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MECÂNICA

DOS FLUIDOS

Germano Scarabeli Custódio Assunção


Perda de carga no
escoamento de fluidos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir escoamentos laminar e turbulento.


„„ Explicar como se calcula o número de Reynolds.
„„ Calcular a perda de carga em escoamentos internos.

Introdução
A compressão correta dos escoamentos de fluidos através de tubulações e
superfícies externas tem diversas aplicações, desde estudos biomecânicos
do escoamento do sangue intravenoso até o escoamento do ar sobre a
fuselagem de um avião. Geralmente, quando focamos nossos estudos
nessa área, uma característica importante do fluido é a sua energia: de
pressão, de movimento (energia cinética) ou de altura (energia potencial).
Neste contexto, a perda de carga nada mais é que a perda de energia
do fluido quando ele percorre determinada trajetória. Nessa situação, por
causa do efeito viscoso do fluido, ocorre atrito devido à interação entre
o fluido em si e à interação entre o fluido e as superfícies sólidas circun-
dantes. Essa perda de energia não é algo desejável, pois, por exemplo,
haveria mais gasto de energia com bombas para bombear o fluido por
uma tubulação (pois parte da energia é dissipada) ou menos energia
estaria disponível para ser transformada em energia elétrica em uma
turbina, devido, também, à dissipação. Para se quantificar essas perdas,
alguns parâmetros fundamentais de caracterização do escoamento são
importantes.
Neste capítulo, você aprenderá como classificar os escoamentos qua-
litativamente e quantitativamente, por meio do número de Reynolds, e
a calcular a perda de carga em escoamentos internos.
2 Perda de carga no escoamento de fluidos

Classificações dos escoamentos


A mecânica dos fluidos é a ciência que se dedica a estudar o comportamento
dos fluidos em contato entre si ou com superfícies sólidas. O fluido pode estar
em repouso (estática dos fluidos) ou em movimento (dinâmica dos fluidos),
conforme Çengel e Cimbala (2015).
Neste contexto, usualmente algumas classificações introdutórias dos es-
coamentos de fluidos servem de base para estudos mais avançados dentro
da mecânica dos fluidos. O primeiro conceito importante refere-se ao tipo
de espaço onde ocorre o escoamento, podendo ser escoamento interno ou
externo. O escoamento interno refere-se a situações em que o fluido está em
um espaço confinado, como um duto de distribuição de água ou de produção de
petróleo. O escoamento externo denota escoamentos em que o fluido está em
espaços não confinados, como ao redor de um prédio ou de uma asa de avião.
Outra classificação importante quando estudamos escoamentos dos fluidos
diz respeito ao comportamento da densidade do fluido durante o escoamento.
Um escoamento é dito incompressível quando sua densidade permanece
constante ao longo do tempo, como ocorre usualmente nos escoamentos de
líquidos (substâncias incompressíveis). Do contrário, temos que o escoamento
é compressível, ou seja, sua densidade varia sensivelmente com o tempo, e
esse efeito não pode ser desprezado, como ocorre frequentemente em gases.
A classificação quanto à viscosidade do fluido é outra forma de se enxergar o
movimento. A viscosidade representa, quantitativamente, o grau de dificuldade
da movimentação de partículas de um fluido, ou seja, a resistência interna ao
movimento. Em escoamentos viscosos, há maior dificuldade de movimentação
e, consequentemente, maior energia gasta nesse processo de movimentação.
Na prática, todos os escoamentos são viscosos, pois não existe fluido com
viscosidade zero. Entretanto, usualmente alguns fluxos são classificados como
escoamentos não viscosos, quando as forças viscosas são desprezíveis em
relação às forças inerciais e de pressão. Por simplificar a análise, é frequente,
embora não real, o uso de viscosidade nula no escoamento.

