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BIBLIOTHECA DO EXERCITO

Casa do Barão de Loreto


- 1881 -

Fundada pelo Decreto no 8.336, de 17 de dezembro de 1881,


por FRANKLIN AMÉRICO DE MENEZES DÓRIA, Barão de Loreto,
Ministro da Guerra, e reorganizada pelo
General de divisão VALENTIM BENÍCIO DA SILVA,
pelo Decreto no 1.748, de 26 de junho de 1937.

Comandante do Exército
General de exército Enzo Martins Peri

Departamento de Educação e Cultura do Exército


General de exército Ueliton José Montezano Vaz

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Homepage: http://www.bibliex.ensino.eb.br
Paulo Sérgio da S ilva Maia

Aviação no
xérci t o
Euma visão histórica
1a edição

BIBLIOTECA DO EXÉRCITO
Rio de Janeiro
2014
BIBLIOTECA DO EXÉRCITO Publicação 905
Coleção General Benício Volume 507

Copyright © by Biblioteca do Exército

Coordenação Editorial:
Paulino Machado Bandeira e Rogério Luiz Nery da Silva

Revisão:
Marcio Costa e Suzana de França

Capa e Diagramação:
Leonardo Dessandes

M217 Maia, Paulo Sérgio da Silva.


Aviação no Exército: uma visão histórica / Paulo Sérgio
da Silva Maia . - Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército,
2014.

600 p.: 23 cm. – (Biblioteca do Exército; 905. Coleção


General Benício; v. 507)

ISBN 978-85-7011-543-0

1.Brasil. Exército – Aviação – História. 2. Aeronáutica


Militar – Brasil – História. I. Título. II. Série.

CDD 358.400981

Os relatos e opiniões expressos nesta obra refletem exclusivamente o


pensamento do autor e não necessariamente os da Editora ou da Instituição.

Impresso no Brasil Printed in Brazil


Apresentação

“Ad astra per aspera”


(Ao triunfo, por árduos caminhos.)
Sêneca a.C.-65d.C.– Filósofo romano

Honrado e com grande satisfação profissional, atendi ao con-


vite do Cel Silva Maia para prefaciar este livro que considero documen-
to de grande importância para entender a evolução da Força Terrestre
brasileira.
Ao longo de sua obra, o autor apresenta, de forma objetiva, os
eventos que culminaram com a implantação da Aviação do Exército (Av Ex).
Fica clara durante a leitura da obra a tentativa de – utilizando-
se de linguagem simples, mesmo quando trata de assuntos de natureza
técnica – manter o leitor interessado e motivado. Permeando sua obra
com fotografias, depoimentos e citações, vê-se sempre presente a preo-
cupação com os futuros leitores.
Não há como não concordar com o autor quando afirma em sua
introdução que a criação da Aviação do Exército foi uma das páginas de
plena relevância de nossa Instituição.
Com muita propriedade e respaldado no conhecimento ad-
quirido em sua participação nas Comissões de Estudo e Implantação, na
Seção de AvEx, na Diretoria de Material de Aviação e, posteriormente,
6 Aviação no Exército - uma visão histórica

como chefe da Comissão de Recebimento de Material Aeronáutico, no


exterior, nos traça fiel radiografia de cada etapa da implantação do
sistema que permitiu alçar o Exército à terceira dimensão no cam-
po de batalha. Como integrante do seleto grupo de militares, sobre
cujos ombros repousou a responsabilidade de encetar as ações para
a efetiva implantação, foi participante dos esforços empreendidos
nesse sentido.
Seria de todo lamentável que os fatos narrados permaneces-
sem jogados no esquecimento, alimentando o desconhecimento sobre
o assunto e, pior, propiciando depoimentos incorretos sobre como os
fatos ocorreram na realidade.
Os avanços tecnológicos e sua repercussão no desenvolvimento
das armas e equipamentos dos exércitos no mundo têm sido o principal
fator da evolução da operacionalidade das Forças Militares.
Esses mesmos avanços vêm continuamente impondo atualiza-
ção doutrinária no emprego das Forças Armadas que, via de regra, ocor-
rem pela incorporação de novos materiais.
Infelizmente, ao longo de sua história, a Força Terrestre se
ressentiu, por falta de recursos, de acompanhar a evolução dos exér-
citos de outros países que compreenderam o respaldo de nações com
influência no cenário mundial em Forças Armadas com poder ajustado
a suas aspirações nacionais.
A evolução tecnológica do Exército se fez muito lentamente, o
que nos levou a chegar ao final do século XX submetidos à doutrina de
emprego da Segunda Guerra Mundial.
No entanto, tínhamos a certeza de que era impositivo evoluir.
A estatura ambicionada pelo País e a nossa crescente importância como
Nação não podiam excluir a presença de um Exército que lhe estivesse à
altura. Precisávamos realizar um salto para o futuro.
Precisávamos nos modernizar e ainda que soubéssemos que
seria impensável, na ocasião, modernizar toda a Força.
Não podíamos postergar a tomada de medidas que, se não no
todo, pudesse trazer parte do Exército para a modernidade.
Nesse contexto, entre outras medidas que permitiram a mo-
dernização e o aumento da capacidade operacional da Força, sem dú-
vida, a de maior expressão foi a da criação da Aviação do Exército,
uma página das mais importantes que permanecia longe do conheci-
Apresentação 7

mento da maior parte do público militar e, por consequência, do pú-


blico em geral. É esse desconhecimento que o autor procura diminuir
na sua narrativa.
Ao longo do livro, o Cel Silva Maia procura relatar de modo di-
dático as etapas que antecederam a efetiva criação da Av Ex e as dificul-
dades que tiveram de ser suplantadas e exigiram de todos os envolvidos
vontade, ousadia e determinação. Relata o descrédito, mesmo no âmbito
da Força, daqueles que não acreditavam em nossa capacidade de levar
adiante um projeto de tal envergadura.
Aborda a dificuldade na pesquisa de dados para a elaboração
de sua obra, o que nos conduz a refletir sobre a necessidade de sermos
mais diligentes na conservação da memória dos eventos significantes
para a evolução técnica do Exército. Essa constatação justifica o fato de o
autor colocar documentos sob a forma de comentários no bojo do livro,
anexando-os ao final e evitando que pudessem se perder, como ocorreu
com a farta documentação produzida na época.
Discorre igualmente sobre o processo de recebimento de
um novo material que se incorporava ao nosso inventário e as difi-
culdades iniciais logo suplantadas com muita perseverança na reu-
nião dos conhecimentos que dotariam a primeira unidade da Avia-
ção do Exército.
A criação, em 1986, foi concretização de um sonho há muito
alentado no seio do Exército e um fator de fundamental importância
para a concessão à Força de mobilidade e flexibilidade essenciais para o
seu eficiente emprego.
Durante a minha carreira, sempre tive a exata dimensão da relevân-
cia da mobilidade aérea como fator de incremento da eficiência operacional.
Entretanto, as dificuldades econômico-financeiras sempre presentes e a falta
de influência no processo decisório levaram-me a adiar esse projeto.
Quando ascendi ao generalato, senti-me mais próximo de po-
der contribuir para tornar realidade esse antigo anseio e iniciei sistemá-
tica pregação sobre o tema.
Ao ser nomeado para o cargo de Ministro de Estado do
Exército, iniciei gestões no sentido de trazer à Força os melhora-
mentos de que precisava. Graças ao excelente relacionamento que
mantinha com o presidente José Sarney e a compreensão das demais
autoridades governamentais pela situação em que se encontrava o
8 Aviação no Exército - uma visão histórica

Exército, pude estabelecer um projeto conhecido como FT-90, de


grande dimensão e alcance ambicioso, composto de muitos pro-
jetos e subprojetos importantes, tais como: a criação dos Grandes
Comandos Militares, em substituição aos Exércitos; reestruturação
das Brigadas; criação da Aviação do Exército para assegurar a mo-
bilidade estratégica e tática necessárias a um grande país em ex-
tensão como o nosso; a criação do Centro de Guerra Eletrônica; a
aquisição e repotencialização dos blindados; a compra dos fogue-
tes de saturação de área ASTROS II; a recuperação e construção de
quartéis; e exponencialmente na área de ensino.
A obtenção dos vultosos e necessários recursos extraorçamen-
tários permitiu a implantação das ações que se impunham para a evolu-
ção do Exército.
É importante ressaltar que os objetivos foram conquistados
pela obstinação e dedicação de todos os escalões subordinados envolvi-
dos no planejamento e na execução das medidas estabelecidas.
Entre as medidas, o estabelecimento do Sistema de Planeja-
mento do Exército (SIPLEX) permitiu dar rumo profissional à Institui-
ção e à realização de planejamentos mais objetivos, verdadeiros, auten-
ticamente nacionais, ajustados às reais necessidades da Instituição e
aos interesses do Brasil. Foi instrumento fundamental para estruturar
as diretrizes para a Força durante minha gestão.
O desejo de colaborar para a modernização do Exército era
uma preocupação que me acompanhava desde os tempos de instrutor
da Escola de Comando e Estado-Maior. Escrevi um artigo que abordava
a necessidade de revisão na estrutura organizacional vigente, no qual já
recomendava mais mobilidade operacional do Exército. (A Defesa Na-
cional-maio/junho de 1962).
Como comandante militar na Amazônia, adquiri a convicção da
imprescindibilidade de conceder ao Exército maior mobilidade tática e
estratégica, em particular naquela região, e que o vetor apropriado seria
o helicóptero, por sua versatilidade operacional.
Nas minhas funções posteriores, jamais tive dúvidas em relação
aos pontos que defendia até aquelas ocasiões. Quando assumi o cargo de
Ministro do Exército, pude transformar em realidade o anseio que tanto
acalentara, contando com a insubstituível participação de um núcleo de
grandes profissionais de todos os postos da hierarquia.
Apresentação 9

No capítulo primeiro, o autor manifesta sua preocupação com


o título do livro, de modo a evitar outras interpretações sobre seu obje-
tivo principal: o de prestar um depoimento sobre como as medidas des-
tinadas à implantação se processaram. Nos contatos que tive com ele,
quando fui entrevistado, vendo o seu dilema e sabedor da importância
de que se revestia essa obra, sugeri-lhe o título que hoje o livro ostenta,
minimizando-lhe a preocupação.
No capítulo seguinte, faz uma abordagem sobre sua participa-
ção no processo de implantação, ao qual me referi anteriormente, pre-
tendendo informar ao público leitor a origem dos conhecimentos que
lhe permitiram cunhar esta obra.
A experiência anterior do Exército com os meios aéreos lhe ser-
ve como pano de fundo para trazer à reflexão a injustificável adoção do
termo recriação quando se fala da atual Aviação do Exército e o fazem
apontar razões que justifiquem o hiato entre a outrora Aviação Militar
e a nossa atual Aviação do Exército. O autor discorre ainda sobre a pro-
priedade de se considerar o tenente Kirk como o patrono de uma avia-
ção à qual nunca pertenceu.
Informa-nos depois detalhes sobre o certame licitatório
para a compra de helicópteros e as atividades de recebimento do
material.
Nos demais capítulos, procura dar ao leitor, inclusive àque-
les que não conhecem a nossa estrutura organizacional, uma ideia
da participação, em particular, do Estado-Maior do Exército. Deta-
lha como, a partir da diretriz emitida na época, na qualidade de
ministro, as medidas decorrentes se desenvolveram. Acrescenta
comentários sobre manifestações contrárias à aquisição dos meios
aéreos por aqueles que não tinham compreensão do que a Aviação
do Exército representaria.
Ao falar sobre o processo inicial de aquisição de novos conhe-
cimentos e absorção de experiência junto à Marinha e Força Aérea, em
particular, deseja demonstrar que o Plano de Implantação foi produto
de dados sólidos, fato comprovado pelo sucesso da implantação. Traz ao
longo dos capítulos informações de grande importância para o correto
entendimento de todo o processo.
Ao tecer comentários sobre o apoio prestado pelas Forças coir-
mãs, presta justa homenagem àqueles que não mediram sacrifícios para
10 Aviação no Exército - uma visão histórica

que hoje pudéssemos nos orgulhar de uma aviação pujante e moder-


na. Destaca, com grande propriedade e justiça, o inestimável apoio
prestado pela Marinha e Força Aérea Brasileira, de transcendental
importância para o sucesso de nossa empreitada. Com elas teremos
eterno preito de gratidão. A coesão entre as nossas Forças Armadas
é uma característica presente entre os militares e se manifesta sem-
pre que a situação assim o exige, o que naquela oportunidade ficou
demonstrada.
O processo de aquisição das aeronaves foi realizado sob rí-
gida observância ao Decreto-lei nº 2.300. Na ocasião, emiti diretri-
zes exigindo o máximo de transparência em todo o processo. Na data
da assinatura do contrato, além de enfatizar a importância do fato
e destacar o apoio da Marinha e da Força Aérea, frisei os motivos
que levaram o Exército a realizar uma concorrência internacional,
ressaltando a busca no maior universo de escolha do material, o cui-
dado de não onerar o País ao buscar financiamento em longo prazo e
exigir a inclusão de cláusula de compensação e permitir nossa maior
inserção no mercado aeronáutico, abrindo novas possibilidades às
empresas nacionais do setor.
Ressalte-se a competência e irrefragável lisura presentes du-
rante todo o processo licitatório. Na busca tenaz e zelosa para a melhor
solução, o Exército obteve, também nessa fase, o assessoramento das
demais Forças e do Ministério da Fazenda, na área comercial. Esse pro-
cedimento lúcido, escrupuloso, objetivo e firme permitiu que o processo
chegasse a bom termo.
O subsequente relato sobre a atuação da Comissão de Recebi-
mento do material serve para corroborar o acerto de sua criação e nos
dá uma exata compreensão da complexidade de suas atividades.
Ao expor, de forma clara e quase didática, os acontecimen-
tos que culminaram com a criação da Aviação do Exército, o autor
dá uma valiosa colaboração para a historiografia do Exército. Que
essa obra sirva de exemplo e estímulo para novas realizações desse
teor.
Cumprimento o Cel Silva Maia por sua louvável iniciativa e ex-
celente trabalho realizado.
Ao publicar esta obra, a Biblioteca do Exército continua a cum-
prir sua atribuição de fiel guardiã da memória militar. Para os leitores
Apresentação 11

civis e militares este livro apresenta significativas informações e funda-


mentais ensinamentos de como se desenvolve o complexo processo de
incorporação de modernos materiais militares.

Gen Ex Leonidas Pires Gonçalves


Ministro do Exército no período 1985-90
À Aviação do Exército e àqueles
que labutaram, labutam e labutarão para o seu
desenvolvimento e grandeza.
Dedicatória

A o general de exército Leonidas Pires Gonçalves que, como


ministro do Exército, transformou em realidade o antigo
sonho da incorporação de meios aéreos ao Exército Brasileiro.

Ao general de exército Angelo Baratta Filho e ao general de


brigada Luiz Oscar Bulcão de Lima, os quais, respectivamente, como
3ª subchefe do Estado-Maior do Exército (EME) e diretor de Material
de Aviação do Exército, souberam interpretar com clareza e descortino
as diretrizes ministeriais e de seus superiores hierárquicos dotando a
Aviação do Exército da estrutura e dos equipamentos adequados.

Aos “asas”, pilotos, gerentes e mecânicos, que, de modo compe-


tente, permitem à Aviação do Exército manter-se como a maior ilha de
excelência do Exército Brasileiro.
Sumário
Apresentação ...................................................................................................... 05
Introdução ...................................................................................................... 19
Capítulo 1 – O título ...................................................................................... 33
Capítulo 2 – Breve relato da minha participação no processo de cria-
ção da Aviação do Exército ............................................... 39
Capítulo 3 – Experiência anterior ........................................................... 45
Capítulo 4 – Nossos chefes ......................................................................... 63
Capítulo 5 – Estrutura do Estado-Maior do Exército ...................... 77
Capítulo 6 – O Plano de Estruturação da Força Terrestre (FT-90).... 85
Capítulo 7 – Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército
no planejamento da FT-90 ............................................... 89
Capítulo 8 – A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do
Exército ..................................................................................... 101
Capítulo 9 – O Plano de Implantação da Aviação do Exército ..... 137
Capítulo 10 – A Comissão de Implantação da Aviação do Exército .... 161
Capítulo 11 – A Seção de Aviação do Exército ...................................... 167
Capítulo 12 – As bases da doutrina de emprego ................................. 195
Capítulo 13 – A elaboração dos Quadros de Organização ............... 203
Capítulo 14 – O processo de avaliação dos materiais de emprego
militar ...................................................................................... 207
Capítulo 15 – Os Requisitos Operacionais Básicos dos helicópteros de
manobra e de reconhecimento e ataque .................... 211
18 Aviação no Exército - uma visão histórica

Capítulo 16 – Apoio da Marinha e da Força Aérea ............................. 219


Capítulo 17 – Escolha do local de implantação da primeira unidade da
Aviação do Exército ............................................................. 223
Capítulo 18 – Seleção e especialização do pessoal ............................. 233
Capítulo 19 – A criação da Aviação do Exército e das organizações mi-
litares de aviação .................................................................. 305
Capítulo 20 – O processo de aquisição das aeronaves ..................... 329
Capítulo 21 – O edital de aquisição das aeronaves ............................ 333
Capítulo 22 – A concorrência internacional para aquisição das aerona-
ves ............................................................................................... 341
Capítulo 23 – O contrato ................................................................................ 371
Capítulo 24 – A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material
no Exterior .............................................................................. 401
Capítulo 25 – Cerimônias e visitas ............................................................ 487
Capítulo 26 – Conclusão da missão ........................................................... 499
Capítulo 27 – Necessidade do estabelecimento de um plano de carrei-
ra para a Aviação do Exército .......................................... 505
Capítulo 28 – As consequências da adoção da Aviação do Exército nas
atividades operacionais e administrativas do Exército
....................................................................................................... 509
Capítulo 29 – A história oral da Aviação do Exército ........................ 511
Capítulo 30 – Conclusão ................................................................................ 513
Anexos ...................................................................................................... 515
Cronologia da Aviação do Exército ............................................................... 591
Colaboradores ...................................................................................................... 595
Referências bibliográficas ................................................................................ 597
Introdução

Aviação no Exército – uma


visão particular

A Aviação do Exército (Av Ex) constitui-se em uma das mais


belas e importantes páginas da gloriosa história do Exército
Brasileiro. Até a decisão de escrever este livro a respeito das ações que culmi-
naram com sua criação, já fora do serviço ativo, me embalava diariamente o
orgulho de ter participado ativamente de todas as etapas de sua implantação.
As placas das unidades, as fotos, as maquetes de helicópteros e outras lem-
branças afixadas nas paredes do meu escritório alimentavam cotidianamente
a minha vibração de ter podido colaborar com a concretização de evento de
tanta importância para a Força Terrestre. Dividia esses sentimentos com os
mais próximos, e, a cada notícia sobre a Aviação do Exército, a saudade que
me provocava o afastamento aumentava. Acompanhava a evolução de lon-
ge até que, notadamente, um comentário realizado na internet, ao qual me
refiro posteriormente, me convenceu da necessidade de transmitir a título
de esclarecimento como se desenvolveram os fatos dos quais participei de
forma direta ou indireta. Chegara o momento. Não podia ficar calado. Alguém
precisava elucidar os acontecimentos que se desencadearam a partir de 1985
e que desembocaram na criação da Aviação do Exército.
20 Aviação no Exército - uma visão histórica

O propósito deste livro é transmitir a minha visão particular so-


bre a sequência das ações que culminaram com a implantação da Avia-
ção do Exército, a respeito da qual, ainda hoje, muito desconhecimento
existe, mesmo no seio da nossa Força.
Este projeto começou a tomar corpo quando resolvi escanear
todas as fotografias dos meus arquivos pessoais. Na ocasião, resolvi edi-
tá-las com o auxílio de um software que permite o sequenciamento das
fotos, a inclusão de legendas e a trilha sonora. Para evitar fazer apresen-
tações muito extensas, separei-as em grupos distintos, e a um conjunto
delas denominei “Minha trajetória na Aviação do Exército”.
Enquanto montava o que era inicialmente um projeto pesso-
al, me convencia cada vez mais da necessidade de que o nascimento da
Aviação do Exército, um evento de envergadura e significância, ficasse
indelevelmente registrado em documento que no futuro pudesse para
uns se constituir em fonte para pesquisa e ser manuseado com orgulho e
nostalgia por aqueles que fizeram parte dessa fase tão significativa para
o Exército Brasileiro. Esta história, no entanto, só poderia ser contada
com a colaboração daqueles que estiveram diretamente envolvidos na
implantação como componentes das Comissões de Implantação, da Seção
de Aviação e da Diretoria de Material de Aviação do Exército (DMAvEx),
no período considerado neste livro, de 1985 a 1991. Não era de meu
conhecimento que algum deles tivesse feito qualquer registro até o mo-
mento. Além do coronel Wanderley, sobre o qual falaremos dele mais à
frente, eu era o único a haver pertencido a todos os organismos referi-
dos anteriormente. Essa constatação tornou mais forte meu desejo de
escrever a respeito.
Um comentário feito na internet foi um dos grandes motivado-
res deste livro e me deixou extremamente agastado. Certo amigo, ao tecer
considerações no site de minha turma de formação na Academia Militar
das Agulhas Negras (AMAN) em relação ao processo de seleção dos aviões
de caça para aquisição pela Força Aérea Brasileira (FAB), afirmava, não
sei amparado em que dados, suposições ou informações de que a escolha
das aeronaves por aquela Força seria realizada “pelo mesmo critério po-
lítico que orientara a compra dos helicópteros para Aviação do Exército”.
Revoltado com a afirmação que me soou de total irresponsabilidade, pois
era feita em veículo exposto à consulta pública, respondi-lhe por e-mail
que sua manifestação em nenhum momento coincidia com a verdade, e
Introdução 21

que a comissão de licitação encarregada da seleção das aeronaves para


a Aviação do Exército, da qual fui parte integrante, jamais, em momento
algum, sofreu quaisquer pressões, de qualquer natureza, para escolha do
equipamento a ser adquirido para a nossa Aviação.
Na oportunidade, para evitar o estremecimento ou até o rom-
pimento de amizade antiga, julguei mais prudente não me estender em
discussões por meio da internet. Aliás, eu deveria é agradecer-lhe, pois
em razão de sua incontinência verbal despertou-se e cresceu em mim a
vontade e a inspiração para escrever este livro.
É extremamente difícil dialogar com pessoas que pretensiosamente
acreditam andar de “braços dados” com a verdade, mesmo que amparadas
em conhecimentos que passam ao largo da realidade dos fatos. Comentários
levianos ombreiam com as irresponsáveis “fofocas”, que são como plumas
de um travesseiro rasgado que se espalham ao sabor do vento forte. É quase
impossível recuperá-las na totalidade. As pessoas devem ser mais respon-
sáveis quando fazem eco de afirmações sobre as quais não prospectaram a
verdadeira realidade. Precisam conter as suas línguas, pois os catadores de
plumas terão que realizar um esforço inaudito para recompor o travesseiro.
É penosa a missão de lidar com “engenheiros de obras prontas”, aqueles que
não possuem a ousadia ou a coragem de enfrentar o desafio de construí-las,
mas são seus grandes e aplicados detratores. Essa é a tarefa a que me propo-
nho, ou seja, desfazer dúvidas, incompreensões e desconhecimento.
A história é pródiga de exemplos em que acontecimentos re-
ais ocorridos no passado são deturpados em sua realidade por gerações
posteriores por conveniência ou irresponsabilidade. Não posso permitir
que isso ocorra em relação à história do nascimento da Aviação do Exér-
cito. As pessoas quando falam devem ter o cuidado para suas palavras
serem mais efetivas do que o seu silêncio.
Esse fato me traz à lembrança a história da filha que tinha um
relacionamento difícil com o pai. Quase nunca conversavam, mas surgiu
a oportunidade de viajarem juntos de carro, e ela imaginou que seria
um bom momento para se aproximarem. Durante o trajeto, o pai, que
estava na direção, comentou sobre a sujeira e degradação de um córrego
que acompanhava a estrada. A garota olhou para o córrego que também
corria a seu lado e viu águas límpidas, um cenário maravilhoso, e teve a
certeza de que ela e o pai não tinham a mesma visão da vida. Seguiram
a viagem sem trocar mais palavras. Muitos anos depois, ela fez a mesma
22 Aviação no Exército - uma visão histórica

viagem, pela mesma estrada, dessa vez com uma amiga. Estando ago-
ra ao volante, ela se surpreendeu, pois do lado esquerdo o córrego era
realmente feio e poluído, como seu pai havia descrito, ao contrário do
belo córrego que ficava do lado direito da pista. E uma tristeza profunda
se abateu sobre ela por não ter levado em consideração o comentário
que seu pai, já falecido, fizera outrora. Infelizmente, episódios como esse
acontecem todo o dia. Via de regra, as pessoas só têm olhos para o que
mostra a sua janela, nunca a do outro. O que a gente vê é o que vale, não
importa que alguém bem perto esteja vendo algo diferente. A mesma es-
trada para uns é infinita; para outros, curta. Para uns, o pedágio sai caro;
para outros, não pesa no bolso. Boa parte dos brasileiros acredita que o
País está melhorando, enquanto a outra perdeu totalmente a esperan-
ça. Alguns celebram a tecnologia como um fator evolutivo da sociedade;
outros lamentam que as relações humanas estejam tão frias. Uns enxer-
gam nossa cultura estagnada; outros aplaudem a crescente diversidade.
Cada um gruda o nariz na sua janela, na sua própria paisagem. Antes
de as pessoas cunharem as suas verdades e emitirem as suas críticas, é
impositivo dar uma espiada pela janela do vizinho.

A fórmula da ignorância perpétua é estar sempre


satisfeito com suas próprias opiniões e contentar-se com seus
próprios conhecimentos.
Elbert Hubbard

Peço perdão e a compreensão dos leitores em relação ao meu


extenso desabafo. Entendam que é muito duro para um profissional
que se doou inteiramente ao seu trabalho, sacrificando a sua própria
família, vivendo inteiramente para cumprir sua missão com eficiência
e honestidade ouvir comentários maldosos e irresponsáveis. Falo por
mim e por uma plêiade de companheiros que participaram da missão
de implantar a Aviação do Exército com o mesmo denodo e acendrado
profissionalismo.
Em relação à influência política, gostaria de esclarecer que em
uma aquisição de material militar, em algumas ocasiões, os interesses
podem ir muito além da simples compra de um sistema de armas, e os
objetivos do Estado se sobreporem aos interesses puramente militares.
Nada obsta que haja o interesse conjuntural em uma transação dessa
Introdução 23

natureza em se alinhar a determinado país, grupo de países ou organi-


zação internacional, como parte de uma política ou estratégia benéfica
aos interesses nacionais. No entanto, esse não foi o nosso caso quando
adquirimos nossos helicópteros. Afirmamos naquela ocasião nossa to-
tal independência em relação às fontes de suprimento. Todavia, jamais
nos afastamos dos interesses do Brasil, fato comprovado pela inserção
no contrato de aquisição de cláusulas que beneficiaram o nosso país. A
interferência política jamais, em momento algum, na compra dos nossos
helicópteros foi sequer mencionada. O que prevaleceu foi, primeiramen-
te, o interesse do Exército, respaldado em um processo licitatório eivado
de clareza, transparência e da total visibilidade. A licitação foi realizada
na forma de técnica e preço na qual as condições de financiamento, de
contrapartida e de transferência de tecnologia, entre outros aspectos,
foram também avaliadas e impactaram o resultado final, não bastando a
análise das características das aeronaves.
Quando refutamos categoricamente o critério político, não
queremos dizer que ele não possa existir ou que seja marcado sempre
por interesses inconfessáveis ou escusos, a despeito dos inúmeros
exemplos de malversação que têm ocupado diariamente o noticiário da
imprensa brasileira. De todo modo, ele não esteve presente no processo
de aquisição dos helicópteros.
Há ainda a ressaltar entre outros estímulos que recebi para escre-
ver este livro minha lembrança do ocorrido quando, anos atrás, fui encarre-
gado de relatar o primeiro manual doutrinário do Exército Brasileiro sobre
Operações de Manutenção da Paz e me surpreendi com a inexistência de
documentos que registrassem a participação do Brasil em eventos ante-
riores dessa natureza. Era mais um importante fato sem registro. Julgo ser
meu dever impedir que tal acontecesse com nossa Aviação.
A conjunção de todas essas motivações e a necessidade de manter
viva a memória dos acontecimentos que proporcionaram o maior sopro de
modernidade experimentado pelo glorioso Exército Brasileiro me levaram a
encarar essa que eu considerava, ao mesmo tempo, uma prazerosa e hercú-
lea missão.
Movia-me também o sentimento de justiça ao me propor a home-
nagear todos aqueles que anonimamente e de forma pioneira deram o maior
de seus esforços como contribuição para a ascensão da Força Terrestre à tão
almejada terceira dimensão do campo de batalha, o espaço aéreo.
24 Aviação no Exército - uma visão histórica

Minha decisão suscitou-me igualmente um misto de arrependi-


mento e apreensão. Arrependimento por não tê-la tomado anteriormente.
Em diversas ocasiões na Seção de Aviação do Exército (Sec AvEx), sobre
a qual discorrerei mais tarde, manifestei a necessidade de que divulgás-
semos ao máximo as decisões tomadas e suas motivações, para que não
nos defrontássemos no futuro com comentários emitidos por pessoas
alheias ao assunto, amparadas em dados que não expressavam a verda-
de em torno dos acontecimentos. Infelizmente, na época, não o fizemos,
talvez pelo total envolvimento nas tarefas de implantação que nos exi-
giam o máximo de dedicação e atenção.
No momento em que eram divulgadas as primeiras medidas
destinadas à implantação da Aviação do Exército, era possível vislum-
brar três públicos distintos. O primeiro, formado por aqueles que, dota-
dos de visão prospectiva, postulava a ideia de o Exército se modernizar e
aprovava a decisão da criação de um vetor de modernidade como a Avia-
ção. O segundo, constituído pelos que, talvez por desinformação, falta
de ousadia, conformismo ou a reunião de todos esses fatores, achava
o investimento injustificado, pois “nos faltavam recursos para comprar
coturnos e cantis”. Eram os céticos, que duvidavam inclusive da capaci-
dade do Exército de implantar a Aviação. Na ocasião, denominávamos
esse posicionamento como a retrógrada “mentalidade da tampa de can-
til”. O terceiro grupo, a quem hoje, principalmente, endereço este livro,
era formado por aqueles que, longe dos centros de decisão, careciam de
informações esclarecedoras sobre o assunto. É sábia a afirmação de que
o desconhecimento é a principal ferramenta da incompreensão. Nesse
grupo, está incluído o público civil. À exceção dos políticos, por sua ob-
tusa visão da importância de Forças Armadas fortes como fiadoras do
desenvolvimento da nação, há uma significativa parcela da população
brasileira, ouso afirmar, uma grande maioria, conforme bem demons-
tram as pesquisas de opinião, que tem grande interesse pelas Forças Ar-
madas e delas se orgulha, a qual merece ser igualmente brindada com
tais esclarecimentos.
Não me propus a elaborar um livro de cunho estritamente des-
critivo, tornando-o um repositório de dados coligidos em publicações do
Exército. Mesmo que o quisesse não o conseguiria por questões que po-
derão ser compreendidas nos capítulos que se seguirão. Meu objetivo
é de expor, com a riqueza de detalhes que minha memória e a minha
Introdução 25

pesquisa permitam, como os fatos dos quais participei direta ou indi-


retamente efetivamente ocorreram. Para tal, procurei entrevistar, entre
outras pessoas, autoridades militares que foram responsáveis pela to-
mada das decisões cruciais para o sucesso da implantação da Aviação
do Exército e às quais os demais militares envolvidos no processo se
esforçaram em proporcionar assessoria eficiente e abalizada, sempre
respaldada em prolongados e minuciosos estudos.
Considerando que a empreitada seria extremamente difícil, mes-
mo sabendo que os eventos não se escondiam em um passado muito re-
moto, cedo concluí que seria imprescindível contar com a ajuda de antigos
companheiros para me apoiarem na árdua tarefa que me aguardava. Logo,
lembrei-me daqueles que comigo trabalharam, como o então major Wan-
derley de Castro, oficial jovem, extremamente dedicado e inteligente. Sua
competente atuação foi de grande valia para que as atribuições da Seção
de Aviação fossem integralmente cumpridas. Oriundo do Quadro de Ma-
terial Bélico e titular da Carteira de Logística da 3ª Subchefia do EME, meu
inesquecível companheiro, integrou as comissões nomeadas para estudar e
implantar a Aviação do Exército, a Seção de Aviação do Exército e a Direto-
ria de Material do Exército. Tive o prazer de tê-lo como companheiro des-
de os bancos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME).
Como titular da área de Logística da Seção de Aviação, sua atuação sempre
oportuna se fez sentir também nas demais áreas, com sugestões pertinen-
tes e inteligentes. O hoje coronel Wanderley foi o único integrante das co-
missões e da Seção de Aviação que teve a ventura de “pairar” sobre todas as
atividades da Aviação do Exército. Após sua saída da Seção de Aviação, foi
chefe da Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior
(COMFIREMEX) e, em seguida, comandante do Batalhão de Manutenção de
Aviação, em Taubaté. A ele se juntam os companheiros da DMAvEx, como os
então major Sergio Cerredelo Roxo e os capitães Roberto Rios, Hélio Gomes
Torres e Francisco Carlos Sardo. Este posteriormente foi designado para
integrar a COMFIREMEX. Seria indispensável igualmente o suporte do te-
nente-coronel Aviador José Albernaz, da FAB, piloto com mais de três mil
horas de voo em aeronaves de asas rotativas, designado pela sua Força para
assessorar a DMAvEx e, posteriormente, nomeado como o primeiro piloto
da COMFIREMEX, sobre a qual faremos referência oportunamente.
O coronel Valentim Ângelo Teixeira, integrante da comissão de
licitação, na qual se destacava como o oficial mais antigo, era outra fonte
26 Aviação no Exército - uma visão histórica

de conhecimentos de capital importância. Na qualidade de ordenador


de despesa do Departamento de Material Bélico (DMB), teve sob a sua
responsabilidade a elaboração do contrato financeiro e toda a gestão
econômico-financeira do contrato, missão de grande complexidade e
que envolvia enorme responsabilidade.
Infelizmente, não pude contar com a ajuda de meu chefe na Se-
ção de Aviação, o coronel João Luiz Saraiva de Castro, e do coronel Mar-
cello Rufino dos Santos, também integrantes pioneiros da Seção de Avia-
ção, que hoje, por motivo de falecimento, não mais se encontram entre
nós e nos trazem saudosa lembrança. Ambos, ainda em vida, foram pro-
movidos merecidamente ao generalato, chegando o general Marcello a
ser chefe do EME quando veio a óbito.
Não posso me esquecer do coronel Sergio Marcondes, que
substituiu o coronel Saraiva na chefia da Seção de Aviação. Sua atuação
destacada e dinâmica foi importante para o prosseguimento das ações
de implantação. O coronel Marcondes me proporcionou um depoimento
dos mais interessantes, que reproduzo ao longo deste livro.
Aos valorosos companheiros antes citados se agrega o major
Simões, primeiro piloto do Exército da COMFIREMEX, substituto do te-
nente-coronel Aviador Albernaz na função de piloto da comissão e o pri-
meiro piloto militar do Exército a realizar o recebimento de aeronaves
nos céus europeus.
Além dos companheiros já referidos, de grande importância se-
ria o auxílio do tenente-coronel Luis Azambuja Contreiras Rodrigues,
piloto pioneiro que, em uma iniciativa de cunho estritamente particular,
escreveu a História oral da Aviação do Exército. Para isso, realizou um
grande número de entrevistas e colheu considerável gama de depoi-
mentos de oficiais e sargentos que participaram de eventos significati-
vos da nossa Aviação. A colaboração do tenente-coronel Contreiras na
construção deste livro foi de grande importância. Ele se constituiu em
meu “renovador de esperança”. Sempre que retornei de minhas infru-
tíferas pesquisas nos arquivos de diversos órgãos que deviam ter guar-
dado a memória do evento que lançou o Exército no futuro, pude reavi-
var minha esperança abalada pelas pesquisas malsucedidas com novos
dados que o amigo Contreiras me colocava à disposição. O trabalho do
tenente-coronel Contreiras é fruto do seu amor pela Aviação do Exército
à qual tão bem serviu como piloto de helicóptero.
Introdução 27

Uma pessoa imprescindível para a elaboração destas linhas


à qual propositadamente não fiz referência a seu nome quando citei
ex-integrantes pioneiros dos organismos responsáveis pela criação da
Aviação do Exército foi o coronel Jomar do Nascimento Telles, merece-
dor, portanto, de uma referência à parte. Uma das memórias vivas de
nossa Aviação, foi o primeiro comandante do 1º Batalhão de Aviação
do Exército e gerente do projeto de construção de sua base física, além
de primeiro piloto da Aviação do Exército na era moderna. Voltaremos
a esse assunto mais tarde. Estudioso, perspicaz e de aguda inteligên-
cia, o coronel Telles reunia vasto conhecimento sobre todas as áreas
de emprego da Força Terrestre. Seu incessante trabalho de pesquisa
sobre o emprego e a evolução da organização e doutrina dos principais
exércitos do mundo colaborou para a apresentação pela 3ª Subchefia
da proposta de inclusão, no Plano de Reestruturação da Força Terres-
tre, a FT-90, da implantação de nossa Aviação de asas rotativas.
A despeito dos estímulos que recebi, meu desejo inicial seguiu
ainda sob a forma de intenção até a entabulação de uma interessante
conversa com o tenente-brigadeiro Cherubim Rosa Filho, um exemplo de
vitalidade do alto dos seus 84 anos. Meu companheiro de tênis no Clube
Naval, a todos impressionava com sua energia e simpatia. Ao falar sobre
minha experiência com a Aviação do Exército e confessar-lhe algumas
frustrações, ele me perguntou por que eu não escrevia algo a respeito. Era
o empurrão de que eu necessitava. Fui definitivamente impulsionado em
direção à tentativa de elaborar estas linhas que, não querendo tornar-me
repetitivo, servirão, a isso me proponho, para esclarecer os eventos que
marcaram a criação da Aviação do Exército. Senti-me à altura do desafio
por haver participado de todas as etapas referentes à “gestação”, ao seu
efetivo “nascimento” e aos “primeiros passos” da Aviação do Exército.
Neste introito, merece destaque a conversa que tive com um
oficial-general sobre minha determinação de escrever este livro, o obje-
tivo ao qual me havia proposto e minhas motivações. Ao comentar sobre
o estímulo inicial provocado pelo comentário sobre o pretenso “caráter
político” da nossa aquisição, ele insinuou que “a comissão só não sofrera
pressão porque o resultado se encaminhara em direção à empresa que
teria sido adrede escolhida [...]”. Acrescentou que “[...] caso contrário, a
pressão teria ocorrido”. Tal afirmação, vinda de um oficial-general, me
deixou ao mesmo tempo surpreso, chocado, consternado e estupefato.
28 Aviação no Exército - uma visão histórica

Sempre tive, reconheço, um comportamento muito apaixonado e impul-


sivo na defesa das minhas convicções. Essa faceta do meu caráter me
causou algumas situações embaraçosas. No entanto, o passar dos anos,
se não me transformou totalmente, pelo menos me permitiu refrear as
reações. Tive que recorrer ao meu autocontrole para não discordar, com
a veemência que se impunha. Era mais um motivo para prosseguir com
minha intenção. É um despropósito que alguém possa pensar que uma
equipe de oficiais extremamente profissionais, compromissados unica-
mente com os interesses do Exército, fosse envolvida, sem o saber, em
um jogo de cartas marcadas. O ocorrido serve para ilustrar o grau de
desconhecimento nos diversos níveis sobre o assunto.
A afirmação do oficial-general longe de arrefecer meu entusias-
mo, ao contrário, me trouxe maior emulação e a certeza de que precisa-
va, imperativamente, atingir a meta a que me propus de divulgar todo
o conhecimento que me fosse possível acessar no recôndito de minha
memória e reunir em outras fontes sobre o processo que se desenvolveu
desde a decisão de criação da Aviação do Exército.
Durante o processo de compra dos helicópteros, no qual me fiz
presente em todas as etapas, só repassei informações ao meu chefe ime-
diato, o general Luiz Oscar Bulcão de Lima, então diretor da DMAvEx, ór-
gão encarregado do processo de aquisição das aeronaves, que jamais fez
quaisquer insinuações a respeito de alterações no curso de nossas ações
para beneficiar quem quer que fosse. Conhecendo bem a personalidade
do general Bulcão, tenho a absoluta certeza de que ele não admitiria e
repeliria com incontida veemência qualquer interferência desse teor no
trabalho que realizava sua diretoria.
Antes de prosseguir, me parece oportuno reproduzir algumas
palavras do coronel Telles, em entrevista a um informativo que circula
no Comando da Aviação do Exército. Indagado sobre seu estado de espí-
rito ao ver a Aviação do Exército nos dias atuais, respondeu:

O primeiro sentimento é de grande orgulho e de estar inclu-


ído entre companheiros da mais elevada estirpe do nosso
Exército que, como pioneiros, tornaram realidade o sonho
da implantação da Aviação do Exército.
A segunda sensação é a de que os primeiros passos são
sempre os mais difíceis, mas de nada adiantaria ficarmos
Introdução 29

somente neles. A evolução se faz necessária e é isto que vemos


em nossa Aviação, o progresso e a modernização em todas as
áreas, seja na de instrução, na de logística e nas de operações.
Tudo nos permite dizer que a nossa Aviação está fadada a per-
manecer em contínua evolução, e, em dias não muito distan-
tes, chegarão novos helicópteros de transporte, de ataque e
as aeronaves de asas fixas, se constituindo em novos desafios
que, como ontem e hoje, sempre serão vencidos.
Resumindo numa só frase a resposta para esta questão: o
Exército Brasileiro efetivamente se alçou à terceira dimen-
são do campo de batalha.

Busquei apresentar os fatos de acordo com uma sequência cro-


nológica de modo a permitir ao conhecer como eles se sucederam. Para
tal, buscaremos tratá-los escalonados no tempo, fixando com a precisão
possível a data ou o período em que eles ocorreram. Ao final do livro
poderá ser encontrado um resumo cronológico dos eventos ocorridos
entre 1985 e 1991.
Essa empreitada me desperta os mesmos sentimentos e o en-
gajamento com os quais cumpria as minhas atividades na 3ª Subche-
fia do EME. Desde a minha transferência para lá, em 1984, foi a única
subchefia onde servi e desempenhei, em épocas distintas, as funções de
adjunto da Carteira de Cavalaria da Seção de Doutrina, adjunto da Seção
de Aviação, chefe da Seção de Doutrina e assistente da subchefia. As inú-
meras e diárias solicitações que envolviam decisões importantes e que
demandavam muita pesquisa e um esforço criativo constante impediam
que deixássemos nossas preocupações na subchefia ao término da expe-
diente. O afã de bem cumprir nossa missão nos levava a carregar nossas
inquietações para todo o lugar. Lembro-me de que em certa ocasião ao
retornar a pé do Hospital da Guarnição, onde fora a uma consulta médi-
ca, quando passava em frente ao Clube Militar do Setor Militar Urbano,
materializou-se em minha mente a solução para um dos problemas que
me preocupava havia dias. De imediato, procurei algo no qual pudesse
tomar nota antes que a solução me fugisse. Encontrei um maço de cigar-
ros usado, jogado ao chão e, na parte interior, fiz as observações que me
permitiram montar um dos quebra-cabeças que me atormentavam. Esse
era o espírito dominante em todos os companheiros que colaboraram na
30 Aviação no Exército - uma visão histórica

implantação da nossa Aviação do Exército e que me acompanhou em


mais esta laboriosa jornada, a total entrega à missão.
Como o antigo anseio de implantar a Aviação do Exército, que mo-
tivou contínuos planejamentos cuja concretização foi repetidamente poster-
gada ao longo dos anos, tornou-se realidade em 1985, a despeito de toda a
incredulidade, das dificuldades e das múltiplas reações?
Como uma equipe de oficiais, sem experiência pregressa na
atividade, pôde planejar com tanto acerto e sucesso a implantação da
Aviação do Exército?
Que motivou as decisões adotadas na implantação?
Como ocorreu o processo de aquisição das aeronaves?
Como a DMAvEx pôde desenvolver com tanta eficiência o processo
de aquisição de aeronaves?
Quais as atividades desenvolvidas durante o processo de recebi-
mento das aeronaves?
Esperamos poder responder e esclarecer essas e outras questões
que certamente povoam as dúvidas de todos aqueles com interesse no pro-
cesso evolutivo da nossa Força.
Quando estive em Taubaté procurando alguns antigos documen-
tos que pudessem me fornecer novos dados, tive um encontro com o coro-
nel Telles, dileto amigo e grande pioneiro da Aviação do Exército. Em de-
terminado momento de nossa conversa, ele me indagou: “Silva Maia, como
é que um grupo tão pequeno como o nosso conseguiu fazer isso tudo?” Em
seguida, mais uma vez questionou: “[...] aliás, como é que nós arranjamos
tempo para fazer tudo aquilo?” Continuando disse: “[...] fico até arrepia-
do [mostrou os braços] quando falo sobre tudo o que conseguimos fazer.”
Esse é o sentimento de todos nós que demos nossa parcela de esforço para
transformar a nossa Aviação na insofismável realidade que ela é hoje.
Ao final deste livro, me permitirei consagrar alguns capítulos
para a apresentação de ideias, a discussão de alguns pontos e a apresen-
tação de sugestões que visam colaborar para, assim espero, a evolução da
nossa Aviação.
Em verdade, não me impulsiona o desejo de escrever um livro. Não
me considero um escritor. Precisaria de intensa pesquisa e muita experiência
para me incluir nessa valorosa categoria de irradiadores do conhecimento.
Além do mais, esse é um assunto sobre o qual ainda nada se escreveu. As-
sim, se me dispusesse a preencher o primeiro requisito do escritor, a intensa
Introdução 31

pesquisa, não conseguiria fazê-lo pelo simples fato de que não há fontes nas
quais se possa pesquisar uma história que até agora não foi contada. Além
disso, os atores diretamente envolvidos em todo o processo ainda em vida
são poucos. O que me move ao tecer estas linhas, reafirmo, é colaborar para
divulgar fatos que não foram objeto de maior divulgação e, dessa forma, in-
seri-los na história da nossa instituição.
A despeito de um longo período na 3ª Subchefia do EME, onde,
como integrante da Seção de Evolução da Doutrina, tive a oportunida-
de de revisar e atualizar manuais, traduzir documentos doutrinários
de exércitos estrangeiros, consultar grande quantidade de publicações
internacionais, elaborar propostas de Requisitos Operacionais Básicos
(ROB), realizar a relatoria de manuais e outras atividades que me exi-
giam uma correta redação, não me considero em nenhuma hipótese
como um escritor, volto a frisar. Logo, fruto de minha inexperiência e
entusiasmo, os leitores se depararão com redundâncias e alguns textos
nos quais a clareza e a concisão poderiam ter sido mais bem esgrimidas.
Perdoem-me de antemão, e, de pronto, agradeço a compreensão.
Ao longo de minha narrativa, mesmo correndo o risco de tor-
nar-me repetitivo quando me referir a alguma organização militar vou
citá-la, em grande parte das ocasiões, por extenso restringindo ao máxi-
mo a utilização de siglas que levam o leitor, principalmente aqueles não
acostumados à terminologia militar, à incômoda necessidade de inter-
romper a leitura para dirigir-se a um glossário. É algo que me incomoda
quando leio um livro e quero poupar os leitores, na medida do possível,
dessa desagradável tarefa.

A história é êmulo do tempo, repositório de fatos,


testemunha do passado, exemplo e aviso do presente, adver-
tência do porvir.
Miguel de Cervantes

Destaco que não me move o desejo de justificar nossas ações. Não


há absolutamente nada a justificar. Atenho-me a divulgar os fatos conforme
os vivi ou dos quais tomei conhecimento por fontes inquestionáveis que de-
les participaram. Durante o processo de implantação, nossas decisões, to-
das colegiadas, foram consequência de análise acurada dos conhecimentos
disponíveis, do exame minucioso das variáveis intervenientes e, somente
32 Aviação no Exército - uma visão histórica

após esse exaustivo exercício mental, transformadas em parecer que ins-


truíam o processo decisório dos nossos chefes, a quem, em última instância,
cabia a tomada da decisão final.
Esclarecer e não justificar é o meu escopo.
O meu livro é, simplesmente, o testemunho daquele que teve
a ventura de viver intensamente como ator uma das mais belas e im-
portantes páginas da gloriosa história do nosso Exército, a criação da
Aviação do Exército.
Antes de prosseguir, gostaria de me dirigir em particular aos es-
pecialistas em Aviação e, mais diretamente, aos nobres companheiros da
nossa valorosa Aviação do Exército. Por favor, não esqueçam que as consi-
derações contidas neste livro, que alicerçaram as decisões no processo de
implantação da nossa Aviação, foram construídas a partir dos conhecimen-
tos disponíveis há mais de 30 anos e podem ter certeza de que na ocasião os
prospectamos à exaustão. Naturalmente, é de se esperar que o pensamento
militar, particularmente em relação à doutrina de emprego e às caracte-
rísticas mais desejáveis para as aeronaves, tenha evoluído ao longo desse
período e provocado algumas mudanças no campo operacional, com reper-
cussão nas demais áreas. Certamente, se o momento de criação da nossa
Aviação fosse hoje, novas condicionantes iriam impactar as decisões. Sei
que alguns companheiros, do alto da vasta experiência reunida após longos
anos de serviços à Aviação do Exército, possam se sentir impelidos a ques-
tionar alguns conceitos aqui expostos que eram válidos na época. Se essa
situação ocorrer, peço se lembrarem de que o testemunho o qual aqui dou
envolve fatos ocorridos em um passado longínquo.
Em pouco tempo, nós, os pioneiros dos pioneiros, deixamos de ser
os que “não sabíamos nada” para os que “sabíamos muito”, graças a mui-
tíssimo estudo, esforço e dedicação. Permanecemos sempre plenamente
conscientes da transcendental importância da missão que recebemos.
Capítulo 1

O título

P or incrível que possa parecer, a definição do título deste


livro ocupou um lugar importante em minhas preocupa-
ções. Por diversas vezes, me senti instado a alterá-lo na tentativa de limi-
tar o leque das minhas pesquisas e de que ele expressasse exatamente
o meu desiderato. Meu desejo era que o título refletisse de modo incon-
teste que esta obra, se posso assim chamá-la, era de cunho estritamente
pessoal e apresentava os fatos vistos sob a minha óptica e daqueles aos
quais entrevistei.
Poderia manter a denominação de meu projeto pessoal, Mi-
nha trajetória na Aviação do Exército; no entanto, apesar de este li-
vro ser de cunho pessoal, não é de caráter personalista. Houve muito
mais gente envolvida na história; logo, precisava encontrar algo mais
abrangente.
Certo dia, ao fazer minha corrida matinal, ocasião em que os
pensamentos me fluem com maior nitidez, me veio a ideia de intitulá-lo A
história da Aviação no Exército, sem me referir à caracterização do seu
surgimento – criação ou recriação. Esse título me possibilitaria solu-
cionar duas questões. A primeira seria de permitir aventurar-me pelo
passado reunindo em um só documento informações esparsas que
encontrei sobre a outrora Aviação Militar, sem violentar o escopo do
livro, e sobre o período compreendido entre 1985 e 1991, definidor da
34 Aviação no Exército - uma visão histórica

minha participação no processo de implantação; a segunda se refere à


utilização das palavras “criação ou recriação”. Ao longo das entrevistas
que realizei, fui questionado a respeito do vocábulo a ser adotado em
relação à fase atual da Aviação no Exército. O termo recriação não é
de modo algum aceito por aqueles que não veem uma ligação entre a
Aviação Militar e a Aviação do Exército. Não gostaria de me imiscuir
nessa discussão; contudo, reconheço que ela não é exclusivamente
de caráter semântico nem pode ser encarada como perfunctória. Não
adotando quaisquer dos termos no título, me dispensaria de firmar
uma posição a respeito. Volto a discorrer sobre o tema oportunamente
sem, no entanto, posicionar-me firmemente. Farei algumas considera-
ções sem emitir um “ponto de vista” com o único objetivo de estimular
o debate sobre a existência ou não de um elo entre a Aviação Militar
e a Aviação do Exército. Queria me afastar dessas discussões; todavia,
algumas argumentações pertinentes e cabíveis me fizeram modificar
meu juízo sobre o tema.
Em consequência, a abordagem da primeira fase da Aviação Mi-
litar será um pouco mais abrangente do que propúnhamos originalmen-
te. Sobre a segunda fase, a Aviação do Exército, o fulcro do nosso livro,
nosso objetivo permanece inalterado.
Não sei se ao longo de uma produção de caráter literário
ocorre sempre ao autor a ideia de modificar o título do texto já elabo-
rado. Como não me disponho a ser um literato e continuo fazendo as
minhas corridas diárias, mais uma vez decidi alterar a “razão social
do livro” e adotei o título de A história da Aviação do Exército: uma
visão particular. A expressão “A história da Aviação no Exército” con-
tinuava a permitir que me aventurasse pelos dois períodos retror-
referidos, Aviação Militar e Aviação do Exército. A “visão particular”
deixaria claro que outros “olhares” pudessem surgir sobre o assunto,
produzidos por aqueles que, como eu, estiveram envolvidos nas ati-
vidades de implantação da Aviação do Exército no espaço de tempo a
que me propus retratar.
Posteriormente, ainda não satisfeito com o título, achei de bom al-
vitre modificá-lo mais uma vez e retirei o termo “história”, de modo a carac-
terizar com maior ênfase como um relato da minha experiência, exclusiva-
mente. A nova denominação de todo modo não cercearia a minha incursão
a respeito de determinados temas que não vivi diretamente e sobre os quais
O título 35

me concedi o direito de abordá-los. Dessa forma, chegamos ao título A Avia-


ção do Exército: uma visão particular.
Achava que não chegaria a uma conclusão sobre o título mais
apropriado para o livro e tinha certeza de que ao publicá-lo não teria
alcançado a referência mais correta. Todavia, o mais importante são os
fatos nele narrados.
Bem; para que os leitores tenham uma ideia de como a defi-
nição do título deste livro me “assombrou” durante muito tempo, vou
manter o texto anterior deste capítulo a despeito do que passo a narrar.
Antes de concluí-lo, enviei a cópia para as pessoas que como
eu estiveram envolvidas na implantação, entre elas o general Leonidas,
a quem considero o grande responsável pela concretização do sonho de
todos nós. Tinha dito a ele que antes de concluí-lo lhe submeteria o livro
e só iniciaria gestões para a publicação no caso da aprovação dele. Em
12 de novembro de 2012, recebi uma ligação do coronel Seixas Marques,
o qual afirmava que o general gostaria de falar comigo. Acrescentou que
ele havia gostado do livro, e isso me tirou um enorme peso das costas.
Ao conversar com o general Leonidas, tendo ele repetido o mesmo juízo
sobre o livro, como adiantara o coronel Seixas Marques, ele só fez uma
ressalva: “Silva Maia, você está sendo muito modesto. O seu livro não é
uma visão particular, e sim uma visão histórica da Aviação do Exército.”
Após agradecer o general as referências favoráveis ao livro, so-
licitei que ele fizesse uma sugestão: “Que o Sr. sugere?”
Ele respondeu: “Aviação do Exército: uma visão histórica.”
Bem; uma sugestão do nosso grande ministro não pode deixar
de ser acatada.
Aqui se encerra a discussão sobre o título.

A pesquisa
Resolvi abrir este tópico exclusivamente para abordar minha
sofrida busca por documentos que me proporcionassem maiores
informações sobre a implantação, considerando que minha memória,
ainda que em bom estado a despeito de meus 68 anos, não teria a
capacidade de armazenar todos os eventos ocorridos ao longo de um
processo de praticamente sete anos, entre 1985 e 1991. Além disso, os
36 Aviação no Exército - uma visão histórica

fatos ocorreram já passados mais de 24 anos. A cada órgão consultado,


a cada contato infrutífero, maior era meu inconformismo pelo pouco
cuidado que temos com a preservação da nossa memória histórica.
Hoje, admiro ainda mais o trabalho dos historiadores na bus-
ca de conhecimentos que, em muitas das ocasiões, padecem da mesma
falta de informações com as quais também me deparei. Incluo-me igual-
mente no universo daqueles que vivendo os eventos importantes dei-
xam de pensar no futuro, antevendo que as ocorrências hodiernas são a
fonte da história do amanhã. No entanto, achava que em órgãos como o
EME, origem dos mais importantes projetos da Força, e no antigo Depar-
tamento de Material Bélico, hoje Comando Logístico (COLOG), poderia
encontrar o material de que precisava. Ledo engano.

O passado não é aquilo que passa, é aquilo que


fica do que passou.
Alceu Amoroso Lima

As denominadas “memórias”, documentos internos do EME,


que elaborávamos justamente para não perder a lembrança das razões
que ampararam as decisões sobre os diversos assuntos, no que concerne
àqueles referentes à Aviação do Exército, não mais existem. Não as en-
contrei. Não consegui igualmente localizar o acervo documental da Se-
ção de Aviação do Exército referentemente ao período de 1985 a 1991.
No COLOG e na DMAvEx, não achei o edital que estabeleceu as
condições para a primeira, friso, a primeira concorrência internacio-
nal realizada pelo Departamento de Material Bélico. Felizmente, mais
tarde, por ocasião de minha visita ao general Bulcão, em Porto Ale-
gre, tive a agradável surpresa de constatar que ele conservava o único
exemplar existente.
Faço agora a mea culpa. Não tivemos, absorvidos pelas enormes
responsabilidades que pesavam sobre nossos ombros, os integrantes das
comissões (para Estudar a Implantação e a de Implantação) e da Seção
de Aviação do Exército, a preocupação de registrar todos os eventos
ocorridos durante o processo de implantação. Além da falta de cultura
nesse sentido, nenhuma determinação ou preocupação nos foi transmiti-
da. Lamento que não houvesse entre nós um cronista do cotidiano. Hoje,
eu não precisaria promover esse resgate.
O título 37

Fica aqui registrada a sugestão para o estabelecimento de nor-


mas a fim de que os documentos referentes a projetos que fogem à roti-
na diária, de importância para o Exército, sejam conservados, indepen-
dentemente de prazo, até seus registros em publicações permanentes,
no intuito de permitirem consulta futura. Hoje, o Exército participa com
extremo sucesso de Operações de Manutenção da Paz. Que se guarde a
memória desses eventos para que possa se constituir em objeto de pes-
quisa pelos interessados. Certamente, ao menos, servirão de subsídio
para a elaboração e desenvolvimento da doutrina de emprego.
Quando estive na 3ª Subchefia procurando documentos anti-
gos sobre a implantação da Aviação do Exército, os quais não encontrei,
pude constatar que, ao contrário do que ocorria “no meu tempo”,
todos os oficiais possuem um computador à disposição, o que facilitará
sobremaneira o arquivamento das informações.
Fica aqui meu apelo e minha sugestão. O Exército precisa se
preocupar em escrever o registro do presente para que os pesquisado-
res e historiadores no futuro possam resgatar a história do passado.
Para evitar que se percam, como ocorreu com a maior parte
dos documentos que tratavam da implantação da Aviação do Exército,
vamos reproduzir alguns que tivemos a ventura de encontrar, no corpo
do livro ou sob a forma de anexos. Na maior parte, eram documentos
ostensivos, e, aqueles que receberam algum grau de sigilo, o tempo e a
legislação pertinente em vigor já trataram de descaracterizá-los como
tal, o que afasta obstáculos à sua publicação.
Capítulo 2

Breve relato da minha partici-


pação no processo de criação da
Aviação do Exército

M inha participação na implantação da Aviação do Exér-


cito iniciou-se em 1985. Após a inclusão da sua criação
no planejamento da FT-90 (Força Terrestre para os anos 1990), recebi a
incumbência, como titular da carteira de Cavalaria da Seção de Doutri-
na, da 3ª Subchefia do EME, de elaborar o Quadro de Organização (QO)
para as unidades de aviação previstas, visando ao cálculo das necessida-
des em pessoal pela 4ª Subchefia, também do EME.
Na ocasião, a eficiência do helicóptero como meio de interven-
ção direta no combate terrestre, proporcionando significativo aumento
na amplitude de atuação da Força Terrestre, já era sobejamente compro-
vada. A nova arma permitia aos exércitos intervirem independentemen-
te no baixo espaço aéreo e comportava-se como uma notável multiplica-
dora da capacidade de combate das tropas em terra.
No planejamento da FT-90, era prevista a criação de uma orga-
nização militar de aviação, de valor subunidade, em cada Comando Mi-
litar de Área. Essa concepção seria alterada a posteriori como veremos
oportunamente. A missão de elaborar uma proposta de QO me levou a
estudar profundamente as aviações existentes nos exércitos do mundo e
40 Aviação no Exército - uma visão histórica

suas concepções de emprego, considerando que o embasamento doutri-


nário era de fundamental importância para a definição da organização
da subunidade. Sobre esse assunto, teceremos novas considerações no
capítulo sobre a doutrina de emprego.
Posteriormente, em 22 de setembro de 1985, fui nomeado
para a Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército.
Após a conclusão e aprovação do Plano de Implantação, em 25 de feve-
reiro de 1986, fui designado para integrar a Comissão de Implantação
da Aviação do Exército. Depois, fui incorporado à nascente Seção de
Aviação do Exército, na 3ª Subchefia do EME, que assumiu os encargos
da Comissão de Implantação e a quem coube efetivamente implemen-
tar as providências, as medidas concretas, para a definitiva implanta-
ção da Aviação do Exército.
Em 25 de junho de 1987, o ministro do Exército, atendendo
à proposta do EME me autorizou a realizar o curso de piloto de heli-
cóptero para a Aviação do Exército, no segundo semestre daquele ano,
com duração de dois meses, na “Prática-Escola de Piloto de Helicópte-
ro Ltda.”, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Determinava que eu fosse
considerado em missão militar durante o referido curso. Em 7 de outu-
bro de 1987, fui julgado apto no exame de saúde realizado pela Junta
Especial do Centro de Medicina Aeroespacial, da FAB. Após o curso, me
aguardava a honrosa missão de ser o primeiro subcomandante do 1º
Batalhão de Aviação do Exército (1º BAvEx), sob o comando do coronel
Telles. Transbordava de orgulho e vibração. Infelizmente por um lado e
felizmente por outro, a fratura de uma perna durante um jogo de fute-
bol, além de me tirar a oportunidade de ser o segundo em comando do
1º BAvEx, acabou redirecionando minha trajetória na Aviação do Exér-
cito para a área de material, que abracei com o mesmo entusiasmo e vi-
bração e que me conduziu ao desempenho de missão no exterior, sonho
acalentado por todo o militar da Força Terrestre e, lamentavelmente,
privilégio de poucos.
A criação do núcleo da DMAvEx e o início dos trabalhos desti-
nados à aquisição das aeronaves exigiram a presença de representante
do EME para prestar o apoio que se fizesse necessário por aquele órgão.
Logo, antes de integrá-la, fui designado como oficial de ligação junto ao
Nu DMAvEx. Meu envolvimento no processo de aquisição das aerona-
ves prosseguiu com a minha posterior transferência para aquele órgão
Breve relato da minha participação no processo de criação da Aviação do Exército 41

de apoio, em 24 de março de 1988. Nesse período, participei da equipe


que elaborou o edital para a concorrência internacional, que julgou as
propostas das empresas concorrentes e realizou as discussões com a
empresa vencedora, ao cabo das quais, foi elaborado o contrato de aqui-
sição das aeronaves. Ao término das negociações para a elaboração do
contrato, fui nomeado chefe da recém-criada COMFIREMEX, na qual
passei 31 meses.
Discorrerei, entre outros assuntos, sobre a elaboração do Plano
de Implantação e dos Quadros de Organização, a definição das premis-
sas doutrinárias que embasaram a Aviação do Exército, suas missões e
objetivos, a elaboração dos requisitos operacionais dos helicópteros de
manobra e de reconhecimento e ataque, o processo de aquisição das ae-
ronaves envolvendo a elaboração do edital, o julgamento das propostas
e a redação do contrato com a empresa vencedora e a atuação da COM-
FIREMEX na recepção do objeto do contrato.
Reuni alguns depoimentos de integrantes das diversas comis-
sões e da equipe que participou das ações que culminaram com a cele-
bração do contrato de aquisição dos helicópteros. Só lamento não ter
conseguido contatar a maior parte dos companheiros com os quais vivi
essa incrível experiência.
Vale a pena aproveitar a oportunidade, e vou fazê-lo sempre
que possível, para ressaltar o acendrado espírito de colaboração e o alto
grau de profissionalismo demonstrado pelos companheiros das Forças
coirmãs na construção dos alicerces da Aviação do Exército.
Ao concluir este livro, espero ter alcançado o objetivo de conce-
der, em particular àqueles que “ouviram falar” e aos que repetem argu-
mentos infundados informações que lhes permitam avaliar o excepcio-
nal trabalho realizado por todos os que, como eu, estiveram envolvidos
de corpo e alma com a criação do grande sopro de modernidade experi-
mentado pelo Exército Brasileiro na era moderna.
Meu trabalho na Aviação do Exército foi o mais instigante e o
mais gratificante que realizei em toda a minha carreira militar. Ocupou
desde o início todos os meus dias, povoou meus sonhos e era persona-
gem contínuo de minhas preocupações. Noite e dia, dei todo o meu em-
penho e esforço com o objetivo de colaborar para que as decisões ado-
tadas dentro de minha esfera de atribuições fossem as mais acertadas.
Esse também era o espírito de todos os companheiros que estiveram
42 Aviação no Exército - uma visão histórica

envolvidos na implantação. Pugnei diariamente para oferecer aos meus


chefes os conhecimentos necessários a fim de respaldar a correção e
lisura do processo decisório. Lutei incansavelmente pelos meus pontos
de vista, sempre embasados em judicioso estudo do assunto, não dei-
xando de conscientemente desistir deles após a decisão superior.
Antes de tudo, é importante ter sempre em mente que a im-
plantação da Aviação do Exército é resultado do vislumbre de chefes
militares que estavam à frente de seu tempo, chefes conscientes da ne-
cessidade de modernização da Força Terrestre, chefes de olhos fitos no
futuro, como o general Leonidas Pires Gonçalves, ministro do Exército, o
general Angelo Baratta Filho, 3º subchefe do EME, e o general Luiz Oscar
Bulcão de Lima, primeiro diretor da DMAvEx, sobre os quais teceremos
algumas considerações mais à frente.
A decisão do general Leonidas de implantar a Aviação do Exér-
cito abriu um novo caminho que não foi fácil percorrer; inúmeros foram
os obstáculos que se interpuseram; dura foi a caminhada. A despeito de
tudo, conseguimos ultrapassar todas as vicissitudes com alegria, entu-
siasmo, vibração e o enorme prazer de poder colaborar com a moderni-
zação da Força. Estávamos trabalhando para criar a Aviação do Exército
com motivação renovada pelo prazeroso desafio. Atiramo-nos às nossas
tarefas com energia redobrada; nada nos faria fraquejar ou esmorecer.
Esse era o estado de espírito reinante entre aqueles sobre cujos ombros
se colocou o “agradável fardo” de estruturar, de dar corpo, a Aviação do
nosso Exército.
Durante a carreira do oficial do Exército, dois cursos são funda-
mentais para a ascensão aos postos mais elevados da hierarquia militar,
o da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), para oficiais capitães,
de realização compulsória, e o da ECEME, cujo acesso ocorre mediante
concurso. A quantidade de documentos e de manuais que exige os dois
cursos obriga os alunos, a partir da EsAO, a incorporarem o hábito de se
utilizarem de maleta popularmente de modelo conhecido como “007”.
Esses cursos são vistos como burocratizantes à medida que a partir de-
les os militares começam a se afastar das atividades de adestramento da
tropa e passam, em particular após a ECEME, a desempenhar cargos na
administração militar. A maleta é um símbolo dessa mudança de status
e se torna um item obrigatório do uniforme do oficial. Fiz essa sumária
digressão para usar uma figura literária que me pareceu apropriada para
Breve relato da minha participação no processo de criação da Aviação do Exército 43

caracterizar o espírito de todos nós, integrantes da primeira comissão


ao recebermos nossa missão. “Nossas maletas ‘007’, longe de se enche-
rem de temores e de preocupações em razão da complexidade como se
afigurava nossa missão, estavam plenas de entusiasmo e certeza no su-
cesso da empreitada que passávamos a realizar.”
Capítulo 3

Experiência anterior

Generalidades

A o definir o escopo e a metodologia a seguir, inicialmente,


tinha decidido que a alusão à história passada da utiliza-
ção de meios aéreos pelo Exército seria objeto de referência sucinta, en
passant. Não pretendia me transformar em um historiador ou historió-
grafo. Considerava que estava além de meu propósito embrenhar-me com
profundidade sobre esse assunto. No entanto, ao longo da pesquisa que
realizei, encontrei diversas referências sobre o tema em fontes distintas e
achei que estaria prestando uma colaboração importante, em particular
àqueles que desejam se aprofundar sobre o assunto, ao reuni-las em um
único documento. De mais a mais, ao longo de minhas entrevistas para a
elaboração desta narrativa, deparei-me com depoimentos que me indu-
ziram a lançar dúvidas entre aqueles que estabelecem uma ligação entre
a Aviação Militar e a Aviação do Exército, fato refutado por outros que as
encaram como eventos singulares e distintos. A discordância atinge inclu-
sive o reconhecimento do tenente Ricardo Kirk como patrono da Aviação
do Exército. Ele faleceu em acidente com a aeronave que pilotava durante
a campanha da Guerra do Contestado, conforme veremos neste capítulo.
Por essa razão, decidi denominar o capítulo de “Experiência anterior”, e
não “Antecedentes históricos”, como o nominara originalmente.
46 Aviação no Exército - uma visão histórica

Como dizia Winston Churchill: “Em história, um dos fatores


mais traiçoeiros é a tendência dos historiadores de construir uma histó-
ria exclusivamente fora dos registros a que tiveram acesso.”
Parafraseando Michael Dobbs em a “Vitória de Churchill”: “A
história é muito mais que uma reunião de estatísticas e datas; é a inte-
ração de um número sem conta de pessoas movidas pela paixão, pelas
ambições, pela razão e muitos outros sentimentos.”
Reproduzo ao longo deste capítulo as informações que pude
acessar, esperando que elas se revistam de interesse para os estudio-
sos. O capítulo se limitará a uma abordagem dos principais eventos
ocorridos durante a existência da Aviação Militar que certamente não
esgotarão o assunto.

Os antecedentes
Segundo as fontes consultadas, as primeiras utilizações de
meios aéreos para fins militares no Brasil teriam origem nos campos de
batalha de Humaitá e Curupaiti, na Guerra da Tríplice Aliança.
Ao patrono do Exército, Duque de Caxias, coube o pioneirismo
de empregar balões cativos em operações militares para observação das
linhas inimigas. Após a guerra, foi criado o Serviço de Aerostação Militar,
cujas atividades se desenvolveram por mais 40 anos.
Em 1910, a aviação já era uma atividade largamente difundida
na Europa. Nesse ano, fábricas francesas aperfeiçoaram seus aeroplanos
e os vendiam a particulares. Paralelamente, dois cursos de pilotagem
destacavam-se: na École d’Aviation Farman, na cidade de Étampes, ao
norte da França, e na de Blériot. Elas se limitavam à formação de pilotos
civis.
No Brasil, a aviação começava a dar seus primeiros passos. Em
1911, alguns estrangeiros já se exibiam nos céus do País. Parte dessas
apresentações aéreas era incentivada pelo recém-criado jornal carioca
A Noite. Foi por meio desse vespertino que se idealizou o Aeroclube Bra-
sileiro, criado em 14 de outubro, o qual tempos depois se tornaria Ae-
roclube do Brasil, largamente apoiado pelos militares da Marinha e do
Exército. Entre os objetivos do Aeroclube, estavam a fundação de uma
escola de aviação e a dotação de “aparelhos de voar” para o Exército e a
Experiência anterior 47

Marinha. No entanto, não havia verba para a empreitada, e uma campa-


nha para levantamento de fundos, denominada “Deem asas ao Brasil”,
foi colocada em prática. A seguir, buscou-se um local para a implantação
da Escola de Aviação, que foi realizada na Fazenda dos Afonsos, então
pertencente à Polícia Militar. No ano seguinte, a convite do Aeroclube
e em benefício da campanha de levantamento de fundos, o aviador ita-
liano Gian Felice Gino apresentou-se na cidade do Rio de Janeiro com
seu aparelho Blériot. Após as demonstrações aéreas, ele se associou a
três outros compatriotas, Vittorio Bucelli, Eduino Oriole e Arturo Jona,
e criou a empresa Gino, Bucelli & Cia. Seus serviços foram, então, ofere-
cidos ao Aeroclube Brasileiro, com o propósito de organizar a Escola de
Aviação. A oferta foi recusada, mas Gino não desistiu de sua empreitada.
Os mesmos serviços foram oferecidos ao Ministério da Guerra, e, ao tér-
mino do ano de 1912, uma proposta final foi aceita. Entre os principais
itens, destacavam-se a aquisição de 11 aeroplanos, a construção de han-
gares e oficinas e a transferência de todos os aparelhos e equipamentos
para o Governo após os cinco anos de contrato. Um ajuste definitivo com
o ministro da Guerra, general Vespasiano de Albuquerque, foi assinado
em 18 de janeiro de 1913, e assim nasceu Escola Brasileira de Aviação.
Com a troca de terras efetuada entre os Ministérios da Justiça
(controlador da Polícia Militar) e da Guerra, o terreno onde deveria ser
instalado o Aeroclube Brasileiro foi cedido para a implantação da Escola
Brasileira de Aviação. Ao longo do ano de 1913, oito pequenos hanga-
res geminados foram construídos. Em fins do mesmo ano, chegaram ao
Brasil nove aviões adquiridos na Europa. Coube ao Ministério da Guerra
indicar um fiscal das atividades da escola. Como o Exército não possuía
nenhum militar brevetado naquele momento, o tenente Jorge Henrique
Moller, da Marinha, foi designado fiscal do Governo. Ele foi o primeiro
militar brasileiro a receber o brevê de piloto. Realizou seu curso na es-
cola de Farman, em Étampes, na França, à qual já nos referimos ante-
riormente, por conta própria, após autorização da Marinha.
A inauguração ocorreu em 2 de fevereiro de 1914, e, na pri-
meira turma, foram matriculados 35 alunos do Exército. Quando a ins-
trução de voo efetivamente começou, os problemas apareceram. O nú-
mero de alunos era elevado para apenas dois instrutores de voo, e as
aeronaves da época eram muito frágeis. Dos 11 aviões prometidos, so-
mente 9 foram adquiridos, e estes careciam de peças de reposição por
48 Aviação no Exército - uma visão histórica

problemas de importação e manutenção adequada, em razão de falta


de mão de obra especializada; além do mais os pagamentos do Gover-
no sofriam atrasos. A somatória de todas as dificuldades contribuiu
para a ineficácia da instrução e a desmotivação dos alunos. O golpe
final veio no meio do ano, após a Escola Brasileira de Aviação funcio-
nar apenas cinco meses. Em consequência de problemas financeiros
e do início da Primeira Guerra Mundial na Europa, a Escola Brasileira
de Aviação foi extinta em junho de 1914. No mesmo ano, os aviões da
escola foram emprestados ao Exército, que se encontrava envolvido na
Guerra do Contestado, em Santa Catarina.
No que tange à Força Terrestre, os primeiros registros do
interesse sobre a adoção de meios aéreos datam de 1911, quando o
Estado-Maior, por intermédio de seu chefe, sugeriu ao ministro da Guerra
o envio de um grupo de oficiais à Europa a fim de estudar o assunto em
escolas militares de aviação.
“Uma nova arma de guerra estava chamando a atenção do mun-
do – o aeroplano –, usado no ‘serviço de exploração’.”
O general Caetano de Faria em relatório ao ministro da Guerra
alertava: “[...] em que pesem as dificuldades de recursos para necessi-
dades mais urgentes, é preciso estudar esse novo elemento.” Sugeriu,
então, que fosse mandado um grupo de quatro a seis oficiais às escolas
militares de aviação, se possível na França, acompanhados por mecâ-
nicos hábeis, que estudariam a referida especialidade. Depois de sufi-
cientemente instruídos, eles elaborariam o projeto segundo o qual o
Governo organizaria o primeiro parque aéreo, para difundir a instrução
aeronáutica no nosso Exército. A sugestão foi reiterada em 1912 e em
1913; porém, somente em 1916 se concretizou. Um grupo de jovens ofi-
ciais foi mandado ao Velho Continente com a missão inclusive de adqui-
rir alguns aviões.
A ideia de incorporar meios aéreos às Forças Armadas no Brasil
ganhou maior ênfase com o advento da Primeira Guerra Mundial quan-
do a Marinha tomou a iniciativa de organizar o primeiro núcleo militar
de aviação no Brasil. Pelo Decreto nº 12.167, de 23 de agosto de 1916,
o então presidente da República, Wenceslau Brás, fundava a Escola de
Aviação Naval, enquanto o ministro da Marinha, almirante Alexandrino
Faria de Alencar, iniciava as negociações para a aquisição dos primeiros
aviões para equipar aquela escola.
Experiência anterior 49

O Exército só iria ter sua Escola de Aviação Militar após o tér-


mino da guerra. Em 15 de janeiro de 1919, pelo Decreto nº 13.417, foi
aberto um crédito de dois mil contos de réis para que se organizasse
o serviço de Aviação Militar. Este foi provido de infraestrutura, com a
aquisição de aviões e de outros materiais necessários. Foram contrata-
dos também professores para a escola, além de operários para a manu-
tenção, e a inauguração oficial ocorreu em 10 de julho de 1919.
Em 1915, a utilização de aeroplanos na Primeira Guerra Mun-
dial havia comprovado que as táticas de combate e até mesmo as es-
tratégias de guerra nunca mais seriam as mesmas. O avião tornara-se
uma máquina de guerra, e todos os exércitos do mundo mostravam vivo
interesse em organizar as próprias Forças Aéreas.
No EME, o marechal Bento Manuel Ribeiro Carneiro Monteiro
fez constar em seu Relatório Anual de 1915 o aviso de que o Exército
Brasileiro não poderia mais ignorar a questão e apresentou os planos
e necessidades para a organização do “serviço de aviação entre nós”. O
argumento inicial é sugestivo. Segundo o chefe do EME, sem aviação “[...]
a luta travar-se-ia entre um cego e um homem de boa vista; por mais ro-
busto que fosse, o cego não poderia evitar as pancadas de seu adversá-
rio”. Isso porque naqueles tempos o avião ainda era visto notadamente
como apenas elemento de observação.
Por se tratar, a meu juízo, de documento de grande importância
e de cunho histórico, achei que seria interessante reproduzi-lo quase em
sua maior parte, conservando a grafia da época:

Em face dos consideráveis progressos da aviação nestes


últimos tempos, não é mais possivel ficarmos alheios a esta
questão. Somos obrigados a resolve-la de qualquer modo,
si não quizermos ficar em atrazo. A extraordinária activida-
de dessas admiráveis esquadrilhas aéreas, que na presente
guerra desempenham papel preponderante na orientação
da artilharia de grosso e pequeno calibre, assignalando com
precisão a posição exacta dos objectivos a bater, tem demons-
trado de modo absoluto a efficacia dessa nova arma. Não ha
mais duvidas sobre a necessidade desses rápidos apparelhos
aéreos em um exército bem organisado, porque sem esses
novos órgãos de observação a inferioridade é manifesta e a
50 Aviação no Exército - uma visão histórica

derrota quasi certa. A luta travar-se-ia entre um cego e um


homem de boa vista; por mais robusto que fosse o cego não
poderia evitar as pancadas de seu adversário.
Felizmente, porem, já V. Exa. encetou a resolução do proble-
ma conseguindo a verba de 100 contos para a acquisição de
alguns desses apparelhos com o fim de organisar o serviço
de aviação entre nós.
Alguns jovens officiaes devem seguir para a Europa proxi-
mamente com essa missão [...]
Sou de parecer que devem ficar subordinados ao nosso
addido militar, por intermédio de quem se communicarão
com o Ministro da Guerra e Chefe do Estado Maior [...]
Muito moços os officiaes que devem partir e por conseguinte
sem a precisa experiencia é natural que sejam amparados ou
orientados por um official mais velho cujo bom senso é conheci-
do e cuja intelligencia já tem sido por varias vexes comprovada.
Quaes os apparelhos a adquirir?
Attendendo à massa de sobresalentes que deve acompanhar
esses apparelhos, calculo que no maximum podem ser com-
prados 4 apparelhos, com a verba de 100 contos concedida.
Deve-se, pois escolher judiciosamente taes apparelhos de
maneira que a instrucção com elle dada aos nossos officiaes
posteriormente, seja a mais completa possível. Ora os aviões
dividem-se em três classes distinctas: 1a) Aviões de reconhe-
cimento, dando 160 até 200 kilometros por hora e transpor-
tando gasolina para 9 horas de trabalho, a 30 litros por hora.
2ª) Aviões de regulação do tiro, com dois motores de 80 a
100 cavallos.
3ª) Aviões de ataque, menos rápidos e mais robustos, com
o armamento indispensável para inutilisar o adversário e
impedir suas observações.
Seria de desejar que fossem adquiridos dois aviões de cada
classe, porque com o desarranjo de um a instrucção não se
interromperia, continuando com outro em quanto se repa-
rasse o primeiro. Cada classe tem a sua applicação particu-
lar, exigindo por parte do piloto e passageiro o adextramen-
to de qualidades differentes. No primeiro caso, a memoria
Experiência anterior 51

topographica, o habito de distinguir de grande altura deta-


lhes e accidentes do solo, de calcular o effectivo de colum-
nas em marcha ou repouso, reconhecendo as armas, as for-
mações e comboios, exigem do official longo trenamento e o
conhecimento profundo do theatro de operações.
No segundo, a calma, o golpe de vista rápido, as evoluções
circulares sobre um mesmo trecho de terreno sujeito ao
fogo vivo do inimigo, já indicam acção diversa, onde o san-
gue frio e a coragem predominam.
No terceiro, o arrojo, a audácia, a precisão na direcção mais
acertada, os bruscos movimentos verticaes e horisontaes,
na defesa e no ataque, resoluto, fazem sentir a necessidade
do completo conhecimento do apparelho, da longa pratica
desses movimentos rápidos de evoluções envolventes, de
onde se possa tirar o melhor partido do armamento.
Ha, por consequencia, vantagem em formar todas essas ap-
tidões pelo exercício continuado, não se descurando de dar
os meios precisos para este fim.
Dever-se-ia, por tanto, adquirir em duplicata como disse, os
apparelhos de cada uma dessas classes. Com a verba conce-
dida, porem, isto não é possivel.
Neste caso, julgo mais acertada a acquisição de dois apparelhos
de reconhecimento, um de regulação de tiro e um de ataque.
Parece-me ser esta a melhor combinação.
Uma outra acquisição que eu aconselharia e que julgo de
grande conveniência, é a de um drachen ou balão captivo,
Sancisse, como dizem os francezes.
Actualmente a artilharia não dispensa mais esses magnífi-
cos postos de obervação cujos serviços têm sido relevantes,
na presente guerra.
Teriam, assim, os nossos officiaes de artilharia meios de se
exercitarem em suas observações do tiro com incontestáveis
vantagens, e, ein caso de guerra, não faltariam observadores
práticos com o necessário adextramento.
Como organisar o serviço?
Penso que o campo dos Affonsos, onde está situada a esco-
la de Aviação presta-se perfeitamente para a installação do
52 Aviação no Exército - uma visão histórica

nosso serviço de aviação. O Ministério da Guerra poderia


tomar conta dessa Escola e organisar ahi definitavamente
o serviço. Uma companhia independente de aviação, com
100 homens, commandada por um capitão escolhido e com
subalternos aviadores poderia aquartelar em dependências
da Escola construídas para esse fim.
A Escola, com a companhia, ficaria sob a jurisdição do Estado-
Maior, que designaria um official superior para chefiar os
serviços auxiliado pelo commandante da companhia e
subalternos.
Far-se-ia mister a concessão annual de 200 contos para
manutenção da Escola e do serviço, alem da importância
necessária às primeiras construcções: alojamentos, rancho,
cosinha, banheiros, latrinas e mais alguns galpões para os
novos apparelhos, alem de uma oflicina de reparos.
Para proceder com acerto encarregar-se-ia o nosso addido
militar em França, de apresentar um plano de installação
sobre as bases já citadas esclarecido pelas informações do
tenente Bento Ribeiro com relação ao que já existe no cam-
po dos Affonsos [...]
O contracto de 2 ou 3 mechanicos hábeis completariam as
providencias já citadas.
Deste modo, penso que ficaria definitivamente ventilada a
questao.
Eis, Snr. ministro o meu parecer sobre a maneira mais prati-
ca de se resolver tão importante problema.

Em julho de 1917, oficiais do Exército foram à França com a


missão de se preparar na Força Aérea francesa para, em seu retorno,
organizar o Serviço Geral de Aviação. A ida de oficiais à França somente
naquele ano nos leva à necessidade de tentar compreender em que qua-
dro se deu a ação do tenente Kirk, levando-se em conta que a Aviação
Militar não havia ainda sido implantada no Exército, por ocasião de sua
atuação na campanha do Contestado.
Inicialmente, o Serviço Geral de Aviação ficou subordinado ao
EME e coube-lhe organizá-lo, bem como o regulamento da Escola de
Aviação, cujo material já havia chegado ao Brasil. As atividades seriam
Experiência anterior 53

coordenadas pela Missão Francesa, à qual caberia a direção técnica da


Escola de Aviação Militar.
Criada em 29 de janeiro de 1919, no Campo dos Afonsos, visava à
formação de oficiais e sargentos nas especialidades de piloto, mecânico e
observador. Efetivamente inaugurada em 10 de julho de 1919, teve como
primeiro comandante o tenente-coronel Estanislau Vieira Pamplona. Os
aviões da escola, vindos para o Brasil em 1919 e 1920, eram franceses e
foram empregados na Primeira Guerra Mundial, e a escola se aproveitou
da infraestrutura organizada pela extinta Escola Brasileira de Aviação, ini-
ciativa de caráter civil, como vimos anteriormente. Além das instalações
da Escola de Aviação Militar, ao longo do tempo foram criados cinco depó-
sitos, no Rio de Janeiro e em São Paulo, dois quartéis para esquadrilhas,
em Santa Maria e Alegrete, e um parque de Aviação, em Santa Maria.
No entanto, no relatório das atividades de 1922, o EME fez
constar as dificuldades para o incremento da Aviação Militar. Interes-
sante é ressaltar o fato de haverem sido criadas as esquadrilhas de Santa
Maria e de Alegrete, mas permanecendo sem recursos orçamentários:

Antes de terminar, devo dizer duas palavras sobre a nossa


aviação. V. Excia. está inteiramente ao corrente da crise que
ella atravessa e conhece a situação precária em que se de-
bate. Há attritos que absorvem sem proveito parte de sua
actividade progressiva e chegam às vezes a ameaçar-nos
com a destruicão de uma obra a que já temos feito grandes
sacrifícios de vidas e de dinheiro.
Que fazer para supera-los? A meu juizo, não fraquear, embora
busquemos paulatinamente, e com mão segura, afastar-lhes
as causas determinantes. Não necessito descer a pormenores,
visto já múltiplas vezes haver permutado opiniões com V. Ex-
cia. relativamente a tão magno problema. O Governo passado
tomou a resolução de criar no Sul duas esquadrilhas, uma em
Santa Maria e outra em Alegrete, além de um parque de avia-
ção, mas descuidou-se de prover recursos orçamentados. D’ahi
innumeras difficuldades com que temos sido surprehendidos
e que V. Excia. terá de aplainar. Essas esquadrilhas já nos foram
de grande utilidade, por occasião das manobras do Rio Grande
no começo do anno passado (1922). Urge criarmos a esqua-
54 Aviação no Exército - uma visão histórica

drilha de bombardeamento em Pelotas, para o que dispomos


de terreno necessario já demarcado e cercado. Segundo um
antigo projecto do Estado-Maior, aproveitar-se-á a superficie
da Lagoa Mirim para os tiros de bombardeio. Sendo estes ti-
ros capitaes na guerra moderna, cumpre que nos exercitemos
nelles o mais rapidamente possivel. Se houvesse dependido de
min, teria organizado só uma esquadrilha no Rio e aproveitado
os recursos da outra para iniciar a escola de Pelotas. Convém
que na primeira opportunidade fundemos o campo de aviação
de S. Paulo e a sua respectiva esquadrilha, por motivos óbvios
e conhecidos de V. Excia.
Tambem nos cumpre empenhar-nos pela realização do pro-
jecto da linha aérea para o Sul, já em mão de V. Excia., o qual
foi conscienciosamente elaborado pela commissão de que é
chefe o 1º tenente Pacheco e Chaves.
A crise financeira obrigou-nos a uma parada momentânea em
matéria de aviação. Mas, embora não disponhamos de recursos
para criações novas, devemos fazer todos os sacrifícios necessá-
rios, afim de que ao menos a instrucção não soffra na Escola do
Campo dos Affonsos. Conforme comuniquei a V. Excia., e me foi
declarado pelo respectivo director, a verba de que a mesma Es-
cola dispõe este anno permitte comprar cinco aviões de ensino,
que lhe são imprescindíveis para os seus cursos práticos.
Não desanimemos em face de contrariedades transitórias:,
a aviação é hoje elemento fundamental nos conflictos inter-
nacionaes. Se a não possuirmos, entraremos numa guerra
em situação precária e desvantajosa. Os Argentinos não a
descuram. Ainda ha pouco faziam incursões, irradiando de
Buenos Aires em todos os rumos, inclusive até bem perto
da fronteira do Rio Grande. Também ha dias, sob a appa-
rencia esporte, foram a Montevideo, aterrando em caminho
nas ccercanias de Colónia. Tudo isso são ensaios militares,
habilmente disfarçados, para quando tiverem necessidade
de voar até essas cochilhas ou mesmo até mais longe.
Fraquear deante desses symptomas expressivos, seria la-
vrar com antecipação a nossa merecida sentença de morte.
As dificuldades para o desenvolvimento da Aviação Militar
Experiência anterior 55

continuaram em 1923, agravadas pelas inquietações de-


correntes dos acontecimentos revolucionários de 1922. As
rivalidades entre os Oficiais brasileiros e franceses, na Es-
cola de Aviação do Rio, foram obviadas pelo novo contrato
firmado com a Missão Militar Francesa.
A aviação militar brasileira está atravessando uma crise la-
mentável.
O antecessor de V. Excia. criou duas esquadrilhas no Rio-
Grande-do-Sul, uma em Santa Maria e outra em Alegrete;
mas, como não foram contempladas no orçamento com a
indispensável verba, têm vegetado até hoje, lutando com
toda a sorte de dificuldades, e formulando sem cessar
as mais justas reclamações. No entanto, é indispensável
mantermos no Sul um núcleo de aviação permanente,
que sirva de Escola a nossos pilotos e nos faculte passar
ao pé de guerra com esperanças de bom êxito. Convém
também criar o mais cedo possível em Pelotas a esqua-
drilha de bombardeio, a fim de que o seu pessoal se possa
treinar nas suas funções utilizando o excelente campo de
experiências formado pela Lagoa Mirim e pela dos Patos.
A Escola de Aviação do Rio continuou na vida irregular e
inquieta que V. Excia. conhece melhor do que ninguém.
Depois dos acontecimentos revolucionários de 1922, so-
brevieram outras crises menores e até a crise grave gerada
pelo incidente Moineville-Garcez, ocorrido quando V. Excia.
se encontrava no Rio-Grande-do-Sul. Pus todo o meu empe-
nho em a conjurar e consegui-o, graças ao apoio do governo
e à sinceridade e patriotismo de vários Oficiais da Escola.
Com a elaboração do novo contrato, pelo qual se retira de
vez dos oficiais franceses qualquer espécie de ingerência
na direcção, mesmo técnica da Escola, estou seguro de
que entraremos em fase mais profícua e teremos afastado
definitivamente toda e qualquer fonte de rivalidades. Por
outro lado o novo Comandante, oficial enérgico, inteligen-
te e disciplinado, é uma garantia de ordem e coesão dos
elementos verdadeiramente aproveitáveis que felizmente
contamos na Escola.
56 Aviação no Exército - uma visão histórica

Torna-se urgentíssimo adquirirmos aviões novos para a


instrução e o respectivo sobressalente. Há cerca de dois
anos que não se compra na Europa nenhuma peça para
reparações; os motores em excesso que possuíamos estão
quási inutilizáveis, pois foi mister retirar deles peças para con-
certos de outros que só assim poderiam continuar em serviço
eficiente. A Escola do Campo do Afonsos é o nosso nú-
cleo central, a verdadeira matriz da nossa aviação militar.
Urge não a deixar morrer nem mesmo fraquear na sua
elevada missão.
De acordo com V. Excia., vamos desenvolver este ano o
mais possível o curso de mecânicos e especialistas, de
modo que tenhamos sempre em quantidade apropria-
da os homens providos desses conhecimentos e sem os
quais nenhuma aviação logra existência regular.
Logo que nos seja possível, devemos criar a esquadrilha de
São Paulo e começar a execução do plano já estudado para
os campos de aterragem desde o Rio até as nossas frontei-
ras meridionais.
Não nos devemos poupar a sacrifícios em prol desta nova
arma. Qualquer que seja a guerra em que tenhamos de envol-
ver-nos no futuro, o seu papel será saliente e talvez decisivo.
Cumpre ainda termos bem presentes os progressos que ela
vai fazendo sobretudo na Argentina, mercê das facilidades
que lhe proporciona o solo deste país. O interesse dos civis
pela aviação e a multiplicidade de seus centros em toda a
extensão da nossa vizinha são sintomas significativos e que
não devemos desprezar. Em meu humilde conceito a Argen-
tina está francamente adiante de nós em matéria de aviação,
razão por que é dever nosso empenhar-nos em a alcançar,
vencendo o mais cedo possível a distância que nos separa.

Ainda em 1927, a Aviação Militar passou por uma fase de reor-


ganização e desenvolvimento, com a efetiva criação da Arma de Aviação.
Com novos aviões e a chegada da Missão Militar Francesa de Aviação,
foi dado um grande impulso para a Escola de Aviação Militar e, conse-
quentemente, para a nova Arma. Em 13 de janeiro de 1927, foi criada a
Experiência anterior 57

5ª Arma, a de Aviação, que se juntava às já existentes, ou seja, Infantaria,


Cavalaria, Artilharia e Engenharia.
A primeira unidade aérea da Aviação Militar foi criada em maio
de 1931, no Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro, e denominada Grupo
Misto de Aviação. Este teve uma atuação destacada no combate aos re-
volucionários paulistas na Revolução de 1932.
Em 1938, a Escola de Aviação Militar passou a denominar-se
Escola de Aeronáutica Militar.
Por decreto presidencial, em 20 de janeiro de 1941, foi criado
o Ministério da Aeronáutica, atribuindo-se à FAB a exclusividade da
realização de estudos, serviços ou trabalhos relativos à atividade aé-
rea nacional, extinguindo-se, então, o Corpo de Aviação da Marinha e
a Aviação Militar.

O tenente Ricardo Kirk


Em 22 de outubro de 1912, o tenente Ricardo Kirk se brevetou
na França e se tornou o primeiro oficial na história do Exército a ostentar
o brevê de piloto de avião, ainda que de natureza civil. Essa diplomação do
tenente Ricardo Kirk, a exemplo daquela do tenente Moller, da Marinha,
ao qual nos referimos anteriormente, decorreu de atitude estritamente
pessoal. Agregue-se a esse comentário que a escola onde se diplomou o
tenente Kirk era destinada à formação exclusiva de pilotos civis.
Em 1914, preocupado com os rumos na campanha do Con-
testado, o ministro da Guerra nomeou o general Setembrino de Car-
valho para o comando das tropas envolvidas no conflito, com a mis-
são de atuar com maior rigidez na solução do conflito. Coube a ele
a iniciativa do emprego de aviões para a realização de missões de
reconhecimento e bombardeio. Preocupado com os rumos da cam-
panha, o general Setembrino de Carvalho em um de seus relatórios
menciona as providências preparatórias para permitir o uso de avi-
ões nas operações em curso:

[...] mas era preciso reconhecer. Era preciso, sobretudo, assi-


nalar a posição dos redutos, operação facílima para aviadores
adestrados e valentes. Lembrei-me então da Escola de Aviação e
58 Aviação no Exército - uma visão histórica

do tenente Ricardo Kirk, a quem tocaria a primazia de inaugurar


em operações de guerra o delicado serviço de exploração aérea.
Pedi ao ministro (16 de setembro de 1914), expondo-lhe essas
razões; e três dias depois recebia um telegrama seu, comuni-
cando-me a partida daquele oficial, com o material necessário à
tarefa que se lhe exigia. Houve, durante a viagem, um lamentá-
vel incêndio comunicado pelas fagulhas da locomotiva que inu-
tilizaram um aparelho, danificando o outro. Mas o tenente Kirk,
depois de escolher em Rio Negro, Canoinhas e União da Vitória,
campos apropriados para avançar, retornou ao Rio para buscar
mais dois monoplanos e os acessórios que lhe faltavam à recom-
posição do aparelho avariado. Antes, porém, de empreender a
viagem, fixou, com o meu acordo, a construção dos hangares em
União da Vitória e dirigiu, em pessoa, os trabalhos iniciais dos
três campos de aviação.

É importante voltar a frisar que na ocasião ainda não havia sido


organizada a Aviação Militar.
Em 1º de março de 1915, após a realização de poucas missões
de reconhecimento, em cumprimento de sua primeira missão de com-
bate no quadro de uma ofensiva contra os rebelados, o tenente Kirk so-
freu um acidente quando a asa esquerda de seu avião bateu na copa de
uma árvore, o qual se chocou com o solo, e ele veio a perder a vida.
O falecimento ocorreu na véspera do dia em que foi realizado o
ataque decisivo contra o reduto rebelde. Do livro A campanha do Contes-
tado, de autoria do tenente Herculano Teixeira de Assunção, que partici-
pou das operações, extrai-se o seguinte relato:

Às 18 horas uma pungente notícia chegou ao conhecimento


do Comandante Estillac: o 1º tenente Ricardo Kirk tinha
sido vitimado num desastre, quando já havia começado o
seu arrojado voo União da Vitória-Rio Caçador-Claudiano.
O piloto militar, que com tanta habilidade manejava a sua
máquina, partiu neste mesmo dia 1º de março de 1915, de
União da Vitória, num belo voo; mas a 1 km do Rio Jangada,
no quilômetro 42 da estrada de Palmas, um incidente im-
previsto fizera o aeroplano precipitar-se em terra, matando
o destemido aviador.
Experiência anterior 59

O tenente Ricardo Kirk posteriormente foi promovido post


mortem a capitão por “atos de bravura” pelo Ministério da Guerra.
O Contestado foi palco da primeira campanha com utilização
de avião para fins militares, do primeiro acidente com aeronave mili-
tar e da primeira vítima militar em acidente aéreo na América do Sul.

O tenente Kirk assinalado pelo círculo

Outras considerações
O site do Comando da Aviação do Exército apresenta o tenen-
te Ricardo Kirk como o maior herói e patrono da Aviação do Exército,
fato que gera discordância entre aqueles que consideram a inexistência
de liame entre a Aviação Militar e a Aviação do Exército, identificando
uma grande distinção entre ambas. Primeiramente, pela diversidade do
meio utilizado; no passado, aviões; no presente, helicópteros. Em segun-
do lugar, argumentam que a Aviação Militar, de curta existência, jamais
conseguiu estruturar-se completamente e limitou sua atuação a voos in-
dividuais. Julgam que a Aviação Militar é uma predecessora da FAB, pois
foi daquela que esta surgiu.
A participação do tenente Kirk em operação de caráter militar
ocorreu em época na qual não se estabelecera ainda uma doutrina de
emprego para a Aviação Militar. Em consequência desse aspecto, depre-
endem alguns que o emprego de aeronaves na campanha do Contestado
foi uma iniciativa de cunho pessoal do general Setembrino, na qual se
utilizou também um piloto civil que, como o tenente Kirk, não estava
60 Aviação no Exército - uma visão histórica

habilitado para ser empregado em aeronave em ambiente operacional.


A atuação de ambos pode ser qualificada como temerária, considerando
que os pilotos não dispunham de qualquer experiência anterior em ope-
ração militar de combate.
A escola em Étampes, onde o tenente Kirk se brevetou, em
1912, era uma instituição civil e pertencia às empresas fabricantes das
aeronaves Blériot e Farman. Ela só foi militarizada por volta de 1915. A
tudo isso, adere-se o fato de que naquela época a Aviação Militar ainda
não havia sido criada, conforme visto anteriormente.
Do exposto, impõe-se, salvo melhor juízo, aprofundar os es-
tudos a respeito. Parece-me importante pelo seu pioneirismo e amor
à aviação que se mantenha a memória do tenente Kirk como herói da
Aviação Militar, assim como a de outros aviadores militares que vieram
a falecer em missões de voo, mesmo fora de situações de combate. Acho
que a todos devemos o mesmo respeito.
Julga-se ainda que a elevação de tenente Ricardo Kirk à cate-
goria de patrono da Aviação do Exército, conforme se verifica no busto
existente na Base de Taubaté, merece nova reflexão. A biografia dele não
apresenta feitos que possam ombreá-lo ao general Sampaio, patrono da
Infantaria; ao general Osorio, patrono da Cavalaria; ao marechal Mallet,
patrono da Artilharia, e aos demais patronos das demais Armas e Ser-
viços que, ao longo de suas vidas, deram inúmeras demonstrações de
bravura no cumprimento do dever. Parece-me ainda muito cedo para
que a Aviação do Exército eleja um patrono.
A nossa Aviação não precisa ir ao passado para procurar seus
heróis, pois eles desde a especialização das primeiras turmas de pilo-
tos, gerentes e mecânicos, em 1986, os nossos “asas”, estão diuturna-
mente dando provas de seu heroísmo enfrentando com galhardia toda
a sorte de dificuldades para fazer cada vez mais forte e pujante nossa
Aviação do Exército.
Outro fato aventado é a impropriedade da adoção do termo re-
criação quando se trata da Aviação do Exército. Entre razões já expostas,
vislumbra-se a inadequação do termo na medida em que o decreto assina-
do pelo Exmo. Sr. presidente da República aprova a criação da Aviação do
Exército, fato que faz perder a força de outras argumentações.
Em entrevista a mim concedida pelo general Leonidas, ele fez
questão de frisar sua peremptória discordância sobre o emprego do termo
Experiência anterior 61

recriação. A opinião do ex-ministro do Exército, ratificada no decreto de


criação da Aviação do Exército, deixa clara a inadequação do termo “re-
criação” como postulam alguns.
Logo, se não houve “recriação”, esvai-se qualquer tentativa de
laço com a Aviação Militar, a despeito de ela ter surgido e se extinguido
no âmbito da nossa Força. Parece-me que a tentativa de negar a “criação”
é um ato que ofende um diploma legal, o decreto de “criação”, que não foi
revogado. Não se trata de negar a história passada da instituição, mas,
sim, de tentar estabelecer a legitimidade dos fatos. Sei que talvez seja
esta a primeira vez que o assunto vem a público dentro desta óptica, e
isso ocorre porque também pela primeira vez se escreve algo sobre a
“criação” da nossa Aviação do Exército. De todo modo, se o tema suscitar,
a partir dessas considerações, acaloradas discussões entre os defensores
do vínculo e aqueles que o negam, não farei parte de nenhum dos grupos.
Decidi que a mim caberia lançar os argumentos e parar por aí.
Raciocínio idêntico faço em relação ao tenente Kirk. Não contes-
to as qualidades do nosso bravo antepassado. Reconheço o seu amor pela
Aviação e sou aplicado partidário da necessidade de culto aos nossos he-
róis do passado. Só não consigo identificar o conjunto de feitos e realizações
de natureza estritamente militar que possam elevá-lo ao mesmo patamar
dos nossos demais patronos. Não me excluo do universo daqueles que lhe
ressaltam a importância, mas não ombreio com os que o defendem como
patrono, até pelo fato da inexistência do vínculo entre a outrora Aviação
Militar e a atual Aviação do Exército, até que se prove em contrário.
Por esse prisma, me parece que a discussão entre “criação” ou
“recriação” da Aviação do Exército não pode ser considerado um fútil
exercício de semântica. Se aceitarmos que o termo “criação” é o corre-
to, conforme propugna o ministro Leonidas, não é lógico que se busque
o patrono da Aviação do Exército em herói da outrora Aviação Militar.
Essa é uma discussão que se impõe.
No passado, a Aviação Militar esteve restrita à operação de ae-
ronaves de asas fixas e não chegou a estruturar-se no País, dando ori-
gem posteriormente à criação da Aeronáutica. A Aviação do Exército foi
criada para operar exclusivamente helicópteros e se submete a constan-
tes aperfeiçoamentos e modernizações, seguindo as metas estabeleci-
das em seu planejamento original.
Fica a sugestão para uma nova e profunda reflexão.
62 Aviação no Exército - uma visão histórica

Se no seio da Aviação do Exército urgia a importância de esta-


belecer um patrono, nada seria mais lógico e justo que a escolha recaísse
sobre o general Leonidas, o seu criador, sem o concurso do qual ela hoje,
provavelmente, ainda seria um sonho. Ainda há tempo para que a mere-
cida homenagem lhe seja prestada em vida.
Capítulo 4

Nossos chefes

C omo dizia um prestigioso chefe militar, as grandes or-


ganizações são como um enorme dragão. Quando se dá
uma marretada no rabo até o impulso chegar à cabeça, há um caminho
tortuoso e demorado a percorrer. Nesse conceito, enquadram-se tam-
bém as instituições militares, entre elas o nosso glorioso Exército.
O general Leonidas teve a coragem e a ousadia de despertar
o dragão de sua letargia dando a marretada que o fez começar a rea-
gir. Aos generais Baratta e Bulcão coube a heroica tarefa de acelerar, de
conceder o máximo de presteza aos impulsos, fazer que a marretada
repercutisse pelo corpo do dragão, operacionalizando as diretrizes mi-
nisteriais e do EME, o que fizeram com rara eficiência.

General Leonidas Pires Gonçalves,


ministro do Exército

Certamente, nenhuma dessas palavras


estaria sendo escrita se não fosse a inabalável von-
tade e a decisão do ministro do Exército, general
Leonidas Pires Gonçalves, de criar a Aviação do
64 Aviação no Exército - uma visão histórica

Exército. Seu inarredável compromisso com a modernidade da Força Ter-


restre permitiu o grande salto do Exército rumo ao futuro, representado
pela incorporação de meios aéreos, e permitiu à nossa Força a tal alme-
jada ascensão à terceira dimensão do campo de batalha terrestre. Sua
percepção do futuro tinha como farol a necessidade de que o Exército
possuísse uma importância coerente com a posição estratégica do País e
o brilhante futuro que ele antevia para o nosso querido Brasil.
O general Leonidas ao decidir pela implantação da Aviação do
Exército demonstrou sua larga visão prospectiva e deu uma demons-
tração cabal de que era um chefe que se encontrava muito à frente de
seu tempo.
Além de tudo, é importante considerar que os recursos neces-
sários à aquisição do material foram obtidos exclusivamente pela atua-
ção e pelo prestígio pessoal do nosso sempre lembrado ministro. Cer-
tamente, o Exército e, em particular, a Aviação do Exército, ao longo de
suas trajetórias, renderão ao sempre lembrado chefe o merecido preito
de gratidão.
Graças ao general Leonidas, no âmbito do Sistema de Planeja-
mento do Exército (SIPLEx), foi estabelecido o Plano de Reestruturação
da Força Terrestre, denominado FT-90, de grande dimensão e alcance
ambicioso. Composto por muitos subprojetos importantes, como a cria-
ção dos Grandes Comandos Militares, em substituição aos Exércitos, a
reestruturação das brigadas, a criação do Centro de Guerra Eletrônica,
a aquisição e repotencialização de blindados, a compra de foguetes de
saturação de área, entre eles figurava a criação da Aviação do Exército,
destinada a assegurar a mobilidade estratégica e tática das quais se res-
sentia a Força Terrestre.
A administração do general Leonidas avulta de importância na
medida em que as ações empreendidas no âmbito do Plano de Rees-
truturação da Força Terrestre, a FT-90, foram o último grande sopro de
modernização experimentado pelo Exército até os nossos dias. As difi-
culdades conjunturais subsequentes constituíram-se em fortes óbices à
implementação de novas medidas tendentes a modernizar a Força.
Como já realçamos, para a consecução dos objetivos definidos
no projeto de modernização, o general Leonidas obteve, em função de
seu prestígio pessoal, recursos extraorçamentários de vulto, os quais
permitiram a ampla concretização das metas estabelecidas.
Nossos chefes 65

Vamos nos apropriar de trechos do depoimento do ministro do


Exército ao tenente-coronel Contreiras no contexto da História oral da
Aviação do Exército. Não se trata de transcrição literal, mas a reprodução
de alguns excertos.

Foi estabelecido o projeto Força Terrestre 90, a conhecida FT-


90, de grande dimensão e alcance ambicioso, composto por
muitos subprojetos importantes: criação dos Grandes Coman-
dos Militares, em substituição aos Exércitos; reestruturação
das Brigadas; criação da Aviação do Exército, para assegurar a
mobilidade estratégica e tática necessária a um país de grande
extensão como o nosso; criação do Centro de Guerra Eletrô-
nica; a aquisição e repotencialização de blindados; compra de
foguetes de saturação de área (Astros II); construção de quar-
téis, entre outros, inclusive na área de ensino [...]
A obtenção de recursos extraorçamentários, no valor de
1 bilhão de dólares, permitiu a realização dos projetos e
subprojetos mais importantes. Cabe esclarecer, sem falsear
a verdade, que os objetivos destas frentes de atuação foram
obstinadamente trabalhados, buscados e atingidos com su-
cesso, graças à dedicação de todos os escalões do planeja-
mento e da execução.
O Sistema de Planejamento do Exército (SIPLEx), cuja im-
plantação foi consolidada em 1985 (Portaria 077 – EME, de
04 Dez 85) teve e tem o mérito de dar rumo profissional à
Instituição. É, antes de tudo, um instrumento de ação ra-
cionalizada. Caracteriza-se por ser um processo, uma ativi-
dade permanente, contínua, evolutiva, vinculada à realida-
de presente e previsível. Consensual. Após a adoção oficial
do SIPLEx passamos a ter planejamentos mais objetivos,
verdadeiros, autenticamente nacionais, ajustados às reais
necessidades da Instituição e aos interesses do Brasil. Foi
instrumento fundamental para estruturar as diretrizes para
a Força durante minha gestão.

Tive a oportunidade de entrevistar o general Leonidas em sua


residência no Rio de Janeiro. Do alto de seus 89 anos, demonstrava inve-
jável vigor físico e lucidez. Suas declarações foram de importância capital
66 Aviação no Exército - uma visão histórica

para a elaboração deste livro, pois a visão macro dos acontecimentos só


poderia originar-se evidentemente daquele que foi o principal respon-
sável pela implantação da Aviação do Exército.
Segundo ele, o anseio de modernizar o Exército era uma preocu-
pação que lhe acompanhava desde os tempos em que era instrutor da ECE-
ME, quando publicou um artigo no qual abordava a necessidade de revisão
na estrutura organizacional vigente na ocasião. Como comandante Militar
do Norte, na Amazônia, convenceu-se definitivamente da imprescindibili-
dade de conceder ao Exército maior mobilidade tática e estratégica, em par-
ticular naquela região, e que o vetor apropriado era o helicóptero, por sua
grande versatilidade operacional. Na Vice-Chefia do EME, continuava con-
victo da necessidade de dotar a Força de meios aéreos; entretanto, naquela
oportunidade, não conseguiu ainda realizar seu intento. Somente quando
foi guindado ao mais alto cargo da Força, como ministro do Exército, pôde
transformar em realidade o anseio havia tanto tempo acalentado.
Acrescentou que sua aspiração se dividia em três fases. A pri-
meira, a da ideia, conceitual, do sonho de modernização. A segunda,
após sua ascensão ao cargo de ministro, a da busca dos recursos que
permitiriam transformar os antigos sonhos em realidade. Nessa fase,
considera importante que se renda gratidão ao apoio concedido pelo
presidente José Sarney, que foi extremamente compreensivo com as ne-
cessidades do Exército a ele expostas. Segundo o general Leonidas, os
recursos para implantação dos projetos previstos no âmbito da FT-90
foram obtidos por autorização expressa do presidente Sarney ao qual
fez uma explanação sobre a aflitiva situação em que se encontrava o
Exército. Ele o autorizou a estabelecer os contatos subsequentes com
o ministro da Fazenda para verificar a disponibilidade dos recursos
pleiteados. O encontro com este, Francisco Dornelles, foi realizado no
Quartel-General do Exército, em Brasília, onde o ministro Leonidas fez
uma exposição sobre a situação da nossa Força e apresentou o planeja-
mento para a impostergável modernização. Em determinado momento,
foi interrompido pelo ministro da Fazenda, que lhe perguntou “como o
Exército tinha chegado àquele ponto?” Ouviu inicialmente a alegação do
ministro Dornelles sobre a dificuldade na obtenção do montante postu-
lado. O general Leonidas retrucou, em razão de sua experiência anterior
como secretário de Economia e Finanças, que em determinada área do
Governo havia a disponibilidade dos recursos pretendidos. O ministro
Nossos chefes 67

da Fazenda respondeu-lhe que, caso efetivamente existissem, seriam


destinados ao Exército. O ministro Leonidas redarguiu dizendo que só
queria o suficiente, pois não possuía planejamento para a quantia que
lhe fora oferecida. Dessa forma, o Exército obteve o montante que lhe
permitiu implantar os projetos previstos. Do total, duzentos e quarenta
e seis milhões de dólares americanos seriam destinados à aquisição das
aeronaves e outros equipamentos para a criação da Aviação do Exército.
A atitude do presidente Sarney em relação ao Exército, apor-
tando os recursos para sua ingente necessidade de modernização, me-
rece o reconhecimento e respeito dos integrantes da Força. Seu exemplo
deveria nortear seus sucessores, o que infelizmente não ocorreu.
Não posso perder a oportunidade para reproduzir trecho muito
significativo da autobiografia de Margareth Thatcher, ex-primeira-ministra
da Inglaterra, sobre a importância dos militares:

Por essa razão, se o Chefe do Estado-Maior de Defesa (ou


seu equivalente) afirma que, sem determinados recursos,
a nação não pode ser adequadamente defendida, somente
um político idiota pode se recusar a ouvir o apelo.
Mas os militares também são diferentes, porque a vida da
caserna é distinta da do civil. As virtudes que precisam ser
cultivadas por aqueles que são chamados a colocar em risco
suas vidas no cumprimento de seu dever simplesmente não
são as mesmas exigidas de um homem de negócios, de um
funcionário civil ou, sem sombra de dúvida, de um político.
É vital, acima de tudo, ter coragem – coragem física.
Os militares precisam desenvolver a camaradagem com
seus companheiros em muito maior grau. Devem ser capa-
zes, implicitamente, de confiar uns nos outros. Soldados,
marinheiros e aviadores também são indivíduos e basta ler
suas biografias para compreender isso. Mas não podem ser
individualistas. Para aqueles que vivem em regime disci-
plinar, são os deveres, e não os direitos, que balizam suas
vidas. Eis por que a vida militar é justamente considerada
uma nobre vocação e por que, através dos anos, muitos dos
que abandonam a carreira militar para ingressar na vida ci-
vil sentem dificuldade de se adaptar.
68 Aviação no Exército - uma visão histórica

Como regra, os militares necessitam ser fisicamente fortes.


Não é suficiente ser talentoso, embora a habilidade certamen-
te ajude. Nenhuma força combatente pode se permitir abrigar,
mesmo em pequena proporção, pessoal que não esteja apto a
cumprir missões que lhe possam vir a ser atribuídas.
Assim, sou contra as atuais tentativas de empregar concei-
tos liberais e institucionais da vida civil em nossas Forcas
Armadas. Programas visando introduzir sistemas jurídicos
segundo o modelo civil, promover direitos homossexuais e
franquear novas atividades para mulheres são, no mínimo,
irrelevantes para as funções que se espera sejam desempe-
nhadas pelos militares. Sob um enfoque pessimista, contu-
do, ameaçam a capacidade militar de forma realmente pe-
rigosa. (THATCHER, Margareth. A arte de governar, 2002.)

O general Leonidas fez outra observação interessante. Disse


que ao ser nomeado para a função de secretário de Economia e Finan-
ças o oficial-general normalmente “torce o nariz”. Não foi o seu caso. O
desempenho do cargo lhe ensinou a prospectar as “fontes do dinheiro”,
fato que foi de suma importância para obter os recursos para a reestru-
turação do Exército.
A terceira fase foi a da aquisição das aeronaves e da implan-
tação da Aviação do Exército para a qual, tinha a percepção, seria ne-
cessário contar com a imprescindível colaboração da Marinha e da Ae-
ronáutica. O Exército não possuía qualquer experiência na aquisição
de meios aéreos nem de bens no vulto dos recursos envolvidos. Des-
sa antevisão, resultou a solicitação do apoio do Ministério da Fazen-
da para a análise da parte financeira referentemente à aquisição dos
equipamentos para a Aviação do Exército. Estabeleceu as ligações com
os demais ministros militares, que, prontamente, concordaram com o
apoio à especialização dos nossos militares e na transmissão de ex-
periências para alicerçar as decisões a serem tomadas pelos escalões
intervenientes no processo de implantação.
Segundo o ministro Leonidas, naquela oportunidade, havia um
ótimo nível de entendimento entre os ministérios militares. Por sugestão
sua, realizava-se mensalmente uma reunião com a presença dos minis-
tros, inclusive o do Estado-Maior das Forças Armadas. Esses encontros
Nossos chefes 69

serviam para manter um ambiente de intensa integração e colaboração.


Fez questão de ressaltar o apoio irrestrito que lhe proporcionaram o
almirante Henrique Sabóia, ministro da Marinha, e o brigadeiro Octávio
Júlio Moreira Lima, ministro da Aeronáutica.
Mais tarde, obteve também o acordo para a permanência dos
militares após a conclusão dos cursos nas respectivas Forças até a im-
plantação do BAvEx, atendendo a uma solicitação do general Martins,
então chefe do EME. Para isso telefonou ao ministro da Marinha e lhe
perguntou se ele “poderia permanecer com os militares qualificados o
tempo necessário recompensando-os e punindo-os até que o Exército
pudesse recebê-los de retorno?”. Como nas demais ocasiões, a resposta
veio incontinenti e positiva. A mesma solicitação foi feita à Aeronáutica,
que também anuiu sem contrapartida. Enfatizou que aquelas conquistas
inicialmente foram todas em decorrência de seu ótimo relacionamento
tanto com as esferas do Governo como com os demais ministros milita-
res e que elas ocorreram segundo uma visão macro da implantação. A
operacionalização de todas as providências decorrentes de sua decisão,
reconhece, foi realizada de modo excepcional pelo EME e pelas comis-
sões nomeadas por aquele alto órgão.
A alusão acrescentada ao decreto de criação da Aviação do
Exército, restringindo-a à operação exclusiva de aeronaves de asas rota-
tivas, decorreu em particular de solicitação do ministro da Aeronáutica,
que sofreu pressões internas por se pensar naquela Força que o Exército
tivesse o interesse em adquirir também aeronaves de asas fixas.
Suas diretrizes iniciais ao EME foram de próprio punho, como
era de seu costume, nas quais enfatizava a adoção da maior transpa-
rência possível, principalmente no processo de aquisição das aerona-
ves. Queria “a caixa-preta aberta” e apontava para a inclusão no valor
total do contrato de aquisição de cláusula offset. Sobre esta, que mais
tarde constaria do contrato, disse que anos após na leitura de um livro
de economia de autor brasileiro havia uma referência que qualificava
a citada cláusula como a mais bem elaborada até aquele momento no
País. Frisou que a especialização do nosso pessoal nas demais Forças
não envolveu qualquer ressarcimento financeiro, o que aumenta a nossa
admiração pelo esforço desenvolvido por elas para nos atender.
Eu não esperava que a entrevista fosse tão longa, pois a respos-
ta que me interessava para me opor às declarações que se constituíram
70 Aviação no Exército - uma visão histórica

em um dos principais motivos para que eu escrevesse este livro era


sobre a existência ou não de condicionantes políticas orientadoras da
compra dos helicópteros na Aerospatiale. Levei um bom tempo para
reunir coragem e vislumbrar a oportunidade de perguntar-lhe sobre
o assunto, pois eu temia criar-lhe algum constrangimento. Quando
ele abordou sua conversa com o presidente Sarney em que ocorreu
a solicitação dos recursos para a concretização do planejamento da
FT-90, perguntei-lhe se o presidente tinha lhe estabelecido alguma
condicionante de cunho político para a utilização deles. Disse-lhe
que minha pergunta originava-se das insinuações sobre o pretenso
caráter político da decisão. Sua reação foi definitiva e categórica. De-
monstrou claramente sua revolta sobre a veleidade dessa suposição,
negando qualquer imposição. Era o que eu esperava. Jamais pensei
que a resposta seria diferente. A afirmação do ministro aumentou
minha motivação para prosseguir nesta minha incursão literária.
Quando foi solicitado a falar sobre a localização do 1º BAvEx, as-
sunto que aludiremos a posteriori e sobre o qual existem algumas ver-
sões, o general Leonidas disse que a decisão foi exclusivamente dele.
Quando era secretário de Economia e Finanças, teve a oportunidade
de conhecer a Bateria de Taubaté, subunidade de Artilharia que foi ex-
tinta para dar lugar à Base de Aviação de Taubaté. Na ocasião, pôde
constatar que a unidade possuía na área que ocupava uma pista de
pouso utilizada pelo aeroclube local. A lembrança permaneceu latente
em sua mente. Quando se aventou a possibilidade de construir o Bata-
lhão de Aviação em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, discordou com-
pletamente, pois tinha plena consciência de que a unidade deveria se
posicionar em uma região central, industrializada, que lhe permitisse
ser apoiada nas melhores condições. Além de tudo, considerava a arti-
culação no sul do País totalmente despropositada. A única beligerância
que restava em relação aos hermanos argentinos era a futebolística. A
articulação central facilitaria também o indispensável apoio às regiões
Centro-Oeste e Norte e proporcionaria a tão almejada mobilidade es-
tratégica e tática naquelas áreas.

Mais uma vez, o general deixou bem claro que sua atuação se
deu em âmbito estratégico, macro. A operacionalização das ações no ní-
vel que denominou de tático foi do EME e do Departamento de Material
Nossos chefes 71

Bélico, aos quais não regateou elogios pela eficiência e profissionalismo


demonstrados no irrestrito cumprimento das suas diretrizes. Frisou em
particular o eficiente trabalho do general Baratta, como 3º subchefe do
EME, na operacionalização de suas orientações para a implantação da
Aviação do Exército.
Ao se referir ao SIPLEx, asseverou que no passado os proje-
tos eram iniciativas pessoais, e não fruto de um planejamento de longo
prazo. Mudavam as administrações, e novos projetos surgiam em detri-
mento dos anteriores. Não havia sistematização. O advento da aprova-
ção daquele sistema evitou que tal prática persistisse. A despeito disso,
sua implantação suscitou reações sob a equivocada alegação de que ele
engessaria e tiraria a liberdade das sucessivas administrações. Ao con-
trário, colaborou para a modernização da Força segundo um processo
racional e vem contemplando a indispensável continuidade administra-
tiva, otimizando a aplicação dos recursos e estabelecendo metas de lon-
go prazo, o que não impede as atualizações ou alterações desde que de
acordo com o projeto global.
O general Leonidas fez questão de realçar sua discordância so-
bre o emprego do termo “recriação” quando se fala da Aviação do Exér-
cito. O decreto respectivo deixa claro tratar-se da “criação” de um novo e
importante componente para a modernização da nossa Força.
Em suma, como restou bem claro no depoimento do general Leo-
nidas, em nível “estratégico”, a decisão de implantação foi exclusivamente
dele. A operacionalização das medidas foi responsabilidade dos órgãos
intervenientes por meio de seus integrantes. É desse nível que o nosso
livro se ocupará.

General Angelo Baratta Filho,


3º subchefe do EME
Minha carreira no EME iniciou-se em 1984 e me proporcionou
a oportunidade de trabalhar de modo mais próximo com diversos ofi-
ciais-generais. Com grande prazer, tive a ventura e a satisfação de fazer
parte da equipe do general Baratta quando ele desempenhava as fun-
ções de 3º subchefe, no momento em que se impunha operacionalizar as
medidas decorrentes da criação da Aviação do Exército. Extremamente
72 Aviação no Exército - uma visão histórica

dinâmico, o general Baratta era o impulso de que


necessitava a Aviação na fase de sua implanta-
ção. A decisão da criação fora tomada, mas as
ações decorrentes precisavam ser concretiza-
das. O dragão precisava começar a se mexer; as
engrenagens necessitavam começar a se movi-
mentar. O general Baratta foi o grande impulsio-
nador do projeto de implantação da Aviação do
Exército.
Minha abordagem sobre alguns dos
nossos chefes tem como objetivo destacar que
os escalões de decisão, que tinham interferência direta e decisiva na
implantação, estavam ocupados por líderes de extrema competência,
decididos e conscientes da necessidade de agilidade no processo de-
cisório. O general Baratta era um deles. Sem dúvida, sua inteligência,
descortino e capacidade de tomada rápida de decisões foram funda-
mentais para a implementação das medidas para implantação da nos-
sa Aviação. Sob sua precisa orientação, a Comissão para Estudar a Im-
plantação da Aviação do Exército, a Comissão de Implantação e a Seção
de Aviação do Exército, sucessivamente, desempenharam com acerto e
eficiência suas atribuições.
É a oportunidade que se me apresenta de agradecer
publicamente ao prestigioso chefe, o general Baratta, pela consideração
com que sempre me distinguiu, e, se tal pode ser permitido a um subor-
dinado, quero parabenizá-lo pelo papel relevante que desempenhou na
criação de nossa Aviação.
Durante o mês de setembro de 2010, tive a satisfação de me re-
encontrar com o general Baratta. Entre os chefes que julgava de presen-
ça obrigatória neste livro, ele foi o último a ser entrevistado. Na ocasião,
o general fez uma abordagem sobre sua passagem pela 3ª Subchefia do
EME quando teve a oportunidade de implantar os dois projetos mais
importantes para a modernização do Exército, a Guerra Eletrônica e a
Aviação do Exército. Discorreu sobre eles com a enorme propriedade de
quem esteve sempre à frente dos dois eventos.
Segundo o general, a missão de implantar a Aviação do Exército
lhe foi conferida pela confiança que lhe depositava o ministro do Exército,
sob o comando do qual servira anteriormente. Afirmou sobre os contatos
Nossos chefes 73

iniciais com a Marinha e a Força Aérea e destacou o esboço de algumas


reações no seio da última Força, logo substituídas, após a “apara das ares-
tas”, pela colaboração incondicional. Recordou sua preocupação com a
seleção de pilotos, gerentes e mecânicos e a exigência para que eles tives-
sem um comportamento irrepreensível nos cursos para os quais foram
designados. Enfatizou sua efetiva participação na escolha da localização
do 1º Batalhão de Aviação do Exército, em Taubaté.
Lembrou também um fato interessante. O curso de pilotos
na Força Aérea era realizado em Pirassununga. Após brevetados, os
pilotos da Aeronáutica, de acordo com a necessidade daquela Força,
faziam o curso de helicópteros em Santos. Os militares do Exército
que foram especializados em Santos não possuíam formação ante-
rior em pilotagem. Em consequência, ao término do curso, a Aero-
náutica informou que não poderia conceder-lhes o brevê, que só era
previsto para pilotos com formação anterior e após a conclusão do
curso de piloto operacional realizado em Santa Maria. O general, en-
tão, determinou a criação de um brevê para a Aviação do Exército,
que hoje é ostentado por todos os pilotos. Na Marinha, a situação era
diferente, pois os oficiais daquela Força chegavam ao curso de pilo-
to de helicóptero sem formação anterior. Logo, não houve problema
em relação ao nosso pessoal, que recebeu o brevê de piloto naval.
Por esse motivo, os pilotos que realizaram o curso na Força Aérea só
possuem o brevê da Aviação do Exército, enquanto os formados na
Marinha usam o de piloto naval e da Aviação do Exército. O general
teceu referências elogiosas aos integrantes da Seção de Aviação do
Exército e a seus chefes, o coronel Saraiva e o coronel Marcondes,
pelo excepcional trabalho que realizaram, cumprindo com precisão
as diretrizes por ele emanadas.
Relembrou um encontro com o ministro da Marinha, almirante Sa-
bóia, que lhe disse: “Baratta, quando escolher o material mantenha-o pelo
resto da vida, pois a Marinha possui diversos tipos de helicópteros, com dife-
rentes tipos de pilotos e mecânicos, diferentes tipos de ferramental, e é onde
a Marinha gasta mais dinheiro.” Ele considerou que a afirmação do ministro
da Marinha havia sido extremamente sábia e pertinente e a expôs nas dire-
trizes que nortearam o trabalho das comissões que presidiu.
Ao general Baratta deve igualmente a Aviação do Exército o re-
conhecimento por sua atuação decisiva na implantação.
74 Aviação no Exército - uma visão histórica

General Luiz Oscar Bulcão de Lima,


diretor da Diretoria de Material de Aviação do Exército

Para mim se constitui enorme prazer e subida honra ter sido


comandado pelo general Bulcão, figura insigne de chefe de Cavalaria.
Além de sua competência, inteligência e desenvolvido espírito profis-
sional, sua qualidade que mais me impressionava era a consideração,
o apreço que dedicava aos seus subordinados. Sua atitude em relação
a seus comandados o fez alvo do respeito e admiração de todos os inte-
grantes da diretoria.
Emitindo diretrizes claras e precisas,
motivava todos com sua maneira atenciosa e
gentil de nos transmitir suas orientações. Sua
responsabilidade profissional o fez conhecedor
profundo do Decreto-Lei nº 200, o qual na épo-
ca estabelecia as normas legais para a realização
das licitações na área governamental, o que co-
laborou decisivamente para o sucesso e lisura
do processo. Além disso, assim que assumiu a
diretoria, estabeleceu contatos com os órgãos da
Marinha e da Aeronáutica envolvidos na gestão de material aeronáutico,
visando à própria capacitação profissional e à dos demais integrantes da
diretoria, no tocante à nova atividade, o que permitiu a eficiente atuação
da DMAvEx em todo o processo de aquisição e de gestão do material
para a Aviação do Exército.
Tive o prazer de entrevistá-lo em sua residência, em Porto Ale-
gre. A despeito de se encontrar ainda em processo de recuperação de
delicada cirurgia, ao ser indagado sobre sua participação no processo
de criação da Aviação do Exército, reagiu com enorme vibração e um
entusiasmo juvenil, o que nos faz ainda hoje lamentar sua prematura
saída da Aviação do Exército logo após a transformação da Diretoria de
Material de Aviação em Brigada de Aviação do Exército, da qual foi o
primeiro comandante. Certamente, sua permanência naquela Grande
Unidade de Aviação por mais tempo teria sido extremamente benéfica
para o prosseguimento da implantação.
Foi durante meu encontro com o general Bulcão que tive a agra-
dável surpresa de saber que ele ainda conservava um exemplar do edital
Nossos chefes 75

da licitação para a aquisição das aeronaves para a Aviação do Exército, o


qual eu já procurara em outros lugares sem obter sucesso. O general ti-
nha feito recentemente uma daquelas limpezas periódicas que procede-
mos com aqueles escritos que juntamos ao longo da vida, principalmen-
te nós, militares. Desfez-se de uma grande quantidade de documentos
antigos, entre os quais as planilhas de avaliação das empresas concor-
rentes que utilizamos durante a avaliação técnica das aeronaves. Era um
dos documentos que eu mais cobiçava, alvo permanente de minhas pes-
quisas, mas que infelizmente repousavam rasgados em um cesto de lixo.
Felizmente, o general resistira em desfazer-se do edital.
A ele coube a tarefa extremamente importante e complexa de
dotar a Aviação do Exército de seus meios aéreos e demais equipamentos
de suporte, bem como estabelecer as condições de qualificação do nosso
pessoal aeronavegante no novo modelo, tudo consubstanciado nas pági-
nas do contrato de aquisição dos helicópteros. Conduziu a equipe da dire-
toria com a eficiência de sempre, emitindo orientações precisas.
A Aviação do Exército, com certeza, o manterá em destaque na
sua galeria dos grandes artífices da sua criação.
Capítulo 5

Estrutura do Estado-Maior do
Exército

J ulgo importante fazer uma digressão sobre a estrutura


do EME, pois, quando os eventos abordados neste livro
ocorreram, a organização era diferente da atual. Portanto, acredito que
servirá para facilitar o entendimento da atuação de cada subchefia no
processo de implantação da Aviação do Exército. Esta breve exposição
sobre o mais alto órgão da administração militar servirá para orientar e
facilitar a compreensão daqueles leitores que não estão familiarizados
com a estrutura militar nesse nível.
Antes de abordarmos a estrutura organizacional do EME, me
parece importante fazer uma alusão à posição que ele ocupava no an-
tigo Ministério do Exército. O organograma abaixo permite uma visão
clara aos leitores. Nele, também podemos visualizar a subordinação do
Centro de Instrução de Guerra Eletrônica e do Batalhão de Aviação do
Exército, os quais por ocasião de suas respectivas implantações estive-
ram diretamente ligados ao EME.
Tive a honra de servir no EME. Isso representou um período
extremamente gratificante e produtivo de minha vida militar. Após
dois anos de permanência na 9ª Região Militar/9ª Divisão de Exérci-
to, fui transferido, a convite, para aquele alto órgão. O EME, denominado
78 Aviação no Exército - uma visão histórica

Órgão de Direção-Geral, é o responsável pela preparação do Exército


para o cumprimento de sua destinação constitucional. Para tal, reali-
za estudos, orienta, coordena e controla todas as atividades relativas
à atuação do Exército em tempo de paz e na guerra.

