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Arquitetura e

Urbanismo Modernista
Material Teórico
Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Me. Franklin Ferreira

Revisão Textual:
Prof. Esp. Claudio Pereira do Nascimento
Função e Perfeição na Obra
de Wright, Mies e Aalto

• Frank Lloyd Wright e a Arquitetura Orgânica;


• O Estilo Internacional de Mies van der Rohe;
• Alvar Aalto e a Arquitetura Moderna Escandinava.

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Demonstrar, através da apresentação de algumas de suas edificações, as estratégias
projetuais que Wright, Mies e Aalto empregam na elaboração de seus projetos. Ainda que
pertençam a uma geração responsável pela formulação e exploração dos paradigmas
modernistas, outro objetivo é explicitar os diferentes caminhos percorridos pelos arquite-
tos mencionados.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de
aprendizagem.
UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Frank Lloyd Wright e a Arquitetura Orgânica


Ainda que seja considerado uma das grandes referências da arquitetura moderna,
Frank Lloyd Wright tem uma trajetória em que transparece a sua autonomia projetual.
Isso se torna evidente em suas bases conceituais que transitam entre referenciais
tanto americano quanto do extremo oriente e também na experimentação tardia
do material que caracterizaria a modernidade na arquitetura, o concreto armado.
Wright, inclusive, não dá prosseguimento à Escola de Chicago ao não persistir no
uso dos novos materiais como o ferro e o vidro.

A Escola de Chicago é fundada pelo engenheiro e arquiteto William Le Baron Jenney (1832-
Explor

1907) que desempenha um papel importante no treinamento da geração mais jovem de


arquitetos de Chicago semelhante ao de Peter Behrens na Alemanha ou de Auguste Perret
na França. Fundamentalmente, a Escola de Chicago está vinculada à criação do edifício de
escritórios modernos (GIEDION, 2004, p.398) cujo ápice de verticalização de prédios vencen-
do barreiras cada vez mais altas se dá entre os anos de 1883-1893. Esse vertiginoso e intenso
crescimento é subitamente interrompido em função da crise de 1893 que afetou Chicago e
suas atividades. Ainda assim, nesse fértil período de uma década, grandes edifícios de escri-
tórios para firmas de negócios e companhias de seguros são os primeiros a aparecer. Poste-
riormente, hotéis, edifícios misatos como escritório-teatro-hotel, compõem programas mais
complexos com a finalidade de atender a outras exigências. O ateliê de Adler e Sullivan se
destaca em meio a uma série de construções anônimas.

O início da trajetória de Wright acontece quando, aos vinte anos de idade, aban-
dona os estudos na Universidade de Wisconsin, sua terra natal, no ano de 1887,
e se muda para Chicago, onde começa a trabalhar no estúdio de Joseph Lyman
Silsbee. Não tarda para que no mesmo ano Wright seja contrato pelo escritório de
Dankmar Adler e Louis Sullivan e inicie o desenvolvimento de projetos paralelos,
dedicando-se ao projeto da capela unitária de Sioux City.

A residência do arquiteto construída em 1889 sofre ampliação quatro anos mais


tarde para a implantação de um estúdio.

Figura 1 – Residência e estúdio, Frank Lloyd Wright, Oak Park, Chicago, 1889-93
Fonte: franklloydwright.org

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Ainda em 1893, Wright recebe a encomenda para projetar a Casa Winslow
em River Forest, Illinois. Nesse projeto, o arquiteto reúne estratégias e elementos
arquitetônicos como as fachadas frontal e posterior, contrastantes entre si, em que
a primeira é simétrica e recuada da rua, e a segunda, assimétrica e recuada em
apenas um dos lados, além do emprego das janelas em fita. Esse conjunto de fato-
res antecipa aquilo que o arquiteto irá explorar na primeira década do século vinte
em projetos residenciais. Em vista, percebe-se uma divisão tripla em base, corpo e
telhado em balanço claramente explícita.

Essa solução serve de embrião para um conjunto de projetos de residências que


será desenvolvido na primeira década do século seguinte. Logo, a Casa Winslow
pode ser compreendida como um trabalho de transição em que também se nota
o emprego de outros elementos compositivos que se repetirão em projetos futuros
como as janelas em faixa.

Figura 2 – Casa Winslow, Frank Lloyd Wright, River Forest, Illinois, 1893
Fonte: Wikimedia Commons

São precisos quase sete anos para que ideias e formas evoluíssem plenamente.
Após inúmeros ensaios e uma busca incessante por uma linguagem estética autô-
noma, Wright inicia uma fase de extrema maturidade com aquilo que viria a ser
conhecido como Estilo Pradaria. De acordo com Frampton (2003, p.64), “o surgi-
mento definitivo do Estilo Pradaria coincidiu com a maturidade teórica de Wright,
como se manifesta em sua famosa conferência de 1901, “The Art and craft of the
Machine” (A arte e o ofício da máquina)”.

