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NEUROCIÊNCIA DA COGNIÇÃO E DA

EMOÇÃO
UNIDADE II
A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE
Elaboração
Luciana Raposo dos Santos Fernandes

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO

UNIDADE II
A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE.............................................................................................................................................5

CAPÍTULO 1
ORGANIZAÇÃO DO CÉREBRO................................................................................................................................................... 5

CAPÍTULO 2
NEUROCIÊNCIA COGNITIVA.................................................................................................................................................... 12

CAPÍTULO 3
NEUROCIÊNCIA COGNITIVA NA PSICOLOGIA.................................................................................................................. 18

REFERÊNCIAS.................................................................................................................................................25
A NEUROCIÊNCIA COMO
NOVIDADE UNIDADE II

A neurociência, no Brasil, ainda é recente e, em consequência, é considerada


uma novidade, devido às possibilidades que ela vem proporcionando e ainda
estão sendo exploradas. Porém, na maioria dos países do chamado primeiro
mundo, ela já se consagrou em suas diversas subáreas, como um campo da
ciência que estuda o sistema nervoso e, em especial, o cérebro, em todos os
seus aspectos: estrutura, função, desenvolvimento ontogenético e filogenético,
processo bioquímicos, patológicos e até farmacológicos, além de como seus
diferentes elementos interagem, dando origem às bases biológicas da cognição
e comportamento. Por isso, nessa unidade, vamos destacamos a organização do
cérebro e a importância da Neurociência Cognitiva, inclusive para a Psicologia,
para uma melhor compreensão da amplitude dessa área.

CAPÍTULO 1
ORGANIZAÇÃO DO CÉREBRO

Por definição, o cérebro é o órgão que funciona como o centro do sistema


nervoso em todos os vertebrados e na maioria dos invertebrados. Ele está
localizado perto dos órgãos sensoriais de sentido. Em um ser humano, o córtex
cerebral tem aproximadamente de 14 a 16 bilhões de neurônios. Já no cerebelo, o
número estimado de neurônios é de 55 a 70 bilhões. Cada um desses neurônios é
conectado por sinapse a vários milhares de outros neurônios que, normalmente,
comunica-se entre si por meio de longas fibras chamadas axônios, que são os
responsáveis por transportar os pulsos de sinais, chamados de potenciais de ação,
às partes distantes do próprio cérebro ou do corpo, até as células receptoras
específicas. Graças a isso, fisiologicamente, o cérebro exerce controle centralizado
sobre os outros órgãos do corpo, tanto gerando padrões de atividade muscular
quanto estimulando a secreção de substâncias químicas chamadas hormônios.
Aparentemente, não há muito para se ver no cérebro, como explica:

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Unidade ii | A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE

Macio, esponjoso, mosqueado e de cor cinza-rosado, dificilmente


poderia se dizer que tem beleza física. Porém, apesar de sua
aparência, ele se classifica como a maior maravilha natural que
conhecemos e tem uma beleza e sofisticação próprias.

O objeto ao qual se aplica essa descrição: o cérebro. Ele é responsável


por nossos pensamentos mais elevados – e por nossos impulsos
mais primitivos. Ele é o supervisor das intricadas operações do
corpo humano. Se tivéssemos de tentar projetar um computador que
imitasse o leque das capacidades do cérebro, a tarefa seria quase
impossível; na verdade revelou-se difícil chegar apenas perto disso.
A simples quantidade de células nervosas no cérebro é suficiente
para intimidar até mesmo o engenheiro de computação mais
ambicioso. Muitos bilhões de neurônios compõem uma estrutura
que pesa apenas 1300 gramas no adulto mediano. Entretanto, não
é o número de células o aspecto mais impressionante em relação ao
cérebro, mas sua capacidade de permitir que o intelecto humano
floresça orientando nosso comportamento e nossos pensamentos
(FELDMAN, R. S., 2016).

Figura 4. Divisão fisiológica do cérebro humano.

Lobo Frontal
Hemisfério Esquerdo
Lobo Parietal

Lobo Occipital

Cérebro

Cerebelo
Lobo Temporal
Medula Espinhal Tronco Encefálico

Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Divisao-fisiologica-do-cerebro-humano-o-cortex-cerebral-e-de-
particular_fig2_274248499.

Funcionamento do cérebro normal


O estudo das lesões no cérebro e os consequentes distúrbios provocados, foram
e ainda são o caminho que, muitas vezes, permite levantar hipóteses sobre o
modo de funcionamento do cérebro normal. Como destaca Gil (2010):

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Se o ser humano pode conhecer o mundo e nele agir, é graças a um


funcionamento coordenado dos recursos cognitivos e às múltiplas
conexões que o cérebro tece, não só entre os dois hemisférios, mas
também no interior de cada hemisfério, desenhando uma rede
complexa, articulada de uma ponta à outra da neuraxe. Inúmeros
vínculos são tecidos entre a cognição, a afetividade, a sensitividade
e a motricidade.

Esses vínculos descritos pelo autor são realizados pelos neurônios, considerados
a unidade fundamental do sistema nervoso (SN), por serem os responsáveis pela
condução e tratamento das informações recebidas. Portanto, são vários bilhões
de neurônios que se conectam através de sinapses, criando inúmeras redes.
É justamente essa reunião de neurônios que constitui a chamada substância
cinzenta, o córtex. Mas os neurônios não estão presentes somente no córtex, eles
também estão espalhados pelo tálamo e núcleos cinzentos. Os prolongamentos
dos neurônios, axônios e dendritos, constituem a chamada substância branca,
que fica entre o córtex e os núcleos cinzentos.