Desempenha importante papel na formulação da Doutrina


Militar e no aperfeiçoamento da estrutura, da articulação, do apare-
lhamento e do adestramento da Força Terrestre, bem como no pla-
nejamento das operações militares. Sua ação se faz sentir igualmen-
te no desenvolvimento científico e tecnológico, na mobilização, no
serviço militar, no moral da Força e até mesmo no trato dos fatores
geográficos, históricos, políticos, psicossociais e econômicos, con-
dicionantes de qualquer formulação estratégica. A história do EME
mostra a extrema coerência entre a maneira pela qual seus quadros
pensaram e agiram e o funcionamento de sua estrutura ao longo do
tempo, refletida na crescente aptidão do Exército para a superação
de inúmeras razões de insegurança, inclusive as decorrentes do pro-
cesso de desenvolvimento, e para a defesa da Pátria. Um órgão de tal
envergadura inserido no contexto do Exército tem seus aspectos di-
nâmicos e estruturais intimamente ligados à evolução da instituição.
A eficiência dos planejamentos elaborados naquele alto órgão fazem
Estrutura do Estado-Maior do Exército 79

ressaltar a excelência da qualidade dos que por lá passaram, eficiên-


cia aliada à competência e ao preparo profissional.

O EME era o órgão de assessoramento do comando da For-


ça, na ocasião a cargo do ministro do Exército, conforme explicita o
organograma anterior. Hoje, o Comando do Exército é exercido pelo
comandante da Força, cargo criado após a extinção do Ministério do
Exército. Também realizava a coordenação com as demais Forças. O
EME possuía seis subchefias (Sch), cada qual chefiada por um ofi-
cial-general.

A 1ª Subchefia
Ela tratava de Estratégia. Tinha como responsabilidade a
avaliação da conjuntura nacional e internacional e, por meio de aná-
lise prospectiva, orientava o planejamento estratégico do Exército,
fixando objetivos para a Força Terrestre coerentes com os Objeti-
vos Nacionais. Era a guardiã do SIPLEx, e nela se originou o Plano
de Reestruturação da Força Terrestre, a FT-90, que desencadeou as
ações de modernização, entre as quais se incluía a Aviação do Exér-
cito. O SIPLEx, publicado em 1984, era uma metodologia completa
de planejamento, indispensável para a manutenção da unidade de
pensamento e ação no âmbito da Força, que ia desde a interpretação
da missão do Exército, passando pelos seus objetivos, concepções
estratégicas e diretrizes, até os planos de execução dos diferentes
sistemas.
O SIPLEx tinha por objetivo manter e aprimorar a tão necessá-
ria unidade de pensamento e ação, sendo essencial, nesse sentido, o en-
tendimento de que todas as ações desenvolvidas no Exército deveriam
estar condicionadas:

– à Missão do Exército;
– à Doutrina Militar Terrestre (DMT);
– aos objetivos estabelecidos na Política Militar Terrestre
(PMT); e
– à consequente Concepção Estratégica do Exército.
80 Aviação no Exército - uma visão histórica

A metodologia do SIPLEx era uma orientação prática e racio-


nal que visava sistematizar o processo de tomada de decisões, para
que se alcançassem os objetivos desejados com economia de meios,
em menor tempo e com os melhores resultados. Mais especificamente,
significava a coordenação das atividades realizadas por todos que intervi-
nham no planejamento, quer suas responsabilidades fossem de assessora-
mento, quer de decisão.
O SIPLEx tinha como finalidades estabelecer um método racio-
nal de planejamento e a execução das ações em vários níveis e setores,
acompanhando a execução, realimentando e controlando o sistema e
propiciando as melhores condições para o cumprimento da missão do
Exército Brasileiro (eficiência, eficácia e efetividade).
A missão, que norteia todas as atividades do Exército, estaria
sempre orientada pela destinação constitucional das Forças Armadas e
direcionada para a conquista e manutenção das aspirações e dos inte-
resses vitais da nação brasileira.
Estabelecia a necessidade de uma avaliação, uma verdadeira
radiografia da instituição que, ao final da síntese, ao estabelecer as in-
dicações para Políticas e Estratégias do Exército, orientaria as etapas
seguintes do planejamento.
A PMT expressaria o “que fazer”, em termos de orientação
e opções políticas, do então ministro do Exército, gerais e específi-
cas, indispensáveis à realização do planejamento estratégico sub-
sequente. A Concepção Política Básica compreenderia as opções
políticas do ministro do Exército no que se referia à Doutrina Mi-
litar Terrestre e suas interações com a organização, o preparo e o
emprego do Exército.

A 2ª Subchefia
Esta era dedicada ao planejamento operacional. Orientava, co-
ordenava e controlava o planejamento para emprego da Força Terrestre
em operações militares futuras, nas ações de defesa interna e externa.
A participação da subchefia ocorreu com a designação de um integrante
da comissão que teve como encargo a elaboração do plano de implanta-
ção da Aviação do Exército.
Estrutura do Estado-Maior do Exército 81

A 3ª Subchefia
A 3ª Subchefia reunia a Doutrina, a Ciência e a Tecnologia.
Orientava seus estudos permanentemente para responder a três ques-
tões principais:
Como o Exército deve se organizar para combater?
Como o Exército deve ser equipado?
Quais os materiais a desenvolver ou adquirir para que o Exér-
cito possa combater?

O estabelecimento da Doutrina de Emprego da Força Terrestre,


sua atualização e a pesquisa dos materiais de emprego militar adequa-
dos às organizações militares operacionais era uma das missões.
A 3ª Subchefia participou ativamente do processo de im-
plantação da Aviação do Exército e abrigou as Comissões de Estudo
e de Implantação da Aviação do Exército e a Seção de Aviação do
Exército. A partir de 1986, após a aprovação do Plano de Implanta-
ção da Aviação do Exército, intensos e exaustivos trabalhos foram
realizados em decorrência da importância, da singularidade e da
originalidade da missão.
A 3ª Subchefia foi o “motor” que impulsionou os rotores da
“recém-gerada” Aviação do Exército. Hábil e eficazmente “pilotada”
pelo general Baratta, “pairou” sobre as eventuais dificuldades com
grande habilidade e sanou pronta e eficientemente as “panes” oca-
sionais.
Hoje, no hall de acesso à 3ª Subchefia, no 2º andar do bloco A,
do Quartel-General do Exército, em Brasília, figura uma frase lapidar de
autoria do notável e saudoso chefe, o marechal Humberto de Alencar
Castelo Branco, a qual em seguida reproduzimos, pois demonstra com
exatidão o estado de espírito dos nossos chefes por ocasião da implan-
tação, que era também o de todos os envolvidos no projeto de criação da
Aviação do Exército.

Ao chefe não cabe ter medo de ideias, nem mesmo


de ideias novas. É preciso não perder tempo, implantá-las e re-
alizá-las até o fim.
Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco
82 Aviação no Exército - uma visão histórica

A seção de Doutrina era dividida em Subseção de Evolução da


Doutrina, Subseção de Formulação da Doutrina e Subseção de Divulga-
ção da Doutrina.
À Subseção de Evolução da Doutrina incumbia o estudo dos
diferentes exércitos no mundo, suas doutrinas de emprego, os novos
materiais, entre outros assuntos.
À Subseção de Formulação de Doutrina cabia a elaboração dos
manuais de emprego das organizações militares da estrutura militar de
guerra, bem como a revisão dos manuais existentes. Era responsável
igualmente pela elaboração e revisão dos Quadros de Organização das
unidades operacionais. Além disso, era instada a opinar sobre uma
gama extensa e variada de outros assuntos de interesse da Força. Vale
ainda ressaltar a responsabilidade sobre a elaboração dos Requisitos
Operacionais Básicos dos armamentos de interesse do Exército. Os
ROB definiam as características dos armamentos a serem adquiridos
ou desenvolvidos pela indústria. Era a “receita do bolo”.

Se o assunto não tem destinatário definido ou se


é muito complexo, manda para a 3ª Subchefia.
Autor desconhecido

A Subseção era dividida em carteiras, correspondentes cada


uma às Armas-Base (Infantaria e Cavalaria), às Armas de Apoio (Arti-
lharia, Comunicações, Engenharia) e aos Serviços, hoje Logística (Inten-
dência e Material Bélico). Em princípio, a cada carteira correspondia um
oficial com curso de Estado-Maior.
A Subseção de Divulgação, como o próprio nome indicava, era
responsável pela edição e distribuição dos manuais.
A subchefia, por meio da Seção de Doutrina, promovia ciclo de pa-
lestras e debates, segundo um programa anual de intercâmbio com exérci-
tos de países amigos. Do exposto, verifica-se que as missões cumuladas à
3ª Subchefia exigiam dos seus oficiais profundo conhecimento doutrinário,
inclusive de outros exércitos, o que capacitava a subchefia a ter o papel de
relevância que exerceu na implantação da Aviação do Exército.

Durante o ano de 1985, quando foi decidida a implantação da Avia-


ção do Exército, foram realizados encontros envolvendo temas relativos ao
Estrutura do Estado-Maior do Exército 83

emprego de helicópteros, operações aeromóveis, força de ação rápida e ou-


tros temas correlatos, o que indicava o interesse da subchefia sobre o assunto.
Esses ciclos de palestras e intercâmbios se inseriram no processo de absorção
de conhecimentos e experiências que permitiriam a formação de sólida base
para a formulação das medidas para a implantação da Aviação do Exército e a
elaboração das bases de uma doutrina autóctone de emprego.
Não posso deixar de aproveitar a oportunidade em que teço es-
sas considerações a respeito da subchefia que representou uma parcela da
maior importância na minha vida profissional. Ela merece toda a minha
reverência profissional e por isso cumprimento e agradeço o convívio dos
companheiros com os quais tive o prazer de ombrear ao longo dos anos em
que lá passei. Todos foram de plena importância na formação e sedimenta-
ção do grande e variado conhecimento profissional que absorvi. A extensa
área de atuação da subchefia exigia de todos os seus integrantes uma cul-
tura profissional desenvolvida indispensável ao cumprimento de suas atri-
buições. Gostaria de poder nominar todos os diletos companheiros com os
quais servi na subchefia; no entanto, pelo temor de cometer alguma injus-
tiça, fruto do esquecimento, ficam aqui as minhas genéricas homenagens.

A 4ª Subchefia
A 4ª Subchefia tratava de Pessoal e Legislação. Depois da inclu-
são no planejamento da FT-90 da implantação da Aviação do Exército,
ainda sob a forma de esquadrilhas articuladas pelos Comandos Milita-
res de Área, a 4ª Subchefia solicitou à 3ª Subchefia o Quadro de Organi-
zação das ditas unidades aéreas de modo que ela pudesse estabelecer as
necessidades em pessoal para atendimento da nova demanda. Cabia à
subchefia, após o recebimento dos Quadros de Organização elaborados
pela 3ª Subchefia, tomar as providências relativas à formação de pessoal
para o atendimento das novas necessidades.

A 5ª Subchefia
A 5ª Subchefia respondia pelo planejamento corrente. Teve um
papel de grande importância na criação da Aviação do Exército à medida
84 Aviação no Exército - uma visão histórica

que, em 1977, realizou estudos nesse sentido que certamente serviram


como subsídio para aqueles realizados posteriormente, em 1985, pela
3ª Subchefia, que culminaram com as ações descritas neste livro.

A 6ª Subchefia
À 6ª Subchefia cabia o Planejamento Diretor e a Modernização
Administrativa. Entre suas atribuições, constavam a elaboração, a im-
plementação e a atualização do Plano Diretor do Exército, cuja gerência
da execução era realizada por intermédio do acompanhamento físico-
financeiro.
Esperamos ter dado, ainda que de modo sucinto, uma visão ge-
ral da estrutura do EME e sua sistemática de funcionamento. A descri-
ção um pouco mais detalhada da 3ª Subchefia é compreensível à medida
que servi nela durante todo o período no qual passei no Estado-Maior e
por sua participação destacada em todo o processo de implantação da
Aviação do Exército.
Todas as subchefias estiveram representadas na comissão ini-
cialmente designada para estudar a implantação da Aviação do Exército.
Capítulo 6

O Plano de Estruturação da
Força Terrestre (FT-90)

E m 1984, o general Leonidas determinou ao EME a reali-


zação de estudos para o estabelecimento de um sistema
de planejamento estratégico. O trabalho abrangeu uma fase da definição
da metodologia e, decorrente desta, o sistema de planejamento propria-
mente dito. Atendendo às diretrizes ministeriais, o EME preparou o Pla-
no de Estruturação do Exército (PEEx), que estabelecia prioridades, me-
didas de racionalização, implantação do Centro de Instrução de Guerra
Eletrônica e da Aviação do Exército, padrões para formação de pessoal,
cronograma do planejamento administrativo, entre outras providências.
Esse planejamento, que seguiu a metodologia do SIPLEx, foi proposto ao
ministro do Exército no dia 21 de agosto de 1985.
O projeto da FT-90, por sua importância para a modernização
da Força Terrestre, foi principal motivação e exigiu dedicação plena,
capacidade criadora e tenacidade para vencer os desafios que se apre-
sentavam. De grande dimensão e alcance ambicioso, era composto por
muitos subprojetos importantes, como a criação dos grandes coman-
dos militares, em substituição aos exércitos; a reestruturação das bri-
gadas; a criação da Aviação do Exército; a criação do Centro de Guerra
Eletrônica; a aquisição e repotencialização de blindados; a compra de
foguetes de saturação de área Astros; a construção de quartéis, entre
86 Aviação no Exército - uma visão histórica

outras ações. Na área do ensino, tratava da ampliação das instalações


da Academia Militar das Agulhas Negras; da criação do Curso de Políti-
ca, Estratégia e Alta Administração do Exército (CPEAEX); da criação da
Escola de Administração do Exército; da criação do Corpo Feminino do
Quadro Complementar de Oficiais; da reformulação do IME, da Escola
Preparatória de Cadetes e do ingresso na AMAN, bem como da completa
reformulação dos currículos de todos os estabelecimentos de ensino.
É oportuna a reprodução de texto do livro História do
Estado-Maior do Exército:

As atividades encetadas nesta fase foram orientadas para a


viabilização da modernização da Força Terrestre e sua pro-
fissionalização. Foram construídos os alicerces capazes de
apoiar a caminhada rumo ao futuro. A modernidade tornou-
se um compromisso impostergável a ser agregado à Institui-
ção, e a tarefa foi entusiasticamente abraçada pelo EME.
A modernização transcorreu impulsionada pelas medidas
visando à reestruturação e articulação da Força Terrestre e
a aquisição de armas, equipamentos, viaturas e aeronaves.
Projetos de reconhecida importância, como o da Força Ter-
restre-90, e de equipamento e reaparelhamento prossegui-
ram sendo incrementados, ensejando a construção, am-
pliação, transferência e adaptação de quartéis, bem como a
atualização do material de diversas organizações militares.
Integrantes do Projeto FT-90, a Aviação do Exército, o Cen-
tro de Instrução de Guerra Eletrônica e a aquisição de blin-
dados tiveram progressos significativos.
A otimização do profissionalismo da Força Terrestre, uma
das direções estratégicas apontadas pelo ministro do Exér-
cito, no sentido de vitalizar o orgulho profissional, determi-
nou o empenho do Estado-Maior no estímulo à instrução,
no adestramento e no preparo técnico-profissional.

Entre outras influências, o Projeto FT-90 foi impactado pelos


acontecimentos ocorridos na Guerra das Malvinas. O conflito envolven-
do a Inglaterra e a Argentina evidenciou o emprego por ambos os con-
tendores de materiais e tecnologias até então não incorporados ao nosso
O Plano de Estruturação da Força Terrestre (FT-90) 87

Exército. Essa preocupante constatação apontava para a premente ne-


cessidade de adotá-los.
O emprego de radares para localização e identificação de alvos
terrestres, e não apenas de vetores aéreos, deixou evidente a necessida-
de de meios de detecção antecipada de ameaças. Com relação à busca
de alvos e direção de tiro, foi constatado o intensivo emprego de dispo-
sitivos de mira a laser e de centrais computadorizadas para o registro
e elaboração dos dados de tiro de artilharia ou lançamento de mísseis
superfície-superfície e superfície-ar. O Exército, mesmo conhecendo os
novos materiais, ainda não dispunha dos equipamentos para emprego
por sua Artilharia, tanto a de campanha como a antiaérea, em função do
elevado custo de aquisição de tais sistemas.
O emprego intensivo pelos ingleses da guerra eletrônica foi
fundamental para o sucesso de suas operações. Tropas desdobradas
no terreno, normalmente dispersas, necessitam comunicar-se entre si
e com seus comandos enquadrantes. O rádio, equipamento de comuni-
cação mais prático, porém menos seguro, e o radar são extremamente
vulneráveis à interceptação e à interferência eletrônica inimiga. Os in-
gleses fizeram uso intenso da interceptação das transmissões argenti-
nas durante o conflito.
O Exército não dispunha de meios ou doutrina de guerra eletrôni-
ca, o que mudaria com o advento da FT-90, com a criação e a aquisição de
meios do Centro de Guerra Eletrônica.
Na ocasião, já era objeto de estudo o emprego de helicópteros or-
gânicos da Força Terrestre em diversos conflitos, inclusive o ocorrido nas
Malvinas, onde, em função do terreno, acidentado e com poucas estradas,
tanto o apoio às ações terrestres como o transporte de pessoal e material
foram realizados com o emprego intensivo das aeronaves de asas rotativas.
O helicóptero já era um equipamento de dotação dos exércitos da Argentina
e do Reino Unido e atuava em uma variada gama de empregos operacionais.
Na década de 1980, assim como ocorria na área da guerra eletrô-
nica, o Exército Brasileiro pela inexistência de meios aéreos orgânicos era
totalmente dependente da Força Aérea para o desempenho de suas missões
administrativas e operacionais. O projeto da FT-90 contemplava a implanta-
ção da Aviação do Exército.
A FT-90, parece-me importante reafirmar, foi o mais ambicioso
projeto de modernização e reestruturação da Força Terrestre.
88 Aviação no Exército - uma visão histórica
Capítulo 7

Proposta de inclusão da criação


da Aviação do Exército no
planejamento da FT-90

Antecedentes

C ertamente, ao longo dos anos, pensadores militares, de-


pois da transferência das aeronaves da outrora Aviação
Militar para a Aeronáutica, embalaram em seus estudos os sonhos de
voltar a dotar o Exército de meios aéreos próprios adaptados às suas
necessidades, uma aviação consentânea com as nossas peculiaridades
para atender às imposições de mobilidade exigidas pela evolução da
doutrina de emprego dos exércitos.
O estudo dos conflitos após a Segunda Guerra Mundial de-
monstrava a crescente importância do helicóptero, em particular no in-
cremento da mobilidade tática.
Parece-me evidente que outros estudos sobre o tema tenham
sido produzidos em anos anteriores; no entanto, os documentos que
pude coligir e compulsar remontam a 1977, ano em que o EME, em ex-
pediente interno, manifestava o interesse de dispor de meios aéreos,
isto é, de aviões leves e helicópteros para facilitar as ligações entre os
grandes comandos e as unidades subordinadas, separados geograficamente
90 Aviação no Exército - uma visão histórica

por grandes distâncias. Os estudos de uma comissão giraram em torno


de duas linhas de ação. A primeira previa a operação dos meios aéreos,
exclusivamente pelo Exército; a segunda definia que em uma primeira
fase as aeronaves seriam operadas pela FAB e, na segunda fase, exclusi-
vamente pelo Exército. A conclusão apontava para a adoção da segunda
linha de ação. Não houve, infelizmente, o prosseguimento das ações sub-
sequentes.
Novas abordagens sobre o tema realizadas ainda em 1977 vei-
culavam outras alternativas que tinham em comum a criação de uma
unidade ou subunidade leve de aviação, a exclusão da possibilidade
de criação de uma Arma de Aviação e a adoção de efetivos e aeronaves
pertencentes ao próprio Exército. As variáveis gravitavam em torno da
infraestrutura de manutenção, que poderia estar a cargo da FAB ou de
empresa civil até que o Exército pudesse absorvê-la. Ao término desses
estudos, realizados de forma detalhada, foi selecionada a linha de ação
que preconizava a operação inicial das aeronaves pela FAB e, posterior-
mente, pelo Exército, ficando a infraestrutura e a manutenção sob o en-
cargo desta. A proposta de implantação previa a criação de companhias
de Aviação do Exército, subordinadas aos Comandos Militares de Área,
de forma progressiva. A ideia esboçada era muito semelhante à que mais
tarde foi proposta no âmbito do Plano de Estruturação da Força Terres-
tre, FT-90. É importante ressaltar a qualidade do estudo realizado. Infe-
lizmente, o elogiável trabalho elaborado naquela ocasião não se trans-
formou em realidade. A proposta foi postergada para nova avaliação em
época mais oportuna. Mais uma vez, a adoção de aeronaves pelo Exérci-
to foi procrastinada. Esse fato serve para realçar a importância do nosso
ministro Leonidas, que, a despeito das vicissitudes do momento, teve
o vislumbre e a coragem de enfrentar de peito aberto as dificuldades
que encontrou para a implantação da Aviação do Exército. Os estudos
de 1977 foram analisados pela 3ª Subchefia do EME e, com certeza, in-
fluenciaram aqueles elaborados a partir de 1985, que culminaram com
a implantação da nossa Aviação.
Como um dos objetivos deste livro é ressaltar o trabalho
daqueles que direta ou indiretamente participaram do processo de
implantação em caráter pioneiro, julgo importante destacar os oficiais
que fizeram parte do grupo que realizou os estudos em 1977. O chefe
do grupo de trabalho foi o general de divisão Roberto Alves de Carvalho
Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército no planejamento da FT-90 91

Filho, o qual teve como integrantes os coronel Ivan Jejuhi Afonso da


Costa, Amauri Soares Vieira e Décio Barbosa Machado, além do tenente-
coronel Marcos Francisco de Carvalho.
Em 1978, a dificuldade de a FAB atender às necessidades da
Força Terrestre voltava a preocupar o EME, que elaborou novos estudos,
amparados naqueles já realizados em 1977. Identificava que a dificul-
dade de apoio aéreo pela FAB tendia a agravar-se em decorrência de
problemas de caráter financeiro e estruturais e voltava a propor a im-
plantação paulatina de meios aéreos orgânicos para atender às neces-
sidades do Exército. Não seria, no entanto, ainda naquela oportunidade
que a implantação ocorreria. Era impositiva a decisão do Alto-Comando
da Força, em particular do ministro do Exército, aliado a uma conjuntura
favorável, como ocorreria mais tarde. A criação da Aviação do Exército
foi mais uma vez protraída.

A proposta de criação da Aviação do Exército


Em 4 de março de 1985, a 3ª Subchefia do EME encaminhava ao
vice-chefe do EME a proposta de criação de uma unidade leve de Aviação
para apoiar a Força Terrestre. O documento reconhecia que um exército
moderno não poderia prescindir do emprego exclusivo de aeronaves le-
ves, especialmente de helicópteros, e mencionava a desvantagem do Exér-
cito em relação àqueles, na América do Sul, que já possuíam aeronaves
orgânicas. A proposta ressaltava que os estudos a respeito da adoção de
meios aéreos já era antiga e voltava a destacar os trabalhos anteriormente
elaborados, aos quais nos referimos anteriormente. Citava os estudos em
desenvolvimento na 1ª Subchefia do EME, relativos à Concepção Estraté-
gica do Exército, no qual figurava a proposta de criação de uma aviação
orgânica da Força Terrestre, identificada como componente de relevância
na reorganização estrutural do Exército Brasileiro.

A mudança, a transformação, a modernização, o


aperfeiçoamento são a lei da vida. Aqueles que se apegam e
confiam somente no passado ou no presente estão destinados
a perder o futuro.
John F. Kennedy
92 Aviação no Exército - uma visão histórica

Referia-se ao fato que, no âmbito da subchefia, o assunto já era


objeto de interesse pela sedimentação da consciência de que o apoio de
aeronaves em proveito da Força Terrestre, particularmente nos moder-
nos campos de batalha, era de fundamental importância, como compro-
vado em conflitos mundiais limitados, a exemplo da Guerra do Vietnã,
a invasão russa ao Afeganistão e a disputa das Malvinas. Essa consta-
tação fez a subchefia propor ainda em 1984 uma pesquisa doutrinária
em relação ao tema. A ECEME foi o órgão encarregado para realizá-la e
enfocou os diversos aspectos abrangidos pelo emprego de aeronaves em
apoio à Força Terrestre.
Pelos estudos realizados por aquela Escola, ficou patente que a
disponibilidade da FAB, em especial, em helicópteros não era suficiente
para atender às necessidades operacionais do Exército Brasileiro, agra-
vada pelo fato de a FAB tê-los disseminado pelo território nacional, o
que diminuía ainda mais a capacidade daquela Força em suprir a de-
manda exigida pelo adestramento da tropa. Ressaltava um fato em par-
ticular, que me parece de grande relevância, quando sublinhava que o
emprego de helicópteros praticado na FAB condicionava a formação de
uma doutrina de operações aeromóveis ultrapassada e deixava de aten-
der aos nossos interesses operacionais.
Neste momento, é importante realizar um breve hiato. É preci-
so que fique claro que o papel dos helicópteros nas Forças Aéreas surgiu
pela necessidade de possuir um meio de maior flexibilidade para aten-
der às missões de salvamento e resgate, envolvendo o atendimento às
tripulações dos aviões, abatidas em combate sobre a terra ou sobre o
mar, tipo de emprego prevalente realizado pela FAB.
Era nítida a crescente importância atribuída aos helicópteros
pelos países mais desenvolvidos, destacando-se que, no contexto da
América do Sul, os exércitos da Argentina, da Venezuela, do Peru e do
Chile já dispunham de helicópteros orgânicos para apoiar suas opera-
ções, ficando o Brasil nesse aspecto em desvantagem. A evolução da
doutrina de emprego de helicópteros demonstrava que a aeronave evo-
luía de simples meio de transporte para uma plataforma aérea de com-
bate, colocada à disposição da Força Terrestre.
O estudo elaborado pela ECEME sugeria que a inclusão do tó-
pico “Emprego de Helicópteros em Apoio às Operações da Força Ter-
restre” na agenda do Intercâmbio Doutrinário com o Exército dos EUA,
Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército no planejamento da FT-90 93

realizado anualmente pela 3ª Subchefia, permitiria ratificar a compre-


ensão de que um exército moderno não poderia se abster de possuir sua
própria Aviação. O intercâmbio doutrinário era um evento anual, com
alternância da sede entre o Brasil e os Estados Unidos da América, onde
eram debatidos assuntos doutrinários de interesse das Forças de ambos
os países, de acordo com uma agenda antecipadamente preparada.
Enfatizava ainda o estudo em apreço que a disponibilidade de
uma aviação orgânica proporcionava ao comandante da Força Terrestre
um sensível aumento na capacidade de conduzir um combate ágil e
continuado, bem como obter vantagens no plano operacional, ainda
que em inferioridade numérica. Voltava a ressaltar, apesar dos esforços
da FAB, que a Força Terrestre não contava de modo satisfatório com
meios de Aviação para cumprir suas missões de adestramento. Concluía
esclarecendo que os vários outros estudos já realizados, a vasta literatura
consultada, o resultado de pesquisa doutrinária e o consenso já existente
no âmbito do Exército induziam à conclusão de que deveria haver no
mínimo uma Unidade de Aviação Leve Orgânica, exclusivamente destinada
a apoiar a Força Terrestre e sob seu controle direto.
A referência sobre a existência de consenso no seio do Exército
quanto à necessidade da implantação, como veremos, não se revestia
de verdade absoluta, considerando que parcela significativa postulava
a aplicação de recursos para solucionar outras necessidades correntes.
A conclusão do estudo da ECEME estimulou a elaboração de
proposta na qual se reconhecia que, para a viabilização da implantação,
certamente muitos esforcos necessitariam ser despendidos, mas, à se-
melhança do desafio da implantação da Guerra Eletrônica que se proces-
sava e de acordo com o espírito de modernização que o Alto-Comando
do Exército vinha imprimindo em suas decisões, deveria ser constituída
uma comissão para estudar o assunto, sugerindo a sua composição e con-
dições de funcionamento. A pesquisa foi encaminhada à apreciação do
3º subchefe, general Haltenburg. Aprovada, foi remetida ao vice-chefe do
EME e à 1ª Subchefia do EME, que, na ocasião, tinha como responsabilidade
a elaboração do Plano de Reestruturação da Força Terrestre, a denomi-
nada FT-90. O encaminhamento ao vice-chefe do EME incluiu uma pro-
posta de diretriz ministerial para o estudo do assunto.
À época da elaboração da proposta de criação da Aviação do
Exército, que se originou na Subseção de Evolução da Seção de Doutrina,
94 Aviação no Exército - uma visão histórica

da 3ª Subchefia do EME, era seu chefe o coronel Rubem Murilo Silva,


cujo adjunto era o tenente-coronel Jomar do Nascimento Telles, mais
tarde primeiro comandante da recém-criada unidade de aviação do
Exército Brasileiro.
A esse respeito, é oportuna a reprodução de depoimento do
coronel Telles ao informativo Águia, publicação que circula na Base da
Aviação do Exército, em Taubaté:

A existência de uma aviação integrante da Força Terrestre


já era acalentada em nosso meio muito antes dos trabalhos
do EME na década de [19]80. Contudo, os estudos naque-
le órgão se intensificaram como consequência da Guerra
das Malvinas, no sentido de dotar o Exército Brasileiro de
meios, como aeronaves próprias e equipamentos de guerra
eletrônica, adequados e indispensáveis para o desempenho
eficaz de nossas tropas nos modernos campos de batalha.
Algum tempo depois, orientado pelo meu chefe (Subseção
de Evolução da Doutrina) elaborou-se uma memória sobre o
assunto que concluía pela necessidade do Exército possuir os
seus próprios meios aéreos, propondo que fosse organizada
uma Comissão para Estudar a Criação da Aviação do Exército.
O parecer foi aprovado e o chefe do Estado-Maior do Exér-
cito, por meio de Portaria nomeou a comissão proposta.
Esta memória datada de 13 de fevereiro de 1985 consti-
tuiu-se em documento que precederia uma série de tantos
outros que culminaram com o Decreto Presidencial crian-
do a Aviação do Exército em 3 de setembro de 1986.
Para melhor compreensão desses fatos, cumpre ressaltar
a existência do que pode ser chamado de momento favo-
rável para o renascimento da Aviação do Exército, como a
vontade política do ministro do Exército, o excelente clima
de entendimento entre os três ministros militares e a exis-
tência de recursos financeiros.

A bem da verdade, a memória expedida pela 3ª Subchefia foi


submentida ao chefe do EME no momento em que o ministro do Exér-
cito, general Leonidas, já havia tomado a decisão de criar a Aviação do
Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército no planejamento da FT-90 95

Exército; caso contrário, ela teria o mesmo destino das propostas ante-
riores, isto é, o esquecimento.

Manifestações contrárias
Contrariando o suposto “consenso no âmbito do Exército sobre
a implantação de uma Aviação Leve”, constantes nos estudos anterior-
mente comentados, as reações contrárias à implantação partiram inclu-
sive do âmbito do próprio EME.
“Nós não possuímos recursos para manter nossas viaturas em
funcionamento; como iremos fazer a manutenção dos helicópteros?
Olha, lá em cima não existe acostamento. Na hora em que ocorrer uma
pane, vai cair.” Esse era um dos comentários que provocava a notícia
da intenção da criação da Aviação do Exército. Não posso classificá-los
como descabidos se considerar que na época o Exército realmente anda-
va às voltas com a imperiosa necessidade de renovar seus equipamen-
tos e se deparava, como sempre ocorreu, e como se sucede hoje, com
dificuldades orçamentárias.
Em agosto de 1985, solicitada a emitir parecer sobre a criação
de uma Unidade de Aviação Leve para apoio exclusivo à Força Terrestre,
a 5ª Subchefia ressaltou como necessário, antes da emissão de parecer,
examinar detida e profundamente os encargos associados que a cria-
ção do novo organismo acarretaria para a estrutura vigente, particular-
mente no que dizia respeito à manutenção, suprimento e atividades de
custeio. Referia-se à difícil situação que o Exército se encontrava, nota-
damente em relação à gestão do material, ou seja, suprimento e manu-
tenção. Acrescentava que a criação de uma Aviação Leve no Exército,
mesmo por meio da obtenção de recursos extraorçamentários, repre-
sentaria considerável acréscimo nas despesas e desequilibraria ainda
mais o perfil orçamentário.

Um país sem capacidade de exercer poder não


pode desempenhar qualquer papel no campo da segurança,
exceto como campo de batalha ou base de lançamento de
armas.
Margareth Thatcher
96 Aviação no Exército - uma visão histórica

Impõe-se neste momento fazer um breve interregno no comen-


tário sobre o documento da 5ª Subchefia para reconhecer que os aspec-
tos expostos exprimiam uma realidade efetivamente existente, da qual
não posso discordar. No entanto, se ficássemos aguilhoados a essas difi-
culdades, jamais sairíamos da situação de atraso tecnológico em que se
encontrava a Força, com sérios reflexos em sua operacionalidade.
Prosseguindo, afirmava o parecer da 5ª Subchefia que, no mo-
mento em que se buscava otimizar a relação investimento/custeio, a
criação de novas e onerosas atividades constituiria sério óbice para a
consecução do equilíbrio orçamentário almejado. Acrescentava que as
atividades de suprimento e manutenção estavam próximas do colapso e
enumerava uma série de razões que resolvemos não apresentar. Acres-
cia que a Aviação Leve, usando equipamento sofisticado, caro e de difícil
reposição, exigindo manutenção contínua, eficiente e inadiável e impon-
do a conservação de estoques de peças de reposição, particularmente
as de mais alta mortalidade, em níveis elevados, representaria pesado
ônus à cadeia logística, e a formação de recursos humanos exigiria altos
investimentos. Demonstrava preocupação quando se referia à comis-
são a qual se pretendia criar e que, segundo sua óptica, teria encargos
que lhe caracterizariam como órgão paralelo para desenvolver ativida-
des precípuas do EME, das quais o alto órgão não poderia nem deveria
abdicar. Sugeria que os encargos propostos para a comissão poderiam
ser atribuídos a um grupo de trabalho organizado no âmbito do EME e
composto por oficiais indicados pelas subchefias envolvidas com o as-
sunto, sob orientacão e presidência da 3ª Subchefia do EME. Concluía
reafirmando que a criação de uma Aviação Leve no Exército represen-
taria sério ônus no que dizia respeito às despesas de custeio e na sobre-
carga que exerceria na cadeia de suprimento e manutenção. Agregava
à sua argumentação o fato que a criação da Aviação Leve representaria
igualmente uma sobrecarga para os sistemas de ensino e de instrução,
uma vez que exigiria recursos humanos altamente especializados para
cuja formação o Exército estava inteiramente despreparado. Propunha a
constituição de um grupo de trabalho no âmbito do EME para “determi-
nar a oportunidade mais favorável de criação”, em função dos óbices que
apontara, e sugeria uma série de providências totalmente pertinentes
que não excluíam, no entanto, a postergação da implantação, como acon-
tecido em situações anteriores. Mas, diferentemente do que se sucedera
Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército no planejamento da FT-90 97

no passado, dessa vez, a vontade inabalável do ministro do Exército se


fazia presente. O tema não seria, como preteritamente ocorrera, ou seja,
remetido a um futuro incerto.
Como podemos verificar, caso houvesse prevalecido o parecer
da 5ª Subchefia, mais um belo estudo seria realizado pelo grupo de
trabalho proposto, e mais uma vez o projeto de criação da Aviação do
Exército iria parar no fundo de alguma gaveta até ser encontrado por
um oficial diligente que reiniciaria o ciclo. Felizmente, escreveu-se um
novo epílogo.
Em outubro de 1985, a 5ª Subchefia do EME por intermédio de
suas seções de Ensino e Instrução e de Logística voltava a se manifes-
tar sobre o assunto e, amparada na argumentação do estudo anterior,
concluía que as deficiências já apontadas “indicavam a necessidade de
prudência na adoção de soluções que pudessem agravar aqueles aspec-
tos, com reflexos diretos na mobilidade e na operacionalidade da Força”.
Ora, na ocasião o Exército ainda vivia embalado pela doutrina de
emprego adotada pelo exército americano na Segunda Guerra Mundial.
Nossa operacionalidade dependia de Batalhões de Infantaria Motoriza-
dos anacrônicos, que, estes sim, eram uma séria agravante à operacionali-
dade da Força. Havia muito o combate moderno possuía outro ritmo. Não
tenho receio de afirmar que a adoção da Aviação do Exército, com a Guer-
ra Eletrônica, foi o grande salto do Exército rumo à modernidade que se
impunha. A reboque da implantação da Aviação, caminhou a formulação
de novas concepções doutrinárias, a renovação dos manuais de emprego,
a criação da Força de Ação Rápida, a estruturação dos Batalhões de In-
fantaria Leve, entre outras providências, todas elas caracterizadas como
vetores de acréscimo significativo na operacionalidade e na mobilidade
tática e estratégica de nossa Força Terrestre.
Um exemplo do descrédito que a implantação enfrentou no
âmbito do próprio Exército foi um fato ocorrido mais tarde com um
oficial da Diretoria de Material de Aviação. Um helicóptero da FAB caíra
na Bahia e, infelizmente, havia, como ainda hoje existe, uma parcela de
militares que incompreensivelmente torcia contra a Aviação, sem atinar
que aquela era a maior onda de modernização que a Força experimentava
nas últimas décadas e que certamente contribuía para destacar o
Exército Brasileiro em relação aos seus congêneres na América Latina. O
oficial da DMAvEx ao cruzar, no Quartel-General do Exército, em Brasília,
98 Aviação no Exército - uma visão histórica

com outro oficial ouviu deste a afirmação, com sentido crítico: “Um
helicóptero de vocês caiu.” O oficial da DMAvEx, um militar normalmente
calmo e ponderado, justificadamente irritado, lhe respondeu: “Coronel,
em primeiro lugar o helicóptero que caiu era da Força Aérea, e não do
Exército; em segundo lugar, se fosse do Exército, não é ‘helicóptero de
vocês’, coronel, é ‘nosso helicóptero’; em terceiro lugar, eu gostaria de
saber em que lado o senhor está.” O coronel achando-se desrespeitado
disse que se dirigiria ao diretor da DMAvEx para se queixar do oficial,
o que fez em seguida. Depois de expor o fato ao diretor, ouviu deste os
argumentos que demonstravam que sua atitude crítica era lamentável e
injustificável e deu-se o caso por encerrado.
No entanto, por uma questão de justiça, volto a enfatizar a minha
convicção de que se não fosse o general Leonidas, ministro do Exército, e
não estivesse ele imbuído da férrea vontade de trazer o Exército ao pre-
sente e abrir-lhe uma porta para o futuro, nada teria acontecido.
Alguns podem aproveitar a oportunidade para pensar em baju-
lação, tantos os elogios que tenho feito ao ministro Leonidas. Tenham a
certeza de que tal sentimento não me move e nunca me moveu. Só devo
ao ministro a eterna gratidão por sua atitude corajosa. Minha posterior
designação para missão no exterior, como chefe da comissão encarre-
gada de receber os helicópteros adquiridos, deveu-se exclusivamente
ao empenho do general Bulcão, que empreendeu esforços para a minha
nomeação, sabendo que eu estava preparado e tinha a competência e o
conhecimento suficientes para exercer a missão com êxito. O comentá-
rio é endereçado aos maledicentes de plantão.
Segundo o general Leonidas, durante entrevista a mim concedi-
da, mesmo no âmbito do Alto-Comando havia reações à implantação. Ele
soube enfrentá-las e transformar em realidade seus antigos sonhos, que
eram também nossos e de muitos companheiros que nos precederam.
É importante ressaltar que os comentários contrários realizados
à época não eram generalizados nem realizados de forma irresponsável.
O Exército tradicionalmente passava por inúmeras dificuldades, fruto dos
parcos recursos e do material totalmente desatualizado. Aliás, em toda a
minha carreira militar, jamais vi o Exército em situação distinta. A nossa
querida e inatacável instituição, a despeito de sua importância para o nos-
so país, esteve sempre às voltas com a administração de escassos créditos.
Nossas viaturas, em particular as blindadas, só funcionavam porque sempre
Proposta de inclusão da criação da Aviação do Exército no planejamento da FT-90 99

fomos extremamente responsáveis e diligentes com o nosso material. A


despeito das dificuldades, com competência e responsabilidade sempre
as mantínhamos nas melhores condições possíveis.
Na maioria das ocasiões, as críticas consideravam que antes de
fazer a aquisição das aeronaves precisávamos suprir outras necessida-
des julgadas mais urgentes por alguns. Isso ficou claro no parecer da 5ª
Subchefia do EME sobre a oportunidade da implantação da Aviação do
Exército e no próprio depoimento do general Leonidas quando ele alu-
diu às reações no âmbito até do Alto-Comando do Exército.
A referência às críticas contrárias serve para realçar que o ca-
minho percorrido desde a decisão do ministro do Exército em implan-
tar a Aviação, passando pelos escalões subordinados encarregados de
operacionalizá-la, não foi fácil. E, por incrível que possa parecer, mesmo
hoje elas persistem. Tem gente que ainda não consegue entender que os
custos da Aviação do Exército são muito menores que os benefícios que
ela aporta ao Exército e ao País.
Nos três próximos capítulos, serão abordadas sucessivamente as
viagens da Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exérci-
to, quando foram visitadas organizações militares da Marinha e da Força
Aérea, o relatório decorrente dessas viagens e o Plano de Implantação da
Aviação do Exército. Como o relatório reúne os conhecimentos obtidos
nas visitas, e o Plano de implantação é uma síntese de ambos, isto é, vi-
sita e relatório, os leitores poderão encontrar quando os assuntos forem
ventilados algumas informações repetidas, mas vestidas com roupagens
diferentes. Isso se impõe. Não seria lógico que eu expusesse somente as
viagens e deixasse os leitores inferirem o conteúdo do relatório e do Plano
de Implantação. Além do mais, tudo é história e tento preservá-la.
Isso posto e certo da compreensão dos leitores, seguirei o planeja-
mento previsto originalmente. De todo modo, mantenho o posicionamento
de sintetizar, sempre e conforme o limite do possível, de modo a não preju-
dicar o entendimento, as informações que repasso ao longo do livro.
Capítulo 8

A Comissão para Estudar a


Implantação da Aviação
do Exército

Generalidades

D ecidida a implantação da Aviação do Exército, a primei-


ra medida nesse sentido foi a designação de uma comis-
são para estudar e propor as ações decorrentes. O início dos trabalhos
foi precedido por documento do chefe do EME, o qual estabelecia os pa-
râmetros orientadores da atuação da dita comissão.
A diretriz assinada pelo general de exército Jorge Sá Freire de
Pinho destinava-se a orientar os trabalhos da Comissão para Estudar a
Implantação da Aviação do Exército, essa era a sua designação. Estabele-
cia como objetivo a apresentação de uma proposta para a efetiva implan-
tação da Aviação do Exército. A fixação do objetivo já nos dava a certeza
de que daquela vez estaríamos trabalhando, contrariamente ao que ocor-
reu no passado, em base sólida, na cristalização do nosso antigo sonho
de possuir meios aéreos orgânicos. A diretriz definia que a Missão Geral
da Aviação do Exército deveria se alicerçar no estudo aprofundado dos
conceitos de emprego de helicópteros em países cujos exércitos já eram
dotados desses meios aéreos, assim como nos reflexos sobre o aumento
102 Aviação no Exército - uma visão histórica

da capacidade operacional da Força Terrestre na condução do combate.


A respeito do estabelecimento das missões básicas, os estudos deveriam
procurar a execução das missões táticas integradas à manobra terrestre e
ao incremento da operacionalidade, permitindo que seu comandante exe-
cutasse com maior eficácia as ações de manobrar, aplicar fogos, observar
e reconhecer, comandar e controlar e realizar o apoio logístico. Lembrava
que as limitações inerentes ao material impunham um estudo racional
do emprego. Sobre a proposta de uma estrutura organizacional para a
Aviação do Exército, lembrava a necessidade de considerar a criação de
um órgão para orientar a fase de implantação e a articulação das futuras
unidades de Aviação, de forma a satisfazer às prioridades do planejamen-
to operacional. A proposta de organização em pessoal e material teria de
se adequar às missões básicas e ter uma estrutura que lhe permitisse um
desenvolvimento futuro sem solução de continuidade. A aquisição do ma-
terial deveria se orientar pelas missões básicas, evitando-se sempre que
possível a diversificação de modelos e se considerar a facilidade de manu-
tenção, os custos de aquisição e a pluralidade de emprego. A quantidade
de aeronaves a ser adquirida se condicionaria à constituição no mínimo
de fração básica de emprego. Deveria ser estudada a conveniência de
aquisição de aeronaves leves de asas fixas para as ações de ligação e ob-
servação, a necessidade de aquisição de outros materiais, como viaturas,
armamento e equipamentos de saúde, de comunicações e de manutenção.
Na área de material, ressaltava dois aspectos. O primeiro re-
ferentemente à preocupação desde o nascedouro de evitar a diversifi-
cação de modelos, que tornaria a atividade extremamente onerosa em
razão do aumento dos custos de manutenção, de formação de pessoal e
de aquisição de ferramental e suprimentos.
Na área do pessoal, os estudos deveriam avaliar o aproveita-
mento dos quadros da ativa, independentemente de Arma ou Serviço,
de oficiais temporários e mesmo a contratação de civis; a necessidade
de definição do nível hierárquico para a formação de pilotos e de espe-
cialistas em manutenção; o apoio a ser prestado pelo fabricante e pelas
Forças Singulares na formação de pilotos e especialistas de manuten-
ção; o recrutamento de especialistas entre os que estivessem exercendo
atividades afins na área de manutenção e a necessidade da existência de
estabelecimento próprio do EB para a formação de pilotos e especialis-
tas em manutenção de aeronaves.
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 103

Em relação à manutenção, determinava que fosse considerada


a sua execução, inicialmente e em curto prazo, com o apoio do fabricante
e de outras Forças Singulares, enfatizando a necessidade de manuten-
ção própria do EB nos diversos escalões e inclusive a previsão de supri-
mentos.
A referida diretriz estabelecia ainda a importância já nesse ní-
vel de estudos sobre a localização da primeira unidade da Aviação do
Exército, levando-se em conta a facilidade para construção das instala-
ções físicas necessárias; a possibilidade de apoio pela FAB; a prioridade
para o apoio aos Comandos Militares do Sul, Norte e Oeste, nessa ordem;
a centralização inicial dos meios como forma de aumentar a flexibili-
dade; as condicionantes de emprego e os reflexos para a manutenção.
De acordo com esse contexto, se estabeleceram e se desenvolveram os
estudos da comissão.
A diretriz em questão respaldou-se em proposta elaborada
pela 3ª Subchefia e atendia igualmente a determinações emanadas do
ministro do Exército.

A Comissão para Estudar a


Implantação da Aviação do Exército

Esta surgia em resposta à inclusão da criação da Aviação do


Exército no âmbito do projeto da FT-90. Como se depreende da diretriz
do chefe do EME, tinha como responsabilidade a realização de estudos
objetivando a apresentação de proposta de medidas a serem adotadas.
O presidente era o general de divisão Angelo Baratta Filho, 3º subchefe
do EME, e o vice-presidente, o coronel de Cavalaria João Luiz Saraiva de
Castro, chefe da Seção de Doutrina da 3ª Subchefia. Reunia representan-
tes de cada subchefia do EME, com ênfase na 3ª Subchefia. Os demais
integrantes eram:

– tenente-coronel de Infantaria QEMA Jomar do Nascimento Telles – 3ª Sch;


– tenente-coronel CDEM Dario Francisco Loriatto – 3ª Sch;
– tenente-coronel de Cavalaria QEMA Paulo Sergio da Silva Maia – 3ª Sch;
– major de Material Bélico QEMA Wanderley de Castro – 3ª Sch;
104 Aviação no Exército - uma visão histórica

– coronel de Infantaria QEMA José Gustavo Petito – 1ª Sch;


– coronel de Cavalaria Pedro Arnóbio Medeiros – 2ª Sch;
– coronel de Infantaria QEMA José Aurélio Valporto de Sá – 4ª Sch;
– coronel de Artilharia QEMA Marcello Rufino dos Santos – 5ª Sch; e
– tenente-coronel de Cavalaria QEMA Edson Machado – 6ª Sch.

A participação de representantes de todas as subchefias do


EME justificava-se pela multifacetação do assunto envolvendo diver-
sas áreas, com prioridade para a 3ª Subchefia, que já realizava estudos
sobre o assunto e da qual partira a proposta da criação da Aviação do
Exército e da diretriz de funcionamento da comissão que se criava. A
despeito da composição da comissão com membros de todas as sub-
chefias, a interação se realizou de modo imediato, com o estabeleci-
mento de contatos pessoais e de laços de amizade e entendimento que
contribuíram para os trabalhos se desenvolverem de forma harmônica
e ganharem a celeridade que os prazos nos impunham. A letra fria dos
documentos oficiais manipulados por destinatários de rostos desco-
nhecidos não raras vezes dificultam ou provocam grandes atrasos na
solução de questões; ao contrário, o contato pessoal resolve com muito
mais presteza mesmo os problemas mais complexos. Além disso, a de-
signação de comissão sob a chefia de um oficial-general proporcionou
muito mais agilidade às nossas ações. Tudo ficou mais fácil. As provi-
dências no âmbito do EME, pela presença dos representantes de cada
subchefia na comissão, ganharam a presteza que o assunto impunha.
Éramos os dentes de uma complexa engrenagem que precisava come-
çar a se mover, a funcionar, e cabia ainda a todos nós da comissão, após
o início do movimento, trabalhar com vistas a que nada pudesse obstá-la
ou provocar qualquer solução de continuidade.
Outro aspecto a ressaltar foi o relacionamento com a Marinha
e a Força Aérea, que, graças ao alto nível de entendimento entre os res-
pectivos ministros, se fez sem as delongas características dos processos
burocráticos tradicionais. Se tivéssemos baseados os contatos com as
demais Forças exclusivamente por meio de ofícios, com certeza nossos
trabalhos não teriam a mesma rapidez. A independência da comissão
para estabelecer os contatos, tanto dentro da Força quanto externamen-
te, colaborou de modo significativo para a eficiente consecução das me-
tas que nos foram cometidas.
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 105

Lembro-me de que durante uma manobra de campanha quan-


do servia na 9ª Região Militar/9ª Divisão de Exército, com sede em Cam-
po Grande, no Mato Grosso do Sul, como oficial de operações (E3), pre-
ocupado com a evolução das unidades participantes naquele exercício,
não titubeei no desempenho das minhas funções em sair do meu PC e,
com o auxílio de um jipe dotado de rádio, contatar pessoalmente cada
comando de peça de manobra e resolver os problemas in loco. Conto o
fato para ressaltar a vantagem de manter o contato pessoal com as par-
tes envolvidas. A amizade pessoal, o calor das palavras ao pé do ouvido,
o esclarecimento dos pontos de vista e o respeito mútuo, tanto no Exér-
cito como em qualquer outra instituição, é o meio mais fácil de resolver
problemas, dirimir dúvidas e clarear situações de toda ordem.

O início dos trabalhos


Os trabalhos da comissão foram iniciados oficialmente em 24 de
setembro de 1985, com uma reunião chefiada pelo general Baratta, na qual
foi divulgada a todos os integrantes a Diretriz de Execução nº 1, que es-
tabelecia o prazo para a apresentação da proposta final, fixado inicial-
mente em 30 dias, intervalo esse que seria posteriormente estendido.
Além disso, foi estabelecido um cronograma de trabalho para todo o pe-
ríodo, com a apresentação das metas a serem atingidas e a definição das
equipes de trabalho. A diretriz fixava para 31 de outubro de 1985 a data
de apresentação da proposta ao chefe do EME. A orientação em relação
aos trabalhos que deveriam ser realizados seguia aquelas contidas na
diretriz do chefe do EME, com outros detalhamentos que se impunham.
Estabelecia a necessidade de iniciar os contatos com as demais Forças
Singulares no mais curto prazo e enfatizava a imperiosa necessidade
de que os integrantes da comissão se dedicassem prioritariamente aos
trabalhos de implantação. Essa observação era importante e pertinente,
uma vez que nenhum oficial fora liberado dos encargos com suas res-
pectivas subchefias.
A comissão foi estruturada nas áreas de Pessoal, Doutrina e
Material. Tive o enorme prazer de fazer parte da equipe de Pessoal, a
quem caberia na fase de implantação o estabelecimento dos parâmetros
relativos ao recrutamento, à seleção, e à especialização do pessoal, tarefas
106 Aviação no Exército - uma visão histórica

de capital importância. Era a principal área, pois se afigurava impositivo


que por ocasião do recebimento dos helicópteros tivéssemos o pessoal
pronto para operá-los e manuteni-los. Dela faziam parte o coronel de
Artilharia Marcello Rufino dos Santos, da 5ª Subchefia, que viria a ser
mais tarde chefe do EME, e o coronel de Infantaria José Aurélio Valporto
de Sá. Foi um raro prazer trabalhar com aqueles oficiais, os quais me
passaram lições importantes. A equipe de Doutrina era formada pelo
coronel Pedro Arnóbio de Medeiros, da 2ª Subchefia, coronel José Gustavo
Petito, da 1ª Subchefia, e o tenente-coronel Jomar do Nascimento Telles,
da 3ª Subchefia. A equipe de Material era constituída pelos tenentes-
coronéis Edson Machado, da 6ª Subchefia, Dario Francisco Loriatto, da
3ª Subchefia, e pelo major Wanderley de Castro, da 3ª Subchefia.
A Diretriz de Execução nº 1 estabeleceu ainda a necessidade
da realização de um programa de viagens às organizações militares das
outras Forças Singulares que operavam helicópteros para coleta dos
subsídios. Ficou estabelecido que diariamente a comissão se reuniria
no auditório da 3ª Subchefia, com a presença do general Baratta, para a
avaliação da progressão dos trabalhos.
Diante da complexidade do assunto, o prazo inicial para apre-
sentação da proposta final necessitou ser prorrogado, culminando os
trabalhos da comissão com a apresentação e a aprovação do Plano de
Implantação da Aviação do Exército, em novembro de 1985.
Em todos os integrantes da comissão, explodia o orgulho de de-
sempenhar uma missão tão nobre e de suma importância para a evolu-
ção do Exército. A emoção, a vibração e a apreensão andavam de braços
dados, invadindo todos nós. Emoção de fazer parte da história da Força;
vibração pela importância do nosso trabalho e apreensão pela neces-
sidade de apresentar os melhores resultados e cumprir cabalmente a
nossa missão.
O desempenho de nossas atividades foi precedido por um pe-
ríodo intensivo de preparação intelectual. Inicialmente, os conhecimen-
tos na área de Aviação estavam mais avançados entre os representantes
da 3ª Subchefia, considerando os estudos anteriormente elaborados na
Subseção de Evolução da Doutrina e na Seção de Doutrina. Conforme
previsto, para a complementação dos conhecimentos adquiridos, foram
realizadas visitas às instalações da Marinha e da Força Aérea que opera-
vam aeronaves de asas rotativas. Ao longo delas, a capacitação de cada
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 107

membro da comissão foi sendo construída graças em particular ao es-


forço de cada integrante e complementada pela troca constante de in-
formações entre os participantes da própria comissão. Era uma relação
simbiótica movida pelo interesse comum de fazer o melhor.
Recordo-me perfeitamente do início de meu envolvimento com
as atividades de implantação quando comprei livros versando sobre as
aeronaves de asas rotativas. Precisava conhecer sua evolução, a dinâmica
de funcionamento. Durante uma viagem ao Rio de Janeiro, logo no início
da nossa incessante busca dos novos conhecimentos que nos eram exigi-
dos, comprei no aeroporto o Manual de helicópteros para pilotos e mecâ-
nicos. Vi-me, então, estudando a aplicação do Princípio de Bernoulli nas ae-
ronaves e tomando conhecimento da brilhante ideia de, em vez de deslocar
as asas contra o vento em busca da necessária sustentação, fazê-las por meio
da rotação, criando as condições de sustentabilidade. Tudo era novidade.
Tudo era fascinante. Para os menos afeitos à física, e me incluo entre eles,
o Princípio de Bernoulli, antes citado, é aquele referentemente ao escoa-
mento dos fluidos. O formato da asa faz o ar que passa por cima dela ter
uma velocidade maior que o ar que corre sob ela. Isso acontece porque a
parte de cima é curva e aumenta a distância percorrida pelo ar e conse-
quentemente sua velocidade. Utilizando o Princípio de Bernoulli, temos
que, sendo a velocidade do ar (fluido) maior na parte de cima da asa, a
pressão é menor, e na parte de baixo, como a velocidade do ar é menor,
a pressão é maior. Dessa diferença, surge a força de sustentação. Quando
esta atinge valor maior que o da força peso, ele decola e se mantém no ar.
Na época, esses novos conhecimentos despertavam em nós um entusias-
mo juvenil e aumentavam a nossa vibração por estarmos envolvidos em
um projeto novo e apaixonante.
Comentávamos que o helicóptero era uma máquina que não tinha
sido feita para voar e, quando o fazia, parecia que ia se desintegrar. Os prin-
cípios aerodinâmicos, bem como os de emprego operacional dos helicópte-
ros, foram alvo de nossos estudos par e passo com as outras atividades que
desenvolvíamos. Essas observações, que podem hoje parecer ingênuas, na
época exerciam grande fascínio, acredito que em todos nós, por se constitu-
írem na abertura de um horizonte de novos conhecimentos.
Durante meus estudos, logo aprendi que os helicópteros eram
máquinas de grande versatilidade, com recursos superiores àqueles dis-
poníveis no avião. Sua incrível flexibilidade, que possibilita o voo nas
108 Aviação no Exército - uma visão histórica

mais diversas condições, tem como consequência tornar sua pilotagem


complicada. O piloto precisa pensar em três dimensões e usar ambos
os braços e pernas o tempo todo para manter a aparelho no ar. É uma
tarefa que requer treinamento intenso e habilidade, assim como aten-
ção contínua na máquina. O helicóptero pode se mover lateralmente em
qualquer direção ou girar 360o. Essa liberdade extra e a habilidade ne-
cessária para dominá-los tornam os helicópteros tão instigantes, mas
também complexos. Uma nova e estimulante atividade surgia. Uma nova
fronteira se descortinava à nossa frente, cheia de desafios.
Com essas e outras informações enriquecidas pelas leituras
diárias sobre o funcionamento da aeronave, assim como os estudos já
realizados sobre a doutrina de emprego, me atirei de corpo e alma nas
minhas tarefas. Certamente, os demais companheiros da comissão se
esmeraram também para atingir o mais alto nível de conhecimento so-
bre a atividade, como ficou bem demonstrado pela excelência do traba-
lho que foi realizado.
Em alguns momentos, era surpreendido pelo pensamento de
que havia somente 20 anos, recém-egresso da AMAN, como aspirante a
oficial de Cavalaria, chegara ao 1º Regimento de Cavalaria, em Itaqui, no
Rio Grande do Sul, uma unidade hipomóvel que ainda se utilizava como
meio operacional de locomoção o cavalo. Que enorme passo o Exérci-
to estava dando. Era motivo de grande orgulho estar colaborando para
que isso se concretizasse. A Aviação possui as mesmas características
da minha Arma de origem. Isso tornava maior a minha identificação, o
meu entusiasmo e a minha vibração. Assim, como a Cavalaria, a Aviação
guarda características de mobilidade, de grande flexibilidade e os mes-
mos horizontes largos e profundos.

O início do ciclo de viagens


e o processo de capacitação
O marco simbólico do começo de nossa missão, a meu ver, foi
o ciclo de viagens às organizações militares da FAB e da Marinha. Res-
saltava no semblante de todos os integrantes da comitiva o entusiasmo
marcado pela missão tão nobre e histórica que iniciávamos. Como a dou-
trina de emprego nas Forças que visitaríamos não tinha similaridade com
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 109

o que se previa para o emprego das nossas organizações militares de


helicópteros, os componentes da equipe de Doutrina foram divididos,
reforçando as equipes de Pessoal e Material.
A primeira viagem foi realizada no período de 14 a 18 de outu-
bro de 1985. A comitiva foi acompanhada pelo tenente-coronel Aviador
Carlos Alberto Jacques. A comissão visitou a Base Aérea de Santa Maria,
a Base Aérea de Santos, ambas da Força Aérea, e o Comando da Força
Aeronaval, em São Pedro da Aldeia, este da Marinha. Apesar de dividida
em áreas de interesse, pessoal e material, o ambiente que imperava era
de participação ativa e cooperativa de todos os integrantes da comissão.
Muito aprendemos naquela semana na qual dedicamos cada
minuto disponível ao conhecimento, à discussão e à interação das infor-
mações que obtivemos seja em conjunto, seja na satisfação do desejo de
novas informações que movia cada um. Nossa sede de coleta do máximo
de subsídios que pudessem nos orientar na adoção das medidas corre-
tas para a implantação da Aviação do Exército servia para aguçar a nos-
sa ânsia de saber cada vez mais. Precisávamos concluir nossa visita com
uma completa e detalhada avaliação das possibilidades de apoio que a
Marinha e a FAB poderiam nos oferecer, em particular, nas áreas de pes-
soal e material. Necessitávamos também reunir conhecimentos sobre as
áreas do recrutamento, da seleção e da especialização do pessoal com
vistas a ratificar ou retificar nossas convicções iniciais sobre tais temas.
Estávamos, permitam-me filosofar, envolvidos naquela busca constan-
te do ser humano pelo conhecimento e pela verdade, naturalmente em
uma área mais restrita.
Durante toda a narrativa de nossas visitas, utilizarei normal-
mente a primeira pessoa do plural por motivo óbvio. Era a viagem da
comissão.

A Base Aérea de Santa Maria


(14 e 15 de outubro de 1985)
A primeira unidade visitada foi a Base Aérea de Santa Maria,
comandada pelo coronel Aviador Sergio Pedro Bambini, onde fomos
recebidos com extrema cordialidade, a despeito do sigilo com que
o assunto foi tratado na ocasião no âmbito da Força Aérea. Naquela
110 Aviação no Exército - uma visão histórica

organização militar, tivemos a oportunidade de travar conhecimento


com o então major Aviador Adenir Siqueira Vianna, que seria mais
tarde assessor da DMAvEx, o qual colaborou de modo significativo
para o desenvolvimento das atividades da diretoria. O comandante
da Base e os comandantes de esquadrões buscaram atender da
melhor forma possível aos interesses da nossa comitiva. A despeito
de a data ser comemorativa do aniversário da Base, diversos oficiais
deixaram de participar das solenidades para se colocarem à nossa
disposição, demonstrando o alto grau de profissionalismo dos nobres
companheiros da gloriosa FAB. Todas as dependências nos foram
franqueadas, e as respostas aos nossos questionamentos, bem como as
exposições realizadas, estiveram sempre eivadas de grande franqueza
e espírito colaborativo. Quando nos referirmos ao longo deste livro
sobre a Base, estaremos englobando a unidade que hospeda, a Base
propriamente dita, e as unidades que são hospedadas. À Base compete
normalmente a responsabilidade de apoiar as unidades operacionais
que nela se encontram estacionadas. No caso da Base Aérea de Santa
Maria, o 5º/8º Grupo de Aviação (5º/8º GAv).
Quando tratarmos de recrutamento, seleção e formação, esta-
remos nos referindo exclusivamente à pessoal aeronavegante. As infor-
mações expostas neste capítulo se restringirão àquelas por mim julga-
das mais importantes e que foram de valia para embasar nossos estudos
e proposições posteriores.
Na Base Aérea de Santa Maria, considerando que o 5º/8º GAv
se limitava a receber pilotos já qualificados, habilitando-os à função de
1º piloto (1P), não obtivemos dados de interesse para o recrutamento.
No que concerne à seleção de pilotos e mecânicos, tivemos
reforçada a ideia de que deveria ser rigorosa e criteriosa, em particu-
lar, em função da complexidade envolvida nas atividades de operação
do equipamento, de manutenção e no controle estatístico de equipa-
mentos e pessoal.
A complexidade, já referida, e os custos de formação de pilo-
tos e graduados indicavam a necessidade de orientar a seleção na busca
de candidatos jovens que pela idade pudessem permanecer no exercí-
cio da atividade o máximo de tempo. Já sabíamos que seria impossível
deixar de abrir algumas exceções nesse aspecto em face da imposição
de formação de elementos de enquadramento, especialmente capitães
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 111

e oficiais superiores, para mobiliarem as funções de Estado-Maior nas


unidades que se pretendia criar, tais como comandante, subcomandan-
te, entre outras. A idade ligava-se exclusivamente ao máximo de perma-
nência na função, pois sabíamos que ela não se constituía em empecilho
à formação do piloto. Convencemo-nos igualmente de que a seleção dos
graduados deveria se orientar para aqueles de melhor nível escolar e
que possuíssem, tanto quanto possível, algum conhecimento da língua
inglesa. Constatamos que determinada habilitação obtida por especia-
lização no âmbito do Exército poderia ser de utilidade na formação do
graduado para o desempenho de atividades de manutenção de aerona-
ves. Desse modo, deveríamos dirigir nossos interesses àqueles recém-egressos
das escolas de especialização, ou seja, da Escola de Material Bélico, da
Escola de Comunicações e da Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea,
considerando que a continuada prática após a conclusão do curso na
Força Terrestre poderia implicar a absorção de “procedimentos” não
condizentes e inadmissíveis com a atividade envolvendo meios aéreos.
Nesta, não se admite o “jeitinho”.
No tocante aos pilotos, aprendemos que uma pequena experi-
ência anterior na pilotagem de aeronaves de asas fixas poderia se revelar
de valia nas semanas iniciais de formação. No entanto, o intenso contato
com a operação anterior de aviões poderia se tornar um complicador na
adaptação às aeronaves de asas rotativas. Esse aspecto, no entanto, não
deveria condicionar a seleção de candidatos a piloto.
Chamou-nos particularmente a atenção a importância conce-
dida ao que a FAB denominava de “oficial especialista”, elemento res-
ponsável pela supervisão e coordenação da manutenção. Lamentavam
o fato de que tais oficiais não eram mais formados pela FAB em virtude
da desativação da Escola de Especialistas de Curitiba. Tal situação era
considerada prejudicial. Os oficiais especialistas deveriam abranger as
especialidades de armamento, de comunicações e de aeronaves. Mais
tarde, convencidos dessa necessidade, proporíamos a criação do cargo
que denominamos, como já aludido anteriormente, de gerentes.
Segundo o comandante da Base, existiam estudos tendentes
à reativação daquele centro de formação. Para ele “[...] se tivesse que
optar por um oficial especialista ou um aviador a escolha recairia no
primeiro”. Tal assertiva nos despertava duas certezas; a primeira,
referentemente à necessidade de planejarmos a formação dos nossos
112 Aviação no Exército - uma visão histórica

especialistas; a segunda, a respeito da “capital importância” de que a


manutenção se revestia quando se trata de meios aéreos. A FAB adotava
a sistemática de acesso de graduados ao oficialato quando passavam a
ocupar a função de oficial especialista, o que era considerado menos
eficiente do que a formação específica. Tais considerações denotavam
a transcendental importância da manutenção em uma unidade aérea. A
máxima era que “na área de manutenção, realizar a economia de pessoal
é perder vidas e equipamentos”.
Constatamos que era fundamental acima de tudo trabalhar
para o estabelecimento de uma “mentalidade de aviação”, comprome-
tida com a segurança de voo e decorrente do alto grau de capacitação
de pilotos e da excelência da formação de graduados especialistas, estes
como sustentáculo de uma manutenção de aeronaves, contínua, minu-
ciosa, criteriosa e sem quaisquer contemplações com adaptações ou so-
luções de emergência.
As particularidades envolvidas pela operação de meios aéreos
nos faziam crescer a certeza de que a implantação da nova atividade e a
contínua formação dos quadros efetivos da aviação do Exército teriam
influência extremamente benéfica para toda a Força Terrestre à medi-
da que a “mentalidade de emprego, operação e manutenção dos meios
aéreos impregnada naqueles militares se disseminariam no âmbito do
Exército criando novos conceitos, seja na área de manutenção, seja no
controle dos suprimentos”.
Foi destacada a importância da seleção e especialização de mé-
dicos em medicina aeroespacial, curso que na FAB era realizado na Base
Aérea do Campo dos Afonsos. Outro aspecto abordado sobre o qual já
fizemos uma breve alusão foi a necessidade do domínio de termos téc-
nicos em inglês, considerando que via de regra os manuais de aviação
eram elaborados nesse idioma. Naquela época, ainda não havíamos ini-
ciado as providências relativas à compra de nossos helicópteros; logo,
não tínhamos noção da língua na qual os manuais seriam elaborados.
Constatamos que a Base não poderia participar na formação
dos nossos pilotos em razão da deficiência em pessoal habilitado para
tal. Esta só recebia pilotos qualificados como 2º piloto e se limitava a
alçá-los a 1P (1º piloto) da aeronave, que operava no caso o Bell UH-
1H, o vulgo “Sapão”. O 5º/8º GAv realizava a qualificação dos pilotos por
meio da execução de missões operacionais. A formação dos graduados
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 113

também não seria possível, pois os da Aeronáutica eram todos formados


na Escola de Especialistas, em Guaratinguetá, o que orientava o nosso
interesse em direção àquela escola. No entanto, a opção de matrícula
de nossos graduados em Guaratinguetá deveria considerar que ela
se destinava prioritariamente a formar especialidades ligadas à
manutenção de aviões. Em consequência, seria importante que em nosso
planejamento estivesse prevista, após o término do curso, a adaptação
dos graduados na manutenção de helicópteros pela realização de
estágios ou pela frequência em outros cursos específicos.
Na FAB, a manutenção possuía quatro escalões/níveis de res-
ponsabilidade:

1º escalão – de pista;
2º escalão – de hangar;
3º escalão – de base; e
4º escalão – de parque.

Na Base Aérea de Santa Maria, os encargos de manutenção eram


do Esquadrão de Suprimento e Manutenção (ESM) que realizava os três
primeiros escalões. Tal procedimento proporcionava a centralização
dos meios, seja em pessoal, seja em ferramental, facilitava o controle da
manutenção e tirava das unidades operacionais essa responsabilidade.
Embora a sistemática da manutenção integrada tenha sido enaltecida
pelo comandante da Base, ela era objeto de restrição pelo comandan-
te do Esquadrão de Helicópteros (5º/8º GAv), uma vez que a unidade
operacional perdia o controle do seu equipamento durante o período
de recolhimento das aeronaves ao elemento de apoio. No tocante à res-
ponsabilidade pela manutenção, a sistemática não colaborava para uma
maior ligação piloto-aeronave, que só vinha a ocorrer durante as inspe-
ções do pré-voo e do pós-voo. Esse é o eterno contencioso entre o pesso-
al de manutenção e os que operam as aeronaves. Os primeiros, preocu-
pados em “baixá-las” para a manutenção; os segundos, ávidos por vê-las
voando continuamente. Sobre esse aspecto, aprendemos ainda que as
atividades de controle e manutenção são continuadas e de fundamen-
tal importância, implicando o estabelecimento do efetivo de cada seção
de tal maneira que a ocorrência de férias ou outros impedimentos não
acarretassem solução de continuidade do serviço.
114 Aviação no Exército - uma visão histórica

Resolvi relatar todos esses detalhes para permitir os leitores


avaliarem a gama de conhecimentos que obtivemos e que, após reagi-
dos, influenciaram o processo de tomada de decisão em relação à es-
truturação da nossa Aviação. Acho importante que isso seja mostrado.
Bem; continuemos com a nossa visita.
A estrutura de manutenção e de suprimento existente na Base
Aérea de Santa Maria tinha toda a sua capacidade absorvida pelo efeti-
vo de aeronaves existente. Em caso de recebimento de novos meios aé-
reos, da FAB ou adquiridas pelo Exército, seria necessário um aumento
de pessoal e ferramental. O Esquadrão de Suprimento e Manutenção
se dividia em quatro setores, ou seja, pessoal, suprimento, manuten-
ção e controle. O primeiro tratava da atividade-meio do esquadrão.
Os demais se dedicavam à atividade-fim. O setor de manutenção era
chefiado por um oficial aviador, com estágio ou vivência prática de ma-
nutenção, não sendo especificamente especializado para o exercício
da função. O setor de controle exercia a fiscalização das atividades de
manutenção e de suprimento. Um oficial do quadro de especialistas
chefiava essa área, cujos parâmetros de fiscalização nos pareceram
bastante severos, o que indicava a necessidade de se pensar para a
Aviação do Exército na especialização de oficial para o desempenho da
gestão de suprimento de Aviação. A sistemática de controle empregada
abrangia cada conjunto ou componente com ciclo de vida definido. A
FAB estava desenvolvendo um programa denominado Projeto 500, que
permitiria um detalhado acompanhamento dos componentes de cada
aeronave por meio de controle informatizado. Esse programa indica-
ria diariamente a demanda de reparos e de inspeções. Lembro que es-
tamos falando dos anos 1980, quando o emprego da informática ainda
não era muito difundido. Recordo-me de que mesmo no âmbito do QG
do Exército, em Brasília, não se encontravam muitos experts no assun-
to, e a linguagem operacional era o DOS. O comandante do ESM teceu
também considerações acerca de outro programa, o Projeto 300, que
permitiria o controle informatizado de todos os itens de suprimentos
disponíveis na FAB. Esse programa asseguraria a intercambiabilidade
daqueles itens no contexto da cadeia de manutenção e de suprimen-
to da Força Aérea. Na ocasião, o sistema encontrava dificuldades para
sua implantação, pois as atualizações só eram feitas mensalmente, o
que não traduzia a real situação dos níveis de estoque. Valendo-se do
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 115

P 300, o ressuprimento seria processado de forma automática, caso


não ocorressem restrições de recursos. Na sistemática que vigorava,
cada vez que os níveis de suprimento da Base atingissem um estoque
mínimo, era providenciado o respectivo ressuprimento. Aquele supri-
mento alocado às unidades era designado como “remoto”, e o armaze-
nado nos parques dos Afonsos e do Campo de Marte, designado como
“central”. Anotávamos cada detalhe. Tudo era importante.
É fundamental ressaltar que o controle dos componentes dos
helicópteros é calcado no número de horas de voo e no tempo de utili-
zação. Esse acompanhamento era de responsabilidade da Seção de Con-
trole, que, além de administrar o ciclo de vida de cada componente, tinha
a seu encargo a execução do controle de qualidade da manutenção por
meio de sua equipe de inspetores. Esta, formada por sargentos de reno-
mada experiência em manutenção, permitiria assegurar um padrão de
cerca de 60% de disponibilidade dos meios aéreos, índice acima da mé-
dia, segundo informações do comandante do ESM. No entanto, em razão
de dificuldades financeiras que repercutiam na cadeia de suprimentos,
tal índice variava. A Base possuía um escalão móvel para o apoio às ae-
ronaves no cumprimento de missões fora da sede com efetivo variável.
Além dos oficiais especialistas, a estrutura de suprimento era
mobiliada por sargentos e suboficiais mecânicos de várias especializa-
ções. Normalmente, a cada aeronave correspondia, quando estivesse em
missão, um mecânico de célula e motores e um mecânico de armamento,
também artilheiro.
O 5º/8ºGAv atuava na área do então III Exército e seguramente
detinha a maior experiência do emprego de helicópteros em apoio ao
Exército. O comandante era de parecer que o esquadrão só deveria cum-
prir missões operacionais. Segundo ele, os encargos de capacitação do
piloto 2P, egresso da Base Aérea de Santos, à condição de 1P sobrecarre-
gavam as atividades da unidade, mesmo recebendo apenas uma média
de seis oficiais para esse aperfeiçoamento.
Na FAB, o helicóptero UH-1H era guarnecido por uma tripulação
de quatro homens, dois oficiais aviadores e dois sargentos mecânicos. Es-
tes auxiliavam os pilotos durante o pouso e a decolagem em regiões de
espaço e visibilidade restritas ou durante o voo pairado. Nessas condi-
ções, ao tripulante cabia a responsabilidade de um setor de observação de
90o. Cada qual realizava também a operação das metralhadoras laterais.
116 Aviação no Exército - uma visão histórica

A orientação dos mecânicos é imprescindível nas situações acima referidas,


uma vez que os pilotos não têm visão da retaguarda do helicóptero.
Não obtivemos como prevíamos a definição sobre um módulo
em pessoal essencial à manutenção de cada aeronave, dado importante
para o planejamento das nossas necessidades, tanto em pilotos como
em elementos de apoio. Foi apresentada uma “solução viável” para cons-
tituição de apoio de manutenção para as 12 aeronaves UH-1H que eram
as operadas naquela Base.
Pudemos nos informar exclusivamente sobre as particularida-
des que envolviam a manutenção do UH-1H no que concerne ao número
de horas de manutenção por hora de voo. As especialidades em mecâni-
cos totalizavam à época 15, todas com formação na Escola de Especia-
listas, em Guaratinguetá. Constatamos que com a estrutura existente, ou
seja, em pessoal e material, a unidade não tinha possibilidade de pro-
porcionar apoio de manutenção a um número maior de helicópteros, o
que já nos alertava em relação aos cálculos mecânico/aeronave os quais
precisávamos realizar.
Foi enfatizada a importância de oficial exclusivamente voltado
para o controle de suprimento diante da quantidade elevada de itens os
quais compõem as aeronaves, o que nos levou a pensar na proposta de
criação de mais uma especialidade, ou seja, a de gerente de suprimentos.
Pelos fatos observados e as informações obtidas durante a vi-
sita, concluiu-se que a Base Aérea, ou o esquadrão operacional que ela
hospedava, não possuía estrutura que lhe permitisse a formação de pi-
lotos sem habilitação anterior, em razão particularmente das restrições
de pessoal, de equipamento e de estrutura de ensino específica. Mesmo
no caso do recebimento de novas aeronaves, era impeditivo o apoio de
manutenção ou a habilitação de maior número de pilotos que os já for-
mados sem um aumento de seus efetivos. A seleção para a Aviação do
Exército com a participação de pessoal temporário foi julgada inapro-
priada entre outros fatores pela “falta de mentalidade”. O 5º/8º GAv po-
deria ocupar-se da capacitação dos nossos pilotos desde que já especia-
lizados e, exclusivamente, no cumprimento de missões desempenhadas
por aquela unidade.
A principal experiência coligida envolveu as atividades de ma-
nutenção, as quais eram centralizadas pela Base, objetos de opiniões fa-
voráveis e desfavoráveis. Cabia-nos avaliá-las e adotar aquela que mais
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 117

se enquadrasse em nossa concepção de emprego. A centralização como


vantagem significativa proporcionava a otimização do aproveitamento
de pessoal e dos meios disponíveis.
Outro fato importante foi a imperiosa necessidade de informa-
tização das atividades de controle de suprimentos. Ela era de extrema
importância e deveria ser implementada desde o início do funciona-
mento de nosso primeiro batalhão de helicópteros.
Na área específica de manutenção e suprimento, sedimentou-se
a necessidade fundamental do estabelecimento de uma “mentalidade de
aviação” intensamente compromissada com o desempenho rígido, siste-
mático e consciencioso da atividade de manutenção de helicópteros.
O esquadrão de helicópteros possuía uma estrutura organizacional
e uma dotação em aparelhos semelhante ao das outras unidades operacio-
nais da FAB. Entretanto, sua organização e doutrina de emprego diferiam da-
quela inerente às operações helitransportadas como a conhecíamos. Em rela-
ção ao tipo de voo, para o cumprimento de suas missões adotavam o rasante,
aproximadamente 100 pés de altura; o de contorno, o mais próximo possível
do solo e sobre os obstáculos, e o Nap of the Earth (NOE), que se caracterizava
pelo máximo de proximidade do solo e entre os obstáculos.
O suprimento de Classe III (combustível) se apoiava na estru-
tura da Petrobras.
No tocante às instalações físicas, também objeto de avaliação,
constatou-se a necessidade da construção de hangares, torre de contro-
le, instalações de controle e segurança de voo, pátio para manobra, pista
de grama para pouso deslizante, instalações e material de combate a
incêndio, material auxiliar de pista, entre outras providências. Era uma
base física diferente daquela que conhecíamos em nossos aquartela-
mentos.
Embora o Bell UH-1H já se ressentisse de problemas de
manutenção e suprimento por causa de seu longo tempo de utilização,
era considerado em termos operacionais uma aeronave eficiente e ofe-
recia boas condições para adaptação de armamentos e estabilidade para
o pouso, em função do trem de aterrissagem (esqui) e do seu baixo cen-
tro de gravidade.
Esses foram alguns dos principais aspectos observados os
quais seriam posteriormente reagidos com as demais observações e que
influenciariam, ou não, os nossos planejamentos futuros.
118 Aviação no Exército - uma visão histórica

Partimos da Base Aérea de Santa Maria com a certeza de que


tanto a Base quanto as unidades de manutenção e de helicópteros ti-
nham muito a contribuir com o Exército na implantação da nossa Avia-
ção, tendo sido constatado o interesse em nos apoiar e um elogiável es-
pírito de cooperação.

A Base Aérea de Santos


(16 de outubro de 1985)
Nosso segundo destino foi a Base Aérea de Santos. Lá, as explana-
ções ficaram sob a responsabilidade exclusiva do seu comandante, o coro-
nel Aviador Sobrinho, que, em razão do alto grau de sigilo como foi tratado
o assunto, se tornou nosso único ponto de contato. Diante do profundo co-
nhecimento daquele oficial no tocante a helicópteros, as informações a nós
transmitidas foram proveitosas, uma vez que o assunto foi encarado com
muita franqueza por ele. Entretanto, a coleta de subsídios não teve a mes-
ma gama de detalhes do ocorrido na Base Aérea de Santa Maria. Esta tinha
como encargo a formação de pilotos de helicópteros da FAB como 2º piloto
e a especialização dos mecânicos de aeronaves de asas rotativas.
Em relação à área de recrutamento, a experiência com a forma-
ção de oficiais R/2 temporários não foi julgada efetiva em face da neces-
sidade fundamental de que os pilotos de aeronaves conhecessem com
profundidade o emprego de Força apoiada. O 1º/11º GAv, que se hos-
pedava na Base, era uma unidade destinada primordialmente à forma-
ção de pilotos de helicópteros para a Força Aérea. Ministrava também
cursos de adaptação para graduados oriundos da Escola de Especialis-
tas, em Guaratinguetá, que se destinavam a unidades de helicópteros.
O 1º/11º GAv cumpria ainda missões operacionais, que, na opinião do
comandante da Base, era benéfico, uma vez que trazia maior motivação
aos instrutores. Além do mais, possibilitava melhor formação do piloto,
tornando-o mais próximo de atuar como 1P.
Em relação à seleção do pessoal, foi realçada a necessidade de
que fosse criteriosa em razão da complexidade das atividades que en-
volviam a operação, emprego e manutenção de meios aéreos.
Sobre a especialização do pessoal, fato que nos interessava vi-
vamente, mais uma vez avultou-se a importância da formação de consciência
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 119

aeronáutica nos efetivos ligados à atividade aérea. Não houve concor-


dância quanto ao vulto da importância do oficial especialista, enfatizada
em nossa visita à Base Aérea de Santa Maria. Julgou-se que a atual siste-
mática, com o acesso do graduado ao oficialato, atendia com eficiência
às necessidades. Foi ressaltado que a formação de pessoal necessitaria
ser encarada como o principal fator no planejamento para a implanta-
ção da Aviação do Exército. A incorporação dos meios aéreos deveria
estar intimamente ligada à conclusão da formação de oficiais pilotos e
graduados mecânicos necessários a operá-los e manuteni-los.
A Base Aérea de Santos possuía um Centro de Instrução des-
tinado à conversão de pilotos de avião em pilotos de helicópteros, já
possuidores de conhecimentos teóricos anteriores, o que não era o caso
do nosso pessoal. O curso de piloto de helicópteros tinha a duração de
cinco semanas, com a carga de 25 horas de voo, qualificando o tenen-
te aviador como 2P da aeronave H-13 (Bell 47, Sioux). Inicialmente, o
oficial frequentava durante uma semana aulas teóricas, o denominado
Ground School, oportunidade em que recebia noções sobre o equipa-
mento, motor, sistemas hidráulicos e elétricos, procedimentos de emer-
gência, tráfego e fraseologia. O comandante da Base observou que uma
das limitações existentes era a capacidade de operação do aeródromo,
que somente possibilitava simultaneamente seis aeronaves na linha de
instrução. Normalmente, para um curso de 25 alunos, ocorriam cerca
de 40 saídas diárias de aeronaves. A Base tinha capacidade de ministrar
dois cursos por ano. Depois do realizado em Santos, os novos pilotos de
helicópteros iam completar a formação no 5º/8º GAv, em Santa Maria,
que acabáramos de visitar.
A Base teve experiência anterior com a formação de civis, sem
os conhecimentos acima referidos. Ficou demonstrada a possibilidade
da formação de pilotos para o Exército, dependente de uma adaptação
curricular. A Base Aérea de Santos não formava os graduados
especialistas, somente qualificava-os à manutenção de helicópteros
em curso de três meses. Como vimos anteriormente, na Força Aérea
a formação dos graduados era realizada exclusivamente na Escola de
Especialistas, em Guaratinguetá, o que nos indicava a necessidade de
estabelecimento prévio de contatos com o Ministério da Aeronáutica
para a obtenção de vagas naquele estabelecimento de ensino. A FAB
formava quadros para suas necessidades específicas, direcionadas
120 Aviação no Exército - uma visão histórica

primordialmente à operação e manutenção de aeronaves de asas fixas,


o que nos levava a considerar as alternativas para adaptação do nosso
pessoal nas aeronaves de asas rotativas antes do retorno ao Batalhão de
Aviação do Exército.
Em decorrência das diferenças existentes na pilotagem de avião
e de helicópteros, ocorriam casos de pilotos que não se adaptavam à pilo-
tagem do último. As reações eram distintas. De acordo com o comandan-
te da Base, um aluno civil, com três horas de voo em helicóptero, realizou
o curso em Santos com menor número de horas do que parcela signifi-
cativa de outros com experiência anterior de pilotagem em aeronaves de
asas fixas. Tal consideração nos reforçava a certeza de que a habilitação
anterior em pilotagem de avião não era critério a ser considerado na se-
leção do pessoal.
O curso normalmente ministrado era limitado, pois incluía so-
mente a formação para pilotar a aeronave (pé e mão), e não seu empre-
go operacional, o que nos levava a considerar a necessidade de prever
um complemento da formação para os nossos pilotos. Destinava-se a
operar o helicóptero como meio de transporte, e não como uma arma de
apoio à Força Terrestre.
A Base tinha uma capacidade de formação proporcional ao
número de aeronaves em operação. No caso dos futuros mecânicos de
helicópteros da FAB, eles realizavam um estágio prático no Centro de
Instrução no quarto semestre do curso da Escola de Especialistas, em
Guaratinguetá, com a duração de cerca de três meses. Aqueles direcio-
nados para as unidades de helicópteros necessitavam ainda se adaptar
à aeronave com a qual iriam efetivamente trabalhar. Nossos mecânicos
teriam de seguir a mesma sistemática. Sugeriu-se que para o Exército
seria mais conveniente a formação do especialista sem qualquer experi-
ência anterior. Isso facilitaria a introdução de nova mentalidade de ma-
nutenção. No caso do aproveitamento de sargentos já formados e com
grande vivência de tropa, poderiam trazer vícios de suas atividades an-
teriores como mecânicos de viaturas.
Outra lição aprendida foi que todas as especialidades nos diver-
sos escalões de manutenção deveriam estar representadas em quanti-
dades compatíveis mesmo na fase de implantação, independentemente
da quantidade de aeronaves adquiridas. A cada modelo destas sempre
corresponderia uma adaptação, considerando as diferenças entre os
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 121

sistemas que as equipavam. Precisávamos estudar os diversos currícu-


los das diferentes escolas do Exército para avaliar quais seriam os mais
adaptados para aproveitamento em especialidades necessárias à Avia-
ção do Exército.
Ficou bem sublinhado que o determinante seria a “decisão de
fazer”, pois a partir dela as soluções ocorreriam, incluindo a adaptação da
estrutura para apoio ao Exército. Essa decisão, carregávamos a certeza, já
tinha sido tomada pelo ministro do Exército, general Leonidas. Sua inaba-
lável determinação, certamente, derrubaria todas as barreiras.
Enfatizou-se a necessidade de que na aquisição do nosso equipa-
mento “se decidisse por aquele que melhor se adaptasse à missão que lhe
seria atribuída”. Deveriam ser evitadas “tentativas” na busca de acertos que
levariam fatalmente a uma variada gama de equipamentos, com as conse-
quentes dificuldades de operação, manutenção e suprimento.
Concluímos que a formação de pilotos e sargentos especialistas
na FAB implicava a incorporação de conhecimentos anteriores de avia-
ção pelo nosso pessoal. Tal exigência deixava antever duas situações. A
primeira seria considerar na formação de pilotos e mecânicos do Exér-
cito a realização dos cursos de formação da Aeronáutica, que era factível
no caso dos graduados mecânicos, mas inapropriado em relação aos ofi-
ciais pilotos. A segunda conduzia à necessidade de adaptação dos currí-
culos da Base Aérea de Santos para especializar nossos pilotos.
Segundo o comandante da Base, o Exército deveria formar, com
a antecedência possível, seu pessoal especializado, ou seja, pilotos e me-
cânicos, o qual deveria estar apto a receber treinamento do fabricante
logo após a celebração do contrato de compra das aeronaves, visando à
adaptação ao material adquirido. Na formulação contratual, se deveria
atentar, com muito cuidado, para o apoio de manutenção a ser prestado
pelo fornecedor, bem como para o suprimento a ser adquirido. Era im-
portante evitar a aquisição de quantidade excessiva de itens de supri-
mento de baixa mortalidade e de pouco interesse para a fase inicial de
implantação. Foi realçado que a quantidade inicial de helicópteros por
menor que fosse não eliminava a necessidade de uma estrutura embrio-
nária de apoio, sobretudo de suprimento e manutenção.
Com essas novas informações, deixamos a Base Aérea de Santos e
nos dirigimos ao Comando da Força Aeronaval, em São Pedro da Aldeia, situ-
ado na cidade de mesmo nome, no Estado do Rio de Janeiro, última etapa da
122 Aviação no Exército - uma visão histórica

nossa viagem, que já se demonstrava até aquele momento largamente fru-


tífera. A exemplo do que ocorria na Força Aérea, a Base Aeronaval existente
em São Pedro da Aldeia atuava como hospedeira de unidades operacionais,
inclusive da Força Aérea, e uma voltada para a instrução.

Comando da Força Aeronaval em


São Pedro da Aldeia (17 e 18 de outubro de 1985)
O Comando da Força compreendia a Base, o Centro de Instru-
ção e as unidades operacionais de helicópteros. Doravante, vamos cha-
mar esse conjunto de Força Aeronaval ou Base.
Nossa recepção foi realizada pelo próprio comandante da Força
Aeronaval, o contra-almirante Pedro Steenhagen Filho. Ficou patente o
caráter totalmente aberto com que a Marinha estava tratando o assun-
to, bem como a sua determinação em auxiliar o Exército. Fomos recebi-
dos com tapete vermelho e banda de música. Em ambiente totalmente
amistoso, todas as portas da Base foram abertas à comitiva. Os oficiais
de Marinha que acompanhavam a nossa comitiva se desdobravam para
atender a todos os nossos interesses. Posso afirmar que a comitiva foi
recebida com grande entusiasmo. Diferentemente do sigilo com que os
assuntos foram tratados nas unidades da FAB, nosso contato com a Base
foi presidido por um ambiente de total descontração, no qual consta-
tamos de pronto o mais vivo interesse daquela Força em proporcionar
total apoio à implantação da nossa Aviação.
A Aviação na Marinha guardava uma série de pontos de identifi-
cação com o que antevíamos para a Aviação do Exército. A visita nos dei-
xou vivamente impressionados. A Base Aeronaval de São Pedro da Aldeia,
com suas bem estruturadas unidades de manutenção, ensino, assim como
as operacionais, a par da excelente disposição da Marinha em contribuir
decisivamente para a implantação da Aviação do Exército, se constituía,
certamente, em organização que reunia as maiores experiências na área
de helicópteros em condições de nos apoiar nos campos da doutrina de
emprego, formação de pessoal e manutenção de nossos equipamentos.
Na área de pessoal, no que diz respeito ao recrutamento, mais uma
vez foi realçado que, especialmente na fase de implantação, ele deveria se
orientar ao universo dos militares da ativa, quaisquer que fossem as funções a
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 123

serem exercidas. Na Marinha, os futuros pilotos eram os egressos da Escola


Naval que, indistintamente, podiam habilitar-se à especialidade. Esse
enfoque assemelhava-se ao por nós imaginado no qual o recrutamento
dos nossos pilotos se faria entre aqueles oficiais diplomados recentemente
pela Academia Militar, permitindo-lhes um período breve de permanência
na tropa. Já considerávamos à época importante que o piloto da aeronave
conhecesse a priori o emprego do elemento terrestre a ser apoiado. Tal
consideração induzia ao recrutamento de oficiais com relativa vivência,
após a formação, em corpo de tropa.
No que diz respeito aos graduados, foi discutido e julgado proce-
dente o recrutamento do indivíduo, com formação em especialidade afim,
na Força Terrestre. A seleção deveria orientar-se basicamente em torno de
graduados de melhor classificação e nível de escolaridade, pois, em particu-
lar, aqueles que fossem realizar o curso em Guaratinguetá teriam de vencer
de início um gap de conhecimentos que os separava dos graduados da FAB.
Para os pilotos os requisitos de conhecimento do emprego da
Força, de idade, (condicionada à possibilidade de permanência na Avia-
ção), de habilitação psicotécnica e de saúde eram essenciais. Mais uma
vez recordou-se a importância da formação, na fase de implantação, de
oficiais capitães e superiores que exerceriam o enquadramento do nú-
cleo inicial do 1º Batalhão de Aviação do Exército.
O sistema de formação de pilotos e mecânicos adotado pela Força
Aeronaval apresentava significativo grau de identidade com o que se visua-
lizava para a formação na Aviação do Exército à medida que estava direcio-
nado à operação, emprego e manutenção exclusivamente de aeronaves de
asas rotativas. Formava elementos sem experiência anterior na pilotagem e
com o enfoque de utilização do helicóptero como “arma”. Possibilitava a for-
mação do piloto operacional, ainda que em um estágio distinto daquilo que
se desejava para a Aviação do Exército, no entanto, em nível significativa-
mente superior ao piloto de helicóptero formado na Base Aérea de Santos.
Além de tudo, iniciava a formação em equipamento mais atualizado do que
aquele pela FAB e possibilitava a formação operacional na mesma unidade
aérea. Constatamos que do currículo ministrado, particularmente no tocan-
te à operação e emprego da aeronave, somente duas horas não se aplicavam
às missões de emprego previstas para apoio à Força Terrestre. A duração
superior ao do curso da Base Aérea de Santos permitiria o brevetamento
de nossos pilotos com um número maior de horas de voo.
124 Aviação no Exército - uma visão histórica

Ao contrário das unidades de Aeronáutica visitadas, a Base reu-


nia as condições apropriadas de formar nossos oficiais pilotos e gradua-
dos especialistas com os meios em pessoal e equipamentos que possuía.
Na formação de pilotos, o único óbice, que não foi considerado crítico ou
impeditivo, residia no número de instrutores disponíveis. No que con-
cerne a aeronaves de treinamento, aguardava-se o recebimento de 16
novos aparelhos Jet Ranger no decorrer de 1986, o que facilitaria sobre-
maneira a formação de pilotos.
Quanto à formação de graduados, verificou-se a possibilidade
de que algumas especializações existentes no Exército, nas áreas de Co-
municações e Eletrônica e Armamento, poderiam ser adaptadas àquelas
necessárias para atividades aéreas.
A formação de pilotos e mecânicos era realizada pelo Centro
de Instrução e Adestramento Aeronaval (CIAAN). Lá, os cursos de
especialização para mecânicos eram ministrados a marinheiros de
1ª classe e cabos, que, após o término, eram promovidos a terceiro-
sargento. Realizavam os cursos de motores, de estrutura e metalurgia,
de manobras e equipamentos, bem como de eletrônica e eletricidade de
aviação. Eram matriculados por meio de prévia seleção a cargo do Serviço
de Seleção de Pessoal da Marinha e iniciavam o curso com conhecimentos
anteriores afins às especialidades que iriam frequentar. O nível técnico
ou de supervisão que habilitava o homem a supervisionar, dirigir ou
chefiar era obtido, mais tarde, pelos graduados que frequentaram o
curso de aperfeiçoamento nas mesmas áreas. Consistia em extensão
do curso realizado em graduação anterior. Eles eram denominados de
subespecialização, por sua menor duração, para sargentos ou cabos
indiferentemente e incluíam as atividades de operação de radar, sonar,
controle de voo e sobrevivência e equipamentos.
Como pudemos depreender das informações sobre a atividade
aérea na Marinha, ela estava totalmente adaptada às nossas necessida-
des mais imediatas.
Um ponto mais uma vez ressaltado foi a capital importância da
formação de uma “mentalidade de aviação” extremamente comprome-
tida com a segurança e subordinada a padrões rigorosos de operação e
manutenção. Este era um tema recorrente. Tal fato apontava na direção
de que a especialização se fizesse sobre elementos despidos de “vícios
comuns a atividades anteriormente desempenhadas não submetidas
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 125

ao mesmo rigorismo de procedimentos que a atividade aérea”. No caso


de graduados do Exército, nos levaria a recrutar militares que tivessem
concluído recentemente o curso de especialização na Força Terrestre e,
se possível, sem vivência em tropa após o curso.
No tocante ao oficial especialista, que seria no futuro o nos-
so gerente, em razão da complexidade das atividades envolvidas pela
manutenção de aeronaves, a especialização na Marinha era obtida no
exterior (EUA). Ela adotava a sistemática de habilitar o graduado ao ofi-
cialato após o exercício continuado da função. Não considerava neces-
sária a formação de oficial especialista em manutenção. No nosso caso,
optamos pela formação dos gerentes, uma vez que não tínhamos tempo
para aguardar sargentos mecânicos novos atingirem o oficialato para
desempenhar a função. Precisávamos desse especialista no mais curto
prazo possível.
O CIAAN participava também da formação de médicos de avia-
ção. Não conseguimos obter dados referentes aos custos de formação de
pilotos e especialização de graduados na Base Aérea Naval de São Pedro
da Aldeia. No entanto, considerando o interesse demonstrado pela Ma-
rinha na criação de uma Aviação para o Exército, acreditávamos que o
maior tempo de duração dos cursos e os gastos envolvidos não se cons-
tituiriam óbice significativo à formação do nosso pessoal.
Mais uma vez, foi enfatizada a necessidade do domínio por ofi-
ciais e praças de vocabulário técnico em inglês, destinado ao manuseio
de manuais técnicos orientadores de manutenção e operação das aero-
naves. O inglês técnico constava dos currículos de aperfeiçoamento no
CIAAN.
Cada fase do curso ministrado na Marinha correspondia a um
grande deslocamento aéreo realizado pelos alunos, o que contribuía
significativamente para o aumento da experiência dos instruendos. Tal
prática não constava dos currículos de formação da Força Aérea.
As especialidades de graduados na Marinha eram grupadas em
áreas de maior abrangência do que as adotadas na Força Aérea. Tal con-
duta subordinava-se à aceitação do aproveitamento de algumas espe-
cialidades existentes na Armada que eram adaptadas à atividade aérea.
Esse procedimento era realizado ao longo do exercício continuado da
função pelo graduado, orientado por elementos com especialização e
aperfeiçoamento específicos em aviação.
126 Aviação no Exército - uma visão histórica

A exemplo do verificado na Força Aérea, os pilotos exerciam


funções administrativas em terra.
Assunto já enfocado anteriormente e reconhecido pelo pessoal
da Força Aeronaval, a diversidade de modelos de aeronaves adotadas
pela Marinha se constituía de fator complicador para a manutenção. A
despeito dessa dificuldade, a limpeza dos hangares e a apresentação dos
helicópteros nos chamaram a atenção e denotavam a excelência dos ser-
viços de manutenção desenvolvidos. Apesar da experiência já obtida, a
Base não tinha ainda se capacitado para a realização de todos os níveis
de manutenção e valia-se do apoio de empresas civis e da Aeronáutica.
A incorporação da capacitação para a realização de todos os ní-
veis de manutenção pela aviação militar nas três Forças Singulares é um
aspecto que deve ser objeto de discussão no traçado de uma política de
manutenção. À medida que as Forças Armadas, que são grandes opera-
doras de aeronaves de asas rotativas, se aparelharem para realizar toda
a gama de intervenções de manutenção exigidas por suas respectivas
frotas, as empresas civis não se sentirão estimuladas a investir recursos
nessa área. Parece-me necessário o estabelecimento de “um meio-ter-
mo”, de modo que possamos preservar uma fatia para as empresas e nos
incluirmos no esforço de fortalecer a indústria civil. Em caso de confla-
gração, é nesse mercado que buscaremos o apoio; logo, ele precisará
estar preparado para tal atividade. Feita essa observação, voltemos às
nossas considerações sobre a visita.
A Marinha pretendia adotar o paiol alfandegado, utilizado pelo
FAB e que vinha se mostrando efetivo na redução dos elevados custos de
manutenção de estoque de sobressalentes. Essa medida foi encampada
por nós por ocasião da elaboração do contrato, como veremos ao longo
do livro, e tem se mostrado eficiente.
Em resumo, a participação da Marinha no processo de forma-
ção de nosso pessoal foi sem maiores delongas a nós hipotecada. A sis-
temática se adequava perfeitamente aos nossos interesses.
Chamou-nos a atenção o Grupo de Desenvolvimento de Táti-
ca (GDT), subordinado diretamente ao chefe do Estado-Maior da For-
ça, que tinha como responsabilidade, entre outras obrigações, propor
e participar no desenvolvimento de novas normas, procedimentos ou
doutrinas táticas; realizar o preparo, a análise e a divulgação de informações
operativas de interesse tático, obtidos por quaisquer meios; estudar e
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 127

disseminar normas e procedimentos específicos para o emprego táti-


co de novos meios, equipamentos e sistemas empregados; executar a
permanente avaliação e revisão das táticas em uso; elaborar os estu-
dos para o estabelecimento de requisitos de material relacionado com
a Força Aeronaval. O GDT possuía uma bem equipada biblioteca espe-
cializada e um arquivo com inúmeros trabalhos no campo da doutrina
de emprego e de seus armamentos. Na área do material, os estudos e
avaliações conduzidas pelo GDT apresentavam o helicóptero Esquilo
como uma aeronave adequada às missões de reconhecimento e como
boa plataforma de armas com a metralhadora coaxial.
Coube à nossa equipe de manutenção da comissão realizar um
detalhado exame sobre a sistemática de manutenção na Força Aerona-
val de modo a respaldar nossos estudos sobre a estrutura que seria ado-
tada em nossas unidades de Aviação. À semelhança da FAB, a Base, além
de ser a hospedeira das unidades operacionais e de instrução da Força
Aeronaval, se encarregava de toda a infraestrutura de apoio. Tinha qua-
tro departamentos ligados à atividade-fim, a saber: de Manutenção; de
Armamento e Aviônica; de Suprimento e de Operações.
O Departamento de Manutenção se assemelhava grosso modo
à Companhia de Material Bélico de Batalhão Logístico, unidade de apoio
da estrutura do Exército, com uma organização peculiar, na qual eram de-
senvolvidos os planejamentos, a supervisão técnica e a manutenção das
aeronaves e seus componentes, à exceção do material de aviônica e de ar-
mamento. Depois de 20 anos de funcionamento, passava por um processo
de reformulação para atender às tarefas de gerenciamento e execução dos
serviços industriais para atuar em proveito das aeronaves da Marinha, de
outras Forças e de entidades civis. A nova estrutura compreenderia três ge-
rências: administração; indústria e manutenção de aeronaves. O chefe do
Departamento, bem como os das demais gerências, era oficial aviador com
experiência em manutenção de aeronaves. Primordialmente, cabia ao De-
partamento analisar, planejar, coordenar, controlar e executar os serviços
de manutenção de 2º e 3º escalões de todas as aeronaves da MB, alocadas
nos esquadrões e nos destacamentos aéreos de helicópteros, à exceção
de equipamentos de aviônica e armamento. A Gerência de Administração
tinha sob sua responsabilidade o controle financeiro e contábil das ativi-
dades industriais, bem como a organização e funcionamento dos paióis
(depósitos) de matéria-prima e de pronto uso. Constituía-se também seu
128 Aviação no Exército - uma visão histórica

encargo a execução de serviços gerais, tais como manutenção e limpeza das


instalações, o transporte de componentes, sobressalentes e matéria-prima
específicos para uso nas aeronaves em revisão. A Gerência Industrial reunia
os serviços especializados em seis divisões, ou seja, motores e acessórios;
componentes; apoio e hangar; ensaios e testes; estruturas e metalurgia. As
atividades dessa gerência, embora exercidas por um oficial aviador, eram
muito mais identificadas com os requisitos técnicos exigidos de um enge-
nheiro aeronáutico. A Gerência de Aeronáutica era na realidade constituída
por um conjunto de gerências referentemente a cada tipo de aeronave de
dotação da Marinha do Brasil. Dessa forma, elas se destinavam cada qual
aos helicópteros Bell 206, Esquilo, SH-3A e Lynx. A gerência para as aerona-
ves Super Puma já estava prevista. Os gerentes de manutenção efetuavam o
planejamento e o controle de todos os grandes serviços, ou seja, revisões e
overhauls. Além disso, eles tomavam todas as providências para a execução
de qualquer serviço a ser prestado pela Base nas aeronaves, sejam aqueles
previstos nas inspeções, sejam mesmo os extraordinários, mantendo um
estreito contato com os esquadrões e com os outros departamentos da Base
Aérea Naval de São Pedro da Aldeia. A atuação dos gerentes de manutenção
lhes possibilitava uma visão global de todas as atividades envolvidas nos
serviços a serem realizados nas aeronaves, exercendo uma coordenação
que seria muito difícil para o chefe do Departamento executar.
A utilização dos oficiais aviadores nos encargos relativos à área
de manutenção só era possível em razão do critério de formação ado-
tado no CIAAN. Como a Marinha do Brasil não forma na Escola Naval
oficiais direcionados especificamente para as atividades de manutenção
e setores correlatos, esse artifício parece ter dado um ótimo resultado.
A Marinha possuía três tipos de especialidades básicas:

– MV: motores de aviação;


– SV: estruturas e metalurgia de aviação; e
– VN: eletrônica e eletricidade de aviação (aviônica).

Existiam subespecialidades de armamento, cursadas pelos me-


cânicos SV.
A diversificação de modelos de aeronaves constituía-se fator
complicador nas atividades de manutenção, pois cada tipo de material
requer diferentes sistemáticas de trabalho. A Marinha do Brasil estava
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 129

procurando ampliar sua capacidade de manutenção, o que permitiria


futuramente uma sensível economia de divisas. A viabilidade técnica e
econômica do apoio às futuras aeronaves do Exército dependeria tão
somente do material que fosse adquirido.
Ao Departamento de Aviônica e Armamento competia a execu-
ção dos serviços de manutenção de 2º e 3º escalões de Aviônica e Ar-
mamento de todas as aeronaves da Marinha, bem como prover a ma-
nutenção de 1º e 2º escalões das aeronaves em trânsito no material de
sua responsabilidade. Era chefiado por um oficial com especialidade em
eletrônica, não necessariamente aviador. O cargo poderia ser exercido
por um engenheiro eletrônico. O departamento se dividia em quatro di-
visões: Técnica; Produção; Controle; e de Armamento de Aviação, mo-
biliado por oficiais da Armada, Fuzileiros ou do Quadro Complementar,
com cursos de eletrônica e de armamento, com o efetivo de 35 praças
distribuídas nas suas diversas seções.
O Departamento de Suprimento era um depósito secundário
que, em face do vulto do material estocado, podia ser considerado na
terminologia da Marinha como o depósito primário do material de
aviação, com um total de 28.000 itens para cinco tipos de aeronaves.
As instalações estavam sendo modernizadas em virtude das exigên-
cias técnicas requeridas pelo suprimento estocado, com a adoção de
novos sistemas de climatização. O departamento tinha uma subordi-
nação técnica à Diretoria de Aeronáutica da Marinha e administrativa
à Diretoria de Abastecimento, a qual se encarregava de atualizar os
inventários periódicos, semanal e mensal. O parâmetro para o estabe-
lecimento do nível inicial de suprimento necessário à implantação de
um tipo de material era tomado normalmente de acordo com informa-
ções do fabricante, observada a experiência já incorporada pela Ma-
rinha. Foi constatado que, em decorrência de problemas oriundos de
falhas na implantação inicial, a cadeia de suprimento ainda não podia
ser considerada ideal.
Tendo em vista o programa de aquisição do Super Puma, estava
em andamento a organização, na própria área do departamento, de um De-
pósito Alfandegado para suprir as necessidades impostas pela manutenção
do material. O departamento possuía um efetivo da ordem de 30 homens,
e seu chefe admitia a viabilidade de proporcionar treinamento específico
para oficiais e sargentos a serem empregados nas atividades de suprimento.
130 Aviação no Exército - uma visão histórica

Ao Departamento de Operações competiam todas as operações


relacionadas à segurança de voo e das instalações do aeródromo. Orga-
nizava-se em cinco divisões das quais nos pareceu as de maior impor-
tância aquelas relacionadas à Segurança das Instalações e ao Apoio e
Segurança de Voo. Todo o material de voo utilizado pelos tripulantes dos
helicópteros era de responsabilidade direta do departamento, incluindo
a manutenção, inspeções e testes de equipamento. O combate a incêndio
constituía-se em uma seção de capital importância para o funcionamen-
to do aeródromo e das operações de voo, normalmente composto por
mecânicos de viaturas com curso de combate a incêndio. Com sistemá-
tica de trabalho muito apurada, suas viaturas eram guarnecidas diaria-
mente meia hora antes do amanhecer. O pessoal nunca era desviado da
função, e o objetivo primacial do trabalho era assegurar a proteção ao
homem. O oficial de segurança, não essencialmente aviador, necessitava
de curso específico e, como pré-requisito, devia ser um indivíduo alta-
mente detalhista. O material auxiliar de pista compreendia as fontes de
partida, os tratores, as empilhadeiras, entre outras máquinas, cujo em-
prego era imprescindível para o apoio de infraestrutura do aeródromo.
A Divisão de Segurança de Voo encarregava-se de todas as atividades de
meteorologia e possuía em sua organização um oficial meteorologista
do Quadro Complementar e sargentos especialistas formados no CIAAN.
A investigação de acidentes era procedida com a finalidade de difundir
orientação técnica para a Força Aeronaval. Nesse particular, a Marinha
do Brasil mantém oficiais com curso de especialização no Centro Nacio-
nal de Investigação e Previsão de Acidentes (CENIPA), da FAB. Os sar-
gentos com especialização nessa área eram formados no CIAAN.
Do confronto entre os conhecimentos que auferimos, consta-
tamos que uma atenção muito especial deveria ser dada à manutenção
e ao controle do suprimento. Não obstante a reconhecida “mentalida-
de de manutenção” da Força Aérea e de sua bem estruturada cadeia de
manutenção, ela enfrentava dificuldades para conseguir um índice de
disponibilidade aceitável, ou seja 60%.
A Força Aérea usava quatro escalões de manutenção, e a Mari-
nha do Brasil, três. Como não havia uma universalidade nessa divisão,
pensava-se que o Exército poderia continuar com seus cinco escalões
já conhecidos sem provocar traumas nem exigir treinamento e estudo
para os administradores da manutenção. Havia dúvidas sobre até que
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 131

escalão seria implantado a manutenção inicialmente. Por medidas de


economia, parecia claro que não deveríamos ultrapassar o nosso 3º es-
calão (troca de componentes). O 4º e 5º escalões precisariam ser rea-
lizados, por algum tempo, no fornecedor das aeronaves adquiridas ou
nas outras Forças até termos a quantidade de helicópteros que tornasse
econômica nossa estruturação para esse fim.
Ao término da nossa visita, reunimos a certeza de que a estru-
tura da Força Aeronaval, aliada ao manifesto interesse de apoiar a cria-
ção da Aviação do Exército, atendia perfeitamente às nossas necessida-
des. Se adotada a formação de pessoal naquela organização militar da
Marinha, as adaptações iriam ser mínimas e restritas ao provimento de
alojamento aos novos alunos. A Força Aeronaval constituía-se em repo-
sitório de significativa experiência na área de instrução, manutenção,
emprego de helicópteros e formulação de doutrina específica.
Concluímos a partir das informações obtidas sobre a distinção
na formação de pilotos de helicópteros na Marinha e na FAB. Nessa úl-
tima, o piloto e o graduado eram formados primeiramente para aten-
dimento das necessidades de operação e manutenção de aeronaves de
asas fixas. No tocante aos oficiais, considerava-se a pilotagem de heli-
cóptero uma adaptação a outro tipo de aeronave. Em relação aos aos
graduados, na Força Aérea pequena parte do curso era destinada à am-
bientação com helicópteros, e a especialização, realizada a posteriori. Na
Marinha, ao contrário, o curso era ministrado como especialização e es-
pecificamente destinado à operação de helicópteros, e o aparelho, enfo-
cado como arma de combate; na Aeronáutica, como meio de transporte.
Nossa viagem contribuiu sobremaneira para a indispensável
coleta de subsídios. Foi de extrema valia para o surgimento de novos
conceitos e reformulações de pontos de vista. Conscientizou todos da
fundamental importância de trabalhar a todo o momento para criar o
mais cedo possível uma “mentalidade de aviação”, imprescindível à ati-
vidade aérea; realçou a importância capital da formação de pessoal,
a componente de maior criticidade para a implantação da Aviação do
Exército o mais cedo possível; caracterizou a inaceitabilidade de impro-
visações ou açodamentos; deixou patente a impossibilidade de a Base
Aérea de Santa Maria apoiar a Aviação do Exército com os então atu-
ais meios em material e pessoal que dispunha; mostrou a necessidade
de adaptação do currículo da Base Aérea de Santos para a formação de
132 Aviação no Exército - uma visão histórica

pilotos para a Aviação do Exército em nível semelhante ao oferecido


pela Marinha, pois a referida adaptação se constituiria em complicador
à efetivação do apoio por aquela Base; confirmou a exequibilidade de
aproveitamento da estrutura de formação da Marinha e da Aeronáutica
desde que realizadas adaptações, em particular na segunda; fez ver que
a opção pelo recrutamento, seleção e formação em torno de militares
de carreira apresentava vantagens significativas em relação às demais
opções, como temporários, civis, entre outros; enfatizou a imprescindi-
bilidade do apoio das demais Forças Singulares na fase de implantação e
demonstrou, em face da complexidade e dos custos envolvidos, a impor-
tância de adotar solução compromissada com a centralização, da adoção
da menor quantidade de modelos de helicópteros e do crescimento gra-
dativo e controlado.
Estávamos mais bem preparados para o cumprimento da
missão a nós imposta. A viagem de estudos atingiu completamente os
objetivos que pretendíamos alcançar e possibilitou à comitiva colher
valiosos conhecimentos para o prosseguimento do nosso trabalho.
Permitiu reforçar a visão de que seria indispensável o apoio da FAB e
da Marinha para a implantação da Aviação do Exército; a necessidade
do início da preparação do pessoal, pilotos e mecânicos no mais curto
prazo; a aquisição de helicópteros, considerando a adequação à mis-
são, facilidades de apoio e pluralidade de emprego; a centralização dos
meios da Aviação do Exército, pelo menos em uma fase inicial; a intera-
ção fundamental entre o emprego doutrinário e o estabelecimento dos
requisitos para os helicópteros, a exemplo do que vinha sendo feito
sistematicamente na Força Aeronaval por meio do Grupo de Desenvol-
vimento de Tática.
Nas reuniões de trabalho da comissão realizadas durante as
nossas visitas, já tínhamos levantado linhas de ação, em particular em
relação à área de pessoal, as quais impunham rapidez nas decisões a
serem adotadas. Chegamos à conclusão de que era importante usar a
estrutura de ambas as Forças Singulares. Pudemos constatar as dificul-
dades para a implantação da Aviação do Exército, a complexidade da
infraestrutura de pessoal e de material e como superá-las. A visita deu
à nossa comitiva a certeza e a convicção de que o Exército efetivamente
precisava dispor de sua aviação orgânica e que deveria de pronto reali-
zar a sua implantação. Segundo palavras dos próprios oficiais da FAB,
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 133

todos reconheciam que as unidades de helicópteros que dispunham não


atendiam às necessidades do Exército, pois elas estavam direcionadas
prioritariamente aos próprios interesses daquela Força.
A viagem propiciou a insubstituível oportunidade de aquisição
de ensinamentos, aumentando dessa forma a apreciável soma de conhe-
cimentos da comitiva na área em estudo. Voltávamos mais fortes e mais
confiantes.
Nunca será suficiente ressaltar a entrega total dos membros
da comissão no desempenho de suas tarefas. Perdoe-me o leitor se in-
corro na prolixidade e na redundância ao voltar continuamente a citar
o excepcional esforço de cada um para o cabal cumprimento de suas
missões. São elogios merecidos. Não será demais frisar o profissionalis-
mo, a competência e a motivação demonstrados por todos os integran-
tes da comissão, os quais permitiram a elaboração de planejamento que
se transformou em referência e, ao longo do processo de implantação
até os dias atuais, demonstra sua eficiência como guia das atividades de
prosseguimento da implantação.
Sobre o assunto mais uma vez vamos lançar mão de trecho do
depoimento do coronel Telles ao informativo Águia:

No início dos trabalhos da Comissão para Estudar a Implanta-


ção da Aviação do Exército, a dificuldade maior, sem dúvida, foi
o quase total desconhecimento dos assuntos por parte de seus
integrantes.
Assim, foi estabelecido um programa de viagens de estudo às
organizações de helicópteros da Marinha e da Força Aérea. Ao
retornar a Brasília os diversos grupos (pessoal, doutrina e ma-
terial) elaboraram seus relatórios e, após muitas reuniões, dis-
cussões, consultas e intensos trabalhos, a comissão encerrou
com propostas concretas para a seleção e formação do pessoal,
sobre a missão e estrutura organizacional da Aviação do Exér-
cito, definido como órgão normativo na área de material a Di-
retoria de Material de Aviação do Exército e sua unidade opera-
cional, o 1º Batalhão de Aviação do Exército com 52 (cinquenta
e dois) helicópteros e indicação de tipos de helicópteros
que atenderiam às necessidades operacionais e o esboço de
um sistema logístico. Como conclusão final, foi proposta a
134 Aviação no Exército - uma visão histórica

continuação dos trabalhos com a nomeação de uma Comissão


para Implantar a Aviação do Exército.
Podem imaginar quão complexas e difíceis foram as atividades
exercidas pelos cinco integrantes desta comissão, se deparan-
do com situações e problemas totalmente inusitados para o dia
a dia de qualquer oficial do Exército, nas áreas de pessoal, dou-
trina e material.
Contudo, com muita determinação, trabalho e dedicação, contan-
do com o valioso apoio do oficial de ligação que o Estado-Maior da
Aeronáutica colocou à disposição do Estado-Maior do Exército,
bem como a sempre pronta disposição da Força Aeronaval em
atender às nossas necessidades, a missão daquela comissão foi
cumprida com muito êxito.

O clímax dos trabalhos da Comissão para Estudar a Implantação


da Aviação do Exército foi a apresentação do Plano de Implantação. Em 27
de novembro de 1985, o chefe do Estado-Maior do Exército encaminha-
va ao ministro do Exército a proposta do planejamento elaborado para
implantação da Aviação do Exército, que seria aprovado no dia seguinte.
Destacava que o plano previa a implantação de uma estrutura em pesso-
al, a montagem de uma infraestrutura de instalações e material, o pros-
seguimento do processo de aquisição de experiência e a necessidade de
recursos extraorçamentários suficientes. Enfatizava o chefe do EME que
a proposta baseava-se em planejamento flexível, simples e exequível; pre-
via a implantação de modo gradual e seguro e permitia, ao mesmo tempo
que se implantasse a infraestrutura em pessoal e em material, o Exército
adquirir a necessária experiência. Destacava que a implantação represen-
taria um passo decisivo para o aumento significativo da capacidade ope-
racional e para elevação do moral de toda a Força.
Como consequência da aprovação do plano e para efetivação das
ações propostas, foi criada a Comissão de Implantação, a quem se atribuiu a
adoção das medidas concretas e a proposta dos atos administrativos e dos
diplomas legais decorrentes, como veremos no capítulo seguinte.
O Plano de Implantação foi fruto de esforço de equipe e resul-
tou dos conhecimentos adquiridos ao longo de inúmeras de palestras,
reuniões, discussões, reflexões, estudos pessoais, consultas e trocas de
informações com todas as fontes de conhecimento disponíveis, entre as
A Comissão para Estudar a Implantação da Aviação do Exército 135

quais se ressalta a vasta experiência dos companheiros das forças coir-


mãs, Marinha e FAB.
No próximo capítulo, discorreremos com maiores detalhes so-
bre o Plano de Implantação da Aviação do Exército.
Capítulo 9

O Plano de Implantação da
Aviação do Exército

O Plano de Implantação da Aviação do Exército, aprovado


pelo ministro do Exército, general Leonidas Pires Gon-
çalves, em 28 de novembro de 1985, determinava o prosseguimento das
providências com vistas à efetivação das ações propostas, inclusive quan-
to às medidas concretas a serem adotadas e a inserção das metas a se-
rem perseguidas no Plano Diretor do Exército (PDE). Foi o coroamento
do trabalho diligente, entusiasmado e responsável dos integrantes da
comissão formada para estudar a implantação da Aviação do Exército.
A elaboração foi tão criteriosa que as metas estabelecidas no plano per-
manecem válidas até hoje.
Desde o início dos trabalhos, nos impúnhamos a necessidade
do estabelecimento de objetivos a serem atingidos. A sistemática evita-
va a perda de foco nas nossas ações. O posicionamento não foi diferen-
te em relação à elaboração do Plano de Implantação. Estabeleceram-se
premissas básicas orientadoras e consideradas fundamentais para o su-
cesso da implantação, tais como:

– aviação limitada à operação de aeronaves de asas rotativas;


– apoio da Marinha e da FAB;
– estrutura simples;
138 Aviação no Exército - uma visão histórica

– implantação gradual;
– centralização inicial dos meios;
– formação do pessoal desde já;
– aproveitamento das estruturas das demais Forças Armadas
e de outros exércitos;
– empenho para se evitar a diversificação do material.

A implantação de uma aviação limitada às aeronaves de asas


rotativas dirimia as preocupações da Força Aérea quanto à possibilida-
de de o Exército incorporar também aeronaves de asas fixas. Se bem
que, sob esse aspecto, ainda tivemos que enfrentar algumas desconfian-
ças de companheiros da FAB.
O reconhecimento da necessidade de contar com o apoio da
Marinha do Brasil e da Força Aérea na formação de pilotos, mecânicos,
gerentes e outros especialistas que se fizessem necessários para a Avia-
ção do Exército sempre fez parte de nossas convicções, mesmo cons-
cientes de que as doutrinas de formação e emprego eram distintas em
cada Força. Sabíamos que mais tarde, conforme efetivamente ocorreu, a
simbiose destas, após a reunião dos nossos quadros no BAvEx, permiti-
ria o estabelecimento de uma doutrina própria. O suporte recebido das
forças coirmãs foi muito além do desejado e do esperado e superou to-
das as nossas expectativas. A Marinha e a Força Aérea jamais pouparam
esforços para atender às solicitações do Exército. A excepcional quali-
dade dos nossos quadros formados naquelas Forças é um atestado ine-
quívoco da elogiável eficiência como cumpriram suas missões em apoio
à Aviação do Exército. É importante destacar que mesmo no processo
de aquisição das nossas aeronaves os conhecimentos obtidos naquelas
Forças foram de grande importância.
A implantação gradual e progressiva, de modo realista, permitiu
que as ações decorrentes fossem encetadas sem açodamento, de modo
criterioso, considerando a complexidade e a singularidade da nova ati-
vidade. No entanto, a capacidade e o dinamismo das pessoas envolvidas
e a vontade inquebrantável dos nossos chefes permitiram que algumas
metas fossem concretizadas antes do prazo estabelecido, a exemplo da
aquisição dos helicópteros, que, inicialmente prevista de forma escalona-
da, foi realizada em uma única etapa, obedecendo integralmente às neces-
sidades operacionais do 1º Batalhão de Aviação do Exército.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 139

O estabelecimento de estruturas simples atendia o caráter de


objetividade.
A centralização inicial dos meios foi julgada imprescindível no
nascedouro da Aviação do Exército. A medida permitiu a concentração
dos esforços e recursos em metas nítidas e consentâneas com as dispo-
nibilidades em pessoal e recursos financeiros. Facilitou o processo deci-
sório e permitiu a tomada ágil de decisões, bem como a rápida implan-
tação das ações decorrentes.
A formação do pessoal de imediato possibilitou que o BAvEx, ao
receber suas primeiras aeronaves, contasse com quadros cuja a experiên-
cia foi obtida ao longo de sua especialização e complementadas durante a
realização de estágios na Marinha e na FAB, nas quais ampliaram sobre-
maneira os conhecimentos adquiridos durante a especialização.
A necessidade de não diversificar o material foi uma convicção
obtida ao longo dos contatos realizados com as nossas forças coirmãs
e outros operadores de material aeronáutico, pela grande dificuldade
que a multiplicidade de modelos, de diferentes origens, provocava para
o funcionamento da logística, com reflexo sobre a operacionalidade dos
equipamentos.
O plano definiu metas referentes à criação das unidades de
aviação, à seleção e formação dos quadros, ao cronograma de aquisi-
ção das aeronaves, aos fundamentos básicos de emprego, às estimativas
das necessidades em pessoal, ao desenvolvimento da implantação, à es-
trutura organizacional das unidades militares de aviação, à seleção dos
helicópteros e outras prescrições de caráter geral sobre as quais tecere-
mos algumas considerações.
Antes de apreciarmos o Plano de Implantação, me pareceu ade-
quado passar aos nossos leitores os conhecimento sobre os dados que o
embasaram. Fizemos alusão nos capítulos anteriores que, além do esforço
individual de cada componente da comissão, das palestras, das discus-
sões, da troca de informações com as mais diversas fontes realizamos um
proveitoso ciclo de viagens a organizações militares da Força Aérea e da
Marinha que se ocupavam da formação de pessoal e da operação e manu-
tenção de helicópteros. Todas essas informações foram reunidas em um
relatório final preparado pelas diversas equipes, o qual propiciou os sub-
sídios indispensáveis para a elaboração do plano. Depois de muita pesqui-
sa, tive a satisfação de defrontar-me com o único exemplar conhecido desse
140 Aviação no Exército - uma visão histórica

relatório. Por sua importância histórica e para que, como ocorreu com
um grande número de documentos produzidos na época da implantação,
ele não permaneça desconhecido e vá, como aconteceu com outros do-
cumentos de plena importância, para o fundo de um saco de lixo ou uma
trituradora de papéis, resolvi reproduzi-lo na íntegra. Tal procedimento
serve também para ratificar que as decisões adotadas no processo de im-
plantação da Aviação do Exército foram fruto de diligente maturação de
todas as informações disponíveis e análise criteriosa do vasto cabedal de
informações colhidas. Nada foi feito ao acaso.
Corro o risco de ser repetitivo, mas não posso falsear com a his-
tória da Aviação do Exército e permitir que mais um registro se apague.
Segue-se a transcrição integral do corpo do relatório com o espí-
rito de informar e de preservar a memória da documentação elaborada na
ocasião. Ele possuía três anexos nas áreas de pessoal, doutrina e material.
A abordagem deles neste momento será procedida sob a forma de comen-
tários. A minudência adotada na apreciação das áreas referidas anterior-
mente, justificada pela importância que se revestiam para nossa Aviação,
indicou ser mais apropriada uma síntese deles. A íntegra dos anexos ao
relatório é apresentada no Anexo 1 a este livro. Lá, os interessados pode-
rão conhecê-los com maior profundidade, em seu inteiro teor.

