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Importância do pH em formulações de uso tópico

Para garantir o padrão de qualidade das formulações de uso tópico, fatores


externos —temperatura, luz, umidade, oxigênio — relacionados ao ambiente sob
os quais os fármacos e os dermocosméticos estarão expostos devem ser
conhecidos e controlados. Se não houver o emprego de embalagens, adjuvantes
farmacotécnicos e veículos adequados, tais condições podem promover reações
e degradações químicas a depender da característica de cada substância. São
elas: hidrólise, oxidação, decomposição fotoquímica e racemização.

Fatores inerentes aos fármacos e dermocosméticos também deverão ser


conhecidos. Esses incluem suas propriedades físico-químicas, inclusive
informações sobre o pH de máxima estabilidade e ação de cada substância. Ao
analisar a formulação como um todo, o farmacêutico deverá avaliar o pH de
estabilidade de cada componente e definir um pH final para o produto acabado,
que abrange todos os pHs de estabilidade. Se houver incompatibilidades
farmacotécnicas entre uma ou mais substâncias, é necessário o contato com o
prescritor para sugerir sua adequação.

Correção de pH em formulações de uso tópico

Ajustar o pH pode significar abaixá-lo ou elevá-lo a valores desejáveis e


apropriados para solubilizar determinada substância, ou para garantir sua
estabilidade e promover sua ação. Esses ajustes também são fundamentais no
que diz respeito à sua aplicação e à compatibilidade fisiológica com o pH da pele.

Relação entre a região do corpo ou fluido x pH característico


Região do Corpo pH
Pele Aproximadamente 5,5
Rosto 4,7-5,5
Axilas 6,1 a 6,8
Cabelos Aproximadamente 5,0
Lágrimas Aproximadamente 7,4
Vagina 4,0-4,5

Para o ajuste do pH podemos utilizar os agentes acidificantes e alcalinizantes.


Quando houver necessidade de manter o pH de uma formulação em valores
inalteráveis durante o período de uso, faz-se necessário o uso de um sistema
tampão. Esse sistema garante a estabilidade do pH em valores inalteráveis.
Trata-se de soluções aquosas geralmente constituídas por um ácido fraco e um
sal desse ácido, ou por uma base fraca e um sal dessa base.

A escolha de um sistema tampão deve estar baseada na faixa de pH da


formulação que se deseja tamponar, na compatibilidade, na via de administração
e na forma farmacêutica. Alguns sistemas tampões são exclusivos de uso
tópico/externo (tampões contendo ácido bórico ou borato de sódio) e outros
podem ser aplicados também para uso interno (tampão citrato, tampão fosfato).

Relação de alguns tampões em função do pH


Faixa de pH Tampão Uso
2,5-6,5 citrato Externo, interno.
3,6-5,6 acetato Externo, interno.
6,0-8,0 fosfato Externo, interno.
8,0-9,0 Bicarbonato de sódio Externo, interno.
6,8-9,1 borato Externo.

Um dos tampões mais usados em formulações tópicas é o tampão citrato, uma


vez que a maiorias das formulações compreende-se em faixas de pH entre 2,5
e 6,5.

Tampão citrato
pH Ácido cítrico mono- Citrato de sódio di-
hidratado para fazer hidratatado para fazer
100g de creme (%) 100g de creme (%)
2,5 6,44 0,784
3,0 5,74 1,764
3,5 4,76 3,136
4,0 4,06 4,116
4,5 3,08 5,488
5,0 1,96 7,056
5,5 0,98 8,428
6,0 0,42 9,212
6,5 0,14 9,604

Como agentes acidificantes, o emprego de soluções auxiliares de ácido cítrico a


25% e 50% e como alcalinizantes, soluções de hidróxido de sódio a 10%, a 0,1
molar e 1 molar e solução de trietanolamina a 50% é mais indicado.

