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FILOSOFIA PORTUGUESA
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ESTE LIVRETO FOI FEITO VOLUNTARIAMENTE PARA FACILITAR A DIVULGAÇÃO DO
TRABALHO DE PESQUISA DE RODOLFO DOMENICO PIZZINGA.
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FEVEREIRO DE 2024
SUMÁRIO
DADOS SOBRE O AUTOR
Mestre em Educação, UFRJ, 1980. Doutor em Filosofia, UGF, 1988. Professor Adjunto IV
(aposentado) do CEFET-RJ. Consultor em Administração Escolar. Presidente do Comitê
Editorial da Revista Tecnologia & Cultura do CEFET-RJ. Professor de Metodologia da
Ciência e da Pesquisa Científica e Coordenador Acadêmico do Instituto de
Desenvolvimento Humano - IDHGE.
FILOSOFIA PORTUGUESA (I): CONSIDERAÇÕES SUCINTAS SOBRE A FILOSOFIA
PORTUGUESA NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIX*
ASPECTOS GERAIS
Cunha Seixas
... derivar todas as idéias das sensações. Para tanto, estas últimas são ordenadas
em classes, que correspondem às qualidades presentes aos objetos. As classes,
por sua vez, são divididas em ordens, de acordo com as sensações que entre elas
se podem estabelecer. Também, de sua doutrina da 'substância' desaparece a
conceituação tradicional de fundamento ou suporte subjacente a algo, que
aparece. Enquanto a essência (tradução que dá à 'ousia' aristotélica) compreende o
complexo de qualidades atuais e que se conclui serem essenciais, a substância
abrange não só as qualidades essenciais como as acidentais, comuns aos estados
presente e passado. Quanto à Natureza, abrange não apenas as notas presentes ao
conceito de substância, mas as qualidades futuras ou possíveis. Assim, as idéias de
essência, de substância e de Natureza passam a corresponder a formas peculiares
de agrupamentos das qualidades que nos são dadas pela observação e pela
experiência sensível.
A Cosmologia, para Silvestre Pinheiro Ferreira, não corresponde à
introdução normativa das ciências físicas e matemáticas, a exemplo da 'Física' de
Verney. Compete-lhe apenas interpretar certas descobertas da ciência
experimental em benefício de teses e de hipóteses filosóficas, que, do contrário,
não se manteriam. Assim, nas 'Preleções', a ciência experimental é que justifica a
interferência filosófica de que todas as partes do universo acham-se ligadas e são
solidárias entre si.
A vinculação do conhecimento à experimentação e à observação estende-se
à ação moral, porquanto as idéias de virtude e de vício se identificam com as de
gosto (agrado) e de dor. O 'bem' é definido como ‘aquela ação de que se costuma
seguir uma maior soma de gostos que de dores’, enquanto a virtude é ‘a ação moral
de que se costuma seguir uma maior sorna de gostos que de dores’ (Preleções §
297).[7]
Os espíritos que, na presença de muitos motivos, obram umas vezes por um, e
outras vezes por outro desses motivos, chamam-se 'livres'; a faculdade de assim
proceder chama-se 'liberdade'; e cada um desses atos chama-se 'escolha'. À
faculdade de escolha também se dá o nome de opção.[8]
Silvestre Pinheiro Ferreira
(Arquivo Histórico Militar)
Paim concluiu, portanto, que Silvestre Pinheiro Ferreira, além de ter oferecido uma
opção para a superação do Empirismo Mitigado, conduziu a jovem intelectualidade da
época a meditar sobre o tema fundamental da liberdade. Por isso, preparou os espíritos
para a aceitação das idéias de Maine de Biran (1766-1824) que se formularam na busca da
coerência do Empirismo...[9]
O termo positivismo foi usado pela primeira vez por Claude Henri Saint-Simon
(1760-1825), que hospedou as idéias materialistas vigentes na França setecentista,
opondo-se ao Deísmo e ao Idealismo e defendendo o estudo da Natureza e o
Determinismo. O Positivismo, segundo Marcuse, designa:
Ora, cada um de nós, contemplando sua própria história, não se lembra de que foi
sucessivamente, no que concerne às noções mais importantes, ‘teólogo’ em sua infância,
‘metafísico’ em sua juventude e ‘físico’em sua virilidade?[18]
... em primeiro lugar, uma filosofia da história que há de mostrar por que a filosofia
positiva é a que deve imperar em um futuro próximo; em segundo lugar, uma
fundamentação e uma classificação das ciências assentadas na filosofia positiva;
por último, uma sociologia ou doutrina da sociedade que, ao determinar a
estrutura essencial da mesma, permita passar à reforma prática e, finalmente, à
reforma religiosa, a Religião da Humanidade.[19]
A Filosofia Comtista não se resume tão-somente na mera organização das
ciências. Estas foram classificadas de acordo com suas respectivas complexidades
crescentes. Tal organização requer, fundamentalmente, uma ordem hierárquica para
poder ser implementada. Partindo da Matemática e passando sucessivamente pela
Astronomia, pela Física, pela Química e pela Biologia, o Fundador do Positivismo
posicionou a Sociologia no ápice da pirâmide, por entender que os complexos fenômenos
que regulam a vida social eram os mais recalcitrantes em se subordinar à disciplina e ao
método científico.
SOCIOLOGIA
BIOLOGIA
QUÍMICA
FÍSICA
ASTRONOMIA
MATEMÁTICA
KRAUSISMO
Karl Christian Friedrich Krause 1781-1832), apesar de não ter sido a mais
importante, foi, certamente, uma das mais singulares figuras do Idealismo Alemão.
Nascido em Eisenberg (Saxônia-Altenburg), estudou na Universidade de Iena, e sua
permanente dedicação à Filosofia acabou por recompensá-lo: discípulos fiéis difundiram
suas idéias, e o Krausismo esparramou-se pela Holanda, Bélgica e Portugal, florescendo
notadamente na Espanha com Julián Sanz del Río (El movimiento krausista conoce en
España su auge entre los años que van de la revolución de 1854 a los albores de la
Restauración (1875). Con él, la interferencia entre la religión y la ciencia empieza a
resquebrajar la ignorancia y la intolerancia circundantes). Suas idéias, que aspiravam a
continuar o pensamento de Kant, pretenderam atenuar os conceitos panteístas,
estabelecendo o que denominou Panenteísmo (Panentheismus), ... doutrina que sustenta
que tudo está em Deus, ou seja, em seu seio.[22]
Alrededor del año 1840, un grupo de juristas españoles, entre los cuales se
encuentra Julián Sanz del Río, buscan apasionadamente una doctrina política que
propicie un proceso regenerador del país, dentro del pensamiento liberal, por
supuesto, aunque éste aparece entonces bajo la forma del doctrinarismo y no
satisfaga las aspiraciones del grupo.
En 1833, un exiliado alemán, Heinrich Ahrens, ha dado en la Sorbona un Curso
de Derecho Natural, o Filosofía del Derecho, que ha sido publicado en París en
1837. Ruperto Navarro Zamorano, miembro del grupo de amigos de Sanz del Río,
lo traduce en 1841. El libro de Ahrens tiene una gran repercusión. En definitiva, la
Filosofía del Derecho se presenta como una reacción frente al iusnaturalismo
racionalista que, alzado como bandera por la burguesía revolucionaria en 1789, ha
perdido su capacidad renovadora al llegar al poder y, una vez positivizado, queda
reducido a la mera legalización del «status» que otorga el poder a esa burguesía.
Este hecho, unido a la pérdida de la noción del Derecho como norma absoluta que
propugna la escuela histórica de Savigny, produce un hueco valorativo que la nueva
Filosofía del Derecho trata de llenar. Ahrens, discípulo de Krause, sin prescindir de
la positivación y relativización de la Ciencia del Derecho, propone guiar ésta hacia
un ideal dado por una profunda base moral, previa al desarrollo de la Ciencia del
Derecho propiamente dicha, y capaz de conducirla por nuevos caminos. Krause -
nos dice- fue quien primero expuso el carácter del Derecho que consiste en la
condicionalidad: definir el principio del Derecho como el conjunto de las
condiciones exteriores de que depende el destino racional del hombre y la
humanidad. Y Giner, años más tarde, añade: Nadie se ha adelantado, no ya a
indicar, sino a desenvolver sistemáticamente este principio del Derecho como un
orden universal de piedad, abnegación y altruismo, tanto como Krause.
Este trasfondo moral hace posible el fortalecimiento de asociaciones nacidas
por la necesidad de cumplir los fines de la Humanidad; a cada finalidad: religiosa,
científica, artística, industrial, moral y jurídica, corresponde una asociación,
quedando al Estado un reducido papel en su propia órbita política, sin
entrometerse en el desenvolvimiento de las demás. Aunque, eso sí, reservándose
un papel mínimo de vigilancia para evitar que las demás asociaciones se interfieran
entre sí y obstaculicen el desarrollo de la finalidad para la que fueron creadas.
Este programa resulta atractivo para los gobernantes liberales, que con diez
años en el poder, constatan día a día la ineficacia de los decretos-leyes en una
sociedad estructurada de manera tradicional, sin cauces de comunicación entre las
diferentes clases sociales y sin una idea clara de comunidad social.
Fonte: http://www.almendron.com
...nada é Deus, excepto Deus, mas os seres são essencialmente distinctos de Deus,
que não consiste em cousa alguma finita e abraça todo o finito em si. Não dizemos
à maneira dos eleatas, que o uno e o todo são identicos, porque a idea de
totalidade importa ordinariamente a idea de uma multiplicidade de factos e de
uma certa união, entre eles, enquanto que Deus é a unidade pura e simples da
essencia: mas, como tudo o que é finito é contido na unidade divina, dizemos que o
uno é também tudo em si e por si. A sciencia do ser é, pois, o ‘panentheísmo’.[23]
(sic).
Esta é ... uma lei geral que vigora inexoravelmente em todo o tempo e lugar. Da
unidade de Deus, ... que transcende todas as essências finitas e todas as oposições
possíveis, se desce ao longo de uma contraposição, até a unidade finita que é o
homem. A volta gradual deste à unidade com Deus, aspiração suprema do
indivíduo humano, é propriamente o conteúdo da história. A adequada
interpretação deste retorno exige que o filósofo-historiador delimite, por cima da
confusão dos fatos históricos, os três estados em que se reparte o processo de
reintegração do homem com seu Criador.[29]
Nesses três estados, o homem forja uma noção particular de Deus, do mundo, de
si mesmo e de seus congêneres.
São características do estado de indiferenciação ou infantil: o homem é um ser
rudimentar e sua vida transcorre em uma inconsciência placentária. Sua noção de Deus é
simples e imediata. Sua mentalidade embrionária o incapacita para a particularização.
Vive uma existência pura e inocente que épocas posteriores poetizaram como o paraíso
terrenal.[30]
São características do estado de oposição ou juvenil: lentamente o homem se dá
conta das coisas que o cercam e se sente atraído por e para elas. Compassadamente,
afasta-se daquela unidade fundamental e passa a se preocupar com as experiências
sensíveis que tem no mundo. Depois de haver perdido Deus, busca-O novamente, agora
nos fetiches, no culto às forças naturais, dos heróis, dos homens-deuses etc. As
faculdades morais apenas começam a despontar.[31]
São características do estado de harmonia ou madureza: o homem, neste estado,
descobre, primariamente, a unidade da própria consciência. Vive, agora, na esfera do
entendimento. Há uma atividade interior criativa, uma dignidade e uma integridade
pessoais que o conduzem a uma nova avaliação de si mesmo. Refletindo sobre sua
própria unidade no meio da multiplicidade e dos seus iguais, começa a observar e a sentir
a presença de uma consciência superior, única e infinita no tempo e no espaço, que liga e
sustenta todos os seres finitos. Nesse estado, segundo Krause, o homem descobre e
alcança a unidade de e com Deus.[32]
Segundo o Krausismo, e conforme se antecipou mais acima, haverá uma época —
época que já começou — em que os homens viverão estreitamente ligados pelo amor,
reconhecendo em Deus a causa primeira e final da vida. Sobre esse estado, o formulador
do Panenteísmo assim vaticinou:
O homem e toda Humanidade serão elevados em Deus, viverão mais fiéis a seu
destino eterno, mais harmônicos com a vida do mundo em esferas superiores,
tanto na Natureza como no espírito. Todos os homens se conhecerão e se amarão
como uma família de filhos de Deus e destinados a reunir-se na plenitude da vida
divina, e nesta última esperança refarão outra vez sua história como uma
construção nova.[33]
1) Foi o Krausismo que, em Portugal, contribuiu para dar maior dignidade doutrinal
e maior consistência teórica e filosófica a muitos dos princípios que o Liberalismo
tinha de comum com ele, reforçando, por assim dizer, a raiz jusnaturalista e
metafísica da idéia da personalidade na base do direito e da moral.