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Segundo Wright, em entrevista para a Architectural Record (março de 1908):


Nós, os do Middle West, vivemos na pradaria. A pradaria tem uma beleza
própria e nós devíamos reconhecer e acentuar essa beleza natural, a
sua planura tranquila. Daí os telhados suavemente inclinados, proporções
modestas, silhuetas tranquilas, largas, maciças e acolhedoras saliências,
terraços baixos e paredes avançadas, rodeando os jardins particulares.
(WRIGHT apud PFEIFFER, 2007, p.21)

Em consonância com a pradaria, o conjunto de casas projetadas por Wright con-


centra estratégias similares. Fundamentalmente, a divisão tripla, já ensaiada na casa
Winslow, torna-se uma constante de modo que é visivelmente nítido uma espécie de
pódio que eleva a construção a alguns degraus, o corpo e telhado com um declive
suave e amplo balanço. A relação entre essas três camadas implica num resultado de
“proporções baixas e estreitamente associadas ao solo” (PFEIFFER, 2007, p.21), como
se a construção se erigisse da superfície, em completa harmonia com o entorno.

Se por um lado as construções reúnem algumas características em comum, por


outro, Wright oscila entre duas distintas tipologias de plantas para a organização do
programa de necessidades das residências. Em determinados momentos, como na
Casa Avery Coonley, de 1908, o arquiteto explora a assimetria; em outras situações,
o compacto, quadriculado e simétrico se sobressaem como na Casa Robie (1908-09).

Casa Avery Coonley, Frank Lloyd Wright, Riverside, Illinois, 1907-08: http://bit.ly/2MZivEx
Explor

Casa Robie, Frank Lloyd Wright, Chicago, Illinois, 1906-09 em: http://bit.ly/3239AGA

Wright faz uma análise dessa fase e chega a uma síntese, aproximadamente duas
décadas mais tarde, ao reunir os princípios orientadores de seus projetos residenciais.
Primeiro: Reduzir ao máximo o número de partes necessárias da casa e
de recintos separados e fazer com que todos se juntem como um espaço
fechado dividido, de modo que a luz, o ar e a vista estejam em todos os
lugares, dando uma sensação de unidade.

Segundo: Associar a edificação como um todo ao seu sítio através da


extensão e ênfase de todos os planos paralelos ao solo, mas mantendo os
pisos afastados na maior parte do sítio, deixando, como consequência, a
melhor parte para ser usada em conexão com a vida da casa. [...]

Terceiro: Eliminar cômodos e casas do tipo caixote ao fazer com que to-
das as paredes se tornem anteparos – tetos, pisos e divisórias devem fluir
entre si como uma grande pele espacial, apenas com subdivisões inter-
nas. Faça todas as proporções da casa mais deliberadamente humanas,
com menos espaços residuais na estrutura e estruturas mais adequadas
aos materiais, tornando o interior mais habitável. [...]

Quarto:Elevar o insalubre pavimento de subsolo em relação ao nível do


solo, tirando-o totalmente para fora, como um baixo pedestal para a

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posição viva da casa, tornando as próprias fundações visíveis, como uma
baixa plataforma de alvenaria na qual a edificação deveria se apoiar.
Quinto: Harmonizar todas as aberturas necessárias para o “exterior” ou
“interior” com as boas proporções humanas e fazê-las ocorrer naturalmen-
te – sejam isoladas ou como uma série no esquema geral da edificação. [...]
Sexto: Eliminar combinações de diferentes materiais, preferindo, sempre
que possível, um único material; não usar ornamentos que não tenham
surgido da natureza do material, [...]. Linhas geométricas ou retas eram
naturais às máquinas empregadas na construção civil, assim os interiores
recebiam esse caráter com facilidade.
Sétimo: Incorporar todos os sistemas de aquecimento, iluminação e tu-
bulação de água e esgoto, de modo que se tornassem elementos constitu-
tivos da própria edificação. [...]
Oitavo: Incorporar como arquitetura orgânica – sempre que possível – o
mobiliário, fazendo desse uma unidade com a edificação. [...]
Nono: Eliminar o decorador. Ele só sabia fazer curvas e eflorescências,
ou então era completamente “histórico”. (WRIGHT apud CURTIS,
2008, p.120)

Uma das primeiras construções a reunir essas estratégias e a dar início à fase
madura de Wright no início do século vinte é Casa Ward Willits (Highland Park,
Chicago, 1902).

Figura 3 – Casa Willits, Frank Lloyd Wright, Highland Park, Illinois, 1901-02
Fonte: Wikimedia Commons
Explor

Planta cruciforme em dupla simetria da Casa Willits: http://bit.ly/36hPJ9G

Localizada em uma zona suburbana, a casa está recuada da rua e admite uma
planta cruciforme em dupla simetria. Dessa forma, o amplo programa organizado
em quatro alas faz com que a residência tenha o seu tamanho visualmente reduzi-
do. Não obstante, ao adotar a planta em formato de cruz, Wright estabelece uma

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

relação mais harmoniosa entre a construção e o paisagismo circundante. Essas


estratégias reduzem visualmente o tamanho da construção.

Por outro lado, a Casa Dana (Springfield, Illinois, 1902-04) é equacionada assi-
metricamente de modo a ocupar o terreno em sua totalidade. Curiosamente, o pro-
jeto de Wright incorpora a casa antiga dos proprietários como uma espécie de altar
familiar (CURTIS, 2008, p.121). Diferentemente do acesso da Casa Willits que se
dá timidamente por um porte-cochère, a entrada principal da Casa Dana possui a
entrada principal localizada na menor fachada, marcada por um telhado em forma
de frontão e uma arcada.