MINISTÉRIO DO EXÉRCITO
ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO
COMISSÃO DE ESTUDO PARA IMPLANTAÇÃO DA
AVIAÇÃO DO EXÉRCITO
RELATÓRIO FINAL
1. FINALIDADE
Apresentar as atividades desenvolvidas pela Comissão, no pe-
ríodo de 24 Set a 14 Nov, relativas aos estudos e trabalhos por ela reali-
zados, com vistas à apresentação de uma proposta para a implantação
da Aviação do Exército.
2. COMISSÃO
a. Presidente: Gen Div ANGELO BARATTA FILHO
b. Vice-Presidente: Cel Cav QEMA JOÃO LUIZ SARAIVA DE
CASTRO – 3ª Sch
c. Membros:
– Cel Cav QEMA Pedro Arnóbio de Medeiros – 2ª Sch
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 141

– Cel Inf QEMA José Gustavo Petito – 1ª Sch


– Cel Art QEMA Marcello Rufino Dos Santos – 5ª Sch
– Cel Inf QEMA José Aurélio Valporto de Sá – 4ª Sch
– Ten Cel Cav QEMA Edson Machado – 6ª Sch
– Ten Cel Inf QEMA Jomar Nascimento Telles – 3ª Sch
– Ten Cel QEM CDEM Dario Francisco Loriato – 3ª Sch
– Ten Cel Cav QEMA Paulo Sergio da Silva Maia – 3ª Sch
– Maj MB QEMA Wanderley de Castro – 3ª Sch

3. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
a. Início das Atividades – 24 Set
1) Reunião inicial, quando foi caracterizado o objetivo da Co-
missão e apresentado um Cronograma de Trabalho a ser seguido, com
vistas ao cumprimento de sua missão.
2) Os Oficiais integrantes foram distribuídos por três equipes:
Equipe de Doutrina
– Cel MEDEIROS
– Cel PETITO
– TC TELLES
Equipe de Pessoal
– Cel MARCELLO
– Cel VALPORTO
– TC SILVA MAIA
Equipe de Material
– TC MACHADO
– TC LORIATO
– Maj WANDERLEY

3) Para o cumprimento da missão, que tinha como condicio-


nante o prazo de 30 dias, foram estabelecidas quatro fases:
– fase de pesquisa
– fase de trabalho dentro das equipes
– fase de viagens
– fase de trabalho de Estado-Maior.

4) Para o cumprimento da missão, julgamos importante contar-


mos, desde logo, com o apoio e a cooperação da Marinha de Guerra do Brasil
142 Aviação no Exército - uma visão histórica

e da Força Aérea Brasileira, a serem conseguidos através de ofícios aos Es-


tados-Maiores daquelas Forças e pela realização de visitas àqueles órgãos.
b. Fase de Pesquisa – (24 Set a 19 Out)
1) Para nivelamento de conhecimentos e capacitação para o
cumprimento da missão, em trabalho descentralizado e dentro das áre-
as específicas de cada equipe.
2) Esta fase foi encerrada com uma reunião da Comissão, quan-
do cada equipe apresentou o resultado de seu trabalho inicial.
c. Fase de Trabalho dentro das Equipes – (de 02 a 11 Out)
1) Em trabalho com tempo integral, a Comissão passou a de-
senvolver suas atividades na 3ª Subchefia.
2) Desde logo, sentimos necessidade de definir a missão da
Aviação do Exército e a sua estrutura inicial, o que ficou decidido em
reunião da Comissão, em 08 Out. (Anexo A).
3) Estabelecidos estes pontos, e com base neles, as equipes
prosseguiram em seus trabalhos, buscando definir os demais aspectos
ligados às suas áreas.
4) Nesta fase, foi realizada uma visita do Presidente da Comissão
aos Estados-Maiores da Armada e da Aeronáutica, sendo que na FAB, a vi-
sita foi estendida ao Gabinete do Ministro, quando foi estabelecido contato
pessoal informal com o próprio ministro, Tenente-Brigadeiro OCTÁVIO JÚ-
LIO MOREIRA LIMA. Tanto a Marinha de Guerra como a FAB demonstraram
muito boa receptividade à atividade da Comissão, ambas concordando que
estava na hora de o Exército Brasileiro pensar em ter sua própria aviação,
entretanto, no EMAer houve preocupação com as repercussões no seu pú-
blico interno, sendo o assunto tratado com muito sigilo e cautela.
5) Durante esta fase foram realizadas diversas reuniões da Co-
missão para discussão dos assuntos e busca de um consenso sobre o
que era estudado por uma equipe era discutido por todos os demais in-
tegrantes da Comissão.
6) Diversas firmas fabricantes de helicópteros estabeleceram
contato com a Comissão, tendo apresentado, em palestras informais, e
sem nenhum compromisso, as suas aeronaves. Nestas oportunidades,
buscávamos obter o máximo de subsídios para o nosso trabalho. É
importante salientar que em momento algum a Comissão procurou
estas firmas, tendo delas partido a iniciativa não tendo sido assumido
qualquer compromisso com as mesmas.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 143

d. Fase de Visitas (de 14 a 18 Out)


1) Foi realizada uma visita, por oito oficiais da Comissão, à Uni-
dades de Helicópteros da FAB e da Marinha, localizadas em S. MARIA,
SANTOS e SÃO PEDRO DA ALDEIA. Os deslocamentos da comitiva foram
feitos em aeronave da FAB.
2) Para esta visita, contamos com um oficial da FAB como liga-
ção, o TC Av CARLOS ALBERTO JACQUES, que nos acompanhou e parti-
cipou de toda viagem de estudos.
3) Como resultado dessa viagem podemos destacar:
a) Base Aérea de STA MARIA
– Unidade operacional da FAB que possui um Esquadrão de He-
licópteros. (Hlcp UH-lH).
– Apesar de alto grau de sigilo em que os assuntos deveriam
ser tratados, por ordem de EMAer, foi demonstrada, ao lado da cordia-
lidade, grande franqueza por parte do Cmt Base e por seus oficiais, que
nos transmitiram todas as informações de forma aberta e sem nenhuma
restrição, dando mostras que concordavam com a ideia de que o Exérci-
to deveria ter sua própria aviação.
b) Base Aérea de SANTOS
1) É onde funciona a Escola de Formação de Pilotos de Helicóp-
teros da FAB.
2) Foi mantido um alto grau de sigilo, por determinação do
EMAer, em todas as nossas atividades naquela Base. Apesar da cordia-
lidade e da franqueza demonstradas pelo Cmt da Base e o seu grande
conhecimento sobre assunto, o caráter sigiloso e o fato de somente ele
conduzir os debates prejudicou a coleta de subsídios por nossa parte.
c) Força Aeronaval de S. PEDRO DA ALDEIA
1) Há a salientar. a receptividade demonstrada pelo Cmt da For-
ça Aeronaval, Almt HAAGEN e por todos seus oficiais, que se colocaram
inteiramente à nossa disposição, procurando, a todo o momento, auxi-
liar-nos em nosso trabalho.
2) Ao final da visita, concluímos que as instalações da F Aer
Nav são excelentes, estando seus oficiais muito bem preparados; a sua
estrutura é mais adequada ao Exército, com uma manutenção mais leve
e simples do que a da FAB. No que se refere a Hlcp, pelo que nos foi
possível observar, ficou-nos a impressão que a Marinha está mais bem
estruturada do que a FAB.
144 Aviação no Exército - uma visão histórica

4) Ao final da viagem pudemos concluir que a mesma foi de


grande importância para o prosseguimento dos trabalhos da Comissão,
por ter permitido o conhecimento de como funcionam as Unidades de
Helicópteros, tanto da FAB como da Marinha. A Comissão pôde cons-
tatar a complexidade da infraestrutura de pessoal e de material, bem
como as dificuldades para a implantação de uma Aviação para o Exér-
cito. Entretanto, a visita veio dar à Comitiva a certeza de que o Exército
Brasileiro precisa dispor de sua própria Aviação, na medida em que as
unidades de Helicópteros da FAB não atendem aos nossos interesses,
estando sua missão mais voltada para suas próprias necessidades.
e. Fase de Trabalho de Estado-Maior – (21 a 30 Out)
1) Definidas a missão da Aviação do Exército e sua estrutura
básica, tratava-se, agora, de chegar a uma solução quanto à implantação
daquela estrutura.
2) Desde logo, surgiram três fatores que iriam condicionar este
trabalho:
– inexistência, no EB, de uma infraestrutura de pessoal e de
material;
– falta de experiência;
– recursos disponíveis.
3) Com base nestas condicionantes, foram levantadas as se-
guintes premissas básicas:
a) Av Ex limitada a aeronaves de asas rotativas (Hlcp):
– para maior simplicidade;
– como medida política, evitando atrito com a FAB, a fim de ob-
ter seu apoio.
b) aproveitamento inicial da infraestrutura para a formação
de pilotos, particularmente da Marinha para a formação de pilotos e
mecânicos.
c) adoção de uma solução flexível, baseada numa estrutura
simples e econômica.
d) implantação gradativa da estrutura.
e) centralização inicial dos meios.
4) Levantadas essas premissas e analisando as possíveis alter-
nativas, a Comissão chegou à proposta, que se acha consubstanciada no
Plano para a Implantação da Aviação do Exército, cujos pontos princi-
pais são os seguintes:
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 145

a) Implantar a Av/Ex por etapas, prevendo um período de 10


anos para a conclusão da lª etapa.
– lª Etapa: Implantação de Btl Av/Ex e do Centro de Instrução,
de forma centralizada.
– 2ª Etapa: Criação de outras Unidades de Aviação,
subordinadas aos Comandos de Área.
b) Formar pilotos e mecânicos, desde já, na FAB e na Marinha.
c) Implantar inicialmente o núcleo do Btl Av/Ex, ficando o Cen-
tro de Instrução para ser criado a partir de 1991.
d) Do Btl AV/Ex, iniciar por apenas 1 Cia Hlcp, com os Pel Man.
e) Utilizar, em princípio, somente dois tipos de Hlcp:
– Hlcp de assalto.
– Hlcp de Rec e Atq, podendo ser, também, de treinamento.
f) Prever, no pacote de aquisição de helicópteros a formação do
piloto operacional e a adaptação do mecânico como encargo da firma
fornecedora dos helicópteros.
5) Uma vez a Comissão tendo chegado a uma solução para a
implantação da Av/Ex, foi a mesma apresentada ao Ch Estado-Maior do
Exército e a todos oficiais-generais do EME, no dia 20 Nov, no Auditório
da 3ª Subchefia, tendo a mesma sido aceita pelo Sr. Chefe EME, com ape-
nas algumas adaptações.
6) Finda esta fase, a Comissão passou a elaborar os documen-
tos referentes à proposta a ser levada pelo Ch EME ao Sr. Ministro do
Exército para aprovação.
4. CONCLUSÃO
Criada em 24 Set 85, a Comissão para Estudar a Implantação da
Aviação do Exército passou a desenvolver intensos trabalhos; primeiro,
de pesquisa, buscando aprofundar-se no assunto e capacitar-se ao cum-
primento da missão; em seguida, de trabalho de estado-maior, buscando
chegar à melhor solução.
Desde logo, deparou-se com duas perguntas:
Qual a Aviação que queremos?
Como implantá-la?
A primeira pergunta foi respondida ao definir a sua missão e
a sua ESTRUTURA; a segunda, pela elaboração de um plano baseado
numa solução que fosse:
– flexível;
146 Aviação no Exército - uma visão histórica

– simples;
– econômica;
– exequível;
– baseada na experiência de outras Forças;
– adaptada à estrutura atualmente existente no Exército;
– levando em conta os recursos disponíveis e a conjuntura do
momento.
Sabemos que este trabalho não está completo e que não
esgotou todo o assunto. Representa, apenas, o primeiro e decisivo
passo para a implantação da Aviação do Exército, havendo necessi-
dade de que os estudos tenham prosseguimento para sua real efe-
tivação.
Gen Div ANGELO BARATTA FILHO
3º Subchefe EME

Para aqueles que não desejarem incursionar sobre o do-


cumento integral transcrito na última parte do livro, na sequência
faremos uma breve apreciação sobre os anexos ao relatório final,
iniciando pelo referente à área de doutrina. Este, assim como os
relativos às áreas do pessoal e material, tinha como escopo apre-
sentar de forma conclusiva o resultado do trabalho da equipe ati-
nente aos aspectos doutrinários para a implantação da Aviação do
Exército.
Respondendo àqueles que criticavam o fato de a nossa
Aviação nascer sem uma base doutrinária de emprego, a consulta
ao anexo permite uma resposta à altura. As bases estavam todas
lançadas. O que faltava definir ocorreria com o desenvolvimento
das pesquisas doutrinárias, que seriam realizadas de acordo com a
sistemática de produção doutrinária estabelecida pelo EME. A evo-
lução se daria pelo contínuo emprego dos nossos helicópteros no
desempenho das missões operacionais que já se encontravam de-
finidas.
Aqueles que tiveram a curiosidade de ler Soldados cidadãos, de
Stephan E. Ambrose, vão constatar que os aliados precisaram desenvol-
ver sua doutrina de emprego durante o transcorrer da Segunda Guerra
Mundial, no fragor dos combates, ao se defrontarem com situações para
as quais não tinham se preparado.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 147

ANEXO A – DOUTRINA
Apresentava o resultado do trabalho da equipe relativo ao tema. Os
estudos buscaram definir a missão geral, as missões básicas e as missões es-
peciais, inseridas no largo espectro da missão a ser cumprida pela Aviação
do Exército, que foram explicitadas levando-se em conta dois aspectos fun-
damentais, a saber: o aumento da capacidade operacional da Força Terrestre
quando dotada de aeromobilidade e a necessária integração às ações da força
apoiada. Definida a missão geral, foram estabelecidas as demais, que se en-
contram detalhadas no Anexo 1. Julgo importante destacar a missão geral, ou
seja, “Proporcionar aeromobilidade à Força Terrestre, nas ações de combate,
de apoio ao combate e de apoio administrativo, aumentando sua capacidade
operacional”, que deixa bem claro que a Aviação do Exército foi criada para
atuar em proveito da manobra terrestre. Faço essa observação em especial
por considerar equivocada a visão hoje defendida de que ela pode realizar
suas missões de modo independente, como uma força autônoma.
O anexo apontava uma proposta de estrutura geral, observados os
aspectos de adequação àquela do então Ministério do Exército sem introdu-
zir sensíveis modificações; organização inicial reduzida; implantação gradati-
va; vinculação com a estrutura departamental e subordinação do BAvEx a um
Comando Militar de Área; apoio da FAB e da Marinha e centralização inicial
dos meios. Institui as condicionantes que levaram à criação do BAvEx, define
suas missões e a estrutura organizacional. Estabelecia ainda as condicionan-
tes doutrinárias e operacionais que iriam orientar a elaboração dos objetivos
básicos operacionais para os helicópteros a serem adquiridos. Nas condicio-
nantes doutrinárias, destacamos os aspectos abaixo, que caracterizavam com
clareza a atuação da unidade aérea que se pretendia criar:

[...]
b) Dentre as missões atribuídas a esse Btl, avultam de im-
portância as de Assalto Aeromóvel e de Reconhecimento e
Ataque, nesta ordem de prioridade.
c) A realização do Assalto Aeromóvel pressupõe a disposi-
ção de Hlcp de manobra com capacidade de transportar um
Grupo de Combate (GC) completamente equipado.
d) No Assalto Aeromóvel, é importante que seja mantida a
integridade do GC, da mesma forma que num mesmo Hlcp
não sejam transportados GC de Pel distintos.
148 Aviação no Exército - uma visão histórica

e) Embora a execução do Assalto Aeromóvel, normalmente,


não implique na conquista do objetivo, e sim sua ocupação,
deve-se considerar a possibilidade de atuação do Ini sobre
os Hlcp que realizam o assalto.
f) Os Hlcp de Rec e Atq, numa operação de Assalto Aeromó-
vel, têm a missão de realizar a escolta dos Hlcp de Assalto
e preparam a área de desembarque, pela execução de fogos
de saturação, desobstruindo ou neutralizando a defesa Ini.
[...]

O documento definia algumas características que deveriam


possuir os helicópteros para o cumprimento das missões que lhes se-
riam destinadas.
Concluía enfatizando que as propostas apresentadas procura-
ram “dentro da realidade e peculiaridades do EB, lançar as bases para a
doutrina da Aviação do Exército Brasileiro”.
Ressaltava a importância:

[...] que seja enfatizada a necessidade do prosseguimento dos


estudos, com o objetivo de se desenvolver a doutrina de em-
prego da Aviação do Exército e os seus reflexos no Ap Adm.
Sem essa providência, seguramente, corremos o sério risco
de ter o Hlcp, saber voar, saber fazê-lo voar, mas não empregá
-lo adequadamente no contexto operacional da F Ter.

ANEXO B – PESSOAL
O relatório se iniciava, e essa era uma convicção de todos, afir-
mando que “A componente ‘PESSOAL’ constitui-se na de maior criticida-
de para a Implantação da Aviação do Exército (Av Ex)”.
Acrescia que:

Os altos custos envolvidos, o caráter eminentemente técnico


da atividade, a necessidade do profundo conhecimento do
emprego do material e da Força a ser apoiada, a exigência
da ‘criação’ de uma ‘mentalidade de aviação’ intimamente
compromissada com a segurança colocam o setor de Pesso-
al em evidência quanto à qualidade do desempenho futuro
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 149

da Av Ex. A variada gama de missões a serem desempenha-


das e o relevo das funções daqueles que, em terra, ‘fazem
voar’ – mecânicos, controladores de voo etc. – permitindo o
eficiente desempenho operacional, indicam a necessidade
de formar um todo homogêneo, direcionado a um único ob-
jetivo: alçar, com eficiência e segurança, a F Ter à 3ª dimen-
são do moderno campo de batalha.

Definia as ações a serem empreendidas, compreendendo as fa-


ses de recrutamento, seleção, formação e adestramento.
Elaborava uma judiciosa análise das ações a se realizarem em
cada fase, listando as vantagens e desvantagens das opções possíveis de
serem adotadas.
Em relação ao recrutamento, concluía sobre a adoção do volun-
tariado.
Sobre o universo a recrutar indicava que:

O universo da ativa satisfaz às necessidades da Av Ex


principalmente na fase de implantação. Apresenta van-
tagens significativas em relação às demais possibilidades
de recrutamento. Considere-se, ainda, que o temporário,
no caso do oficial, conforme declarações obtidas nas de-
mais F Sing, somente tem se mostrado eficiente no de-
sempenho da atividade de instrutor de pilotagem. O in-
teresse de voar o máximo possível, visando à formação
de currículo que o habilite ao exercício de atividade civil
posteriormente, é característico no oficial temporário.
Sua atuação no emprego operacional tem sido passível
de restrições. Acresça-se que, em relação aos oficiais
temporários, a habilitação técnica em pilotagem não ex-
clui a necessidade de formação tática, que envolve altos
custos e representa período significativo na formação do
piloto operacional.

Propunha que:

A responsabilidade exclusiva pelo recrutamento caberá ao Exér-


cito. A sistemática a ser adotada deverá ser aquela atualmente
150 Aviação no Exército - uma visão histórica

aplicável para o recrutamento de pessoal aos cursos de es-


pecialização na F Ter, consideradas as peculiaridades e exi-
gências da atividade da Aviação do Exército (Av Ex) em seus
múltiplos aspectos.

Sobre a seleção do pessoal, definia que ela deveria igualmente


caber ao Exército, salvo nos aspectos específicos para pessoal aerona-
vegante e especialistas em aviação, nos quais seria imprescindível o
apoio das estruturas destinadas a esse fim existentes nas demais For-
ças Singulares.
Estabelecia alguns critérios para a seleção do pessoal e alertava
sobre a necessidade de legislação definidora do tempo mínimo em ser-
viço ativo no desempenho de cargo ligado à Aviação do Exército após a
formação (especialização). O período mínimo de cinco anos era o vigen-
te nas demais Forças Singulares.
O anexo apresentava uma análise detalhada dos cursos minis-
trados para oficiais e praças de Aviação e listava para cada um deles os
objetivos, o público-alvo e as respectivas cargas horárias. A Marinha de-
nominava o curso de pilotos para oficiais como aperfeiçoamento; os de
praças eram de especialização, subespecialização ou expeditos. Os cur-
sos de especialização para praças compreendiam as áreas de motores,
manobra e equipamento de aviação, estrutura e metalurgia, bem como
de aviônica. Os de subespecialização, que exigiam especialização ante-
rior em aviação ou radar, incluíam atividades de apoio ao voo, tais como
controle de voo, equipamento de voo e sobrevivência. Os cursos expedi-
tos tratavam de solda em aeronaves, controle de corrosão e outros.
Concluía sobre o assunto que:

(a) O curso de formação de oficiais pilotos na Marinha, à se-


melhança do que ocorrerá em relação ao pessoal destinado
à Aviação do Exército, habilita militares sem quaisquer co-
nhecimentos anteriores em operação de helicópteros (teó-
rica ou prática). O aproveitamento pelo Exército é perfeita-
mente pertinente e exequível na medida em que não exigirá
adaptação significativa do currículo do CIAAN.
O recebimento pela Marinha de novos helicópteros, em 1986,
e a atual disponibilidade em instrutores deixam antever a pos-
sibilidade de aquele Centro apoiar o Ex na formação de pilotos.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 151

(b) No tocante à formação de graduados mecânicos, res-


saltam os dois níveis de formação; o primeiro destinado
a habilitar marinheiros às funções de auxiliar de manu-
tenção e de mecânico de 1º escalão (fiel); o segundo, com
caráter complementar, aperfeiçoa o marinheiro espe-
cialista, alçado à graduação de 3º Sgt, habilitando-o ao
exercício da função de mecânico nos escalões da Força
Aeronaval. Os cursos de subespecialização e expeditos
completam as necessidades de técnicos para apoio ao
voo. Esta sistemática constitui-se adequada às necessi-
dades da F Ter.

Sobre os cursos na Força Aérea, a análise foi feita com a mesma


profundidade adotada para avaliação da estrutura da Marinha. Ao con-
trário desta, a qualificação de oficiais e praças era realizada em locais
distintos; na Base Aérea de Santos, para o curso de pilotos, e em Guara-
tinguetá, para sargentos. Já tratamos do assunto quando abordamos as
nossas viagens em capítulo anterior. Referia-se às particularidades dos
cursos da FAB que exigiam adaptações para atenderem às nossas neces-
sidades. Na conclusão, definia que:

(a) O curso de formação de pilotos na FAB necessitará de


adaptação do currículo, com acréscimo significativo de
instruções teórico-práticas para atendimento das necessi-
dades de formação do Exército.
(b) Uma vez que na FAB os graduados são formados para
atuar prioritariamente na área de aeronaves de asas fixas e
que a formação específica para o Hlcp somente se faz no 4º
Sem de sua formação, necessitando posterior complemen-
tação por 3 meses em Santos/SP, no 1º/11º GAv, a formação
de graduados do Ex na FAB, ainda que sólida, estará eivada
de conhecimentos desnecessários ao desempenho de fun-
ções na Aviação do Exército.

O relatório prosseguia detalhando as particularidades na espe-


cialização de pessoal para a área de operação e manutenção de helicóp-
teros e, em mais uma conclusão parcial, aludia que:
152 Aviação no Exército - uma visão histórica

(1) Pelo exposto o aproveitamento das estruturas de for-


mação das Forças Singulares mostra-se o mais adequado à
F Ter, de início.
(2) O aproveitamento de empresas civis tornar-se-ia compatível
somente a partir da antevisão da impossibilidade de as F Sing
atenderem às necessidades do EB, na fase de implantação, hi-
pótese não considerada. No entanto, a possibilidade de estágios
em empresas que, atualmente, apoiam a Mar e FAB na manuten-
ção de helicópteros constitui-se em fator de real interesse.
(3) No tocante à formação no exterior, é fundamental o es-
tabelecimento, no contrato de aquisição de helicópteros, de
curso de adaptação, para pilotos e mecânicos, ao equipa-
mento adquirido. Quanto à formação tática de pilotos e reu-
nião de conhecimentos doutrinários de emprego da Av Ex,
o envio de militares ao exterior, em países cujos exércitos
possuam aviação orgânica, acarretará em extremo benefí-
cio à operacionalidade da Aviação do Exército.
(4) A formação no Exército Brasileiro não é recomendável, face
à inexistência de pessoal habilitado para a função de instrutor; o
alto grau de especialização e tempo exigido para a formação do
instrutor de voo; o elevado custo na formação, quando compara-
do com os pequenos efetivos a formar e a inexistência de estrutu-
ras de formação em condições de prover o apoio que se requer.
(5) A combinação das diferentes hipóteses de formação mostra-
se compatível, na medida em que se situam, conforme o objetivo
de formação, como complementares.

Acrescentava ainda que:

O aproveitamento simultâneo do apoio da Marinha e da FAB,


subordinado às possibilidades de atendimento ao EB por cada
uma das Forças e do aspecto ‘político’ que tal medida envolve
leva a tomar como tempo mínimo necessário à formação aquele
referente ao curso de maior duração.

Fazia a análise sobre as estruturas da Marinha e da FAB e abor-


dava aspectos sobre o início da formação do pessoal, a respeito da qua-
lificação do pessoal de terra encarregado das atividades de segurança
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 153

das instalações físicas do batalhão, do apoio ao comando e outras, bem


como do pessoal destinado a mobiliar o órgão de apoio à Aviação do
Exército, em vista da necessidade de criar um órgão específico para esse
fim. Em seguida, fazia uma previsão dos efetivos em oficiais e sargentos
a serem formados no período de 1986 a 1990.
Emitia ainda considerações sobre o adestramento e referente
à elaboração dos quadros de organização. Sobre as ações em uma se-
gunda fase, previa que elas, em princípio, ocorreriam sob exclusiva res-
ponsabilidade do Exército, que deveria contar com seu sistema próprio
de seleção e formação do pessoal, consolidando experiência absorvida
na formação de pessoal nas demais Forças Singulares e no estrangei-
ro. Concluía ao seu término definindo o universo de recrutamento de
oficiais e praças, as condições de seleção, os efetivos e locais a serem
especializados, assim como as providências decorrentes.

ANEXO C – MATERIAL
No anexo, foram listados inicialmente todos os helicópteros em
uso por outras Forças Armadas e factíveis de adoção segundo as missões
previstas para serem realizadas pela Aviação do Exército.
Ressaltava que:

[...] para qualquer planejamento futuro, as estruturas de ma-


nutenção da MB e da FAB só detêm viabilidade de apoio para
material idêntico ao adotado por elas. Qualquer helicóptero
diferente daqueles supramencionados obrigará uma adapta-
ção dos respectivos sistemas atuais de manutenção.

Destacava a necessidade de providências referentes ao estabele-


cimento dos Objetivos Básicos Operacionais (OBO) para os helicópteros
de reconhecimento e ataque e de manobra, assim como para a seleção e
aquisição das respectivas aeronaves. Lembrava a importância de estabe-
lecer uma estreita ligação com os possíveis pretendentes a fornecimento
dos helicópteros, para que as propostas apresentadas estivessem em con-
sonância com os requisitos pré-selecionados.
Discorria sobre as particularidades do aquartelamento do BAvEx e
a infraestrutura de apoio. Sobre esse último aspecto, ressaltava que:
154 Aviação no Exército - uma visão histórica

O objetivo primordial, a ser perseguido nesta fase de implan-


tação, diz respeito ao desenvolvimento de uma acentuada
mentalidade de apoio, voltada para a área de aviação. Espe-
ra-se que, fruto desse acontecimento, o panorama atual da
manutenção sofra um incremento, em virtude da influência
dos rígidos padrões de controle exigidos pelos trabalhos de
aviação. O futuro Núcleo de Implantação será obrigado a de-
talhar um planejamento híbrido, consolidando a sistemáti-
ca padrão para o material já adotado pelo EB e aquela a ser
estruturada para apoiar a componente aérea. O material de
uso comum, como viaturas, armamento, equipamento, farda-
mento, comunicações e eletrônica, etc, atenderá às normas
já existentes em suas respectivas diretorias. Os demais itens
característicos das atividades de aviação (aeronaves, aviôni-
cos, armamento específico, material de segurança e proteção
ao voo etc.) serão tratados de maneira peculiar.

Discorria o relatório sobre a Segurança de Voo, a Prevenção e


Combate a Incêndio, Próprios Nacionais e informatização das atividades da
Aviação do Exército. No tocante à manutenção e suprimento, definia que:

Na fase inicial da implantação (1985-1995), o Exército necessi-


tará organizar uma cadeia de manutenção/suprimento peculiar
aos meios aéreos. Neste estágio, a prática acumulada pelas forças
coirmãs servirá de ponderável subsídio para que a estrutura em
formação possa superar os problemas inerentes à nova experi-
ência. O principal objetivo é estar-se em condições de viabilizar,
operacionalmente, um sistema embrionário de manutenção/
suprimento de aviação, tão logo a mão de obra especializada co-
mece a ser alocada para a constituição dos quadros da Aviação
do Exército. Isto deverá ocorrer, conforme planejamento espe-
cífico, antes do recebimento do material destinado a mobiliar
a estrutura de apoio. Esta estrutura, a ser implantada, deverá
ser suficientemente flexível para se adequar com o mínimo de
adaptações exigidas pelos demais modelos de helicópteros (ins-
trução e ataque), a serem adquiridos no período 1990/1995. A
adequabilidade do emprego em campanha assume um aspecto
fundamental, considerando-se que, no contexto das operações,
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 155

a Aviação do Exército poderá ter os seus meios articulados fora


das suas instalações de tempo de paz.

Fazia uma análise detalhada sobre as estruturas de manuten-


ção e suprimento adotadas no Exército, na Marinha e na Aeronáutica.
Concluía, propondo, entre outras medidas:

– a centralização dos meios, na fase inicial, tendo em vista mi-


nimizar os custos, otimizar os procedimentos de manutenção
e facilitar o desenvolvimento da doutrina de emprego da Av Ex;
– evitar a diversificação do material;
– a ênfase no processamento automático de dados em todas
as atividades da Av Ex;
– a utilização do apoio nas estruturas existentes dessas for-
ças coirmãs;
– o preparo antecipado de todo o pessoal com um efetivo
compatível, em condições de participar do recebimento do
material;
– a adoção de cuidados especiais durante a fase contratual,
principalmente quanto a participação inicial do fornecedor
nas atividades de manutenção (assistência técnica), treina-
mento, sobressalentes (armazém alfandegário) e manuais
técnicos; prazos de pagamento; juros; amortizações; de-
sembolso; seguro, etc.

Essas foram algumas das exaustivas considerações que serviram


de amparo para a elaboração do Plano de Implantação. Alguns poderão se
indagar sobre a razão pela qual resolvi abordar com maior detalhamento os
trabalhos anteriores do que o plano propriamente dito. Pareceu-me mais ló-
gico esse posicionamento, pois o Plano é uma síntese de todo aquele esforço
de busca de conhecimentos que antecedeu à sua elaboração final.
A aprovação do Plano de Implantação da Aviação do Exército
desencadeou a efetivação das ações propostas, inclusive quanto às me-
didas concretas a serem adotadas e a inclusão destas no PDE. Autorizava
a “[...] proposta dos atos administrativos que dependam da decisão mi-
nisterial, bem como a minuta dos diplomas legais a serem submetidos
ao presidente da República”. Era o sinal verde.
Seguem-se os pontos principais do Plano de Implantação.
156 Aviação no Exército - uma visão histórica

A criação das organizações


militares de Aviação do Exército
A primeira etapa da implantação no que diz respeito às or-
ganizações militares de Aviação envolvia um período estimado de
dez anos, e previa a criação de um Batalhão de Aviação, do Centro
de Instrução e da Diretoria de Material de Aviação. Para a conse-
cução das metas propostas para essa etapa, foram definidas ações
referentes à especialização de pessoal e à elaboração dos diplomas
legais para a criação do 1º Batalhão de Aviação do Exército e da
Diretoria de Material de Aviação do Exército, bem como o início da
construção da base física do batalhão que operaria inicialmente sob
a forma de núcleo. Essas ações, previstas para ocorrerem a partir
de 1986, apontavam ainda a aquisição de um primeiro lote de heli-
cópteros de manobra.
A Diretoria de Material de Aviação do Exército foi criada,
como planejado, como núcleo, em 1986, e iniciou de imediato seus
trabalhos para se capacitar ao cumprimento de suas missões, das
quais avultava a aquisição dos helicópteros, fato concretizado com
a assinatura do contrato de compra em junho de 1988. Na mesma
data, foi criado o Batalhão de Aviação do Exército, ainda sem uma
base física e sem o seu pessoal, que se encontrava em fase de espe-
cialização e estágio na Marinha e na Força Aérea. O plano conside-
rava indispensável a existência de uma diretoria, com o objetivo de
administrar o material de aviação e como órgão de apoio técnico-
normativo, coordenando e fiscalizando as atividades de suprimento,
manutenção, controle do material e documentação e o suprimento de
combustíveis e lubrificantes. Mais tarde, a extinção da diretoria, que
teve seus encargos absorvidos pela Brigada de Aviação do Exército,
Grande Unidade de Aviação, e sua posterior recriação demonstraram
a imprescindibilidade daquele órgão e o acerto das considerações
defendidas no âmbito do plano.
O Centro de Instrução de Aviação, que viria a assumir a res-
ponsabilidade de continuar a especialização dos quadros da Aviação de
Exército, iniciou suas atividades como núcleo em janeiro de 1991 e foi
criado oficialmente em 26 de setembro de 1991, de acordo com o prazo
previsto pelo plano.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 157

Aquisição das aeronaves;


definição de cronograma
O plano previa que o processo de aquisição das aeronaves, in-
cluindo as negociações e o recebimento, ocorresse durante o período
compreendido pela primeira etapa dele, ou seja, de 1986 a 1995. O rece-
bimento da última aeronave adquirida em 1991 comprova que, mesmo
com a inexperiência dos membros da comissão, ela foi extremamente
precisa e competente em seu planejamento. A despeito da assinatura
do contrato haver ocorrido somente em 1988, contrariando a previsão
inicial de 1986, a entrega final do lote de 52 aeronaves ocorreu antes do
prazo definido pelo plano.
A flexibilidade e a prudência com que foram construídas as me-
tas permitiram manter ao longo de todos esses anos a atualidade e a
credibilidade do Plano de Implantação, em atestado inconteste da com-
petência daqueles que colaboraram para a sua elaboração, bem como do
acerto das diretrizes emanadas pelos nossos chefes.

Seleção e especialização do pessoal


A especialização do pessoal era a atividade julgada de funda-
mental importância para o sucesso da implantação e um dos seus prin-
cipais pilares. Na qualidade dos operadores, isto é, pilotos, gerentes e
mecânicos, residia o sucesso da nascente Aviação do Exército.
Entre outras premissas, o plano estabelecia que esta fosse uma
especialidade, deixando claro, desde sua concepção, que não se antevia
à época a criação de uma Arma de Aviação, como ocorrido na outrora
Aviação Militar. Esse assunto a meu ver merece nos dias atuais alguma
reflexão e debates a respeito. Movido pela dúvida e sem um juízo com-
pletamente formado sobre o assunto, dedico ao fim do livro um capítulo
para a abordagem desse tema, ainda envolto em controvérsias.
O plano estabelecia igualmente as condições para recrutamen-
to e seleção dos quadros para os cursos do nosso pessoal aeronavegan-
te, incluindo os médicos especializados em medicina aeroespacial. Em
decorrência dos custos de formação e da alta especialização exigida,
definiu sabiamente que o período mínimo de permanência na Aviação
158 Aviação no Exército - uma visão histórica

do Exército seria de cinco anos, após a conclusão da especialização. De-


talhava ainda o rol de providências a serem postas em execução para o
desenvolvimento das atividades de capacitação do pessoal.
O plano sugeria que no contrato de compra das aeronaves
fosse incluída uma cláusula que estipulasse a adaptação dos quadros
da Aviação do Exército, ligados à atividade de operação e manuten-
ção, às aeronaves adquiridas como encargo da empresa fornecedo-
ra dos helicópteros. Essa medida foi integralmente cumprida, e os
pilotos, gerentes, mecânicos e gerentes realizaram cursos no Brasil
e na França. Certamente, a medida repercutiu de modo extremamente
positivo nos quadros da Aviação do Exército.

Estimativas das necessidades em pessoal


O plano, a despeito de sua objetividade e simplicidade, estabe-
lecia até as estimativas dos efetivos em pessoal, baseados em um mó-
dulo de 12 aeronaves, a partir da experiência colhida na Marinha e na
Força Aérea, de modo a orientar necessidades subsequentes.
No tocante aos pilotos, consideraram-se dois por aeronave e
um fator de correção de 1,25, resultando para um módulo de 12 heli-
cópteros um total de 30 pilotos. O fator de correção previa situações
diversas, como férias e outros impedimentos.
O cálculo das necessidades em mecânicos subordinou-se a uma
disponibilidade média de 70% das aeronaves, chegando-se a um total
de 70 mecânicos de diferentes especialidades também para o módulo
de 12 aeronaves.

Fundamentos da doutrina
A explicitação dos fundamentos da doutrina de emprego já no
Plano de Implantação mostra o grau de conhecimento dos integrantes da
comissão e a consciência de que, antes da efetiva criação, era preciso de-
finir para que o Exército necessitava de uma aviação orgânica, bem como
estabelecer o farol orientador das demais considerações – “a missão”. Esse
era o marco primacial que iria servir de bússola para as demais ações.
O Plano de Implantação da Aviação do Exército 159

A Aviação do Exército teria como missão geral “proporcionar a


aeromobilidade à Força Terrestre nas ações de combate, apoio ao combate
e de apoio logístico, aumentando a sua capacidade operacional”. Atribuía
à Aviação, além de sua missão básica, que era o assalto aeromóvel, uma
gama variada de outros empregos, considerando a grande versatilidade
do novo meio que se incorporava à Força Terrestre. Definiu para o Bata-
lhão de Helicópteros missões consentâneas com aquelas previstas para a
Aviação do Exército, propondo a dosagem de um batalhão para cada Co-
mando Militar de Área. Esta considerava que o emprego dos batalhões
seria coordenado pelo seu comando enquadrante, o qual possuiria em sua
estrutura organizacional um núcleo de elementos de aviação especializa-
dos no planejamento de operações com o emprego de helicópteros.

Desenvolvimento da implantação
No que concerne ao desenvolvimento das atividades previstas
no âmbito do plano, propõe a criação de uma Comissão de Implantação da
Aviação do Exército. A ela atribuía a responsabilidade de implementar to-
das as metas definidas pelo plano, o que efetivamente ocorreu com compro-
vado sucesso. A comissão mais tarde foi transformada em Seção de Aviação
do Exército e funcionou na 3ª Subchefia do EME e a ela subordinada.

As aeronaves
Em decorrência dos conhecimentos adquiridos, a comissão
pôde estabelecer no plano orientações para a aquisição das aeronaves.
Foram propostas as condicionantes doutrinárias e operacionais, bem
como alguns requisitos que mais tarde instruiriam a elaboração dos
OOB das aeronaves de manobra e de reconhecimento e ataque. Os co-
nhecimentos amealhados pela comissão já lhe permitiam propor carac-
terísticas de um equipamento que até então não integrava o inventário
do Exército Brasileiro.
Em razão das especificações sugeridas para as aeronaves, o pla-
no apresentava uma relação das empresas fabricantes de helicópteros
que possuíam equipamentos com características as quais atendiam às
160 Aviação no Exército - uma visão histórica

necessidades da Aviação do Exército, visando orientar e fornecer subsí-


dios para as aquisições que se processariam no futuro.
À exceção da empresa Westland, fabricante inglesa do Lynx,
todas as citadas se apresentaram como participantes da licitação, que
ocorreu posteriormente.

A segunda etapa
A segunda etapa da implantação, a partir de 1996, ficou para ser
regulada em planejamento específico do qual não nos ocuparemos neste
livro.
Depois de sua aprovação pelo chefe do Estado-Maior do Exército,
o plano foi encaminhado ao ministro do Exército. Destacava o chefe do EME
que o documento previa a implantação de uma estrutura em pessoal, a
montagem de uma infraestrutura de instalações e material, o prosseguimento
do processo de aquisição de experiência e a necessidade de recursos
extraorçamentários suficientes. Enfatizava ainda que a proposta baseava-
se em planejamento flexível, simples e exequível e previa a implantação de
modo gradual e seguro, permitindo que ao mesmo tempo que se implantasse
a infraestrutura em pessoal e material o Exército pudesse adquirir a
necessária experiência. Destacava que a implantação representaria um
passo decisivo para um aumento significativo da capacidade operacional e
para elevação do moral de toda a Força.
Como consequência da aprovação do plano e para efetivação
das ações propostas, foi criada a Comissão de Implantação, a quem se
atribuiu a adoção das medidas concretas, a proposta dos atos adminis-
trativos e dos diplomas legais decorrentes, como veremos no capítulo
seguinte.
Capítulo 10

A Comissão de Implantação da
Aviação do Exército

A Comissão de Implantação da Aviação do Exército foi a


sucessora da Comissão para Estudar a Implantação, que
havia concluído seu trabalho com a aprovação do Plano de Implantação
tratado no capítulo anterior. A essa nova comissão cabia a responsabili-
dade de tornarem concre-
tas as medidas propostas
pela anterior, aprovadas
pelo ministro do Exército.
A bola estava no meio do
campo; agora era a hora
de começar o jogo.

Reprodução estilizada da
portaria de nomeação da
Comissão de Implantação
162 Aviação no Exército - uma visão histórica

A comissão foi nomeada em 9 de dezembro de 1985, pela Por-


taria nº 078 – EME, que determinava a sua organização em caráter tem-
porário, com a missão de implantar a Aviação do Exército.

Reunião da Comissão de Implantação com delegação estrangeira

Como apresenta a reprodução anterior, a Comissão de Implantação


era integrada pelo coronel de Cavalaria QEMA João Luiz Saraiva de Castro,
da 3ª Subchefia/EME, posteriormente promovido ao generalato, o chefe
da comissão; pelo coronel Artilharia QEMA Marcello Rufino dos Santos,
da 5ª subchefia/EME, também promovido ao generalato, e, mais tarde,
chefe do Estado-Maior do Exército; pelo coronel de Infantaria QEMA Jomar
Nascimento Telles, da 3ª Subchefia/EME, que foi o primeiro comandante do
1º Batalhão de Aviação do Exército; pelo autor, da 3ª Subchefia/EME, e pelo
major MB QEMA Wanderley de Castro, da 3ª Subchefia/EME.
Segue-se a reprodução do documento oficial de designação da
comissão:

Comissão para a Implantação da Aviação do Exército


(Organização)
PORTARIA No 78-EME, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1985
O CHEFE DO ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO, no uso das
atribuições que lhe confere o Art 2º do Regulamento
do Estado-Maior do Exército, aprovado pelo Decreto no
88.780, de 30 de setembro de 1983, e de acordo com o
A Comissão de Implantação da Aviação do Exército 163

Despacho do Sr. Ministro do Exército, de 28 de novembro


de 1985, resolve:
1. Organizar, no âmbito do Estado-Maior do Exército, em cará-
ter temporário, a Comissão abaixo mencionada para implantar
a Aviação do Exército.
– Cel Cav QEMA João Luiz Saraiva de Castro
– Cel Art QEMA Marcello Ruffino dos Santos
– Ten Cel Inf QEMA Jomar Nascimento Telles
– Ten Cel Cav QEMA Paulo Sergio da Silva Maia
– Maj MB QEMA Wanderley de Castro
2. Designar seu chefe como gerente do respectivo projeto.
3. Determinar que a referida Comissão passe a integrar a 3ª
Subchefia do EME.
(Of nº 221/SG 2.1.5, de 10 Dez 85/EME – Prot no 1.787)

O coronel Saraiva, chefe da comissão, foi designado gerente


do projeto de implantação. A comissão passou a integrar a 3ª subche-
fia. Os oficiais designados também participaram da comissão anterior
e desempenharam papel preponderante na elaboração do Plano de
Implantação. Conforme se verifica, à exceção do então coronel Mar-
cello, que pertencia à 5ª subchefia, os demais integrantes da comissão
já eram da 3ª Subchefia do EME, fato que se justifica considerando que
a ela cabiam as áreas de doutrina, ciência e tecnologia, todas afins com
a nova estrutura que se implantava. Além disso, um dos primeiros es-
tímulos para criação da Aviação do Exército saiu da “terceira”, como
a chamávamos. Entre os encargos da subchefia, já vimos em capítulo
anterior, estavam a produção e a revisão dos manuais doutrinários de
emprego da Força Terrestre, a elaboração dos quadros de organização,
o estabelecimento dos requisitos operacionais para os materiais de in-
teresse do Exército e outras tarefas as quais permeavam as áreas de
interesse que estariam envolvidas na implantação da Aviação do Exér-
cito. Logo, todos se encontravam suficientemente preparados para o
exercício de suas respectivas funções.
A comissão foi estruturada com as áreas de instrução,
pessoal, doutrina de emprego e apoio logístico. A despeito da perfeita
integração entre os membros da comissão e da necessidade constante
de participação de todos os integrantes nos assuntos de todas as
164 Aviação no Exército - uma visão histórica

áreas, convencionou-se a distribuição de responsabilidades. A área de


instrução foi atribuída ao coronel Marcello; a de pessoal, ao autor deste
livro; a de doutrina de emprego, ao coronel Telles, e o apoio logístico, ao
major Wanderley.
Pode a princípio parecer desproporcional que uma missão
de tão grande amplitude, “implantar a Aviação do Exército”, tenha
sido cometida a uma comissão composta por unicamente cinco ofi-
ciais. Acho que foi o reconhecimento do trabalho o qual já vínhamos
desenvolvendo que gerou a confiança em nossos superiores de nós
sermos suficientemente competentes para “carregar o piano”. À nós
coube a suprema honra de “funcionar os motores”, de fazer as “héli-
ces girarem”. Fizemos por merecer a confiança que nos depositaram.
As mangas já estavam arregaçadas. Tínhamos a exata medida da nos-
sa responsabilidade. Iniciamos de imediato o nosso trabalho, a prin-
cípio orientado para duas vertentes, a especialização do pessoal e a
construção da base física do BAvEx. Trabalhamos bem e rápido. Os
resultados ficam fáceis de serem avaliados. Basta olhar para o atual
estágio da nossa Aviação e avaliar a sua repercussão na evolução ex-
perimentada pelo Exército com a sua chegada.
Preferi estender o relato de nossas atividades no capítulo se-
guinte, no qual abordo a Seção de Aviação do Exército. Como ela era
constituída pelo mesmo núcleo da Comissão de Implantação, hoje me é
difícil separar o que foi feito sob cada designação. Só posso adiantar que
trabalhamos muito, e os obstáculos não foram poucos. As dificuldades,
no entanto, eram facilmente aplainadas pelo nosso imenso prazer e or-
gulho de estarmos incumbidos de tão nobre missão.
Iniciamos o tiroteio. Era preciso no mais curto prazo selecionar
o pessoal com todas as consequências que isso acarretava, consubstan-
ciadas na elaboração e publicação das portarias, a seleção dos volun-
tários, o transporte para os locais de seleção, a definição dos locais de
alojamento e alimentação, a apuração dos candidatos aptos, o retorno
destes às suas OM de origem e em seguida a movimentação para os lo-
cais de cursos, a publicação de todos os atos decorrentes e outras pro-
vidências que a memória no momento não me permite resgatar. Era
preciso ao mesmo tempo fazer o contato com a Marinha e Força Aérea
para definir o local dos cursos, dos currículos, das cargas horárias, dos
uniformes, do enquadramento do nosso pessoal pelas outras Forças.
A Comissão de Implantação da Aviação do Exército 165

UFA!!!! Era muita coisa a fazer. É impossível revelar aqui em detalhes


tudo aquilo que foi realizado.

Ao mesmo tempo, urgia iniciar a construção da base física do


batalhão. Garimpar projetos, definir a localização, realizar o processo
licitatório para definir a empresa construtora, localizar os recursos e
uma gama de outras providências que faziam que os nossos dias fossem
muito curtos. E ainda havia os OBO dos helicópteros, a definição dos
detalhes da estrutura organizacional do Batalhão de Aviação e outros te-
mas. Lidávamos com uma quantidade considerável de órgãos no âmbito
e fora da nossa Força. Fazíamos seguidas viagens. Tínhamos que tudo
acompanhar de perto.
Era muita coisa. Acreditem.
Capítulo 11

A Seção de Aviação do Exército

A criação da Seção de Aviação do Exército atendeu a


uma proposta da 3ª Subchefia do EME, local onde
funcionava a Comissão de Implantação. Considerava a necessidade
de definir um organismo de caráter permanente e exclusivo, no âm-
bito do Órgão de Direção-Geral, o EME, para o trato da Aviação do
Exército, pela singularidade e especificidade de nova área. Julgava-
se que a criação de uma Seção de Aviação seria fundamental para o
estudo, planejamento, orientação, coordenação e controle, no âmbito
do assessoramento das decisões e diretrizes ministeriais, relativas à
Aviação do Exército. Até aquele momento, os oficiais que integravam
a Comissão de Implantação acumulavam suas funções com as que
desempenhavam em suas subchefias e não possuíam uma estrutura
própria de pessoal auxiliar, para atender às suas necessidades buro-
cráticas, nem mobiliário adequado.
Na ocasião, já haviam sido criados a Diretoria de Material de
Aviação e o 1º Batalhão de Aviação do Exército acrescentando novos
encargos. Desse modo, a Seção de Aviação do Exército absorveu to-
das as responsabilidades. Na sua trajetória, portou-se como um ór-
gão executivo, normativo e de assessoria para os assuntos da Aviação
do Exército, desenvolvendo seus trabalhos tanto no âmbito do Minis-
tério do Exército quanto na ligação com as demais Forças Singulares.
Prosseguiu com a efetivação das providências impostas pelo Plano
168 Aviação no Exército - uma visão histórica

de Implantação. Funcionava nas instalações da 3ª Subchefia e era su-


bordinada a esta.
A proposta de criação da Seção de Aviação do Exército consi-
derava as responsabilidades do EME como órgão assessor do ministro
do Exército, na orientação, controle e coordenação das atividades de
direção setorial e nas áreas de pesquisa e desenvolvimento relativas à
doutrina de emprego, ao ensino, à instrução e ao pessoal. Logo, o acrés-
cimo de novas e originais responsabilidades decorrentes da criação da
Aviação exigia estrutura específica.
Mesmo após a criação da Seção de Aviação do Exército, os
oficiais continuaram a desempenhar suas funções cumulativamente com
aquelas já exercidas anteriormente, que não eram poucas, tomando como
prioritárias as relativas à Aviação. Ela ocupou as instalações da Seção de
Doutrina, da 3ª Subchefia, e se utilizava do pessoal auxiliar desta, não
tendo ainda naquela oportunidade uma estrutura específica de apoio.
Foram endereçados expedientes à FAB e à MB os quais solicitavam a
designação de um oficial de ligação de cada Força para assessorar a
Seção no que se fizesse necessário e agilizar as ligações com aquelas
Forças. A FAB designou inicialmente o tenente-coronel Jacques, que foi
posteriormente substituído pelo tenente-coronel Linhares. A Marinha,
por razões que não consigo me recordar, não designou qualquer oficial
naquela ocasião.
Era um núcleo reduzido, mas valoroso e competente. O vul-
to da tarefa jamais nos intimidou, servindo os novos desafios como
estímulo ao cabal cumprimento de nossas responsabilidades. Para o
cumprimento de sua missão, que rezava textualmente “prosseguir com
as medidas para implantação da Aviação do Exército”, a seção, entre
outras inúmeras atividades, elaborou estudos e propostas nas áreas
de doutrina, pessoal e material, realizou visitas e palestras, estabele-
ceu contatos no seio do Exército e com as demais Forças Singulares,
acompanhou a implementação das ações aprovadas e participou de
simpósios e intercâmbios. Envolveu-se ativamente no recrutamento e
seleção dos candidatos a pilotos, mecânicos e gerentes, acompanhan-
do inclusive aqueles selecionados nos exames físicos e de saúde na
Marinha e na Aeronáutica. Além disso, se fez sempre presente, solu-
cionando problemas de toda a ordem nas Bases das demais Forças,
onde os futuros “águias” se especializaram.
A Seção de Aviação do Exército 169

Seção de Aviação do Exército: Em pé, o major Wanderley; sentado, o autor

Aos cinco, friso cinco, integrantes da Seção cabiam as ta-


refas de dar continuidade ao prosseguimento da implantação da
Aviação do Exército no apoio à seleção do pessoal aeronavegante,
no acompanhamento dos cursos na Marinha e na Aeronáutica e na
assessoria ao núcleo da Diretoria de Material de Aviação, visando
à aquisição dos helicópteros. A tudo isso se agregava o desenvolvi-
mento das bases da doutrina de emprego das aeronaves por meio
da elaboração das diretrizes para a elaboração dos manuais de
campanha. Era uma gama muito variada de missões complexas, mas
realizadas com competência e extrema motivação. A tarefa foi em
parte facilitada, uma vez que todos os integrantes da seção tinham
tomado parte nas comissões de Estudo e de Implantação da Aviação
do Exército enfocadas anteriormente. Tínhamos ainda de respon-
der pelas carteiras que éramos titulares na Seção de Doutrina. Há
um ditado que diz “cabeça vazia oficina do diabo”. Esse temor não
nos afligia. Vivíamos a “mil”. Era, no entanto, uma roda-viva que,
antes de tudo, nos enchia de prazer e vibração. Batíamos o corner,
cabeçeávamos e ainda fazíamos o gol.
170 Aviação no Exército - uma visão histórica

Reunião da Seção de Aviação com representantes estrangeiros

Integravam a Seção de Aviação do Exército os mesmos oficiais


que compunham a extinta Comissão de Implantação. Para evitar re-
tornos ao capítulo passado, não custa relembrar que os integrantes da
Seção eram:

– Cel Cav QEMA João Luiz Saraiva de Castro (chefe);


– Cel Art QEMA Marcello Ruffino dos Santos;
– Ten Cel Inf QEMA Jomar Nascimento Telles;
– Ten Cel Cav QEMA Paulo Sergio da Silva Maia; e
– Maj MB QEMA Wanderley de Castro.

À excessão do coronel Marcello, éramos todos efetivos da Seção


de Doutrina. Dessa forma, já trabalhavámos juntos havia algum tempo,
já tinhamos sólidos laços de amizade, fatos que colaboraram para que
construíssemos uma equipe coesa e harmoniosa. A integração do coronel
Marcello foi imediata, uma vez que com ele trabalhamos nas comissões
anteriores. Além disso, a sua vasta cultura profissional, grande competência
e qualidades de liderança cedo nos fizeram admirá-lo e respeitá-lo. Essa
conjunção de fatos tornou nosso pesado fardo fácil de ser carregado.
A Seção de Aviação do Exército 171

O coronel Saraiva, que já era nosso chefe quando pertencíamos


somente à Seção de Doutrina, prosseguiu nessa qualidade nas comis-
sões anteriores. Sério e extremamente compromissado com suas atri-
buições, exercia seu cargo com entusiasmo e constante preocupação.
Com sua promoção ao generalato, foi substituído pelo coronel Sergio
Marcondes, que soube dar continuidade com grande eficiência às ações
iniciadas por seu antecessor. Sem contestar o valor do coronel Marcon-
des, parodiando o célebre vulto militar da nossa história, o Duque de
Caxias, “era fácil a missão de conduzir subordinados que estavam plena-
mente conscientes e imbuídos de seus deveres”. Por intermédio do co-
ronel Telles, tive o grande prazer de reencontrar o coronel Marcondes, o
que ocorreu em contato telefônico. Ao falar sobre a minha empreitada,
ele reagiu com o mesmo entusiasmo e vibração com que se desincumbiu
da chefia da seção. Incontinênti, se colocou à minha disposição e, após
poucos dias do nosso contato inicial, me enviou um extenso depoimen-
to, que abaixo reproduzo na íntegra.

Prezado Cel Silva Maia


Neste momento me é difícil passar para o papel todos os
fatos ocorridos no processo de criação da Aviação do Exér-
cito. A lembrança longínqua da gama de eventos dos quais a
Seção de Aviação participou me dificulta neste depoimento
reviver tudo que foi feito no período em que chefiei a Seção.
Foi um árduo trabalho, realizado com muito entusiasmo e
crença de que, com o trabalho em equipe, muita dedicação
e a ajuda do bom Deus tornaríamos realidade a nossa Avia-
ção, aspiração antiga de gerações anteriores.
No passado fui testemunha de muitas conversas a respei-
to da necessidade da criação da nossa Aviação. Das inves-
tidas neste sentido, me recordo do então tenente Art Ary
Cavalieri, piloto privado e observador aéreo, que quase foi
preso por defender, com paixão, a incorporação de meios
aéreos orgânicos. Como ele, vários companheiros fizeram
tentativas semelhantes, todas abortadas no nascedouro no
âmbito do próprio Exército, pois a Aeronáutica manifesta-
va-se contrária tanto ao nosso anseio como a Marinha, que
tinha a mesma aspiração. Recordando os companheiros da
172 Aviação no Exército - uma visão histórica

Marinha, quanta audácia e coragem de nossos irmãos pilo-


tos navais. A criação da aviação naval foi um ato de louvável
heroísmo. Vidas de pilotos não foram poupadas na busca de
experiências de voo. Em certa época, os aviões da Marinha
eram considerados ‘objetos voadores não identificados’. A
atualidade é diferente. Hoje encontramos na Base Aerona-
val de São Pedro da Aldeia uma notável escola de aviação
de helicópteros onde nosso pessoal teve oportunidade de
aprender a voar e a manter uma manutenção rigorosa das
aeronaves. Somos sinceramente agradecidos aos compa-
nheiros da aviação naval. A despeito das reações iniciais,
não posso deixar de ressaltar o grande e eficiente apoio que
recebemos da Força Aérea Brasileira na formação dos nos-
sos quadros, oficiais e sargentos.
Minha história como chefe da Seção de Aviação começou
quando se concluía a minha missão como chefe do
Estado-Maior da 4ª Brigada de Infantaria, em Belo
Horizonte. Na ocasião recebi o convite formulado pelo
general Baratta, 3º subchefe do EME, para substituir o
coronel Saraiva, que deixava a chefia daquela Seção em
função de sua promoção ao generalato. Confesso que
foi uma das maiores vibrações de minha carreira, pois,
como piloto privado e sendo um daqueles que sempre
aspiraram por uma aviação nossa, o desempenho daquela
função me permitiria colaborar para transformar em
realidade o sonho que eu tinha acalentado no passado e
me transformaria em um dos pioneiros na implantação
da Aviação do nosso Exército. Foi uma honra e um desafio
espetacular para um coronel de Infantaria, com curso de
Comandos, com experiência em exercícios com apoio da
FAB, quer em emprego de tropa, inclusive na selva, quer
em exercícios com cadetes no Curso de Infantaria e SIEsp/
AMAN. Tive também algumas experiências em missões de
apoio aos exercícios com cadetes na AMAN, como piloto
privado, utilizando aviões do Aeroclube de Resende. Que
falta fazia, naquela época, a nossa aviação própria. Uma
menção justa e especial ao Aeroclube de Resende, que
A Seção de Aviação do Exército 173

formou, como pilotos privados, vários oficiais e sargentos


do Exército que puderam executar voos de apoio à AMAN
sempre que eram solicitados e quando faltava apoio da
FAB. Alguns companheiros tiveram inclusive oportunidade
de ingressar na Aviação do Exército e se tornar pilotos de
helicópteros, tais como o general Peternelli, o coronel Luiz
Claudio e o saudoso coronell Pavanello, naquela época já
um entusiasta da aviação.
Por um dever de justiça, faço uma referência pessoal ao
trabalho do meu antecessor na chefia da Seção, o coronel
Saraiva. Tive a oportunidade de sentir, por ocasião da pas-
sagem da função, sua dedicação, organização e perfeito con-
trole das atividades da Seção, o que me facilitou muito no
prosseguimento da missão.
Foi com muito entusiasmo e incontida vibração que me
vi em Brasília, servindo pela primeira vez no EME e na
Seção de Aviação do Exército. Lembro-me do dia em que
cheguei à Seção e me deparei com os companheiros que
me assessorariam naquela função. Eram eles o tenente-
coronel Telles, o tenente-coronel Silva Maia e o tenente-
coronel Wanderlei, esse último de saída para a função de
instrutor da AMAN. Nesse momento, surgiu minha gran-
de dúvida. Como uma Seção tão pequena estava execu-
tando uma missão tão grande e complexa? Mas, após os
primeiros contatos com a equipe, senti que estava muito
bem assessorado por esses companheiros, pois conhe-
ciam com profundidade a missão. Todos tinham partici-
pado da comissão de estudo e de implantação, que foram
formadas, sucessivamente, para planejar a implantação
da nossa aviação. O espaço físico da Seção era pequeno,
a equipe mínima. Mais tarde, chegariam os novos com-
panheiros, major Mat Bel Azambuja, em substituição ao
tenente-coronel Wanderley, e o major Inf Schramm para
a vaga deixada pelo coronel Telles e, posteriormente, o
major Inf Jeannot. Pois foi com essa equipe, trabalhando
além do dever, que permaneci na chefia durante os anos
de 1987, 1988 e início de 1989.
174 Aviação no Exército - uma visão histórica

Confesso que me assustei quando sentei a minha mesa e co-


mecei a tomar conhecimento do volume de missões e dos
custos envolvidos por uma aviação. Os trabalhos já em an-
damento, de planejamento da construção do aquartelamento
da Base de Taubaté, formação de pilotos e graduados espe-
cialistas, a escolha dos tipos de helicópteros a serem adqui-
ridos, os demais investimentos para a implantação, todos
eram encargos enormes. Criei cedo a certeza de que o apoio
da Marinha e da Aeronáutica seriam imprescindíveis.
Em 1986, foi assinado o ato de criação da Aviação do Exér-
cito, e, em 1987, os acordos que permitiriam os recursos
necessários para aquele empreendimento audacioso e o
apoio garantido da Marinha e Aeronáutica. Justiça se faça
ao general Leonidas, então ministro do Exército, ideali-
zador da criação da nossa Aviação e lutador incansável,
desde o início, para transformar nosso sonho em realida-
de. O braço forte do general Leonidas nessa empreitada
foi o general Baratta, então 3º subchefe do EME, um che-
fe audacioso e possuidor de uma larga visão de futuro,
que nos prestigiou muito e nos deu sempre total apoio,
ouvindo nossas sugestões e corajosamente assumindo
riscos calculados que o dignificaram na função que exer-
ceu. As medidas mais corajosas foram tomadas naquela
ocasião, tais como a extinção da Bateria Aérea existen-
te em Taubaté, que estava prevista para ser transferida
para Nioaque, em Mato Grosso do Sul, sendo seu aquar-
telamento, efetivo em oficiais e praças e suas viaturas
transferidos para o núcleo base do Batalhão de Aviação
do Exército, que lá se estabeleceria. Presto aqui minhas
saudações ao general Etualpe, comandante da 12ª Bda de
Infantaria, e ao major Volney, então comandante da Ba-
teria de Artilharia Antiaérea de Taubaté, que, surpresos,
inicialmente, com as medidas que estavam sendo toma-
das pelo EME, nos apoiaram totalmente na missão.
Enquanto tudo isto acontecia, as primeiras turmas de pi-
lotos e especialistas começavam a ser brevetadas na Ma-
rinha e Aeronáutica. Aqui faço um parêntese para homenagear
A Seção de Aviação do Exército 175

os oficiais da Marinha e da FAB, que nos assessoraram


com muita dedicação na formação de nossos pioneiros.
O apoio foi total e irrestrito; nossos pilotos usavam ho-
ras de voo de pilotos daquelas Forças; nossos sargentos
passaram a integrar as equipes de manutenção. Fomos
testemunhas de uma solidariedade irrestrita; os compa-
nheiros da Aviação Naval e da FAB vibravam e se entu-
siasmavam passando suas experiências para nossos pilo-
tos e graduados especialistas. Destaco aqui os comandos
da Base Aeronaval de São Pedro da Aldeia, da AFA, das
Bases Aéreas de Santos, Santa Maria, Recife e da Escola
de Especialistas de Aeronáutica, em Guaratinguetá. To-
dos esses comandos foram valiosos em suas colabora-
ções, não medindo esforços para nos ajudar.
Paralelamente, os comandos de área nos apoiavam admi-
nistrativa e logisticamente, com grande dificuldade, mas
não medindo esforços.
Simultaneamente, a Diretoria de Engenharia, representada
no projeto de construção da sede em Taubaté pelo major
Engenheiro Militar Junqueira, trabalhava exaustivamente
no projeto para o início das obras do 1º Batalhão de Aviação
do Exército em Taubaté. O projeto ficou impecável e estáva-
mos ansiosos para que a licitação fosse realizada e que uma
construtora de peso fosse eleita para o início das obras. Fi-
nalmente, a Construtora Odebrecht venceu a concorrência,
e a obra foi iniciada com a construção do grande canteiro
de obras; em menos de dois anos estávamos trazendo para
Taubaté o núcleo base do 1º Batalhão de Aviação do Exérci-
to que fora criado e tendo sido designado para o comando o
tenente-coronel Telles.
Outro encargo entusiasmante da Seção foi a realização de
palestras na Academia Militar das Agulhas Negras, Escola
de Comando e Estado-Maior do Exército e no Gabinete do
Ministro para todos os comandantes de Região Militar e dos
Grandes Comandos do Exército. Essas palestras foram fei-
tas com muita vibração e demonstrando ao Exército nossa
fé e confiança na realidade da Aviação do Exército. Éramos
176 Aviação no Exército - uma visão histórica

correspondidos principalmente na AMAN, onde os cadetes


demonstraram muita vibração pela Aviação do Exército.
Outra oportunidade que nos serviu muito para os estudos
que realizávamos na Seção, para escolha das aeronaves, foi
a visita que fizemos, acompanhados pelo tenente-coronel
Telles e Silva Maia, ao Centro de Instrução da Aviação do
Exército dos USA e à fabrica de helicópteros da BELL, nos
Estados Unidos. Essas visitas nos deram a oportunidade de
sentir o avanço tecnológico daquele país e a experiência de
guerra da aviação do Exército americano.
Graças a Deus, ao final do ano de 1988, estávamos com
nosso 1º Batalhão de Aviação em suas instalações, a des-
peito de, ainda, estarem inconclusas as obras. Já nessa
época, havia sido criada a Diretoria de Material de Avia-
ção sob o comando do coronel Cav Bulcão, que seria pro-
movido ao generalato no exercício do seu comando. Na
oportunidade, ocorreu a transferência do tenente-coro-
nel Silva Maia para aquela Diretoria, onde continuou seu
excelente trabalho no processo de seleção das aeronaves
que deveriam ser adquiridos pelo Exército. Anterior-
mente, o tenente-coronel Silva Maia tinha sido designado
para apoiar a DMAvEx no processo licitatório. A Diretoria
realizou a licitação para compra dos helicópteros com o
apoio da Seção.
Como resultado da licitação, o Consórcio Engesa-Helibras
-Aerospatiale foi escolhido para fornecer os helicópteros
para o nosso Exército, tendo o tenente-coronel Silva Maia
assessorado por um companheiro da FAB, recebido a mis-
são de, na França, acompanhar a fabricação e o recebimento
dos helicópteros.
Nessa oportunidade, o Batalhão em Taubaté, ainda em
obras, se encontrava em plena atividade já com um
número significativo de pilotos, gerentes e mecânicos
especializados na Marinha e na Força Aérea, bem como
oficiais engenheiros formados no IME, especializados em
engenharia aeronáutica. Com o Exército conscientizado
e acreditando na recém-criada Aviação tivemos que
A Seção de Aviação do Exército 177

encerrar nossa missão na ativa. Não tive a satisfação de,


na ativa, receber os primeiros helicópteros, mas deixei a
função gratificado, pois os alicerces estavam fixados, e a
Aviação do Exército já era uma realidade. Para propagar
nossa aviação usei muito os cartões com a maquete da
Base e os chaveiros da Aviação do Exército que sempre
nos enchiam de orgulho na missão. Antes de ingressar
na reserva, passei a chefia da Seção para o então coronel
Andrade Nery, que logo foi promovido a general de
brigada e posteriormente foi o primeiro comandante
do Comando de Aviação do Exército em Taubaté. Com a
satisfação do dever cumprido ingressei na reserva após
37 (trinta e sete) anos de ativa, tendo sido gratificado ao
receber como minha última missão na ativa participar da
implantação da nossa Aviação do Exército.

Coronel Marcondes, chefe da Seção de Aviação, e o tenente-coronel Silva Maia, ad-


junto da Seção, durante apresentação de palestra realizada na AMAN

Como sou cristão e acredito na força da fé, dou meu testemunho


da presença de Deus na Seção de Aviação do Exército. Através de orações
fervorosas, o milagre da Aviação foi se realizando em tempo recorde e
com toda segurança de voo. A Aviação do Exército veio a ser a primeira
colocada em segurança de voo no mundo. Agradeço ao meu Deus a opor-
tunidade que me proporcionou de haver colaborado um pouco, com este
que reputo um milagre.
178 Aviação no Exército - uma visão histórica

Coronel Marcondes, tenente-coronel Telles e o autor em


visita às instalações da Bell Textron, nos Estados Unidos da
América do Norte

Aos nossos chefes que acreditaram em nós, aos nossos pilotos


e especialistas pioneiros que com suas famílias sofreram os tempos difí-
ceis da implantação nossos agradecimentos e nossas homenagens pela
vitória honrosa da implantação. A missão de vocês da ativa de hoje é
manter o objetivo conquistado e plagiando o sempre lembrado general
Rodrigo Otávio:
‘Muito mais difícil que manter hoje a Aviação do Exército foi a
missão de nossos pioneiros responsáveis pela sua criação.’
AVIAÇÃO!

Visita à Bell Textron

Continuamos na Seção de Aviação a realizar diversas via-


gens de estudos. Entre elas, inclui-se aquela à Bell Helicopter Tex-
tron, citada no depoimento do coronel Marcondes, onde tivemos a
A Seção de Aviação do Exército 179

oportunidade de realizar o voo no helicóptero Bell 407, Comanche,


uma aeronave destinada a substituir os Bells 206 como helicóptero
de observação da Aviação do exército americano, e visitar as insta-
lações da fábrica.
A história da Seção de Aviação confunde-se com a do nas-
cimento e crescimento da nossa Aviação. Podemos considerar que
a seção foi a maternidade onde o “nosso filho” foi diligentemente
cuidado, recebeu seus ensinamentos e a sólida base para seu cres-
cimento. Para tal, a Aviação do Exército contou com “cuidadores”
desvelados que reuniam, já naquela oportunidade, todos os conhe-
cimentos que lhe pressagiavam um futuro de sucesso. Mesmo no
processo de aquisição das aeronaves, de responsabilidade do De-
partamento de Material Bélico, a Seção de Aviação se fez presente
designando um oficial como ligação, tarefa da qual fui incumbido
para prestar a assessoria à Diretoria de Material de Aviação do
Exército, órgão de apoio subordinado ao DMB, a quem caberia rea-
lizar a aquisição dos helicópteros.

Reunião de estudos com delegação estrangeira

Recentemente ao reencontrar-me com o coronel Telles e


recordarmos nossa atuação nas comissões de Estudo e de Implantação,
bem como na Seção de Aviação, relembrando de quão poucos éramos,
em determinado momento ele perguntou-me, como fizera em encontro
anterior: “Como é que nós tínhamos conseguido fazer aquilo tudo?”
Devolvi-lhe a pergunta com outra: “Como é que nos tínhamos arrumado
tempo para fazer aquilo tudo?”
180 Aviação no Exército - uma visão histórica

General Baratta, ao fundo, preside reunião da Seção de


Aviação do Exército, com delegação estrangeira

Em complemento ao depoimento que nos dera anteriormente,


o coronel Marcondes me enviou um novo relato. Não posso deixar de
transcrevê-lo. Acontece com todos nós “pioneiros”. Quando se trata de
Aviação a emoção e a vibração se tornam incontidas.
Aludia a alguns fatos que já tinham sido abordados. A despeito
disso, resolvi incluí-lo com pequenas supressões. Sei que a extensão do
seu relato foi fruto do imenso orgulho que brotou no peito do velho sol-
dado ao poder evocar a nossa amada Aviação do Exército.
Aduziu que:

[...] que o convite para assumir a função de chefe da Seção de


Av Ex, ocorrido quando servia em Belo Horizonte, e exercia
a função de chefe de Estado-Maior da 4ª Bda de Infantaria,
ocorreu por uma grande coincidência. No desempenho
de minha função acompanhava com muito entusiasmo o
processo de implantação da nossa Aviação, quando, no
final de 1986, o coronel Telles sofreu um acidente de carro
próximo à cidade de Barbacena tendo recebido o apoio
através do coronel Bini, comandante do 11º BI de Montanha,
unidade subordinada à nossa Brigada. Na oportunidade, em
conversa com o Telles, que ficara agradecido pela atenção
que recebeu, fiquei sabendo que estavam procurando um
coronel para substituir o coronel Saraiva na chefia da Seção
de Aviação, pois este seria promovido a general e não poderia
A Seção de Aviação do Exército 181

continuar na função. O coronel Bini, amigo do coronel


Telles, sugeriu o meu nome, considerando que, entre outros
aspectos, eu era piloto privado e tinha algum conhecimento
sobre a atividade. Minha indicação foi levada ao general
Baratta, 3º subchefe do EME, que aprovou o meu nome.
Com intensa vibração, aceitei a honrosa missão de chefiar a
equipe pioneira que já trabalhava na implantação da nossa
Aviação.
Por nunca ter servido no EME minha preocupação inicial foi
de conhecer a organização e as missões de cada subchefia.
Fiquei entusiasmado com a estrutura e com a qualidade dos
companheiros que lá serviam, todos oficiais brilhantes e de
alto conceito entre seus pares.
O expediente na Seção envolvia o constante estabelecimento
de ligações com a Marinha e FAB, com as subchefias do EME,
os departamentos e respectivas diretorias, pois dependíamos
do apoio de todos. As Grandes Unidades (GU) que apoiavam
os nossos oficiais e sargentos que já realizavam os cursos na
Marinha e na FAB eram, igualmente, um importante elo na
cadeia de apoio aos nossos pilotos e mecânicos. A transfe-
rência de etapas de alimentação, a movimentação para os lo-
cais de curso, o pagamento dos alunos e outras atividades de
apoio administrativo eram preocupações constantes. Todas
as dificuldades foram suplantadas fruto do esforço coletivo
de todos os órgãos envolvidos, e nossos militares tiveram sa-
tisfeitas suas necessidades de forma eficiente.
A Seção de Av Ex, com sua estrutura diminuta, conseguiu cumprir
sua missão. A despeito da interveniência de diversos órgãos no
atendimento aos nossos militares, cabia à Seção o trabalho de co-
ordenação e verificação do bom andamento de todas as medidas.
É importante ressaltar o trabalho dos companheiros das Grandes
Unidades (Brigadas) que trabalharam diuturnamente para que
nada faltasse ao nosso pessoal. Recordo-me do major Vilela, da
1ª Brigada de Infantaria, de Niterói, que não mediu esforços para
atender os nossos militares que se encontravam realizando curso
na Base Aeronaval de São Pedro da Aldeia. Esforços semelhantes
despenderam os companheiros que apoiaram o nosso pessoal
182 Aviação no Exército - uma visão histórica

em Santos, Santa Maria, Guaratinguetá e Pirassununga. Quanta


dificuldade. A destacar, também, apoio que nossos pioneiros rece-
beram de suas respectivas famílias que enfrentaram toda sorte de
dificuldades, mas, com sacrifício, proporcionaram a seus maridos
e pais a tranquilidade necessária para a realização de seus cur-
sos. Vivíamos na Seção sob tensão constante, trabalhando com
afinco para que tudo ocorresse a contento. A licitação da obra do
1º BAvEx foi feita pela 2ª Região Militar. Foi um trabalho intenso,
sempre acompanhado pela Seção e pelos companheiros que já se
encontravam em Taubaté. Em razão da necessidade do tenen-
te-coronel Telles, que fora nomeado comandante do 1º BAvEx
e gerente do projeto de implantação da unidade em Taubaté,
permanecer em Brasília, ficou inicialmente respondendo pelo
comando do Batalhão o tenente-coronel Roberto, designado sub-
comandante, que acompanhou a instalação do Btl em Taubaté.
Até o pagamento dos trabalhadores inseria-se em nossas preo-
cupações, pois qualquer atraso poderia implicar em delonga na
conclusão das obras.
Merece ser lembrada a seleção dos oficiais e sargentos. O
estabelecimento dos critérios para a seleção do pessoal; o
percentual de vagas para as Armas; o estabelecimento do
número de vagas; as discussões em torno da extensão das vagas
para o Quadro de Mat Bel, a Arma de Comunicações e o Serviço
de Intendência; a definição dos requisitos necessários para os
candidatos e índices para exames médicos e psicológicos eram
algumas das atividades que requeriam a participação ativa
da Seção. Houve a necessidade de abrir algumas vagas para
capitães mais antigos para desempenho de funções no Estado-
Maior do Batalhão e para o enquadramento dos oficiais e
praças. Tudo isso exigiu da Seção estudos e debates constantes
para elaboração das propostas a serem apresentadas aos
nossos superiores. Felizmente, tudo foi se encaminhando.
Lembramos também das dificuldades dos pioneiros nos rigo-
rosos exames médicos e psicológicos nos hospitais da Mari-
nha e Aeronáutica. Os candidatos se deslocaram de diversos
pontos do País, implicando na necessidade de obter aloja-
mento em unidades da 1ª RM. Quantas responsabilidades,
A Seção de Aviação do Exército 183

mas tudo funcionava como um relógio, não faltou nada.


Nossa vibração era grande quando íamos visitar as bases
de formação, e os instrutores faziam voos conosco em heli-
cópteros pilotados por nossos pilotos.

Coronel Marcondes, chefe da Seção de Aviação, faz exposição


para a delegação da França

Outra oportunidade que tive, de grande valia para nossos


estudos, foi a viagem aos USA a convite da Bell Helicópteros
onde, além da fábrica da empresa, tivemos a oportunidade
de visitar o Centro de Instrução de Aviação do Exército
dos USA, que reunia em seus quadros oficiais e graduados
com experiência de combate nas guerras da Coreia, Vietnã
e conflitos no Oriente Médio. A permanência de alguns
dias naquele Centro deu-nos a certeza da necessidade de
uma aviação própria do Exército. Pudemos colher muitos
ensinamentos. A visita às instalações da Bell foi valiosa pela
oportunidade de conhecer os avanços técnicos no processo de
fabricação. Durante esta viagem, aconteceu um fato ao mesmo
tempo interessante, inusitado e pitoresco. Acompanhavam-me
os tenente-coronéis Telles e Silva Maia. Se bem me recordo, não
havia marcação de lugares, e o avião estava cheio. Era um voo
de Miami para Dallas. Quando entramos no avião, os coronéis,
‘muito vivos’, conseguiram lugares lado a lado, certamente
para fugirem do incômodo de terem que dialogar com um
americano. Sobrou para o chefe uma poltrona no meio, aquela
que ninguém gosta. Para minha satisfação e incredulidade
184 Aviação no Exército - uma visão histórica

dos meus acompanhantes, era ao lado de uma morena de


estonteante beleza. O Telles e o Silva Maia, que ocuparam
assentos próximos, começaram a me lançar aqueles olhares
cheios de malícia. A despeito de falar pouco inglês, por ser a
minha interlocutora de origem hispânica, tive oportunidade
de entabular uma animada conversação com a jovem, que era
cantora de música gospel e muito religiosa, como eu. Falamos
de nossas experiências religiosas e apesar do meu fraco inglês
conseguimos nos comunicar naquele dialeto criado quando,
a despeito de línguas distintas, temos o interesse de nos
entender. Agora os meus diletos subordinados me olhavam
incrédulos e com uma enorme inveja. Ao término do voo, após
as despedidas, meus dois companheiros, cheios de “malícias” e
admiração, queriam saber como, com meu inglês macarrônico,
eu havia conseguido conversar com aquela bela moça o voo
inteiro. Brinquei dizendo que havia recebido o apoio do meu
anjo da guarda.
Antes de concluir, gostaria de lembrar que durante o tempo que
estive na chefia da Seção, tive o apoio irrestrito dos chefes do
EME, o general Pamplona e general Tinoco, e dos 3º subche-
fes/EME, o general Barata, o general Freitas Almeida e do meu
saudoso irmão, general Yvens, que por feliz coincidência era o
3º subchefe por ocasião de minha despedida do serviço ativo.
AVIAÇÃO! coronel Marcondes.

Seção de Aviação prossegue no processo de capacitação por


meio do contato com representantes de exércitos de países amigos
A Seção de Aviação do Exército 185

De acordo com diretriz orientadora do general Baratta, estáva-


mos autorizados a fazer ligações com outros organismos dentro e fora da
Força, após a comunicação ao chefe imediato. Em uma dessas ocasiões,
fomos, eu e o major Wanderley, ao Ministério da Aeronáutica fazer conta-
to com um dos seus comandos, cuja designação prefiro omitir. Sabíamos
que naquele momento estávamos pisando em terreno minado, pois havia
alguma reação por parte da FAB em relação à criação da nossa Aviação. Só
não sabíamos que dentro de pouco tempo uma das minas explodiria sob
os nossos pés. Quando lá chegamos, não me recordo por que motivo, fo-
mos recebidos diretamente pelo respectivo comandante, um brigadeiro.
Era um tenente-brigadeiro, posto que equivale ao de general de exército,
o mais alto de nossa hierarquia. Esperávamos que fôssemos recebidos
pelo chefe do seu Estado-Maior ou outro assessor. Fomos surpreendidos.
Ao entrarmos no gabinete, a mina explodiu. Sabendo o brigadeiro do as-
sunto que iríamos tratar, o apoio da Força Aérea à implantação da nossa
Aviação, assim que adentramos na sala, ainda em posição de sentido e
no momento em que estávamos perfilados em uma enérgica continência
de saudação, fomos recebidos com uma saraivada, uma explosão, de ma-
nifestações de contrariedade. “Vocês vão matar muita gente. Vocês não
têm filosofia de manutenção. Agora que a Força Aérea ia comprar outros
meios para apoiar vocês, vocês fazem isso. Não vai dar certo!” E por aí foi.
Escutávamos impassíveis. Estupefatos. Sem reação. Tínhamos sido pegos
desprevenidos. Isso é um pecado mortal para o cavalariano como eu, ser
pego desprevenido. Mas, aconteceu. O Wanderley, que tinha ficado atrás
de mim, tentava diminuir de tamanho para se esconder e escapar da ca-
choeira de palavras que brotavam da indignação do brigadeiro. Segundo
o Wanderley, ele falou por quase meia hora, mas acho esse cálculo um
pouco exagerado. Em determinado momento, o brigadeiro, após ter dado
vazão a toda a sua contrariedade, numa calma que também nos descon-
certou, nos perguntou candidamente: “O que é que vocês querem, meus
filhos?” Instintivamente, lhe respondi, respeitosamente: “Eu quero me
retirar, Excelência”. Naturalmente, tal não aconteceu. O brigadeiro nos
ouviu, nos passou uma série de conselhos, o tranquilizamos em relação
aos nossos cuidados com a implantação e fomos atendidos naquilo que
solicitamos. Tive oportunidade de relembrar essa inesquecível situação
com o hoje coronel Wanderley, e graças a ele pude recuperar os detalhes
do que acabo de relatar. Rimos muito do acontecido. Essa não foi a única
186 Aviação no Exército - uma visão histórica

situação inusitada que enfrentei. Em prol da nossa Aviação qualquer sa-


crifício ou constrangimento era perfeitamente assimilável.

Palestra promovida pela Seção de Aviação, com a participação


de oficiais da Força Aérea Brasileira

Mais tarde, viriam prestar seus inestimáveis serviços ao prosse-


guimento da implantação como integrantes da Seção de Aviação do Exército
os atuais coronéis Azambuja e Otto Schramm e o general Jeannot. Somente
tive a oportunidade de trabalhar com o Schramm e o Azambuja. Por ocasião
da chegada do general Jeannot, eu já me encontrava na DMAvEx.
Por uma questão de amizade e respeito pelo trabalho por ele
realizado ao longo de sua carreira em prol da consolidação da implan-
tação da nossa Aviação do Exército, a despeito de não ter tido o prazer
de com ele trabalhar na Seção de Aviação, segue-se um breve depoi-
mento sobre a fase inicial de implantação da qual ele também partici-
pou ativamente, a partir de 1988. Do alto de sua larga e reconhecida
experiência sobre o assunto e movido pela intensa vibração que lhe
acomete ao falar da nossa gloriosa Aviação, o general Jeannot me brin-
dou com um longo e detalhado relato do qual pincei as partes que es-
tavam ligadas ao período que engloba este livro, objetivo do qual tenho
procurado não me afastar.

Convidado pelo coronel Silva Maia para oferecer um de-


poimento sobre minha passagem pela Aviação do Exército,
imediatamente aceitei. Orgulhoso pela distinção, a vontade
A Seção de Aviação do Exército 187

inicial de muito escrever foi lentamente substituída pela


certeza de que deveria ser breve. Primeiro, porque seu livro
já é suficientemente rico em fatos, documentos e histórias
pessoais; segundo, porque seu trabalho foca apenas a pri-
meira fase da implantação (seu planejamento, a aquisição
e contrato do primeiro lote de helicópteros e a etapa inicial
de recebimento das aeronaves), enquanto minha experiên-
cia dá-se a partir da discussão dos termos daquele grande
contrato.
Podemos dizer, assim, que sou da equipe que sucedeu aque-
la primeira que planejou e iniciou a implantação da nossa
Aviação.
Por viver intensos 18 anos na Aviação do Exército, durante
os períodos de implantação, consolidação e expansão (de
1988 a 2008, ausente apenas em 1996, como aluno do cur-
so de Política e Estratégia, e em 1997, servindo no Comando
de Operações Terrestres), sou observador privilegiado para
criticar o projeto inicial, já que fui um dos aplicadores da-
quele planejamento. Cheguei à Seção de Aviação do Exército
em 1988, como major, já com o curso de Estado-Maior. O
chefe da Seção era o coronel Marcondes (Sergio Monteiro
Marcondes, substituído em 1988 pelo coronel Nery (Durval
Antunes de Andrade Nery), e os outros integrantes eram o
tenente-coronel Schramm (Otto Schramm Filho) e o major
Azambuja, mais tarde substituídos pelos major Jeffe e Vile-
la. Pequena equipe, não? Mas muito produtiva, como a pri-
meira. Recém-saídos daquela Seção eram o tenente-coronel
Silva Maia, movimentado para constituir o núcleo inicial da
Diretoria de Material de Aviação do Exército (DMAvEx), e o
tenente-coronel Telles, nomeado comandante do 1º Bata-
lhão (1º BAvEx).
Naquele momento, a concorrência para aquisição das ae-
ronaves já tinha sido vencida pelos helicópteros da Euro-
copter; o núcleo da DMAvEx e o do 1º BAvEx começavam a
ser ativados e iniciava-se a discussão do contrato de aqui-
sição entre a DMAvEx e o consórcio vencedor (tendo como
‘chairman’ o próprio tenente-coronel Silva Maia).
188 Aviação no Exército - uma visão histórica

Naquela oportunidade, os primeiros aeronavegantes


do Exército (então realizando estágios práticos em
diversas bases da Marinha e da Força Aérea) começavam
a ser movimentados, criteriosamente selecionados, para
Taubaté. As obras do que viria a ser nossa Base de Aviação
estavam no início, seis residências estavam prontas e
todos os outros pavilhões estavam com sua construção
por começar. O comandante do 1º BAvEx, coronel Telles,
permanecia em Brasília, e o subcomandante, o tenente-
coronel Roberto (Roberto Sarmento), já se encontrava em
Taubaté.
É curioso lembrar que, antes disso tudo, ainda em 1987,
quando eu era oficial de operações da 9ª Brigada de Infan-
taria Motorizada, no Rio de Janeiro, ao chegar de um exer-
cício no campo, recebi uma mensagem do major Wanderlei,
da Seção de Aviação, de Brasília, querendo falar comigo.
Tratava-se de sondagem para um convite a fim de integrar
a equipe de implantação do 1º BAvEx, em face de o oficial
previamente indicado não ter sido aprovado nos exames
médicos feitos na Força Aérea. O convite nunca foi confir-
mado. Eu o aceitaria [...]
Fiquei na Seção de Aviação do Estado-Maior do Exérci-
to, em Brasília, até 1990, quando a mesma foi extinta.
Resumidamente, nossa missão era ativar a Aviação do
Exército, tendo por base o seu Plano de Implantação, es-
plendidamente comentado no trabalho do coronel Silva
Maia. O gigantismo do trabalho era assustador, porém
a verdade é que o Estado-Maior do Exército (EME) está
aparelhado para tarefas desse tipo. Assim, o que tínha-
mos a fazer era acionar os órgãos administrativos do
Exército, como os órgãos de direção e apoio setorial e as
regiões militares, para os encargos decorrentes da ati-
vação da aviação. Tínhamos de alertar o Exército para
as necessidades e prioridades das novíssimas asas do
Exército. Para isso, foi expedida a ‘Diretriz para a Im-
plantação da Aviação do Exército’, que estabelecia as
devidas prioridades e prazos para aquelas ações. Esse
A Seção de Aviação do Exército 189

documento foi muito bem elaborado e muito oportuno,


consubstanciado em Portaria do EME, proposta pelo ge-
neral Freitas Almeida, então seu 3º subchefe. Creio que
foi um documento que muito auxiliou e facilitou a efeti-
va execução do Pano de Implantação da Aviação.
Sou testemunha de que o Plano de Implantação, devido
a sua simplicidade, objetividade e flexibilidade, foi mag-
nífico. Essas três notáveis características facilitaram
enormemente nosso trabalho de execução. Obviamente,
houve modificações, pequenas modificações, mas todas
perfeitamente coerentes com o escopo geral. Naquela
época, já havíamos acumulado, considerando o estágio
inicial do empreendimento, um razoável volume de co-
nhecimento. Como o coronel Silva Maia relata em seu
livro, o intercâmbio com outros segmentos aéreos, mili-
tares e civis e nacionais e estrangeiros, foi intenso. Todo
esse conhecimento começava a ficar disponível para
nós, que sucedíamos a equipe inicial. Assim, concluímos
que uma única modificação de vulto deveria ser feita,
relacionada à estrutura inicialmente visualizada. Enten-
díamos que a logística não operacional do material esta-
va muito bem equacionada, a cargo da DMAvEx. Porém,
faltava uma estrutura eficaz para a logística operacional
de campanha, incluindo a área de pessoal e a de manu-
tenção do material. Mais do que isso, faltava um órgão
que centralizasse e gerenciasse a sensível e indispen-
sável atividade de segurança de voo. Percebemos, ain-
da, que deveria existir um elemento que centralizasse o
planejamento e a coordenação da instrução individual e
adestramento técnico e tático específicos da atividade
aérea (a área de ensino já estava equacionada, com o
planejamento do Centro de Instrução de Aviação). Foi
assim que surgiu a ideia da criação de um ‘Comando de
Aviação’, que ficaria com aqueles encargos (ensino, se-
gurança de voo, planejamento e supervisão da instrução
e adestramento, manutenção operacional e gerência do
pessoal aeronavegante). Foi assim, também, que surgiu
190 Aviação no Exército - uma visão histórica

a proposta de criação do Batalhão de Manutenção de


Aviação. E foi essa a razão do recrutamento de um nú-
mero determinado de oficiais superiores, inicialmente
não previstos, mais tarde especializados na Marinha e
na Força Aérea, para mobiliarem aquelas organizações.
Penso eu, após quase trinta anos de aplicação dessas
propostas, que foi uma decisão acertada.
Como fui um dos poucos que viveu aqueles momentos,
devo dizer que essas foram as únicas modificações
significativas que realizamos no planejamento inicial.
Algumas outras, como a criação da Base de Aviação, já
vinham sendo discutidas pelo Estado-Maior do Exército
e não se relacionavam unicamente ao caso da Aviação.
Todavia, quando a proposta de criação do Comando de
Aviação foi aprovada, em nível fora do Estado-Maior do
Exército, a DMAvEx foi extinta (esta não era nossa ideia
original; permito-me concluir, salvo melhor juízo, que um
fator daquela decisão foi o de não aumentar o número do
cargo de generais), passando seus encargos para o novo
órgão criado. A aprovação de nossa proposta veio ainda
com a alteração do nome de ‘Comando’ para ‘Brigada
de Aviação’, o que ocasionou a existência de um órgão
exclusivamente operacional com os encargos de um
órgão de apoio setorial. A experiência, como sabemos,
não deu certo, e, após três ou quatro anos, voltou-se à
proposta original.
Também participei ativamente da criação do Grupo de Avia-
ção, creio que em 1994, (que comandei, e que teve vida cur-
ta, pois foi uma experiência baseada na organização doutri-
nária da Força Aérea, que não era nosso caso) e da criação
dos três Batalhões de Aviação em Taubaté (com um período
em que a designação passou a ser ‘Esquadrão de Aviação’,
ideia também apoiada na busca de similaridade com a For-
ça Aérea, experiência curta que também não deu certo). To-
das essas propostas não se originaram na Aviação. Mas isso
é história para ser contada em outra ocasião, já que foge do
escopo do trabalho do coronel Silva Maia.
A Seção de Aviação do Exército 191

O general Maurice Cannet, de terno azul, primeiro comandante da Aviação do


exército francês (ALAT), conversa com os componentes da Sec Av Ex

Durante o período abrangido pelo livro do coronel Silva


Maia, enquanto ainda na Seção de Aviação, embora tivesse
variados encargos relativos à coordenação das medidas de
implantação, estive principalmente envolvido na área de es-
pecialização técnica do pessoal aeronavegante e na doutri-
na de emprego dos meios aéreos, analisando como melhor
utilizar nossos helicópteros, considerando as particularida-
des do nosso Exército e as condições dos possíveis oponen-
tes e das áreas de provável emprego. Em 1989/1990, fiz o
curso de piloto de helicópteros na Força Aérea Brasileira,
integrando a quarta turma. Ao terminar o curso, o Coman-
do de Aviação (então designado Brigada) já estava criado,
com os encargos da extinta DMAvEx acumulados. Fui seu
primeiro oficial de operações (E/3). Após isso, em 1991,
fui subcomandante do 1º Batalhão de Aviação (1º BAvEx).
Em 1992 e 1993, estive como oficial de ligação junto ao Co-
mando de Aviação do Exército dos Estados Unidos, em Fort
Campbell, naquele país, onde realizei o curso de piloto de
helicóptero de reconhecimento (OH 58 modelos A e C), ha-
bilitando-me ao voo com óculos de visão noturna, quando
vivi intensamente a Arma de Aviação. Uma vez mais tive o
orgulho de ser o primeiro oficial do Exército Brasileiro a re-
ceber as asas de aviador daquele país. Ao voltar ao Brasil,
em 1994, desempenhei as funções de comandante do 3º Ba-
talhão de Aviação e do 1º Grupo de Aviação e fui subdiretor da
192 Aviação no Exército - uma visão histórica

DMAvEx, então recriada. Com minha promoção a general,


fui duas vezes diretor de Material de Aviação e comandante
de Aviação por três anos. Toda essa experiência permite-
me avaliar, com muita segurança, os acertos e os erros nas
medidas de implantação, consolidação e expansão da nossa
Aviação. Com os limites impostos pelo período abrangido
no livro, farei a seguir algumas (poucas) observações restri-
tas àqueles anos.

Reunião com delegação estrangeira. Da esquerda para a direita,


tenente-coronel Silva Maia, tenente-coronel Schramm,
tenente-coronel Roberto, oficial não identificado,
major Azambuja e representante estrangeiro

Considero extremamente importante a decisão de fazer a


primeira aquisição escolhendo exclusivamente aeronaves
novas. Muito se discutiu a respeito de que poderia ter sido
melhor adquirir aeronaves usadas (como os UH-1H que o
exército norte-americano disponibilizou para alienação na-
quela época), por razões financeiras. A aquisição de aero-
naves novas permitiu um aprendizado inestimável na área
de gerenciamento da frota, indispensável a uma aviação
organizada, inclusive demonstrando ser economicamente
vantajosa a médio e longo prazo.
A decisão de primeiro criar uma unidade operacional (o 1º
BAvEx) e somente depois uma unidade de ensino (o Centro de
Instrução de Aviação) permitiu que a Aviação não se detivesse
em questões acadêmicas e priorizasse acentuadamente os
A Seção de Aviação do Exército 193

aspectos operacionais, diferentemente de outras atividades


criadas na mesma época da Aviação, nas quais a escola
era o primeiro elemento a ser ativado, o que, na prática,
dificultou enormemente a efetiva utilização operacional
daquela atividade. Essa decisão garantiu ao Exército dispor
rapidamente de uma unidade operacional, embora não se
descuidando do essencial ensino.
O investimento prioritário no desenvolvimento técnico do
pessoal mais jovem, que teria mais tempo de permanência
na Aviação, foi aspecto notável. Assim, os oficiais e sargen-
tos mais jovens, como regra geral, sempre tiveram priori-
dade para sua especialização, o que é incomum em novas
atividades, permitindo desenvolvimento incomum e rápido
da nossa Aviação [...]
É importante registrar, também, as facilidades proporcionadas
pelo volumoso e detalhado contrato de aquisição das primeiras
aeronaves. Como subdiretor e diretor de Material de Aviação,
assinei variados contratos de aquisição de material e servi-
ços, inclusive de aquisição de aeronaves Black Hawk e Cou-
gar. Sempre tomei como exemplo aquele primeiro contrato,
que deve servir de modelo para todo o Exército. Cumpre sa-
lientar sua cláusula de compensação, modelo para todos os
outros contratos de compensação mais tarde assinados por
nós. É incalculável o valor de suas vantagens para o Exérci-
to e para o País, tanto na área financeira como tecnológica,
comercial e econômica.
Afinal, o trabalho foi só perfeição? Negativo! O planejamen-
to da estrutura, a aquisição de material, o treinamento dos
aeronavegantes, foi tudo sem falhas? Claro que não! Houve
erros. Contudo, é preciso que entendamos que, naqueles
momentos iniciais, adicionavam-se às naturais limitações
individuais o pouco conhecimento, a falta de experiência e
os restritos meios disponíveis, o que justifica sobejamente
as falhas e erros existentes. Estes devem ser registrados e
criticados no local e momento adequados.
É óbvio que muita coisa poderia ter sido melhor. Com
o conhecimento hoje acumulado e com a enorme
experiência hoje adquirida, podemos facilmente identificar,
particularmente aqueles especialistas em Aviação, áreas de
194 Aviação no Exército - uma visão histórica

melhoria e pontos críticos a serem evitados. Nada disso


diminui o magnífico e exemplar trabalho realizado pelos
que planejaram e iniciaram a implantação da Arma Aérea
do Exército.
Finalmente, minha inabalável crença nos destinos da Avia-
ção da Força Terrestre, convicto de que o poder de um Exér-
cito moderno mede-se não mais por seus blindados, mas
por seus helicópteros armados.

Ao final do depoimento do general Jeannot, constatamos o registro


de erros ou falhas cometidas ao longo do processo inicial de implantação. Já
me referi anteriormente que jamais tivemos a veleidade, falo por todos aqueles
companheiros das comissões para Estudar a Implantação e a de Implantação
e da Seção de Aviação, de afirmar que o processo se tivesse desenvolvido sem
falhas. O próprio general Jeannot só hoje reconhece a ocorrência de incorreções,
amparado em sua enorme experiência, mas não teve a oportunidade de vis-
lumbrá-las quando em 1988, com a mesma nossa inexperiência, passou a inte-
grar a Seção de Aviação.
Considerando que até hoje a correção de rumo adotada em relação
à Aviação do Exército foi de pequena monta, acredito que os nossos acertos
foram em quantidade significativamente maior que os nossos erros.
Certamente, muito outros fatos e eventos ocorreram durante a minha
permanência na Seção de Aviação; no entanto, o tempo implacável apagou-os
de minha memória e as de meus companheiros, Telles e Wanderley, que tam-
bém não conseguiram reproduzi-los.
Capítulo 12

As bases da doutrina de emprego

P or ocasião da decisão de criar uma comissão para estudar


a implantação da Aviação do Exército, manifestou-se a
preocupação da inexistência de uma doutrina de emprego. É importante
considerar que as doutrinas existiam, pois diversos exércitos no mun-
do já possuíam as suas aviações orgânicas e as estruturavam de acordo
com suas necessidades e hipóteses de emprego. Essas doutrinas já eram
objeto de estudo e do conhecimento pela 3ª Subchefia do EME. A atenta
análise das concepções de emprego dos diversos exércitos do mundo, as
técnicas de utilização dos novos materiais, a influência dos novos equi-
pamentos na evolução doutrinária, a leitura de manuais estrangeiros,
a revisão dos manuais em uso no Exército Brasileiro eram atividades
rotineiras incluídas na missão da 3ª Subchefia, em particular, da Seção
de Doutrina, à qual pertencíamos.
A Guerra das Malvinas, que colocou em campos opostos a In-
glaterra e a Argentina, evidenciou o emprego de materiais em estudo
no EME, mas ainda não incorporados ao Exército Brasileiro. O conflito
serviu para estimular o anseio de agregar novos meios indispensáveis à
nossa operacionalidade. Um conflito tão próximo de nossas fronteiras,
envolvendo potência extracontinental, certamente funcionou como in-
centivo para o processo de modernização que em seguida viria.
A utilização de radares para localização e identificação de alvos
terrestres, o emprego de dispositivos de mira a laser, o emprego de centrais
196 Aviação no Exército - uma visão histórica

computadorizadas para o registro e elaboração dos dados de tiro de


artilharia ou lançamento de mísseis superfície-superfície e superfície-
ar, o uso intensivo da guerra eletrônica e, em particular, o emprego de
helicópteros foram tecnologias de larga utilização, que indicavam a
importância de incorporação desses equipamentos. Acrescente-se que
na época o helicóptero já se caracterizava como o meio que prometia
eliminar o problema de unidades dispersas e desorganizadas no
terreno, como ocorreu com o emprego de paraquedistas, em particular,
na Segunda Guerra Mundial.
Já havia a consciência de que ao criar a Aviação era de funda-
mental importância definir para que tipo de missão o Exército desejava
incorporar meios aéreos orgânicos. Estabelecer uma concepção básica
de emprego, adaptada às nossas necessidades operacionais e ao teatro
de operações em que tal emprego ocorreria, se constituía em tarefa pri-
mordial. Definir um objetivo era o que se impunha. Em qualquer área
da atividade humana, é essencial o estabelecimento de objetivo claro,
nítido e alcançável. A definição do norte, sem o qual se vaga em todas as
direções, é de fundamental importância para o estabelecimento das me-
tas que irão possibilitar que se chegue ao resultado desejado. A Bíblia
diz em Lucas 14:28-31:

Pois qual de vós, querendo edificar uma torre, não se senta


primeiro a calcular as despesas, para ver se tem com que
a acabar? Para não acontecer que, depois de haver posto
os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem
comecem a zombar dele, dizendo: Este homem começou a
edificar e não pode acabar. Ou qual é o rei que, indo entrar
em guerra contra outro rei, não se senta primeiro a consul-
tar se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra
ele com vinte mil?

Jamais nos afastamos do nosso objetivo.


Vale lembrar que, sob o ponto de vista dos doutrinadores, não se
vislumbra uma prevalência do material sobre a doutrina e vice-versa. Eles
se condicionam, se integram, interagem e definem as suas respectivas evo-
luções. Ao longo dos tempos, o surgimento de novos materiais tem sido o
emulador da evolução da doutrina de emprego do que o caso contrário.
As bases da doutrina de emprego 197

A elaboração da doutrina de emprego começou a ser esboçada


desde o momento em que, após aprovada a criação de unidades aéreas pelo
Plano de Estruturação da Força Terrestre, a FT 90, foi solicitado à 3 ª subche-
fia pela 4ª Subchefia que se elaborasse uma proposta de Quadro de Organi-
zação, visando à avaliação das novas necessidades em pessoal. Naquele
momento, embasado nos estudos que se procederam, já havia a convicção
de que a Aviação surgia como um multiplicador do poder de combate da
Força Terrestre. Ela possibilitaria conceder aos meios terrestres uma fle-
xibilidade e mobilidade que não lhes permitiam os meios materiais orgâ-
nicos de que dispunha. A força helitransportada pode manobrar e atacar
o inimigo em múltiplas direções, fugindo à interferência do terreno, retar-
dando-o ou imobilizando-o, enquanto permanece com maior liberdade
para manobrar, capacidades essas que não tínhamos.
O Exército ainda vivia sob a égide dos batalhões motorizados
da Segunda Guerra Mundial. A adoção da Aviação permitiria à Infantaria
uma capacidade de desengajamento e uma mobilidade que não possuía
até então. À Artilharia possibilitaria mudanças de posições com muito
mais rapidez. As operações de infiltração, exfiltração, envolvimento, en-
tre outras, ganhariam um novo ritmo. Nas situações altamente dinâmi-
cas do combate moderno para atingir a eficiência e eficácia necessárias,
se fazia fundamental ter o poder de combate na área de operações com
a máxima rapidez.
A doutrina para o emprego de helicópteros em vigor na Otan
não foi o padrão orientador de nossa concepção de emprego por ampa-
rar-se em hipótese completamente distinta daquela por nós visualizada.
Em caso de conflagração no Teatro de Operações europeu, previa-se o
enfrentamento inicialmente de uma grande vaga de blindados das for-
ças do Pacto de Varsóvia, em número muito superior ao que possuía a
Otan em solo europeu. Estimava-se que as forças americanas que esta-
beleceriam o primeiro contato em caso de ataque combateriam à pro-
porção de seis batalhões do Pacto contra um das forças da Otan, em uma
situação na qual todas as unidades soviéticas eram mecanizadas. Logo,
a ênfase se dirigia ao emprego de helicópteros especializados na luta
antiblindado, como o Gazelle francês. Mesmo os helicópteros de maior
capacidade destinavam-se a transportar equipes terrestres com arma-
mento anticarro para confrontar a ameaça prevista. Esse não era o nos-
so caso. Logo, não podíamos nos valer do apoio da doutrina de emprego
198 Aviação no Exército - uma visão histórica

europeia. Isso também ocorria em relação aos nossos vizinhos sul-ame-


ricanos, onde a incorporação de meios aéreos de asas rotativas ocorreu
para fazer face a necessidades específicas, sem um nítido embasamento
doutrinário adequado ao nosso emprego.
A concepção cujo emprego mais se aproximava daquela que
antevíamos era a adotada pelos Estados Unidos ao longo da Guerra do
Vietnã, na qual a utilização dos helicópteros servia para conceder à For-
ça Terrestre a mobilidade que lhe era dificultada em razão das caracte-
rísticas do Teatro de Operações em que as forças americanas atuavam.
Nada a obstar. Até aquela época, a doutrina de emprego operacional do
Exército Brasileiro sofria significativa influência daquela adotada pelo
exército dos Estados Unidos da América. Podemos mesmo afirmar que a
nossa doutrina era o espelho da americana adotada até a Segunda Guer-
ra Mundial.
Já era consenso que a força helitransportada tinha a capacidade
de manobrar e de atacar o inimigo em múltiplas direções, retardando-o
ou imobilizando-o, libertando-se das imposições decorrentes das condi-
ções do terreno. Permitia ainda que a tropa atuasse de forma profunda
em território inimigo sem o perigo da dispersão ocorrida nas operações
de transporte por aviões.
Nos nossos estudos doutrinários, estiveram sempre presentes
as imposições representadas pelas características do TO brasileiro, as
dimensões continentais do País, a missão constitucional do nosso Exér-
cito, seu efetivo e as prováveis ameaças, fatores que reclamavam um ve-
tor de alta mobilidade.
A missão principal que se estabeleceu para a Aviação, como ve-
tor multiplicador do poder de combate, foi proporcionar deslocamento
rápido e em profundidade à Força Terrestre. Em decorrência dessa pre-
missa básica, o primeiro QO proposto considerava um núcleo de aero-
naves de transporte de tropa, denominadas de manobra, protegidas por
outras menores, versáteis, que, antecipando a vaga de helicópteros de
manobra, dariam segurança ao deslocamento, neutralizando pelo fogo,
quando necessário, as zonas de desembarque. Esses helicópteros foram
denominados de reconhecimento e ataque. As aeronaves de manobra,
de transporte de tropa, eram o cerne do Batalhão de Aviação. A missão
clássica de apoio aéreo aproximado, com o emprego de aeronaves de
asas fixas, permaneceria com a Força Aérea.
As bases da doutrina de emprego 199

A chave das operações helitransportadas é a estreita integração


entre a força de helicópteros e a tropa que realizará as operações. Des-
se modo, era importante que se estruturassem unidades especializadas
nesse tipo de operação, dotadas de material compatível com a doutrina
peculiar de emprego. Essas unidades seriam os posteriormente criados
batalhões de Infantaria Leve.
A bem da verdade, os estudos doutrinários já se haviam inicia-
dos bem antes, na Subseção de Evolução da Doutrina, da 3ª Subchefia,
tendo dado origem à apresentação de proposta, posteriormente aprova-
da pelo 3º subchefe, general Haltenburg, de criação de uma Aviação do
Exército, posteriormente remetida à 1ª Subchefia.
Depois da decisão do ministro do Exército, general Leonidas, de
criar a Aviação do Exército, os estudos, que já se procediam, se intensifi-
caram, pois, antes de tudo, era de fundamental importância para defini-
ção das etapas posteriores o estabelecimento do arcabouço doutrinário.
Na atualidade, conforme indica o seu caráter dinâmico, a dou-
trina experimenta um constante processo de análise que dita a sua evo-
lução e sua adaptação às novas concepções de emprego subordinadas às
hipóteses de atuação da nossa Aviação. A doutrina de emprego, o com-
ponente humano e o material constituem o tripé sobre o qual se ampara
qualquer Força Armada. A eficiência dessas três componentes, que, con-
forme vimos, se integram, interagem e se complementam, indica o grau
de operacionalidade de cada Força.
Ao verificarmos as características de cada aeronave, de mano-
bra e reconhecimento e ataque, constataremos que elas possuem ve-
locidades distintas. O Panther possui velocidade máxima de 324km/h
enquanto o Esquilo, de 287km/h. Considerando a necessidade de que
os helicópteros de ataque precedam a vaga de helicópteros de manobra
e que as aeronaves de manobra devem aproveitar o máximo sua veloci-
dade de deslocamento para atingir sua zona de desembarque no mais
curto espaço de tempo, há a necessidade de estabelecer procedimen-
tos operacionais com vistas à obtenção do maior nível de eficiência e
de segurança nas operações. É o material ditando a doutrina. Da análise
desses fatores, entre outros, nascem as concepções doutrinárias. Nes-
se contexto, trabalham os doutrinadores à procura de concepções de
emprego as mais eficientes possíveis. Nesse intuito, o Estado-Maior do
Exército, por intermédio da 3ª Subchefia, expediu diretrizes à Escola de
200 Aviação no Exército - uma visão histórica

Aperfeiçoamento de Oficiais e à de Estado-Maior do Exército de modo a


explorarem em seus temas o emprego da Aviação do Exército em acor-
do com as bases definidas no plano de implantação. Tal medida, a par
das atividades como o intercâmbio doutrinário e estágios com exércitos
com Aviação orgânica, possibilitaria, como vem ocorrendo, a consolida-
ção de uma doutrina própria adaptada à nossa realidade.
No tocante à definição de uma estrutura organizacional, a cria-
ção de uma Brigada de Aviação, como aconteceu posteriormente, para en-
quadrar as unidades de helicópteros não foi prevista no Plano de Implan-
tação por dois motivos. O primeiro deles considerava que os batalhões de
Aviação ficariam subordinados aos Comandos Militares de Área que, por
sua vez, possuiriam uma Seção de Aviação composta por militares espe-
cializados, inclusive pilotos, com reconhecida experiência na atividade e
capacidade de prestar a necessária assessoria ao comando enquadrante
para orientar o planejamento das missões do Batalhão, integrado à ma-
nobra terrestre. A dosagem inicial e mínima, estabelecida no Plano de Im-
plantação, era de um Batalhão por Comando Militar de Área. Consideran-
do as missões acometidas ao batalhão, essa era a organização, pensava-se
à época, a mais apropriada. O outro motivo era que se julgava muito difícil
que uma Grande Unidade de Aviação pudesse coordenar o emprego de
batalhões espalhados na imensidão do solo brasileiro ou em um Teatro de
Operações. Sendo a missão primordial para aumentar o poder de comba-
te da Força Terrestre, seria mais lógico que as unidades aéreas estivessem
subordinadas aos Grandes Comandos enquadrantes. Felizmente, a exis-
tência da Brigada de Aviação do Exército foi efêmera.
A adoção da denominação de “manobra” para as aeronaves
destinadas ao transporte da tropa considerou o fato de que sendo elas a
ossatura do batalhão o seu emprego estaria sempre intimamente subor-
dinado à manobra terrestre. A denominação “utilitária”, que era adota-
da pelo exército americano, não nos pareceu adequada, pois queríamos
enfatizar que o emprego dessas aeronaves restringia-se à execução de
missões de combate.
Ao longo da leitura da História oral da Aviação do Exército,
trabalho elaborado pelo tenente-coronel Contreiras, ao qual faremos
outras referências, deparei-me com algumas declarações que preci-
sam ser devidamente esclarecidas, ou melhor, refutadas. Uma delas
diz respeito à criação da Brigada de Aviação. Concordamos que possa
As bases da doutrina de emprego 201

haver um Comando de Aviação para coordenar as peculiaridades es-


pecíficas da Aviação do Exército. Quanto à brigada, como já exposto,
não vislumbramos dentro do arcabouço doutrinário previsto uma si-
tuação de emprego típico. Outra declaração provavelmente partida de
“estrategistas de antolhos” era sobre a necessidade que o Exército ti-
vesse a sua Aviação dotada de aeronaves de ataque. Para quê? Atacar
qual ameaça? As nossas aeronaves se constituem em plataforma que
lhes permite executar esse tipo de missão, não as inabilitando para o
desempenho de outras. Quando me refiro aos “estrategistas de anto-
lhos”, falo daqueles que se debruçam sobre manuais estrangeiros, em
particular americanos, e se sugestionam pelo seu poderio, deixando de
considerar que nossas condições econômicas e as nossas ameaças são
completamente distintas. Alegam que compramos aeronaves civis, o
que demonstra desconhecimento completo da evolução e emprego das
aeronaves de asas rotativas, e outros materiais, em operações milita-
res. O primeiro helicóptero americano desenvolvido sobre requisitos
estritamente militares só ocorreu muitos anos após a utilização dessas
aeronaves como arma de combate.
Em face das peculiaridades inerentes ao emprego de helicóp-
teros pela Força Terrestre, os nossos estudos, de caráter doutrinário,
se desenvolveram fundamentalmente em torno da pesquisa a manuais
de exércitos estrangeiros, possuidores de aviação orgânica, o que nos
permitiu o entendimento da filosofia que presidia o estabelecimento de
cada doutrina específica e, a partir daí, definir aquela que mais se apli-
cava à nossa realidade.
Sobre a existência de perigos iminentes ou latentes, li recente-
mente o lúcido depoimento do general Heleno à Revista do Clube Mili-
tar. Quando perguntado sobre ameaças à nossa soberania na Amazônia,
declarou não haver perigos iminentes. Tal fato, no entanto, não exclui a
necessidade de estarmos preparados para enfrentá-los quando chegar
a ocasião. As Forças Armadas de todo o mundo, mesmo dos países mais
ricos e desenvolvidos, se debatem diariamente com a necessidade de
estabelecer uma relação custo/benefício nos seus gastos operacionais.
Essa condicionante também esteve presente em nossas propostas.
É preciso que os planejadores militares andem de braços dados
com a realidade nacional e, como dizia o general Haltenburg, “olhem
para as estrelas sem despregar os pés do chão”.
202 Aviação no Exército - uma visão histórica

É um disparate afirmar que a nossa Aviação foi criada


privilegiando o transporte. Não há na base doutrinária qualquer
referência à missão de transporte puro e simples, e sim de concessão de
aeromobilidade à Força Terrestre, na qual se encontra explícito o des-
locamento tático por helicóptero. Há uma variedade de outras missões
que podem ser desempenhadas pelos batalhões quando suas aeronaves
não estiverem totalmente engajadas em operação helitransportada.
Poderíamos escrever um novo livro a respeito. Não é o meu de-
siderato. Deixamos essa missão para os atuais “asas”.
Da conversa com diversos companheiros da Aviação do Exérci-
to, extraímos a nossa certeza e tranquilidade em relação ao realismo e
a serenidade com que está sendo conduzido o futuro da nossa Aviação.
Eles continuarão a olhar para o céu, mas não cometerão a imprudência
de perder sua âncora no solo terrestre.
A principal característica a ser concedida pela Aviação do Exér-
cito consiste em proporcionar a aeromobilidade derivada do meio físico
onde atua e das possibilidades do equipamento que emprega. Enten-
de-se por aeromobilidade como a capacidade que proporciona à Força
Terrestre para aplicar rapidamente o seu poder ofensivo, simultanea-
mente ou sucessivamente, contra objetivos ainda que se situem muito
distantes entre si.
Capítulo 13

Elaboração dos Quadros


de Organização

O Quadro de Organização, como a própria denominação


indica, define a estrutura organizacional de uma unida-
de militar operacional. Especifica as subunidades e frações que a inte-
gram, suas respectivas composições em pessoal e estabelece os cargos/
funções desempenhados por cada militar. Define ainda as capacidades
operacionais (possibilidades, limitações) e o seu comando enquadrante.
Para aqueles desconhecedores da terminologia militar, é
necessário esclarecer que a denominação “unidade” diz respeito ao
nível batalhão, regimento ou similar; “subunidade”, ao escalão com-
panhia, esquadrão ou bateria, e o termo fração é empregado para o
nível pelotão.
Derivado da concepção geral de emprego estabelecida pelo
EME, o Quadro de Organização para o Batalhão de Aviação do Exér-
cito foi aprovado em 21 de outubro de 1986 como uma organização
militar orgânica de Comando Militar de Área. A unidade tinha como
missão o apoio ao Grande Comando na execução das ações de assal-
to aeromóvel, comando e controle, ações anticarro, ataque ao solo,
reconhecimento e segurança, observação e limitado apoio logístico. A
despeito da gama de missões atribuídas ao batalhão, ressaltava-se como
a principal o assalto aeromóvel. No entanto, a versatilidade de seu meio
204 Aviação no Exército - uma visão histórica

orgânico, o helicóptero, permitia ao batalhão e ao comando enquadrante


outras situações de emprego. Ao Batalhão de Aviação se atribuía a capaci-
dade de, em uma só vaga, transportar o escalão de ataque de um Batalhão
de Infantaria, ou seja, duas companhias de Infantaria. Para tal, foi estru-
turado com duas companhias de helicópteros de Manobra e uma Compa-
nhia de Helicópteros de Reconhecimento e Ataque.
As discussões em torno da denominação das subunidades e
da própria OM ocuparam parte do tempo dedicado à montagem da
estrutura organizacional. Quanto à fração elementar, ou seja, o pelo-
tão, não havia dúvida, pois essa nomenclatura era a adotada nas OM
de Infantaria e Cavalaria. No que concerne aos escalões unidade e
subunidades, sugeriu-se inicialmente que a unidade se denominas-
se batalhão, adotada na Infantaria, e as subunidades subordinadas
de esquadrão, empregada na Cavalaria, ou que se adotasse o termo
regimento (Cavalaria) para a unidade, e as subunidades seriam de-
nominadas de companhia (Infantaria). Aventou-se inclusive a adoção
da denominação de grupo (Artilharia), em substituição a batalhão,
naturalmente ideia partida dos nobres companheiros da Arma dos
fogos profundos, a nossa Artilharia. Por bizantina que possa parecer,
a discussão era pertinente, pois todos queriam puxar um “pouco da
brasa para a sua sardinha”.
Prevaleceram as denominações hoje existentes, batalhão e
companhia. Ganharam os infantes.
A despeito de ser oficial de Cavalaria, essa foi uma das discus-
sões à qual não me dediquei com o empenho de sempre. O importante
era esquecer o corporativismo e evitar o aparecimento de quaisquer
obstáculos que pudessem se transformar em empecilho para o prosse-
guimento das atividades da implantação da nossa Aviação.
O estabelecimento da estrutura organizacional do 1º BAvEx foi
trabalho fruto da perfeita integração entre os integrantes da seção. No
entanto, é importante destacar que a estrutura da Companhia de Ma-
nutenção nasceu do trabalho competente e diligente do major Wan-
derley, assessorado pelos oficiais que realizavam os cursos de gerente,
aos quais cabe parte da paternidade no nascimento daquela estrutura.