2) Foi também o Krausismo que, pela primeira vez, veio espalhar no ambiente
espiritual português do século XIX um conjunto de motivos doutrinários e de
princípios que, conquanto não tivessem atuado desde logo sobre as realidades
imediatas da vida social, ficaram todavia constituindo, dentro da Universidade,
uma atmosfera ou clima especial em suspensão, onde foram, posteriormente,
alimentar-se todos esforços e tendências para uma correção do Liberalismo
Político Português até o fim do século XIX.[36]
NOTAS
1. Cs. Esboço Histórico da Philosophia em Portugal no Século XIX, In: Princípios Geraes
de Philosphia, por José Maria da CUNHA SEIXAS, p. V. No artigo: A Reação Espiritualista
em Portugal: Krausismo e Ecletismo, In: Ciências Humanas (17), p. 32, António BRAZ
TEIXEIRA escreveu: Após a morte de Silvestre Pinheiro Ferreira, em 1846, a especulação
livre e responsável conhece um longo eclipse durante uma década e meia em que, à parte
o exemplo isolado de Vicente Ferrer Neto Paiva, na Faculdade de Direito de Coimbra,
praticamente manifestação alguma se registra no pensamento português.
3. Ibid.
11. Manuel António FERREIRA-DEUSDADO, op. cit., p. XVI. António BRAZ TEIXEIRA, op.
cit., p. 34, informa: Se, no que respeita ao conceito de razão, aos limites do conhecimento
e à idéia de Deus e suas relações com o mundo, o pensamento de Ferrer, no seu exigente
racionalismo de sinal iluminista, no seu idealismo gnosiológico e no seu Teísmo cristão se
distingue com nitidez do intuicionismo racional de Krause, da sua crença na coincidência
entre as categorias lógicas e ontológicas e da sua metafísica panenteísta, já quanto à
concepção orgânica, hierárquica e teleológica do Universo e à doutrina antropológica
vem coincidir em muito com as teses do especulativo alemão, decerto por se tratar de
domínios em que este se encontra mais próximo da linha escolástico-leibniziana-wolfiana
que orientou o primitivo magistério do nosso jurista-filosófico e à qual sempre continuará
ligado.
15. Will DURANT, História da Filosofia, Vida e Idéias dos Grandes Filósofos, pp. 341 e 342.
20. Op. cit., p. 342. Acredita-se que tais desilusões, pinçadas em sua biografia, podem ser
procedentes de alguns fatos mercantes em sua vida, como a perda da fé no Catolicismo
quando jovem, a decepção com Saint-Simon, a infelicidade no casamento, que o
submergiu em uma profunda depressão mental, levando-o a tentar o suicídio no Sena, o
falecimento precoce de Clotilde de Vaux, que com sua mãe Rozalia e sua filha adotiva
Sofia constituíam-se nos seus três anjos inspiradores, a impossibilidade de obter uma
nomeação oficial para ensinar Matemática na Escola Politécnica de Paris e, por último, o
fato de ter de viver os últimos trinta e quatro anos sob a proteção pecuniária de seus
discípulos e seguidores.
21. pp. 8 e 9.
23. Apud José Maria da CUNHA SEIXAS, Ensaios de Crítica Philosophica..., p . 168.
24. Cs. o meu trabalho Introdução ao Rracionalismo Harmônico de Krause. In: Presença
Filosófica, Rio de janeiro, 13 (1 a 4): 87-98, jan./dez. 1988, p. 7.
34. Encontra-se essa idéia em Kant onde o direito das gentes deveria fundar-se numa
Federação de Estados livres (Fædur Pacificum)
SITES CONSULTADOS
http://www.sgmf.pt/Cultures/pt/SGMF/Internet/Historia/Cronologia/
http://www.instituto-camoes.pt/cvc/filosofia/rep1.html
http://bnd.bn.pt/ed/eca_queiros/iconografia/imagens/pi2662p/
pi2662p_teofilo_braga.html
http://www.marxists.org/reference/subject/philosophy/works/fr/st-simon.htm
http://passavarahp.vila.bol.com.br/trabalhos/FundadoresePioneiros.doc
http://www.marxists.org/reference/subject/philosophy/works/fr/comte.htm
http://www.portalmundos.com/mundofilosofia/espanola/krausismo.htm
http://www.filosofiayderecho.com/biblioteca-e/krause.htm
FILOSOFIA PORTUGUESA (II): A DOUTRINA MÍSTICA DE ANTÓNIO DE LISBOA
TRAÇOS BIOGRÁFICOS
As crônicas e a tradição informam que Santo António, uma das mais importantes figuras
das culturas lusófonas, nasceu em Lisboa no final do século XII. A data exata de seu
nascimento é desconhecida e foi fixada em 15 de Agosto, tributo pela devoção nutrida
por ele, durante toda a vida, à Virgem Maria – Mãe de Jesus. O ano também é duvidoso.
Uns falam de 1191, outros de 1195.
Nessa época, seus pais, Martim de Bulhões e Teresa Taveira, moravam junto à
Catedral de Santa Maria no caminho que levava à porta de ferro, mais tarde Arco de
Nossa Senhora da Consolação, e, logo que o menino veio ao mundo, batizaram-no com o
nome de Fernando Martini Bulhões. Ainda criança, seus pais o puseram sob os cuidados
dos cônegos da Catedral, para que pudesse desde a mais tenra idade ser doutrinado e
educado na fé católica.
Apesar da preocupação de seus pais com sua formação religiosa, o menino era
adulado e mimado vivendo na regalia e no luxo. Mas isso não o satisfazia. A bajulação, a
mentira, a pompa e a politicagem que cercavam sua família, pelo fato de seu pai ser
Governador de Lisboa, o enfastiaram da vida aparatosa que levava. Iimpulsionado por
uma espiritualidade incipiente, mas férrea e definitiva, decidiu afastar-se daquele
ambiente em que residia, resolvendo-se pela vida religiosa.
Transcorria o ano de 1210 e, nessa época, havia em Lisboa um Mosteiro de
Agostinianos denominado São Vicente de Fora, construído por D. Afonso I. Ali foi bater
Fernando e, recebido pelo Cônego Gonçalo Mendes, começou vida nova, vestindo o
hábito branco dos Cônegos de Santo Agostinho. Nesse Convento residiu e estudou por
vinte e seis meses.
Foi no Mosteiro de Santa Cruz que Dom Fernando Martini entrou em contato com
os mais famosos escritores latinos da Antigüidade, com os Santos Padres, com a teologia
e com a filosofia, debruçando-se sobre os escritos dos mais famosos pensadores de
todos os tempos. Sobre essa fase especial da vida de Dom Fernando, Baggio informa:
Nesse universo maravilhoso, Fernando trabalhou e labutou por nove anos, no fim
dos quais era doutor consumado nas ciências divinas e humanas. Por isso, torna-
se, ao lado de um grande Santo, um grande representante da cultura de seu século.
[1]
Esteve em Bolonha e na França e acabou por se tornar um orador tão famoso que,
um dia, foi convidado pelo Papa Gregório IX para pregar em Roma para o próprio Santo
Padre e para os cardeais. O Papa gostou tanto da pregação que quis que Frei António
ficasse hospedado no palácio papal. Quis fazê-lo também cardeal. Mas Frei António não
aceitou nem se instalar em Roma, nem o barrete cardinalício. Continuou missionário,
peregrinando de lugar em lugar, ensinando e divulgando a Sagrada Escritura,
consagrando integralmente sua vida à pregação e à catequese, quer pelo exemplo, quer
pela palavra.
Papa Gregório IX
[estava] orando o bom Frade, em seu quarto; encheu-se este de luz e um menino
veio pousar nos braços do Frei António, que sorria, enquanto este O contemplava e
acariciava.[5]
... ambas se entrelaçam de forma que, começando por constituir uma a parte inferior e a
outra a superior do mesmo todo, da vida ativa se sobe para a contemplativa, e desta se
desce depois para a ativa, trazendo-lhe forças ou energias preciosas para a sua eficiência
e aperfeiçoamento.[8]
A NOITE MÍSTICA
O Conticínio (Conticinium)
É a primeira fase da Noite em que tudo está silente. É o tempo em que são satisfeitas
as seduções blandiciosas da carne — carnis suavia blandimenta. O Santo ensinou que,
para vencer as tentações próprias do Conticínio, é preciso meditar sobre as iniqüidades
praticadas, considerar o exílio (e desejar ardentemente a reintegração) e contemplar o
Criador. Auxiliado pela razão e pela discrição, o principiante vai subindo, degrau por
degrau, a escada da crucifixão: a razão dominando os sentidos e esclarecendo sobre o
bom caminho. Assim, derramando lágrimas, envergonhado, vexado e cabisbaixo vai o
postulante trilhando a senda que levará à iluminação. Lentamente, os sentidos físicos e
os apetites do corpo vão sendo dominados, e os incipientes passam para o estádio de
aproveitantes (fase da Meia-Noite).[14] Porém, no que concerne ao sofrimento moral,
este se vai intensificando. É o reconhecimento tácito da queda, do afastamento da Luz,
do exílio de Deus, da consciência plena da ainda permanência nas trevas. É a angústia por
desejar alcançar a Luz Maior, por desejar ardentemente realizar o Cristo Interno e, em
graça total, contemplar o Criador. É o desespero por ter, tenuemente, vislumbrado a
possibilidade de se tornar uno com o Pai — o Deus de seu coração — e de não ter podido
ainda realizar o sonho dos sonhos. É uma dor lancinante. Um desespero sufocante. Um
horror atemorizante. É a noite negra. É a crucificação individual. É o inferno interior. É a
compreensão do exílio da Vida. A Noite Negra traz à lembrança a fase negra da Crisopéia.
A Aurora (Aurora)
O Toque traz ao beneficiário vantagens muito amplas: aqui, a visão possível e o gozo
inefável de Deus; mais tarde, a glória celeste. Mas, para alcançar o estado vibratório
especial para que tal êxtase místico seja viável, o Santo Português ensinou que esta
graça... deve ser pedida em oração acompanhada de lágrimas, fonte de devoção e de
amor. A ORAÇÃO...
Assim, pode-se entender que Santo António foi um exemplo vivo de que a vida
contemplativa não é incompatível com a vida ativa. A análise de sua obra permite que
seja considerado o pensador mais importante da pré-escolástica Franciscana. O sentido
fundamental da antropologia antoniana, segundo Maria Cândida Pacheco, é claramente
otimista, abarcando toda Criação, e sua obra, cujo fundamento é a Teoria Criacionista
(entretanto não no sentido leonardino, e muito menos esotérico), abrange, no seu
desdobramento, Deus, o Mundo, a Alma e o Homem. Mas, realmente, não importa se
Santo António foi ou não foi um esoterista ou mesmo um iniciado. Foi, verdadeiramente,
um Homem Santo, cuja santidade esteve a serviço da Ordem de Francisco e da Igreja
Católica. Se a confraria católica de hoje se debruçasse um pouco sobre seus sermões e
sobre sua Filosofia... muito teria a aprender. Talvez até se (des)preocupasse com as lendas
e paspalhices disseminadas irresponsavelmente sobre ele.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todavia, se vencer (e um dia vencerá) haverá de se tornar uno com o Pai. Ah! Bendita
Unidade! Pois é aceito com todas as fraquezas do passado. O esforço sincero
empreendido para alcançar a Luz Perfeita e a Harmonia Imaculada é recompensado pela
compreensão, pela bondade e pelo amor do Deus do seu coração, que sempre o aguardou
no santuário interno do seu ser (Sanctum Sanctorum) e que sempre o desejou de volta.
Nesse instante o exílio termina. O filho retorna à casa paterna. A reintegração é operada.
A Alquimia Interior está concluída. Deus e seu filho tornam-se UM, amalgamados, para
toda a eternidade, pois o filho se realiza no PAI, e o PAI, no filho. Nesse momento, e só
nesse momento, o homem será capaz de compreender o verdadeiro sentido da
fraternidade. Nada, absolutamente, nada mais o separará de seus irmãos de jornada.