Figura 4 – Casa Dana, Frank Lloyd Wright, Springfield, Illinois, 1902-04


Fonte: dana-thomas.org

Figura 5 – Planta assimétrica da casa Dana


Fonte: Wikimedia Commons

Wright é encarregado de projetar a Casa Martin em Buffalo, Nova York, em


1904. Com um programa complexo, a Casa Martin admite dimensões monumen-
tais. O projeto que antecede a primeira viagem de Wright ao Japão, já demonstra
um arquiteto bastante maduro, com clareza das estratégias projetuais empregadas
nas casas de pradaria.

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Explor
Casa Martin, Frank Lloyd Wright, Buffalo, Nova York, 1904: http://bit.ly/2q2frOT

Com o término da construção da Casa Martin, Wright mostra ter um vocabulário


compositivo bastante consistente e clareza das estratégias projetuais para as casas
de pradaria. O ano de 1905 é bastante emblemático para Wright, pois realiza a sua
primeira viagem ao Japão, de onde buscará parte das referências para os seus pro-
jetos com o objetivo de enriquecer o seu repertório estético e também conceitual.

Entre outras obras ao Estilo Pradaria, Wright projeta a Casa Robie (Chicago,
Illinois, 1906-09), “considerada uma das mais claras expressões do arquiteto do
ideal” desse conjunto de casas (CURTIS, 2008, p.124). A casa está implantada em
um terreno estreito e de proporções reduzidas. Uma das exigências do proprietário
para o programa, mais modesto se comparado ao da Casa Martin, é que ele veja os
vizinhos caminharem pela calçada sem ser visto, além de ter vistas para um parque
situado à diagonal do terreno a apenas uma quadra de distância.

Figura 6 – Casa Robie, Frank Lloyd Wright, Chicago, Illinois, 1906-09


Fonte: flwright.org

A Casa Robie exprime as características das Casas de Pradaria com bastante lu-
cidez. Ao implantar a residência num terreno de esquina, demasiadamente estreito,
Wright demonstra rigor estético, técnico e simbólico.

Com esses e outros exemplos não mencionados, é notória a flexibilidade de Wright,


a partir de um sistema aparentemente preestabelecido e rígido, de dar respostas a
diferentes tamanhos e variáveis de programas desse conjunto de residências.

Um dos pontos a serem investigados por Wright, tanto nas primeiras residências
mais modestas quanto nas posteriores, maiores como a sua reputação se transfor-
ma ao longo dos primeiros anos do século vinte, é o nível da planta. Sabe-se que o
subsolo é erguido da superfície e assume a linguagem de um pedestal. Esse meca-
nismo que resulta numa tectônica maciça eleva os demais níveis onde o arquiteto
explora a planta aberta. Espaços mais abertos, delimitados apenas por anteparos
ou elementos arquitetônicos que não sejam paredes nem portas.

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Oscilando entre a planta cruciforme e a longitudinal, Wright opera em diversas


tipologias de terreno de modo a envolver o paisagismo ao projeto arquitetônico
(evidentemente quando o entorno era pouco povoado). Essa estratégia justifica a
anterior tendo em vista que o embasamento é levado paro o nível do solo de modo
que este sirva de pedestal para o andar principal. Associadas à planta aberta, lon-
gas janelas de peitoril elevado determinando uma faixa transparente ao redor da
casa intensificam essa relação do interior com o exterior.
Por fim, essa faixa de janelas é protegida por longos beirais pintados de cores
claras com o objetivo de levar luz natural aos ambientes internos. Não somente,
os telhados levemente inclinados, definindo uma terceira faixa, fazem com que as
casas de pradaria assumam a sua horizontalidade tão expressiva.
Naturalmente, as Casas de Pradaria que determinam uma primeira fase de Wright,
ainda pautada num tradicionalismo norte-americano, podem ser compreendidas como
uma transição para uma etapa seguinte em que o arquiteto passa a explorar o concreto
armado e a liberdade formal, deixando a alvenaria de lado. Independentemente
do material empregado em seus projetos, Wright, sem dúvida alguma, deve ser
compreendido como um dos personagens responsáveis pela formação da linguagem
moderna ao lado de Le Corbusier e de outros grandes nomes da arquitetura da
primeira metade do século vinte como será visto na sequência.

O Estilo Internacional de Mies van der Rohe


Nascido em Aachen, cidade que estabelece divisa com a Holanda e com a
Bélgica e pertencente à região da Colônia, Ludwig Mies van der Rohe (1886–1969)
inicia a sua carreira de arquitetura quando se muda para a capital alemã no ano
de 1905. Em Berlim, Mies van der Rohe trabalha no escritório de Bruno Paul
(Seifhennersdorf, 1874 – Berlim, 1968) e três anos mais tarde transfere-se para o
escritório de Peter Behrens (Hamburgo, 1868 – Berlim, 1940).