Considerando os comentários que mais tarde se produziram en-


volvendo a capacidade do helicóptero escolhido para transportar o Grupo
Elaboração dos Quadros de Organização 205

de Combate, é importante realçar que na ocasião já se estudava na 3ª


Subchefia a proposta de limitar o grupo de combate em oito combaten-
tes, o que facilitaria as ações de coordenação de seu comandante. Além
disso, a substituição do calibre 7,62mm pelo 5,56mm era uma tendência
generalizada.
Capítulo 14

O processo de avaliação dos


materiais de emprego militar

A inclusão desse tema me pareceu importante para permi-


tir o entendimento do processo particular como foram
avaliados os helicópteros adquiridos. Além disso, aquele tradicional,
regulamentarmente adotado, é pouco conhecido mesmo no âmbito do
Exército.
A concepção, o processo de produção e a aquisição dos ma-
teriais de emprego militar para o Exército se fazem de acordo com o
Modelo Administrativo dos Materiais de Emprego Militar, as Instruções
Gerais (IG) 20-12.
As Instruções Gerais em questão têm como finalidade ordenar
e descrever as principais atividades e eventos que ocorrem durante o ci-
clo de vida de um material de emprego militar e fixar os órgãos respon-
sáveis pela sua execução em cada fase. Elas estabelecem uma sucessão
de etapas até a aprovação do material. Englobam, entre outras, as infor-
mações sobre as necessidades correntes; o sumário de informações e
previsão tecnológica; a previsão de necessidades operacionais futuras;
o levantamento das necessidades correntes; a consolidação das neces-
sidades correntes; o levantamento doutrinário das necessidades ope-
racionais; a elaboração de condicionantes doutrinárias e operacionais,
dos Objetivos Básicos Operacionais (OBO) e dos Requisitos Técnicos
208 Aviação no Exército - uma visão histórica

Básicos (RTB); o estudo de viabilidade técnica e econômica; as reuniões


decisórias e as avaliações técnicas e operacionais.
Sem que isso alterasse a sua essência, os OBO foram transfor-
mados em Requisitos Operacionais Básicos (ROB). Quando acharem
uma ou outra sigla estarei falando da mesma coisa.
O ciclo, como não poderia deixar de ser, é complexo e demanda
prazo considerável para a concretização de todas as ações. Mesmo os
materiais já em produção são submetidos a ele. Todos os equipamentos,
até aqueles que quando apresentados à avaliação já estão em produção,
precisam ser reagidos com os ROB e com os RTB, devem ser avaliados
técnica e operacionalmente e serem objeto de aprovação ou não nas
reuniões decisórias.
A realização dos eventos previstos nas IG 20-12 é de responsa-
bilidade de órgãos distintos, entre eles o Estado-Maior do Exército, por
meio de suas subchefias, e da Secretaria de Ciência e Tecnologia, por
intermédio dos órgãos técnicos que lhe eram subordinados.
Na ocasião da aquisição dos primeiros helicópteros para a
Aviação do Exército, por motivos óbvios, o Exército ainda não possuía
um organismo especializado e pessoal habilitados para a realização de
avaliação técnica e operacional de material aeronáutico. Acrescia-se à
condição anterior a premência de tempo decorrente da necessidade de
aplicar os recursos recebidos da União em tempo curto. A tudo isso se
somava a dificuldade de trazer ao País em tempo hábil as aeronaves das
empresas que manifestassem o interesse de participar da concorrência
para fornecê-las ao Exército.
Dos helicópteros que participaram da licitação da Aviação do
Exército, somente o Dauphin, versão civil do Panther, esteve em testes
no País, na Base Aérea e Naval de São Pedro da Aldeia.
O Departamento de Material Bélico, órgão que seria responsá-
vel pela compra das aeronaves, alegou na ocasião que, por não se incluir
em sua esfera de competência, não se envolveria no processo de ava-
liação técnica e operacional que, por força da legislação, como vimos
anteriormente, era responsabilidade do EME e da Secretaria de Ciência
e Tecnologia.
Em razão de todos os fatores já apontados, a avaliação das
aeronaves foi feita, durante o julgamento das propostas, pela Diretoria
de Material de Aviação do Exército, em caráter excepcional e singular,
O processo de avaliação dos materiais de emprego militar 209

comparando-se às informações prestadas pelas empresas concorrentes


com cada Requisito Operacional Básico. Podemos classificá-la como
uma avaliação de caráter teórico. Era o que podia ser feito.
Para tornar o processo de avaliação o mais próximo da realida-
de, de acordo com as condições peculiares representadas pela impos-
sibilidade de submeter as aeronaves à avaliação regulamentar, os ROB
foram “explodidos” em sub-requisitos que envolviam parâmetros técni-
cos quantitativos, avaliáveis, para o cumprimento de cada objetivo ope-
racional definido. O processo gerou cerca de 500 itens de análise, que
permitiram, conforme as condições do momento, o melhor julgamento
possível.
Alguns podem aludir ao fato de que alguma empresa possa ter
apresentado dado de desempenho ou característica que não coincidia
com a realidade. Tal situação não foi identificada. Muito ao contrário.
Também não seria concebível que empresa do porte das que participa-
ram da licitação pudesse se utilizar desse tipo de artifício.
A Aerospatiale apresentou em sua proposta um envelope (faixa
de operação) de utilização dos rádios HF muito superior às necessidades
operacionais do Exército. Posteriormente, no ensaio dos equipamentos,
em Marignane, na França, por ocasião do recebimento das aeronaves,
constatou-se que o equipamento montado no helicóptero não atingia
toda a amplitude da faixa de frequência informada pela empresa, apesar
de atender plenamente às nossas especificações. Em decorrência disso,
a título de “multa”, gerou-se um crédito em favor do Exército, de valor
considerável, que foi utilizado para equipar nossas aeronaves com ins-
trumentos do painel de bordo não previstos no contrato. Detalharemos
o fato posteriormente.
A abordagem do Ciclo Administrativo de Vida dos Materiais
de Emprego Militar, ainda que de forma sucinta, além de facilitar o
entendimento do processo singular de avaliação das aeronaves que
adquirimos, permite aos nossos leitores o conhecimento, de modo
superficial, de como os materiais se tornam passíveis de incorpora-
ção ao Exército.
A submissão dos materiais ao ciclo é de interesse dos
fabricantes de material bélico, pois outros países se sentirão seguros
para adquirir seus equipamentos quando reagidos e aprovados pelo
exército do país de origem.
210 Aviação no Exército - uma visão histórica

Só tomei conhecimento da existência das IG 20-12 quando che-


guei ao Estado-Maior do Exército. Provavelmente seu desconhecimen-
to seja grande ainda hoje, mesmo no meio militar, em particular entre
aqueles que não tiveram a oportunidade de servir nos órgãos abarcados
pelo sistema. Parece-me que o aprendizado do ciclo, ainda que de forma
simplificada, seria importante na formação profissional do militar. Essas
noções deveriam ser transmitidas nas escolas de formação, de oficiais e
sargentos, permitindo-lhes ambientar-se e entender o processo a que
são submetidos os nossos equipamentos.
De posse das informações deste e do próximo capítulo, o nos-
so leitor terá uma compreensão mais abrangente do processo geral de
incorporação de novos sistemas de armas ao Exército e, certamente,
entenderá as razões que nos levaram a submeter os helicópteros a um
processo distinto.
Capítulo 15

Os Requisitos Operacionais
Básicos dos helicópteros de
manobra e de reconhecimento e
ataque

C omo vimos no capítulo anterior, o modelo do ciclo de


vida dos materiais de emprego militar, justificadamen-
te, é complexo e demanda considerável tempo entre o “nascimento” do
material e sua efetiva incorporação ao inventário do Exército. Os ROB
que estabelecem as características do equipamento são uma parte con-
siderada fundamental para o desenvolvimento do processo. Sua elabo-
ração é demorada e precedida de um longo período de estudos, pesqui-
sas e consultas. Antes de ser absorvido pela Aviação do Exército, tive a
incumbência de apresentar a proposta dos ROB do carro de combate
principal e para os óculos de visão noturna de primeira geração. O carro
de combate principal é a coluna vertebral das unidades blindadas. É o
mais importante vetor terrestre de concessão de potência de fogo, ação
de choque e mobilidade às forças apoiadas. Ao longo de minha pesquisa
para elaboração das propostas, realizei consultas a diversas publicações
que renderam a ordem de 20 volumes, os quais se encontram na biblio-
teca da 3ª Subchefia do EME, compostos pelos diversos documentos e
artigos que consultei. Além disso, a colaboração de diversos militares foi
212 Aviação no Exército - uma visão histórica

necessária para que as propostas fossem concluídas e aprovadas. Faço


esse introito para deixar bem destacada a importância dos ROB e a di-
ficuldade para produzi-los. Posteriormente, já envolto nos trabalhos da
Aviação do Exército, participei da elaboração dos ROB dos helicópteros
de Manobra e de Reconhecimento e Ataque.
Os denominados, na época, Objetivos Básicos Operacionais
(OBO) e, posteriormente, rebatizados como Requisitos Operacionais
Básicos (ROB) são uma espécie de “receita de bolo”, considerando-se
como “bolo” o material de emprego militar a que se refere. Os ROB,
ou simplesmente requisito (s), se originam da doutrina de emprego
das organizações operacionais dotadas do material. Eles são orienta-
dores dos projetos dos fabricantes de material militar. Logo, quando
desenvolvidos ou produzidos, os referidos materiais devem atender
às características operacionais e técnicas constantes dos ROB. Servem,
igualmente, para avaliação de materiais nacionais ou estrangeiros já
em produção, nos quais se incluíam os helicópteros adquiridos para a
Aviação do Exército. Os materiais que atendem aos ROB são passíveis
de adoção pelo Exército Brasileiro.
Os requisitos se agrupam em três categorias. A primeira, a dos
requisitos “absolutos”, aos quais o material deve satisfazer imperativa-
mente. O não atendimento a qualquer requisito absoluto torna o mate-
rial inservível para o Exército. A segunda, a dos requisitos “essenciais”,
apresenta uma “margem de manobra”, e o não atendimento a um deles
não reprova o material. A terceira é constituída pelos requisitos “desejá-
veis”, que são orientadores de pesquisa. Sua presença nos ROB não im-
plica que o material deva necessariamente atendê-lo.
A explicação anterior se justifica por dois motivos principais.
O primeiro, como já frisamos, se refere ao desconhecimento por grande
parte do público interno e certamente pela maioria do público externo
do Ciclo de Vida dos Materiais de Emprego Militar. Há grande desconhe-
cimento sobre como nascem e como são avaliadas as nossas necessida-
des em material. O segundo, que eu considero de grande importância,
é o entendimento de que o material para ser adquirido deva atender às
exigências dos ROB, que, como já vimos, definem as características para o
cumprimento das missões estabelecidas pela doutrina de emprego. Essa se-
gunda consideração é importante para o entendimento do processo particu-
lar que foi adotado para avaliação dos helicópteros adquiridos pelo Exército.
Os Requisitos Operacionais Básicos dos helicópteros de manobra e de reconhecimento e ataque 213

O material militar, em princípio, não deve ser submetido a es-


forços superiores aos exigidos por sua missão operacional, expostas nos
ROB, pois podem não estar preparados para tal, e a utilização inade-
quada pode comprometer a segurança dos operadores, do material e da
missão. Nada impede, no entanto, que o material possa apresentar ca-
pacidades superiores àquelas definidas nos ROB. Esse comentário pode
ser tomado como extemporâneo. No entanto, é um recado oportuno a
ser passado aos utilizadores os quais esquecem que os equipamentos
não devem ter excedidas suas capacidades operacionais, sob pena de
provocar danos que podem incapacitá-lo ou trazerem risco àqueles que
dele se servem.
A cada requisito atribui-se um valor correspondente à impor-
tância que ele representa no desempenho do material. Nos requisitos
absolutos, os valores variavam de sete a dez; nos requisitos essenciais,
de quatro a seis, e nos desejáveis, de um a três.
Os ROB se transformam em parâmetros técnicos mensuráveis
por meio dos Requisitos Técnicos Básicos, os RTB. A transformação dos
ROB em RTB é de responsabilidade dos órgãos técnicos subordinados
à Secretaria de Ciência e Tecnologia. Os RTB permitem que se realize a
avaliação numérica das capacidades do equipamento.
No seu introito, os ROB apresentam as condicionantes doutri-
nárias e operacionais definidoras do emprego do material. As condicio-
nantes operacionais estabelecem o Teatro de Operações de provável
emprego e sua caracterização.
Ao longo dessa abordagem sobre os ROB dos helicópteros de
manobra e de reconhecimento e ataque, nos limitaremos a tecer comen-
tários sobre os requisitos absolutos, pela sua importância, e discorrere-
mos, para não sermos muito extensos, sobre alguns ROB essenciais.
No que concerne às aeronaves da Aviação do Exército, as condi-
cionantes doutrinárias expressavam em termos gerais as condições de
emprego do material. Pressupunham que a aeromobilidade era impres-
cindível para o sucesso das operações, e que, das missões atribuídas ao
Batalhão de Aviação do Exército, a do assalto aeromóvel avultava de im-
portância. Estamos utilizando o pretérito nesse tópico para ambientar
o assunto à época em que os ROB foram elaborados. Se mantivéssemos
o tempo presente, não estaríamos incorrendo em erro, à medida que os
ROB, salvo pequenas modificações, continuam válidos até hoje. Nesse
214 Aviação no Exército - uma visão histórica

tópico, fica clara a missão básica do BAvEx, que é a de “realizar o assalto


aeromóvel”. Estabeleciam a capacidade de transporte das aeronaves de
manobra em um Grupo de Combate completamente equipado.
A capacidade das aeronaves foi determinada em função de duas
condicionantes principais. A primeira referente à necessidade de manu-
tenção da integridade da fração (grupo de combate e pelotão), ou seja,
por ocasião do deslocamento, elas não deveriam se dividir. A segunda
considerava que a perda de uma aeronave não teria influência marcante
na capacidade de combate do pelotão e, por consequência, na da com-
panhia. Somente como notícia aos leitores não afeitos com a estrutura
militar, a nossa organização é ternária. O pelotão possui três grupos de
combate, e a companhia, três pelotões.
Hoje há uma tendência à aquisição de aeronaves de maior capa-
cidade de transporte. Talvez em um cenário de conflito de baixa inten-
sidade ela seja mais eficaz. Não nos aprofundaremos sobre o assunto. A
perda de aeronaves maiores, transportando maiores efetivos, contribui
para a sensível diminuição do poder de combate no objetivo e aumenta
significativamente os custos da operação em vidas humanas e material
de alto custo.
Em seu último tópico, as condicionantes doutrinárias dispu-
nham claramente que os helicópteros de reconhecimento e ataque em
uma operação de assalto aeromóvel tinham a missão de realizar a escol-
ta dos helicópteros de manobra e preparar a área de desembarque pela
execução de fogos de saturação, destruindo ou neutralizando a defesa
inimiga quando necessário.
O primeiro requisito absoluto para o helicóptero de manobra
detalhava a essência da missão do BAvEx e da aeronave que ia dotá-lo.
Definia as condições de operação da aeronave (temperatura, altitude,
tipo de voo) e estabelecia a necessidade de transportar a uma distância
de 100km um grupo de combate, totalmente equipado, retornando ao
ponto de origem com determinado nível de reserva de combustível. A
esse item foi atribuído o valor dez.
A definição da necessidade de boa manobrabilidade visava aten-
der, entre outras situações, à realização dos voos Nap of the Earth. Esse
tipo de deslocamento, adotado pela aviação do exército americano, era
feito com as aeronaves voando pouco acima da copa das árvores para se
furtarem da observação, inclusive radar, e fogos do inimigo. Considerando
Os Requisitos Operacionais Básicos dos helicópteros de manobra e de reconhecimento e ataque 215

que o voo nessas condições exige constante mudança de velocidade e al-


tura, o que implica grande desgaste físico da tropa transportada, esse pro-
cedimento normalmente só é indicado em situações de real necessidade.
A facilidade de embarque e desembarque foi outro requisito
absoluto. Sobre esse aspecto, um fato merece ser destacado. Tive a opor-
tunidade de presenciar a avaliação do Dauphin, versão civil do Panther,
na Base Aérea e Naval de São Pedro da Aldeia. Na ocasião, constatei que
a altura do piso da aeronave em relação ao solo era um pouco elevada e
certamente seria obstáculo para o embarque rápido de combatente de
menor estatura. A observação deu origem ao desenvolvimento de estri-
bo (“marche – pied”), que posteriormente passou a dotar todas as nos-
sas aeronaves de manobra.
A capacidade de a aeronave operar sem restrições nas diferen-
tes regiões do nosso TO foi imposição ditada pela diversidade geográfica
do País, com áreas de grande variação de altitude e temperatura.
Foram definidas ainda a capacidade de realizar operações de
resgate e evacuação aeromédica de desempenho intensivo em situações
de combate. A aeronave deveria possuir condições de voo International
Flight Rules (IFR) – voo por instrumentos – e duplicação dos instrumen-
tos do painel de voo. O voo IFR é aquele realizado em condições adver-
sas de visibilidade. A duplicação exigida dos painéis não fazia referência
aos instrumentos que equipariam as aeronaves. Isso seria definido pos-
teriormente pela comissão que elaborou o contrato de aquisição.
A adoção de dispositivo corta-fios era uma imposição de se-
gurança baseada em histórico de acidentes de colisão com fios de al-
ta-tensão. A necessidade de operar em áreas com grande densidade de
partículas, terrenos arenosos, entre outras adversidades, conduziu à ne-
cessidade de dotar a aeronave de filtro antiareia, se bem que somente
alguns equipamentos foram adquiridos.
O estabelecimento de múltiplas ligações definiu os
equipamentos rádio a serem incorporados ao helicóptero. Entre eles,
queremos destacar o High Frequency (HF) – alta-frequência –, que
apresenta uma particularidade para instalação nas aeronaves. Como
necessita de uma antena muito grande para que possa operar a grandes
distâncias, e a superfície da aeronave é restrita, utiliza-se um equipamento
que simula o aumento da superfície da antena. Voltaremos a tratar desse
assunto posteriormente.
216 Aviação no Exército - uma visão histórica

Como a possibilidade de ser alvejado estará sempre presente


nas situações de combate, os assentos blindados para os pilotos foi uma
imposição. Alguém poderá indagar-se a razão pela qual a mesma proteção
não foi exigida para todos os transportados. A aeronave enfrenta sempre
o compromisso com o peso transportado. Quanto maior o peso, menor a
quantidade de combustível e menor o raio de ação. Em consequência, deve-
se privilegiar aqueles de quem depende o prosseguimento seguro do voo.
No entanto, definia a necessidade de assentos anticrash (anti-impacto)
para a tropa transportada. São aqueles com a capacidade de atenuar
os fortes choques do aparelho contra o solo em situação de pouso de
emergência ou queda.
Os ROB dos helicópteros de manobra apresentavam um total
de 22 requisitos absolutos. Fizemos os comentários que achamos possí-
vel realizar sem cometer alguma inconfidência e revelar características
que devem permanecer de conhecimento restrito.
Não abordaremos os demais requisitos essenciais nem os de-
sejáveis.
No que concerne aos helicópteros de reconhecimento e ataque,
além de estabelecer a missão básica de proteção à vaga de helicópte-
ros de assalto, as condicionantes doutrinárias e operacionais definiam
o emprego na destruição de blindados inimigos, nas ações de reconhe-
cimento, comando e ligações de comando. Consideravam a necessidade
de que a aeronave possuísse características de elevada agilidade, exce-
lente manobrabilidade, relativa tolerância balística e baixa assinatura
acústica, visual, térmica e de radar. A característica de plataforma de boa
estabilidade, para permitir o tiro em ótimas condições, aparecia de for-
ma intrínseca nos objetivos formulados.
A definição da autonomia considerava sua missão precípua de
apoio ao assalto aeromóvel, estabelecendo as condições de voo a se-
rem adotadas (máxima, cruzeiro, voo estacionário, baixa velocidade). A
alusão ao voo estacionário e em baixa velocidade considerava a neces-
sidade de que permanecessem em sobrevoo na zona de desembarque
enquanto a tropa abandonava as aeronaves de manobra. A possibilida-
de de servir de plataforma para uma gama variada de armamentos é
óbvia para helicópteros com esse tipo de missão. Os demais requisitos
absolutos guardavam semelhança com aqueles estabelecidos para os
helicópteros de manobra.
Os Requisitos Operacionais Básicos dos helicópteros de manobra e de reconhecimento e ataque 217

Quero destacar o primeiro objetivo absoluto que aludia à tri-


pulação de dois pilotos, com um deles exercendo a função de atirador.
Reconheço que não havia a necessidade de naquele documento estabe-
lecer essa precisão. No entanto, na época, éramos impressionados pelo
Cobra, helicóptero americano especializado nas missões de ataque, que
em face de sua sofisticação exigia essa definição de seus tripulantes. É
forçoso reconhecer, entretanto, que os americanos além de não terem
restrições orçamentárias quando se trata de aparato bélico visavam lu-
tar guerras de outras intensidades. Não sei como a Aviação do Exército
trata hoje o assunto e não pretendo aprofundar a discussão. Volto, mais
uma vez, à sábia frase do general Haltenburg: “Olhos nas estrelas, mas
sem tirar os pés do chão.”
Capítulo 16

Apoio da Marinha e da
Força Aérea

N este momento, e sempre, é imperativo que se teça


uma alusão sobre o inestimável e imprescindível
apoio que a Marinha do Brasil e a Força Aérea Brasileira prestaram
ao processo de implantação da nossa Aviação. Dotados de alto senso
profissional e pródigos nas demonstrações contínuas de um elevado
espírito de cooperação e de compreensão de nossos interesses e ne-
cessidades, os nobres companheiros da Marinha do Brasil e da Força
Aérea marcharam conosco, ombro a ombro, permitindo que nossos
objetivos pudessem ser efetivamente atingidos.
A participação da Marinha e da Aeronáutica foi de funda-
mental importância para o sucesso do processo de implantação
da Aviação do Exército. As Forças Armadas são extremamente co-
operativas. Sua missão constitucional assim o exige. No combate,
é imprescindível o máximo de integração e de apoio mútuo. Além
de superior cooperação, implica o máximo de sacrifício e patrio-
tismo, qualidades que são abundantes entre nós militares. Aliás, os
tempos atuais me provocam esse tipo de comentário: “Se os nos-
sos políticos cultivassem essas qualidades, não estaríamos tão mal
representados, e a corrupção não grassaria com tanta intensidade
no nosso país.”
220 Aviação no Exército - uma visão histórica

Na Força Aérea, inicialmente temerosa pela possibilidade de


que o termo Aviação do Exército pudesse englobar o anseio de incor-
porar, igualmente, aeronaves de asas fixas e pela necessidade de conter
algumas reações originadas em seu público interno, o assunto foi trata-
do de forma cautelosa. Logo que foi esclarecido que a nossa Aviação nas-
cia restrita à operação de aeronaves de asas rotativas, o apoio daquela
Força se realizou de modo incondicional e exemplar. O ocorrido quando
eu e o então major Wanderley fomos estabelecer um primeiro contato
na Força Aérea, conforme relatado em capítulo anterior, traduz bem o
clima inicial que logo se desanuviou, e obtivemos todo o apoio de que
necessitávamos.
Na Marinha, a possibilidade de conseguir um aliado no anseio
de operar as aeronaves da aviação embarcada, naquela ocasião, de res-
ponsabilidade exclusiva da Força Aérea, resultou um apoio entusiasmado
desde o início. Enquanto nas primeiras visitas a Comissão para Estudar
a Implantação da Aviação do Exército foi recebida com grande sigilo nas
Bases Aéreas de Santa Maria e Santos, em São Pedro da Aldeia, na Força
Aeronaval, era visível a satisfação na recepção à nossa comissão.
O que é importante reiterar e ressaltar é o alto grau de profis-
sionalismo evidenciado por nossos interlocutores na Marinha e na Força
Aérea. Tivemos por parte dos nossos companheiros das forças coirmãs
constantes demonstrações de grande competência, abnegação, cultura
profissional e de um superior espírito de colaboração. A eles a Aviação do
Exército deve uma grande parte do crédito no acerto das decisões adota-
das no processo implantação da Aviação do Exército, em todas as áreas.
A rápida reação de todos os órgãos da Marinha e da Força Aérea
para atendimento às nossas solicitações revela o alto grau de eficiência
que permeia aquelas Forças e seus integrantes. A participação de ambas
foi particularmente importante na especialização de nossos pilotos,
gerentes e mecânicos. Após a conclusão dos cursos, se prontificaram
a mantê-los em atividade, nas unidades onde foram especializados até
que o 1º BAvEx pudesse absorvê-los, integrando-os às suas atividades,
como se fossem dos quadros efetivos de cada Força. Sabemos que isso
foi feito com sacrifício.
Um fato marcante presenciado pelo coronel Telles serve
para ratificar o envolvimento da Marinha e da FAB na implantação da
Aviação do Exército. Já nomeado comandante do 1º BAvEx, o Telles
Apoio da Marinha e da Força Aérea 221

precisou falar com o 3º subchefe, general Freitas Almeida, que havia


substituído naquela função o general Baratta. Ao chegar ao gabinete
do general e solicitar permissão para entrar, percebeu que ele falava
ao telefone. Fez o gesto de retirar-se e foi interrompido pelo general
que lhe disse para permanecer. Segundo o Telles, durante toda a con-
versação o general declarava sua contínua concordância com o que
dizia seu interlocutor: “Sim, certamente; sem dúvida, vamos tomar as
providências”, e por aí foi. Após a conclusão do telefonema, travou-se
o seguinte diálogo:
– Telles, acabei de tomar uma “mijada” de um almirante e acho
que ele é mais moderno que eu – disse o general Freitas Almeida.
– O que foi, general? – perguntou-lhe Telles.
– Ele está reclamando que nós não estamos pagando diária aos
nossos pilotos e que ele não pode formá-los dando voltas em torno da
torre. Se nós não providenciarmos os recursos, ele vai pagar com os que
ele dispõe para seu próprio pessoal – respondeu-lhe o general Freitas
Almeida.
Telles aproveitou para indagar ao general sobre a recomenda-
ção de que os voos com os nossos pilotos fossem feitos em locais onde
houvesse hotel de trânsito para economizar o pagamento de diária.
– E se durante o deslocamento ele encontrar mau tempo? –
indagou Telles e complementou: – Vai ter que pousar onde estiver.
– Eu sei, Telles, mas vai convencer o pessoal responsável pela
liberação dos recursos – respondeu-lhe o general.
O diálogo, certamente, irá lembrar aos irmãos militares que o pro-
blema não atingia exclusivamente aos nossos “asas”. Quantas vezes tivemos
que realizar nossas viagens a serviço sem receber uma única diária.
Esses fatos servem para ressaltar o extraordinário apoio pres-
tado por nossas coirmãs, que não poderá jamais ser por nós esquecido
e que deve ser constantemente relembrado. Uma escola que em curto
espaço de tempo, com prejuízo das férias de seu pessoal, reestrutura um
curso, e um almirante que trata o nosso pessoal como cuida de sua gen-
te são exemplos marcantes. E não falamos dos sacrifícios financeiros. O
combustível consumido na especialização do nosso pessoal, que não foi
indenizado, a reparação de aeronaves acidentadas, uma em cada Força,
totalmente arcada por elas fazem parte do esforço da Marinha e da FAB
para atender às nossas necessidades.
222 Aviação no Exército - uma visão histórica

O Exército, ou a Aviação do Exército, em particular, poderia


criar uma data para homenageá-las ou incluir, no programa de celebra-
ção do seu aniversário, uma cerimônia de agradecimento a ambas. Fica
a sugestão.
Poderia ter abordado esse tópico quando aludisse aos cursos
de especialização do nosso pessoal, o que farei mais à frente. No entan-
to, queria colocar em merecido destaque o inestimável apoio que rece-
bemos das demais Forças e achei que justo seria fazê-lo dedicando um
capítulo exclusivo sobre o tema.
Os leitores me perdoem se em algumas ocasiões utilizo o ver-
bo na primeira pessoa do singular e em outras na 1ª pessoa do plural.
Quando o faço no plural é porque, principalmente, me sinto até hoje um
integrante da Aviação do Exército, que ocupa um espaço perene nas mi-
nhas recordações.
Capítulo 17

Escolha do local de implantação


da primeira unidade da Aviação
do Exército

A s ações que antecederam a escolha do local para o des-


dobramento da base física da primeira unidade de Avia-
ção do Exército fazem parte de um dos inúmeros assuntos que certa-
mente permanece desconhecido pela grande maioria do público militar.
Existem algumas versões sobre a definição da sede para o 1º Batalhão
do Exército. Como não participei diretamente do assunto, vou fazer co-
mentários sobre os que me chegaram ao conhecimento. Naturalmente,
a decisão final foi da maior autoridade envolvida, que era o general Le-
onidas, ministro do Exército. Após a decisão de implantar a Aviação, de
acordo com o planejamento da FT-90, que previa uma unidade em cada
Comando Militar de Área, aventou-se que o batalhão seria desdobrado
na região de Santa Maria, onde a FAB já possuía uma Base Aérea em ati-
vidade. Era a unidade de apoio ao Comando Militar do Sul.
Segundo o brigadeiro Cherubim Rosa Filho, que na época exercia
as funções de subchefe do Estado-Maior da Aeronáutica, a divulgação da
notícia levou o presidente da Argentina, Raul Alfonsín, a telefonar para o
presidente do Brasil, José Sarney, solicitando que o 1º BAvEx não fosse ins-
talado próximo à fronteira, onde já havia uma considerável concentração de
nossas unidades. Alegou o bom nível de entendimento que atravessavam
224 Aviação no Exército - uma visão histórica

as relações entre os dois países. Atendendo ao pedido, o presidente Sarney


teria solicitado ao general Leonidas que a localização fosse alterada.
De acordo com o depoimento do general Baratta concedido
ao tenente-coronel Contreiras, constante da História oral da Aviação do
Exército, ratificado em depoimento que ele me concedeu, a primeira al-
ternativa indicava efetivamente a construção do Batalhão em Santa Ma-
ria. No entanto, a área teria sido descartada porque iria ocupar o campo
de instrução do Exército existente na região, trazendo problemas para o
adestramento da tropa. Havia também a possibilidade de uma reação por
parte dos amigos argentinos. O segundo local vislumbrado seria a região
de Campinas, que também apresentava o inconveniente de ocupar o cam-
po de instrução de uma brigada. Uma nova opção apontava para Tauba-
té. Após conversar com o prefeito sobre as vantagens de acolher a nova
unidade, o general Baratta solicitou que o chefe do Executivo local apre-
sentasse à Câmara um projeto versando sobre a desapropriação de áreas
adjacentes à 12ª Bateria de Artilharia, que se encontrava em processo de
extinção. Na área da bateria, havia inclusive uma pista de pouso.
Outra versão indica que, ao saber que o Exército estava procu-
rando uma área para construir o aquartelamento, o prefeito de Taubaté
procurou o general Luís Paulo Fernandes de Almeida, que havia coman-
dado a brigada de Caçapava e estava servindo em Brasília, e propôs a
instalação da nova OM de Aviação naquele sítio.

Portaria de designação da sede do 1º Batalhão de Aviação do Exército


Escolha do local de implantação da primeira unidade da Aviação do Exército 225

Ao mesmo tempo que esses e outros fatos ocorriam, no âmbito


da 3ª Subchefia, prosseguiam as atividades de implantação, entre elas
o estudo sobre a melhor área para localização do 1º BAvEx, ocasião em
que Santa Maria ainda aparecia como provável sede. A análise teve como
premissa básica que a área a ser escolhida fosse da União, sob a juris-
dição do Exército. Foram selecionadas como favoráveis as regiões de
Formosa, em Goiás; Mangaratiba, no Rio de Janeiro; Campinas, em São
Paulo, e a própria área de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Os critérios
orientadores foram todos de caráter técnico e levavam em conta, entre
outros aspectos, a facilidade de ligação a aeroportos, a proximidade de
centros produtores de material de aviação e de apoio de manutenção,
a facilidade de apoio às organizações militares do Exército, a ocorrên-
cia de condições meteorológicas favoráveis à realização de voo na maior
parte do ano, entre outras particularidades. Concluiu-se que a região de
Mangaratiba apresentava as melhores condições. Entretanto, a localiza-
ção já se definia em relação a Taubaté.
Conversei com o coronel Telles a respeito do tema. Ele partici-
pou da viagem na qual surgiria a proposta da escolha de Taubaté como
sede do 1ºBAvEx, que obviamente dependeria da ratificação pelo minis-
tro do Exército. A viagem, cuja comitiva era chefiada pelo general Ba-
ratta, foi realizada após a decisão de não desdobrar a unidade em Santa
Maria. A primeira OM visitada foi a brigada de Campinas. Na oportuni-
dade, seu comandante apresentou uma série de argumentos contrários
à articulação naquele local pelos prejuízos que a perda de sua área de
instrução acarretaria para aquela Grande Unidade. O comandante da
Região Militar, que participava da reunião, apresentou a sugestão da
utilização do aquartelamento da bateria antiaérea de Taubaté, que se
encontrava em extinção e cuja área, depois da conclusão de demanda
judicial, tinha passado à jurisdição da União. Ao visitarem-na, consul-
tado sobre a exequibilidade do local, o coronel Aviador Linhares, oficial
de ligação da FAB junto à Seção de Aviação do Exército, pronunciou-se
favoravelmente.
Na entrevista que realizei com o ministro Leonidas, ele foi en-
fático ao afirmar que a decisão de articular o 1º BAvEx em Taubaté tinha
sido exclusivamente dele, contestando as demais versões a respeito da
definição da localização. Acreditamos que todas elas possam ser válidas,
tendo ocorrido em escalões distintos, contemporaneamente.
226 Aviação no Exército - uma visão histórica

Em síntese, a decisão final de instalar o batalhão em Taubaté


foi do general Leonidas, na qualidade de ministro do Exército. Tal fato,
no entanto, não descarta a veracidade e pertinência das demais versões
apresentadas, pois todas excluíam Santa Maria, no Rio Grande do Sul,
como um local apropriado, e apontavam a área localizada no Sudeste, no
caso Taubaté, a melhor para instalação da primeira unidade de Aviação
do Exército, o que efetivamente ocorreu.
Do exposto, podemos inferir que, por todos os motivos, a insta-
lação do batalhão, inicialmente prevista no planejamento da FT-90 em
Santa Maria, era inadequada naquela conjuntura. Não se sustentavam
as justificativas para tal. A definição da área de Taubaté, não aventada a
princípio, deveu-se a uma conjunção de fatores que conduziram a uma
decisão que tem se mostrado acertada.

Instalações do Batalhão de Aviação, em Taubaté, em construção

Neste momento, é oportuna a transcrição de artigo publicado no


informativo Águia, editado no Comando de Aviação do Exército, o qual
retrata com rara felicidade a epopeia vivida pelos heroicos pioneiros que,
sob o comando do coronel Telles, trabalharam para a construção da base
física do 1º Batalhão de Aviação do Exército e na estruturação da unidade.

O tenente Paulo Roberto Campos Cobra, Ten Cobra, foi uma


testemunha privilegiada da implantação do 1º BAvEx porque
servia na 12ª Bateria de Artilharia Antiaérea, subordinada à 12ª
Brigada de Infantaria, que seria extinta para que a nova unidade
militar fosse construída na área que ocupava. Ele nos conta
que a Bateria era uma unidade precursora do 20º Grupo de
Escolha do local de implantação da primeira unidade da Aviação do Exército 227

Artilharia de Campanha. Ocupava o local de um antigo Pos-


to Agropecuário do Ministério da Agricultura. A área estava
em litígio, pois a UNITAU (Universidade de Taubaté) a rei-
vindicava para si.
O posto foi extinto em 1975, e a área foi oferecida ao
comando da 12ª Brigada para instalar a bateria, que ficava
aquartelada em Jundiaí [...]
No segundo semestre de 1987, a Bateria foi visitada por
uma comitiva do EME, e a área foi escolhida. Acostumados
com tantas alterações, o assunto foi motivo de brincadeira
para os integrantes da Bateria que, céticos, diziam: ‘Rapaz,
essa aviação não vem para cá é nunca! Isso aí é mais uma
história, mais um motivo para nós passarmos aqui um pe-
ríodo pensando nas modificações’, refletindo o descrédito
na instalação da Aviação do Exército, em Taubaté. Certo
fim de semana, todavia, ao retornar da cidade para a vila
militar, onde morava, o Ten Cobra encontrou o comboio do
2º Batalhão Ferroviário, de Araguari. Eram cerca de dez
tratores, cinco D-8, outras viaturas e pessoal do batalhão.
Foi preciso abrir uma estrada para que o comboio pudesse
entrar no quartel.
O dia 4 de janeiro de 1988 foi a data marcada pelo Estado-
Maior do Exército para a assunção de comando do Cel
Telles, tendo em vista que a Bateria havia sido extinta em
31 de dezembro de 1987. A data, depois de um feriado de
Ano Novo, era inconveniente para contar com a presença
de autoridades. O evento, todavia, contou com a presença
do chefe do EME, uma vez que o 1º BAvEx era diretamente
subordinado àquele órgão. Compareceram também
militares do Comando Militar do Sudeste (CMSE), a
Aeronáutica e dois helicópteros da Marinha.

Tinha início um recente desafio para o coronel Telles, implan-


tar o 1º BAvEx. O novo comandante ouviu o conselho do chefe do EME:

Telles, não queira fazer tudo sozinho. Procure com que as


pessoas que estão à sua volta, que são seus subordinados
ou seus superiores, se sintam envolvidas no projeto de
228 Aviação no Exército - uma visão histórica

criação da Aviação do Exército, porque isso vai te facilitar


muito. Você vai ter muita gente a favor, porém muita gente
que, por não compreender bem, não auxiliará. (Depoimento
concedido pelo Ten Cobra, em 30 de julho de 2003).

O comando do coronel Telles teve início com duas preocupa-


ções. A primeira era a construção da base física do batalhão, encargo do
2º Batalhão Ferroviário e da empresa Odebrecht. A segunda era implan-
tar o espírito de Aviação do Exército. Inteligentemente, mandou instalar
uma biruta e mantinha seu capacete de voo na mesa para caracterizar
que ali estava o comandante de uma unidade da Aviação do Exército.

A situação era totalmente atípica. Era um quartel e um


canteiro de obras ao mesmo tempo. Seguia-se a rotina de
uma unidade militar com educação física pela manhã, for-
maturas matinais e ordem unida. O efetivo era de aproxi-
madamente quinze sargentos e quarenta e poucos cabos e
soldados. Faziam uma instrução especial, adaptada para a
circunstância com manutenção do armamento e marchas.
Naquela época, uma das maiores preocupações era com a
segurança do aquartelamento, da reserva de armamento
e das viaturas. Os trabalhadores, suando, passavam perto
da reserva de armamento, ficavam olhando para as armas.
Talvez fosse apenas curiosidade, mas para que não houves-
se risco de que alguma arma desaparecesse, as medidas de
segurança foram reforçadas. O Cel Telles realizava duas reu-
niões semanais. Uma com o estado-maior do Batalhão e a
outra era feita com os responsáveis pela obra. A Comissão
Regional de Obras (CRO) era representada pelo tenente-
coronel Silva, engenheiro, e pelo major Felipe, engenheiro
eletricista. Representando a Odebrecht, estava o engenhei-
ro Sérgio Serbaro acompanhado de outros engenheiros. O
estado-maior do Batalhão também comparecia. A reunião
servia para que o comandante acompanhasse o estágio em
que se encontravam as obras e o desenvolvimento em rela-
ção ao previsto, assim como as necessárias correções. Tam-
bém coordenávamos os trabalhos da construtora com os
do Batalhão Ferroviário. A empresa pressionava exigindo a
Escolha do local de implantação da primeira unidade da Aviação do Exército 229

conclusão da terraplanagem, mas o Batalhão Ferroviário ti-


nha seus próprios problemas, principalmente a chuva, pois
aquele foi um ano muito chuvoso, inclusive fora de época.
Com o início das obras, o aspecto físico da área se modi-
ficou. O 2º Batalhão Ferroviário começou a terraplanagem
e depois a empresa Odebrecht começou a construir as ins-
talações. A construção chegou a ter aproximadamente dois
mil trabalhadores, oriundos de diversas partes do Brasil,
que moravam no alojamento, próximo ao local onde hoje
se localiza a capela. Uma das primeiras obras foi a cons-
trução dos blocos de apartamentos, localizados perto das
casas, construções remanescentes do Posto Agropecuário,
que serviam como PNR, onde moravam os militares. O Cel
Telles tinha muita preocupação com o espírito de corpo da
tropa. O expediente chegava a quatorze horas diárias, mas o
pessoal mantinha o moral elevado. Todos procuravam cola-
borar, independente de grau hierárquico, seja do soldado ao
coronel. (Extraído da dissertação História oral da Aviação
do Exército, de 1985 a 1994, de autoria do tenente-coronel
R1 Luis Azambuja Contreiras Rodrigues).

No Exército, pelo menos “no meu tempo” (não gosto dessa


expressão saudosista), as coisas eram sempre difíceis. Nesse aspecto,
guardamos forte identidade com o time do Corinthians, onde nada se
consegue sem sacrifícios. Lembro-me de que, ao ser transferido para o
Colégio Militar de Manaus, a mesa de jantar que eu tinha na minha resi-
dência era feita do caixote que havia sido utilizado na minha mudança.
Enquanto isso, os integrantes da Marinha tinham recebido a residência
com mobiliário e até talheres. Para o nosso pessoal, a despeito dos nos-
sos esforços e da própria Marinha, não foi diferente.
Segundo o hoje coronel Simões:

Os oficiais designados para realizar o curso de piloto na Ma-


rinha, por decisão da Seção de Aviação do Exército, eram
todos casados, pois havia previsão de nossa inclusão na
lista de ocupação de PNR. O problema de moradia foi um
grande óbice a ser superado. A despeito da nossa inclusão
na lista supracitada, a expectativa de recebermos moradias
230 Aviação no Exército - uma visão histórica

não era animadora, e tivemos que acorrer ao mercado local,


onde as dificuldades de aluguel eram enormes. Por ser uma
região de praia, os proprietários preferiam deixar as casas
fechadas para alugar somente na temporada, onde os alu-
guéis eram muito mais altos e compensavam o tempo que
as casas ficavam vazias. Tive que trocar de casa umas três
vezes, e a última foi a de um cabo da Marinha, onde fiquei
mais tempo. Tinha sido construída pelo proprietário e apre-
sentava uma série de defeitos de construção e não estava
em bom estado de conservação. Foi onde nasceu o meu filho
mais velho. Na medida em que as casas em Taubaté ficavam
prontas, éramos transferidos para o BAvEx. Após quase 2
(dois) anos e 08 (oito) meses foi a minha vez de transferir-
me. A casa era nova, excelente. Fiz a minha mudança na épo-
ca do período chuvoso, o que a tornou inesquecível. O arru-
amento interno não possuía pavimentação. Era um lamaçal.
Ao chegar ao local, o motorista do caminhão vendo o estado
da rua disse: ‘O caminhão não chega lá. Não sei como vou
fazer.’ Pedi o apoio da nossa Engenharia, que se encontrava
lá em apoio à Odebrecht, empresa que construía as insta-
lações do BAvEx. Mandaram um trator de rodas que, após
alguns movimentos, ficou atolado em frente à minha casa.
Para desatolá-lo, enviaram um trator de esteira que, após
algumas manobras, rompeu as instalações de água que pas-
savam pela rua. Instalou-se o caos. A solução encontrada foi
fazer um caminho com tábuas e sobre ele levar a mudança.
E assim foi feito. Sob a chuva, meus móveis chegaram à mi-
nha casa completamente molhados.
A casa era muito boa, à exceção do espaço lateral, destinado a
estacionar o carro, que era descoberto. Segundo soube, um ge-
neral havia dito que ‘capitão não tinha carro logo não precisava
de garagem coberta’. Somente mais tarde elas foram cobertas.

Para o coronel Telles, um dos grandes problemas que ele en-


controu inicialmente foi compatibilizar o cronograma das obras da in-
fraestrutura do batalhão com o previsto para a entrega do material de
aviação adquirido. A Aerospatiale cumpria com regularidade o seu pro-
grama, mas as obras não seguiam no mesmo ritmo.
Escolha do local de implantação da primeira unidade da Aviação do Exército 231

Não estávamos preparados para receber os manuais, o fer-


ramental, os suprimentos. Havia a necessidade de que o
Depósito Especial Alfandegado (DEA) estivesse pronto, o
que não era realidade. Não era culpa da empreiteira, mas da
situação do momento. Vivíamos uma época em que a infla-
ção beirava os quarenta por cento ao mês. Quando recebia
recursos para compra de materiais, se não os empenhasse
de imediato, não poderia mais comprá-los. O problema da
energia só foi resolvido fruto do bom relacionamento com
as autoridades locais, que autorizaram a construção de uma
potente ‘gambiarra’ para alimentar as instalações do DEA,
até que a rede elétrica estivesse pronta, incluindo subesta-
ções de energia etc.

Acrescentou que às vésperas do recebimento do primeiro heli-


cóptero, em 1989, havia a previsão da transferência para o batalhão de
todo o pessoal que estava na Marinha e na FAB, inclusive a incorporação
dos novos soldados. Seria a primeira incorporação. Os alojamentos não
tinham sido construídos, os recursos disponíveis eram insuficientes e
talvez só permitissem a construção de uma garagem para viaturas cujo
projeto não previa paredes laterais ou internas. A situação produziu o
seguinte diálogo entre o coronel e o responsável pelas obras:

– O que o Sr. consegue fazer com os recursos disponíveis?


Perguntou coronel.
– Posso fazer a garagem, respondeu o responsável.
– Então, faça a garagem, disse o coronel.
– Mas o Sr. não tem viaturas, retrucou o responsável.
– O Sr. pode fechá-la com tapumes? Perguntou o coronel.
– Posso, respondeu o responsável.
– Então, teremos o nosso alojamento, respondeu o coronel.

E assim foi feito. A garagem foi o primeiro alojamento dos


soldados. Havia um único banheiro, e as fardas eram penduradas em
pregos afixados às paredes. A incorporação foi feita com os 40 dias de
internato, e o funcionamento do curso de cabos ficou sob a direção do
então tenente Braga, hoje general. Nesse período inicial, a improvisação
ocupou papel importante na rotina diária: “Como recebemos todas as
232 Aviação no Exército - uma visão histórica

mesas do refeitório e não tínhamos ainda o total do efetivo do batalhão,


as usamos como escrivaninha, pois o mobiliário ainda não tinha chegado.
Chegamos a usar caixotes de suprimentos como mesa.”
Durante o mês de maio de 1988, nenhuma das viaturas da em-
preiteira conseguia se movimentar no grande “barral” que era o batalhão,
ou melhor dizendo, o canteiro de obras. As chuvas contínuas não permi-
tiam secar o terreno, o que provocava atraso no cronograma das obras. E
quando secava a poeira era insuportável. Foi difícil a vida dos pioneiros.
A única coisa que não faltava era dificuldade; no entanto, havia muita boa
vontade, dedicação e entusiasmo. Existia problema de transporte, tanto
pelo número ainda insuficiente de viaturas como pela dificuldade de li-
gação com a cidade, pois a estrada de acesso não era pavimentada. Por
ocasião das chuvas, inúmeras vezes o batalhão teve que socorrer viaturas
militares e civis atoladas. Na véspera do recebimento da primeira aero-
nave, durante a noite, choveu muito, obrigando a empreiteira, durante
a madrugada, a espalhar brita nas vias de acesso ao local da cerimônia
para evitar o atolamento das viaturas dos convidados. O barro era tanto
que na frente do PC do comandante havia uma lâmina de ferro para o
pessoal limpar os coturnos (calçado militar) antes de entrar na sala.
Nem o comandante escapou das dificuldades. Sua residência só
ficou pronta oito meses após a assunção do comando. Neste ínterim, ele
morou sozinho, em uma pequena sala onde hoje é o gabinete odontológi-
co, pois sua família permanecia em sua residência, em São José dos Cam-
pos. Azar dos subordinados. Comandante morando no quartel é sinal de
expediente prolongado. E assim acontecia.

Outro aspecto da construção das instalações da Base de Taubaté e 1º BAvEx


Capítulo 18

Seleção e especialização
do pessoal

P or ocasião da reunião inicial da Comissão para Estudar


a Implantação da Aviação do Exército, já existia, em par-
ticular nos representantes da 3ª Subchefia que a integravam, a consci-
ência de que a Aviação do Exército se apoiaria em três pilares que lhe
proporcionariam a base de sustentação necessária ao seu nascimento
e desenvolvimento: a doutrina, o material e o pessoal. Já frisamos esse
fato anteriormente. Entre eles, considerávamos o prevalente e de maior
criticidade o representado pela área do pessoal. Dele dependeria efe-
tivamente o sucesso do presente e do futuro da Aviação. O pessoal era
uma área prioritária, particularmente por se constituir na componente
em que na prática não se poderia “queimar etapas”. De maneira geral,
eram necessários para a especialização dos pilotos em média 13 meses
e dos mecânicos 16 meses. Logo, se impunha iniciar no mais curto prazo
a preparação dos quadros.
Os altos custos envolvidos na formação de pilotos, gerentes,
mecânicos engenheiros e médicos aeronavegantes, o caráter eminente-
mente técnico da nova especialidade, a exigência de um alto índice de
profissionalização abarcando o profundo conhecimento do material, de
suas características, possibilidades e emprego e a necessidade de criação
234 Aviação no Exército - uma visão histórica

de uma nova mentalidade intimamente compromissada com a seguran-


ça deixavam antever que a componente pessoal teria um papel de trans-
cendental importância a desempenhar no novo poder que emergia, a
Aviação do Exército.
No processo de especialização, a fase inicial foi a do recruta-
mento, no qual foram buscados os recursos humanos que concorre-
riam às demais fases. Nesse ponto, vamos recordar alguns detalhes já
explorados quando foi abordado em capítulo anterior o relatório do
qual se originou o Plano de Implantação. Nos estudos preliminares para
a definição das condições de recrutamento, foram analisados o tipo de
recrutamento e o universo a recrutar. No tocante ao tipo do recrutamen-
to, concluiu-se pelo voluntariado, julgado o único aceitável para a nova
atividade que apresentava, entre outras, as vantagens da comunhão de
interesses entre a instituição e o candidato e permitia a aferição da re-
ceptividade pelo público interno. Quanto ao universo a recrutar, os estu-
dos conduziram à decisão em torno do pessoal denominado de carreira.
Circunscreveu-se inicialmente aos tenentes das turmas mais modernas
que possuíssem o mínimo de vivência na tropa e capitães recentemente
aperfeiçoados, tendo em vista basicamente permitir que depois de espe-
cializados pudessem permanecer em função na Aviação do Exército pelo
maior tempo possível. Com esse procedimento, o Exército resgataria o
alto investimento efetuado na especialização e permitiria que atingis-
sem o mais alto grau de operacionalidade. Com relação aos graduados,
sistemática semelhante foi adotada, recaindo a prioridade do recruta-
mento em terceiros-sargentos modernos, com especialidade em áreas
afins dos cursos que iriam frequentar.
A responsabilidade do recrutamento era exclusiva do Exérci-
to, de acordo com a sistemática já tradicionalmente consagrada para o
atendimento aos cursos de especialização que já se realizavam no âmbi-
to da Força, consideradas, no entanto, as peculiaridades e imposições de
ordem médica, psicológica e física que a nova modalidade exigia.
Pode parecer aos nossos leitores, em particular aos militares,
que as considerações aqui feitas sejam dispensáveis. Ao abordá-las, me
proponho a demonstrar, em particular àqueles que não tiveram a opor-
tunidade de tomar conhecimento do processo, que todas as decisões
tomadas no âmbito da implantação da Aviação foram fruto de aprofun-
dados estudos, cuidadosa reflexão, debates e consultas às fontes que
Seleção e especialização do pessoal 235

reuniam conhecimentos compatíveis sobre a atividade no País e no ex-


terior, como não poderia deixar de ser. Não me cansarei de relembrar
esse particular.
À fase do recrutamento seguia-se a da seleção, na qual no
universo de voluntários foram escolhidos os mais aptos. A inexistência
no Exército Brasileiro de sistema habilitado à seleção de pessoal
aeronavegante e demais especialistas de Aviação tornou imprescindível
o apoio das estruturas destinadas a esse fim existentes na Marinha e na
Força Aérea. A despeito de uma relativa similitude nos critérios adotados
na seleção pelas Forças Singulares, imposições diversas induziram à
necessidade do aproveitamento dos sistemas de seleção da Marinha e da
FAB. Nessa fase, foram selecionados os candidatos a serem matriculados
nos cursos de especialização. Ela comportava três etapas. A primeira ao
nível da Diretoria de Movimentação (D Mov), onde os requerimentos de
inscrição à seleção foram analisados à luz dos requisitos estabelecidos
em portaria que regulou o assunto, principalmente no que diz respeito
ao atendimento da legislação de movimentação e cursos. A segunda,
com a participação da Seção de Aviação do Exército, envolveu a análise
de parâmetros de interesse mais específico para a atividade de Aviação,
obtidos nas informações prestadas pelos candidatos em seus requeri-
mentos e junto às diretorias de Cadastro e Avaliação e de Promoções.
Parece-me interessante detalhar um pouco mais o desenvolvimento
dessa etapa de seleção.
Inicialmente, os requerimentos, grupados por Arma ou QMB,
eram distribuídos aos oficiais da Seção de Aviação, cabendo a cada um
deles a responsabilidade de selecionar, em princípio, os candidatos que
fossem de sua respectiva Arma/Quadro/Serviço. Como a seção só tinha
oficiais de Infantaria, Cavalaria e do Quadro de Material Bélico, todos
se envolveram na análise de mais de uma Arma, Quadro ou Serviço. No
caso da seleção dos oficiais de Cavalaria, minha Arma de origem, can-
didatos ao curso de piloto em 1986, dos 71 requerimentos recebidos
foram selecionados 25, tendo sido objeto de análise o ano de formação
na AMAN, a classificação, o grau/menção obtido ao final do curso de
formação, a habilitação anterior em pilotagem de aeronave, o domínio
da língua inglesa, o resultado de inspeção de saúde realizada em sua
guarnição de origem e o conceito do comandante de sua unidade. Esses
dados, depois de quantificados, foram calculados pelo computador, que
236 Aviação no Exército - uma visão histórica

os transformava em pontuação e emitia uma listagem estabelecendo o


grau obtido por cada candidato. Dada a notória importância que a classi-
ficação na turma assume na vida do militar brasileiro, naturalmente esse
foi um dos fatores considerados prevalentemente.
O grau de conclusão na escola de formação, que define a clas-
sificação do oficial em sua turma, normalmente “persegue” o militar
durante toda a sua vida na ativa. Costumeiramente, os primeiros de tur-
ma são aqueles que no futuro concorrerão ao generalato. Essa situação
pode mudar para aqueles que, não concluindo o curso da AMAN nos
primeiros lugares, obtêm sucesso no curso da Escola de Aperfeiçoamen-
to de Oficiais ou, mais tarde, na Escola de Comando e Estado-Maior. No
caso dos tenentes, que eram o universo de seleção, esses outros cursos
não contavam, pois só são realizados a partir do posto de capitão. Ao
procurarmos selecionar naquela etapa os oficiais mais bem classifica-
dos, os prováveis futuros generais, pensávamos na necessidade de co-
meçar a criar a imprescindível mentalidade de Aviação da qual nós já
estávamos impregnados. Precisávamos que no futuro a elite dirigente
do Exército estivesse povoada de chefes imbuídos da ideia de que o cus-
to de ter uma aviação orgânica é sempre menor que os benefícios que
ela traz para a Força Terrestre.
Levados os requerimentos à Diretoria de Cadastro e Avaliação
e de Promoções, foram avaliados outros dados que poderiam influir na
modificação da contagem atribuída. Dessa última verificação, surgiram
os candidatos que efetivamente seriam levados à 3ª etapa da seleção.
Vale frisar neste momento que a proposta inicial elaborada
pela Comissão de Implantação apontava a direção de restringir as va-
gas para pilotos somente aos oficiais de Infantaria e Cavalaria. Julgava-se
de fundamental importância que os pilotos tivessem conhecimento do
emprego das chamadas Armas combatentes às quais iriam prioritaria-
mente apoiar. Durante o período de formação na Academia Militar, esses
conhecimentos são transmitidos, com maior ênfase aos cadetes das Ar-
mas-Base, Cavalaria e Infantaria, habilitando-os para a nova tarefa. Eles
conheciam com maior profundidade o emprego de suas respectivas Ar-
mas, e era doutrinário o emprego do binômio em campanha (Infantaria
x carro). No tocante aos oficiais de Artilharia, a despeito dos excelentes
pilotos oriundos daquela Arma de apoio, sua formação para o desem-
penho de funções complexas inerentes à sua Arma, que requer também
Seleção e especialização do pessoal 237

alto grau de especialização, não apontava a direção de desviá-los de sua


nobre missão. O mesmo raciocínio era válido para os companheiros de
Engenharia. Esse também era o consenso na Seção de Aviação. Quando
fui levar proposta de portaria à Diretoria de Movimentação, órgão subor-
dinado ao Departamento Geral do Pessoal, que tinha como responsabili-
dade desencadear o processo de movimentação do pessoal selecionado,
passei por uma situação extremamente embaraçosa e constrangedora.
Ao dirigir-me ao diretor de Movimentação e apresentar-lhe o documen-
to, ele perguntou-me a razão pela qual somente os oriundos das Armas
-Base estavam previstos para serem selecionados para o curso de pilotos.
Tentei explicar-lhe as condicionantes doutrinárias que nos conduziram
à decisão quando fui bruscamente interrompido. “O Sr. está querendo
me ensinar doutrina?” Como o diálogo começava a tomar rumos desa-
gradáveis, pedi-lhe permissão para me retirar e comuniquei o fato aos
meus superiores. A partir daí, a proposta inicial foi questionada, sofreu
inúmeras pressões, mais ditadas pelo corporativismo das outras Armas
e Serviços do que em decorrência de um raciocínio lógico. Como o objeti-
vo era dar celeridade às medidas, decidiu-se aumentar a abrangência do
universo de seleção. A nova distribuição adotada previa 25% das vagas
para cada uma das Armas (Infantaria, Cavalaria e Artilharia), 15% para a
Engenharia e 10% para o QMB.
Não tenho a veleidade de considerar que o processo ora des-
crito fosse o mais correto e justo e estivesse imune a quaisquer crí-
ticas ou correções. Nosso objetivo sempre foi o de selecionar o que
melhor existia para a nossa Aviação.
À fase seguinte, concorriam os militares selecionados na fase
anterior e somente esses. Essa fase, crítica para aqueles que a ela se
submetiam, comportava a realização de exames de saúde e psicológico,
sob padrões extremamente severos, de exclusiva responsabilidade dos
órgãos de seleção da Marinha e da FAB, acatando o EME incondicional-
mente todo e qualquer parecer emitido pelas juntas daquelas Forças.
Cabe realçar o alto índice de reprovação ocorrido nessa fase, especial-
mente nos exames de saúde. Esse fato conduziu à necessidade de majorar
nas seleções seguintes a quantidade de candidatos que seriam apresen-
tados à avaliação nessa fase. O comprometimento da acuidade auditiva e
visual, anomalias da coluna vertebral, afecções dos seios malares ou faciais
foram alguns dos principais diagnósticos que conduziram à incapacitação.
238 Aviação no Exército - uma visão histórica

A situação mais complicada deu-se na seleção dos dois capi-


tães que fariam o curso com as primeiras turmas. Todos os apresen-
tados na Força Aérea foram reprovados no exame médico. Situação
quase semelhante ocorreu na Marinha. Tivemos que realizar repeti-
dos contatos com os órgãos responsáveis pelos exames para, enfim,
conseguirmos a anuência dos examinadores e aprovar um capitão para
matrícula em cada Força. Posteriormente, considerando a rigidez dos
exames físicos e psicológicos, para cada seleção foi apresentado um
número bem superior ao número de vagas. Para a seleção de 2 capitães
e 10 tenentes pilotos, concorriam, em média, 8 capitães e 44 tenentes.
Na Marinha, os exames médico e psicológico eram realizados
por uma Junta Especial de Saúde para Pessoal Aeronavegantes (JESPA);
na Força Aérea, pelo Centro de Medicina Aeroespacial (CEMAL), ambos
situados no Rio de Janeiro.
Foi, conscientes da extremada importância da missão de pre-
parar quadros altamente capacitados, que desenvolvemos as atividades
de seleção do pessoal – pilotos, gerentes e mecânicos. O grande estímulo
e a motivação que a nova atividade criaria na jovem oficialidade e nos
graduados deixavam antever que a quantidade de candidatos para pre-
enchimento das vagas suplantaria quaisquer expectativas. A previsão
transformou-se em realidade. A acolhida ao chamamento de candidatos
para a Aviação do Exército sempre superou as previsões mais otimis-
tas. Seriam os pioneiros, oriundos de diversas organizações militares,
de todos os recantos do País, cheios de vibração e entusiasmo, que mais
tarde se constituiriam na sólida base sobre a qual se apoiaria a nascente
Aviação do Exército.
Segue-se um depoimento do hoje tenente Sérvulo:

Eu estava na Escola de Sargento das Armas (EsSA) em


1986, quando soubemos que o Exército estava criando
a sua própria Aviação. A notícia despertou um vivo
interesse em todos nós. Apareceu um grande número de
voluntários. Eu fazia o curso de Artilharia e também me
apresentei como voluntário. Antes do final do curso, os
cinco primeiros classificados, todos voluntários, foram
indicados para concorrer ao curso de Meteorologia, pois
em nosso currículo havia matérias correlatas com aquela
Seleção e especialização do pessoal 239

especialidade, como a balística, o emprego de balões


meteorológicos etc.

Entre os depoimentos que colhi junto aos pioneiros da Aviação


do Exército, por se tratar de fato ocorrido na fase da seleção, me parece
oportuno reproduzir o concedido pelo então tenente Simões, o qual vol-
taremos a nos referir ao longo deste livro. Segundo ele:

Após ter realizado o Curso de Observador Aéreo, ao retor-


nar à minha unidade fui fazer a minha apresentação na 1ª
Seção (S1/Pessoal). Na oportunidade, o sargento brigada
(o mais antigo) me perguntou se eu tinha tomado conhe-
cimento da publicação no Noticiário do Exército (NE) da
portaria regulando a seleção de pilotos para a Aviação do
Exército. Sabendo que o sargento, como dizemos na gíria
militar, era meio ‘raro’ e não tendo, ainda, conhecimento de
que o Exército estava implantando uma aviação orgânica,
disse-lhe que devia ter se enganado e que a portaria deveria
tratar do curso de observador aéreo, que eu tinha concluído
recentemente.
– Não, tenente; é do curso de piloto, disse o sargento.
– Não pode ser, sargento! Asseverei.
– Tenente, o Sr. está duvidando de mim? Declarou o sargento.
– Mostre-me o NE, solicitei.
E, sob olhar triunfal do sargento brigada, constatei que lá
estavam as instruções para os candidatos à seleção para o
curso de pilotos para a Aviação do Exército. Fiquei muito
interessado, pois identificava que o curso apresentava ca-
racterísticas de complementaridade com o que eu havia
concluído. Logo, pensei, vou me candidatar. Dias depois,
quando fui despachar com o comandante da unidade já
levei entre os documentos para assinatura o meu reque-
rimento para o curso de piloto. Era o último da ‘pilha’. Ao
lê-lo, o comandante me olhou e perguntou: ‘O que é isso?
Curso de piloto?’. [Ele também não tinha lido o NE] Adu-
ziu, então: ‘Só vou assinar porque você não vai conseguir. O
Exército não vai permitir. Você acabou de fazer um curso e
não vai aplicar?’
240 Aviação no Exército - uma visão histórica

Bem, o comandante assinou, e eu fui selecionado. No meu


exame de saúde, realizado na Marinha, dos candidatos so-
mente três foram aprovados sem restrição. Eu fui um deles.

O então tenente Contreiras foi mais um dos selecionados que


fez parte da primeira turma a frequentar o curso de piloto na FAB. Se-
gundo ele:

Ao ler as primeiras partes do livro escrito pelo Cel Cav Silva


Maia sobre a Aviação do Exército (Av Ex), onde ele se refere
à descrença de alguns militares na capacidade de o Exército
implantar uma aviação orgânica, lembrei-me de ter incorrido
nessa atitude. Eu era um segundo-tenente vibrador, empol-
gado com minhas atividades de comandante de pelotão, no
7º Regimento de Cavalaria Mecanizado, o ‘Malacara 7’, subal-
terno do 2º Esquadrão, o ‘2 de Ouro’. Em fins de 1985, li uma
notícia sobre a aviação, algo sobre estudos. Pensei, com um
muxoxo: ‘Isto é coisa para meus netos.’ Gozei férias em de-
zembro e, no início de 1986, entrando no apartamento que
servia de ‘república’ para quatro ‘pica-fumo’ (jargão utilizado
na Cavalaria para identificar tenentes novos), encontrei, na
porta do meu quarto, um aviso do então Ten Nodiri:
‘Contreiras, se quiseres fazer curso de piloto, vá direto no
S3 para que ele faça o requerimento.’
Tive dificuldade de conciliar o sono naquela noite. Nunca
tinha pensado em ser piloto. A maioria dos meus conhe-
cidos que queriam ser militares fez concurso para as três
Forças Armadas, mas eu só queria o Exército e só fiz con-
curso para a Escola Preparatória de Cadetes do Exército. A
dificuldade em dormir era provocada por um contínuo es-
tudo de situação que fazia mentalmente. Tentava imaginar as
consequências e o futuro da nova atividade, as vantagens e
desvantagens, ao mesmo tempo que temia o desafio. Acabei
decidindo por fazer o requerimento e no dia seguinte fui direto
ao S3, como o Nodiri havia me recomendado.
A vida continuou no regimento. Início de ano, muitas atividades
decorrentes da incorporação e início da instrução ocupan-
Seleção e especialização do pessoal 241

do a mente, tentando não pensar no assunto Aviação para


não criar expectativas. Nesse meio tempo, chegou um ra-
diograma perguntando em que Força eu queria fazer o cur-
so: Força Aérea ou que eu, por ser solteiro, fosse designado,
após severa seleção, para fazer o curso na Marinha do Brasil.
Optei pela Marinha intuitivamente, sem embasar a decisão.
Quis o destino Força Aérea Brasileira (FAB). No final concluí
que o destino tinha me favorecido. Depois descobri que os
alunos da Marinha tinham embarcado no navio-aeródromo
Minas Gerais, o que para mim teria sido um desafio extra
porque eu enjoo no mar com facilidade. Logo em seguida,
veio um novo radiograma determinando a minha apresen-
tação no Colégio Militar do Rio de Janeiro para a inspeção
de saúde.
Quando eu era cadete do primeiro ano da Academia Militar
das Agulhas Negras, fui vítima de um trote de muito mau
gosto. Um cadete do quarto ano passou muita graxa de sa-
pato na minha cara. Uma parte dessa graxa entrou nos ouvi-
dos. Tive uma infecção. Fui ao Hospital Escolar dias depois,
e o médico limpou meu ouvido, tirando pus misturado com
graxa, que ainda tinha ficado dentro dele. Este fato quase
me impediria de entrar para a Aviação. Dias antes de viajar
para o Rio de Janeiro, fui ao médico do regimento sentindo
um incômodo no ouvido. O diagnóstico foi excesso de cera.
Ele então limpou meu ouvido usando cotonetes. Lembro que
ele ‘fuçou’ e ‘escavou’ meu ouvido, provocando muita dor.
Quando iniciei a viagem, já apresentava sintomas de nova
infecção no ouvido. O deslocamento aéreo foi doloroso.
Agora já sei os efeitos das variações de pressão, mas àquela
época não sabia. Eu estava com os condutos auditivos entu-
pidos de secreção e quando começou aumentar a pressão
devido à aproximação para o pouso no Rio de Janeiro, meus
tímpanos começaram a doer, exigindo o máximo de concen-
tração para resistir. A reunião no Colégio Militar foi muito
agradável. Além do entusiasmo natural diante das perspec-
tivas, ainda tivemos a oportunidade de confraternizar com
companheiros de turma, que não encontrávamos desde o
242 Aviação no Exército - uma visão histórica

aspirantado. A minha turma de 1983 era o centro do uni-


verso de seleção para o curso, por isso havia um número
grande de oficiais da turma. A situação para mim foi de
muita tensão. Uma noite eu tive uma febre muito alta. Nós
dormíamos no alojamento do Colégio Militar. Acordei em-
papado de suor. Os lençóis molhados. Eu estava receoso de
que a minha condição atrapalhasse a seleção, por isso não
divulguei a minha doença. Fui até o banheiro, tomei uma
ducha e voltei ao alojamento. Por sorte havia camas vagas, e
escolhi outra para tentar dormir novamente. Fomos para o
exame no Centro de Medicina Aeroespacial (CEMAL), perto
do aeroporto Santos Dumont. Lembro-me do otorrino, que
foi muito gentil, e brincou com meu sotaque gaúcho, mas
foi duro no diagnóstico. Ele disse que a infecção iria corro-
er o meu tímpano e que eu perderia audição e não poderia
ser piloto. Tenho temperamento acomodado e conformado.
Não sei como decidi ‘correr atrás’. Procurei o médico do Co-
légio Militar, que me encaminhou à Policlínica Militar. Eu
não conhecia nada do Rio de Janeiro. Nem me lembro como
cheguei lá. O esforço foi compensador. O otorrino que me
atendeu afirmou que o diagnóstico estava errado, que era
impossível examinar meu ouvido, cheio de secreção, e que
só poderia dar um diagnóstico depois que a infecção fosse
debelada. Prescreveu o tratamento e me dispensou.
Como o período para o tratamento era longo, creio que de
duas a três semanas, liguei para o comandante do regimen-
to e pedi permissão para permanecer no Rio de Janeiro, no
que fui atendido. Uma viagem para Livramento e o provável
retorno para novo exame no Rio seria muito caro e eu prova-
velmente não teria condições de dar instrução no regimento.
Voltei por conta e risco ao CEMAL para conversar com o
otorrino e tive a agradável surpresa de saber que o diretor
do centro não havia acatado o parecer dele e me dera um
prazo de 20 dias para que eu retornasse. O médico, porém,
emitiu outra opinião desfavorável. Ele afirmou que o prazo
não era suficiente. Que devido à gravidade da infecção eu
não estaria curado na data da nova inspeção.
Seleção e especialização do pessoal 243

Adquiri os medicamentos receitados na policlínica e iniciei


um período de tratamento, ‘internado’, por assim dizer, aos
cuidados de minha irmã, que me serviu de enfermeira, pin-
gando os remédios nos ouvidos. Felizmente me curei antes
do previsto e fui aprovado no novo exame, recebendo pare-
cer favorável da junta.
De volta ao regimento, pouco tempo depois chegou o radio-
grama me relacionando para o curso. Em 10 de maio, dia
da Cavalaria, eu já estava desligado e em trânsito. Coloquei
todos os meus pertences num carro e parti rumo a Piras-
sununga. Na data e hora determinada, me apresentei no 2º
Regimento de Carros de Combate, atual 13º Regimento de
Cavalaria Mecanizado. Nem tive tempo de terminar minha
apresentação ao Cel Telles. Mal comecei a me manifestar,
ele me avisou que, por determinação do Gen Baratta, eu te-
ria que raspar meu bigode. Fiquei triste. O bigode é tradição
na família. Meu pai era conhecido na cidade de Bagé pelo
seu cachimbo e pelo bigodão característico. Não pestanejei.
Haveria tempo para outro bigode, o que aconteceu. Fomos
informados que a partir daquele momento estaríamos sob
as vistas e os fogos de todo o Exército. Teríamos que nos
esforçar ao máximo, obter os melhores resultados, sem des-
cuidar da disciplina, já que estaríamos representando a For-
ça Terrestre numa unidade da Força Aérea.

Nas duas primeiras turmas de oficiais que realizaram os cursos


de piloto na Marinha e na Força Aérea, os que se apresentaram à sele-
ção ocupavam em sua maioria lugar de destaque em suas respectivas
turmas de formação, ou seja, os primeiros lugares. Isso nos deixava a
certeza de que pela superior qualidade do material humano selecionado
estaríamos trazendo para a Aviação, além de gente competente, oficiais
com requisitos para atingir o generalato. O estabelecimento de critérios
rigorosos para a seleção, afora outras considerações, nos garantia que,
no futuro, teríamos profissionais preparados para o cumprimento de
suas missões. Essa certeza tem se confirmado. Tivemos o grande prazer
de ver estampada no Informativo do Exército, enquanto eu escrevia este
livro, a promoção ao generalato do coronel Laerte de Souza Santos, mais
244 Aviação no Exército - uma visão histórica

um pioneiro da Aviação do Exército, brevetado piloto com a primeira


turma que realizou curso na Marinha. A notícia me provocou uma rara
sensação de orgulho e felicidade. Anteriormente, já haviam sido promo-
vidos ao último posto da carreira os generais Cunha, Diniz e Carvalho.
Minha vibração com a promoção ao generalato do coronel Laerte não
significa que eu tenha ficado menos orgulhoso com o acesso dos outros
oficiais da Aviação do Exército ao mesmo posto. Quando estabelecemos
os critérios de seleção de pilotos em 1985, o fizemos com o objetivo de que
essa situação ocorresse no futuro e tivéssemos um núcleo de generais im-
pregnados da salutar mentalidade da Aviação. O fato é que minha ativa par-
ticipação na seleção da primeira turma, da qual fez parte o general Laerte,
me proporcionou maior contato com ele e o consequente estabelecimento
de maiores laços de entendimento.
Faço referência somente às duas primeiras turmas por ter acom-
panhado de perto todo o processo de especialização desde a seleção. Nas
turmas posteriores, eu já me encontrava na Diretoria de Material de Avia-
ção do Exército.
Sobre o pioneirismo a respeito do qual não canso de me referir,
é oportuna a transcrição de um brilhante texto elaborado pelo tenente-
coronel Ronaldo Medeiros Lopes, no qual ele consegue sintetizar com
grande objetividade e concisão a saga vivida pelos militares que chega-
ram a Taubaté ainda na fase de construção do complexo.

Tributo aos pioneiros


Texto: tenente-coronel Ronaldo Medeiros Lopes

Fazia algum tempo que sobrevoavam aquela imensidão verde. Os


olhos do jovem piloto buscavam locais para o pouso em caso de pane da ae-
ronave. Mas a Floresta Amazônica não oferecia muitas possibilidades. Eram
raras as clareiras. Via-se somente o corte do rio que a aeronave acompanha-
va. Era a primeira vez que voavam sobre a selva. Olhou para o lado. O 2P era
tão jovem quanto ele e com a mesma pouca experiência em voo. Pensou na
carga que pesava sobre si; afinal, como comandante da aeronave, era res-
ponsável por aquele helicóptero que custava milhões de dólares e, o mais
importante, era responsável pelas vidas que estavam a bordo. Logo seus
pensamentos se voltaram para a casa, para filha que nascera havia pouco
Seleção e especialização do pessoal 245

e para esposa com quem casara não havia dois anos. Pensou nas dificulda-
des que sua opção pela aviação impusera a sua recém-criada família. A casa
apesar de nova ficava em meio a um grande canteiro de obras. A poeira e
o barro faziam parte do dia a dia, sem contar os animais peçonhentos que,
vez por outra, eram encontrados no quintal ou mesmo dentro da casa. A
base ficava longe da cidade, e o transporte era uma dificuldade. Sorte que as
outras famílias estavam sempre dispostas a acudir, em caso de necessidade.
Mais uma vez ele olha para o painel da aeronave, tudo está bem. Lá fora,
no horizonte, algo que parece uma clareira, na verdade uma oca. Aponta
o local para o outro piloto que confirma com um aceno. Volta a pensar em
Taubaté, o canteiro de obras, no hangar recentemente construído, ao qual
nos dias de chuva só se chegava de caminhão, nas mesas de trabalho que
eram na verdade caixotes de peças de aeronaves. Quantas dificuldades. Fal-
tava quase tudo, mas todo começo tende a ser difícil. Pensou nos compa-
nheiros de labuta, oficiais e praças, aqueles pioneiros, quanta gente boa e
de qualidade, todos comprometidos com a nascente Aviação. Lembrou-se,
então, do pouso que fizera horas atrás em um pelotão de fronteira. Um sol-
dado perguntara: “O senhor é da Aeronáutica?” E ele respondeu: “Não, nós
somos do Exército Brasileiro.” Na face do soldado viu um misto de espanto e
contentamento, pois era uma novidade o Exército ter seus próprios helicóp-
teros e pilotos. De repente o seu peito se encheu de orgulho. Sua mente foi
tomada pela sensação única de fazer parte de algo grandioso, pois aquele
jovem pioneiro era integrante de um vetor de modernidade, uma verda-
deira expressão do desenvolvimento do Exército Brasileiro do século XXI e
estava ajudando a escrever uma bela página da história da Força Terrestre:
a criação da Aviação do Exército.

Após a seleção de saúde realizada em 1985, em face dos resul-


tados apresentados, o EME, por meio da Seção de Aviação do Exército,
solicitou à Diretoria de Saúde a adoção de medidas tendentes a aprimo-
rar a seleção dos recursos humanos. A partir daí, foi instituída a obri-
gatoriedade de que os requerimentos fossem instruídos com parecer
da Junta de Inspeção de Saúde da Guarnição de origem, como meio de
identificação prévia de motivos de óbvia incapacitação para a atividade
aérea. Sugeriu-se ainda que fossem divulgadas medidas de caráter profi-
lático para a preservação da acuidade auditiva, por meio da utilização de
protetores auriculares nas instruções de tiro, particularmente.
246 Aviação no Exército - uma visão histórica

À fase de seleção sucedia aquela em que o militar efetivamente


passava a se integrar à nova especialidade. Como já exposto, o processo
de especialização na Marinha era o que maior identidade apresentava
com o que se planejava para a Aviação do Exército. Naquela Força, a
habilitação para a pilotagem era considerada como especialidade. Os
cursos de especialização eram montados sob a premissa de que os
militares matriculados não possuíam qualquer conhecimento anterior
sobre a atividade aeronavegante. Na Força Aérea, o emprego dos
helicópteros estava ligado especificamente à execução de atividades
de busca e salvamento, situando a atuação dos helicópteros mais como
atividade auxiliar àquelas desempenhadas pelas aeronaves de asas fi-
xas. Os cursos destinavam-se a habilitar pilotos e mecânicos, já forma-
dos, para operação e manutenção de helicópteros e revestiam-se de
caráter eminentemente prático, em face dos conhecimentos anteriores
dos militares matriculados. A despeito dessas diferenças, precisávamos
utilizar o apoio de ambas as Forças, pois era imprescindível formar a
maior quantidade de pessoal antes do recebimento das aeronaves.
Apropriadamente, alguns companheiros nos questionavam so-
bre os problemas de padronização que a adoção de estruturas distintas
de especialização poderia acarretar. Estávamos cônscios dessa situação.
A escolha da formação dos quadros, pilotos, gerentes e mecânicos, na
Marinha e Aeronáutica, além de ser “politicamente correta”, foi por nós
considerada desde o início a melhor alternativa, a mais desejável. A des-
peito de doutrinas distintas, teríamos a oportunidade de conhecê-las e,
após a reunião do nosso pessoal no 1º Batalhão de Aviação do Exército,
se estabeleceria uma padronização que permitiria elaborar uma dou-
trina própria, autóctone, para atendimento às nossas peculiaridades e
necessidades.
Como vimos anteriormente, o curso de pilotos na FAB era re-
alizado pelo 1º/11º GAv, unidade operacional com encargos de ensino,
sediada na Base Aérea de Santos, em Guarujá, São Paulo. Para oficiais
da FAB tinha a duração de 30 dias e a realização de 35 horas de voo. Ao
término do curso, o oficial era habilitado para o exercício da função de
2º piloto (2P) na aeronave UH-IH. O 2P é o piloto que ainda não alcançou
a sua habilitação para o comando da aeronave, formação a ser·comple-
tada no 5º/8º Grupo de Aviação, sediado na Base Aérea de Santa Maria,
no Rio Grande do Sul.
Seleção e especialização do pessoal 247

Para a especialização de pilotos da Aviação do Exército, na FAB,


o curso, em face do desconhecimento anterior de nossos oficiais sobre a
atividade aérea, sofreu uma reformulação e foi organizado em três fases.
A 1ª, realizada na Academia da Força Aérea, em Pirassununga, em São
Paulo, era eminentemente teórica, na qual o futuro aviador recebia no-
ções sobre sistema de investigação e prevenção de acidentes aeronáu-
ticos, navegação e tráfego aéreo, fraseologia, eletrônica, conhecimento
dos equipamentos utilizados para orientação de voo, medicina de avia-
ção, meteorologia, instrumentos de voo e aerodinâmica, entre outras
disciplinas.
Sobre o curso realizado na AFA, nos contou o hoje coronel Con-
treiras que:

A recepção pela Academia da Força Aérea (AFA) foi exce-


lente. Ficamos instalados no Hotel de Trânsito de Oficiais.
Como a academia é muito grande, podíamos solicitar uma
viatura para nos deslocarmos para sala de aula, rancho, etc.
Além do oficial de ligação e dos instrutores, tivemos pouco
contato com os demais militares da FAB. Vivíamos a rotina
de aulas de manhã e de tarde, treinamento físico no final da
tarde e estudo à noite. As refeições eram feitas no ambiente
comum, mas creio que pelo ineditismo e pela falta de ati-
vidades em conjunto não houve interação com os demais
oficiais da academia. A AFA preparou um programa especial
para nós. Foram dez semanas de instrução. Foi um período
de muita dedicação. O curso exigia a preparação contínua
para os assuntos que seriam abordados no dia seguinte.
Nossa motivação era enorme. Um instrutor da AFA nos uti-
lizou como parâmetro. Ele era criticado pelos cadetes da
Força Aérea porque suas provas eram difíceis, e o resultado
eram notas baixas. Consta que ele aplicou a mesma prova
na nossa turma e nos cadetes. Como o nosso resultado foi
superior, ele lavou alma, afirmando que ele não fazia pro-
vas difíceis, os cadetes é que estudavam pouco. Éramos
mais experientes, nosso curso de menor duração e tínhamos
uma grande motivação, e isto fazia diferença. Como o curso
ocorreria em duas fases, em cidades distintas, Pirassununga
248 Aviação no Exército - uma visão histórica

e Santos, os responsáveis pela seleção determinaram que


todos os solteiros fossem designados para a FAB. Os únicos
casados eram o então major Marcos, hoje general, mais an-
tigo e xerife da turma, e o Ten Bassoli.
Apesar da solteirice da maioria, não houve festas. O momen-
to era de dedicação ao estudo. Praticamente levávamos vida
de cadete. Não saíamos durante a semana e todas as noites
estudávamos. Nos fins de semana, saíamos para tomar uma
gelada e conhecer as atrações de Pirassununga. Na AFA fize-
mos o nosso primeiro voo. Não tenho boas recordações por-
que enjoei durante as manobras da aeronave T25. Restou a
lembrança da foto junto a um antigo avião com registro da
Aviação Militar. Trajávamos o antigo macacão cor marrom,
que tinha o cheiro insuportável do produto anticombustão,
e na cabeça ainda usávamos o extinto ‘bibico’.

Após a primeira fase, os alunos se deslocavam para a Base


Aérea de Santos, onde se desenvolvia a etapa seguinte. Naquela Base, o
curso se iniciava no helicóptero H-13, o conhecido “bolha”, equipamento
antigo, mas extremamente apropriado para a instrução por exigir maior
habilidade do piloto.

H-13

O curso no H-13 compreendia uma fase teórica, com 44 ho-


ras, e uma prática, com 32 horas de voo, no fim das quais era feito o
famoso voo solo. Após isso, eram ainda realizadas l7 missões com a ex-
Seleção e especialização do pessoal 249

ecução de manobras mais complexas, como a operação em área restrita.


À fase do H-13, se concluída com êxito, sucedia a do UH-1H, o conheci-
do “Sapão”, que compreendia a carga horária de 24 horas de instrução
teórica e 27 horas de instrução prática. Ao término do curso, após re-
alizar um total de aproximadamente 70 horas de voo, o piloto estava
habilitado a exercer a função de 1º Piloto (1P) do H-13 e 2P do UH-1H. A
partir daí, iniciava-se a 3ª fase, na Base Aérea de Santa Maria, no 5º/8º
GAv, onde se realizava o estágio de manutenção da operacionalidade.
Na Marinha do Brasil, cabia ao CIAAN, localizado na Base Aérea
e Naval de São Pedro da Aldeia, a missão de especializar, aperfeiçoar e
subespecializar oficiais e praças para o exercício das atividades envol-
vidas pela Aviação Naval. A semelhança entre as filosofias de emprego
da aviação no Exército e naquela Força permitiu o aproveitamento da
Marinha, com poucas modificações ou adaptações curriculares.
O curso de pilotos era realizado também na Marinha em duas
fases. A primeira, desenvolvida nas instalações do CIAAN, por meio de
aulas teórico-práticas e viagens de instrução, perfazia 22 semanas; a se-
gunda, subdividida em instrução teórica e instrução prática de voo, era
realizada sob a coordenação do Centro de Instrução, no 1º Esquadrão de
Helicópteros de Instrução (HI), com a duração de 30 semanas.
Ainda no tocante aos oficiais, a especialização abrangeu os ge-
rentes de manutenção, de suprimentos e de aviônica oriundos do Qua-
dro de Material Bélico e da Arma de Comunicações, os médicos aerona-
vegantes e os engenheiros militares.
A especialização de graduados, como ocorreu com os oficiais, tam-
bém se desenvolveu com o inestimável apoio da Marinha e da Força Aérea.
No caso dos pilotos, a habilitação para o exercício pleno da es-
pecialidade de Aviação foi efetivamente obtida por ocasião da realiza-
ção dos estágios. Durante a execução destes, foram obtidos os requisitos
mínimos para o desempenho de função de 1P, que habilitava o militar
como comandante da aeronave e a executar as missões operacionais.

Na Marinha, o estágio de manutenção da operacionalidade se


desenvolveu na própria Base Aérea e Naval de São Pedro da Aldeia. A
exemplo do que ocorreu na FAB, os pilotos e mecânicos já formados par-
ticiparam de missões operacionais executadas pela Força Aeronaval e
nas atividades diárias das unidades onde se encontravam adidos.
250 Aviação no Exército - uma visão histórica

Em 1988, o Exército possuía uma plêiade de mais de 150


militares especialistas de Aviação, pequeno e seleto grupo de ide-
alistas sobre cujos ombros repousava a honrosa e histórica missão
de iniciar o voo da Força Terrestre rumo ao céu. A jornada se inicia-
ra em 1986. A árdua trajetória, característica nas ações de pionei-
rismo, foi percorrida com denodo e abnegação. Somente a vontade
consciente e animadora daqueles que se consagram resolutamente
à profissão e nela realizam um verdadeiro sacerdócio tornou pos-
sível o cabal cumprimento de missão imposta a cada um. Muitos
obstáculos foram transpostos. No entanto, outros certamente iriam
surgir. Eram homens de têmpera forte, compromissados com o fu-
turo, que souberam se portar como lídimos herdeiros dos exemplos
legados pelos que lhes precederam.
Este capítulo é antes de tudo uma justa homenagem aos pilo-
tos, gerentes e mecânicos, pioneiros da Aviação do Exército. Gostaría-
mos de citá-los e destacá-los um a um e ressaltar as dificuldades e as
vitórias obtidas dia a dia. A necessidade de não estender muito o prazo
de conclusão deste livro me conduziu à procura de um atalho que me
permitisse atingir meu objetivo. Encontrei-o no trabalho do tenente-
coronel Contreiras, ao qual já fiz referência, que coligiu uma grande
quantidade de depoimentos ao longo de alguns anos. Em decorrência,
solicitei-lhe a autorização para reproduzir trechos de alguns deles que
julguei mais adequados para contar a saga dos nossos briosos “asas”.
Não vou me eximir de igualmente inserir outros depoimentos de com-
panheiros que obtive ao longo das entrevistas realizadas por mim para
elaboração deste livro. Quando não houver citação ao trabalho do co-
ronel Contreiras, considere-se que o depoimento foi por mim toma-
do. Em consequência, ao longo deste capítulo os leitores encontrarão
“soltos” no texto algumas “caixas”, com relatos muito interessantes e
demonstrativos do período em que o pessoal da Aviação do Exército
se especializou e estagiou na Marinha e na Força Aérea. Eles atestam
igualmente, mais uma vez, o inestimável apoio daquelas Forças e o bri-
lhantismo dos nossos pioneiros.
Dizem as “más línguas” que os primeiros são os “piotários”
aqueles que enfrentam a “barra pesada”. Os que vêm depois, que percor-
rem os caminhos já desbravados, é que são os “pioneiros”. Os primeiros
roem os ossos para que os seguintes possam saborear o filé mignon.
Seleção e especialização do pessoal 251

O grande patrimônio de qualquer instituição, o seu maior


bem, é o homem. Nas Forças Armadas, essa verdade ganha uma di-
mensão bem maior. A qualidade do profissional é fator preponde-
rante para a eficiência dos exércitos. Com plena consciência desse
fato, ocorreram as atividades de seleção e especialização do pesso-
al da Aviação do Exército. A evocação dos profissionais das Forças
Armadas, em particular do meu Exército, me enche de emoção. Tal
sentimento me leva a reproduzir o texto que se segue e que orna o
site do Exército.

Senhor, umas casas existem, no vosso reino onde homens


vivem em comum, comendo do mesmo alimento, dormin-
do em leitos iguais. De manhã, a um toque de corneta, se
levantam para obedecer. De noite, a outro toque de cor-
neta, se deitam obedecendo. Da vontade fizeram renúncia
como da vida.
Seu nome é sacrifício. Por ofício desprezam a morte e
o sofrimento físico. Seus pecados mesmo são genero-
sos, facilmente esplêndidos. A beleza de suas ações é
tão grande que os poetas não se cansam de a celebrar.
Quando eles passam juntos, fazendo barulho, os cora-
ções mais cansados sentem estremecer alguma coisa
dentro de si. A gente conhece-os por militares...
Corações mesquinhos lançam-lhes em rosto o pão que co-
mem; como se os cobres do pré pudessem pagar a liberdade
e a vida. Publicistas de vista curta acham-nos caros demais,
como se alguma coisa houvesse mais cara que a servidão.
Eles, porém, calados, continuam guardando a Nação do es-
trangeiro e de si mesma. Pelo preço de sua sujeição, eles
compram a liberdade para todos e os defendem da invasão
estranha e do jugo das paixões. Se a força das coisas os im-
pede agora de fazer em rigor tudo isto, algum dia o fizeram,
algum dia o farão. E, desde hoje, é como se o fizessem. ‘Por-
que, por definição, o homem da guerra é nobre. E quando
ele se põe em marcha, à sua esquerda vai coragem, e à sua
direita a disciplina.’ (MONIZ BARRETO, Carta a El-Rei de
Portugal, 1893).
252 Aviação no Exército - uma visão histórica

As considerações acima ganham importância quando o assunto é


Aviação. A complexidade da atividade exige a participação de pessoal com o
mais alto grau de capacitação.

Todos os pilotos já cometeram erros, mas são bem


poucos os que estão vivos dentre aqueles que o cometeram em
momentos cruciais.

As diretrizes do general Baratta foram precisas e rigorosas em


relação à especialização do pessoal e englobaram desde a seleção até o
comportamento e o aproveitamento dos militares na realização dos cur-
sos. Exigia o máximo de entrega de cada um. Não havia lugar para erros.
A especialização do pessoal, oficiais e sargentos foi comple-
mentada com a realização de cursos previstos no âmbito do contrato
de aquisição das aeronaves. Esse assunto será objeto de abordagem no
capítulo em que tratarmos das cláusulas contratuais.

Nós não podíamos errar. Qualquer erro nessa


fase inicial poderia redundar no fracasso da implantação da
Aviação do Exército. Muita gente dizia: “Nós não temos a ca-
pacidade de fazer a manutenção dos nossos caminhões, dos
nossos jipes, dos nossos blindados, como é que nós vamos fa-
zer a manutenção dos helicópteros? Olha, lá em cima não tem
acostamento. A hora que der pane vai cair.”

Aos militares que foram matriculados nos cursos, na Marinha


e na FAB, foi distribuído um folheto com informações de caráter geral.
Dele vamos destacar as palavras finais:

Nunca é demais lembrar que somos hóspedes de uma Força


irmã e, como tal, nossos deveres e obrigações sobrelevam-
se no sentido de reconhecer todos os esforços e os sacrifí-
cios que estão sendo despendidos pela Mar/FAB em bene-
fício do Exército.
A gratidão é uma virtude nem sempre cultuada, mas impo-
sitiva para os militares do Exército Brasileiro, junto a todos
os integrantes da Marinha do Brasil/Força Aérea Brasileira.
Seleção e especialização do pessoal 253

O Exército confia em você.


Para o alto e para frente!

Os militares da Aviação do Exército complementaram suas es-


pecializações posteriormente, na Aerospatiale, Turbomeca, Thomson e
Helibras, entre outras empresas. O Exército formou também no Centro
de Medicina Aeroespacial da FAB os médicos especialistas.
O curso para Engenheiro de Armamento Aéreo foi realizado no
Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos,
São Paulo, com duração de 12 meses, e se destinava a oficiais diploma-
dos em Armamento pelo Instituto Militar de Engenharia.

Bom piloto é aquele que não tem grandes aventu-


ras aeronáuticas para contar.
Voar é a segunda maior emoção do mundo co-
nhecida pelo homem. Pousar é a primeira.
Se antes do embarque encontrar piloto velho em
aeronave nova, embarque tranquilo. Mas se encontrar aero-
nave velha com piloto novo... desista!
O bom piloto não é o que sai de uma situação de
emergência, mas o que não entra em uma.
O único momento em que o copiloto está acima
do piloto é quando a curva é para a esquerda.
O piloto bom não é aquele que possui apenas ex-
celentes habilidades, porém o que faz uso de seu excelente jul-
gamento para nunca precisar usar sua excelente habilidade.
Existe o piloto velho e o piloto audacioso, não o
piloto velho e audacioso.
Autor desconhecido

A adaptação dos cursos pela Marinha e pela Força Aérea ex-


igiu um grande esforço daquelas Forças. O curto espaço de tempo que
ambas tiveram para realizar o ajustamento dos currículos visando ao
atendimento das nossas necessidades as tornam ainda mais credoras do
nosso agradecimento e admiração.
Em alguns casos, os cursos eram previstos para pessoal com
formação aeronáutica anterior, o que obrigou de um lado a reformulação
254 Aviação no Exército - uma visão histórica

dos currículos; de outro, o grande empenho de nossos oficiais e grad-


uados para diminuir o gap de conhecimento, o que fizeram com muito
entusiasmo, tornando-os alvo da admiração e respeito de seus colegas
e instrutores.

O apoio da Marinha e da Aeronáutica, possível a partir de liga-


ções diretas entre os ministros militares, se propagou pelas respectivas
cadeias de comando com um único foco, ou seja, atender às solicitações
do Exército. Usando a gíria futebolística: eles mataram no peito e fize-
ram um golaço.
A realização dos cursos certamente representou um enor-
me desafio para todos os nossos militares pela multiplicidade das
pressões suportadas. De um lado, o EME, que desejava e exigia o
melhor aproveitamento de todos; por outro, o enfrentamento de
uma atividade completamente desconhecida. Sobre os ombros
dos selecionados, repousava também a responsabilidade de repre-
sentar o Exército em atividade realizada em outra Força, e este se
manteve muito atento ao desempenho de seus representantes, bem
como exigiu o mais alto grau de proficiência. A necessidade de en-
frentar cursos sobre áreas até então desconhecidas, o fantasma re-
presentado pela possibilidade de não se obter aproveitamento, em
particular nas provas de voo, e a pressão exercida pela busca de re-
sultados destacados se constituíam em pesadas cargas suportadas
pelos nossos militares, que souberam suplantá-las e obter resulta-
dos expressivos.
Sobre os alunos das turmas iniciais de oficiais e sargentos, os
pioneiros, pesava ainda o fato de serem os primeiros a enfrentar os de-
safios sem a possibilidade de utilizarem as “barbadas” passadas pelos
companheiros que os antecederam no curso. Na gíria militar, as “barba-
das” se constituem nas “dicas” que os alunos de cursos anteriores pas-
sam aos novos matriculados para tentar tornar menos tortuoso o cami-
nho daqueles que lhes sucedem.
Na etapa inicial, a partir de março de 1986, foi de suma
importância a ênfase na divulgação aos nossos militares dos man-
damentos da Segurança de Voo. Com a colaboração imprescindível
da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira, as primeiras tur-
mas de aeronavegantes do Exército, conhecendo a importância da
Seleção e especialização do pessoal 255

atividade de prevenção de acidentes aeronáuticos, puderam iniciar


a implantação dessa filosofia desde cedo, no 1º BAvEx. A partir de
1987, os oficiais começaram a frequentar os Cursos de Segurança
de Voo e os Estágios do Fator Humano e Material, que foram realiza-
dos no Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuti-
cos da Aeronáutica (CENIPA).
Em março de 1986, o Noticiário do Exército divulgava
a matrícula das primeiras turmas nos cursos de especialização
para pilotos de helicópteros na Marinha do Brasil e na Força
Aérea Brasileira. Tratava-se de um acontecimento histórico para
o nascimento da Aviação do Exército. Sobre o ombro daqueles
pioneiros, repousaria o futuro da Aviação. A responsabilidade era
imensa; as expectativas maiores ainda.
Decorridos somente quatro meses da aprovação do Plano
de Implantação da Aviação do Exército, tínhamos conseguido nesse
exíguo espaço de tempo elaborar as propostas dos critérios de se-
leção, submetê-las à aprovação do Departamento Geral do Pessoal,
publicá-las, divulgá-las, receber os requerimentos dos candidatos,
fazer a seleção de acordo com os critérios estabelecidos, trazer os
candidatos selecionados de diversas partes do País para os exames
no Rio de Janeiro, mobilizar as estruturas da Marinha e da Força Aé-
rea encarregadas da seleção física e psicológica, definir os candida-
tos aptos, publicar os resultados, tomar as providências decorrentes
para apresentação nos locais onde frequentariam os cursos e acertar
os detalhes de suas respectivas especializações com adaptações de
currículos, entre outras providências. O vulto das tarefas que em ou-
tras condições demandaria tempo considerável, em particular por se
tratar da interveniência das três Forças, só foi possível realizar em
tão curto espaço de tempo pelas ligações pessoais, sem burocracia,
iniciada pelo contato do nosso ministro com os das outras Forças, o
que se propagou pelos demais escalões. Foi um enorme trabalho que
exigiu muito esforço e dedicação.

O problema dos morros não é que eles são altos, o


problema é que eles são duros!
Não se espante com a altura do voo; quanto mais
alto mais longe do perigo!
256 Aviação no Exército - uma visão histórica

Todo piloto começa a carreira com um saco cha-


mado “sorte”, que está cheio, e outro chamado “experiência”,
que está vazio. O segredo é você encher o saco da “experiên-
cia” sem precisar esvaziar o saco da “sorte”.
As emergências para as quais você treina rara-
mente acontecem. A emergência para a qual você não treinou
é a que pode matá-lo.
Para muita gente o céu é o limite. Para quem é da
aviação o céu é o lar.
Três coisas que quando ditas por um piloto são
acidentes certos: estou com pressa; acho que dá e minha na-
morada está lá embaixo olhando.
Que o chão nunca seja meu destino, mas apenas
uma escala para meu próximo voo.
Autor desconhecido

Para que fique registrado, destacarei nominalmente os ofi-


ciais e sargentos que integraram as turmas pioneiras que realizaram
os cursos de piloto, gerente e mecânico na Marinha do Brasil e na For-
ça Aérea Brasileira. Vamos nos ater às turmas de 1986 e 1987, em rela-
ção às quais tive sob minha responsabilidade as propostas das normas
para a seleção e o acompanhamento dos exames dos candidatos. Não
podemos, e não desejamos, tirar das turmas seguintes o mesmo cará-
ter de pioneirismo.
A despeito de alguns eventos terem ocorrido antes na FAB, va-
mos iniciar nossos comentários sobre a fase de especialização pela Mari-
nha, respeitando a antiguidade entre as Forças.
Em 31 de março de 1986, com as presenças do general de Exér-
cito Rubens Mario Brum Negreiros, comandante Militar do Leste; do al-
mirante de Esquadra Hugo Stoffel, comandante em chefe da Esquadra;
do general de Divisão Angelo Baratta Filho, 3º subchefe do EME; do ge-
neral de Divisão Wilberto Luiz Lima; do general de Brigada Luiz Paulo
Fernandes de Almeida; do general de Brigada Adriano Aulio Pinheiro
da Silva; do contra-almirante Heitor Alves Barreira Junior; do contra-al-
mirante Pedro Steenhagen Filho; do comandante da Força Aeronaval e
do contra-almirante José Julio Pedrosa, foi realizada, no Centro de Ins-
trução e Adestramento Aeronaval, sob o comando do capitão de Fragata
Seleção e especialização do pessoal 257

Sergio Luiz Belmonte Loncan, a aula inaugural do 1º Curso de Aperfei-


çoamento de Aviação para oficiais do Exército Brasileiro destinado a
formar aviadores da Força para o exercício das funções de pilotagem de
helicóptero da recém-criada Aviação do Exército.
A aula foi proferida pelo vice-almirante Claudio José Correa
Lamego, diretor de Aeronáutica da Marinha, que, após fazer um breve
histórico sobre a outrora Aviação Militar, lembrou que os exércitos
modernos, bem como as marinhas, não podiam prescindir de suas aviações
táticas orgânicas para a consecução correta e adequada do aprestamento
de suas Forças. Enfatizou que somente dessa maneira poderiam ter o
completo domínio da ação de comando, a percepção de suas possibilidades
e das limitações para enfrentar o inimigo. Destacando a notável evolução
do emprego do helicóptero, fez votos de pleno sucesso aos oficiais-alunos,
ressaltando por fim que a “Marinha do Brasil envidaria o melhor dos seus
esforços para lhes transmitir a sua experiência ganha em mais de 20 anos
de operação com sua atual Aviação”. Concluiu dizendo que:

Este Centro de Instrução e Adestramento com ensinamen-


to técnico e o 1º Esquadrão de Helicópteros de Instrução,
cuidando da instrução de voo, têm excelentes condições
de lhes proporcionar sem falsa modéstia um dos melhores
cursos de piloto de helicópteros do mundo.

Integraram a primeira turma os seguintes militares:


Cap Inf Paulo Roberto de Moraes;
1º Ten Inf Atílio Paulo Ferraro;
1º Ten Inf Marcos Antonio Horta Ferreira;
1º Ten Inf Paulo John Garcez Moreira;
1º Ten Cav Carlos Esteve Bella;
1º Ten Cav Helton Silveira Pereira;
1º Ten Cav José Preto Cardoso Neto;
1º Ten Art Luiz Arnaldo Barros Pereira Simões;
1º Ten Art Laerte de Souza Santos;
1º Ten Art João Luiz Ribeiro Franco;
1º Ten Art Ricardo de Amaral Baptista;
1º Ten Eng Orlando Augusto Fleury; e
1º Ten Eng Fernando Luiz Perini.
258 Aviação no Exército - uma visão histórica

Na Marinha, o primeiro voo solo foi realizado em 5 de novembro


de 1986 pelo 1º Ten Inf Paulo John Garcez. O evento de significado históri-
co trouxe a todos os envolvidos na implantação da Aviação do Exército um
grande orgulho e reacendeu em todos nós a chama vibrante do pioneirismo.

O major Moraes recebe o “batismo”

O tenente Luiz Osvaldo Barros Pereira Simões distinguiu-se


como o primeiro lugar de sua turma. Ele seria mais tarde designado pi-
loto da Comissão de Recebimento de Material no Exterior.
A solenidade comemorativa da conclusão da primeira turma de
pilotos na Marinha foi recebida com entusiasmo por toda a Força. O even-
to simbolizava um novo marco na capacitação dos nossos quadros, que se
investiriam da nobre tarefa de alçar o Exército à 3ª dimensão, o espaço
aéreo. O ato foi marcado presença de autoridades civis e militares.
Seleção e especialização do pessoal 259

Solenidade de conclusão do primeiro curso de pilotos


da Aviação do Exército, na Marinha

Na oportunidade, as palavras dirigidas aos novos pilotos dão a


dimensão do evento:
Excelentíssimos senhores
vice-almirante Mario Cezar Flores (Com em Chefe da Es-
quadra) vice-almirante Wandyr das Neves Siqueira (D Aer
M) vice-almirante Murillo Cruz Guimarães de Souza Lima
(D Ens M) contra-almirante Pedro Steenhagen Filho (Com
For Aer Nav) contra-almirante Manoel Van Der Haegen da
Silva (Asst da MB na ESG)
senhores oficiais,
senhoras e senhores,
É com prazer e grande entusiasmo que venho à Base Aérea e
Naval de São Pedro da Aldeia para trazer a esta plêiade de
jovens oficiais sobre cujos ombros, a partir de hoje, passa a
pairar o honroso encargo de iniciar o voo da F Ter rumo ao
domínio da 3ª dimensão do campo de batalha as palavras
de confiança do Exército Brasileiro.
Hoje, coerente com a sua manifesta vontade de possuir meios
aéreos orgânicos, em decorrência de suas necessidades ope-
racionais, vê a Força Terrestre concretizar-se nova etapa de
implantação de sua Aviação. Após 46 anos da extinção da glo-
riosa Aviação Militar vê hoje o EB, pleno de exultação, o início do
ressurgimento de seus meios aéreos orgânicos através da vossa
diplomação. Justiça se faz ao afirmarmos que a consecução des-
te nosso antigo desiderato é fruto da vontade férrea, de decisão
260 Aviação no Exército - uma visão histórica

corajosa e da extrema perspicácia no vislumbre das nossas ne-


cessidades operacionais da nossa Força, do Exmo. Sr. ministro
do Exército. Consciente de que a aeromobilidade nos campos de
batalha da era moderna é fator imprescindível ao sucesso das
operações de uma F Ter, determinou, após estudos elaborados
pelo EME, a execução de medidas para a implantação da nossa
Aviação, atendendo antiga aspiração do Exército.
Os helicópteros constituem, hoje, meios de importância primor-
dial para o sucesso das operações em que se empenha qualquer
força militar, conforme se tem observado nos mais recentes con-
flitos bélicos.
Nesta oportunidade, o nosso preito de reconhecimento à Ma-
rinha do Brasil pelo inestimável apoio na formação de nosso
pessoal, sem o qual extremamente árdua seria a colimação do
nosso objetivo. Ao Exmo. Sr. ministro da Marinha o agradeci-
mento do Exército pela decisão e determinação da cooperação
que possibilitou efetivamente a formação dos nossos pilotos.
Ao Exmo. Sr. chefe do Estado-Maior da Armada o reconheci-
mento do Exército pelo planejamento, coordenação e ordens
que vieram possibilitar ao Cmdo da Força Aeronaval o cum-
primento da missão de executar o curso dos nossos oficiais.
Em especial nossos agradecimentos ao Almte STEENHAGEN,
Cmt da Força Aeronaval, pela extrema compreensão de nos-
sos problemas e pelo atendimento sempre pronto aos nos-
sos interesses e aspirações, ainda quando as mesmas impli-
cavam em dificuldades quase inarredáveis. A este pugilo de
oficiais de escol, Cmt e demais oficiais da Força Aeronaval, a
quem estiveram afetas as tarefas de adestramento de nossos
pilotos o preito do eterno reconhecimento do Exército.
Aos novos pilotos quero ressaltar que no desenvolvimento
da implantação da nossa Aviação formamos a consciência
de que como parte significativa da componente “PESSOAL”
constitui-se no valor de maior sensibilidade, em face da ele-
vada importância que representam, como suporte do nosso
poder aéreo orgânico nascente. O homem sempre será o
elemento principal. Não se lhe poderá negar o que de me-
lhor existe em termos de formação profissional.
Seleção e especialização do pessoal 261

Por isso temos a certeza de vosso sucesso.

A trajetória que percorreis, acompanhada por nós dia a


dia, nos dá a exata dimensão do vosso valor. Os inúmeros
obstáculos que tivestes que suplantar dão testemunho de
vossa perseverança, esforço, dedicação extrema e demons-
tram a vontade consciente e animadora daqueles que se
consagram resolutamente à profissão e nela realizam, num
verdadeiro sacerdócio, o exato cumprimento do dever. Sem
dúvida, os obstáculos não deixarão de existir. Se a luta nos
primórdios da Aviação Militar foi dura, agora também o
será. Somente muita dedicação, esforço e perseverança de
cada um e um acendrado espírito de equipe permitirão o
desenvolvimento que se espera da nossa Aviação.
O futuro vos reserva desafios que irão exigir grande dose
de renúncia e desprendimento. Nossa confiança é inabalá-
vel em que sabereis portar-vos como lídimos continuadores
dos precursores da outrora Aviação Militar.
Os exemplos de perseverança, dedicação, abnegação e amor à
profissão dos nossos companheiros da Força Aeronaval serão
seguidos e imitados por nossos jovens aviadores que aprende-
ram aqui na Base Aérea e Naval de São Pedro da Aldeia aquilo
que Deus legou somente aos pássaros, o domínio dos céus.
262 Aviação no Exército - uma visão histórica

Aprenda com os erros dos


outros ou você não viverá o suficiente
para errar como todos eles.
Só quem voa entende por-
que os pássaros cantam.
É bem melhor estar aqui
embaixo desejando estar lá em cima do
que estar lá em cima desejando estar
aqui embaixo.
A única situação em que
você pode achar que tem combustível
demais é quando tem um princípio de
incêndio.
Decisões acertadas vêm
com a experiência, e a experiência vem
com decisões erradas.
Autor desconhecido
Seleção e especialização do pessoal 263

Segundo o então tenente Simões, ao qual já nos referimos an-


teriormente:

Após a conclusão do curso de pilotos na Marinha, como íamos


lá permanecer, pois as instalações do BAvEx ainda estavam em
construção, tínhamos duas opções. A primeira era a perma-
nência no Esquadrão de Instrução (HI) e a segunda ir para o
Esquadrão de Helicópteros de Emprego Geral, o HU. A segun-
da alternativa nos daria a opção de nos qualificarmos em outro
modelo, o Esquilo, já que na fase de formação nos qualificamos
no Bell Jet Ranger 206. Escolhi ficar no HI. Dessa forma, com
outros companheiros que lá permaneceram, também tive a
oportunidade de atuar como instrutor, na parte teórica (Grou-
nd School), de outras turmas do Exército e da própria Marinha.
Como éramos considerados como oficiais do Esquadrão, rece-
bíamos as mesmas missões que os oficiais de Marinha, inclusi-
ve concorríamos às diversas escalas de serviço. De tempos em
tempos, oficiais almirantes que serviam em outras unidades,
para não perderem as suas qualificações, vinham a São Pedro
da Aldeia voar, e nós éramos designados como instrutores. Voei
com um almirante médico que a cada três meses aparecia para
voar. Os pilotos de Marinha do Esquadrão não gostavam desse
tipo de voo. Primeiro porque voar com um almirante exigia mui-
to tato, e depois, no caso particular do almirante médico, ele não
possuía a mesma destreza do que um oficial operacional. Nessas
situações nos perguntavam ‘alguém do Exército é voluntário?’, e
todos nós nos apresentávamos. Queríamos voar, ganhar expe-
riência e, dessa forma, aceitávamos qualquer missão. Em toda
oportunidade que aparecia, por mais
‘boca podre’ que fosse, desde que nos
permitisse voar, éramos voluntários.
Até a lavagem dos compressores das
aeronaves nós ‘piruávamos’ (gíria
militar que significa ser voluntário
para cumprir alguma missão).
A lavagem do compressor ocorria ao
término da utilização da aeronave no
264 Aviação no Exército - uma visão histórica

dia, antes de seu recolhimento para o hangar. Em função da ma-


resia, havia necessidade da limpeza diária dos compressores.
Normalmente, ocorria ao final do expediente. Após a injeção de
líquido específico, havia a necessidade de dar partida nos mo-
tores e funcionar a aeronave por volta de 10 (dez) minutos. A
manobra, além de exigir os mesmos procedimentos de cabine
de um voo normal, nos agregava uma fração de horas de voo ao
currículo. Não nos importávamos que a lavagem do compressor
na maioria das ocasiões implicasse na nossa permanência na
Base além do horário do expediente. O importante era a experi-
ência. Precisávamos estar preparados para exercer nossas fun-
ções quando fôssemos para o Batalhão. Participamos da Opera-
ção Dragão e outras manobras típicas de Marinha. Foram quase
2 (dois) anos e 8 (oito) meses, incluindo o período de nossa for-
mação, onde operamos como se fôssemos pilotos de Marinha.

Oficiais em curso na Marinha recebem


a visita de autoridades militares

O segundo curso de pilotos pioneiros na Marinha teve início em


23 de março de 1987 e foi concluído em 1º de julho de 1988. Participa-
ram do curso os militares abaixo nominados:
Cap Cav Ibere Gomes de Freitas;
Cap Cav Carlos Alexandre Cadaval Pereira da Rocha;
1º Ten Com Antonio Macedo Figueiredo Junior;
1º Ten Art Eduardo Diniz;
Seleção e especialização do pessoal 265

1º Ten Cav Lourival Carvalho da Silva;


1º Ten Inf Hoover Lira Sales;
1º Ten Cav José Aparecido Magane;
1º Ten Cav Nilson Lopes Souto;
1º Ten Art Edison José Milanello;
1º Ten Art Marcos Antonio Borges Cordeiro;
1º Ten Cav Victor Douglas da Silva Oliveiral;
1º Ten QMB Edmir Rodrigues;
1o Ten Art Eduardo Rodrigues Schneider; e
1º Ten Eng Luiz Cláudio Brunhago Madruga.

Segunda turma de pilotos na Marinha

O curso foi muito bom, porém nós fomos submetidos


a uma pressão conjuntural porque nós éramos da primeira tur-
ma de oficiais do Exército na recém-criada Aviação do Exército,
fazendo curso em uma Base Aérea da Marinha. Essa pressão foi
exercida pelo 3° subchefe do EME, Gen Baratta, responsável pelo
curso. O general disse que nós tínhamos que tirar no mínimo oito
em todas as provas. (Entrevista concedida pelo Ten Cel Preto, em
13 de agosto de 2005).
História oral da Aviação do Exército, do TC Contreiras
266 Aviação no Exército - uma visão histórica

Lembre-se, sempre, que você pilota com a cabe-


ça, e não com as mãos. Nunca permita que sua aeronave leve
você a algum lugar onde sua cabeça não tenha chegado cinco
minutos antes.
O bom piloto é aquele que tem o número de pousos
igual ao de decolagens. No mundo, quanto mais se vive mais se
aprende; na aviação, quanto mais se aprende mais se vive.
Autor desconhecido

Alunos do curso de pilotos preparados para o exercício


de sobrevivência no mar
Seleção e especialização do pessoal 267

[...] a Marinha nos tratou como seus oficiais. Do


uniforme, recebíamos macacão novo, coturno novo, luva de
voo nova, capacete novo. Tudo que o oficial de Marinha re-
cebia para fazer o curso nós também recebíamos, não tinha
diferença nenhuma. A única distinção entre os militares das
duas Forças era o “courinho”, plaqueta de identificação do ae-
ronavegante confeccionada em couro, utilizada no macacão,
que da Marinha era marrom e do Exército preta. (Entrevista
concedida pelo Cel Garcez, em 9 de dezembro de 2005).
História oral da Aviação do Exército, do TC Contreiras

Instrução de sobrevivência no mar

[...] foi a busca do desconhecido, a preocupação era


muito grande porque se alguém fosse reprovado ficaria com
uma carga cármica dali para o resto de sua carreira porque o
Exército estava de olho, os tenentes receberam muita responsabili-
dade. (Entrevista concedida pelo Ten Cel Horta, em 13 de outubro
de 2005).
História oral da Aviação do Exército, do TC Contreiras

Outro aluno, considerado nervoso pelos compa-


nheiros, tinha um instrutor que também era considerado nervo-
so. Uma vez o aluno, ainda com poucas horas de voo, vinha para o
pouso. Como é normal, estava com “dificuldade para pousar a ae-
ronave no pátio e foi juntando gente e demorando para pousar, e
268 Aviação no Exército - uma visão histórica

o instrutor não conversou; deu uma aloprada, cortou o motor, e


a aeronave pousou de qualquer maneira. (Entrevista concedida
pelo Cel Laerte, em 22 de outubro de 2005).
História oral da Aviação do Exército, do TC Contreiras

A proficiência dos nossos pilotos foi tão destacada que, durante o


período de estágio, realizado depois da conclusão do curso de piloto, eles
participaram, totalmente integrados, das atividades nas subunidades de
Marinha onde se incorporaram após o curso, atuando nas missões de voo.
Inicialmente, as tripulações eram mistas, mas se chegou a organizar tri-
pulações exclusivas do Exército. Em razão da reconhecida competência de
nossos pilotos, a parte teórica do curso para segunda turma do Exército, o
denominado Ground School, foi ministrado pelos então tenentes Ferraro,
Laerte e Simões, que tinham se brevetado na primeira turma.

Estávamos em uma viagem do Estágio Echo, o de


voo instrumento, em um procedimento de descida VOR, em Ribei-
rão Preto. Meu instrutor era o Ten FN Fanzeres, do HI. No debrie-
fing da missão, o instrutor me encheu de “acima da média”; acho
que metade da avaliação. Ao finalizar a avaliação, o Ten Fanze-
res me perguntou o que eu tinha achado do voo e do procedi-
mento de descida. Respondi-lhe que não havia entendido porque
eu demorara tanto para enquadrar a final, se eu tinha cravado
o “bank”, a razão de descida e o “pau e bola” estavam cravado e
centrada o tempo todo, respectivamente. O tenente coçou a cabe-
ça, pensou um pouco e, ao final, perguntou-me:
– Para que lado você fez a curva?
Respondi-lhe:
– Para a direita.
Ele pegou a folha do procedimento e disse:
– Era para a esquerda. Ficha rosa recheada de
acima da média!!!
Ele pegou nova ficha de avaliação e me cravou o
insuficiente no item correspondente.
Maldita incontinência oral!!!
Por que não fiquei quieto?
Já era tarde.
Seleção e especialização do pessoal 269

Só sobrou a noite na maravilhosa Ribeirão Preto


e um chopp gelado no Pinguim para afogar as mágoas...
Depoimento do 1º Ten QMB Edmir Rodrigues

O primeiro curso de pilotos do Exército na FAB foi iniciado em


30 de maio de 1986, em cerimônia presidida pelo comandante Militar do
Sudeste, general de Exército Sebastião Ramos de Castro. Ele terminou em
23 de fevereiro de 1987. No entanto, no ano anterior, o voo solo do capi-
tão Marcos, em 22 de outubro, encerrava um enorme simbolismo, cons-
tituindo-se em evento que marcava o primeiro solo de piloto da nascente
Aviação do Exército. A despeito de o coronel Telles ter a primazia de ser
o primeiro piloto a brevetar-se, esse curso foi realizado em organização
civil, enquanto o do capitão Marcos ocorreu em ambiente militar.

A maior dificuldade do voo era certo clima de


terror que alguns instrutores criavam. Quando o camarada
olhava a escala de voo e via que ele ia voar com o SEM, que era
o Cap Sindorf, ou EST, que era o Ten Esterlino, o cara já ficava
preocupado. (Entrevista concedida pelo Ten Cel Bispo, em 19
de dezembro de 2005).
História oral da Aviação do Exército, do TC Contreiras

O encerramento do primeiro curso de pilotos de helicópteros


ministrado pela Força Aérea Brasileira para oficiais do Exército marcou
a habilitação da primeira turma de pilotos do Exército após a extinção
da Aviação Militar, em 1938. Plenos de orgulho e conscientes de sua im-
portância para o futuro da Aviação do Exército, a primeira turma de pi-
lotos pioneiros brevetados era constituída pelos seguintes oficiais:
Cap Inf Antonio Marcos Moreira Santos;
1º Ten Inf Washington Bispo Tavares;
1º Ten Inf Luiz Antonio Cauduro Souza;
1º Ten Inf Ygor Moreira Lima;
1º Ten Cav Douglas Bassoli;
1º Ten Cav Franklin Campos de Oliveira;
1º Ten Cav José Carlos Braga Avellar;
1º Ten Cav Luis Azambuja Contreiras Rodrigues;
1º Ten Art Moisés Cavalcanti de Albuquerque Filho;
270 Aviação no Exército - uma visão histórica

1º Ten Art Alvimar Alvair da Silva Costa;


1º Ten Art Marcilio Pereira de Oliveira;
1º Ten Com Alberto de Andrade Oliveira; e
1º Ten Com Mauro Raimundo Marques Silveira.

Em pé, da esquerda para a direita, Ten Bassoli, Ten Avellar, Cap Marcos,
Ten Ygor, Ten Mauro Marques e Ten Alvair; agachados, Ten Albuquerque,
Ten Contreiras, Ten Bispo, Ten Cauduro, Ten Marcilio e Ten Franklin

Primeira turma de pilotos na Força Aérea Brasileira


Seleção e especialização do pessoal 271

Capitão Marcos decola para o voo solo

Capitão Marcos cumprimentado por seu instrutor


272 Aviação no Exército - uma visão histórica

Oficiais-alunos do 1º curso de pilotos na FAB

Para o então capitão Marcos uma manobra mar-


cante foi o voo pairado. Segundo ele, “pairar é uma coisa mag-
nífica”. O helicóptero balançando “vai para um lado, vai para
o outro, o quadrado fica pequeno, a gente bate de um lado,
bate de outro, o instrutor assume, mostra que é fácil, só para
diminuir o aluno, bota um dedo em cima do cíclico – é fácil, é
assim que fica”, e você nunca consegue pairar. O voo solo foi
um momento ímpar.
O Cap René, oficial de Operações do Esquadrão,
queria que o Cap Marcos fosse o primeiro a solar. Como a
cerimônia contaria com a presença do chefe do EME, Gen
Pamplona, o voo de check foi extremamente rigoroso. En-
fim, o voo solo ocorreu com sucesso no dia 22 de outubro
de 1986. O Cap Marcos descreve a emoção do seu voo solo, o
primeiro da recém-criada Av Ex, caracterizando que o Exérci-
to tinha voltado a ter asas. Os demais alunos que tinham sido
seus cadetes quando era instrutor da Seção de Instrução Es-
pecial (SIEsp) da AMAN gritaram “para a água, para a água”
jogando-o no canal entre Santos e Guarujá.
História oral do Exército, do TC Contreiras
Seleção e especialização do pessoal 273

Segundo o coronel Bispo:

Durante o seu curso de piloto, em instrução de voo,


o instrutor às vezes batia no capacete quando ele fazia uma ma-
nobra incorreta e o chamava de jumento, exigindo que ele man-
tivesse a atitude do helicóptero, o que era difícil porque o Bell
47, o H-13, tinha uma grande bolha e não tinha onde marcar
as referências. Além disso, tinha que controlar a rotação com a
manete e, normalmente, o aluno olhava mais para o tacômetro
no painel do que para fora, como seria o correto. Para agravar a
dificuldade, os velhos helicópteros, já em fase de desativação, ti-
nham problemas nos comandos. (Entrevista concedida pelo Ten
Cel Bispo, em 19 de dezembro de 2005).
História oral do Exército, do TC Contreiras

Elogios aos instrutores nunca são unânimes, principalmente


quando se trata daqueles mais rígidos, com maior nível de exigência.
O desempenho das atividades de instrutor e de juiz de futebol guarda
algumas similitudes, pontos de tangência. Ambos devem exigir o cabal
cumprimento das regras e regulamentos para que os “instruendos/
atletas” desempenhem seus papéis com o máximo de eficiência e
segurança. Suas atitudes sempre provocam uma reação que suscitam
“elogios” da parte do “instruído ou arbitrado” que, em muitas das
ocasiões, injustamente, se dirigem às respectivas genitoras “culpando-
as de tê-los trazidos ao mundo”. Aos instrutores e juízes deveria ser
permitido registrar uma progenitora fictícia a quem seriam endereçados
esses “elogios”, deixando as naturais livres dessa carga negativa. Mas,
no final das contas, os mais exigentes são os grandes responsáveis
pela beleza do espetáculo. São eles que garantem a superior qualidade
dos “instruendos/atletas” e que asseguram a qualidade do seu
desempenho. Nesse momento, a nossa respeitosa e agradecida
homenagem aos instrutores da Marinha e da Força Aérea Brasileira que,
com inquestionável competência, transmitiram aos nossos “asas” os
conhecimentos que lhes permitiram tornar nossa Aviação a grande ilha
de excelência do nosso Exército.
Em outro depoimento sobre o curso em Santos, disse o coronel
Contreiras:
274 Aviação no Exército - uma visão histórica

[...] a parte prática de voo foi realizada na Base Aérea de


Santos, onde se localizava o 1º/11º GAv, responsável pela
instrução de voo de helicóptero para os pilotos da FAB.
Tivemos uma rápida adaptação, estudando a aerodinâ-
mica do helicóptero e o funcionamento do BELL OH-13,
o famoso “Bolha”. Fomos a única turma do Exército que
teve a honra de voar o aparelho, já em fase de desativa-
ção. A passagem em Santos foi mais tensa que o perío-
do em Pirassununga. O contato com os oficiais da FAB,
principalmente com os instrutores, seria mais frequente
devido à atividade de voo. Não percebi qualquer comen-
tário contrário à Av Ex. Os instrutores assumiram a mis-
são, se empenharam na sua execução, dedicando o tempo
necessário para a instrução, transmitindo seus conheci-
mentos e nos deram toda a atenção solicitada. Choques
surgiram por causa da diferença de cultura e postura
entre os componentes das duas Forças. O fato mais gra-
ve ocorreu em voo. Um oficial do Exército interrompeu
rispidamente a instrução porque o instrutor da FAB co-
meçou a bater com a mão no capacete do aluno cada vez
que ele cometia um erro. O comportamento do instrutor
parecia ser aceito na escola. Depois ficamos sabendo que
já tinha ocorrido em menor escala com outros alunos. A
instrução foi interrompida, e o instrutor conduziu o heli-
cóptero de volta para a Base. A ocorrência foi superada, e
os voos prosseguiram.
Sou testemunha da dedicação e empenho dos instruto-
res na nossa formação. Apresentei, em diversas opor-
tunidades, dificuldades na execução das manobras,
não atingindo o nível de proficiência previsto para o
período. Por sorte minha, havia uma manifestação de
interesse do Exército que a maioria dos pilotos tivesse
sucesso. Em função dela, tive várias horas-extras além
do previsto nas normas de ensino. Tive todo o apoio do
Maj Marcos, que intercedeu junto à Seção de Operações
para conceder horas a mais. Também fui escalado com o
instrutor que tinha mais facilidade com as ‘causas impossíveis’,
Seleção e especialização do pessoal 275

ou seja, os alunos problemáticos. Quase no final do cur-


so, eu ainda tinha dificuldade de fazer o táxi, variando
a altura no deslocamento. O instrutor me mandou fa-
zer uma hora de táxi sobre a pista de pouso e no final
me aprovou. O voo no H-13 era bem difícil. O aparelho
teve seu primeiro modelo fabricado em 1947. Os equi-
pamentos da FAB eram bem antigos e muito exigidos
por causa da instrução. O H-13 não tinha o Fuel Control
Unity (FCU). Tinham acelerador. Cada movimento do co-
letivo tinha que ser acompanhado da respectiva rotação
do manete de combustível para manter a rotação, que
era a maior preocupação do aluno. Por causa da impor-
tância dessa aceleração, durante o briefing, um instru-
tor demonstrava com os braços o efeito da rotação na
sustentação, encolhendo os braços para significar que
a sustentação diminuía quando a rotação caía, como se
os rotores estivessem encolhendo. A demonstração era
cômica para alegria dos alunos, que se divertiam à custa
do empenhado instrutor, repetindo exageradamente os
gestos dele. Uma vez fui escalado para voar com esse
instrutor e tive que me controlar e não rir enquanto ele
repetia, didaticamente, a lição.
Como em qualquer universo, existiam todos os tipos de
instrutores. Alguns mais cordatos, outros mais exigentes.
Existiam aqueles que o aluno começava a tremer no dia an-
terior, quando lia no Plano Diário de Voo (PDV) que estava
escalado com aquele instrutor.
O curso deveria terminar no final de 1986, mas só en-
cerrou no início do ano seguinte. Contribuíram para o
atraso a turma de pilotos da FAB, que teve prioridade na
formação e o fato de que o esquadrão estava recebendo
as aeronaves Esquilo em substituição aos H-13. Quando
chegamos a Santos, alguns instrutores estavam em Itaju-
bá, na Helibras, realizando o voo no Esquilo. Depois esses
instrutores foram ministrar a instrução para os demais
instrutores. A segunda turma que realizou o curso em
Santos já fizera o voo no Esquilo.
276 Aviação no Exército - uma visão histórica

O clima em Santos também não colaborou. Como é co-


mum para a época, temporais de verão atrapalhavam o
voo. Dependendo do instrutor, o aluno ficava até aliviado
quando o voo ‘melava’, ou seja, era cancelado devido às
condições meteorológicas. No final do ano chegou a San-
tos a turma da FAB. Como eram tenentes e estavam na
mesma condição de alunos, tivemos bom entrosamento.
Fomos encontrar alguns deles depois em Santa Maria. O
esquadrão, apesar de não ser operacional, foi acionado
para ‘caçar boi no pasto’ como ficou conhecido o even-
to. Os fazendeiros foram acusados de esconderem o gado
para especular, e a ordem do Governo foi confiscar os
bois. Para isso empregaram os helicópteros UH-1H do
esquadrão para sobrevoar fazendas do Mato Grosso, pro-
curando gado gordo.
Desde o início do curso ficamos adidos a 2ª Brigada
de Artilharia de Costa e Antiaérea, mas tivemos pouco
contato com os oficiais da guarnição devido à distân-
cia. Participamos de uma confraternização organizada
pela brigada no clube Ilha Porchat, creio que para co-
memorar o Dia do Exército. As visitas eram frequentes.
Sentíamo-nos como aves raras. Mas o acompanhamento
era importante, tanto para a coordenação como para os
alunos, que sempre desfiavam um rol de lamentações e
apresentavam seus pleitos.
Um dos pontos altos do curso foram os voos solo. O pri-
meiro foi o voo do Cap Marcos. Não recordo qual autori-
dade estava presente. O fato foi registrado no jornal local.
Antes de partir para Santa Maria, fizemos alguns voos no
UH-1H. Fizemos um voo de navegação Santos-São Pedro
da Aldeia-Santos no H-13. A navegação do UH-1H foi feita
na região de Pirassununga. Ficamos alguns dias alojados
na AFA para cumprir essa etapa. A conclusão do curso foi
muito comemorada, principalmente com o recebimento
da tão almejada águia. O brevê da antiga Aviação Militar
reestilizado. Como bem ressaltou o Cel Silva Maia, não
recebemos o brevê da FAB. A desculpa era de que o “H”
Seleção e especialização do pessoal 277

que os pilotos da FAB usam como referência ao curso de


piloto de helicóptero simbolizava operacionalidade, que
não era nosso caso. Alguns pilotos do Exército se anteci-
param e adquiriram por conta própria o brevê, mas creio
que o fato tornou-se público e os responsáveis recolhe-
ram os exemplares disponíveis. O fato é que anos depois
um comandante do 1/11º GAv veio a Taubaté entregar
os brevês para os pilotos. Esse oficial da FAB tomara co-
nhecimento do ocorrido e concluiu que era uma injustiça.
Alguns pilotos que tinham feito curso em Santos foram
convocados, inclusive eu, para receber o brevê simboli-
camente em Taubaté.

Em 1987, foram fixadas mais 24 vagas para prosseguimento da


especialização de pilotos, sendo 14 na Marinha e 10 na Força Aérea. Do
total, duas destinavam-se a capitães com curso da Escola de Aperfeiçoa-
mento de Oficiais do Exército.
O acerto das decisões quanto à formação na Marinha e na FAB
vem sendo ratificado ao longo dos anos pela excepcional qualidade de
nosso pessoal, conforme demonstra o baixo índice de acidentes e o alto
grau de disponibilidade das nossas aeronaves. Além disso, a integra-
ção, a fusão e a adaptação das doutrinas de especialização adotadas por
aquelas Forças permitiram o estabelecimento de uma doutrina própria
para a Aviação do Exército.
Em 1986, foram formados 25 pilotos, 8 gerentes e 45 sargentos.
Em 1987, seriam mais 25 pilotos, 6 gerentes, 2 médicos de aviação, 1
engenheiro de armamento e 32 sargentos, além dos oficiais designados
para o comando e subcomando do 1º BAvEx.

Gerentes
Tão importante como a função de voar executada pelos pilo-
tos é a de fazer voar, responsabilidade de gerentes e mecânicos. A eles
compete a nobre missão de manter as aeronaves em condições de ope-
ração de modo que os pilotos possam explorar todas as suas capacida-
des com segurança.
278 Aviação no Exército - uma visão histórica

Passei algum tempo angustiado buscando nos recônditos da


minha já gasta memória as razões pelas quais resolvemos estabelecer
a função de gerente, que tem se mostrado de grande importância para
a Aviação do Exército. A criação da figura do gerente nas áreas de ma-
nutenção aviônica e suprimento era um dos eventos que mais preocu-
pações me provocava. Não conseguia lembrar-me como havia ocorrido.
Não tinha nítida em minhas lembranças a cadeia de acontecimentos que
levou a comissão a criá-la, já que ela não existia com essa denominação
na Marinha e na Força Aérea.
Somente após uma visita ao coronel Wanderley, na qual tive-
mos a oportunidade, depois de um longo tempo que não nos falávamos
pessoalmente, de rememorar nossa passagem nas comissões (para Es-
tudar a Implantação e de Implantação da Seção de Aviação do Exército),
bem como na Seção de Aviação do Exército, pude recuperar a sequência
dos fatos que nos induziram à criação da função. O Wanderley, nossa
amizade me permite assim tratá-lo, além de uma memória prodigiosa,
permaneceu durante muito mais tempo do que eu ligado à Aviação do
Exército. Segundo ele, tudo começou com um trabalho na área de pes-
soal, do qual eu participei e não me lembrava, em que se estabeleceram
os perfis dos pilotos e do pessoal de apoio para a Aviação do Exército,
que tiveram como base os dados colhidos em estudos sobre a Aviação
Ligeira do Exército francês. Por haver na aviação francesa cargo similar,
ainda que com outra denominação, o assunto começou a nos chamar
a atenção. O tema viria a ser objeto de tratamento e sedimentação du-
rante o ciclo de viagens realizado pela Comissão de Estudo para a Im-
plantação, nas quais compreendemos a importância de que houvesse
um oficial destinado a coordenar os trabalhos de manutenção, que já
se afiguravam para nós de grande complexidade e importância para a
operacionalidade da Aviação. Com os contatos mantidos com o Departa-
mento de Manutenção da Força Aeronaval, nossas convicções se fortale-
ceram. Na FAB, o tema não prosperou, pois aquela Força não concordava
em realizar um curso com esse objetivo, considerando que a sistemática
não era adotada. Na Marinha, o desejo de colaboração irrestrita com a
implantação da Aviação do Exército permitiu que obtivéssemos a anu-
ência e o apoio para a formação do novo cargo.
Após o ciclo de visitas inicial, retornamos à Força Aeronaval, eu
e o Wanderley, onde adquirimos a certeza da necessidade de especializar
Seleção e especialização do pessoal 279

elemento que pudesse coordenar as complexas atividades de manuten-


ção, dos equipamentos de aviônica e suprimento. Decidida a necessidade
de criar a função, faltava definir uma designação para ela. O assunto foi
por nós levado ao conhecimento do coronel Marcello, surgindo desse con-
tato a denominação de gerente. A ideia foi submetida ao coronel Saraiva,
chefe da comissão, que a aprovou, surgindo o novo cargo.
Os cursos de gerentes englobavam as especialidades de Manu-
tenção, Suprimentos e de Aviônica. Foram realizados inicialmente na
Marinha do Brasil, na Base Aérea de São Pedro da Aldeia. Para os can-
didatos aos cursos de gerente de Manutenção e de Suprimentos era exi-
gido que possuíssem, preferentemente, curso de extensão de Material
Bélico; para os candidatos ao curso de Aviônica, curso de extensão de
Manutenção de Material de Comunicações.

Curso de motores Arriel para gerentes de manutenção na Turbomeca, em


Jacarepaguá, no Rio de Janeiro; da esquerda para a direita, Ten Alievi, Ten
Alexandre, Ten Waldino, Ten Tramontin e o técnico da Turbomeca

A segurança de voo é montada sobre um tripé


cujas pernas são a qualidade do produto, a eficiência opera-
cional e a integridade da manutenção.
A missão da perna “manutenção” é preservar o
nível de segurança intrínseco da aeronave, evitando que a sua
280 Aviação no Exército - uma visão histórica

utilização e o desgaste decorrente comprometam a segurança


de voo. A manutenção colabora significativa e decisivamente
para a segurança. Quando ela não funciona perfeitamente, o
tripé corre um sério risco de desabar.

1º curso do manual THM do Esquilo para gerentes de Manutenção na He-


libras; em pé, da esquerda para a direita, Ten Waldino, Suzuki, Sr. Pessoto,
da Helibras, majores Rios e Kyota; agachados, Ten Alievi, Ten Alexandre, Ten
Alberto, Ten Tramontin, Ten Avena e Ten Freire

Ao gerente cabe a responsabilidade de planejar, coordenar


e controlar as necessidades relacionadas às suas respectivas áreas. A
despeito da inexistência de currículos específicos nas demais Forças
Singulares, os militares matriculados puderam, durante seus respectivos
cursos, absorver uma gama considerável de conhecimentos que lhes
permitiram mais tarde executar no 1º BAvEx suas funções com a eficácia
requerida. A adoção da especialidade certamente colaborou para o
baixo índice de acidentes ocorridos na Aviação do Exército. Da leitura
dos capítulos referentes à formação dos nossos militares na Marinha
e na FAB, o leitor pode inferir que a despeito do reconhecimento da
necessidade de um oficial para coordenar as atividades de manutenção
havia uma diferenciação no enfoque da sua formação. Enquanto na
Marinha o oficial era especializado no exterior, na Força Aérea existiam
duas correntes. Uma defendia que o oficial fosse especializado para tal,
ainda que o curso ocorresse no âmbito da própria Força. A segunda
considerava que o oficial surgiria como consequência do fluxo de carreira
Seleção e especialização do pessoal 281

do sargento mecânico. A conclusão fundamental é que ambas as Forças


estavam conscientes da necessidade desse indivíduo de enquadramento,
responsável pelas atividades de coordenação da manutenção. Do atento
estudo de análogas considerações, também chegamos à conclusão de
que seria imperiosa a criação da função. A originalidade ficou por conta
da denominação que, no nosso caso, passou a ser de gerente. Optamos
pela especialização de oficial em curso específico.

Equipe de manutenção do 1º BAvEx. O primeiro, à direita,


é o Ten Valdino, gerente de manutenção

Cumpre-me fazer neste momento uma ressalva sobre uma crí-


tica, que julgo injusta e inapropriada, feita em depoimento, constante
do trabalho do coronel Contreiras, sobre o desenvolvimento do curso de
gerente na Marinha. A especialidade de gerente por nós idealizada não
era objeto de formação pelas demais Forças Singulares. Não obstante
isso, imbuída do mais alto espírito profissional e de cooperação, a Mari-
nha aceitou absorver os pesados encargos decorrentes e demonstrou a
máxima eficiência, fato atestado pela inquestionável qualidade dos nos-
sos gerentes. Além do curtíssimo tempo de reação, o curso de gerente
não era de funcionamento rotineiro, e a Marinha precisou adaptar pro-
cedimentos. É normal que, na época, partidas de jovens que via de regra
são imbuídos de mordaz senso crítico, as críticas ocorressem. O que me
282 Aviação no Exército - uma visão histórica

parece de grande injustiça é tanto tempo depois, conhecedores das di-


ficuldades e reações esboçadas na ocasião, que elas fossem reavivadas.
Para aqueles afeitos à rotina dos estabelecimentos de ensino militar fica
mais fácil avaliar o enorme esforço realizado pela Marinha e pela Força
Aérea para em curtíssimo espaço de tempo atender às necessidades do
Exército, adaptando currículos, instrutores e monitores, o que fizeram
de modo que só pode despertar elogios e gratidão.

Mecânicos
Como já realçamos, manutenção de aeronaves é uma atividade
que envolve grande complexidade e que, antes da sua execução, neces-
sita de um planejamento minucioso com vistas a prover, durante a sua
realização, todos os meios em pessoal, ferramental e suprimentos ne-
cessários. No entanto, o sucesso dessa atividade depende antes de tudo
de mecânicos altamente capacitados, motivados e cônscios da impor-
tância que representam para a operacionalidade da Aviação. Sua mis-
são de “fazer voar” é tão nobre quanto a de “voar”. Considera-se que um
mecânico só alcança um grau adequado de proficiência após oito anos
do exercício ininterrupto de sua atividade, em decorrência do alto grau
de complexidade da função.
Estive em Taubaté durante o período de elaboração deste livro
na tentativa de colher novos depoimentos e fiquei agradavelmente im-
pressionado no meu contato com oficiais e praças do Batalhão de Ma-
nutenção. A competência e vibração como aqueles militares suplantam
as dificuldades para o desempenho de suas missões, realizando-as com
invejável eficiência, me deixaram entusiasmado.

Naquela ocasião, contou-me o sargento José Machado, mecâni-


co de motores, que:

[...] não acreditava que seria selecionado para fazer o curso


de mecânico, pois todos os mais bem classificados de minha
turma na Escola de Sargentos se candidataram a uma vaga
nos cursos de sargentos para a Aviação do Exército. Era
algo novo. Todos estavam empolgados e estimulados para
Seleção e especialização do pessoal 283

enfrentar novos desafios. A reprovação de diversos compa-


nheiros nos exames médicos, que eram muito severos, per-
mitiu que eu estivesse entre os selecionados, para minha
grande satisfação. Foi um momento de intensa vibração. Fiz
o curso na Marinha com a duração de dois anos tendo che-
gado ao batalhão em 1990.

Prosseguiu, dizendo que:

[...] na Marinha estudamos todos os tipos de aeronaves que


eram operadas pela Força Aeronaval. Quando cheguei ao
Batalhão, a unidade ainda se encontrava em construção. A
nossa grande expectativa era a realização do curso na fábri-
ca, na França, que nos proporcionaria acrescentar os conhe-
cimentos necessários para realizar a manutenção das nos-
sas aeronaves. A qualificação técnica do sargento de aviação
é muito elevada, o que o torna um auxiliar muito especial.
Todos nós conservamos até hoje um enorme orgulho de fa-
zer parte da história da nossa Aviação do Exército e de ter,
com o nosso esforço, colaborado para mantê-la operacional.

