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Ajoelhados Diante Da Verdade: O Caminho da Doutrina para a Piedade

Introdução:

- Todo homem humilde se ajoelha perante toda verdade – Ernest Hello

- Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes. – Tiago 4.6b

- Com esta citação e com a passagem de Tiago, iniciamos nossa reflexão acerca do
caminho da doutrina para uma vida de piedade, ou, no conceito do Jonas Madureira,
para uma inteligência humilhada.

- Qual sua atitude diante do conhecimento de Deus? Você se achega humilhado diante
da possibilidade de que Deus se revelou ou orgulhoso, confiando na sua capacidade de
conhecer a Deus?

- Mas o que é inteligência humilhada? Jonas Madureira cunhou esse termo para
expressar uma atitude com que as pessoas se chegam ao conhecimento de Deus.
Você pode chegar confiando em sua própria razão, colocando sua mente acima de tudo
ou colocar a revelação de Deus, a Bíblia, acima da sua limitação de ser finito.

- Vamos dar um exemplo para simplificar: O que é necessário para que você veja?
Olhos e luz. No escuro, mesmo que você tenha olhos, você nada verá. E se você for
cego, toda luz do mundo nada lhe valerá.

- O mesmo vale no conhecimento de Deus. A luz é a revelação de Deus. Se Deus não


se revelar, você jamais será capaz de conhecê-lo. Nossos pensamentos não chegam
aos céus, mas o Senhor é Deus Emanuel, Deus conosco; Deus que se revelou
supremamente na encarnação do seu Filho e que nos deixou sua Palavra para que
o conhecêssemos.

- Mas e se você não tiver olhos, como você vai ver esta revelação? Jesus mesmo disse
que alguns não veem (Mateus 13.13), mas o que aos apóstolos “foi dado conhecer os
mistérios do reino dos céus” (Mateus 13:11).
- Sendo assim, para conhecermos a Deus precisamos de duas graças: a graça da
revelação e a graça da capacitação. Precisamos que Deus se revele e que ele nos
capacite a ver e entender sua revelação.

- Mas glórias a Deus, “pois Deus que disse: “Das trevas resplandeça a luz”, ele mesmo
brilhou em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face
de Cristo” (2 Coríntios 4:6).

- Deus ultrapassa nossa capacidade de exaurir o mistério da sua infinita grandeza. A


natureza criada por Deus torna o homem indesculpável e mostra apenas “vestígios”,
como “pegadas”, que revelam que alguém passou por ali, e nada mais. Nas Escrituras,
Deus manifesta-se claramente por meio do Filho, Jesus Cristo, o Deus encarnado.

- Isso é inteligência humilhada. Reconhecer nossa total incapacidade de conhecer a


Deus sem sua graça. Isto é caminhar da doutrina para a piedade.

- Mas vamos por partes.

- Precisamos antes iniciar a explorar os conceitos da Inteligência Humilhada,


precisamos de algumas definições.

- Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes. – Tiago 4.6b

- O que isto significa?

- No capitulo 4 de Tiago, vemos o apostolo falar acerca de como viver num mundo
cheio de guerras. Só que questão aqui não é uma guerra externa, como a guerra da
Ucrânia e Rússia. Tiago diz que o nosso verdadeiro problema não está fora de nós, mas
dentro de nós.

- Ao olharmos o texto, podemos notar que o cristão luta em três guerras: Contra as
pessoas, contra nós mesmos e contra Deus.

- Ele vai começar mostrando que infelizmente há uma guerra entre irmãos. E a razão
desta guerra acontecer é por causa dos prazeres que militam nossa carne. Tiago vai dizer
que nossos desejos são como um soldado armado pronto para guerrear. E o que gera
esta força é a cobiça do coração.
- Depois ele vai falar da guerra contra nós mesmos. Ele vai mostrar que a fonte de todas
essas guerras está dentro do nosso próprio coração. A essência do pecado é o egoísmo.