Peter Behrens é considerado um dos precursores do Movimento Moderno em arquitetura na


Explor

Alemanha. Ainda que a sua formação seja nas artes gráficas (pintor e artista gráfico) e ofe-
reça contribuição ao movimento artístico de Munique, Jugendstil, Behrens se torna um au-
todidata na arquitetura e no desenho industrial. De acordo com Roth (2017, p. 471), Behrens
“considerava o arquiteto como um líder da elite cultural, o promotor das formas corretas da
nova ordem social”. Dessa forma, o arquiteto se envolve diretamente com o campo da cons-
trução civil ao ensinar e praticar arquitetura, desenho industrial e design gráfico em várias
áreas. Behrens se destaca nas áreas de formação ao iniciar parceria com a fábrica AEG ao
projetar luminárias, aparelhos elétricos e catálogos de vendas. Após o trabalho de desenho
industrial e gráfico, Behrens projeta inúmeros edifícios da AEG. Além disso, o arquiteto é um
dos fundadores do Deutscher Werkbund, uma associação de arquitetos, artistas, designers,
artesãos, economistas, políticos e industriais que defendem reformas na educação e na in-
dústria. Em seu escritório, recebe personagens que se destacariam no campo da arquitetura,
como W. Gropius, L. Mies van der Rohe e Le Corbusier.

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No escritório de Behrens, Mies se torna assistente principal com a saída de Walter
Gropius, com quem teve breve contato. Behrens, sem dúvida alguma, mostra-se
uma das principais influências de Mies van der Rohe, pois é dele que “Mies herda
o conceito do artista como um agente do gosto da época e da arquitetura como
uma expressão de poder técnico” (ROTH, 2017, p.474). Além disso, Mies van der
Rohe também absorve de Behrens a atenção pelo detalhe e pela precisão tanto no
projeto quanto na construção.

Ainda enquanto funcionário no ateliê de Behrens, Mies van der Rohe presencia
o desenvolvimento de um dos mais emblemáticos projetos do escritório, um dos
edifícios da AEG. De acordo com Giedion (2004, p.614):
A fábrica de turbinas de Peter Behrens, de 1909, mostrou que os mate-
riais como o vidro e o ferro encerravam uma força secreta de expressão
que poderia ser evocada assim que um artista compreendesse como de-
senvolver seus meios e possibilidades.

Figura 7 – Fábrica de turbinas AEG, Peter Behrens, 1908


Fonte: Wikimedia Commons

A influência de Peter Behrens em Mies van der Rohe se torna explícita desde
o primeiro contato que o jovem teve ao ingressar no ateliê de Behrens em 1908.
A manipulação do vidro e do aço passa a admitir uma nova estética compositiva.
Esse meio de expressão permitido pelos dois materiais se transforma em uma das
fundações mais sólidas para os meios de expressão de Mies.

Reconhecemos a influência em Mies não somente da obra e pensamento de


Behrens, mas também na obra de Frank Lloyd Wright, quando o arquiteto norte
americano surge no campo europeu em 1910 através de uma exposição exibida em
Berlim. De acordo com o próprio Mies van der Rohe:

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Nós, jovens arquitetos, encontrávamos num estado de dolorosa disso-


nância interna. A obra desse grande mestre apresentou um mundo ar-
quitetônico de força inesperada, clareza de linguagem e riqueza formal
desconcertante. (MIES VAN DER ROHE apud GIEDION, 2004, p. 615)

A estratégia adotada por Wright em relação à planta aberta com a finalidade de


garantir fluidez faz com que Mies van der Rohe repense a rigidez dos espaços cria-
dos pelos europeus à época. A estratégia da planta livre será tardiamente adotada
pelo arquiteto em seus projetos na década de 1920, unindo-se ao aço e ao vidro.

Por fim, outro impulso que fornece arsenal conceitual a Mies van der Rohe parte
dos holandeses. Os experimentos realizados no campo da habitação exploram uma
nova linguagem arquitetônica concebida pela estética ensaiada no De Stijl. O gru-
po formado por Theo van Doesburg, Gerit Rietveld e Piet Mondrian, entre outros,
reúne pintura, escultura e arquitetura e as suas novas formas de expressão.

O De Stijl surge como um jornal na Holanda no ano de 1917. No centro do grupo está a obra
Explor

dos pintores Piet Mondrian e Theo van Doesburg e o arquiteto Gerrit Rietveld. Basicamente,
de acordo com o primeiro manifesto do grupo de 1918, “há uma exigência de um novo
equilíbrio entre o individual e o universal, além da libertação da arte tanto das coerções da
tradição quanto do culto da individualidade” (FRAMPTON, 2003, p.171).

Após anos adquirindo experiência, Mies van der Rohe abre o seu próprio escri-
tório ao projetar a Casa Pearls em Berlim-Zehlendorf em 1911. No ano seguinte,
substitui o seu mestre, Behrens, como arquiteto da Sra. H. E. L. J. Kroller para o
projeto de sua galeria e residência em Haia, na Holanda, um dos seus últimos pro-
jetos significativos antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial.

O primeiro contato que o arquiteto tem com o vidro de maneira mais investigativa,
de modo que o material se torna o protagonista da arquitetura, é em 1920 com
o projeto de um arranha-céu. No ano seguinte, Mies van der Rohe explora o
mesmo tema do arranha-céu facetado de vidro no projeto para o concurso da
Friedrichstrasse. Segundo Frampton (2003, p. 194), “nessa época, a intenção de
Mies era usar o vidro como uma superfície refletora complexa que, sob o impacto
da luz, estaria permanentemente sujeita a transformações”.