Escoamentos laminares e turbulentos


Dentro desses conceitos introdutórios, outra classificação extremamente prática
e relevante dos escoamentos diz respeito ao tipo de movimento das moléculas
dos fluidos: se esse movimento ocorre de uma forma mais ordenada ou ale-
atória. Quando um fluido escoa com baixas vazões, o escoamento é suave e
ordenado — chamado de escoamento laminar. Nessa situação, o fluido escoa
Perda de carga no escoamento de fluidos 3

em camadas paralelas, sem mistura lateral ou correntes transversais ao fluxo


principal. Um escoamento laminar é, portanto, aquele em que as partículas
fluidas movem-se em camadas lisas ou lâminas (FOX; MCDONALD; PRI-
TCHARD, 2014). Pensando em termos do vetor velocidade, o escoamento
laminar é aquele em que o fluido tem somente uma direção. Assim, por exem-
plo, para o fluxo ao longo do eixo x, teríamos que a velocidade de todas as

partículas do fluido seria igual a V = uî. Na prática, o escoamento laminar é
pouco encontrado, sendo observado em escoamentos que apresentam elevada
viscosidade ou em micro canais, segundo Çengel e Cimbala (2015).
O escoamento usualmente observado ocorre de forma aleatória e desorde-
nada — chamado de escoamento turbulento. Nessa situação, as partículas
dos fluidos misturam-se enquanto se movimentam, ou seja, há movimentação
transversal e lateral à direção principal do movimento. Considerando como
direção do fluxo o eixo x, a velocidade nesse tipo de escoamento pode ser
→ ^
considerada tridimensional e representada por V = (u + u´)î + v´î + w´k, sendo
a velocidade principal representada por u, e as velocidades transversais e
^
laterais representadas pelos valores infinitesimais uʹ, vʹ e k .
O estudo do escoamento turbulento, embora muito mais difícil de ser mo-
delado e ainda hoje não resolvido pela física clássica devido à aleatoriedade do
movimento, é mais importante do ponto de vista prático do que o escoamento
laminar, pois é observado na maioria das situações reais: fluxo na fuselagem
de carros e aviões, gases de chaminés e torres de resfriamentos, escoamentos
em redes de distribuição e saneamento, linhas de destruição de ar e gases, etc.
O movimento caótico no escoamento turbulento gera vórtices que interagem
uns com os outros, o que aumenta as perdas por atrito. Em termos práticos,
isso aumenta, por exemplo, a energia requerida de uma bomba para transportar
fluido em uma tubulação.
A passagem do escoamento laminar para o turbulento não ocorre de forma
abrupta, mas suave entre esses dois padrões. Nesse caso, o escoamento é
chamado de escoamento de transição: aquele em que há algumas flutuações
intermitentes do fluido em um escoamento laminar, embora não seja suficiente
para caracterizar um escoamento turbulento (KESSLER, 2016).
Ambos os escoamentos podem facilmente ser observados por meio de uma
simples experiência em casa, conforme sugerem Potter, Wiggert e Ramadan
(2015, p. 90): abra a torneira somente o suficiente para que a água escoe como
uma corrente silenciosa; observe que, devido ao movimento ordenado das
moléculas, é possível inclusive ver através da água — esse é o escoamento
laminar; ao se abrir mais a torneira, observa-se que o movimento da água não
permanece mais ordenado como antes e não é possível mais ver a transparência
4 Perda de carga no escoamento de fluidos

(devido aos movimentos transversais das lâminas de água); nesse caso, temos
que o escoamento é turbulento.
A Figura 1, a seguir, ilustra outra situação, com tinta injetada em uma linha
de água para facilitar a observação do movimento. Com a válvula posicionada
à jusante na linha, é possível controlar a vazão do fluido. Permanecendo com
a válvula praticamente fechada, o fluido adquire uma velocidade baixa ao
longo da linha, e podendo ser observado o escoamento laminar (Figura 1a).
Ao abrir cada vez mais a válvula, ocorre a transição e, devido ao aumento da
velocidade, o escoamento se torna turbulento (Figura 1b).
Note que a explicação até o presente momento sobre o escoamento ser
laminar ou turbulento foi meramente qualitativa, ou seja, observando-se
somente o grau de movimentação e ordenamento do movimento e usando
a velocidade do fluido para isso. Entretanto, há uma forma quantitativa de
classificar se o escoamento é laminar ou turbulento, e a transição entre esses
escoamentos sofre influência de outros parâmetros além da velocidade, con-
forme veremos adiante.