Dentro do sistema nervoso central (SNC), o cérebro é o responsável pelas funções


mais elevadas, que vão desde a interpretação de estímulos à ordenação de
movimentos musculares, sendo a parte mais desenvolvida do encéfalo. Além
disso, ele também armazena informações e é responsável por processos psíquicos
elaborados, que determinam inteligência e personalidade. (RUBINSTEIN;
CARDOSO, 2012)

Sua composição se dá pelos hemisférios cerebrais, juntamente ao diencéfalo.


Quanto a aparência, ela é geralmente comparada a uma noz. Já para funcionar
recebe em média 25% do sangue bombeado pelo coração.

Feldman (2016) apresenta a estrutura cerebral a partir do que alguns autores


chamam de cérebro antigo, que é uma parte que comanda atividades básicas,
como comer, dormir e respirar. Seria o chamado cérebro primitivo. Essa parte do
cérebro é composta por bulbo raquidiano, ponte, cerebelo e formação reticular.
O bulbo controla algumas funções corporais específicas, como respiração e
batimentos cardíacos. A ponte funciona como reguladora do sono e também
como um neurotransmissor de informações motoras, ao controlar os músculos
e seus movimentos tanto do lado direito quanto do lado esquerdo do corpo. O
cerebelo tem como função principal o controle do equilíbrio corporal, sem o qual
seria impossível andar em linha reta. Mas ele também está relacionado a funções
intelectuais de análise, de resolução de problemas e coordenação sensorial. Por
sua vez, a formação reticular funciona como um guarda, que vigia atentamente

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qualquer excitação corporal. Quando percebe alguma ameaça, ele ativa um


estado aumentado de atenção, até identificar qual deve ser a resposta. Como
essas atividades são consideradas menos sofisticadas, elas mesmas explicam a
designação de cérebro antigo.

Continuando com sua explanação, o autor também apresenta o cérebro novo,


assim chamado devido a sua evolução recente: ele é formado pelo córtex cerebral,
que faz do homem um ser diferenciado, distinto dos outros animais. Essa parte
do cérebro é dividida em quatro seções, os lobos: frontais, parietais, temporais
e occipitais, que são separados fisicamente pelos sulcos.

Além da estrutura física, o cérebro também é estudado a partir das funções


associadas a áreas específicas, entre as quais são conhecidas três principais: áreas
sensoriais, áreas de associação e áreas motoras. Essa divisão é uma simplificação
didática, pois é sabido que o comportamento recebe influência de diversas áreas
do cérebro ao mesmo tempo:

As pessoas usam diferentes áreas do cérebro quando criam frases


(uma tarefa verbal) em comparação a quando elas improvisam
melodias musicais. Além disso, quando as pessoas sofrem lesão
cerebral, porções intactas do cérebro às vezes podem assumir
as funções que antes eram gerenciadas pela área lesionada. Em
resumo, o cérebro é extraordinariamente adaptável. (FELDMAN,
2016, p. 74)

Portanto, o cérebro é a parte mais importante do SNC, pois é ele que favorece
a tomada de consciência de todas as informações coletadas por nossos órgãos
dos sentidos e também é o responsável pela interpretação dessas informações
coletadas, fazendo uma comparação entre as vivências e expectativas levantadas.
O cérebro é também responsável pela emissão de respostas, tanto as voluntárias
quanto as involuntárias, que são a expressão do nosso comportamento atuando
sobre o ambiente. Na mesma linha, ocorrem os processos mentais: pensamentos,
atenção e capacidade de julgamento. (COSENZA; GUERRA, 2011)

Por sua vez, a neurofilósofa canadense-americana Patrícia Churchland (1942)


afirma que a mente é produto do cérebro que executa tarefas complexas. Apear
disso, ela destaca que não somos máquinas e que os computadores, que podem
executar várias ações, mas o fazem de forma mecânica, sem compreensão do que
está sendo feito, estão muito distantes do comportamento humano. No livro O
Materialismo Eliminacionista, que ela escreveu com o marido Paul Churchland,
há indagações sobre qual seria a verdadeira natureza dos processos e estados

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mentais, em que meio eles ocorrem e como se relacionam com o mundo físico?
Em resposta, eles mostram que a capacidade de pensar sobre as coisas, sobre
a própria existência e tomar atitudes, implicam em dizer que seres humanos
possuem mentes, que os diferenciam dos demais animais.

Portanto, não causa nenhuma surpresa a que tentativa de esclarecer o que


significa ter uma mente esteja no centro das preocupações da tradição filosófica
ocidental. Afinal, tudo que vivemos, é processado e armazenado pelo cérebro,
cuja química é alterada a cada acontecimento e a cada aprendizagem.

Gazzaniga e Heatherton (2005) corroboram a afirmação do casal Churchland.


Para eles, a mente é referente à atividade mental, que acontece sempre que
pensamos em uma situação, que acionamos a nossa memória, que planejamos um
evento. Essa atividade mental é resultado de processos biológicos que acontecem
no cérebro, por meio da ação das suas células nervosas e também da associação
com as reações químicas.

Velho conceito de corpo e mente separados


Estudamos em René Descartes (1596 – 1650), filósofo, físico e matemático
francês, considerado o pai da filosofia moderna, o dualismo corpo e mente, ou
seja, como duas entidades separadas e irreconciliáveis. E ele não foi o primeiro
a falar disso, pois tirou essas ideias de Platão, considerado o pai da filosofia
ocidental. Freud também os estudou e tinha ideias similares sobre a separação do
corpo e da mente. E essa é a forma pela quais médicos e psicólogos mais antigos,
de uma maneira geral, estudaram e atuaram. Enquanto o médico procurava
“consertar” o corpo, pois a mente era irrelevante para ele, o psicólogo tratava a
mente sem se importar com o corpo.

