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HISTÓRIA DO

BRASIL: IMPÉRIO E
REPÚBLICA

Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

GRADUAÇÃO

Unicesumar
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Administração
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de EAD
Willian Victor Kendrick de Matos Silva
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi

NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Direção de Operações
Chrystiano Mincoff
Direção de Mercado
Hilton Pereira
Direção de Polos Próprios
James Prestes
Direção de Desenvolvimento
Dayane Almeida
Direção de Relacionamento
Alessandra Baron
Direção de Planejamento de Ensino
Fabrício Lazilha
Direção Operacional de Ensino
Katia Coelho
Supervisão do Núcleo de Produção de
Materiais
Nalva Aparecida da Rosa Moura
Design Educacional
Rossana Costa Giani
Projeto Gráfico
Jaime de Marchi Junior
José Jhonny Coelho
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a
Distância:
Editoração
História do Brasil : Império e República. Luciene Maria Robson Yuiti Saito
Pires Pereira.
Maringá - PR, 2015.
Revisão Textual
293 p. Simone Limonta
“Graduação - EaD”. Viviane Favaro Notari

1. Brasil. 2. História. 3. Império. 4. República EaD. I.Título. Ilustração


André Luís Onishi
CDD - 22 ed. 981
CIP - NBR 12899 - AACR/2

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário


João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828
Viver e trabalhar em uma sociedade global é um
grande desafio para todos os cidadãos. A busca
por tecnologia, informação, conhecimento de
qualidade, novas habilidades para liderança e so-
lução de problemas com eficiência tornou-se uma
questão de sobrevivência no mundo do trabalho.
Cada um de nós tem uma grande responsabilida-
de: as escolhas que fizermos por nós e pelos nos-
sos farão grande diferença no futuro.
Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar
assume o compromisso de democratizar o conhe-
cimento por meio de alta tecnologia e contribuir
para o futuro dos brasileiros.
No cumprimento de sua missão – “promover a
educação de qualidade nas diferentes áreas do
conhecimento, formando profissionais cidadãos
que contribuam para o desenvolvimento de uma
sociedade justa e solidária” –, o Centro Universi-
tário Cesumar busca a integração do ensino-pes-
quisa-extensão com as demandas institucionais
e sociais; a realização de uma prática acadêmica
que contribua para o desenvolvimento da consci-
ência social e política e, por fim, a democratização
do conhecimento acadêmico com a articulação e
a integração com a sociedade.
Diante disso, o Centro Universitário Cesumar al-
meja ser reconhecido como uma instituição uni-
versitária de referência regional e nacional pela
qualidade e compromisso do corpo docente;
aquisição de competências institucionais para
o desenvolvimento de linhas de pesquisa; con-
solidação da extensão universitária; qualidade
da oferta dos ensinos presencial e a distância;
bem-estar e satisfação da comunidade interna;
qualidade da gestão acadêmica e administrati-
va; compromisso social de inclusão; processos de
cooperação e parceria com o mundo do trabalho,
como também pelo compromisso e relaciona-
mento permanente com os egressos, incentivan-
do a educação continuada.
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está
iniciando um processo de transformação, pois quan-
do investimos em nossa formação, seja ela pessoal
ou profissional, nos transformamos e, consequente-
Diretoria Operacional mente, transformamos também a sociedade na qual
de Ensino
estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando
oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capa-
zes de alcançar um nível de desenvolvimento compa-
tível com os desafios que surgem no mundo contem-
porâneo.
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo
este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialó-
gica e encontram-se integrados à proposta pedagó-
gica, contribuindo no processo educacional, comple-
mentando sua formação profissional, desenvolvendo
competências e habilidades, e aplicando conceitos
teóricos em situação de realidade, de maneira a inse-
ri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais
têm como principal objetivo “provocar uma aproxi-
mação entre você e o conteúdo”, desta forma possi-
bilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos
conhecimentos necessários para a sua formação pes-
soal e profissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cres-
cimento e construção do conhecimento deve ser
apenas geográfica. Utilize os diversos recursos peda-
gógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possi-
bilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente
Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e en-
quetes, assista às aulas ao vivo e participe das discus-
sões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de
professores e tutores que se encontra disponível para
sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de
aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui-
lidade e segurança sua trajetória acadêmica.
AUTORES

Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira


Graduação em História pela Universidade Estadual de Maringá (2005).

Especialização em História Econômica pela Universidade Estadual de Maringá


(2008).

Mestrado em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita


Filho/FCL de Assis (2011).

Especialização em Educação Especial pelo Instituto Paranaense de Ensino –


Maringá/PR (2013).

Especialização em Psicopedagogia Institucional pelo Instituto Paranaense de


Ensino-Maringá/PR (em andamento).

Especialização em Atendimento Educacional Especializado – UniCesumar


(em andamento).

Membro da Sociedade Internacional de Estudos Jesuíticos.


APRESENTAÇÃO

HISTÓRIA DO BRASIL: IMPÉRIO E REPÚBLICA

SEJA BEM-VINDO(A)!
Caro(a) acadêmico(a) do curso de Licenciatura em História da UniCesumar, o livro que
você está prestes a estudar foi elaborado com muito carinho e satisfação e tem por obje-
tivo auxiliá-lo(a) no processo de aprendizagem sobre a formação e a evolução do Brasil,
do período imperial à contemporaneidade.
Antes de iniciarmos nosso estudo, gostaria de fazer uma breve apresentação sobre mi-
nha formação. Sou formada em História pela Universidade Estadual de Maringá, no Pa-
raná, na qual também realizei uma especialização em História Econômica. Possuo uma
especialização em Educação Especial, realizada no Instituto Paranaense de Ensino – Ma-
ringá/PR e sou mestre em História, na linha de Políticas: ações e representações, pela
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP. Além do Ensino Supe-
rior, trabalho na Educação Básica, na rede regular e na educação especial.
Feita a apresentação, gostaria de ressaltar que o objetivo deste livro é possibilitar que
você adquira o conhecimento necessário sobre o período abordado para que possa
atuar como professor(a) de História. Nesse sentido, o livro conta com informações fun-
damentadas em autores clássicos, especialistas no período e que você deve conhecer.
Além disso, traz sugestões de livros, documentos históricos, filmes, sites e atividades de
análise e de reflexão que vão enriquecer a sua aprendizagem.
Compreender o processo de formação do Brasil desde a independência de Portugal até
a (re)construção da sociedade após o período da ditadura militar (1964-1985) não é ta-
refa simples. Por essa razão, é importante que você tenha disciplina e dedicação para
vencer os assuntos e as atividades propostas ao longo de todo o livro, além de aprovei-
tar ao máximo os recursos e as dicas apresentados aqui e, também, aqueles oferecidos
pela UniCesumar.
Com o livro que apresento e com o seu esforço e a sua dedicação, tenho certeza de que
nossa viagem pela história do Brasil ocorrerá de maneira prazerosa e você apreenderá
as nuances que caracterizaram esse rico período da nossa história.
Ao longo deste livro, caro(a) acadêmico(a), discorreremos acerca das conjunturas que
permearam o processo de emancipação política do Brasil em 1822, evidenciando o pro-
cesso de construção da identidade nacional do país recém-emancipado até a segunda
metade do século XX.
Iniciamos nossa primeira unidade com uma análise do processo de independência do
Brasil e buscamos a compreensão de como o novo país se organizou enquanto nação
independente. Entender como os projetos e as ideologias presentes nas lutas pela inde-
pendência se organizaram e se articularam após 1822 também é uma preocupação so-
bre a qual nos debruçaremos nessa primeira unidade, que discute as relações políticas,
econômicas e sociais até o período das regências.
Na segunda unidade, nosso objetivo é compreender as conjunturas que caracterizaram
o reinado de D. Pedro II e que possibilitaram a discussão sobre a mudança do regime
imperial para o republicano. Analisar o contexto e as circunstâncias que permitiram que
APRESENTAÇÃO

os movimentos abolicionista e republicano ganhassem espaço na sociedade brasi-


leira é fundamental para que sejamos capazes de apreender as mudanças nas bases
sobre as quais o Brasil se sustentava.
A terceira unidade é dedicada ao estudo da consolidação da República no Brasil e
à análise das rupturas e das continuidades das características das forças políticas,
econômicas e sociais no país. Compreender a ideia de democracia que a sociedade
do final do século XIX e início do século XX tinha contribui para que possamos en-
tender as transformações pelas quais o país passou ao longo do século XX.
Na quarta unidade, nosso objeto de estudo é a ascensão dos regimes autoritários
no Brasil a partir do governo de Getúlio Vargas e do golpe de 1964 que instaurou a
ditadura militar no Brasil. Nesse momento, o objetivo é verificar como o conceito de
democracia foi manipulado a partir dos interesses de uma minoria e como a socie-
dade reagiu a essa manipulação.
Na quinta e última unidade de nosso livro, discutiremos o período da ditadura mili-
tar brasileira, com o objetivo de conhecermos e compreendermos a realidade bra-
sileira numa época na qual as liberdades, os direitos e a democracia deixaram de
existir para a maioria da população. Conhecer essa parte da história do Brasil é vital
para que, em tempos de turbulências políticas, econômicas e sociais, não se evoque
um passado que deixou marcas indeléveis nos brasileiros. Terminamos nosso estu-
do sobre nosso país analisando o processo de redemocratização do Brasil e a sua
organização a partir de 1985.
Espero, caro(a) acadêmico(a), que você aprecie o livro que recebe e que o aproveite
ao máximo para conhecer nossa história, enriquecendo o seu conhecimento, e que
você leve o conhecimento aqui adquirido para as salas de aula, contribuindo para
a formação de cidadãos críticos e conscientes. Espero, também, que o desejo de
se aprofundar nas temáticas aqui apresentadas desperte o interesse pela pesquisa
acadêmica, essencial para nossa completa formação.
09
SUMÁRIO

UNIDADE I

O IMPÉRIO DO BRASIL: ESTUDO DO PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA DO


BRASIL E A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO

15 Introdução

16 Análise do Processo de Independência do Brasil

25 Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O


Primeiro Reinado

38 A Crise do Primeiro Reinado e a Abdicação de D. Pedro I

47 O Período Regencial (1831-1840)

58 Considerações Finais

UNIDADE II

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


ANÁLISE DO PROCESSO DE TRANSIÇÃO DO FIM DA MONARQUIA PARA
O INÍCIO DA REPÚBLICA BRASILEIRA

67 Introdução

68 O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II

79 A Economia no Período Imperial Brasileiro

86 O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial

96 O Movimento Republicano e o Fim da Monarquia no Brasil

104 Considerações Finais


SUMÁRIO

UNIDADE III

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA


REPÚBLICA
NO BRASIL E AS TRANSFORMAÇÕES NA SOCIEDADE BRASILEIRA NO
INÍCIO DO SÉCULO XX

111 Introdução

112 República Velha ou República da Espada

135 Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho


Assalariado: As Transformações Econômico-Sociais na Primeira República

151 Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930

161 Considerações Finais

UNIDADE IV

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


E A SUPRESSÃO DA “DEMOCRACIA” BRASILEIRA: DA ERA VARGAS À
DITADURA MILITAR

169 Introdução

170 Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)

186 A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)

201 Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da


Ditadura Militar no Brasil

218 Considerações Finais


11
SUMÁRIO

UNIDADE V

OS ANOS DE CHUMBO: A DITADURA MILITAR NO BRASIL E O LONGO


PROCESSO DE REDEMOCRATIZAÇÃO

225 Introdução

226 A Consolidação do Golpe de 1964 e a Organização do Estado Militar

235 O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular: Manifestações e


Organizações Populares Contra a Repressão

247 As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País

268 Considerações Finais

275 Conclusão
277 Referências
Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

I
O IMPÉRIO DO BRASIL:

UNIDADE
ESTUDO DO PROCESSO DE
INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E A
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO

Objetivos de Aprendizagem
■■ Analisar o processo de Independência do Brasil.
■■ Compreender o processo de formação do Estado brasileiro após a
separação de Portugal.
■■ Entender as discussões acerca da organização política e econômica
do Estado em formação.
■■ Verificar a constituição social do Brasil pós-independência e suas
relações e participações na construção do Estado brasileiro.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Análise do processo de Independência do Brasil
■■ Aspectos da formação do Estado brasileiro pós-independência: o
Primeiro Reinado
■■ A crise do Primeiro Reinado e a abdicação de D. Pedro I
■■ O Período Regencial (1831-1840)
15

INTRODUÇÃO

Prezado(a) aluno(a), ao longo da disciplina de Brasil Colônia, você se debruçou


sobre o início da ocupação e da colonização do território brasileiro por parte de
Portugal e sobre a formação de uma sociedade baseada nos princípios do Pacto
Colonial. Após conhecer e analisar o desenvolvimento do Brasil durante todo o
período em que esse esteve sob domínio de Portugal, você analisará o desenvol-
vimento do país enquanto Estado e nação independente.
Nesta primeira unidade, discorreremos acerca do contexto no qual se desen-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

volveu o projeto de emancipação política do Brasil, analisando os fatores políticos,


econômicos e sociais que permearam esse processo e compreenderemos a ação
dos atores sociais que atuaram e/ou contribuíram para a concretização do pro-
jeto de separação entre Brasil e Portugal.
Ao abordarmos o pretenso fim da dependência política do Brasil em relação
a Portugal, é imprescindível nos atentarmos para a maneira como o recém-in-
dependente país buscou constituir suas bases e construir uma identidade que
representasse a miscelânea de povos e de culturas que aqui se encontravam, levan-
do-se em consideração a influência de ideias largamente difundidas na Europa
naquele momento que se contrapunham à realidade política e social do Brasil.
Nesse sentido, nossa análise sobre esse primeiro momento do Brasil enquanto
país independente irá se fundamentar na discussão sobre as rupturas e/ou as
permanências de ideias e de instituições presentes no contexto do processo de
emancipação política do Brasil e na fundamentação das bases organizacionais
do país, contrapondo o discurso adotado ao longo das lutas de independência à
estrutura colocada em prática após a separação de Portugal.
Compreendendo essa primeira unidade da evolução histórica do Brasil
enquanto Estado, você, caro(a) aluno(a), terá dado o primeiro passo para um
melhor entendimento das instituições e dos conceitos vigentes em nosso país na
atualidade. Pronto para começarmos?

Introdução
I
©shutterstock

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Monumento à Proclamação da Independência – São Paulo

ANÁLISE DO PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA DO


BRASIL

Embora o marco da emancipação política do Brasil tenha sido definido em 7


de setembro de 1822, a ideia ou antes o desejo de uma ruptura com Portugal
configurou-se no interior da colônia muito antes dessa data. Analisando a histo-
riografia a respeito desse tema, é possível observar a corroboração de inúmeros
estudiosos à ideia de que a transferência da família real portuguesa para as ter-
ras brasileiras, no início do século XIX, contribuiu para o estabelecimento de
uma conjuntura que fez nascer – ou que intensificou – o vislumbre da formação
de um país livre do julgo dominador de Portugal.
Tais conjunturas dizem respeito à configuração de uma estrutura governa-
mental que representou uma modificação do papel da colônia dentro do contexto
do antigo sistema colonial, na medida em que o Brasil adquiriu status de sede
do governo imperial, este estabelecido em um primeiro momento na Bahia e,
posteriormente, na cidade do Rio de Janeiro. Essa nova condição da colônia
exigiu uma série de investimentos na criação de uma estrutura condizente com
sua nova realidade que suscitou o debate acerca da relevância do país diante do
cenário que se desenhava.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
17

Conforme aponta Faoro (1976, p. 249), as consequências imediatas da chegada


e da instalação da família real portuguesa no Brasil traduziu-se no fechamento
dos portos da metrópole, fato que a impossibilitava de exportar produtos e/ou
adquirir bens e produtos necessários à sua subsistência, na ruptura do Pacto
Colonial a partir da abertura dos portos brasileiros à Inglaterra e às nações amigas
e, por fim, na centralização do poder que aglutinava as “dispersas e desarticu-
ladas capitanias”.
Diante do estabelecimento desse novo cenário que, no entendimento de mui-
tos historiadores, representava um prolongamento das instituições existentes em
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Lisboa – antiga sede do governo colonial português – e que não respeitava as


características próprias da colônia, os conflitos entre essas duas partes do império
português se acentuaram, levando ao início de uma guerra política e ideológica
que teve como consequência as lutas pela emancipação da colônia.
As revoltas ocorridas ao longo do período colonial, sobretudo a Inconfidência
Mineira (1789) e a Conjuração Baiana (1798), ambas com caráter separatista, já
demonstravam a insatisfação de setores da sociedade brasileira com a adminis-
tração portuguesa, insatisfação essa que ganhou corpo quando da transferência
da família real para esse território e das consequências decorrentes desse evento
durante a da primeira metade do século XIX.
No momento em que o Brasil foi elevado à condição de reino, passando a
integrar o Reino Unido de Portugal e Algarves (1815), as divergências ideológi-
cas entre os que viviam deste e do outro lado do Atlântico foram acentuadas e a
manutenção da ordem vigente até então tornou-se cada vez mais difícil.

Análise do Processo de Independência do Brasil


I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Carta de Lei elevando o Brasil a Reino Unido ao de Portugal e do Algarves, RJ, Arquivo Nacional, 1815
Fonte: MultiRio (online).