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Figura 8 – Arranha-céu para o concurso Friedrichstrasse, L. Mies van der Rohe, 1921
Fonte: Fotografia Markus Hawlik

Para o concurso Friedrichstrasse, Mies van der Rohe adota a forma prismática,
que, segundo o próprio arquiteto na descrição que acompanha o projeto, adequa-se
melhor ao terreno triangular (FRAMPTON, 2003, p.194). O vidro é utilizado nas
superfícies facetadas como forma de evitar planos de grandes dimensões.

Mies van der Rohe segue explorando o vidro em edifícios de escritórios e defen-
de que:
O edifício de escritórios é uma casa de trabalho (...) de organização, clari-
dade e economia. Salas de trabalho luminosas, amplas, fáceis de supervi-
sionar, divididas apenas da maneira que o exijam as funções específicas.
O máximo efeito com o mínimo dispêndio de meios. Os materiais são
o concreto, ferro e vidro. (MIES VAN DER ROHE apud FRAMPTON,
2003, p.195)

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Nota-se claramente uma forte influência de Frank Lloyd Wright com o projeto
para o Edifício Larkin (Nova York, 1904; demolido em 1950) e também de Le
Corbusier com o modelo Dom-ino no que diz respeito à ideia de uma arquitetura
“de pele e osso”.

Após quase uma década inteira de experimentações, a fase inicial de Mies van
der Rohe tem o seu auge com a elaboração de três projetos-chave que acontecem
após a conclusão da Exposição Deutsche Werkbund Weissenhofsiedlung em
Stuttgart, na Alemanha em 1927.

A Deutsche Werkbund Weissenhofsiedlung é uma exposição que acontece em Stuttgart,


Explor

Alemanha, em 1927. À época, L. Mies van der Rohe assume a direção da Deutsche Werkbund
(grupo fundado em 1907 por Peter Behrens) e organiza essa exposição cujo objetivo é
discutir a habitação moderna e dar sequência aos esforços do grupo para aprimorar a
produção industrial alemã nas suas mais variadas formas de expressão, do desenho do
objeto ao edifício. Dessa forma, são reunidos inúmeros arquitetos, entre eles Le Corbusier,
Peter Behrens, Walter Gropius, Hans Scharoun e o próprio Mies van der Rohe para apresentar
propostas de habitação tendo em vista a nova estética do século XX, baseada, entre outros
fatores, na economia e no funcionalismo.
Para mais informações, leia o artigo “Do Weissenhofsiedlung ao Hansaviertel: a arquitetura
moderna e a cidade pensadas desde a habitação”, de Cláudia Piantá Costa Cabral no link a
seguir: http://bit.ly/36IbLCL

O primeiro projeto é o Pavilhão do Estado Alemão da Exposição Mundial de


Barcelona de 1929. Construído para ser uma estrutura temporária para a Exibição
Internacional daquele ano (reconstruído na década de 1980), o projeto de Mies van
der Rohe representa a síntese da forma associada à técnica ao explorar os valores
da arquitetura moderna.

• Pavilhão Alemão, L. Mies van der Rohe, Barcelona, 1929.


Explor

Disponível em: http://bit.ly/2pAuCiD


• Planta aberta do pavilhão em que se percebe a fluidez dos espaços compostos pelos
planos verticais, disponível em: http://bit.ly/33gJxgi

O projeto do arquiteto dá continuidade ao discurso do De Stijl ao abordar uma


arquitetura concebida a partir de uma sequência de planos verticais centrífugos.
Essa estratégia, também vista na obra de F. L. Wright e nas casas de campo do pró-
prio Mies van der Rohe, é levada ao extremo a partir do momento que o arquiteto
utiliza materiais que garantem a esbeltes.

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Do horizonte, a fina laje de cobertura repousa sutilmente sobre oito colunas
cruciformes de aço cromado. Os planos verticais autoportantes compõem a planta
aberta, estratégia vinda de Frank Lloyd Wright já experimentada por Mies van der
Rohe no projeto da casa de campo em 1923.

Figura 9 – Casa de campo em tijolos, L. Mies van der Rohe, 1923


Fonte: moma.org

A planta aberta, como referência à planta livre, um dos cinco pontos da arquite-
tura moderna, implica na fluidez do espaço. O espaço contínuo já é explorado na
obra de Frank Lloyd Wright em que a planta centrífuga composta por uma associa-
ção de planos verticais interrompidos sugere a fluidez espacial.

A simplicidade da estrutura composta pelos oito apoios dispostos de forma du-


plamente simétrica se contrapõe às superfícies verticais, ora sob a fina laje de co-
bertura, ora se expandindo para fora da projeção da laje.

Dessa forma, o arquiteto organiza inúmeras possibilidades de espacialidades em


função das disposições das paredes, estas interrompidas estrategicamente com o
objetivo de se criar a continuidade espacial. Um plano vertical ao fundo do lote,
justaposto a um banco longínquo de frente ao principal espelho d’água, articula os
dois únicos planos horizontais: a cobertura da área expositiva à direita a uma área
técnica à esquerda.