Todavia, e isto o Santo não comentou, outros níveis de elevação espiritual deverão ser
alcançados. Se o Teclado Cósmico é ilimitado... ilimitadas são as possibilidades em
direção ao Centro de Idéia. Mas, onde está o centro?
Mas enquanto a Aurora não chega, cada peregrino, reconhecendo os limites de seu
próximo, e principalmente os próprios, deve envidar todos os seus esforços e empenhar
todo seu conhecimento para que haja, perto de si e onde for possível, paz, harmonia,
beleza, tolerância, solidariedade, compreensão, justiça, temperança, fortaleza e amor —
condições essenciais e preliminares para a realização de uma verdadeira e autêntica
FRATERNIDADE ENTRE OS HOMENS.
NOTAS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
______. Obras completas. Vol. II. Sermões dominicais. Depois de pentecostes. Tradução de
Henrique Pinto Rema. Porto/ Lisboa: Restauração, 1970, 472 p.
______. Obras completas. Vol. III. Sermões dominicais. Domingos do Advento ao 4º depois
da epifania. Marianos e festivos. Tradução de Henrique Pinto Rema. Porto/ Lisboa:
Restauração, 1970, 460 p.
BAGGIO, Hugo D. Frei. Santo António. São Paulo: Edições Loyola, 1982, 99 p.
GUIMARÃES, Almir Ribeiro Frei. Almanaque popular Santo António. Petrópolis: Vozes,
1984, 127 p.
PIZZINGA, Rodofo Domenico et alii. A noite mística: senda da verdadeira fraternidade. In:
Convergência Lusíada. Revista do Real Gabinete Português de Leitura. Rio de Janeiro 12:
171-6, 1995 e In: Anais do II Simpósio Internacional de Ética, 1a. parte, Rio de Janeiro,
50-5, 1994.
ANEXO I
MISTÉRIOS DA NOITE NEGRA
marcorelho.tripod.com.br/misteriosmarcorelianos/id43.html
Acesso em 25/12/2003
Ensaio Rosacruz sobre o momento trágico que todos nós, humanos mortais — místicos
ou não — atravessamos, invariavelmente, durante nossa vida neste Planeta Terra.
A Noite Negra é um dos períodos que todo místico é compelido a vivenciar na Senda
da Luz. Não houve um só um Avatar, Messias ou Profeta que, de uma forma ou de outra,
não tenha evocado esse período de grande confusão, que todo buscador, num dado
momento de sua busca, deve enfrentar e, se possível, superar.
Passamos a não acreditar mais em nada, nem em Deus, nem em Satanás, nem no
homem, nem no amigo, nem em nós próprios. Deixamo-nos aprisionar pela fatalidade e
tornamo-nos o espectador entediado de nós mesmos.
Tomemos um dos exemplos mais dolorosos para ilustrar o que dizemos: a morte.
Muitos místicos já vivenciaram um período de total entrega após a perda de um ente
querido. Nessas penosas circunstâncias, eles se sentiram assaltados por um sentimento
de injustiça, que inevitavelmente os levou a duvidar de suas próprias crenças. Por que seu
marido ou sua mulher, seu pai ou sua mãe, seu filho ou sua filha, seu irmão ou sua irmã,
morreram tão jovens? Por que com tanto sofrimento? Por que naquele momento? Deus
verdadeiramente existe? Será que o misticismo só serve para dar falsas esperanças,
tornar a existência menos amarga, dissimular um Não-Ser, escusar um acaso cego e
arbitrário? É claro que quando se deixa a mente se enredar nesse tipo de engrenagens de
perguntas-respostas surgem tantos 'por ques' quanto motivos para duvidar.
Com efeito, quanto mais duvidamos da dimensão espiritual da existência, mais damos
importância ao mundo material. Em outras palavras, quanto mais questionamos o Deus
de nosso coração, mais o Diabo de nossa compreensão se rejubila. Pode acontecer que
coloquemos em dúvida nosso ideal místico, porque a morte, é bem verdade, priva-nos de
uma presença à qual nosso Eu objetivo foi apegado por muitos anos.
Mas, se a existência da alma sempre foi para nós uma evidência, se consagramos toda
uma vida terrena à evolução de nossa alma, como não a reconhecer no momento
derradeiro em que ela deixa o corpo de alguém que amamos tanto quanto amamos a nós
mesmos?
Alguns se sentem invadidos pela dúvida quando sofrem provações que atribuem a um
carma negativo, ao seu ver injustificado, em vista do bem que tinham a certeza de ter
espalhado ao seu redor. Assim, nunca se deve estabelecer uma relação sistemática entre
a provação e o carma negativo. Em outras palavras, parece-me fundamental compreender
que nem todas as provações, sejam quais forem, são necessariamente cármicas. Muitas
delas têm caráter puramente evolutivo, e sua única finalidade é testar nossa força
interior, pressionando, ao mesmo tempo, nossa aptidão física e mental para sobrepujá-
las. As provações existem porque são uma condição sine qua non de evolução, e porque é
impossível, como seres encarnados que somos, evoluirmos sem termos problemas a
resolver e dificuldades a superar. Assim, parece-me muito importante não sermos vítimas
de um misticismo mal compreendido, que tenda a associar toda tribulação a um carma
negativo. Se assim fosse, deveríamos admitir que Jesus foi crucificado — para usar
apenas um exemplo — para compensar uma sucessão de más ações! Esse tipo de
conclusão, devemos admitir, é absurdo e se opõe ao mais simples bom-senso.
Enquanto o ser não tiver atingido o ponto de evolução que propicia a experiência
íntima do Divino, permanece vulnerável em sua busca, e sua vulnerabilidade é
proporcional à sua fé mística. Isso pressupõe que bem poucos de nós podem afirmar que
nunca conheceram períodos sombrios em sua vida espiritual ou que não os conhecerão
mais. O próprio Mestre Jesus, em um momento supremo de sua missão, clamou: Pai, por
que me abandonastes? Por uma fração de segundo, esse Iniciado do mais alto grau
duvidou. [Sobre este tema, convido para a leitura de um texto de minha autoria, que se
encontra neste site, cujo título é: Aspectos Esotéricos da Vida de Jesus.].
Mas, a questão essencial é saber do que ele duvidou e do que nós duvidamos quando a
Noite Negra mergulha nossa alma nas trevas do ateísmo. Quando examinamos
atentamente esse acontecimento da vida mística de Jesus, tudo leva a pensar que ele não
duvidou de Deus, mas de si mesmo e de sua capacidade de permanecer fiel em seu
sofrimento. Em nosso nível, é exatamente o contrário que acontece quando duvidamos,
porque na maior parte do tempo duvidamos de tudo, menos de nós próprios. Nossa única
preocupação deve ser a de pedir o auxílio do Cósmico para termos força interior para
vencer nossa própria fraqueza, pois é nessa vitória que está a solução de todos os
problemas, por mais dramáticos que eles sejam no plano humano. Isto pressupõe que a
prece e a meditação constituem nossos dois maiores aliados para fazer brilhar
novamente a LUZ quando as circunstâncias tiverem mergulhado nosso Sanctum interior
na mais total obscuridade. O que devemos fazer pelo bem de nosso corpo, também
devemos fazer pelo bem de nossa alma. Em vez de esperarmos até que as circunstâncias
alterem nossa vida espiritual e destruam nossa fé mística, devemos cultivar nosso jardim
interior, semeando ali as sementes de um amor incondicional à CAUSA SUPREMA.
Desejo dizer, com tudo isto, que é mais fácil preservarmos nosso corpo dos perigos
que o ameaçam, do que protegermos nossa alma dos ataques do abandono espiritual. No
primeiro caso, a ameaça é perceptível; no segundo, ela não o é. Isso explica por que um
Rosacruz que começa a atrasar o estudo semanal de suas monografias acaba não as
abrindo mais. Finalmente, chega o momento em que ele não é mais Rosacruz a não ser no
nome, quando então reúne as melhores condições para passar pela experiência de uma
Noite Negra decisiva para seu futuro místico.
Excerto do livro Assim Seja, por Christian Bernard, Imperator da Antiga e Mística Ordem
Rosacruz – AMORC. Publicado na Revista O Rosacruz, nº 239, 1º Trimestre/2002.
FILOSOFIA PORTUGUESA (III): O PENSAMENTO PANTITEÍSTA DE JOSÉ MARIA DA
CUNHA SEIXAS
Por serem muito religiosos, principalmente D. Maria Antónia, que era considerada
proficiente em história sacra, a maioria dos mestres dos nove filhos do casal foi de padres
ou de noviças de convento. Corria o segundo quartel do século XIX e assim eram os
costumes da época e os hábitos locais. É de se presumir que a família dos Cunha Seixas
propendesse para o conservantismo, já que - como pensa Eduardo Soveral - não há
notícia de discórdias na estirpe do Filósofo. (No Anexo II apresenta-se o retrato de
Seixas).
A severidade com que eram educados os filhos dos Cunha Seixas agravou-se com a
morte do pai. A mãe, viúva aos 35 anos, tomou a si a educação dos filhos e, temendo
perder o controle sobre eles, acabou por isolá-los das outras crianças. Isso trouxe óbvias
conseqüências para a personalidade em formação do jovem Cunha Seixas. Ferreira-
Deusdado, que o conheceu intimamente, assim o retratou: O José Maria da Cunha Seixas
não foi nem poderia ser um político, porque lhe faltavam qualidades de adaptação; não
poderia ser um dramaturgo, um romancista, porque na sua abstracção não tinha o geito
da observação social. Era excentrico, ingenuo de mais; muitas cousas não as via, a sua
boa-fé quasi infantil prejudicou-o muitas vezes e gravemente.[4] (sic).
Cunha Seixas, que foi o terceiro dos irmãos, apesar de desde pequeno
insinuar que seria eclesiástico, acabou formando-se em Direito, em 27 de junho de
1864, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (não sem antes se ter
matriculado, em 1858, em teologia e filosofia), tendo sido aprovado Nemine
Discrepante e condecorado com as Honras de Accessit, distinção já obtida nos 2º,
3º e 4º anos do aludido Curso. Tanto durante a época de estudante quanto depois
de formado, colaborou na parte literária e política de diversos jornais, como o
Viriato, de Viseu, o Comércio de Portugal, o Jornal de Lisboa, o Acadêmico de
Coimbra, o Comércio de Lisboa, o Jornal do Comércio, a Gazeta de Portugal, o
Diário Ilustrado, o Diário do Comércio, o Progresso, o Economista, o Distrito de
Beja e tantos outros periódicos, notadamente de Lisboa, onde foi grande a
variedade dos assuntos abordados pelo Filósofo.
O presente livro que hoje vem a publico não é senão a primeira parte d’uma obra
maior em que o auctor esgotou toda a sua vida.
Tendo publicado volumes diversos, só a esta obra elle chamava o ‘seu livro’.
Chegou a fazer imprimir essa obra inteira, faltando só o rosto e o indice; d’essa
impressão fez brochar alguns pouquissimos exemplares que deu para serem lidos a
especialistas intimos.
Estando as folhas assim impressas na typographia, deu se ahi um desastre
casual, que as inutilisou absolutamente a todas. Um d’esses exemplares brochados
serviu de original e começou a reimprimir a obra em typo e formatos diversos.
Achavam-se as folhas impressas d’esta primeira parte, não ainda feita a
impressão do titulo, do prologo, nem do indice, quando o auctor foi colhido pela
morte. Essas folhas incompletas, algumas truncadas, foram no seu espolio de
inventario judicial vendidas como papel a peso para embrulhos e adquiridas já em
segunda mão pelo Sr. Eduardo Augusto da Cunha Seixas, que zelosamente as fez
juntar e completar para editar este livro.[9] (sic).
Exemplares deste livro, de capa azul e sem rosto, foram oferecidos pelo Sr.
Eduardo Augusto da Cunha Seixas à Biblioteca Nacional de Lisboa, à Biblioteca da atual
Academia das Ciências de Lisboa, à Biblioteca da Universidade de Coimbra, à Biblioteca
Pública Municipal do Porto e provavelmente às bibliotecas de Viseu e do Funchal.