Os mecânicos garantem a segurança, a eficiência e a disponi-


bilidade das aeronaves, permitindo aos pilotos explorá-las no limite de
suas possibilidades operacionais sem risco de falhas mecânicas. Cada
sistema integrante dos helicópteros, por sua complexidade, demanda
inspeções contínuas, periódicas e preventivas as quais exigem dos me-
cânicos um alto grau de especialização, implicando a necessidade de
formação de profissionais para cada sistema, como veremos ao longo
deste capítulo.
A especialidade exige do indivíduo o estudo constante dos ma-
nuais para obtenção dos conhecimentos indispensáveis à realização da
manutenção de cada componente ou conjunto da aeronave. Estes serão
usados na fase de preparação para a ação que irão desenvolver. Em suma,
é uma atividade que necessita de total envolvimento e compromisso.
Para bem caracterizar a importância dos graduados mecânicos
para a Aviação do Exército, vamos reproduzir o depoimento do coronel
Telles a respeito. Durante o período em que ele esteve comandando o 1º
BAvEx, recebeu inúmeras visitas de autoridades militares, entre elas o
284 Aviação no Exército - uma visão histórica

coronel Kerrand, subcomandante da Aviação do Exército Francês, a Avia-


tion Légère de l’Armée de Terre (ALAT).
O coronel Kerrand, entre as sugestões apresentadas ao coro-
nel Telles, enfatizou a necessidade de provocar a integração e o entrosa-
mento entre pilotos e mecânicos:

Os pilotos têm a tendência em se constituir em uma casta,


mas o senhor tem que trabalhar para que isso não ocorra. O
piloto precisa entender que o sargento mecânico é tão im-
portante quanto ele, pois é o sargento que dá à aeronave
as condições de funcionamento que permitem ao piloto o
cumprimento de sua missão.

Esse espírito vem sendo, segundo o coronel Telles, dissemina-


do na Aviação do Exército, e pude ter a oportunidade de constatá-lo em
recente visita que fiz a Taubaté.
Reproduzo abaixo um artigo de autoria do primeiro-tenente
de Material Bélico Sammuel Magnus Linhares de Aguiar, publicado na
revista Guardião da Aviação, editada pelo Batalhão de Manutenção e Su-
primento de Aviação do Exército. Permiti-me apropriá-lo, introduzindo
algumas modificações e suprimindo alguns trechos, por considerar o
texto a síntese daquilo que pensávamos a respeito da importância dos
mecânicos de Aviação. Tive a oportunidade de trabalhar em estreito
contato com um deles, o sargento Vitor Borck, prova viva da excepcional
qualidade desses profissionais.

Guardadas as devidas proporções podemos entender o me-


cânico de aviação como um médico das aeronaves. Cabe a ele
o dever de zelar pela ‘saúde’ da sua ‘paciente’. Tal como o mé-
dico, o mecânico se vale de um variado instrumental para de-
volver a saúde à ‘doente’. A função do mecânico é de tamanha
importância que o seu comando enquadrante, além de pro-
porcionar-lhe uma eficiente estrutura de apoio, desenvolve
medidas de caráter social visando minorar-lhe as preocupa-
ções externas de modo a permitir-lhe focar-se exclusivamen-
te na complexa atividade de manutenir as aeronaves.
De fato, é o mecânico o elemento central para o qual convergem
todos os esforços da manutenção, sendo ele o responsável pela
Seleção e especialização do pessoal 285

execução, de maneira precisa, de todas as atividades desenvol-


vidas durante as inspeções dos helicópteros. Portanto, é o me-
cânico o sustentáculo da manutenção, sendo este um elemento
decisivo para a capacidade operacional da Aviação do Exército.
Trata-se de um recurso humano de inestimável importância e
de difícil formação, uma vez que, particularmente, o mecânico
de aeronaves necessita de anos de experiência para alcançar
um bom nível desempenho.

Os graduados mecânicos foram inicialmente especializados


no Centro de Instrução e Adestramento Aeronaval (CIAAN) e na Esco-
la de Especialistas da Aeronáutica. Posteriormente, com a criação do
Centro de Instrução de Aviação do Exército, passaram a ser formados
em Taubaté. Na atualidade, a Escola Municipal de Ciências Aeronáu-
ticas (EMCA), em Taubaté, forma profissionais que são aproveitados
como integrantes do quadro de sargentos temporários especialistas
de aviação.
A especialização dos mecânicos para a Aviação teve seu início
a partir de 1986, sendo selecionados militares do Quadro de Material
Bélico e da Arma de Comunicações. Os oriundos de Comunicações fo-
ram orientados para a especialidade de mecânico de aviônica, e os de
Material Bélico, para especializações como mecânico de motores (MV),
de voo (BAV), de estrutura e metalurgia, de manutenção de armamentos
de aeronaves (BAR), de sistema hidráulico e de sistema elétrico. Foram
realizados ainda cursos nas áreas de controle de tráfego aéreo, comuni-
cações e meteorologia.
Em 1986, os cursos se encontravam em andamento em ambas
as Forças. Na Marinha, funcionaram aqueles nas especialidades de es-
trutura e metalurgia (SV), motores de aviação (MV) e aviônicos (VN); na
Força Aérea, os de mecânico de aeronave (BAV) e armamento (BAR) e,
posteriormente, os cursos de sistema elétrico, sistema hidráulico, me-
teorologia e controle de tráfego aéreo. O curso de mecânico de arma-
mento, realizado na Escola de Especialistas da Aeronáutica, em Guara-
tinguetá, tinha dois anos de duração para os militares que ingressavam
na Força Aérea. Para os nossos militares do Exército, somente um ano,
o que exigiu dos nossos sargentos um grande esforço para a conclusão
do curso. Todos cumpriram com louvor a missão que lhes foi imposta.
286 Aviação no Exército - uma visão histórica

Em Taubaté, colhi outro interessante depoimento prestado


pelo hoje tenente Sérvulo, cuja íntegra se segue:

Fui da 1ª turma de meteorologistas. Em 1986, quando


realizava o curso de formação de sargentos de Artilharia
na Escola de Sargentos das Armas (EsSA), fiquei saben-
do que o Exército planejava implantar a sua Aviação. A
notícia foi motivo de entusiasmo entre todos os alunos,
que viam se abrir uma nova oportunidade. Ao final do
curso, fui designado, como voluntário, para realizar o
curso de meteorologia. A indicação recaiu sobre os cinco
mais bem classificados da turma. A escolha do pessoal
de Artilharia para o curso de meteorologia se justificava
porque durante a nossa formação recebemos instruções
sobre assuntos afins, tais como meteorologia, balística,
que tinham correlação com a nova especialidade, ainda
que com menor profundidade, como, mais tarde, desco-
briríamos. O pessoal de Comunicações foi indicado para
o curso de controlador de voo. Chegamos à Escola de Es-
pecialistas da Aeronáutica em 1987.
A primeira grande dificuldade que enfrentamos no curso
foi que ele era realizado para o pessoal da FAB em 2 (dois)
anos e para nós foi reduzido para 1 (um) ano. No perí-
odo básico, tínhamos matérias como física, matemática
e química. O período básico, que era feito em 6 meses
pelo pessoal da FAB, para nós durou um único mês. Foi
um horror. Para quem tinha dificuldade naquelas maté-
rias foi um ‘Deus nos acuda’. Resolvemos o problema nos
ajudando mutuamente. Para mim foi um período parti-
cularmente difícil. Para complicar mais ainda tínhamos
o inglês técnico. Foi muito árduo. Estudamos muito. Os
solteiros ficaram alojados na Escola, e no início éramos
vistos com certo olhar de desconfiança. Acho que não
acreditavam que sairíamos bem no curso. Um dia estava
sentado na primeira fila da sala da televisão e fui obriga-
do a sair de lá por um aluno da FAB. Para não criar con-
fusão acedi. Foi o único incidente por que passei. Depois
Seleção e especialização do pessoal 287

o entrosamento começou a ocorrer, e, como tínhamos um


ótimo time de futebol, ganhamos a amizade do pessoal.
Éramos um total de 28 sargentos, sendo 5 de meteoro-
logia, 5 de controle de voo e 18 mecânicos de diversas
especialidades.
Com o passar do tempo e com muito esforço, nós
começamos a apresentar melhor rendimento que os
alunos da FAB, o que fez aumentar o respeito que con-
seguimos. Um aluno nosso além de tirar dez numa prova
ainda provou ao instrutor que uma questão estava mal
formulada. Sobressaímo-nos no curso com muito esforço
e abnegação. Queríamos contribuir da melhor maneira
para o sucesso da implantação da Aviação do Exército.
Durante o curso, estagiamos no aeroporto de Congonhas
por aproximadamente 2 meses, nossa primeira experiên-
cia prática. Terminado o curso, fui designado para a Base
Aérea de Recife e fiquei 1 (um) ano trabalhando no ae-
roporto dos Guararapes. Lá, ao contrário de Congonhas,
operávamos sozinhos fazendo os briefing com os pilotos,
informando sobre as condições meteorológicas para de-
colagem, na rota e no destino, além de informar as alter-
nativas. Cheguei, finalmente, em Taubaté em 1989. Só ha-
via um hangar e uma única aeronave. A torre de controle
ainda não estava pronta. Os meteorologistas e os contro-
ladores operavam do solo. Era o chamado BARREX, pois
havia barro em todo canto. Os deslocamentos eram difí-
ceis. Teve até um subtenente que ganhou dinheiro ven-
dendo galochas para o pessoal, tanta era a lama que havia
no batalhão. Após um dia no alojamento optei por morar
na cidade.
Uma das situações mais marcantes ocorreu quando eu
me encontrava de serviço. Estava prevista uma missão de
6 (seis) ou 7 (sete) aeronaves que iriam para o Rio Gran-
de do Sul. O tempo estava muito nublado, e alertei ao co-
mandante da missão que não seria possível ultrapassar
a serra próxima à área do Btl. No briefing relatei as con-
dições desfavoráveis, mas o Cmt da missão decidiu sair.
288 Aviação no Exército - uma visão histórica

Após algum tempo, todas as aeronaves retornaram, pois


constataram que as condições eram realmente adversas.
Começaram a me pressionar para saber se o tempo me-
lhoraria. Naquela época era muito diferente de hoje. Re-
cebíamos os boletins por telefone, ao contrário de hoje,
em que as informações chegam pelo computador, GPS e
com imagens satélite. Quando vai melhorar? Quando vai
dar? Pressionado, resolvi telefonar para uma cidade que
se localizava do outro lado da serra para verificar quais
as condições meteorológicas daquele lado. Telefonei para
a delegacia da cidade.
Eu – Aqui é o Sgt Sérvulo, do 1º BAvEx. Estou com proble-
ma para decolagem de umas aeronaves por causa do tempo.
Como está por aí?
Delegacia – Aqui o tempo tá bom.
Eu – Tem nuvem?
Delegacia – Tem algumas.
Eu – Você está vendo o céu?
Delegacia – Estou. Está até fazendo sol.
Eu – Obrigado, você me salvou.
Passei as informações ao Cmt da missão lhe dizendo que o
tempo após a serra era favorável e, se ele conseguisse ul-
trapassá-la, não haveria problema para a continuação da
missão. As aeronaves conseguiram uma ‘janela’ na serra e
prosseguiram em sua missão.
Se fosse hoje, seria uma barbada, com toda esta quantidade
de meios que temos à nossa disposição.

Depois da formação das primeiras turmas de Especialistas da


Aviação do Exército, os novos aeronavegantes do Exército Brasileiro
continuaram em período de estágio na Marinha do Brasil e na Força
Aérea Brasileira, incorporando novos conhecimentos nas mais diver-
sas áreas de manutenção aeronáutica, participando das inúmeras ati-
vidades do cotidiano daquelas unidades aéreas e incorporando valio-
sas experiências que seriam de grande valia no início de suas funções
no 1º Batalhão de Aviação do Exército e nas demais unidades da Av Ex
criadas, a posteriori.
Seleção e especialização do pessoal 289

Alunos da primeira turma de meteorologia (1987), após cerimônia de término de


curso. Da esquerda para direita, 3o Sgt Caruso, 3o Sgt Claudio, 3o Sgt Heitor, 3o Sgt
Sérvulo e 3o Sgt Alfredo

A partir de 1988, com a chegada das primeiras aeronaves em


Taubaté, a manutenção começava a dar seus primeiros passos. O con-
tato com os helicópteros passou a ser mais intenso, e a dedicação e o
profissionalismo eram o contrapeso das deficiências. Naquele começo,
tudo era novidade, as decisões mais simples, cercadas de muitos estu-
dos e cuidados. Não se aceitava o erro. Os obstáculos eram superados
cuidadosamente, e a segurança na execução das atividades estava em
primeiro lugar.

Éramos 3o Sgt ainda muito jovens, realizando curso em ou-


tra Força (FAB) sobre uma atividade completamente distin-
ta daquilo que havíamos experimentado até aquela ocasião.
Isso nos causava grande apreensão e preocupação, que não
era menor nos nossos chefes, que eram muito exigentes
com o nosso aproveitamento e comportamento. Uma sema-
na após nossa apresentação na Escola de Especialistas da
Aeronáutica, em Guaratinguetá, recebemos a visita do ge-
neral Baratta acompanhado pelo major Jeannot, que seria
mais tarde promovido ao generalato e seria Cmt Av Ex. A visita
destinava-se a nos passar orientações e realçar a importância
290 Aviação no Exército - uma visão histórica

da nossa qualificação e, principalmente, recomendar o nos-


so comportamento. Na reunião foi tão ressaltada a questão
do nosso comportamento e houve tantas ‘ameaças’ que pas-
samos a simbolizar a estátua do Ícaro, localizada próximo
à entrada da Escola, como o tamanho da ‘naba’ que um de
nós iria levar em caso de mau aproveitamento ou compor-
tamento não apropriado.

Alunos do curso de mecânico de armamento, em Guaratinguetá

O passar dos anos tem sido testemunha do enorme avanço da


manutenção das aeronaves da Aviação do Exército, que demonstra hoje
um nível de eficiência do mais elevado grau. Conduzida por profissio-
nais da mais alta competência, imbuídos da necessidade de incessante
busca de novos conhecimentos, a manutenção de helicópteros consti-
tui-se numa “ilha” de excelência dentro do grande “arquipélago” de mo-
dernidade que é a Aviação do Exército. Ao mecânico de aviação se exige
responsabilidade, honestidade, competência, espírito de grupo, meticu-
losidade, dinamismo, disciplina e o constante desejo de aperfeiçoar-se
no desempenho de sua atividade.

O alojamento que ocupávamos na Escola de Especialis-


ta da Aeronáutica era muito movimentado. Toda vez que
entrava uma autoridade era praxe o comando de ‘atenção
o alojamento!’, e todos se perfilavam. No entanto, os en-
graçadinhos viviam dando falsos avisos a título de galhofa.
Seleção e especialização do pessoal 291

O fato ocorria com tanta frequência que os alunos passa-


ram a desprezar o anúncio, e até mesmo faziam comen-
tários inapropriados e jocosos. Certa feita, o brigadeiro,
comandante da Escola entrou no alojamento e foi dado o
‘atenção alojamento!’. Como alguns já estavam de ‘saco
cheio’ com os avisos falsos, um amigo bem próximo à
porta de entrada fez o seguinte comentário, em voz alta:
‘tá chegando mais um veado.’ O brigadeiro, após coman-
dar o ‘à vontade’, muito elegantemente, fez de conta que
não tinha ouvido e continuou a visita. O amigo que fez o
infeliz comentário ficou paralisado por alguns minutos
e preocupado com a possível repercussão do ocorrido.
Felizmente o acontecido passou às histórias de caserna
somente como mais um ‘causo’.

Alunos e instrutores do curso de meteorologia na Escola de


Especialistas da Aeronáutica, em Guaratinguetá, em 1987

A qualidade da manutenção realizada na Aviação do Exército


traduz um reflexo da evolução pela qual ela vem passando desde a sua
criação até os dias atuais. Tem nos mecânicos um dos pilares da segu-
rança de voo. É no trabalho e na dedicação desses profissionais que está
calcada toda a estrutura operacional a qual possibilita ao braço alado
do Exército Brasileiro fazer-se presente em todo o território nacional,
deslocando com segurança nossas tripulações e contribuindo para o en-
grandecimento da Nação.
292 Aviação no Exército - uma visão histórica

O envelhecimento de nossa frota e a escassez de recursos têm


desenhado um cenário cada vez mais desafiador, exigindo de nossos
profissionais um crescente preparo intelectual, um profundo dinamis-
mo e uma elevada motivação para continuar conduzindo com qualidade
e segurança o futuro de nossa Aviação. É o mesmo espírito pioneiro que
deu asas ao Exército Brasileiro, o qual permanece imutável no coração
de cada responsável pela manutenção de nossas aeronaves.
Segundo o tenente Moisés Rabelo Santana (Inspetor – Mec
voo), no seu caso, a primeira dificuldade foi a tomada de decisão de
se voluntariar ou não para a Aviação do Exército. Tomada a decisão,
dedicou-se a ela com o máximo de vibração. Vamos ao seu depoimento:

Abraçar a Aviação do Exército, que para nós surgira, ou


permanecermos na nossa especialidade era o nosso dile-
ma. A despeito das dificuldades, ressalto a maneira como
fomos recebidos na Força Aérea, de braços abertos nos
passando uma gama enorme de informações. Fizemos o
curso compactado. Terminado o curso em Guaratingue-
tá, nós, mecânicos, passamos pela mesma situação que
os controladores de voo e os meteorologistas. Só recebe-
mos a nossa designação 6 (seis) meses após o término do
curso na Escola de Especialistas da Aeronáutica. Ficamos
durante esse período adidos ao Batalhão (Btl) de Lorena
aonde íamos a cada 15 (quinze) ou 20 (vinte) dias veri-
ficar se alguma decisão tinha sido tomada. No meu caso,
eu me deslocava do Rio de Janeiro para contatar o Btl na
esperança da aguardada designação. Finalmente, fomos
movimentados para o 2º/8º Grupo de Aviação, o Esqua-
drão Poti, em Recife. Quando chegamos ao Esquadrão,
das 12 (doze) aeronaves existentes 8 (oito) estavam ‘em-
baixo’. Nós iniciamos como ‘aprendizes’ e ao final de seis
meses nós já éramos checadores dos mecânicos da FAB.
Em dado momento, o chefe do material, cargo correspon-
dente ao nosso gerente de manutenção, reuniu todo o
pessoal da FAB e disse ‘agora eu não quero mais os peri-
quitos em cima das aeronaves. Eles têm que ficar embai-
xo e nós temos que subir, pois nós temos que aprender’.
Seleção e especialização do pessoal 293

Isso demonstra o entusiasmo e o profissionalismo com


que nos agarramos àquela oportunidade do estágio na
FAB. Ao final de nossa permanência, o Esquadrão tinha
100% de suas aeronaves voando.
Quando chegamos da Base Aérea de Santos, nós já
conhecíamos o Esquilo, e o pessoal da FAB não tinha fami-
liarização com a aeronave, pois operavam antes os UH-1H.
O estágio foi uma grande oportunidade para aprendizagem
da nossa nova especialidade e permitiu o estreitamento dos
laços com os amigos da Força Aérea.
O check do mecânico de voo, que o tornava um mecânico
operacional, consistia em orientar o piloto para que este
apoiasse o esqui da aeronave em uma grande chaminé de
uma olaria desativada e pegar nela um pequeno graveto.
Aquele graveto se transformava em um troféu, e o mecânico
o levava orgulhoso de volta para o esquadrão. A elevação
à categoria de mecânico operacional compreendia aquela
prova e o pouso em área restrita, que era feito na margem
de um rio, num banco de areia. Era uma área de vegetação
densa e cabia ao mecânico de voo a orientação dos pilotos.
O pouso e a decolagem sem incidentes era o coroamento da
missão. Tivemos êxito.
Quando chegamos em 1989 no Batalhão em Taubaté, a
quantidade de barro era tanta que a unidade foi apeli-
dada de BARREX. O batalhão ainda estava em constru-
ção. Vínhamos para o trabalho num caminhão QT de 6
Ton, pois de carro era complicado. No início, tínhamos
problemas de toda ordem, inclusive de segurança. Che-
gamos a montar uma patrulha, pois as casas eram cons-
tantemente roubadas, a qual foi desativada quando se
descobriu que os próprios soldados da patrulha passa-
vam as informações para os ladrões.
Uma situação sempre lembrada foi a ida à França para
a realização do curso de adaptação às aeronaves que
tinham sido adquiridas. O curso na fábrica nos ajudou
muito. Tive algumas peripécias no meu voo de ida. Tive-
mos alguns problemas de caráter financeiro, pois a nossa
294 Aviação no Exército - uma visão histórica

ajuda de custo demorou a chegar. Passamos mesmo al-


gumas dificuldades que só foi possível ultrapassar com a
ajuda da COMFIREMEX, que nos adiantou algum dinhei-
ro. A oportunidade de travar contato com outra cultura
foi muito importante para todos nós.

Foram dez meses difíceis. Nós tivemos que estu-


dar muito. Não pensávamos em outra coisa; a atenção estava
voltada para os estudos, mesmo porque a cobrança era muito
grande. A pressão para que os alunos tivessem um bom de-
sempenho vinha tanto do Exército como da Força Aérea.
História oral da Aviação do Exército

Quando realizava o curso de mecânico de aviônica conheci


uma Sgt da Aeronáutica e iniciamos um namoro que, com o
passar dos dias, se transformou em compromisso mais sé-
rio. Em determinado dia, quando passeava com minha na-
morada, de mãos dadas, fomos severamente repreendidos
por um oficial da Aeronáutica dizendo-nos que ‘isso não é
possível; fere a disciplina militar; é um absurdo’, e proibiu-
nos de repetir o gesto sob pena de sermos punidos. Passa-
dos alguns anos, retornei a Guaratinguetá e, já casado com a
Sgt, comparecemos a uma solenidade na Escola de Especia-
listas, onde tínhamos realizado nossos respectivos cursos.
Em determinado momento, ficamos surpreendidos ao re-
encontrar o oficial que nos repreendera no passado que, sa-
bendo do nosso casamento, muito consternado, nos pediu
desculpas dizendo-nos ‘eu tentei destruir com o casamento
de vocês’. Durante a solenidade o referido oficial contou o
fato ao brigadeiro comandante da escola, que fez questão
de nos procurar, com sua esposa, para pedir-nos desculpas
pelo ocorrido, num gesto de grande cortesia.

Em 1987, 17 sargentos realizaram o curso de mecânico de mo-


tores no Centro de Instrução Aeronaval (CIAAN), na Base Aeronaval de
São Pedro da Aldeia. A especialidade de mecânico de motores habilita o
militar ao reparo de avarias do grupo motor propulsor, execução de revi-
são de motores e de mecanismos de acionamento dos rotores, operação
Seleção e especialização do pessoal 295

do ferramental e equipamentos de medida, além de tornar o mecânico


apto à função de tripulante de voo. O sargento José Carlos Massacani
ficou em primeiro lugar.
Segundo o sargento Leandro Lourenço, os nossos militares fo-
ram muito bem recepcionados na Escola de Especialistas, tendo ele re-
cebido um Próprio Nacional Residencial (PNR) para morar com a sua
família. Ele era um dos poucos que realizavam o curso acompanhado de
seus familiares, o que certamente lhe causou maiores dificuldades do
que aos demais sargentos sem os mesmos encargos. “Fomos tratados
como se fôssemos da Força Aérea. A maioria das aulas era em conjunto
com os alunos da FAB. Os dez mecânicos do Exército se destacaram e
eram os primeiros da turma.”
Lembra que já tinham experiência de manutenção. A casa onde
morava virou ponto de reunião de alunos. Eram oito ou nove que iam até
lá no fim de semana para estudar. Sua esposa preparava sucos e lanches
como um lenitivo para as infindáveis horas de árduo estudo. Tinha cer-
teza de que além de melhorar o relacionamento entre eles já começava
a criar um certo espírito de corpo. Os monitores e instrutores comenta-
vam, e os alunos garantiam que “é tão bom estudar com eles”.

Na parte básica, tivemos que estudar muita física e mate-


mática. Alguns militares apresentaram dificuldades, pois
os conhecimentos iam além daqueles exigidos no exame de
admissão ao Curso de Formação de Sargentos. Tudo foi supe-
rado por ‘aquela vibração de querer ser da Aviação’. O pessoal
do Exército era mais rigoroso e mais estudioso ‘porque nós
queríamos ser sempre os melhores’.

Em 15 de abril, ainda em 1987, no CIAAN, realizou-se a soleni-


dade de encerramento do curso de mecânico de aviônicos. Com a pre-
sença de autoridades militares da Marinha e do Exército, assim como de
familiares dos formandos, os sargentos receberam os seus merecidos
brevês, constituindo-se dessa forma na primeira turma de mecânicos
para a Aviação do Exército formados na especialidade. A aviônica en-
globa a manutenção preventiva e corretiva de instrumentos de voo e de
sistemas elétricos e eletrônicos da aeronave. Em primeiro lugar, classifi-
cou-se o sargento Domingos Sávio Barroso.
296 Aviação no Exército - uma visão histórica

Formatura de sargentos mecânicos na Marinha

Em 19 de maio de 1987, se encerrou o curso de mecânico de


manutenção de aeronaves, em Guaratinguetá, que se iniciara em março
do ano anterior. O sargento Vianei Marcon Bronzatti se classificou em
1º lugar. Em São Pedro da Aldeia, ocorreu o encerramento do curso de
mecânico de estrutura e metalurgia, cujo primeiro lugar foi obtido pelo
sargento Worney José Gomes Oliveira.

A qualificação técnica do graduado de Aviação é muito


elevada. As atividades de manutenção e de outras
especialidades exigem um profundo conhecimento para o
desempenho das mesmas. E uma constante atualização. O
graduado de Aviação, certamente, tem um conhecimento
da área em que trabalha superior aos dos graduados dos
corpos de tropa.

Julgo importantes essas citações e me esforcei ao máximo


em recolhê-las para prestar a todos o justo reconhecimento pelo
pioneirismo na Aviação do Exército. Infelizmente, não tive acesso a
documentos que me permitissem divulgar o nome da totalidade dos
inscritos nos diversos cursos realizados nas demais Forças Singula-
res nos anos de 1986 e 1987.
Durante a permanência na Marinha e na Força Aérea, por oca-
sião da realização de seus respectivos cursos e, em seguida, no decurso
dos estágios, assim como os oficiais, os sargentos deram demonstrações
Seleção e especialização do pessoal 297

contínuas de orgulho profissional, aplicação e competência e foram ob-


jeto da admiração e reconhecimento de seus pares e superiores daque-
las Forças.

Recepção aos gerentes e mecânicos que realizariam estágio no 5º/8o


Grupo de Aviação da Força Aérea, em Santa Maria-RS

Os estágios
Ao término dos cursos, as instalações do BAvEx não se
encontravam prontas, e as primeiras aeronaves não tinham sido
recebidas. O afastamento dos militares formados do contato com as
atividades aéreas, seja na operação, seja na manutenção, criaria um
sério incômodo pela impossibilidade de aplicação dos conhecimentos
adquiridos, com a consequente desatualização e a exigência, em particular,
no caso dos pilotos, de uma requalificação O assunto foi resolvido graças
ao excelente clima de entendimento reinante entre os ministros das três
Forças, ao qual já nos referimos ao longo deste livro. Em ligação direta
com os ministros da Marinha e da Aeronáutica, o general Leonidas
obteve a concordância de ambos para a permanência do nosso pessoal
em unidades daquelas Forças até que o 1º Batalhão de Aviação do
Exército tivesse condição de absorvê-los.
Os estágios nas organizações militares operacionais da Mari-
nha do Brasil e da FAB permitiram aos pilotos, gerentes e mecânicos
adquirirem experiência e vivência aeronáutica. No período, o nosso pes-
soal pôde expandir os conhecimentos adquiridos, aprender as rotinas
e as atividades de operações, consolidando inclusive a mentalidade de
segurança de aviação. Foi uma fase importante para o amadurecimento
298 Aviação no Exército - uma visão histórica

profissional. Aos pilotos permitiu o aperfeiçoamento da prática de pi-


lotagem; aos gerentes e mecânicos possibilitou a aplicação dos ensina-
mentos obtidos em sala de aula por meio até da prática em aeronaves do
mesmo modelo, que encontrariam posteriormente no 1º BAvEx.

Uma vez o comandante do Esquadrão foi para


o hangar e “tinham umas cinco ou seis aeronaves na manu-
tenção. Ele olhou para a primeira aeronave, tinham uns dois
caras do Exército trabalhando nela. Olhou para uma outra,
tinham mais dois, três e na outra idem. Praticamente só tinha
gente do Exército trabalhando. Ele parou, pensou e falou: “O
que vai ser do meu Esquadrão quando esses caras forem em-
bora? O Esquadrão vai fechar as portas!” (Entrevista concedi-
da pelo Sgt Frederico, em 23 de janeiro de 2006).
História oral da Aviação do Exército, do Ten Cel Conteiras

A situação criada pela impossibilidade de transferir o pessoal


para o 1º BAvEx pode indicar açodamento no início da especialização do
pessoal. No entanto, era de suma importância no início das atividades
da primeira unidade de Aviação do Exército que os quadros estivessem
suficientemente preparados para caminhar com seus próprios pés, ou
melhor, com suas próprias mãos. Era impositivo contrariar a expectativa
de muitos que não acreditavam termos competência para implantar e
manter a Aviação do Exército no lugar de destaque que ela ocupa hoje,
um marco de excelência.
O interesse, a aplicação, o desenvolvido espírito profissional,
o desprendimento e orgulho de pertencerem à novel atividade foram
qualidades sobejamente demonstradas por oficiais e praças, o que pos-
sibilitou essa fase também ser coroada de êxito.
Uma das primeiras missões cumpridas pelo então sargento Ra-
belo durante o seu estágio na Força Aérea como auxiliar do mecânico de
voo foi realizar o abastecimento de uma aeronave Bell H-13, a vulgar-
mente denominado “bolha”, que decolaria em cumprimento de missão.

Após a conclusão do abastecimento, no momento em que a


aeronave já decolava, desconfiei que não colocara a tampa
no tanque de combustível. Naquela oportunidade, não havia
como verificar e não tinha meio de entrar em contato com
Seleção e especialização do pessoal 299

o piloto. Informei o fato ao Sgt do qual era auxiliar, tendo


este dito que não me preocupasse, pois certamente a tampa
estava fechada. ‘Eu acho que não fechei a tampa’, matutava
não conseguindo afastar minha enorme preocupação.
Sabendo que a autonomia da aeronave com o tanque cheio
era de duas horas e meia resolvi permanecer no local,
torcendo que o helicóptero retornasse logo. O receio era que
sem a tampa o combustível derramaria, ou se evaporaria,
podendo implicar as duas situações em risco para a aeronave
e, consequentemente, sua tripulação. Passaram-se uma hora,
uma hora e meia, duas horas, a ansiedade chegava ao limite.
‘Eu vou ser preso. Vão me mandar embora.’ Estes e outros
pensamentos terríveis me abalavam. Duas horas e meia, e
o helicóptero não retornou. Não era mais possível disfarçar
a enorme aflição de ter ocorrido um acidente. Acionado os
meios de busca, um outro helicóptero decola na tentativa de
procurar o que não havia retornado. Após um período que
durou uma eternidade, retorna o helicóptero de busca e dele
salta um Sgt que sem o capacete de voo se deslocava em pas-
sos pesados e com uma feição de pesar. Corri para ele aflito
e lhe perguntei se tinham achado a aeronave. O Sgt com voz
pesarosa disse que sim. ‘E o piloto?’ Perguntei, apavorado, já
enxergando o helicóptero destruído em qualquer lugar. Res-
pondeu-me o outro Sgt ‘Bem, o piloto está almoçando com
os pais no sítio deles’ motivo pelo qual tinha retornado. E a
tampa do tanque estava fechada.

Em seu depoimento sobre o tema deste capítulo, o coronel Tel-


les enfatizou considerar:

[...] da mais alta importância para o sucesso da Av Ex em


seu nascimento e sua posterior consolidação o processo de
seleção do pessoal, pilotos, gerentes e mecânicos. Quando
comentam que a Aviação do Exército foi um projeto de en-
vergadura que deu certo, eu retruco dizendo que a quali-
dade do pessoal foi o fator determinante para que o suces-
so fosse alcançado. Fomos muito felizes ao estabelecer os
critérios de seleção que nos permitiu a escolha de pessoal
300 Aviação no Exército - uma visão histórica

da mais alta capacitação e qualidade. Conseguimos atrair,


até por se constituir em novo desafio, os melhores quadros
entre o público-alvo. Desde cedo, estávamos conscientes
da necessidade da implantação de uma nova mentalidade
no Exército, a mentalidade de Aviação, e essa seria a mas-
sa crítica encarregada de disseminá-la. Outro fato de suma
importância foi a nossa decisão de iniciar a especialização
dos nossos quadros até antes do ato de criação da Av Ex e
do 1º BAvEx e muito antes do recebimento das primeiras
aeronaves, que só ocorreu a partir de 1989.

Destacou ainda:

[...] as dificuldades contornadas pela Escola de Especialis-


tas de Guaratinguetá para poder especializar nossos gra-
duados; a realização em curto espaço de tempo da mudan-
ça de currículo que, sendo originalmente de dois anos, foi
adaptado para somente um ano; o começo do curso antes
da data prevista para os especialistas da Aeronáutica, impli-
cando na convocação antecipada do corpo discente daquela
Escola dão a medida do vulto da mobilização daquele esta-
belecimento de ensino para nos atender. Tudo feito com o
máximo de dedicação.

Sobre seu estágio na Base Aérea de Santa Maria, relatou o coro-


nel Contreiras que:

[...] por ser mais demorada, a formação de recursos


humanos começou antes de tudo, antes mesmo da aviação
ser criada. O 1º Batalhão de Aviação do Exército (1º BAvEx)
foi criado em 1986, quando as turmas já faziam os cursos
na FAB e MB. Não havia, porém, qualquer instalação. Como
contou o Cel Telles, ele comemorou o primeiro aniversário
do batalhão em Brasília. O curso da FAB estava acabando, e
surgiu a questão de onde classificar os concludentes. Ouvi
dizer que queriam nos devolver para nossas unidades de
origem, onde aguardaríamos a construção da unidade de
aviação. Sabiamente, alguma autoridade assessorou os
Seleção e especialização do pessoal 301

oficiais que cuidavam da implantação que essa não era


uma boa solução. Como o prazo para a movimentação para
o 1º BAvEx era estimado em dois anos, o que realmente
aconteceu, a informação era de que nesse período os
alunos voltariam à estaca zero. Alunos com pouquíssima
experiência em pouco tempo perderiam as habilidades
adquiridas e teriam que voltar a realizar o curso novamente.
A solução adotada foi mandar os alunos de Santos para um
estágio no 5º Esquadrão do 8º Grupo de Aviação (5º/8º
GAv), Esquadrão Pantera, sediado na Base Aérea de Santa
Maria, na localidade de mesmo nome. Foi uma decisão
importantíssima. Em Santa Maria, pudemos adquirir a
preciosa ‘cultura de aviação’, que serviu de esteio para a
implantação segura da aviação. Certamente, uma boa parte
do êxito dessa implantação pode ser atribuída aos estágios
realizados na FAB e MB. Lá encontramos o grupo de
sargentos que havia feito o curso na Escola de Especialistas
da Aeronáutica, em Guaratinguetá. Foi o início de uma
parceria duradoura, muito importante para o êxito da
aviação. Ficamos adidos ao 3º Regimento de Artilharia de
Campanha Autopropulsado (3º GAC Ap), Regimento Mallet,
também conhecido como Boi de Botas. Tivemos ótima
interação com os oficiais da unidade porque muitos deles
eram da nossa turma ou contemporâneos de academia.
O comandante do Grupo, Cel Benedito Lajoia Garcia, nos
pregou uma peça. Fomos obrigados a prestar compromisso
à bandeira do regimento como é de praxe aos integrantes
da unidade. Disciplinados, mas contrariados, obedecemos.
Intimamente me confortava dizendo que Mallet e Osorio
eram companheiros em Tuiuti.
Também fomos bem recebidos na Base e no Esquadrão. Fo-
ram pouquíssimas as manifestações de desagrado pela nos-
sa presença. Rapidamente nos integramos na rotina da uni-
dade. Fomos distribuídos para estagiar nas diversas seções
do estado-maior. Lembro-me de apenas uma manifestação
contrária de um oficial da FAB, que afirmou que achava que
não tínhamos competência para operar a aviação. Outro, jocoso,
302 Aviação no Exército - uma visão histórica

sugeriu que ficássemos com os velhos UH-1H e que a FAB


ficasse com os novos aparelhos.
Fazíamos alguns poucos voos. O esquadrão operacional
era muito empregado em apoio ao Comando Militar do Sul,
sobrando poucos helicópteros para a instrução. Não parti-
cipamos dessas missões porque não éramos operacionais.
Participamos de alguns exercícios na Base e fomos a Saicã
para observar uma manobra do Esquadrão. Também parti-
cipamos do exercício de resgate no mar em Florianópolis.
Além do voo de instrução, fazíamos as patrulhas de frontei-
ra. Uma seguia pela fronteira Brasil-Uruguai, de Pelotas a
Livramento. Outra ia pela fronteira da Argentina até Foz do
Iguaçu e a mais longa ia até Ponta Porã [...]
Participamos da fase teórica do curso de reconhecimento
ministrado no esquadrão de reconhecimento, o 1º/10º GAv.
No final do curso haveria um voo na aeronave Xavante. Nun-
ca fiquei tão feliz por ter sido escalado de serviço no dia
previsto para o meu voo. Disseram que passasse no Esqua-
drão para remarcar o voo, mas como já tinha passado mal
no voo de T25 da AFA, não quis arriscar de novo.
No início de 1988 começou a construção do 1º BAvEx. O Cel
Telles solicitou que alguns militares fossem transferidos
para preencher os cargos do batalhão. Assim, foram trans-
feridos para Taubaté o Cap Marcos, o Bispo, o Bassoli e o
Tramontin e alguns sargentos.
Em Santa Maria, formávamos um grupo coeso, incluindo
os sargentos. Estabelecemos laços de companheirismo e
camaradagem enquanto íamos nos desenvolvendo e adqui-
rindo habilidades e experiências. Esse caminhar junto foi
importante para o prosseguimento e sucesso da aviação.
Estabelecemos a mútua confiança e a mentalidade de ope-
rar em equipe, como deve ser a tripulação. Sobre esse as-
pecto, tenho que registrar uma preocupação frequente en-
tre os militares da FAB, tanto oficiais como sargentos. Fruto
do desconhecimento das relações profissionais no Exército,
eles julgavam que havia uma distância muito grande entre
o oficial e o sargento do Exército. Por isso, eles acentuavam,
Seleção e especialização do pessoal 303

enfatizavam que o oficial deveria ‘obedecer’ o sargento


quando este orientava um helicóptero. Lembro que um ofi-
cial da FAB indagou se o coronel do Exército, comandante
da unidade, iria pedir para a torre de controle alguma au-
torização, sabendo que lá estava um sargento controlador.
Jamais, até o presente, nunca ouvi falar que algum oficial
tivesse contrariado qualquer orientação ou parecer técni-
co emitido por um sargento por razões hierárquicas. Nos
dois anos iniciais, exercemos a função de copiloto. Antes de
sairmos de Santa Maria, fizemos um cheque quando fomos
declarados 1P.
Capítulo 19

A criação da Aviação do Exército


e das organizações militares de
aviação

Aviação do Exército

A Aviação do Exército foi criada em 3 de setembro de


1986, na mesma data de criação da Diretoria de Mate-
rial de Aviação e do 1º Batalhão de Aviação do Exército, ocasião em que
diversas medidas destinadas à implantação, em particular relativas à
especialização do pessoal, já eram alvo de implementação. O advento
da Aviação do Exército introduziu uma nova expressão no léxico dos
planejadores militares brasileiros – “a ascensão à terceira dimensão do
campo de batalha”. A data consubstancia um ponto de inflexão na histó-
ria da Força e constitui-se em marco na evolução da sua operacionalida-
de, concedendo-lhe a alta mobilidade e a letalidade imprescindíveis no
combate moderno.
306 Aviação no Exército - uma visão histórica

Foto do despacho do ministro do Exército, general Leonidas Pires


Gonçalves, com o presidente da República, José Sarney, no qual
foram assinados os decretos de criação da Aviação do Exército e
das OM de Aviação do Exército

O Decreto Presidencial nº 93.206 estabelecia em seu arti-


go primeiro que a Aviação do Exército destinava-se à operação de
helicópteros necessários ao cumprimento da missão da Força Ter-
restre. A precisão manifestada na expressão “operação de helicóp-
teros” aplacava incertezas, em particular na Aeronáutica, quanto à
possibilidade de o Exército pretender incorporar aeronaves de asas
fixas. Em seu artigo segundo, definia que os então ministérios da
Marinha e da Aeronáutica cooperariam na organização e implan-
tação da Aviação do Exército. Essa cooperação já havia sido “costu-
rada” anteriormente por meio de contatos diretos do ministro do
Exército com os demais ministros militares.
Do Noticiário do Exército que publicou o decreto de criação da
Aviação do Exército e que expõe a fotografia do ministro do Exército por
ocasião de despacho com o presidente da República no qual este assina
o documento histórico, extraímos as seguintes palavras:
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 307

A doutrina atual de emprego das Forças Terrestres prevê


o emprego dos meios aéreos como apoio imprescindível às
suas operações. As experiências colhidas nos últimos e re-
centes conflitos demonstram que o emprego desses meios
representa papel decisivo no combate atual [...]
Com a criação de uma Aviação o Exército lança-se na terceira
dimensão dos modernos campos de batalha [...]
A Aviação do Exército proporciona maior mobilidade à
Força Terrestre nas ações de combate, apoio ao combate e
apoio administrativo, resultando um aumento de sua capa-
cidade operacional.

O Batalhão de Aviação do Exército. A criação.


Os primórdios
Conforme já referido anteriormen-
te, o 1º Batalhão de Aviação do Exército (1º
BAvEx) foi criado pelo Decreto Presidencial
nº 93.208, de 3 de setembro de 1986. Ficou
inicialmente subordinado ao Estado-Maior
do Exército, o que permitiu a agilização da
implantação daquela organização militar de
aviação, facilitando a ligação do gerente do
projeto com o seu comando enquadrante.
Fisicamente, a Aviação passou a tomar forma com a instalação
do 1º BAvEx na cidade de Taubaté, em São Paulo, em janeiro de 1988.
A escolha da área por decisão do ministro do Exército, conforme já vi-
mos, considerava entre outros aspectos sua posição estratégica no eixo
Rio-São Paulo e a proximidade dos importantes centros industriais e de
pesquisa na área da aviação, como a Embraer, Helibras e Centro Técnico
Aeroespacial.
As plantas que orientaram a Comissão de Obras do Exército para
a elaboração dos projetos do BAvEx foram obtidas na Diretoria de Obras
da Marinha (DOMar), que forneceu ainda as informações técnicas sobre os
hangares construídos em São Pedro da Aldeia. A DOMar também apoiou o
desenvolvimento do projeto das instalações de Taubaté, que estiveram sob a
responsabilidade do Departamento de Engenharia e Construção do Exército.
308 Aviação no Exército - uma visão histórica

Base Aérea de Taubaté, foto atual

Foto da Base Aérea de Taubaté, sede do 1º BAvEx, em construção

O coronel de Infantaria Jomar do Nascimento Telles foi o primei-


ro comandante do 1º Batalhão de Aviação do Exército e gerente do pro-
jeto de implantação da nova unidade. Seu subcomandante foi o tenente-
coronel de Cavalaria Roberto Sarmento, nomeado subgerente do projeto.
Segundo relato do coronel Telles, as dificuldades e desafios enfren-
tados foram de grande monta. Quando cogitado para comandar a primeira
unidade da nascente Aviação do Exército, ele foi procurado por alguns com-
panheiros, com a melhor das intenções, e por outros que não acreditavam
que a Aviação do Exército fosse se transformar em realidade que diziam:

Telles você está maluco. Vai deixar de comandar o 37º


BIMtz, na sua terra? Nós não temos a capacidade de manu-
tenir as nossas viaturas, como vamos conseguir com os he-
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 309

licópteros? Nós não temos vocação, não temos tradição. Olha, lá


em cima não tem acostamento, vai cair helicóptero. E o primeiro
helicóptero que cair, você pode ter certeza, nós vamos entregar
todos para a Força Aérea.

Aduziu que:

Na verdade havia aquela ideia que nós não tínhamos a capaci-


dade de operar com helicópteros. A minha preocupação, desde
o início, foi segurar aquele entusiasmo inicial dos meus pilotos
no voo. Vamos medir bem o tamanho dos nossos passos para
que eles não sejam maiores que as nossas pernas. Nós não podí-
amos nos ‘dar ao luxo’ de ter um acidente, o que poderia provo-
car um sentimento negativo e descrença no âmbito do Exército,
dando munição aos que não acreditavam no nosso sucesso.

Aqui me permito um breve parêntese. Originariamente, eu seria o


indicado para desempenhar a função de subcomandante do Batalhão. Excep-
cionalmente, pela importância da organização militar que nascia, o cargo de
subcomandante, fato que não acontece nas demais OM do Exército, seria de-
sempenhado por oficial com curso de Comando e Estado-Maior. A perspecti-
va me enchia de transbordante orgulho. No entanto, antes que a previsão se
tornasse realidade, tive a infelicidade de quebrar a perna durante a disputa de
um jogo de futebol. Meu acidente começou a se desenhar em uma partida de
dupla de vôlei, eu era um jogador contumaz, ocasião em que o açodamento
para entrar na quadra e não perder a vez me impediu, infelizmente, de fazer
o usual aquecimento e alongamento. Logo de início, tive uma ruptura parcial
dos gêmeos, hoje denominados gastrocnêmicos (não sei o que a mudança do
nome contribuiu para a evolução da medicina) da perna esquerda. A falta de
uma recuperação criteriosa (o trabalho sempre com a maior prioridade) e
a consequente atrofia da musculatura seriam decisivos na fratura da minha
perna e no término do meu sonho de transformar-me piloto de helicópte-
ro e subcomandante do Batalhão. Sabendo que o tenente-coronel Roberto,
além de grande amigo, era um oficial altamente qualificado e preparado para
o exercício da função, indiquei-o para substituir-me, proposta que foi pron-
tamente encampada pelos meus superiores. O tenente-coronel Roberto é da
Arma de Cavalaria como eu. Tínhamos que manter um equilíbrio no coman-
do do Batalhão, pois o comandante era de Infantaria.
310 Aviação no Exército - uma visão histórica

Julgo adequado fazer aqui alguns comentários sobre a brevetação


dos militares que integrariam o comando do BAvEx. Já havia um consen-
so na Seção de Aviação de que os militares designados para o comando,
comandante, subcomandante e integrantes do estado-maior da unidade,
tivessem o curso de piloto, até pela necessidade do conhecimento da termi-
nologia própria da Aviação, ou seja, deviam falar a mesma língua. No caso
do comandante e do subcomandante, o general Baratta deu todo o apoio à
proposta, decidindo, no entanto, que a formação deles deveria se limitar à
função de 2º piloto (2P). Após a decisão, foram estabelecidos contatos com
a Marinha e a Força Aérea, mas elas não puderam atender ao solicitado pela
impossibilidade de reduzir a duração dos seus respectivos cursos regulares.
Havia premência na formação de ambos, pois a designação do coronel Tel-
les como gerente do projeto de construção lhe impunha outras atividades,
e o tenente-coronel Roberto era seu principal assessor. A FAB apresentou a
sugestão da realização do curso na empresa civil de pilotagem, prática que
operava aeronave idêntica à utilizada na Base Aérea de Santos, onde a FAB
formava seus pilotos de helicópteros. Após solarem na prática, os oficiais
teriam a transição para piloto militar naquela Base. E assim foi feito.
O coronel Telles e o tenente-coronel Roberto receberam seus
brevês das mãos do chefe do EME, general Pamplona, no salão de honra
do Estado-Maior do Exército. Após a cerimônia, o coronel Telles, condu-
zido ao Gabinete do Ministro, teve a oportunidade de receber os cumpri-
mentos daquela alta autoridade.

Cerimônia de brevetação do coronel Telles e do tenente-coronel Roberto no Gabine-


te do Estado-Maior do Exército. O coronel Telles é cumprimentado pelo general de
Exército Pamplona, chefe do EME
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 311

Voltemos ao BAvEx. A falta de experiência conduziu à necessi-


dade de realizar inúmeros contatos com a Força Aérea, Marinha e em-
presas civis especializadas, a fim de definir o projeto do novo complexo
aeronáutico. Estive também em companhia do então major Wanderley
em contato com órgãos da FAB e da Marinha para a obtenção de plan-
tas de hangares e outros dados que pudessem orientar os trabalhos do
Exército na elaboração dos projetos. O material que obtivemos foi en-
tregue ao major Junqueira que, na oportunidade, integrava a Comissão
Regional de Obras.
Segundo o coronel Contreiras:

A vinda para Taubaté foi repleta de expectativas e ten-


sões. Por um lado um mundo maravilhoso se abria, por
outro as responsabilidades eram enormes. Todo o Exérci-
to estava de olho na gente. Provavelmente alguns torcen-
do contra. Não podíamos errar. O Ten Guerra era o oficial
de dia quando cheguei. Sem alojamento, ele me ofereceu
uma vaga no quarto dele no Hotel de Trânsito (HT). Fi-
quei alguns dias em um antigo Próprio Nacional Residen-
cial (PNR) da bateria, que ficava ao lado da guarita do
antigo Corpo da Guarda da mesma bateria. Era um PNR
que o Cel Telles tinha destinado a alojamento dos soltei-
ros enquanto ele definia quando e como o HT seria ocu-
pado. A casa, que também servia de alojamento do oficial
de dia, não tinha forro, ou era parcial, me lembro que se
via as telhas. O barulho de água caindo na caixa era cons-
tante, inclusive à noite. Éramos muitos. O movimento de
entrada e saída era intenso. Eu cheguei a Taubaté com
28 (vinte oito) anos e meus companheiros também nessa
faixa etária. Não havia televisão. Saíamos praticamente
todos os dias. De quarta a domingo éramos “habitués” no
bar da moda. Desgraça era o serviço de oficial de dia. Se
fosse fim de semana era impossível dormir. A noite toda
o pessoal voltando da cidade. Além do barulho da chega-
da, acendiam a luz e usavam o banheiro, e a água jorrava
na caixa. Sem falar nos mosquitos e no calor, já que era
início de 1989.
312 Aviação no Exército - uma visão histórica

Não posso deixar de mencionar o BARREX. O Cel Telles só


autorizou que ocupássemos os quartos do HT depois que ti-
véssemos providenciado um plástico para proteger o piso. O
ano de 1989 foi chuvoso. Muitos caminhões circulando para
cima e para baixo tornavam o canteiro de obras um barro
só. O barro grudava no coturno. Era quase impossível cami-
nhar. O coturno pesava. O Cel Telles permitiu que um cami-
nhão tipo QT (qualquer terreno) nos levasse para o hangar.
O Cap Marcos e alguns outros que possuíam moto eram os
únicos que se deslocavam por meios próprios. O acesso ao
hangar era pelo pátio, por um caminho ao norte dos lagos.
O atual estava sendo construído. Sem aeronaves, era permi-
tido estacionar no pátio. Os primeiros dias no hangar foram
marcados pela falta de água e luz. Utilizávamos um contai-
ner da empreiteira com banheiro e água. Aproveitávamos
para aquecer a água para o chimarrão. A vantagem é que o
expediente terminava no horário. Não era possível esten-
dê-lo para o período noturno. Também não havia móveis.
O pessoal fazia uma romaria ao Depósito Especial Alfande-
gado (DEA) para apanhar as embalagens do material que
estava chegando. As caixas serviam de mesa. Fazia-se um
buraco numa das laterais para encaixar as pernas e pronto.
Sentávamos em toscos bancos de madeira. O ano de 89 foi
marcante. No início de abril, fui para Itajubá fazer curso na
fábrica, na Helibras. Período também excitante pela espera
da nova aeronave. Eu ainda estava em Itajubá quando a pri-
meira aeronave foi entregue e não participei da cerimônia.
Depois fiquei sabendo que tinha sido escalado para fazer
o curso na França. Por conta disso, deveria completar as
500 (quinhentas) horas de voo. Eram muitas horas em
um curto período. Eu tinha preferência na escala. Isso
causou incômodo nos companheiros, que com toda razão
queriam voar também. O voo, como todos sabem, também
desgasta, e eu tive que me esforçar para cumprir a escala.
Eram tempos dos reconhecimentos em São Paulo, dos
helipontos dos hospitais e dos corredores visuais. Também
fazíamos circuitos de navegação no interior. Esses circuitos
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 313

normalmente ocorriam nos fins de semana. Éramos


uma novidade nos céus do Brasil. Numa das primeiras
passagens por Campinas, chamei a torre, e ao pronunciar
meu indicativo o controlador surpreso perguntou:
– Confirme; Exército Brasileiro?
Achei divertido o tom de voz e a dúvida do controlador e
orgulhoso respondi:
–Afirmativo! Exército Brasileiro.
Terminando com o numeral da aeronave.
Numa das passagens pelo corredor Tietê, perto do Campo
de Marte, quando chamamos a torre, eles pediram uma
passagem baixa para conhecer a aeronave. Esse fato foi
posterior, pois eu já estava pilotando um Pantera, que era
desconhecido no Brasil. Também cheios de orgulho fizemos
a passagem baixa bem devagar para exibir o novíssimo he-
licóptero.
O outro fato foi mais complicado. Eu e o Alvair estávamos
fazendo um circuito. Chegamos a Santos pelo litoral. Abas-
tecemos e decolamos de volta para Taubaté. O trajeto pas-
sava sobre a cidade de São Paulo. Sem experiência, não
lembramos o quanto Santos fica perto de São Paulo. Fomos
subindo, e, antes que pudéssemos chamar o controle, um
controlador entrou na fonia, com voz nervosa e chaman-
do com determinação, incisivo. Quando respondemos, ele
mandou fazer uma curva para a direita e descer rapidamen-
te, pois estávamos na reta final da aproximação do aeropor-
to de Congonhas. E nos amedrontou dizendo que tinha uma
aeronave de grande porte na nossa cauda. Com essa mano-
bra rápida, eu me perdi na navegação. O controlador pas-
sou uma orientação. Determinou que seguíssemos por uma
avenida de São Paulo. Nem eu nem a Alvair conhecíamos a
cidade, e a carta aeronáutica não tem nome de ruas. Pedi
auxílio, e o controlador, com muita má vontade e com ris-
pidez, nos conduziu até a vertical da tal avenida pelo radar.
Fomos até encontrar o Rio Tietê e voltamos para Taubaté.
Uma atividade importante naqueles dias foram os desfiles
aéreos em Brasília. Tivemos uma preparação cuidadosa e
314 Aviação no Exército - uma visão histórica

fizemos muitos voos em formatura. Ainda em 1989, parti-


cipamos das comemorações da Semana do Exército. Creio
que fomos para o desfile de 7 de Setembro. Não encontrei
registro, mas certamente outros desfiles ocorreram.

Par e passo com as atividades de construção, se fez igualmen-


te necessária a preparação para o recebimento das aeronaves, supri-
mentos, ferramental etc. Acresça-se ainda necessidade de preparação
do pessoal. Realmente, os sacrifícios foram enormes e só foram ven-
cidos graças à vontade inabalável de todos os pioneiros da Aviação,
que souberam de modo eficiente suplantar os obstáculos que se lhes
apresentaram.
Vou relatar aqui outro interessante depoimento que me foi dado
pelo amigo, o coronel Telles. Em 1988, atendendo a um convite do exérci-
to francês, ele foi designado, acompanhado pelo major Azambuja, repre-
sentante do Estado-Maior do Exército, para visitar instalações da Aviation
Légère de L’Armée de Terre (ALAT). Levava a orientação de iniciar os con-
tatos visando ao estabelecimento de intercâmbio de troca de informações
e de oficiais de ligação entre as duas aviações. No comando da ALAT, foi
recebido pelo seu comandante, o general Delacroix de Vaubois. Após sua
recepção e almoço, teve a oportunidade de participar de reunião, com a
presença de oficiais franceses, entre eles um representante da Direction
Génerale de L’Amement (DGA), ao qual o general passou a palavra, após
informar que já havia uma proposta de colaboração a apresentar. O repre-
sentante francês disse que o seu exército estava pronto para enviar uma
missão composta de oficiais e sargentos “para assessorar o Exército Bra-
sileiro na implantação da Aviação do Exército, com atribuições de acom-
panhar a instrução de voo e opinar, no caso dos pilotos, quais estariam
habilitados para o recebimento do brevê”. Nesse ínterim, o coronel Telles
pediu a palavra e disse que deveria haver algum mal-entendido. Informou
que os nossos oficiais e sargentos já tinham iniciado a sua formação e que,
naquele momento, já como pilotos, gerentes e mecânicos, estavam em
unidades da Marinha e da Força Aérea Brasileira desempenhando as suas
funções até que fossem transferidos para o batalhão.

O que os senhores estão nos oferecendo ocorreu com a Missão


Francesa enviada ao Brasil nos anos 20. Nós agora não precisa-
mos disso. O que queremos é estabelecer um intercâmbio de
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 315

informações entre as nossas aviações pela troca de milita-


res designados por cada Exército. Certamente temos muito
a aprender com os senhores, que têm uma enorme experi-
ência com o emprego de helicópteros.

O representante da DGA pediu a palavra e perguntou ao co-


ronel Telles: “Cel, o senhor esta rejeitando um programa que foi aceito
pelo Djibouti e pelo Equador?”
O coronel Telles respondeu que cada caso era um caso. Cada
país tinha suas peculiaridades. Percebendo haver um grande mapa-
múndi afixado na parede à sua retaguarda, o coronel Telles acrescentou:

Atrás de mim tem um grande mapa-múndi. Daí onde o


senhor se encontra, certamente, está vendo o Brasil, mas
deve ter grande dificuldade para identificar o Djibouti e o
Equador. Talvez o senhor não saiba que o Brasil já tem a
terceira indústria aeronáutica do mundo. Não é isso que o
Brasil deseja.

O general Delacroix interveio e disse: “Coronel, eu já entendi.


Com certeza houve um erro de interpretação da nossa parte. Na próxima
semana, nós teremos uma solução.”
Na semana seguinte, o general Delacroix informou ao coronel
Telles que uma delegação francesa iria ao Brasil para discutir a coopera-
ção de acordo com os moldes de interesse do Exército Brasileiro.
Essa inquebrantável vontade de superar obstáculos sem es-
morecer demonstrada pelos pioneiros da Aviação do Exército é um dos
fatores que me impulsionaram a trilhar a senda representada pela ela-
boração deste livro. A cada palavra, a cada fato rememorado, agradeço a
Deus e a meus chefes por terem me dado a oportunidade de participar
da tarefa de colaborar na sua implantação e de poder me incluir entre
seus pioneiros.
Por ser oportuno e apropriado, reproduzo mais uma vez um
trecho do excepcional trabalho de autoria do tenente-coronel de Cava-
laria Contreiras, piloto pioneiro da Aviação do Exército, que veicula uma
série de depoimentos os quais retratam com perfeição o sacrifício rea-
lizado pelos pioneiros e suas respectivas famílias no início do funciona-
mento do 1º BAvEx.
316 Aviação no Exército - uma visão histórica

O terreno onde se localiza o complexo de Aviação


fica afastado do centro de Taubaté, no vale do córrego Itaim.
Na época, a estrada não era pavimentada. O asfalto só vinha
até o entroncamento da rua São Pedro com a avenida Oswal-
do Aranha. O acesso era difícil. O ônibus urbano funcionava
de segunda à sexta com intervalos de uma hora, e, no fim de
semana, esse intervalo chegava a duas horas. Nos dias de chu-
va, a estrada ficava enlameada. No início da construção do 1º
BAvEx, o serviço de terraplanagem, os deslocamentos dos ca-
minhões e máquinas pesadas provocavam poeira nos dias se-
cos. No período de verão, as chuvas provocavam muito barro
no canteiro de obras, o que trouxe para o batalhão o apelido
de BARREX.
História oral da Aviação do Exército, do Ten Cel Contreiras

Uma data que deve ser destacada é 4 de janeiro de 1988. Na-


quela ocasião, pela primeira vez, um helicóptero da Marinha pilotado
por oficiais do Exército pousou na área do Batalhão de Aviação.

Às vezes, o barro era tanto que o carro não podia


circular. Era deixado no corpo da guarda, e os moradores iam
a pé até as suas casas. As obras causavam incômodo para os
moradores. Os bate-estacas faziam barulho, e a cada pancada
as casas tremiam. Havia a poeira provocada pelo movimento
dos caminhões, e o expediente dos trabalhadores começava às
seis horas e terminava por volta das vinte e duas horas. O mo-
vimento dos trabalhadores causava desconforto para as famí-
lias que moravam na vila militar.
História oral da Aviação do Exército, do Ten Cel Contreiras

Em 21 de abril de 1989, data do recebimento da primeira ae-


ronave do contrato, o HB 350 L1 Esquilo 01, ou, conforme denomina-
ção operacional, HA-001, as instalações básicas para o funcionamento
do Batalhão já se encontravam parcialmente prontas, e um total de 200
profissionais pioneiros, entre pilotos, gerentes de manutenção, mecâni-
cos e pessoal de apoio, se encontravam prontos para o cumprimento de
suas respectivas missões.
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 317

O batalhão foi estruturado em uma Companhia de Comando


e Serviço, uma Companhia de Suprimento e Manutenção, uma Compa-
nhia de Fuzileiros, uma Companhia de Reconhecimento e Ataque e duas
Companhias de Manobra, representados na figura abaixo.

Estrutura do 1º Batalhão de Aviação do Exército

A Companhia de Comando e Serviços, além de desempenhar to-


das as missões tradicionais para aquele tipo de subunidade, incorporava
um Pelotão de Segurança e Controle, com os encargos de auxílio à nave-
gação, coordenação e controle do tráfego aéreo e combate a incêndio,
resgate de tripulações e prestação de serviços de informações aeronáu-
ticas e meteorológicas, visando ao cumprimento de missões aéreas. Era
ainda voltada para a segurança das instalações do batalhão.
A Companhia de Manutenção e Suprimento era um dos princi-
pais alicerces do batalhão. Sua missão principal era de “fazer voar”, ou
seja, manter as aeronaves operacionais. Possuía em seus quadros ofi-
ciais e praças de Material Bélico e de Comunicações.
As Companhias de Helicópteros de Reconhecimento e Ataque e
de Manobra eram o cerne da operacionalidade do batalhão e reuniam os
vetores de mobilidade da unidade.
Por saber de uma “briga sadia” que envolveu a realização de ho-
ras de voo no início das atividades do 1º BAvEx, em função do insuficiente
número de aeronaves, perguntei ao coronel Simões, piloto pioneiro, como o
batalhão havia conseguido administrar essa normal ansiedade dos pilotos.
Segundo ele, como as primeiras aeronaves recebidas pela unidade eram os
318 Aviação no Exército - uma visão histórica

Esquilos, e o pessoal da Marinha que permaneceu estagiando no Esquadrão


de Instrução não tinha sido qualificado naquele modelo, eles tiveram a prio-
ridade para o voo. À medida que a instrução se desenvolvia, o coronel Telles,
comandante da unidade, resolveu formar uma “esquadrilha” para realização
de voo de formação, com o objetivo de apresentar-se em Brasília por ocasião
do desfile em comemoração ao Dia do Soldado, 25 de agosto. Juntamente com
o tententes Esteve, Laerte e Bispo, ele teve o privilégio de ser escolhido para
compor a formação. Participaram do histórico voo o capitão-tenente Delson,
da Marinha, e o capitão Aviador Esterlino, da FAB, os quais foram designa-
dos pelas suas respectivas Forças para se integrarem ao BAvEx na sua fase de
implantação. Esse fato lhes abriu a oportunidade de realizar um número de
horas de voo superior ao dos demais pilotos, em função do trabalho intensivo
que realizaram. Isso os habilitou mais tarde a fazerem o curso de qualificação
no Panther, na França, como instrutores. Naturalmente, que essa providência,
necessária naquele momento, pode ter desagradado os demais pilotos. Não
foram poucas as dificuldades no início da nossa implantação. Digo nossa, pois
jamais deixei de me considerar um “Asa”.

Primeira aeronave da Aviação do Exército a pousar na Academia Militar das Agu-


lhas Negras, em Resende; da esquerda para a direita, o Maj Moraes, o Maj Pavanello,
o Ten Esteve e o Sgt Allan
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 319

Em um dos encontros com o Telles para tratar deste livro, tive a


oportunidade de tomar conhecimento de uma carta que ele havia recebi-
do do coronel Kerrand, que desempenhava a função de subcomandante
da Aviação do exército francês (ALAT). O Telles a recebeu em meados de
1987, antes da efetiva assunção do comando do batalhão, que ocorreu
em janeiro de 1988. Ela certamente se constituiu em uma das principais
fontes de orientação para o seu comando. Ao lê-la, fiquei entusiasmado
com o seu teor, pois ela apresentava inclusive pontos comuns com as
ideias que defendíamos no âmbito da Seção de Aviação. A necessidade
de criação do espírito de corpo, que nós chamávamos de “mentalidade
de Aviação” (nossa intenção era disseminar essa nova mentalidade além
da Aviação do Exército, divulgando-a para todo o Exército). As descon-
fianças que enfrentaríamos com os críticos pouco benevolentes, entre
outros temas tratados na carta, me permitiu avaliar o quão certo nós es-
távamos. A necessidade de enfatizar a importância dos graduados mecâ-
nicos e de todos os demais sargentos especialistas era uma preocupação
do coronel Kerrand e outro ponto de identidade com o qual pensávamos
na ocasião e que norteou as nossas ações durante os trabalhos iniciais
de implantação. Destaco que hoje, no batalhão, essa ideia resta total-
mente arraigada. O coronel Telles me relatou inclusive a surpresa de um
general, em visita ao BAvEx, que ficou admirado com a presença de gra-
duados durante o coquetel de recepção.
Ao traduzir o documento, fiz algumas poucas adaptações em
vez de realizar uma tradução literal, que poderia exprimir ideias dife-
rentes daquelas expostas na carta. Pela importância do documento, ele
será exposto no Anexo 5, na íntegra. Na sequência, sua tradução:

Caro Coronel Telles


Na ocasião em que o deixei, há seis meses, após uma exce-
lente estadia em Brasília, o Sr. me perguntou quais os conse-
lhos que eu poderia dar a um oficial que será o primeiro co-
mandante do primeiro batalhão de helicópteros de seu país.
Eu peço que me desculpe pelo atraso desta resposta, mas
eu espero que esta carta vos chegue às mãos antes de sua
assunção do comando.
Se eu bem compreendi os projetos de seu alto-comando, o
Sr. se instalará a partir de 1º de janeiro em uma Base que foi
320 Aviação no Exército - uma visão histórica

construída com parte ou todo o efetivo em pessoal, mas sem


os helicópteros, por alguns meses.
Parece indispensável que o Sr. utilize esses meses para criar
o espírito de corpo. Efetivamente, se o Sr. falhar nesse pri-
meiro objetivo poderá enfrentar consequências desastro-
sas e incalculáveis para o futuro do seu batalhão e para toda
a Aviação do Exército. Eu imagino que a criação da Aviação
do Exército, como em todos os exércitos do mundo que cria-
ram uma Aviação, não suscitou o entusiasmo de todo mun-
do, em sua Força Aérea e mesmo no seio do Exército. Nessas
condições, o Sr. será observado por um certo número de crí-
ticos nem sempre benevolentes. Em contrapartida, aqueles
que desejam que o Exército, como todos os exércitos mo-
dernos do mundo, possua uma aviação operacional e eficaz,
o apoiarão e ajudarão nessa tarefa difícil de implantar uma
primeira unidade desse gênero.
Parece-me essencial que se forme em todo o efetivo díspar
que o Sr. terá à sua disposição daqui a alguns dias uma equipe
coesa de pioneiros tendo um único objetivo: conseguir a
implantação operacional do batalhão. Quando eu escrevo
‘todo esse pessoal díspar’, eu me refiro a todo o pessoal,
não somente aos pilotos mas também aos mecânicos, aos
especialistas rádio, aos controladores de voo, quando o
Sr. os tiver, aos especialistas em combate a incêndio. Eu
insisto particularmente nos mecânicos que se sentem
algumas vezes um pouco ‘os esquecidos e mal amados’ da
equipe, porque sua função é menos destacada e prestigiosa.
É certo que se o Sr. não obtiver de seus subordinados o
convencimento de que os pilotos não são ‘uma raça de
senhores’ e os demais, mecânicos e os outros especialistas,
não são uma raça de ajudantes o Sr. não terá uma unidade
operacional e eficaz. Creia que numerosos pilotos pensarão
que fazem parte de uma ‘raça de senhores’ e desprezarão de
bom grado os outros.
Acrescento que esse espírito de equipe repercute direta-
mente sobre a segurança de voo, que será sua primeira e
maior preocupação enquanto o Sr. for comandante do batalhão.
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 321

Voltarei a esse assunto mais à frente. Eu acredito que esses


meses sem receber os helicópteros podem ser utilizados em
proveito de organizar as suas estruturas internas e revisar
com todo o pessoal os conhecimentos teóricos adquiridos
fora do Exército.
Organizar as estruturas: a meu ver se trata de preparar tudo
que será indispensável para que o Sr. não seja surpreendido
pela chegada das aeronaves.
É necessário antes de tudo organizar uma sala de operações
onde serão preparadas todas as missões e onde as equipa-
gens encontrarão toda a documentação aeronáutica indis-
pensável. Será necessário prever o escritório de segurança de
voo, que será o conselheiro permanente para que desde o iní-
cio o maior rigor envolva a preparação e execução dos voos.
Parece-me indispensável, nesse particular, que o Sr., ou a au-
toridade à qual está subordinado diretamente (inicialmente,
como me foi dito ao Estado-Maior do Exército), estabeleça
um regulamento provisório sobre os voos, as ordens de voos
e suas preparações, fixando de um modo tão preciso quanto
possível o que é permitido e o que é proibido; e isso vai desde
o uniforme que deverá ser utilizado para os voos até a descri-
ção dos diferentes tipos de voo, passando pela composição
das equipagens, a supervisão médica, a ingestão de bebida
alcoólica, os imperativos de repouso, etc. A segurança de voo
é, evidentemente, de uma extrema importância. É impossível
nesta carta abordar completamente este tema. Por essa ra-
zão, eu lhe sugeri há algum tempo que pudesse vir para ver
como somos organizados na ALAT francesa sobre esse ponto
em particular e também sobre o quotidiano de uma unidade
da ALAT; eu não sei qual a solução reservada a essa sugestão,
mas será com prazer que eu lhe guiarei junto às unidades que
o Sr. poderá visitar.
É necessário prever as áreas de trabalho e de instrução e a
de voos técnicos. De fato, é preciso que o Sr. tenha um con-
trole permanente do que fazem suas aeronaves, a fim de evi-
tar qualquer risco de colisão ou simplesmente de perturbar as
sessões de instrução.
322 Aviação no Exército - uma visão histórica

Rever os conhecimentos adquiridos fora do Exército.

É evidente que deverá haver diferenças significativas en-


tre as normas em vigor na Marinha e na Força Aérea. Ao
Sr. competirá decidir, após ter escutado os alunos formados
em cada uma das outras Forças Armadas, o que será adota-
do pela sua Aviação, proibindo qualquer outra prática, caso
contrário o Sr. terá rapidamente imprecisões, fonte de pro-
blemas na área da segurança de voo.
Vai ser necessário prever as fichas de instrução, incluindo
de modo detalhado o que será realizado pelas equipagens
durante a instrução.
Como lembrança, pois esse problema certamente não lhe
escapou, é necessário prever o modo como se desenrolarão
os voos a serem realizados sobre áreas inóspitas (balisas
de emergência? quais os equipamentos a utilizar?). Nesse
particular, certamente o Sr. se interessará sobre os procedi-
mentos da Marinha e da Força Aérea.
E um dia... que eu desejo que ocorra o mais rápido possível,
pois a espera é sempre sofrida, o Sr. verá chegar seu primei-
ro helicóptero, logo seguida de outros.

Então, dois perigos o espreitam.

A eliminação do primeiro depende do Sr., e eu estou cer-


to de sua capacidade para atingir o objetivo: se trata de
acalmar a excitação que irá se apossar em todo o seu
pessoal e exigir, para a segurança deles, como para a
credibilidade de sua Aviação nascente, que desde o pri-
meiro voo de cada um no batalhão o maior rigor seja a
regra. Evidentemente, eu não falo dos voos de ambien-
tação com a aeronave, realizado pelos instrutores do
construtor, que são feitos sob a responsabilidade deste
e não sob a sua.
O segundo não depende do Sr., mas do Estado-Maior;
parece-me indispensável que ele lhe permita dispor do
tempo necessário para se tornar operacional. Gostaria de
explicar-me sobre esse ponto:
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 323

Se as autoridades do seu Exército adquirirem o hábito de


utilizar os helicópteros para efetuar suas ligações, o Sr. se
verá rapidamente envolvido por essa missão particular em
detrimento de outras, e o Sr. correrá o risco de ser uma uni-
dade de ligação que não é a mais apropriada para helicóp-
teros militares.
É necessário que o Estado- Maior fixe os limites nesse parti-
cular, que não poderão ser desrespeitados. Evidentemente,
é necessário que ele fixe a missão operacional do batalhão
e qual o prazo que ele estabelece para que o seu batalhão
seja operacional no sentido de estar capacitado para cum-
prir a missão. Verifique, se possível, que esse prazo não seja
demasiado curto porque é certo que uma unidade não fica
operacional por golpe de ‘varinha mágica’, mas sim progre-
dindo passo a passo conforme a instrução individual.
Essa progressão, passo a passo, lhe caberá realizar a cada
ocasião. É necessário primeiramente fazer a retomada
de todos os seus pilotos, de modo que eles sejam capa-
zes de refazer todos os exercícios de base sobre o apare-
lho a ser adquirido. Por essa razão, me parece que o Sr.
não poderá esperar realizar nenhuma missão operacional
mesmo simples antes de no mínimo de 4 a 6 meses após o
recebimento da maior parte de suas aeronaves. E isso se o
comando superior permitir preparar sua unidade sem lhe
impor outras missões, em particular a de ligação.
Estou consciente de que não pude lhe dizer tudo
nesta carta, mas creio ter abordado o essencial, e
permaneço à sua inteira disposição se o Sr. necessitar de
esclarecimentos sobre tal e tal ponto, ou ainda, se o Sr.
desejar abordar outros.
Aceite meus votos de que o comando do seu batalhão seja
um sucesso não somente para o Sr. como para toda a Avia-
ção do Exército.
Da minha parte, eu não tenho nenhuma dúvida, pois se o
Alto-Comando o escolheu é porque sabia de sua capacidade
para bem conduzir essa tarefa delicada.
Que este ano que vai começar para o Sr. da melhor maneira
324 Aviação no Exército - uma visão histórica

lhe aporte todas as incomparáveis satisfações de um bom


comandante. E creia que eu lhe invejo um pouco porque é
uma bela missão a que lhe foi confiada.

Amigavelmente

Kerrand

A Diretoria de Material de Aviação do Exército


A Diretoria de Material de Aviação do Exército
foi criada em 3 de setembro de 1986 pelo Decreto Pre-
sidencial nº 93.207, na mesma data em que foi criada a
Aviação do Exército e o 1º Batalhão de Aviação do Exér-
cito.
Iniciou suas atividades em 1º de novembro
do mesmo ano como Núcleo da Diretoria de Material de Aviação do
Exército. Foi provisoriamente instalada em uma sala do Departamento
de Material Bélico, ao qual estava subordinada, e posteriormente passou
a ocupar as instalações onde funcionava anteriormente a Diretoria
de Recuperação. Seu primeiro diretor, por curto espaço de tempo,
foi o coronel Ernesto Kurt Dietzold, que, por motivo de promoção ao
generalato, passou o comando para o coronel de Cavalaria QEMA Luiz
Oscar Bulcão de Lima, a quem coube efetivamente implantar a Diretoria
e as medidas necessárias a dotar a Aviação do Exército da sua estrutura
em material. Logo em seguida promovido ao generalato, o general
Bulcão foi confirmado como o primeiro diretor da DMAvEx.
A diretoria inaugurava uma nova “realidade orçamentária” em
razão dos altos custos inerentes à atividade de Aviação. Certamente, as
previsões dos recursos para o funcionamento da diretoria “chocaram”
inicialmente as autoridades responsáveis pela liberação dos orçamentos.
Mais uma vez, fez-se presente o nosso ministro, general Leonidas, que
já entabulara os contatos para a liberação dos montantes necessários,
tanto no âmbito do Exército como na esfera governamental. A estrutura
organizacional teve como parâmetro aquela adotada pela Diretoria de
Aeronáutica da Marinha.
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 325

A ativação da diretoria foi realizada progressivamente. Inicial-


mente, providenciou-se a capacitação de seus quadros, com a designa-
ção de oficiais para realizarem cursos de gerente de manutenção, su-
primento e aviônicos na Base Aérea de Santos. Foi executado ainda um
programa de visitas a diversos órgãos da Marinha do Brasil e da Força
Aérea Brasileira, com o objetivo de conhecer as atividades desenvolvi-
das pelas Forças coirmãs nas suas cadeias de manutenção e de supri-
mento. Sobre o processo de capacitação dos oficiais da DMAvEx, nos
conta o então capitão Francisco Carlos Sardo que:

A DMAvEX designou dois oficiais de Material Bélico e dois


oficiais do Quadro de Engenheiros Militares para realizar
os cursos de gerentes. Eram eles o Maj QMB Sérgio Cerre-
delo Roxo; Maj QMB Roberto Rios; Maj QEM Mec Edmilson
Amarante Botelho e eu, na qualidade de Engenheiro Militar
na área de Telecomunicações. O grupo de oficiais foi enca-
minhado para a Base Aérea de Santos, no mesmo período
em que lá se encontravam em formação os componentes
da primeira turma de pilotos do Exército. Na Base Aérea
de Santos, não havia um curso estruturado para o tipo de
função que viríamos a exercer e, no início do curso, ficamos
como observadores das atividades diárias de manutenção
que ocorriam na Base. Em um primeiro momento, o grupo
foi orientado pelo Cel Cmt do Grupo Suporte de Base – GSB
–, (não lembro se era esse o nome correto). Em menos de
uma semana, foi apresentado o funcionamento de uma Base
Aérea e a relação entre o Cmt GSB e o Cmt Base. Em seguida,
voltamos à condição de observadores. Por nossa iniciativa,
organizamos um programa com assuntos de interesse, que
era submetido regularmente ao Cmt GSB, que providen-
ciava para que os responsáveis pelos diversos setores or-
ganizassem algumas apresentações e práticas. Por enten-
der que os assuntos tratados no âmbito da Base estavam
aquém do propósito que se imaginava para a formação do
nível de gerentes, com capacitação para atuação em órgão
de apoio como a DMAvEx, por iniciativa do Maj Botelho, foi
proposto ao Cmt GSB um programa de visitas e estágios nas
326 Aviação no Exército - uma visão histórica

unidades de manutenção de nível equivalente aos 3º e 4º


escalões do Exército. O programa incluía ainda visitas e es-
tágios a alguns órgãos de direção da FAB localizados no eixo
São Paulo-Rio de Janeiro. Após aprovado pelo Cmt GSB, nós
próprios fazíamos os contatos e agendamentos e colocáva-
mos em execução as atividades programadas. Dessa forma,
foram visitados os Parques de Manutenção Aeronáutica de
São Paulo, do Galeão e dos Afonsos, a Diretoria de Material
da Aeronáutica, o Departamento de Proteção ao Voo e o
Centro Tecnológico da Aeronáutica. Embora o curso esti-
vesse sob gestão da FAB, foi organizada uma semana de ati-
vidades com a Marinha do Brasil. Em particular na Direto-
ria de Aeronáutica da Marinha (DAeRM), o estágio foi muito
proveitoso, pois aprendemos bastante sobre o processo de
aquisição de aeronaves, componentes e qualificação de for-
necedores e prestadores de serviços. Em complemento ao
estágio na DAeRM, foi organizado um outro na Base de São
Pedro da Aldeia, e essa experiência permitiu estabelecer os
diferenciais de abordagem da gestão praticados pela FAB e
pela MB. Ainda fizeram parte do programa criado pela tur-
ma visitas técnicas em empresas prestadoras de serviços
de manutenção de helicópteros, com destaque para a Rolls
Royce, a Oldi e a Líder Táxi Aéreo.

A partir de janeiro de 1987, a DMAvEx iniciou uma nova fase


com o retorno dos oficiais que realizaram os cursos de gerência. Ao longo
desse ano, a diretoria passou a capacitar-se para desenvolver seu maior
projeto, a Concorrência Internacional para aquisição dos 52 helicópteros,
seus equipamentos, suprimentos e outros meios materiais para a com-
posição da primeira unidade aérea do Exército. No segundo semestre do
ano em questão, envolveu-se totalmente nas atividades de compra das
aeronaves, com a publicação do edital, o recebimento e julgamento das
propostas das empresas licitantes, a divulgação do resultado e as nego-
ciações para elaboração do contrato com o consórcio vencedor. A partir
daí, passou também a exercer suas atividades de órgão setorial de apoio e
técnico-normativo, envolvendo, entre outras atividades, a fiscalização do
acompanhamento do contrato.
A criação da Aviação do Exército e das organizações militares de aviação 327

Em 24 de novembro de 1989, o Decreto nº 98.445 extinguiu a


diretoria e criou a Brigada de Aviação do Exército, com sede em Brasília,
diretamente subordinada ao EME. O general Bulcão, que chefiava a direto-
ria extinta, foi o primeiro comandante da Brigada de Aviação do Exército.

General Bulcão, diretor de Material de Aviação do Exército,


em visita à Helibras

Demonstrando a efetiva necessidade de um órgão de apoio espe-


cializado para a Aviação do Exército, a DMAvEx foi recriada pelo Decreto de
19 de julho de 1993, subordinada ao extinto Departamento de Material Bé-
lico, hoje Comando Logístico. Reiniciava suas atividades com a competência
de planejar, integrar, coordenar, controlar e, no seu nível, executar as ações
relacionadas às atividades de suprimento e de manutenção do material
de aviação e de qualquer outro relacionado especificamente à Aviação do
Exército. A diretoria voltava a partir de então a executar as mesmas tarefas
que no passado justificaram a sua criação, a atuação como órgão técnico-
normativo e gestor do material de aviação. O fato, me parece, demonstra de
forma inconteste o açodamento de sua extinção no passado.

No período em que estive na diretoria, me envolvi totalmen-


te nas ações englobadas pelo processo de aquisição dos helicópteros.
328 Aviação no Exército - uma visão histórica

Deixarei para falar mais sobre ele quando me referir às diversas etapas
que culminaram com a celebração do contrato.
Durante minha permanência na diretoria, tive a oportunidade
de ser indicado para realizar o curso de gerente, à semelhança do que
ocorreu com outros oficiais. Seria a oportunidade de obter um tão so-
nhado brevê da Aviação do Exército. No entanto, as minhas atividades
eram de tal monta que solicitei a dispensa de realizar o curso. Pena,
pois gostaria de tê-lo entre as recordações de minha passagem pela
Aviação do Exército.
Em 24 de setembro de 1986, o ministro do Exército, general
Leonidas Pires Gonçalves, em Portaria Ministerial nº 1.039 aprovava a
criação dos distintivos da Aviação do Exército, de piloto do Exército, dos
cursos de especialização e das insígnias de comando da Diretoria de Ma-
terial de Aviação, bem como do 1º Batalhão de Aviação do Exército.
Capítulo 20

O processo de aquisição
das aeronaves

O processo de aquisição das aeronaves, consubstanciado


na elaboração do edital, no julgamento das propostas
das empresas concorrentes e na elaboração do contrato de aquisição
com o consórcio vencedor, foi desenvolvido com a experiência obtida
após um extenso período de preparação intelectual dos militares envol-
vidos e complementado pelos inúmeros contatos com os órgãos da Ma-
rinha e Força Aérea que tratavam da compra de meios aéreos.

Panther participa de exercício com a tropa


330 Aviação no Exército - uma visão histórica

Inúmeras horas foram dedicadas às conversas com integrantes


da Diretoria de Aeronáutica da Marinha (DAerM) e da Diretoria de Ma-
terial da Aeronáutica.(DIRMA), inclusive pelo general Bulcão, diretor de
Material de Aviação do Exército, que, após ser investido no cargo, deslo-
cou-se ao Rio de Janeiro para a realização de contatos visando à absor-
ção dos conhecimentos indispensáveis ao desenvolvimento do processo
que se iniciava.
Mais uma vez, nessas ocasiões, ficou demonstrado o alto espí-
rito profissional e o elevado senso de cooperação de que são imbuídos
os valorosos companheiros das duas Forças coirmãs. Tínhamos a cons-
ciência de que não poderíamos cometer os mesmos equívocos ocorridos
anteriormente com as demais Forças. Para a consecução desse objetivo,
volto a frisar, foi de fundamental importância a experiência a nós trans-
mitida pelos nobres companheiros da Marinha e da Aeronáutica.
No meu caso em particular, desloquei-me ao Rio de Janeiro em
diversas ocasiões na busca de conhecimentos, ocorrendo situações em
que passei jornadas inteiras dialogando na DAerM com o comandante
Cirino e outros integrantes daquela diretoria de Marinha, enfocando as
aquisições de material aeronáutico feitas anteriormente, as particulari-
dades dos contratos e aquilo que na visão deles poderia ser melhorado,
o que não deveria ser repetido e o que valia a pena manter, entre essas
particularidades, vale aqui ressaltar, a adoção do Depósito Alfandegado,
medida que o Exército incorporou posteriormente e que tem se demons-
trado muito positiva. Na DIRMA, recebemos igualmente informações de
grande importância que nos permitiram desenvolver nossas atividades
com acerto.
De novembro de 1987 a junho de 1988, durante um período
de sete meses, estivemos completamente absorvidos pelo processo de
aquisição. Digo estivemos porque na oportunidade já me encontrava
na DMAvEx, inicialmente designado pelo EME como oficial de ligação
e posteriormente como um dos seus integrantes. Durante esse longo
período, hipotecamos todas as nossas capacidades para cumprir nossa
missão, sem nos descurarmos das demais atividades da DMAvEx, que
continuavam em seu curso. Só tínhamos horário de chegada. A saída fi-
cava por conta do cansaço ou da conclusão da tarefa prevista. No final
do ano, só chegamos em casa para comemorar o Natal e o Ano Novo com
nossas famílias próximo à meia-noite. Nada de férias e muito menos de
O processo de aquisição das aeronaves 331

folga no Carnaval. Dizem que o sacrifício no desempenho do dever é um


“gozo”. Estávamos trabalhando dentro desse espírito. Mineiramente e
sem alarde, nos dedicamos inteiramente, com afinco, às nossas respon-
sabilidades e, felizmente, as concluímos com oportunidade e eficiência.
Ao longo dos próximos capítulos, abordaremos cada fase do
processo que culminou com a assinatura do contrato com o consórcio
vencedor.
Capítulo 21

O edital de aquisição
das aeronaves

A despeito do tempo decorrido, julguei que a consulta ao


edital não seria difícil, considerando que era o “primei-
ro documento normativo de uma concorrência internacional” realizada
pelo Exército. Por envolver uma aquisição de forte simbolismo para a
Força, acreditei que ele estaria arquivado no Comando Logístico ou na
Diretoria de Material de Aviação do Exército em lugar de destaque. Ledo
engano. Mais uma vez, a minha pesquisa foi infrutífera. Estive nos dois
órgãos citados e nada encontrei. Minha esperança transformou-se em
decepção e apreensão. O edital era um documento de fundamental im-
portância para os esclarecimentos a respeito das condições estabeleci-
das para a aquisição das aeronaves.
Dirigi-me, então, à Imprensa Nacional, preocupado por consi-
derar que seria a minha última esperança de ter acesso ao documento.
Infelizmente, mais uma vez, fui malsucedido. Na data em que pensava
ter ocorrido a publicação, 25 de agosto de 1987, Dia do Soldado, nada foi
encontrado. O edital era considerado por mim uma peça-chave. Fiquei
desolado. Mas não me considerei derrotado. A esperança de encontrá-lo
em uma verificação mais aprofundada no mesmo local permanecia. Se
o “brasileiro não desiste nunca”, o militar brasileiro, do Exército e de
Cavalaria, nem vislumbra essa possibilidade. Desistir nem pensar. Com
334 Aviação no Exército - uma visão histórica

viagem marcada para o Rio de Janeiro e Porto Alegre, decidi só retomar


a busca após meu retorno a Brasília.
Desloquei-me ao Rio de Janeiro e em seguida a Porto Alegre.
Fui a essa última cidade para visitar alguns parentes. Em Porto Alegre, o
destino me proporcionou a ventura e o enorme prazer de reencontrar o
meu inesquecível chefe, o general Bulcão, o grande diretor da Diretoria
de Material de Aviação do Exército. Durante nosso encontro, após lhe
manifestar a satisfação em revê-lo, expus-lhe a minha intenção de resga-
tar a história do nascimento da Aviação do Exército e de rememorar os
inesquecíveis acontecimentos envoltos na aquisição dos helicópteros.
Ao comentar minha desilusão por não ter encontrado o edital, tive a feliz
surpresa de saber que o general possuía uma cópia daquele importante
documento. Ufa!!!!. Estava salvo. Poderia, com auxílio dele, deixar bem
claro o que efetivamente ocorreu.
Dias após, já de retorno a Brasília, ao receber o edital, que me
foi enviado pelos Correios, pude, com a mesma emoção que tomou conta
de mim ao folhear o contrato na DMAvEx, verificar que minhas rubricas
e assinatura também figuravam em todas as páginas daquele histórico
documento.
Outro fato sugestivo envolvendo o edital foi o encontro que tive
com um determinado oficial-general no Clube Militar, na sede da Lagoa.
Tendo o assunto girado em torno deste livro, em determinado momento
ele comentou que “nem sabia que, na época, tinha sido publicado um edi-
tal”. Bem, se o general não sabia, certamente, muita gente não sabia e não
sabe até hoje. Mais um motivo para esmiuçá-lo no que me for possível.
O edital da concorrência internacional para compra dos helicóp-
teros para a Aviação do Exército foi antes de tudo um trabalho de equipe
desenvolvido sob a segura orientação do general Bulcão. Não há que desta-
car o trabalho individual de qualquer dos componentes da equipe a não ser
aquele executado pelo general Bulcão, que emitiu diretrizes claras, precisas,
esclarecedoras e sempre oportunas, assim como assumiu todas as responsa-
bilidades pelos atos da Comissão Especial de Licitação.
A decisão adotada pelo Departamento de Material Bélico, com
respaldo no Decreto-Lei nº 200, atendendo às diretrizes do ministro do
Exército, foi realizar uma licitação na modalidade de técnica e preço,
pois era impositiva, além da avaliação dos custos, a análise de aspectos
relativos à nacionalização, transferência de tecnologia, da compatibili-
O processo de aquisição das aeronaves 335

dade das características do equipamento a ser adquirido com aquelas


definidas nos requisitos operacionais básicos, além de outras necessi-
dades estabelecidas no bojo do edital. Ademais, a decisão de realizar
a aquisição sob a forma de uma concorrência internacional era tam-
bém uma imposição do ministro, visando dar o máximo de visibilidade
ao processo de aquisição. “Nada de caixa-preta!”, enfatizava o general
Leonidas. O processo devia ser o mais transparente, o mais cristalino
possível. Entre outras determinações, ele enfatizou a necessidade de os
helicópteros da Aviação do Exército serem novos, “com garantia”. Essa
determinação, em particular, nos permitiu refutar as inúmeras ofertas
de helicópteros já em uso e possibilitou a construção da terceira perna
do forte tripé sobre a qual Aviação do Exército se projetaria. À cuidado-
sa seleção e à excepcional qualidade da especialização proporcionada
pela Marinha e pela FAB precisávamos agregar a excelência do material
a ser adquirido. “Não quero que amanhã venham dizer que a Aviação
do Exército começou com sucata”, enfatizava o general Leonidas. Essa
determinação foi fundamental para a consolidação da Aviação do Exér-
cito, pois afastou a necessidade de o Batalhão se preocupar de início em
realizar com seus meios a manutenção das aeronaves. Haveria apoio no
local de técnicos das empresas envolvidas na fabricação da aeronave. Os
suprimentos estariam disponíveis no Depósito Alfandegado, e existiria
constante orientação aos nossos mecânicos, gerentes e pilotos.
Uma afirmação do general Diogo, chefe do DMB, que soou como
diretriz geral para a aquisição das aeronaves foi: “Podemos comprar ae-
ronaves de qualquer lugar do mundo, porém será necessário assegurar
a nacionalização da manutenção e do máximo de itens de suprimento.”
Além das especificações técnicas das aeronaves, o edital incluía,
entre outros aspectos, dados referentes ao ferramental, aos equipamen-
tos para manutenção, aos estágios e aos cursos para capacitação de pes-
soal. Estabelecia a abertura das propostas para o dia 23 de outubro de
1987, quando se comemora o Dia do Aviador.
Algumas datas previstas no cronograma inicial para o transcurso
do processo foram alteradas em função da complexidade das solicitações
feitas às empresas concorrentes, que demandaram maior prazo para o
atendimento.
Os requisitos técnicos e as imposições estabelecidas eram ri-
gorosos e visavam preservar a excelência do produto a ser adquirido, as
336 Aviação no Exército - uma visão histórica

condições favoráveis de custos, a forma de pagamento compensadora e


a lisura e a transparência da operação comercial.
Conhecida por poucos, a tarefa de elaboração do edital im-
plicou a necessidade de contatos no Ministério da Fazenda sobre a
interpretação do texto do Decreto-Lei nº 200, que na época regia as
licitações realizadas pelos órgãos governamentais. O trabalho realiza-
do pela Comissão Especial de Licitação, composta por oficiais do De-
partamento de Material Bélico e da Diretoria de Material de Aviação
do Exército, tinha como objetivo o integral e irretocável cumprimento
daquele diploma legal, evitando quaisquer possibilidades de reclama-
ções que pudessem arguir dubiedade de interpretação das ações ence-
tadas pela comissão.
O edital possuía 33 páginas e 6 anexos, estes com 40 páginas,
perfazendo um total de 73 páginas, elaborado pela Comissão Especial
de Licitação, que fora nomeada em 20 de agosto de 1987, pelo Boletim
Interno nº 156, do DMB, documento que tornou público o edital de Con-
corrência Internacional nº 01/87 DMB.
Os capítulos constitutivos do edital se dividiam em um pre-
âmbulo, a definição de condições gerais, o detalhamento do objeto
da licitação, a sistemática de habilitação das empresas, a proposta
técnica, a proposta comercial, as condições de julgamento, o calen-
dário dos eventos, as condições de execução do contrato e as dis-
posições finais. Os anexos referiam-se aos Requisitos Operacionais
Básicos dos helicópteros, o roteiro de informações para apresenta-
ção da proposta técnica, o esclarecimento sobre os níveis de manu-
tenção, o Depósito Alfandegado e o modelo de carta para o pedido
de inscrição à licitação.
A comissão era composta pelos seguintes militares:

Cel Cav Luiz Oscar Bulcão de Lima – presidente – diretor


da DMAvEx;
Cel Art Valentim Angelo Teixeira – adjunto – DMB;
Cel Inf Linelson de Souza Gonçalves – adjunto – DMB;
Ten Cel Cav Paulo Sergio da Silva Maia – adjunto – EME;
Maj QEM Sergio Cerredelo Roxo – adjunto – DMAvEx;
Cap QEM Francisco Carlos Sardo – adjunto – DMAvEx; e
Cap Hélio Gomes Torres – secretário – DMAvEx.
O processo de aquisição das aeronaves 337

Ao longo deste capítulo, vamos tecer considerações somente


sobre os dados contidos no edital que envolviam particularidades es-
pecíficas dos contratos na área aeronáutica. Aquelas comuns às demais
licitações não serão objeto de abordagem.
Estabelecia o edital que os contatos entre a Comissão Especial
de Licitação e as empresas concorrentes, quando julgados necessários,
seriam realizados exclusivamente por documento escrito, ficando ve-
dada a possibilidade de contatos diretos com a comissão ou qualquer
um dos seus integrantes. Além do mais, especificava que as respostas
às dúvidas apresentadas à comissão por um dos concorrentes seriam
divulgadas na íntegra aos demais. Essa conduta, adotada por decisão
do general Bulcão, colaborou sobremaneira para aumentar a transpa-
rência das ações da comissão e para impedir qualquer manifestação
de atendimento diferenciado a qualquer dos participantes. Durante o
curso dos eventos, conforme previsto, até o resultado final, o general
Bulcão não recebeu privadamente qualquer representante de empresa
participante da licitação.
O edital definia o objeto do contrato em 36 helicópteros de ma-
nobra e 16 de reconhecimento e ataque, suprimentos não apoiados pelo
Depósito Alfandegado para dois anos de operação, considerando 300
horas de voo por aeronave/ano, ferramental e equipamentos de manu-
tenção, publicações técnicas para manutenção e operação, meios mate-
riais especiais e cursos e estágios para capacitação de pessoal militar
para operação e manutenção. Informava que os helicópteros deveriam
atender às especificações estabelecidas nos ROB para as aeronaves e im-
punha que as empresas estrangeiras estivessem consorciadas com em-
presas nacionais, sendo estas consideradas as líderes de cada consórcio
concorrente.
Para evitar a imobilização de vultosos recursos na aquisição
de suprimentos, o edital estabeleceu três cláusulas interativas
e complementares: o Depósito Alfandegado, o buy back e a de
suprimentos. A cláusula do Depósito Alfandegado determinava que
o consórcio vencedor mantivesse próximo do local de operação
das aeronaves uma instalação para armazenamento dos itens de
maior custo, sob a responsabilidade da contratada até sua aquisição
pelo Exército. Pela cláusula de suprimentos, solicitava-se que a
empresa contratada fornecesse uma lista de itens de maior índice
338 Aviação no Exército - uma visão histórica

de mortalidade para dois anos de operação, considerando a media


de 300 horas de voo/ano. Pela cláusula de buy back, estabelecia-se
a recompra dos itens de suprimentos propostos caso não fossem
utilizados durante o prazo de até três anos após a aquisição, ou de sua
vida em prateleira, o que ocorresse antes. Essas cláusulas permitiram
uma considerável economia de recursos. Quando abordarmos a
elaboração do contrato com o consórcio vencedor, nos alongaremos
um pouco mais a respeito dessas cláusulas.
Ainda com os olhos fitos no emprego racional dos recursos,
foram solicitadas informações sobre a intercambiabilidade entre os
conjuntos das aeronaves, sobre a capacidade de manutenção já in-
corporada pela Força Aérea Brasileira e Marinha do Brasil e pelas
empresas do parque nacional aeronáutico em relação às aeronaves
oferecidas.
No tocante à garantia técnica, ela deveria abranger o funciona-
mento global dos helicópteros, incluindo os componentes de subcontra-
tadas, e não ser inferior a 12 meses ou 1.000 horas de voo. Incluía ainda
a garantia de fornecimento de suprimentos, mesmo de subcontratados,
pelo período mínimo de 15 anos.
A proposta comercial continha a necessidade de compensação,
envolvendo a aquisição pelo governo estrangeiro representado no con-
sórcio vencedor de material aeronáutico e/ou material bélico de 100%
do valor total de todo o material a ser adquirido. Em caso de outros pro-
dutos, a compra deveria ser superior à média do comércio entre os dois
países nos últimos três anos. O valor em acréscimo seria igual ou supe-
rior ao do contrato de aquisição.
Nas condições de julgamento de cada proposta, especificava-se
a possibilidade de convocação de representante das empresas concor-
rentes para esclarecimento de dados constantes da proposta técnica.
Foi estabelecido que, para efeito de julgamento das propostas
comerciais, as condições de pagamento e financiamento e a oferta de
compensação (offset) seriam preponderantes. Verifica-se que nesse as-
pecto a apresentação do menor preço não era fator determinante da es-
colha das aeronaves.
Sobre os anexos, cabe ressaltar o de letra “C”, que definia
o “Roteiro para Apresentação da Proposta Técnica”. Destinava-se a
orientar as licitantes sobre as informações julgadas necessárias.
O processo de aquisição das aeronaves 339

Não excluía a possibilidade de as licitantes serem instadas a


apresentar outros dados que não tivessem sido objeto de licitação
anteriormente. Deixava a critério de cada consórcio a apresentação
de dados complementares.
O Anexo C antecipava para as concorrentes os principais itens a
serem avaliados pela comissão. Reagidos com os ROB, de conhecimento
de todos os participantes, permitiam a comparação de cada aeronave
em relação às demais. O anexo em questão dava a exata compreensão
do desenrolar da avaliação a ser elaborada pela comissão. Apresentava
um total de cinco itens principais, a saber: desempenho, tecnologia, grau
de confiabilidade e manutenção, adaptação aos diversos tipos de ope-
rações e comunicações. Estes eram subdivididos em grande número de
subitens aos quais nos referiremos mais à frente quando tratarmos do
processo de avaliação.
O Anexo D especificava os níveis de manutenção, conceituan-
do-os de modo a permitir o máximo de padronização nas informações
pedidas às empresas licitantes.
O Anexo E referia-se ao Depósito Alfandegado e esclarecia as
condições de funcionamento exigidas pelo Exército.
Pelo exposto, apesar de nosso interesse de não nos alongarmos
demais sobre o assunto, pode-se constatar a minuciosidade do edital.
Na fase precedente à reunião de abertura das propostas, hou-
ve intensa troca de correspondências de esclarecimentos sobre dúvidas
dos licitantes acerca do edital e dos documentos de especificações téc-
nicas anexados a ele. O modelo adotado, como já dito, foi o de divulgar
para todos os licitantes as respostas a cada dúvida encaminhada. Muitas
vezes, a resposta dada para sanar determinada dúvida de um dos lici-
tantes criava novas dúvidas em outros, e, com isso, o número de corres-
pondências se intensificava.
É importante ressaltar que ao longo do processo de elaboração
do edital, o general Diogo, chefe do DMB, acompanhou sempre de perto
todos os trabalhos desenvolvidos pela Comissão Especial de Licitação.
Periodicamente, realizava reuniões em seu gabinete com toda a equipe,
ocasião em que tomava conhecimento dos textos propostos, aprovando-
os, alterando-os ou mesmo rejeitando-os. Foi dele exclusivamente
a deliberação e a responsabilidade de atrasar a liberação do edital
até que, por proposta do Ministério do Exército, fossem introduzidas
modificações no Decreto-Lei nº 200, diploma que regia as concorrên-
cias governamentais, de modo a permitir a participação de empresas
estrangeiras em consórcio com empresas nacionais, como era desejável.
Somente após isso, a redação final foi aprovada pelo chefe do DMB, e o
edital, publicado.
Capítulo 22

A concorrência internacional
para aquisição das aeronaves

O utro marco da implantação da Aviação do Exército foi a con-


corrência realizada em 1987 que culminou com a aquisição
de 16 helicópteros HB 350 L1 – Esquilo (HA-1) e 36 AS – 365 F Dauphin (HM-
1), fornecidos pelo Consórcio Aerospatiale/Helibras. Esse último helicópte-
ro teria mais tarde modificada sua denominação para AS 365K Panther, em
função das modificações aportadas e para caracterizar seu emprego militar.
Doravante, é com essa designação que a ele faremos referência.

Equipe da DMAvEx integra a reunião com os representantes das empresas


participantes da concorrência internacional para aquisição das aeronaves. Da
direita para a esquerda, Cel Linelson, Maj Gomes Torres, Maj Roxo e Maj Rios
342 Aviação no Exército - uma visão histórica

Em 30 de novembro de 1987, no auditório do Departamento


de Material Bélico, foi realizada a reunião de divulgação do resultado da
habilitação das empresas que se candidataram a fornecer os itens cons-
tantes do edital, primeira fase da Concorrência Internacional. A reunião,
um dos eventos do calendário da Comissão Especial de Licitação, tinha
como objetivo dar conhecimento dos consórcios aceitos para concorre-
rem ao certame, após a análise da capacidade jurídica e técnica, assim
como da idoneidade financeira.
Justificadamente, o número de presentes à reunião foi significati-
vo. O auditório se apresentava repleto. Não obstante não se constituir um
ato terminativo, o interesse das empresas era muito grande em razão do
vulto dos recursos envolvidos na negociação e por tratar-se de um evento
de grande singularidade, principalmente para o Exército. Abria-se uma
nova atividade e um novo ramo de fornecimento de produtos para a Força.

Outro aspecto da reunião com os representantes das empresas concorrentes.


Em pé, o Cel Linelson; sentado, o Maj Gomes Torres

Foram habilitados seis consórcios:

1) Bell Helicópter Textron Inc, representada pela Moto-


ravia Representações Aeronáuticas Ltda;
2) Agusta S.p. A, representada pela Agusta, S.p. A;
3) Centrul National Aeronautic, representada pela
Mayrink Veiga S/A;
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 343

4) United Technologies Corporation, Sikorsky Division,


representada pela Powerpack Representações e Comér-
cio Ltda;
5) Messerschmitt, Bolkow, Blohm GMBH, representada
pela Prólogo S/A Produtos Eletrônicos;
6) Consórcio Helibras, Engesa, Aerospatiale, representa-
do pela Helibras do Brasil.

Da esquerda para a direita, Cel Valentim, ordenador de despesa do DMB,


Gen Div Décio, VCh do DMB, e o então Cel Bulcão, diretor da DMAvEx

O ato seguinte foi o recebimento das propostas. A mesma serieda-


de, competência e eficiência que estiveram presentes nas demais ativida-
des envolvendo a implantação da Aviação do Exército imperaram naquele
ato. Compreendeu uma série de medidas de caráter especial com o objetivo
de manter a isenção e a total visibilidade do processo licitatório. O grande
interesse despertado pela Concorrência Internacional nº 01/87-DMB por
parte das licitantes e de outras empresas ligadas direta ou indiretamente ao
setor de aeronáutica previa uma presença de público que talvez excedesse a
capacidade do auditório do DMB. Tal afluência poderia dificultar de algum
modo os trabalhos da Comissão Especial de Licitação e das próprias licitan-
tes interessadas no acompanhamento da reunião. Requeria-se um controle
rígido para que esta não fosse prejudicada por comentários dos presentes.
A seriedade dos assuntos que seriam tratados exigia um ambiente calmo e
344 Aviação no Exército - uma visão histórica

disciplinado, caracterizado pelo respeito a cada um dos envolvidos. Além


disso, a elevada projeção das licitantes no seleto universo das empresas de-
dicadas à área da aviação exigia que as reuniões tivessem um desenvolvi-
mento compatível com o alto nível dos concorrentes. Assim foi feito.
Cabia ao secretário da Comissão Especial de Licitação a identificação
dos representantes das licitantes por meio do preenchimento de uma lista de
presença. Eram verificadas a identidade e os documentos que os habilitavam
como representantes legais das respectivas empresas (procuração).

Aspecto da reunião de apresentação das propostas

Entrega das propostas das empresas concorrentes

A presença nas reuniões foi facultada a outros participantes,


restringindo-se, no entanto, ao número de assentos disponíveis no au-
ditório do DMB.
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 345

Para a ocupação destes, as delegacões deveriam obedecer às indi-


cações existentes no auditório. As reuniões se iniciavam impreterivelmente
às 14h e eram abertas pelo general Bulcão, presidente da Comissão Espe-
cial de Licitação, que fazia o anúncio da pauta do dia. Na primeira reunião
para entrega dos invólucros de habilitacão e das propostas, a chamada dos
representantes obedecia à ordem alfabética dos consórcios que representa-
vam. De posse dos envelopes, a Comissão Especial de Licitação fazia a aber-
tura daqueles relativos à documentação de habilitação. Esses documentos e
os invólucros nº 2 e 3, propostas técnica e comercial, respectivamente, eram
grupados em mesas distintas para cada licitante, a fim de serem rubricadas
pelos representantes dos demais concorrentes. Esse procedimento garantia
a todos que as propostas não seriam objeto de substituição. Nessa ocasião,
os invólucros foram mantidos fechados. Nas 2ª e 3ª reuniões, o presidente
da Comissão Especial de Licitação realizou a abertura dos invólucros nº 2
e 3, grupando todos os documentos em mesas distintas, como já ocorrera
na reunião anterior, uma para cada licitante, mantendo-se a mesma siste-
mática anterior, com a convocação dos representantes que apuseram suas
rubricas nas demais propostas, após abertas.
As questões levantadas pelos participantes durante as reuni-
ões foram lançadas em ata e registrado em relatório o parecer sobre o
assunto, que era apresentado na reunião seguinte e/ou remetido às lici-
tantes por meio de ofício. A manifestação de participante era permitida
após inscrição junto aos representantes da Comissão Especial de Lici-
tação. A chamada para o aparte era realizada pela ordem de inscrição.
As reuniões ocorreram em sucessivos tempos de 50 minutos de
duração, com intervalos de 10 minutos entre cada tempo e somente eram
encerradas após a assinatura da ata pelos representantes dos licitantes.

O autor confere a proposta da Sikorsky


346 Aviação no Exército - uma visão histórica

O autor recebe a proposta da Agusta

Reunião de recebimento das propostas. Da esquerda para a direita,


o Cel Linelson, o Cap Sardo e, ao fundo, o autor

Sentado, o Cap Sardo e uma funcionária do DMB.


Em pé, o autor presta esclarecimentos à plateia
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 347

Da esquerda para a direita, o Cel Valentim, do DMB,


o Cel Bulcão, diretor da DMAvEx, e o autor

Em primeiro plano, o Cap Sardo. Ao fundo, da esquerda para a direita,


o Maj Roxo, o Cel Valentim e o Cel Bulcão. Os inúmeros volumes sobre
as mesas são as propostas apresentadas

Achei importante descrever com algum detalhe o desenvolvi-


mento das reuniões para demonstrar mais uma vez a lisura e o alto grau
de profissionalismo que presidiram todos os eventos realizados pela Co-
missão Especial de Licitação.
O julgamento das propostas foi realizado com a rígida
observância do Decreto-Lei nº 200, de 21 de novembro de 1986, e se
processou em quatro fases: habilitação, à qual já nos referimos, a análise
da proposta técnica e da proposta comercial e a apreciação final.
348 Aviação no Exército - uma visão histórica

Propostas das concorrentes

Antes da apreciação das propostas pela Comissão de Licitação,


foi concedida a todas as licitantes vistas sobre as propostas das demais
concorrentes, conforme podemos verificar nas fotos abaixo. Esse proce-
dimento foi mais uma demonstração da total transparência do processo
licitatório. Todos tomaram conhecimento do conteúdo das propostas
das concorrentes.

Representantes verificam proposta de outro consórcio concorrente

Tendo já feito referência à primeira fase no item anterior, va-


mos abordar diretamente a segunda fase, na qual as propostas técnicas
foram analisadas mediante o levantamento completo das características
técnicas e operacionais dos helicópteros oferecidos pelos licitantes e a
verificação do atendimento aos ROB dos helicópteros de manobra e de
reconhecimento e ataque, respectivamente.
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 349

Outro aspecto da análise da proposta

Como já expusemos, a avaliação das aeronaves em relação ao


atendimento aos ROB foi realizada pela comissão em caráter excepcional
em face da impossibilidade do cumprimento do estabelecido pelas IG
20-12 do Ciclo Administrativo dos Materiais de Emprego Militar.
Nessa fase, foram também analisadas a forma de pagamento e
financiamento, a proposta de nacionalização, a assistência técnica, entre
outras solicitações contidas no edital.
Como já citado, a licitação foi realizada sob a forma de técnica e pre-
ço. Em decorrência, cada consórcio apresentou uma proposta comercial a
qual envolvia custos, financiamento e contrapartida (offset) e uma proposta
técnica. Temos repetido algumas informações durante o transcurso do livro
no intuito de ressaltá-las e não deixar quaisquer dúvidas em nossos leitores.
Perdoem-me a prolixidade, mas nesse particular ele me parece desculpável.
As propostas comerciais foram examinadas com o apoio de
representantes do Ministério da Fazenda, do Ministério da Indústria e
Comércio e do Banco Central. Foram enviadas àqueles órgãos descarac-
terizadas, de modo que seus avaliadores não pudessem identificar a que
consórcio pertencia.
A descaracterização não foi realizada nas propostas técnicas,
que foram avaliadas pelos oficiais da DMAvEx participantes da Comis-
são Especial de Licitação, por motivos óbvios, considerando que se tra-
tavam de aeronaves que possuíam características distintas, o que as
identificavam facilmente.
Na apreciação da proposta técnica de cada empresa, no tocante
às características de cada aeronave para o cumprimento das missões
350 Aviação no Exército - uma visão histórica

em que seriam empregadas, mais de 500 itens foram avaliados. Cada


oficial recebia uma proposta para análise e estudava-a com profundida-
de. Em seguida, nas reuniões no plenário da comissão, eram divulgados
os dados analisados para conhecimento de todos os integrantes. Poste-
riormente, as propostas eram avaliadas conjuntamente, momento em
que eram atribuídos valores para cada item das propostas. A sistemática
permitiu que os componentes da comissão tivessem perfeito conheci-
mento do conteúdo de todas as propostas apresentadas. Na avaliação
das aeronaves, cada ROB foi desdobrado em diversos subitens, que per-
mitiram valorar minuciosamente cada característica analisada. O valor
atribuído a cada subitem era proporcional ao peso atribuído aos ROB
dos quais se originaram. Após a análise de cada item e os corresponden-
tes subitens, os valores atribuídos a cada um, pelo consenso do plenário
da comissão, eram introduzidos no computador para os cálculos finais,
definindo, então, o valor final obtido por cada proposta.
Quando encontrei o general Bulcão em Porto Alegre, após sa-
ber que ele conservava exemplar do edital, me veio a esperança de po-
der encontrar as fichas de avaliação das aeronaves com a pontuação
respectiva. Ele as conservou, mas pouco antes de nosso contato as tinha
destruído. Pena! Teria sido muito bom divulgá-las.
Perdoem-me o estilo repetitivo que adotei para explicar como
as propostas técnicas foram avaliadas em relação ao atendimento dos
ROB. Fiz isso no intuito de deixar o mais claro possível como a avaliação
se desenvolveu.
A definição do sistema pontuação para avaliar as propostas
de venda de helicópteros para o Exército Brasileiro não se restringiu
unicamente à valoração das características técnicas das aeronaves, mas
se estendeu às demais demandas definidas no bojo do edital. Foi, an-
tes de tudo, um processo previamente estudado e baseado nas normas
e técnicas de tomada de decisão aplicadas inclusive em administração
de empresas, em que o administrador se vê frequentemente diante de
situações nas quais deve decidir sobre o melhor investimento e, nessas
situações, necessita de métodos racionais e equilibrados para poder di-
mensionar adequadamente o problema e tomar a melhor decisão, de
acordo com os objetivos da empresa.
O processo visava tabular de forma ponderada, mensurando os
atributos previamente estudados pela Comissão de Licitação.
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 351

O processo deixava transparecer a sempre presente preocupa-


ção de tornar mensurável, objetiva e impessoal a avaliação. O modelo
indicava o uso intensivo das informações disponíveis, tanto aquelas das
propostas quanto, quando tal se aplicasse, as obtidas em publicações
especializadas. Procurou-se a redução das incertezas. Posso afirmar que
ele conduziu a tomada da melhor decisão possível para atender exclusi-
vamente aos interesses da Força.
Foram estabelecidas duas matrizes básicas. A primeira, referente
aos ROB das aeronaves, composta por cerca de 500, decorrentes do detalha-
mento de cada objetivo. A matriz nº 02 envolvia os demais requisitos cons-
tantes do edital da licitação. Para cada um destes se estabelecia um critério
de apreciação. A título de exemplo e para não nos alongarmos sobre o tema,
vamos abordar o critério básico estabelecido para apreciação da sistemática
de manutenção. Deveria se considerar nesse atributo as fases de manutenção
(calendárica/horária), custos dos suprimentos necessários a atendê-las com
base na previsão de 300 horas de voo, por ano, por aeronave.
Em relação à tecnologia, envolvendo a transferência dos processos
de fabricação dos helicópteros, deveria se orientar em torno dos percentu-
ais a serem atingidos, dos prazos para a transferência de tecnologia às em-
presas nacionais envolvidas e das restrições de transferência de tecnologia.
Todos os demais itens receberam idêntico nível de detalhamen-
to, de modo a orientar e a padronizar a atuação dos membros da comis-
são na análise de cada proposta e no estabelecimento de sua valoração.
Com os atributos levantados e devidamente detalhados, realiza-
mos nosso trabalho em condições de elaborar o cálculo das matrizes de
pontuação, indicando a melhor opção de compra que atendesse simulta-
neamente aos ROB, assim como as melhores opções técnico-financeiras e
logísticas (suprimento e manutenção).
Nada foi feito ao acaso ou fruto de improviso. Todo o processo,
em cada momento, foi alicerçado em estudos minuciosos e preparação
responsável, proporcionais à magnitude de nossa tarefa.
Na montagem do processo de aquisição e durante o julgamen-
to das propostas técnicas, a comissão teve a assessoria de oficiais da
Marinha Brasileira e da Força Aérea Brasileira, pilotos de helicóptero e
especializados em seu emprego operacional.
Como vimos anteriormente, o documento orientador da avalia-
ção da proposta técnica foi o Anexo “C” do edital, que apresentava, com
352 Aviação no Exército - uma visão histórica

clareza, o roteiro das informações de caráter técnico as quais deveriam


ser fornecidas pelas empresas concorrentes. Para dar uma ideia, ainda
que pálida, do que foi analisado, vamos discorrer sobre o anexo.
No tocante às características de desempenho, foram avaliadas,
comparativamente:
a. Velocidade
1) velocidade máxima (ao nível do mar, IS+20o);
2) velocidade máxima mantida (com peso máximo, ao nível do
mar, ISA + 20°C);
3) velocidade de cruzeiro;
4) velocidade para máxima autonomia.

b. Autonomias
1) Máxima quantidade de combustível utilizável:
– sem tanques auxiliares (em kg ou litros);
– com tanques auxiliares (em kg ou litros).
2) Quantidade de combustível não utilizável;
3) Consumo de combustível (com peso máximo, ao nível do
mar, ISA + 20oC, velocidade de cruzeiro);
4) Autonomia máxima (com peso máximo, ao nível do mar, ISA
+ 20o, sem reserva de combustível);
5) Autonomia máxima (com peso máximo, ao nível do mar, ISA
+ 20oC, com reserva de combustível).

c. Alcances (em km)


1) Alcance máximo (com peso máximo, ao nível do mar, ISA +
20oC, sem reserva de combustível);
2) Alcance máximo (com peso máximo, ao nível do mar, ISA +
20oC, com reserva de combustível).

d. Transporte de tropa
Número de assentos para transporte de tropas (não incluir os as-
sentos para os dois pilotos e mecânico de voo).

e. Número de macas possível de ser instalado e disponibilidade de


assentos nessa configuração (não incluir os assentos dos dois pilo-
tos e do mecânico de voo).
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 353

f. Potências (em SHP)


1) Potência máxima de decolagem;
2) Potência máxima contínua;
3) Teto máximo;
4) Teto de serviço;
5) Voo sem efeito solo.

g. Voo IFR (Instrumento)


1) Fabricantes dos equipamentos mínimos a serem oferecidos;
2) Equipamentos julgados necessários ao voo IFR, segundo
as normas do Departamento de Aviação Civil (DAC).

h. Faixa de temperatura ambiente de operação


Limites da faixa de temperatura ambiente, em cg, de operação do
modelos.

Densidade de carga da cabine de carga


j. Área e volume da cabine de carga (em metros)

l. Carga útil (em kg)


Pesos: básico; máximo de decolagem e de todos os opcionais pas-
síveis de serem instalados.

m. Acessos à cabine de carga (em metros)


Quantidades dos acessos à cabine de carga.

n. Alturas (em metros)


1) a distância mínima entre o rotor de cauda e o solo;
2) a distância mínima do componente dos modelos que mais
se aproxima do solo.

o. Pouso em terrenos acidentados


Capacidade de pouso em terreno em declive (citar o grau máximo
de inclinação permitido).

p. Gancho
1) a capacidade de carga no gancho permitida para os modelos;
354 Aviação no Exército - uma visão histórica

2) a velocidade máxima dos modelos com carga no garncho.

q. Guincho
1) a capacidade de carga no guincho permitida para os mode-
los;
2) o comprimento do cabo do guincho;
3) o tipo de acionamento do guincho (elétrico, hidráulico).

r. Configuração standard e opcionais. Indicar os principais


equipamentos, componentes e sensores, instrumentos que
compõe a configuração standard dos modelos, bem como
todos os opcionais de instalação previstos na linha de pro-
dução normal.

s. Manobrabilidade
1) Capacidade de realização de voos NOE; a razão de su-
bida máxima (com peso máximo, ao nível do mar, ISA +
202C); os limites da faixa de “G” que os modelos podem
suportar e o tipo do rotor principal (semirrígido, rígido,
articulado).
No tocante à “Tecnologia”, foram apreciados, entre outros, os
seguites aspectos:
a. Grau de atualização dos modelos apresentados, indicando a
data de início e previsão de encerramento da fabricação em
série dos referidos modelos.
b. Tecnologia adotada na fabricação da estrutura, equipamen-
tos, componentes e demais itens principais dos modelos
apresentados.
No aspecto “Grau de Confiabilidade e Manutenção”, foram
solicitados para avaliação:
a. Características gerais do sistema de comandos, citando se
são duplos e independentes.
b. Redundância dos sistemas essenciais dos modelos apresen-
tados.
c. Mean Time Between Failure – MTBF (tempo médio entre pa-
nes) dos modelos apresentados, bem como de seus princi-
pais componentes, equipamentos e demais itens essenciais.
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 355

d. “Programa de Manutenção”
a) relação homem/hora necessária para substituição dos
principais equipamentos, componentes e demais itens de
porte;
b) o intervalo de Overhaul (revisão geral) da (o):
– transmissão principal; transmissão intermediária;
transmissão do rotor de cauda; cabeça do rotor princi-
pal; pás do rotor principal e de cauda; servos primários
e auxiliares; motor e seus acessórios; demais itens prin-
cipais dos modelos.
c) características gerais do motor (se modular, intervalo de
inspeção etc.);
2) Programa de manutenção da aeronave (calendárica, horá-
ria etc).
3) Assistência técnica no Brasil.

Capacidade de receber armamento foi outro aspecto avaliado,


em particular nos seguintes pontos:

1) Capacidade dos modelos de servirem como plataforma das


seguintes armas:
a) Helicóptero de Manobra
– Foguete SBAT/70 de fabricação da Avibras ou similar,
com casulo (s), quando necessário;
– Mtr 7,62 MAG, simples ou dupla, com casulo, quando ne-
cessário;
– Dispositivo (s) de fixação que permita (m) a utilização do
seguinte armamento: Mtr 7,62 MAG.
b) Helicóptero de Reconhecimento e Ataque
Foguete SBAT/70 de fabricação da Avibras ou similar, com ca-
sulo (s), quando necessário;
– Mtr .50 (12,7mm), com casulo, quando necessário;
– Mtr 7,62 MAG, simples ou dupla, com casulo, quando ne-
cessário;
– Míssil AC;
– Canhão de 20 a 30mm.
a) Armamento (s) que possuam provisões já homologadas;
356 Aviação no Exército - uma visão histórica

b) Influência no desempenho das aeronaves em caso da


adoção de cada um dos armamentos já homologados.
c) Capacidade de sobrevivência em campo de batalha foram
avaliados:
1) Tolerância balística (especificar) para os componentes es-
senciais, tais como fuselagem, rotores, motor, transmissão
etc.;
2) Proteção anticrasch da aeronave como um todo;
3) Tanques autosseláveis;
4) Assentos com proteção anticrash para pilotos e tropas;
5) Prosseguir o voo sem óleo na caixa de transmissão prin-
cipal.
d) Capacidade de operação em climas frios (-15o);
e) Capacidade de operação em regiões de clima úmido e quente,
como a Selva Amazônica, indicando os reflexos no desempenho
do helicóptero em operação nessas regiões.
e. Capacidade de compatibilizar o painel com o equipamento indi-
vidual de visão noturna, observando quais as modificações ne-
cessárias aos modelos apresentados para que estes sejam com-
patíveis com a utilização dos equipamentos individuais de visão
noturna (óculos/binóculos).
f. Capacidade de instalação de sensores e equipamentos de co-
municações e navegação, indicando quais seriam os sensores e
equipamentos de comunicações e navegação possíveis de serem
instalados nos modelos apresentados.
g. Capacidade de operar em área de grande densidade de partí-
culas no ar, indicando a capacidade de instalação nos modelos
de separador de partículas. Citar a percentagem de redução da
potência em razão da instalação desse equipamento, bem como
o peso dele.
h. Outros dados sobre operações:
1) Possibilidades dos modelos serem dotados de dispositivos
corta-fios;
2) Tempo mínimo entre corte e partida do motor;
3) Existência na configuração standard, de sistema de estabiliza-
ção automática e piloto automático;
4) Características gerais e tipo do trem de pouso;
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 357

5) Características gerais do sistema de partida e geração de energia;


6) Características gerais do sistema de combustível;
7) Características gerais do sistema hidráulico;
8) Características gerais das pás do rotor principal e do rotor de
cauda (material composto, metal etc.).
i. Comunicações

Capacidade do sistema de comunicações dos helicópteros ofere-


cidos de ligação com a Força Terrestre, com o Serviço Móvel da Aeronáu-
tica e com Redes de Controle de Tráfego Aéreo, no Brasil e no exterior,
considerando que tal sistema deva ser compatível com o adotado pelo
Exército. Esse item estabelecia 14 caracterísiticas do sistema. Resolvemos
não detalhá-las por considerar que as informações possam revelar dados
que acarretem prejuízo às operações de comunicações no âmbito da For-
ça. Elas eram necessárias aos licitantes à medida que a configuração rádio
do helicóptero implica a instalação de antenas cuja interface com o equi-
pamento resulta em determinado grau de complexidade.
A abordagem desse assunto serve também para demonstrar o
nível de conhecimento dos integrantes da comissão, que permitiu, com
o indispensável auxílio de representantes do EME, da Marinha e da Ae-
ronáutica, um minucioso roteiro para avaliação técnica das aeronaves.
Os dados avaliados foram aqueles constantes das propostas de
cada empresa, e não nos cabe aqui analisar a qualidade das propostas e
dos dados apresentados pelos diversos concorrentes.
As propostas da Bell Textron e da Sikorsky apresentavam gran-
des restrições em relação às areas de transferência de tecnologia, finan-
ciamento, compensação, Depósito Alfandegado, entre outras, que depen-
diam de autorização do congresso americano para sua implementação.
Sobre esse aspecto, é interessante reproduzir o comentário realizado por
John B. Alexander em seu livro Ganhando a guerra, editado pela Biblio-
teca do Exército, no qual fica bem demonstrado a existência até hoje de
severas restrições do governo dos Estados Unidos da América do Norte à
venda de seus equipamentos bélicos e à transferência de suas tecnologias.

[...] a segunda desvantagem, associada aos controles


exagerados de exportação, é prejudicar os negociantes
norte-americanos em relação à competição internacional.
358 Aviação no Exército - uma visão histórica

Isso não acontece apenas com o comércio de armas não


letais, já que ouvi muitas queixas de homens de negócios
dos EUA contra a misteriosa burocracia estabelecida
pelo governo dos Estados Unidos. Os efeitos impactam
a nós todos, uma vez que diminuem as receitas do país e
contribuem para nosso déficit na balança comercial.

O pagamento de dívida do governo brasileiro ao Canadá era


uma das inaceitáveis condições presentes nas propostas americanas
para obtenção do financiamento para aquisição dos helicópteros.
Pelas razões expostas, a proposta de menor preço, que era a da
Bell, foi preterida, preferindo-se a da Aerospatiale, a qual não deixava
qualquer incerteza em relação às exigências constantes do edital e ofe-
recia aeronaves de tecnologia superior.
Coube ao Departamento de Material Bélico a avaliação e a ad-
ministração da parte econômico-financeira, realizando o julgamento
das propostas financeiras e, posteriormente, redigindo as cláusulas fi-
nanceira e do contrato de compensação e efetivando, nesse particular,
após a assinatura do contrato, o controle da execução.
Na qualidade de chefe da Assessoria Administrativa (A/5) e or-
denador de despesa do Departamento de Material Bélico, o coronel Va-
lentim Angelo Teixeira foi nomeado para integrar a Comissão de Licitação
e teve papel de capital importância na elaboração, discussão e gestão da
parte financeira. Como responsável por todos os contratos no âmbito do
departamento e das diretorias subordinadas, era impositiva a sua presen-
ça entre os membros da Comissão de Licitação. Como ordenador de des-
pesa, sua responsabilidade avultava, o que o obrigou a realizar inúmeras
reuniões, em particular com o general Diogo, chefe do Departamento, e
com a Diretoria de Material de Aviação, com vistas à sua preparação para
atender às múltiplas implicações de um processo de tal envergadura e
que se revestia de total originalidade. A complexidade envolvida obrigou
o coronel Valentim a formar uma equipe de apoio cujos integrantes foram
matriculados em um estágio especial da Escola de Administração Pública,
que tratava especificamente de toda a legislação que regulamentava o as-
sunto. Em decorrência dos novos conhecimentos adquiridos ao longo do
curso, inúmeras propostas de alterações na lei de licitações foram sugeri-
das, visando permitir maior abrangência à licitação, possibilitando que o
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 359

maior número de fabricantes de aeronaves pudesse concorrer, conforme


diretrizes emanadas dos escalões superiores.
A imposição da apresentação de uma Proposta Técnica e uma
Proposta Comercial, desta constando, pela primeira vez nas licitações
feitas pelo Exército, uma “Cláusula de Compensação”, envolvendo ma-
terial aeronáutico e/ou material bélico preferencialmente, no valor de
100% em relação ao preço total da proposta comercial, gerou os pesa-
dos encargos de elaboração e administração de dois contratos particula-
res, o financeiro e o de compensação. O vulto e a importância da missão
justificaram a definição antecipada, também nessas áreas, de normas e
de um sistema de avaliação com o estabelecimento de pontuação que
foram seguidos, rigidamente, durante toda a fase do julgamento. É im-
portante ressaltar que as normas referidas foram produzidas antes da
publicação do edital, quando não havia qualquer definição sobre as em-
presas que se apresentariam à licitação.

Outro aspecto da reunião em que as empresas tomaram conhecimento


das propostas das demais participantes

O resultado da Concorrência Internacional nº 01/DMB repre-


sentou o desfecho de um longo e minucioso processo de avaliação de
cada proposta apresentada. Foi declarado vencedor o consórcio integra-
do pela Helibras-Engesa-Aerospatiale, representado pela Helibras.
A despeito de uma declaração feita por um representante da
Bell ao general Bulcão, expressando a sua admiração pela elogiável
360 Aviação no Exército - uma visão histórica

qualidade do processo desenvolvido pelo Exército, a empresa interpôs


recurso, inicialmente na esfera administrativa, tentando impugnar o re-
sultado da licitação. Inconformada com sua classificação em 2º lugar,
alegava que o resultado não fora suficientemente justificado, postulava a
nulidade do julgamento e que ele fosse novamente realizado. Não arguia
a ilegalidade da licitação, mas postulava o refazimento do julgamento.
A ação intempestiva, sem justificativas plausíveis que amparassem seu
pleito, não teve prosseguimento, sendo prontamente rechaçada por ser
considerada a pretensão totalmente improcedente.

