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Ranhuras no Paiol: trajetórias e resistências pela perspectiva de Dona Ana

Ferreira Oliveira

Bruno Matheus Santos Nessa


Julia Toebe Zen
Kauane Andreiov Soares Antunes
Rebecca Ramos Dias1

Introdução

O presente trabalho, produzido durante a disciplina de Educação do Popular


do Curso de Ciências Sociais – Licenciatura da Universidade Federal da Fronteira
Sul (UFFS) após visita de campo realizada no quilombo Paiol de Telha, tem por
objetivo fazer uma breve análise da história de vida de Ana ­Oliveira Ferreira,
moradora e herdeira de terras no território da Invernada Capão Grande – Fundão.
Pretendemos, por meio dessa narração de vida, articular uma retomada histórica da
vivência de um povo através das memórias dos sujeitos para pensarmos as relações
de aprendizagem em experiências como a da visita realizada.

Sendo assim, na primeira parte deste artigo, traremos uma revisão


bibliográfica para retomar a história do quilombo e contextualizar a narrativa trazida
mais à frente sobre a história de Dona Ana. Neste momento, utilizamos a
contribuição de autores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que
fizeram parte do processo de demarcação de terras no quilombo, além de outros
autores que pesquisaram e estudaram a história do Paiol de Telha por meio de sua
cultura, religiosidade, costumes, identidades e assim por diante.

Em seguida, fizemos a delimitação metodológica do método de análise por


meio da experiência de vida e do discurso, bem como justificamos a escolha pela
metodologia em questão.

1
Graduandos dos cursos de Ciências Sociais – Licenciatura e Bacharelado da Universidade Federal
da Fronteira Sul.
Por fim, temos a narrativa da história de vida de Ana Ferreira Oliveira,
chamada de Dona Ana, onde re-contamos a história, permeada de muita dor e
resistência, de uma das mais antigas residentes e herdeiras do quilombo. A
entrevista foi feita no dia da visita ao Paiol de Telha, onde fomos gentilmente
acolhidos e conversamos com Ana sobre sua trajetória. Neste trabalho, procuramos
relacionar os relatos da moradora com a história do quilombo, mas também
questões profundas sobre pertencimento, identidades, resiliência do povo negro e a
violência usada contra eles históricamente.

Revisão bibliográfica sobre a história do Paiol de Telha

O quilombo Invernada Paiol de Telha – Fundão está localizado no município


de Reserva do Iguaçú e foi o primeiro território quilombola reconhecido pelo Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) do estado do Paraná. A titulação
da terra aconteceu em 2021, apesar do processo de demarcação ter começado em
2004, com a equipe liderada pela antropóloga Miriam Hartung.

A história da comunidade do Paiol de Telha remonta dos anos 1860, onde,


após seu falecimento, a proprietária de terras Balbina Francisca de Siqueira Cortez,
viúva de Manoel Ferreira dos Santos, deixou a seus 13 escravos as terras da
fazenda Capão Grande por meio de testamento (CARARO, CARARO; 2013). No
entanto, o testamento não se fez claro quanto às dimensões exatas do território
delimitado em questão, e, a partir daí, começaram a surgir inúmeras contestações
sobre o legado das terras, seja por familiares de Balbina, grileiros e até colonos.

Após o falecimento de Dona Balbina, os escravizados e suas famílias


passaram a ocupar a fazenda, que na época era formada por cerca de 8 mil
hectares. Para administrar o território, foi adotado um sistema de criação e cultivo
comunitário, cada família era responsável por uma parte da terra e por alguma
atividade necessária para manutenção da comunidade. Desta forma, os membros
herdeiros da Fazenda desenvolveram um senso de comunidade e identidade,
composto por ideais religiosos, festivos e toda uma tradição própria do povo que ali
habitava (CARARO, 2016).

De acordo com o testamento da ex-proprietária da Fazenda, o território estava


destinado aos escravizados e seus descendentes apenas, não podendo ser legada
a ninguém mais (HARTUNG, 2004). Esse fato é confirmado pelos atuais moradores
do quilombo, que em diálogo conosco afirmaram a identidade baseada na
hereditariedade. Segundo eles, “lá (se referindo ao quilombo) só entra quem puder
provar com a árvore genealógica” – as únicas exceções sendo aqueles que são
considerados “acolhidos”, ou seja, que ajudaram e contribuíram para o
funcionamento e história do Paiol de Telhas.