Princípios Gerais de Filosofia apresentam, em mil e poucas páginas, uma síntese do
pensamento de Cunha Seixas, que subordinou seus mais expressivos trabalhos a uma
intenção sistemática por ele denominada Pantiteísmo, que pretendeu plasmar a idéia ( já
amplamente divulgada em obras anteriores como, por exemplo, O Pantiteísmo na Arte,
Cânticos e Poesias) de que Deus em tudo está, mas é distincto, formulação que se opôs
tanto ao Panenteísmo de Krause (tudo está em Deus)[10], quanto ao Panteísmo.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
01882001000100012&lng=pt&nrm=iso. ISSN 0102-0188.
SISTEMA PANTITEÍSTA
Para dar consistência ao seu sistema, o Trevoense estabeleceu três leis (universais)
psicológicas do conhecimento. A vida do pensamento, explicou, tem seu ponto de
partida na intuição, que a reflexão, pelo processo de abstração, termina por aperfeiçoar.
A intuição, entretanto, constitui-se em mera afirmação espontânea, e a reflexão, por
outro lado, não consiste na ciência. Na elaboração psicológica há um terceiro termo - a
síntese. O primeiro termo, segundo Cunha Seixas, é objetivo e indica a totalidade
existente; é simples e espontâneo. Corresponde ao processo de intuição de um ser
qualquer. O segundo termo é múltiplo, subjetivo, lento, e na maioria das vezes,
imperfeito. Compreende o número de relações desse ser. O terceiro termo é a síntese ou
reunião de todos os elementos. Nesse estágio, o mesmo ser aparece ordenado e pode ser
perfeito, se no segundo estágio a intuição for bem elaborada pelo entendimento. É a
ordem ou harmonia na pluralidade. Cunha Seixas resumiu seu pensamento da seguinte
forma: O primeiro [termo] é a totalidade ... e que podemos designar pela palavra - ser; o
segundo é a maneira de ser, abrangendo as relações dessa natureza, podendo estas ser
designadas pela palavra - manifestação; o terceiro é a ordem na multiplicidade, e esta
ordem é portanto - harmonia.[24]
Considerando estas três leis universais, seu formulador propôs que, ao se estudar um
objeto, a trajetória seja seqüencial. O quadro abaixo, resumidamente, demonstra o
pensamento seixino[25]:
2ª Lei: as suas maneiras de ser, isto é, as suas relações e manifestação, apontando sua
atividade e suas antinomias; e
3ª Lei: a classe a que pertence na ordem universal, ou seja, a síntese. Acima destas
leis está o Absoluto.
O ponto de partida da ontognosiologia seixina é a idéia de ser - o Sinal de Verdade - e
seu Sistema, como acuradamente percebeu António Braz Teixeira na obra O Pensamento
Filosófico-Jurídico Português, traduz-se num pluralismo monadológico, num dinamismo
triádico, que tem como momentos essenciais, o ‘ser’, a ‘manifestação’ e a ‘harmonia’, e
numa teleologia do bem, que se projeta no plano antropológico e se garante e
fundamenta num pensamento de Absoluto.[26]
LEIS ELEMENTOS
O Ser Possibilidade
Unidade
Identidade
Substância
Relações ou Manifestações Causa
Relação
Tempo
Espaço
Grandeza
Harmonia Finalidade
Ordem
TEODICÉIA PANTITEÍSTA
No quadro acima cada atributo de cada ordem combina-se com mais dois. Por
exemplo: necessidade, liberdade (e criação) e conservação (do Universo). E Cunha Seixas
justificou: Como Deus é o princípio de toda a ciência, é de toda a razão que, sendo fonte
das leis universais, saídas da sua própria essência, as reflita triplamente. As leis
ontológicas são pois como vindas de Deus o seu próprio reflexo.[30]
Paralelamente, Cunha Seixas ensinou que a teodicéia inclui uma parte prática, da qual
surgem as instituições religiosas. Para ilustrar esta idéia, apresenta-se um parágrafo da
lavra do autor com um esquema geral explicativo:
A nossa teoria das idéias é uma verdadeira filosofia da religião: se as idéias nascem
dos sentidos, não há possibilidade de religião; se nascem da razão humana, e nada
há em nós senão humano, teremos a mesma conclusão. Se as idéias estão em
Deus, e se nós nada vemos senão pelo divino, suprime-se a nossa atividade e só
fica o infinito, surgindo logicamente o panteísmo. Se as idéias ‘são’ em Deus e
‘estão’ em nós, o homem tem realidade e avista outra realidade suprema. Este
último sistema, que é o que seguimos, é pois essencialmente religioso e
harmônico.
A filosofia da religião não se funda somente na teodicéia, mas também nos
fatos históricos e tem íntimas relações com a filosofia das religiões.[31]
SUJEITO: O Homem
OBJETO: Deus
Depois de se estudar a obra (quase) completa de José Maria da Cunha Seixas, pode-se
sem receio de cometer qualquer equívoco, mas, ao contrário, subscrever as reflexões de
Aquiles Côrtes Guimarães, que percebeu o sentido de originalidade no pensamento do
Trevoense. O próprio Pantiteísmo foi um superlativo esforço do Filósofo no sentido de
tentar salvar, ou até mesmo resgatar, o espiritualismo católico, já que, desde jovem,
demonstrou uma preocupação especulativa permanente no que concerne ao tema do
Absoluto, ainda que negando a existência da Santíssima Trindade e outras categorias da
teologia católica.[32] Absolutamente consciente e convicto de suas reflexões, o
Trevoense não se afastou, ao longo da vida, um único milímetro de sua metafísica
especulativa, permanecendo fiel ao Sistema Pantiteísta por ele engendrado até o dia de
sua morte. Já Antero de Quental, aos trinta e três anos, resignadamente, ultimou sua
conversão ao Catolicismo e, palavras suas, tornou-se completamente católico. Leonardo
repetiu o gesto. A ninguém é permitido censurá-los ou criticá-los.
IDÉIAS ONTOLÓGICAS
ORDEM RACIONAL MÉDIA ORDEM RACIONAL SUPREMA
SER O Ser por Excelência
O Ser Infinito
SUBSTÂNCIA A Substância Infinita
TEMPO A Eternidade
ESPAÇO A Imensidade
CONSIDERAÇÕES FINAIS
NOTAS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SITES CONSULTADOS
http://www.geocities.com/Athens/Troy/4285/ensino23.html
http://home.utad.pt/investigacao/origins/bacal.html
http://www.ensayistas.org/
ANEXO I
J. M. CUNHA SEIXAS
Esta dupla natureza das idéias racionais explica que seja também por meio de um
processo trágico de ser, manifestação e harmonia, que a ordem ontológica se desenvolve
e se concretiza e a finalidade de cada ser se coordena, dinamicamente, com a dos demais
seres, contribuindo todos e cada um deles para a realização dos mais altos destinos do
universo. Cada ente é, assim, algo individualizado, dotado de finalidade própria,
constituindo um infinito relativo que, no seu movimento próprio, se manifesta,
relacionando-se com todos os outros do mesmo género e, através deles, com a ordem
mais global do ser.
A idéia de ordem, associada à idéia dos seres como infinitos relativos, conduz o
nosso espírito à noção de um Ser Perfeito e Absoluto, que tenha em si o seu próprio fim e
que, na sua unidade e simplicidade, seja causa e ordenador dos restantes seres. Dado
que, no entanto, o finito não pode existir sem a sua causa geradora e como o infinito é
também a eternidade e a imensidade, Deus está em tudo, conferindo a todos os infinitos
relativos a sua realidade e subsistência, sendo, porém, deles perfeitamente distinto, pois
o eterno e imenso não pode confundir-se com o transitório e o limitado. Daí que, apesar
de nos movermos, sermos e vivermos em Deus, participando da sua realidade, com Ele
não nos confundamos nunca.
Sendo, embora, abscôndito na sua natureza e, como tal, inacessível a toda a
explicação ou demonstração, Deus manifesta-se no universo e patenteia-se
intuitivamente à razão, como inteligência suprema, lugar e fonte de verdade e de vida e
sede do infinito e do absoluto. Deste modo, Deus não é inteiramente incognoscível,
sabendo nós Dele, através da Sua manifestação, que é absoluto, omnipotente e perfeito,
imutável e uno, infinito, eterno, omnisciente e omnipresente, sendo seus atributos
supernos a verdade, a bondade e a beleza. (sic).
ANEXO II
ANEXO III
TRAÇOS BIOGRÁFICOS
Sampaio Bruno
José Pereira de Sampaio, que se deu a conhecer pelo apelido Bruno (Sampaio Bruno) em
homenagem ao Filósofo Italiano renascentista Giordano Bruno (1546 -1600), nasceu em
30 de novembro de 1857, na cidade do Porto, Portugal, na qual também viria a morrer em
11 de novembro de 1915.
Formou-se em Medicina em 1876, mas, aos quinze anos, já havia sido levado à barra
dos tribunais por ter redigido nos folhetins O Vampiro e o Laço Branco, dois romances de
ficção intitulados Os Três Enforcados e Os Três Frades, tendo sido, todavia, liberado pelo
Tribunal em virtude de sua pouca idade. Aos dezessete anos publicou seu primeiro livro
Análise da Crença Cristã, no qual afirmou que um único momento de ociosidade de Deus
denotaria imperfeição. Em decorrência disso, entendeu Bruno, Deus é permanentemente
ativo e, portanto, perpetuamente criador. Nessa obra considerou o Catolicismo uma
religião obsoleta, anacrônica e moribunda, e, em virtude dessa crença, determinou-se a
demolir a estrutura teológica católica estabelecida. Esses conceitos, e outros de teor
semelhante expostos na obra brunina, levantaram muita polêmica, importando em
inflamados debates em torno de seu pensamento. Esses debates perduram até a
contemporaneidade.
Em sua obra, entre outros, três pontos são marcantes: a exaltação do amor, as
relações interpessoais e a noção de liberdade. Talvez, para Bruno, o primeiro degrau da
escada redentora do homem radique na autolibertação e na mesma libertação de todos
os seres, de tal sorte que essa redenção deverá se dar paralelamente e no seio de um
envolvimento universal progressivo. Entretanto, deve-se assinalar que a própria categoria
da liberdade nas lucubrações do Autor de A Idéia de Deus, para não resvalar para o puro
egoísmo - o que fica evidente quando proclama e prevê uma redenção do próprio
Universo - deve conjugar-se ternariamente à igualdade e à fraternidade. Nesse sentido,
do homem se exige que ajude e se esforce para a eliminação do mal. Para Bruno, enfim, a
liberdade é a natureza, o próprio destino do homem.
Admitindo uma cisão herética(!?) entre Deus e o Universo criado, Sampaio Bruno
rejeitou a onipotência atual de Deus, mas subscreveu, contraditoriamente, o
providencialismo, o profetismo e a escatologia. Esses temas estão explicitados em A Idéia
de Deus (obra basicamente estruturada para se opor ao Deísmo Racionalista de Amorim
Vianna) e em O Encoberto. Nesta última, ao discutir alegoricamente o Mito do
Sebastianismo Português, expôs sua compreensão da filosofia da história portuguesa.
Exilou-se em Paris por dois anos (1891-1893) em decorrência de sua participação
como um dos mentores da fracassada Revolução Republicana de 1891. Ao retornar à
Pátria, acabou por discordar do caráter positivista que passou a preponderar no Partido
Republicano do qual era membro. Afastou-se, por isso, da política nacional após o 5 de
outubro de 1910, para terminar seus dias como Diretor da Biblioteca Municipal do Porto,
meditando sobre seus temas preferidos: religião e filosofia. Por seu espírito missionário,
sua vasta cultura, sua excepcional atividade e sua invulgar originalidade, tornou-se um
ponto de referência insubstituível para compreensão da história do pensamento
português.
Como afirmou José Marinho no livro Verdade Condição e Destino no Pensamento
Português Contemporâneo, com Sampaio Bruno, a filosofia portuguesa antecipa-se em
pontos essenciais à poesia, à razão intuitiva, à imaginação simbólica. Ou como escreveu
Aquiles Côrtes Guimarães no trabalho Em Torno da Questão do Absoluto no Pensamento
de Sampaio Bruno: Singular em Sampaio Bruno é o fato de que, em momento algum, ele
se desvincula do solo da cultura portuguesa para enfrentar [qualquer questão]. Por isto
mesmo, não se trata de um filósofo que pensou em Portugal, mas de um pensador
português comprometido essencialmente com os horizontes da cultura lusitana.[1]
Em vista disso, pensa-se que Sampaio Bruno seja um dos mais respeitados e
admirados filósofos portugueses, e seus escritos inserem-se diuturnamente nas reflexões
do pensamento luso-brasileiro contemporâneo. Este trabalho, evidentemente, não
poderia examinar todo o seu pensamento; por isso, ficou adstrito, basicamente, à sua
Cosmogonia, que se estruturou, como se verá, em três momentos principais.