Inseridos nesse quadro de instabilidade e de dificuldades da monarquia portu-


guesa em conciliar diferentes interesses em uma sociedade composta por grupos
sociais diversificados, aqueles que, entre as décadas finais do século XVII e iní-
cio do século XVIII, esboçaram o ideal separatista e tiveram que articular seus
interesses a uma discussão e a um movimento que, para além de questões polí-
ticas, perpassava o entendimento e – conforme veremos após a declaração de
independência – a adaptação das ideologias presentes nos discursos que emba-
savam a concepção de uma emancipação política do Brasil.
A presença de instituições portuguesas em solo brasileiro e a constante
intervenção das Cortes de Lisboa na administração do Brasil, impedindo o seu
progresso, deram aos intelectuais do período os motivos para elaborarem um
discurso influenciado pelos últimos acontecimentos da Europa e da América,
quais sejam: a Revolução Francesa e as independências dos Estados Unidos e
das colônias espanholas.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
19

A esse fato somou-se uma realidade na qual os portugueses que aqui se ins-
talaram a partir de 1808 eram nomeados para cargos na administração joanina
ou enriqueciam devido aos privilégios a eles concedidos pela coroa, aumentando
a insatisfação dos brasileiros. Além dessa insatisfação, o incremento do comér-
cio, ocorrido a partir da abertura dos portos e do fim dos monopólios impostos
pelo Pacto Colonial, fez com que brasileiros de diferentes setores sociais passas-
sem a apoiar os intelectuais e seus ideais liberais, embora com uma interpretação
própria desse conceito, voltada para a defesa de seus próprios interesses.
Nesse sentido, de acordo com Faoro (1976, p. 246), o liberalismo que embalava
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

os ideais separatistas no Brasil entre os séculos XVII e XVIII era mais justifica-
dor do que doutrinário, visto que aqueles que compunham o estrato mais rico
da sociedade brasileira defendiam uma política liberal em prol de seus próprios
interesses, combatendo uma possível participação política das classes menos pri-
vilegiadas de nossa sociedade.
Corroborando com a análise de Faoro sobre a concepção de liberalismo no
Brasil, Emília Viotti da Costa destaca que
Na Europa, o liberalismo era uma ideia burguesa voltada contra as Ins-
tituições do Antigo Regime, os excessos do poder real, os privilégios da
nobreza, os entraves do feudalismo ao desenvolvimento da economia.
No Brasil, as ideias liberais teriam um significado mais restrito, não se
apoiariam nas mesmas bases sociais, nem teriam exatamente a mes-
ma função. Os princípios liberais não se forjaram, no Brasil, na luta
da burguesia contra os privilégios da aristocracia e da realeza. Foram
importados da Europa. Não existia no Brasil da época uma burguesia
dinâmica e ativa que pudesse servir de suporte a essas ideias. Os adep-
tos das ideias liberais pertenciam às categorias rurais e sua clientela. As
camadas senhoriais empenhadas em conquistar e garantir a liberdade
de comércio e a autonomia administrativa e judiciária não estavam, no
entanto, dispostas a renunciar ao latifúndio ou à propriedade escrava
(COSTA, 2010, p. 28).

O que esse contexto nos permite observar é que, embora com a instalação da
família real no Rio de Janeiro e a elevação do Brasil à condição de Reino Unido
de Portugal e Algarves o país tenha recebido investimentos que contribuíram
para a melhoria das condições econômicas e sociais – mesmo que estas tenham
sido sentidas de maneiras diferentes pelos diferentes setores da sociedade bra-
sileira –, a administração joanina precisou lidar com a fragilidade do seu poder

Análise do Processo de Independência do Brasil


I

real, visto que setores e ideias distintas em relação à situação vigente começa-
ram a emergir tanto no interior do Brasil quanto em Portugal.
As revoluções de 1817 (Pernambuco) e 1820 (Lisboa) mostram que os rumos
adotados por D. João VI na condução da administração de seus domínios não
satisfaziam os interesses de muitos. A primeira, representada pela “aliança entre
propriedade agrária e as concepções liberais definiu um ideário com o liberalismo
forrado de energia republicana” (FAORO, 1976. p.263) e a segunda, era repre-
sentada pelo questionamento da elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal
e Algarves, questionamento esse suscitado pelo desenvolvimento do Brasil em

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
detrimento de Portugal.

Em 1817, no Campo das Princesas, em Recife, os revoltosos dominaram o antigo Palácio do Governo
Fonte: MultiRio (online).

Diante do crescente antagonismo que caracterizava a manutenção da relação


dependente entre Portugal e Brasil, já invertida em seu sentido mais profundo
no início do século XIX, tornou-se quase impossível evitar o fortalecimento e
a defesa das ideias e dos movimentos emancipatórios ao longo desse período.
Desse modo, a elite brasileira chegou ao poder em 1822 na figura de D. Pedro
com a tarefa de organizar uma nação independente, com bases nos princípios
liberais, sem, no entanto, ferir seus interesses.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
21

“A independência de uma sociedade é o conjunto de condicionamentos his-


tóricos e político que não se confundem com um único evento”
Fonte: Oliveira (2009 apud GRINBERG; SALLES, 2009).

A figura de D. Pedro, regente do Brasil após a volta de D. João VI para Portugal


diante da pressão das cortes lisboetas, aglutinou em torno de si as principais
mentes do processo de emancipação política do Brasil. A crise que se instalou
no Brasil após a partida de D. João VI tem no seu interior o medo de uma pos-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

sível retomada da exploração e do atraso resultantes da condição de colônia do


país e acentuaram o discurso pela independência. Nesse contexto, D. Pedro apro-
ximou-se dos brasileiros e, gradativamente, deixou-se influenciar pela ideia do
rompimento com seu pai e Portugal.
Percebendo as ações em torno de D. Pedro no Brasil, as cortes portugue-
sas o pressionavam para que retornasse a Portugal, fato que levou um dos mais
expressivos defensores da independência, José Bonifácio, a intervir junto ao
regente e convencê-lo a permanecer no Brasil e conduzir a libertação e a reor-
ganização do país.
O Dia do Fico (09 de janeiro de 1822) desencadeou os movimentos que
levaram ao rompimento oficial entre Portugal e Brasil, com a declaração de inde-
pendência deste último em 7 de setembro de 1822.
O fim das relações coloniais entre
Portugal e Brasil foi analisado sob
vários ângulos e aspectos, o que
significa que o processo de eman-
cipação política do Brasil recebeu
inúmeras interpretações, que
variavam – e ainda variam – de
acordo com o momento histórico
em que foram elaboradas.
©shutterstock

Os intelectuais brasileiros e as abordagens sobre a


independência do Brasil

Análise do Processo de Independência do Brasil


I

Logo após o 7 de setembro de 1822, José da Silva Lisboa, o Visconde de


Cairu, procurou legitimar o novo Estado por meio da continuidade da dinastia
dos Bragança, colocando a independência do Brasil como o marco fundador do
país, realizada sob o singular regime monárquico de um herdeiro dos Bragança
(NEVES, 2009, apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 98).
Em sua análise sobre a independência do
Brasil, Varnhagem demonstrou que essa signifi-
cou uma “continuidade entre o passado colonial
e o novo projeto nacional, enfatizando a influ-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ência civilizadora da colonização portuguesa
sobre o novo país nos trópicos” (NEVES, 2009
apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 99).
O liberal e amigo próximo da família impe-
rial Joaquim Manuel de Macedo, ao tratar do
assunto, considerou o processo e a independên-
cia do Brasil como um período de criação de
“uma nação como memória coletiva e idealizada
de acontecimentos e personagens excepcionais,
organizados em narrativa linear” (NEVES, 2009
apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 99). D. Pedro I
Fonte: Revista de História (online).

Além de intensa participação na política do período imperial, Joaquim Ma-


nuel de Macedo foi também professor, jornalista, poeta e escritor, cujo o ro-
mance de maior expressão foi A Moreninha, publicado em 1844.
Para conhecer mais sobre a biografia desse intelectual do período imperial,
acesse o conteúdo disponível em: <http://www.academia.org.br/abl/cgi/
cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=905&sid=218>. Acesso em: 10 abr. 2015.
Fonte: a autora.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
23

Como é possível observar, caro(a) aluno(a), até a década de 1850, as análises


sobre a independência do Brasil adotaram um viés que destacava a continui-
dade das características da colonização portuguesa no Brasil, isto é, apontavam
para uma herança colonial que fortalecia a imagem da família real portuguesa
e ressaltava a importância de D. Pedro I para a constituição do novo país, numa
tentativa de forçar uma união da sociedade em torno dos Bragança.
Essa ideia de herança portuguesa vai dominar as análises sobre a indepen-
dência até a década de 1860, quando uma nova corrente de intelectuais defendeu
a ideia de ruptura com as instituições portuguesas e o nosso passado colonial.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Para esses intelectuais, a independência do Brasil ocorreu de fato em 07 de abril


de 1831, quando D. Pedro I abdicou do trono e retornou a Portugal.
No início do século XX, a ideia de ruptura e da construção de uma nação
caracterizada por algo além das influências portuguesas foi reforçada pelo Instituto
Histórico e Geográfico do Brasil, visando uma aproximação entre os processos
de independência do Brasil e dos demais países da América Latina (NEVES,
2009 apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 100).
Nesse mesmo período, as análises de Caio Prado Jr. realçaram a abordagem
marxista, evidenciando os aspectos econômicos do processo de emancipação
política do Brasil e enquadrando-o no contexto da falência do sistema colonial.
A tese de Caio Prado Jr. foi corroborada por muitos intelectuais a partir da
década de 1970 e do crescimento dos cursos de pós-graduação no Brasil. Nomes
como Fernando Novais e Guilherme Motta também analisaram a independên-
cia do Brasil no contexto da crise do antigo sistema colonial. Para esses autores,
a independência foi o momento inicial de um longo processo de ruptura, resul-
tado da desagregação do sistema colonial e da montagem do Estado Nacional
(NEVES, 2009 apud GRIMBERG; SALLES, 2009, p. 101).
Os intelectuais do século XX produziram inúmeras análises sobre a inde-
pendência do Brasil e a historiografia passou a contar com uma diversidade de
ideias e de opiniões sobre esse assunto que contribuíram para o alargamento das
discussões acerca não só do período colonial brasileiro, mas também do con-
texto que se instalou com a Proclamação da República.

Análise do Processo de Independência do Brasil


I

Além da questão da continuidade ou da permanência da herança portuguesa


ou, ainda, de uma ruptura com as instituições coloniais, essas análises possibili-
taram o conhecimento de outros aspectos do início do Brasil imperial, trazendo
para o cerne do debate a participação de outros setores da sociedade que não
aqueles que compunham a elite, considerando o papel desses na formação de
uma identidade nacional.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As discussões acerca das conjunturas que marcaram o processo de indepen-
dência do Brasil ainda despertam o interesse de historiadores renomados
que buscam, por meio da análise de documentos, compreender os interes-
ses por trás dos discursos e movimentos emancipatórios. Em 2015, os histo-
riadores José Murilo de Carvalho, Lúcia Bastos e Marcello Basile publicaram
uma obra na qual apresentam uma documentação inédita que remonta aos
anos de 1820 a 1823 e permite novas abordagens sobre esse período de
nossa história.
Para maiores detalhes, acesse o conteúdo disponível em:
<http://oglobo.globo.com/cultura/livros/livro-reune-panfletos-que-permi-
tem-novas-interpretacoes-da-independencia-do-brasil-15720391>. Acesso
em: 10 abr. 2015.
Fonte: a autora.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
25

©shutterstock
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

ASPECTOS DA FORMAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO


PÓS-INDEPENDÊNCIA: O PRIMEIRO REINADO

Caro(a) aluno(a), após a análise apresentada no tópico anterior, você pode se


perguntar: qual é o papel do povo brasileiro durante todo o processo de eman-
cipação política do Brasil?
Para responder a essa questão, recorreremos a Emília Viotti da Costa, a qual
afirma que a independência do Brasil foi articulada e levada a cabo por uma
elite composta de
fazendeiros, comerciantes e membros de sua clientela, ligados à eco-
nomia de importação e exportação e interessados na manutenção das
estruturas tradicionais de produção cuja base era o sistema de trabalho
escravo e a grande propriedade (COSTA, 2010, p. 11).

Essa elite, ao longo dos primeiros anos da independência, reivindicou a participa-


ção, senão o comando do país, acentuando os conflitos e as divergências políticas
e ideológicas que fizeram parte das lutas pela independência até o momento da
abdicação de D. Pedro I em 1831.

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

Os demais indivíduos que compunham a sociedade brasileira, como os


escravos e os indígenas, foram deixados à margem do processo e, após a inde-
pendência, o entendimento próprio que a elite tinha do conceito de liberalismo
não permitiu que esses indivíduos tivessem uma maior participação nos enca-
minhamentos do novo período.
O 07 de setembro de 1822 entrou para a história do Brasil como o início da
organização de uma sociedade não mais presa aos laços do Pacto Colonial ou de
fidelidade para com Portugal. Significou, ainda, a ascensão de D. Pedro como o
primeiro imperador do Brasil, o qual, em teoria, conduziria o país recém-liberto

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
à reestruturação política, econômica e social, orientado pelos princípios liberais.
Para Oliveira, o uso do termo independência tinha por objetivo
(...) construir a “independência nacional”, articulando a monarquia a
uma Constituição que estabelecesse limites ao poder real e garantisse
direitos e liberdades civis e políticas aos cidadãos do império. Preten-
dia-se, por essa via, entre outras exigências, contestar o absolutismo
representado por D. João VI e o “despotismo” exercido por ministros,
por conselheiros e pela corte radicada no Rio de Janeiro desde 1808.
(OLIVEIRA, 2009 apud GRIMBERG; SALLES, 2009, p. 18-19).

Portanto, 07 de setembro de 1822 deveria representar, ao menos no imaginá-


rio de parte daqueles que lutaram pela emancipação, sobretudo os intelectuais
brasileiros, um novo período da história do Brasil caracterizado pelo fim das ins-
tituições absolutistas que estiveram presentes nesse território desde a chegada
da família real portuguesa e sua corte.
Não foi o que aconteceu. De acordo com a mesma autora, o período que
abrange a chegada da corte portuguesa (1808) até a abdicação de D. Pedro I
(1831) “se configurou como uma das balizas definidoras do surgimento e do
perfil do Estado monárquico e da nação no Brasil do século XIX” (OLIVEIRA,
2009 apud GRIMBERG; SALLES, 2009, p. 17).
D. Pedro I, realizada a independência, enfrentou o conflito oriundo das dife-
renças entre os grupos que participaram das discussões e dos desdobramentos
do processo de independência e que estavam divididos entre os radicais e os
moderados. José Bonifácio, importante articulador da emancipação, mostrou-
-se nesse momento novamente ao lado do imperador, buscando garantir a união
dos diferentes grupos em torno da lealdade ao império e à figura do imperador.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
27

A elite que ajudou a colocar D. Pedro I como imperador do Brasil, atingido


o seu objetivo de livrar o Brasil das amarras impostas pela submissão a Portugal,
buscou consolidar o poder em suas mãos, subjugando o próprio imperador na
defesa de seus interesses. Por essa razão, o Brasil pós 1822 se constituiu sob as
mesmas bases das instituições tradicionais de ordem econômica dos tempos do
período colonial, moldando e manipulando os conceitos de liberalismo e nacio-
nalismo à sua própria realidade.
O que a historiografia brasileira tem demonstrado é a fidelidade não
apenas do príncipe regente D. Pedro, mas da cúpula política “modera-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

da” que o cercava, ao modelo político da monarquia dual. A evolução


da conjuntura política ao longo desses dois anos evidencia que foi a
ação das lideranças políticas nas Cortes portuguesas, inclusive neutra-
lizando a atuação de D. João VI, que colocou o Brasil diante do impasse
da recolonização ou independência (WEHLING, 2004, p. 239).

Essa adaptação e manipulação dos conceitos de liberalismo e de nacionalismo à


realidade brasileira e sua articulação com os interesses das elites locais nos aju-
dam a compreender por que uma nação, que no desenrolar do seu processo de
independência baseava seu discurso na construção de uma sociedade constitu-
ída sob o liberalismo, manteve viva a escravidão por várias décadas, relutando
em abrir mão das “vantagens” da manutenção
desse modo de produção.
O grupo composto pelos modera-
dos, que tinha nomes como José Bonifácio
Joaquim Gonçalves Ledo, Januário da Cunha
Barbosa e José da Silva Lisboa (Visconde
de Cairu), defendia a organização do país
sob uma monarquia constitucional e tinha o
apoio dos proprietários rurais do país, inte-
ressados em manter a salvo seus interesses
pessoais. Esse grupo buscou o fortalecimento
da imagem da D. Pedro I, tendo nas ideias
de José da Silva Lisboa a expressão de seus
ideais de união do país, exaltando a figura
José da Silva Lisboa (Visconde de Cairu)
do imperador. Fonte: Matta (online)

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

Contrapondo-se a esse grupo, estavam os defensores da República e da


democracia. Os indivíduos que compunham esse grupo desenvolviam ativida-
des relacionadas às cidades, estando distantes dos proprietários rurais do Rio
de Janeiro e de São Paulo na defesa de interesses como a manutenção da escra-
vidão. Conforme analisa Wehling (2004, p. 240),
(...) não foi apenas a força do poder central do Imperador Pedro I que
os derrotou, mas o apoio a este de vastos setores da propriedade rural
nordestina. Faltava a esse grupo, ademais, um projeto de estado e de
nação, afora os princípios mais gerais dessa forma de governo.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Havia ainda um terceiro grupo na disputa pelo comando do Brasil e com ideias
que iam em direção contrária ao ideal de independência. Esse grupo era com-
posto por portugueses e defendiam a recolonização do Brasil com a volta das
conjunturas que marcaram as relações entre Brasil e Portugal até 1808.
A organização do país passava pela articulação das correntes ideológicas diver-
gentes em seu interior, numa tentativa de equilibrar os interesses de D. Pedro I e
os anseios da população. Para tanto, os deputados que compunham a Assembleia
Constituinte – convocada antes da independência, mas quando esta já se deline-
ava na cabeça dos brasileiros – começaram a elaborar a primeira Constituição
do Brasil, à qual deveria D. Pedro I submeter sua forma de governo.