General Bulcão concede entrevista à imprensa

O primeiro recurso deu entrada no Gabinete do Ministro no dia


previsto para a cerimônia de assinatura do contrato com o consórcio
vencedor, certamente com a manifesta intenção de causar um enorme
mal-estar. Segundo o general Bulcão, ele foi procurado naquele dia pelo
assessor jurídico do Gabinete do Ministro, o qual lhe informou sobre o
teor do documento. O general disse-lhe que não o tornasse conhecido
até o encerramento da cerimônia, o que efetivamente ocorreu.
Em sequência, a Bell entrou com uma representação
repetindo a mesma solicitação inicial. Após isso, fez gestões por seus
representantes, pelo embaixador americano e pela Líder Táxi Aéreo
S/A junto ao DMB e à DMAvEx, para que houvesse a preterição do
consórcio vencedor em seu favor. Mais uma vez, não tendo sido acolhido
seu pleito, impetrou um Mandado de Segurança pleiteando a anulação
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 361

do julgamento da concorrência “por não ter havido justificação


bastante”. Logo, ela não refutava a inexistência ou impropriedade da
justificação do julgamento. Apontava o fato de que não fora “bastante”.
Não reclamava qualquer violação de direito. Em momento algum,
questionou a imparcialidade. Mostrava, sim, a sua contrariedade pelo
fato de o resultado não a beneficiar.
Convém lembrar que a Comissão de Licitação, além de apre-
sentar as justificativas em seu relatório em reunião pública, divulgou
os motivos que levaram ao resultado apurado. Na ocasião, foram apre-
sentados ainda os documentos elaborados na avaliação das propostas
e os fundamentos pormenorizados de sua decisão, a respeito dos quais
todos os concorrentes tiveram conhecimento.
Os argumentos da impetrante mais uma vez não foram aceitos,
e o resultado da licitação, por sua lisura e correção inatacáveis, foi ho-
mologado.
Na oportunidade, quero fazer um reparo sobre declaração mi-
nha feita em depoimento ao tenente-coronel Contreiras para o seu tra-
balho História oral da Aviação do Exército. Naquela ocasião, informei que
havia redigido a resposta ao recurso da Bell, o que, reconheço, foi uma
declaração incorreta. Jamais quis me arrogar a paternidade desse fato.
Já frisei anteriormente que as decisões se originam de nossos chefes,
cabendo-nos assessorá-los. O que preparei foi a argumentação, segundo
minha esfera de atribuição, da parte técnica, que iria respaldar nesse
aspecto a resposta elaborada pela assessoria jurídica do DMB.
O coronel Valentim, a quem nos referimos anteriormente, pres-
tou um interessante e elucidativo depoimento sobre o assunto, que
transcrevemos abaixo:

Outra situação que me suscitou grande preocupação ocor-


reu antes da assinatura do contrato, quando a Bell Helli-
copter entrou na justiça tentando impedir a sua assinatura.
Por volta das quatro horas da tarde, o vice-chefe do DMB,
Gen Décio (o chefe do DMB, Gen Diogo, estava viajando), me
chamou e determinou que me apresentasse imediatamente
no Gabinete do Ministro e que o Sr. ministro desejava falar
comigo. Chegando lá, me apresentei ao Gen Leonel, Ch Gab,
que me levou, imediatamente, à presença do Gen Leonidas.
362 Aviação no Exército - uma visão histórica

O Sr. ministro disse que me chamara porque o Gen Bulcão,


diretor da DMAvEx, estava viajando. Perguntou-me se eu
tinha conhecimento de que a Bell entrara na Justiça para
impedir a assinatura do contrato. Respondi-lhe que tinha
pleno conhecimento do assunto e que já o discutira com o
Gen Bulcão. Ele me determinou a preparação de um dossiê
sobre toda a negociação com a Aerospatiale, incluindo de-
talhes das propostas de ambas as empresas, abordando cri-
térios de julgamento e tudo aquilo que confirmasse a lisura
do processo licitatório. O documento deveria estar pronto
às 10h do dia seguinte. Retirei-me, passei no meu gabinete,
peguei todos os documentos para consulta disponíveis, fui
para casa e virei a noite inteira trabalhando, pois o assunto
era vasto, complexo e não podia cometer nenhum engano
ou erro. No dia seguinte, bem cedo, me dirigi para o QG do
Ex e fiquei à espera do primeiro bom datilógrafo do DMB.
O primeiro a chegar foi o Sr. Wesley (Ney, como era conhe-
cido). Dei-lhe a missão de datilografar tudo, cerca de umas
doze páginas, com o mais absoluto cuidado para não errar.
Quando pronto, fiz uma cuidadosa revisão e, em seguida,
me dirigi ao Gabinete do Ministro. Às dez horas em ponto,
estava à sua frente com tudo pronto. Entreguei-lhe as duas
cópias, ele as leu, disse que estava bem feito, me determinou
que me fardasse com o 4º A, pedisse um carro do Gabinete
e me dirigisse para o Itamaraty, que o ministro das Relações
Exteriores estaria à minha espera. Ordenou-me que entre-
gasse uma das cópias a ele e que respondesse a qualquer
pergunta que ele me fizesse. Assim o fiz e após a leitura
completa do documento, o ministro apenas me perguntou
se ele podia mostrar aquele documento ao embaixador dos
EUA, no Brasil. Respondi-lhe que sim e me despedi. Pelo que
me consta, o assunto foi encerrado ali; a Bell aquietou-se e
não mais perturbou.

Não vendo atendido o seu pleito em nenhuma das esferas, a Bell


propôs que lhe fosse concedida uma carta de intenções assegurando-
lhe futuras aquisições ou que o objeto do contrato fosse dividido entre
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 363

ela e o consórcio vencedor, o que a levaria a encerrar suas manobras


para tentar anular a licitação. Evidentemente, nenhuma das intenções
daquela empresa prosperou.
Sobre o assunto, reproduzimos texto publicado pelo Noticiário do
Exército, de 21 de julho de 1988:

O Exército Brasileiro, com absoluta competência e irrefra-


gável lisura, está adquirindo os helicópteros indispensáveis
a sua aviação.
COMPETÊNCIA E LISURA JÁ EVIDENTES NA DECISÃO DE
ADOTAR A VIA CONCORRÊNCIA INTERNACIONAL, APE-
SAR DE TER CONDIÇÃO LEGAL PLENA DE A SEU EXCLU-
SIVO CRITÉRIO DISPENSÁ-LA. (grifo do autor).
Na busca tenaz e zelosa da melhor solução, o Exército obteve
assessoramento de perícia e idoneidade indiscutíveis: na
parte comercial, do Ministério da Fazenda; na parte técnica,
dos ministérios da Marinha e da Aeronáutica. Peritos e
órgãos especializados de outros ministérios também foram
consultados.
As possibilidades de nacionalização dos equipamentos,
financiamento em longo prazo e contrapartida comercial
foram levadas na alta conta que o interesse nacional exige.
Este procedimento lúcido, escrupuloso, objetivo e
firme permitiu que fosse celebrado, com o Consórcio
Aerospatiale-Engesa-Helibras, o contrato melhor ajustado
às necessidades do Exército e aos interesses da economia e
de desenvolvimento nacionais.
Nesta hora de imprescindível contenção de despesas, ficam
assegurados o desejável financiamento de longo prazo, com
dois anos de carência e, por intermédio de uma cláusula de
compensação, a contrapartida segura de uma aquisição de
equipamentos brasileiros que significará uma exportação
de valor idêntico ao do valor dos helicópteros adquiridos.
No que concerne à indústria, cumpre assinalar a vantagem
da transferência de tecnologia e mesmo a perspectiva de
desenvolvimento de uma aeronave, de asas rotativas, intei-
ramente brasileira.
364 Aviação no Exército - uma visão histórica

O produto adquirido é de superior qualidade: são helicóp-


teros de última geração, incorporando tecnologia de ma-
teriais compósitos e de avançada concepção da cabeça do
rotor principal.
Neste quadro complexo e abrangente, o preço é apenas um
dos fatores de decisão, e não o único ou preponderante.
Atropelando esta obviedade, uma das concorrentes decla-
ra-se prejudicada, alegando ter apresentado menor preço.
Significativamente, as demais concorrentes, também de re-
nome internacional, aceitaram o resultado, aliás, com per-
feito respaldo nos fundamentos da concorrência.
Após conseguir levar suas alegações improcedentes a al-
guns jornais e revistas, a concorrente inconformista está
anunciando a possibilidade de ser impetrado um Mandado
de Segurança.
Na mais recente destas matérias, a própria revista que vei-
cula observa: ‘Por trás desta briga toda, está o encolhimento
do mercado internacional de helicópteros.’
A ‘briga toda’ é um exagero, mas a retração dos compra-
dores é uma dura realidade para a concorrente insatis-
feita, deixando-a em desconfortável posição perante seus
acionistas.
Neste contexto, há, provavelmente, apenas um esforço pu-
blicitário, na vã tentativa de tornar aparentemente discutí-
vel o irrefutável resultado da concorrência.
O Exército está tranquilo e confiante. Tranquilo porque tem
consciência de que agiu com competência; confiante por-
que a decisão está nas boas mãos da Justiça brasileira.

O objeto do contrato
O objeto do contrato celebrado entre o Exército Brasileiro e
o Consórcio Engesa-Helibras-Aerospatiale envolveu a aquisição de 16
aeronaves Esquilo HB 350 L1, monomotor; 36 aeronaves Panthers AS
365K, bimotor; equipamentos de navegação e comunicações para todas
as aeronaves; ferramental até 3º escalão; documentação técnica; meios
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 365

auxiliares de instrução; treinamento de pessoal no Brasil e no exterior e


assistência técnica.
As aeronaves foram adquiridas sob a forma que podemos classifi-
car pela conhecida expressão “porteira fechada”. A modalidade significa que
após a definição dos equipamentos de navegação e de comunicações que
desejávamos, inclusive com a especificação dos fabricantes, a responsabili-
dade da aquisição e da realização da interface com os aparelhos seria exclu-
sivamente da Aerospatiale. A decisão da escolha desse tipo de compra dos
equipamentos de navegação/comunicação (Nav/Com) decorreu de experi-
ência colhida com os valorosos companheiros da Marinha e da Força Aérea.
Para melhor entendimento do assunto, é importante frisar que
os equipamentos de navegação e comunicações eram produzidos e for-
necidos por outras empresas, inclusive americanas, como os de comuni-
cação Collins. Do exposto, pode surgir a pergunta: não seria mais barato
comprar diretamente do fabricante e entregá-los à empresa para a mon-
tagem nos helicópteros? Aprendemos a tempo que não. Nos inúmeros e
extremamente frutíferos contatos que tivemos com as Forças coirmãs,
soubemos de casos que indicavam que a compra do “pacote fechado” se-
ria a melhor alternativa. Entre as situações que tomamos conhecimento,
incluía-se a briga interminável envolvendo o defeito em equipamento de
navegação/comunicação fornecido a uma das Forças, em que o fabrican-
te alegava que o problema identificado era causado pela sua interface na
aeronave de responsabilidade do fabricante, e não do equipamento em
si, o que era contestado pela outra parte.
No nosso caso, tivemos um único interlocutor, a quem cabia a
responsabilidade de resolver os problemas com qualquer equipamento
de dotação dos helicópteros.
A integração dos equipamentos na aeronave é muito delicada
e exige a definição de requisitos técnicos específicos, além de custosa
campanha de voos para sua homologação. A sistemática adotada nos
permitiu gerar um crédito importante junto à Aerospatiale, ao qual fa-
remos alusão quando discorrermos sobre o “problema do HF Collins”.
O AS 365K Panther, designado HM-1 pela Aviação do Exército,
sem sombra de dúvida, era uma aeronave tecnologicamente superior
àquelas do consórcio posicionado em 2º lugar na licitação. Tem como
missão primordial o deslocamento de tropas em operações aeromó-
veis. Helicóptero multifunção, o Panther, além de sua missão básica,
366 Aviação no Exército - uma visão histórica

pode realizar ações de apoio logístico, evacuação aeromédica e mesmo


de ataque por constituir-se em plataforma estável e favorável para esse
tipo de missão. No Brasil, apenas o Exército o utiliza para emprego mi-
litar, mas suas variantes são usadas no mercado civil e no exterior por
Forças Armadas da Arábia Saudita e Israel, entre outras. Também é uti-
lizado pela Guarda Costeira dos Estados Unidos, pela Marinha francesa,
pela China e pela Marinha da Bulgária.

O Panther nas Forças Armadas chinesas (Foto extraída do jornal O Globo)

Por ocasião do início do funcionamento da COMFIREMEX, em


Marignane, a China já possuía uma comissão similar em atividade na
Aerospatiale, envolvida em processo de transferência de tecnologia
para aquele país. O primeiro voo do Dauphin, versão da qual se origi-
nou o Panther, aconteceu em 1984, e sua produção seriada teve início
em 1986. Alternativamente, o Panther pode ser empregado também em
missões de reconhecimento, apoio à guerra eletrônica, busca e salva-
mento e transporte de carga, além das anteriormente citadas.
No Brasil, a aeronave se utiliza do apoio da Helibras, o que faci-
lita a logística e a manutenção. Atualmente, impulsionado por dois mo-
tores Turbomeca Arriel de 653hp cada um, a aeronave pode atingir até
324km/h de velocidade máxima e transportar, além da tripulação, nove
homens equipados, ou seja, um grupo de combate de Infantaria. Pode
transportar até 1.600kg de carga externa. É dotada atualmente de uma
metralhadora lateral calibre 7,62mm. Sua configuração em aviônicos
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 367

permite a realização de voos por instrumentos em situações de baixa ou


nenhuma visibilidade, com alta segurança.
Ninguém melhor para fazer um juízo a respeito do material do
que o seu utilizador. Em consequência, vamos transcrever abaixo trecho
da revista Rotores, editada pela DMAvEx, sobre o Panther.

Designados pelo Exército Brasileiro como HM-1, os Euro-


copter AS 365K Pantera são hoje os principais vetores de asas
rotativas do Exército Brasileiro, que adquiriu 36 (trinta e
seis) exemplares. Desenvolvidas a partir do helicóptero civil
AS-365 Dauphin, conceitualmente essas aeronaves são uti-
lizadas como helicópteros de manobra da Aviação do Exér-
cito, tendo como principal tarefa o transporte de frações de
tropas em operações aeromóveis.
No entanto, as excelentes características de desempenho
do Pantera fazem com que esse helicóptero seja empregado
em missões como reconhecimento, apoio à guerra eletrôni-
ca, busca e salvamento, evacuação aeromédica e transporte
de carga. Muito veloz, manobrável e capaz de portar uma
impressionante carga útil, o Pantera é equipado com uma
moderna suíte de aviônica que permite que esse helicóptero
execute surtidas com enorme precisão, mesmo a baixa altu-
ra e sob condições de voo por instrumentos.
Por ser o seu principal helicóptero, os HM-1 participaram
de praticamente todas as principais operações realizadas
pela Aviação do Exército, tendo os Panteras cruzado todo o
território nacional na execução de inúmeras missões.

Na criação da Aviação do Exército, a aeronave AS 365K, deno-


minda internamente de HM1, foi um símbolo de modernidade. Design
característico, adoção de um novo conceito de rotor de cauda (inédito à
época no Brasil) – de onde provinha o “barulho de avião”–, velocidade
excepcional, dissolvia qualquer dúvida ao olhar um Pantera: era a “aero-
nave do Exército”. Somando-se a isso, o fato de o Pantera ser a aernonave
que “mais cumpre missão” na Aviação do Exército, me atrevo a chamá-lo
de “símbolo da Aviação do Exército”. Cap QEM Carlos Eduardo de Oliveira
– Revista Guardião da Aviação – Ano 2, Dez/10.
368 Aviação no Exército - uma visão histórica

As prováveis ameaças não apontam hoje, e com muito mais


razão, não indicavam na ocasião, necessidade de equipar a Aviação do
Exército com uma aeronave especialmente desenvolvida para missões
de ataque, como o Cobra ou, mais modernamente, o AH-64 Apache ou
similares. Embora em um primeiro momento seja natural pensar que
essa seria uma capacidade desejável, ter uma aeronave que cumpriria
exclusivamente missões de ataque, isso, além de exigir um significati-
vo maior aporte de recursos financeiros, diminuiria a flexibilidade da
Aviação do Exército em se adaptar às condições brasileiras, tanto ope-
racionais como orçamentárias. Sendo assim, para a função de aeronave
de ataque, o Exército decidiu de modo adequado, pertinente e realista
adquirir uma aeronave polivalente. Além de cumprir suas missões pri-
mordiais, os HB 350 L1 Esquilo são empregados em evacuações aero-
médicas, transportes de carga externa (750kg por meio de gancho ex-
terno), infiltração e exfiltração de pessoal (por meio de rapel e de outras
técnicas), podendo, com o uso de guincho, içar cargas de até 136kg, em
locais onde não possam pousar.

Aeronave Esquilo operando no 1º BAvEx

Os operacionalmente denominados HA-1 pelo Exército Brasi-


leiro são caracterizados pela excepcional manobrabilidade, grande ve-
locidade e extrema versatilidade como desempenham com, igual efici-
ência, múltiplas tarefas.
As aeronaves, destinadas ao emprego na missão de proteção
às vagas dos helicópteros de manobra, podem ser configuradas com
um variado leque de armamento, o que lhes permite o desempenho
em diferentes empregos, como o reconhecimento e ataque, e outros.
Conforme previa o plano de implantação, seriam utilizadas também na
formação de pilotos.
A concorrência internacional para aquisição das aeronaves 369

São helicópteros monoturbina. Com velocidade máxima de


287km/h e alcance em torno de 650km, o HB 350 L1 é dotado hoje de
uma turbina Turbomeca Arriel 2B com 650hp de potência. Quando ad-
quiridas, as turbinas que equipavam as aeronaves eram Arriel 1D1.
As aeronaves podem ser armadas com metralhadoras axiais
calibre .50, lança-foguetes nacionais SBAT-70 e metralhadoras laterais
calibre 7,62mm.
O Esquilo, por sua versatilidade, potência e simplicidade de
manutenção contribui significativamente para a operacionalidade da
nossa Aviação.
Capítulo 23

O contrato

P assados quase 23 anos de sua celebração, em visita à Di-


retoria de Material de Aviação do Exército, com o objeti-
vo de colher subsídios para este livro, me foi concedido o prazer pelo
tenente-coronel Alievi de manusear as páginas do contrato original da
Concorrência Internacional nº 01/DMB.
Com incontido orgulho e emoção, ao folheá-lo vi minhas rubricas
em cada página e em seus anexos, testemunho de minha colaboração em
mais uma fase do projeto de implantação da Aviação do Exército. Naquele
momento, me lembrei de meu grande e valoroso chefe, o general Bulcão,
do coronel Valentim, do
tenente-coronel Linelson,
do DMB, e dos meus com-
petentes companheiros da
DMAvEx, que tiveram parti-
cipação ativa e relevante no
processo de aquisição, como
o tenente-coronel Albernaz,
da Força Aérea, designado
para assessorar a DMAvEx, e
Equipes da DMAvEx e da Aerospatiale iniciam as os majores Roxo, Sardo, Lo-
reuniões para a elaboração do contrato riatto, Rios e Gomes Torres.
372 Aviação no Exército - uma visão histórica

Após a apuração do resultado da licitação para fornecimento


dos helicópteros para a Aviação do Exército, seguiu-se a fase da elabora-
ção do contrato com o consórcio vencedor. Contrariamente ao que possa
parecer às pessoas não afeitas à construção de contratos aeronáuticos,
essa fase é, e foi, extremamente trabalhosa, longa e tensa, bem como exi-
giu de todos os participantes, de ambas as partes, Exército e consórcio,
muito esforço, dedicação, perseverança na defesa de suas convicções e
resistência à fadiga para enfrentar as intermináveis negociações, além
de paciência e firmeza para fazer prevalecer os pontos de vista. Prepa-
rei-me exaustivamente para essa fase. Examinei detidamente diversos
contratos da área aeronáutica elaborados pela Marinha e pela Aero-
náutica. Conversei longamente com os responsáveis pela redação deles,
procurei identificar com nitidez e clareza quais os pontos que neces-
sitavam de mudança, tentei absorver o máximo da experiência obtida
pelos nossos coirmãos e me conscientizei da imposição de não cometer
os mesmos erros. Isso não seria permitido a nós.
Com os conhecimentos alicerçados pelos intensos estudos reali-
zados, com a experiência adquirida e com a competente orientação ema-
nada pelo general Bulcão, a equipe da DMAvEx chegou à mesa de negocia-
ções com capacitação suficiente para produzir um contrato que atendesse
integralmente aos interesses da Força Terrestre, sem tergiversar ou tran-
sigir em relação a eles. Os objetivos foram plenamente atingidos. Ainda
hoje, o contrato permanece como referência e serviu de orientação para
os que se seguiram. Tenho a felicidade e o orgulho de repetidamente escu-
tar efusivos elogios à qualidade do contrato que nós elaboramos.
Iniciamos a discussão do contrato com o firme propósito de
nos portarmos com o máximo de lisura, transparência, correção, ho-
nestidade e imbuídos de nossa grande responsabilidade. Tínhamos a
consciência de que éramos clientes especiais e como tal deveríamos ser
encarados. Não era todo o dia que uma empresa da área aeronáutica
realizava uma venda envolvendo o montante previsto para a nossa Avia-
ção. Sabíamos que o contrato deveria atender aos interesses das partes
intervenientes, não cabendo reivindicações impossíveis de serem aten-
didas. Contudo, sabíamos que em defesa dos interesses do Exército era
impositivo sempre perseguir o limite do possível. E assim o fizemos.
As negociações eram diárias e se prolongaram por um perío-
do muito superior ao inicialmente previsto. Houve diversas ocasiões em
O contrato 373

que elas prosseguiram muito além do nosso expediente diário. Mais de


uma vez, tivemos que sair do QG do Exército, em Brasília, pulando as
janelas que dão acesso ao pátio interno onde estavam estacionadas nos-
sas viaturas, pois as portas já se encontravam trancadas.
Em inúmeras situações, adotamos a estratégia de longas discus-
sões por vários dias seguidos sobre um mesmo assunto a fim de “minar a
resistência” dos nossos interlocutores e chegar aos “textos” que atendes-
sem aos nossos interesses. É válido registrar, a título de curiosidade, que
em determinada data, não conseguindo avançar sobre a redação de uma
cláusula em relação à qual a discussão já se arrastava desde o dia anterior,
avisei que as conversas estavam encerradas e que passaríamos a enta-
bular negociações com a empresa que se posicionara em segundo lugar.
Após a uma breve interrupção, voltamos a nos reunir e conseguimos a
anuência do consórcio para a aprovação do texto como desejávamos.
Os contratos na área de aquisição de meios aéreos são extre-
mamente complexos e envolvem um número considerável de áreas de
interesse, aquelas ligadas diretamente à aeronáutica e as que lhes são
complementares ou correlatas. Os custos do material, da manutenção,
dos suprimentos, da documentação técnica, da formação de pessoal e
das garantias são altos e requerem definições muito claras e precisas
dos compromissos assumidos. Na construção do contrato, sem sombra
de dúvida, começou a nascer o futuro da operacionalidade das unidades
aéreas que se utilizarão do material.
Como oficial mais antigo da equipe encarregada da redação da
parte técnica do contrato, diariamente apresentava ao general Bulcão,
no início e no término dos trabalhos, um relatório verbal sobre a evo-
lução das negociações e recebia sempre as diretrizes para o prossegui-
mento de nossa missão. Aos subordinados se deveria permitir lavrar
elogios formais aos seus superiores. Certamente, o general Bulcão seria
alvo das minhas referências e de todos que tiveram o prazer de com ele
servir. Chefe extremamente ponderado, de aguçada inteligência, muito
afável, sem deixar de ser exigente com seus subordinados, era alvo da
estima e admiração de todos nós.
É motivo de orgulho que o contrato tenha se constituído em
modelo para todos os outros realizados posteriormente, mesmo que não
tratassem de material aeronáutico. Isso demonstra a competência dos
companheiros envolvidos em sua elaboração. A eles a justa homenagem.
374 Aviação no Exército - uma visão histórica

A extensão e a minuciosidade do contrato não permitem que


façamos uma abordagem de todo o seu conteúdo. No entanto, me pa-
rece válido destacar as principais particularidades. Entre elas, ressalta-
remos algumas que até aquela ocasião eram estranhas às negociações
envolvendo a aquisição de material de emprego militar, como o estabe-
lecimento de comissão para recebimento do material, o Depósito Alfan-
degado, o buy back, a contrapartida ou offset, a nacionalização dos equi-
pamentos e da manutenção e outros assuntos de natureza aeronáutica.
O contrato possuía um total de 245 páginas e 59 anexos, estes
com 312 páginas, totalizando 557 páginas.
Os inúmeros comentários partidos de diversas origens me
permitem afirmar sem muito risco de incorrer em erro que foi um dos
melhores contratos firmados na área aeronáutica até aquela ocasião,
elaborado por uma equipe com pouca experiência na área de aviação,
mas plena de entusiasmo, competência e uma vontade imensa de fazer
o melhor. Não esqueçamos o sempre presente apoio da Marinha e da
Força Aérea as quais nos transferiram uma considerável carga de conhe-
cimentos que foi muito bem absorvida em curto espaço de tempo pelo
brioso team encarregado da construção do contrato, sob a irreparável
orientação do nosso grande chefe, o general Bulcão.
O certame licitatório não se conclui com a apuração do concor-
rente vencedor. Enganam-se completamente aqueles que assim pensam.
A fase que lhe sucede, a elaboração do contrato, envolve tanta complexi-
dade e criticidade como a fase anterior. É na celebração do contrato que
se estabelecem os compromissos a serem cumpridos por ambas as par-
tes. É a fase em que se oficializa o “casamento”. Ao contrário dos contra-
tos nupciais, ele deve conter normas muito claras, detalhadas e precisas,
principalmente se tratando de contrato na área aeronáutica.
A seguir, discorreremos, friso, de forma sucinta, sobre as prin-
cipais cláusulas.
Nesse tipo de negociação, é de fundamental importância o esta-
belecimento de um glossário de modo que todas as partes intervenientes
falem a “mesma língua”. No contrato da Aviação do Exército, essa necessi-
dade se apresentava com maior evidência pela particularidade de envol-
ver linguagem específica da área aeronáutica, que até pouco tempo não
era por nós utilizada. Na época, também tivemos que estudá-los de modo
a empregá-los adequadamente. Para facilitar o entendimento deste livro
O contrato 375

e ambientar nossos leitores sobre a área de aviação, nos limitaremos a


alguns termos de caráter específico com os seus respectivos significados.
Até a título de simples curiosidade me parece interessante a abordagem.
AOG – Aircraft on ground. Sistema de atendimento a pedido de
suprimento em que o item solicitado deve ser entregue ao solicitante
para eliminar a indisponibilidade do helicóptero para o voo. É um pro-
cedimento considerado excepcional em relação às práticas normais de
atendimento a pedido de suprimento. O pedido deve se restringir à (s)
peça (s) indispensável (is) para a recolocação em voo do helicóptero.
Para esse tipo de atendimento, as empresas possuem uma sistemática
particular, de modo que ela ocorra entre 24 a 72 horas após o recebi-
mento da solicitação.
Buy back – Compromisso do vendedor de aceitar a devolução
por pagamento ou abertura de crédito dos itens de suprimento, ferra-
mental e equipamento de solo que não fossem utilizados; no nosso caso,
no prazo de três anos a contar da data do recebimento do item.
Equipamentos de Nav/Com – São os equipamentos de radiona-
vegação e de comunicações instalados nas aeronaves.
Ferramental – Engloba as ferramentas, equipamentos de teste,
as bancadas e outros equipamentos e materiais de apoio à manutenção.
Kit/Operação de montagem – Conjunto de partes separadas
constitutivas do helicóptero e destinadas à montagem final e personali-
zação em instalações da Helibras no Brasil.
Lead Time – É o tempo necessário para recompletamento do
estoque de um item de suprimento específico. Para a aviação, esse con-
ceito é de fundamental importância. A aeronave parada é sinônimo de
prejuízo. Em consequência, a necessidade de previsão para cada item é
fundamental à medida que abrevia a imobilização da aeronave por se
encontrar o suprimento disponível.
Lote – Determinada quantidade de produtos entregues ao
Exército de acordo com as quantidades, especificações e datas constan-
tes dos cronogramas estabelecidos no âmbito do contrato. Referia-se a
qualquer conjunto de materiais objeto do contrato (helicóptero, supri-
mento, ferramental, curso, meios auxiliar de instrução).
Mean Time Between Failure (MTBF) – Era o tempo médio
entre falhas ou período médio entre falhas. É um valor atribuído a
um determinado componente para descrever a sua confiabilidade. Indica
376 Aviação no Exército - uma visão histórica

quando poderá ocorrer uma falha. Quanto maior for esse índice, maior
será a confiabilidade do componente e do conjunto. Normalmente, é
medido em horas.
Modificação Mandatória – É a modificação cuja não aplicação
acarreta a imediata interdição de voo do helicóptero. As empresas
são extremamente ciosas em relação à segurança de voo. Seus
departamentos de controle de qualidade funcionam incansavelmente
para a pesquisa dos materiais em uso e de novos materiais que
possam melhorar a segurança de voo. Além disso, todo e qualquer
acidente relatado é pesquisado a fundo, e, se for identificado algum
componente como responsável por ele, a empresa poderá emitir
um boletim de modificação de caráter mandatório. As modificações
mandatórias se originavam do contratado ou eram emanadas por
órgãos oficiais franceses com responsabilidade na homologação de
produtos aeronáuticos. Em caso de ocorrência antes da entrega da
aeronave, ela deveria ser obrigatoriamente incorporada pelo contra-
tado. Via de regra, o ônus da modificação é da empresa fornecedora
do equipamento.
Modificação recomendada – É qualquer modificação sugerida
pelo fabricante que não esteja classificada como mandatória. Ficará a
critério do operador incorporá-la.
Offset – Também denominado de compensação. Estabelece a
aquisição no país comprador de itens em valor igual ao do montante
total do contrato assinado com o país vendedor.
Part Number – Código alfanumérico de referência dado pelo fa-
bricante a determinado item para sua identificação. É a carteira de iden-
tidade do item. Durante a recepção das aeronaves, tive a oportunidade de
fazer com o sargento Borck o que denominávamos o releve (checagem)
dos motores das aeronaves. De cada peça, verificávamos a coincidência
do Part Number com o descrito na documentação da aeronave. Ao todo,
72 motores foram verificados. Ao major Sardo coube a ingrata e complexa
missão de conferir o PN, em quantidade considerável, dos itens de supri-
mentos. Eram tantos que não me atrevo a falar em números.
Recebimento definitivo – Ato em que o Exército, por meio de cer-
tificado específico, reconhecia que os produtos constantes do lote apresen-
tado preenchiam os requisitos técnicos contratuais, dando ao contratado a
quitação da sua entrega. Era antecedido pelo recebimento provisório.
O contrato 377

Recebimento provisório – Ato formal que autorizava o contra-


tado remeter ao Brasil os lotes apresentados. Não implicava transferên-
cia de propriedade.
Rush Order – Nesse caso, trata-se de uma necessidade de su-
primento previsível em curto prazo. O pedido nessa modalidade é feito
para resolver uma falha no aprovisionamento ou para antecipar uma
solução de uma situação de AOG. O prazo de expedição pela empresa é
de três semanas após o recebimento do pedido.
Time between overhaul (TBO) – É o tempo entre as grandes ma-
nutenções ou manutenções de grande porte.

O contrato
Na sequência, apresentaremos algumas das cláusulas do con-
trato nos limitando a breve comentário sobre o conteúdo de cada uma
delas. Dependendo da área que disciplinavam, elas remetiam aos anexos
nos quais o nível de detalhamento necessário era realizado.

Cláusula da Comissão de Fiscalização e


Recebimento do Material (COMFIREMEX)
A Comissão de Fiscalização no Exterior tinha como missão re-
presentar o contratante, nas instalações do contratado, nas atividades
de controle e fiscalização da execução do contrato, realizar recebimen-
to provisório de todo o material adquirido e verificar o andamento dos
cursos de capacitação do pessoal.
Considerava-se o recebimento na França como provisório, pois
o definitivo só ocorria após a aceitação da aeronave ou outro item do
objeto do contrato pelo 1º BAvEx. A realização de dois recebimentos se
justificava porque, em relação aos Esquilos, somente a primeira aerona-
ve foi totalmente montada na França; as demais, de acordo com o pro-
jeto de transferência de tecnologia e do máximo de nacionalização do
produto, foram montadas em Itajubá e enviadas para o Brasil nas deno-
minadas operações de montagem. Em relação aos Panthers, a despeito
do recebimento principal ser realizado em Marignane, o que permitiu
378 Aviação no Exército - uma visão histórica

sanar um número considerável de discrepâncias para o transporte ao


Brasil, exigia-se a desmontagem de alguns conjuntos para o transporte,
como as pás, que, após a remontagem no Brasil, necessitavam de novos
ensaios e, em consequência, a realização de novo recebimento. A mesma
sistemática se aplicava aos suprimentos, ferramental e documentação
técnica.
Entre outras responsabilidades, além do recebimento das ae-
ronaves, suprimentos, ferramental e documentação técnica, inseriam-se
o apoio aos cursos de pilotos, gerentes e mecânicos, o encaminhamento
de propostas de alterações no contrato, o zelo pelo cumprimento dos
prazos, a informação sobre a aplicação de multas e a não concordância
com acréscimos ou modificações sem expressa autorização do escalão
superior. A sistemática já era adotada pela Marinha e pela Força Aérea,
tendo o Exército, pelos argumentos apresentados por aquelas Forças,
se convencido da necessidade de estabelecê-la. Além disso, enviava um
considerável volume de informações sobre outros equipamentos de in-
teresse da Aviação do Exército.

Reunião da COMFIREMEX com representantes da Aerospatiale

O acerto da decisão de designar a comissão é bem demonstra-


da pela sua manutenção até os dias atuais. Além de tudo, a comissão
permitiu o estabelecimento de um laço estreito e ágil para a solução de
problemas com o fornecedor, tanto pela proximidade física como pelo
relacionamento pessoal que se estabeleceu ao longo do tempo. Ressalte-
se que graças à atuação da comissão inúmeros créditos foram gerados
em favor da Aviação do Exército por causa de sua ação fiscalizadora.
O contrato 379

Cláusula de aceitação e recebimento


Essa cláusula detalhava de modo pormenorizado como ocorreria
o recebimento de todo o material objeto do contrato. No caso das
aeronaves, conforme já explicitado no item anterior, previa o recebimento
provisório em Marignane, na França, sede da Aerospatiale, a realização de
testes em Itajubá, sede da Helibras, e o recebimento definitivo no BAvEx.

Cláusula do Depósito Alfandegado


O Depósito Alfandegado já era uma sistemática adotada pela
Marinha. Localizado na área da Base de Aviação de Taubaté, seria uma
instalação habilitada pela Secretaria de Receita Federal, colocada à dis-
posição do contratado, seus subfornecedores e subcontratados. O ge-
renciamento técnico-administrativo era da contratada, a Aerospatiale,
facultando-se ao Exército a fiscalização no tocante ao atendimento das
cláusulas contratuais a qualquer momento.
É importante esclarecer que os itens em depósito permaneciam
sob a propriedade da contratada até sua utilização pela Aviação do
Exército. A medida, além de permitir a economia de custos, evitando
que o Exército imobilizasse recursos em suprimentos, facilitava o acesso
mais rápido aos itens que se encontrassem no pool (estoque) do depósi-
to e garantia os suprimentos disponíveis ao “pé da obra”.
O valor estabelecido pelo Exército para o estoque a ser mantido
no Depósito Alfandegado era de 10% do valor total do contrato, o que
equivalia a aproximadamente 24 milhões de dólares. Obrigatoriamente,
deveria conter, para pronto uso, itens de suprimento que implicassem a
indisponibilidade das aeronaves.
Uma das situações críticas no tocante a suprimentos é aque-
la representada pela realização das grandes revisões. A cláusula previa
que nessas ocasiões os suprimentos necessários deveriam estar dispo-
níveis no estoque até 30 dias antes das datas previstas pelo batalhão.
É apropriado discorrer nesse tópico a respeito de uma das inúmeras
modificações que a atividade aeronáutica trouxe para a administração
de suprimentos no âmbito do Exército. O material aeronáutico precisa
ostentar as melhores condições operacionais. A falha de uma aeronave
380 Aviação no Exército - uma visão histórica

não permite encostá-la no meio-fio e arrumar um mecânico nas


proximidades para resolver o problema. O evento pode implicar perda
de vidas e material de altíssimo custo. Para a operação em condições de
segurança, há necessidade de manutenção constante e eficiente, o que
implica a disponibilidade imediata de peças de reposição de uma cadeia
de suprimentos de pronta resposta. O Depósito Alfandegado é um dos
principais elos dessa cadeia.
Os itens de menor custo e de maior índice de mortalidade fo-
ram adquiridos no bojo do contrato e eram administrados pelo pessoal
da área de suprimento do BAvEx. Foram denominados de suprimentos
Não Apoiados pelo Depósito Alfandegado (NADAS).

Cláusula de suprimentos Não Apoiados pelo


Depósito Alfandegado (suprimento NADAS)
Parte dos suprimentos foi adquirida para gerenciamento
pelo BAvEx, não se encontrando no estoque do Depósito Alfandega-
do, como deixa clara a denominação concedida a essa cláusula. Para
isso, solicitou-se ao contratado uma lista de itens de maior mortali-
dade necessários para apoiar a manutenção das aeronaves por um
período de dois anos, considerando a realização de 300 horas de
voo/ano por aeronave. Essa cláusula está interligada à de buy back
à medida que definia que o contratado recompraria os itens não
utilizados ao longo de três anos, a partir da data de recebimento
no 1º BAvEx. A solicitação de proposta à empresa assegurava que,
em razão da experiência do fornecedor, teríamos uma lista adequa-
da à manutenção dos aparelhos adquiridos. A exigência de recom-
pra dos itens não utilizados no prazo definido evitaria que fossem
propostos aqueles desnecessários ou em quantidades superiores às
nossas necessidades.
Essa cláusula nos moldes em que foi construída originou-se do
estudo de experiência vivida por uma de nossas Forças Singulares, que,
na ocasião de compra de aeronaves nos Estados Unidos da América, ad-
quiriu quantidade significativa de suprimentos, por sugestão do forne-
cedor, cuja maioria, ao cabo de mais de mais de dez anos de operação,
ainda se achava nas prateleiras.
O contrato 381

A eficiente gerência dos suprimentos é uma entre as inúmeras


excelências que devem andar de braços dados com a atividade de avia-
ção. Ela deve estar sempre de plantão, rondando o perfeito esgrimir dos
leads times, de modo que as aeronaves ostentem sempre as melhores
condições de operação.

Cláusula de manutenção
Nessa cláusula, ficaram estabelecidas garantias de que o con-
sórcio vencedor proporcionaria a prestação de serviços de manuten-
ção necessários em todos os escalões durante no mínimo o prazo de
vigência do contrato. Aludia ainda ao fornecimento de material e do-
cumentação técnica, bem como ao treinamento de pessoal, os quais
permitissem ao 1º BAvEx executar a manutenção de 1º e 2º escalões e
mesmo algumas intervenções de 3º escalão. Incluía a garantia de que
alguns meios de manutenção seriam nacionalizados progressivamen-
te com apoio de empresas nacionais do ramo aeronáutico e permitia
a manutenção de determinados componentes até o 4º escalão. Este,
também denominado de nível parque, envolvia a recuperação de ma-
terial que necessitasse de ampla revisão ou completa reconstrução de
parte, conjunto ou subconjunto.

Cláusula de buy back (Recompra)


O buy back se constituía no compromisso do contratado de
aceitar a devolução por pagamento ou abertura de crédito dos itens de
suprimento, ferramental e equipamento de solo que não fossem utiliza-
dos no prazo de três anos a contar da data do recebimento do item.
Em razão de nossa pouca experiência, não estávamos capaci-
tados para definir quais os itens de suprimento, ferramental e equipa-
mentos de solo eram necessários. Então, estabelecemos as condições de
operação das aeronaves e o prazo a ser considerado e solicitamos que
a contratada fizesse a proposta dos materiais e suas respectivas quanti-
dades. Essa cláusula impediu que a lista apresentasse itens desnecessá-
rios, pois tal fato implicaria a recompra pela contratada.
382 Aviação no Exército - uma visão histórica

Já vimos, e não custa reafirmar, que a introdução dessa cláusula


em nosso contrato foi fruto de experiência obtida em contatos realiza-
dos com a Marinha e com a FAB e evitou que amargássemos os mesmo
problemas por elas enfrentados pela imobilização em seu pool, durante
anos, de suprimentos sem utilização.

Cláusula de garantia
Estabelecia o prazo de duas mil horas de voo ou dois anos de opera-
ção a partir da data do recebimento definitivo das aeronaves pelo 1º BAvEx,
em Taubaté. A garantia envolvia todos os itens componentes da aeronave,
inclusive os fabricados por terceiros. Definia, igualmente, os prazos para
correção ou substituição de item defeituoso e as penalidades que incorre-
ria o contratado em caso de não atendimento aos prazos estabelecidos. Pela
sua importância, a cláusula possuía um alto nível de detalhamento.
A aquisição feita da aeronave totalmente equipada permitia
que em situações de exigência de garantia, mesmo que envolvesse equi-
pamentos diversos, só houvesse um único interlocutor.

Cláusula de modificações técnicas


Ao longo da vida das aeronaves, são expedidos boletins ditados
pela segurança de voo que implicam a aplicação de modificações técni-
cas. Tais modificações eram emitidas pelo fabricante ou, no nosso caso,
por órgãos oficiais franceses responsáveis pela homologação de produ-
tos aeronáuticos. Quando recebem a denominação de mandatórias, elas
são obrigatoriamente incorporadas, e, nesse caso, a cláusula definia que
no período de vigência da garantia elas seriam incorporadas em todas
as aeronaves sem qualquer ônus para o Exército.

Cláusula de assistência técnica


Detalhava o apoio em pessoal técnico que o consórcio propor-
cionaria ao 1º BAvEx nas diversas áreas de manutenção.
O contrato 383

Cláusula de pintura, inscrições e


graduação dos instrumentos
A cláusula referente à pintura, inscrições e graduação dos ins-
trumentos envolveu uma situação sui generis. A definição da pintura das
aeronaves foi estabelecida na DMAvEx, pois o EME não estabelecera
qualquer diretriz nesse sentido. Em consequência, de posse do manual
de camuflagem do Exército, a proposta foi construída na própria dire-
toria e foi objeto de aprovação. Na ocasião, considerou-se que a pintura
deveria ser camuflada pelo caráter operacional do equipamento, que
deveria ostentar as cores predominantes do Teatro de Operações (TO)
brasileiro e ter suas extremidades descaracterizadas para mascarar a
silhueta e dificultar a identificação.

Cláusula de qualificação e
treinamento do pessoal
A cláusula de qualificação e treinamento de pessoal teve como
objetivo, além da adaptação aos helicópteros adquiridos, permitir ao
maior número de militares da Aviação do Exército, oficiais e sargentos, pi-
lotos, gerentes e mecânicos, a oportunidade de realizar curso no exterior,
na certeza de que tal medida teria impacto extremamente positivo na ca-
pacitação e na motivação do pessoal envolvido. Isso efetivamente ocorreu.
O curso de pilotos compreendia três semanas dedicadas à parte
teórica (Ground School) e duas semanas de parte prática, nas quais eram
realizadas 10 horas de voo. Previa a qualificação de 72 pilotos. Todos
realizaram a parte do Ground School em Marignane. A parte de voo na
França ficou restrita a 20; 12 foram qualificados como pilotos e 8 como
instrutores. A estes, os instrutores, era prevista a carga de 18 horas de
voo; os demais foram qualificados em voo no 1º BAvEx, em curso minis-
trado pela Aerospatiale.
Trinta e seis mecânicos de voo realizaram o curso em Ma-
rignane, dos quais somente seis concluíram a fase de pista e voo na
França, sendo a complementação dos demais feita em Taubaté. Foram
ainda qualificados em Marignane 18 mecânicos de motores, 12 de es-
trutura e metalurgia, 12 de hidráulica, 8 de eletricidade, 8 inspetores
384 Aviação no Exército - uma visão histórica

de manutenção, 8 controladores de suprimento, 12 especialistas em


instrumentos e 8 mecânicos de aviônica, em um total de 112 gradu-
ados. A alusão à quantidade das vagas alocadas particularmente aos
graduados serve para demonstrar que eles foram também alvo de
nossa preocupação.
Não conhecemos uma situação em que tal efetivo de sargen-
tos houvesse conseguido a oportunidade de realizar cursos no exte-
rior. Tínhamos plena convicção de que os custos envolvidos dariam
o máximo de retorno ao Exército em termos de militares altamente
capacitados e motivados para o desempenho de suas funções. Hoje, a
qualidade da manutenção na Aviação do Exército, com reflexo direto
na segurança de voo, conforme atestam o baixo índice de acidentes
e o alto percentual de disponibilidade das aeronaves, demonstra o
acerto da decisão.
Na atualidade, quando passam para a reserva, os nossos pilotos,
gerentes e mecânicos, com alta qualificação, não encontram qualquer difi-
culdade para serem absorvidos pela iniciativa privada em empresas da área
aeronáutica. Parece-me de grande importância, salvo melhor juízo, que o
Exército estabeleça alguns mecanismos que estimulem, em particular, os
mecânicos a permanecerem na Força após sua passagem para a reserva.
Para os gerentes foram destinadas seis vagas para manutenção,
seis para suprimento e quatro para aviônica.
O treinamento para as aeronaves Esquilos foi efetivado no Brasil.
A qualificação no modelo HB 350 L1, Esquilo, para mecânicos
de motores e de aviônicos foi realizada no Brasil, nas instalações da Tur-
bomeca do Brasil e da Engesa Eletrônica S/A, respectivamente.

Cláusula de transferência de
tecnologia e nacionalização
A cláusula de transferência de tecnologia e nacionalização,
conforme ficou bem demonstrada no discurso do general Leoni-
das, ministro do Exército, por ocasião da cerimônia de assinatura
do contrato, era, e é ainda hoje, uma necessidade que se impunha.
Não era mais o momento de aceitar “caixas-pretas”. A adoção dessa
cláusula era uma forma de o Exército apoiar a indústria aeronáutica
O contrato 385

nacional. Chamo a atenção aos críticos daquela época, pois na atu-


alidade a frota de helicópteros civis no Brasil é uma das maiores do
mundo, e a Embraer se firmou como empresa de renome mundial
na fabricação de aeronaves de asas fixas. Nada impede que a curto
ou médio prazo a pujança do País nos permita cada vez mais nacio-
nalizar a produção de helicópteros. A partir do contrato da Aviação
do Exército, a Helibras nacionalizou diversos procedimentos na ma-
nutenção e produção de helicópteros, que antes eram realizadas no
exterior.
A cláusula estabelecia que a Aerospatiale efetuasse irrestrita-
mente a transferência de tecnologia de projeto, de processo, de produto
e de fabricação dos helicópteros objetos do contrato e que essa trans-
ferência seria orientada segundo os interesses do Exército e de outros
órgãos brasileiros, privados ou governamentais. Envolvia a concepção,
o desenvolvimento completo e a produção de sistemas e células de heli-
cópteros, o apoio aos helicópteros em operação e a obtenção de tecnolo-
gias modernas aplicáveis.
O contratado se comprometia ainda a complementar a transfe-
rência de tecnologia à Helibras ou a outra empresa nacional por meio da
formação de recursos humanos, da nacionalização da produção, da pro-
cura de parceiros nacionais para fornecimento e a manutenção de com-
ponentes, equipamentos ou subconjuntos, da implementação de pro-
gramas de cooperação com o Centro Técnico Aeroespacial, objetivando
o desenvolvimento de helicóptero nacional, entre outras providências.
No bojo dos anexos ao contrato, podem ser encontrados o faseamento
das etapas de nacionalização e o protocolo de cooperação técnica firma-
do com a participação da Aerospatiale, do Centro Tecnológico da Aero-
náutica e da Helibras.
Outro assunto alvo de muitas discussões foi o estabelecimen-
to do valor da transferência de tecnologia para empresa brasileira ha-
bilitando-a à fabricação de equipamento no Brasil ou à manutenção de
algum item, conjunto ou subconjunto. Os valores propostos pelo consór-
cio eram submetidos à apreciação da Secretaria de Ciência e Tecnologia
do Exército, a quem competia analisar se os custos a serem computa-
dos como compensação eram pertinentes e se a empresa que receberia
a transferência de tecnologia tinha capacidade absorvê-la. Esse processo
era moroso e demandava um prazo considerável.
386 Aviação no Exército - uma visão histórica

Cláusula de fiscalização
Pormenorizava as condições gerais para a fiscalização do de-
senvolvimento do contrato pelo Exército. Abordava, com minúcia, as
ações que seriam realizadas por ocasião dos recebimentos provisório
e definitivo.

Cláusula de compensação (offset)


No princípio dos anos 1950, ocorreu o que pode ser considera-
da a primeira operação de offset. A FAB adquiriu da Inglaterra aeronaves
Gloster Meteor, que foram trocadas pelo valor equivalente em algodão.
Em 1979, os esforços do engenheiro Cláudio Barreto Viana, di-
retor-presidente do Grupo Aeromot, junto às autoridades do Ministé-
rio da Aeronáutica possibilitaram a obrigatoriedade de que as aerona-
ves Boeing 737 e Airbus A 300, adquiridas pela Varig e Vasp, tivessem
poltronas fabricadas por empresa brasileira, que foi contemplada com
transferência de tecnologia e treinamento adequado para absorvê-la.
A aprovação do Decreto no 86.010, de 15 de maio de 1981, re-
presentou a primeira ação governamental para obrigar a contrapartida
em benefício da indústria aeronáutica a partir das importações de aero-
naves, motores e partes para a aviação civil brasileira.
Mais tarde, foi substituído por outro decreto, de julho de 1987,
que ampliou a obrigatoriedade, sendo regulamentado pela Portaria n°
434/DGAC, de 14 de dezembro de 1988, quando foram estabelecidas as
diretrizes para a compensação.
A partir do contrato da Aviação do Exército, o Exército Brasilei-
ro tem exigido offset no percentual de 100% sobre os valores de outros
contratos de aquisição de helicópteros. Em 1989, o edital da Telebras
para a aquisição e o lançamento dos satélites Brasilsat B1 e B2 contem-
plava a exigência de compensações.
Em 1991 e 1992, foram aprovadas a Política de Compensação Co-
mercial, Industrial e Tecnológica do EMAer e a Diretriz 360-1, que a regulava.
No final de 2000, o Comando da Marinha aprovou a sua política de
compensação, prevendo a exigência de offset nas importações de equipa-
mentos e sistemas em benefício da Marinha do Brasil e da indústria naval.
O contrato 387

No contrato da Aviação do Exército, a cláusula de compensação


estabelecia que o governo francês teria de comprar do Brasil itens em va-
lor igual ao do montante total do contrato assinado. Frisava que o valor
deveria ser agregado ao das aquisições normalmente ocorridas entre os
dois países, sendo contabilizado separadamente. A cláusula beneficiou
a indústria aeronáutica nacional à medida que, como contrapartida, a
Força Aérea francesa adquiriu treinadores do Embraer EMB-12, Tucano.
Seu texto foi tão abrangente que no contrato consta somen-
te uma referência a sua redação. O que seria denominado Contrato de
Compensação, um instrumento à parte, era constituído de 18 cláusulas.
A falta de experiência na montagem de contrato dessa enver-
gadura e a originalidade conduziram à necessidade, para se contrapor
à experiência dos negociadores franceses, de solicitar o apoio da Inter-
bras, uma subsidiária da Petrobras especializada nesse tipo de negocia-
ção. A assessoria de pessoal especializado daquele órgão serviu muito
para agregar eficiência e objetividade na elaboração da documentação
reguladora. Assim, antes das reuniões realizadas com o consórcio ven-
cedor, sempre ocorria uma reunião preparatória com os representantes
da Interbras para estabelecer a identidade de pensamento e os objetivos
a serem atingidos. Essa medida deu excelentes resultados e colaborou
sobremaneira para a elaboração de um contrato de compensação que,
como os demais documentos que compuseram o processo licitatório,
serve de exemplo e referência até hoje.
O cumprimento do estabelecido pela cláusula de compensação
foi um contínuo gerador de impasses com o consórcio vencedor. A tentati-
va de inclusão de despesas não contratualmente consideradas como gas-
tos de compensação era constante. Alegavam que a utilização de empresa
aérea brasileira para transporte de seus funcionários geraria recursos
para o Brasil. Entre as inúmeras consequências da cláusula de compen-
sação, todas favoráveis à balança comercial brasileira, insere-se a expor-
tação para Europa feita por empresa brasileira associada à Secopa France
de produtos brasileiros no valor de mais de quarenta milhões de dólares e
o transporte pela Varig de equipamentos da França para o Brasil.
Mais uma vez, vamos nos valer do depoimento do coronel Valentim,
gestor do contrato, na qualidade de ordenador de despesa do DMB, o
qual ressalta as dificuldades enfrentadas no acompanhamento da exe-
cução do contrato:
388 Aviação no Exército - uma visão histórica

O cumprimento do contrato de compensação (ou da cláu-


sula de compensação) era sempre motivo de sérias dis-
cussões com os fornecedores. Se nos descuidássemos,
tentavam incluir despesas completamente alheias ao seu
objeto, tais como diárias de hospedagens em hotéis no
Brasil e as passagens aéreas dos funcionários da Aeros-
patiale quando vinham ao Brasil por alguma imposição
contratual, alegando que viajavam pela Varig e que isso
geraria recursos para o Brasil.

A cláusula de compensação transformou-se posteriormente,


em razão de seu vulto e de sua importância, em um contrato que teve
como principal negociador o coronel Valentim, o qual se valeu da
competente colaboração da Dra. Senhorinha, assessora jurídica do
DMB, e de um economista da Interbras, cujo nome lamentavelmente
não foi possível recuperar, mas era um expert no assunto e responsável
por negociar contratos de compensação para a Petrobras no mundo
inteiro. Os encontros com os representantes da Aerospatiale, sempre
que possível, ocorriam semanalmente e eram precedidos por reuniões
fora do expediente, em algumas ocasiões na residência do coronel
Valentim, onde eram discutidos os assuntos que seriam negociados no
dia seguinte e estabelecidos os nossos limites de aceitação. Essa medida
foi de capital importância para que os interesses do Exército e do Brasil
fossem preservados.

Cláusula de penalidades e multas


Essa cláusula estabeleceu as maiores multas já praticadas em
contrato aeronáutico no Brasil até aquela ocasião e serviu como fator de
“estímulo” para o cumprimento dos prazos e condições estabelecidos.
Foi uma das cláusulas mais demoradas para se consolidar. As discussões
se prolongaram, e sua aprovação definitiva pelas partes envolvidas de-
mandou negociações extensas. Não transigimos em qualquer momento
e atingimos os objetivos a que nos propusemos ao iniciar as tratativas
nesse particular. Tratava-se de nos assegurar que o contrato se desen-
volveria sem maiores percalços.
O contrato 389

Cláusula de documentação técnica


A despeito de se constituir de área eminentemente técnica, é vá-
lida a abordagem desse item em razão de suas peculiaridades e de sua im-
portância para a correta e eficiente operação e manutenção das aeronaves
e demais equipamentos. A documentação técnica prevista pelo objeto do
contrato era constituída por coleções que incluíam, além dos manuais re-
lativos à operação e à manutenção, o manual de voo, o registro individual
de controle, o livro do motor, a caderneta da célula, a caderneta do motor
e a caderneta da bateria, além daqueles referentes a todo o ferramental.
A documentação técnica na área aeronáutica é complexa e ex-
tremamente dinâmica, assim como exige uma estrutura em pessoal es-
pecífica para mantê-la constantemente atualizada. É imperativa a ma-
nutenção de uma equipe especializada na tarefa do seu controle diário.
Ela recebe dos fornecedores de material aeronáutico atualizações que
podem implicar inclusive a modificação do “envelope de voo” da aerona-
ve ou a imediata suspensão do voo até sanado o problema que suscitou
a medida. Chama-se “envelope de voo” as condições de operação da ae-
ronave definidas em seu respectivo manual.

A cláusula de financiamento
Como já vimos anteriormente, o coronel de Artilharia QEMA
Valentim Angelo Teixeira desempenhou como chefe da Assessoria Ad-
ministrativa (A/5) e ordenador de despesa do Departamento de Mate-
rial Bélico papel de capital importância na elaboração, discussão e ges-
tão da parte financeira do contrato da Aviação do Exército.
As discussões e a elaboração do “contrato” econômico-finan-
ceiro foram complexas e exigiram um grande esforço de todos os envol-
vidos. Conforme a proposta do Consórcio Helibras-Aerospatiale, a em-
presa francesa garantia o financiamento de somente 80% do valor total
da compra e concedia um prazo de carência de dois anos para o início
do pagamento, devendo o down payement (entrada), no valor de 20%,
ser pago com recursos do próprio Exército. No entanto, o ministro do
Exército não pretendia utilizar os recursos do Fundo do Exército para fa-
zer esses pagamentos e determinou que fosse encontrada outra fonte de
390 Aviação no Exército - uma visão histórica

financiamento. Um consórcio de oito bancos internacionais, liderados


pelo Banque Nationale de Paris (BNP), organizado com a interveniência
da própria Aerospatiale, apresentou uma proposta de financiamento em
duas fases (tranches/parcelas). A primeira, no montante de vinte mi-
lhões de dólares, garantia o pagamento de parte do down payement, o
sinal. A segunda parcela, de aproximadamente vinte e quatro milhões
de dólares, seria negociada a posteriori. A negociação da primeira tran-
che não se revestiu de maior dificuldade, tendo sido obtido o aval do
Banco Central (BC), o qual permitiu que os pagamentos fossem feitos
nos prazos contratualmente estabelecidos.
A negociação da segunda tranche, no entanto, encontrou sérios
obstáculos em decorrência de restrições impostas pelo Banco Central,
que não concordava com a taxa de juros cobrada pelo consórcio finan-
ciador. Na qualidade de ordenador de despesa do DMB e gerente do con-
trato de financiamento, coube ao coronel Valentim a responsabilidade
de intermediar a negociação entre o BC e o BNP. A grande preocupação,
a qual a todos envolvia, era que os recursos destinados à primeira tran-
che chegavam ao fim e não se havia ainda obtido os recursos necessários
ao pagamento da segunda, o que poderia gerar o descumprimento con-
tratual, tornando necessária a utilização de recursos do Fundo do Exér-
cito, medida que, como já vimos, o ministro não se dispunha a adotar. A
pressão era enorme. A interveniência do general Leonidas, em ligação
direta com o ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega, permitiu que
as arestas fossem devidamente aparadas, chegando-se a um acordo que
satisfazia a ambas as partes, ao Exército e ao Banco Central. A sensação
de alívio foi enorme. O desfecho coroou os ingentes esforços feitos, em
particular, pela divisão administrativa do DMB.
A administração econômico-financeira do contrato foi extraor-
dinariamente trabalhosa e requeria atenção especial. Cada lote de aero-
nave, ferramental, suprimento, documentação ou curso de capacitação
do pessoal gerou uma quantidade significativa de notas promissórias,
chegando a totalizar mais de 3.200, com prazos de vencimentos variadas,
requerendo uma grande atenção para que fossem liquidadas nas datas
certas, já que os bancos não dispensavam um centavo que fosse de juros
de mora. O atraso nos pagamentos poderia causar enormes transtornos
no fechamento das contas, controladas pela Secretaria de Economia e
Finanças do Exército, pelo BC e pela Secretaria de Controle das Esta-
O contrato 391

tais, do Ministério da Fazenda, o qual supervisionava toda a entrada de


material importado pelos órgãos públicos que acarretasse acréscimo na
dívida externa nacional.
Segundo o coronel Valentim:

A ocasião de grande preocupação ocorreu com a negociação


para a segunda ‘tranche’ de financiamento do down payement
(sinal). Numa das ‘rodadas’ de negociação entre o BNP e o BC,
este fez novas exigências apresentando discordâncias sobre
assuntos que os representantes do BNP consideravam já su-
perados, e, consequentemente, não estavam mais dispostos a
ceder. Ao retornarmos para o meu gabinete, a representante
do BNP disse-me que o assunto estava esgotado e que não
tinha mais possibilidade de negociação. ‘Coronel, lamento
muito, mas o assunto está encerrado; não há mais possibi-
lidade de fazermos o financiamento.’ Respondi-lhe que ‘tam-
bém lamentava muito, mas não haveria financiamento e que
iria comunicar ao chefe do DMB, que trataria do assunto com
o ministro.’ Ela levantou-se, despediu-se. Como o expediente
havia se encerrado, não tive mais tempo de levar o fato ao co-
nhecimento do Ch do DMB e fui para casa atordoado, imagi-
nando qual seria a reação do Min Leonidas quando soubesse
desse final. Ele continuava irredutível em utilizar o Fundo do
Exército para esse fim. Já em casa, lá pelas tantas horas da
noite, toca o telefone; era a representante do BNP, falando de
São Paulo, me dizendo que havia considerado bem o caso e
que ainda via uma possibilidade de negociação; caso eu pu-
desse recebê-la; no dia seguinte ela retornaria a Brasília com
uma nova proposta para analisarmos e levarmos à conside-
ração do BC. Respirei aliviado e dando graças a Deus por não ter
falado com o Ch do DMB sobre o assunto.
As novas condições propostas pelo BNP foram levadas à
consideração do BC, que as julgou com melhores condições
de aceitação, mas não se definiu a respeito. O tempo corria,
os recursos da primeira parcela estavam findando e os
compromissos tinham datas de vencimentos definidas. Vendo
esgotadas as possibilidades de conseguir uma definição do
392 Aviação no Exército - uma visão histórica

BC, levei o fato, e as consequências que dele adviriam, ao


conhecimento do Ch do DMB, informando-lhe que, na minha
opinião, era necessário um entendimento pessoal entre o
Min Leonidas e o Min Mailson, a quem o BC era subordinado.
Tomando conhecimento do problema, o Min Leonidas me
chamou ao seu gabinete. Coloquei-o ciente de todos os esforços
que havíamos feito até o momento e que tudo resultara
infrutífero; o BC não dava nenhuma resposta, por mais que
fosse cobrado. De imediato, na minha presença, ele mandou que
fosse feita uma ligação telefônica para o Gabinete do Ministro
da Fazenda e que ele falaria, pessoalmente, com o Min Mailson.
Após a conversa, o Min Leonidas disse-me que o Min Mailson
prometera-lhe que iria se entender com o BC e que tudo seria
resolvido. Essa conversa teve lugar numa quarta-feira, pela
manhã, e nesse mesmo dia o Min Leonidas viajaria e só estaria
de regresso na tarde da segunda-feira seguinte. Determinou que
eu ficasse atento e cobrasse do BC a solução; caso encontrasse
dificuldades, recorresse ao Ch Gab ou ao Ch CIE. Aconteceu
que, no mesmo dia, o Min Mailson viajou e, possivelmente, não
tratou do assunto com o BC, pois nenhum progresso foi obtido.
Retornando da viagem e informado pelo Gen Leonel, chefe
de gabinete do Min do Exército, que o assunto continuava no
mesmo estágio, o Min Leonidas me chamou à sua presença.
Contei-lhe que tinha ido, diariamente, ao BC e lá fora informado
pelos funcionários encarregados que o assunto continuava
em estudo, tudo indicando que o Min Mailson não tomara
nenhuma providência. Disse-lhe, ainda, da minha preocupação
e que os recursos disponíveis não eram mais suficientes para
pagar as notas promissórias que venceriam daí a dez dias.
Nunca vi o Min Leonidas tão enfurecido; ‘aquele... prometeu-
me que iria dar ordens para o Banco Central resolver essa
questão; confiei naquele... e ele não fez nada’. E acrescentou, já
mais calmo: ‘Coronel, ministro também diz...’ Em seguida, me
entregou um cartão de um diretor do BC e perguntou-me se
eu o conhecia e se já havia tratado com ele pessoalmente em
alguma oportunidade. Respondi-lhe que não o conhecia, e ele
determinou que eu fosse imediatamente para o BC e procurasse
O contrato 393

falar com o tal diretor. Eram mais de cinco horas da tarde e dirigi-
me, sem perda de tempo, ao BC, comunicando antes ao vice-chefe
do DMB, Gen Décio, a ordem que recebera do ministro. Chegando
ao BC, fui diretamente para o gabinete do dito diretor, sendo
informado pela secretária que ele estava numa reunião e que
não havia hora certa para terminar, mas que ele ainda retornaria
ao seu gabinete antes de deixar o BC. Informei-lhe que eu havia
recebido ordens do ministro do Exército para não voltar sem falar
com o dito diretor e que eu também não tinha hora para sair de
lá e iria esperar até que a reunião terminasse. Passadas quase
uma hora e meia, adentrou na sala um funcionário do BC que
eu já conhecia de outras oportunidades e com quem mantinha
um ótimo relacionamento. Por feliz coincidência, ele agora era
o chefe de Gabinete do diretor com quem eu precisava falar.
Perguntou-me porque eu estava ali àquela hora, acrescentando
que só podia ser algum ‘pepino’. Disse-lhe do que se tratava e
quais as consequências advindas da indefinição do BC. O Exército
estava prestes a se tornar inadimplente por falta de recursos para
saldar compromissos que se venceriam a curto prazo. Expliquei-
lhe que, mesmo após a solução, ainda demandaria alguns dias
para a formalização do contrato de financiamento e a liberação
dos recursos e que o prazo estava se esgotando. A solução teria
que ser urgentíssima. Após ouvir todas as minhas ponderações
sobre o assunto, ele virou-se para mim e disse: ‘Deixe comigo,
o assunto está resolvido; eu me entendo com o diretor; pode
informar isso ao Min Leonidas.’ Pedi-lhe, então, que sendo assim
me fornecesse um documento qualquer, mesmo que fosse uma
carta, confirmando a aceitação das condições do financiamento
propostas e que o BC avalizaria o contrato de financiamento. De
posse de uma carta, redigida na hora pela secretária, voltei ao
QG do Ex e fui diretamente ao Gabinete do ministro, que ainda
se encontrava lá, apesar de já serem mais de oito horas da noite.
Dei-lhe ciência de que o assunto estava resolvido, que os recursos
estavam assegurados e mostrei-lhe a carta do BC com essa
afirmação. Recebi seus agradecimentos pelo cumprimento da
missão, que ele afirmou saber ter sido difícil, e fui para casa, com
menos uma preocupação, pelo menos por enquanto.
394 Aviação no Exército - uma visão histórica

O relato do coronel Valentim dá a exata medida das dificulda-


des enfrentadas e suplantadas durante todo o processo do contrato en-
volvendo as suas fases.
O contrato de financiamento previa que as partes deveriam se
reunir duas vezes ao ano, com alternância de sede, uma vez no Brasil e
outra na França, para discutirem o seu desenvolvimento e serem feitos
os ajustes necessários, desde que aprovados de modo consensual. As
despesas com transporte e diárias eram encargo exclusivo da delegação
que se deslocasse; logo, quando as reuniões fossem na França, ficariam
a cargo do EB. Por razões de economia, nem todas as reuniões previstas
para ocorrerem na França foram efetivadas.
Uma delas, com a participação do general Bulcão e do co-
ronel Valentim, foi realizada aproveitando-se um convite da Aeros-
patiale para a participação no Salão de Bourget, sem despesas de
qualquer natureza para os cofres públicos brasileiros. Essa reunião
durou cerca de quinze dias e foi empreendida nas instalações da Ae-
rospatiale, em Paris e em Marignane, com a equipe brasileira sendo
chefiada pelo coronel Valentim, já que o general Bulcão precisou re-
tornar ao Brasil. Na qualidade de chefe da COMFIREMEX, participei
das ditas reuniões.
As demais cláusulas do contrato eram de caráter técnico, esta-
belecendo entre outros aspectos, a configuração das aeronaves, equipa-
mentos de navegação e comunicação. Não serão feitas referências a elas.

A solenidade de assinatura do contrato


Finalmente, chegamos à celebração do contrato. Dando a prova
inconteste de sua importância, a assinatura do contrato decorrente da
Concorrência Internacional nº 01/DMB foi realizada no salão de honra
do Quartel-General do Exército, em Brasília, em 24 de junho de 1988.
Para nós, os integrantes da Comissão de Licitação, a solenidade revestiu-
se de grande satisfação, orgulho e emoção.
A ocasião consubstanciava o pleno alcance dos objetivos que
nos foram determinados a atingir. Era o coroamento de uma etapa ex-
tremamente trabalhosa e de grande responsabilidade. A bela cerimônia
teve a maciça presença de autoridades civis e militares. As palavras não
O contrato 395

serão suficientes para descrever o entusiasmo que bradava em nossos


corações. Era a satisfação do dever plenamente cumprido.

Equipe da DMAvEx na solenidade de assinatura do contrato. Da esquerda para a


direita, Ten Cel Av Albernaz, o autor, Cel Bulcão, Cap Sardo, Cel Spangemberg,
Maj Roxo, Maj Rios e Maj Loriatto

Além do ministro do Exército, general Leonidas Pires Gonçalves,


se encontravam presentes um número significativo de oficiais-generais
e outras autoridades civis e militares.
O contrato do lado brasileiro foi assinado pelas seguintes
autoridades:

General de Exército Diogo de Oliveira Figueiredo,


chefe do DMB;
Dr. Hélio Gil Gracindo, procurador-geral adjunto
da Fazenda Nacional;
Sr. Fernando Antonio Rainho Thomaz Ribeiro, pre-
sidente da Helibras;
Sr. Alberto Lopes Lavanère Wanderley, vice-
presidente da Helibras;
Sr. Lucien Lordereau, diretor comercial da Divisão
de Helicópteros da Aerospatiale; e José Luiz Whi-
taker Ribeiro, presidente da Engesa, e Sr. Luiz Ara-
tangy, vice-presidente da Engesa.
396 Aviação no Exército - uma visão histórica

O general Diogo, chefe do DMB, assina o contrato

Assinaram como testemunhas o general de Brigada Luiz Oscar


Bulcão de Lima, diretor de Material de Aviação do Exército, o coronel
Valentim Angelo Teixeira, chefe da Assessoria Administrativa e ordena-
dor de despesa do Departamento de Material Bélico, o autor, o Sr. Pierre
Pech, representante da Aerospatiale, e o Sr. Percy Almar de Arruda.

Representantes do Consórcio Helibras-Engesa-Aerospatiale assinam o contrato.


Em pé, atrás do diretor comercial da Aerospatiale, Sr. Lucien Lordereau, o autor

Na ocasião, o ministro do Exército, general de Exército Leoni-


das Pires Gonçalves, ao ressaltar a importância do evento, teceu as con-
O contrato 397

siderações que, por sua importância, reproduzimos na íntegra, a seguir:

Esta solenidade possui um alto significado para o Exército


Brasileiro. Chegamos ao momento culminante da Concor-
rência Internacional, levada a efeito para selecionar a em-
presa que equipará, em uma primeira fase, a Aviação do
Exército.
A implantação da Aviação do Exército, elemento de grande
flexibilidade tática e estratégica, constitui a concretização
de uma etapa de fundamental importância no processo de
reestruturação da Força Terrestre.
A conquista da terceira dimensão do campo de batalha pro-
porcionará um alto nível de operacionalidade à Força e ex-
trema mobilidade na execução das operações de defesa in-
terna, além de atender a uma antiga aspiração do Exército.
Após 47 anos, volta a Força Terrestre a contar com sua Avia-
ção orgânica.
De há muito, nos preparamos para este momento. Graças à
colaboração de nossas coirmãs, a Marinha e a Força Aérea,
temos um núcleo de pilotos e pessoal de terra adestrados
para operar as aeronaves que, em breve, receberemos.
Vale ressaltar, por ocasião deste ato, os motivos que leva-
ram o Exército Brasileiro a adotar a decisão de adquirir os
meios aéreos através de uma Concorrência Internacional.
Os mais significativos foram:
– Por ser uma atividade pioneira na Força, havia a
necessidade de que se possuísse um conhecimento, o mais
amplo possível, dentro do universo de escolha do material;
– preocupação do Exército, já manifestada quando da aqui-
sição dos meios terrestres, em buscar a nacionalização dos
equipamentos;
– o cuidado em não onerar a Nação, na hora em que se pro-
cura cortar os gastos públicos, através de um financiamento
em longo prazo e de uma cláusula de compensação;
– e, finalmente, tornar público ao parque nacional aeronáu-
tico a abertura de novas possibilidades comerciais.
O contrato que, em poucos instantes, vamos assinar com o
398 Aviação no Exército - uma visão histórica

Consórcio Aerospatiale-Engesa-Helibras estabelece, tam-


bém, um marco na retomada da tradicional cooperação
franco-brasileira no campo militar.
Espero que esta cerimônia seja o início de um relacionamento
estável e proveitoso do Exército Brasileiro com o consórcio.
Estou convicto de que o futuro testemunhará o acerto da es-
colha realizada pelo nosso Exército.
Muito obrigado!

Em primeiro plano, O general Bulcão, diretor de Material de Aviação,


na cerimônia de assinatura do contrato

Em depoimento a mim concedido, disse o general Leonidas que


após a assinatura do contrato ele foi à França, onde, acompanhado pelo
embaixador brasileiro, fez uma visita protocolar ao ministro da Defesa
francês. Em determinado momento do encontro, este lhe falou da ne-
cessidade de incluir no contrato o que chamou de “cláusula do terceiro
destino”, na qual o comprador se compromete a não vender a terceiros o
produto adquirido sem a devida autorização do vendedor. De imediato,
o ministro Leonidas retrucou dizendo que se o governo francês insistis-
se nesse posicionamento ele cancelaria o contrato. O ministro francês
disse-lhe: “Se eu fosse o senhor, reagiria da mesma maneira.” E o assunto
foi completamente esquecido.
Segundo ainda o general Leonidas, após a assinatura do contra-
to, ele foi procurado, por telefone, pelo embaixador dos Estados Unidos
O contrato 399

da América no Brasil, o qual lhe asseverou que poderia colocar à dis-


posição do nosso país, sem restrições, tudo que tinha sido negado, du-
rante o processo licitatório, nas propostas apresentadas pelas empresas
americanas. O ministro Leonidas retrucou dizendo-lhe que a oferta era
extemporânea e que deveria ter sido apresentada na devida ocasião e
encerrou a conversa.
Capítulo 24

A Comissão de Fiscalização
e Recebimento de Material
no Exterior

I nicialmente, o chefe do Departamento de Material Bélico,


general de Exército Diogo de Oliveira Figueiredo, não se
mostrou favorável à criação de uma comissão permanente nas insta-
lações da contratada para recebimento dos helicópteros, por entender
que a sistemática adotada até então para recebimento dos demais ma-
teriais adquiridos, verificações temporárias, seria aplicável também ao
material aeronáutico. Como o Exército desde tempos imemoriais vem se
confrontando com recursos sempre insuficientes para sua manutenção
e funcionamento, certamente os custos de uma comissão permanente
devem ter pesado na avaliação do general Diogo. A DMAvEx tentou de-
monstrar ao chefe do DMB que a complexidade, o vulto e o custo do ma-
terial adquirido e as experiências obtidas na Marinha e na Força Aérea
indicavam a imperiosa necessidade de nomeação de uma comissão per-
manente nas instalações do contratado para fiscalizar o cumprimento
do contrato. A Marinha e a Força Aérea já adotavam essa maneira de agir.
Fui encarregado de elaborar um estudo a respeito e estive na presença
do general Diogo, se não me falha a memória em mais de uma ocasião,
na tentativa de demonstrar a necessidade de um novo posicionamento
402 Aviação no Exército - uma visão histórica

para o recebimento de um material com características até então iné-


ditas. A decisão final, no entanto, só foi conseguida por intervenção do
general Leonidas, que teria acolhido sugestão nesse sentido dos demais
ministros militares, em particular do brigadeiro Moreira Lima, ministro
da Aeronáutica.
Por esse motivo, a portaria ministerial que instituía as comis-
sões de Fiscalização e Recebimento de Material no exterior e no País,
conforme previstas no contrato, só foi assinada em 12 de outubro de
1988, menos de três meses do início do funcionamento da comissão.

Constituição da comissão
Já nos referimos anteriormente à missão contratualmente es-
tabelecida para a COMFIREMEX quando fizemos uma rápida digressão
a respeito das principais cláusulas do contrato. Abordaremos a seguir
como ela foi estruturada e como se desincumbiu de sua missão.

Inauguração das instalações da COMFIREMEX

A COMFIREMEX era constituída por mim, chefe da comissão,


e pelos tenente-coronel Aviador José Albernaz, da Força Aérea Brasi-
leira, piloto da comissão, major CDEM Francisco Carlos Sardo, oficial
engenheiro e gerente de aviônica, e sargento Borck, mecânico de aero-
nave e auxiliar.
A designação de um oficial da FAB para o cargo de piloto se
deveu ao fato de na ocasião o Exército ainda não possuir piloto com um
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 403

total de horas de voo que o habilitasse a pilotar aeronaves em voo de re-


cepção. Se exigia um número superior a 400 horas de voo para o desem-
penho da função. Essa exigência partiu da própria fábrica e foi sugerida
pela comissão à DMAvEx também para os pilotos que fossem realizar
o curso em Marignane. Visava evitar que eocorressem reprovações na
qualificação no Panther, que seria ministrada pela Aerospatiale, confor-
me previsto em contrato.

Reunião em Marignane nas instalações provisórias da COMFIREMEX,


com representantes da Aerospatiale e Helibras

Assim como os demais documentos emitidos pelas


comissões de implantação e pela Seção de Aviação ao longo do
processo de estruturação da Aviação do Exército, aqueles expedidos
pela COMFIREMEX, quase em sua totalidade, não foram por mim
encontrados nas buscas que fiz na Seção de Aviação/3ª Subchefia do
EME, na Diretoria de Material de Aviação, no Comando de Aviação e no
atual Departamento Logístico. Fui encontrar alguns em viagem que fiz
à França, onde, devidamente autorizado, visitei a comissão que ainda
realiza sua importante missão junto à Eurocopter, a nova denominação
da Aerospatiale após sua integração à Messerchmidt alemã. Não obstante
ter deixado grandes amigos naquele país, o principal motivo de minha
viagem foi a esperança de encontrar nos arquivos da comissão a extensa
documentação expedida durante o período em que a chefiei. Mais uma
vez, meus esforços foram infrutíferos. A despeito da gentileza de seu
chefe, o coronel Edmir, só consegui recuperar poucos documentos que
404 Aviação no Exército - uma visão histórica

ainda se encontravam lá arquivados. Considerando que eles permitem


dar aos nossos leitores uma visão, ainda que tênue, do importante
trabalho que a comissão desempenhou no passado e ainda desenvolve
no presente, resolvi reproduzi-los ao longo deste capítulo. Tive um
grande trabalho, pois o tempo se encarregou de esmaecer as cópias que
obtive. Em consequência, durante o processo de escaneamento e, em
seguida, a passagem para o word, a maioria das páginas se transformou
em uma “sopa” de letrinhas me obrigando à sua reconstituição. Valeu a
pena. Primeiramente, por poder reviver aquela etapa tão significativa da
minha vida profissional. Em segundo lugar, por me dar a oportunidade
de proporcionar uma radiografia, mesmo que incompleta, do nosso
trabalho.
Em relatório elaborado ainda no início de nossas atividades, su-
gerimos o aumento do efetivo da comissão em razão do vulto das ativida-
des que se prenunciavam. Infelizmente, isso não foi possível, e tivemos,
felizmente, a garra e o denodo suficientes para cumprir com eficiência
nossa missão, uma característica que nos acompanha, militares, ou seja,
a perene busca em atingir nossos objetivos quaisquer que sejam as difi-
culdades que se apresentem.
A duração da missão estabelecida para a comissão foi inicial-
mente de 26 meses. Em decorrência do retardo na entrega das aero-
naves, o prazo de permanência foi posteriormente prorrogado por
mais cinco meses, por decisão do chefe do Estado-Maior do Exército,
após a realização de uma visita à fábrica, conforme veremos ao longo
desta narrativa.
Se um dos meus objetivos ao escrever este livro é promover
justiça ao pioneirismo na Aviação do Exército, não posso deixar de fazer
uma referência particular e justa aos meus valorosos colaboradores na
comissão, os quais nominei no início deste capítulo. Mais uma vez, ves-
tindo orgulhosamente o uniforme dos “desbravadores”, fomos dar corpo
à primeira Comissão de Fiscalização do Exército Brasileiro no Exterior.
Além disso, a comissão envolvia outra nuance pioneira, consubstancia-
da no fato de que se tratava da fiscalização e recebimento de material
aeronáutico. Não tivemos qualquer preparação anterior para enfrentar
a originalidade, a singularidade e o ineditismo da missão que se apre-
sentava. No entanto, fomos para ela munidos de ferrenha vontade de de-
sempenhá-la com o mais alto grau de eficiência e entusiasmo possíveis.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 405

Notícia publicada no informativo interno da Aerospatiale


sobre o início dos trabalhos da COMFIREMEX

Nossa experiência veio se consolidar por meio do estudo aplicado


e diário, pois estávamos a milhares de quilômetros do País e não tínhamos
a possibilidade que possuíam os companheiros da Aviação do Exército
que ficaram no Brasil de trocar experiências e conhecimentos diários
com os nossos irmãos da Marinha e da Aeronáutica. Nosso manancial de
conhecimentos aeronáuticos era o tenente-coronel Aviador Albernaz,
com larga experiência na pilotagem de helicópteros, mas que não tinha
conhecimento no mesmo nível sobre as atividades de uma Comissão de
Recebimento de Material Aeronáutico nem sobre as aeronaves que iríamos
406 Aviação no Exército - uma visão histórica

receber. Nosso maior trunfo foi a inabalável força de vontade de cumprir


cabalmente as tarefas, o que, sem falsa modéstia, efetivamente conseguimos,
fato reconhecido pelos próprios franceses que, de início, pareciam reticentes
em relação à nossa capacidade para cumprir a missão e cedo passaram a
nos respeitar pelo profissionalismo. Aprendemos rapidamente. Não fomos
enviados para lá como recompensa, mas designados porque éramos os mais
capacitados para o desempenho da missão e, por essa razão, a cumprimos
com a eficácia que se exigia. Não pensem que foi fácil.

A entrega de mais uma aeronave para início do recebimento

Morávamos na cidade de Marignane por sua localização próxi-


ma às instalações da fábrica. Marignane está localizada no Departamen-
to de Bouches-Du- Rhône e se insere na região da Provence-Alpes-Côte
d’Azur. A cidade contava com aproximadamente trinta mil habitantes e
era essencialmente residencial. Com um comércio pouco expressivo, se
situa às margens da Lagoa Berre, ao redor da qual se estende um grande
complexo petroquímico que absorvia a maior parte da força de traba-
lho local. Na área do cantão de Marignane, se localiza o aeroporto in-
ternacional de Marseille-Provence, onde encontrávamos as instalações
da Aerospatiale, hoje Eurocopter, outra grande fonte absorvedora da
mão de obra. Situada a aproximadamente 20km de Marselha, com suas
ruas ladeadas de plátanos e pequenas praças acolhedoras, Marignane se
constitui em uma cidade típica do “Midi”. A prefeitura local se instala em
um antigo palácio da idade medieval.
Desde a adaptação dos familiares em uma pequena cidade
francesa até a obtenção de nossa capacitação para a missão, caminhos
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 407

difíceis foram percorridos. Enfrentamos inclusive um episódio em que


nosso brioso e competente sargento Borck, militar de excepcional ca-
pacidade de trabalho, se deparou com o dilema de solicitar seu desliga-
mento da missão, pois o que percebia mensalmente não era suficiente
para os seus encargos financeiros domiciliares. Esse fato já havia ocorri-
do com missão que a Marinha mantinha na Aerospatiale em anos ante-
riores. A situação era provocada, entre outros aspectos, pela valorização
da moeda francesa em relação ao dólar, o que tornava o custo de vida
mais caro para todos nós. Aduza-se que a tabela de vencimentos no exte-
rior previa para a região de Marignane proventos menores do que aque-
les pagos ao pessoal que servia em Paris. A situação foi contornada pelo
grande profissionalismo do sargento Borck, com o apoio e compreensão
de sua bela família e pela reestruturação dos vencimentos no exterior
durante o governo do presidente José Sarney.

Galeria dos chefes da COMFIREMEX, hoje COMFIMAEX

Neste momento quero fazer um agradecimento às nossas que-


ridas famílias. Nós, me permito falar por todos, os integrantes da comis-
são, chegamos para o cumprimento de nossa tarefa com uma gama de
conhecimentos que vinha sendo alicerçado desde 1985, como era o meu
caso. A despeito do ineditismo, não éramos completamente alheios em
relação às atividades que iríamos desempenhar e, ainda que de modo
408 Aviação no Exército - uma visão histórica

superficial, estávamos prontos para a missão ou pelo menos tínhamos


noção do que iríamos enfrentar. De todo modo, não nos causava qual-
quer temor confrontar o desconhecido.

Pátio de manobras da Aerospatiale. O Panther Av Ex pronto para decolagem

No entanto, nossas famílias não passaram pela preparação que


ocorre com as dos militares que acompanham na missão no exterior.
Normalmente, a designação é feita com razoável antecedência, o que
não foi possível com a nossa nomeação. O período entre a decisão de
criação da comissão, a designação de seus membros e o efetivo início da
missão foi muito curto. A necessidade de rápida integração a um modo
de vida ignorado, o apoio aos nossos filhos, que tiveram que frequentar
escolas em idioma até então desconhecido foram algumas das dificulda-
des galhardamente desempenhadas pelas nossas esposas. Adélia, minha
esposa; Ana Maria, esposa do tenente-coronel Albernaz; Kátia, esposa
do major Sardo; Monica, esposa do major Simões, e Eliete, esposa do
sargento Borck, compreenderam a importância das atividades que de-
sempenhávamos e foram exemplares em seus comportamentos. A elas
este é o momento de publicamente demonstrarmos nossa gratidão. Ra-
pidamente, suplantaram a barreira da língua, a desconfiança inicial dos
vizinhos franceses e fizeram novas e duradouras amizades. Sem a pos-
sibilidade de ter o apoio de uma pessoa para ajudar na lide doméstica,
pois empregada é um luxo que normalmente não se encontra nos lares
franceses e quando ocorre é a preço muito alto, nossas esposas realizavam
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 409

todas as atividades do lar, que as donas de casa conhecem perfeitamente


quão árduas são, além daquelas de apoio aos nossos filhos. Mais uma
vez, o nosso agradecimento emocionado.
Não posso me esquecer do major Simões, que se juntou a nós
posteriormente substituindo o tenente-coronel Albernaz. Oriundo da
Arma de Artilharia, primeiro de sua turma de formação na AMAN, pri-
meiro em seu curso de piloto na Marinha, dotado de fina educação civil
e militar, a despeito de sua inexperiência na atividade de recebimento e
de um número de horas de voo bem menor do que as do tenente-coronel
Albernaz, cedo se impôs pela sua competência, ganhando a admiração
e o respeito de todos. A ida do major Simões só foi possível após ele ter
atingido as 400 horas de voo exigidas para o desempenho da função de
piloto de recebimento. Na ocasião, lamentamos profundamente a saí-
da do tenente-coronel Albernaz, que, além de ter se tornado um grande
amigo, sempre demonstrou a maior competência no desempenho de
suas atividades. No entanto, ficamos extremamente felizes por contar
com um representante do Exército executando uma função investida de
tamanha responsabilidade. Pela primeira vez na história, um militar do
Exército Brasileiro realizava esse tipo de função. O major Simões supe-
rou todas as expectativas e executou as tarefas com o mesmo brilhantis-
mo que conduzia sua carreira militar. Nunca duvidamos de sua aptidão
para cumprir a missão. Jamais me pairou qualquer dúvida quanto à sua
capacitação. Sabia que ele compensaria a falta de experiência com a von-
tade férrea de bem cumprir a sua tarefa. Não poderia esperar menos
de um oficial que até aquele momento construíra uma carreira militar
plena de sucesso. Além de tudo, corria em suas veias o nosso sangue
verde, que alimenta todos nós, militares do Exército, e nos impulsiona
à dedicação, ao afinco, ao denodo, ao entusiasmo e à determinação no
cumprimento de nossas atividades.
Neste momento, vale ressaltar mais essa demonstração de com-
petência dada pela nascente Aviação do Exército ao conseguir designar
em menos de quatro anos após sua criação um piloto apto a participar
do recebimento das aeronaves. Certamente, essa capacitação foi produ-
to de um enorme esforço do 1º Batalhão de Aviação do Exército, que
se desincumbiu com excelência da difícil tarefa de distribuir aos ávidos
pilotos as horas de voo disponibilizadas pelos ainda insuficientes meios
aéreos que então dispunha.
410 Aviação no Exército - uma visão histórica

Nesta oportunidade, não poderia deixar de renovar meus agra-


decimentos aos meus caros amigos da primeira COMFIREMEX pela ami-
zade e pelo trabalho competente, diligente, responsável e eficiente que
realizaram, o qual permitiu que nossa missão fosse cabalmente cumprida.
Nossos contatos com a DMAvEx eram frequentes, seja por meio
de ofícios, que eram enviados normalmente via fax, seja por intermédio
de contatos telefônicos. Semanalmente, ligava para o general Bulcão e o
mantinha informado sobre os principais fatos ocorridos e o andamento
do contrato.

As atividades
As atividades da COMFIREMEX, em Marignane, se iniciavam
diariamente às 8h e prosseguiam normalmente até as 18h. Tendo em
vista a defasagem de até cinco horas em relação ao horário brasileiro, o
expediente sofria as alterações que se fizessem necessárias, atendendo
às determinações da Diretoria de Material de Aviação do Exército.

Reunião de trabalho com o chefe do Departamento de Qualidade, Sr. Raquin, e


representantes do Departamento de Cooperação e Licença, Srs. Dominoni e Galvin

Por ocasião da campanha de voos de recepção, o expediente


poderia se estender até a noite em função da necessidade de verificar a
iluminação interna e externa da aeronave. No período de verão, os dias
escureciam muito tarde, com luminosidade até as 22h, o que implicava
a realização de voos após esse horário. O prolongamento do expediente
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 411

diário se fazia sempre que necessário, apesar das reclamações de nossas


valorosas esposas e de nossos impacientes filhos e filhas, os quais sen-
tiam a ausência de seus pais.
Por determinação da DMAvEx, durante o expediente na fábrica
usávamos trajes civis, ou seja terno e gravata, exceto nas atividades de
recebimento das aeronaves, mesmo quando no solo, ocasião em que co-
locávamos o macacão de voo. Os militares de outras nações adotavam a
mesma sistemática.
Malgrado estar sempre presente em todas as atividades de re-
cebimento, participando ativamente daquelas realizadas no solo, não
estive em todos os voos. Nessas ocasiões, era muito mais importante
deixar os lugares disponíveis para meus auxiliares. Normalmente, par-
ticipavam dos voos um piloto, um engenheiro navegante e um mecâni-
co, todos da Aerospatiale; do nosso lado, o tenente-coronel Albernaz,
piloto, o major Sardo, engenheiro e gerente de aviônica, e o sargento
Borck, mecânico de aeronave. Eram seis a bordo, com a necessidade de
ter uma visão sobre o painel do helicóptero. Sendo assim, era melhor eu
não “atrapalhar”. Hoje, me arrependo de não ter dedicado parte do meu
tempo para aprofundar meus conhecimentos técnicos sobre a aviôni-
ca, navegação e mesmo sobre a pilotagem da aeronave. Preferi destinar
meus esforços exclusivamente para o cumprimento da minha missão na
gestão do nosso contrato, naquilo que me cabia.
Indaguei-me sobre com que profundidade eu abordaria as nos-
sas atividades de recebimento do objeto do contrato e em particular das
aeronaves. Certamente, considerando que entre os leitores haveria um
público heterogêneo, com interesses distintos sobre o assunto, decidi
não ser muito superficial, a ponto de decepcionar os mais exigentes, e
não me envolver demasiadamente, correndo o risco de tornar menos
atrativo para os demais esse tema tão complexo e apaixonante. Como
fizemos até agora, vamos discorrer sobre cada atividade de per si.
No que diz respeito ao recebimento das aeronaves, cumpríamos
um programa por etapas. A primeira, realizada no solo, dizia respeito à
conformidade contratual. Era o confronto da aeronave com todas as es-
pecificações estabelecidas. Em seguida, ainda no solo, era examinado o
kit de bordo e a documentação de acompanhamento. A etapa seguinte,
também no solo, implicava a verificação do estado interno e externo. Na
sequência dos ensaios no solo, se incluía a verificação da estanqueidade
412 Aviação no Exército - uma visão histórica

em câmara própria e, finalmente, a campanha de ensaios em voo. O rece-


bimento de cada aeronave apresentava prazos distintos em função das
discrepâncias encontradas. Recordo-me que o recebimento da aeronave
Panther 02 chegou a durar quase dois meses, e essa não foi a aeronave
que levamos mais tempo para receber.
A seguir, vou fazer uma breve explanação de como ocorria o rece-
bimento de todo o objeto do contrato, passando pelas atividades que de-
sempenhávamos. Tentei ser o mais didático e o menos repetitivo possível.
Se não consegui, pelo menos me deem o crédito de haver me esforçado.
Em algumas ocasiões, discorreremos sobre o recebimento do Esquilo 01 e
dos Panthers ao mesmo tempo, podendo dar a entender que eles ocorre-
ram simultaneamente. Não foi o caso. A primeira aeronave recebida foi o
Esquilo, seguindo-se os 36 Panthers, como veremos mais adiante.

O recebimento das aeronaves


O recebimento dos helicópteros era a parte “nobre” da nossa
missão. Envolvia os ensaios mecânicos de funcionamento geral, as verifi-
cações de performances, os ensaios dos equipamentos opcionais, os voos,
inclusive noturno, a verificação do desempenho dos equipamentos rádio
e de navegação, o ensaio específico do piloto automático, a ocorrência de
vazamento de fluidos, entre outros procedimentos.
Pretendíamos passar ao caro leitor uma ideia mais completa de
como se processava o recebimento com a reprodução do relatório relativo
ao Panther 01. Foi o único que consegui recuperar entre os 37 produzidos.
Achei somente o relatório propriamente dito, pois os anexos e os apêndi-
ces que o compunham não foram encontrados. No entanto, como se tra-
ta de documento de caráter técnico, eivado de terminologia aeronáutica,
temi que mesmo o sintetizando poderia tornar enfadonha a leitura. Não
gostaria também de deixar de reproduzi-lo pelo temor que ele se perdes-
se como ocorrido com um grande número de documentos. Para atender,
como dizia o filósofo, “a gregos e baianos”, vamos transcrevê-lo como o
anexo, no final do livro, para a consulta pelos interessados e faremos so-
mente algumas observações adiante.
As aeronaves eram colocadas à nossa disposição para o início das
atividades de recebimento no interior de um hangar específico e submetidas
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 413

à minuciosa verificação relativa à existência de todos os equipamentos


definidos no contrato, verificação visual do trem de pouso, dos rotores,
principal e de cauda, portas, vidros, entre outros procedimentos. Era feita,
igualmente, a conferência dos Part Numbers dos componentes dos moto-
res e dos demais itens nos quais essa verificação era possível.
A verificação no solo, além da análise da conformidade contratu-
al, já referida, compreendia a conferência do kit de bordo, a documentação
de acompanhamento, o exame do estado interno e externo e os ensaios de
solo. A análise da documentação implicava a conferência do Registro Indi-
vidual de Controle, das cadernetas dos motores, da célula, da bateria, do
livro de bordo, bem como a correta escrituração.
A aeronave AS 365K Panther 01 correspondia ao lote de nº 17. O
programa de recebimento provisório compreendeu uma série de verifica-
ções, desenvolvidas no período de 2 de dezembro de 1989 a 22 de dezem-
bro de 1989. O recebimento do Panther 01 estava pressionado pela neces-
sidade de o BAvEx ambientar o quanto antes seu pessoal com a aeronave.
Como referido anteriormente, o período de recebimento de cada
aeronave era de duração variável. Enquanto no Panther 01 durou 20 dias,
no Panther 02 foram dois meses. Recebemos ambas ao mesmo tempo.
No Panther 02, após o primeiro ciclo de atividades, que durou 29 dias, foi
retrocedido à Aerospatiale, para realização dos cursos de piloto previstos
em contrato. Com a interrupção dos cursos em março de 1990, a aeronave
entrou novamente em processo de recepção provisória, que teve a dura-
ção de mais 30 dias.
Na leitura dos relatórios periódicos, mais à frente, os leitores po-
derão ter uma visão de como se procederam os demais recebimentos.
Para dar uma ideia da importância da atividade de recebimento,
de acordo com aquele limite que nos impusemos em relação à profundi-
dade da abordagem do assunto, vamos nos referir a alguns dos problemas
detectados no recebimento do Panther 01:

– pouca altura do gancho (para transporte de carga exter-


na) em relação ao solo, levando à necessidade de estabele-
cimento em manual de procedimento padrão;
– necessidade de fixação no painel de indicativo do peso e do
centro de gravidade da aeronave (varia em cada helicóptero);
414 Aviação no Exército - uma visão histórica

– dificuldade de acesso à cabine dos pilotos, tendo a comis-


são sugerido o aumento do curso da biela (limita o curso de
abertura das portas dos pilotos) das portas como solução,
ainda que paliativa;
– necessidade de introdução de segunda tomada na caixa
de interfone do mecânico de voo, de modo a permitir que o
comandante da tropa transportada pudesse se comunicar
com os pilotos;
– troca da configuração interna dos assentos para permitir
ao mecânico de voo uma melhor visão sobre o painel;
– necessidade de mudança na colocação do pino de segu-
rança da alavanca do trem de pouso;
– introdução do alarme sonoro que alerta no caso de movi-
mentos extremos do cíclico (um dos comandos da aerona-
ve), no solo e em voo, em caso de “G” (gravidade) excessivo;
– definição de local específico e de fácil acesso para a caixa
de mapas;
– introdução da chave seletora do VOR Master (equipamen-
to de auxílio à navegação);
– modificação do posicionamento da caixa de comando do
ADF (equipamento de auxílio à navegação);
– instalação de proteção para os equipamentos instalados
no compartimento de bagagem;
– dificuldade de monitoramento pelo 2P (2º piloto) do tor-
químetro, no que dizia respeito principalmente à faixa limi-
te de torque;
– a falta de proteção no guincho;
– necessidade de modificação no manual de voo referente
ao reostato de iluminação do pupitre (console) rádio;
– falta das instalações aeromédicas;
– necessidade da troca da junta de vedação da proteção do
radar em razão de vazamento ocorrido durante os ensaios
de estanqueidade;
– solicitação de emissão pela Aerospatiale de documenta-
ção específica sobre a utilização do gancho e do guincho; e
– necessidade de introdução de iluminação própria para o
horizonte de emergência.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 415

Chamávamos discrepância a toda desconformidade com o con-


trato ou com os manuais da aeronave. Essas foram somente algumas das
identificadas. Procuramos apresentá-las da forma mais simples, depu-
rando-as ao máximo da terminologia técnica.
A referência ao recebimento do Panther 01 serve para ambien-
tar os leitores sobre as particularidades do recebimento de helicópte-
ros. Isso não quer dizer que ele tenha sido recebido antes do Esquilo 01,
que foi a primeira aeronave a nos ser entregue. Como foi o único relató-
rio recuperado, achei de bom alvitre apresentá-lo.

Linha de produção do Esquilo

O leitor menos avisado poderá estranhar um tão grande número


de problemas. No entanto, em uma atividade tão complexa como a de fa-
bricar uma aeronave, eles ocorrem, e a função do comprador é a de zelar
para que o produto lhe seja entregue nas melhores condições. Essa era a
nossa função. E não pensem que os defeitos eram sempre os mesmos em
cada aeronave. A despeito da presteza e da boa vontade da Aerospatiale
em corrigir os problemas apresentados, a cada recepção não era surpresa
a necessidade de correção de novas discrepâncias. As aeronaves estão em
constante evolução, e a introdução de modificações ao longo de sua vida,
para melhorar as condições de segurança, ocorre amiúde.
De acordo com o previsto no contrato, após os ensaios em voo
realizados pela Aerospatiale, a verificação pelo Service Industrielle de
L’Armement (SIAR) e a recepção provisória pela comissão, o helicópte-
ro seria desmontado, embalado para transporte aéreo e enviado para a
Helibras para complementação dos demais trabalhos.
416 Aviação no Exército - uma visão histórica

Apesar da exiguidade do tempo decorrido entre nossa instala-


ção e o início das atividades de recepção, das dificuldades inerentes à
adaptação local, dos problemas de caráter administrativo e da vida pes-
soal, das dificuldades de comunicação, fruto da ainda existente barreira
da língua, a comissão se desincumbiu com proficiência de suas missões.
Elaborávamos relatórios periódicos que eram enviados à DMAvEx, dan-
do ciência de todas as atividades realizadas. O relatório dizia respeito ao
desenvolvimento do contrato nas diversas áreas. Tratava, entre outros
detalhes, de créditos gerados, problemas de pagamento, recebimento de
lotes e as alterações identificadas, as providências adotadas, cursos para
pilotos e mecânicos, reuniões realizadas, recebimento dos helicópteros
com a análise de cada item em desconformidade, documentação, visitas
realizadas a fornecedores e outros assuntos que se fizessem oportunos.
Examinaremos esses relatórios mais adiante. Na leitura deles, se poderá
ter uma visão de como se procederam os demais recebimentos.

Preparativos para voo de recebimento do Esquilo 01

A conferência dos lotes de suprimento


A conferência dos lotes de suprimento se tratava de uma tarefa
que exigia muita minúcia e paciência. O responsável era o major Sardo, que
exercia também outras atividades na comissão. Meticuloso, desempenhou
suas funções com raro brilhantismo. O recebimento dos suprimentos era
regido por normas estabelecidas pela comissão e implicava duas fases. A
primeira referente à preparação para o recebimento quando era solicitada à
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 417

Aerospatiale a lista de itens integrantes do lote e realizada a comparação com


a lista constante do contrato. Essa comparação envolvia a verificação do Part
Number (carteira de identidade do item), a nomenclatura, as quantidades e
os preços. Quando identificada a presença de PN diferente do estabelecido
contratualmente, eram solicitados os esclarecimentos pertinentes. Além
disso, comportava a identificação no manual correspondente das ilustrações
relativas a cada item, assinalando-se a localização para facilitar a conferência
e o recebimento definitivo no Brasil. Se considerarmos que alguns lotes
envolviam centenas de componentes, podemos ter a visão da tarefa hercúlea
tão bem desenvolvida pelo major Sardo. A segunda fase implicava a conferência
e o recebimento propriamente ditos nos quais eram verificados o estado do
componente, a conformidade das informações prestadas nas etiquetas de
cada item e a data de validade nos suprimentos com duração de vida (durée
de vie) específica. Após a conclusão das verificações, os itens aprovados eram
atestados com o carimbo da comissão. A conclusão do recebimento dos lotes
englobava ainda o acompanhamento da embalagem, a colocação nas caixas
de transporte e o acompanhamento do embarque, e cada uma dessas fases
era atestada pela comissão. No final, elaborava-se um relatório para remessa
à Diretoria de Material de Aviação do Exército.
A primeira atividade de recebimento envolveu dois lotes de
suprimentos e dois lotes de documentação técnica. Não foram realizadas
segundo as condições desejáveis em razão da exiguidade de tempo
disponível. A restrição de prazo subordinava-se ao fato de que os itens a serem
embarcados eram parte do esforço da Helibras para aprontar a aeronave
Esquilo 01, que já tinha data para ser entregue ao 1º BAvEx em solenidade
militar. Tal restrição não evitou que apontássemos discrepâncias que foram
corrigidas em tempo útil. Os problemas ocorridos, ainda que indesejáveis,
se transformaram em valiosa experiência para os futuros recebimentos de
material. Nos posteriores, foram cumpridas todas as etapas previstas nas
normas da comissão. Solicitamos à Aerospatiale a mudança da etiquetagem
dos itens que se encontravam em desacordo com o previsto no contrato.
Entre as atividades de recebimento dos suprimentos, se inseria a
atestação dos kits das demais 15 aeronaves HB 350 L1, Esquilo, que seriam
totalmente montadas no Brasil, para permitir à Helibras paulatinamente
aumentar o índice de nacionalização na produção das aeronaves. A despei-
to de se tratar de suprimentos que atendiam ao acordo entre os consorcia-
dos, as atestações da comissão eram indispensáveis para que a Aerospatiale
418 Aviação no Exército - uma visão histórica

pudesse exercer o direito de cobrar do Exército a quitação das promissórias


respectivas. Desse modo, nosso controle se fazia para que os embarques in-
cluíssem o maior número possível de operações de montagem a fim de que
o processo de produção na Helibras não sofresse solução de continuidade.

A conferência da documentação técnica


A conferência da documentação técnica também se inseria no rol
de responsabilidades da COMFIREMEX. Ela se constituiu em fator de cons-
tante e permanente preocupação e exigiu tempo e muito empenho na sua
verificação. A documentação técnica é peça fundamental para a manuten-
ção e operação segura das aeronaves. Elas são dinâmicas e sofrem constan-
tes atualizações decorrentes das modificações aportadas aos helicópteros
durante seu ciclo de vida, com o intuito da melhoria de seu rendimento e
das condições de segurança, o que obriga o operador a um rígido controle.
A verificação, a consulta e a atualização da documentação técnica inserem-
se entre as atividades de maior responsabilidade e complexidade do setor
aeronáutico. Exigem uma estrutura em pessoal, devidamente capacitada,
orientada unicamente para o seu controle e o acompanhamento diário.
A falta ou desatualização dos manuais pode provocar uma situação igual,
grosso modo, a que encontramos ao adquirir um equipamento eletrônico
de certo grau de complexidade, e o fabricante nos fornece um manual desa-
tualizado ou que se refere a modelo ultrapassado. No caso do equipamento
eletrônico, podemos nos utilizar do método de tentativa e erro sem maiores
consequências. Com os helicópteros, esse processo representará certamen-
te a perda de vidas e de vultosos recursos.
Entre as documentações recebidas pela comissão, incluíam-se
aquelas que acompanhavam cada aeronave e as orientadas para o su-
primento, o ferramental e a manutenção. A documentação fornecida era
personalizada, tendo em vista a particularidade das nossas configura-
ções e as características de emprego.
A desatualização de alguns manuais gerou a necessidade do es-
tabelecimento de programa de reuniões semanais com os respectivos
responsáveis na Aerospatiale, de modo que pudéssemos acompanhar
o ritmo das indispensáveis atualizações. Em diversas ocasiões, lotes de
suprimento, de ferramental, de meios auxiliares de instrução, da pró-
pria documentação técnica e inclusive de helicópteros foram recusados,
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 419

pela constatação de discrepâncias na documentação distribuída. A apre-


sentação de equipamento sem que sua especificação estivesse contida
no manual, ou vice-versa, redundava na recusa do item.
A comissão recebeu uma coleção de manuais e realizou a revisão
deles. Em razão do pequeno efetivo e do vulto das nossas tarefas, com vistas
a liberar os demais integrantes da comissão para suas inúmeras atividades,
me envolvi diretamente na análise da documentação. Em decorrência desse
trabalho, um grande número de incorreções foi identificado, bem como soli-
citado à Aerospatiale a introdução das modificações nos manuais enviados
à DMAVEX e ao 1º BAvEx. É importante lembrar o quão penosa se tornava a
tarefa da revisão dos manuais, pois não tínhamos realizado qualquer curso
que nos aportasse os conhecimentos sobre as áreas de manutenção e opera-
ção dos equipamentos. Suprimimos essa lacuna sempre que necessário com
muito estudo e o inestimável auxílio dos demais companheiros da comissão.
A despeito de haver prometido anteriormente não ser enfado-
nho na abordagem de alguns assuntos que podemos classificar como
de natureza predominantemente técnica, vamos correr o risco de nos
alongar a respeito do recebimento da documentação que acompanhava
a aeronave tratando sobre o Registro Individual de Controle (RIC). Com
isso, queremos enfatizar a complexidade que envolve o tema Aviação e o
quanto tivemos que aprender em curto espaço de tempo. A abordagem
do RIC nos proporciona a oportunidade de tecer algumas considerações
sobre as derrogações, por serem elas uma de suas partes constitutivas.
O RIC é um dos inúmeros controles exigidos pela atividade aeronáutica.
Nesta, desde a origem, tanto o pessoal (seleção, qualificação)
quanto o material são submetidos a uma grande quantidade de rígidos
controles, visando proporcionar o mais alto nível de segurança à opera-
ção e manutenção das aeronaves. Em relação ao pessoal, desde a seleção,
os candidatos a futuros pilotos, gerentes ou mecânicos são submetidos
a testes os mais rigorosos, de modo que somente os comprovadamente
aptos conseguem capacitar-se à arte de pilotar ou de manutenir. No to-
cante ao controle do material, o RIC se constitui em um dos controles a
que é submetida a aeronave em seu processo de fabricação.
O Registre Individuelle de Controle/Registro Individual do Con-
trole (RIC) era um documento básico de acompanhamento da aeronave.
Sua originalidade para os integrantes da Aviação do Exército levou à ne-
cessidade de que a comissão elaborasse um documento orientador do seu
manuseio, consulta e atualização. Objetivava elucidar antecipadamente as
420 Aviação no Exército - uma visão histórica

dúvidas que certamente surgiriam. O RIC, também denominado de Log


Book, era composto por um conjunto de documentos que refletia a evolução
do processo de produção de cada helicóptero. Apresentava a identificação,
o certificado de conformidade, a lista das derrogações registráveis, o teor
das derrogações, a lista das modificações aplicadas, o inventário dos com-
ponentes com limite de vida e sujeitos ao Time Between Overhaul (TBO),
a carta de orientações úteis aos clientes e as fichas de matrícula dos itens
controlados, cuja vida útil deveria ser imperiosamente registrada.
O certificado de conformidade atestava de maneira formal a quali-
dade e a conformidade da aeronave com as condições exigidas pelas normas
e regulamentos em vigor. Fazia ressalva no tocante a derrogações existentes
na aeronave por razões que serão tratadas posteriormente nesse documento.
As derrogações registráveis eram representadas por grupo
alfanumérico, no qual as letras indicam o local de onde se originou
(Marignane ou La Corneuve) e os números de seu efetivo registro.
Marignane e La Courneuve eram os locais onde se realizava a produção
dos helicópteros. Em Marignane, se localizava a Divisão de Helicópteros
propriamente dita, e, em La Courneuve, se desenvolvia a produção das pás.
A derrogação constituía-se em uma autorização dos diversos ser-
viços de controle de qualidade para a aceitação, em caráter excepcional,
de uma quantidade limitada de item, conjunto ou subconjunto, com algu-
ma discrepância constatada. Era considerada como discrepância toda não
conformidade do material com o seu projeto, suas performances técnicas
ou operacionais previstas, toda anomalia de aspecto e qualquer aplicação
de modificação. A classificação da discrepância como derrogação permitia
a garantia de que todas as medidas para autorização de uso do item,
subconjunto ou conjunto seriam tomadas e assegurava uma vigilância sobre
esses elementos durante a fabricação do produto e sua utilização. Apenas
as derrogações registráveis chegavam ao conhecimento do utilizador.
As derrogações somente seriam aceitas como tal, em nível de fa-
bricante, após a aprovação pelos organismos envolvidos de controle de qua-
lidade. Em caso de um deles opinar contrariamente, a derrogação seria re-
cusada. Elas se classificavam em registráveis, não registráveis e internas. As
não registráveis envolviam discrepâncias de pequena monta, encontradas
em itens não vitais e que, apesar de não atenderem às especificações exatas
previstas para uma determinada peça, satisfaziam às normas de tolerância.
As derrogações registráveis se originavam normalmente de
verificações realizadas durante a montagem ou ensaios de funcionamento
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 421

em função de pequenos reparos ou ajustes realizados sobre peças ou itens


controlados. Elas eram sempre comunicadas ao cliente, seja por influir
sobre a utilização do aparelho, seja por envolver qualquer limitação sobre
o funcionamento, a manutenção, a durabilidade, a performance contratual
e a intercambiabilidade de função ou dimensional. As derrogações não
implicavam quaisquer problemas à segurança da aeronave. A cada uma
delas estava obrigatoriamente associada uma solução em relação ao
problema apresentado, que poderia ser uma simples anotação da existência
de reparo ou retoque, uma diminuição do número de horas de vida da peça,
uma diminuição do seu TBO, uma diminuição do preço da peça, entre outras
providências. Tais derrogações eram registradas para permitir um bom
acompanhamento da vida da peça e da aeronave e submetidas à aprovação
do controle de qualidade, do escritório de projetos e do Service Industrielle
de L’Armement, órgão de controle do Ministério da Defesa francês, sendo
aprovadas como tal, conforme já referido anteriormente, somente em caso
de anuência de todos os serviços envolvidos.
A título de exemplo, as aeronaves que eram produzidas, na ver-
são standard, ou seja, sem qualquer personalização exigida pelo compra-
dor, saíam da linha de produção, em média, com mais de uma derrogação.
As derrogações eram registradas em formulário próprio, nu-
merados e controlados, no qual constavam sua descrição detalhada e to-
das as informações necessárias à sua identificação e controle, bem como
a especificação dos órgãos que atestaram sua exequibilidade.
O RIC apresentava ainda a lista das modificações aplicadas à
aeronave, que tem como parâmetro a primeira aeronave fabricada e re-
fere-se às diversas evoluções experimentadas pelo equipamento ao lon-
go do seu processo de produção. A lista é em última instância a história
do desenvolvimento do modelo. Sua apresentação era tão detalhada e
minuciosa quanto a lista das derrogações.
O Inventário (livret) dos componentes, com limite de vida e
sujeitos ao TBO, é outra parte integrante do RIC. O inventário deve
sempre acompanhar a peça controlada para manutenção ou repara-
ção de modo que o controle seja rigoroso, bem como conter todas as
observações, permitindo o acompanhamento da vida de cada compo-
nente. O controle de itens, subconjuntos ou conjuntos submetidos à
limite de vida ou tempo de duração entre operações de manutenção
(TBO) é realizado com extremo rigor, pois pode implicar a segurança
da operação da aeronave.
422 Aviação no Exército - uma visão histórica

A carta de orientações úteis tem por objetivo transmitir aos clientes


determinadas condutas que visavam facilitar a interface com o fornecedor.
As fichas de matrícula dos itens controlados eram documentos expe-
didos pelos diversos fabricantes dos itens ou conjuntos que imperiosamente
deviam ter sua vida útil monitorada. Apresentavam uma descrição extrema-
mente detalhada de cada item, assim como de suas condições de utilização.
Acompanhavam ainda cada aeronave o inventário geral e o li-
vro do motor, ambos com o mesmo nível de detalhamento dos documen-
tos constantes do RIC.
Ao longo da nossa missão, tivemos, ao mesmo tempo que de-
sempenhávamos nossas atividades diárias, que aprender isso tudo. Lon-
ge de se tornar um estorvo, essas dificuldades nos instigavam e aumen-
tavam nosso entusiasmo com a missão.

Pilotos e mecânicos realizando cursos da Aerospatiale participam


das atividades de recebimento. Em primeiro plano, o major Sardo

Os testes de estanqueidade
A verificação da estanqueidade das aeronaves, ou seja, da sua
vedação contra a penetração de líquidos no interior da célula e do radar
era outra atividade de fiscalização e estava compreendida entre os itens
de verificação no solo. O teste era realizado em instalação específica onde
a aeronave era submetida a jatos de água sob pressão, simulando uma
precipitação em condições de voo. A cabine de testes de estanqueidade
era semelhante a um lava a jato. O helicóptero era posicionado no centro
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 423

da instalação e recebia jatos de todas as direções. Acompanhávamos


cada ensaio constatando a efetividade do teste e o preenchimento dos
requisitos que atestavam o resultado esperado. Em função de relatos
veiculando problemas de estanqueidade nos primeiros HB 350 L1, Esquilo,
montados no Brasil, que já se encontravam em operação, a COMFIREMEX
solicitou à fábrica a mudança nas condições de aferição da estanqueidade,
com o aumento da pressão e do volume da água na cabine de testes. Essa
mudança foi realizada após alguns embates. A modificação dava para a
comissão a garantia de que as aeronaves AS 365K Panther não sofreriam
os mesmos problemas quando fossem entregues para operação no Brasil.
Os testes eram feitos nessas condições, pois não podíamos aguardar um
dia chuvoso para realizar a verificação. Além do mais, a região sofria com
um clima seco, com pouquíssima precipitação na maior parte do ano.

O teste do guincho e do gancho


O guincho e o gancho são dois equipamentos destinados ao
transporte de carga. O gancho é normalmente utilizado para cargas em
geral; o guincho, em situações de resgate de pessoal. O teste da capaci-
dade do guincho e do gancho também se incluía nas verificações em voo.
A Aerospatiale possuía uma área específica para a realização dos testes,
com cargas já preparadas e de pesos variados.

Voo de recepção. Área de teste de capacidade do gancho


424 Aviação no Exército - uma visão histórica

O acompanhamento da produção
O acompanhamento da produção era mais uma atividade
da comissão e tinha como objetivo verificar se o ritmo de fabricação
de cada aeronave indicava que os prazos estabelecidos no contrato
seriam cumpridos. A presença de representantes do cliente na linha
de montagem não era um procedimento usual. No entanto, objeti-
vando inclusive a melhor capacitação do nosso pessoal, acordamos
com a direção da empresa um plano de acompanhamento envol-
vendo a presença do tenente-coronel Albernaz e do sargento Borck
pela manhã na linha de produção. A bem da verdade, é importante
que se diga que jamais fui obstado de, quando julgasse necessário,
me fazer presente no acompanhamento da produção com meus au-
xiliares.
A DMAVEX era constantemente informada sobre a progres-
são da produção e a respeito dos problemas porventura identifica-
dos. A atividade permitia que aprofundássemos os conhecimentos
sobre as aeronaves e suas partes constitutivas. Permitia-nos ainda
estabelecer um convívio amigável com o pessoal envolvido na produ-
ção, o qual é sempre desejável, pois tornam a busca de informações
menos trabalhosa.

Linha de montagem do AS 365K Panther


A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 425

Outro aspecto da linha de montagem do Panther

O voo de recebimento
O voo de recebimento tinha a finalidade de verificar a confor-
midade do helicóptero com as performances previamente estabelecidas
no contrato e no respectivo manual. No caso de identificada quaisquer
discrepâncias, a aeronave deveria passar pelos ajustes que se fizessem
necessários. Aquelas identificadas em voo, à medida que vão sendo sa-
nadas, permitem que a aeronave atinja as condições de operação previs-
tas nos manuais do equipamento. Também se constituía um elo impor-
tante na segurança da operação do equipamento.

Preparação para voo de recebimento do Panther


426 Aviação no Exército - uma visão histórica

Implicava o conhecimento da aeronave e seus sistemas. Como


ventilado anteriormente, compreendia inicialmente um minucioso tra-
balho de solo, no qual se incluía a inspeção externa detalhada antes de
cada decolagem, a inspeção pré-voo. Contávamos sempre com a partici-
pação de piloto, engenheiro e mecânicos da Aerospatiale, profissionais
altamente qualificados que apoiavam nossa tripulação. Os parâmetros
aferidos nos voos de recepção eram aqueles previstos no respectivo ma-
nual de operações e os especificados no contrato.

Voo de recebimento. Nas extremidades, dois mecânicos da Aerospatiale.


Da direita para a esquerda, sargento Borck, engenheiro navegante Tontic,
piloto de ensaio Andrés, o autor e o tenente-coronel Aviador Albernaz

Os programas dos voos também estavam detalhados nos anexos


ao contrato de aquisição das aeronaves e incluíam, entre outros itens, os
ensaios hidráulicos e elétricos no solo, verificação da iluminação inter-
na e externa, do painel de bordo, do console e do teto. Os ensaios eram
divididos em grupos e englobavam o exame no solo antes da primeira
decolagem, a verificação em voo do bom funcionamento do helicóptero
e das performances e o check dos equipamentos de Nav/Com, do piloto
automático e dos equipamentos opcionais. Nesses grupos, se abrigavam
uma série de procedimentos a serem adotados e testados, aos quais não
faremos referência por serem muito extensos.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 427

Sobre essas atividades, teceremos maiores detalhes quando


fizermos adiante referência aos relatórios periódicos.

Um dos voos de recepção em Marignane. Da esquerda para a direita, Semioli,


engenheiro naval da Aerospatiale; Sgt Borck, mecânico da COMFIREMEX; o autor;
major Simões, piloto da COMFIREMEX; Sr. Andrés, piloto de teste (Pilot d’Essais) da
Aerospatiale

Acompanhamento dos cursos


Entre as atividades da COMFIREMEX, se inseria o apoio aos
cursos de pilotos, gerentes e mecânicos realizados pela Divisão de En-
sino da Aerospatiale, denominado Campus, em Marignane. Em meio a
outras providências, implicava a obtenção de autorização para o acesso
dos alunos na análise dos currículos, na proposta de modificações deles,
na alteração do número de vagas, no apoio para a solução de problemas
de caráter pessoal e em outras medidas que se fizessem necessárias. A
otimização dos cursos era feita à medida que eles se desenvolviam e se
recebia dos instruendos as informações sobre a qualidade, pertinência e
adequação deles. Fruto do trabalho conjunto de alunos e comissão, foram
428 Aviação no Exército - uma visão histórica

realizadas modificações em diversos currículos, como os de gerente de


manutenção, gerente de aviônica e o estágio de motores para sargentos
mecânicos, que foram alterados em sua grade curricular e horária para
melhor atender aos interesses da Aviação do Exército.
Os problemas particulares eram provocados fundamentalmente
pelo depósito no Banco do Brasil de Nova Iorque das indenizações
devidas aos alunos, uma vez que eles não recebiam recursos em mãos
para as despesas de estadia. Isso exigia esforços da comissão para
resolver as dificuldades decorrentes, inclusive com o adiantamento de
algum numerário para atendimento de problemas emergenciais.

Em cerimônia realizada em 15 de março de 1990, na sede da Aerospatiale, em


Marignane, o coronel Silva Maia, chefe da COMFIREMEX, teve a honra de entregar
ao coronel Wanderley o diploma que lhe foi conferido como o 19.000º aluno a ser
formado pelo centro de treinamento da fábrica

A comissão envidou todos os esforços para lhes proporcionar


o máximo de apoio possível, seja no acompanhamento dos cursos, seja
na resolução de problemas particulares. Com o objetivo de permitir aos
alunos um momento de lazer e ao mesmo tempo melhorar o nível de
entendimento com os diversos setores da empresa, foi programado, sem
prejuízo das atividades curriculares, um jogo de futebol entre as equipes
da COMFIREMEX e do Departamento de Cooperação e Licença.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 429

Equipes de futebol da COMFIREMEX e da Aerospatiale

Disputado em clima de congraçamento, o jogo teve o resultado


final de 2x0 para a equipe da Aerospatiale (sempre os franceses!!). Abai-
xo, reproduzimos o texto do artigo publicado no informativo da Aeros-
patiale sobre o evento:

Le personnel du département Cooperation-Licences a orga-


nizé un match de football sur le terrain du complexe sportif
contre une délégation brésilienne conduite par le Lieutenat
Colonel Da Silva Maia, représentant de la COMFIREMEX dans
l’établissement. ne fois n’étant pas coutume, l’équipe locale
n’a pas laissé les honneurs de la victoire à ses hôtes, qui ont
dû s’incliner sur le score de 2-0. ais le match retour est déja
prévu. eul regret pour l’équipe H/CL il n’aura pas lieu dans le
pays de l’adversaire.
O pessoal do Departamento de Cooperação e Licença orga-
nizou um jogo de futebol no campo do complexo esportivo
contra uma equipe conduzida pelo tenente-coronel Da Silva
Maia, representante da CONFIREMEX. Não sendo o costu-
me, a equipe local não deixou a seus hóspedes a honra da
vitória, que foram derrotados pelo placar de 2x0. O jogo re-
torno já foi previsto. O único lamento da equipe local é que
não será no país do adversário.
430 Aviação no Exército - uma visão histórica

A comissão em determinada ocasião autorizou, a título de com-


plemento da formação, a participação de alunos nas atividades de re-
cepção das aeronaves.
A segurança da fábrica era exercida com rigidez. Os badges
(crachás) distribuídos, após a aprovação do ingresso nas instalações
pela segurança, restringiam o acesso a determinadas áreas. Mesmo para
os integrantes da comissão, quando havia a necessidade de se deslocar a
determinadas áreas, se fazia indispensável o acompanhamento por fun-
cionário designado pela fábrica.

Quadro de controle dos cursos de pilotos, gerentes e mecânicos

Em determinado dia, durante o horário do almoço, fui alerta-


do que alguns alunos tinham sido “detidos” pela segurança por estarem
transitando em local não permitido. Dirigi-me, então, ao Departamento
de Cooperação e Licença, nosso elo com a Aerospatiale, e solicitei provi-
dências imediatas para a “libertação” de nossos militares, o que ocorreu
logo depois. Na época, enfrentávamos alguns “conflitos” com a Aerospa-
tiale sobre o desenvolvimento do contrato, e permaneceu a dúvida se a
atitude da segurança não teria sido uma reação à situação. O fato jamais
voltou a acontecer.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 431

Curso de motores Arriel, na Turbomeca, na cidade de Tarnos, na França, em março


1990. Em pé, da esquerda para a direita, técnico da Turbomeca; 1o Ten Roberto Cos-
ta; Maj Gomes Torres; TC Wanderley; TC Zacharias; técnico Prezotto (HB); técnico
Didier (Turbomeca). Agachados: 1o Ten Tramontin; 1o Sgt Godois; Eng. Pires (HB);
1o Ten Ferraz e 1oSgt Barros

Um dos problemas enfrentados por aqueles que participaram


dos cursos ministrados na França foi a barreira da língua. Particular-
mente, no tocante aos pilotos formados em São Pedro da Aldeia, a difi-
culdade se manifestou, pois, durante o período em que permaneceram
na Marinha, se dedicaram ao estudo do inglês, supondo que as aerona-
ves poderiam ser adquiridas nos Estados Unidos ou na Inglaterra. To-
dos se habilitaram em língua inglesa pelo Centro de Estudos do Pessoal
(CEP) e até contrataram professor particular para melhorar o conheci-
mento da língua. Não sabem por que razões, na época, acreditavam que
a compra seria em país de língua inglesa. O resultado foi que, em razão
de a aquisição haver sido feita na França, e os cursos serem realizados
em língua francesa, eles ficaram “com a brocha na mão”. O critério ini-
cial previsto para o curso na França seria a proficiência na língua. Como
não havia habilitados, a seleção foi realizada, no caso dos pilotos, entre
aqueles que possuíam maior número de horas de voo. No entanto, as
dificuldades em relação ao idioma foram contornadas pela presença de
tradutor durante os cursos e pelo reduzido número de alunos em cada
turma. A vantagem foi que iniciaram o aprendizado de uma nova língua.
432 Aviação no Exército - uma visão histórica

A exemplo dos cursos de piloto, os de gerente e mecânico contaram com


a presença de intérprete.
Como parte do longo depoimento, que se encontra disperso em
alguns capítulos do livro, prestado pelo coronel Contreiras em relação
ao curso que realizou na França, relatou que:

No final de 1989, ocorreu um fato importante, tanto profis-


sional quanto pessoal. Embarcamos para fazer o curso de
piloto do helicóptero 365K – Panther, denominado no Exér-
cito como HM-1 (helicóptero de manobra), Pantera. Além
da expectativa de conhecer e pilotar uma máquina nova e
maior, tínhamos a possibilidade de viajar para o exterior.
Saímos do Brasil com uma inflação mensal de cerca de 70%.
Chegamos a Marselha, e o Cel Silva Maia, chefe da Comissão
de Fiscalização e Recebimento de Material (COMFIREMEX),
nos esperava no aeroporto. Levou-nos para o hotel Breteuil.
No caminho, nos ministrou uma aula de geografia sobre a
cidade. Ficamos algum tempo no hotel, mas alguns militares
que estavam na cidade há mais tempo tinham descoberto
um flat, o Citadines, e uma parte dos militares, eu incluído,
se mudou para o flat. Tive a sorte de ficar no apartamento
com o Garcez, Esteve e Bispo. Os primeiros ficaram no quar-
to, cada um na sua cama. Eu e o Bispo ficamos na sala, divi-
dindo o sofá-cama. Obedecendo à regra que diz ‘à esposa de
César não basta ser honesta, tem que parecer honesta!’, nós
usávamos a colcha enrolada, colocada entre para nós para
dividir o espaço de cada um no sofá.
Observávamos tudo curiosos, tudo era novidade. A adap-
tação foi fácil porque o grupo se amparava. Tínhamos a
orientação do Cel Silva Maia, que já conhecia a rotina e o
comportamento dos franceses e da fábrica, e o auxílio do
Laerte e do Simões, que tinham nos precedido. O sargento
Borck também nos dava dicas. As primeiras semanas foram
de estudo teórico sobre o helicóptero. Como sempre, mui-
ta dedicação e estudo de noite no hotel. O curso tinha uma
dificuldade a mais por ter sido ministrado em francês. O
tradutor também estava fazendo o curso e não tinha muita
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 433

experiência. Algumas vezes, até ele ficava na dúvida sobre a


explicação do Sr. Raguet, o instrutor.
Logo fomos para o voo. O primeiro instrutor, o Sr. Andrés.
Era mais simpático. Como ele veio para o Brasil para con-
tinuar a instrução aqui, foi substituído por outro instrutor
mais fechado, não lembro o nome dele. O contrato previa o
voo na nossa aeronave. A entrega atrasou, e o Cel Silva Maia
exigiu o cumprimento do contrato; ficamos esperando na
fábrica. Tivemos alguns momentos de ociosidade, mas o Cel
Silva Maia nos empregou para ajudar no recebimento das
aeronaves. Nós tínhamos que conferir todos os Part Num-
bers das peças das aeronaves. São centenas e algumas de
difícil acesso. Usávamos até um espelho para conferir se o
número estava de acordo com o registrado no livro da ae-
ronave. O coronel Silva Maia era muito rigoroso, exigindo o
cumprimento do contrato. Por conta disso, teve alguns atri-
tos com os franceses, que tentavam nos enrolar. Sobre esse
aspecto, ele pode discorrer melhor.
A parte boa ficou por conta das viagens. Todas as semanas
alugávamos um carro numa loja na própria fábrica. Pas-
sávamos no supermercado para comprar a comida para a
semana e para a viagem. Dormíamos cedo na sexta e ma-
drugávamos no sábado, retornando domingo de noite. Cha-
mava a atenção a qualidade das estradas, as autoroute, e o
fato de elas serem particulares. Muitos anos depois, as es-
tradas brasileiras seriam objeto de concessão, permanecen-
do propriedade pública.
A fábrica reduziu suas atividades no período de festas. A
maioria foi liberada. Ficamos eu e o Fenley para adiantar o
voo, mas eu fui encontrar os casados em Saint Gervais para
passarmos o fim de ano juntos. As mulheres fizeram uma
compra para a ceia, e confraternizamos no hotel onde os ca-
sais se hospedavam. Lá aconteceu um fato pitoresco. Eu me
aborrecia quando identificávamos nossa nacionalidade, e
os franceses afirmavam: ‘Beaucoup des brasiliens au Bois de
Boulogne.’ Uma referência aos travestis que frequentavam o
parque em Paris. Eu não retrucava, por educação, mas uma
434 Aviação no Exército - uma visão histórica

vez falei para o Bispo que responder que: ‘Se existem tra-
vestis brasileiro em Paris, é porque os franceses gostam.’
O dono do hotel onde os casais se hospedavam emprestou
a coberta de mesa para fazermos a ceia. O Bispo perguntou
se tinha vinho para vender, e ele respondeu que não podia
vender vinho. Ele foi simpático e ficou conversando, mas
ao saber da nossa nacionalidade, fez o comentário que me
referi. O Bispo respondeu utilizando o meu comentário. O
francês, percebendo a indelicadeza, se retirou rapidamen-
te, mas voltou alguns minutos depois com uma garrafa de
vinho, falando que não podia vender, mas podia dar. As-
sim, comemoramos a chegada dos anos 90 e a minha pro-
moção a capitão.
Fazíamos as refeições na fábrica sem custo, com direito a
uma garrafa de vinho. Infelizmente, alguns brasileiros pega-
vam o vinho e não tomavam, com o objetivo de trazer para o
Brasil. Uma funcionária que controlava o caixa uma vez co-
mentou, irônica, vendo uma mesa de brasileiros com várias
garrafas sobre a mesa: ‘Beaucoup des boutteiles.’’
Sou muito agradecido ao Exército por essa oportunidade.
Aprendi muito viajando para o Primeiro Mundo.