- Veja, Adão e Eva caíram porque queriam ser iguais a Deus. Abraão mentiu para salvar
sua pele. Acã causou uma derrota para o povo de Israel porquê de forma egoísta tomou
o que era proibido. Tal como Tiago e João, nós também pediríamos a Jesus um lugar
especial no Reino.

- Desejos egoístas são perigoso e nos levam a ações erradas, nos levam a orações
erradas, nos movem a um relacionamento errado com Deus, nos levam a um
entendimento e uso errado do conhecimento acerca de Deus.

- Em seguida Tiago fala acerca da raiz de toda a guerra, a rebelião contra Deus. Mas,
como alguém em sã consciência pode estar em guerra contra Deus? Cultivando amizade
com os inimigos de Deus. E quem são? O mundo, o diabo e a carne. Dois inimigos fora
de nós e um dentro de nós.

- Então vem a grande questão, como eu venço estes inimigos?

- Primeiro Tiago nos informa que Deus está do nosso lado nesta luta. Ele sempre nos
dará graças para vencermos. Porém, há ponto chave nesta verdade, e aqui chegamos à
parte que lemos do verso 6.

- Veja o verso completo: 6Antes, ele dá maior graça; pelo que diz:

Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes.1

- Para termos o auxílio da Graça não podemos ter um coração soberbo, altivo, cheio de
si.

- O texto diz que Deus resiste aos soberbos. O verbo resistir, αντιτασσομαι
antitassomai, significa organizar-se para uma batalha contra. Indica que Deus
batalha contra o soberbo.

- Mas o que é uma pessoa soberba?

1 Sociedade Bíblica do Brasil, Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Sociedade
Bíblica do Brasil, 2003), Tg 4.6.
- A palavra soberba υπερηφανος huperephanos, significa: Ato de mostrar-se acima dos
outros, que se eleva sobre que se coloca acima dos outros, que sobrevaloriza seus
próprios meios ou méritos, que despreza os outros ou até trata-os com desprezo, uma
pessoa arrogante.

- Essa palavra é a junção da preposição huper, que significa acima, além, mais que.
Com a palavra phaino, que significa trazer à luz, fazer brilhar, aparecer, ser visto.

- Lembra da metáfora da luz e dos olhos acima, então o soberbo é que aquele que
enxerga as verdades da vida e Deus, não da perspectiva correta, mas sobre o pedestal do
diabo.

- Porém Tiago mostra o contra ponto. Ao ponto que Deus guerreia contra os orgulhosos,
ele concede graça aos humildes.

- A palavra humilde ταπεινος tapeinos, significa aquele que não se levanta muito do
chão.

- Interessante que de tapeinos deriva o verbo tapeinoo, que significa rebaixar à condição
humilde, reduzir as circunstâncias mais pobres, ser categorizado abaixo de outros que
são honrados ou recompensados, ter uma opinião modesta de si mesmo, comportar-se
de modo modesto, alguém destituído de toda arrogância. O verbo tapeinoo aparece em
Filipenses 2.8.

- A graça de Deus exige uma resposta: A resposta da humildade. A dadiva de Deus


sustentar a graça só é desfrutada por aqueles dispostos a admitir sua necessidade da
dádiva e aceitação dela.

- Os orgulhosos, por sua vez, encontram apenas a resistência da parte de Deus.

- Tiago mostra o caminho da humildade com quatro atitudes: Submissão a Deus,


resistência ao Diabo, comunhão com Deus e humildade diante de Deus.

- Ao falar para nos submeter a Deus, Tiago usa o verbo υποτασσω hupotasso, um
termo militar grego que significa “organizar [divisões de tropa] numa forma militar sob
o comando de um líder”. Em uso não militar, era “uma atitude voluntária de ceder,
cooperar, assumir responsabilidade, e levar uma carga”.2

- Em outras palavras, Tiago está dizendo, coloquem todas as áreas da sua vida sob a
autoridade de Deus.

- Então entendemos o que é soberbo e o humilde.