A CONSTITUIÇÃO OUTORGADA DE 1824

A Assembleia Constituinte encarregada de elaborar a primeira Constituição do


Brasil era composta por
sacerdotes (...), funcionários públicos ou profissionais liberais: advoga-
dos, médicos, professores diplomados na Universidade de Coimbra ou
em alguma outra instituição europeia, uma vez que não existiam uni-
versidades no Brasil. Havia também comerciantes e fazendeiros. Mas,
qualquer que fosse sua condição social ou profissional, os deputados à
Assembleia Constituinte estavam unidos por laços de família, amizade
ou patronagem a grupos ligados à agricultura e ao comércio interno.
Não é, pois, de espantar que tenham organizado a nação de acordo com
os interesses desses grupos (COSTA, 2010, p. 134).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
29

Esse grupo de indivíduos estabeleceu que a forma de governo no Brasil seria a


monarquia constitucional, que tinha como objetivo limitar o poder de D. Pedro
I e, também, manter o controle sobre a população. A Constituição que resultou
dessa Assembleia foi inspirada nos ideais do liberalismo, mas, como já dito ante-
riormente, em um liberalismo adaptado à realidade brasileira, ou seja, entendido
“a partir das peculiaridades da burguesia local e da ausência das duas classes que
na Europa constituíram o seu ponto de referência obrigatório: a aristocracia e o
proletariado” (COSTA, 2010, p. 136).
As discussões travadas entre os deputados que compunham a Assembleia
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Constituinte tinham, em primeiro lugar, a tarefa de definir quem eram de fato os


brasileiros que aqui viviam, ou seja, quem, diante da inegável miscelânea de povos
e culturas que ocupou esse território desde a sua “descoberta” e do início da colo-
nização portuguesa, teria seus direitos enquanto brasileiro realmente assegurados.
Os deputados Souza França e Araújo Lima defendiam que o termo cidadão
não poderia designar todos os indivíduos que se encontravam em terras brasileiras,
devendo excluir dessa denominação os crioulos ou filhos de escravos. Nesse sen-
tido, a concessão de direitos políticos também deveria ser limitada, haja vista que
nem todos estavam aptos a desempenhar as atividades decorrentes da participa-
ção política (RIBEIRO; PEREIRA, 2009 apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 151).
Rocha Franco defendia que, para ser considerado cidadão brasileiro, era
necessário ser residente do Brasil e possuir propriedade, comprovando, dessa
maneira, a participação em uma cidade e, consequentemente, na sociedade. Já
o deputado Nicolau Campos Vergueiro ia na contramão desses argumentos e
defendia que todos aqueles que vivessem em solo brasileiro eram considerados
cidadãos brasileiros, sendo que apenas no que dizia respeito aos direitos políti-
cos é que deveria se estabelecer uma condição ou diferenciação. Essa condição
residiria no valor da renda do indivíduo, isto é, àquele que possuísse determi-
nada renda seria garantido as prerrogativas políticas (RIBEIRO; PEREIRA, 2009
apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 152-153).
Na tentativa de determinar a quem serviria o título de cidadão no Brasil, o
deputado Montezuma discursou dividindo os brasileiros em cidadãos ativos e
passivos. Os cidadãos ativos seriam os brancos e os passivos os negros e seus des-
cendentes. Seguindo essa linha de raciocínio, os direitos políticos ficariam restritos

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

aos cidadãos ativos, enquanto os cidadãos passivos ficariam à margem dos acon-
tecimentos (MARTINS, 2007, p. 45).
O que podemos observar das discussões ocorridas na Assembleia Constituinte
sobre o tema é que a parcela dos brasileiros que não correspondiam aos europeus
ou a seus descendentes foi excluída do processo de constituição do Estado brasi-
leiro, em uma negação da cultura dos povos que aqui já se encontravam antes da
chegada do branco europeu – como os índios – bem como a negação da hetero-
geneidade que caracterizava a sociedade brasileira.
Sendo assim, o projeto de Constituição previa a restrição da designação do

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termo de cidadão e, como resultado, da concessão de direitos civis e políticos a
uma parcela significativa da sociedade brasileira, representada pelos estrangei-
ros, índios, mestiços, crioulos e escravos, esses últimos entendidos como uma
mercadoria, uma “coisa” que, embora necessária para a organização e para a
estruturação do trabalho, não eram vistos
como pessoas.
Ao “coisificar” o negro escravo e ao
negar-lhe a prerrogativa de cidadão e a
concessão dos direitos civis e políticos,
o projeto de Constituição elaborado pela
Assembleia Constituinte em 1823 defen-
dia a manutenção do regime escravocrata
no país, protegendo os interesses dos pro-
prietários de terra do Brasil e garantindo
as condições sobre as quais se apoiava a
economia brasileira do período.
Além da polêmica em torno da defi-
nição do cidadão brasileiro, os deputados
reunidos em 1823 divergiam sobre os
limites do poder de D. Pedro I. Divididos
entre o Partido Português e o Partido
Brasileiro, os deputados tentaram estabe-
lecer as bases sobre as quais o imperador Membros da Assembleia Constituinte na abertura
dos trabalhos
deveria conduzir o seu governo.
Fonte: MultiRio (online)

O IMPÉRIO DO BRASIL:
31

O Partido Português defendia que a D. Pedro I cabia o poder absoluto, sendo


indispensável que o imperador tivesse autonomia para fazer os encaminhamentos
necessários para a organização do novo Estado. Indo de encontro a essa ideia, o
Partido Brasileiro defendia a divisão do poder – a exemplo das constituições euro-
peias – em três níveis, que tinham, por objetivo restringir o poder do imperador.
Como resultado desse debate, optou-se pela adoção de um sistema político
estruturado e a divisão do poder foi feita em Poder Executivo, Poder Legislativo
e Poder Judiciário. De acordo com essa divisão, o Poder Executivo seria exercido
pelo imperador D. Pedro I, o Poder Legislativo pelos deputados e senadores e o
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Poder Executivo pelos juízes. A novidade estava no fato de que o poder Executivo
estaria submetido ao Legislativo, ou seja, o poder do imperador D. Pedro I esta-
ria limitado pela sanção dos deputados e dos senadores aos seus projetos.
A submissão do Poder Executivo ao Poder Legislativo e a consequente limi-
tação do poder de ação de D. Pedro I desagradou o imperador, que planejara
exercer o comando do Brasil de forma absolutista e centralizadora. Diante do
cenário imposto pela Assembleia, D. Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte
e convocou o Conselho de Estado para a elaboração de uma Constituição que
preservasse seus interesses.
A dissolução da
Assembleia Constituinte
ocorreu na noite de 12 de
novembro de 1823, num
episódio que ficou conhe-
cido como Noite da Agonia,
quando o brigadeiro José
Manuel de Moraes inva-
diu a sede da Assembleia no
Rio de Janeiro a mando de D.
Pedro I e decretou o fim dos
trabalhos dos deputados ali
reunidos. Sede da Assembleia Constituinte no Rio de Janeiro
Fonte: MultiRio (online).

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

Os principais jornais do período eram utilizados para divulgar as notícias das


discussões que ocorriam na Assembleia, demonstrando o importante papel
da imprensa para os desdobramentos dos trabalhos da Assembleia.
Fonte: a autora.

Após a dissolução da Assembleia Constituinte e a nomeação de um Conselho

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de Estado, D. Pedro I retomou a elaboração da Constituição do Brasil. O Conselho
de Estado nomeado por ele manteve alguns dos pontos expostos no projeto ela-
borado pelos deputados da Assembleia Constituinte, garantindo a manutenção
dos privilégios das classes dominantes e a divisão dos brasileiros em cidadãos
ativos e passivos (ROMPATTO, 2001, p. 190).
O ponto mais importante desse novo projeto de Constituição que se deli-
neava corresponde à aproximação de D. Pedro I ao absolutismo, na medida em
que esse articulou para garantir que seus interesses políticos fossem sobrepostos
aos dos liberais. Nesse sentido, a Constituição, embora mantivesse os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário, adicionou um quarto poder que garantia ao
imperador a submissão do corpo político às suas decisões. Tratava-se do Poder
Moderador, que seria exercido exclusivamente pelo imperador e garantia-lhes
poderes absolutos (ROMPATTO, 2001, p. 191).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
33

PODER MODERADOR
IMPERADOR

PODER LEGISLATIVO PODER EXECUTIVO PODER JUDICIÁRIO

ASSEMBLEIA GERAL CONSELHO DE ESTADO SUPREMO TRIBUNAL


DE JUSTIÇA

SENADO CÂMARA DOS DEPUTADOS


PRESIDENTE DAS
PROVÍNCIAS
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CONSELHOS PROVINCIAIS

Figura 1: Organograma da Constituição de 1824


Fonte: a autora.

A Carta Constitucional foi outorgada à população brasileira em 25 de março


de 1824, a qual não viu com bons olhos o documento que não representava os
anseios de uma parcela significativa daquela sociedade. Diante disso, algumas
províncias do Brasil recusaram-se a jurar a Constituição, iniciando um período
de manifestações contrárias à sua imposição.

Nesse contexto de revolta contra a outorga de uma Constituição que conce-


dia poderes sem limites ao imperador, destaca-se o movimento conhecido
como Confederação do Equador, que teve início quando as ideias centrali-
zadoras e absolutistas de D. Pedro I começaram a esboçar-se após a inde-
pendência. O movimento de caráter separatista iniciou-se em Pernambuco,
liderado por Cipriano Barata e Frei Caneca e teve o apoio de várias provín-
cias do Nordeste.
A historiadora Amy Caldwell de Farias, em seu livro Mergulho no Letes:
uma reinterpretação político-histórica da Confederação do Equador,
de 2006, faz uma análise do movimento, objetivando questionar a historio-
grafia tradicional sobre o movimento e trazer à cena novos fatos e atores,
por meio de novas abordagens.
Fonte: a autora.

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

A GUERRA DA CISPLATINA

O governo de D. Pedro I foi marcado por agitações políticas no âmbito interno


e externo do Império do Brasil. Do momento de sua coroação como Imperador
do Brasil até a sua abdicação em 1831, o Brasil esteve envolvido em conflitos que
contribuíram para abalar a confiança e o poder do imperador.
Ainda envolvido nos conflitos decorrentes da outorga da Constituição de
1824, D. Pedro I precisou voltar sua atenção para uma disputa envolvendo o
Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata, que teve início em 1825 e perdu-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
rou até o ano de 1828.
Esse conflito começou a desenrolar-se
muito antes de D. Pedro tornar-se impera-
dor do Brasil. Pouco depois da chegada da
família real portuguesa ao Brasil, as tropas
de Napoleão Bonaparte tomaram a Espanha
destituindo a coroa dos Bourbons. Carlota
Joaquina era irmã de Fernando VII, o rei
espanhol deposto por Napoleão e, portanto,
herdeira da coroa espanhola, a qual objeti-
vava ocupar e defender, objetivo esse que não
foi alcançado, na medida em que a princesa
não foi capaz de tecer alianças e conquistar
o apoio necessário para ascender ao trono
espanhol (PEREIRA, 2012).

A região da Cisplatina
Fonte: MultiRio (online).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
35

No período que abordamos, a Espanha possuía o controle das Províncias


Unidas do Rio da Prata, atuais territórios da Argentina, Paraguai e Uruguai (na
época, denominado de Banda Oriental do Uruguai), regiões importantes para
o desenvolvimento comercial devido à proximidade com rios que facilitavam o
escoamento de produtos. Por essa razão, D. João VI tinha interesse em domi-
nar a região, mas devido às relações pouco amigáveis com a princesa Carlota
Joaquina e não acreditando na sua lealdade ao assumir o comando da Espanha,
optou por ocupar ele próprio a região e garantir sua submissão ao Reino de
Portugal, Brasil e Algarves.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A conquista da região deu-se em 1821, quando o general Carlos Frederico


Lecor, a serviço de D. João VI, derrotou as tropas de José Gervasio Artigas e os
territórios foram anexados ao reino português.
Destacamos, caro(a) aluno(a), que manter a região sob o domínio português
significou lidar com os conflitos políticos existentes na região, conflitos esses que
agravaram-se ainda mais durante o processo de emancipação do Bra-
sil, quando houve uma alteração no balanço de poder do local. Lecor
apoiou nossa independência e manteve-se fiel à D. Pedro I. Porém, a
conjuntura platina alterou-se profundamente “com um movimento
militar que prenunciava deflagrar em conflito armado”, quando muitos
dos habitantes se mantiveram fiéis a Portugal (PEREIRA, 2012, p. 86).

O chefe militar D. Álvaro da Costa defendia que as Províncias Unidas do Rio


da Prata deveriam permanecer ao lado de Portugal e a este submeter-se após a
independência do Brasil. Contando com o apoio de boa parte da população da
região, D. Álvaro da Costa incitava os habitantes das Províncias Unidas do Rio
da Prata à rebelar-se contra a dominação brasileira e manter-se fiel a D. João VI
e Portugal. Em seus discursos, pregava que

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

Quando os laços de mútua conveniência não prendem os povos uns


aos outros, não desata por si. Não acrediteis a doutrina contrária que
vos pregam. Vós só podeis tirar dessa luta as tristes recordações do pai,
do irmão, do parente morto e dos míseros filhos desamparados que
uma infernal política sacrificou. Abandonai a odiosa pretensão em que
vossos chefes se empenharam; eles só defendem seus interesses e não
vossos direitos, porque aqui não há ninguém que os pretenda usurpar;
[...] Recordai o amor, a obediência, a fidelidade que vossos pais sem-
pre tiveram aos nossos reis: voltai aos vossos lares e pregai a doutrina
do homem justo e convidai todos os vossos concidadãos a reentrar na
obediência e fidelidade que deveis ao benigno de todos os monarcas, ao
nosso Augusto Rei, o senhor d. João VI [...] (ARQUIVO NACIONAL

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
apud PEREIRA, 2012, p. 88).

Os conflitos na Cisplatina somaram-se ao enfrentamento entre as tropas brasileiras


e as portuguesas que se encontravam na Bahia, região que também questionava a
separação de Portugal. Desse modo, observamos, caro(a) aluno(a), que garantir
a soberania nacional após 1822 representou um trabalho árduo para D. Pedro I e
seus aliados. De norte a sul do país, eclodiram manifestações contrárias à inde-
pendência e de apoio à Portugal.
Desse conflito entre o Brasil e as Províncias do Rio da Prata resultou a incor-
poração da Banda Oriental do Uruguai ao território brasileiro e o reconhecimento
da independência do Brasil pelas Províncias Unidas do Rio da Prata em 1824. No
entanto, já em 1825, desenrolava-se um novo conflito envolvendo essa região.
A Banda Oriental do Uruguai, também denominada de Cisplatina, tornou-
-se alvo de uma disputa entre o Império do Brasil e a Argentina. A região da
Cisplatina pertencia ao Brasil, mas a Argentina reivindicava sua reincorpora-
ção às Províncias Unidas do Rio da Prata. O conflito desenrolou-se quando o
representante do governo argentino Manoel José Garcia enviou um documento
para o governo brasileiro no qual reivindicava a reincorporação da Cisplatina,
chamada por ele de Província Oriental (PEREIRA, 2012, p. 90).
Em resposta a esse documento, D. Pedro I declarou guerra à Argentina, jus-
tificando tal ação no argumento de que a região da Cisplatina fora anexada de
maneira legal, não sendo fundamentada a tentativa de sua usurpação por parte
da Argentina.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
37

O confronto entre as duas regiões foi mais um fator a colaborar com o des-
gaste da imagem do imperador. A crise que se estabeleceu nos negócios entre a
Bahia e a Cisplatina com o fechamento do porto da Prata, os gastos com a guerra,
o recrutamento e o alistamento forçado dos homens para lutarem na guerra e o
saldo de mortes abalaram a imagem de D. Pedro I.
A situação chegou ao fim em 1828 com a assinatura de acordo de paz entre
Brasil e Argentina, em um momento em que ambos os países encontravam-se
desgastados e fragilizados economicamente. Por esse acordo, intermediado pela
Inglaterra, Brasil e Argentina, reconheciam a criação do Estado Independente
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

do Uruguai.

Principais locais de batalha, povoações e fortes durante a Guerra da Cisplatina (1825-1828)


Fonte: Universidade Federal do Paraná (online).