(a)

(b)

Figura 1. Classificação dos escoamentos quanto à sua movimentação: (a) escoamento


laminar e (b) escoamento turbulento.
Fonte: Adaptada de Rodrigues (2010, p. 5).
Perda de carga no escoamento de fluidos 5

Número de Reynolds
Para um escoamento ser classificado como laminar ou turbulento, três parâ-
metros relacionados à caracterização do escoamento são usados. O primeiro,
conforme já vimos, é a velocidade do escoamento. À medida que a velocidade
aumenta, ocorre a tendência de transição do escoamento laminar para o tur-
bulento. Outro parâmetro se refere ao comprimento característico do campo
de escoamento: o diâmetro de uma tubulação, por exemplo, para escoamentos
internos. Conforme esse valor aumenta, ocorre, também, a tendência de tran-
sição do escoamento laminar para o turbulento. O terceiro e último parâmetro
é a viscosidade cinemática do fluido escoando: à medida que a viscosidade
cinemática diminui, mais fácil se torna o movimento e, dessa forma, mais
fácil é para o fluido se tornar turbulento.

Na mecânica dos fluidos, usualmente quando nos referimos à viscosidade, estamos


tratando da viscosidade absoluta ou, como também é conhecida, viscosidade dinâmica,
cuja unidade é o Pa ∙ s (ou kg/m ∙ s) e usualmente representada por μ. Ela representa
a resistência interna do fluido ao movimento. Entretanto, para fins práticos, usa-se
a relação entre a viscosidade absoluta e a densidade do fluido, razão denominada
viscosidade cinemática (ϑ), tendo o m2/s como sua unidade e obtida da seguinte forma:

μ
ϑ=
ρ

Esses três parâmetros foram combinados e, após diversos experimentos,


Osborne Reynolds (1842–1921) chegou a uma correlação adimensional, que hoje
recebe seu nome — número de Reynolds — e é expressa da seguinte maneira:

VL
Re = (1)
ϑ

onde V é a velocidade do fluido, L é o comprimento característico por onde


o fluido escoa, e ϑ é a viscosidade cinemática desse fluido.
6 Perda de carga no escoamento de fluidos

A equação (1) é válida para qualquer escoamento viscoso. Para escoamentos


externos, o comprimento característico L representa usualmente a superfície
de contato com o fluido, com: a corda de asa de um avião, o comprimento
de um navio e a altura de um edifício. Para escoamentos internos, o valor do
comprimento característico usualmente se refere ao diâmetro hidráulico por
onde o fluido escoa.
Assim, outra forma de representar a equação (1) seria expandir o termo
da viscosidade cinemática e considerar que o escoamento é interno em uma
tubulação circular. Com essas considerações, a equação (2) é obtida:
ρVD
Re = μ (2)

onde D é o diâmetro interno por onde o fluido escoa, μ é a viscosidade


absoluta, e ρ é a densidade do fluido.
O termo do comprimento característico para tubulações circulares refere-se
ao diâmetro. Para tubulações não circulares, o número de Reynolds baseia-se
no diâmetro hidráulico, Dh, definido conforme a equação (3):
4AC
Dh = (3)
P

onde AC é a área da seção da transversal do tubo ou duto, e P é o seu perí-


metro molhado. A Figura 2 apresenta alguns exemplos de diâmetros hidráu-
licos para diferentes formas. Observe que, para tubos circulares (Figura 2a),
o diâmetro hidráulico é a mesma coisa que seu diâmetro.
Para definir quantitativamente se um escoamento é laminar ou turbulento,
usamos o número de Reynolds. O número de Reynolds no qual o escoamento
deixa de ser laminar é chamado de número de Reynolds crítico e igual a 2.300.
Ou seja, abaixo desse valor, o escoamento sempre será laminar. A partir desse
valor, ocorre o escoamento de transição e, para valores maiores que 4.000, o
escoamento se torna turbulento, conforme apresentam os seguintes intervalos:

„„ 0 < Re ≤ 2.300 — escoamento laminar


„„ 2.300 < Re ≤ 4.000 — escoamento de transição
„„ Re > 4.000 — escoamento turbulento
Perda de carga no escoamento de fluidos 7

4(πD2/4) (a)
Dh = =D
πD
D

4a2
Dh = =a a (b)
4a
a

4ab 2ab a
Dh = = (c)
2(a + b) a + b b

Figura 2. Cálculo do diâmetro hidráulico: (a) escoamento em uma tubulação circular,


(b) escoamento em um duto quadrada e (c) escoamento em um duto retangular.
Fonte: Adaptada de Çengel e Cimbala (2015).

Esses intervalos representam valores tradicionalmente utilizados em es-


coamentos. Entretanto, é importante ressaltar que, sob condições especiais,
é possível encontrar variações dentro desses valores. Em tubos muito lisos
(com rugosidade baixa) e com controle vibracional, é possível obter escoa-
mentos laminares com valores de Reynolds de até 100.000, segundo Çengel
e Cimbala (2015).
Olhando da ótica das forças agindo no fluido, e não dos parâmetros do
fluido, o número de Reynolds pode ser observado como adimensional, que
relaciona as forças inerciais com as viscosas. A força inércia representa a força
necessária para movimentar determinado volume de fluido, enquanto que a
viscosa representa a resistência à movimentação desse volume (como se fosse
8 Perda de carga no escoamento de fluidos

o atrito no estudo da física clássica em sólidos). Dessa forma, o número de


Reynolds pode ser escrito da seguinte forma:

Força inercial
Re =
Força viscosa

Além da definição quantitativa quanto ao tipo de escoamento (laminar ou


turbulento), o número de Reynolds apresenta diversas outras aplicações dentro
da mecânica de fluidos e da transferência de calor. Uma delas, significativa,
consiste em determinar se dois sistemas distintos são semelhantes. Por exemplo,
para se ensaiar a ação do vento sobre um edifício (real), ele pode ser feito em
uma escala menor (modelo), e seu comportamento avaliado em um túnel de
vento. Para garantir que o fluxo entre o real e o modelo seja dinamicamente
similar, ambos devem ter a mesma geometria e o mesmo número de Reynolds:

Remodelo = Rereal

Essas informações são altamente relevantes do ponto de vista da engenharia,


pois permitem que os engenheiros façam modelos em escalas reduzidas e
ensaiem o comportamento de estruturas antes de fabricá-las em escalas reais,
economizando tempo e investimento.

Perda de carga em escoamentos internos


Conforme apresentado anteriormente, os escoamentos completamente limita-
dos por superfícies sólidas são denominados escoamentos internos. Eles podem
ocorrer em tubos, dutos, difusores, bocais, válvulas e demais acessórios. Seu
estudo é extremamente relevante, pois são encontrados em diversas situações,
como nas veias e artérias do corpo, nos sistemas de abastecimento e sane-
amento das cidades, nos sistemas de irrigação da agricultura, nos sistemas
que transportam fluidos nas fábricas, nas linhas hidráulicas de aeronaves, etc.
(POTTER; WIGGERT; RAMADAN, 2015).
Nesses escoamentos, geralmente há a subdivisão entre a região de entrada
e o escoamento completamente desenvolvido. Os fluidos, antes de entrarem
no conduto, têm um campo de velocidade uniforme. À medida que entram
em contato com a superfície sólida do material, a sua velocidade em contato
com a parede tende a ser zero (devido ao atrito entre fluido e superfície). Para
compensar essa redução de velocidade nas extremidades, a velocidade no centro
Perda de carga no escoamento de fluidos 9

do conduto aumenta progressivamente à medida que o fluido é retardado nas


extremidades, para manter a vazão mássica constante ao longo do escoamento.
Esse aumento da velocidade causa uma mudança progressiva do perfil
velocidade no início do escoamento interno — região conhecida como com-
primento de entrada. Quando a forma do perfil já não mais varia ao longo
do comprimento do tubo, dizemos que o escoamento está completamente
desenvolvido.
A Figura 3 ilustra o perfil de velocidade a montante do duto, sua mudança
ao longo do comprimento de entrada e o perfil final atingido pelo escoamento.
Fox, McDonald e Pritchard (2014) explicam que a forma final que o perfil de ve-
locidade completamente desenvolvido atinge depende do tipo de escoamento —
laminar ou turbulento.