Atualmente, cada vez mais profissionais olham o corpo e a mente como


inseparáveis ou como uma unidade interconectada. Antonio Damasio, um dos
grandes pensadores de nossa Era, em seu livro, O erro de Descartes, escreve sobre
moralidade separada do corpo, da parte espiritual, como algo que não existe
uma dimensão, que não pode ser mensurável, como pertencente a outro lugar:

Esse é o erro de Descartes: a separação em forma de um abismo entre


corpo e mente, entre o corpo como algo mensurável, dimensionável,
operado mecanicamente, divisível e de outro lado a mente como
algo não mensurável, não dimensionável, inflexível, indivisível [...]
sugestionando que a causa, o julgamento moral, e o sofrimento que
vêm da dor física ou emocional existem separadamente do corpo.

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Infelizmente, ainda hoje há pensadores e cientistas negacionistas, que separaram


os papeis do corpo e da mente. Mas ambos são um só e quando o separamos
pagamos um alto preço por isso, sem necessidade nenhuma.

Curiosidade sobre os três cérebros


As estruturas do cérebro, filogeneticamente mais antigas, são constituídas de uma
grande parte do tronco cerebral e, em particular, do sistema reticular implicado
na vigília, bem como dos núcleos cinzentos centrais implicados na motricidade.
Segundo a concepção tripartida de MacLean, essas estruturas correspondem ao
cérebro reptiliano que, além de ser o mais arcaico, rico em receptores opiáceos
e em dopamina, controla os comportamentos indispensáveis às necessidades
básicas e à sobrevida da espécie, como o ato de comer e a defesa do território.

Já o sistema límbico ou cérebro mamífero, também chamado de paleomamaliano,


envolve como um anel o cérebro reptiliano, na face interna dos hemisférios
cerebrais. A parte mais profunda, conectada ao hipotálamo, é constituída de
estruturas subcorticais, do hipocampo e da amígdala. A parte periférica do
anel corresponde ao córtex límbico, que é constituído do giro do hipocampo
(T5 ou giro para-hipocampal) e do giro do corpo caloso (giro do cíngulo) que,
em conjunto, constitui o grande giro límbico de broca ou gyrusfornicatus,
percorrido por um feixe associativo, o cíngulo, tem sua origem no córtex fronto-
orbital, que é completado pelo aparelho olfatório. Além disso, múltiplas conexões
unem o sistema límbico com o neocórtex (frontal, temporal) da face interna dos
hemisférios cerebrais, com os núcleos, ditos límbicos, do tálamo (sobretudo
os núcleos anterior e dorsomedial) e com a formação reticulada mesencefálica
(área límbica do mesencéfalo). Enfim, o sistema límbico compreende o circuito
de Papez, que é feito de fibras eferentes do hipocampo que, por intermédio do
trígono ou fórnix, atingem os corpos mamilares, fazem conexão com o feixe
mamilotalámico de Vicq d’Azyr, para chegar, enfim, ao núcleo anterior dos tálamos
e ao giro do cíngulo (ou cingular). O sistema límbico intervém na regulação dos
comportamentos instintivos e emocionais, como também na memória.

Acima dos cérebros reptiliano e límbico, abrem-se os hemisférios cerebrais cobertos


por um manto ou córtex cerebral e que constituem o cérebro neomamaliano que,
além de gerenciar as informações provenientes do meio ambiente, adapta as
ações, permite o desdobramento das funções cognitivas, com destaque para a
linguagem, e dá a capacidade de planificação, de antecipação do lobo frontal,
em que culmina a humanização do cérebro.

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Até a concepção do cérebro trino, que graças à neurociência, cuja função é


revisar, atualizar e comprovar teorias, tornou-se ultrapassada, não pode ser
imaginada sem as conexões que ligam as três estruturas entre si.

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CAPÍTULO 2
NEUROCIÊNCIA COGNITIVA

A neurociência cognitiva, ramo da neurociência e da psicologia, preocupa-se com


o estudo dos processos e aspectos biológicos, subjacentes à cognição, com foco
específico nas conexões neurais do cérebro que estão envolvidas nos processos
mentais. Portanto, para abordar como as atividades cognitivas são afetadas ou
controladas por circuitos neurais, a neurociência cognitiva se fundamenta tanto em
teorias da ciência cognitiva quanto em evidencias da neurobiologia e da modelagem
computacional ((também conhecida como neurociência teórica ou neurociência
matemática) que emprega modelos matemáticos, análises teóricas e abstrações
do cérebro para compreender os princípios que governam o desenvolvimento,
a estrutura, a fisiologia e as habilidades cognitivas do sistema nervoso. Já os
métodos que ela incluem procedimentos experimentais de psicofísica e psicologia
cognitiva, além de neuroimagem, funcional, eletrofisiologia, genômica cognitiva
e genética comportamental.

Em consequência de todos esses aspectos, a neurociência cognitiva também


se preocupa em estudar pacientes com déficits cognitivos oriundos de lesões
cerebrais, pois os danos sofridos, por alterar os circuitos neurais, fazem o cérebro
funcionar mal durante os processos cognitivos básicos e, assim, fornecem um
comparativo importante para os cérebros saudáveis, cujos circuitos neurais e​​ stão
funcionando bem, inclusive para se obter conclusões sobre a base dos processos
cognitivos afetados. Ao mesmo tempo, examina e estuda as habilidades cognitivas
baseadas no desenvolvimento do cérebro longo do tempo, com o objetivo de
analisar as diferenças e levantar possíveis razões para elas.

