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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Profª. Alda Valverde

RESUMO DA AULA DE INTERPRETAÇÃO E ESTILÍSTICA DO TEXTO JURÍDICO – I

Estratégias e tipos de leitura: de reconhecimento, analítica e crítica; tipologia textual; coerência:


competências necessárias para o seu cálculo; estilística: figuras de palavras; reestruturação de frases;
estudo de caso: sentença.

O QUE É INTERPRETAR?

“Interpretar uma expressão de Direito não é simplesmente tornar claro o respectivo dizer, abstratamente
falando; é sobretudo, revelar o sentido apropriado para a vida real, e conducente a uma decisão reta.”
(MAXIMILIANO, 2006, p. 8)

Métodos de interpretação do Direito

Método:

“o procedimento a ser adotado no estudo ou na exposição de determinado tema” (SILVA, De Plácido,


2004, P. 916).

1- Gramatical

Consiste em uma leitura inicial do texto, com o objetivo de determinar o significado literal e o alcance
das palavras, não apenas isoladamente, mas também em conexão com as demais palavras.

2-Método Sistemático

Objetiva analisar a norma jurídica em consonância com outras normas diversas, mas referentes ao
mesmo objeto. Não admite a análise de uma norma isolada das demais.

3-Método teleológico

Fixa-se na noção de finalidade ou de utilidade social do Direito para servir à sociedade. É a utilidade
social do Direito que determina sua aplicação. Busca salvaguardar os fins sociais da lei e o bem comum.

4- Método histórico- evolutivo

Conforme SALEILLES, (...) “a interpretação da lei não deve ater-se apenas aos antecedentes legislativos e
suas condições de nascimento, mas a lei deve ser adaptada às condições do meio social que lhe
proporcionam nova vida. Quando se adapta a lei às modificações sociais ocasionadas no transcorrer do
tempo, seu sentido evolui paralelamente à sociedade".

Cf. AFTALIÓN, Enrique R.; VILANOVA, José. Introducción al Derecho. 2. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1991. p.
284. Tradução livre.

2- Técnicas de leitura:

2.1- Leitura de Reconhecimento

Identifica o significado das palavras, associa-as às demais, analisa todos os elementos “periféricos” do
texto como o título, a autoria, a data e o local da sua publicação.
- Significado explícito

2.2- Leitura Analítica

Desmembra o texto em parágrafos, destaca as ideias principais, anota (na margem ao lado do parágrafo)
palavras-chave que o resuma.

2.3- Leitura Crítica

Explora os implícitos, associa as ideias do texto a outros que tratem do mesmo assunto, avalia o sentido
extraído do texto.

Cálculo da coerência textual

1-Informatividade

Grau de informações novas que expressas em um texto. O equilíbrio se dá conforme a expectativa do


emissor a respeito do conhecimento de mundo do receptor. Deve estar adaptada, também, ao veículo
de comunicação em que o texto é transmitido.

2- Focalização

Ativa o conhecimento de mundo do receptor, por meio de “pistas” fornecidas no texto pelo emissor
que as apresenta de forma destacada. Essas serão focalizadas pelo leitor e o ajudarão a extrair o sentido
do texto.

3- Intencionalidade

Expressa como os emissores usam o texto para perseguir e realizar suas intenções. Os emissores
registram “pistas linguísticas” que guiam o receptor na direção da tese defendida. Tais pistas podem se
concretizar por meio de conectores interfrásticos, modalizadores, operadores argumentativos, etc.

4- Intertextualidade

É a adoção de uma palavra ou ideia, já utilizadas em outro texto, que reforçam o sentido que o emissor
deseja transmitir. Se o receptor identificá-las e conhecer o seu sentido, terá mais facilidade de
interpretar o texto.

5- Aceitabilidade

Construção de um texto, claro (bem ordenado), objetivo, conciso. Além disso, que o conteúdo seja
relevante e verdadeiro.

6- Consistência

As ideias são expostas de forma ordenada, seguindo um “fio condutor”.

Estilística do texto jurídico

Segundo Miguel Reale:

"Os juristas falam uma linguagem própria e devem ter orgulho de sua linguagem multimilenar,
dignidade que bem poucas ciências podem invocar (...) antes exige os valores da beleza e da
elegância" e devem "ter vaidade da linguagem jurídica, uma das primeiras a se revestir de forma
científica, continuando a ter, desde as origens, o Direito Romano como fonte exemplar e ponto de
referência."

http://jus.com.br/artigos/12364/atributos-da-linguagem-juridica#ixzz2d832OjiO

Características do estilo jurídico:

1- Uso de termos técnicos.