Aspectos da Formação do Estado Brasileiro Pós-Independência: O Primeiro Reinado


I

A CRISE DO PRIMEIRO REINADO E A ABDICAÇÃO DE D.


PEDRO I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Manchete sobre a abdicação de D. Pedro I em 1831


Fonte: Arquivo Nacional (online).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
39

Como podemos notar até o momento, caro(a) acadêmico(a), desde que assu-
miu a condição de defensor perpétuo do Brasil e, posteriormente, imperador do
Brasil, D. Pedro I precisou lutar e coordenar diferentes interesses e situações na
busca pela construção do Estado brasileiro.
Em seu caminho, deparou-se com ideologias e conflitos cujos desdobra-
mentos contribuíram para que o imperador fosse perdendo aliados e apoio da
população brasileira. Nesse cenário, sua reputação e capacidade de estar à frente
de uma nação que buscava sua afirmação diante de outras e de si mesma foi ques-
tionada e colocada à prova.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Somadas essas questões às tendências monarquistas e absolutistas de D.


Pedro I, seu governo foi marcado por uma intensa agitação no país que refletia
os anseios dos “cidadãos” brasileiros e, também, a influência dos acontecimen-
tos externos tanto no âmbito político quanto no econômico e no cultural.
Internamente, eclodiram manifestações e motins contrários ao governo de
D. Pedro I e à repressão sofrida por aqueles que se opunham à administração
do imperador. A situação de descaso com a maioria dos brasileiros, os de cama-
das inferiores e a concessão de privilégios a portugueses imigrados distanciavam
D. Pedro I da população local. Além disso, o seu amplo poder conquistado por
meio da criação do Poder Moderador e sua política externa não agradavam a
elite da época.
Externamente, a influência da Inglaterra ao longo de todo o Primeiro Reinado
gerou desconfiança e preocupações por parte das elites brasileiras, que temiam que
o imperador cedesse à pressão inglesa pelo fim da escravidão no Brasil, fato que
prejudicaria essa camada social, colocando em risco seus interesses e privilégios.
Nesse contexto, instalou-se um cenário de insatisfação com o governo e com
a figura de D. Pedro I, que foi o ponto de partida para a sua abdicação em 1831.
Na defesa pelo afastamento de D. Pedro, indivíduos, embora com ideias, interes-
ses e propostas diversas, uniram-se para acabar de vez com o poder de D. Pedro I.
O amplo descontentamento que levou à revolução da Abdicação em
1831 foi pouco coeso no que diz respeito aos atores, formas de conce-
ber a política e a sociedade, haja vista a profunda diversidade e hierar-
quização social, política e étnica que caracterizava a sociedade imperial
brasileira nas primeiras décadas do século XIX. Por um lado, havia
uma massa populacional pobre formada em sua maioria por libertos e

A Crise do Primeiro Reinado e a Abdicação de D. Pedro I


I

mestiços que vivia em acentuada pobreza. A esta população livre pobre


se somavam os escravos de ganho que circulavam pelas ruas da Corte
em seus diversos ofícios e atividades. Tal população trouxe sempre pre-
ocupações para as autoridades, que, através da Intendência de Polícia e
legislação punitiva e coercitiva – com rondas noturnas e revistas – pro-
curava manter, embora com dificuldades, a ordem nas ruas (RAUTER,
2011, p. 98).

Chamamos sua atenção, caro(a) aluno(a), para o fato de que, mais uma vez, a
sociedade, embora unida no desejo de ver afastado o imperador, dividia-se na
defesa de ideologias distintas e que representavam, cada uma ao seu modo, os

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interesses de apenas alguns indivíduos.
De um lado, estavam os chamados liberais moderados, que defendiam a
redução do poder de D. Pedro I em benefício do poder da Assembleia. Embora
considerados liberais, não defendiam o fim da escravidão, visto que isso iria
contra seus interesses econômicos e eram contrários à adoção do sistema repu-
blicano. O liberalismo a que se referiam dizia respeito apenas à questão do fim
do absolutismo de D. Pedro I.
No outro lado, encontravam-se os liberais exaltados, que defendiam a república
mesmo que fosse preciso uma revolução. De acordo com Rauter (2011, p. 100),
Ao contrário dos moderados, os exaltados eram francamente revolu-
cionários. Até a abdicação, eram mais discretos no seu republicanismo
e no seu federalismo, mas, no governo regencial, o propalaram aber-
tamente. A insurreição era para eles um “direito dos povos” na luta
contra a tirania e o despotismo, e a república a melhor forma de go-
verno. Porém, a revolução era considerada um recurso extremo, a que
se recorrer em situações limite onde imperava o despotismo absoluto,
o que, na visão dos exaltados estava acontecendo naquele momento,
tanto no final do primeiro reinado, quanto nos primeiros anos da re-
gência. Tratava-se de uma revolução de caráter popular que instauraria
um governo liberal e diversas outras transformações de caráter social.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
41

Nesse momento de agitação política e social, as elites intelectuais do Brasil e


os demais indivíduos da sociedade brasileira uniram-se independentemen-
te de suas condições sociais em torno de um objetivo comum, o que não
significava que as barreiras e as diferenças sociais haviam sido superadas.
Fonte: a autora.

A SUCESSÃO DO TRONO PORTUGUÊS


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Uma questão que acentuou os conflitos nas relações entre D. Pedro I e os bra-
sileiros esteve relacionada com a sucessão do trono português, após a morte de
D. João VI, em 1826.
Com a morte do monarca português,
D. Pedro I assumiu o lugar de seu pai
no comando de Portugal. Entretanto sua
ideia era abdicar do trono português em
favor de sua filha D. Maria II e, enquanto
esta não pudesse assumir o trono, visto
que era ainda uma criança, seria nome-
ada uma regência liderada pela irmã de
D. Maria II, D. Isabel Maria, que gover-
naria Portugal até que a herdeira legítima
do trono pudesse se casar com D. Miguel
– irmão de D. Pedro I – e este assumisse,
então, a coroa portuguesa (VIANNA,
2013, p. 43-44).
A solução para essa questão não saiu
de acordo com os desejos de D. Pedro Gravura anônima, Maria da Glória, filha de D. Pedro I
I e este foi aclamado Rei Absoluto de Fonte: MultiRio (online).

Portugal em 1828. Essa nomeação interferiu diretamente na situação política


do Brasil, agravando ainda mais as já complicadas relações entre o imperador e
os brasileiros. A situação agravou-se quando D. Miguel usurpou o trono portu-
guês e autodeclarou-se rei de Portugal, anulando a Constituição outorgada por

A Crise do Primeiro Reinado e a Abdicação de D. Pedro I


I

D. Pedro I à Portugal. Diante da atitude de D. Miguel, D. Pedro precisou voltar


suas atenções para Portugal, na tentativa de expulsar seu irmão do trono e devol-
vê-lo à sua legítima herdeira, D. Maria II.

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Honoré Daumier, Caricatura, D. Pedro e D. Miguel, “Dois Hipócritas Que Não Se Farão Grande Mal
Fonte: MultiRio (online).

A elite política brasileira acusava D. Pedro I de dedicar maior atenção às questões


que envolviam a sucessão do trono português do que os problemas internos do
Brasil. Somaram-se a essa crítica as manifestações contrárias ao fato de que, ao
invés de se dedicarem aos assuntos brasileiros, os ministros, deputados e diplo-
matas brasileiros precisavam voltar suas atenções para a solução do problema
dinástico português, haja vista que esse assunto envolvia a infanta brasileira D.
Maria e significava o envolvimento de outros países como Inglaterra e Áustria
– ambos visando defender seus próprios interesses – no desenvolvimento da dis-
cussão. Além disso, o fantasma da recolonização do Brasil voltou a assombrar
a sociedade diante da coroação de D. Pedro I como rei de Portugal.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
43

A ABDICAÇÃO DE D. PEDRO I.

A oposição a D. Pedro I ganhava força com a ação da imprensa, representada


pelos jornais A Astréia, fundado em 1826 por Antônio José do Amaral e José
Joaquim Vieira Souto; Aurora Fluminense, fundado em 1827 e que teve em
Evaristo Ferreira da Veiga sua voz mais expressiva; o Malagueta, que voltou à
ativa em 1828 com críticas ferozes ao imperador, que levaram à repressão de
Luiz Augusto May, redator do jornal (VIANNA, 2013, p. 50).
Diante do crescente ataque de seus opo-
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sitores por meio da imprensa, D. Pedro I


reprimiu legalmente as publicações, além
de continuar promovendo perseguições e
ataques utilizando-se também de periódi-
cos escritos por seus aliados.
Esse cenário foi se consolidando e, em
1830, a divergência entre os brasileiros e os
portugueses que apoiavam D. Pedro I tor-
nara-se insustentável, resultando em uma
troca de acusações entre representantes das
duas nacionalidades por meio da imprensa
e no aumento do número de deputados de
oposição a D. Pedro I.
Após uma viagem a Minas Gerais, rea-
lizada no final de 1830, da qual retornou
em abril de 1831, D. Pedro I foi recebido
por seus aliados, dentre eles, portugueses e
alguns brasileiros que ainda enxergavam no
imperador a figura do defensor do Brasil, Jornal A Aurora Fluminense
com manifestações de apoio (VIANNA, Fonte: MultiRio (online).

2013, p. 53).

A Crise do Primeiro Reinado e a Abdicação de D. Pedro I


I

No entanto, durante a recepção de D. Pedro I, brasileiros de oposição ao


governo e contrários aos portugueses que aqui viviam, chamados de exaltados,
promoveram ataques aos portugueses que ovacionavam D. Pedro I. Durante
as festividades pela chegada de D. Pedro I, os exaltados atacavam os portugue-
ses que usavam de garrafas e outros artifícios para se defender. Os conflitos
que marcaram esses eventos ficaram conhecidos como a Noite das Garrafadas
(VIANNA, 2013, p. 54).
A noite das garrafadas representou o auge das diferenças entre brasileiros
e portugueses e a crescente oposição a D. Pedro I. Os eventos que se seguiram

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àqueles dias levaram ao extremo as relações entre o imperador, os liberais e os
demais brasileiros. Não havia mais respeito por aquele que um dia representou
o início e a defesa de um novo capítulo na história do Brasil. Suas tentativas de
moldar e de manipular a sociedade e a Constituição para restaurar a monarquia
absolutista e governar sem a interferência da Assembleia minaram gradativa-
mente a confiança nele antes depositada.
As críticas e as acusações diárias, nem todas verdadeiras, publicadas na
imprensa provocaram uma agitação social a qual os ministros da guerra e da
justiça de D. Pedro I não conseguiam conter. A situação era clara: o imperador
perdera o apoio, a confiança e a lealdade de seus súditos brasileiros.
Quando D. Pedro I nomeou para ministros nomes impopulares, como o
marquês de Paranaguá, o visconde Alcântara, o marquês de Baependi, o conde
de Lages e o marquês de Aracati, os brasileiros saíram às ruas para manifestarem
sua insatisfação e contavam com o apoio dos soldados do quartel de infantaria.
O senador Vergueiro, Evaristo da Veiga e Odorico Mendes – organizadores do
movimento liberal contra o imperador – endossaram os discursos e os protes-
tos contra D. Pedro I (LUSTOSA, s.d., p. 613).
Em reposta a essa manifestação, D. Pedro enviou um comunicado à popu-
lação, no qual dizia:

O IMPÉRIO DO BRASIL:
45

Brasileiros! Uma só vontade nos una. Para que tantas desconfianças,


que não podem trazer à pátria senão desgraças? Desconfiais de mim?
Assentais que poderei ser traidor àquela mesma pátria que adotei para
minha? Ao Brasil? Àquele mesmo Brasil por quem tenho feito tantos
sacrifícios? Podereis querer atentar contra a Constituição, que vos ofe-
reci e que convosco jurei? Ah, brasileiros! Sossegai. Eu vos dou minha
imperial palavra de que sou constitucional de coração e sempre sus-
tentarei essa Constituição. Confiai em mim e no ministério: ele está
animado dos mesmos sentimentos que eu; aliás, [se assim não fosse] eu
não o nomearia. União e tranqüilidade, obediência às leis, respeito às
autoridades constituídas (LUSTOSA, s. d., p. 614-615).
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As palavras de D. Pedro I não tiveram efeito sobre os manifestantes, que exi-


giam a demissão dos novos ministros, os quais não eram dignos de confiança.
D. Pedro I recusou-se a satisfazer o desejo da população e manteve-se firme em
sua posição. Porém, o imperador já dava sinais de compreender que sua per-
manência como chefe de Estado do Brasil não mais se sustentaria. Diante disso,
escreveu ao antigo aliado José Bonifácio pedindo que este aceitasse o cargo de
tutor de seu filho D. Pedro de Alcântara.
No dia 07 de Abril de 1831, D. Pedro I abdicou do trono brasileiro em favor
de seu filho D. Pedro de Alcântara, então com cinco anos de idade. Chegava ao
fim o Primeiro Reinado, com uma ruptura dramática entre o Brasil e o impe-
rador, que afirmava: “entre mim e o Brasil tudo está acabado e para sempre”
(LUSTOSA, s.d., p. 618).

A Crise do Primeiro Reinado e a Abdicação de D. Pedro I


I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
D. Pedro entregando o ato de renúncia
Fonte: MultiRio (online).

Para os opositores de D. Pedro I, a sua abdicação significou uma ruptura defi-


nitiva com Portugal, uma vez que o Brasil não mais seria governado por um
representante que possuía também direitos monárquicos sobre aquela nação. A
sensação de liberdade tomou conta dos brasileiros naquele momento e essa sen-
sação era expressa na imprensa como a felicitar os indivíduos pela conquista.
No jornal Nova Luz Brasileira, de Ezequiel Corrêa dos Santos, era possí-
vel encontrar o que a abdicação de D. Pedro I representou para seus opositores:
Abdicou o tirano; e nas mãos da liberdade existe hoje o cetro d´ouro
que o monstro havia convertido em virga-férrea. Os Brasileiros come-
çam finalmente a possuir uma pátria; e o Brasil vai-se querendo situar
na América Livre (MATTOS apud GRIMBERG; SALLES, 2009, p. 19).

Para alguns historiadores estudiosos do período, 1831 é considerada a data da


verdadeira independência do Brasil, data em que o país passa a ser de fato dos
brasileiros, governado por brasileiros.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
47

O PERÍODO REGENCIAL (1831-1840)

Com a abdicação de D. Pedro I, em 07 de abril de 1831, caro(a) aluno(a), encer-


rou-se o primeiro capítulo da história da formação do Brasil enquanto Estado
independente. A partir dessa data, o processo de evolução da sociedade brasi-
leira entrou em uma fase em que as divergências políticas e ideológicas ganharam
novo fôlego e por todo país assistimos a eclosão de movimentos que buscavam
a consolidação de projetos distintos para o país.
Mais uma vez, cabe ressaltar que as discussões acerca dos encaminhamen-
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tos políticos do país ganhavam destaque e dividiam a sociedade. As palavras de


um contemporâneo do período mostram o clima na sociedade brasileira a par-
tir de 1831:
Nasci e me criei no tempo das regências; e nesse tempo o Brasil vivia,
por assim dizer, muito mais na praça pública do que mesmo no lar
doméstico; ou em outros termos, vivia em uma atmosfera tão essen-
cialmente política que o menino, que em casa muito depressa aprendia
a falar liberdade e pátria, quando ia para a escola, apenas sabia soletrar
a doutrina cristã, começava logo a ler a aprender a constituição política
do Império (RESENDE, 1944 apud GRIMBERG; SALLES, 2009, p. 28).

Tal era o clima nas ruas do Brasil a partir de 1831. As ideologias e os projetos
políticos presentes no momento após a abdicação de D. Pedro I eram represen-
tados pelos liberais moderados – que eram a maioria na Câmara dos Deputados
–, pelos liberais exaltados – que, embora tivessem ajudado no processo que levou
à abdicação de D. Pedro I, tiveram seus interesses e ideais colocados de lado
após o 07 de abril, quando os moderados assumiram o controle do governo –
e pelos restauradores (também chamados de caramurus), que apoiavam a volta
de D. Pedro I.

O Período Regencial (1831-1840)


I

“Os moderados seguiam os postulados clássicos do liberalismo, tendo em


Locke, Montesquieu, Guizot e Constant suas principais referências; preten-
diam, e conseguiram, efetuar reformas político-institucionais que reduziam
os poderes do imperador, conferiam maiores prerrogativas à Câmara dos
Deputados e autonomia ao Judiciário, e garantiam a observância de direi-
tos previstos na Constituição, almejando uma liberdade moderna, que não
ameaçasse a ordem imperial. Já os exaltados, adeptos de um liberalismo ra-
dical de feições jacobinistas, inspirado sobretudo em Rousseau, buscavam
conjugar princípios liberais clássicos com ideais democráticos, pleiteando
profundas reformas políticas e sociais, como uma república federativa, a ex-
tensão da cidadania política e civil a todos os segmentos sociais livres, o fim

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gradual da escravidão, uma relativa igualdade social e até um tipo de refor-
ma agrária. Por sua vez, os caramurus filiavam-se à vertente conservadora
do liberalismo, tributária de Burke; críticos ferozes da Abdicação e avessos
a qualquer reforma na Constituição, vistas como quebra arbitrária do pacto
social, almejavam uma monarquia constitucional fortemente centralizada,
ao estilo do Primeiro Reinado e, excepcionalmente, nutriam anseios restau-
radores”.
Fonte: Basile (2006, p. 31-57).