Porém, já de início o testamento foi completamente descumprido, e assim


começaram as contestações e expropriações da terra dos herdeiros. O primeiro
processo de expulsão dos habitantes da Invernada foi arquitetado pelo fazendeiro
Pedro Lustoza, vizinho do Capão Grande. Lustoza era considerado pelos herdeiros
alguém de confiança até o momento em que decidiu se aproveitar de seus
“companheiros” e invadiu mais da metade das terras dos mesmos, dando início ao
requerimento de mais de 5.000 ha, que foi aprovado em 1895. Assim seguem-se
inúmeros outros momentos de expropriação e tomada de território dos herdeiros
(HARTUNG, 2004).

Em 1967 o processo foi um pouco diferente. Segundo documentação


encontrada pela antropóloga Miriam Hartung (2004), 28 herdeiros teriam transferido
seus direitos hereditários para Alvy Baptista Vitorassi e João Pinto Ribeiro e
perderam mais da metade da Fazenda. No entanto, segundo os atuais moradores
do Paiol de Telhas, esses herdeiros só realizaram a transferência por não terem
conhecimento de que se tratava de uma abnegação de seus direitos, acreditando
ser, na verdade, um processo de titularização que lhes daria segurança da posse da
terra. Após esse acontecimento, temendo outra perda de seus territórios, os
herdeiros passaram a lutar pela propriedade, em escritura, da Invernada.

A mais recente e prejudicial expropriação das terras, que levou a inúmeras


expulsões e violência causadas aos herdeiros do Paiol até hoje, ocorreu em 1975.
Neste ano aconteceu a venda das terras que pertenciam a Oscar Pacheco – que
supostamente comprou 90% do território pertencente a Alvy Vitorassi – para a
Cooperativa Central Agrária Ltda. (HARTUNG, 2004). A delimitação da terra vendida
foi especificada em 1600 alqueires. Desde então, a briga na justiça pela propriedade
do território entre a Cooperativa se tornou central, mesmo agora com a titularização
do quilombo, que permanece sendo constantemente ameaçado.
Mas voltando a 1975, é necessário destacar a violência cometida contra os
herdeiros. Desde a expulsão, que foi realizada a base da agressão, onde os
habitantes da Fazenda foram ameaçados, tiveram suas casas queimadas por
jagunços, alguns foram assassinados e outros tiveram que se deslocar para outras
terras, como o chamado “Barranco”, a realidade destes sujeitos foram invisibilizadas
e suas vozes silenciadas.

Sendo assim, essa violência e silenciamento vivenciados pelos habitantes do


quilombo Paiol de Telhas será evidenciada por meio dos relatos da história de vida
de Ana Ferreira Oliveira­­, que traremos a seguir como forma de ilustrar as
implicações da opressão sistemática cometida contra os descendentes de escravos
no país.

Imagens 1, 2 e 3, respectivamente - Casa da memória do quilombo, pequena igreja localizada


no território e o Centro de Eventos Quilombolas.

Metodologia: Análise de história de vida a partir do discurso

Criada pela Escola de Chicago e pelos sociólogos da época, em especial


William I. Thomas e Florian Znaniecki, o método de pesquisa social história de vida
averigua a articulação existente entre a história individual e a história coletiva, desta
forma, a pesquisa estabelece uma relação mútua entre a trajetória individual e a
trajetória social. Este método se tornou um divisor de águas para as ciências sociais
e humanas, sendo até hoje um dos mais utilizados em pesquisas de campo por
antropólogos, “Narrar a vida é dela se re-apropriar, refazendo os caminhos
percorridos, o que é mais do que ‘revivê-los’” (BOSI, 1987, p.55).
Já a teoria da análise de discurso proposta na obra “Materialidades
discursivas” por Pêcheux2 em 1908, propõe a formação discursiva, repleta de
particularidades que moldam o sujeito. Sendo assim, o filósofo une a análise
discursiva com a formação ideológica mudando o olhar do objeto, passando a utilizar
o conhecimento dos materialismos dialético e histórico. Pêcheux, em sua obra, deixa
claro que o materialismo dialético engloba o materialismo histórico, considerando
todo o universo, formado de matéria e movimento. Assim, a noção de processo e a
de movimento são básicas no estabelecimento da teoria e da análise de discurso
que propõe.