O sistema de comunicações das aeronaves.


O caso do HF
Como já relatado, os ROB estabeleciam como um de seus requi-
sitos absolutos que as aeronaves fossem dotadas de sistema de comuni-
cações o qual lhes permitissem a ligação com as unidades terrestres em-
pregadas, a operação em aerovias, com possibilidade de manter contato
com as redes de tráfego aéreo de terra, e a intercomunicação entre seus
tripulantes e com o comandante da tropa transportada.
As condicionantes acima referidas envolviam a capacidade de
as aeronaves se ligarem aos sistemas de comunicações da Força Terres-
tre, com o Serviço Móvel da Aeronáutica e com as redes de controle do
tráfego aéreo, no Brasil e no exterior. Entre as redes em que atuava a
Força Terrestre, inseria-se a equipada com rádios do denominado grupo
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 435

4, que operava a grandes distâncias dentro de um determinado espec-


tro de frequência, que julgamos melhor omitir. Na proposta da empresa
vencedora, a Aerospatiale, a faixa de atuação declarada para o equipa-
mento de HF que integraria a aeronave era superior àquela definida no
edital de licitação.
Por ocasião dos voos de recepção em Marignane para verifica-
ção do desempenho dos equipamentos rádio, eram realizadas ligações
com estações de rádio, que, no caso do HF, situava-se em país do conti-
nente africano costeiro ao Mar Mediterrâneo. Nesses ensaios, verificou-
se que o citado equipamento não operava em todo o espectro informado
pela Aerospatiale.
Antes de prosseguir, é interessante fazer uma rápida aborda-
gem sobre as particularidades envolvidas na interface do equipamento
HF em uma aeronave, para os leitores menos afeitos à questão. Os rádios
HF têm a característica de transmissão e recepção de voz em longas dis-
tâncias. Isso é explicado pela propagação da onda de HF que se encami-
nha para a ionosfera e lá é refletida para a superfície terrestre atingindo
até milhares de quilômetros do ponto inicial.
Em razão da propagação ionosférica, as transmissões feitas
dessa forma podem ter alcances mundiais, dependendo da potência
empregada e da hora do dia/noite. É vital para permitir comunicações
diante de uma extensa floresta, enormes vazios populacionais, com lo-
cais habitados distantes e elevada umidade no solo e no ar.

Os equipamentos HF, na época, exigiam grandes extensões de


antena, o que tornava problemático seu emprego nas aeronaves, em par-
ticular nos helicópteros, por causa da pouca superfície disponível. Nessas
436 Aviação no Exército - uma visão histórica

situações, criava-se um artifício eletrônico na figura de um equipamento


que “simulava” um comprimento maior para a antena instalada.

No nosso caso, o HF instalado atendia aos requisitos estabele-


cidos pelo Exército, mas não atingia aquele desempenho informado pela
empresa.
Feita essa constatação, a comissão exigiu da Aerospatiale que
tomasse as providências para o problema ser sanado, o que não ocor-
reu em razão da impossibilidade técnica de melhorar o desempenho até
os limites constantes da proposta da empresa. Em consequência, após
infindáveis e tensas reuniões, recuperou-se a quantia de aproximada-
mente oitocentos mil dólares, em forma de crédito, que foi utilizada para
a aquisição de novos equipamentos para as aeronaves. O montante de
crédito recuperado por si só justificou sobejamente a nomeação da co-
missão. Frise-se, no entanto, que essa não foi a única situação em que
nossa atuação implicou a obtenção de créditos em favor do Exército.
Eles foram auferidos em todas as outras áreas do contrato.
Dos equipamentos de comunicações, o HF não foi o único que
nos exigiu a intervenção junto à empresa. O rádio em VHF (Very High
Frequency) Collins teve identificado problemas após o início da opera-
ção do HB 350 L1, Esquilo, no Brasil. O fato foi reportado pelos pilotos.
Pelos relatos, o equipamento não funcionava em determinadas frequ-
ências e, em particular, nas de socorro. De início, os interlocutores da
Aerospatiale trataram o assunto como se fosse falta de experiência dos
nossos pilotos. Em seguida, com as evidências apresentadas, a fábrica
passou a considerar a ocorrência um problema de localização da antena
na aeronave, e, finalmente, ao enviar o relato do caso para a Rockwell,
fabricante e detentora da marca Collins, foi verificado que um lote de al-
guns dos componentes usados na fabricação do rádio apresentava defi-
ciência de funcionamento. Essa conclusão gerou um recall mundial para
os equipamentos de uma determinada faixa de números de série. Nesse
fato, fica bem demonstrado o acerto de nossa decisão de comprar as ae-
ronaves sob a modalidade de “porteira fechada”. Coube exclusivamente
à Aerospatiale resolver o problema junto à Collins, sem que tivéssemos
de nos preocupar em resolver um conflito que certamente ocorreria
com cada fornecedor, no caso a Aerospatiale e a Collins, atribuindo a
responsabilidade ao outro.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 437

O recebimento do HB 350 L1,


Esquilo, Av Ex 01
A recepção da primeira aeronave foi um fato de extrema signi-
ficância para todos nós. O regozijo, a emoção, a preocupação, a apreen-
são, uma gama indescritível de sentimentos se apossou dos integrantes
da comissão. Era o início efetivo da nossa missão. Outras atividades já se
haviam iniciado, mas essa envolvia novas responsabilidades, e estávamos
todos determinados a fazer o melhor possível. Infelizmente, não consegui
localizar a documentação relativa ao recebimento do Esquilo 01.
Segundo o estabelecido contratualmente e de acordo com o es-
copo de aumentar o índice de nacionalização da produção das aerona-
ves, somente uma aeronave Esquilo foi totalmente montada na França,
cabendo à Helibras, no Brasil, a instalação do módulo C do transponder,
das partes fixas do armamento axial, das partes fixas e móveis dos retro-
visores, a realização da pintura e a aposição das inscrições. As demais
aeronaves Esquilos, com já vimos anteriormente, seriam fornecidas des-
montadas, cabendo à Helibras os trabalhos de montagem e dos ensaios
em voo (mis à point).
A aeronave teve o retardo de um mês em relação ao previsto
para seu embarque para o Brasil em função das discrepâncias aponta-
das (e, naquela ocasião, tínhamos pouca experiência). Além das inúme-
ras verificações no solo, foram realizados sete voos, quatro diurnos e
três noturnos, com duração variada. Voamos um total de seis horas e
realizamos quase quarenta pousos e decolagens.
No início da campanha de voos do Av Ex 01, enviei ao diretor de
Material de Aviação do Exército um fax do qual me permito reproduzir
alguns trechos, plenos da mais profunda emoção.

Possuídos de incontida emoção, esta chefia e demais mem-


bros da COMFIREMEX participam VEx., pela primeira vez
história, helicóptero militar com inscrição Exército rasgou
céu França, em cumprimento voo recepção [...]
Permita-me apresentar sinceros parabéns VEx. e equipe,
nossas sinceras congratulações sucesso alcançado mais um
combate buscando conceder nossa Força necessária capaci-
tação cumprimento sua missão constitucional.
438 Aviação no Exército - uma visão histórica

Fruto perseverança e pertinácia VEx. e caros companheiros


DMAVEX, podemos usufruir de momento inesquecível, o da
concretização de antigo sonho, o surgimento da nossa Avia-
ção do Exército.

Voo de recebimento do Av Ex 01

A partir da data de início dos ensaios em voo, em 1º de feverei-


ro de 1989, os sete voos, inclusive noturno, ocorreram nos dias 1, 2, 3 e
15 do mês em questão. O espaço de 12 dias, entre o terceiro e o quarto
dias, se deveu à necessidade de correção das discrepâncias apontadas
pela comissão nos voos anteriores. O vulto dos problemas detectados
levou à realização de, após introduzidas as correções, um novo ciclo de
recepção em voo, que se reiniciou em março de 1989.
Entre os problemas encontrados, se incluíam a deficiência do
sistema de iluminação do painel de bordo e a pintura interna da cabine.
A discrepância exigiu a convocação dos fornecedores e implicou uma
série de modificações de custos consideráveis, fruto do trabalho desen-
volvido pela comissão.
Teceremos novas considerações a respeito do recebimento do
Esquilo 01 quando abordarmos os relatórios periódicos das nossas ati-
vidades, que eram remetidos à DMAvEx.

A solenidade de recebimento do Av Ex 01,


Esquilo, em Marignane
Por carregar um enorme simbolismo, tanto para a fábrica quan-
to para o Exército Brasileiro, sob os auspícios da empresa e após a con-
clusão do recebimento em Marignane, foi organizada pela Aerospatiale
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 439

uma cerimônia de entrega solene da primeira aeronave, o HB 350 L1,


Esquilo, aeronave de reconhecimento e ataque, em 10 de março de 1989.
O grande hangar impecavelmente limpo, as dezenas de cadei-
ras perfeitamente alinhadas e o grande público presente não permitiam
disfarçar a importância do evento e o clima de emoção imperante. As
presenças de diversas personalidades da alta cúpula da Aerospatiale
davam a medida do significado do evento também para a empresa. En-
tre os presentes, estavam os orgulhosos integrantes da COMFIREMEX,
que viam naquele momento transformarem-se em realidade os antigos
anseios do Exército Brasileiro de busca de sua modernização, incorpo-
rando novo e moderno meio que lhe proporcionaria a tão almejada mo-
bilidade, indispensável ao seu emprego eficiente.
É difícil transmitir para o papel a mescla dos sentimentos que nos
assomavam como atores daquele espetáculo inesquecível. Aquela seria a
única aeronave Esquilo a ser voada pela comissão em Marignane. Era a nº
1, a precursora de mais 51 aeronaves que dariam forma à novel Aviação do
Exército. Pela primeira vez em sua história, o Exército Brasileiro operaria
aeronaves de asas rotativas.
Por todos os motivos, a entrega da primeira aeronave foi um evento
singular e marcante.

Texto do artigo publicado no informativo da empresa sobre o evento. Na


foto à esquerda, a aeronave pronta para a solenidade. À direita, autorida-
des da Aerospatiale, SIAR e integrantes da COMFIREMEX

Além de altos executivos da empresa, como os Srs. Lambert,


Dubreuil e Larreur, Raquin e outros, é importante ressaltar a presença
do tenente-coronel Tapella, representante da Surveillance Industrielle
de L’Armement (SIAR), órgão das Forças Armadas francesas encarregado
440 Aviação no Exército - uma visão histórica

da fiscalização das empresas do país dedicadas à fabricação de material


da área de armamento. Sobre o SIAR e seus representantes, tenente-coronel
Tapella e o engenheiro Charbonnier, teceremos outras considerações ao
longo deste livro.

Cerimônia de entrega do Esquilo Av Ex 01. Da esquerda para a direita, o


Sr. Larreur, chefe do programa Esquilo; o tenente-coronel Tapella, do SIAR;
o Sr. Lambert; o autor, chefe da COMFIREMEX; o tenente-coronel Albernaz;
o major Sardo; o sargento Borck e o Sr. Dubreuil, chefe dos programas

A solenidade de entrega do Av Ex 01
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 441

O autor, chefe da COMFIREMEX, discursa durante o evento

Entrega simbólica da chave do Av Ex 01


442 Aviação no Exército - uma visão histórica

Lembrança alusiva à data, oferecida pelo tenente-coronel Tapella

Com a voz embargada pela emoção, dirigi a palavra aos pre-


sentes, em discurso preparado em francês antecipadamente, pois
ainda não tinha a necessária fluência na língua. A todos transmiti
a transcendental importância que aquela data representava para o
nosso Exército.

A solenidade de recebimento do HB 350 L1,


o Av Ex 01, em Taubaté
Atendendo ao convite da Aerospatiale, acompanhado pelo pilo-
to da comissão, tenente-coronel Albernaz, devidamente autorizado pela
DMAvEx, desloquei-me ao Brasil para acompanhar a solenidade de rece-
bimento do HB 350 L1, Esquilo, o EB 01, pelo1º BAvEx. Em 21 de abril
de 1989, em Taubaté, nas instalações do 1º Batalhão de Aviação do Exér-
cito, com a presença do ministro do Exército e de outras autoridades, foi
recebida oficialmente a aeronave Esquilo 01, ostentando as inscrições
do Exército Brasileiro. Com os pilotos, capitães Bispo e Esteve, o general
Leonidas teve a oportunidade de realizar o primeiro voo em aeronave
militar do Exército Brasileiro.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 443

A entrega do primeiro helicóptero se constituiu em evento de


grande importância por marcar a concretização da incorporação do
meio operacional que iria permitir à nossa Força Terrestre se alçar à tão
almejada 3ª dimensão no campo de batalha. Era também de significativa
relevância para a história da Aviação do Exército. Além disso, todos esta-
vam de olhos fitos no evento, tanto os que torciam contra como aqueles
que se posicionavam a favor.
Entre as muitas atividades programadas pelo coronel Telles, a que
se revestia de um especial simbolismo era o voo, após a entrega solene do
helicóptero, com o ministro do Exército a bordo. Esse deslocamento se tor-
nou um fato de grande preocupação. Havia o receio de que pudesse ocorrer
algum acidente/incidente envolvendo a maior autoridade da Força e figura
preeminente do Governo. O coronel Marcondes, chefe da Seção de Aviação,
por determinação 3º Sch/EME, telefonou ao coronel Telles sugerindo-lhe que
a tripulação fosse composta por um oficial da FAB e um da Marinha, acrescen-
tando, para não constrangê-lo, que seria uma forma de homenagear as Forças
pelo apoio prestado até aquela data. O coronel Telles, que não queria abrir
mão de ver seus pilotos tripulantes do memorável voo, com grande presença
de espírito, disse que se o problema era homenagear as duas Forças designa-
ria dois oficiais pilotos do batalhão formados na Marinha e na Força Aérea,
respectivamente, prestando assim a justa e merecida homenagem às nossas
coirmãs. No entanto, o coronel Marcondes voltou a insistir no assunto, e o
coronel Telles retrucou que seria da sua maneira ou não haveria voo. O coro-
nel Marcondes, dando-se por vencido, ou convencido, pediu ao coronel Telles
que fizesse contato com o assistente do ministro, solicitando que ele sondas-
se a posição do general Leonidas em relação ao assunto. O coronel Telles te-
lefonou ao assistente, colocando-o a par da situação, e pediu-lhe que fosse o
veículo da consulta. “Telles, você acha que eu vou perguntar isso ao ministro?
Ele vai pensar que eu estou achando que ele está com medo. Se vira! Você não
aceitou o comando do batalhão? Agora trate de resolver isso sozinho!”
E o problema foi resolvido. No dia da solenidade, após a recepção,
a aeronave alçou voo com os dois pilotos do Exército, os capitães Bispo e
Esteve, um formado na Marinha e outro na Aeronáutica, levando em seu in-
terior o ministro e dois oficiais-generais das outras Forças Singulares. Dessa
forma, fez-se a homenagem à Marinha do Brasil e à Força Aérea Brasileira,
ficando demonstrado que a confiança que o coronel Telles sempre deposi-
tou na competência de seus subordinados era plenamente correspondida.
444 Aviação no Exército - uma visão histórica

O general Leonidas, ministro do Exército, é recebido pelo coronel Telles,


comandante do 1º BAvEx

Na ocasião, o comandante do batalhão, coronel de Infantaria


Jomar do Nascimento Telles, pleno de justificado júbilo e emoção, ende-
reçou aos seus subordinados as seguintes palavras:

Vivemos nesta data um fato marcante para a Aviação do Exér-


cito, em especial, para o nosso batalhão, quando se materializa
no helicóptero que acabamos de receber o anseio de nos lançar
aos céus com nossas próprias asas rotativas.
Se buscarmos os antecedentes desse evento histórico, encon-
traremos suas raízes nos ideais de nossos antepassados que
viveram – desde a pioneira utilização militar dos balões até a
extinta Arma de Aviação – desafios heroicos e maravilhosos.
Porém, num passado muito mais recente, suas causas imedia-
tas estão alicerçadas na atual administração do Exército, que o
está transformando numa Força Terrestre moderna e com ele-
vado grau de operacionalidade, apto, portanto, para atender às
necessidades de que certamente teremos que enfrentar neste
limiar do ano 2000, já tão próximo de nós.
Nesse contexto de transformações absolutamente necessárias
e inadiáveis, determinadas pelo Sr. ministro do Exército, foi
criada em 3 de setembro de 1986 a Aviação do Exército
e, na mesma data, sua Diretoria de Material e o 1º BAvEx,
primeira unidade destinada a cumprir missões operacionais
com helicópteros – meio imprescindível à Força Terrestre
nos modernos campos de batalha.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 445

Se àquela época, há pouco mais de dois anos, a Aviação do


Exército tinha sua existência restrita ao texto legal dos do-
cumentos que a originaram, atualmente é uma realidade e
tem em nossa unidade sua maior concretização. Hoje se se-
dimenta, ainda mais esta convicção, pois se junta ao nosso
pessoal e infraestrutura própria o instrumento síntese da
atividade-fim do batalhão, o helicóptero.
Há que lembrar que essa realidade é fruto de planejamento
meticuloso do EME e do apoio valioso de diversos órgãos
do Exército, num trabalho integrado e profícuo do qual tam-
bém participam empresas civis envolvidas no programa de
implantação do 1º BAvEx.
Para que nossa Aviação chegasse ao atual estágio, de grande
valia têm sido os ensinamentos auferidos nas OM das Forças
coirmãs: Marinha e Aeronáutica, proporcionando-nos a segu-
rança necessária para voarmos com nossas asas. Temos, con-
tudo, consciência do real estágio da nossa arte de voar e isto
nos dá a verdadeira dimensão de nossas limitações e a certeza
de que continuaremos a contar com o inestimável apoio da-
quelas Forças. Por oportuno, julgo conveniente transcrever
palavras do Sr. ministro do Exército pronunciadas em 25 de
agosto de 1988, referindo-se à Aviação do Exército:
‘Este novo passo que nos proporciona a tão sonhada tercei-
ra dimensão no campo de batalha evidenciou mais uma vez
o sentimento de harmonia existente entre as Forças Armadas
brasileiras. No preparo da infraestrutura que permitirá a ope-
ração dos helicópteros do Exército, foi fundamental o apoio
amigo e eficiente da Marinha e da Força Aérea, a quem deve-
mos a formação de nosso primeiro pessoal especializado.’
Meus comandados
A cerimônia da qual participamos neste momento, tomados
de grande emoção, nos traz o sentimento de muita alegria
e justificado orgulho, nos lembra também que aumentam
as responsabilidades que pesam sobre os nossos ombros. O
Exército está colocando em nossas mãos materiais comple-
xos e valiosos como o helicóptero que acabamos de receber;
todavia, maior que o seu custo material é o valor da confiança
446 Aviação no Exército - uma visão histórica

que em nós é depositada. Neste sentido, estou tranquilo;


com fé em Deus, determinação e competência atingiremos
o objetivo de tornar o nosso batalhão operacional.
Meus comandados
O mais fácil está feito, certamente teremos muitos obstáculos
pela frente, mas, com certeza, saberemos vencê-lo com convic-
ção de que dificuldades constituirão apenas o estímulo para o
cumprimento de nossa missão, que é nobre, pioneira e histórica.
Aviação!

O general Leonidas, ministro do Exército,


recebe a saudação de praxe

Ministro Leonidas (segundo da esquerda para a direita) entre oficiais-generais


durante a solenidade de recepção da primeira aeronave do contrato da Aviação do
Exército, em Taubaté. O ministro Leonidas está ladeado pelo general Décio, vice-
chefe do DMB, e o general Martins, chefe do Estado-Maior do Exército
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 447

General Leonidas e representantes da Marinha e da FAB dirigem-se ao


helicóptero 01 para realização do voo histórico

Da esquerda para a direita, capitão Bispo, oficial da FAB, general Leonidas,


oficial da Marinha e o capitão Esteve
448 Aviação no Exército - uma visão histórica

General Leonidas examina a maquete do complexo de Aviação de Taubaté

General Leonidas cumprimenta o Sr. Rainho,


presidente da Helibras

A seguir, reproduzimos as palavras, do Sr. ministro do Exército, ge-


neral Leonidas Pires Gonçalves, que constam do livro de ouro do 1º BAvEx.

A Aviação do Exército foi um anseio que parecia


inatingível. Hoje, recebemos nossa primeira aeronave de asas
rotativas.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 449

A emoção sentida no voo histórico que acabamos


de realizar no helicóptero EB 01 é comparável, somente com o
pisar o solo deste batalhão, marco inicial de nossa conquista
da terceira dimensão do campo de batalha.
1º Batalhão de Aviação do Exército!
Sois a realidade daquilo que um dia foi sonho,
mas que a nossa e vossa vontade ousaram realizar.

Entrega da primeira aeronave. Da esquerda para a direita, o Sr. Rainho,


presidente da Helibras; o ministro Leonidas; o coronel Telles e o major Simões

O início do recebimento provisório


dos AS 365K Panther, em Marignane
O primeiro voo de recepção de uma aeronave de manobra, o
AS 365K Panther, ao qual fizemos referência no início deste capítulo,
foi outro evento pleno de vibração e entusiasmo para os integrantes da
comissão. As aeronaves de manobra constituem a ossatura dos bata-
lhões de Aviação do Exército. São elas que permitem à Força Terrestre
deslocar-se com a rapidez exigida nos campos de batalha da atualidade.
O emocionado fax que enviei ao general Bulcão, diretor de Material de
Aviação do Exército, era o espelho, a exata radiografia do ambiente de
450 Aviação no Exército - uma visão histórica

enorme satisfação que reinava entre nós da comissão. Estávamos plenos


de emoção e vibração pelo emblemático momento que se nos apresen-
tava. O sonho a longo tempo acalentado se materializava. Foi um aconte-
cimento marcante na vida de todos nós. Tínhamos a consciência do que
ele representava para a nossa querida Força Terrestre.

Com o peito invadido do mesmo orgulho ostentado pelos jo-


vens oficiais do nosso glorioso Exército que, em 1920, em tra-
balho pioneiro, carregavam em seus ombros a nobre missão
de incorporação de meios aéreos à Força Terrestre, participo
a V. Ex. que esta comissão, nesta data, iniciou o recebimen-
to dos helicópteros de manobra AS 365K Panther, estabele-
cendo o primeiro marco da adoção pelo 1º BAvEx dos meios
aéreos que lhe proporcionarão a capacidade para o efetivo
cumprimento de sua missão básica, o assalto aeromóvel.

Os relatórios periódicos
Os relatórios transmitiam uma síntese das atividades ocorridas
no período, que já haviam sido detalhadas em ofícios e fax enviados ao
nosso escalão superior. Eles eram normalmente de periodicidade tri-
mestral, podendo de acordo com o vulto das atividades serem elabora-
dos em prazo menor, como ocorreu no nosso primeiro ano de funciona-
mento quando praticamente a cada mês emitíamos um relatório.
As discrepâncias verificadas ao longo do processo de recebimento
dos lotes de suprimentos, ferramental, meios auxiliares de instrução, trei-
namento de pessoal e de aeronaves farão parte dos nossos comentários
que se seguem e estavam presentes em todos os relatórios. Algumas delas
requeriam reiteradas discussões até a definição das responsabilidades e a
tomada das providências para a introdução das correções, que, em algumas
ocasiões, envolviam um ciclo longo até que o problema fosse resolvido.
Na maioria das vezes, faremos comentários sobre as situações
abordadas nos relatórios originais, evitando simplesmente de reprodu-
zi-las na integralidade, o que daria uma visão mais detalhada do nosso
trabalho, mas que, certamente, cansaria nossos leitores. Por essa razão,
faremos sempre que possível uma síntese da síntese, visando tornar a
leitura mais “palatável”. Condensá-los foi uma tarefa difícil e que me exigiu
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 451

muitos dias de trabalho. Os relatórios tinham até 15 páginas e invaria-


velmente possuíam muitos anexos nos quais determinados assuntos
eram descritos de modo mais pormenorizado, abrangente. Desse modo,
tive que “quebrar a cabeça” para, sem contrariar a essência do conteúdo,
restringir ao máximo o texto. Espero ter atingido esse objetivo.
Antes de prosseguir com o assunto, como procedi ao comentar as
cláusulas do nosso contrato, vou apresentar algumas definições sobre equi-
pamentos e instrumentos aos quais farei referência ao longo dos meus co-
mentários sobre os relatórios. Já expliquei o motivo de inserir os glossários
próximos aos textos nos quais os termos são encontrados e apliquei aqui
o mesmo raciocínio. No entanto, em relação a esse glossário, tive algumas
dúvidas. Será que haveria necessidade de definir a utilização desses equi-
pamentos para pessoas que os desconhecem? Será que não vou incorrer
no erro de tornar necessária a explicação da explicação? Estarei tornando o
meu livro muito prolixo? Bem, desse último pecado já pedi perdão antes. Na
análise de todas as incógnitas intervenientes, decidi que a melhor atitude
seria manter o glossário. De todo modo, o leitor curioso, penso que todos
são, se não houvesse qualquer explicação ia se obrigar a consultar algum
meio de pesquisa para se inteirar da finalidade dos instrumentos que se-
rão citados. Prefiro que eles compreendam meu esforço em tornar a leitura
mais clara do que me “xingarem” por dar-lhes um trabalho extra. Já lhes sou
muito grato por manusearem estas páginas.
Fiz o melhor que pude para dar-lhes uma ligeira noção do em-
prego dos equipamentos que formam a denominada aviônica das aero-
naves. Espero inclusive que estas breves explicações agucem a curio-
sidade dos amantes da Aviação para aprofundar as suas pesquisas e,
quem sabe, tornarem-se um dos integrantes do seleto clube.
Procuramos, sem prejuízo do entendimento, tornar mais conci-
sa possível cada definição. E, por favor, não pensem que estou querendo
evidenciar alguma erudição aeronáutica. Longe disso. Não sou piloto. Tive
que rever os meus alfarrábios para chegar a essas definições. Bem, aí vão:
Automatic Directional Finder (ADF) – Instrumento utilizado para
executar navegação via Rádio Farol (NDB). É o sistema de navegação mais
comum e mais simples. Sua operação é bastante simples. O piloto sintoni-
za uma estação de Rádio Farol ou rádio AM e um ponteiro no Indicador de
Rádio Magnético (RMI) indica a direção que deve ser seguida sobre uma
bússola. Um sinal de áudio também identifica a estação recebida.
452 Aviação no Exército - uma visão histórica

Autorrotação – A autorrotação é uma condição estável de voo


em que a força necessária para manter o rotor a rodar não provém do
rotor, mas sim do fluxo de ar a passar por este. Só é possível executar tal
manobra perdendo altitude. É comparável ao voo planado.
Bordo de ataque – Seção dianteira de uma pá.
Carga G – 1G é a força com que uma pessoa é atraída para a Ter-
ra. Os movimentos de aceleração e a inércia durante as manobras alte-
ram esse número. Uma pessoa com 70kg, sofrendo uma carga de 3G du-
rante a execução de um looping, terá o seu peso aumentado para 210kg.
Uma curva de zero G imita a sensação de um ambiente sem gravidade.
Cíclico – Controle direcional do helicóptero.
Coletivo – Controle principal de potência para movimento ver-
tical do helicóptero.
Distance Measuring Equipment (DME) – É um equipamento de
radionavegação que permite determinar a distância de uma aeronave
em relação a um ponto localizado no terreno. Com a utilização do DME,
a aeronave tem constantemente fornecida em mostradores a sua dis-
tância em relação à estação. Consiste de um transmissor de bordo cha-
mado interrogador que emite pares de pulsos de energia a intervalos
regulares e que são captados pela estação terrestre. Esta, denominada
transponder, responde à emissão do interrogador também em pares de
pulsos, só que a intervalos e frequências diferentes. O intervalo de tem-
po gasto pela ida e volta dos pulsos é então transformado em unidade de
distância (milha náutica) pelo computador acoplado ao equipamento e
mostrado visualmente ao piloto no painel.
Efeito solo – Composição de dois efeitos diferentes: aumento da
sustentação, em razão da proximidade do solo, e a redução do arrasto
gerado pelo “vórtice de ponta” das asas.
Horizontal Situation Indicator (HSI) – Instrumento de bordo
utilizado para navegação VOR ou aproximações ILS.
Indicador de Ng – Instrumento que indica a porcentagem de
RPM (rotações por minuto) que gira a turbina geradora dos gases do
motor.
Instrumental Landing System (ILS) – É um sistema que fornece
orientação para uma aeronave se aproximando e pousando em uma pis-
ta, durante condições meteorológicas por instrumentos, tais como teto
baixo ou visibilidade reduzida.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 453

Kit Engetrônica – Era composto por equipamentos (ADF 60 –


VHF/20B – VIR 31 H – TDR 90 e DME 40) que seriam fornecidos pela
empresa. Fazia parte do acordo entre as empresas do consórcio e não
implicava custo adicional.
Non Directional Beacon (NDB) – Transmissor de rádio que emi-
te ondas eletromagnéticas para utilização em navegação aérea. O NDB
pode ser identificado pelo Código Morse e prefixo.
NR/NTL – Indicador do percentual de RPM da turbina livre.
Radio Magnetic Indicator (RMI) – Indicador rádio magnético
para navegação baseada em auxílios rádio. Geralmente, é acoplado a um
ADF.
Rotor principal – Localizado na parte superior do helicóptero.
É responsável por 100% da sustentação e translação, devendo ter no
mínimo duas pás, podendo ser de vários tipos.
Rotor de cauda ou antitorque- Localizado no final da cauda do
helicóptero, tendo como função anular o torque, que é o esforço rotacio-
nal do motor sobre o eixo do rotor.
Transponder (TDR) – Dispositivo de comunicação que recebe,
amplifica e retransmite um sinal em uma frequência em resposta a outra
fonte. Respondem a sinais interrogadores emitidos por um radar, o qual
envia em resposta sinais que podem conter informações codificadas,
como a identificação e altitude. São essenciais para o controle efetivo do
tráfego aéreo, além de possibilitar a distinção de uma aeronave inimiga
de uma aliada em seu emprego militar.
Very High Frequency Omnidirectional Range (VOR) – é um tipo
de navegação de rádio, o qual permite as aeronaves determinar sua po-
sição e permanecer no curso. Recebe sinais de rádio transmitidos por
uma rede fixa radiobalizas. O equipamento VOR é utilizado como baliza-
mento de aerovias, ou seja, na navegação em rota, e também nas apro-
ximações. Normalmente, em virtude da alta frequência, não acompanha
a curvatura da superfície terrestre. O alcance para a recepção do sinal
de um VOR dependerá da altitude que a aeronave se encontra, isto é,
quanto mais alto melhor.
VNE – Velocidade nunca a exceder.
Isso posto, vamos aos nossos relatórios periódicos.
Nosso primeiro relatório, datado de 13 de janeiro de 1989, re-
feria-se às atividades de fiscalização e recebimento no período de 22 de
454 Aviação no Exército - uma visão histórica

novembro a 22 de dezembro de 1988. Estávamos em atividade havia


pouco mais de um mês, já sobrecarregados pelas inúmeras dificuldades
que batiam às portas da comissão.
No período, nos dedicamos ao acompanhamento da produção,
nas linhas de montagem, das aeronaves HB 350 LI, Esquilo, e do AS 365K
Panther, o que nos permitiu desenvolver a nossa capacitação, visando ao
desempenho de nossas funções. Precisávamos no mais curto prazo estar
prontos para bem cumprir a nossa missão.
Constatamos junto à linha de montagem que os servos-coman-
dos previstos para dotarem as aeronaves Esquilo seriam de fornece-
dores distintos. Considerando a repercussão negativa dessa atitude às
atividades de suprimento e manutenção e que tal medida contrariava
disposições contratuais, transmitimos à Aerospatiale nossa discordân-
cia, informando que as aeronaves somente seriam recebidas se os inven-
tários comportassem itens idênticos.

O Esquilo 01 em voo de recebimento

Sensível aos argumentos apresentados, a empresa concordou


com nossa posição e propôs que todos os servos-comandos fossem da
marca SAMM, após estudos e depois de comprovarmos que a proposta
se mostrava vantajosa por apresentarem os servos SAMM rendimento
superior aos da Dunlop, anteriormente previstos para dotarem as ae-
ronaves. Submetemos nosso parecer à DMAvEx, que concordou com a
solução apresentada. Como os novos equipamentos colaborariam para
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 455

a melhoria da qualidade das aeronaves, a modificação não implicaria


ônus para o Exército Brasileiro, pois os servos SAMM já eram manuteni-
dos no Brasil, o que não ocorria com os da Dunlop. Logo, foi autorizada
a substituição.
Nessa fase, as atividades de fiscalização do Esquilo 01 se res-
tringiram ao acompanhamento dos ensaios no solo, considerando que
ela se desenvolvia ainda sob a responsabilidade da Aerospatiale. A pre-
visão era que, após a conclusão dos testes no solo, a partir de 1º de ja-
neiro de 1989, se iniciassem os ensaios em voo. A entrega para inspeção
e testes pelo SIAR era prevista para o período de 15 a 20 de janeiro. Só a
partir daí, ocorreria a entrega à comissão.
Por ocasião da chegada desta a Marignane, a quase totalida-
de dos itens que compunham os kits das aeronaves Esquilo 02 e 03
já se encontrava embalado para transporte, tendo em vista o prazo
necessário para a as providências aduaneiras na França e diante da
previsão do embarque do material com destino a Paris, via rodovi-
ária, a partir de 15 de dezembro de 1988. Dessa forma, não teve a
comissão a oportunidade de exercer uma fiscalização mais acurada.
Considere-se que, de acordo com o previsto no contrato, cabia à co-
missão somente a missão de atestar que o material havia sido efeti-
vamente embarcado. Ela acompanhou na data prevista o embarque
e constatou, a despeito das dificuldades relatadas, a falta de alguns
itens, tais como as portas corrediças, as cablagens, que deixaram
de seguir em face da indefinição do armamento a ser montado so-
bre a aeronave, e os servos SAMM, em função da recente decisão
de adotá-los. Algumas discrepâncias menores foram abordadas em
documento específico.
Recebemos igualmente dois lotes de suprimentos que envol-
viam ferramental e outros itens. Por ocasião da chegada da comissão
à Aerospatiale, como ocorreu com os kits, esses lotes já se encon-
travam embalados e em condições de embarque imediato. Tendo em
vista que a abertura de todas as embalagens para conferência, como
seria normal acontecer, pudesse acarretar um atraso no transporte,
previsto para ser realizado por aeronave da FAB já com data marca-
da, optamos pela verificação por amostragem quando constatamos a
falta de alguns itens e outros com Part Numbers em desacordo com
o previsto em contrato. A comissão obteve o compromisso escrito da
456 Aviação no Exército - uma visão histórica

Aerospatiale da complementação dos lotes e do envio das justificativas


para a alteração dos PN. O Part Number é um código alfanumérico de
referência dado pelo fabricante a determinado item para a sua iden-
tificação.
Optei por renovar a definição de uns termos e da função de al-
guns instrumentos no bojo de minha narrativa para evitar de jogar o
leitor a todo momento para consulta ao glossário, obrigando-o a inter-
romper a leitura, fato que para mim, como leitor, me é extremamente
desagradável. Além disso, não estou contando essa história exclusiva-
mente para especialistas em Aviação.
A despeito de as atividades de recebimento dos primeiros lotes
não haverem sido realizados de acordo com as condições previstas, os
problemas ocorridos, ainda que indesejáveis a qualquer título, permi-
tiram a absorção já naquele momento de valiosa experiência. Daí para
frente, os lotes quando apresentaram alterações foram recusados até a
sua respectiva regularização.
Foi ainda recebido um lote referente à documentação técnica e
outro relativo a curso para o pessoal da Aviação do Exército. Em relação
ao primeiro, a Aerospatiale fez a proposta de substituição do “manual de
voo” e do “memento do piloto”. A comissão enviou um parecer à DMAvEx
e veiculou as vantagens, considerando que a modificação, se adotada,
proporcionaria créditos ao EB da ordem de onze mil dólares. No que
concerne aos lotes de treinamento de pessoal, solicitamos algumas alte-
rações nos currículos e na carga horária, as quais geraram outros crédi-
tos a nosso favor.
Tendo em vista possibilitar aos integrantes da comissão conhe-
cimento das atividades da usina, de seus departamentos, das peculiari-
dades referentes ao desenvolvimento do nosso contrato, da solução das
discrepâncias encontradas nas diversas áreas de interesse, entre outros
aspectos, foram realizadas as primeiras de muitas reuniões de trabalho
com representantes da fábrica.
Em relação ao AS 365K Panther, nos familiarizamos com o desen-
volvimento do programa e com as expectativas de colocação das aeronaves
à disposição da comissão. Na época, se encontravam em linha de produção
as três primeiras aeronaves. Preocupava-nos sobremaneira a falta de de-
cisão quanto ao plano de pintura da aeronave AS 365K Panther, que seria,
conforme autorização concedida pelo EB, apresentada no Salão de Bourget.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 457

Na conclusão do nosso primeiro relatório, informávamos à


DMAvEx que, apesar do pouco tempo para preparação e instalação, das
dificuldades inerentes à adaptação local, dos inúmeros problemas admi-
nistrativos e de vida pessoal e das dificuldades de comunicação, a comis-
são se desincumbia a contento de todas as atividades a ela cometidas.
O segundo relatório de 1989, referente ao período de 22 de de-
zembro de 1988 a 3 de fevereiro de 1989, já apresentava um aumento sig-
nificativo das nossas atividades. Como éramos os representantes do EB sur
place, no local, o Departamento de Cooperação e Licença solicitou a inter-
venção da comissão para a normalização do fluxo de pagamento dos lotes
2, 3 (kits Esquilo), 53, 54, 55 e 56 (ferramental e treinamento de pessoal)
já recebidos provisoriamente, cuja segunda parcela do sinal se encontrava
em atraso. Realizamos gestões no DMB e na DMAvEx para a solução do pro-
blema e constatamos que decorria de entraves de caráter administrativo.
Estes foram resolvidos em seguida resolvidos. Na época, fomos consultados
sobre a possibilidade de que, a exemplo do ocorrido com as comissões da
Marinha e Força Aérea, que em épocas anteriores funcionaram em Marig-
nane, os “aceites” das faturas fossem realizados pela comissão, consideran-
do a previsão de nossa permanência contínua na usina durante o período
de 26 meses. Somos de parecer que o procedimento proposto era factível,
perfeitamente absorvível como encargo e que sua implantação favoreceria
ao desenvolvimento do contrato; no entanto, a decisão dependeria exclusi-
vamente do DMB. Optou-se pela permanência do aceite pelo DMB.
Recebemos e acompanhamos o embarque de lotes diversos já
de acordo com as normas estabelecidas pela comissão. Na fiscalização,
os itens eram individualmente reagidos em relação aos respectivos ma-
nuais, ao estabelecido nas cláusulas contratuais, verificadas as quanti-
dades e qualidade de cada item. A comissão elaborou normas particula-
res sobre o assunto, que eram rigidamente seguidas.
O funcionamento do Depósito Especial Alfandegado era obje-
to de grande preocupação para as partes. A comissão realizou reuniões
para que o início do funcionamento daquela sensível instalação ocorres-
se no mais curto prazo possível. O material destinado ao Depósito Es-
pecial Alfandegado, segundo a Aerospatiale, encontrava-se pronto para
embarque desde novembro de 1988 e aguardava somente a conclusão
das providências necessárias à operacionalização das instalações no 1º
BAvEx (conclusão das obras civis e legalização na Receita Federal).
458 Aviação no Exército - uma visão histórica

Solicitamos a mudança da etiquetagem dos itens de suprimen-


to, os quais se encontravam em desacordo com o previsto em contrato.
A modificação, realizada posteriormente, exigiu a adaptação de progra-
mas em uso na empresa.

O Panther 01, no Salão de Bourget

Em razão de nossa responsabilidade na fiscalização dos cursos


de treinamento do pessoal da Aviação do Exército, realizamos adapta-
ções de currículos e cargas horárias. Tendo tomado conhecimento da
existência de curso de qualificação de pilotos de ensaios em voo, infor-
mamos à DMAvEx sobre as condições de funcionamento. Na oportuni-
dade, aduzíamos que esforços para a matrícula de pilotos da Aviação do
Exército se constituiriam em grande impulso no campo de capacitação
do pessoal. Sugerimos a modificação no programa de qualificação de pi-
lotos, bem como ratificamos a necessidade de que aqueles a serem indi-
cados para os cursos de piloto instrutor e comandante de bordo possu-
íssem no mínimo de 400 horas de voo em helicóptero.
Iniciávamos o recebimento provisório HB 350 LI, Esquilo 01.
Era a primeira aeronave a ser recebida. Já tínhamos providenciado a
qualificação do nosso piloto, o tenente-coronel de Aviador Albernaz,
que, a despeito de mais de três mil horas de voo em helicóptero, ain-
da não era habilitado no Esquilo. Pode parecer estranho que estejamos
mais uma vez falando sobre o recebimento do Esquilo 01. Lembro, no
entanto, que estamos fazendo uma síntese dos relatórios periódicos, o
que nos leva a repisar o assunto, dessa vez com um enfoque diferente,
mais técnico, sem dar margens à emoção, como fizemos antes.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 459

Minha intenção original era a de reproduzir na íntegra o texto


do relatório referente ao recebimento do Esquilo 01 para dar uma noção
mais detalhada de como ele se desenvolveu. Além disso, sua transcri-
ção serviria para preservá-lo do “sumiço”, como ocorrido com a grande
maioria dos documentos que produzimos. O relatório refere-se somente
à 1ª fase do recebimento, que durou até 3 de fevereiro. A partir daquela
data, o helicóptero voltou à fábrica para a introdução das correções e re-
tornaria à comissão em março para nova campanha de voos. Entretanto,
mais uma vez, o caráter técnico do documento me leva a transformá-lo
em Anexo de nº 4, que os senhores poderão compulsar ao folhearem o
final deste livro.
No período, iniciamos as nossas visitas aos fornecedores de
material de interesse militar para a Aviação do Exército. Em 16 de janei-
ro de 1989, estivemos na Kleber Industrie, empresa fabricante de ma-
teriais de borracha para emprego no transporte e estocagem de líqui-
dos diversos (água, combustíveis, óleos e lubrificantes). O material era
de interesse significativo para o Exército e, em particular, para a nossa
Aviação, pela flexibilidade e presteza que poderia conceder aos sistemas
de suprimento de líquidos de qualquer natureza. O sistema já era utili-
zado pela ALAT. A empresa se colocou à disposição para a realização de
demonstração no Brasil. Os equipamentos foram mais tarde adquiridos
pela Aviação do Exército. Estivemos ainda no terminal de carga da Air
France, em Paris. A empresa era a responsável pelo transporte do mate-
rial objeto do contrato.
O Relatório nº 03/89, que encaminhava diversos ofícios com
maior detalhamento das atividades da comissão, se referia ao período
de 4 de fevereiro a 10 de março de 1989. Além da continuação do rece-
bimento dos diversos lotes, nossa principal atividade continuava sendo
a recepção do Esquilo 01, que sofrera retardo em função das discrepân-
cias identificadas. Nesse relatório, foram anexados dois outros a respei-
to dos voos de aceitação e do atendimento da aeronave aos ROB.
Até o momento da elaboração do relatório, já tínhamos gerado
alguns créditos em função da alteração e ajustes do programa de qualifi-
cação do pessoal e reiterávamos na Aerospatiale as solicitações concer-
nentes à emissão da documentação correspondente.
Continuamos a recepção dos kits de montagem dos HB 350
L1, Esquilo, que vinham apresentando a falta de alguns componentes.
460 Aviação no Exército - uma visão histórica

A despeito de tratar-se de um problema que tinha relação exclusivamen-


te com os consorciados, nosso intuito era evitar atrasos na finalização
dos nossos helicópteros de responsabilidade da Helibras em suas insta-
lações no Brasil. O Batalhão de Aviação estava ávido para receber suas
aeronaves, que eram aguardadas com impaciência, em particular, pelos
pilotos. Fizemos reiteradas solicitações na empresa para que os kits fos-
sem embarcados completos. Segundo a Aerospatiale, as faltas não im-
plicavam transtorno ou atraso no processo de montagem final das ae-
ronaves na Helibras. Não tínhamos respaldo contratual para intervir. As
faturas correspondentes aos kits eram pagas dez dias após o embarque,
independentemente do nosso aceite. Nem por isso, íamos cruzar os nos-
sos braços. Sugerimos a introdução de aditivo ao contrato regulando a
emissão do aceite somente quando o kit estivesse completo.
O recebimento provisório do Esquilo 01 foi detalhado em oito
ofícios, os quais foram remetidos à DMAvEx. Infelizmente, não consegui
recuperá-los. O embarque da aeronave para a Helibras sofreu um atraso
de aproximadamente um mês em face das discrepâncias identificadas.
O processo de recebimento, além do trabalho contínuo e diuturno, en-
volveu repetidas verificações da aeronave no solo e em voo. O atendi-
mento às diversas observações feitas pela comissão, com a adoção de
correções, como a utilizada para o sistema de iluminação do painel de
bordo, com custos significativos para a empresa, já demonstrava a nossa
seriedade e determinação para bem cumprir nossa missão.
Diante da necessidade de colocar à disposição da DMAvEx na
fase de implantação o maior número possível de informações a respeito
de material aeronáutico, prosseguimos no nosso ciclo de visitas fazendo
contato com diversas empresas do ramo aeronáutico, entre elas a Tran-
saco, fabricante de equipamento de análise de óleo; a Euromissile, que
comercializava os mísseis Hot 2; a France Aviation, fabricante de equi-
pamento de navegação, e a Semia, fabricante de equipamento de análise
vibratória. Todas as visitas geraram documentos detalhados, os quais
foram enviados à nossa diretoria.
Participamos de reunião com o representante da Aerospatiale,
responsável pelo Salão de Bourget, para definir detalhes da apresenta-
ção do AS 365K Panther Av Ex naquele local. A empresa estava ansiosa
para mostrar ao mundo a primeira versão para emprego militar do Dau-
phin; logo, o salão seria o palco ideal para isso.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 461

A preocupação, justificada, com o início do funcionamento do


Depósito Especial Alfandegado permanecia. Aproximava-se a data de en-
trega do Esquilo 01, e a instalação ainda não se encontrava em condição
operacional. Em razão de preocupações veiculadas pelo coronel Telles a
respeito da disponibilidade de apoio ao Av Ex 01 e às demais aeronaves
que se seguiriam, por meio daquela modalidade de suprimento, realizei
diversos contatos com o departamento de pós-venda da fábrica. Transmi-
timos a apreensão quanto à data de efetivo funcionamento daquela ins-
talação. Segundo o Sr. Calvet, o funcionamento dependia da conclusão do
sistema contra incêndio. Ressaltei que seria inadmissível qualquer aero-
nave entrar em indisponibilidade por falta de suprimento oriundo do De-
pósito Especial Alfandegado. O Sr. Boulnois, vice-presidente da Helibras, e
o Sr. Dominoni, representante do Departamento de Cooperação e Licença,
garantiram que tal fato não ocorreria, e, em caso de necessidade, o apoio
à aeronave seria fornecido diretamente pela Helibras.
Tenho mantido a referência sobre o nome das pessoas com
quem tratamos dos diversos assuntos ao longo do nosso trabalho em
Marignane por dois aspectos. Em primeiro lugar, porque com muitos
deles mantivemos uma relação de respeito profissional e até de amiza-
de surgida dos seguidos embates que tivemos na defesa de nossos in-
teresses, os quais eram os das organizações que representávamos. Em
segundo lugar, no caso de me darem o prazer de folhear estas páginas,
acredito que eles ficarão satisfeitos, assim o espero, de terem os seus
nomes lembrados.
O Anexo A ao Relatório 03/89 tratava do programa de recebi-
mento dos helicópteros, em particular do Av Ex 01. Relatava os proble-
mas detectados e as providências solicitadas.
Em razão da configuração rádio e de navegação definida pela
Aviação do Exército, a fábrica precisou introduzir modificações na aero-
nave, particularmente em razão da instalação de novas antenas. A proxi-
midade entre elas acarretava algumas interferências.
A realização do primeiro voo noturno permitiu a identificação
da má qualidade da iluminação do painel de bordo, a qual dificultava
a leitura dos instrumentos. A solução adotada, com a colocação de um
refletor na parte superior do teto, foi julgada inapropriada. Os equipa-
mentos rádio funcionaram normalmente. Em razão dos problemas assi-
nalados, foram empreendidos outros voos noturnos com a presença do
462 Aviação no Exército - uma visão histórica

piloto-chefe dos ensaios em voo da Aerospatiale e do engenheiro de voo


responsável pelo projeto de iluminação. A efetiva constatação do pro-
blema levou a empresa à realização de estudos que visavam à melhoria
da iluminação do painel de bordo.
Após várias reuniões com representantes da empresa, con-
cluiu-se que a melhor opção seria manter a aeronave em Marignane até
que os problemas fossem solucionados e reiniciar-se, então, um novo ci-
clo de recebimento pela comissão. Essa decisão foi crítica, uma vez que,
depois de expedida, a aeronave ainda sofreria na Helibras alguns traba-
lhos de personalização e só então seria objeto de recebimento definiti-
vo. A solenidade de incorporação do helicóptero ao 1º BAvEx já estava
definida, com a previsão da presença de inúmeras autoridades, inclusive
do ministro do Exército.
O helicóptero foi apresentado novamente à comissão em 8 de
março de 1989, reiniciando-se todos os voos. Os instrumentos que se
encontravam em falta foram instalados no aparelho, bem como solucio-
nados os problemas anteriormente apontados, inclusive a correção de
vibração. Foram feitos novos testes com os equipamentos rádio.
Um novo voo noturno permitiu a verificação das modificações
introduzidas na iluminação interna, entre elas a nova pintura do painel
de instrumentos, com a adoção de tinta preta antirreflexo, a melhoria da
iluminação interna dos instrumentos da parte inferior do painel e a in-
trodução de novos comandos, possibilitando desligar o projetor do teto
ou mesmo mantê-lo ligado no caso de falha do sistema principal. Solici-
tamos ainda a modificação da pintura interna de toda a cabine para a cor
preta, o que facilitaria a utilização de óculos de visão noturna.
Ao concluirmos o recebimento, podíamos afirmar que houve
uma sensível melhora na qualidade da aeronave. O layout dos instru-
mentos, equipamentos rádio e opcionais foi considerado bom, permi-
tindo fácil acesso e leitura. Alguns equipamentos rádio tiveram que ser
colocados em um console complementar, um pouco atrás dos assentos
dos pilotos, dificultando de certa forma sua leitura, mas, mesmo assim,
o acesso foi julgado razoável. Segundo o nosso piloto, o helicóptero, após
a introdução das modificações, passou a ser uma aeronave que dava
prazer de voar, se bem que mais no período diurno do que durante a
noite. Algumas modificações no sistema de iluminação ainda se faziam
necessárias, e continuaríamos trabalhando nesse sentido. A conclusão
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 463

do recebimento provisório do Esquilo 01 encerrava uma das fases mais


significativas da nossa missão. Entretanto, havia muito mais a fazer.
A fim de se assegurar da correção do processo de avaliação das
aeronaves durante a licitação, a DMAvEx determinou à comissão que por
ocasião do recebimento do Esquilo 01 reagíssemos a aeronave em rela-
ção a todos os ROB definidos para o helicóptero. Pareceu-me importante
divulgar o documento na íntegra para mostrar o trabalho realizado pela
comissão, para dar ao nosso público leitor uma visão mais clara de como
se processa a “avaliação prática” do material em relação aos seus ROB
e para demonstrar que a avaliação “teórica”, feita durante o processo li-
citatório, ressalvada a peculiaridade do processo, foi realizada de modo
correto. O documento foi anexado ao relatório em tela, e o leitor poderá
consultá-lo ao final do livro, no Anexo 2.
O recebimento provisório era por nós encarado como a grande
oportunidade que tínhamos para constatar na prática se as aeronaves
efetivamente atendiam às características constantes nos ROB. Durante
o processo de aquisição das aeronaves, fizemos a avaliação teórica, com
base nos dados que as empresas nos forneceram. Agora era “à vera”.
O trabalho esteve sob a responsabilidade do nosso piloto, o tenente-
coronel Albernaz. A apresentação do documento na íntegra é também
uma homenagem ao elogiável trabalho desenvolvido pelo Albernaz.
Acima de tudo, pairava a nossa ansiedade de poder comprovar o acerto
de nossa escolha.
Falar do nosso trabalho me enche de muita satisfação. Como
já frisei, era a primeira vez que o Exército designava uma missão para
recebimento de material aeronáutico. Não tivemos qualquer preparação
anterior, e mesmo o tenente-coronel Albernaz, piloto experiente, jamais
havia participado desse tipo de missão. Não tínhamos o “cabral” (expe-
riência legada por antecessores) nem a quem perguntar. Nosso sucesso
foi fruto de muito estudo, muita “pestana queimada” e entrega total às
nossas atividades.
Neste momento, um fato me vem à memória. Tenho a impres-
são de que o fato ocorreu nesse período. Foi a nossa primeira reunião
de trabalho com o chefe dos programas, o Sr. Dubreuil, que não fazia
da simpatia uma característica de sua personalidade. Era o que deixava
transparecer em nossos contatos iniciais. Não me recordo quem tomou
a iniciativa de convocá-la. Provavelmente, pelo seu desfecho, que passo
464 Aviação no Exército - uma visão histórica

a relatar, foi uma iniciativa da Aerospatiale. Naquela oportunidade, ain-


da no início da nossa missão, as coisas não ocorriam como o desejado.
Estávamos tendo problemas com o andamento do contrato. Quando foi
acertada a ocasião em que ocorreria a reunião, acreditei que teria so-
mente a presença do Sr. Dubreuil e algum auxiliar direto, um tetê-à-tête,
com o objetivo de estabelecer um mis à point e colocar as coisas nos
trilhos. Compareci à reunião acompanhado do major Sardo e do nosso
intérprete, pois naquela ocasião meu francês ainda não me permitia me
expressar com a clareza que o evento exigia e entender o que era dito
com a maior exatidão. Aliás, o meu entendimento já era assez bon (bas-
tante bom), mas eu me fazia de “morto”. O importante era compreender
cada detalhe do que seria dito pelos franceses e tornar mais cristalina
possível a nossa posição. Não me lembro da agenda estabelecida.
O encontro não foi nas instalações da comissão. Seria em campo
“inimigo”. Quando chegamos ao local, tivemos a nossa primeira surpre-
sa. Fomos conduzidos a uma grande sala de reunião. De um dos lados da
grande mesa, estavam o Sr. Dubreuil e uma equipe de uns seis a oito au-
xiliares, entre chefes de programa, engenheiros e outros profissionais.
Não me vem à memória os nomes dos nossos interlocutores. Do outro
lado, estávamos eu, o major Sardo e o nosso intérprete. Não gostei do
ambiente nem do tipo de reunião que se pressagiava. Fiquei apreensivo
com aquela “demonstração de força”, mas de modo algum intimidado.
No entanto, até o momento do início da reunião, nada indicava que ela
iria ficar quente em pouco tempo.
Não me recordo a partir de que momento o encontro começou
a tomar rumo indesejado. O Sr. Dubreuil, como já ressaltei, não era pes-
soa das mais simpáticas ou talvez estivesse até aquele momento mal
informado a respeito do nosso preparo e motivação. Fico muito chate-
ado de não recordar e poder contar maiores detalhes do ocorrido. Mi-
nha memória se recusa a responder aos meus apelos. O que me lembro
com clareza é que em determinado momento, sem maiores explicações,
abandonei a reunião com os meus acompanhantes em resposta ao tom
adotado. Eles compreenderam o nosso gesto e devem ter lamentado o
desconforto que nos causaram. A partir daí, as relações se processaram
dentro de um novo clima, de respeito e compreensão.
Por ocasião do quarto relatório, no período de 20 de março a 15
de maio de 1989, já tínhamos concluído o recebimento do Av Ex 01, Esquilo.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 465

Prosseguíamos no recebimento dos kits do Esquilo, continuando a pres-


sionar a Aerospatiale para que eles fossem embarcados completos. Na
oportunidade, já conseguíamos atestar o embarque com até 95% das
operações.
Iniciávamos as nossas atividades visando ao recebimento dos
Panther em um total de 36 unidades. Era grande a nossa expectativa. Em
virtude da apresentação do Panther 01 no Salão de Bourget, trabalhávamos
na definição do plano de pintura interna. Com a participação dos Sr. Breton
e Sr. Dominoni, realizamos uma reunião para detalhar o assunto, sendo
definida a cor preta para o painel de bordo. Segundo o Sr. Breton, por serem
fornecidas exclusivamente em cinza, alguns itens teriam que permanecer
naquela cor. Tendo em vista a harmonização interna e a compatibilização
com a futura adoção de equipamentos de visão noturna, solicitamos que
os assentos-comando fossem entregues na cor bleu nuit (azul-noite). O
Sr. Dominoni alegou dificuldade para a mudança da cor, pois a fábrica já
havia empenhado recursos na aquisição do tecido originalmente definido.
Lembramos a necessidade de busca de solução consentânea ao nosso
interesse. Uma semana depois nos foi apresentado o plano interno de
pintura da aeronave em concordância com nossas solicitações, sendo este
submetido à aprovação da DMAvEx. As providências para a substituição do
tecido dos assentos-comando já haviam sido tomadas.
A primeira visita de inspeção do diretor de Aviação do Exército,
general Luiz Oscar Bulcão de Lima, que ocorreria no período de 26 a 28 de
abril, exigiu algumas reuniões com nossos correspondentes na empresa para
fixação de um programa que incluiria a inspeção da comissão, a visita às ins-
talações da fábrica e a solenidade de entrega da Medalha do Pacificador a in-
tegrantes da comissão, além do encontro com delegação do exército francês
e atividades de cunho social. Havia muito trabalho de coordenação a ser feito.
Continuando o nosso ciclo de contatos com as empresas
de equipamentos aeronáuticos, recebemos representantes da Nyco,
fornecedora de óleos, fluidos e lubrificantes para Aviação, e da Superflexit,
produtora de artefatos de borracha destinados à armazenagem, transporte
e abastecimento de líquidos em geral.
Na ocasião, em razão da nossa presença na linha de produção
dos AS 365K Panthers, já apresentávamos a primeira solicitação de alte-
ração no painel de bordo, a qual envolvia a inversão de posicionamento
do VLF “OMEGA” (equipamento de navegação) e do VOR Master.
466 Aviação no Exército - uma visão histórica

Atendendo ao pedido do chefe do Departamento de Coope-


ração e Licença, Sr. Tironneau, desloquei-me ao Brasil, acompanhado
do tenente-coronel Aviador Albernaz, no período de 8 a 23 de abril de
1989, para acompanhar a recepção do Av Ex 01, Esquilo, pelo 1º BAvEx.
O deslocamento, devidamente autorizado pelo general diretor de Ma-
terial de Aviação do Exército, teve como escopo proporcionar aos com-
ponentes da COMFIREM/Helibras os esclarecimentos que se fizessem
necessários para o bom andamento do processo de recepção definitiva
da aeronave. Na oportunidade, tomando conhecimento das observações
realizadas pela COMFIREM/Helibras sobre o posicionamento do HSI à
proteção para o rádio Arc 182 e à situação do console dos rádios, no
retorno a Marignane desencadeamos as providências, visando à solução
dos problemas relatados. Estes já haviam sido por nós detectados; no
entanto, alguns dependiam de maior prazo para correção, e a melhoria
do posicionamento do console rádio era difícil de resolver pela falta de
espaço interno.
Prosseguíamos na recepção dos lotes de suprimento, ferramen-
tal, meios auxiliares de instrução, documentação técnica e de qualificação
do pessoal em um total de 29 lotes. A observação de algumas rachaduras
nas células dos Esquilos durante o transporte para a Helibras nos levou
a solicitar providências da empresa para modificar o sistema de embala-
gem da aeronave. A adoção de modificações na documentação técnica, na
responsabilidade de transporte de alguns lotes e nos ajustes nos cursos
de qualificação do pessoal nos propiciaram novos créditos no período.
Por não estar claramente definida a participação da comissão
na realização dos cursos para o pessoal da Aviação do Exército, solici-
tamos à DMAvEx que incluísse em nossas normas de atuação o apoio
a eles por sermos os únicos representantes do contratante na empresa
e pela necessidade de proporcionar aos instruendos as melhores con-
dições, em razão das dificuldades que provavelmente encontrariam ao
chegar a país estranho, de língua desconhecida. Dessa forma, nos pare-
cia importante a nossa interveniência. Estávamos preparados para pro-
porcionar o auxílio necessário aos militares matriculados, seja no acom-
panhamento da parte didática, seja no atendimento às necessidades de
caráter administrativo. Aspectos peculiares de alguns cursos, que inclu-
íam o deslocamento no interior da França e outras providências que os
instruendos, por força de desconhecimento da língua, do país e da falta
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 467

da disponibilidade de tempo, não poderiam realizar, indicavam a nossa


atuação em prol dos nossos gerentes, pilotos e mecânicos. Já tínhamos
um rol considerável de atividades a empreender e um efetivo pequeno,
mas também o prazer de bem servir.
Estávamos ainda às voltas com o problema do Depósito Es-
pecial Alfandegado. A Aerospatiale nos solicitou que contatássemos a
DMAvEx a fim de definir as responsabilidades relativas à nacionalização
dos produtos adquiridos por aquele depósito e sobre a manutenção do
sistema de refrigeração das instalações que funcionariam no 1º BAvEx.
Segundo a Aerospatiale, pelo contrato, as atividades em pauta eram de
responsabilidade do contratante e, por essa razão, não consideraram
esse custo na formação do preço dos itens que seriam fornecidos por
aquela modalidade de apoio. Alegavam que as taxas de sobrepreço co-
bradas ao Exército estavam muito abaixo das que normalmente prati-
cavam. Segundo ainda as mesmas fontes da Aerospatiale, nos contratos
com a Marinha e com a Aeronáutica, as responsabilidades e os custos
relativos à nacionalização e à manutenção do sistema de refrigeração
haviam sido absorvidos por aquelas Forcas Singulares. Esse não era
um assunto de nossa responsabilidade, mas já estávamos mergulhados
nele. Mais um “pepino” para ser descascado. Levantamos a bola para a
DMAvEx, pois cabia a ela a decisão.
Por solicitação desse órgão, foi realizado pela comissão, com
origem de Paris, o transporte de material adquirido da Aerospatiale,
destinado ao controle do estoque do Depósito Especial Alfandegado, em
Taubaté. O transporte foi efetuado por aeronave C-l30 da FAB e envolveu
um total de 650kg de material. Estivemos presentes no embarque.
Já frisamos a importância da documentação técnica. A correta
operação e manutenção dos meios aéreos está diretamente ligada ao seu
eficiente e eficaz manuseio. Em face das peculiaridades de funcionamento
da comissão, a intensa atividade burocrática, a existência de somente um
mecânico, absorvido na datilografia e em outras atividades específicas,
o trabalho de exame da documentação não poderia ser realizado com
a intensidade que o assunto requeria. Aduza-se que essa tarefa de
análise deveria ser desenvolvida pela DMAvEx, a quem efetivamente
pertencia a responsabilidade de sua gerência. Em função da quantidade
crescente das discrepâncias que encontramos, graças ao trabalho que
se realizava mesmo fora das horas de expediente, adotamos a decisão
468 Aviação no Exército - uma visão histórica

de, com prejuízo da produção e da remessa de documentos, reservar ao


sargento Borck uma parte do dia para a análise detalhada dos manuais.
Como primeiro resultado dessa medida, identificamos problemas de
despersonalização e de desatualização em relação às evoluções, que
eram sérios. Demonstramos à nossa diretoria que os manuais exigiam
um trabalho integrado de verificação com a participação da DMAvEx e
do 1° BAvEx e que a solução das discrepâncias deveria ocorrer por meio
da COMFIREMEX, considerando que a documentação das aeronaves era
elaborada na Aerospatiale, em Marignane.
O Relatório nº 05/89 ocupou-se do período de 16 de maio a 5
de julho de 1989. Recebemos a Sra. Monique Brunet e o Sr. Alain de Car-
mejane, representantes locais da Varig, que manifestaram o interesse de
participar do transporte das aeronaves objeto do contrato, assunto já
referido em documentos anteriores enviados à DMAvEx. Concorde com
a orientação da nossa diretoria, hipotecamos o nosso apoio, desde que
a Varig apresentasse dados concretos referentes à sua capacitação para
assumir os encargos correspondentes, sem a ocorrência de quaisquer
entraves ao pleno desenvolvimento do programa de entrega de todo o
material. Continuamos a contatar representantes de equipamentos de
interesse para a Aviação do Exército.
Por sermos também um representante do governo brasileiro
na região, sempre que possível fazíamos um trabalho de divulgação do
nosso país. Nesse contexto, recebemos o presidente do Comitê Franco
-Brasileiro da região de Provence Côte D’Azur, Sr. Cristian Botto. O refe-
rido comitê se ocupava do estreitamento de relações comerciais e so-
cioculturais com o Brasil. Faremos uma referência sobre o assunto no
decorrer deste livro.
A despeito de termos encerrado o recebimento do Esquilo 01,
continuávamos trabalhando no aperfeiçoamento daquelas aeronaves,
em particular na melhoria do posicionamento do console de rádio. No
bureau de estudos da linha Esquilo, foram analisadas as possíveis modi-
ficações para minorar os incômodos acarretados. As mudanças analisa-
das consideraram as limitações impostas pela configuração da aerona-
ve. A comissão julgou apropriada uma das linhas de ação e encaminhou
à DMAvEx o projeto concernente.
De 12 a 16 de junho de 1989, estivemos no Salão Aeronáutico
de Bourget, onde o Panther 01 foi apresentado publicamente. Visitamos
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 469

ainda a Crouzet e a Turbomeca, essa última fabricante dos motores que


equipavam as nossas aeronaves, o que colaborou para ratificar a ótima
impressão sobre as empresas. Na Turbomeca, recebemos as listas de
itens necessários às revisões de 100 e 400 horas, que foram remetidas
à DMAvEx.
No período, foram recebidos cinco kits do Esquilo e um lote de
suprimentos não apoiados pelo Depósito Especial Alfandegado.
O início do processo de recepção dos AS 365K Panther passava
a orientar nossos esforços. Tal fato implicou o deslocamento do gradu-
ado mecânico para a linha de produção onde realizava o acompanha-
mento diário da montagem das aeronaves. O processo de conferência,
além de exigir a tarefa complexa e demorada de consulta aos manuais,
se apresentava extremamente difícil e trabalhoso em face da nossa inex-
periência no trato daquela aeronave. A permanência do graduado junto
à produção impediu que continuássemos enviando à DMAvEx o mesmo
fluxo de documentos que ocorria até a ocasião. O Panther 01 encontra-
va-se em 10 de agosto de 1989 em trabalho final de montagem.
O Relatório de nº 6 referiu-se ao período de 8 de agosto a 30 de
setembro de 1989. Dedicamos nessa etapa parte dos nossos esforços na
coordenação do desenvolvimento do programa de treinamento do pes-
soal da Aviação do Exército. Fizemos diversas reuniões com o chefe do
Centro de Instrução e seus assessores para melhor adequar currículos,
cargas horárias, criação de novas vagas e supressão de outras. Solicita-
mos à direção do centro que incluísse no currículo de todos os cursos
noções sobre a filosofia de elaboração e consulta da documentação téc-
nica produzida pela Aerospatiale, considerando que o desconhecimento
desses pontos poderia se constituir em fator complicador no manuseio
da referida documentação. Na ocasião, foram debatidos diversos assun-
tos de interesse.
O Sr. Dubreuil, chefe dos programas, manifestou a preocupa-
ção sobre o atraso na aprovação da segunda parte do sinal, prevista no
contrato financeiro. Esse assunto foi ventilado em um depoimento do
coronel Valentim em capítulo precedente. Referiu-se à possibilidade de
atraso no embarque dos kits de helicópteros, caso a situação persistisse.
Ficou acertado na ocasião que o fato não seria motivo para retardo no
treinamento do nosso pessoal. Esse não era um assunto dentro da esfera
de atribuições da comissão, mas como estávamos lá éramos envolvidos
470 Aviação no Exército - uma visão histórica

em muitas ocasiões nessas situações e desempenhávamos as funções do


“bom meio de campo”, transmitindo as apreensões à DMAvEx, a quem
cabia traçar as diretrizes para tratar dessas questões.
Na área de treinamento do pessoal, nos debatíamos com a falta
de recebimento em tempo útil da relação dos estagiários a serem matri-
culados, bem como de informações relativas a número de passaporte,
data e local de nascimento, data de expedição e validade do passaporte,
fotografias, todas indispensáveis às formalidades que precedem a emis-
são de autorização para acesso às instalações da fábrica, o que ocasio-
nava transtornos e embaraços à Aerospatiale e à comissão. A segurança
era um assunto tratado com alta prioridade na fábrica, e o acesso era
objeto de severas medidas de controle. O acúmulo e a diversidade de
problemas de cunho administrativo apresentados pelos estagiários se
constituíam pesado encargo.
A documentação técnica mantinha-se como um dos maiores
problemas ainda carentes de solução. O conjunto de manuais dos Es-
quilos continuava a apresentar discrepâncias, e as soluções não surgiam
com a presteza que desejávamos. Manifestamos essa preocupação a
todos os escalões da empresa e solicitamos que providências urgentes
fossem tomadas. Já tínhamos passado aos responsáveis diversos pro-
blemas assinalados na documentação dos Panthers que havia sido co-
locada à nossa disposição. A falta de personalização da documentação
coerente com a configuração particular das nossas aeronaves exigia a
adequação dos nossos manuais, a qual não ocorreu com a agilidade que
se impunha. É fato que entre a celebração do contrato e a recepção das
primeiras aeronaves o período decorrido foi curto, o que não podia se
aceitar como justificativa para o vulto das incorreções encontradas.
Nessa ocasião, como era lógico, o 1º BAvEx, que já possuía um
número considerável de pilotos, gerentes e mecânicos com relativa ex-
periência, era a principal fonte originadora da identificação de proble-
mas na documentação. Nossa função era exercer pressão contínua para
a obtenção das soluções. Com o objetivo de tentar evitar com os
Panthers o mesmo vulto de incorreções ocorrido com a documenta-
ção dos Esquilos, solicitamos a apresentação à comissão, do lote 61
(Doc Tec Panther), com no mínimo 30 dias de antecedência em relação à
data prevista para embarque do material. Na oportunidade, informamos
à Aerospatiale que a expedição só ocorreria após a completa reparação
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 471

das incorreções encontradas. Enfrentamos com os meios auxiliares de


instrução a mesmo situação de falta de personalização que encontra-
mos na Doc Tec.
As reuniões de trabalho se sucediam, ora com os especialistas
da documentação técnica, ora para acompanhamento do desenvolvi-
mento dos cursos de oficiais e sargentos e do programa Panther.
Em 14 de setembro de 1989, acompanhamos, a convite, um
exercício da 4ª Divisão Aeromóvel (4eme Division Aeromobile), visando
à coleta de dados logísticos e operacionais de interesse da nossa Aviação.
A divisão foi criada em 1985 com 240 helicópteros de ataque e trans-
porte, para emprego em operações tanto no TO europeu como em outro
continente. Na oportunidade, pudemos acompanhar o reabastecimento
das aeronaves Gazelle em campanha. No exercício, tomamos conheci-
mento do emprego tático dos reservatórios de borracha, que permitem
disseminar reservas de combustível nas áreas operacionais, aumentando
o tempo de permanência em missão pelas aeronaves.

Exercício da 4eme DAM. Aeronaves Gazelle em abastecimento

Como consequência da nossa participação no exercício da 4ª Di-


visão Aeromóvel e de contatos realizados com fabricantes de materiais
voltados ao abastecimento e armazenamento de combustíveis de avia-
ção, remetemos farta documentação à DMAvEx. Os materiais das empre-
sas Aerazur e Pronal foram testados na Amazônia com êxito, levando à
aquisição das bombas de abastecimento e dos plots de armazenamento
472 Aviação no Exército - uma visão histórica

de combustível Pronal (200l, 1.500l e 5.000l). Atualmente, todas as OM


da Amazônia e do Pantanal possuem pessoal especializado no abasteci-
mento de helicópteros em campanha.

´
Teste de abastecimento em campanha. Nas duas fotos da esquerda, aparecem o
coronel Roberto, 1º subcomandante do 1º BAvEx, e o coronel Wanderley, na época,
na DMAvEx

Em 23 de setembro de 1989, atendendo ao convite do presiden-


te do Comitê France-Brésil, com a participação do coronel Masi, adido
Militar do Exército, visitamos a Escola de Aplicação da ALAT, situada em
Le Luc, destinada ao treinamento avançado de pilotos de helicóptero.
Recebemos quatro kits do AS 350 L1, Esquilo, um lote de supri-
mento NADAS Esquilo e um de documentação técnica, de ferramental e
de meios auxiliares de instrução, todos do Panther. O lote de ferramental
teve seu embarque sustado até que as discrepâncias identificadas fos-
sem sanadas.
Em 30 de setembro de 1989, a previsão era que as aeronaves
01, 02, 03 e 04 fossem entregues ao SIAR durante o mês de novembro,
e a apresentação do Panther 01 à comissão ocorresse em 15 de novem-
bro, com um atraso em relação ao previsto em contrato de 15 dias.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 473

Assim como ocorreu com o Esquilo, nosso piloto teve que se


qualificar no Dauphin, versão civil do Panther, antes de iniciar os voos
de recebimento. Solicitamos à Aerospatiale, em função da observação
das aeronaves em linha de produção e da opinião de pilotos da Avia-
ção do Exército que realizavam curso em Marignane, a retificação do
posicionamento da antena do Homing, situada em local considerado
operacionalmente incômodo. Segundo a empresa, o posicionamento da
antena atendia a imperativos técnicos, considerando que ela deveria ser
montada sobre superfície plana e em situação transversal ao eixo da ae-
ronave. Outros problemas identificados foram a dificuldade de acesso
à cabine dos pilotos, em razão altura do piso e da forma e tamanho das
portas, e a necessidade de melhoria do posicionamento dos instrumen-
tos montados sobre no console do AS 365K.
Concluímos o relatório informando que o cabedal de experiên-
cia reunido pela comissão em relação à atividade de recebimento de ma-
terial até aquele momento permitia, malgrado o reduzido efetivo, que a
missão cometida fosse cumprida com eficiência. As intervenções para
a correção de discrepâncias em cada lote se faziam de modo intenso,
constante e contínuo. O vulto dos problemas encontrados na documen-
tação técnica, nos meios auxiliares de instrução, no ferramental, nos es-
tágios de qualificação do pessoal, nos lotes de suprimentos e na própria
configuração das aeronaves justificava plenamente a existência de orga-
nismo do cliente próximo ao fabricante. O registro da totalidade das in-
tervenções da comissão, necessário a dar a estrita dimensão dos nossos
trabalhos, era prejudicado, considerando que as situações ocorriam em
velocidade maior que a capacidade de produzir documentação. As atas
das inúmeras reuniões, em diversas ocasiões, deixavam de ser produzi-
das em face da impossibilidade física do registro de todos os assuntos.
Pela primeira vez, incluíamos no relatório referência à quantidade
de documentos processados pela comissão. Após dez meses incompletos
do início oficial do funcionamento, ocorrido em 22 de dezembro de
1988, tínhamos expedido 207 ofícios e 236 faxes endereçados ao nosso
escalão superior. À Aerospatiale e a outras empresas foram enviados 139
ofícios e 191 faxes. Entre relatórios, atas de reuniões, boletins mensais e
outros documentos, emitiram-se 81 documentos. Entre ofícios e faxes, de
natureza militar ou civil, havíamos recebido 226 documentos, com todas
as suas implicações.
474 Aviação no Exército - uma visão histórica

Quando vi esses números no relatório original, fiquei impres-


sionado ao relembrar a quantidade de documentos que processamos.
Não consegui acreditar. No entanto, não podia duvidar, pois a cópia do
documento estava na minha frente. No início das nossas atividades, em
particular, informávamos à DMAvEx todo e qualquer evento que reper-
cutisse sobre o contrato. Talvez fosse excesso de zelo. Era o nosso desejo
de bem cumprir nossa missão. O último relatório de 1989 que encon-
tramos foi o de nº 6. Após ele, provavelmente em razão do aumento das
atividades, devemos ter elaborado mais dois; porém, não consegui recu-
perá-los.
O Relatório nº 01/90 correspondia ao período de 10 de janei-
ro a 30 de março. Era impraticável, como ocorrera no ano anterior, que
elaborássemos o documento com a frequência mensal como no ano
anterior. Nossas responsabilidades cresceram significativamente com
o início do recebimento dos Panthers e dos cursos de qualificação do
pessoal. A previsão de recepção de aeronaves para aquele ano era de
18 unidades, indicando a possibilidade de que iríamos receber mais de
uma por mês. Tivemos que nos desdobrar. Missão a Garcia!
No período, foram gerados a nosso favor créditos de aproxi-
madamente USD 115,000.00, referentes a alterações nos lotes de docu-
mentação técnica, na recusa de itens que foram julgados possíveis de
confecção no Brasil, pelo transporte de suprimentos pela FAB e por mo-
dificações aportadas no programa de qualificação de nosso pessoal.
A Aerospatiale ainda reclamava do atraso no recebimento de
informações sobre os oficiais e sargentos que frequentariam os cursos.
O Sr. Zuro, do serviço de segurança da empresa, solicitou uma reunião
com a comissão na qual manifestou a preocupação com o fato. Como
abordado em relatório anterior, a identificação prévia era determinação
do Ministério da Defesa. Informou ter sido advertido por aquele minis-
tério e acrescentou que a ocorrência de novos atrasos poderia implicar
a recusa da autorização para acesso à fábrica. Apresentou documento
solicitando nossa intervenção para que as informações obrigatórias, às
quais fazia referência á cláusula 17.14 do contrato, fossem apresentadas
segundo o prazo previsto.
Estávamos envolvidos no recebimento do Panther 04. Lembro
que os Panther 01, 02 e 03 devem ter sido tratados nos relatórios que
não foram encontrados, conforme anteriormente exposto.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 475

Voltemos ao recebimento do Panther 04.


Debatíamos as condições gerais de aceitação das aeronaves de
04 a 10, sem os instrumentos que eram de responsabilidade da Enge-
trônica e se encontravam em atraso. Em diversas reuniões, tratamos de
problemas referentes às discrepâncias assinaladas. A aeronave apresen-
tou problemas na documentação técnica e na sua configuração, tendo a
empresa assumido compromisso com a rápida regularização das falhas
e omissões apontadas.
Em 6 de março, comunicamos à Aerospatiale a recusa de pros-
seguimento do recebimento provisório do Panther 04 até que fossem
sanadas as discrepâncias constatadas. Vale lembrar que as interrupções
nos recebimentos de qualquer lote duravam somente o tempo necessá-
rio para a correção dos problemas identificados ou a obtenção de com-
promisso de que eles seriam corrigidos em prazo aceitável. A solução
final era sempre da DMAvEx nessa última situação.
Em 14 de março, por ocasião de nova reunião, foi abordado o
atraso no programa de entrega dos equipamentos de bordo de respon-
sabilidade da Engetrônica. Segundo a Aerospatiale, a integração daque-
les instrumentos só ocorreria a partir do Panther 15 em razão do atra-
so na entrega dos itens por aquela empresa. A decisão sobre o assunto
foi postergada, considerando a necessidade de ser ouvida a Brigada de
Aviação do Exército, que assumira os encargos da DMAvEx.
Em 28 de março, em função do atraso na entrega do lote 64
(ferramental de aviônica), foi solicitada a extensão da garantia sobre os
equipamentos da linha Collins, tendo a Aerospatiale concordado com a
proposição da comissão. Foram discutidos ainda problemas relativos à
repetição de panes com os servos SAMM (vazamentos) e interferência
no rádio ARC 182.
Encaminhamos expediente solicitando providências no tocante
às quebras dos suportes de fixação das carenagens das luzes anticolisão,
identificadas nas aeronaves AS 350 LI nº 01 e 02. A questão não foi
objeto de resposta, e a comissão reiterou a solicitação.
Em função de dados fornecidos pelo consórcio durante a Con-
corrência Internacional no 01/DMB, emitimos documentação solicitan-
do o acréscimo nas aeronaves Panthers dos porta-mapas e das provi-
sões para macas (instalações sanitárias). A Aerospatiale concordou com
a solicitação. Informamos à fábrica que os assentos-conforto colocados à
476 Aviação no Exército - uma visão histórica

disposição para recepção não se enquadravam nas condições visualiza-


das por ocasião de sua encomenda. Supunha-se que o material guardava
similaridade com os assentos utilizados nas versões VIP, fato que em
parte justificava seu alto custo. Acrescentamos que a qualidade de con-
forto apresentada pelos assentos era substancialmente inferior àquela
esperada, sendo o custo “despropositado”. Discutia-se tornar sem efeito
a aquisição do material em apreço, transformando seu valor em crédito
a nosso favor.
Em 12 de março de 1990, foi endereçada documentação à
“SAMM – DPT Hydraulique” versando sobre as panes ocorridas com
os servos-comandos que equipavam as aeronaves AvEx. Ainda naquela
data, em face do atraso na entrega do lote nº 64 (ferramental de aviô-
nica), foi enviado expediente à Aerospatiale pedindo providências para
solucionar o fato. A falta de resposta às reiteradas solicitações verbais e
escritas foi considerada uma omissão julgada grave e incompreensível.
Por causa das repercussões negativas na manutenção dos helicópteros
pelo 1o Btl Hlcp, informamos que o assunto consubstanciava claro des-
cumprimento contratual com consequências extremamente danosas.
Solicitávamos os esclarecimentos completos e devidos sobre os fatores
motivadores do atraso no mais curto prazo possível. Pedimos ainda a
extensão de garantia de alguns materiais para nos resguardar de situa-
ção criada exclusivamente por omissão e responsabilidade da empresa.
Informávamos também que a partir daquela data a empresa passara a
incidir na cláusula 32.2 do Contrato no 0l/88-DMB/Ext, que estabelecia
as multas por atraso. Elas por sinal eram bem altas.
Interrompemos o curso de mecânico de voo, pois a parte
prática não se desenvolvia de acordo com o previsto contratualmente no
tocante à realização de horas de voo individuais. Alegava a Aerospatiale
que, em virtude do término do curso de pilotos, não seria possível fazer
voar os mecânicos de voo por causa da falta de disponibilidade de
equipagens. Comunicamos à empresa que, na hipótese de o curso não
ser recomeçado até a data prevista para o seu término, a Aerospatiale
deveria fornecer crédito correspondente às quatro semanas de pista,
bem como apresentar uma solução para a complementação da formação
no Brasil. Informamos que a liberação do pagamento do lote estaria
condicionada à resposta favorável. O curso foi complementado no Brasil
com instrutores da Helibras e da Aerospatiale.
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 477

Em 12 de março, interrompemos o recebimento do lote no 66


(Suprimento NADAS) pela constatação da falta de 20 itens, integraliza-
dos a posteriori.
A falta de informações concretas no tocante à integra1ização
do lote 63 (ferramental 365K) levou-nos a informar à Aerospatiale que
a empresa passava a incorrer na cláusula de multa contratual a contar
de 30 de setembro do ano anterior, data prevista para a entrega. O pro-
blema girava em torno do banco hidráulico, recusado por desconformi-
dade contratual. Na semana posterior ao nosso comunicado, a Aeros-
patiale colocou o banco hidráulico à disposição para recebimento, e ele
foi novamente recusado por falta de documentação técnica referente ao
motor. Comunicamos à fábrica que a contagem do prazo de atraso para
efeito de aplicação de multa mantinha-se em vigor.
A documentação técnica continuava, e foi assim durante toda
a duração de nossa missão, um motivo de constante preocupação pe-
las razões que já aludimos. Introduzimos um número considerável de
modificações nos RIC das aeronaves recebidas. Prosseguíamos com as
reuniões para a correção.
No período compreendido por esse relatório, fui submetido,
em caráter de urgência, à intervenção cirúrgica para corrigir problema
abdominal consequente de cirurgia anterior, ficando hospitalizado de
15 a 22 de fevereiro, o que não foi motivo para me manter alheio às ati-
vidades da comissão.
Por ocasião desse relatório, tínhamos expedido cumulativa-
mente, desde o início de nossa missão, 347 ofícios e 398 faxes de natu-
reza militar, 261 ofícios e 221 faxes a empresas civis, 9 atas de reuniões,
8 boletins mensais, 8 relatórios e 98 documentos diversos. Tínhamos
recebido 23 ofícios e 272 faxes militares, bem como 149 ofícios e 63
faxes civis, além de 86 documentos diversos. Havíamos realizado 123
reuniões de trabalho e 9 visitas a fabricantes.

O Relatório nº 02/90 englobava o período de 1º a 30 de junho


de 1990. Possuía originalmente 11 páginas e 5 anexos.
Na ocasião, já tínhamos assinado o termo de compromisso que,
a cada helicóptero recebido, seria gerado em nosso favor um crédito de
US$ 9,000.00 em função dos problemas identificados com o HF. O assun-
to foi detalhado anteriormente.
478 Aviação no Exército - uma visão histórica

As reuniões de trabalho se sucediam envolvendo todos os depar-


tamentos. Trabalhávamos para melhorar as condições da garantia técnica
procurando estabelecer uma sistemática para agilizar a substituição de
itens recolhidos sob aquela rubrica. Tínhamos panes repetidas com os Del-
ta NG e os pilotos automáticos (PA) que precisavam ser solucionadas. Além
disso, até aquela ocasião, o DEA ainda não tinha deslanchado. O assunto foi
levado ao Sr. Leyssieux, chefe do Departamento Pós-Venda, que se compro-
meteu a envidar os esforços necessários com o objetivo de proporcionar
o máximo de satisfação à Aviação do Exército. Persistia o atraso na com-
plementação do lote nº 64 (ferramental de aviônica) a que nos referimos
no relatório anterior. Atendendo a questionamento formulado pela comis-
são, a Aerospatiale comunicou a previsão de entrega das bancadas Collins,
componentes do lote 64, para fim de junho de 1990, tendo concordado em
estender a garantia dos equipamentos afetados pelo atraso em questão.
Os problemas identificados ao longo do processo de recebimento
em todas as áreas do contrato foram sendo resolvidos gradativamente. Cer-
tamente, o esforço da comissão exercendo pressão contínua sobre a Aeros-
patiale serviu para que as soluções ocorressem de forma mais ágil e sempre
de acordo com os interesses da nossa Aviação e do Exército Brasileiro.
Continuávamos com a recepção dos Panthers. Na ocasião, tra-
balhávamos nos Panthers 05, 02 e 06. Cada aeronave correspondia a um
lote. Os Panthers correspondiam aos lotes de 17 a 42. Durante o pro-
cesso, ocorriam algumas inversões, seja em função de interrupções no
recebimento, seja por acordo firmado com a fábrica. Como ocorria nor-
malmente, o recebimento das aeronaves geravam uma série de reuniões
com os órgãos responsáveis pela produção, pelos ensaios em voo e com
a chefia do programa respectivo.
Na recepção do Av Ex 05, foram assinaladas discrepâncias na
documentação da aeronave relativas à falta de registro de utilização do
guincho e gancho; ao não cumprimento de prescrições quanto à con-
tagem de ciclos do motor; à falta de inclusão na documentação dos re-
sultados das análises espectrométricas de óleo da BTP (caixa de trans-
missão principal), BTA (caixa de transmissão traseira) e motores e a
incorreções no inventário da aeronave.
Em 18 de abril de 1990, foi comunicada à Aerospatiale a inter-
rupção do recebimento provisório do Panther 06 pela constatação de
discrepâncias, entre elas a identificação de interferência rádio e a cons-
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 479

tatação de que as pás do rotor principal apresentavam, pela análise da


documentação, duas horas de utilização em outra aeronave. Enfatizamos
à chefia do Departamento de Controle de Qualidade que em hipótese al-
guma seriam aceitos itens já voados em outras aeronaves e que a recusa
era definitiva, não havendo possibilidade de aceitação de helicóptero com
item naquelas condições. Apesar de a prática ser considerada normal sob
o ponto de vista industrial, a refutamos em relação às aeronaves da Avia-
ção do Exército. Que a adotassem com as aeronaves dos outros.
A resistência do piso da cabine do AS 365K Panther também se
encontrava em desconformidade com o previsto em contrato (780 daN/
m2) e a fixada na aeronave (610daN/M2). A Aerospatiale informou que
o problema se situava em torno de incorreção na elaboração do Anexo
B do contrato. Segundo a empresa, o dado correto era 610 daN/m2. O
assunto foi submetido à apreciação da Bda AvEx.
Prosseguiam-se as reuniões semanais com os responsáveis
pela documentação técnica. Realizamos com os departamentos de Do-
cumentação Técnica da Aerospatiale e da Turbomeca diversas ações
orientadoras das próximas revisões que os manuais sofreriam.
Tratávamos de assuntos ainda pendentes, como a aplicação de
modificação na caixa de controle do rádio ARC 182, da instalação de por-
ta-cartas e da elaboração do programa de treinamento para 1991.
Levamos ao presidente da Divisão de Helicópteros nossa insatis-
fação pelos contínuos problemas identificados no que concernia também
à área do Pós-Venda. O Sr. Bigay informou que as recentes mudanças no
departamento já se inseriam dentro do esforço para melhorar a qualidade
do atendimento à Aviação do Exército.
No trimestre, concluímos o recebimento dos lotes 18, 21 e 22,
respectivamente Panthers 02, 05 e 06, e dois lotes de suprimentos NADAS.
Solicitamos a complementação dos cursos de aviônica para ofi-
ciais e sargentos no tocante à fase desenvolvida pela Collins francesa,
em razão da alegação contida em documento da Brigada de Aviação do
Exército de que a ela se desenvolvera sobre bancadas distintas daquelas
adquiridas em contrato.
A Aerospatiale endereçou à comissão proposta de derrogação
envolvendo a caixa de controle do ARC 182 Collins. Diante das incor-
reções contidas na documentação, foram solicitadas informações adi-
cionais referentes:
480 Aviação no Exército - uma visão histórica

– às aeronaves atingidas pela derrogação;


– ao motivo pelo qual não foram relacionadas as caixas de con-
trole das aeronaves já entregues, considerando que a discrepância mo-
tivadora da derrogação fora assinalada já anteriormente pela comissão.

Atendendo à nossa solicitação, a Aerospatiale concordou em


fornecer “guias do piloto” (manuais de utilização) referentes aos equi-
pamentos ARC 182 Collins, ADF 60, Radar 1400c Bendix, HF 230, VIR
31, DME 40, VHF 230 e VLF/“OMEGA”. Os documentos não adquiridos
contratualmente foram fornecidos sem ônus, à razão de uma coletânea
por aeronave. Segundo informação da Aerospatiale, a aquisição do
conjunto de manuais, com os respectivos fornecedores, representou
custo de cinco mil e setecentos dólares americanos.
A dificuldade na leitura de PN e NSN (National Stock Number)
durante o processo de conferência do RIC se apresentava a cada recebi-
mento provisório, em razão de referências ocultas sob camada de pintu-
ra, gravadas em local de difícil acesso e visualização ou por gravação mal
feita. A empresa foi cientificada e corrigiu os problemas.
Em 5 de maio de 1990, a Aerospatiale assinalou a possibilidade de
perturbação radar quando de emissão HF em torno de 26,6 MHz. O proble-
ma se traduzia por interferência na tela sobre a qual apareciam linhas ra-
diais, ou saturação da imagem, ou redução da densidade dos ecos. Segundo
a empresa, a Bendix, fabricante do equipamento, informara que o problema
poderia se situar no nível da montagem das juntas de hiperfrequência.
Dessa forma, encerrávamos mais um relatório. O cômputo
acumulado dos documentos processados até aquela data apontavam a
expedição de 448 ofícios e 486 faxes militares, 278 ofícios e 249 faxes
civis e 163 reuniões de trabalho. Os recebidos, entre ofícios e faxes civis
e militares, chegavam a 736.
O Relatório 03/90, o último que conseguimos recuperar, se re-
feria ao período de 1º de julho a 1º de outubro de 1990.
Na ocasião, cada recebimento gerava a nosso favor USD
13,500.00 por aeronave, sendo 9,00.00 do HF e 4,500.00 da suspensão
da entrega de proteção para as pás.
Reiterávamos ao Sr. Galvin (“Livraison Helicopter” – Entrega
dos Helicópteros para recebimento) a necessidade de antecipação da
disponibilidade da documentação das aeronaves para exame preliminar,
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 481

considerando o volume de incorreções que eram usualmente identifi-


cadas. Acertamos ainda detalhes para a melhoria nas condições de re-
alização dos ensaios de estanqueidade, pois a identificação de falta de
vedação das portas corrediças e basculantes já havia ocorrido.
Semanalmente, com a participação dos responsáveis pela
elaboração de cada manual técnico, era realizada nas dependências
da comissão reunião relativa ao acompanhamento da atualização e à
correção de discrepâncias identificadas na documentação técnica.
Em razão da baixa qualidade e do alto custo, a comissão rejei-
tou os assentos-conforto na situação em que foram apresentados. De-
pois de seguidas reuniões, deliberou-se que a Aerospatiale forneceria ao
EB, além de novos assentos, um conjunto de assentos-conforto traseiros
civis, apoios de cabeça para os assentos traseiros e a preparação de três
aeronaves para recepção dos assentos civis.
Foram solicitadas providências ao diretor do Departamento de
Pós-Venda com vistas a esclarecer como seria realizada substituição dos
Deltas NG nos HB 350 L1, Esquilo. Foram ainda transmitidas as apreen-
sões no tocante à falta de eficiência daquele departamento no atendi-
mento às necessidades da Aviação do Exército. O Sr. Larreur prometeu
a elaboração de documento de esclarecimento sobre a substituição. O
assunto foi posteriormente resolvido com a instalação de novos equipa-
mentos nas aeronaves.
Recusamos o recebimento do Av Ex 07 em face das inúmeras
discrepâncias detectadas. Solicitamos a convocação do SIAR e do re-
presentante do Departamento de Cooperação e Licença para discutir a
imprescindível melhoria do estado das aeronaves e da documentação
respectiva. Em reunião com a participação de representantes dos de-
partamentos de Controle de Qualidade (Sr. Raquin e Portely), Entrega
de Helicópteros (Sr. Galvin) e SIAR (Sr. Charbonier), foram solicitadas
providências imediatas no que diz respeito à melhoria de qualidade dos
RIC e dos demais documentos de acompanhamento das aeronaves. Na
ocasião, informamos que o recebimento das aeronaves estava interrom-
pido até o esclarecimento sobre a resistência do piso do AS 365K Pan-
ther, assunto que já era objeto de discussões.
Voltamos a nos reunir com o presidente da empresa para mais
uma vez tratar de dificuldades encontradas no curso das nossas ativida-
des e da morosidade da atuação do Departamento de Pós-Venda.
482 Aviação no Exército - uma visão histórica

Persistiam as nossas preocupações com a qualidade da docu-


mentação técnica, inclusive a de responsabilidade da Turbomeca.
No relatório, tratávamos de assuntos referentes a problemas
com os Esquilos de 01 a 05 ocorridos no Brasil, às condições de reinício
dos recebimentos provisórios, que se encontravam interrompidos; à ho-
mogeneização de todas as capas (forrações) dos assentos-comando dos
AS 365K Panthers; ao banco hidráulico do lote 63, que não fora aceito
pelo Btl Hlcp; aos assentos-conforto do Panther; às proteção das pás do
Panther, que foram julgadas desnecessárias, e ao apoio da Aerospatiale
à missão Amazônia, que seria realizada pela Aviação do Exército.
O problema dos ARC 182, ruído de fundo, chegava ao seu final
com o desenvolvimento de correção da discrepância identificada. Os en-
saios ocorreriam em outubro, e a modificação de todos os equipamentos
era prevista para dezembro, no BAvEx e/ou Helibras.
Recebemos no período mais oito lotes, incluindo os Panthers 07, 08
e 09. O Av Ex 07 teve seu recebimento provisório interrompido de 24 a 31
de julho de 1990 em face da identificação de discrepâncias, as quais foram
posteriormente solucionadas. O Av Ex 08 foi também alvo de interrupção em
31 de julho em razão de 45 discrepâncias no exame preliminar da documen-
tação da aeronave. O processo foi reiniciado em 13 de agosto de 1990. Em 9
de agosto de 1990, a comissão interrompeu o recebimento do Av Ex 09 por
causa da identificação de 41 discrepâncias na verificação preliminar da docu-
mentação da aeronave, cujo processo foi reiniciado em 23 de agosto de 1990.
Atendendo a expediente da comissão referente às condições de
realização do estágio na Collins, durante o curso de Aviônica para oficiais
e sargentos do Btl Hlcp, informou a Aerospatiale que pesquisa realizada
naquela empresa permitiu a constatação de que o banco utilizado era
idêntico ao previsto em contrato. A identidade foi verificada sob o plano de
princípio, considerando existir diferença no painel de comando. Concordou a
empresa em rever o assunto por ocasião da recepção do banco pelo Exército.
Caso apresentada dificuldade de operação pelos militares, a Aerospatiale
concordaria em tomar as medidas necessárias à correção do problema.
A constatação de faltas sobre o lote 66 verificadas no Brasil provo-
cou uma reunião com a chefia do departamento encarregado do embarque
do material, considerando que este, como ocorria normalmente, fora rigo-
rosamente conferido e, no momento de entrega à fábrica para expedição,
não apresentava qualquer discrepância. Em resposta e após realização de
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 483

investigação, a comissão recebeu documento da empresa informando que a


ocorrência fora gerada por falha no momento da expedição. Os problemas
foram corrigidos com a remessa dos itens faltantes.
Como conclusão de uma série de negociações com a Aerospatiale,
a empresa concordava em instalar, sem ônus para o EB, em toda a frota Pan-
ther, as redes de amarração de carga transportada no bagageiro.
Após um ano e dez meses de atividades, entre ofícios e faxes envia-
dos a organizações militares e civis, atingíramos o total de 1.750 documen-
tos expedidos e realizáramos 183 reuniões de trabalho. Recebêramos 880
documentos de natureza militar e civil.

Recebimento do último Panther já com a presença dos integrantes da nova comis-


são. Da esquerda para a direita, mecânicos da Aerospatiale; Sgt Roberto; Ten Cel
Loriatto; o autor; Sgt Borck; Maj Simões e o Sr. Andrés, piloto da Aerospatiale

Como a conclusão da nossa missão ocorreu em julho de 1991,


deixamos de sintetizar relatórios de nossas atividades elaborados nos
nove meses seguintes, o que deve ter correspondido a no mínimo três
outros relatórios. Não vou me permitir “achar”, pois o “achismo” é vee-
mentemente condenado por nós, militares, mas quero crer que a “sínte-
se da síntese” que elaboramos pôde dar aos nossos leitores uma ideia do
trabalho que realizamos, e este era o meu objetivo. Pena que dos 1.750
documentos expedidos eu só tenha localizado 18. Felizmente, entre eles
se encontravam os relatórios aos quais nos referimos. Tentei localizá-los
em diversas fontes, mas não obtive êxito.
Antes de concluir este capítulo me vem à memória fato ocor-
rido durante a recepção das aeronaves Em determinada ocasião, che-
gou-nos a informação da ocorrência de vazamento no trem de pouso de
484 Aviação no Exército - uma visão histórica

uma determinada aeronave Panther que já havia sido recebida provi-


soriamente em Marignane. Toda vez que eu tomava conhecimento des-
se tipo de comunicação, ainda bem que foram poucas, ficava chateado,
pois trabalhávamos com o maior afinco para que os problemas fossem
todos sanados ou as providências para tal implementadas antes que a
aeronave embarcasse para o Brasil. Informações nesse sentido nos dei-
xavam com o orgulho profissional ferido. Ao recebermos a comunicação,
passamos a tomar as nossas providências. Incontinênti, fizemos chegar
o ocorrido à Aerospatiale; esta alegou que o identificado havia sido so-
mente um suintement (suor) na perna do trem de pouso. Feito o ensaio
nos laboratórios da empresa, o qual acompanhei, verificou-se que se ele
permanecesse nas condições em que se apresentava a aeronave poderia
fazer mais de vinte mil pousos sem necessidade de reposição do fluido
hidráulico, não representando assim riscos à operação. Bem; se o pes-
soal no Brasil enquadrava o fato como discrepância, nós da comissão
não devíamos encará-lo de modo diferente. Se era, com dizem nossos
conterrâneos nordestinos, para “arrochar” mais ainda, vamos fazê-lo.
Se eles já ficavam “tiriricas” com a gente no dia a dia, agora ia ser mui-
to pior. A partir daí, aumentou o nosso rigorismo na verificação desse
item em particular. Além do maior número de pousos por ocasião dos
ensaios em voo, chegávamos ao detalhe de passar o dedo nas pernas
do trem de pouso para verificar se havia algum vestígio de fluido. Nessa
situação, me lembrava daquele tenente, quando eu era cadete da AMAN,
que passava o dedo embaixo das camas para verificar se havia algum
resquício de poeira no chão. Em consequência, chegamos a determinar
a substituição de quatro trens de pouso em uma determinada aeronave.
O pessoal da Aerospatiale ficava doido. Afinal de contas, se não me falha
a memória, cada trem custava da ordem de mais de cem mil dólares.
Tendo assumido o major Simões a função de piloto em substi-
tuição ao tenente-coronel Albernaz, continuávamos com a severa avalia-
ção do trem de pouso na ordem do dia. O Simões fazia, durante os voos,
pousos sucessivos e “duros” para testá-los. Em um deles, eu estava pre-
sente. Toda a vez que isso ocorria, o piloto da Aerospatiale, que sempre
fazia parte da tripulação, interferia nos comandos tentando suavizar o
pouso. Mas o Simões não dava “colher de chá”. “Coronel, ele está inter-
ferindo, me disse o Simões. Se ele continuar vou abortar o voo.” Eu lhe
respondi: “Se ele voltar a interferir pode interromper o recebimento. A
A Comissão de Fiscalização e Recebimento de Material no Exterior 485

decisão é sua.” E assim foi feito, e o fato não mais se repetiu. Se não fosse
um assunto tão sério esse “conflito de cabine” dava para a gente rir. Foi
o que ocorreu quando relembramos o fato.
O vulto das atividades ocorridas durante a nossa permanência
na chefia da comissão efetivamente foi muito maior do que as aqui ex-
postas. Precisaríamos de um outro livro para comentar todos os eventos
ocorridos. O que apresentamos, após uma grande depuração dos dados
constantes dos relatórios, permite uma pálida visão do nosso trabalho.
No entanto, nosso objetivo era dar um ideia geral dos problemas enfren-
tados, de como funcionava a comissão e, em particular, de demonstrar
a necessidade de mantê-la, quando se tratar da aquisição de material
aeronáutico.
Capítulo 25

Cerimônias e visitas
As cerimônias e visitas foram outras ocasiões que se inseriram no
extenso quadro de atividades da comissão. As solenidades davam a exata
dimensão da importância da parceria que se iniciava entre a Aerospatiale e
o Exército Brasileiro. As visitas se dividiam em duas categorias, isto é, as re-
cebidas pela comissão, que tinham como intuito a verificação do nosso fun-
cionamento, e aquelas realizadas pela comissão, cujo objetivo era buscar in-
formações de interesse da Aviação do Exército. Vamos colocar em destaque
somente as mais significativas; as demais já fizemos alusão anteriormente.

Entrega da Medalha do Pacificador a


dirigentes da Aerospatiale
A cerimônia de entrega da Medalha do Pacificador envolveu os
Srs. Bigay e Lucien Lordereau, respectivamente presidente da Divisão
de Helicópteros e diretor comercial da Aerospatiale.
O evento ocorrido em 12 de janeiro, com a presença do adido
militar do Exército, causou significativo impacto pelo ineditismo da co-
menda que era concedida àqueles dirigentes pelo Exército Brasileiro. O Sr.
Lucien Lordereau foi o chefe da equipe da Aerospatiale durante o proces-
so de elaboração do contrato celebrado com a empresa. Não obstante os
ásperos embates que tivemos durante as reuniões para discussão do con-
trato, o tenho na mais alta consideração pela sua competência e polidez.
488 Aviação no Exército - uma visão histórica

Da esquerda para a direita, Cel Masi, adido militar do Exército; O Sr. Bigay, PDG da Aeros-
patiale Helicópteros; Ten Cel Silva Maia; o Sr. Lordereau, diretor comercial da Aerospatiale

Visita do diretor de Material de


Aviação do Exército
Tivemos o grato prazer de receber a visita do general Bulcão,
diretor da Material de Aviação do Exército, destinada a verificar o fun-
cionamento da comissão e o desenvolvimento do contrato. Ela também
serviu para estabelecer contatos com o exército francês a fim de tomar
conhecimento de equipamentos que pudessem colaborar para o aumen-
to da eficiência da Aviação do Exército na área de interesse da diretoria.

Da esquerda para a direita, major da DMAvEx; Sr. Godet, piloto de ensaios;


general Bulcão; Sr. Dubreuil, chefe dos programas; o autor; coronel Masi, adido
militar do Brasil; Sr. Larreur, chefe do Programa Esquilo; Sr. Meylan, do Depar-
tamento de Cooperação e Licença; Sr. Jean Noel, do Departamento Comercial;
Sr. Lemaitre, chefe do Centro de Treinamento e o tenente-coronel Albernaz
Cerimônias e visitas 489

Acompanhado do adido militar à embaixada brasileira em Pa-


ris, coronel Masi, o general Bulcão, entre outros eventos nos quais to-
mou parte, presidiu a solenidade em que, com o tenente-coronel Alber-
naz, piloto da comissão, eu tive a honra de ser agraciado com a Medalha
do Pacificador. O general Bulcão cumpriu extenso programa de visitas,
incluindo as linhas de montagem, onde pôde verificar as aeronaves da
Aviação do Exército que se encontravam em produção e os demais de-
partamentos da fábrica.

Visita do general Bulcão. Solenidade de entrega da Medalha do Pacificador

Visita do general Bulcão. Solenidade de entrega da Medalha do Pacificador ao Ten


Cel Av Albernaz e ao autor. Na foto, aparecem com as respectivas esposas o Ten Cel
Tapella, do SIAR; o Cel Masi, adido do Exército; o adido da Aeronáutica; o chefe da
DGA e o general Delacroix de Vaubois, Cmt da ALAT
490 Aviação no Exército - uma visão histórica

O general Bulcão se dirige aos presentes

O general Bulcão entre oficiais franceses e membros da comitiva


Cerimônias e visitas 491

Visita às instalações da ALAT


Em 24 de setem-
bro de 1989, por iniciativa
do Comitê França-Brasil,
dirigido pelo Sr. Christian
Botto, o adido militar do
Exército, em Paris e os inte-
grantes da comissão visita-
ram a Escola de Aplicação
da ALAT (Aviation Légère
de l’Armée de Terre).
Como visto an-
teriormente, o Comitê
França-Brasil é uma en-
tidade dedicada a fomentar e desenvolver as trocas entre a região
da Provence-Alpes-Côte d’Azur e o Brasil, sob o aspecto econômico
e cultural.
A delegação foi recebida pelo coronel Rospide, subcomandan-
te da Base, que, após uma palestra inicial versando sobre as missões
da unidade, apresentou as instalações e os equipamentos em utilização.
Pudemos reunir uma série de informações de interesse para a Aviação
do Exército nas áreas de emprego operacional das aeronaves, manuten-
ção e controle de suprimentos, a qual foi repassada à DMAvEx para pos-
terior divulgação ao BAvEx.

Solenidade de concessão da
Medalha do Pacificador a integrantes do SIAR
Outro evento significativo foi a solenidade de concessão da Me-
dalha do Pacificador aos representantes do SIAR, em Marignane. Em li-
nhas gerais, a Surveillance Industrielle pour l’Armement (SIAR) era um
organismo da Delegation Generale pour l’Armement (DGA), órgão do
Ministério da Defesa da França, e tinha entre outras responsabilidades
fiscalizar a qualidade dos produtos da área de Defesa fabricados pelas
empresas francesas, assegurando a efetividade deles, identificando possíveis
492 Aviação no Exército - uma visão histórica

discrepâncias, acompanhando o solucionamento dos problemas encon-


trados e avaliando a satisfação dos clientes, em particular das Forças
Armadas utilizadoras.
Em Marignane, representava o SIAR o tenente-coronel Ta-
pella, que tinha como auxiliar o engenheiro aeronáutico Charbon-
nier. Ao longo do processo de recepção das aeronaves, sempre que
solicitado nos proporcionaram o apoio desejado, colocando-se em
algumas ocasiões contra os interesses da fábrica, demonstrando alto
espírito profissional e a identificação com as missões do organismo
que representavam, entre as quais, destacamos anteriormente, a sa-
tisfação do cliente.
Pelos serviços a nós prestados julgamos o tenente-coronel Ta-
pella e o Sr. Charbonnier merecedores de uma justa homenagem; logo,
foi feita a proposta ao escalão superior de distinguir ambos com a Me-
dalha do Pacificador.
Elas foram recebidas pelos agraciados em cerimônia realizada
na Embaixada do Brasil, em Paris, no gabinete do adido militar, coro-
nel Masi. O ato constitui-se em estímulo ao estreitamento dos laços de
franca cooperação que já reinava entre os representantes do SIAR e a
COMFIREMEX.

Cerimônia realizada na Embaixada do Brasil, em Paris. Entrega da Medalha do


Pacificador ao tenente-coronel Tapella
Cerimônias e visitas 493

Entrega da medalha ao Sr. Charbonnier

A comenda recebida pelos amigos do SIAR foi totalmente merecida.


A homologação das aeronaves pelas autoridades aeronáuticas
francesas era impositiva. Elas não poderiam ser apresentadas ao cliente
sem essa aprovação prévia, garantindo que estavam livres de problemas
de concepção e de projeto. Na única aeronave HB 350, Esquilo, que foi
recebida em Marignane no processo de homologação pelo SIAR, durante
a campanha de testes, verificou-se um problema de funcionamento das
turbinas, denominado de pompage, que ocorria sob determinadas condi-
ções de operação. Essa anomalia provocou uma modificação nos motores
por parte da Turbomeca, o que resultou em um aumento de potência sem
qualquer ônus para o Exército. Essa foi uma das diversas intervenções do
SIAR que nos favoreceram. Ela, por si só, já justifica a homenagem.

Visita do novo diretor de


Material de Aviação do Exército
De acordo com o programa de visitas e inspeções da Diretoria
de Material de Aviação do Exército, a COMFIREMEX recebeu em Marig-
nane o novo diretor, general Nery. Na oportunidade, foi realizado um
programa de visitas às linhas de montagem de helicópteros, à fábrica
de pás, em La Courneuve, ao Comando da Aviation Légère de l’Armée de
Terre (ALAT) e ao Salão Aeronáutico de Bourget.
494 Aviação no Exército - uma visão histórica

Visita do general Nery às instalações da COMFIREMEX.


Da esquerda para a direita, Sgt Vitor Borck, mecânico; Maj Simões, piloto da
COMFIREMEX; Gen Nery; o autor, chefe da COMFIREMEX, e o Ten Cel Lacerda, da
DMAvEx

Visita ao comando da ALAT. Em pé, o primeiro à esquerda é o autor,


chefe da COMFIREMEX; o quarto, o Cel Merialdo, adido militar Francês em Brasília,
que acompanhou o Gen Nery; em seguida, o Gen Nery e, ao lado, o Cmt da Aviation
Légère de l’Armée de Terre (ALAT)

Fato a destacar foi o encontro com o inesquecível piloto de Fór-


mula 1, Ayrton Senna, que se encontrava no Salão de Bourget a convite
da Aerospatiale, de quem havia adquirido uma aeronave Esquilo.
Cerimônias e visitas 495

Encontro com Ayrton Senna no Salão de Bourget

Visita do chefe do Estado-Maior do Exército


Em 26 e 27 de setem-
bro de 1990, acompanhado de
uma delegação militar francesa,
o general de Exército Moreira,
chefe do Estado-Maior do Exér-
cito, visitou as instalações da
Aerospatiale e a comissão. Na
ocasião, ele pôde se informar
a respeito da evolução do con-
trato, o qual envolveu a entrega
das aeronaves, suprimentos,
ferramental e documentação
técnica. Participou ainda de
reunião com representantes da
fábrica na qual foram tratados
assuntos referentes à progres-
são do contrato. A essa altura,
havia um razoável retardo, par-
ticularmente em virtude de re-
Visita do general Moreira, chefe do EME cusa no recebimento de algumas
496 Aviação no Exército - uma visão histórica

aeronaves. Durante essa reunião, tendo Aerospatiale apresentado dados


que não condiziam com a realidade, devidamente autorizado pelo general
Moreira, fiz uma dura intervenção (já possuía razoável fluência na língua
francesa) rebatendo cada argumento apresentado.
Ao término da visita e em função do retardo existente, como já
me encontrava em fim de missão, fui consultado pelo general Moreira se
eu desejava permanecer mais um tempo para completar o recebimento
das aeronaves. Como não poderia deixar de ser, e o faria qualquer mili-
tar imbuído de suas responsabilidades, disse-lhe que eu gostaria de con-
cluir a missão para a qual eu fora designado. Em decorrência, em 12 de
dezembro de 1990, atendendo à proposta do Estado-Maior do Exército,
o ministro do Exército prorrogou por cinco meses minha permanência
na chefia da comissão. Talvez a minha veemência na defesa dos interes-
ses do Exército tenha sido levada em conta na decisão.

Visita da delegação do Comitê França-Brasil

Integrantes do Comitê França-Brasil, da direção da Aerospatiale


e da COMFIREMEX

A visita de delegação do Comitê França-Brasil foi outro fato de


destaque. Serviu para estreitar os laços de entendimento que haviam sido
estabelecidos anteriormente. Como já exposto, o Comitê França-Brasil,
criado com o intuito de incrementar as trocas econômicas e culturais entre
a região da Provence-Alpes-Côte d’Azur e o Brasil, era uma iniciativa do Sr.
Cerimônias e visitas 497

Christian Botto. Com esse objetivo, patrocinava manifestações diversas,


como encontros profissionais, exposições e outros eventos, sempre com o
objetivo de estimular a aproximação entre a região e o nosso país.
O trabalho de divulgação do Brasil realizado por aquele comi-
tê na região era merecedor de nossa admiração e respeito. Apesar dos
esforços do comitê em divulgar uma imagem positiva do nosso país, seu
foco principal era o incremento das relações comerciais.
Sobre a imagem do Brasil na França, vale a pena fazer um breve
hiato para narrar um fato acontecido comigo. Na época, não me recordo
de esforços institucionais em melhorar a imagem do nosso país naquela
região. Em função da falta de uma campanha de esclarecimento, passei
por uma situação que só não me provocou riso, pois ele foi abafado pela
surpresa e indignação. Tendo sido procurado em minha residência por
uma jovem que oferecia cartões de apresentação, ao saber que eu era
brasileiro, em determinado momento de nossa conversa, ela me per-
guntou: “É verdade que no Brasil durante o Carnaval os homens podem
estuprar e matar as mulheres?” Surpreso com a descabida indagação
e pela ignorância de minha interlocutora sobre a realidade do nosso
país, manifestei-lhe a minha indignação por ela acreditar que em pleno
século XX seria possível a alguém se arrogar o direito de, em qualquer
parte do mundo, praticar tais atos. Minha indignação englobava tam-
bém a constatação de que, efetivamente, o nosso governo não desen-
volvia, pelo menos naquela importante região, esforços para transmitir
aos franceses a exata dimensão de nossa pátria. Nesse sentido, apesar
de não estar inserido em minhas responsabilidades, fiz um contato com
nosso adido em Paris para verificar a existência de material de divulga-
ção que pudesse ser distribuído aos habitantes locais. Fui informado de
que permanecia em depósito uma grande quantidade de revistas Man-
chete ou Cruzeiro, não me recordo com exatidão. Era uma edição come-
morativa ao centenário da Torre Eiffel, a qual divulgava a relação entre
os dois países e passava uma imagem muito positiva do Brasil. Pedi ao
adido que me mandasse o maior número possível de exemplares e os
distribuí na região.
A divulgação desse fato, apesar de não estar intimamente liga-
do ao fulcro deste livro, me parece oportuna por dois aspectos. O pri-
meiro deles aponta para a necessidade de que as embaixadas sejam
mais atuantes no seu trabalho de difundir uma imagem positiva do País;
498 Aviação no Exército - uma visão histórica

o segundo está ligado à conveniência de apoio a essas instituições pri-


vadas, como o Comitê França-Brasil, que prestam um grande serviço ao
mostrarem uma imagem favorável do Brasil.
de profissionalismo, entendimento e respeito. A concessão da
honraria atesta que nosso trabalho contribuiu de algum modo para o
estreitamento das relações entre o Exército Brasileiro e as Forças Arma-
das francesas.
Sempre fugi dos elogios, mas passei toda a minha vida militar
tentando merecê-los dando o máximo de minha capacidade para o inte-
gral cumprimento de minhas responsabilidades.
Capítulo 26

Conclusão da missão

E m 31 de julho de 1991, ocorreu o término de minha mis-


são. Fui substituído pelo tenente-coronel de Infantaria
QEMA Luis Carlos de Vasconcellos.
O período de 1º a 30 de agosto foi dedicado à passagem de fun-
ção ao novo chefe da COMFIREMEX.
Em 2 de setembro de 1991, quando já me encontrava em gozo
de trânsito, fui agradavelmente surpreendido ao tomar conhecimento da
organização pela Aerospatiale de uma cerimônia para minha despedida.
Com a presença da alta direção da empresa e cerca de 70 pesso-
as representando os diversos departamentos com os quais a COMFIRMEX
trabalhou direta ou indiretamente, o evento ocorreu no denominado “Bâ-
timent VIP”. Na oportunidade, o President Directeur General (PDG), Sr.
Bigay, fez uso da palavra, ressaltou o trabalho da comissão e me entregou
um modelo reduzido do Panther em madeira, uma peça artesanal.
Na foto oficial do evento que me foi ofertada, com a maquete,
dando a exata dimensão do trabalho realizado durante o período em
que chefiei a comissão, foi escrito:

Em souvenir d’une mission conduite avec beau-


coup d’exigence, avec le souci de l’efficacité, mais sans oublier
l’amitié.
500 Aviação no Exército - uma visão histórica

Como recordação de uma missão conduzida com muita exigên-


cia, com a preocupação da eficácia, mas sem esquecer a amizade.

Minha despedida, realizada pela Aerospatiale. O Sr. Bigay, PDG da Divisão de


Helicópteros da Aerospatiale, me entrega uma maquete em madeira do AS 365K
Panther

O Sr. Bigay fala aos presentes


Conclusão da missão 501

A palestra foi sucedida por um almoço no restaurante VIP da fábrica,


onde se realizaram os brindes de praxe. Tivemos também o prazer de receber
as despedidas dos integrantes do Departamento de Cooperação e Licença e
de Entrega das Aeronaves.

Almoço de confraternização com funcionários do departamento encarregado da


entrega dos helicópteros à comissão

Minha despedida dos integrantes do Departamento de Entrega das Aeronaves


(Livraison Helicopter)
502 Aviação no Exército - uma visão histórica

Os franceses
Tenho escutado muitos comentários desabonadores a respeito
dos franceses, normalmente provenientes de pessoas que jamais se re-
lacionaram estreitamente com eles ou só tiveram contatos esporádicos,
sem maior profundidade, e que emitem um juízo açodado. Não comungo
dessas opiniões.
Tive a oportunidade de conviver profissionalmente com repre-
sentantes da Aerospatiale por praticamente três anos, se forem consi-
derados os contatos estabelecidos por ocasião da apresentação das pro-
postas e aqueles decorrentes das reuniões de discussão para elaboração
do contrato. Além disso, estabeleci um grande círculo de amizades na
cidade onde morei. Conheci franceses de todos os níveis.
Ao longo de todo o período de minha chefia da COMFIREMEX,
jamais tive recusada uma solicitação, mesmo que algumas delas tives-
sem sido antecedidas de acaloradas discussões, e as soluções não tives-
sem sido obtidas com a presteza desejada. Os contratos aeronáuticos
envolvem grande complexidade e grandes custos. É normal que a defesa
dos interesses de cada instituição pelos profissionais que as representam
sejam feitas com entusiasmo.
No tocante às atividades das quais participei diretamente, volto
a comentar, a despeito de enfrentar situações de extremo stress, jamais
vi negado ou desrespeitado um direito adquirido pelo contrato cele-
brado. Houve ocasião em que, os leitores devem lembrar, solicitamos
a troca de quatro trens de pouso na mesma aeronave, o que foi feito,
apesar dos custos envolvidos e do atraso decorrente para a recepção da
aeronave. No meu círculo pessoal, incluindo o grande número de amigos
de meus filhos, sempre tive provas de amizade e simpatia. Resolvi fazer
essas considerações por me parecer um dever de justiça tentar desfazer
uma visão, de alguns, que julgo equivocada e, a meu ver, preconceituosa.