REGÊNCIA TRINA PROVISÓRIA (1831) E REGÊNCIA TRINA


PERMANENTE (1831-1835)

Nesse momento da história do Brasil, o primeiro ponto a ser resolvido era a


questão da sucessão de D. Pedro I no comando do país, uma vez que o príncipe
herdeiro D. Pedro de Alcântara tinha apenas cinco anos de idade. Mesmo sendo
imediatamente após a renúncia de D. Pedro I, coroado imperador do Brasil com o
nome de D. Pedro II, Pedro de Alcântara não tinha como governar o país devido
à sua pouca idade. Os moderados assumiram a frente das discussões em busca
da solução para a questão que se apresentava.
De acordo com a Constituição de 1824, até que o novo imperador atingisse
a idade necessária para assumir o comando do país, este deveria ser governado
por um membro da família imperial com mais de 25 anos de idade, o que não
existia no Brasil, visto que as irmãs de D. Pedro II que aqui viviam também eram
menores de idade (VIANNA, 2013, p. 59).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
49

Diante desse cenário, ainda de acordo com o que estabelecia a Constituição


de 1824, cabia aos senadores e aos deputados que compunham a Assembleia
Geral eleger uma Regência composta por três membros que seria presidida pelo
membro mais velho. Essa solução também não pôde ser colocada em prática de
imediato, na medida em que muitos membros da Assembleia Geral encontra-
vam-se ausentes do Rio de Janeiro por conta do período de férias (VIANNA,
2013, p. 59).
Levando-se em consideração a urgência de se definir um novo comando para
o Brasil, os senadores e deputados que se encontravam no Rio de Janeiro reuni-
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ram-se e elegeram uma Regência Provisória até que a Assembleia Geral tivesse
condições de eleger uma Regência Permanente.
Os senadores e deputados que permaneceram no Rio de Janeiro elegeram os
senadores José Joaquim Carneiro de Campos (Marquês de Caravelas), Nicolau
Pereira de Campos Vergueiro e o brigadeiro Francisco de Lima e Silva para com-
por a Regência Trina Provisória. A escolha desses três nomes para a Regência
Trina Provisória reafirmou a liderança dos moderados nesse período de transição.

Francisco de Lima e Silva representava o Nicolau P. de Campos, um senador


Exército no Governo moderado com ideias liberais
Fonte: MultiRio (online). Fonte: MultiRio (online).

O Período Regencial (1831-1840)


I

A Regência Trina Provisória governou por um curto período de tempo, sendo


eleita em abril de 1831 e dissolvida em 17 de junho de 1831, quando os mem-
bros da Assembleia Geral elegeram os nomes que compunham a Regência Trina
Permanente. Para formar a Regência Trina Permanente, foram escolhidos os
deputados José da Costa Carvalho e João Bráulio Muniz, além de manter-se o
brigadeiro Francisco de Lima e Silva. Mais uma vez, todos os membros repre-
sentavam os liberais moderados.
O Padre Diogo Antônio Feijó foi nomeado Ministro da Justiça e adotou
medidas radicais para conter a agitação social que dominava o país desde os tem-

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pos de oposição ao imperador D. Pedro I e que não diminuíram após a renúncia
dele. Os liberais exaltados e os restauradores (ou caramurus) demonstravam sua
insatisfação com o governo, promovendo ataques pela imprensa e instigando a
população contra as atitudes da Regência, o que levou ao surgimento de vários
motins ao longo do período de governo da Regência Trina Permanente.
O ministro da Justiça Padre Diogo Antônio Feijó acusava José Bonifácio, que
integrava o grupo dos restauradores, de liderar as manifestações e os protestos
contra o governo. Assim, passou a articular para que ele fosse retirado do cargo
de tutor do jovem D. Pedro II, desejo que realizou em 1833, após uma acusa-
ção de conspiração de Bonifácio contra o governo. Em seu lugar, foi nomeado
para tutor do jovem imperador Aureliano Coutinho, marquês de Intanhaém
(VIANNA, 2013, p. 66).

“A imprensa conheceu desenvolvimento sem precedentes na década de


1830. (...). Esse desenvolvimento da imprensa vincula-se intimamente às dis-
putas políticas, à emergência de diferentes projetos políticos e à mobiliza-
ção da opinião pública. Foi a arena na qual os debates transcorreram com
maior abertura e amplitude (...)”.
Fonte: Basile (2009, p. 65).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
51

ATO ADICIONAL DE 1834

O Ato Adicional de 1834 foi a resposta aos desejos da elite política de uma reforma
na Constituição de 1824, considerada ultrapassada diante da nova conjuntura
política do país, qual seja, a existência de uma Regência.
Dentre os principais pontos questionados na Constituição em vigor, estavam
os que tratavam da administração das Províncias, da continuidade do Conselho
de Estado, do mandato vitalício dos Senadores e discutia-se, ainda, a possibili-
dade de transformar a Regência Trina em Regência Una, ou seja, eleger apenas
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um indivíduo para estar à frente do Brasil durante a impossibilidade do impe-


rador de assumir o trono (VIANNA, 2013, p. 66-67).
Perceba, caro(a) aluno(a), que as discussões apontavam para alterações em
pontos importantes da Carta Constitucional de 1824, uma vez que buscava-se
uma autonomia maior para as Províncias, o que poderia gerar alguns incômodos
para a administração central, por exemplo, a adoção de medidas contrárias às
propostas pelo governo. Além disso, a alteração do caráter vitalício dos Senadores
não foi bem aceita por eles, por razões óbvias.
Mesmo com algumas propostas que mexiam na estrutura de organização do
país, os parlamentares reuniram-se e, em 1832, decidiram que as discussões e as
votações dessas propostas ocorreriam em 1834. Diante disso, em 12 de agosto
de 1834, as propostas foram votadas e reunidas no documento denominado
Ato Adicional à Constituição, o qual alterava alguns pontos da Carta de 1824.
Dentre as alterações estabelecidas pelo Ato Adicional, destacam-se a cria-
ção das Assembleias Legislativas Provinciais, que garantiam o poder de legislar
sobre as questões civis, jurídicas e eclesiásticas das Províncias, concebendo
maior autonomia às províncias; a extinção do Conselho de Estado criado por
D. Pedro I após a dissolução da Assembleia Legislativa em 1823, a transforma-
ção da Regência Trina para Regência Una, com eleição popular para o regente
que teria um mandato de quatro anos. (VIANNA, 2013, p. 67-68).

O Período Regencial (1831-1840)


I

Regência Una de Padre Diogo Antônio Feijó e Regência Una de Araújo Lima
Com a instituição do Ato Adicional de 1834 que transformara a Regência
Trina em Regência Una, as eleições para escolher o novo regente ocorreram
em 1835. Os cidadãos ativos brasileiros, aqueles que tinham direito ao voto, de
acordo com a Constituição de 1824, deveriam escolher entre os candidatos o
senador Padre Diogo Antônio Feijó, do Partido Moderado e o deputado Antonio
Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Albuquerque, representante da aris-
tocracia nordestina.
O senador Padre Diogo Antonio Feijó venceu as eleições e tornou-se o

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Regente do Brasil. Seu governo foi marcado por forte oposição tanto de mem-
bros do próprio partido quanto da população, fato que fez crescer o número de
revoltas por todo o país.

As eleições de 1835 tiveram um caráter diferente das eleições para cargos


da administração do Brasil ocorridas até então, devido às conjunturas sob
as quais se realizaram.
Para saber mais sobre o processo eleitoral de 1835, suas conjunturas e seus
resultados, leia: CRUZ, Fábio S. Santa. Moderadores em disputa: considera-
ções sobre o pleito de 1835 para a escolha do Regente Uno do Império do
Brasil. In: Revista Em tempos de História. nº 6, 2002.
Fonte: a autora.

O IMPÉRIO DO BRASIL:
53

Diante da oposição sofrida dentro de seu partido,


o Regente Feijó e seus aliados fundaram um novo
partido, denominado Progressista, contra o qual
seus opositores fundaram o Regressista. Esses
dois partidos posteriormente foram transforma-
dos nos Partidos Liberal (antes Progressistas) e
Conservador (antes Regressistas).
A oposição a Diogo Feijó crescia à medida
que ele apresentava projetos que iam de encon-
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tro aos interesses da elite e da aristocracia do


país, sobretudo no que diz respeito à questão da
escravidão. Feijó era a favor do fim da escravidão,
uma vez que essa instituição representava uma O Regente Feijó
Fonte: MultiRio (online).
contradição com o discurso liberal adotado pela
elite política e intelectual do país desde os tempos das lutas pela independência.
A defesa do fim do regime escravocrata levantou a ira dos proprietários de
terras e aumentou a oposição ao regente. Diante da crescente onda de insatisfação
e dos motins e das revoltas que demonstravam a falta de apoio a seu governo e da
falta de condições e de apoio para lidar com a situação, o Padre Diogo Antonio
Feijó renunciou ao cargo de Regente do Brasil em 1837.

O Padre Diogo Antônio Feijó colocou em destaque a questão da escravidão


durante o período em que foi Regente do Brasil, dando evidência à contra-
dição entre o discurso de uma nação liberal e a manutenção do regime que
representava a supressão dos direitos e das liberdades individuais.
Fonte: a autora.

O Período Regencial (1831-1840)


I

Em seu lugar assumiu o Ministro do


Império, o senador pernambucano Pedro de
Araújo Lima, passando este a ser Regente inte-
rino até as eleições realizadas em 1838, nas
quais ele saiu vitorioso, tornando-se o segundo
Regente Uno do país.
O governo de Araújo Lima foi marcado por
alguns avanços para a sociedade brasileira, na
medida em que ele preocupou-se com aspec-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tos do desenvolvimento cultural da nação que
até então, devido às agitações políticas e sociais
que assolaram o país desde o início da perda Pedro de Araújo Lima, Marquês de Olinda
de popularidade de D. Pedro I, estavam em Fonte: MultiRio (online).

segundo plano nas preocupações daqueles que


comandavam o país.
Foi na Regência de Araújo Lima que o Imperial Colégio de Pedro II, o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Arquivo Nacional foram criados,
demonstrando conquistas importantes para o desenvolvimento cultural e cien-
tífico do Brasil (VIANNA, 2013, p. 73).
Embora o governo de Araújo Lima mereça destaque por essas inovações, a
luta para acalmar as agitações e as revoltas que eclodiam em todo o país desde o
período da Regência de Feijó também foi um aspecto importante do seu mandato,
sendo ele capaz de vencer a Cabanagem (ocorrida no Grão-Pará) e a Sabinada
(desenrolada na Bahia) (VIANNA, 2013, p. 73).
Araújo Lima foi eleito como Regente Uno em 1838 e por essa razão seu
mandato deveria durar até 1842, quando seriam promovidas novas eleições. No
entanto, em 1840, o regente foi deposto diante da organização de um golpe que
objetivou colocar D. Pedro II no comando do Brasil antes mesmo de comple-
tar a maioridade. O chamado Golpe da Maioridade será o tema de abertura da
nossa próxima unidade, caro(a) aluno(a).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
55

AS REVOLTAS DO PERÍODO REGENCIAL

Caro(a) aluno(a), como podemos perceber até o momento, o período que se


seguiu à independência do Brasil e à coroação de D. Pedro como imperador do
Brasil foi marcado por divergências ideológicas e pelo surgimento de projetos
políticos de formação de uma identidade nacional divergentes, que acirraram a
disputa pelo poder no país.
No período regencial sobre o qual nos debruçamos nesse momento, encon-
tram-se algumas das mais expressivas revoltas que apontam para a complexidade
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da organização da sociedade pós-independência e para as divergências internas.


Dentre as revoltas iniciadas nesse período e que tiveram desdobramen-
tos ao longo do Segundo Reinado, em nosso estudo, destacamos a Cabanagem
(1835-1840), a Sabinada (1837-1838), a Balaiada (1838-1841) e a Revolução
Farroupilha (1835-1845).

Movimentos Sociais no Período Regencial


Fonte: MultiRio (online).

O Período Regencial (1831-1840)


I

Essas revoltas traziam em si propostas que iam de encontro ao direciona-


mento tomado pelo governo central no período regencial. De acordo com Basile,
Ponto importante a destacar nesses quatro movimentos diz respeito às
propostas e medidas de secessão e de república; a primeira só não en-
saiada na Balaiada, e a segunda proclamada na Revolução Farroupilha
(tanto no Rio Grande do Sul como em Santa Catarina) e na Sabinada.
Cumpre observar, todavia, que em nenhuma dessas revoltas tais ideias
parecem ter constituído objetivo prévio ou vieram depois se conver-
ter em causa maior que congregasse os revoltosos. Salvo raríssimas e
pontuais exceções, não havia ideais separatistas presentes nos projetos
políticos das facções regenciais, nelas incluídos os liberais exaltados,

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que capitanearam tais levantes. Quanto à adoção da República, embora
fizesse parte, sem dúvida, do projeto e dos exaltados, o ponto central
defendido por esse grupo no tocante à forma de governo era a imple-
mentação do federalismo – de preferência republicano para a maioria,
mas, se necessário (e não raro até mesmo de bom grado), monárquico.
(BASILE apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 71).

O IMPÉRIO DO BRASIL:
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NOME ANO LOCAL COMPOSIÇÃO TENDÊNCIA CAUSAS RESULTADOS


Guerra dos 1832 Pernambuco Setores mais baixos da popula- Caramuru Exigiam o retorno de D. Pedro Fracassou após a morte
Cabanos ou 1835 ção como índios e escravos. I e o fim das Regências. de D. Pedro I em 1834
Cabanada

Cabanagem 1835 Belém Conflito entre monarquistas e Exaltada Buscavam a independência da Fracassou diante do
1840 regionalistas antiportugueses região do Grão-Pará. Reivindi- avanço das tropas
e entre a elite (comerciantes cavam melhores condições de imperiais. Estima-se
e fazendeiros e o proletariado vida e ampliação da participa- que houve cerca de 30
(índios)). ção política. mil mortos durante o
conflito.
Sabinada 1837 Bahia Militares, médicos, jornalistas Exaltada Teve início com um manifesto Foram derrotados
1838 e também representantes contra o Império que reivindi- pelas forças do governo
das camadas mais baixas da cava a independência do Es- central
sociedade. tado. Transformou-se também
em um conflito racial.
Balaiada 1838 Maranhão Escravos, índios e bandidos Exaltada Lutavam contra a dominação Fracassou diante das
1841 fugitivos. política e econômica dos forças militares do
fazendeiros da região. governo maranhense,
apoiadas por outras
províncias.
Guerra dos 1835 Rio Grande Estancieiros, produtores de Exaltada Descontenta- Após a longa duração
Farrapos 1845 do Sul e Santa charque, escravos. mento com a política imperial, do conflito e a procla-
Catarina busca por maior autonomia mação da República Rio
das províncias, revogação Grandense, os farrapos
dos altos impostos cobrados, foram derrotados pelo
fim da entrada de charque de governo imperial.