- Mas o nosso curso fala de viver da doutrina para a piedade. E o que vem a ser
piedade?

- Tomemos com base o texto de Tito 1.1-4: - 1Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus
Cristo, para promover a fé que é dos eleitos de Deus e o pleno conhecimento da verdade
segundo a piedade,2na esperança da vida eterna que o Deus que não pode mentir
prometeu antes dos tempos eternos3e, em tempos devidos, manifestou a sua palavra
mediante a pregação que me foi confiada por mandato de Deus, nosso Salvador, 4a Tito,
verdadeiro filho, segundo a fé comum, graça e paz, da parte de Deus Pai e de Cristo
Jesus, nosso Salvador.3

- Paulo não era homem de jogar palavras ao vento. E a introdução da carta à Tito
é rica em verdades do Evangelho ao apresentar o ministério do Evangelho. Por isto
não podemos ignorar. E aqui vai uma dica de leitura, nunca ignore as introduções.

- Primeira pergunta que devemos fazer para esta introdução é: Quem é Paulo?

- Paulo se apresentar com duas credenciais, servo de Deus e Apostolo de Jesus Cristo.

- A primeira fala de submissão, a segunda fala de autoridade. Veja, Paulo se tornou


servo por uma rendição pessoal e um apóstolo por uma nomeação divina.

- “Paulo, servo de Deus”, O que Paulo que dizer com isto?

- Ao intitular servo, Paulo está mostrando que ele era propriedade exclusiva de Deus e
estava a serviço dele. Podemos perceber isto pela palavra que Paulo usa aqui. Ele usa a

2 James Strong, Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong (Sociedade Bíblica do Brasil,
2002).

3 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Tt
1.1–4). Sociedade Bíblica do Brasil.
expressão Doulos (δουλος doulos), que é uma pessoa que se rende à vontade de outro,
um homem de condição servil, um escravo.

- A mensagem aqui é que aquele que não está a serviço de Deus não são servos de
Deus, mas ainda são servos do pecado.

- “e apóstolo de Jesus Cristo”, a autoridade de Paulo.

- Aqui temos uma definição do oficio que Paulo recebeu de Cristo. Ele está em
harmonia com o sentido de servo, visto que um apostolo é um emissário, um enviado.

- Mas qual o objetivo de Paulo ao se apresentar assim?

- Primeiro, promover a fé dos eleitos de Deus (v.1b)

- Agora, o que é esta fé que Paulo quer promover?

- Na bíblia a fé detona dois sentidos: Doutrina e a confiança na palavra do


Evangelho. No grego é a mesma palavra para as duas pistis, porém o contexto em
que são usadas é que define qual dos dois sentidos é.

- Veja, Judas vai dizer no verso 3 diz o seguinte: 3Amados, quando empregava toda a
diligência em escrever-vos acerca da nossa comum salvação, foi que me senti obrigado
a corresponder-me convosco, exortando-vos a batalhardes, diligentemente, pela fé
que uma vez por todas foi entregue aos santos.4

- Fé aqui é doutrina. Tudo aquilo que foi ensinado pelos apóstolos até aquele
momento.

- Quando falamos fé cristã, estamos dizendo o conjunto de doutrinas, verdades e


ensinos que caracterizam a nossa crença.

- Já em Efésios 2.8-9 temos o seguinte: 8Porque pela graça sois salvos, mediante a fé;
e isto não vem de vós; é dom de Deus; 9não de obras, para que ninguém se glorie. 10Pois
somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão
preparou para que andássemos nelas.5

- Fé aqui é a convicção de algo.


4 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Jd
3). Sociedade Bíblica do Brasil.

5 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Ef
2.8–10). Sociedade Bíblica do Brasil.
- No caso de Tito, podemos notar que de certo modo Paulo está querendo mostrar das
duas coisas. Primeiro está querendo mostrar com esta afirmação é que seu objetivo é
levar a fé salvadora aqueles que foram escolhidos por Deus. Paulo anuncia o
evangelho a todos, confiando que aqueles que o Senhor almeja salvar responderão a fé.