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Pavilhão Alemão, L. Mies van der Rohe, Barcelona, 1929: http://bit.ly/33iatwk e Vista da
Explor

associação dos planos verticais em contraste aos planos horizontais: http://bit.ly/2WLVjN8

Como uma pintura neoplasticista de P. Mondrian, o Pavilhão de Barcelona de


Mies van der Rohe é composto por uma associação de planos verticais autopor-
tantes interrompidos estrategicamente para se garantir a continuidade espacial.
O maior plano, ao fundo do lote, articula as duas coberturas do projeto. Justaposto
a essa superfície, um banco longínquo de frente ao principal espelho d’água.

No ano de 1930, Mies van der Rohe recebe a encomenda para o projeto da
casa Tugendhat em Brno, na República Checa (antiga Tchecoslováquia). A casa,
construída em um terreno demasiadamente íngreme possibilitando um horizonte
desobstruído para a cidade, adapta a concepção espacial do Pavilhão de Barcelona
a um programa residencial (FRAMPTON, 2003, p.198). Situada em um terreno
em declive em relação à rua de acesso, a casa se desenvolve em três níveis de modo
que o nível de acesso sugere uma construção de pavimento único.
Explor

Casa Tugendhat, L. Mies van der Rohe, Brno, 1930: http://bit.ly/32lk8Rt

Ao norte, a fachada voltada para a rua de acesso se mostra fechada e reservada;


por outro lado, a fachada sul se apresenta através de um espaço aberto e transparente.

A construção é modulada pelas mesmas colunas cruciformes cromadas do pa-


vilhão, resultando na planta livre, melhor percebida no pavimento intermediário.
A pièce the resistance, de acordo com Curtis (2008, p.307), é a sala de estar, sala
de jantar e o estúdio conjugados num espaço contínuo de 25 x 15 metros.

Figura 10 – Casa Tugendhat, L. Mies van der Rohe, Brno, 1930


Fonte: http: moma.org

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O piso intermediário invoca a planta aberta do Pavilhão de Barcelona no espaço
conformado pelas salas de estar e jantar e estúdio. O espaço contínuo é caracteri-
zado pelas superfícies verticais “soltas” e também por uma malha estrutural rígida
composta pelos pilares cruciformes cromados.

A casa-modelo para a Exposição da Construção em Berlim erguida em 1931


encerra a tríade de projetos que coroam a primeira fase de Mies van der Rohe.
Também, nessa obra, há a ordenação centrífuga horizontal subdividida e articulada
por planos e colunas independentes.

Figura 11 – Casa-modelo para a Exposição da Construção, L. Mies van der Rohe, Berlim, 1931
Fonte: moma.org

A casa-modelo de pavimento único se fundamenta na planta aberta. A apro-


ximação dessa proposta com a casa de campo de tijolos (1923) e o Pavilhão de
Barcelona (1929) é notória e, indubitavelmente, resgata a estratégia de concepção
espacial explorada por F. L. Wright. Os planos verticais interrompidos pelo espa-
ço que, por sua vez, torna-se contínuo, estabelecem uma relação harmoniosa e
definem uma série de espacialidades. Esses planos, ora sob a projeção da laje de
cobertura, ora se projetam para além.

A contribuição de Mies van der Rohe para a arquitetura moderna não se limita
à sua produção na Alemanha. Após contribuir com a direção da Bauhaus nos últi-
mos dois anos antes do seu fechamento pelo regime nazista em 1933, Mies van der
Rohe entra em uma nova fase.

É nos Estados Unidos que, a partir de 1939 com o projeto para o Campus de
Tecnologia de Illinois, em Chicago, que o arquiteto dá início ao seu grande legado
além da Europa. Edifícios residenciais como as torres para o Lake Shore Drive
(Chicago, 1948-51), o edifício de escritórios Seagram (Nova York, 1958) em parce-
ria com Phillip Johnson e a casa Farnsworth (Illinois, 1946-50), além de inúmeros
outros projetos realizados no continente americano, reúnem características de um
Mies van der Rohe extremamente maduro, cuja pesquisa se fundamente explicita-
mente no emprego da estrutura metálica em diálogo com as superfícies transparen-
tes, difundido, portanto, o Estilo Internacional.

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

Alvar Aalto e a Arquitetura


Moderna Escandinava
Considerado o último mestre do modernismo (pelo menos da primeira gera-
ção de arquitetos pertencentes ao movimento), Alvar Aalto é responsável por
elaborar uma arquitetura funcionalista em consonância com a cultura local e
enraizada na natureza.

Aalto nasce em 1898 em Kuortane, uma cidade localizada a Sudoeste da


Finlândia. Entre 1916 e 1921, estuda arquitetura no Politécnico de Helsinque
com Usko Nystrom (1861-1925) e Armas Lindgren (1874-1929), dois docentes da
geração pré-racionalista.

O início de carreira do arquiteto, em 1922, é marcado por uma forte influên-


cia tanto dos seus professores, em específico de Nystrom, quanto do sueco Erik
Gunnar Asplund (Estocolmo, 1885-1940) cuja obra representa um período de
transição da arquitetura neoclássica para a moderna, tornando-se um dos princi-
pais expoentes do funcionalismo, não apenas na Suécia, mas na Escandinávia de
maneira mais abrangente.