Figura 5. Neurociência cognitiva preocupa-se com o estudo dos processos e aspectos biológicos,
subjacentes à cognição, com foco específico nas conexões neurais.

Fonte: https://luisdegarrido.com/research/cognitive-neuroscience-and-neurobiology-luis-de-garrido/.

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A abordagem cognitiva
Conforme aponta Eysenck (2017) a abordagem cognitiva reconhece que os processos
cognitivos desempenham um importante papel tanto para o desenvolvimento
quanto para o tratamento dos transtornos mentais e, a cada dia, ocupa um espaço
cada vez maior. Já a neurociência cognitiva também é definida pelo mesmo
autor como a área que usa informações sobre o cérebro e o comportamento
como base para a compreensão da cognição humana. Consequentemente, para
os neurocientistas cognitivos é extremamente importante estudar o cérebro e o
comportamento, enquanto as pessoas estão envolvidas em atividades cognitivas,
pois elas são geradas por processos internos que ocorrem no cérebro. Tal estudo
é realizado a partir de diversas formas, entre as quais técnicas de imagem
cerebral, como imagem por ressonância magnética funcional (IRMf), e técnicas
eletrofisiológicas, a partir do registro de sinais elétricos emitidos pelo cérebro,
inclusive no caso dos efeitos que uma lesão cerebral pode provocar na cognição
humana.

Como já dizemos anteriormente, o estudo das lesões é realizado por se acreditar


que, ao investigar o prejuízo cognitivo que um paciente com lesão cerebral
apresenta, é possível obter tanto informações sobre como é o funcionamento
normal, quanto um indicativo das áreas cerebrais responsáveis pelos processos
cognitivos.

Por que esse interesse? Porque pelo uso de diferentes formas de investigar
detalhadamente o funcionamento da estrutura do cérebro surge à possibilidade
de se obter informações sobre a localização e o momento em que processos
cognitivos específicos ocorrem, ou seja, é possível estabelecer a ordem da ativação
de diferentes áreas cerebrais durante o desempenho de uma tarefa e, ao mesmo
tempo, saber se as mesmas áreas cerebrais podem ser acionadas igualmente por
duas tarefas ou se existe alguma diferença significativa. Eysenck (2017, pp. 12-
13) cita como principais técnicas para o estudo do cérebro, o(s)/a(s):

1. Registro de unidade isolada (ou de célula única): trata-se de uma


técnica que envolve a inserção no cérebro de um microelétrodo, de um
décimo de milésimo de um milímetro de diâmetro, para estudar a atividade
em neurônios isolados. Esse instrumento é muito sensível, uma vez que
alterações elétricas de um milionésimo de volt podem ser detectadas.

2. Potenciais relacionados a eventos (ERPs / ou estímulos muito


semelhantes): após vários eletrodos serem colocados no couro cabeludo
de um indivíduo qualquer, por meio da repetição, o padrão de atividade

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cerebral elétrica dele é registrado e calculado para produzir uma forma de


onda única. Apesar de essa técnica permitir investigar vários processos
cognitivos com muita precisão temporal, sua resolução espacial é muito
fraca.

3. Tomografia por emissão de pósitrons (PET): trata-se de uma técnica


que envolve a detecção de pósitrons (partículas atômicas emitidas por
algumas substâncias radioativas), que tem razoável resolução espacial,
mas pouca resolução temporal. Ela serve para medir a atividade neural de
forma indireta.

4. Imagem por ressonância magnética funcional (IRMf): essa técnica


envolve a imagem da oxigenação do sangue, usando uma máquina de imagem
por ressonância magnética (IRM). Sua resolução espacial e temporal são
superiores à PET. Porém, também fornece uma medida indireta da atividade
neural.

5. Imagem por ressonância magnética funcional relacionada a evento


(IRMfe): “envolve a separação dos elementos de um experimento em
pontos discretos no tempo, de modo que os processos cognitivos (e as
respostas cerebrais) associadas a cada elemento possam ser analisadas
independentemente” (HUETTEL, 2012, p. 1152). Em geral, a IRMf relacionada
a um evento é muito informativa , tanto que se tornou muito popular..

6. Magnetoencefalografia (MEG): é uma técnica que envolve a mensuração


dos campos magnéticos produzidos pela atividade elétrica cerebral.
Proporciona informações bastante detalhadas em nível de milissegundos
sobre o curso temporal dos processos cognitivos, que tem uma resolução
espacial razoavelmente boa.

7. Estimulação magnética transcraniana (TMS): nessa técnica uma bobina


é colocada próxima à cabeça do participante e uma pulsação de corrente
magnética muito breve passa através dela, produzindo um campo magnético
de vida curta que, geralmente (mas nem sempre), inibe o processamento
na área afetada do cérebro. Quando o pulso é repetido várias vezes em
uma rápida sucessão, há a estimulação magnética transcraniana repetitiva
(rTMS). Atualmente a rTMS é amplamente usada.

Note que, o autor não defende uma técnica em detrimento da outra. Ele apenas
aponta suas vantagens e limitações, destacando que em muitos momentos é
importante combinar técnicas de investigação diferentes, dependo do foco
da pesquisa.

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Para ampliar um pouco mais os conhecimentos sobre estimulação cerebral


não invasiva, sugerimos que assista os dois vídeos seguintes. Eles são longos,
mas valem a pena!

Pedro Schestatsky: “Estimulação cerebral nas doenças neuropsiquiátricas: será


o fim das pílulas?; https://www.youtube.com/watch?v=jn9kjdTFFiM.