r
U0 u D
x

Comprimento de entrada Perfil de


velocidade
completamente
desenvolvido

Figura 3. Escoamento ao longo da região de entrada de um fluido em um conduto.


Fonte: Adaptada de Fox, McDonald e Pritchard (2014).

O escoamento laminar ou turbulento também afeta outra característica


do movimento: o tamanho do comprimento de entrada. Para escoamentos
laminares, o comprimento de entrada pode ser aproximado com boa precisão
ao seguinte valor:

Lentrada–laminar = 0,06 ∙ Re ∙ D (4)

onde Re é o número de Reynolds, e D é o diâmetro do tubo (ou o diâmetro


hidráulico, caso o conduto tenha formato não circular).
10 Perda de carga no escoamento de fluidos

Para o escoamento ser turbulento, a mistura entre as camadas do fluido


faz com que o perfil de velocidade seja completamente desenvolvido mais
rapidamente, e pode ser calculado por meio da equação:
1
Lentrada – turbulento = 1,356 ∙ Re 4 ∙ D (5)

A correta determinação do comprimento de entrada é importante para saber


a partir de qual ponto a tomada de pressão pode ser realizada para computar a
perda de pressão na linha. Embora algumas correlações possam ser encontradas
na literatura para o cálculo da perda de pressão ao longo do comprimento de
entrada, para fins práticos, essas correlações não são tão relevantes, visto que
a grande maioria dos escoamentos internos tem comprimento muito maior
que o da região de entrada, conforme Çengel e Cimbala (2015). Portanto,
para garantir rigor na estimativa de perda de pressão entre dois pontos, com
equações clássicas da mecânica de fluidos, basta assegurar que as tomadas
de pressão sejam realizadas em uma região fora do comprimento de entrada.
Mesmo que o perfil de velocidades dos escoamentos laminares e turbu-
lentos seja distinto, quando estamos estudando escoamentos completamente
desenvolvidos, de forma global, a perda de pressão entre dois pontos pode ser
obtida por meio da mesma equação:

L ρVméd
∆P = f (6)
D 2

onde f representa o fator de atrito de Darcy, L é o comprimento entre dois


pontos onde a pressão é tomada, D é o diâmetro do tubo, ρ é a densidade do
fluido, e Vméd é a velocidade média do escoamento.
Uma forma equivalente e mais prática de escrever a perda de pressão entre
dois pontos é usando esses valores em termos de altura equivalente de coluna
do fluido que escoa pelo duto. Nesse caso, chamamos a perda de pressão pelo
seu sinônimo: perda de carga. Usando o teorema de Stevin (que estabelece
que a pressão é proporcional à densidade, aceleração da gravidade e altura
do fluido), podemos estabelecer que a perda de carga entre dois pontos de
um escoamento será:

L Vméd
2

hL = f (7)
D 2g
Perda de carga no escoamento de fluidos 11

Observe que, embora o perfil de velocidade mude entre os escoamentos


laminar e turbulento, como o valor que, de fato, se utiliza nas equações (6) e
(7) para o cálculo da perda de carga é o da velocidade média, considerando que
temos o mesmo duto e a mesma vazão volumétrica, essa diferença no perfil
não altera o valor de Vméd, como pode ser observado na Figura 4.