Para ler monografias contendo composição e modo de preparo, acesse o


Formulário Nacional da Farmacopeia Brasileira 2ª edição - Revisão 2 (soluções
auxiliares)

Exemplos de incompatibilidades farmacotécnicas entre ativos

1- Bicarbonato de sódio e cloridróxido de alumínio

Essa associação é incompatível farmacotecnicamente devido às divergências de


pH. O bicarbonato de sódio tem um pH em torno de 7 a 8,5, é incompatível com
ácidos, metais, alumínio e álcool. Já o cloridróxido de alumínio é estável em meio
neutro a levemente ácido, em torno de 3 a 4,5, a depender de sua concentração.
A associação dessas duas substâncias pode ocasionar precipitação. Portanto,
formulações com associação entre cloridróxido de alumínio e bicarbonato de
sódio, bórax e carbonato de sódio são incompatíveis.
2- Peróxido de benzoíla associado a ácido retinoico e ou eritromicina

Essas associações são incompatíveis farmacotecnicamente devido às questões


de oxidação. O ácido retinoico e a eritromicina são instáveis na presença de
agentes oxidantes fortes, oxigênio, luz e metais pesados. O peróxido de benzoíla
é um agente oxidante, que reduz ou inativa a ação deles. A eritromicina
associada a pHs ácidos também perde grande parte de sua efetividade, seu pH
de estabilidade deverá ser neutro.

3- Vitaminas C lipossomadas e ácidos

Essa associação é incompatível farmacotecnicamente devido às divergências de


pH. No mercado existem várias marcas de derivados esterificados de vitaminas
C tópica lipossomadas, e para cada uma delas se define uma concentração e
um valor de pH de estabilidade. Como exemplos temos as Thalaspheras de
Vitamina C® (pH entre 5 e 6 e concentração de uso até 5%), VC-PMG® (pH
entre 7,0 a 7,5 e concentração de 1% a 3%), AA2G® (pH entre 5,0 a 7,0 e
concentração de até 2%), Éster-C® (pH entre 5,0 a 6,0 e concentração de 1%
a 2%), VC-IP® (pH entre 4,0 a 6,0 e concentração de 0,05% a 1%) e Nanosferas
de Vitamina C® (pH entre 5,5 a 6,8 e concentração de 0,5% a 3%).

Normalmente essas vitaminas lipossomadas possuem pH de estabilidade


levemente ácido a neutro. A depender do pH de estabilidade do ativo ácido
(ácido glicólico, málico, mandélico, kójico, fítico, etc.) a ser associado a elas,
poderá ocorrer incompatibilidade farmacotécnica, devido aos pHs de
estabilidade que são inconciliáveis.

4- Ácido kójico e arbutin

Essa associação é incompatível farmacotecnicamente devido às divergências de


pH. Ácido kójico, cujo pH de estabilidade varia de 3,5 a 5, é um inibidor da síntese
de tirosinase e é compatível com alfa-hidroxiácidos. Contudo, é incompatível
com arbutin, que possui um valor de pH de estabilidade acima de 5 até um
máximo de 8. Alternativamente temos o alpha-arbutin, um derivado do arbutin,
que age também inibindo a tirosinase.Seu pH de estabilidade varia de 3,5 a 6,5,
utilizado em concentrações de 0,2% a 2%. Outra possibilidade é o uso do
dipalmitato de ácido kójico, um estér do ácido kójico, cujo pH de estabilidade
varia de 4,0 a 9,0 e é utilizado em concentrações de 1% até um máximo de 5%.

5- LCD e ácido salicílico

Essa associação é incompatível farmacotecnicamente devido às divergências de


pH. O Licor carbonis detergens (LCD), um preparado feito à base de extratos do
coaltar (alcatrão da hulha) em tintura de quilaia, tem ação redutora e
antipruriginosa, cujo pH de estabilidade é neutro a alcalino. Se associado ao
ácido salicílico, cujo pH de estabilidade varia entre 3,0 e 3,5, poderá ocorrer a
separação do coaltar que se encontra saponificado no LCD.