HCPA - Grand Round - Estimulação cerebral não-invasiva (rTMS e tDCS) baseada


em evidências: https://www.youtube.com/watch?v=Nf0cljOXdTc.

Adendo importante
Além de lançar luz sobre os processos neurais subjacentes à mente humana,
a neurociência, inclusive a cognitiva, revolucionou a psicologia clínica ao
gerar avanços significativos em nossa compreensão das doenças psiquiátricas.
Ao comparar os cérebros de indivíduos saudáveis ​​com os de indivíduos com
transtornos psiquiátricos, os neurocientistas foram capazes de melhorar nosso
conhecimento tanto das causas dessas doenças quanto de seus tratamentos mais
eficazes.

Estudos de neuroimagem, por exemplo, já sugeriram que algumas pessoas


deprimidas podem ter hipocampos menores, o que pode estar relacionado ao
estresse, pois provavelmente houve uma diminuição da neurogênese no hipocampo.
Esse achado também é consistente com a evidência de que os medicamentos
antidepressivos servem para promover a neurogênese no hipocampo, mas como
esse processo leva muito tempo, ele também pode explicar por que os pacientes
demoram várias semanas, para perceber os efeitos dos antidepressivos. Embora os
antidepressivos produzam efeitos diretos sobre os níveis de neurotransmissores
que se acredita estarem envolvidos no humor, essas descobertas sugerem que a
neurogênese ainda é o mecanismo de ação mais significativo. Portanto, devem
ser desenvolvidos medicamentos que visem especificamente esse aspecto.

A esquizofrenia também ganha destaque nesse contexto. Uma variedade de


estudos neuroquímicos, de neuroimagem e de modelos animais apontou para
um papel proeminente do nível elevado de dopamina em uma parte do ,cérebro
chamada estriado, principalmente, por se pensa que uma das funções desse
neurotransmissor responsável por levar informações para várias partes do
corpo e, quando é liberado provoca a sensação de prazer e aumenta a motivação.
Portanto, cave a dopamina sinalizar a saliência dos estímulos externos. Como
o alimento que pode ser assinalado, por exemplo, como saliente é necessário

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Unidade ii | A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE

para a sobrevivência, os cientistas levantaram a hipótese de que a atividade


anormal da dopamina no corpo estriado pode causar estímulos inócuos de
saliência aberrante em indivíduos com esquizofrenia, dando origem a delírios
e alucinações sobre os estímulos em questão. Consequentemente, o mecanismo
chave dos medicamentos antipsicóticos é o bloqueio dos receptores de dopamina.

Além disso, a dopamina também está envolvida no vício, pois o neurotransmissor


desempenha um papel fundamental na motivação e na recompensa (que é certo
tipo de saliência) e, quando são ingeridas drogas que aumentam os níveis de
dopamina no circuito de recompensa, uma resposta condicionada é evocada.

Em indivíduos comuns, esse circuito de recompensa é mantido sob controle


por circuitos no córtex pré-frontal, cuja função é controlar o funcionamento
executivo, ou seja, a capacidade de resistir a desejos de curto prazo a serviço
de um objetivo de longo prazo. Já em indivíduos com dependência, a resposta
condicionada da droga é tão forte que os circuitos de recompensa substituem os
circuitos pré-frontais, resultando na busca compulsiva de drogas mesmo diante
de consequências negativas.

Constatamos, então que, a pesquisa contemporânea vem mostrando que a


neurociência e a psicologia podem trabalhar juntas para benefício mútuo, pois
quando aprendermos mais sobre a relação entre o mental e o físico, podemos
compreender melhor ambos. Além disso, a maioria dos estudos científicos do
sistema nervoso fornece insights cruciais sobre o funcionamento da mente e
do cérebro, o que é indispensável para a psicologia. Portanto, se a neurociência
permite-nos compreender os vários funcionamentos da mente operando por
meio de redes de conexões neurais, assim como os computadores operam por
meio de conexões elétricas, ao estudar como essas conexões neurais funcionam,
podemos compreender melhor tanto a cognição humana normal quanto a doença
quando essas conexões neurais dão errado.

De acordo com a Society for Neuroscience os conceitos centrais do cérebro enfocados


na Neurociência são:

1. O cérebro é o órgão mais complexo do corpo.

2. Os neurônios se comunicam usando sinais elétricos e químicos.

3. Os circuitos determinados geneticamente são à base do sistema nervoso.

4. As experiências de vida mudam o sistema nervoso.

5. A inteligência surge quando o cérebro raciocina, planeja e resolve problemas.

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A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE | Unidade ii

6. O cérebro torna possível comunicar conhecimentos por meio da linguagem.

7. O cérebro humano nos dá uma curiosidade natural para entender como o


mundo funciona.

8. As descobertas fundamentais promovem uma vida saudável e o tratamento


de doenças.

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CAPÍTULO 3
NEUROCIÊNCIA COGNITIVA NA PSICOLOGIA

Desde quando o filósofo, psicólogo e primeiro intelectual estadunidense a oferecer


um curso de psicologia nos Estados Unidos, William James (1842- 1910) escreveu
que para estudar psicologia em um nível científico, seria necessário primeiro
ter uma compreensão abrangente da biologia, em The Principles of Psychology,
um dos primeiros volumes a explorar a relação entre psicologia e biologia, esse
argumento se tornou tão histórico que, atualmente psicólogos vem recorrendo a
neurociência, em suas diversas subdivisões, para trabalhar com problemas que
envolvem a mente e o corpo, pois se os estados mentais são físicos, embora cada
um seja distinto ou uma subclasse do outro e se os estados físicos influenciam
os estados mentais e vice-versa, tudo isso constitui a base de muitas resoluções.