Os primeiros anos de prática de Aalto, de 1923 a 1927, são marcados por uma
ampla investigação estética em projetos de naturezas distintas como apartamentos
e um clube para operários, inúmeras igrejas (incluindo reformas), casas da Guarda
Civil. Em 1927, o arquiteto assume decididamente o Classicismo romântico em sua
obra com os projetos para a igreja Viinika e biblioteca Viipuri. Entretanto, logo no
ano seguinte, ao vencer o concurso de projeto para o sanatório de Paimio em par-
ceria com a arquiteta Aino Aalto (Helsinque, 1894-1949), Aalto “estabelece firme-
mente o estilo funcionalista fundamental do primeiro período de sua maturidade”
(FRAMPTON, 2003, p.238) que se estende até 1934.

O projeto para o Sanatório Paimio representa o ápice da pesquisa sobre o fun-


cionalismo ortodoxo na obra dos Aalto e inaugura um período de maturidade do
ateliê que se estende até 1934. Nessa fase, Alvar Alto reconhece as influências da
arquitetura construtivista russa e também do neoplasticismo holandês, sobretudo
no que diz respeito ao emprego do concreto “desnudado” como forma de sedimen-
tação de uma nova materialidade. A tectônica se apresenta de maneira austera,
porém integrada com a natureza circundante, estratégia essa que Aalto busca em
seus projetos.

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Figura 12 – Sanatório para tuberculosos, Alvar e Aino Aalto, Paimio, Finlândia, 1929-33
Fonte: Wikimedia Commons

Essa imersão na estética funcionalista que caracteriza a modernidade na ar-


quitetura na primeira metade do século XX se dá pela participação de Aalto em
congressos internacionais sobre arquitetura e construção modernas, sendo que um
colóquio em Paris sobre concreto armado, em 1928, torna-se o ponto crucial para
que o arquiteto explore o material no projeto para o sanatório. Nesse momento,
Aalto reconhece forte influência da estética construtivista holandesa e russa.

Entretanto, esse contato com a arquitetura moderna no exterior, que se pauta,


entre outros fatores, na industrialização, não é o suficiente para Aalto explorar o
Estilo Internacional em sua obra. Pelo contrário, como afirma Curtis (2008, p.454):
Na verdade, o Estilo Internacional fora um breve interlúdio e suas lições
haviam sido imediatamente enxertadas em uma subestrutura das tradi-
ções de edificações nacionais (ou mesmo Românticas Nacionais). É ten-
tador declarar que havia uma genialidade nórdica no trabalho cuidadoso
com o local, paisagem, luz e materiais naturais [...].

Nesse sentido, Aalto se volta para o contexto local, de certa forma como Wright
faz quando elabora o conjunto de casas de pradaria, com o objetivo de sobrepor os
princípios da construção local com a estética do projeto moderno.

Com a finalização da construção do Sanatório Paimio, Aalto é convidado por


Harry e Mairea Gullichsen, donos da Ahlstrom, uma grande firma de madeira,
celulose e papel, a projetar uma série de móveis em madeira. A experiência com
essa matéria-prima em abundância no local resulta na fundação da Companhia de
Móveis Artek em 1935, responsável por distribuir os móveis dos Aalto. Associado
ao êxito dos móveis em madeira, os Aalto são patrocinados tanto pela Ahlstrom
quanto pela Enso-Gutzeit, outra grande madeireira, o que tensionaria ainda mais o
distanciamento de Aalto do concreto bruto do Estilo Internacional.

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UNIDADE Função e Perfeição na Obra de Wright, Mies e Aalto

De acordo com Frampton (2003, p.239), “o primeiro indício desse afastamento


do Construtivismo internacional surgiu com a sua própria casa [...] em 1936”. Com
esse projeto em Munkkiniemi, Helsinque, Aalto sedimenta uma nova e duradoura
fase em sua carreira.

Não tarda para que em 1938 o arquiteto crie a obra-prima de sua carreira pré-
-guerra, a Villa Mairea. A casa de verão construída para Mairea Gullichsen em
Noormarkku é resultado do entrelaçamento de dois corpos em L que geram uma
espécie de pátio interno. Dessa forma, Aalto evidencia a sua pesquisa que gira em
torno da aproximação do homem com a natureza, uma vez que os ambientes prin-
cipais da casa se voltam para esse pátio. Inserida em um sítio rodeado por grandes
árvores, a Villa Mairea é o resultado do encontro de dois corpos em L que definem
um pátio. Simbolicamente, o pátio assume a função de conectar o homem à natu-
reza. Essa é uma estratégia recorrente em projetos pós-guerra, desde residências
até instituições públicas de escala mais generosa.

Figura 13 – Villa Mairea, Alvar e Aino Aalto, Noormarkku, Finlândia, 1938-39


Fonte: Archdaily

Na contramão ao uso exacerbado do concreto e dos grandes planos de vidro,


Aalto intensifica essa adequação de uma estética de princípios universais a uma
condição em que há a tentativa de um resgate da linguagem local. Aalto estabelece
um jogo muito sábio de contrastes na Villa Mairea. A sensualidade da linha curva
e os materiais naturais como as chapas de madeira, os tijolos aparentes e alvenaria
rebocada em contraponto ao rigor do ângulo reto e os volumes brancos.
Explor

Villa Mairea, Alvar e Aino Aalto, Noormarkku, Finlândia, 1938-39: http://bit.ly/2NJevHn

O pátio se torna um elemento fundamental que se repete em outras obras do


escritório já no período pós-guerra. Para o projeto da Prefeitura em Saynatsalo
(1948-52), o prédio administrativo em U justaposto a um bloco independente que
abriga a biblioteca define o grande vazio do átrio central, este elevado a três metros
em relação à rua.