A IDÉIA DE DEUS
Em A Idéia de Deus, obra que o Ilustre Pensador Portuense teria preferido que se
intitulasse Amorim Vianna, seu interlocutor privilegiado, particular e
preponderantemente no último capítulo denominado Mal e Bem, está
minudenciosamente delineado seu pensamento metafísico. A primeira observação a
fazer é sobre a estrutura da obra, que é composta de sete capítulos, formados de duas
díades cada um, a saber: Filosofia e Metafísica; Matemática e Poesia; Superstição e
Religião; Teologia e Moral; Contingente e Necessário; Infinito e Perfeito; e Mal e Bem.
Da obra global brunina, conforme já se teve oportunidade de referir, ressalta a
preocupação do pensador com o tema da liberdade, e foi exatamente por isso - por
defender a liberdade - que foi obrigado a se exilar em Paris. José Esteves Pereira discutiu
em profundidade essa categoria, e como já foi assinalado, a idéia do progresso em Bruno,
particularmente no que tange ao homem, é triádica, pinçando-a e a amalgamando a duas
outras: igualdade e fraternidade.[2] Esta postulação constitui-se em um dos pilares
primordiais do pensamento filosófico do Especulativo Portuense. Por suas posições
precisas e corajosas, Leonardo Coimbra viria a cognominá-lo Apóstolo da Liberdade.[3]
Nesse particular, não há exagero de Leonardo.
É ainda Esteves Pereira que chama atenção para a reflexão brunina no que concerne
ao binômio LIBERDADE versus AUTORIDADE, e as possíveis articulações de princípios e
regimes. O Esquema que será apresentado a seguir resumirá esse tema .[4]
Das diversas categorias observadas no Esquema 1, conclui-se que é evidente que
jamais poderia ter sido monárquico, comunista ou anarquista. Para se arrematar esse
tema (entretanto sem se ter a pretensão de esgotá-lo), fica-se com a idéia de Bruno
sobre o futuro, cuja glória, pontuou o Filósofo, será alcançar Unidade na Liberdade.[5]
CATEGORIAS
Autoridade Liberdade
Monarquia ou Patriarcado Democracia
(governo de todos por um só) (governo de todos por cada um)
Panarquia ou Comunismo Anarquia
(governo de todos por todos) (governo de cada um
por cada um)
Exagero ou não, pode-se pensar em admitir que A Idéia de Deus foi articulada para
alcançar esse clímax, ou seja: a proposta brunina para a existência de Deus e,
conseqüentemente, para a própria criação do Universo e dos seres brotou antes, tendo se
constituído, possivelmente, no mote para a elaboração da obra como um todo.
Realmente, sem se pensar em minimizar o esforço e o mérito desse insurreto Quixote
Português, o livro ora referenciado, smj, poderia resumir-se tão-só ao último capítulo -
Mal e Bem. Este é o ápice da metafísica brunina, o ponto nuclear de sua meditação.
Conjeturando, talvez o Autor tenha pensado que não seria dada a devida importância a
uma mensagem tão extravagantemente heterodoxa e sobrenaturalista em um livreto de
poucas páginas. E assim preferiu elaborar uma obra mais densa e de tomo, na qual
destilou toda sua insurgência contra a tradição teológica, metafísica e científica vigentes.
Fez muito bem. Presentemente, o autor deste modesto rascunho, quase um século e
meio depois do nascimento de Bruno, especula sobre suas especulações. Assim é a
trajetória da Filosofia.
Voltando à coluna vertebral da cosmogonia brunina, algumas considerações devem
ser feitas relativas a cada um dos três momentos por ele anunciados. Primeiro Momento:
Deus existe. No início Ele era a Plena Consciência. Era Onipotente; era Invariável,
Homogêneo, Infinito e Puro. Francisco da Gama Caeiro, percucientemente, entendeu que
a única noção acessível deste Momento é a de tempo, e como não poderia ser diferente,
com os mesmos atributos.
Segundo Momento: ocorre a instabilidade, e acontece uma preliminar mudança de
atributos. Deus, lentamente, vai deixando de ser Onipotente para se ir tornando
Onisciente. Inicia-se uma diferenciação de parte do Espírito Puro. No segundo momento,
do Espírito Puro diminuído fluem para o Espírito Alterado (tempo alterado ou
heterogêneo, matéria, mundo e movimento) permanentes emanações que o penetram, o
depuram e o incitam a retornar e a perseguir a reintegração. Segundo Bruno, as
emanações oriundas do Espírito Puro diminuído não prevaricam à medida que penetram
no Espírito Alterado e se afastam de sua origem. O movimento é o início e o fundamento
para o regresso ao Espírito Homogêneo. E assim, em conseqüência de sua diminuição,
Deus - segundo Bruno - sofre da diminuição do espírito puro e do mal da criatura. Por
isso, o homem deve libertar-se a si, libertando os outros homens. Em decorrência dessa
linha de raciocínio oriunda de uma compreensão à qual Bruno denominou de verdade
acima da razão(?), foi possível ao Filósofo compatibilizar providência, milagre e oração,
tendo, por isso, ou também por isso, colocado o Pensador Portuense em franca oposição
e em rota de colisão com o Deísmo Racionalista de Amorim Vianna. Assim deixou Bruno
gravado em A Idéia de Deus: A oração é a aspiração do espírito alterado para o espírito
puro; subordina-se a uma lei transcendente de atração. O milagre é a emanação que
impulsiona o espírito alterado a avançar na libertação. A Providência é o concurso do
espírito puro diminuído com o espírito alterado para, pela libertação deste, se completar,
reintegrando-se o Absoluto.[7]
Do exposto, nota-se que, em Bruno, fé e razão são harmônicas, porque Deus e
homem haverão de se encontrar, e a Verdade, observa Caeiro, brotará dessa síntese, e,
assim, ambas são termos analíticos de uma mesma Razão. Objeta-se, todavia,
terminantemente, à essa linha de justificativa, porque, ressalvada compreensão mais
avançada da qual não se possui elementos para concordar, entende-se, que a fé é um ato
unilateral e solitário de exclusão da razão — é a própria deserção consentida da razão —
e só pelo conjunto de dogmas e de doutrinas de uma dada religião, pelas diversas
variantes de argumentos autoritários, pelo infundado medo do desconhecido e pela
infantilidade abstrusa de desejar agradar a Deus ou a seus presumidos e autonomeados
representantes, alguém pode abrir mão de sua LIBERDADE (o que se configura em uma
incoerência no pensamento de Bruno), e se deixar cercear por essa virtude teologal, que
só pode interessar aos detentores do poder teológico, qualquer que seja a origem, a
natureza ou a confissão. A fé só é cabível se ancorada em e derivada de uma
EXPERIÊNCIA PESSOAL que a justifique. Ainda assim, nada é definitivo na humana
caminhada. O ser humano obriga-se a estar alerta para novas descobertas, e o que hoje
pode ter aparência de coisa absoluta, amanhã poderá se modificar. Só o tolo tem
compromisso inamovível com as idéias que engendrou ou engendra. Leonardo Coimbra
refletiu magistralmente sobre esse tema e que será examinado em Filosofia Portuguesa V.
A ciência, por outro ângulo, mostra isso a cada instante. Enfim, na visão brunina, a meta
universal do estado de coisas que representa o Segundo Momento é o retorno ao
Primeiro Momento. O Heterogêneo deseja, precisa e há-de se reintegrar no Homogêneo
inicial. A ansiedade pela volta à origem é permanente; a aspiração dessa essencial
espiritualidade, segundo Bruno, ainda que rebelde, constitui-se em um fato irrecorrível; a
reabsorção no Puro Bem associa nessa trajetória Homem e Universo. Ora, não se pode,
terminativamente, concordar com essa especulação, pois, o mal é uma ilusão fabricada
própria da humana ignorância. Disto se serve a senda esquerda ou negra. A Divindade e o
próprio Universo estão ancorados em Leis Eternas, Imutáveis, Neguentrópicas e
Irredutíveis, que, em última instância, independem inteiramente da limitada razão
humana. São o que são, sempre foram e sempre serão. Deus e o Universo não se
amoldam à compreensão do ser; é o ser que, por um supremo esforço e pelo mérito, vai,
paulatinamente, compreendendo a consistência da Criação e realizando sua reintegração
na Consciência Cósmica, da Qual, em realidade, nunca esteve desvinculado, afastado ou
excluído. A famosa formulação de Protágoras o homem é a medida de todas as coisas
precisa ser melhor examinada e comparada com os pensamentos de Santo Agostinho (Si
fallor sum: se erro, existo) e de Descartes (Cogito, ergo sum: Penso, logo existo). Se,
porventura, alguém se engana ao somar 1 + 1, ao perceber que se enganou, tem a
possibilidade de corrigir o erro cometido, mas, enquanto ser pensante (res cogitans), isto
lhe garante que existe. Fica, entretanto, uma questão em aberto: por pensar, o ser sabe
que existe ou por existir pode pensar? O que se sabe realmente a respeito dos minérios e
minerais, vegetais e animais? Pensarão todos? De qualquer sorte, parafraseando um belo
pensamento de Nadime L'Apiccirella, estudante de Psicologia da Universidade Federal de
São Carlos - UFSCar, a crueldade e a fraternidade estão em lados opostos, entretanto
ligadas por uma ponte: a responsabilidade e a consciência de que somos todos irmãos.
Precisamos, assim, estar alertas com nossos pensamentos, pois podem gerar palavras,
atos e escolhas que não são, em si, harmônicos com a HARMONIA CÓSMICA. A única
limitada possibilidade de compreensão parcial do funcionamento do Teclado Universal é
pela Via Transnoética. Limitadíssima, pois o ente, nesta Ronda, ainda não completou
sequer a integralidade consciente de seus sete membros constitutivos. Por último, é
preciso ser compreendido que o ser decodifica as impressões transnoéticas acessadas de
acordo com sua capacidade de apreensão. Logo, ainda que a LEI seja uma e única, cada
ente a realiza de forma pessoal, sendo, ipso facto, intransferível em sua totalidade (talvez,
nem em parte) para outro ente. Esta argumentação não se esgota aqui. É o começo de
uma grande peregrinação.
Terceiro Momento: tendo em vista a aspiração do heterogêneo de se reintegrar no
Homogêneo, a reintegração, segundo Bruno, far-se-á. O espírito retomará sua
homogeneidade inicial e primordial. Assim, pode-se inferir que a trajetória metafísica
Homogêneo-Heterogêneo-Homogêneo é equivalente, mercê do efeito de um mistério, ao
retorno circular Onipotência-Onisciência-Onipotência. Resumindo:
... se abriu à sua razão experimental, ao seu deísmo ético e à sua metafísica
meramente cultural, a nova visão de um monismo teológico, que permitiu uma
‘segunda navegação’ gnosiológica e impôs uma missionação de cariz religioso
cujos procedimentos deveriam ser simultaneamente herméticos e racionais.
É certo que superou uma posição materialista-culturalista, que só aceitava uma
metafísica de raiz experimental, e considerava Deus com a mais alta e fecunda
idéia do Homem, como o ideal onde as mais belas virtudes eram elevadas ao
infinito. A indecisão ontológica das idéias e da cultura foi ultrapassada. Ao
materialismo inicial sucedeu um panteísmo espiritualista. Mas, ainda neste, a
condição humana ficou indecisa e frustrada, sem atingir o ápice de sua
dramaticidade existencial que consiste precisamente na tomada de consciência de
que é na salvação de cada homem ‘concreto’, na decifração ‘pessoal’ do destino
Humano, que está o cerne da religiosidade, ou, se preferirmos, da relação essencial
que liga a Humanidade ao Absoluto.