6- Gel aniônico (carbopol) e ácidos.

Essa associação é incompatível farmacotecnicamente também devido às


divergências de pH. Substâncias de pHs ácidos promovem a redução drástica
do pH de estabilidade desse gel (6,0-10), promovendo sua desgeilificação
(quebra da viscosidade).

Alguns exemplos de pH de ativos de uso tópico

Matéria-prima Faixa pH de Matéria-prima Faixa pH de


estabilidade estabilidade
Ácido glicólico Hidratante (5-6,5) Biosulphur fluid® 5,5
70% Esfoliante (3-4,0)
Ácido kójico 3,5-5,0 Cafeisilane C® 3,5-6,5
Ácido láctico 85% 3,5-4,5 Clindamicina 3,5-6,5
fosfato
Ácido retinóico 4,5-6,5 Clindamicina 4,0
cloridrato
Ácido salicílico 3,0-3,5 Clobetasol pH ácido ou
propionato neutro
Alantoína 4,0-8,0 Cloridróxido de pH neutro ou
alumínio ácido
Alpha arbutin ® 3,5-6,5 Licor carbonis pH neutro ou
detergens (LCD) alcalino
Arbutin 5,0-8,0 DMAE Base 6,5-7,0
Argireline® 5,0-7,0 D-Pantenol 3,5-7,5
Ascorbosilane 5,0-7,0 Eritromicina pH neutro
C® estolato
Azeloglicina® 5,0-11,0 Lactato de Menor que 6,0
amônio
Raffermine® pH acima de 4,0 Thalaspheras de 5,0-6,0
Vitamina C®
Tensine® pH igual ou maior Bicarbonato de 7-8,5
que 6,5. sódio
Clorexidina 5,0-7,0 Hidroquinona 3,0-4,0
digluconato
Dipalmitato de 4,0-9,0 VC-PMG 7,0-7,5
ácido kójico
AA2G 5,0-7,0 Éster-C 5,0-6,0
VC-IP 4,0-6,0 Nanosferas 5,5-6,8
vitamina C®
Ácido Bórico 3,8-4,8 Peróxido de 2,8-6,6
benzoíla

Saiba mais no Manual de Estabilidade: pH de ativos de uso tópico, 3ª edição -


2014.

Lia também o Compêndio Magistral Anfarmag, 1ª edição -2018.

Verifique Fichas de Referência e de Especificação de Compra de Insumos


Farmacêuticos Ativos.
Referências
Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução
nº 67, de 8 de outubro de 2007. Dispõe sobre Boas Práticas de Manipulação
de Preparações Magistrais e Oficinais para Uso Humano em Farmácias.

ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Formulário Nacional da


Farmacopeia Brasileira, 2ª edição – Revisão 2. Brasília: Anvisa, 2012.

Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais. Manual de Estabilidade: pH


de ativos de uso tópico, 3ª edição. São Paulo: Anfarmag, 2014.

Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais. Compêndio Magistral


Anfarmag, 1ª edição. São Paulo: Anfarmag, 2019.

Ferreira, A.O.; Brandão, M.A.F e Polonini, H.C. Guia Prático da Farmácia


Magistral, 5ª edição. Juiz de Fora: Editar, 2018.

Cavalcanti, L.C. Incompatibilidades Farmacotécnicas: motivo,


recomendação e uso terapêutico, 2ª edição. São Paulo: Pharmabooks, 2008.

Thompson, J. E.; Davidow, L. W. A Prática Farmacêutica na Manipulação de


Medicamentos, 3ª edição. Porto Alegre: Artemed, 2013.

Souza, M.V.M & Junior, D.A. Ativos dermatológicos: dermocosméticos e


nutracêuticos – 9 volumes. São Paulo: Daniel Antunes Junior, 2016.

Souza, G.B. Formulário Farmacêutico Magistral. São Paulo: Editora


Medfarma, 2016.

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