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Ao gerar esse desnível, Aalto organiza o setor de lojas comerciais no andar in-
ferior, voltado diretamente para rua; enquanto que as partes mais representativas
da prefeitura se situam voltadas ao pátio central, cujo acesso se dá por duas esca-
darias (uma em cada extremidade do bloco da biblioteca). Interessante notar que a
proporção das escadarias é adequada ao espectador em função da aproximação do
volume da biblioteca com o bloco da prefeitura, atribuindo a atmosfera de uma viela
à medida que o espectador se aproxima desses vazios.

Figura 14 – Prefeitura, Alvar e Aino Aalto, Saynatsalo, Finlândia, 1948-52


Fonte: Archdaily

Figura 15 – Vista de uma das escadarias que permite acesso ao pátio


Fonte: Archdaily

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Figura 16 – Plantas em que verifica-se o pátio central como elemento articulador do projeto
Fonte: Archdaily

A prefeitura evoca um pátio central delimitado pelo complexo, mas aberto à po-
pulação. O acesso a esse vazio se dá por duas escadas localizadas nos interstícios
do bloco da prefeitura em U para o bloco isolado da biblioteca. Portanto, a lógica
de acessos à construção é invertida: no térreo, as lojas voltadas para a rua garantem
determinada dinâmica; no nível do pátio, três metros acima, os acessos se voltam
a esse grande vazio.

Ainda que o pátio seja um elemento recorrente em sua obra, Aalto não segue
um padrão preestabelecido para a concepção de seus projetos. Isso é nítido ao se
analisar como o arquiteto compreende, para cada situação, estratégias específicas
que resultam em investigações formais variadas. Não apenas a composição das
volumetrias, mas a maneira como a tectônica se evidencia é muito peculiar através
dos ângulos retos, das linhas sinuosas e, também, dos ângulos mas acentuados.

Com o distanciamento dos funcionalistas mais dogmáticos dos anos 1920, Aalto
reage sensivelmente ao concreto armado ao se aproximar da matéria-prima local
como a madeira. Esse elemento, ora associado ao tijolo aparente, ora à alvenaria
rebocada, e também utilizado com bastante honestidade no interior das construções,
faz com que Aalto se concentre em uma arquitetura voltada ao bem-estar do homem.

Nesse aspecto, a obra de Aalto pode se aproximar à de Frank Lloyd Wright no


sentido que ambos, em determinado momento de suas carreiras, compreendem
que a arquitetura é o intermédio do homem com a natureza ao criarem ambientes
que refletem uma perene sensibilidade à luz, com aberturas capazes de enquadrar
a natureza circundante.

Indubitavelmente, Aalto deve ser considerado um dos mais importantes arquite-


tos modernistas tendo em vista essa tradução que faz de uma linguagem universal
para a local deixando um legado ímpar.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Vídeos
Harry Seidler Lecture: Principles in the Mainstream of Modern Architecture
https://youtu.be/mhu6dOSSuEI
Keynote: Saarinen versus Saarinen: The Search for an American Modern Architecture
https://youtu.be/bh4ruwc5vDw
Vincent Scully – The Shingle Style and Frank Lloyd Wright (Modern Architecture Course)
https://youtu.be/-LdPwDGkyzE
Frank Lloyd Wright, Architecture, & Environment
https://youtu.be/5L4_d1rX4cA
Frank Lloyd Wright interview
https://youtu.be/DeKzIZAKG3E
El Pabellón de Barcelona y el Espacio Moderno
https://youtu.be/l0Htg8f5IFE
Mies van der Rohe’s Farnsworth House (1 of 3)
https://youtu.be/8M3p9iKITaA
Mies van der Rohe’s Farnsworth House (2 of 3)
https://youtu.be/Z-JHaP9bdBY
Mies van der Rohe’s Farnsworth House (3 of 3).
https://youtu.be/vYcg_h0bOkQ
La obra de Mies Van Der Rohe
https://youtu.be/f-XWmRRGML0
Detlef Mertins – Goodness Greatness: The Image of Mies, Reconsidered
https://youtu.be/XoWxVNbS_a0
Alvar Aalto Documentary
https://youtu.be/nuP8qIDtSxI
”Alvar Aalto and the Future of the Modern Project” with Kenneth Frampton
https://youtu.be/Mjd58mE76tU

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Referências
COHEN, J. L. O futuro da arquitetura desde 1889: uma história mundial. São
Paulo: Cosac Naify, 2013.

CURTIS, W. J. R. Arquitetura Moderna desde 1900. Porto Alegre: Bookman, 2008.

FRAMPTON, K. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins


Fontes, 2003.

GIEDION, S. Espaço, tempo e arquitetura: o desenvolvimento de uma nova tra-


dição. São Paulo: Martins Fontes 2004.

INAKI, A. A boa vida: visita guiada às casas da modernidade. Barcelona: Gustavo


Gili, 2001.

PFEIFFER, B. B. Frank Lloyd Wright. Koln: Taschen, 2007.

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