de
crédito é um documento necessário ao exercício do direito literal e
autônomo nele contido, no qual só se produz efeitos se preencher os
requisitos legais, ou seja, para que se configure um título de crédito é
preciso que este esteja tipificado em lei. Mamede defende ainda que os
títulos de crédito não apenas provam um direito, eles o representam, pois
são documentos necessários ao exercício do direito neles anotados.

Assim como muitos institutos, o Direito não fica de fora da dinâmica dos
dias modernos, em que a tecnologia evolutiva que ocorre no meio da
informatização tem se tornado um recurso necessário, sendo praticamente
impossível a não incorporação das nossas leis a essa realidade. Podemos
tomar como exemplo os títulos de crédito, que em plena era virtual, aderiu
a necessidade de se adequar aos novos moldes virtuais, não sendo mais
representado somente pelo defasado modelo de título de crédito
incorporado ao papel.
/
Assim como muitos instrumentos do meio jurídico, os títulos de créditos
são norteados por alguns princípios e dentre estes se encontra o princípio
da cartularidade[1] o qual segundo Oliveira (2014) defende que o crédito
deve estar materializado em um documento (título), a fim de que se
comprove sua existência, sendo o crédito inexigível na ausência deste
documento. Com base nesse princípio podemos nos questionar: Como
então defender uma desmaterialização dos títulos de crédito, se um dos
seus princípios caracteriza como necessário um documento palpável a fim
de se comprovar o crédito?

É importante salientar que o princípio da cartularidade traz uma bagagem


histórica do tempo em que não havendo recursos tecnológicos, tampouco a
dinâmica da globalização, a forma para se comprovar um crédito era
através de um documento físico, simplesmente por não haver outro recurso
que fosse eficaz e ao mesmo tempo seguro para possibilitar essa
comprovação, diferente dos últimos anos, em que há uma necessidade de
adaptação dos títulos a realidade globalizada e tecnológica.

Para Dutra e Lemos (2013, p.164) a “desmaterialização ou a inexistência da


cártula não descaracteriza o título de crédito”, ideia que é fortalecida
quando compreendemos que com os avanços tecnológicos vem
acompanhada a necessidade de se repensar acerca da cartularidade. Um
exemplo vistoso dessa pauta são os cartões de banco com tarja magnética,
que permitem a retirada de dinheiro da conta corrente bancária em
substituição ao cheque.

Por mais que a função do princípio da cartularidade exista para que haja
um zelo pela segurança das operações que careçam da comprovação dos
créditos, este princípio vem perdendo o seu espaço, pois, na era em que
vivemos, os novos recursos tecnológicos permitem que a informação acerca
do titular do crédito esteja sempre atualizada, além de permitir que as
informações para a efetuação de transações sejam transmitidas de forma
bem mais prática, eficiente e veloz.

Em suma, pode-se dizer que por mais contestável que seja quando posta em
contraponto ao princípio da cartularidade, a desmaterialização de títulos de
crédito não surgiu no intuito de descaracterizar o princípio, mas assim

/
como muitos institutos do direito, veio como um fruto de uma evolução
natural da era da tecnologia e digitalização da informação.

Não existe mais a possibilidade de se planejar recursos e mudanças que


afetem o meio jurídico sem se considerar a utilização da tecnologia, uma
vez que o fenômeno da informatização propõe tornar o direito mais prático,
seguro e eficiente, ou seja, por mais que o princípio da cartularidade
defenda meios “palpáveis” para que haja a comprovação do crédito, há de
se considerar que os títulos de créditos transcritos em documentos
surgiram em uma época em que não havia nenhum método mais seguro e
eficaz do que o mesmo. Na nossa era, impedir a desmaterialização de títulos
de credito, seria uma forma de engessar o direito, uma verdadeira barreira
contra o avanço e contra um melhor cumprimento da justiça.

REFERENCIAS

DUTRA, Maristela Aparecida. LEMOS, Florence Diniz dos Santos. Título


de crédito eletrônico no direito brasileiro. Revista Jurídica
UNIARAXÁ, Araxá, v. 17, n. 16, p. 149-178, 2013. Disponível em:
<www.uniaraxa.edu.br/ojs/index.php/juridica/article/download/428/407
>. Acesso em: 19 abr. 2018.

MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: títulos de crédito.


5. ed. São Paulo: Atlas, 2009. v.4.

OLIVEIRA, Katiane da Silva. O princípio da cartularidade e os títulos


de crédito virtuais. Conteúdo Jurídico, Brasilia-DF: 29 dez. 2014.
Disponível em:<http://www.conteudojuridico.com.br/?
artigos&ver=2.51879&seo=1>. Acesso em: 19 abr. 2018.

TORRES, Rafael Afonso Neves. Desmaterialização de título de


crédito. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 14 dez. 2015. Disponível em:
<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.54920&seo=1>.
Acesso em: 19 abr. 2018.

/
[1] A expressão cartularidade é proveniente da palavra chartula, do baixo
latim, que era empregada para significar tanto a incorporação do direito ao
documento, como o direito decorrente do título em relação ao negócio
fundamental, chamado por isso mesmo, o negócio subjacente, de relação
extracartular.

Disponível em: https://cardosogustavo.jusbrasil.com.br/artigos/568645989/desmaterializacao-de-


titulos-de-credito-face-o-principio-da-cartularidade

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