(a) Vméd

u(r)
r

Escoamento laminar

Vméd
(b)

r
u(r)

0
Camada turbulenta
Camada de
superposição
Camada
amortecedora
Escoamento tubulento
Subcamada viscosa
Figura 4. Diferença entre os perfis de velocidade de um escoamento
(a) laminar e (b) turbulento. Observe que embora sejam distintos, ambos
apresentam a mesma velocidade média, representada pelo valor Vméd.
Fonte: Adaptada de Çengel e Cimbala (2015).
12 Perda de carga no escoamento de fluidos

O fato de o escoamento ser laminar ou turbulento afeta o fator de atrito


apresentado nas equações (6) e (7) pelo parâmetro f. Para escoamentos lami-
nares, ou seja, cujo valor de Re ≤ 2300, o fator de atrito pode facilmente ser
determinado pela equação (8):
64
f = Re (8)

Entretanto, a obtenção do fator de atrito para escoamentos turbulentos não


depende somente de Re, mas também da rugosidade do material do conduto em
contato com o fluido. A relação entre essas duas variáveis e o fator de atrito
não pode ser obtida por meio de uma análise algébrica teórica. Assim, todas
as relações existentes são obtidas a partir de análise experimental.
Dentre as diversas relações existentes, a mais testada e aceita é a equação
de Colebrook, apresentada na equação (9):

( (
1 ε 2,51
= –2,0 ∙ log + (9)
√f 3,7D Re√ƒ

onde ε é a rugosidade, e D é o diâmetro da tubulação.


Observe que essa equação é implícita, visto que o termo de interesse
aparece dos dois lados da igualdade. Para resolvê-la, devem-se usar métodos
iterativos. Estima-se um valor inicial para f do lado direito da igualdade e,
depois de algumas interações, tem-se o valor de f convergido. Entretanto,
diversas calculadoras científicas atuais já têm função para o cálculo de f, ou
mesmo, alguns sites.

Além da resolução passo a passo na calculadora, há diversos sites que já apresentam


o solver da equação de Colebrook. O link a seguir é um exemplo de uma planilha do
Excel® que resolve essa equação.

https://goo.gl/hkFs44
Perda de carga no escoamento de fluidos 13

No início do século XX, quando ferramentas computacionais não estavam


disponíveis, outra wforma para encontrar o valor do fator de atrito da equação
(9) foi proposta por Lewis F. Moody (1800–1953). Ele compilou diversas
curvas com valores de f, em função do número de Reynolds e da rugosidade
relativa, conforme a Figura 5 mostra de forma simplificada. Esse conjunto de
curvas ficou conhecido como diagrama de Moody e é um dos responsáveis
pela popularização da equação de Colebrook, visto que diferentes valores do
fator de atrito poderiam ser diretamente obtidos a partir da simples leitura
de um gráfico. Para acessar o diagrama de Moody na íntegra, consulte Fox,
McDonald e Pritchard (2014).

0,1 Escoamento turbulento completamente rugoso


Laminar
(f se torna constante)
ε/D = 0,01

ε/D = 0,001
f
De transição ε/D = 0,0001
0,01 ε/D = 0

Turbulento liso

0,001
103 104 105 106 107 108
Re

Figura 5. Representação esquemática do diagrama de Moody.


Fonte: Adaptada de Çengel e Cimbala (2015).
14 Perda de carga no escoamento de fluidos

Adicionalmente, diversas equações explícitas que aproximam o valor da


equação (9) têm sido propostas. Em um estudo recente, Genić et al. (2011)
estudaram 16 dessas correlações explícitas e concluíram que a mais precisa para
o cálculo do fator de atrito de forma explícita, para escoamentos turbulentos,
foi a proposta por Zigrang e Sylvester (1982):

{ [ ( ( (([{
–2
ε 5,02 ε 5,02 ε 13
f = – 2,0 log – log D – log + (10)
3,7 D Re Re 3,7 D Re

Além da perda de carga devido ao atrito ao longo do fluxo, conforme


discutimos acima, em escoamentos internos reais, usualmente há diversas
descontinuidades, que também geram perdas de carga no fluido. Essas per-
das de pressão também são conhecidas como perdas menores e podem ser
calculadas pela equação (11):