E essa limitação foi-lhe imposta pela fidelidade às posições mestras de que
expôs logo na 'Análise da Crença Cristã': o repúdio, por absurda, da tese da criação
a partir do nada, da noção de pessoa etc. Foi vítima enfim, da forma
preconceituosa e hostil como analisou o Cristianismo, negando antecipadamente
às suas doutrinas a possibilidade de terem valor filosófico.[11]
Ainda que se concorde com Soveral de que a indecisão ontológica das idéias e da
cultura tenha sido ultrapassada, e de que do materialismo tenha n’A Idéia de Deus
brotado um Panteísmo Espiritual, não se pode concordar que seja na salvação de cada
homem concreto que esteja o cerne da religiosidade, nem a relação essencial que liga a
humanidade ao Absoluto. Se foi hostil ou não a forma como Bruno analisou o
Catolicismo, certamente que preconceituosa não foi. Foi possivelmente, inusitada,
infirme, inverossímil e até, substantivamente contraditória e insustentável, pois o que é
onipotente é tudo, inclusive onisciente. E o que é onipotente não pôde, não pode e não
poderá ser menos do que onipotente. E se se chega ao limite de admitir o Absoluto como
Onipotente, na onipotência estão inclusas a onissapiência, a oniparência, a onipresença e
a onividência. De passagem, não se pode, jamais, deixar de ter em mente, que ao
conjeturar sobre a Divindade e seus modos de expressão, o homem utiliza categorias e
avaliações humanas, que são apenas reflexos ilusórios e/ou distorcidos dessa mesma
Divindade, da qual o próprio homem ainda se encontra em um estágio placentário de
compreensão, de realização, de ascensão e de reintegração. Assim, especulativamente, se
se valorar com o número 1 (um) cada um dos atributos mencionados, a soma, só por
equívoco ou desatenção, pode ser interpretada como igual a 5 (cinco). Onipotência +
onissapiência + oniparência + onipresença + onividência são iguais a UM, ou seja,
ONIPOTÊNCIA (1 + 1 + 1 + 1 + 1 = 1). Pode-se usar a própria Trindade para,
comparativamente, reforçar e melhor esclarecer a asserção anterior, ou seja: Pai + Filho +
Espírito Santo = ABSOLUTO. Não que o Absoluto dependa de cada parte em si, ou de
cada uma das Pessoas que constituem a própria Trindade, para ser e permanecer
absoluto. Em realidade, o Absoluto é Uno porque é Trino e é Trino porque é Uno. Esta
última afirmação pode, aparentemente, estar em contradição com a anterior, mas se se
trocar o vocábulo dependência por interdependência, então, neste caso, talvez se possa
compreender melhor a Lei do Triângulo. Nesse lineamento especulativo entende-se que
Pai + Filho + Espírito Santo = UM, ou seja, 1 + 1 + 1 = 1, ou que, Pai = Filho = Espírito
Santo = ABSOLUTO.[12] Em última instância: o Pai é, o Filho é, o Espírito Santo é, e o
Absoluto, conseqüentemente, é. E se o Absoluto é, o próprio tempo é também. Não
houve o antes, não haverá o depois. Passado e futuro são dimensões afeitas
exclusivamente ao gênero humano, como também o é o próprio espaço. Espaço e tempo
são apenas construções da mente humana (nesse particular, acolhe-se o pensamento de
Amorim Vianna). Com o advento da Teoria da Relatividade, o entendimento sobre o
espaço e sobre o tempo passou, na verdade, a ser representado por um contínuo espaço-
tempo quadridimensional. Agora, a admissibilidade de que a Onipotência de Deus mercê
do efeito dum mistério(!?) tenha se alterado, se apoucado ou se subtraído a si própria, e
se reduzido tão-somente à onisciência, pode, smj, ser admitida como uma ponderação
ilógica, artificial, insustentável e inaudita, jamais como preconceituosa. Sacar do nada
uma afirmação como essa, tendo por base, exclusivamente, o apoiamento da expressão
mercê do efeito dum mistério, é arremessar ao vazio os cânones do pensar filosófico e
desconhecer o mais elementar (mas de veracidade insubstituível) princípio esotérico:
Assim como em cima, é embaixo. Na verdade, é e não é. Por isso, o raciocínio noético
utilizado algumas linhas atrás, para contraditar o absurdo brunino, é, ao mesmo tempo,
também, talvez absurdo, e, provavelmente, inverossímil. O exercício filosófico que se
propôs, pode entusiasmar o aprendiz despreparado, mas não convencerá o místico
evoluído, nem o iniciado ou o ocultista autênticos. Onipotência, onissapiência,
oniparência, onipresença e onividência são, tão-somente, entre outros, meros vocábulos
dialeticamente derivados das especulações teoontognosiológicas da mente objetiva (ou
subjetiva, que nada mais é do que um degrau acima da objetiva), que expressam o estágio
psicológico e espiritual-religioso da consciência do ser singular, no sentido de tentar
compreender a ilimitabilidade cósmica (in)criada, relativamente à Divindade (abstrata ou
concreta), que presumidamente a criou. Se a criou! Mas, ainda que Bruno,
presumidamente, nada tenha conhecido da Tradição Primordial, reconhece-se e se
aplaude seu arrojo propugnador, já que a própria Tradição, também, paradoxalmente,
desvela-se sutilmente no âmbito do contraditório. Por tudo isso, agasalha-se o
pensamento de Aquiles Guimarães. Sampaio Bruno, compreende-se, foi um pensador de
ruptura, que independente de qualquer juízo ou análise – por mais duros e veementes que
sejam – que se faça de sua obra, revelou-se sim, e aí se concorda com Soveral, um
verdadeiro Missionário e Herói Português, que dedicou sua vida ao progresso moral e
material da humanidade, e, em particular, do seu País. Contemporaneamente, o próprio
Soveral, insere-se nesta categoria de pensadores. Este autor declara-se saudoso da
convivência amiga e fraterna de que desfrutou com o Insigne Portuense Eduardo Soveral.
Foi em um modesto restaurante na Cidade do Porto, bebericando Água Mineral Luso, por
mais de quatro horas, que recebeu sua primeira magna aula sobre Filosofia Portuguesa.
Inesquecível momento de reflexão, de aprendizado e de bondade. Irrefragavelmente,
Soveral encontrou o Céu de sua compreensão. Estará filosofando com Sampaio Bruno?
Prosseguindo: Até porque, manter posições irreduzíveis, encastelar-se em princípios
irredutíveis, constitui-se em um cousismo, como, em seqüência, já se afirmou, diria
Leonardo Coimbra. E, em Bruno, percebe-se, há mudança, há aprofundamento em muitas
de suas teses juvenis. O que não significa que não tenha havido ruptura. Aliás, o que mais
se observa em A Idéia de Deus é um fabuloso rompimento que jamais sofreu
reconciliação com a dogmática católica. Cunha Seixas representou outro exemplo de
filósofo de ruptura, pois tendo também se insurgido contra a divina religião, dela se
afastou e formulou, como se reviu, um sistema espiritualista original, cuja
ontognosiologia contrasta vertical e horizontalmente com sua formação religiosa iniciada
no seio da família, em Trevões, e que haveria de se esgotar, mais tarde, em Coimbra,
quando, inclusive, decidiu abandonar o Curso de Teologia que havia iniciado. Domingos
Tarrozo é outro filósofo que se insere nessa categoria, e sua Filosofia da Existência
precisa ser melhor examinada pelas elites pensantes, portuguesa e brasileira. Ousa-se
afirmar que há mais coerência na cosmogênese tarrozina, do que na metafísica
heterodoxa de Bruno, ainda que teleologicamente otimista, ainda que a teleologia seja
uma contradição da noesis. Outra ilusão da razão(?!), portanto, é a admissão de que o
Universo progride para um télos. O Universo é; não virá-a-ser.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
NOTAS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SITES CONSULTADOS
http://www.instituto-camoes.pt
/cvc/filosofia/rep6.html
http://www.supphoto.net
/galerie/photos/portugal/index.php
http://www.geocities.com
/nowarski99/pt/1.htm
http://www.ensayistas.org
/filosofos/portugal/soveral/
http://www.ehu.es
/~uppbacol/4.html
http://www.bn.pt/
FILOSOFIA PORTUGUESA (V): O CRIACIONISMO DE LEONARDO COIMBRA
Leonardo Coimbra
Dialogando com Kant, compreendeu que todos os espaços são partes de um único e
mesmo espaço. Ainda que estas noções tenham o defeito de ser realistas, Leonardo
reconheceu que são perfeitamente justas e rigorosas.
Leonardo jamais pensou em retribuir o milagre da vida com indiferença. Não importa
que 1 g de gordura produza 1,61 g de glicose e seja equivalente a 1,52 g de sacarose.
Também falar em energia vital sem a ter definido - advertiu o Filósofo - é esquecer o
trabalho psíquico... A evolução biológica - sintetizou Leonardo Coimbra - é a construção
progressiva que a direção e a herança tenham feito num tempo determinado pelo
conjunto das noções geológicas, físicas e químicas. Para Leonardo, não há justificativa
para se especular sobre quando apareceu a vida. O que interessa é como são compatíveis
os tempos geológico e biológico. E quanto à vida, sob o prisma da espiritualidade, seu
pensamento seguiu a tradição católica. Nunca aceitou que o ser fosse apenas um
aglomerado de átomos e de moléculas, mas um complexo dual corpo-alma. Toda a ética
leonardina baseia-se no bem, na beleza, na justiça e na virtude, que, um dia, desembocará
na GRAÇA. O ser humano não está só e muito menos perdido no Cósmico. O ponto de
convergência é a Divindade, estado ou condição aonde as humanas aspirações haverão
de ser realizadas. As únicas indiferenças que devem ser realmente desprezadas são as
paixões desarmonizadoras, os desejos inconfessáveis e imoderados, as concupiscências,
as ambições deletérias, as degradações morais etc. Indiferença no sentido de vergonha e
de profundo arrependimento por ter permitido que, por fraqueza ou por inconsciência,
tais mazelas tenham, um dia, enfermado a personalidade-alma, sim. Isto, então, na
verdade, não é propriamente indiferença, mas desejada e festejada consciência
consciente do delito praticado. Este é o início da (re)conciliação do ser consigo, com o
outro e com a Divindade que nele (imanente) sempre esteve. Quanto ao fato de a vida ser
confiada aparentemente sem consulta prévia a cada ser, este pensamento só pode ser
produto do desconhecimento do próprio propósito da existência e da encarnação. Ou, de
se presumir ter chegado a conclusões satisfatórias com base em premissas ilusórias,
insuficientes e fraudulentas. Quando o ente compreender que a vida é um presente
merecido, então, estará apto para cumprir a missão com a qual se comprometeu antes de
nascer. Perpetuamente, há possibilidade de (re)nascimento, de (re)integração e de
(re)encontro.
Aprofundando sua tese criacionista, Leonardo observou que a sensação é uma noção
psicológica - momento dialético - e não um dado. Perseverou nessa tese e elaborou,
nessa base, um sistema metafísico que garantisse o valor das sensações e as sucessivas
noções psicológicas. O biologismo, segundo seu entendimento, é pensamento
decorrente de um direcionismo próprio - o Espírito.
E, por último, propugnou que não há pessoa sem pessoas. Não há ser humano sem
sociedade. Consciência, noções, pessoa, síntese, ações, pessoas: Sociedade. Uma
consciência isolada acabaria por esgotar sua capacidade de síntese. As consciências
individuais condicionam-se e vivem em reciprocidade de pensamentos, sentimentos e
ações, ponderou Leonardo.
... tendência funesta e irreprimível do homem ... para considerar como estático e
definitivo, como realidade concluída e firme de uma vez para sempre, para não
dizer como coisa feita, as próprias realidades espirituais, as idéias, os símbolos, as
estratificações jurídicas, os transitórios preconceitos políticos ou sociais, as
convenções históricas tidas como sagradas ou invioláveis, os princípios ou dogmas
de ordem religiosa, múltiplas idéias-crenças, tidas como inalteráveis, de ordem
científica.[2]
CONSIDERAÇÕES FINAIS
NOTAS
1. Obras Completas de Leonardo Coimbra, vol. II, Luta pela Imortalidade, p. 363.
2. Op. cit., p. XIII.
3. Op. cit., p. 260.
4. Obras Completas de Leonardo Coimbra, vol. I, Criacionismo (Esboço de um Sistema
Filosófico), p. 328.