O Período Regencial (1831-1840)


outros países no Brasil.
57

Quadro 1: Principais Revoltas do Período Regencial


Fonte: adaptado de Skidmore (2003).
I

Diante dessa exposição, caro(a) aluno(a), ressaltamos que a eclosão desses


movimentos e dos demais que ocorreram ao longo de todo o período regencial
refletem o descontentamento de setores da sociedade em relação à forma de con-
trole adotada pelo governo central. Por essa razão, algumas dessas revoltas vão
se prolongar pelo Segundo Reinado e contribuirão para o acirramento das dis-
cussões acerca do momento político em questão.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), nosso objetivo nesta primeira unidade foi apresentar um pano-
rama do processo de formação da sociedade brasileira após a Independência,
visando analisar criticamente as conjunturas que caracterizaram os primeiros
passos na construção de uma identidade nacional para o país recém-emancipado.
Com esse objetivo em mente, nos debruçamos sobre as interpretações da
historiografia acerca do processo de emancipação política do Brasil, buscando
compreender de que maneira a ruptura entre Brasil e Portugal em 1822 signifi-
cou a libertação de fato do Brasil da dominação estrangeira.
O que pudemos observar foi que a consolidação e o reconhecimento do Brasil
enquanto nação independente foi um processo que não se concluiu nos primeiros
anos pós-independência, na medida em que a influência de Portugal e de outras
nações estrangeiras, como foi o caso da Inglaterra, estiveram muito presentes na
organização do novo país, fato que, por várias vezes, contribuiu para que os enca-
minhamentos tomados pelo governo brasileiro não respondessem aos anseios
dos brasileiros que aqui viviam. Essa influência pôde ser sentida nas diversas
esferas de organização da vida nesse território, tanto nos direcionamentos polí-
ticos e econômicos quanto no que diz respeito aos aspectos sociais e culturais.
Os indivíduos que lutaram pela separação de Portugal visando a um futuro
baseado nos princípios liberais e na esperança de construção de uma sociedade
na qual seus interesses fossem defendidos, viram suas esperanças diluídas quando
o projeto da primeira Constituição após a independência dividiu a sociedade

O IMPÉRIO DO BRASIL:
59

entre cidadãos ativos e cidadãos passivos, ou seja, entre aqueles a que teriam os
direitos e os interesses assegurados e aqueles a quem apenas caberia assistir à
evolução do país à margem do processo.
Na busca pela defesa de interesses próprios e de projetos políticos que bene-
ficiavam apenas parte da sociedade, o liberalismo em seu sentido pleno foi
substituído no Brasil por uma ideologia que, ao mesmo tempo em que se dizia
liberal, assentava-se em elementos que impediam o verdadeiro progresso da
nação como um todo
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Considerações Finais
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O IMPÉRIO DO BRASIL:
I
61

1. “Direitos Civis e Direitos Políticos são expressões sinônimas, que querem dizer
Direito da Cidade; porém, os Publicistas, para enriquecer a nomenclatura da Ci-
ência, lhes têm dado significação diversa, tomando a primeira pelos direitos que
nascem das relações de indivíduo com indivíduo, e a segunda pelos direitos que
nascem das relações do indivíduo com a sociedade”. (ANAIS DA CÂMARA DOS
DEPUTADOS apud RIBEIRO; PEREIRA apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 152). O
debate acerca da definição do conceito de cidadão no Brasil após a independên-
cia gerou conflitos entre os parlamentares até que se chegasse a um consenso.
Explique o que representou para a sociedade brasileira a divisão dos brasi-
leiros entre cidadãos ativos e passivos prevista no projeto de Constituição
elaborado pela Assembleia Constituinte em 1823.
2. “Legisladores! É chegado o tempo de estabelecerdes a nossa Liberdade sobre
bases menos frágeis; mais filosóficas e justas do que essas que regem a oprimi-
da Europa. Em vossas mãos está hoje a felicidade presente no Povo brasileiro”.
(NOVA LUZ BRASILEIRA apud MATTOS apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 19). A
abdicação de D. Pedro I em 1831 representava a esperança da conquista da ver-
dadeira liberdade do povo brasileiro das influências internacionais. Descreva os
fatores internos e externos que contribuíram para que D. Pedro I abrisse
mão do governo brasileiro.
3. Após a renúncia de D. Pedro I abriu-se um período de discussões acerca dos ru-
mos do desenvolvimento do Estado brasileiro. Com relação ao início do Período
Regencial no Brasil e aos projetos políticos apresentados nesse momento, assi-
nale a alternativa correta.
a) Com a volta de D. Pedro I para Portugal, a elite política do Brasil conseguiu en-
contrar um equilíbrio entre suas propostas políticas, evitando que os conflitos
que marcaram o Primeiro Reinado reaparecessem.
b) O grupo dos exaltados apresentavam, em 1831, um projeto para o Brasil basea-
do na adoção de uma nação com ideais republicanos e organizado com a mão
de obra assalariada.
c) Os restauradores foram assim chamados devido à defesa que faziam do retorno
de D. João VI como monarca do Brasil e à retomada do projeto colonizador, ideal
para o desenvolvimento de seus interesses.
d) As ideologias e os projetos políticos presentes no momento após a abdicação de
D. Pedro I eram representados pelos liberais moderados, que defendiam a redu-
ção dos poderes do imperador, pelos liberais exaltados, que defendiam a adoção
de uma República Federativa e pelos restauradores, críticos da abdicação.
e) Com o acirramento dos debates na Assembleia Legislativa, os Deputados e os
Senadores do Brasil optaram por permitir que uma junta composta por repre-
sentantes dos moderadores, dos exaltados e dos restauradores assumissem o
comando do Brasil até que D. Pedro II pudesse assumir o trono.
4. O Período Regencial iniciado em 1831 representou um período conturbado da
história brasileira no qual se configurou um cenário de agitações sociais e de mu-
danças políticas. Levando-se em consideração as discussões apresentadas nesta
unidade, leias as afirmações abaixo:
I. A escolha dos membros que compunham a Regência Trina Provisória reafirmou
a liderança dos moderados nesse período de transição.
II. O Ato Adicional de 1834 foi a resposta aos desejos da elite política de uma refor-
ma na Constituição de 1824, considerada ultrapassada diante da nova conjuntu-
ra política do país, qual seja, a existência de uma Regência.
III. A dissolução da Regência Trina Permanente ocorreu devido à vontade de D. Pe-
dro II assumir o trono, visto que já ele se encontrava em idade suficiente para o
exercício da administração.
IV. A oposição a Diogo Feijó crescia à medida que este apresentava projetos que
iam de encontro aos interesses da elite e da aristocracia do país, sobretudo no
que diz respeito à questão da escravidão.
Estão corretas as afirmativas:
a) I.
b) III e IV.
c) I, II e III.
d) I, II e IV.
e) II e IV.
63

UM ARTISTA NA CORTE: O BRASIL NA VISÃO DE JEAN-BAPTISTE DEBRET


Jean-Baptiste Debret foi um pintor francês que, em suas viagens ao Brasil, procurou re-
tratar por meio da pintura suas impressões acerca da sociedade formada na América nos
tempos do governo joanino e no Primeiro Império.
Debret permaneceu no Brasil por quinze anos, entre 1816 e 1831 e como resultado des-
sa estadia em nosso país produziu uma obra na qual retratou a escravidão no Brasil e
outros aspectos de nossa sociedade e da nossa cultura, ainda em formação no período
de sua visita. Desse modo, suas obras relacionadas ao Brasil são documentos importan-
tes para compreendermos um pouco de nossa própria história, na visão de um artista
preocupado não só em retratar os elementos que compunham a política e a economia
de nossa sociedade, mas também elementos sociais de nossa cultura.
No período em que permaneceu no Brasil, Debret foi testemunha dos eventos que mar-
caram a nossa evolução, desde a elevação do Brasil à condição de Reino Unido até a
abdicação de D. Pedro I. Nesse sentido, teve a oportunidade de analisar e de retratar, por
meio de sua pintura histórica, suas impressões acerca desses eventos.
Sua maior obra em relação ao que viu e viveu no Brasil, Viagem Pitoresca e Histórica
ao Brasil, foi publicada em três volumes entre os anos de 1834 e 1839, em Paris na Fran-
ça, e representa mais do que o incentivo de D. João VI para instalação de uma Academia
de Belas Artes. As representações presentes nesses três volumes – que por muito tempo
não tiveram seu valor histórico reconhecido – demonstram o interesse e o envolvimento
pessoal que o artista desenvolveu pelo Brasil no período em que aqui esteve.
Analisar a obra de Jean-Baptiste Debret em relação ao Brasil permite ao professor de
história ampliar as possibilidades de estudo e instigar aqueles sob sua tutela.
Fonte: adaptado de LIMA (2004).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Título: O Tempo e o Vento


Autor: Érico Veríssimo
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: O Tempo e o Vento é uma coletânea de livros composta
por sete livros que contam a história da formação e evolução do
Rio Grande do Sul. A obra compreende o período de 1745 a 1945,
contemplando dessa maneira, eventos importantes da região e do
Brasil, por exemplo, os eventos que marcaram a Guerra da Cisplatina
(1825-1828) e a evolução da Revolução Farroupilha (1835-1845).
Érico Veríssimo conduz sua análise da história do Rio Grande do Sul
com uma narrativa que permite ao leitor compreender de maneira
hábil o desenrolar dos acontecimentos.

Título: Uma História de Amor e Fúria


Ano: 2013.
Direção: Luiz Bolognesi
Sinopse: O filme aborda a história do Brasil desde o seu
“descobrimento” até um futuro fictício no ano de 2096. A história é
contada a partir dos conflitos que marcaram a evolução histórica
do nosso país, como os conflitos indígenas, as revoltas do período
imperial brasileiro bem como do período de vigência da ditadura
militar brasileira. Trata-se de uma animação que busca evidenciar
as influências dos conflitos na formação da identidade nacional.

O historiador Bóris Fausto faz uma análise do período imperial brasileiro, discutindo os
elementos que marcaram o processo de independência do Brasil e a organização do
novo país após a emancipação política de Portugal.
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=FIoM1gz-pdE. Acesso em: 01 jul. 2015.
Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

II
O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:

UNIDADE
ANÁLISE DO PROCESSO DE TRANSIÇÃO
DO FIM DA MONARQUIA PARA O INÍCIO
DA REPÚBLICA BRASILEIRA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Analisar o governo de D. Pedro II.
■■ Compreender o processo de desenvolvimento da economia cafeeira.
■■ Entender as discussões acerca da escravidão e o movimento
abolicionista ao longo do Império.
■■ Verificar as conjunturas que marcaram o fim do período monárquico
no Brasil e a Proclamação da República.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ O Segundo Reinado: o governo de D. Pedro Il.
■■ A economia no período imperial brasileiro.
■■ O movimento abolicionista no Brasil Imperial.
■■ O movimento republicano e o fim da monarquia no Brasil.
67

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), estudamos na unidade I os aspectos políticos e sociais que mar-


caram o início do período imperial do Brasil, com o governo de D. Pedro I e de
que maneira o Estado brasileiro buscou constituir-se e consolidar-se enquanto
nação livre perante as demais nações.
Nesta unidade, o objetivo é dar continuidade à análise desse processo, evi-
denciando os elementos que caracterizaram o governo de D. Pedro II, buscando
compreender a lógica seguida por esse imperador para levar adiante o processo
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de constituição de uma identidade brasileira.


Destacamos na unidade anterior que os primeiros anos do Brasil após sua
independência de Portugal não foram tranquilos, enfrentando o imperador con-
flitos tanto de ordem interna quanto externa. Ao estudarmos o governo de D.
Pedro II, perceberemos que as tensões políticas, econômicas e sociais continua-
rão presentes, promovendo, mais uma vez, transformações profundas nas bases
de organização do país.
Veremos acirrarem-se as discussões em torno do liberalismo e a continuidade
do sistema escravocrata estará no centro dessas discussões. Com o crescimento
do movimento abolicionista, os proprietários de terras e de escravos no Brasil
buscam alianças e mecanismos para perpetuar a escravidão e evitar o que, para
eles, significaria a redução de seus ganhos.
Com a abolição da escravidão em 1888, a monarquia brasileira perderá
sua principal base de sustentação, conforme veremos, e chegará ao fim no ano
seguinte, em um processo que denota a maneira pela qual o país se organizará a
partir daquele momento, com a concentração do poder nas mãos da aristocra-
cia em detrimento, mais uma vez, das camadas populares.
Portanto, caro(a) aluno(a), as discussões apresentadas nesta unidade reque-
rem atenção, haja vista tratarem da análise de um momento decisivo na história
da formação do Estado brasileiro.

Introdução
II

O SEGUNDO REINADO: O GOVERNO DE D. PEDRO II

D. Pedro I abdicou do trono brasileiro em 7


de Abril de 1831, deixando o país nas mãos
de seu filho Pedro de Alcântara de cinco
anos de idade, o que o impossibilitava de
assumir o comando do Brasil. Diante dessa
impossibilidade, uma junta de três membros
foi formada para administrar o país até que

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Pedro de Alcântara, agora D. Pedro II, atin-
gisse a maioridade. Tinha início o Período
Regencial que perdurou até 1840.
O Regente Uno Araújo Lima fora eleito
em 1838 após a renúncia do Regente Padre
Diogo Antônio Feijó e deveria governar o
Brasil até 1842, quando haveria novas eleições
para escolherem seu sucessor. No entanto, D. Pedro II
Araújo Lima deixou o comando do Brasil Fonte: Portal do Instituto Brasileiro de Museus
(online).
em 1840, dois anos antes do fim do seu
mandato.
A precocidade do fim do mandato de Araújo Lima explica-se pela aprova-
ção da Lei de Interpretação do Ato Adicional de 1834, aprovada em 1840. De
acordo com essa lei, as medidas impostas pelo Ato de 1834 que garantiam maior
autonomia às Províncias e aos Municípios foram revogadas, restaurando a ação
centralizadora do governo central.
A aprovação da Lei Interpretativa deve ser entendida pelo caráter conserva-
dor do governo de Araújo Lima (VIANNA, 2013, p. 73), que tinha o apoio dos
membros do Partido Regressista, no contexto da eclosão das inúmeras revoltas
em todo o país, conforme elencamos na unidade anterior. Nesse sentido, a descen-
tralização do poder decorrente do aumento da autonomia das Províncias gerou
um desconforto e uma desconfiança por parte dos defensores da monarquia,
que temiam que o governo central não mais recuperasse o controle da situação.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


69

Diante desse cenário, a elite brasileira demonstrava o desejo de ver o país


novamente regido por um poder central forte, capaz de evitar a onda de mani-
festações e de ameaças separativas que se espalhavam pelo país. Nesse contexto a
ideia de emancipação da maioridade de D. Pedro II surge entre os membros tanto
do Partido Progressista quando do Partido Regressista, ambos preocupados com
os rumos que a nação tomava, mesmo após a aprovação da Lei Interpretativa.
De acordo com Olivieri,
De qualquer modo, o Rio de Janeiro era a sede do poder no país. Um
país constantemente ameaçado pela desunião das Províncias e pelo des-
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membramento. Nesse sentido, D. Pedro II, embora criança, teve grande


contribuição a dar ao Brasil. Como imperador, era o símbolo vivo da
unidade de uma pátria há pouco tempo conquistada aos portugueses.
Essa posição lhe dava, diante da opinião pública, uma autoridade maior
do que a de qualquer regência. (OLIVIERI, 2001, p. 10).

“Ninguém lembrou de perguntar sobre os méritos do régio adolescente.


Mais uma vez era o símbolo que se impunha à pessoa. Era a representação e
o prestígio da instituição que deveria ‘salvar a nação’”.
Fonte: Schwarcz (1998. p. 68).

Com essa imagem construída diante dos brasileiros, D. Pedro II passou a ser
considerado, mesmo que ainda muito jovem, como o único capaz de resolver a
situação conflituosa na qual o Brasil se encontrava. Assim, a elite política do país
buscou medidas para driblar a Constituição de 1824 – que dizia que o imperador
deveria ter 18 anos para assumir o trono – e antecipar a ascensão de D. Pedro II
ao cargo de chefe do Estado brasileiro.

O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II


II

O GOLPE DA MAIORIDADE E A COROAÇÃO DE D. PEDRO II

A solução encontrada para a questão foi ignorar o que dizia a Constituição e


intensificar, em 1840, a campanha pela redução da maioridade do imperador
com a criação do Clube da Maioridade, pelo Partido Liberal, e que não encon-
trou oposição dentre os adversários políticos. De acordo com Schwarcz, “era a
instabilidade da ordem política e a inquietação diante das várias rebeliões que
levaram a se enterrar o regime antes da sua morte” (1998, p. 68).
Apoiado pelo povo e incentivado por

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seu tutor, o Visconde de Intanhém, aos
15 anos de idade D. Pedro II foi coro-
ado imperador do Brasil. (OLIVIERI,
2011, p. 12).
A coroação de D. Pedro II foi cele-
brada com uma grande festa que, de
acordo com Schwarcz (1998, p. 78), para
além da importância política do aconte-
cimento, demonstrou a suntuosidade do
momento para a construção de uma cul-
tura local. Ainda segundo a autora,

D. Pedro II na época da sagração, RJ, Fundação


Biblioteca Nacional
Fonte: MultiRio (online).

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


71

Talvez a sagração de d. Pedro II represente mesmo um primeiro mo-


mento em que se fundem duas instâncias. De um lado, era evidente o
lado instrumental do ritual por parte das elites, que com ele recoloca-
vam um imperador como símbolo da nação, e encontravam na monar-
quia um sistema necessário de arbitramento dos conflitos entre elas.
Ou seja, tomado desse ângulo, tratava-se claramente de um golpe das
elites para as elites. De outro lado, porém, a riqueza do ritual e da força
de sua divulgação levaram a uma explosão do imaginário popular, que,
na “chave das festas”, relia a mística desse pequeno rei brasileiro, “sagra-
do e encantado”. (SCHWARCZ, 1998, p. 83).
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DIRETRIZES DO GOVERNO DE D. PEDRO II

Passada a festa e os rituais que marcaram sua coroação, o jovem D. Pedro II pre-
cisou lidar com as agitações políticas e sociais que permeavam o país. A principal
preocupação do imperador era em relação às revoltas que surgiram ainda no
Período Regencial. Algumas delas foram controladas e sufocadas, mas outras,
como a Revolução Farroupilha – iniciada em 1835 no Rio Grande do Sul – con-
tinuavam a merecer atenção. Além dessa revolta, apenas a Revolução Praieira
ocorrida em Pernambuco em 1848 representou uma ameaça aos planos de D.
Pedro II.

A Revolução Praieira de 1848 articula-se no contexto das revoluções demo-


cráticas que ocorreram na Europa no mesmo período. Período conhecido
como Primavera dos Povos, as revoluções de 1848 representaram um mo-
vimento das camadas populares contra governos centralizadores e autori-
tários que não levavam em consideração a defesa dos interesses do povo.
Para um conhecimento mais aprofundado sobre a Primavera dos Povos, leia:
HOBSBAWM, Eric J. A era das revoluções: 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra,
2009.
Fonte: a autora.