Apesar disso, enquanto a neurociência enfoca conjuntos de propriedades físicas, a


psicologia visa às contrapartes mentais. Aparentemente, as duas disciplinas podem
parecer díspares, mas a neurociência tem um papel a desempenhar na psicologia.
Portanto, ambas se complementam de várias maneiras, tanto que juntas, as
duas áreas podem ajudar a responder questões sobre cognição, comportamento,
desenvolvimento neural, neuropsicofarmacologia e plasticidade, por exemplo.
Afinal, compreender como o cérebro funciona em um nível científico e utilizar
a tecnologia de scanners cerebrais auxilia a identificação de correlações entre
o cérebro e os estados mentais.

Figura 6. Enquanto a neurociência enfoca conjuntos de propriedades físicas, a psicologia visa às


contrapartes mentais.

Fonte: https://hhd.psu.edu/graduate/dual-title-degree-programs/social-and-behavioral-neuroscience.

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A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE | Unidade ii

Isso é possível porque a neurociência criou maneiras novas e avançadas para os


cientistas avaliarem os processos biológicos que sustentam o comportamento, o
que, por sua vez, permite que os profissionais tomem decisões mais informadas
sobre intervenções e tratamentos mentais.

No caso do aprendizado, por exemplo, a neurociência cognitiva tem como


preocupação estrutural analisar e estudar, fundamentalmente, como os processos
cognitivos são produzidos. Tais processos envolvem atenção, memória, percepções,
pensamento, consciência, comportamento emocional, aprendizagem e linguagem,
que refletem o modelo dinamicista, em que as áreas cerebrais (auditiva, sensorial e
tátil-cinestésica, visual, planejamento consciente do comportamento e programas
de ação) além de se integrarem funcionalmente, influenciam-se ativamente pelo
meio sociocultural, bem como pelas relações sociais do homem.

Em um modelo mais atual e tecnológico, as funções cognitivas com base em


mecanismos de processamento de informação e construção de representações
mentais, trabalham para conceber os processos cognitivos em uma dimensão
corpórea e interativa com o ambiente. As ações dos sistemas cognitivos em
seus respectivos contextos demonstram um processo de adaptação ativa em
relação à base cerebral da atividade consciente humana, constituída por sistemas
funcionais complexos e diferenciados. Desse modo, é possível deduzir que
as funções mentais superiores são processos cognitivos, sendo essas funções
mentais superiores importantes para a aprendizagem numa relação direta com
a linguagem, mediando nossas funções psicocognitivas. (BASTOS; ALVES, 2013)

A partir de Luria (1992; 2006; 2010 apud BASTOS; ALVES, 2013), por exemplo,
podemos estudar os apontamentos científicos apresentados por Vygotsky, à
sua época, e continuadas exaustivamente pelo autor que conjecturava uma
ciência da consciência humana, que integrava os estímulos externos, valorizava
a importância do mundo exterior, sem, portanto, deixar descartar os aspectos
dos processos cognitivos.

Nesse contexto se faz jus observar que há avanços na história da ciência e, mais
precisamente da neurociência cognitiva, uma vez que, nos fins do século XVII,
o neuroanatomista alemão, fisiologista e pioneiro no estudo da localização
das funções mentais no cérebro, Franz Joseph Gael (1759 - 1828) sugeriu que
certas funções mentais superiores estariam localizadas em distintas áreas do
cérebro. Mais adiante, por volta do século XX, Vygotsky apresentou como
processos psicológicos superiores, as ações conscientemente controladas, a
atenção voluntária, a memorização ativa e o pensamento abstrato.

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Unidade ii | A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE

Portanto, ao retomarmos a história, poderemos observar avanços significativos


no desenvolvimento da neurociência cognitiva, que está sendo alargada desde o
final do século XVII, passando por períodos em que neurologistas e anatomistas
pesquisavam as bases neurológicas por meio de autópsias e de estudos clínicos
em pacientes com lesões cerebrais.

Já no início do século XXI, estudos avançados sobre neurociências, neuropsicologia


e neuroplasticidade vêm se desenvolvendo largamente e a prova disso é o trabalho
atual do professor neurocientista emérito da Universidade da Califórnia, Michael
Merzenich (1947), como comprova a reportagem apresentada pela Revista Exame
em 29 de abril de 2016.

Na ocasião, ele explicou que, desde os anos de 1960, quando ainda predominava
entre neurocientistas a ideia de que o cérebro seria um órgão estático, pré-
moldado sob estrita ordenação genética, já defendia que era possível, ao longo de
toda a vida, criar novos circuitos e conexões neuronais em resposta a estímulos
e experiências, o que resultaria em mudanças funcionais.

Portanto, teorias sobre a neuroplasticidade formuladas tanto por Merzenich


quanto por outros neurocientistas contemporâneos abriram perspectivas
revolucionárias, para crianças com dificuldades de aprendizado e para pessoas
com lesão cerebral decorrente de trauma ou de doenças como acidente vascular
cerebral (AVC). Nas décadas de 1970 e 1980, por meio de experimentos com
animais, Merzenich também demonstrou que os circuitos neuronais e as sinapses
se modificavam rapidamente de acordo com a atividade praticada. Em um dos
seus ensaios, rearranjou os nervos na mão de um macaco e observou que as
células do córtex sensorial do animal rapidamente se reorganizaram para criar
um novo mapa mental daquele membro.