5. Ibid., passim.
6. Mônada - para Leonardo Coimbra - é todo o direcionismo de matéria, seja qual for a
sua categoria, desde o mais ligeiro afloramento de vida até a mais ampla e profunda
consciência. Ibid., p. 368. Comparar com o conceito leibniziano, e, se for o caso, com
conceitos anteriores.
7. Discorda-se do vocábulo eficiência utilizado. Eficiência sem eficácia resulta, no mínimo,
apenas na metade da questão. E, na maioria das vezes, converte-se em retrocesso. Mais
concertado seria empregar a palavra efetividade ou excelência, que congloba os dois
conceitos. Assim:
EFICIÊNCIA + EFICÁCIA = EFETIVIDADE (ou EXCELÊNCIA)
8. Ibid., pp. 378 e 379.
9. Obras Completas de Leonardo Coimbra, vol. I, A Alegria, a Dor e a Graça, passim.
10. Ibid., passim.
11. Ibid., passim.
12. Op. cit., p. 501.
13. Obras Completas..., Luta pela Imortalidade, p. 232.
14. Obras Completas..., A Razão Experimental, p. 543.
15. Obras Completas..., Jesus, passim.
16. Obras Completas..., Problema da Educação Nacional, p. 923.
17. Obras Completas..., O Homem às Mãos com o Destino, passim.
18. Obras Completas..., Do Amor e da Morte, p. 579.
19. A Criação e a Liberdade em Leonardo Coimbra (Tese de Doutorado), Ricardo João
Inchausti, pp. 209 a 213.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANEXO I
INSTITUTO CAMÕES
FIGURAS DAS CULTURAS LUSÓFONAS
Leonardo Coimbra
Autor do texto: Pedro Calafate
Fonte: http://www.instituto-camoes.pt
/encarte/figlcoimbra.htm
Acesso em 16/12/2003
Natural da vila da Lixa, próximo de Amarante, foi uma das figuras mais proeminentes
do movimento da Renascença Portuguesa, que fundou, juntamente com Teixeira de
Pascoaes, António Sérgio e Raul Proença, entre outros. Entre 1919 e 1931 foi professor
de Filosofia na Faculdade de Letras do Porto, por ele criada quando, pela primeira vez,
ocupou o cargo de Ministro da Instrução Pública.
Por outro lado, o modelo de ciência a que se referia nada tinha a ver com o do
positivismo. Tratava-se de uma ciência constituída na base da dialéctica nocional do
pensamento, ou seja, não incide sobre coisas mas sobre noções ou representações
mentais, considerando que a sensação é uma noção psicológica e não um dado e que,
como noção que é, não é uma realidade completa mas um momento dialéctico de um
processo, numa constante marcha para mais realidade e acréscimo de sentido. É na base
deste Criacionismo, que começa por afirmar-se inicialmente num plano gnosiológico, que
se virá a afirmar a liberdade do homem, pois a realidade não poderá nunca ser deduzida
de uma noção sintética superior, se essa mesma noção não tiver sido por nós elaborada.
Em última análise, a realidade não poderá nunca separar-se da dinâmica do pensamento;
não é um conjunto de coisas de que o pensamento de aproprie, mas um conjunto de
noções, sempre e já elaborado pela acção criadora do pensamento, num processo em si
mesmo ilimitado. Se o espírito se move num conjunto de noções por si elaboradas, então
ele é acto criador, não se limitando a assimilar e a receber o já feito e o já pensado.
A matéria não é assim o fundamento do pensamento, mas um seu produto, pelo que
importa superar a divisão entre matéria e forma no âmbito do processo gnosiológico,
para afirmar que toda a matéria e toda a realidade é já uma nocionalidade e uma ordem.
O espírito é a actividade funcional do conhecimento; a matéria é todo o conhecido
considerado independentemente da actividade que conhece, e a experiência é a
interacção do espírito e da matéria no acto de conhecer.
L. C. afirma, assim, uma dialéctica ascensional, que partindo do processo de
elaboração das noções científicas nelas se não detém, petrificando ou estagnando,
procurando, antes, elevar-se à constituição da última realidade irredutível, por si definida
como a «pessoa moral». Enquadram-se neste processo dialéctico afirmações célebres de
L.C., nomeadamente quando proclama que o homem é livre porque «a vida social lhe
permitiu interpor entre a sensação e o acto a demora e a riqueza do pensamento», ou
que, «o homem não é uma inutilidade num mundo feito, mas obreiro de um mundo a
fazer».
Leonardo Coimbra
(Desenho do pintor Eduardo Malta)
Neste ponto, L.C. recorre à Monadologia, inspirado em Leibniz, mas criticando a idéia
de uma harmonia pré-estabelecida, porque contrária à liberdade inerente ao seu
Criacionismo, bem como à dinâmica comunicacional entre as mónadas. O Universo é
criado pelo homem num processo dialéctico que o faz chegar a um Deus não menos
transcendente, pelo fraterno amor de tudo, e não algo criado de uma vez por todas pela
vontade divina. Em última análise Deus é a Luz que ilumina a actividade criadora do
homem, Luz pela qual ele ascende na infinita possibilidade da acção moral. Deus é o
Amor que une, e cada consciência é a unidade elementar que pelo amor se move atraído
pela «Grande Unidade». Por isso, a compreensão é a Unidade e compreender é Amar.
L.C. também se afirma aqui como o Filósofo da Saudade, termo que lhe permite
entender a vida como tendência para a superação e o excesso de si própria, superando,
pelo desejo da Unidade, a dimensão separatista que degrada e corrompe. A Saudade será
a expressão do grande «abraço unitário» que nos atrai ao Centro do Grande Circulo do
Ser, porque o que existe de mais material são «as almas afastadas». Assim, a Saudade
será sempre a companheira do homem, enquanto se interpuser uma distância entre ele e
a Luz do Espírito, porque só Esta conseguiria vencer as resistências que criam a sombra
da Saudade.
CONCLUSÕES E ADITAMENTOS
TRÍADES
PENSADOR SISTEMA ARQUÉTIPOS TIPOS
(PRINCIPAIS)
DEUS HOMEM
CONTICÍNIO
ANTÓNIO CATOLICISMO INVISÍVEL VISÍVEL
DE LISBOA (EMPRESTADO) MEIA-NOITE
INCORPÓREO CORPÓREO
AURORA
O SER
SER SUPREMO O SER
SINGULAR
CUNHA SEIXAS PANTITEÍSMO MANIFESTAÇÃO IMENSIDADE
ESPAÇO
HARMONIA ETERNIDADE
TEMPO
HETEROGÊNEO
HOMOGÊNEO
HOMOGÊNEO
PERFEIÇÃO
PANTEÍSMO PERFEIÇÃO
HETEROGÊNEO RELATIVA
SAMPAIO BRUNO (HETERODOXO)
(EMPRESTADO) TEMPO
HOMOGÊNEO TEMPO ALTERADO
INFINITO
(ESPAÇO)
MÔNADA
ALEGRIA DEUS
HARMONIA
DOR HARMONIA PLENA
LEONARDO COIMBRA CRIACIONISMO PROGRESSIVA
GRAÇA INFINITO MORAL
CONSCIÊNCIA
RELIGIOSA
José Maria da Cunha Seixas foi considerado pelo meu amigo e saudoso Filósofo
António Quadros como o pensador português que assumiu o verdadeiro significado da
filosofia da história. Foi o primeiro filósofo lusitano que intentou conciliar imanência e
transcendência. Não aceitando a existência verdadeira do mal, acreditou na harmonia
infinita, via pela qual o ser (imortal), em sua vida ilimitada, em um progresso ascensional
infindável, busca o Absoluto. Nesse evolver, o homem irá com a memória do seu passado
percorrer outros planos de existência e de consciência, mantendo nessa trajetória sua
integral personalidade em direção a um perpétuo ideal. Seu sistema é, ao mesmo tempo,
teleológico e contingente. Entretanto, não se percebeu no exame integral da obra de
Cunha Seixas a explicitação detalhada de como acontece essa peregrinação.
E, nesse caminhar dialético, tudo se passa em conformidade com as Leis do Ser
(Unidade), da Manifestação (Relação) e da Harmonia (Ordem). Com isto em mente, Cunha
Seixas ensinou que a vida do pensamento tem seu ponto de partida na intuição, que a
reflexão, pelo processo de abstração, termina por aperfeiçoar. A intuição, contudo,
constitui-se em mera afirmação espontânea, e a reflexão, por outro ângulo, não consiste
na ciência. Na elaboração psicológica há um terceiro termo, que é a síntese. Com base
nessas postulações, o Trevoense entendeu que o sentir da humanidade oferece boa lição.
A idade primitiva - muitas vezes chamada paraíso terrestre - era uma época em que não
havia desequilíbrios marcantes nem desarmonia sensível. A segunda idade foi um tempo
de lutas e de contradições. A terceira idade deverá conciliar a humildade do viver primevo
com as dificuldades e as inconsistências da segunda idade. Nota-se, aqui, a profunda
influência exercida por Krause no que concerne à filosofia da história por este concebida.
O movimento dialético seixino tem um desenho muito semelhante aos períodos de
indiferenciação, de oposição e de harmonia do Panenteísmo Krauseano (Filosofia
Novíssima).
Um último exemplo do pensamento tríadico de Cunha Seixas é avultado na Teoria do
Amor. Nela o ser é duplo, representado pelo homem e pela mulher. A manifestação
opera-se pela união dos dois seres no casamento. A harmonia aparece no último termo,
que é a família, que em relação à sociedade é um ser...
Não se pode, todavia, deixar de registrar que Cunha Seixas, nos Princípios Gerais de
Filosofia, sua última (e magna) obra, chegou a propor para algumas ciências específicas,
uma vinculação e uma absoluta dependência à sua Lei Pantiteísta, como foi o caso, por
exemplo, da matemática e da química. Como se viu, Cunha Seixas regeu todas as suas
introspecções pela LEI DO SER, DA MANIFESTAÇÃO E DA HARMONIA. Física, Direito,
Estética, Mecânica etc. não poderiam ficar (como não ficaram) excluídas das meditações
do Pensador Beirão.
Já Sampaio Bruno posicionou o problema do mal (contrariamente a Cunha Seixas) no
centro de uma teurgia e de uma teleologia próprias. Para Bruno, o mal existe. Sim. Por ter
havido uma cisão entre Deus e o Universo, o mal, a opressão, o sofrimento, a dor, a
injustiça, a discórdia e toda e qualquer forma de desarmonia, são oriundos da perda
(parcial) da Onipotência Divina. A Onipotência dando lugar à Onisciência produziu o mal,
fautor do erro e da angústia. Em Bruno, o ser age para um télos e, novamente, três
instantes aparecem em suas reflexões: auto-libertação, libertação de seus irmãos e
libertação universal. E por isso, justamente por isso, o fim supremo e único do ser, a juízo
de Bruno, é eliminar o mal em qualquer instância que se apresente. Eliminado o mal, a
reabsorção ou reintegração do heterogêneo no Homogêneo acontecerá. Refletindo sobre
a questão do mal, que no transcurso da história da filosofia tem subsistido sobre duas
vertentes singulares (vale dizer, metafísica e subjetivista, tem-se: no primeiro caso, ou é o
próprio não-ser ou uma dualidade do ser, e, no segundo, um juízo ou um desejo negativo),
teve, na Filosofia Portuguesa em geral — e em particular em Bruno, como se viu — curso
e interpretação particulares. Ao se considerar o mal sob a ótica metafísica, acaba-se por
cair na velha discussão estóico-epicurista, qual seja: Deus ou quer tirar os males e não
pode, ou pode e não quer, ou não quer nem pode, ou quer e pode. Se quer e não pode, é
impotente: o que não pode ser em Deus. Se pode e não quer, é invejoso, o que é
igualmente contrário a Deus. Se não quer nem pode, é invejoso e impotente, portanto,
não é Deus. Se quer e pode — o que só convém a Deus — de onde provêm a existência
dos males e por que não os elimina? Por outro lado, o mal pode ser entendido como
desvalor, ou seja, objeto de um juízo negativo de valor, contrariando regras ou normas de
ordem natural ou comportamental. A noção de Bruno sobre esta categoria é metafísica,
mas, smj, subjetivamente canhestra, e, tanto quanto as outras as quais rapidamente se
aludiu (e que mais à frente serão novamente reapreciadas), não se compatibiliza com o
entendimento esotérico tradicional, que, no limite, admite ser o mal tão-só ausência da
LUZ, e, de permeio, interpretação ou admissibilidade equivocada do funcionamento da
LEI. O mal é a REALIDADE; o bem, a ATUALIDADE. Como, ordinariamente, o ser singular e
a humanidade coletivamente não têm acesso direto e imediato à totalidade da
ATUALIDADE CÓSMICA, percebem, entendem ou decodificam certas manifestações
como mal. Este equívoco é produto da ignorância ainda prevalecente no atual estágio da
consciência dos seres. Será ultrapassado. Enquanto não é morte, assassinatos, guerras,
invasões, estupros, roubos, degolas, penas capitais e desarmonias em geral.