- Segundo, que ele quer ensinar a verdadeira doutrina do Evangelho.

- Por isto ele se coloca como servo e apostolo. Servo para proclamar a mensagem da
Cruz, apostolo para ensinar de forma autoritativa como viver a mensagem da
Cruz.

- Então, podemos dizer que um dos objetivos de Paulo ao escrever a Tito é


despertar ardor missionário. Ou seja, promover a fé salvadora. A palavra
promover que Paulo é uma preposição que significa “por toda a parte”.

- Se o primeiro objetivo de Paulo é missão, o segundo é a piedade, ou seja, o


discipulado.

- Veja, e o pleno conhecimento da verdade segundo a piedade6. Paulo nos ensina


algo valioso aqui. Ele não somente queria ver pessoas abraçando a fé, mas queria ver
estas pessoas crescendo na fé.

- A palavra que Paulo para conhecimento é a palavra επιγνωσις epignosis, que significa
um conhecimento preciso e correto. Esta palavra era usada no NT para expressar o
conhecimento de coisas éticas e divinas.

- Pregar, discipular e enviar, esta tríade rege a nossa caminhada.

- Além disto, ainda aqui neste verso, Paulo ensina que o conhecimento da verdade vai
além de somente conduzir o homem a Deus. A verdade nos conduz a piedade.

- E o que Paulo quer dizer com piedade? A palavra piedade, do grego ευσεβεια
eusebeia tem sentido de fidelidade, reverência e respeito. Paulo mostra que o
verdadeiro salvo mostrará uma vida de piedade, ou seja, fiel aquilo que prega.

- Aqui ele faz um contraste com os falsos mestres. Estes ensinam doutrinas geram
comportamentos depravados (mais frente veremos isto). Paulo vai mostrar que a

6 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Tt
1.1). Sociedade Bíblica do Brasil.
verdadeira fé irá produzir uma vida piedosa, ou seja, uma vida em acordo com a
sã doutrina.

- Sendo assim, Paulo está no dizendo que a piedade autentica a verdade, ou seja, a
vida piedosa mostra que a verdade que nós proclamamos é genuína. A verdade do
evangelho conduz à piedade.

- Então seria a piedade o sinal da verdade? Ou a verdade é a causa da piedade? As


duas coisas. As duas andam juntas. A piedade é o sinal da verdade porque a verdade
leva a piedade.

- Veja, o que Paulo nos ensina é que à medida que crescemos no conhecimento da
fé (doutrina), cresceremos em piedade (prática). À medida que crescemos na
ortodoxia, crescemos na ortopraxia.

- Quanto mais entendemos o que Deus fez por nós em Cristo, mais o amamos e vivemos
para Ele como servos fiéis.

- Paulo vai tratar desta dinâmica mais na frente, no capitulo 2 quando ele vai mostrar
que a verdade do Evangelho transforma uma vida de impiedade (2.12) em uma vida de
santidade.

- Paulo fala para Tito que não quer que simplesmente os crentes de Creta acreditem nas
coisas certas. Ele quer que os crentes produzam frutos através de uma vida de santidade.

- O objetivo de Paulo não era fazer convertidos, mas sim, discípulos.

- Note algo interessante, Paulo não está descrevendo somente o seu ministério. Ele está
oferecendo um modelo para o ministério de Tito e consequentemente para o nosso em
todo o tempo e em todo lugar.

- Então, o segundo objetivo de Paulo é a piedade.

- Missão e piedade. Proclamar a Palavra e fazer discípulos. Paulo está ecoando as


palavras de Jesus em Mateus 28: 19Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; 20ensinando-os a
guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os
dias até à consumação do século.7

7 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong
(Mt 28.19–20). Sociedade Bíblica do Brasil.
- 2na esperança da vida eterna que o Deus que não pode mentir prometeu antes dos
tempos eternos3e, em tempos devidos, manifestou a sua palavra mediante a pregação
que me foi confiada por mandato de Deus, nosso Salvador8

- Temos aqui uma nova situação de causa e efeito. A fé e a piedade estão baseadas,
sustentadas na esperança.