Como resultado, para esta pesquisa foi feita a escolha de unir ambos os
métodos, uma vez que são métodos qualitativos de investigação utilizados para
compreender os aspectos subjetivos com relação a temas específicos utilizando o
conhecimento dos materialismos. Durante a pesquisa, foram realizadas gravações e
fotografias que viriam a auxiliar a análise, possibilitando uma avaliação crítica do
discurso.

A história de vida da Dona Ana: resistência e pertencimento

A história do quilombo Invernada Paiol de Telha – Fundão se remonta


principalmente através da contação da história pelos mais velhos e por aqueles que
dela fazem parte, onde o relato da história de vida se sistematiza através da
contação das vivências daqueles que descenderam, ocuparam, participaram e
lutaram por este território. É o caso de uma das entrevistadas que conhecemos
durante a visita ao quilombo.

Dona Ana Ferreira Oliveira, nascida em 1929 neste território, tem hoje 94
anos de idade e narrou um pouco sobre sua história de vida e resistência, numa
trajetória marcada pela luta pelo pertencimento e ligação com uma terra que sempre
fora herdeira. Descendente de um dos 13 escravos libertos e herdeiros, segundo o
testamento deixado por Dona Balbina Francisca de Siqueira Cortez, em 1860, dona
Ana é uma das herdeiras desta terra e nos conta sobre as imigrações, a invasão
alemã e as inúmeras andanças devido às expulsões sofridas e vividas ainda na
infância com seus pais.
2
Precursor e grande nome dentro do coletivo intelectual, fundador da linha conhecida como análise
de discurso na segunda metade do século XX, teorizando sobre a materialidade do discurso.
Imagem 4 - Dona Ana Imagem 5 - Turma na casa de Dona Ana

O ato de Dona Balbina em tornar herdeiros os escravos libertos, revela que


as relações entre senhores e escravizados se estendiam em muito além daquelas
previstas pelo sistema escravocrata. Com uma herança de mais de 8 mil hectares, e
assim distintos da maioria dos pobres e brancos do período, a vida dos libertos e
herdeiros da Invernada Paiol de Telha – Fundão passa a ser reafirmada e
reconhecida enquanto organização. Nas falas de Dona Ana, temos o relato destas
relações entre herdeiros, principalmente no que diz respeito à relação com a terra e
a agricultura, produção que garantia o sustento das famílias. Em pequenas roças se
plantava batatinha, milho, trigo e feijão, além da criação de gado e outros animais.
Segundo o relato, as famílias, mesmo morando em lotes separados, trabalhavam em
conjunto para atender as demandas do serviço e garantir a subsistência de todos os
moradores, era o chamado puxirão: trocas de serviço entre famílias e mulheres para
ajudar aqueles que estavam mais apurados no trabalho, e assim, não perdessem
suas produções.

A origem comum dos descendentes de escravos libertos, definida através da


descendência dos escravos e libertos herdeiros, bem como, as relações comuns que
se estabeleceram através desta origem compartilhada, foi o que manteve os
descendentes unidos durante os diferentes momentos de expropriação e expulsão
de suas terras. Por esta descendência e origem compartilhada, que tanto através
das relações de consanguinidade quanto de relações de afinidade, as famílias que
foram expulsas de suas terras e das terras dos seus antepassados, ainda assim, se
mantiveram organizadas enquanto grupo de luta em outros territórios. O relato de
vida de Dona Ana evidencia o que foram estas expulsões e a necessidade de estar
sempre migrando para outros territórios e periferias, devido à invasão da terra dos
herdeiros. Segundo ela, quando o território em que residiam deixava de ser uma
tapera, uma área de mato, sendo uma moradia com roças, criação de animais,
horta, casa e plantas, aconteciam as invasões e as violências. Num destes
acontecimentos, conta das ameaças sofridas caso não saíssem de suas casas e no
risco de vida que seu pai correu em meio às invasões de terras para defender sua
família; outras famílias tiveram suas casas e sua produção agrícola queimadas,
sendo obrigadas a saírem de seus lotes sob risco de morte. O relato da violência
sofrida carrega consigo também a experiência da luta e da esperança de se firmar
em um local, onde Dona Ana enfatiza as relações de violência e injustiças do
delegado Oscar Pacheco dos Santos e a Cooperativa Central Agrária Lida.