O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II


II

O poder voltou às mãos do imperador e mais uma vez o Poder Moderador


garantiu a centralização que Liberais e Conservadores buscavam após o Período
Regencial e sobretudo o Ato Adicional de 1834. Para consolidar seu poder e
governar com relativa estabilidade, D. Pedro II foi aconselhado a se aproximar da
aristocracia e conceder-lhe algum privilégio, numa tentativa de acalmar aqueles
que o criticavam por sua postura mais favorável ao fim da escravidão (FAUSTO,
1995, p. 177-178).
Da aliança entre o imperador e a aristocracia,
Começou a funcionar um sistema de governo assemelhado ao parla-

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mentar, mas que não se confunde com o parlamentarismo no sentido
próprio da expressão. Em primeiro lugar, lembremos o fato de que a
Constituição de 1824 não tinha nada de parlamentarista. De acordo
com seus dispositivos, o Poder Executivo era chefiado pelo imperador
e exercido por ministros de Estado livremente nomeados por ele. Esse
critério é diverso do parlamentarismo, pois nesse sistema o ministério
– chamado de gabinete – depende essencialmente do Parlamento, de
onde sai a maioria de seus membros. (FAUSTO, 1995, p. 179).

Na construção dessa base política, a aristocracia encontrou no Partido Liberal seu


maior aliado devido às ideias defendidas por este de construção de um governo
federalista com maior participação dos poderes locais e, portanto – embora
defendendo a monarquia – a sua não colaboração para a manutenção do Poder
Moderador. O Partido Conservador, por sua vez, assentou sua base de apoio nos
comerciantes e nos senhores de crédito, na defesa do fim do tráfico de escravos
e na elaboração das leis abolicionistas (FAORO, 1976, p. 341-342).
Coube a D. Pedro II equilibrar os antagonismos de ambos os partidos com
a nomeação de políticos tanto de um quanto de outro para a composição do
legislativo. Nomeava seus ministros com vistas à defesa de seus interesses, não
se obstando de demiti-los diante da contrariedade desles. Ademais, embora
os cargos de deputados e de senadores fossem preenchidos por meio de elei-
ções populares, esse preenchimento era feito de acordo com a vontade e com os
interesses do imperador e por indivíduos que, na maioria das vezes, não repre-
sentavam o voto dos brasileiros.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


73

Faoro (1976) e Schwarcz (1998)


apontam que, ao menos nos primei-
ros anos de seu governo, D. Pedro
II manteve-se distante dos aconte-
cimentos e das agitações políticas
do Brasil, exercendo seu comando
por meio da nomeação de ministros
a quem confiava a direção do país,
supervisionando seus atos. Segundo
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os autores, o imperador dedicava-se


à sua educação, voltando seu inte-
resse para as artes e para a ciência, o
que explica o desenvolvimento des-
ses setores e a criação de algumas
instituições que marcaram o desen-
volvimento do Rio de Janeiro no
período em questão.

Angelo Agostini, As fraudes eleitorais são satirizadas


durante o segundo reinado, Biblioteca Municipal de SP.
Fonte: MultiRio (online).

“O ‘grande imperador’ era, então, apenas uma representação de si, cumprin-


do de forma ritual, pomposa e elaborada uma agenda oficial feita para apre-
sentá-lo apenas em momentos destacados”.
Fonte: Schwarcz (1998, p. 85-86).

O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II


II

Se o imperador dedicava-se mais às artes e às ciências, cabia ao seu Ministério


discutir as questões mais importantes do governo, estas voltadas à política e à
economia. Os ministros Araújo Lima, Eusébio de Queiroz, Paulino José Soares
de Sousa e Joaquim José Rodrigues Torres juntamente com a câmara dos depu-
tados – composta em sua maioria por membros do Partido Conservador – foram
os que tiveram de lidar com as questões relativas à economia brasileira, por
exemplo, a estrutura agrária e a escravidão, sendo esta última um assunto con-
troverso e que envolvia uma série de considerações que foram calorosamente
debatidas ao longo de todo o Segundo Reinado e à qual dedicaremos especial

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atenção mais adiante.

A GUERRA DO PARAGUAI (1864-1870)

A Guerra do Paraguai marcou o governo de D. Pedro II na medida em que


representou o maior conflito armado ocorrido nesse período. Mais uma vez, o
Brasil envolveu-se em uma batalha com as províncias que compunham a região
do Prata (Argentina e Uruguai). No entanto, ao contrário do que ocorrera no
passado, dessa vez o Brasil aliou-se a esses países para lutar contra o Paraguai,
formando a Tríplice Aliança.

Guerra do Paraguai
Fonte: Estudo Prático (online).

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


75

A historiografia destaca que vários fatores contribuíram para o início do


conflito, sendo este analisado por diversos ângulos que incluem a emergência
dos países após a crise do sistema colonial no século XIX, as relações conflitan-
tes entre Brasil e Uruguai no início da década de 1860 e as disputas em torno dos
rios Paraguai e Uruguai devido às suas possibilidades comerciais.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

De acordo com Enrique Amayo (1995), a Guerra do Paraguai deve ser enten-
dida dentro do contexto do desenvolvimento do imperialismo e, sobretudo,
no que comete à Inglaterra nesse período.
Para saber mais sobre a relação entre o desenvolvimento inglês e a Guerra
do Paraguai acesse o conteúdo disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?pid=S0103-40141995000200013&script=sci_arttext>. Acesso em: 01
maio 2015.
Fonte: Amayo (1995).

O Paraguai, ao contrário do que ocorrera em vários países, após sua inde-


pendência da Espanha no início do século XIX, adotou medidas de governo
que visavam a alcançar o desenvolvimento do país, livrando-o da dependência
econômica de outras nações. Com essas medidas, o Paraguai conquistou uma
situação diferenciada em relação aos demais países da América Latina que pas-
saram por processos de independência no mesmo período.
Nesse contexto de busca pelo seu desenvolvimento e por sua independência
econômica, na segunda metade do século XIX, o Paraguai adotou uma política
expansionista, liderada pelo ditador Francisco Solano Lopez que pretendia alcan-
çar e conquistar terras na região da Bacia do Prata, abrindo um caminho para
o Oceano Atlântico. A eclosão da guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai
ocorrerá nesse contexto e trará diferentes resultados para os países envolvidos.

O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II


II

Para o Brasil, a postura do Paraguai ameaçava a sua ideia de promover a


livre navegação na bacia do Prata, o que representava uma alternativa de comu-
nicação mais viável entre as Províncias do Centro-Oeste, Mato Grosso e Goiás,
além da tentativa de impedir a reorganização do antigo Vice-Reino do Prata.
(SALLES, 2015).
No que diz respeito à Argentina, a relação com o Paraguai e sua busca pelo
crescente desenvolvimento foi permeada pelo confronto entre os paraguaios e
a burguesia portenha de Buenos Aires, à qual não pretendia submeter-se. Os
paraguaios pretendiam ter autonomia e livre acesso aos rios Paraná e Paraguai,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
desafiando a dominação dos argentinos na região. (FAUSTO, 1995, p. 211).

Posto de Comerciantes no rio Paraná, século XIX


Fonte: MultiRio (online).

O Uruguai, por sua vez, vivia momentos de instabilidade interna, na medida


em que estava dividido entre os grupos denominados blancos – proprietários
rurais que não viam com bons olhos a aproximação e as influências de potên-
cias europeias sobre o país– e os colorados – próximos dos comerciantes e que
defendiam os ideais liberais e o fortalecimento das relações com as nações euro-
peias (FAUSTO, 1995, p. 210). O envolvimento do Uruguai com o Paraguai e o
desenrolar de suas relações estavam diretamente ligadas à influência que o Brasil
exercia no Uruguai.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


77

De acordo com Bóris Fausto,


Na primeira metade do século XIX, a posição do Brasil diante dos seus
vizinhos pode ser assim resumida. A maior preocupação do governo
imperial se concentrava na Argentina. Temia-se a unificação do país,
que poderia se transformar em uma República forte, capaz de neutrali-
zar a hegemonia brasileira e atrair a inquieta província do Rio Grande
do Sul.

No que diz respeito ao Uruguai, houve sempre uma política de influ-


ência brasileira no país. Os gaúchos tinham interesses econômicos no
Uruguai, como criadores de gado, e viam com maus olhos medidas de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

repressão ao contrabando na fronteira. O Brasil colocou-se ao lado dos


colorados, cuja linha política se aproximava de seus interesses. (...).

As relações do Brasil com o Paraguai, na primeira metade do século


XIX, dependeram do estado das relações entre o Brasil e a Argentina.
Quando as rivalidades entre os dois países aumentavam, o governo im-
perial tendia aproximar-se do Paraguai. Quando as coisas se acomoda-
vam, vinham à tona as diferenças entre Brasil e Paraguai. As divergên-
cias diziam respeito às questões de fronteira e à insistência brasileira na
garantia de livre navegação pelo Rio Paraguai, principal via de acesso a
Mato Grosso. (FAUSTO, 1995, p. 211).

As análises feitas pelo autor acima citado nos ajudam a compreender a forma-
ção da aliança entre Brasil, Argentina e Uruguai que começou a se desenhar em
1862 quando se formou um governo republicano na Argentina – com princí-
pios que eram comuns aos liberais brasileiros – e o Brasil aliou-se aos colorados
no Uruguai.
Diante da aliança entre o Brasil e os colorados do Uruguai, o Paraguai passou
a apoiar os blancos na defesa de seu território e contra a acusação dos rio gran-
denses de que os uruguaios roubavam seu gado e abrigavam escravos fugitivos.
Com a intensificação da interferência brasileira no Uruguai e das divergências
entre blancos e rio grandenses, o Paraguai declarou guerra ao Brasil, confiante
de que teria o apoio da Argentina e na força de seu exército. (SALLES, 2015).
Solano Lopez se enganou. Sem o apoio da Argentina, que se aliou ao Brasil
e ao Uruguai formando a Tríplice Aliança, no decorrer dos seis anos em que a
guerra perdurou, o exército paraguaio foi submetido a sucessivas derrotas e o
país viu sua economia retroceder diante dos investimentos para o conflito. Além
disso, estima-se que 2/3 da população paraguaia sofreu com o ônus da guerra.

O Segundo Reinado: O Governo de D. Pedro II


II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Os três chefes de Estado do Uruguai, Brasil e Argentina, numa caricatura da revista A Semana
Ilustrada, 1865
Fonte: MultiRio (online).

Os efeitos da Guerra do Paraguai para o Brasil influenciou no processo de


fim da escravidão (1888) e da Proclamação da República (1889). Embora a
Tríplice Aliança tenha saído vitoriosa da guerra, todos os países envolvidos
sofreram com as consequências no âmbito político, econômico e social.
Para conhecer um pouco mais sobre os efeitos da Guerra do Paraguai para
os países envolvidos, veja o conteúdo disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo.php?pid=S0103-40141995000200012&script=sci_arttext&tlng=es>.
Acesso em: 02 maio 2015.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


79
©shutterstock
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A ECONOMIA NO PERÍODO IMPERIAL BRASILEIRO

No período da história brasileira sobre o qual nos debruçamos neste momento,


o período imperial, teve como um de seus elementos característicos a conso-
lidação da cafeicultura como o carro-chefe da economia do país. Os grandes
proprietários de terras, das fazendas de café e senhores de escravos fortaleceram-
-se enquanto classe econômica, compondo uma elite que participou ativamente
dos encaminhamentos políticos que permearam a organização do Brasil após
a independência.
Após a transferência da família real portuguesa para o Brasil e o fim do Pacto
Colonial – uma das consequências dessa mudança, a Grã-Bretanha passou a ter
privilégios na relação comercial com o Brasil na medida em que a importação de
seus produtos para o Brasil estava sujeita a tarifas alfandegárias menores, garan-
tindo uma dependência maior do Brasil em relação a esses produtos.
A dependência econômica do Brasil em relação à Grã-Bretanha foi uma das
razões que contribuíram para que no período imperial o país atravessasse uma
crise que influenciou a eclosão de várias revoltas em todo o país, algumas das
quais mencionamos na unidade anterior.
A partir do governo de D. Pedro II, a cafeicultura se desenvolveu e o café
transformou-se no principal produto de exportação do Brasil, garantindo alguma
estabilidade para um país em um contexto até então permeado por oscilações
políticas e inquietação social.

A Economia no Período Imperial Brasileiro


II

De acordo com Lago,


Em tal contexto, quando se considera o desempenho econômico do
país como um todo, o período que vai de 1808 a 1850 pode ser vis-
to como uma era de estagnação, apesar de progressos específicos em
determinadas regiões. Após 1808, os produtos manufaturados britâni-
cos logo inundaram o mercado brasileiro, sendo vendidos até mesmo
em áreas remotas. (...). No entanto, o aumento das importações não
foi acompanhado por um crescimento equivalente da capacidade de
importar, uma vez que os termos de troca (relação entre os preços de
importação e de importação) passaram a ser desfavoráveis ao Brasil,
e assim o país foi perdendo aos poucos sua posição relativamente fa-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
vorável nos mercados internacionais de seus produtos de exportação
tradicionais. (LAGO, 2014, p. 64).

Diante da queda nas exportações dos produtos que, durante o período colonial,
garantiram a inserção do Brasil no mercado mundial, o crescimento da produção
cafeeira e de sua exportação possibilitou que a economia brasileira novamente
tivesse chances de competir no mercado mundial, haja vista a crescente demanda
por este produto por parte de países europeus e dos Estados Unidos.

Victor Frond, Fazenda Produtora de Café, 1861


Fonte: MultiRio (online).

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


81

As maiores fazendas de café concentravam-se no Rio de Janeiro, São Paulo


e Minas Gerais, o que significa que essas regiões transformaram-se, ao longo do
período imperial, no centro econômico do país. A concentração das fazendas
de café nessas regiões nos ajuda a compreender o maior desenvolvimento alcan-
çado por essas regiões em comparação com as demais regiões do país. O Rio de
Janeiro, por exemplo, receberá maiores investimentos, garantindo seu status de
capital do Império e ampliando a participação política da aristocracia carioca
nos anos seguintes.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Uma dinastia da aristocracia cafeeira fluminense


Fonte: MultiRio (online).

Com o desenvolvimento da economia cafeeira, o tráfico de escravos também


ganhou fôlego, visto que a manutenção da produção assentava-se nesse tipo de
mão de obra, que representava para os barões do café um investimento mínimo
comparado ao uso da mão de obra assalariada, aumentando sua margem de lucro.
Além do declínio das atividades que ocuparam o centro da economia brasi-
leira no século XVIII, outra razão para o aumento da produção cafeeira no Brasil
e para sua exportação reside nas transformações pelas quais o cenário mundial
estava passando. Marquese e Tomich (apud GRINBERG; SALLES, 2009), ao ana-
lisarem a evolução da produção cafeeira no Brasil, relatam que

A Economia no Período Imperial Brasileiro


II

A escala e o caráter do mercado se modificaram de modo igualmente


profundo no século XIX. Na década de 1880, a produção total de café
no globo era dez vezes maior do que cem anos antes. Entre uma data e
outra, a grande novidade foi o aparecimento dos Estados Unidos como
comprador. Nesse período, sua população aumentou 15 vezes e o con-
sumo per capita anual passou de apenas 25 gramas para quatro quilos.
Tratava-se de um mercado aberto, livre de tarifas de importação desde
1832, que pouco exigia a respeito da qualidade do café adquirido. Os
demais grandes compradores do período, todos localizados no norte
de uma Europa em rápido processo de industrialização e urbanização,
também se distinguiram no século XIX pela explosão demográfica e
pelo notável aumento nas taxas de consumo per capita. Interessa desta-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
car nisso tudo que a passagem do mercado restrito e de luxo do século
XVIII para o mercado de massa industrial do século XIX foi claramen-
te induzida pela oferta a baixo custo do produto. (MARQUESE; TOMI-
CH apud GRINBERG; SALLES, 2009, p. 361).

Seguindo a análise dos autores mencionados, a transformação e a evolução do


mercado mundial exigiu que os países economicamente pautados nas atividades
agrícolas aumentassem sua produção para atender às necessidades das econo-
mias internacionais, cada vez mais voltadas para a industrialização. Além disso,
os autores chamam nossa atenção para o fato de que a manutenção do sistema
escravocrata no Brasil foi um fator decisivo para que o país conseguisse se desta-
car em relação aos seus concorrentes (MARQUESE; TOMICH apud GRINBERG;
SALLES, 2009, p. 361).

Nesse cenário, a escravidão perpetuava-se como instituição necessária e


fundamental para a continuidade do crescimento econômico do país. Para
a aristocracia, lutar contra a escravidão era lutar contra o desenvolvimento
econômico do país.
Fonte: a autora.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


83
©shutterstock

1850: A PROPRIEDADE DA TERRA E O TRÁFICO DE ESCRAVOS


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Nesse contexto de desenvolvimento e de expansão da produção cafeeira, as


questões relacionadas à propriedade da terra e as discussões sobre a escravidão
ocupavam a mente da elite política e aristocrática do país, devido à intrínseca
relação entre essas duas esferas da sociedade.
As diretrizes legais que regulamentavam a propriedade da terra no Brasil
até o ano de 1822 estavam fundamentadas no sistema de doações, formalizado
pela Lei de Sesmarias, criada nos primeiros anos da colonização do Brasil. Com
a independência do Brasil, a Lei de Sesmarias perdeu seu efeito e não houve a
regulamentação de uma nova lei em relação à propriedade da terra até a metade
do século XIX.
Nesse período que se estende de 1822 – com o fim da Lei de Sesmarias – a
1850 – quando é publicada a Lei de Terras – o acesso à terra no Brasil deu-se
principalmente por meio da ocupação. Por essa razão, ao discutir uma nova legis-
lação fundiária para o Brasil, foi preciso levar em consideração aspectos que iam
além da extensão das propriedades, como os relativos à situação dos posseiros e
às suas condições de submeter-se e adaptar-se às necessidades do modelo agro-
exportador da economia brasileira no século XIX.
Em conformidade com a realidade econômica do país caracterizada pela
expansão do caráter agroexportador do setor cafeeiro, em 1850 foi aprovada a
Lei de Terras, que regulamentava o acesso à terra a partir daquele momento. De
acordo com essa lei, o único meio legal de garantir a propriedade da terra era
por meio da compra. As doações, as concessões ou as posses foram considera-
das ilegais, sendo que os indivíduos com propriedades nessa situação estavam
sujeitos às sanções do governo central.