- - 2na esperança da vida eterna que o Deus que não pode mentir prometeu antes dos
tempos eternos

- Como assim? A fé leva à esperança, e a esperança sustenta a fé. Quanto mais


conhecemos a Cristo, mais confiante será nossa Esperança. Quanto mais confiante
for nossa esperança, mais fácil será enxergar além das circunstâncias do momento
e confiar em Jesus.

- Somente uma fé firmada e consolidada em Cristo permitiria que os crentes de


Creta ficassem firmes na fé em meio as perseguições.

- Paulo estava mostrando que a verdade do Evangelho não apenas transforma a


vida aqui e agora, mas também aponta para uma esperança gloriosa no futuro.

- Interessante que a esperança na vida eterna é que nos move a um viver piedoso.

- Então, resumindo, uma pessoa soberba é que aquela que enxerga as verdades da vida e
Deus, não da perspectiva correta, mas sobre o pedestal do diabo. Uma pessoa humilde, é
aquela que não se levanta muito do chão, ou seja, ela tem a consciência de quem ela é,
de onde Deus a tirou, de onde Deus a colocou, para Deus a vai levar e que tudo isto foi
por graça. Sendo assim, a graça de Deus exige uma resposta: A resposta da humildade.
A dadiva de Deus sustentar a graça só é desfrutada por aqueles dispostos a admitir sua
necessidade da dádiva e aceitação dela. E por fim um viver piedoso é um viver de
acordo com a doutrina.

- Mas o que tudo isto tem a ver com a questão da inteligência humilhada? É que o
conceito de Inteligência Humilhada tem implicações para o homem todo, não somente
com referência ao seu pensamento, mas também a suas ações práticas.

8 Sociedade Bíblica do Brasil. (2003). Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Tt
1.2–3). Sociedade Bíblica do Brasil.
- Por exemplo, como nós podemos lidar com questões como o problema do mal, quem é
o homem segundo a Escritura, questões diversas da cosmovisão cristã, relação do
cristão com a cultura, com o trabalho, etc?

- A primeira coisa que precisamos tem em mente é que é possível ser piedoso e, ao
mesmo tempo, inteligente!

- Precisamos ter em mente que todas as nossas ações são em Coram Deo, ou seja, na
presença de Deus, diante de Deus.

- Infelizmente em nossas igrejas, o que temos visto é um Anti-intelectualismo que gera


um analfabetismo bíblico no meio do povo. Por conta disto, acabamos indo de um
extremo a outro. Ou temos aversão ao estudo da doutrina e da teologia, ou abraçamos
este estudo, mas sem a busca do viver piedoso.

- Teologia ou estudo da doutrina sem piedade, é academicismo frio e morto. Piedade


sem doutrina é religiosidade e fanatismo.

- Ortodoxia e ortopraxia, são dois binômios inseparáveis.

- Veja, o cristão sabe, ou deveria saber, que o homem é um ser dependente da graça de
Deus e que deve depositar sua inteligência e tudo o que faz aos pés da cruz; é nessa
humilhante posição que devemos deixar cativo nosso pensamento.

- As vezes pensamos que para viver uma vida piedosa diante de Deus precisamos
aniquilar totalmente nosso intelecto. O correto é afinarmos nosso intelecto e tudo o que
fazemos em nosso dia a dia com as Escrituras, a tal ponto de vivermos para Glória de
Deus como ele quer que vivamos.

- E para nortear nossos estudos precisamos ter em mente que precisamos vigiar para não
pensarmos e agirmos em terceira pessoa. Como assim? Para falar de forma convincente
sobre Deus, é necessário fazer teologia diante de Deus à luz das Escrituras.