Ao relatar as invasões, a migração e a ocupação dos Barrancos, Dona Ana


comenta do desejo que tinha em voltar para a terra que era herdeira, de ocupar um
território que também era seu por direito, de uma herança garantida por testamento
e a alegria em poder finalmente se estabelecer, construir casa e se fixar. Ao tratar de
sua história pessoal de vida, a entrevistada relata toda a dor e luta de um povo, que
em meio às invasões, expropriações e migrações buscava formas de viver em
comunidade e seguir tradições. Fica evidente em seu relato como algumas destas
tradições se modificaram ao longo do tempo, e muito disso é atribuído por Dona Ana
à constante desapropriação de territórios, bem como das dificuldades enfrentadas
pelos moradores.

Em meio a estes fatos relatados, também se evidencia a relação com a


religiosidade e as tradições, as encomendas das almas nas quartas e sextas de
quaresma, os cânticos com as matracas, os remédios caseiros, a partilha dos
alimentos e entre outros. Outros aspectos citados são em relação à visita do padre
São João Maria e do médico da região naquele período, Antônio Madeireiro, ambos
citados em alguns momentos da entrevista.

Ela narra sua história em cima de muita dor e sofrimento, mas também sobre
muita luta e resistência. Por meio de seus relatos, é possível perceber como a
estrutura em que estamos calcados – através do colonialismo, a tentativa iminente
de retirada desse povo de sociedade e as expulsões dos herdeiros dos locais que
são seus por direito – demonstram que, para esse sistema, o povo negro será
sempre colocado às margens.
Dona Ana relata que a primeira expulsão ocorreu quando ainda era criança, a
resistência por parte de sua família em deixar as terras herdadas fazia com que
corressem risco de vida e uma prática muito comum na época era a queima das
propriedades dos moradores herdeiros das terras. Com isso, eram jogados de um
canto para outro, sempre partilhando do desdém por onde passavam. Quando se
instalavam em um “canto”3 e trabalhavam no local, com as práticas do campo e da
agricultura de subsistência, “ajeitavam” o local e por lá permaneciam, segundo ela,
sua permanência nos locais variava entre 7 a 9 anos até que precisassem se retirar.
Assim, eles eram levados para outro “canto” e a prática se repetia, através dos seus
trabalhos “ajeitavam” o lugar para serem novamente retirados. Essa prática durou
boa parte da vida dos herdeiros.

As histórias da vida da Dona Ana, junto com a dos outros moradores, levam a
uma reflexão acerca do pertencimento, uma vez que eles não se denominam, e de
certa forma não se identificam, como “sem terra”, já que nas palavras dos mesmos
eles são herdeiros, e a luta não se tratava de uma terra qualquer, mas sim da terra
onde seus antepassados residiram, onde sua ancestralidade estaria. Quando
questionada sobre sua percepção a respeito desses acontecimentos sendo tão
nova, ela disse “Eu tinha 12 anos, só chorava, minha mãe uma vez disse que ia me
jogar no mato se eu não parasse de chorar, então eu parei”. O silenciamento até
mesmo da dor sentida, tendo que desde de muito nova esconder e ser forte, para
poder até hoje com o direito de suas terras e lutar pelo pertencimento.

Pela sua vida dona Ana também enfrentou a dor da perda, relatou que ao
todo ela teve nove filhos, mas devido à falta de recursos de saneamento e saúde,
enfrentou o luto de 7 deles, com a idade que variava de três a cinco anos. Com uma
profunda tristeza no olhar, ela contou sobre a perda de seu último filho, que morreu
vítima do crupe4, disse que não procurou tratamento, pois devido ao trauma da
perda de seis filhos, não queria inconscientemente aceitar a perda de mais um,
negando sua doença. A falta de recursos médicos permeia até hoje na vida dessas
pessoas. Eles tinham como refúgio as crenças populares, as tradições passadas
através das gerações, carregavam a medicina popular e com isso podiam controlar

3
Esta é a forma com que a própria herdeira se refere aos locais onde residiam após as expulsões.
4
Infecção das vias aéreas superiores que bloqueia a respiração e causa uma tosse forte
característica.
ou amenizar as enfermidades que os acarretavam, contavam apenas com o
conhecimento das ervas, das crenças populares e da lua.