Já no fim dos anos 1980, ele se integrou ao grupo da Universidade da Califórnia


em São Francisco que desenvolveu o implante coclear. Em 1996, fundou a
Scientific Learning Corporation, empresa que desenvolve softwares voltados a
aprimorar o aprendizado infantil com base em modelos de plasticidade cerebral.
Foi também um dos fundadores, em 2004, da empresa Posit Science, da qual
é cientista chefe, que desenvolve softwares para treinamento cerebral, como o
BrainHQ,. com base nos resultados de suas próprias pesquisas.

Nos últimos anos, Merzenich tem se dedicado a verificar se a prática de exercícios


intelectuais pode ajudar a remodelar as funções cerebrais, na tentativa de
possibilitar a recuperação de habilidades perdidas por causa de doenças, lesões

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A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE | Unidade ii

ou envelhecimento. Seus estudos já foram publicados em mais de 150 artigos


científicos, muitos deles em revistas de grande impacto, como Science e Nature.
Graças a tudo isso, recebeu diversos prêmios acadêmicos, como o RussPrize,
o IpsenPrize e o ZülchPrize. Em 2013, Merzenich publicou o livro Soft-Wired:
Howthe New Science of Brain Plasticity Can Change Your Life (ainda sem
publicação em português, mas cujo título em nossa lingua poderia ser Como a
nova ciência da plasticidade cerebral pode mudar sua vida), no qual apresenta
estratégias para que pessoas comuns possam assumir o controle dos processos
de plasticidade cerebral e, assim, melhorar sua qualidade de vida.

Efeitos positivos da união entre a psicologia e a


neurociência
Quando ambas as áreas se unem, sempre surgem muitos efeitos positivos em
relação às condições que afetam a saúde mental e o comportamento. Entre outros
exemplos, podemos citar:

» Abuso de drogas – Nos últimos anos, tem havido muitas pesquisas sobre
as causas do abuso de drogas, incluindo avaliações neurocientíficas que
analisam como as influências externas afetam o processamento inconsciente
e impulsionam o comportamento viciante. Sabemos que há uma série
de fatores que contribui para o início do vício e alguns neurocientistas
sugerem que, assim como os fundamentos neuroquímicos do vício, o status
socioeconômico de uma pessoa influencia seu bem-estar por meio do
processamento inconsciente, criando uma necessidade maior de recompensas
adicionais no cérebro.

» Ansiedade - Os transtornos de ansiedade são caracterizados por sentimentos


persistentes de mal-estar ou preocupação. Já os tratamentos podem assumir
a forma de terapia ou de medicação, pois ambas apresentam vários graus de
sucesso. Porém, uma descoberta recente baseada na neurociência pode mudar
a forma como alguns ansiolíticos são formulados, pois os pesquisadores da
Universidade de Alberta, em 2018, identificaram uma via cerebral, que pode
ser um novo alvo para medicamentos para reduzir a ansiedade. Ao avaliaram
um mensageiro químico do cérebro chamado NPY em relação à região da
amígdala sensível ao estresse, eles encontraram o mecanismo pelo qual a
substância química ajuda a reverter a resposta ao estresse causada pelo
hormônio CRH. Como ambos os produtos químicos usam os mesmos canais,
os pesquisadores foram capazes de identificar e inibir a produção da proteína

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Unidade ii | A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE

causadora da ansiedade até que os canais eventualmente desapareçam,


fornecendo um alvo potencial para a produção de novos medicamentos.

» Autismo - Com um amplo espectro de condições, o autismo é caracterizado


por desafios em áreas como habilidades sociais, comportamento e comunicação
verbal e não verbal. Diante dessas condições, as pesquisas em neurociências
já estão contribuindo com informações importantes em relação a quando e
como o autismo é diagnosticado, ao mesmo tempo em que também ajudam
a esclarecer as características da doença em termos de atividade cerebral.
Entre outros aspectos, os pesquisadores já foram capazes de identificar
diferenças estruturais e funcionais no cérebro de pessoas com autismo e
distúrbios relacionados ao espectro; como bem descobriram que a região
do cérebro da amígdala é subativa quando pessoas com autismo tentam
ler expressões faciais. Além disso, como mais homens do que mulheres são
afetados pelo transtorno, os neurocientistas da Universidade de Cambridge,
desde 2019, vêm explorando o impacto dos níveis de testosterona fetal
e concluíram que níveis mais elevados no pré-natal estão associados a
habilidades sociais reduzidas, além de outros marcadores de autismo que
podem ajudar na identificação precoce

» Depressão clínica - Caracterizada por persistente desânimo, a depressão


clínica tem sido tratada por meio de vários ramos da neurociência. Estudos
usaram varreduras cerebrais antes de um curso de tratamento para identificar
mudanças em indivíduos com depressão, com resultados mostrando que
alguns tipos de tratamento funcionam melhor para indivíduos com ativação
basal relativamente normal da região cerebral do córtex cingulado anterior
subgenual (sgACC), enquanto alguns funcionaram melhor para aqueles
com ativação de sgACC de linha de base anormal (Roiser 2015). A partir
de tais estudos, os dados podem ser coletados e usados ​​para informar as
seleções de tratamento para indivíduos com depressão clínica. Entre eles,
por exemplo, alguns podem responder melhor aos tratamentos psicológicos;
enquanto outros, ao tratamento farmacológico.