- Mas talvez você pense: mas professor, eu não sou teólogo, ou não tenho pretensão de
ser. Como isto se aplica a mim?
- Aí é que nos enganamos. Todos nós somos teólogos. Veja, o saber teológico não é
apenas para ministros ordenados, ou mestres profissionais na teologia, o conhecimento
teológico deve ser transmitido e intensificado para todos os crentes. Somos todos
teólogos no sentido de que todos temos algum tipo de saber sobre Deus. Buscando o
estudo da Palavra aprimoramos isso, ou conformamos o que conhecemos pela revelação
geral ao que chamamos de revelação especial, i.é., a Bíblia.

- Por isto devemos ter cuidado com um tipo de conhecimento academicista sobre Deus e
sua Palavra. Kevin Vanhoozer no seu livro o Pastor como Teólogo público escreve: Ser
um teólogo no mundo acadêmico implica correr o risco de tornar-se uma mente
sem corpo. O teólogo que não é pastor se assemelha a uma alma que, depois da
morte, foi separada do corpo, isto é, da igreja. Lamentamos esse “estado
intermediário” anormal, mas, crentes na ressurreição, aguardamos com
expectativa o tempo em que alma e corpo serão reunidos. Mentes teológicas
pertencem a corpos eclesiásticos.

- Essa é uma questão importante, não apenas para pastores ou seminaristas que estão em
treinamento para o ministério pastoral, mas, para todo cristão. Devemos estudar a
Bíblia, não apenas sobre a Bíblia. Este é o caso de muitas pessoas que tem contato com
literatura teológica, leem tantos livros, conhecem todos os mais recentes lançamentos
publicados pelas editoras, leem tudo que sai de novidade, mas, não estudam o texto
bíblico em si. Não se debruçam em conhecer o texto propriamente dito. Estão perto da
“teologia”, mas, distantes do saber teológico. Qual a importância disso? Bem, leia os
livros poéticos, principalmente Provérbios, os autores não pedem conhecimento, pedem
sabedoria. Essa deve ser a ânsia do estudante de teologia, sabedoria para viver tudo
quanto conhece sobre Deus.

- De fato, o Antigo Testamento faz uma distinção entre conhecimento e sabedoria.


Somos instruídos a obter conhecimento, mas, acima de tudo, somos instruídos a obter
sabedoria. O propósito de obter conhecimento é tornar-se sábio no sentido de saber
como viver de uma maneira que agrada a Deus.

- Somos todos teólogos de fato, mas, nem sempre bons teólogos. O objetivo de
aprendermos não é apenas teórico, mas, pratico. O conhecimento de Deus jorra para a
piedade. O verdadeiro objetivo da teologia é a glória de Deus. Para que isso aconteça o
saber (conhecimento) deve andar como a sabedoria (piedade cristã).

- É nisto que consiste o nosso curso.