Alguns aspectos nos chamaram a atenção, dentre eles está a fé que Dona
Ana carregava consigo. Sua casa era ornamentada com diversas imagens de
símbolos cristãos, e quando indagada, nos relatou que carrega dentro do si a fé
católica, relatando que também é um dos motivos para ter tanta força. Com isso, nos
contou sobre uma das práticas culturais que foram se perdendo ao longo do tempo:
as “recomendas”. Segundo ela, as recomendas aconteciam quando os moradores,
ornamentados de símbolos católicos, passavam de casa em casa, cantando
músicas específicas daquele rito, em cada casa paravam e, de acordo com o santo
que cada família escolhia, recomendavam as almas do cemitério, do purgatório e
dos antepassados daquela família. Essa prática ocorria nas quartas e sextas-feiras
da quaresma e devia ser feita à noite, com as luzes da casa apagadas e todos
deviam ficar em silêncio até que a procissão passasse, quando as pessoas
chegassem cantando e recomendando as almas, as luzes iam se acendendo.
Atualmente não há mais o costume de praticar a recomenda, mas essa expressão
da religiosidade e festividade permanece viva nas memórias de Dona Ana, que
lamenta o esquecimento do rito por parte das novas gerações.

Mais ao final da nossa conversa com Dona Ana, perguntamos sobre seu
gosto pessoal, o que ela comia quando criança e o que ela carregava na memória. A
resposta, dada com um semblante que remetia a um saudosismo, era de que,
quando criança, adorava comer quirera com suan5 de porco, lembrança que com
nostalgia despertou seu paladar, e assim ela continuou contando sobre os “pratos da
roça” que ela gostava e gosta até hoje. Segundo ela, as comidas cultivadas por eles
mesmo, como a batata doce e a mandioca, era o que mais ela gostava de comer.

Ao final nos despedimos, e ela, com toda simpatia, agradeceu a visita com um
sorriso no rosto pediu e que voltássemos, mas teria que ser logo, se referindo a sua
idade avançada, em uma brincadeira que transparece para nós que ela parece já
estar finalizando sua história, marcada pelo sofrimento, mas também sobre muita
resistência, uma mulher eternizada como símbolo de luta.

5
Também chamada de suã mineira ou de espinhaço suíno, é a espinha dorsal do porco, que tem
carne, osso e gordura.
Considerações finais

A história de vida de Dona Ana, contada por ela própria, evidencia uma
dimensão geral e ao mesmo tempo particular de um período da história de luta dos
herdeiros da Invernada Paiol de Telha – Fundão, de Dona Ana e de sua família. A
história de vida apresenta-se então, como uma prática social, segundo Bragança
(2012), e fica evidente no momento dos acontecimentos relatados a
transmissão/recriação da cultura, por meio das narrativas envolvendo pais, filhos,
das histórias da família e da comunidade; estas práticas que passam por gerações,
são a comunicação viva do testamento construído socialmente pela comunidade.
Enquanto grupo, sentados em volta de Dona Ana para ouvir o relato de suas
histórias e de seu conhecimento, nos utilizamos da forma propriamente humana de
produzir conhecimentos, constituindo o registro das narrativas de vivências orais de
vida e da história individual/coletiva.

Outras fotos tiradas na Viagem

Imagens 6 e 7 - Crianças brincando na lama e na chuva; conversa com Dona Ana

Image 8 - Paisagem do quilombo em um dia de chuva.


Referências

BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: Lembranças de Velhos. São Paulo: Edusp,


1987.

BRAGANÇA, IF de S. História de vida nas ciências humanas e sociais:


caminhos, definições e interfaces. Histórias de vida e formação de professores:
diálogos entre Brasil e Portugal [online]. Rio de Janeiro: EDUERJ, p. 37-57, 2012.

CARARO, Adriana Ribas Adriano. A INVERNADA PAIOL DE TELHA E A NOVA


LEGISLAÇÃO QUILOMBOLA (1975-2015). Universidade Estadual de Ponta Grossa
(UEPG), 2016.

CARARO, Adriana Ribas Adriano; CARARO, Jeferson. Paiol de Telhas: a saga de


um quilombo no Paraná. Revista Ars Histórica, ISSN 2178-244X, nº 6, p. 1-14, 2013.
Acesso em: www.história.ufrj.br/~ars/.

HARTUNG, Miriam Furtado. O sangue e o espírito dos antepassados: escravidão,


herança e expropriação no grupo negro Invernada Paiol de Telha /PR. Florianópolis,
NUER/UFSC, 2004.

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