» Doença de Alzheimer - Caracterizado pela deterioração cognitiva, o


Alzheimer leva a um declínio nas habilidades intelectuais e ainda pode
causar mudanças na personalidade e no comportamento do indivíduo. Por
meio da neurociência aplicada a animais, os pesquisadores descobriram
que a perda de memória associada à idade pode ser reversível usando
uma abordagem de transferência de genes. Em estudos com macacos, os
cientistas identificaram que os neurônios de controle em uma área do

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A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE | Unidade ii

cérebro encolhem com a idade e param de produzir substâncias químicas


reguladoras que afetam a capacidade de raciocínio e a memória. Ao inserir
um fator de crescimento do nervo nas células e reinjetá-lo no cérebro dos
macacos, os cientistas conseguiram restaurar a contagem e a função das
células, fornecendo informações valiosas sobre o potencial de tratamento de
doenças relacionadas à idade em humanos, conforme informou em 2019, o
National Institute on Aging (NIA/Instituto Nacional em Envelhecimento),
uma divisão do National Institutes od Healtg (NIH) estadunidense.

» Doença de Huntington – Trata-se de uma desordem neurológica que


causa movimentos involuntários e deficiência intelectual, causada por
uma sequência de DNA defeituosa que cria proteínas tóxicas e danifica os
neurônios dos doentes. A doença de Huntington ainda não tem cura, mas
a neurociência está ajudando a encontrar uma solução, tanto que, além de
vários tipos de terapia de edição de genes que já foram aplicados por meio
de pesquisas nos últimos anos, um novo sistema gerado em 2018 se mostrou
promissor em termos de ser mais seguro e específico do que as criações
anteriores. Nesse sistema uma fita de DNA é cortada para desativar o gene
defeituoso e prevenir a produção da proteína tóxica. Tal procedimento
indica uma possível cura futura para Huntington.

» Esquizofrenia – Como um transtorno psiquiátrico caracterizado por


percepção prejudicada da realidade, a esquizofrenia tem uma variedade
de sintomas debilitantes, incluindo psicose e alucinações. Por meio da
neurociência, já houve alguns avanços na categorização dos sintomas e
na atribuição às estruturas e funções cerebrais, com o objetivo de ajudar
a desenvolver e melhorar as estratégias de tratamento. Além disso, como
os cientistas já descobriram quando e onde as alterações da dopamina
ocorrem no cérebro dos pacientes, a neurociências também está ajudando
tanto no avanço da pesquisa farmacológica quanto na compreensão sobre
quais sistemas neurotransmissores e regiões cerebrais estão envolvidas
no problema, no intento de identificar as principais características
neurobiológicas e neuroquímicas da esquizofrenia.

» Mal de Parkinson – Como um distúrbio degenerativo do sistema nervoso,


o Parkinson causa comprometimento das células nervosas do cérebro que
controlam o movimento, afetando também as habilidades de tomada de
decisão de uma pessoa. Nesse âmbito, a neurociência, inclusive a cognitiva, já
bem ajudando a compreender melhor o curso da doença de várias maneiras,
incluindo a criação de modelos computacionais que oferecem uma visão

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Unidade ii | A NEUROCIÊNCIA COMO NOVIDADE

sobre a força das conexões dentro da região dos gânglios basais do cérebro.
Portanto, como essas conexões diferem em pacientes com Parkinson, elas
podem ajudar os psicólogos a criarem terapias personalizadas para padrões
de degeneração neural.

Note que, essas são apenas várias áreas diretamente relacionadas à psicologia
nas quais a neurociência está fazendo uma imensa diferença.

Neurociência, Reabilitação Cognitiva e Modelos de Intervenção em


Terapia Ocupacional – A terceira edição do livro organizado por Noomi
Katz, PhD em terapia ocupacional e, desde 2007, presidente do Centro de
Pesquisa do Ono Academic College, em Kiryat Ono, Israel, representa um
avanço expressivo na transposição do conhecimento sobre cognição e suas
aplicações teóricas e prática ao exercício da terapia ocupacional. Trata-se de
ferramenta funcional para estudantes e profissionais da área compreendem
o desempenho humano e, assim, melhorarem sua atuação. Escritos por
renomados especialistas, os capítulos enfatizam a cognição essencial à vida
cotidiana e abordam tópicos e modelos gerais de intervenção, baseados em
evidências científicas e fundamentados na prática, considerando todo o ciclo
de vida de crianças, adolescentes, adultos e idosos com deficiências cognitivas
e distúrbios relacionados. A primeira parte dele fornece uma visão geral, em
oito capítulos, que serve de base para os muitos modelos de intervenção
apresentados na Parte 2, que, por sua vez, tem dez capítulos, que refletem
a literatura contemporânea, fornecem novos estudos de caso e discutem as
mais recentes pesquisas na área. Para facilitar o processo de aprendizagem,
cada capítulo ainda conta com as sessões “Objetivos de aprendizado” e
“Questões de revisão”. Publicado pela Editora Santos, o exemplar com 432,
aproximadamente, custa R$ 241,00 reais.

24
REFERÊNCIAS

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comportamento. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2000.

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Figura 11. https://www.elle.com/it/blog/news/a1371434/emoticon-emoji-telefonata-faccine-disegnini/.

Figura 12. theconversation.com/no-crying-doesnt-release-toxins-though-it-might-make-you-feel-better-


if-thats-what-you-believe-106860.

Figura 13. http://www.anthonybontrager.com/2017/09/26/eq-critical-leaders/.

Tabelas
Tabela 1. Bear, Connors e Paradiso, 2008.

Tabela 2. Lundy-Ekman, 2008.

Tabela 3. Gazzaniga, Heatherton, 2005.

Quadros
Quadro 1. https://www.slideserve.com/leo-love/linguagem (slide 10/56).

Quadro 2. https://www.diferenca.com/emocao-e-sentimento/.

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