O retorno
Retornei ao País em setembro de 1991 com grande desejo e espe-
rança em poder continuar prestando meus serviços à Aviação do Exército,
atividade que ajudei a criar. No entanto, já era, como dizemos, coronel full e
Conclusão da missão 503

ainda não havia comandado. Dessa forma, fui designado para o COTER, onde
desempenhei função sem qualquer correlação com a Aviação, na qual eu
gostaria de ter continuado a ser útil como havia ocorrido até aquela opor-
tunidade. Todavia, uma leva de novos companheiros de grande competên-
cia se encarregava de dar sequência, com o mesmo entusiasmo e dedica-
ção, ao trabalho pioneiro que fora brilhantemente realizado.
Meus laços com a inesquecível Aviação do Exército não se rom-
peram nessa ocasião. Após a conclusão do comando do 1º Regimento de
Cavalaria Mecanizado, situado em Itaqui, no Rio Grande do Sul, unidade
de minha Arma de origem, retornei ao Estado-Maior do Exército para a
mesma 3ª Subchefia em que outrora passei a época mais profícua da mi-
nha vida profissional e onde iniciei minha história com a querida Aviação.
Na ocasião, tive a oportunidade de participar da elaboração da Diretriz
para Prosseguimento da Implantação da Aviação do Exército. Esse foi o
último evento que me ligou à Aviação do Exército. Dessa forma, termina a
minha longa trajetória com a Aviação do Exército. Gostaria que ela tivesse
sido muito mais extensa.
Em 29 de março de 1999, o presidente da República francesa,
Grande Mestre da Ordem Nacional do Mérito, me proporcionou uma
grande honra ao conceder-me o Grau de Cavaleiro. O ato ocorreu oito
anos após o término de minha missão e me provocou enorme surpresa e
orgulho, pois foi uma honraria fruto de trabalho e do respeito profissio-
nal. As minhas relações com o SIAR sempre foram norteadas pelo mais
alto grau de profissionalismo, entendimento e respeito. A concessão da
honraria atesta que nosso trabalho contribuiu de algum modo para o
estreitamento das relações entre o Exército Brasileiro e as Forças Arma-
das francesas.
Sempre fugi dos elogios, mas passei toda a minha vida militar
tentando merecê-los dando o máximo de minha capacidade para o inte-
gral cumprimento de minhas responsabilidades.
Capítulo 27

Necessidade do estabelecimento
de um plano de carreira para a
Aviação do Exército

A o longo dos anos, discute-se a necessidade, ou não, da cria-


ção de uma nova Arma e o consequente estabelecimento
de um plano de carreira específico para a Aviação do Exército. Não raras
vezes, tenho tomado conhecimento do afastamento de pilotos, gerentes e
mecânicos de suas áreas específicas para atuarem em outras totalmente
distintas. A formação do pessoal da Aviação do Exército, além de ser de
alto custo, exige constante prática e atualização, ditadas pelo dinamismo
da atividade aérea. A evolução das aeronaves e equipamentos de apoio e
manutenção, as modificações aportadas continuamente nos manuais de
manutenção e operação implicam a necessidade de permanência na ativi-
dade. No caso dos pilotos, o afastamento da atividade aérea, na falta de um
planejamento que lhe permita a realização de um determinado número de
horas de voo anualmente, pode resultar na perda de sua qualificação para
operação do equipamento, obrigando-o a se requalificar quando retorna a
uma unidade de Aviação. Aduza-se que o custo de formação de um piloto
é particularmente alto. Há a necessidade de uma séria reflexão a respeito.
Por ocasião de minha participação em uma palestra na AMAN
sobre a implantação da Aviação do Exército, o então coronel Bonumá me
506 Aviação no Exército - uma visão histórica

disse: “Silva Maia, vocês não podem deixar que a Aviação se torne uma
casta.” Concordo plenamente. Isso somente poderá ocorrer caso a Avia-
ção do Exército permaneça na situação em que se encontra, uma “espe-
cialidade” que transcende totalmente o conceito que temos a respeito
desse assunto. A criação de uma Arma de Aviação é uma necessidade
decorrente de sua peculiaridade. Parece-me já existir uma anuência tá-
cita do Exército uma vez que que se admite a existência de patrono para
uma atividade que é considerada especialização. Além disso, as unida-
des hoje são denominadas “de Aviação do Exército”, a exemplo das OM
de Infantaria, Cavalaria etc. Talvez se considere que os efetivos atuais
nas OM de Aviação do Exército, que no futuro se expandirão em virtude
de necessidade operacional, não são compatíveis com uma nova Arma.
Lembro, no entanto, que todos os comandos apoiados, a partir do esca-
lão brigada, precisam ter em seus respectivos estados-maiores especia-
listas no emprego das aeronaves, no caso pessoal de Aviação, para o pla-
nejamento das operações nas quais se insira o emprego de helicópteros.
Outro fato a considerar é que o piloto precisa ter certas carac-
terísticas particulares que podem não ser suficientemente trabalhadas
durante os atuais cursos de formação na AMAN.
Também se precisa levar em conta que o militar selecionado para
tornar-se piloto após sua formação não deverá frequentar cursos que lhe
desenvolvam áreas não muito adequados à pilotagem de aeronaves.
A criação da Arma de Aviação no Exército é um assunto contro-
verso e apresenta na atualidade vantagens e desvantagens. Minha afir-
mação considera o fato de que no futuro, com o crescimento das unida-
des de helicópteros, o que me parece inexorável, a nova Arma, em razão
do aumento dos efetivos, se tornará impositiva. Entre as vantagens da
criação da Arma de Aviação, avulta a importância de se entregar às uni-
dades de helicópteros pessoal, oficiais e sargentos, preparado ao longo
do curso de formação para o exercício de suas atividades específicas,
com reflexos positivos na operacionalidade das unidades aéreas. Além
disso, permitirá que o militar de Aviação permaneça em sua atividade
durante toda a sua carreira, evitando-se transferi-lo, como ocorre hoje,
para organismo sem ligação com a atividade, provocando sua desatuali-
zação e a perda de qualificação.
O detalhe a considerar é que as potencialidades a serem de-
senvolvidas em pilotos e mecânicos não são exatamente as mesmas que
Necessidade do estabelecimento de um plano de carreira para a Aviação do Exército 507

aquelas as quais se desejam aos militares das demais Armas. Esse me


parece um argumento que, por si só, já justificaria a nova Arma.
Sabemos que a criação de uma Arma envolve considerações de
toda ordem, inclusive de caráter administrativo. Talvez, essas últimas
sejam o principal obstáculo a transpor. O importante é que não se perca
esse foco e que o assunto, desde já, seja objeto de estudo para no mo-
mento em que a oportunidade se apresente as ações já estejam suficien-
temente amadurecidas. O futuro do País já começa a indicar que ocupa-
remos cada vez mais um lugar de realce no concerto das demais nações.
E não existe nação forte sem Forças Armadas fortes e efetivas. Logo, não
podemos esperar o futuro sem uma antecipada preparação para enfren-
tá-lo. Esse é mais um repto que lanço neste livro. Infelizmente, hoje na
reserva, lançar ideias, desafios, é o máximo aonde posso chegar. Cabe
aos companheiros da saudosa ativa pensar sobre a viabilidade do as-
sunto, ou seja, prospectar nosso amanhã e decidir sobre os destinos do
nosso querido Exército.
O debate está aberto.
Capítulo 28

As consequências da adoção da
Aviação do Exército nas atividades
operacionais e administrativas do
Exército

N ão disponho de todos os dados sobre o assunto. No en-


tanto, não tenho dúvidas sobre as inúmeras e positivas
repercussões que a criação da Aviação do Exército trouxe para a Força
Terrestre.
Sob todos os títulos, ela só gerou benefícios para a Força. Uma
das consequências da adoção de helicópteros no Exército foi a formação
de consciência de que era necessária a especialização de tropa terrestre
para o emprego em operações helitransportadas. No passado, cada
comandante ansiava receber uma aeronave para adestramento de seus
soldados. No entanto, as disponibilidades sempre foram muito inferiores
às necessidades exigidas pelo adestramento. É forçoso reconhecer que
a Força Aérea sempre envidou o máximo de seus esforços para atender
ao Exército, mas vivia com as mesmas limitações em meios e recursos,
restrições essas que eram experimentadas pelas Forças Armadas como
um todo. A criação dos batalhões de Infantaria Leve preencheu a lacuna
existente pela falta de elemento estruturado e organizado em pessoal e
equipamento para esse tipo de missão.
510 Aviação no Exército - uma visão histórica

Certamente, a filosofia de manutenção, que já era desenvol-


vida, sofreu um novo impacto positivo. Não posso emitir juízo sobre a
sua mensuração, pois, lamentavelmente, não pude viver essa realidade
quando retornei da França.
Outro aspecto que acredito haver experimentado uma grande
modernização foi a logística de controle e reposição de suprimentos
que, na Aviação, deve ser feita sob critérios extremamente eficientes,
pois, caso contrário, pode redundar em acidentes, aeronaves indisponí-
veis e custos financeiros consideráveis.
Certamente, outras benéficas consequências advieram com a
criação da Aviação do Exército. Meus conhecimentos não me permitem
chegar mais longe. Acho que fica muito a ser dito, pois tenho a convicção
de que o impacto da chegada da Aviação no Exército foi de uma impor-
tância capital para a evolução da nossa Força. Disso eu tenho certeza
absoluta.
Capítulo 29

A história oral da Aviação


do Exército

N ão poderia deixar de fazer estas considerações a


respeito de algumas declarações contidas no excep-
cional trabalho do coronel Contreiras com as quais não concordei.
Provavelmente, à época em que as entrevistas foram realizadas, os
depoimentos tenham sido prestados sem a expectativa que eles se
tornassem públicos. Algumas já foram impessoalmente rebatidas
ao longo deste livro,
pois poderiam suscitar
ao leitor uma ideia dis-
torcida da realidade. Os
reparos quando reali-
zados não fizeram qual-
quer alusão à fonte e não
desmerecem, em hipó-
tese alguma, a elogiável
e brilhante iniciativa do
coronel Contreiras, que
se limitou a reprodu-
O coronel Contreiras, na época tenente, é o pri- zir os testemunhos que
meiro à direita lhes foram prestados.
512 Aviação no Exército - uma visão histórica

Ao abordarmos a qualificação do nosso pessoal já manifestamos


a discordância em relação aos comentários sobre a desconformidade do
curso de gerente. Demonstrei que as afirmações me soaram completa-
mente inapropriadas em função do curto lapso de tempo concedido às
demais Forças Singulares para reagirem às nossas solicitações. Elas se
envolveram completamente com o propósito de fazer o melhor para nos
atenderem. Os objetivos foram plenamente atingidos, como bem carac-
teriza o alto padrão de eficiência demonstrado pelo pessoal da Aviação
do Exército ao longo de todos esses anos.
Quando me referi à doutrina, tive também a oportunidade para
me contrapor a outra afirmação de que nossa Aviação nascia sem res-
paldo doutrinário, ao demonstrar que as bases já tinham sido lançadas
antes da sua criação.
Maior estranheza me causou um comentário partido de inte-
grante da Comissão Especial de Licitação quando, inicialmente, se avoca a
responsabilidade sobre atos que jamais foram fruto de ação isolada. Como
já afirmei, o trabalho da Diretoria de Material de Aviação do Exército ao
longo do processo de aquisição dos helicópteros foi realizado em equipe
como sói acontecer nas atividades realizadas no âmbito da nossa Força. Se
alguém poderia destacar, com justiça, uma atuação individual seria a do
general Bulcão, que assumiu a responsabilidade das decisões sobre todas
aquelas tomadas no âmbito da diretoria. Confunde-se também o entrevis-
tado ao afirmar que havia uma tendência para determinado concorrente,
o que não identifiquei na ocasião e, se o tivesse constatado, o afastaria de
imediato dos trabalhos da comissão, medida que tenho a plena convicção
de que seria totalmente apoiada pelo general Bulcão.
Fora essas observações, só me resta mais uma vez enaltecer o
trabalho do coronel Contreiras, fruto de seu esforço pessoal, do qual al-
guns trechos encontram-se reproduzidos neste livro.
Capítulo 30

Conclusão

P rocuramos transmitir ao longo dessas linhas uma visão


particular dos eventos ocorridos durante a fase de im-
plantação da Aviação do Exército.
Conforme já explicitado anteriormente, não me assola a velei-
dade de me arrogar como o dono da verdade, Por essa razão, tive o cui-
dado de pedir às pessoas que estiveram envolvidas nos fatos narrados
uma revisão sobre o contido neste livro.
Infelizmente, não pude ouvir todos, pois alguns dos pioneiros,
em particular, ex-integrantes das Comissões de Implantação, já falece-
ram. Meu principal escopo, como já afirmei anteriormente, é resgatar
uma página importante da história do nosso glorioso Exército que es-
tava “adormecida”. Espero ter colaborado para tal. Gostaria de ter dito
mais. No entanto, minha memória de muitos eventos se esvaneceu, e eu
não pude recuperar muitos fatos que ocorreram no período.
Além disso, eu precisava concluir o livro que para mim já estava
se tornando uma obra de igreja. Segundo Pablo Neruda “é facil a mis-
são de escrever um livro. Basta iniciar por uma letra maiúscula, termi-
nar com um ponto e em seu corpo recheá-lo com ideias”. Concordo em
parte com a definição. As tarefas de iniciar este livro e alimentá-lo com
ideias não foi tão difícil como terminá-lo. Precisei de muita coragem e
determinação para fazê-lo. Sempre que o reli achei que poderia agregar
514 Aviação no Exército - uma visão histórica

mais alguma informação, o que me levava a postergar a conclusão. Não


poderia fazer da minha hesitação um moto perpétuo, e tomei, enfim, a
decisão de concluí-lo.
Deixo aos companheiros que viveram a criação da Aviação a
oportunidade de preencher as lacunas que eu tenha deixado ao tentar
reviver a nossa saga como participantes de uma das mais significativas
etapas vividas pela nossa querida Força. Espero que algum “Asa” se dis-
ponha a prosseguir na tarefa de mostrar como é de fundamental impor-
tância a nossa Aviação do Exército e leve para o papel a história de seus
feitos a partir de 1991 até os nossos dias para que ela não se perca, como
ocorreu com a memória de sua criação.
Assume-me a estranha sensação de haver encerrado este livro
sem conseguir chegar ao seu final. Tenho o sentimento de haver cumprido
a missão de modo incompleto. Entretanto, já estava na hora de parar. Dessa
forma, concluo-o pelo menos com a satisfação de haver recuperado uma
parte de uma das mais lindas e importantes páginas da história do Exército
e lamento profundamente não ter podido fazer mais. Perdoem-me.
Procurei cometer o mínimo de imprecisões. Para tal, antes da con-
clusão do livro, o distribuí a algumas pessoas a fim de que elas aportassem
as correções, inclusive de estilo e gramaticais, julgadas necessárias.
Reconheço que diversos fatores, entre eles a falta de fonte de
pesquisas e a dificuldade de estabelecer contatos com os integrantes das
primeiras turmas de pilotos, gerentes e mecânicos, deixarão espaços a
serem preenchidos. Que eles sirvam de estímulo para que novas incur-
sões literárias sobre este apaixonante tema, “A incorporação de meios
aéreos ao Exército Brasileiro”, ocorram. Certamente, este livro não es-
gota o assunto e não reproduz todos os eventos ocorridos na ocasião.
Neste momento, lamento mais uma vez não ter me transformado no mo-
mento oportuno em cronista diário dos eventos desde os primeiros atos
que embalaram o nascimento do nossa Aviação do Exército.
Aviação!
Anexo 1

Anexos ao Relatório da Comissão para Estudar a Implantação


da Aviação do Exército

ANEXO A – DOUTRINA
1. FINALIDADE
Apresentar, de forma conclusiva, o resultado do trabalho da
equipe, relativo aos aspectos doutrinários para a implantação da Avia-
ção do Exército.
2. DESENVOLVIMENTO
a. Consideração geral
1) Preliminarmente, a equipe realizou intensa pesquisa bibliográ-
fica em variadas fontes de consulta nacional (monografias e trabalhos do
EME) e estrangeira (manuais e publicações especializadas) sobre o assunto.
2) A viagem de estudos, realizada às bases aéreas da FAB de
SANTA MARIA e de SANTOS e à Base Aeronaval de S. PEDRO DA ALDEIA,
propiciou a insubstituível oportunidade de aquisição de ensinamentos,
aumentando a soma de conhecimentos na área em estudo.
b. Missão da Aviação do Exército
1) Estudos iniciais induziram à necessidade de se definir a Mis-
são Geral, as Missões Básicas e as Missões Especiais, inseridas no largo
espectro da missão a ser cumprida pela Aviação do Exército.
516 Aviação no Exército - uma visão histórica

2) Para a definição da missão geral duas considerações funda-


mentais foram levadas em conta:
– o aumento da capacidade operacional da F Ter quando dotada
de aeromobilidade;
– a necessária integração a todas as ações que envolvem a F Ter.
3) Missão Geral
Proporcionar aeromobilidade à Força Terrestre, nas ações de
combate, de apoio ao combate e de apoio administrativo, aumentando
sua capacidade operacional.
4) Quanto às missões básicas, foram considerados principal-
mente os seguintes aspectos:
– execução de missões táticas integradas à manobra terrestre;
– missões que possibilitem ao Cmt da F Ter executar ações de
manobrar, de aplicar fogos, de observar, reconhecer, comandar e contro-
lar e de Ap Adm;
– limitações inerentes ao Hlcp que impõe um emprego racional
do mesmo.
5) Missões Básicas
– Assalto Aeromóvel
– Ataque: contra carros, contra tropa, contra instalações etc.
– Reconhecimento e Segurança
– Ligação e Observação
– Comando e Controle
– Operações de Guerra Eletrônica
– Apoio Logístico
6) Por não estarem, normalmente, ligadas às operações con-
vencionais foram identificadas como especiais, missões nas quais avulta
de importância o emprego do Hlcp.
7) Missões Especiais
– Infiltração e Exfiltração
– Operações Contraguerrilhas
– Operações Psicológicas
– Operações de ACISO
– Outras
c. Estrutura Geral da Aviação do Exército (Ap 1 e 2)
1) Sugerimos que o EME, como responsável pela implantação
da Aviação do Exército, constitua uma Comissão (Grupo ou Núcleo) para
Anexo 1 517

a execução da mesma integrando-a à 3ª SCh; tal Comissão deverá iniciar


suas atividades o mais cedo possível, colocando em execução o Plano de
Implantação da Aviação do Exército.
2) Na estrutura geral apresentada (Ap 1 e 2) os seguintes as-
pectos foram observados:
– adequação à atual estrutura do Ministério do Exército, sem
introduzir sensíveis modificações na mesma;
– organização inicial reduzida, com possibilidade de ampliação;
– implantação gradativa, com vistas a providências relativas à
pessoal, material e desenvolvimento da doutrina;
– vinculação com a estrutura departamental (DEP e DMB) su-
bordinação de U operacional a um Cmdo Mil A;
– apoio da FAB e da Marinha;
– centralização dos meios pelo menos inicialmente;
– organização, ao final de uma primeira etapa, que integre uma
OM operacional, uma infraestrutura adequada de manutenção e para a
formação de pilotos e mecânicos.
3) A criação, inicialmente, do Batalhão de Aviação do Exército
(BAvEx) levou em conta, basicamente, as considerações abaixo:
– aproveitamento da infraestrutura de ensino (instrução) da
FAB e da Marinha para a formação inicial de pilotos e mecânicos;
– ativação, no mais curto prazo, de frações operacionais para o
apoio a um Grande Comando;
– aplicação, o mais cedo possível, da doutrina de operações ae-
romóveis a ser desenvolvida e, em consequência, a sua avaliação;
– aquisição inicialmente de Hlcp para o assalto aeromóvel que
por suas características o identificam como aeronave de emprego geral;
– possibilidade de tornar os pilotos operativos em OM de Avia-
ção do Exército, o que resultará em reais benefícios para a consolidação
de uma mentalidade operacional para a Aviação do Exército;
– aquisição de experiência pelos pilotos que irão compor o fu-
turo quadro de instrutores do CIAvEx.
d. Escalões de Emprego
Os meios aéreos do Exército estarão subordinados a um
Cmdo Área, podendo aquele G Cmdo pô-los em apoio às suas DE, ou
mesmo, às suas Bda.
e. Batalhão de Aviação do Exército (BAvEx)
518 Aviação no Exército - uma visão histórica

1) Missão
Apoiar o Grande Comando, principalmente na execução de
ações de assalto aeromóvel, comando e controle, ações anticarro, ata-
que ao solo reconhecimento e segurança, observação e limitado Ap Log.
2) Possibilidades
– Proporcionar meios aéreos para a execução do assalto aero-
móvel com valor de um BI, em uma só vaga;
– Realizar o combate anticarro em ações independentes ou com
frações de tropa anticarro;
– Proporcionar escolta armada e apoio de fogo aéreo limitado
às operações aeromóveis;
– Realizar o reconhecimento e a segurança em ações indepen-
dentes ou em combinação com unidades de Cavalaria;
– Vigiar extensas áreas, como elemento de economia de forças;
– Proporcionar meios aéreos para as ações de comando e controle;
– Proporcionar meios aéreos para a execução de golpes de mão,
infiltração e exfiltração;
– Proporcionar meios aéreos para uma reação rápida da F Ter,
deslocando reservas e limitados meios de apoio de fogo;
– Proporcionar limitado apoio aéreo para os trabalhos de en-
genharia;
– Realizar, de forma limitada, o apoio logístico;
– Realizar evacuação aeromédica;
– Quando dotado de equipamento adequado, participar de ope-
rações de Guerra Eletrônica;
– Participar de operações de Defesa Interna, particularmente
nas ações contraguerrilha;
– Proporcionar meios aéreos para operações psicológicas;
– Realizar de forma limitada, a. manutenção, ressuprimento e
recuperação de suas aeronaves;
– Instalar e operar um aeródromo de campanha para Hlcp;
– Realizar a defesa imediata de suas instalações.
3) Limitações
– Atuação dependente das condições meteorológicas adversas;
– Elevado consumo de combustível;
– Necessidade de pessoal e equipamento altamente especiali-
zado para operar e manutenir os helicópteros;
Anexo 1 519

– Elevada fadiga das tripulações, particularmente dos pilotos,


pelo tipo de voo rente ao solo;
– Vulnerabilidade ao poder aéreo, à defesa aérea e às medidas
de guerra eletrônica;
– Necessidade de coordenação no uso do espaço aéreo;
– Dificuldades relacionadas com o·ocultamento e disfarce das
aeronaves;
– Necessidade de uma estrutura especializada de apoio em ter-
ra para as operações dos helicópteros;
– Necessidade de treinamento especializado da tropa que atua
em combinação com os seus meios.
4) Estrutura Organizacional (Ap 3)
a) Além do Cmdo e seu EM, o Batalhão de Aviação do Exército
(BAvEx) integra:
– uma CCSv, com organização e encargos semelhantes a uma SU
de OM operacional valor U;
– uma Cia Mat Bel, destinada a prover a manutenção e supri-
mento do material de Aviação ao Btl;
– uma Cia Seg organizada com o fim de proporcionar meios de
controle de voo, combate a incêndio e segurança das instalações;
– três Cia Hlcp, contando cada uma com três Pel Man e um Pel Rec Atq.
b) Para a organização da Cia Hlcp, os seguintes fatores foram
considerados:
– prioridade, no caso brasileiro, à semelhança de outros países
do continente, para a missão de assalto aeromóvel;
– essa prioridade decorre de características próprias do teatro
de operações continental, onde avultam os rios caudalosos, os grandes
espaços e uma deficiente rede de rodovias;
– a atribuição para um mesmo Hlcp de missões, como Rec e Atq,
observada em vários exércitos, mesmo de países desenvolvidos, repre-
sentando uma solução doutrinária viável, como alternativa ao Hlcp des-
tinado exclusivamente ao ataque (AC principalmente), considerando o
seu alto custo de aquisição;
– atribuição de um número de Hlcp ao Pel Man suficiente para
o transporte de um Pel/Cia Fzo;
– constituição do Pel Rec Atq com três seções a Hlcp cada, de
modo a atuarem aos pares e em apoio a cada Pel Man.
520 Aviação no Exército - uma visão histórica

f. Diretriz para os OBO


1) A elevada complexidade que envolve o estabelecimento dos
OBO de Hlcp não permitiu, dentro do prazo concedido para a conclusão
dos trabalhos, que a equipe estabelecesse esses objetivos conforme a
sistemática preconizada nas IG 10-36.
2) Contudo, a apreciável soma de conhecimentos já acumulada
possibilita a definição de uma diretriz para os OBO de Hlcp, consubstan-
ciada nas principais condicionantes doutrinárias e operacionais e nos
requisitos mais importantes que os Hlcp devam atender.
3) Condicionantes Doutrinárias
a) O EB consciente de que a aeromobilidade nos modernos
campos de batalha é imprescindível para o sucesso das operações da F
Ter organizará sua Aviação, tendo como OM operacional o Batalhão de
Aviação do Exército.
b) Dentre as missões atribuídas a esse Btl, avultam de impor-
tância as de Assalto Aeromóvel e de Reconhecimento e Ataque, nesta
ordem de prioridade.
c) A realização do Assalto Aeromóvel pressupõe a disposição
de Hlcp de manobra com capacidade de transportar um GC completa-
mente equipado.
d) No Assalto Aeromóvel, é importante que seja mantida a inte-
gridade do GC, da mesma forma que num mesmo Hlcp não sejam trans-
portados GC de Pel distintos.
e) Embora a execução do Assalto Aeromóvel, normalmente, não
implique na conquista do objetivo, e sim sua ocupação, deve-se conside-
rar a possibilidade de atuação do Ini sobre os Hlcp que realizam o assalto.
f) Os Hlcp de Rec e Atq, numa operação de Assalto Aeromóvel,
têm a missão de realizar a escolta dos Hlcp de Assalto e preparam a área
de desembarque, pela execução de fogos de saturação, desobstruindo
ou neutralizando a defesa Ini.
4) Condicionantes operacionais
– A área do Teatro de Operações continental é caracterizada
pela presença de rios caudalosos, grandes espaços vazios e deficiente
rede rodoviária;
– Essa característica exige que o Cmt da F Ter disponha de
meios que lhe proporcionem grande mobilidade e flexibilidade na con-
dução de suas operações;
Anexo 1 521

– Mesmo em termos de América do Sul, os principais países já


dispõem de Aviação orgânica do Exército, que lhes confere aeromobili-
dade própria às suas respectivas forças.
5) Características dos Hlcp para atender às principais missões:
a) Assalto Aeromóvel
– Transportar um grupo de combate equipado;
– Ser dotado·de boa manobrabilidade;
– Servir como plataforma de armas de saturação;
– Possibilidade de atuar como helicóptero utilitário;
– De preferência biturbinado;
– Baixa silhueta.
b) Reconhecimento e Ataque
– Servir de plataforma de armas de saturação e de mísseis AC;
– Ter capacidade para operar sob condições atmosféricas ad-
versas;
– Oferecer relativa proteção blindada para a guarnição e compo-
nentes sensíveis, compartimentos de munição e tanques de combustível;
– Capacidade de executar os voos de contorno e tático;
– Oferecer baixa assinatura visual, acústica, antirradar e infra-
vermelha;
– De preferência biturbinado.
3. CONCLUSÃO
a. As propostas apresentadas no presente trabalho estão cal-
cadas em conhecimentos doutrinários adquiridos, principalmente, em
manuais de outros exércitos e publicações especializadas estrangeiras,
bem como na experiência da nossa Marinha e da FAB.
b. Cumpre ressaltar, contudo, que não se tratou de simples có-
pia de fontes de consulta. Muito mais do que isso, os estudos em tela
buscavam, dentro da realidade e peculiaridades do EB, lançar as bases
para a Doutrina da Aviação do Exército Brasileiro.
c. A equipe de doutrina, consciente de sua interação com as de-
mais equipes, em todas as fases do trabalho, manteve permanente con-
tato com os demais integrantes da Comissão, trocando ideias, discutin-
do e colhendo subsídios e assessorando.
d. É importante que seja enfatizada a necessidade do prosse-
guimento dos estudos, com o objetivo de se desenvolver a doutrina de
emprego da Aviação do Exército e os seus reflexos no Ap Adm. Sem essa
522 Aviação no Exército - uma visão histórica

providência, seguramente, corremos o sério risco de ter o Hlcp, saber


voar, fazê-lo voar, mas não empregá-lo adequadamente no contexto ope-
racional da F Ter.
e. Para a consecução do objetivo mencionado no item anterior,
os estágios em Centros de Doutrina de Aviação do Exército de outros pa-
íses serão, sem dúvida, um instrumento de real valor a ser considerado.
f. Finalmente, mas não menos importante, é conveniente que a
Comissão de Implantação da Aviação do Exército seja estruturada para
responder a essa preocupação, de forma que paralelamente à implanta-
ção do núcleo do BAvEx esteja sendo desenvolvida a doutrina da Avia-
ção do Exército.
Anexo B – Pessoal

1. FINALIDADE
Apresentar, sob a forma de trabalho de estado-maior os estudos so-
bre a área de PESSOAL, para a implantação da Aviação do Exército (Av Ex).
2. IMPORTÂNCIA
A componente “PESSOAL” constitui-se na de maior preocupa-
ção para a Implantação da Aviação do Exército (Av Ex).
Os altos custos envolvidos, o caráter eminentemente técnico da ati-
vidade, a necessidade do profundo conhecimento do emprego do material
e da Força a ser apoiada, a exigência da “criação” de uma “mentalidade de
aviação” intimamente compromissada com a segurança colocam o setor de
PESSOAL em evidência, quanto à qualidade do desempenho futuro da AvEx.
A variada gama de missões a serem desempenhadas e o relevo
das funções daqueles que, em terra, “fazem voar” – mecânicos, contro-
ladores de voo etc. –, permitindo o eficiente desempenho operacional,
indicam a necessidade de formar um todo homogêneo, direcionado a
um único objetivo:
– “ALÇAR, COM EFICIÊNCIA E SEGURANÇA, A F TER À 3ª DI-
MENSÃO DO MODERNO CAMPO DE BATALHA.”
3. GENERALIDADES
A preparação do “PESSOAL” para atendimento às necessidades
da implantação da Av Ex compreende as ações de:
524 Aviação no Exército - uma visão histórica

– RECRUTAMENTO
– SELEÇÃO
– FORMAÇÃO
– ADESTRAMENTO
Desenvolver-se-á, a princípio, em duas fases:

Recrutamento Seleção Formação Adestramento

Exército
1ª fase Marinha Mar
Exército Marinha
1986-1991 FAé FAé
Força Aérea

2ª fase
Exército Exército Exército Exército
1992-1995

Considera-se como factível e fundamental na 1ª fase o apoio


das demais Forças Singulares, mormente nas ações de seleção e forma-
ção do pessoal.
Espera-se que na 2ª fase possa o Exército absorver todos os en-
cargos envolvidos na capacitação do pessoal.
As fases são estimadas, devendo o início da 2ª fase subordinar-
se à avaliação crítica à época do estágio de desenvolvimento alcançado
pela AvEx.
4. AÇÕES A REALIZAR NA lª FASE
a. Recrutamento
1) Tipos: voluntário e compulsório
a) Análise

Voluntário Compulsório

Vantagens: Vantagens:
– Comunhão de interesse entre a instituição – Não visualizadas
e o candidato com o consequente
comprometimento de desempenho pelo último.
Anexo B – Pessoal 525

– Aferição pela instituição da receptividade Desvantagens:


do público interno à implantação da Aviação – Não atende aos
do Exército. interesses da
– Forma prioritária adotada pelo Exército instituição.
Brasileiro. – Desmotivação.
– Tempo curto de
permanência na
atividade.

b) Proposta
Adotar o recrutamento em caráter “VOLUNTÁRIO”.

2) Universo a recrutar

Carreira Temporário
Vantagens: Vantagens:
– Mentalidade militar; – Menor custo na formação do
– Homogeneidade na formação Piloto “não operacional”;
militar; – Evitar a ocorrência de claros
– Vivência no emprego da F Ter de oficiais da ativa;
pelo – Grande contingente disponível;
exercício da carreira na tropa; – Preparação de reserva.
– Possibilidade de permanência Desvantagens:
maior no serviço ativo, compensando – Formação militar heterogênea;
os altos custos de formação; – Menor conhecimento do
– Possibilidade de acesso à EsAO e emprego da F Ter;
ECEME, fundamental ao – Necessidade de curso específico
conhecimento do emprego dos para nivelamento de
diversos escalões da Força; conhecimentos doutrinários;
– Possibilidade de exercício, na – Tempo de permanência em serviço
AvEx, de cargos de Of Sup e General; ativo reduzido;
– Facilidade de recrutamento; – Baixa relação custo x benefício
Desvantagens: quando confrontada com o
– Torna necessária a compatibil- tempo de permanência em Sv ativo;
idade dos efetivos formados pela – O conhecimento de pilotagem
AMAN para atendimento às novas civil anterior não exclui a necessidade
necessidades; de curso de formação de piloto
– Inicialmente, acarretará claros militar;
em OM de tropa. – Constatação pelas demais forças
da deficiência como piloto operacional;
526 Aviação no Exército - uma visão histórica

– Constatação pelas demais forças


da deficiência como piloto
operacional;
– Decorrente da situação militar
(caso do piloto civil-Reserva da
FAB).

c) Civil
Como os oficiais temporários são oriundos do meio “civil”, con-
sidera-se esta categoria já analisada.
d) Quadro Complementar
O quadro ainda não foi objeto de regulamentação, o que impe-
de sua análise nesta fase.
e) Proposta
O universo da ativa satisfaz às necessidades da AvEx, principal-
mente na fase de implantação. Apresenta vantagens significativas em
relação às demais possibilidades de recrutamento.
Considere-se, ainda, que o temporário, no caso do oficial, conforme
declarações obtidas nas demais F Sing, somente tem se mostrado eficiente
no desempenho da atividade de instrutor de pilotagem. O interesse de voar
o máximo possível, visando à formação de currículo que o habilite ao exercí-
cio de atividade civil posteriormente, é característico no oficial temporário.
Sua atuação no emprego operacional tem sido passível de restrições. Acres-
ça-se, em relação aos oficiais temporários, que a habilitação técnica em pilo-
tagem não exclui a necessidade de formação tática, que envolve altos custos
e representa período significativo na formação do piloto operacional.
3) Responsabilidade de Execução.
A responsabilidade exclusiva pelo recrutamento caberá ao
Exército. A sistemática a ser adotada deverá ser aquela atualmente
aplicável para o recrutamento de pessoal aos cursos de especialização na
F Ter, consideradas as peculiaridades e exigências da atividade da Aviação
do Exército (Av Ex) em seus múltiplos aspectos.
b. Seleção
1) Premissa Básica
O recrutamento far-se-á em torno, exclusivamente, do universo
de “militares de CARREIRA”.
2) Responsabilidade
Anexo B – Pessoal 527

Do Exército, com execução nas demais Forças Singulares, ini-


cialmente, da avaliação psicológica e de saúde.
3) Hipóteses de Execução
Considerando a inexistência, no Exército Brasileiro, de sistema
de seleção para pessoal aeronavegante e especialistas em aviação, é im-
prescindível o apoio das estruturas destinadas a este fim existentes nas
demais Forças Singulares.
Configuram-se, assim, como hipóteses possíveis, o aproveita-
mento dos sistemas de seleção da:
a) Marinha
b) Força Aérea
c) De ambas as forças simultaneamente
d) Estruturação de sistema próprio
A adoção das possibilidades definidas nas letras a) e b) e c) su-
bordinam-se à análise sobre a sistemática de seleção nas outras Forças
Singulares. O aproveitamento simultâneo de suas estruturas se sujeita à
compatibilidade das exigências na seleção em cada Força.
No tocante à letra d), considera-se como a opção mais desvan-
tajosa, no momento, face à inexistência de estrutura adequada e de pes-
soal habilitado para compor juntas de seleção de pessoal para ativida-
des de aviação.
4) Critérios a adotar
a) Avaliação
– Psicológica
– Saúde
b) Aptidão
– Física
c) Outras condições
(1) Para oficiais
– Coerência com a Política de Pessoal do Ex
– Para 1º Ten (*)
(*) Inicialmente far-se-á necessária a seleção de oficiais dos
postos de Capitão e Superior para o desempenho de funções no Btl de
Aviação, no órgão de apoio (Diretoria de Aviação) e no Centro de Instru-
ção de Aviação do Exército (CIAvEx).
(2) Para graduados
– 3º Sgt recém-concludentes de escolas de formação (Escola de Ma-
terial Bélico (EsMB) e Escola de Comunicações (EsCom), para a área de Mnt.
528 Aviação no Exército - uma visão histórica

– 3º Sgt recém-concludentes de curso de especialização em ra-


dar, para a área de controle de voo.
– Habilitação em áreas que permitam adaptação à atividade aérea.
5) Proposta
Utilização dos sistemas de seleção já existentes. O aproveita-
mento simultâneo subordina-se à compatibilidade e uniformidade dos
critérios adotados pelas Forças Singulares.
Simultaneamente, o Exército deverá estruturar-se de modo a
poder realizar, a médio prazo, a seleção completa de seu pessoal.
O alto custo envolvido na formação de pessoal de Aviação torna
necessária a elaboração de legislação definidora do tempo mínimo em
serviço ativo no desempenho de cargo ligado à Aviação do Exército após
a formação (especialização). O período mínimo de cinco anos é proposto
considerando ser o adotado pelas demais Forças Singulares.
Tal medida – elaboração de legislação – torna-se necessária,
principalmente no caso de “oficiais temporários” (quando recrutados) e
graduados mecânicos, segmentos nos quais se situam a maior “evasão”
na Marinha e Força Aérea.
c. Formação (pilotos e graduados especialistas)
1) Sistemática adotada nas outras Forças Singulares
a) Na Marinha de Guerra
(1) OM formadora: Centro de Instrução e Adestramento Aero-
naval (CIAAN).
(2) Missão:
Aperfeiçoar, especializar e subespecializar oficiais e praças
para o exercício das atividades inerentes à Aviação Naval.
(3) Cursos
(a) Aperfeiçoamento de oficiais
Requisito: Oficial da Marinha
Condições físicas e psicológicas – exames realizados na Junta
Especial de Saúde do Pessoal Aeronavegante (Jespa) e Serviço de Sele-
ção do Pessoal Aeronavegante (SSPM).
Propósito: Aperfeiçoar o oficial para operação de helicópteros da
Marinha e seus sistemas de armas para o desempenho de funções técni-
cas, operacionais e administrativas relacionadas com a aviação naval.
Duração: 52 semanas (1.036 horas)
(b) Especialização p/praças
(1.1) Motores de Aviação (MV)
Anexo B – Pessoal 529

Requisito: Marinheiro de máquinas. Propósito: Qualificar ao


exercício de funções relacionadas com manutenção de helicópteros. Ha-
bilitar as funções auxiliares de manutenção e realização de manutenção
de pista (fiel de aeronave).
Duração: 24 semanas
(1.2) Manobra e equipamento de aviação (QV) Requisito: Mari-
nheiro de armamento e convés
Propósito: Habilitar a orientar operações de aeronaves em
pouso e decolagem; executar combate a incêndio e a manter e reparar
equipamentos e materiais de voo e sobrevivência
(1.3) Estrutura e Metalurgia (SU)
Requisito: Marinheiro de máquinas
Propósito: Qualificar para o exercício de funções de manuten-
ção de helicópteros e auxiliar na execução de reparos estruturais e hi-
dráulicos; realizar Mnt de pista (fiel de aeronave) Duração: 24 semanas
(1.4) Aviônica (VN)
Requisito: Marinheiro de operações
Propósito: Qualificar ao exercício de funções nas áreas de eletrici-
dade, eletrônica e instrumentos de aeronaves. Habilitar à função de auxiliar
de todos os escalões de Mnt, em aviônica, exequíveis na aviação naval
Duração: 19 semanas
(1.5) Conclusão Parcial
Os cursos de especialização para praças de ClAAN destinam-se
a habilitar o marinheiro com qualificação anterior afim. Visam, basica-
mente, a adaptá-lo como auxiliar de Mnt de aeronaves (Hlcp) nos níveis
da Força Aeronaval e habilitá-lo à função de mecânico de pista (1º esca-
lão). Concede ao marinheiro condições de acesso a 3º Sgt.
(c) Cursos de aperfeiçoamento para praças
Os cursos de aperfeiçoamento para praças constituem-se em
extensão dos cursos de especialização realizados pelo CIAAN.
Abrangem as mesmas áreas e destinam-se exclusivamente a 3º
Sgt já especializados.
(1.1) Motores
Requisito: 3ª Sgt de motor de aviação
Propósito: Qualificar a todos os níveis de Mnt e ao exercício de
funções de “líder”, coordenador e supervisor de serviços de manutenção.
Duração: 22 semanas
(1.2) Manobra e equipamentos (RV)
530 Aviação no Exército - uma visão histórica

Requisito: 3º Sgt de Manobra e Equipamento de voo


Propósito: Qualificar à supervisão e orientação de atividades de
pouso e decolagem, abastecimento, segurança de aeródromo e heliporto.
Exercer liderança de equipes de salvamento e combate a incêndio.
Duração: 22 semanas
(1.3) Estrutura e Metalurgia (SV)
Requisito: 3º Sgt de estrutura e metalurgia de aviação.
Propósito: Qualificar nas atividades de inspeção de estruturas,
investigação de corrosão, coordenação e supervisão de serviços de Mnt.
Duração: 22 semanas
(1.4) Aviônica
Requisito: 3º Sgt de aviônica
Propósito: Qualificar à inspeção, operação e realização de tes-
tes; pesquisar avarias e supervisionar a manutenção de aviônica.
Duração: 29 semanas
(1.5) Conclusão Parcial
Os cursos de aperfeiçoamento assumem caráter de comple-
mentaridade em relação aos de especialização. Habilitam somente 3º
Sgt, com especialidade em aviação, ao desempenho de atividades, na
área de Mnt, em nível não obtido nos cursos de especialização.
(d) Cursos de Subespecialização
Destinam-se à qualificação de praças, com especialização an-
terior em aviação ou radar. Compreendem atividades de apoio ao voo.
(1.1) Equipamento de voo e sobrevivência Requisito: Praças
das especialidades de aviação
Propósito: Qualificar para manter, instalar, substituir, estocar e
orientar o uso de equipamentos de voo e sobrevivência.
Duração: 16 semanas
(1.2) Controle de voo
Requisito: Praça operadora de radar
Propósito: Qualificar praças para operar torre de controle, con-
trolar e orientar tráfego e pilotos.
(e) Cursos expeditos (de interesse para a Aviação do Exército)
de curta duração
Combate a incêndio de aviação (Of e praças)
Combustíveis de aviação (praças)
– Preparação de instrutores (Of e praças)
– Manobra de helicópteros (Of e praças)
Anexo B – Pessoal 531

– Semicondutores (praças)
– Inglês Técnico (Of e praças)
– Solda em aeronaves (praças)
– Metalurgia básica em aviação (Of e praças)
– Controle de corrosão em aeronaves (Of e praças)
– Segurança de aviação (Of e praças)
(4) Conclusão Parcial quanto à Formação na Marinha
(a) O curso de formação de oficiais pilotos na Marinha, à seme-
lhança do que ocorrerá em relação ao pessoal destinado à Aviação do
Exército, habilita militares sem quaisquer conhecimentos anteriores em
operação de helicópteros (teórica ou prática). O aproveitamento pelo
Exército é perfeitamente pertinente e exequível na medida em que não
exigirá adaptação significativa do currículo do CIAAN.
O recebimento pela Marinha de novos helicópteros, em 1986, e
a atual disponibilidade em instrutores deixa antever a possibilidade de
aquele Centro apoiar o Ex na formação de pilotos.
(b) No tocante à formação de graduados mecânicos, ressaltam os
dois níveis de formação; o primeiro, destinado a habilitar marinheiros às
funções de auxiliar de manutenção e de mecânico de 1º escalão (fiel); o
segundo, com caráter complementar, aperfeiçoa o marinheiro especialis-
ta, alçado à graduação de 3º Sgt, habilitando-o ao exercício da função de
mecânico nos escalões da Força Aeronaval. Os cursos de Subespecializa-
ção e expeditos completam as necessidades de técnicos para apoio ao voo.
Esta sistemática constitui-se adequada às necessidades da F Ter.
b) Força Aérea Brasileira (FAB)
(1) Pilotos
(a) OM formadora: 1º/11º GAv (Santos/SP)
(b) Desenvolvimento da formação
A formação de piloto de helicóptero na FAB é dividida em duas
etapas, envolvendo conhecimentos de caráter técnico e tático.
Em função de sua formação acadêmica, o oficial da FAB, futuro
piloto de helicóptero, ao iniciar o curso leva em sua “bagagem” profissio-
nal qualificações sobre ambientação aérea, voo por instrumentos e no-
ções teóricas sobre aviação que correspondem no curso similar realizado
na Marinha (CIAAN) à fase teórico-prática, com duração de 26 semanas.
(c) Conclusão Parcial
(1.1) O curso de formação de pilotos na FAB encontra-se
532 Aviação no Exército - uma visão histórica

estruturado para a formação de pilotos de helicóptero com conhecimentos


teórico-práticos de aviação.
(1.2) Para o atendimento das necessidades da F Ter, será impositiva
uma reformulação do currículo com aumento de aulas teóricas e práticas.
(2) Especialistas (graduados)
(a) OM formadora: Escola de Formação de Sargentos Especia-
listas (Guaratinguetá/SP) e 1º/11º GAv/Santos.
(b) Requisitos: Exame de seleção
Exame físico e psicológico
(c) Duração: 2 (dois) anos e 3 meses
(d) Desenvolvimento da Formação
(1.1) Na Escola de Guaratinguetá são formadas todas as espe-
cialidades de sargentos necessárias aos quadros da FAB.
(1.2) No tocante a graduados, que atuarão na área de helicópte-
ros, consideram-se 2 fases distintas:
1ª Fase – Estágio Realizado no 1º/11 GAv Santos, durante o 4º
semestre de formação.
2ª Fase – Após a conclusão do curso em Guaratinguetá, curso
de 3 (três) meses em Santos/SP.
(e) Conclusão Parcial
Tendo em vista as necessidades iniciais do Exército e a estru-
tura de formação da FAB, apresenta-se como exequível solicitação de
vagas e a formação de graduados do Ex na Força Aérea.
(3) Conclusão da Formação na FAB
(a) O curso de formação de pilotos na FAB necessitará de adap-
tação do currículo, com acréscimo significativo de instruções teórico
-práticas para atendimento das necessidades de formação do Exército.
(b) Uma vez que na FAB os graduados são formados para atuar prio-
ritariamente na área de aeronaves de asas fixas e que a formação específica
para Hlcp somente se faz no 4º Sem de sua formação, necessitando posterior
complementação por 3 meses em Santos/SP, no 1º/11º GAv, a formação de
graduados do Ex na FAB, ainda que sólida, estará eivada de conhecimentos
desnecessários ao desempenho de funções na Aviação do Exército.
2) Áreas de Formação Necessárias
a) Para Oficiais
(1) Pilotagem
(2) Medicina de Aviação
Anexo B – Pessoal 533

(3) Especialistas (manutenção, suprimento, armamento comu-


nicações, eletrônica, eletricidade, instrumentos etc.).
Obs.: Na Marinha, o oficial torna-se especialista como decor-
rência do fluxo de carreira, e não de formação específica, em Escola pró-
pria, como ocorria, anteriormente, na FAB.
Atualmente, na Força Aérea, o preenchimento dos claros de ofi-
cial especialista se faz como na Marinha, sistemática considerada por
alguns menos eficiente que a anterior, quando o oficial especialista era
formado em escola específica (Curitiba).
Por ser mais coerente com a política de Pessoal do Exército, o
atual sistema da Marinha e da FAB parece-nos mais apropriado pelas
seguintes razões:
– Evita gastos específicos na formação;
– Possibilita acesso do subtenente ao oficialato como incentivo
à carreira;
– Compatível com a atual Política de Pessoal do Exército;
– Permite maior experiência na atividade ao longo da carreira.
(a) O acesso à Escola de Especialista na FAB era permitido a
Sgt com 5 (cinco) anos de graduação que, ao término do curso, eram
promovidos a oficiais, tornando-os superiores hierárquicos aos gra-
duados com maior tempo de serviço, aos quais se subordinavam antes
do curso.
(b) A atual sistemática de formação de graduados especialistas
da Marinha ligada à atividade aérea prevê na fase de aperfeiçoamento a
preparação do graduado para o exercício da função de direção das ativi-
dades de manutenção
b) De graduados
(1) Manutenção
(2) Apoio ao voo – controle
– combate a incêndio;
– operação de radar;
– resgate;
– segurança;
– outras.
3) Locais de formação possíveis de serem utilizados pelo EB
– Marinha;
– Força Aérea;
534 Aviação no Exército - uma visão histórica

– Empresas civis;
– Exterior;
– No próprio EB
Combinação de duas ou mais hipóteses.
a) Peculiaridades da formação de pilotos e graduados especia-
listas na MB e FAB
A Marinha e a Força Aérea apresentam algumas peculiaridades
que as tornam distintas, na formação de pessoal para operação (pilotos)
e manutenção (especialistas) de helicópteros.

MARINHA FORÇA AÉREA

–Formação voltada e especificamente – Habilitação à pilotagem


para operação e Mnt de Hlcp. de Hlcp e Mnt em caráter
– Hlcp empregado em relação à Força complementar.
apoiada como “Arma”. – Hlcp em relação à Força
– Maior duração do curso de pilotos. apoiada é encarado como
– Habilitação dos graduados em meio de transporte.
2 fases (especialização e – Menor duração do curso de
aperfeiçoamento). piloto.
– Formação do graduado em
uma fase c/ênfase nas
aeronaves de
asas fixas.

b) Aproveitamento das estruturas

Adoção de uma só
Simultâneo
estrutura

– Falta de homogeneidade na – Homogeneidade na formação.


formação. – Facilita o planejamento das
– Duração diferenciada dos cursos. etapas de capacitação do
– Atende à injunção de caráter pessoal.
político. – Poderá acarretar clima
– Maior capacidade de formação. desfavorável com a Força não
– Obtenção das experiências e aproveitada, com repercussão
conhecimento das vulnerabilidades negativa na coesão entre as
na formação da Mar e FAB. F Sing.
Anexo B – Pessoal 535

Apesar das peculiaridades, diferença de conteúdo, enfoque e


duração de currículos, o aproveitamento das estruturas das duas Forças
(Mar e Aer) é considerado exequível e “politicamente” desejável.
c) Outros locais de formação
(1) Empresas civis
As empresas civis, via de regra, exercem a contratação de pi-
lotos e mecânicos já formados. Aquelas ligadas à formação habilitam o
piloto para o cumprimento de missões de caráter civil, inapropriados ao
que se deseja para a AvEx.
A habilitação em empresa civil não responde às necessidades
para um piloto militar, que é bem mais complexa.
(2) Exterior
Apresenta-se imprescindível em 2 aspectos:
– para habilitação plena do piloto operacional;
– para adaptação à aeronave comprada, caso se faça a aquisição
em empresa estrangeira, por pilotos e graduados especialistas;
– na absorção doutrinária.
(3) Próprio EB
Inexequível inicialmente pela inexistência ou impossibilidade
de instalação de uma estrutura de formação em curto prazo.
d) Conclusão
(1) Pelo exposto, o aproveitamento das estruturas de formação
das Forças Singulares mostra-se o mais adequado à Força Terrestre de
início.
(2) O aproveitamento de empresas civis tornar-se-ia com-
patível somente a partir da antevisão da impossibilidade de as F Sing
atenderem às necessidades do EB, na fase de implantação, hipótese não
considerada. No entanto, a possibilidade de estágios em empresas que,
atualmente, apoiam a Mar e FAB na manutenção de helicópteros consti-
tui-se em fator de real interesse.
(3) No tocante à formação no exterior, é fundamental o estabe-
lecimento, no contrato de aquisição de helicópteros, de curso de adap-
tação, para pilotos e mecânicos, ao equipamento adquirido. Quanto à
formação tática de pilotos e reunião de conhecimentos doutrinários de
emprego da AvEx, o envio de militares ao exterior, em países cujos exér-
citos possuam aviação orgânica, acarretará em extremo benefício à ope-
racionalidade da Aviação do Exército.
536 Aviação no Exército - uma visão histórica

(4) A formação no Exército Brasileiro não é recomendável, face


à inexistência de pessoal habilitado para a função de instrutor; o alto
grau de especialização e tempo exigido para a formação do instrutor de
voo; o elevado custo na formação, quando comparado com os pequenos
efetivos a formar, e a inexistência de estruturas de formação em condi-
ções de prover o apoio que se requer.
(5) A combinação das diferentes hipóteses de formação mos-
tra-se compatível, na medida em que se situam, conforme o objetivo de
formação, como complementares.
e) Proposta
(1) No País
Formar pilotos e graduados especialistas com o aproveitamen-
to dos sistemas da Marinha e FAB.
(2) Em empresas civis
Realizar estágios com mecânicos já habilitados em aeronaves,
de Mnt de Hlcp, desde que possível.
(3) No exterior
– Realizar estágios de adaptações para pilotos e mecânicos
como cláusula de contrato com a empresa fornecedora, no Hlcp a ser
adquirido.
– Habilitar:
– o Comando do Btl em conhecimentos doutrinários junto ao
Exército de país amigo;
– pilotos em voos operacionais (táticos);
– oficial de manutenção.
4) Prazos de habilitação de pilotos e graduados especialistas
O aproveitamento simultâneo do apoio da Marinha e da FAB, subor-
dinado às possibilidades de atendimento ao EB por cada uma das Forças e do
aspecto “político” que tal medida envolve, leva a tomar como tempo mínimo
necessário à formação aquele referente ao curso de maior duração
a) Na Marinha
(1) Piloto
52 semanas
(2) Graduados especialistas
Especialização: 22 semanas (médio)
Aperfeiçoamento: 22 semanas (médio)
b) FAB
Anexo B – Pessoal 537

(1) Piloto
30 semanas (Estimado. Ainda objeto de confirmação)
(2) Graduados especialistas
Formação: 52 semanas
Especialização: 12 semanas
c) Prazo mínimo a considerar
Pela adoção simultânea das estruturas de formação da FAB e
da Marinha:
(1) Piloto
52 semanas
(2) Graduados especialistas
64 semanas
Com vistas a evitar a postergação do recebimento do 1º lote de
aeronaves, caso tal medida se faça necessária, a adoção da estrutura da
Marinha para a preparação de pessoal, para o recebimento da 1ª aquisi-
ção, é a mais aconselhada por:
– desenvolver-se em períodos semelhantes para oficiais e sar-
gentos (52 semanas e 44 semanas);
– permitir a realização de estágio entre o término da formação
e o 1º recebimento das aeronaves;
– homogeneizar a formação de pilotos e mecânicos;
– formar quadros especificamente para atuação na área de he-
licópteros.
5) Início da formação de pilotos e graduados especialistas
A qualificação de pilotos e graduados especialistas deverá pre-
ceder o desenvolvimento de quaisquer atividades na implantação, con-
siderando que:
– a eficiência da manutenção e operação dos equipamentos é
consequência direta da aptidão pessoal do pessoal;
– é necessário, à época do recebimento do material, possuir
pessoal altamente qualificado, desde o início do efetivo emprego da
AvEx.
d. Qualificação de pessoal de apoio de terra
Foram consideradas como atividades de apoio de terra:
– Segurança (de instalações, equipamento e de voo);
– Apoio ao comando (atividades relacionadas com pessoal, in-
formações, operações e apoio logístico).
1) Segurança
538 Aviação no Exército - uma visão histórica

a) De instalações
Constituída de pessoal de guarda, destinado a prover seguran-
ça ao espaço físico na sede do Batalhão e às suas instalações.
Para prover segurança às aeronaves estacionadas em campanha.
O recrutamento, seleção e formação desenvolver-se-ão segun-
do a atual sistemática em vigor no Exército, para as demais OM de tropa.
b) De equipamento
Nesta categoria, inclui-se, somente, o pessoal especializado em
combate a incêndio de aviação.
O recrutamento e seleção far-se-ão da mesma maneira como
ocorre, atualmente, nas demais OM de tropa.
A formação será procedida com auxílio das outras F Sing. e Cor-
po de Bombeiros.
c) De voo
Através de cursos específicos a serem realizados nas outras
Forças Singulares, segundo as necessidades identificadas por ocasião da
implantação da AvEx.
2) De apoio ao comando
A atividade de apoio ao comando na AvEx, em linhas gerais,
será desenvolvida de modo semelhante às ações desenvolvidas em OM
de tropa. Logo, as atividades de recrutamento, seleção e formação são
aquelas em desenvolvimento na F Ter.
e. Qualificação de pessoal para o desempenho de função em ór-
gão de apoio à Av Ex
Considerando a necessidade da criação de órgão de apoio especí-
fico – Diretoria de Aviação –, destinado ao provimento de necessidade da
Av Ex e, por serem altamente técnicas as atividades a serem desenvolvidas
naquele órgão, propõe-se que:
– os cargos a serem desempenhados por oficiais, nas diversas
assessorias da futura diretoria, sejam ocupados preferentemente por
habilitados em pilotagem de helicópteros;
– os cargos de graduados, nas áreas de manutenção e supri-
mento, sejam exercidos por militares especialistas (mecânicos).
Não há necessidade de ser piloto ou mecânico, basta um es-
tágio em órgãos afins na MB e na FAB, como foi previsto no quadro
abaixo.
f. Efetivos a formar
Anexo B – Pessoal 539

Altamente condicionado às possibilidades de atendimento pe-


las outras Forças Singulares às nossas necessidades iniciais, estimam­se
como mínimas as seguintes:
Categoria 1986 1987 1988 1989 1990
Of St/ Of St/ Of St/ Of St/ Of St/
Sgt Sgt Sg Sgt Sgt
Pilotos 20 20 20 20 20
Médicos 02 02 02 02
Esp Av
Graduados 50 50 50 50 50
Esp
Apoio Terra A regular
Órgão de 4 8 Para os demais anos, se for o caso, fruto
apoio à das observações dos enviados para
AvEx (1) Mar e FAB

1) Entende-se por formação a realização de estágios nos órgãos


afins da MB e FAB, de modo a facilitar a implantação da Diretoria de Aviação.
Obs.: Não foram objeto de cálculo as necessidades de cabos e
soldados.
g. Adestramento
O adestramento limitar-se-á, inicialmente, a estágios para pi-
lotos em exércitos de países amigos que possuam aviação orgânica e,
posteriormente, no próprio EB, no exercício de atividade de pilotagem,
por ocasião de manobras.
Tal fato prende-se à impossibilidade, no Brasil – inclusive às ou-
tras Forças Singulares – de adestrar pilotos da Av Ex com o espectro de
missões a serem cumpridas, em apoio à Força Terrestre.
h. QO
O quadro de organização, elaborado em caráter experimental
(Adendo 2), constitui-se em resultado das informações colhidas junto à
Marinha do Brasil e Força Aérea Brasileira e alguns exércitos estrangei-
ros possuidores de aviação orgânica.
5. AÇÕES A REALIZAR NA 2ª FASE
As ações nesta fase, em princípio, ocorrerão sob exclusiva res-
ponsabilidade do Exército, que deverá contar com seu sistema próprio
540 Aviação no Exército - uma visão histórica

de seleção e formação do pessoal, consolidando experiência absorvida


na formação de pessoal nas demais F Sing e no estrangeiro.
6. CONCLUSÃO
a. Recrutamento e seleção de oficiais pilotos, médicos e gradu-
ados especialistas
1) Universo a recrutar
a) Pilotos
Inicialmente, oficiais de carreira das Armas e de Mat Bel.
b) Médicos
– Oficiais de carreira do Serviço de Saúde.
c) Graduados especialistas
– 3º Sgt concludentes das Escolas de Formação de Graduados do EB.
2) Condições de seleção
a) Pilotos
– Ser voluntário.
– Possuir, no mínimo, dois anos de função na tropa.
– Atender às condições de seleção estabelecidas pela MB e FAB
para aeronavegantes.
– Poder permanecer na Av Ex por prazo mínimo de 5 (cinco anos).
b) Médicos
– Ser voluntário.
– Atender às condições de seleção estabelecidas pela MB e FAB
para aeronavegantes.
– Poder permanecer na Av Ex por prazo mínimo de 5 (cinco anos).
c) Graduados especialistas
– Ser voluntário
– Atender às condições de seleção estabelecidas pela MB e FAB
para aeronavegantes.
– Comprometer-se a permanecer no EB por prazo mínimo de 5
(cinco) anos.
b. Formação
1) Efetivos a formar e locais de formação
a) Pilotos
Adendo 1.
b) Médicos
Mínimo (estimativo) de 2 (dois) por ano, a partir de 1987 na
Mar e FAB.
Anexo B – Pessoal 541

c) Graduados e especialistas
Necessidade mínima de 50 (cinquenta) especialistas/ano a
partir de 1986, distribuídos pela Marinha e FAB
2) Estágios
a) Na Marinha e Força Aérea
Para pilotos e graduados em sequência à conclusão da formação.
b) Na indústria fornecedora de helicópteros
Precedendo o recebimento das aeronaves, para pilotos e mecâ-
nicos, inclusive a preparação de instrutores e monitores.
c) No exterior
Para o comando do BAvEx
c. Adestramento
1) No exterior
Junto aos exércitos de nações amigas que possuam aviações orgâ-
nicas.
Somente para pilotos já formados.
d. Recrutamento, seleção e formação de outros recursos humanos
1) Recrutamento e seleção
De acordo com a atual sistemática de recrutamento e seleção de
graduados e soldados
2) Formação
a) Para atividades não especializadas
Conforme os programas de formação e adestramento em vigor
b) Para atividades especializadas
Através de cursos expeditos fora do Exército, em espe-
cialidades tais como:
Combate a incêndio, combustíveis de aviação, solda em aerona-
ves, controle de corrosão, segurança de aviação e outros
e. Providências exigidas
1) Ligação com as demais Forças Singulares (MB e FAB), no
sentido de:
– detalhar as condições de apoio;
– proporcionar facilidades à realização de contatos do pessoal
responsável pela implantação da Av Ex com órgãos daqueles ministérios;
– solicitar oficiais de ligação daquelas Forças para assessora-
mento à Comissão de Implantação.
2) Aumento dos efetivos do Exército para o atendimento das
necessidades da Aviação do Exército.
542 Aviação no Exército - uma visão histórica

3) Estabelecimento das medidas necessárias ao recrutamento


e seleção do pessoal no mais curto prazo.
4) Designação dos integrantes do Núcleo de Implantação da
Aviação do Exército.
5) Inclusão no currículo das Escolas de Formação e Aperfeiçoa-
mento de assuntos referentes ao emprego da AvEx.

Adendo 1
Pilotos

Força Aérea Marinha

Total: 10 Total: 10

2. Graduados especialistas

Força Aérea Marinha

Especialidade Qtd Especialidade Qtd


Motores 6 (seis) Motores de 8 (oito)
Aviação (MV)
Armamento 8 (oito) Manobra e
equipamento ***
de aviação
(1)
Estrutura 2 (dois) Estrutura e 7 (sete)
Metalurgia 1 (um) Metalurgia
Hidráulica 2 (dois)
Eletrônica 2 (dois) Aviônica 6 (seis)
Sist. elétrico 1 (um)
Instrumentos 2 (dois)
Equipamento 2 (dois)
*** *** de voo e
sobrevivência (2)
Suprimento 2 (dois) *** ***
*********** Controle de voo 2 (dois)
Total 25 (vinte) Total 25 (vinte e
e cinco) cinco)
Anexo B – Pessoal 543

Farão os cursos de especialização e aperfeiçoamento


Curso de subespecialização

3. Pilotos e graduados especialistas

Força Aérea Marinha (cursos expeditos)

Combate a incêndio (1)


(Of e praças)
(2)
Combustíveis de aviação
(3)
Preparação de instrutores
(Of e praças)

*** Solda em aeronaves (praças)

Semicondutores (praças)

Meteorologia básica
(Of e praças)

Controle de corrosão
(Of e praças)

Segurança (Of e praças)

(1) Quantidade a regular.


(2) Em princípio, serão cursados por oficiais e graduados que
frequentaram os cursos de pilotos e mecânicos.
(3) Pequena duração.
Anexo C – Material

l. FINALIDADE
Apresentar uma proposta para a implantação da Aviação do
Exército (Av Ex) no tocante aos aspectos da área de material.
2. DESENVOLVIMENTO
a. Tipos de aeronaves
1) Inicialmente, a equipe realizou uma pesquisa bibliográfica,
coletando os principais modelos de helicópteros utilizados nas forças
armadas nacionais e estrangeiras.
De posse da definição das missões e dos requisitos operacio-
nais para atendê-las, foram selecionados, basicamente, dois tipos de he-
licópteros:
a) De Manobra
(1) Estados Unidos
– Bell 205/UH-1H
– Bell UH-1N (212)
– Bell 214 ST-Sikorsky UH-60A Black Hawk
– Sikorsky AUH-76
(2) França
– Aerospatiale AS 332B Aerospatiale Super Puma
– Aerospatiale AS 365F Dauphin 2
(3) Itália
546 Aviação no Exército - uma visão histórica

– Agusta 412 Griffon


(4) Inglaterra
– Westland Utility Lynx
(5) Alemanha Ocidental
– MBB BK 117
B) Reconhecimento e Ataque
(1) Estados Unidos
– Bell AH-15 Modernized Cobra
– Hughes AH-64A Apache
– Hughes 530MG Defender
– Bell 206/OH 58A Kiowa
– Bell OH-58D Aeroscout
(2) França
– Aerospatiale Gazelle
– Aerospatiale AS 350 L1 Ecureuil
– Aerospatiale AS 313H Alouette II E 319 E-II
- Aerospatiale AS 365F Dauphin 2
3) Itália
– Agusta A 109A
– Agusta A 129 Mangoose
(4) Inglaterra
– Westland Army Lynx-3
(5) Alemanha Ocidental – MBB BO 105
2) Tendo em vista o possível aproveitamento da infraestrutura
existente, levantou-se, também, as aeronaves em uso nas demais Forças
Singulares do país.
a) Força Aérea Brasileira
– Bell H-13 Sioux (Bolha – Treinamento)
– Bell UH-1H
– Bell 206/0H 58A Kiowa (Jet Ranger) (em desativação)
– Aerospatiale Puma 330 (está sendo substituído pelo AS 332B
Super Puma)
– Esquilo (em aquisição)
B) Marinha do Brasil
– Bell 206/OH 58A (Jet-Ranger – treinamento)
– Helibras – Esquilo
– Westland – Lynx
Anexo C – Material 547

– Westland – Wasp (em desativação)


– Sikorsky – Sea King SH-3 (em processo de modernização na
Agusta – Itália)
– Aerospatiale – AS 332B Super Puma (em aquisição)
É importante ter-se em conta que, para qualquer planejamento
futuro, as estruturas de manutenção da MB e da FAB só detêm viabilida-
de de apoio para material idêntico ao adotado por elas. Qualquer heli-
cóptero diferente daqueles supramencionados obrigará uma adaptação
dos respectivos sistemas atuais de manutenção.
3) Posteriormente, por determinação superior, foram selecio-
nadas as seguintes aeronaves, segundo os parâmetros definidos pela
doutrina:
– missão;
– estrutura organizacional;
– versatilidade de emprego;
– compatibilidade, com a infraestrutura existente no país (mi-
litar e civil);
– custos.
a) Manobra
– Bell 212 UH-1N (Iroquois)
– Sikorsky UH-60A (Black Hawk)
– MBB BK 117
– Aerospatiale AS 332B Super Puma
B) Reconhecimento e Ataque
– Aerospatiale AS 350 L1 Ecureuil (Esquilo)
– Bell 206/OH-58 A (Kiowa)
– MBB B0 105
Obs.: A seleção das aeronaves foi realizada à guisa de orientação
do processo de compra. No entanto, durante o processo licitatório algu-
mas não foram apresentadas; outras as fabricantes o fizeram com mode-
los mais atualizados.
4) Em função da gama de informações obtidas na fase atual, o
futuro Núcleo (Comissão) de Implantação da Av Ex tomará as providên-
cias referentes ao estabelecimento dos OBO, à seleção e à aquisição das
respectivas aeronaves.
Além disso, faz-se necessária uma estreita ligação com os possí-
veis fornecedores de material, no sentido de que as propostas apresentadas
548 Aviação no Exército - uma visão histórica

estejam em consonância com os requisitos pré-selecionados.


A aquisição das aeronaves processar-se-á através do DMB, de-
vidamente assessorado pelo Núcleo (ou Comissão) para a Implantação
da AvEx.
b. Aquartelamento
1) A atual Comissão de Estudo para a Implantação da Av Ex de-
dicou, ao longo deste período, uma semana de viagem de estudos, du-
rante a qual se visitaram as instalações da FAB (Bases Aéreas de Santa
Maria e de Santos) e da MB (Base Aeronaval de São Pedro da Aldeia).
2) Desta forma, para o futuro Núcleo de Implantação, será de
todo interessante extrair-se do acervo da Diretoria de Obras Militares
aquelas especificações concernentes às instalações comuns aos nossos
aquartelamentos. No entanto, devem ser observadas as peculiaridades
referentes à infraestrutura de aviação, aproveitando, em princípio, a ex-
periência das forças coirmãs.
c. Infraestrutura de apoio
1) O objetivo primordial a ser perseguido nesta fase de implan-
tação diz respeito ao desenvolvimento de uma acentuada mentalida-
de de apoio, voltada para a área de aviação. Espera-se que, fruto desse
acontecimento, o panorama atual da manutenção sofra um incremento,
em virtude da influência dos rígidos padrões de controle exigidos pelos
trabalhos de aviação.
2) O futuro Núcleo de Implantação será obrigado a detalhar um
planejamento híbrido, consolidando a sistemática padrão para o mate-
rial já adotado pelo EB e aquela a ser estruturada para apoiar a com-
ponente aérea. O material de uso comum, como viaturas, armamento,
equipamento, fardamento, comunicações e eletrônica, etc., atenderá às
normas já existentes, em suas respectivas diretorias. Os demais itens
característicos das atividades de aviação (aeronaves, aviônicos, arma-
mento específico, material de segurança e proteção ao voo etc., serão
tratados de maneira peculiar).
3) Segurança e Proteção ao Voo
Concernente a esta atividade, o EB deverá se valer da utiliza-
ção da estrutura existente, nas instalações da FAB e MB; contudo, cabe
ressaltar a necessidade da Av Ex ser dotada de meios compatíveis para
emprego em campanha.
4) Prevenção e Combate a Incêndio
Anexo C – Material 549

A organização desta atividade deverá ser efetivada, valendo-se,


também, das experiências das forças coirmãs, acrescidas das adapta-
ções necessárias ao seu emprego em campanha.
5) Próprios Nacionais
Seguirão as normas, atualmente, em vigor na Força Terrestre,
quer seja sob o aspecto residencial, quer sob o aspecto do aquartela-
mento. Entretanto, ressalta-se que neste último caso deverão ser obser-
vadas as peculiaridades inerentes à aviação.
6) Informática
A informatização, referente ao elenco de todas as atividades da
AvEx, constitui-se num instrumento fundamental para a sua implanta-
ção e o seu desenvolvimento.
d. Manutenção e Suprimento
Na fase inicial da implantação (1985-1995), o Exército neces-
sitará organizar uma cadeia de manutenção/suprimento peculiar aos
meios aéreos. Neste estágio, a prática acumulada pelas forças coirmãs
servirá de ponderável subsídio para que a estrutura em formação possa
superar os problemas inerentes à nova experiência. O principal obje-
tivo é estar em condições de viabilizar, operacionalmente, um sistema
embrionário de manutenção/suprimento de aviação, tão logo a mão de
obra especializada comece a ser alocada para a constituição dos qua-
dros da Aviação do Exército. Isto deverá ocorrer, conforme planejamen-
to específico, antes do recebimento do material destinado a mobiliar a
estrutura de apoio. Esta estrutura, a ser implantada, deverá ser suficien-
temente flexível para se adequar com o mínimo de adaptações exigidas
pelos demais modelos de helicópteros (instrução e ataque), a serem
adquiridos no período 1990/1995. A adequabilidade do emprego em
campanha assume um aspecto fundamental, considerando-se que, no
contexto das operações, a Aviação do Exército poderá ter os seus meios
articulados fora das suas instalações de tempo de paz.
Doutrinariamente, a atividade de manutenção do Exército se
fundamenta nas categorias abaixo discriminadas:

Categorias Escalões Ações básicas Resp


Orgânica 1º Conservação Usuário
2º OM
550 Aviação no Exército - uma visão histórica

Campanha 3º Reparação Cia MB


4º Pq R Mnt
De retaguarda 5º Recuperação Arsenais

No tocante à manutenção peculiar ao material de aviação, faz-


se necessária, na fase inicial, uma adaptação aos sistemas da FAB e da
MB. Esta sistemática possibilitará ao Exército a captação de experiência
e do apoio das estruturas existentes, naquilo que for aplicáve1 ao em-
prego nas operações terrestres. A MB e a FAB, embora dispondo de sis-
temas organizados de manutenção/suprimento, atribuem aos mesmos
um escalonamento diferenciado daquele adotado pelo EB, a saber:
Força Aérea

Níveis ou Escalões Responsabilidade


categorias para execução
Pista 1º Esquadrão operacional
Hangar 2º Esquadrão de suprimento
Base 3º e manutenção
Parque 4º Parque de Material
Aeronáutico/Empresa civil

Marinha

Categorias Escalões Responsabilidades


Pista 1º Esquadrão operativo
Hangar 2º Depto Mnt Base
Base 3º Depto Mnt Base – Fabricante
Empresa civil

A proposta do Batalhão de Aviação apresenta na sua estrutura


uma Companhia de Material Bélico, à qual será atribuída a missão de
prover a manutenção e os itens de suprimento naquilo que for aplicável
ao material peculiar de aviação. No momento, ainda não se dispõe do
embasamento doutrinário que assegure, sem margem de erros, as reais
possibilidades desta subunidade. Entretanto, na fase inicial da implan-
tação, poder-se-ia sugerir a adoção, experimental, do sistema abaixo:
Anexo C – Material 551

– 1º escalão de manutenção (pista), a cargo da Companhia de


Helicóptero;
– 2º escalão de manutenção (hangar) e o 3º escalão de manu-
tenção (base), a cargo da Cia Mat Bel;
– 4º e 5º escalões de manutenção apoiados na estrutura das
demais Forças Singulares (naquilo que for possível) e na indústria civil
(nacional e estrangeira).
Na segunda fase de implantação, a Aviação do Exército poderia
assimilar o 4º escalão, mantendo, ainda, o 5º escalão apoiado na indús-
tria nacional.
Sem dúvida, caberá à futura Diretoria de Aviação normalizar
todos os procedimentos atinentes à sua respectiva área de atribuições.
A manutenção do material convencional deverá, pelo menos na
fase inicial da implantação, seguir o processamento usual adotado pelo
DMB. Desta forma, caberá à Cia Mat Bel, tão somente, os encargos de
apoio ao material de aviação. A CCSv executará a manutenção de 2º es-
calão do material convencional de todo o Batalhão. As companhias deve-
rão se encarregar da manutenção de 1º escalão do material em questão.
Desta forma, o comportamento da manutenção assumirá o se-
guinte panorama, na fase inicial da implantação:

Subunidade CC Cia Cia Cia Obs


Material Sv Seg Hlcp MB
Convencional 1º/2º 1º 1º 1º 3º escalão-Blog por
área
4º escalão – RM (Btl
MB)
5º escalão – Arsenal

Aviação 1° 2º 4º escalões na FAB/


– – 3º Mar,
Indústria civil (nacion-
al
e estrangeira)

Entretanto, é de suma importância ter-se em mente que a possibi-


lidade de apoio das forças coirmãs se limita a helicópteros do mesmo tipo e
552 Aviação no Exército - uma visão histórica

modelo daqueles por elas adotados. Quanto à cadeia de suprimento, sobre-


tudo naquilo que se refere a peças e conjuntos de reparação, o DMB deverá
analisar em termos “custo-benefício” a viabilidade de adoção do processo
de apoio, baseado no “armazém alfandegado”. Sobretudo nos primórdios da
implantação, talvez esta sistemática seja menos onerosa para a instituição.
O fluxo do suprimento de classe III (combustível, lubrificantes
e produtos afins), para aviação, merecerá uma atenção especial uma vez
que o emprego deste apoio, em campanha, carece de experiência no país.
3. CONCLUSÃO
a. No tocante ao material de aviação e aspectos correlatos, a im-
plantação da Av Ex deverá se orientar pelas principais condicionantes
abaixo especificadas:
1) a centralização dos meios, na fase inicial, tendo em vista mi-
nimizar os custos, otimizar os procedimentos de manutenção e facilitar
o desenvolvimento da doutrina de emprego da AvEx;
2) evitar a diversificação do material, inicialmente adotado;
3) dar ênfase ao emprego do processamento automático de da-
dos em todas as atividades da AvEx, particularmente naquelas voltadas
para a manutenção e o suprimento;
4) dentro daquilo que for aplicável, sem comprometer a opera-
cionalidade da MB e da FAB, apoiar-se nas estruturas existentes dessas
forças coirmãs;
5) a mão de obra especializada (pilotos, mecânicos e demais
elementos de apoio de terra) já deverá apresentar um efetivo compatí-
vel, em condições de participar do recebimento do material.
b. Cuidados especiais deverão ser dispensados durante a fase
contratual, principalmente quanto à participação inicial do fornecedor
nas atividades de manutenção (assistência técnica), treinamento, so-
bressalentes (armazém alfandegário) e manuais técnicos; prazos de pa-
gamento; juros; amortizações; desembolso; seguro, etc.
c. A construção do aquartelamento deverá, em princípio, atender
ao cronograma constante do Anexo D ao presente relatório, objetivando a
implantação progressiva da estrutura do 1º Batalhão de Aviação.
d. Deverá ser atribuída uma atenção especial aos escalões de
manutenção que, inicialmente, o Exército deverá assumir. Por medidas
econômicas e por falta de necessária experiência, parece claro que não
devamos ultrapassar, inicialmente, o nosso 3º escalão.
Anexo C – Material 553

e. A partir de 1990, teremos mais aeronaves do que a Marinha,


atualmente. Como a MB já constatou ser economicamente viável a ins-
tituição da reparação e recuperação (4º e 5º escalão no EB), é bastante
provável que o Exército chegue, também, a essa conclusão, principal-
mente pelos altos custos dessa manutenção nas empresas civis. Assim,
há que se preparar os recursos humanos para se estudar e planejar a
manutenção completa de nossas aeronaves, para se ter o domínio global
de todos os escalões e diminuir os altos custos que a aviação impingirá
à Força Terrestre.
f. A Diretoria de Aviação deverá ser criada e organizada antes
do recebimento do primeiro lote de material específico, de modo que ela
participe e se responsabilize pela estruturação da cadeia de apoio.
Anexo 2

Relatório de recebimento provisório


AERONAVE: AS 365K Panther no 01
LOTE: Nº 17
Nº de SÉRIE: 6323
MATRÍCULA EB: HM-2001
1. Introdução
O programa de recebimento provisório do AS 365K Panther
01 foi concluído com a execução das atividades específicas previstas na
cláusula 20 do Contrato nº 01/88-DMB (Ext.)
O ciclo de verificações, desenvolvido no período de 12 Dez 89 a
22 Dez 89, comportou as atividades de:
– conformidade contratual (no solo);
– kit de bordo e documentação (no solo);
– verificação do estado interno e externo (solo);
– ensaios no solo;
– ensaios em voo.
Como exposto anteriormente, o período de recebimento de
cada aeronave era de duração variável. Enquanto no Panther 01 durou
20 dias, no Panther 02 foram dois meses. Recebemos ambas ao mesmo
tempo. No Panther 02, após o primeiro ciclo de atividades, que durou
556 Aviação no Exército - uma visão histórica

29 dias, foram elaborados um certificado de transferência provisória de


propriedade e outro de recebimento provisório. O helicóptero foi então
retrocedido à Aerospatiale (Apêndice C), para realização dos cursos de
piloto previstos em contrato. Com a interrupção dos cursos em março
de 1990, a aeronave entrou novamente em processo de recepção provi-
sória, com duração de 30 dias, com vistas à sua expedição para o Brasil.
2. Desenvolvimento
a. Detalhamento das atividades
1) Recebimento do lote de bordo
a) Documentação (Anexo 1)
– conferência da documentação da aeronave;
– verificação do RIC (derrogações, fichas matrícula, compatibi-
lidade dos itens descritos no RIC, AMS etc.);
– conferência das cadernetas dos motores;
– conferência das cadernetas de célula (horas de voo, PRE);
– verificação da escrituração das cadernetas dos motores em
relação ao MCM, horas de utilização, ciclos de operação;
– verificação da caderneta da bateria;
– conferência do livro de bordo.
b) Kit de Bordo (Anexo 2)
– composição do kit;
– comparação com o ICO;
– verificação da aplicabilidade ao AS 365K Panther;
– verificação da instalação dos diversos itens sobre a aeronave.
c) Lote de acompanhamento (Anexo 3)
– conferência dos itens componentes;
– verificação da documentação específica;
– verificação da instalação sobre a aeronave.
d) Verificação no solo
– conferência interna e externa;
– constatação da conformidade contratual;
– verificação de discrepâncias;
– preenchimento da ficha de conferência no solo (Anexo 4).
e) Ensaios no solo
– ficha original de peso e balanceamento (Anexo 5);
– ensaio de estanqueidade (radome – proteção do radar);
– verificação da ejeção das portas basculantes.
Anexo 2 557

f) Ensaios em voo
– ensaios mecânicos, funcionamento geral da aeronave, verifi-
cações de performances (Anexo 6);
– ensaios de equipamentos opcionais (Anexo 7);
– voo noturno (Anexo 8);
– verificações do funcionamento dos equipamentos rádio e de
navegação (Anexo 9);
– ensaio específico para verificação do piloto automático (Ane-
xo 10);
– ensaio específico para verificação de vazamentos de óleo
(Anexo 11).
b) Execução
1) Verificação no solo
Consideram-se neste item as observações realizadas pela Co-
missão antes e durante o período contratual, de recebimento da aero-
nave:
a) Degraus de Comando
Face ao acordo industrial do Consórcio, os degraus de coman-
do constituem-se em responsabilidade da Helibras. Em consequência,
serão os mesmos montados por aquela empresa no Brasil. Os degraus
montados, por solicitação desta Comissão, serão mais longos que os
efetivamente previstos no Contrato. A modificação, de conhecimento da
Bda AvEx, teve como escopo a melhoria das condições de acesso à aero-
nave, permitindo a utilização das portas corrediças e basculantes.
b) Gancho
O equipamento quando instalado guarda, em relação ao solo,
uma distância de 15 cm, o que implica no estabelecimento de procedi-
mento padrão para o táxi de aeronave dotada do referido material. Os
procedimentos normais com relação a transporte de carga externa e às
precauções a serem tomadas estão contidos no Manual de Voo.
c) Peso e Balanceamento
A ficha original de pesagem consta do Anexo 5. A Comissão jul-
ga importante a adoção no painel da aeronave de autocolante que per-
mita a inscrição do peso e CG (centro de gravidade) de cada aeronave.
Os dados contidos no PMV (Cap. 6.1, p. 3) constituem-se em exemplo. A
observação se faz por possuir cada aeronave seu próprio peso.
d) Acesso à cabine de pilotagem
558 Aviação no Exército - uma visão histórica

Conforme já informado, anteriormente, o acesso à cabine de pi-


lotagem se faz de modo extremamente desconfortável. Esta Comissão
sugeriu à Aerospatiale o aumento do curso da biela das portas como so-
lução paliativa, considerando que a adoção de degrau de comando para
acesso dos pilotos foi considerada inexequível. A Aerospatiale produziu
um protótipo de biela que, aumentando consideravelmente o ângulo de
abertura das portas, permitiu melhoria significativa das condições de
acesso.
Após um ciclo de discussões com a empresa a modificação em
tela foi incorporada e incluída em Termo de Compromisso, posterior-
mente.
e) Telefone de bordo
Esta Comissão considera necessária a adoção da 2ª tomada na
caixa de interfone do mecânico de voo, de modo a permitir que o co-
mandante da tropa transportada na aeronave (Cmt CG ou outro) possa
ter acesso à comunicação com os pilotos. A deficiência poderá ser mini-
mizada com a utilização de extensão, até a decisão quanto à utilização
da 2ª tomada.
f) Posicionamento do mecânico de voo
A atual configuração dos assentos-comando não reserva ao
mecânico de voo local compatível com suas atividades específicas. Du-
rante os voos de recebimento determinou-se a troca do posicionamento
dos bancos situados próximo aos bancos dos pilotos, tendo os mesmos
sido colocados voltados para a direção de deslocamento da aeronave, de
modo a permitir ao mecânico melhor visão sobre o painel de 14 Infor-
mações.
g) Pino de segurança da alavanca do trem de pouso
A colocação do pino de segurança da alavanca do trem de pouso
se faz de maneira incômoda, devido ao posicionamento do interruptor
de desarmamento da PSU. O interruptor poderá ser trocado de posição
a pedido do cliente, uma vez que a posição atual é a prevista na configu-
ração “standard” da aeronave.
h) Coloração diferente das manetes coupe-feu (corta-fogo)
Apresentam coloração distinta nas aeronaves 01 e 03. É neces-
sário por questão de segurança que haja padronização. A sugestão é que
as manetes sejam de cor vermelha e com os punhos amarelos. A Aeros-
patiale fará a modificação.
Anexo 2 559

i) Luz de aviso “DOOR”


A versão militar do Dauphin não prevê a instalação da luz de
aviso “DOOR” (portas abertas ou destravadas). Por causa da incidência
de panes nos micro-switchs sinalizadores, a Aerospatiale eliminou o cir-
cuito, uma vez que a versão militar não impõe o sistema de alarme. En-
tretanto, especial atenção deverá ser dada às restrições de velocidade
impostas pelo manual de voo. A introdução do referido aviso poderá ser
objeto de solicitação caso haja interesse da AvEx.
j) Alarme sonoro “Gong”
O alarme sonoro “Gong” é um meio de alerta complementar ao
alarme visual “Limit”. O alarme visual “Limit” acende no solo em caso de
movimentos extremos de comando cíclico. Em voo em caso de “G” exces-
sivo ou quando o Delta NG é superior + 0.4. O referido alarme, previsto
no PMV, será incorporado nas aeronaves de 01 a 06 na Helibras sob a
forma ele “retrofit” e a partir da 07, em linha na Aerospatiale.
l) Caixa para mapas
A aeronave não é dotada de local específico para o depósito
de cartas e/ou documentos. A Aerospatiale aguarda definição da Av Ex
quanto ao tipo e local de montagem.
m) Chave seletora do VOR Master
A referida chave não prevista contratualmente, mas submeti-
da à análise e aprovada por esta Comissão concede maior segurança à
operação com o único VOR instalado na aeronave. O detalhamento da
operação encontra-se no manual de voo.
n) Caixa do comando do ADF
O posicionamento inicial da caixa foi modificado por conside-
rar-se incômodo o seu manuseio devido à proximidade da alavanca de
comando de travamento da roda do nariz.
o) Torquímetro
Há dificuldade de monitoramento pelo 2P/instrutor do torquí-
metro, principalmente na faixa limite de torque.
p) VLF “OMEGA”
Falta proteção para o equipamento instalado no compartimen-
to da bagagem. O projeto será concluído e as proteções serão realizadas
em linha na Helibras, a partir do helicóptero Av Ex 08, bem como as de
números 01 a 07, conforme programa a ser estabelecido no Brasil.
q) Fixação do guincho sobre o helicóptero.
560 Aviação no Exército - uma visão histórica

Falta proteção sobre a calha do lado direito, contra vibrações


da argola de fixação do guincho. A referida proteção deverá ser incorpo-
rada pela Helibras antes do recebimento definitivo.
r) Reservatório de combustível
Foi incorporada modificação que melhora as condições de es-
tanqueidade dos reservatórios. As aeronaves 02 e todas a partir da 04
possuem tal modificação incorporada em linha de montagem. Para os
helicópteros 01 e 03 a modificação será realizada pela Helibras.
s) Carenagens
Não existem sinalizações visuais indicativas de carenagem
aberta. Algumas travas estão pintadas em vermelho, entretanto deverão
ser repintadas em tonalidade coral. A atualização do PPH prevê utili-
zação de tinta fluorescente. As carenagens de acesso à bateria, tomada
de fonte externa, abastecimento sob pressão e carenagens laterais in-
feriores estão com as articulações frouxas. Segundo a Aerospatiale as
correções serão aplicadas na Helibras com a utilização de eixos de maior
diâmetro, aumentando assim a rigidez da articulação e diminuindo as
folgas.
t) Interruptor geral do armamento
Previsto no Anexo B do contrato e não existe até no helicóptero.
Não há, até o momento, um consenso sobre o assunto.
u) Fixação do guincho sobre o helicóptero
Falta a proteção sobre a calha do lado direito contra vibrações
da argola de fixação do guincho. A referida proteção deverá ser incorpo-
rada pela Helibras antes do recebimento definitivo.
No acordo entre as empresas que constituíam o consórcio fo-
ram estabelecidas as responsabilidades de cada uma no processo de
produção das aeronaves. A participação da Helibras, em particular, tam-
bém se inseria dentro do aumento do índice de nacionalização do equi-
pamento.
v) Pintura
Pintura em mau estado. Será retocada no Brasil. Pás do rotor de
cauda arranhadas (dentro da tolerância). Antena do Homing com pintu-
ra descascada (dentro da tolerância).
Lembro que o recebimento do Panther 01 era avidamente
aguardado pelo 1º BAvEx. Afinal de contas ele era a ossatura do Batalhão
e os pilotos estavam ansiosos para se qualificarem sobre o aparelho.
Anexo 2 561

w) Painéis transparentes e janelas


Painéis transparentes dianteiros com arranhões. Foram forne-
cidos dois painéis adicionais. Janelas de mau tempo não possuem fixa-
ção quando na posição aberta (não previsto no Anexo B1 no contrato)
x) Fechaduras
Todas as fechaduras estão com os bujões soltos. Segundo o Con-
trole de Qualidade da Aerospatiale, as folgas existentes estão dentro do
limite de tolerância. Esta Comissão discute, no momento, a propriedade
dos limites aludidos.
y) Degraus de acesso à CTP (Caixa de Transmissão Principal)
A forração dos degraus encontra-se em mau estado e deverá
ser refeita na Helibras.
aa) Pneus
Foram observados sulcos na banda de rodagem. Tendo em vista
o previsto na CT 20.07.03.411 do MET (manual correspondente), pe-
quenos cortes são normais desde que não alcancem as lonas.
ab) Farol de pouso
O farol esquerdo não está rigidamente fixado. As correções se-
rão aplicadas na Helibras.
ac) Reostato de iluminação do console rádio
Falta marcação sobre a base. A informação foi incorporada no
PMV, de forma a permitir o conhecimento das duas funções.
ad) Instalação aeromédica
Partes fixas não instaladas. A Aerospatiale fará a instalação a
partir do helicóptero n° 12, os anteriores, do 01 ao 11, na Helibras. A
parte fixa da instalação sanitária é composta por:
– 1 gancho suporte para garrafa de soro;
– 1 suporte para fixação do saco de material (compartimento
de bagagem);
– partes de fixação do assento do enfermeiro;
– 2 ganchos de fixação de correias para imobilização das macas
superiores (fixados na parte superior do arco de 9°);
– 2 suportes para ganchos de fixação na parte superior direita
do arco entre as portas dianteira e traseira;
– fixação na parede traseira dos receptáculos de suporte a
apoio das macas.
2) Ensaios em Voo
562 Aviação no Exército - uma visão histórica

Realizados de acordo com o previsto em contrato, sendo efetu-


ados 4 voos com duração total de 04:25Hs.
a) Voo nº 1 – Ensaios mecânicos de funcionamento geral e veri-
ficações das performances.
Data: 19.12.89 – Hora: 14:25 – Duração: 01:40.
Os parâmetros obtidos durante o voo encontram-se no Anexo 6
a este relatório. Todos os dados e performances foram comparados com
o manual de voo, não tendo sido registrada qualquer discrepância.
(1) Observações
(a) RMI lP
De acordo com as observações contidas nos ofícios Nº
249-M/89-COMF, 250-M/89-COMF e 252-N/89-COMF e 255-M/89-
COMF, desta Comissão, o referido equipamento será acrescido ao painel
de bordo da aeronave. Os prazos de montagem serão definidos em ter-
mo aditivo a ser celebrado entre as partes. A montagem sobre o Panther
01 será feita sob a forma de “rattrapage” (reposição).
(b) Nível Vibratório
Efetuado regulagem em voo até a VNE, sendo considerado nor-
mal.
(c) Controle Performance
Executado voo pairado FES (fora do efeito solo) à Zp 9300 ft e
Os -2°C
Massa = 3628 Kg – Torque = 78% – Delta NG = -4/-4
Resultado obtido excede a performance prevista no PMV.
b) Voo no 2 – Ensaios Equipamentos Opcionais
Data: 21.12.89
Hora: 10:55Hs Duração: 00:45Hs
(a) Filtro Antiareia
Instalação e funcionamento normal dos filtros.
(b) Guincho
Testes da cápsula explosiva e da lâmpada de superaquecimento
normais. Operação e funcionamento considerados normais no solo e em
voo sem carga e com carga de 256kg. Não foi testado em sua capacidade
máxima (272kg) por não haver carga com este peso disponível.
(c) Gancho
Teste do indicador de carga normal, teste de alijamento de car-
ga normal (elétrico lP e 2P; manual 1P). Realizado voo com cargas de
Anexo 2 563

430kg e 1.077kg. Os parâmetros obtidos estão reportados na ficha apro-


priada (Anexo 7).
(d) Bloqueio Falso ADF
Há indicação de falso bloqueio do ADF quando da operação do
guincho (carga metálica e com cabo distendido em torno de 30 metros).
Discrepância julgada “sem indicação de correção”.
c) Voo no 3 – Voo noturno (Anexo 9)
Data: 20.12.89
Hora: 18:25 Hs - Duração: 00:30 Hs
Tráfego normal e aproximação ILS.
(1) Observações
(a) Horizonte Emergência – Iluminação
O horizonte de emergência não possui iluminação própria. No
caso de pane elétrica total, somente poderá ser iluminado através da
iluminação de segurança, que atinge somente a parte inferior do instru-
mento. A adoção de horizonte com iluminação própria ocorrerá a partir
do Panther 05. Nas demais aeronaves a montagem será feita na Helibras
em condições a serem definidas.
(b) Agulhas do Horizonte
Os índices indicadores de LOC e Glide no horizonte artificial (re-
cópia do HSI) não são do mesmo tipo montado no HB 350 L1. As barras
vertical e horizontal existentes neste tipo de Horizonte são previstas no
sistema diretor de voo, estando desta forma desativados no 365K. Po-
derão ser ativados a pedido do cliente para funcionar como repetidoras
do sistema ILS, entretanto como as duas barras possuem sensibilidades
diferentes dos índices previstos para o ILS e, ainda, o inconveniente de
haver somente uma bandeira FLAG para as duas agulhas. Esta Comissão
estudará sua implantação. Os índices existentes no ADI são suficientes
para a execução da aproximação ILS (são recópia dos índices do HSI).
(c) Iluminação do painel de bordo
O HSI 2, o indicador do Homing 2, o indicador NR 2, o indicador
de combustível e os cronômetros são dotados de fonte luminosa distinta
daquela dos demais instrumentos montados no painel de bordo. A Ae-
rospatiale julga a harmonização do painel eficiente, acenando com sua
aprovação pelos ensaios em voo da própria fábrica e do SIAR. Esta Co-
missão aguarda a manifestação do 1º BAvEx quanto ao assunto.
d) Voo no 4 – Ensaio de Equipamentos de RAD/NAV
564 Aviação no Exército - uma visão histórica

Data: 20.12.89 Hora: 09:30 Hs Duração: 01:30 Hs


Os dados relativos aos diversos equipamentos e as referências
em que foram testados estão reportados na ficha apropriada (Anexo 8).
(1) Observações
(a) “OMEGA”
O equipamento foi testado nos modos relativo e absoluto. As di-
ferenças entre os valores teóricos das coordenadas e os valores obtidos
estão reportadas na ficha apropriada (Anexo 9)
(b) HF 230
A frequência mais baixa de contato conseguida foi 9.028. Apa-
rentemente, o equipamento não opera em baixa frequência e a curta dis-
tância. O ponteiro do ADF vai para a posição 90º em caso de transmissão
maior que 10 segundos. Foi testado na frequência 11.273 a curta distân-
cia e considerado normal. Há corte automático na recepção do ARC 182
durante a transmissão HF. Deverão constar do PMV estas anomalias.
(c) HOMING
Testado nas frequências 46,6 e 69,6. Sensibilidade boa abaixo
de 300 ft. O equipamento não funciona com o trem de pouso abaixado.
Deverá ser reportado no manual de voo ou no manual de utilização do
equipamento.
(d) VHF 20 B e ARC 182
As frequências testadas em cada equipamento, bem como as
interferências identificadas, estão marcadas na ficha apropriada (Anexo
7). A ARC 182 apresenta ruído de fundo no interfone quando o volume é
aumentado de 60% a 70%.
(e) Interferência Radar Altímetro/UHF
Identificada uma perturbação do radar altímetro no ARC 182
(faixa UHF, sem abafador) quando voando e abaixo de 1500ft.
Anexo 3

Relatório
HB 350 L1 Esquilo – Helicóptero de Reconhecimento e Ataque

Atendimento aos Requisitos Operacionais Básicos (ROB)

ABSOLUTOS
Conforme já aludido anteriormente os requisitos absolutos são
aqueles a que a aeronave deve imperativamente satisfazer.
l) Transportar, no mínimo, uma tripulação de dois homens, am-
bos os pilotos, e um deles exercendo a função de observador e/ou ati-
rador.
R – Sim, o helicóptero é capaz de transportar 02 pilotos e mais
04 passageiros.
2) Possuir estabilidade, particularmente, no voo estacionário,
que lhe possibilite servir como plataforma para emprego, eficiente, com
um ou mais dos seguintes armamentos:
– Foguetes;
– Mísseis anticarro;
– Mtr axial e laterais.
R – Sim, o helicóptero possui boa estabilidade, mesmo no voo
pairado, porém não pode ser avaliado quanto ao emprego do armamento,
566 Aviação no Exército - uma visão histórica

pois montagem na do armamento será responsabilidade da Helibras,


após definição do 1º BAvEx.
3) Possuir autonomia de, no mínimo, 2 horas permanecendo
com uma reserva de 20 min, voando com 02 pilotos (80kg cada) nas
condições ISA + 20oC, a 1.200m de altitude, na configuração armada com
míssil AC (4 a 8 Mísseis do tipo HOT ou TOW)
Hipóteses consideradas para determinação do peso para a missão:
a – Peso vazio 1.340kg
b – Equipagem 160kg
c – Armamento:
– partes fixas 27kg
– partes móveis 175kg
– míssil 150kg
– combustível mínimo para a missão (utilizadas as curvas da
proposta técnica).
PESO TOTAL 2.174kg
PESO MAX DECOLAGEM 2.200kg
R - O helicóptero poderá cumprir a missão.
4) A autonomia requerida deverá ser cumprida com o helicóp-
tero podendo voar 1/4 do tempo em voo de cruzeiro e 3/4, em missão
da qual 60% em voo estacionário ou em baixa velocidade e 40% em ve-
locidade próxima à máxima.
R- Não pode ser respondido, pois falta no manual de voo a parte
de performance complementar (curvas de desempenho).
5) Ser muito ágil e dotado de muito boa manobrabilidade, com
capacidade de realizar o voo NOE à velocidade de 70 a 100km/h;
– suportar uma carga momentânea máxima de + 2,5 G, à velo-
cidade de cruzeiro e negativa de 0 G, durante um período máximo de 4
segundos. (Peso dez).
R – O PMV restringe os limites de manobras em não ultrapassar
o limite de reversibilidade dos servos-comandos em fator de carga. Es-
tes limites não são especificados no manual de voo.
6) Possuir comandos duplos e independentes e circuitos re-
dundantes para os sistemas essenciais de voo. (Peso dez).
R – O helicóptero possui comandos de voo duplo-assistidos por
04 servos-comandos hidráulicos. O sistema hidráulico não é redundante,
porém o helicóptero é pilotável em caso de falha de geração hidráulica.
Anexo 3 567

Obs.: Esta característica não foi considerada eliminatória a épo-


ca da avaliação, considerando que nenhuma das aeronaves apresenta-
das possuía redundância do sistema hidráulico.
7) Ser autossuficiente na partida dos motores, após o helicóp-
tero ter sido exposto a uma temperatura de 0o por um período de 02
horas. (Peso oito).
R – A aeronave é autossuficiente para a partida, não havendo no
PMV nenhuma restrição nas condições acima. Pode ser operado de -40o
a ISA+35o (limitado a 50o ao nível do mar).
8) Dentro das condições estabelecidas no item 4.a.3), carga
máxima e autonomia requeridas, se biturbinado, estando apenas com
um motor em funcionamento prosseguir 50km em voo e pousar em se-
gurança; se monomotor, estando o mesmo parado, ter possibilidade de
pousar em autorrotação e em segurança. (Peso oito).
R – Realizados vários pousos em autorrotação. Muito bom o com-
portamento da aeronave, tanto durante a descida como no próprio pouso.
9) Operar sem restrições, inclusive sofrer manutenção de cam-
panha em qualquer ponto do território nacional. (Peso dez).
R – Poderá operar em qualquer ponto do território nacional
com as limitações previstas no PMV, porém não pode ser avaliado quan-
to à manutenção de campanha.
10) Ser dotado de sistema de comunicações que permita:
– Ligação com unidades terrestres empregadas na área de atu-
ação do helicóptero. (Peso dez).
– operar em aerovias, com possibilidade de manter contato
com redes de controle de tráfego aéreo de terra. (Peso dez).
– intercomunicação entre tripulantes e Cmt GC (ICS TEAM) (*)
(Peso dez).
R – O helicóptero está dotado de equipamentos que permitem a
ligação com as unidades terrestres através do ARC 182 VHF/UHF/AM/
FM. Poderá operar em aerovias através do ARC 182 ou VHF 20 B. Possui
sistema de interfone que permite a intercomunicação entre os pilotos e
Cmt do CG. Além destes equipamentos, possui HF/SSB que lhe permitirá
as comunicações a grandes distâncias.
Os problemas de interferência dos equipamentos e as soluções
(modificações) propostas pela Aerospatiale foram tratados no relatório
de recebimento provisório.
568 Aviação no Exército - uma visão histórica

11) Ter condições de receber assentos blindados com tolerân-


cia balística para projéteis de até 7,62mm e dotados de amortecedores
(anticrash) para os pilotos. (Peso dez).
R – Segundo o fabricante, o helicóptero poderá receber assen-
tos blindados, porém não foram previstos em contrato.
12) Ser dotado de dispositivo corta-fios, tipo navalha, para a prote-
ção em caso de colisão com redes transmissoras de eletricidade. (Peso oito).
R O helicóptero pode receber o dispositivo corta-fios, porém
não foi previsto em contrato.
13) Apresentar muito boa visibilidade frontal e lateral para os
pilotos. (Peso nove).
R – É boa a visibilidade tanto frontal como lateral. O aumento
de tamanho do painel não prejudica a visibilidade.
11) Possuir painel e consoles com instrumentos de voo e de-
mais equipamentos que permitam fiel leitura, interpretação e acesso
aos mesmos. (Peso nove).
R – O painel e instrumentos são de fácil leitura e interpretação.
Entretanto, os interruptores dos comandos dos sistemas, apesar de fá-
cil interpretação apresentam dificuldade de leitura, devido a uma capa
protetora colocada sobre os interruptores. A retirada da capa protetora
que permitiria uma melhor leitura dos interruptores será uma decisão
operacional de responsabilidade do Cmt do Batalhão, uma vez que a re-
ferida capa faz parte do kit antiareia encomendado no contrato. O posi-
cionamento da tomada do capacete do piloto implica normalmente na
passagem do fio próximo à manete “coupe-feu”. Na ocasião em que o fio
passar inadvertidamente sob a manete, um movimento do piloto poderá
provocar, no contato do fio com a manete, o corte do motor.
Tal fato implica na necessidade do estabelecimento de um pa-
drão de operação da aeronave, com a passagem do fio do capacete, por
baixo do cinto do piloto (por exemplo) de modo a evitar a ocorrência do
problema.
15) Ser dotado de trem de pouso com robustez necessária para
operação em terreno irregular, bem como para suportar pousos de emer-
gência e, ainda, adequado a operarem terreno com pouca resistência.
(Peso nove).
R – Robusto, o trem de pouso não foi testado quanto ao pouso
em terreno de pouca resistência.
Anexo 3 569

16) Ter possibilidade de pousar e decolar sobre terrenos com


declive de 10% pelo menos. (Peso alto).
R – As limitações quanto ao pouso e decolagem são:
– cabrado – 10%.
– picado – 6%
– lateral – 8%
17) Possibilitar a instalação de modernos equipamentos de ob-
servação e aquisição de alvos que permitam o melhor cumprimento de
suas missões. É desejável que o reconhecimento possa ser realizado a
distância de até 5km (dia claro) e 2,5km (noite clara). (Peso nove).
R – Não foi solicitada em contrato a instalação dos ditos equi-
pamentos. Segundo o fabricante, eles poderão ser instalados bastando
para isso pequenas modificações.
18) Nas condições do item 4.a.3), carga máxima e autonomia
requeridas, pousar em áreas restritas, com diâmetro mínimo,
aproximado, igual a três vezes o diâmetro do rotor principal. (Peso sete).
R – É possível o pouso em áreas restritas nas condições acima.
19) A concepção do aparelho deverá minimizar os riscos de in-
cêndio e explosão e, ainda, facilitar a saída dos ocupantes em caso de
acidentes. (Peso nove).
R – Existe um sistema de detecção de incêndio ligado a um alar-
me visual no painel de instrumentos. A aeronave possui extintor de in-
cêndio e as portas são alijáveis, o que facilita seu abandono em caso de
emergência.
20) Nas condições de ISA + 20°C, altura 1.200m, realizar o voo
pairado fora do efeito solo, estando o helicóptero abastecido para autono-
mia estabelecidas no item 4.8.3). Esse voo deverá ser realizado com uma
margem de reserva de 10% de potência do (s) motor (es). (Peso oito).
R – Não pode ser colocada a quantidade de combustível para a
missão, devido a falta no PMV das curvas de performance, além do que o
PMD de 2.450kg com cargas externas não está ainda homologado.
21) Ser dotado de pontos de fixação (Hard Points) e cablagem
que permitam equipar a configuração básica com os armamentos citados
no item 4.a.2). (Peso dez).

R – Os pontos de fixação dos armamentos e suas respectivas


cablagens serão montados na Helibras.
570 Aviação no Exército - uma visão histórica

ESSENCIAIS
Os objetivos essenciais são aqueles que permitem uma flexibi-
lidade em relação às características que definem.
1) Possuir elevado grau de estabilidade, particularmente no voo
estacionário, qualquer que seja a direção do vento (Vel. de até 50km/h),
de modo a satisfazer as exigências relativas ao tiro de seu armamento.
(Peso seis).
R – O helicóptero é bastante estável no voo estacionário.
Limitações do vento:
– dianteiro e lateral esquerdos 55km/h
– traseiro 50km/h
– lateral direito 36km/h
2) Possuir velocidades aproximadas de:
– 300km/h (VNE);
– 250km/h (Vel. Cruzeiro). (Peso cinco).
R – A VNE é 287km/h (155Kt) a zero ft (Zp).
Em altitude a velocidade decresce 3 Kt para cada 1.000 pés.
– A velocidade de cruzeiro, com peso máximo, é 243km/h.
3) Ser dotado de duas turbinas. (Peso seis).
R – O helicóptero é monomotor e está equipado com uma tur-
bina ARRIEL 1D1.
4) Possuir elevado grau de sobrevivência, apresentando:
– condições de receber dispositivos alerta laser/radar, disper-
sador “chaff” e geradores de ponto quente (“flares”), a fim de evitar ser
atingido, se detectado. (Peso cinco).
R – O helicóptero na atual configuração não possui elevado
grau de sobrevivência. Nenhum dispositivo foi encomendado no contra-
to. Através de aperfeiçoamentos na pintura externa, tenta-se pelo me-
nos diminuir seu reconhecimento visual.
5) Possuir elevado grau de sobrevivência, apresentando:
– tolerância balística para os componentes essenciais, possibi-
litando o prosseguimento de voo e pouso de emergência, mesmo após
os rotores (cabeça e pás), motor e transmissão principal terem sido atin-
gidos por projéteis até o calibre 7,62mm. (Peso seis).
R – As pás principais e traseiras são construídas de material
composto, o que lhe dá certo grau de sobrevivência.
Anexo 3 571

A transmissão principal poderá funcionar 45min. a uma veloci-


dade de 55Kt e potência reduzida com a pressão do óleo mínima.
6) Possuir elevado grau de sobrevivência, apresentando:
– proteção “anticrash”, minimizando a ocorrência de ferimentos
em todos os tripulantes em caso de pousos de emergência, resistindo
aos impactos a uma velocidade vertical, mínima, de 7m/s. (Peso seis).
R – A proteção da tripulação é assegurada para pousos de emer-
gência a uma razão de 6m/seg.
7) Possuir elevado grau de sobrevivência, apresentando:
– proteção anti-incêndio, dispondo de reservatório de combus-
tível “anticrash” e autosselante e, ainda, um sistema ele alarme e extin-
ção de fogo nas turbinas e outros componentes essenciais. (Peso seis).
R – Os tanques de combustível são autosselantes, conforme
normas internacionais (Proteção contra impacto 7,67mm).
Há um sistema ele alarme visual de incêndio situado no painel
de instrumentos e sistema (extintor) de fogo situado no piso da aerona-
ve, abaixo do assento do piloto.
8) Ter condições de decolar, em situações de emergência, no
máximo um minuto após a partida dos motores. (Peso cinco).
R – O helicóptero é capaz de decolar em menos de um minuto.
9) Ter, na configuração básica, possibilidade de operar em con-
dições de voo Instrumental Flight Rules (IFR), possuindo, no mínimo, os
seguintes instrumentos. (Pesos seis).
– horizonte artificial para o 1º piloto (lP);
– horizonte artificial para o copiloto (2P);
– bússola magnética;
– bússola elétrica;
– VOR/ADF.
R - A configuração prevista permite efetuar o voo VFR diur-
no e VFR noturno. A operação IFR é uma decisão operacional. O
helicóptero está equipado com 2 horizontes, artificiais (1P e 2P),
mais o horizonte de segurança, bússolas elétricas e magnéticas,
VOR, ADF, 2 VHF, UHF, HF, DME e TRANSPONDER, porém não possui
piloto automático.
10) Ter possibilidade de ser empregado nas missões de coman-
do e ligação tendo, para tal, uma disposição de 02 a 03 assentos, além
dos dois destinados aos pilotos. (Peso quatro).
572 Aviação no Exército - uma visão histórica

R – Além dos 02 pilotos o helicóptero poderá transportar até


04 passageiros.
11) Ter possibilidade de atuar nas missões de busca, resgate
(inclusive com guincho) e evacuação aeromédica, dispondo, para tal, de
uma ou duas macas. (Peso quatro).
R – O helicóptero está equipado com guincho elétrico AIR EQUI-
PEMENT. O comportamento do helicóptero é excelente quando da rea-
lização de missão de resgate com este tipo de equipamento. Realizados
dois içamentos com carga de 80kg a, aproximadamente, 20 metros de
altura. As possibilidades, limitações, procedimentos normais e de emer-
gência estão descritos no PMV parte 09.
12) Apresentar facilidades para manutenção orgânica, par-
ticularmente a ser realizada em campanha, caracterizada por ne-
cessidade de ferramentas não especializadas e limitadas a um pe-
queno número.
R – Não pode ser julgado. As inúmeras atividades de caráter
administrativas/de fiscalização e de controle exercidas pela Comissão
e o número insuficiente de mecânicos que a compõe (um) impedem a
designação de elemento para acompanhamento do programa, situação
que permitiria a avaliação deste aspecto.
13) Apresentar facilidades para manutenção orgânica, particu-
larmente a ser realizada em campanha, caracterizada por:
– emprego maximizado de dispositivos de autocontrole.
R – Mesmas observações do item anterior.
14) Apresentar facilidades para manutenção orgânica, particu-
larmente a ser realizada em campanha, caracterizada por:
– concepção modular dos diversos componentes e facilidades
de acesso aos mesmos.
R – Mesmas observações do item anterior.
15) Apresentar facilidades para manutenção orgânica, parti-
cularmente a ser realizada em campanha, caracterizada por rapidez na
substituição de componentes essenciais como: motor (2 homens em 2h
e 30min); caixa de transmissão principal (2 homens em 7 horas) e pás
do rotor principal (2 homens em 45 min). (Peso seis)
R – Mesma observação do item anterior.
16) Apresentar facilidades para manutenção orgânica, particu-
larmente a ser realizada em campanha, caracterizada por:
Anexo 3 573

– com uma utilização de 90 horas por mês, necessitar, no


máximo, 1 homem/hora de manutenção por cada hora de voo, ex-
cetuando o tempo disponível para manutenção geral (“overhaul”).
(Peso seis).
R - Mesma observação do item anterior.
Obs.: O programa de manutenção abaixo descrito indicando a
relação homem/hora é de responsabilidade da Aerospatiale:

Substituição dos principais equipamentos:


– pás principais 2 homens 00h25min
– cabeça do rotor principal 2 homens 01h48min
– cabeça do rotor principal + mastro 2 homens 02h07min
– mastro (nu) 2 homens 03h55min
– CTP 2 homens 04h00min
– conjunto motor 2 homens 01h30min
– Ligação CTP/motor 2 homens 01h10min

Os tempos acima indicados são calculados para as condições


mais desfavoráveis, quer dizer, no campo com a ajuda do ferramental
talha de manutenção. A montagem desta talha dura 10 min.

Manutenção programada (essencialmente célula)


– inspeção periódica: a cada 400 horas ou anual 45 horas
– inspeção maior: a cada 3.600 h ou a cada 8 anos 300 horas

Manutenção diária ou periódica


– inspeção diária: antes do voo 05min.
intervoos sem abastecimento 03min.
intervoos com abastecimento 08min.
após o último voo 08min.
– Inspeção complementar a cada 100 horas 20min.

17) Apresentar o maior número de componentes na situação


de “on condition” ou com intervalos de manutenção geral superiores a
2.000 horas. (Peso seis).
R – Questão respondida pela Aerospatiale. Sem condições de
avaliação pela Comissão. O HB 350 L1 apresenta um grande número de
574 Aviação no Exército - uma visão histórica

componentes essenciais cuja manutenção é feita “on condition” e o TBO


superior a 2.000 horas.
Componentes principais de manutenção “on condition”.
(Obs.: A resposta listava um total de 36 itens “on condition” ou
com revisão em prazo superior a 1.500 horas. Resolvemos não reprodu-
zi-la na íntegra para não alongarmos o relatório.)
18) Ser dotado de equipamento que permita a operação em
áreas com grande densidade de partículas dispersas no ar e sistema an-
tigelo. (Peso seis).
R – O helicóptero está equipado com filtro antiareia. Testado
somente seu funcionamento, não podendo ser avaliado quanto à efici-
ência. Existe um equipamento opcional de aquecimento de combustível,
porém não foi encomendado.
19) Apresentar pouca sensibilidade à variação do centro de
gravidade durante o voo, seja lateral ou longitudinal, com peso máximo
de carga. (Peso cinco).
R – O helicóptero apresenta pouca sensibilidade à variação do
CG durante o voo, tanto longitudinalmente como lateralmente com o
peso máximo de carga. Atenção deverá ser tomada durante o carrega-
mento para que o CG permaneça dentro dos limites do PMV.
20) Ser reabastecido rápida e facilmente, por pressão e gravi-
dade, inclusive com os motores ligados, recebendo uma média de 200l/
min de combustível. (Peso cinco).
R – O abastecimento pode ser efetuado com os motores em
funcionamento. O tanque tem capacidade de 535 litros, podendo
ser abastecido por gravidade em um tempo de 5 minutos aproxima-
damente.
21) Ter condições de prosseguir o voo, mesmo com o rotor de
cauda imobilizado, realizando, nestas condições, o pouso em segurança.
(Peso quatro).
R – Realizado vários pousos com simulação de imobilização do
rotor de cauda, tendo a aeronave um comportamento muito bom.
22) Ter possibilidade de prosseguir o voo por 20 min., mesmo
após ter-se esgotado o óleo da caixa de transmissão. (Peso seis).
R – Não pode ser testado, porém o PMV indica a possibilidade
de prosseguimento do voo, com potência reduzida por 5 min., com pres-
são mínima do óleo.
Anexo 3 575

23) Possuir sistema automático de estabilização. (Peso seis).


R – O piloto automático é um opcional não previsto em contrato.
24) Apresentar baixo nível de ruído no interior do helicóp-
tero que deverá ser aproximado de 90 decibéis para a tripulação e
demais ocupantes não munidos de protetores para o ouvido. (Peso
quatro).
R – A Comissão não possui equipamentos que possam medir os
níveis de ruídos no interior do helicóptero.
25) A concepção da cabine deve permitir a utilização de equi-
pamentos de visão noturna por intensificação de luz residual, bem como
os de tipo termal de imagem. (Peso seis).
R – A concepção da iluminação da cabine permite, pela simples
troca das lâmpadas por UV e tratamento dos instrumentos, a possibili-
dade de utilização de óculos de visão noturna.
26) Apresentar uma probabilidade maior que 90% para cum-
prir uma missão de duas horas, sem abandono da mesma devido a qual-
quer falha mecânica. (Peso seis).
R – Não pode ser avaliado.
27) Apresentar condições para ser reabastecido e rearmado
num prazo máximo de 15min. Essas duas atividades deverão ser reali-
zadas simultaneamente e para qualquer configuração armada do heli-
cóptero. (Peso cinco).
R – O helicóptero pode ser abastecido no tempo requerido, po-
rém, quanto ao armamento, não pode ser testado devido a sua monta-
gem estar prevista na Helibras.
28) Nas condições do item 4.a.3), apresentar uma razão de su-
bida igual ou superior a 7m/s. (Peso cinco).
R – Com peso igual ao PMD (2.200kg) a 1.200 metros e ISA+20
velocidade ascensional é de 5,8m/s.
29) Possuir característica de estabilidade, particularmente, no
voo estacionário e pontos de fixação (Hard Points) e cablagem que per-
mitam o emprego armado com canhão de 20 a 30mm. (Peso seis).
R – O helicóptero possui boa estabilidade no voo pairado.
30) Ter possibilidade de receber sistema de identificação de ae-
ronave (Transponder). (Peso seis).
R – A aeronave tem possibilidade de receber o Transponder,
porém não foi pedido em contrato.
576 Aviação no Exército - uma visão histórica

31) Ter possibilidade de receber equipamento de navega-


ção que permita a determinação da altura de voo (rádio-altímetro).
(Peso seis).
R - A aeronave tem possibilidade de receber rádio-altímetro,
porém não foi pedido em contrato. Foi previsto no painel de bordo o
espaço destinado à instalação deste equipamento.
32) Ter possibilidade de ser dotado com equipamento de nave-
gação autônoma (DOPPLER, “OMEGA” ou outro). (Peso cinco).
R – A aeronave tem possibilidade de receber equipamento de
navegação autônoma, porém não foi pedido em contrato.

DESEJÁVEIS
Estes são objetivos orientadores de pesquisa. A aeronave não
precisa atendê-los.
1) Ter possibilidade de ele ser dotado de radar meteorológico.
(Peso três).
R – Não está previsto nos opcionais da linha de produção este
tipo de equipamento.
2) Ser facilmente transportável em aeronaves do tipo C-130.
(Peso um).
R – Existe um plano de embarque do helicóptero em aeronave
C-130, com os tempos de desmontagem, carregamento etc., porém não
pode ser avaliado.
3) Ser dotado de piloto automático transparente aos comandos
do piloto, permitindo a sua intervenção, a qualquer momento, mesmo
com esse equipamento ligado. (Peso três).
R – O helicóptero pode ser equipado com este tipo de opcional,
porém não está previsto em contrato.
4) Possuir equipamento que possibilite o voo pairado sem a in-
tervenção do piloto (Peso dois).
R – Não é possível realizar voo pairado sem intervenção dos
pilotos.
5) Em caso de pouso forçado em curso de água ou no mar, a
flutuabilidade do helicóptero deve ser suficiente para permitir a saí-
da de emergência dos ocupantes do aparelho. Esta capacidade deverá,
eventualmente, ser aumentada para o caso de cumprimento de missões
especiais. (Peso dois).
Anexo 3 577

R – Não pode ser avaliado.


6) Ter possibilidade de receber equipamento (s) que permita
(m) a realização de voo tático noturno. (Peso três).
R – A aeronave tem possibilidade de realização do voo tático
noturno, bastando para isso introduzir as modificações necessárias.
7) Permitir a instalação de equipamento de comunicações para
controle de voo tático (rádio com contra-contramedidas eletrônicas –
CCME). (Peso três).
R – Não é de conhecimento desta Comissão a possibilidade de
instalação de equipamentos CCME.
8) Ter possibilidade de ser equipado com instrumento que permi-
ta a localização, com facilidade, do elemento a ser apoiado, estando o mes-
mo em área de difícil acesso e de pouca visibilidade (Homing). (Peso três).
R – Não foi previsto em contrato a instalação deste equipamento.
9) Ter possibilidade de instalação de radar meteorológico.
(Peso três).
R – Não está previsto nos opcionais de linha de produção.
10) Ter possibilidade de utilizar, no painel, iluminação compa-
tível ao uso de óculos de visão noturna. (Peso um).
R – O painel tem possibilidade de receber iluminação compatí-
vel com os óculos de visão noturna, necessitando efetuar o tratamento
dos instrumentos e troca das fontes luminosa.
Anexo 4

Relatório periódico nº 2
Recebimento do HB 350 L1 Esquilo 01

1) 27 Jan 89
Reunião preliminar com o Service Industrielle de l’ Armement
(SIAR), organismo do Ministério da Defesa francês, responsável pelo
controle do material de interesse militar.
a) Assunto – Transmissão à Comissão de detalhes envolvendo
derrogação, relativa ao cárter da aeronave. Entende-se por “derrogação”
quaisquer modificações impostas à aeronave que não estejam de acordo
com as condições estabelecidas em contrato ou que difiram da aeronave
padrão.
b) Motivo da derrogação – Com a adoção dos servos SAMM,
em substituição aos da DUNLOP, anteriormente, previsto em contrato,
conforme já aludido em documentação endereçada à DMAvEx por esta
Comissão, não se conseguiu em um deles a folga de l mm prevista na TO.
c) Opções para resolução da discrepância:
(1) Retoque (reusinagem) de uma das orelhas do cárter permi-
tindo que se produza a folga prevista (desenhos elucidativos em anexo),
a ser realizado na Aerospatiale.
580 Aviação no Exército - uma visão histórica

(2) Diminuição da altura do parafuso do servo-comando.


d) Derrogação – Considerando que o redimensionamento da
cabeça do parafuso do servo-comando por ser de responsabilidade de
fornecedor demanda prazo que provavelmente implicaria em atraso da
aeronave, optou a Aerospatiale por fazer o retoque em uma das orelhas
do cárter, permitindo a folga prevista em TO e, segundo depoimento do
escritório de estudos e projetos, mantendo o mesmo ciclo de vida do
item.
e) Considerações da Comissão – Sobre a derrogação relativa ao
cárter PN 350 A 37 129 200, esta Comissão fez ver ao SIAR da necessi-
dade da identificação da origem do problema, considerando:
(1) O mesmo ter ocorrido por defeito de usinagem do cárter,
hipótese em que o mesmo deveria ser substituído;
(2) O redimensionamento dos parafusos dos servos-comandos
possa ser suficiente para a obtenção da folga necessária.
f) Conclusão – Das discussões em torno dos fatores motivado-
res da derrogação e de suas consequências derivam-se as seguintes con-
clusões:
(1) Necessidade de obtenção de compromisso da Aerospatiale
de que o helicóptero seria entregue ao 1° BAvEx com o problema da
folga resolvido, seja por substituição do cárter ou do parafuso do servo-
comando;
(2) Obtenção de crédito no valor do cárter, válido até a correção
do problema;
(3) Necessidade de pesquisa da origem da derrogação visando
à identificação de seu fator motivador (cárter ou parafuso do servo-
comando). Ainda durante a referida reunião ficou definido o dia 01
Fev para a entrega da aeronave ao cliente, com vistas aos voos de
recebimento.
2) 28 Jan 89
a) Reunião com o SIAR
Na ocasião foram debatidas com os representantes da SIAR as
seguintes derrogações, todas constantes do Log Book da aeronave, a sa-
ber:
(1) Falta do indicador NR/NTL do copiloto (indica o no de rotações
do rotor e o no de rotações da turbina livre).
(2) Falta do indicador NG (percentagem de rotação da turbina).
Anexo 4 581

(3) Falha no sistema Klaxon (alarme de alta e baixa rotação e do


sistema hidráulico).
A fábrica se compromete a resolver as derrogações 01 e 02 an-
tes da entrega da aeronave ao 1° BAvEx, por se constituírem em falha de
abastecimento do fornecedor. A entrega da aeronave foi transferida para
o dia 2 Fev, para a correção da falha do Klaxon.
3) Dia 01 Fev 89
a) Reunião com o SIAR
O SIAR colocou neste dia a aeronave à disposição da Comissão
informando que a pane do Klaxon estava sanada, permanecendo a aero-
nave com as derrogações acima referidas. O início dos voos de recepção
pela COMFIREMEX foi marcado para as 15:00 horas do mesmo dia.
b. Início dos voos de recepção
(1) Duração: 01:45min
(2) Ensaios mecânicos: (Os resultados constaram de anexo ao
relatório que não pude, infelizmente, encontrar.)
(3) Problemas constatados:
– Falta do NR/NTL do copiloto;
– O indicador de NG instalado não se encontra de acordo com
as especificações do contrato;
– Permanece a pane do Klaxon (o sistema de alarme não acio-
nou durante o corte do motor).
Obs.: O sistema de alarme não funcionou por ocasião da baixa
rotação nem de simulação de falha no sistema hidráulico.
4) 2 Fev 89
a) 2o voo de recepção
(1) Duração: 01h10min.
(2) Objetivo: ensaios rádio e instrumentos, utilização do guin-
cho e gancho.
(3) Considerações:
(a) A aeronave apresentou muito bom rendimento quando da
realização de voo com carga externa;
(b) Pequena vibração no voo nivelado com discreto aumento
quando submetida a “g”;
(c) Interferência da transmissão de HF no ponteiro do ADF
levando este a indicações imprecisas. Para resolver o problema ado-
tou a Aerospatiale a solução do deslocamento do ponteiro do ADF
582 Aviação no Exército - uma visão histórica

para a posição de 90° (través) toda a vez que há uma emissão HF. A
solução foi considerada satisfatória. Ressalve-se que o normal seria
que, apesar da transmissão de HF, o ponteiro do ADF se direcionasse
para a transmissora e, somente para o través, quando a estação esti-
vesse nesta direção;
(d) Interferência da transmissão de HF no ARC 182
A emissão de HF provocava ruídos no VUHF ARC 182. A solu-
ção adotada pela Aerospatiale foi a de interromper automaticamente
a recepção VUHF quando da emissão HF. A recepção do VUHF tem
retorno automático quando interrompida a transmissão HF. A solu-
ção foi considerada boa, no entanto, consubstancia uma interferência
rádio anormal;
(e) Interferência da transmissão do VHF 20B no ARC 182
Devido à potência do VHF 20B produzia-se interferência na re-
cepção do ARC 182. A solução encontrada foi a dessensibilização auto-
mática de 10 decibéis no áudio do ARC 182, tornando desnecessária a
atuação do piloto para diminuição do volume;
(f) Supressão do interruptor ON/OFF das agulhas do horizonte
artificial.
Considerada como muito boa a solução do aparecimento auto-
mático das agulhas do horizonte artificial assim que sintonizada a fre-
quência ILS no VIR 31. O desaparecimento ocorre também automatica-
mente;
(g) O VOR entrou em pane por ocasião da execução de manobra
de autorrotação;
(h) A aeronave apresentou bom comportamento em autorro-
tação;
(i) Pane do Klaxon
O sistema de alarme (Klaxon) não funcionou durante o corte do
motor nem por ocasião de simulação de pane hidráulica.
5) Conclusões
Foram transmitidos todos os dados coligidos à Aerospatiale,
bem como solicitadas as correções das panes apresentadas e o estudo
para solucionamento das interferências rádio.
b) Recepção da documentação.
(1) Horário: 15:00h
(2) Local: Depto de Controle de Qualidade
Anexo 4 583

(3) Considerações:
(a) Foram constatadas as faltas do Livro da Aeronave (Livret
d’Aeronef), do “Carnet de Route” (lista todos os voos realizados, com a
identificação das equipagens etc) e das curvas de performance do motor
no PMV (Manual de voo – Parte 5).
(b) O certificado de homologação de tipo não foi assinado pelo
SIAR.
(c) Na oportunidade foi identificada a dificuldade de leitura
das inscrições referentes aos interruptores de comando dos sistemas
no console. A má visibilidade decorre de proteção de plástico que en-
volve os referidos interruptores. Segundo a Aerospatiale a proteção em
questão faz parte do kit antiareia. Como soluções possíveis a retirada da
proteção de plástico ou a utilização do console sempre com iluminação,
mesmo de dia, o que contorna o problema em pauta. Ambas as soluções
deverão fazer parte de normas de padronização a serem instituídas a
nível batalhão.
c) 3o voo de recepção – voo noturno
(1) Duração: 0h30min.
(2) Equipamento rádio: Funcionamento normal.
(3) Aproximação por instrumento: Boa precisão na aproxima-
ção ILS.
(4) Iluminação do painel.
A iluminação é deficiente dificultando a leitura dos instrumen-
tos de bordo. O sistema de iluminação de segurança (emergência) tam-
bém é deficiente.
6) Dia 03 Fev 89
Face às discrepâncias encontradas, obteve-se o consenso so-
bre a necessidade da permanência da aeronave, na fábrica, atrasan-
do-se o recebimento provisório deste prazo. A decisão levou em con-
sideração o fato de que na Aerospatiale a busca das soluções sobre
os problemas detectados se faria em menor prazo e melhores condi-
ções que na Helibras. Em vista do exposto, retornou o helicóptero à
fábrica. O processo se reiniciará quando recolocado o helicóptero à
disposição da Comissão.

Do exposto pudemos constatar, já em relação à primeira ae-


ronave, que o recebimento de material desta natureza é tão complexo
584 Aviação no Exército - uma visão histórica

quanto a tecnologia que ele envolve. O nosso leitor leigo poderia se indagar
como um equipamento que já vinha sendo fabricado anteriormente
pode apresentar uma quantidade tão grande de problemas. Deve-se
considerar que a personalização do helicóptero com a introdução de
itens não previstos na versão standard, o que era o nosso caso, gera uma
nova aeronave com novas peculiaridades.
Anexo 5

Carta do Cel Kerrand ao Cel Telles


586 Aviação no Exército - uma visão histórica
Anexo 5 587
588 Aviação no Exército - uma visão histórica
Anexo 5 589
Cronologia da Aviação
do Exército

P areceu-me importante estabelecer com a exatidão pos-


sível a cronologia da sucessão dos fatos que culminaram
com a tão sonhada implantação da Aviação do Exército, para permitir
ao leitor uma compreensão holística dos eventos e suas repercussões.
O trabalho exigiu uma minuciosa pesquisa entre os remanescentes que
participaram das atividades em questão, pois as fontes de pesquisa,
como já frisado anteriormente, pecam pela grande escassez.
Nem sempre tive sucesso em recuperar as datas das ocorrências.
Por esse motivo, resolvi manter no quadro que se segue alguns eventos
ainda que sem a respectiva data de ocorrência, por considerar que a sua
menção e registro são de importância para o entendimento do processo
global. De todo modo, eles aparecem na sequência em que ocorreram.

Evento Data Ato

Diretriz Ministerial
Memória ao 3º Sch/ propondo a 13 Fev 85 Memória da Seção
criação da de Evolução da
AvEx e de comissão para estudar o Doutrina ao 3º Sch/
assunto. EME
Proposta da 3º Sch ao V Ch do EME 04 Mar 85 **********
592 Aviação no Exército - uma visão histórica

Plano de Reestruturação da FTer –


FT90
Nomeação da Comissão para 24 Set 85 Port 060 EME
estudar a implantação da AvEx
Início dos trabalhos da Comissão 25 Set 85
para estudar a implantação ***********
Conclusão dos trabalhos da Comissão 14 Nov 85
para estudar a implantação ***********
Encaminhamento ao Sr. ministro pelo 27 Nov 85 Of nº 033/ST-1
Ch do EME da proposta do
plano de implantação da AvEx
Aprovação pelo Min Ex da 28 Nov PS nº 1.109/85-
Proposta de implantação da AvEx 85 GMEx
Nomeação da Comissão para 09 Dez 85 Port 78-EME
implantar a AvEx
Diretrizes para a AvEx 27 Dez 85 Port nº 081-EME
1ª fase da seleção de pilotos 02 a 06 Fev *************
86
2ª fase da seleção pilotos 23/28 Fev
86 ***********
Início do 1º curso de piloto na FAB 23 Fev 86
Início do 1º Curso de Pilotos na 31 Mar 86
Marinha ***********
Aprovação dos OBO Hlcp de manobra 20 Mai 86 Port. nº 27 EME-Res-
OBO 37/86
Alteração dos OBO do Hlcp Mnb 09 Jul 86 Port Res 048-4ª Sch/
EME
Criação da AvEx Dec 3.206
Criação do 1º BAvEx 03 Set 86 Dec 3.208
Dec 3.207
Criação da DMAvEx
Aprovação dos OBO Hlcp de Rec Atq 15 Set 86 Port 086, 3ªSch/EME-
OBO 040/86
Criação dos distintivos e insígnias da 24 Set 86 Port. Min. 1.039
AvEx
Aprovação do QO para o BAvEx 21 Out 86 Port Nº101-
4ª Sch/EME-Res
Cronologia da Aviação do Exército 593

Cap Marcos realiza o primeiro voo 22 Out 86 *********


solo
de oficial da Av Ex na BAe de Santos
DMAvEx inicia suas atividades 01 Nov 86
**********
Ten Garcez, primeiro voo solo – Base 05 Nov 86
Aérea **********
e Naval de São Pedro da Aldeia
Conclusão do curso de piloto na FAB – 23 Fev 87
1ª Turma ***********
Início do 2º curso de piloto na 23 Mar 87
Marinha ***********
Designação Taubaté sede do 1º BAvEx 04 Jun 87 Port Res 091 4ª Sch/
EME
Alteração nos OBO do Hlcp Rec Atq 09 Jul 87 Port Res 048-4ª Sch/
EME
Publicação do edital nº 01/DMB 25 Ago 87
Início do 2ºcurso de piloto na FAB ?
***********
Recebimento das propostas das 23 Nov 87
empresas concorrentes **********
Divulgação do resultado da habili- 03 Dez 87
tação ***********
Abertura das propostas técnicas 09 Dez 87 ***********
Início do funcionamento do 1ºBAvEx 04 Jan 88
Hlcp da Marinha com pilotos do 04 Jan 88
Exército
pousam pela primeira vez no
1ºBAvEx
Início da discussão do contrato ? ***********
Término da discussão do contrato ? ***********
Término do 2º curso de pilotos Mar 1º Jun 88
Primeira reunião do processo de 30 Nov 87 ************
aquisição
Habilitação das empresas
Assinatura do contrato de aquisição 24 Jun 88
das aeronaves ***********
594 Aviação no Exército - uma visão histórica

Criação das comissões de 12 Out 88 Port Min 990


recebimento
Aprovação das diretrizes para a AvEx 27 Dez 88 Port 08/3ª Sch/EME
Nomeação para a COMFIREMEX 26 Out 88 Port Min 1.033
Primeiro pouso de helicóptero da 04 Nov 88
Marinha ***********
no 1º BAvEx pilotado por tripulação
do
Exército
Inauguração das instalações da 22 Dez 88
COMFIREMEX em Marignane ***********
Início do recebimento em voo do 1º Fev 89
Esquilo 01 ***********
Conclusão do recebimento do Esquilo 09 Mar 89
01 ***********
Solenidade de recebimento do Esqui- 10 Mar 89
lo 01 ***********
em Marignane
Recebimento do Esquilo 01, no BAvEx 21 Abr 89
***********
Visita do Gen Bulcão – Dir 26 a 28 Abr ***********
DMAvEx à COMFIRMEX 90
Recebimento do Panther 01, em ?
Marignane ***********
Recebimento do Panther 01 no 1º ?
BAvEx ***********
Extinção da DMAvEx e criação da 24 Nov 89 Dec nº 98.445
Bda de AvEx
Término da missão em Marignane 31 Jan 89
***********
Prorrogação da missão 12 Dez 90 Port Min 999
Término da missão. Passagem de 31 Jul 91 ***********
chefia
Como realçado acima, algumas lacunas permanecem na crono-
logia pela dificuldade de se obter os documentos que registrem as datas
em que os eventos ocorreram. Mantive alguns sem data pela importân-
cia que tiveram no processo de implantação e na esperança de que al-
gum leitor possa, como dizemos, “preencher os lugares vagos”.
Colaboradores

N ão poderia deixar de destacar aqueles notáveis chefes e


os preclaros companheiros que colaboraram para que
este livro chegasse ao seu final. Sem a preciosa ajuda deles minha tarefa
teria sido muito mais difícil. A despeito de te-los nominado ao longo de
minha narrativa, julguei que seria justo destacá-los, mais uma vez, pois
como eu, cada um deles, representa um pouco da história da Aviação do
Exército. Por isso, mais uma vez, a minha gratidão.

Gen Ex Leonidas Pires Gonçalves


Gen Ex Angelo Baratta Filho
Gen Div Luiz Oscar Bulcão de Lima
Gen Div Jeannot Jansen da Silva (piloto)
Cel Art Valentim Ângelo Teixeira
Cel Inf Sergio Marcondes
Cel Inf Celso Seixas Marques
Cel Inf Jomar Nascimento Telles (piloto)
Cel Av José Luiz Albernaz Rosa
Cel Int Linelson de Souza Gonçalves
Cel MB Wanderley de Castro (gerente Mnt de aeronave)
Cel QEM Francisco Carlos Sardo (gerente de Mnt de Avionica)
Cel Art Luis Arnaldo Barros Pereira Simões (piloto)
596 Aviação no Exército - uma visão histórica

Cel MB Edmir Rodrigues (gerente de Mnt de aeronave/piloto)


Ten Cel Luis Azambuja Contreiras Rodrigues (piloto)
Referências bibliográficas

Conforme relatado ao longo deste livro, a sua originalidade impe-


diu a consulta a outras fontes literárias, tendo sido objeto somente docu-
mentos de caráter oficial da época. Quando falamos de documentos oficiais,
nos referimos àqueles de circulação regular no âmbito da Força, como o
Noticiário do Exército e os Boletins do Exército que, por ocasião do proces-
so de implantação, fizeram chamadas sobre assuntos de interesse da Avia-
ção do Exército. Nesses documentos, minha pesquisa se ateve em particular
aos cursos de oficiais e sargentos na tentativa de que os matriculados em
1986 e 1987 tivessem seus nomes destacados. Conforme já expus anterior-
mente, fixei-me nesses dois anos por considerar que essas foram as turmas
que considero realmente pioneiras Utilizei também algumas citações que
foram extraídas das obras abaixo citadas e trechos de artigos publicados
no informativo Águia, editado no Comando de Aviação do Exército, e da re-
vista Rotores. Apropriei-me, ainda, com a permissão do autor, o coronel de
Cavalaria R1 Luis Azambuja Contreiras Rodrigues, de trecho de entrevistas
constantes de seu trabalho História oral da Aviação do Exército.

Documentos oficiais
Noticiários do Exército
Boletins do Exército
Revista Rotores, da Diretoria de Material da Aviação do Exército
598 Aviação no Exército - uma visão histórica

Informativo Águia
Site do Comando de Aviação do Exército
Revista Guardião, da Aviação do Batalhão de Manutenção de
Aviação do Exército
História do Estado-Maior do Exército

Documentos não oficiais


ALEXANDER, John B. Ganhando a guerra. Rio de Janeiro: Bibliex,
2007.
AMBROSE, Sthepen E. Soldados cidadãos. Rio de Janeiro: Bibliex,
2010.
CONTREIRAS RODRIGUES, Luis Azambuja. História oral da
Aviação do Exército de 1985 a 1994 (dissertação apresentada à Escola de
Comando e Estado-Maior do Exército para a obtenção parcial do título
de Mestre em Ciências Militares). Rio de Janeiro, 2006.
D’Assumpção, Herculano Teixeira. A campanha do Contestado:
as operações da coluna do Sul. Bello Horizonte: Imprensa Official, 1917.
HOUSE, Jonathan M. Combinação das Armas: a guerra no século
XX. Rio de Janeiro: Bibliex, 2007.
TATCHER, Margareth. A arte de governar. Rio de Janeiro: Bibliex,
2005.
Quantidade de páginas 600 páginas
Formato 16 x 23cm
Mancha 29 x 45 paicas
Tipologia Cambria
Corpo/entrelinha 11,5/14,5
papel do miolo Pólem Sóft 80g
Papel de capa Cartão Supremo 240g (plastificada)
Impressão e acabamento Ediouro Gráfica

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