1. Exercite-se na devoção: O conceito de Inteligência Humilhada

-6Expondo estas coisas aos irmãos, serás bom ministro de Cristo Jesus, alimentado com
as palavras da fé e da boa doutrina que tens seguido. 7Mas rejeita as fábulas profanas e
de velhas caducas exercita-te, pessoalmente, na piedade. 8Pois o exercício físico para
pouco é proveitoso, mas a piedade para tudo é proveitosa, porque tem a promessa da
vida que agora é e da que há de ser9 (1Tm 4.6–8)
- É com este conselho de Paulo ao jovem Timoteo que começamos hoje nossa aula.
- Exercita-te, pessoalmente, na piedade. O que isto significa?
- Numa breve analise do contexto, podemos notar que Paulo após falar das qualificações
dos líderes da igreja, agora começa a falar da obra destes lideres num contexto de falsos
mestres e ensinos.
- No capitulo 3 ele termina falando que a igreja é a coluna e baluarte da verdade, que o
capitulo 4 começa dizendo que os falsos mestres estão entregues à sua mentira. Há dois
pontos a serem destacados: Primeiro, o perigo das falsas doutrinas (Tm 4.1-5) e
segundo, o valor da sã doutrina (Tm 4.6-16).
- E aqui temos um conselho peculiar de Paulo, o compromisso do pastor em relação à
piedade pessoal.
- Das quinze ocorrências da palavra grega “eusebeia”, treze se encontram nas cartas
pastorais, nove delas somente em 1 Timoteo.
- É interessante isto, porque o exercício físico traz equilíbrio na vida do homem.
- Você passa a se alimentar melhor, dormir melhor, ter uma divisão de tempo
equilibrada.
- Paulo então orienta Timoteo que tenha esse mesmo cuidado com a piedade. A palavra
exercita-se (γυμναζω gumnazo), significa exercitar vigorosamente, por qualquer meio,
o corpo ou a mente10. E para se exercitar na piedade é necessário disciplina, equilíbrio e
uma busca constante deste conhecimento.
- E o que isto tem a ver com nosso assunto? Tudo.
- Veja, por causa da queda, o homem agora não consegue viver uma vida de equilíbrio
entre duas ideias. Temos a tendência de sempre inclinar para extremos.
- Vejamos como podemos nos exercitar na piedade:

a) Fuja dos extremos e se ponha de joelhos

9 Sociedade Bíblica do Brasil, Almeida Revista e Atualizada, com números de Strong (Sociedade
Bíblica do Brasil, 2003), 1Tm 4.6–8.