Vméd2
hL = K (11)
2g

onde K representa um valor de perda concentrada que depende da geometria


da descontinuidade, pode ser uma curva, uma válvula, uma restrição, uma
redução, etc.. Existem diversos dados experimentais para os valores de K de
diferentes acessórios. A Figura 6 representa alguns valores típicos de K. Para
acessar esses valores na íntegra, consulte Çengel e Cimbala (2015).
Curvas e desvios
Curva suave de 90° Curva chanfrada de 90° Curva chafrada de 90° Cotovelo rosqueado de 45°:
Flangeado: KL = 0,3 (sem palhetas): KL = 1,1 (com palhetas): KL = 0,2 KL = 0,4
Rosqueado: KL = 0,9

45°
v v v v

Curva de retorno de 180°: Tê (escoamento de desvio): Tê (escoamento de linha): União rosqueada:


Flangeado: KL = 0,2 Flangeado: KL = 1,0 Flangeado: KL = 0,2 KL = 0,08
Rosqueado: KL = 1,5 Rosqueado: KL = 2,0 Rosqueado: KL = 0,9

v
v v

Válvulas
Válvula de globo, completamente aberta: KL = 10 Válvula de gaveta, completamente aberta: KL = 0,2 Figura 6. Alguns valores
1
Válvula de ângulo, completamente aberta: KL = 5 4 fechada: KL = 0,3
1
de K para acessórios
Válvula de esfera, completamente aberta: KL = 0,05 2 fechada: KL = 2,1
3
usualmente encontrados
Válvula de retenção de batente: KL = 2 4 fechada: KL = 17
em escoamentos internos.
* Esses valores são representativos para os coeficientes de perda. Os valores reais dependem muito do projeto e da fabricação das componentes e podem diferir dos Fonte: Adaptada de Çengel e
valores dados de forma considerável (particularmente para as válvulas). Os dados reais do fabricante devem ser usados no projeto final. Cimbala (2015).
Perda de carga no escoamento de fluidos
15
16 Perda de carga no escoamento de fluidos

ÇENGEL, Y. A.; CIMBALA, J. M. Mecânica dos fluidos: fundamentos e aplicações. 3. ed.


Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2015. 1016 p.
FOX, R. W.; MCDONALD, A. T.; PRITCHARD, P. J. Introdução à mecânica dos fluidos. 8. ed.
Rio de Janeiro: LTC, 2014. 871 p.
GENIĆ, S. et al. A Review of Explicit Approximations of Colebrook’s Equation. FME
Transactions, Belgrade, v. 39, n. 2, p. 67–71, 2011. Disponível em: https://www.mas.
bg.ac.rs/_media/istrazivanje/fme/vol39/2/04_mjaric.pdf. Acesso em: 26 mar. 2019.
KESSLER, M. Escoamento Turbulento. Engineering Simulation and Scientific Software,
Florianópolis, 18 out. 2016. Disponível em: https://www.esss.co/blog/escoamento-
-turbulento. Acesso em: 26 mar. 2019.
POTTER, M. C.; WIGGERT, D. C.; RAMADAN, B. H. Mecânica dos fluidos. 4. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2015. 711 p.
RODRIGUES, L. E. M. J. Aula 10 – Escoamento Laminar e Turbulento. São Paulo: Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, 2010. 17 p. (Notas de aula da disciplina
Mecânica dos Fluidos). Disponível em: http://www.engbrasil.eng.br/pp/mf/aula10.
pdf. Acesso em: 26 mar. 2019.
ZIGRANG, D.J.; SYLVESTER, N. D. Explicit approximations to the solution of Colebrook's
friction factor equation. AIChE Journal, New York, v. 28, n. 3, p. 514–515, May 1982.

Leituras recomendadas
BARRAL, M. F. Perda de carga. 30 p. Santo André: Centro Universitário Fundação Santo
André, 2007. (Notas de Aula). Disponível em: http://www.leb.esalq.usp.br/leb/disci-
plinas/Fernando/leb472/Aula_7/Perda_de_carga_Manuel%20Barral.pdf. Acesso em:
26 mar. 2019.
WHITE, F. M. Mecânica dos fluidos. 8. ed. Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2018. 864 p.

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