A tríade brunina expressa em A Idéia de Deus é notadamente circular, não-teológica,
mas teúrgica, absolutamente incompatível com a Tradição Arcaica, com a Cabala, com a
Doutrina Teosófica, com a Antroposofia e com os princípios esotéricos veiculados pelas
fraternidades iniciáticas autênticas. Constitui-se, salvo melhor argumentação, de uma
metafísica panteísta heterodoxa, que recebeu de Leonardo Coimbra as mais pesadas e
fundadas objeções. Acompanha-se Leonardo, e até com mais veemência, em tais
objeções (que já foram antecipadas no exame parcial do pensamento brunino).
Entretanto, na altura deste trabalho-pensamento, acredita-se ser conveniente,
tangenciar superficialmente o entendimento dos ocultistas – particularmente os
associados ao pensamento de Helena Petrovna Blavatsky – no que se refere aos DOIS
UNS. Há teosoficamente o UM do Plano Impenetrável, do Incognoscível e do Absoluto,
sobre o qual nenhuma explicação é pertinente, pois é inacessível à Inteligência. O que
caracteriza este UM são as TREVAS – REALIDADE ÚNICA E VERDADEIRA – base e fonte
da LUZ. Segundo esta concepção, as TREVAS são PURO ESPÍRITO e a LUZ é tão-só
matéria derivada. As TREVAS são o ABSOLUTO VERDADEIRO. Demon est Deus inversus.
O SEGUNDO UM está associado ao plano das Emanações; é o reflexo luminoso do
PRIMEIRO UM – é o LOGOS DO UNIVERSO DA ILUSÃO, e é andrógino por natureza. Emite
de si mesmo 7 (sete) raios, semelhantemente aos Três Sephiroth Superiores que
produzem os Sete Inferiores. Nesse sentido, e somente nesse sentido, o Homogêneo
converte-se no Heterogêneo, que, realmente, sempre foi, é e será parte integrante do
próprio HOMOGÊNEO. Tropologicamente argumentando, Homogêneo e Heterogêneo
formaram, formam e formarão perpetuamente uma UNIDADE INDIVISÍVEL. No Gênese I,
6 está escrito: E Deus disse: Faça-se o firmamento... e Deus – o Segundo cumprindo o
Decreto emanado do Primeiro – fez o firmamento (Gênese I, 7). Mas é preciso alcançar o
claro entendimento místico, teosófico e iniciático de que este Poder (o Segundo Deus ou
Aiôn) e todos os Poderes do Universo, não evoluem uns dos outros, mas são,
inapelavelmente, apenas aspectos variados da mesma e única manifestação de AIN-SOPh
– o TODO ABSOLUTO ou PRIMEIRO UM, ou seja, a CAUSA SEM CAUSA. Assim
considerando, a Humanidade não é o produto completo do ABSOLUTO (PRIMEIRO UM); é
em realidade filha dos ELOHIM (ALHIM). Em outros termos: a Humanidade,
originariamente, proveio de um GRUPO SETENÁRIO DE ELOHIM (Homem Celeste). A
própria interpretação teológica do versículo de João, o Evangelista (E a LUZ brilhou nas
TREVAS, e as TREVAS não a compreenderam) vem dando azo a especulações
contraditórias sobre a Criação (Sístole-Diástole) e à produção de mitos e figuras mal
compreendidas, cujas distorções, paralelamente à ilusão da mediunidade visionária (como
advertiu Rudolf Steiner) vêm arrastando o livre-arbítrio para o âmbito da •••••• ••••••.E,
assim, o novo dogma transformou-o no maligno. Este conhecimento Bruno não acessou,
daí a incongruência de seu pensamento. Nesta oportunidade, deseja-se clarificar que o
ABSOLUTO citado (e por citar) em várias passagens das reflexões anteriores, é o que se
refere ao PRIMEIRO UM, e a possibilidade de unificação consciente com este plano
vibratório é uma hipótese-certeza que depende exclusivamente de cada ser singular,
ainda que, contraditoriamente (mas apenas na exterioridade), esse tempo assintótico só
possa acontecer quando tudo e todos voltarem a repousar no seio desse mesmo
Absoluto. Esta afirmação feita desta forma parece um paradoxo. Então, cada um terá que
realizar esta compreensão, s o l i t a r i a m e n t e, no Santuário Sagrado do seu Coração.
Eu estou no outro, e o outro está em mim. Este é realmente o entendimento elevado –
atual – do sentido esotérico, místico e iniciático embutido na famosa frase Eu e o Pai
somos Um. Verdadeiramente é mais do que isto! Deste entendimento, Deus manifesta-se
de dois modos: a) mânvâantâra – DEUS EXPLICITUS: atividade ou existência (Diástole); e
b) prâlâya – DEUS IMPLICITUS: passividade ou involução (Sístole). No homem, esta Lei
Cósmica assemelha-se aos estados de vigília e de sono. Portanto, em última instância, o
Ser (Sein) – como compreendeu hermeticamente Fichte – é Uno, e o ser só O compreende
como Múltiplo (Dasein), vale dizer, por intermédio da existência manifesta. PRIMEIRO UM
—› Idéias Arquetípicas —› Vir-a-Ser(!?) —› Criação(!?) —› Retorno(!?). Enfim, tudo se
resume a uma perpétua transferência numênico-fenomenal, e vice-versa. Tudo que é, foi
e será, e as incontáveis formas de manifestação do Ser, ao desaparecerem, continuarão a
existir como reflexos. Mais uma vez impõe-se a leitura da obra platônica. Esta é, smj, a
melhor aproximação que é dada a um mortal fazer, pois, como disse Hermes Trismegistus,
falar de Deus é impossível pois O que não possui corpo, nem aparência, nem forma, nem
matéria, não pode ser percebido pelos sentidos. Mas a hipótese–certeza de unificação
com o PRIMEIRO UM é assintótica, é meritocrática e é plenamente acontecível!
Estagnação, em qualquer sentido, é uma inviabilidade. E, certamente, a •••••• •••••• não
prevalecerá.
É conveniente, portanto, sobre outro aspecto, que se repita (ampliadamente) nestas
Conclusões e Aditamentos, uma parte das conclusões deste pesquisador (em
colaboração) incluídas no trabalho Influência do Pensamento Martinista na Obra de
Sampaio Bruno, apresentado no Colóquio Antero de Quental Dedicado a Sampaio Bruno,
tendo em vista que, credita-se equivocadamente em Portugal parte da metafísica
heterodoxa brunina, à inverídica possibilidade de ter Sampaio Bruno sofrido, de alguma
maneira, influência esotérica de Saint-Martin ou do Martinismo. Salvo melhor
informação, mas este autor curva-se à esta possibilidade, essa influência não ocorreu
pelos seguintes e principais motivos: a) a primeira pista aparece na Introdução da obra
brunina Os Cavaleiros do Amor (Plano de Um Livro a Fazer), da lavra de Joel Serrão.
Apesar de as primeiras leituras do Especulativo Portuense terem sido de inspiração
maçônica, ele próprio nunca foi iniciado nesta Fraternidade, como parece nunca ter sido
vinculado a qualquer fraternidade esotérica. Textualmente afirmou em 26 de janeiro de
1902: Não simpatizo com associações secretas porque é força de sua essência que elas
fazem prevalecer sobre a idéia de justiça para todos a idéia de proteção para alguns; e,
assim, sacrificam o direito do profano à iniqüidade do iniciado, com cuja causa o laço da
misteriosa solidariedade se aperta. Não cabe neste momento discutir o posicionamento
ou o conceito que Sampaio Bruno derivava das sociedades esotéricas (que
presumidamente não conhecia, e que, se conhecia, conhecia o que podia ser conhecido),
melhor, das fraternidades iniciáticas (sempre se pensando naquelas vinculadas à Tradição
Primordial). Fica-se, por isso, tão-só no registro, e se propõe uma questão: que faria a
humanidade, hoje, se desvendasse os mistérios do Arqueômetro de Saint-Yves
d’Alveydre, e tivesse acesso aos conhecimentos que os atlantes possuíram (e possuem)?
Mal-aventurado aquele passar a PALAVRA; b) em segundo lugar, sobre os conceitos
expressos pelo Ilustre Filósofo Luso no que concerne à criação a partir do nada, à noção
de pessoa, à questão do mal ( já anteriormente examinada), ao milagre, à providência, ao
estado normal do homem, à idéia de Deus e de sua Onipotência, e, finalmente, à própria
diminuição do espírito puro, nenhum deles se compatibiliza, sob qualquer ângulo, com a
tradição esotérica em geral, muito menos com os princípios martinistas em particular; c)
terceiro, o próprio conceito que Sampaio Bruno admitia para o trabalho desenvolvido nas
sociedades ou fraternidades esotéricas, conforme declaração textual apresentada no
item a; d) o fato de à época da expansão da Tradicional Ordem Martinista (final do século
XIX e início do século XX), Portugal (ao que se presume) não ter instalado nenhuma
heptada martinista, é outro indicativo a ser substantivamente considerado (mas, o
Martinismo tem tantas correntes!); e) o quinto ponto é a não confissão ou declaração do
pensador dessa influência. Não há, inclusive, nenhuma referência que justifique
concretamente a absorção ou exposição em suas obras de qualquer princípio, lei ou
postulado martinista; e f) por último, o Martinismo, como foi anteriormente
sinteticamente apresentado em uma página deste site, é, em última instância, uma
SENDA CARDÍACA que se baseia duplamente na razão e na emoção (ou mais
esotericamente no LIVRO DO HOMEM e no LIVRO DA NATUREZA) para reintegração
assintótica do homem no seio do Absoluto. Sampaio Bruno pensou de maneira diversa o
processo de emancipação do homem e de sua redenção (reintegração).
Por tudo isto, pode-se, indubitavelmente, concluir que Sampaio Bruno, no que pese (e
pesa muito) o caráter religioso de sua Filosofia, a universalidade de seu pensamento, o
conteúdo metafísico de sua obra e a própria razão da finalidade e da existência do
Universo e remissão do homem, não demonstrou em sua obra qualquer influência, ainda
que adjetiva, dos princípios definidos pelo Martinismo autêntico, como também de
nenhuma outra ordem esotérica tradicional. E assim, princípios martinistas, uma coisa;
panteísmo heterodoxo brunino, outra completamente diferente.
Nada indica que, no passado, Portugal tenha sido um pólo especial irradiador da
Tradição. O fato de ter acolhido muitos templários depois de sua perseguição na França
por Felipe - o Belo (com apoio de Clemente V) é tão-somente parte da coisa, não a coisa
completa. A calcinação do último – o vigésimo segundo – Grande Mestre dos Templários,
iniciou um período longo de dormência da Tradição, que só veio a acordar no século (XX)
que recentemente se encerrou. A Tradição, por aquela época, salvo melhor informação,
centrava-se em outros pontos da Terra. Hoje, entretanto, mais do que sabe a maioria dos
portugueses, Lisboa oculta em uma de suas ruas uma Mansão Secreta da ... e
eventualmente o ALTO CONSELHO DO A ... ali se reúne. MAHA. Para informações mais
detalhadas e mais concertadas sobre este tema, recomenda-se a consulta às obras
singulares de Raymond Bernard[1].
O homem não é
uma inutilidade
num mundo feito,
mas obreiro
de um mundo a fazer.
E Sampaio Bruno, ainda que optando por uma vereda heterodoxa de coloração
panteísta, ofereceu uma metafísica redentora, não apenas do ser humano, mas universal
e fraterna de todos os seres, rumo a um Homogêneo misteriosamente alterado. Ainda
que se lhe possa fazer oposição, é inegável sua preocupação teleológica, na qual
sobressai uma permanente catequese do bem. Bebeu em Plotino, presume-se. Só que
superficialmente. Plotino era um Iniciado.
NOTAS
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