10 James Strong, Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong (Sociedade Bíblica do Brasil,
2002).
- Por exemplo, quando falamos então acerca do conhecimento de Deus vemos
claramente este ponto.
- No livro do Jonas encontramos dois extremos a serem evitados se queremos viver uma
vida verdadeiramente piedosa diante do conhecimento de Deus, a saber o fideísmo ou
racionalismo. E o que são estes dois extremos?
- O que é o fideísmo? Bom, a grosso modo, o fideísmo é a negação de qualquer
possibilidade de se conhecer a Deus por meio da racionalidade. Ou seja, a razão
humana não pode trazer luz a este conhecimento. Ele é adquirido em última instância
unicamente pela fé.
- Segundo José Ferrater Mora, o “fideísmo é a doutrina que sustenta a impotência da
razão para alcançar certas verdades e a consequente necessidade de introdução da fé”
- O fideísta vai defender que apenas a fé é suficiente para garantir e avaliar o
conhecimento de Deus. Ele deixa a razão de lado e prioriza a fé.
- Em termos práticos, o fideísta é aquele que rejeita o estudo da doutrina sobre o
pretexto de que é o Espírito Santo que importa. Quem nunca ouviu a expressão: Esse
negócio de teologia não importa, o que importa é a joelhologia.
- Interessante é que o fideísmo é isso: usar a razão para afirmar, sobre a fé, que fé e
razão não se misturam. Esta é uma mania consolidada em muitos segmentos da igreja
brasileira. Kierkegaard caiu nessa. Karl Barth também.
- Agostinho, numa de suas Cartas, afirmou:
“É impossível que Deus odeie em nós o atributo pelo qual nos fez
superiores aos demais seres vivos. Devemos, portanto, recusar-nos a crer
de um modo que não receba ou não busque razão para nossa crença, uma
vez que sequer poderíamos crer se não tivéssemos almas racionais”.
- Infelizmente, é fácil perceber que muitos cristãos, na prática, preferem ser cientistas no
trabalho e intuitivos na fé. E o desastre se vê quando começam as conversas sérias:
versículos evocados fora de contexto, má compreensão de preceitos elementares, papo
superficial.
- O outro extremo que nós temos é o racionalismo. E o que é o racionalismo? Ao
contrário do fideísta, o racionalista é aquele que se esforça para encontrar razões,
evidências ou indícios para fundamentar o conhecimento de Deus.
- O “‘racionalismo’ é o nome da doutrina cuja única faculdade adequada ou completa de
conhecimento é a razão, de modo que todo conhecimento (verdadeiro) tem origem
racional”. Ou seja, a fé não é necessária para o conhecimento. Aliás, para os
racionalistas, a fé é algo subjetivo e, por isso, não passa de uma questão de foro íntimo.
Assim, não se pode pensar na aquisição ou apreensão de qualquer conhecimento
verdadeiro de Deus com base meramente na fé.
- Vejam, estamos diante de duas posições radicais que, de certo modo, apontam para a
conhecida polarização entre fé e razão. De um lado, tem se o fideísmo, que seria o
sacrifício da razão em favor da fé; do outro, o racionalismo, que seria o sacrifício da fé
em favor da razão.
- O conceito de inteligência humilhada não pretende favorecer nenhuma dessas duas
posições. Não se trata de tender nem para o racionalismo nem para o fideísmo. A
inteligência humilhada não quer sacrificar nem a fé nem a razão, mesmo porque não é
necessário eliminar uma das duas para chegarmos ao conhecimento de Deus.
- Mas é possível um ponto de equilíbrio entre estas duas visões? Podemos fugir dos
extremos?
- Primeira coisa que precisamos ter em mente é que, não se trata da morte da fé nem da
morte da razão, mas da fé que busca a compreensão e reconhece o papel
importantíssimo da razão na busca pelo conhecimento de Deus.
- Jonas define que A inteligência humilhada é a fé que não tem medo de pensar, duvidar
ou questionar. A fé não precisa morrer, só precisa pensar. Uma fé assim percebe a
racionalidade e a ordem divina nas coisas criadas sem, de forma alguma, anular-se ou
destruir-se. É possível ser piedoso e, ao mesmo tempo, inteligente!
- Porém, a inteligência humilhada é também a consciência da humilhação da razão que
nos faz reconhecer o papel fundamental da fé.
- Eu acho fantástica essa fala de Jonas acerca disto, ele diz que a razão não precisa
morrer, só precisa dobrar os joelhos. A razão que se sujeita a Deus não deve se
envergonhar da sua sujeição, nem se inferiorizar pelo fato de reconhecer sua
dependência da revelação. Pelo contrário, a razão, consciente da sua miséria, deveria ser
grata pela dádiva da revelação, pois, como aprendemos com nossas mães, quando
alguém nos dá um presente, a única reação adequada é a gratidão.
- Outro ponto interessante é que antes de sermos piedosos precisamos ser gratos.
- E aqui vai outra sacada genial, não é a razão que faz o teólogo e cristão piedoso, mas,
sim, a gratidão.
- A nossa razão nos faz inteligentes, mas a gratidão nos torna piedosos.
- Mesmo porque, para ser inteligente, o teólogo precisa, em primeiro lugar, ser capaz de
praticar a intelecção mais profunda que a mente humana pode realizar: a oração. Ora, é
indubitável que a oração é a intelecção mais profunda do teólogo; porém, ao orar, o
teólogo também oferece o testemunho mais patente de sua piedade.
- Sendo assim, eu exercito a piedade quando reconheço que minha inteligência é
humilhada e ferida pela Palavra. O caminho para uma vida piedosa é um coração ferido
pela Palavra, porém grato, pela dadiva da revelação e da salvação que me permite
encontrar Deus de forma verdadeira e plena.
- Parafraseando Chesterton, a inteligência humilhada não é como “um balão que sobe ao
céu” (o fideísta) ou “uma toupeira que vive unicamente cavando na terra” (o
racionalista), mas é como “uma árvore cujas raízes se alimentam da terra enquanto os
ramos mais altos parecem subir quase até as estrelas”.
- A inteligência humilhada não desfalece quando atormentada pelos limites da razão;
antes, suspira pela possibilidade de receber a revelação com as mãos vazias. Essa é a
condição intelectual mais apropriada para manter o teólogo íntegro nas sendas soturnas
e tenebrosas da fé.

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