2- Concisão, objetividade, clareza.
3- Na argumentação, emprego de figuras retóricas.
Retórica, conforme Reboul,
“é a arte de persuadir por meio do discurso”.
REBOUL, Olivier. Introdução à retórica. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins
Fontes, 2000, p. XIV.

Alguns tipos: as figuras de palavras


1- Comparação:
Ex.: “Portanto, modéstia às favas, mais uma vez, este é um voto histórico, tal como o de
vossa excelência, mas esse foi o voto que permitiu que se abrisse essa caixa de segredos.”
(Ministro Gilmar Mendes, Julgamento da cassação da chapa Dilma/Temer- junho de 2017)
2- Metáfora (lat. metaphòra,ae 'metáfora', do gr. metaphorá,âs “mudança, transposição”)
Ex.: “A intervenção militar no Estado do Rio de Janeiro representa um placebo político:
não conduz à cura para a insegurança que se proliferou no Estado. Esta doença produziu
uma metástase cuja reversão exigirá mais do que a presença repressora do exército.”
(Parágrafo extraído de um texto argumentativo.)

3- Alegoria (lat. allegorìa,ae derivado do gr. Allégoría que significa “dizer o outro”):
Conforme AZEREDO (2008, p.485), A alegoria se dá por meio de uma sucessão de metáforas.
Acrescenta que “Por meio da alegoria, ideias ou realidades abstratas ganham representação
concreta, geralmente por meio de narrativas [...]”
Ex.: Uma vez, um sultão poderoso sonhou que havia perdido todos os dentes. Intrigado,
mandou chamar um sábio que o ajudasse a interpretar o sonho. O sábio fez um ar sombrio e
exclamou: "Uma desgraça, Majestade. Os dentes perdidos significam que Vossa Alteza irá
assistir a morte de todos os seus parentes". Extremamente contrariado, o Sultão mandou
aplicar cem chibatadas no sábio agourento. Em seguida, mandou chamar outro sábio. Este,
ao ouvir o sonho, falou com voz excitada: "Vejo uma grande felicidade, Majestade. Vossa
Alteza irá viver mais do que todos os seus parentes". Exultante com a revelação, o Sultão
mandou pagar ao sábio cem moedas de ouro. Um cortesão que assistira a ambas as cenas
vira-se para o segundo sábio e lhe diz: "Não consigo entender. Sua resposta foi exatamente
igual à do primeiro sábio. O outro foi castigado e você foi premiado". Ao que o segundo sábio
respondeu: "a diferença não está no que eu falei, mas em como falei".
Pois assim é. Na vida, não basta ter razão: é preciso saber levar. É possível embrulhar os
nossos pontos de vista em papel áspero e com espinhos, revelando indiferença aos
sentimentos alheios. Mas, sem qualquer sacrifício do seu conteúdo, é possível, também,
embalá-los em papel suave, que revele consideração pelo outro.”
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI217918,61044Cinco+licoes+sobre+a+vida+e+o+
Direito+por+ministro+Barroso

4- Símbolo – tipo de metáfora


Ex.: “É o Juiz entre a cruz e a espada. De um lado, a consciência, a fé cristã, a compreensão
do mundo, a utopia da Justiça… Do outro lado, a Lei.”

5- Personificação – tipo de metáfora


Ex. O Juiz, de sua vez, deve ser a “boca da Lei.”

6- Metonímia (gr. metónumía,as 'emprego de um nome por outro', pelo lat. metonymìa,ae)
Ex.: Art. 16. CPP- O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à
autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da
denúncia.

7- Antonomásia – (tipo de metonímia-gr. antonomasía,as através do lat. antonomasìa, em


retórica 'nome que nada tinha que ver, morficamente, com o nome a que se juntava ou a
que substituía')
Refere-se, apenas, a nomes próprios
“Pode ter intuito descritivo, laudatório, pejorativo, eufêmico ou irônico.” (AZEREDO, 2008,
p.487)
Ex.: “B.S.S é surdo e mudo, tem 21 anos e é conhecido em Coité como “Mudinho.” (Processo
Número1863657-4/2008 Autor: Ministério Público Estadual
Réu: B.S.S)
Ex.: O Divino Mestre morreu para nos salvar.

8- Perífrase - (tipo de metonímia)


Assemelha-se à antonomásia, só que se refere, também, a nomes comuns.
Ex.: As pessoas que tudo querem (os gananciosos) nada conseguem.

9- Diáfora ou antanáclase – uma espécie de trocadilho


Ex.: “Morte à vista do pedido de vista” (Ascânio Seleme, O Globo, País, p. 10, 15 fev. 2020)

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