A Economia no Período Imperial Brasileiro


II

A publicação da Lei de Terras em 1850 significou o alinhamento da política


central com o novo contexto econômico do Brasil, caracterizado pela desestrutu-
ração do complexo agroexportador açucareiro e a ascensão da atividade cafeeira,
com o consequente deslocamento do centro econômico da região Nordeste para
o Sudeste do país. Nesse sentido, a lei de 1850 veio ao encontro dos interesses da
aristocracia cafeeira, representando uma forma de proteger seus investimentos
das tentativas ou possibilidades de indivíduos de outras camadas sociais terem
acesso à terra, durante o desenvolvimento da produção.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Charles Ribeyrolles, A Casa Grande de uma fazenda de café no século XIX
Fonte: MultiRio (online).

A promulgação da Lei de Terras em 1850 esteve relacionada também aos


rumos que o debate acerca da escravidão estava tomando naquele momento.
Desde os tempos da transferência da família real portuguesa para o Brasil, a
Inglaterra, que ajudou o Brasil nesse processo, pressionava o governo para colocar
fim ao tráfico de escravos e à escravidão. Durante a primeira metade do século
XIX, o Brasil adotou uma postura que na teoria aceitava as imposições feitas
pela Inglaterra no que dizia respeito à escravidão, embora na prática, até 1850,
nada tenha feito de efetivo para cumprir os acordos estabelecidos com o país.
Entretanto, em 1850, diante da crescente pressão inglesa e também da inten-
sificação do movimento abolicionista, o governo brasileiro publicou a Lei Eusébio
de Queirós, que proibia e condenava o tráfico negreiro. Portanto, a partir dessa
data, a entrada de escravos no Brasil por meio dos navios negreiros estava proi-
bida, o que afetava diretamente a economia do país, na medida em que a mão
de obra utilizada nas propriedades rurais era essencialmente escrava.
Embora a elite econômica do país tenha se mostrado contrária à aplicação

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


85

da Lei, ela foi colocada em prática e foi preciso que os proprietários rurais bus-
cassem novas formas de assegurar a mão de obra nas suas fazendas. Uma das
soluções encontradas foi o aperfeiçoamento do tráfico interprovincial de escra-
vos, ou seja, o comércio interno de escravos, o que elevou o valor do escravo
enquanto mercadoria e foi um dos fatores que contribuiu para a gradativa subs-
tituição da mão de obra empregada nas fazendas produtoras de café, assunto
sobre o qual nos aprofundaremos em outro momento.
Caro(a) aluno(a), devemos estar atentos para o significado do ano de 1850
para o estabelecimento de novas diretrizes sobre as quais a sociedade brasileira
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

vai se organizar a partir de então. As transformações na economia com o deslo-


camento do centro econômico do Nordeste para o Sudeste do Brasil, a criação de
uma nova legislação fundiária que limitava o acesso à terra por meio da compra
e impedia que trabalhadores livres conquistassem o direito à propriedade devido
ao alto valor da terra e a suspensão do tráfico negreiro
com a promulgação da Lei Eusébio de Queirós
mostram os conflitos e as divergências políticas
e ideológicas existentes no interior da sociedade
brasileira, além de representar o grau de influ-
ência de fatores externos na organização do país.
A partir da segunda metade do século XIX, as
diferenças e as contradições presentes na sociedade
brasileira foram levadas ao extremo e tive-
ram como consequência eventos que
tornaram insustentável a manuten-
ção da ordem vigente, culminando
no fim da escravidão e no conse-
quente fim do regime monárquico.

Eusébio de Queirós, responsável pela aprovação da lei de


extinção do tráfico negreiro
Fonte: MultiRio (online).

A Economia no Período Imperial Brasileiro


II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O MOVIMENTO ABOLICIONISTA NO BRASIL IMPERIAL

Na segunda metade do século XIX, a produção cafeeira encontrava-se desen-


volvida e representava a principal fon te de recursos para o país, sustentada pela
mão de obra escrava. Mesmo quando os primeiros imigrantes começaram a che-
gar ao Brasil para servir de mão de obra em diversos setores, a escravidão vai
ser ainda, até a Lei Áurea, a base de sustentação não só da economia, mas tam-
bém da monarquia brasileira.
Quando o Brasil tornou-se independente de Portugal, na primeira metade
do século XIX, o discurso da elite política e intelectual, responsável pela organi-
zação do país recém-emancipado, estava fundamentado nos princípios liberais,
tão em voga na Europa e que já tinha influenciado o processo de independên-
cia e de organização de outras regiões da América.
No entanto, ao evocar o liberalismo e fazer dele a diretriz de orientação para
a constituição do novo Estado, os intelectuais brasileiros adotaram sua própria
versão do liberalismo, na medida em que a escravidão, já enraizada no Brasil e
nos brasileiros, mesmo representando a antítese dos fundamentos liberais, não
poderia deixar de existir, ao menos não até que uma forma de trabalho tão van-
tajosa quanto ela fosse adotada, sem comprometer os lucros dos detentores do
poder econômico no Brasil.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


87

Conforme aponta Alfredo Bosi,


Para entender a articulação de ideologia liberal com a prática escravista
é preciso refletir sobre os modos de pensar dominantes da classe políti-
ca brasileira que se impôs nos anos da independência e trabalhou pela
consolidação do novo império entre 1831 e 1860 aproximadamente.

O que atuou eficazmente em todo esse período de construção do Bra-


sil como Estado autônomo foi um ideário de fundo conservador; no
caso, um complexo de normas jurídico-políticas capazes de garantir
a propriedade fundiária e escrava até seu limite possível. (BOSI, 1992,
p. 195)
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

No decorrer do período imperial, devido à aproximação e à dependência da


Grã-Bretanha, o debate sobre a questão
da escravidão foi recorrente em maior ou
menor grau, dependendo do grupo político
que estava no comando do país, ao lado do
imperador. A questão da escravidão, destaca
Lilia Schwarcz (1998), foi em grande medida
a responsável pela alternância dos partidos
Liberal e Conservador nos principais cargos
do governo brasileiro.
A Grã-Bretanha havia colocado fim ao
tráfico de escravos e à escravidão em suas pos-
sessões no século XVIII e impelia o Brasil a
fazer o mesmo desde o momento em que se
aliou a Portugal contra a França, ajudando
D. João VI e sua família a fugir para o Brasil,
então sua colônia, no início do século XIX.
Nessa ocasião, Portugal firmou um acordo
com a Grã-Bretanha no qual se comprome-
tia a acabar gradativamente com o tráfico
negreiro. O Tratado de Amizade e Aliança
assinado em 1810 foi o primeiro ato contra a
Tratado da Amizade e Aliança
escravidão no Brasil, influenciado pelo aliado
Fonte: MultiRio (online).
europeu de Portugal.

O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial


II

“Nos países em que se processou a Revolução Industrial os novos gru-


pos ligados ao capitalismo industrial que passaram a influenciar a política
condenaram a escravidão. A existência de uma grande massa de escravos
nas regiões coloniais parecia-lhes um entrave à expansão de mercados e à
modernização dos métodos de produção. Os setores agrários haviam sido
escravistas, os novos grupos desvinculados da Grande Lavoura apontavam
todos os aspectos negativos da escravidão. A partir de então o sistema es-
cravista estava condenado”.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Fonte: Costa (2010, p. 274).

Os primeiros acordos firmados entre Portugal e a Grã-Bretanha objetivando


o fim da escravidão nas colônias americanas não saíram do papel. Levar-se-ia
anos ainda até que o Brasil abdicasse da prática escravocrata e adotasse a mão
de obra livre e assalariada. Seria preciso superar o preceito de que a escravidão
era um mal necessário ao desenvolvimento do país. Por essa razão, a abolição
da escravidão foi um processo lento, construído ao longo de todo o império.
A pressão britânica para a abolição da escravidão no Brasil não surtiu efeito
de fato até 1850, uma vez que a sociedade não se encontrava pronta para tal acon-
tecimento e não havia uma alternativa de substituição de mão de obra escrava
que não comprometesse os lucros dos proprietários rurais e, consequentemente,
esfriasse os investimentos na agricultura.

O CAMINHO PARA A LIBERDADE

A Lei Eusébio de Queirós de 1850 foi o primeiro passo efetivo no processo que
culminou com a abolição da escravidão no Brasil, embora há tempos a discus-
são acerca desse tema estivesse presente nos círculos intelectuais do país. Cabe
ressaltar, caro(a) aluno(a), que, enquanto o debate sobre a escravidão esteve
restrito aos centros da intelectualidade da sociedade, pouco se avançou na pro-
moção do fim dessa instituição.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


89

Os intelectuais defenso-
res da abolição perceberam
que aproximar a sociedade
como um todo nos deba-
tes acerca da escravidão
permitiria que o tema se
transformasse em uma questão social, forçando a compreensão de que, a partir
da segunda metade do século XIX, a substituição do trabalho escravo por outras
formas de trabalho era apenas uma questão de tempo.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A partir da compreensão de que o fim da escravidão era um fato irreversí-


vel, era necessário estabelecer os termos e as
diretrizes sobre as quais o processo de abo-
lição ocorreria (COSTA, 2010). Intelectuais,
aristocracia, liberais e conservadores passa-
ram a debater sobre, cada um sob uma óptica
que dizia respeito à preservação de seus inte-
resses, qual era a melhor maneira de levar a
cabo o fim da escravidão.
Os possíveis prejuízos à economia não
podiam deixar de ser levados em considera-
ção. Por essa razão, uma das propostas para a
concessão de liberdade para os escravos afri-
canos baseava-se na promulgação de leis que
objetivavam preparar o país para a concre-
tização da abolição. Além de propor o fim
gradual da escravidão, esse projeto – proposto
pelos liberais – previa ainda uma indenização
para os proprietários de escravos, numa ten-
tativa de reparar as perdas que esles teriam ao
Escravos na colheita de café, Vale do Paraíba,
alforriar seus escravos, perdendo, consequen- 1882 (Marc Ferrez/Colección Gilberto Ferrez/
temente, a força de trabalho de suas lavouras. Acervo Instituto Moreira Salles)
Fonte: História Ilustrada (online).

O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial


II

O projeto dos liberais forne-


ceu as bases para a promulgação
da Lei do Ventre Livre em 1871,
proposta pelo Visconde do Rio
Branco e que estabelecia que
os filhos de escravas nascidos
a partir daquela data seriam
considerados livres e da Lei
dos Sexagenários em 1885,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que declarava livre os escravos
com idade acima dos 60 anos
(COSTA, 2010, p. 364).

A Lei dos Sexagenários teve pouco efeito prático, na medida em que era
raro um escravo no Brasil atingir a idade ideal para ser beneficiado pela lei.
A expectativa de vida de um escravo brasileiro era de aproximadamente 30
anos.
Fonte: a autora.

Mesmo diante da oposição da elite latifundiária brasileira, a sociedade enten-


dia que a escravidão era uma instituição que não mais se encaixava na realidade
brasileira. Com isso queremos dizer que a população, pelo menos em sua maio-
ria, apoiava o fim do regime escravocrata e reforçava o discurso e a campanha
dos intelectuais abolicionistas.
Nesse contexto de acirramento das discussões sobre a escravidão, os escravos
também manifestavam suas opiniões a respeito, demonstrando toda a ansiedade
pelo fim do regime que lhes fora imposto. As fugas dos escravos tornaram-se
constantes e “a escravidão tornou-se uma instituição desmoralizada” (COSTA,
2010, p. 364). Como nos mostram Pereira e Machado,

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


91

Cientes de que a escravidão perdia a legitimidade, os grupos de es-


cravos passavam a ganhar em ousadia e articulação, utilizando-se da
quebra do consenso sobre a escravidão para avançar em todo tipo de
reivindicação. Revoltando-se, fugindo, cometendo crimes, demandan-
do melhorias, assim como salário e autonomia de ir e vir, os escravos,
no decorrer da década, mostraram que confrontavam a escravidão tan-
to por dentro do sistema quanto por fora dele, exigindo simplesmente
a liberdade. (PEREIRA e MACHADO, apud GRINBERG e SALLES,
2009, v. 3, p. 376).

Como é possível observar, caro(a) aluno(a), na década de 1880, o movimento


abolicionista ganhara força e adeptos, tornando a manutenção do regime escra-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

vocrata uma afronta à sociedade brasileira. Era imprescindível que o imperador


tomasse uma atitude definitiva. A questão adquiriu proporção e urgência que
não mais podia esperar discussões ou definições sobre indenizações.
D. Pedro II, que desde o início de seu governo preocupou-se mais com
assuntos relacionados à arte e à cultura do que com a política e a economia do
país, nesse momento de efervescência em
que se encontrava a sociedade brasileira,
mais uma vez preferiu dedicar-se a temas
menos urgentes do que ao “problema”
que ganhava força no interior do país.
As viagens do imperador para a
Europa eram frequentes e sua autoridade
passou a ser questionada diante dos cons-
tantes períodos em que se ausentava do
país. Sua imagem enquanto monarca e
imperador do Brasil ficaram abaladas.
Acusavam-no de fugir das questões polí-
ticas que imperavam no Brasil naquele
momento (SCHWARCZ, 1998, p. 429).

Lei Áurea, de 1888


Fonte: Silva (online).

O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial


II

Em 1887 o imperador mais uma vez decidiu viajar para a Europa, igno-
rando o crescimento do movimento abolicionista e das agitações em torno das
ideias republicanas. Em seu lugar assumiu sua filha, a princesa Isabel, a quem
coube a responsabilidade de lidar com as agitações que assolavam o país naquele
momento, colocando fim à questão da escravidão.
Com tendências abolicionistas, a Princesa Isabel, em 13 de Maio de 1888
assinou a Lei Áurea, colocando um fim na escravidão no Brasil. Segundo Lilia
Schwarcz, “não havia mais como adiar o processo. Redigido de maneira sim-
ples, o texto da lei era curto e direto: ‘É declarada extinta desde a data desta lei

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
a escravidão no Brasil. Revogam-se as disposições em contrário’”. (1998, p. 437).

DEPOIS DA ABOLIÇÃO

Manchete no jornal Gazeta de Notícias sobre a abolição da escravidão


Fonte: Museu Afro Brasil (online).

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


93

A assinatura da Lei Áurea foi comemorada dentro e fora do Brasil, uma vez
que desde o início do século XVIII nações estrangeiras combatiam a escravidão
e pressionavam o Brasil para colocar fim à instituição no país. A Princesa Isabel
entrou para a história como a redentora dos escravos, o que contribuiu para que
o desgaste da monarquia, representada por um imperador cuja popularidade e
autoridade estavam em decadência, fosse revertido em apoio à princesa.
Porém, é preciso analisar, caro(a) aluno(a), o que aconteceu após a publi-
cação da Lei Áurea. Como se processou a concessão de alforria aos escravos e
como a sociedade se organizou para receber essa massa de indivíduos a par-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tir de então libertos. A questão em torno de como a massa de escravos libertos


foi incorporada na sociedade a partir de 1888 muito nos diz sobre a atitude da
Princesa Isabel.
Vimos que o projeto dos liberais com relação à escravidão baseava-se no fim
gradual dessa instituição com o pagamento de uma indenização aos senhores de
escravos. Dessa forma, o Brasil conseguiria organizar-se e preparar-se para o fim
definitivo do regime escravista, sem grandes prejuízos para a monarquia e eco-
nomia. No entanto, mesmo se considerarmos que a escravidão demorou para
ser abolida do país na medida em que as discussões acerca do tema remontam
ao início do século XIX, quando ela de fato acontece, o Brasil não estava pronto.
Conforme veremos mais adiante, em algumas regiões do país, como no
Nordeste e no Sul, o trabalho escravo estava sendo gradativamente substituído
pelo uso da mão de obra estrangeira, mas os resultados dessas primeiras experi-
ências não foram satisfatórios, por razões que discutiremos em outro momento.
Diante disso, persistia ainda no país a questão de como as propriedades rurais
iriam manter o funcionamento de suas atividades, tão importantes para o desen-
volvimento econômico do Brasil.

O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial


II

Além da questão de substituição da mão de obra nas fazendas produtoras


em todo o país, outro problema desencadeado pela promulgação da Lei Áurea
dizia respeito à alocação dos escravos recém-libertos na sociedade brasileira.
Havia emprego para todos esses indivíduos? Eles teriam condições de manter-
-se e suprir suas necessidades básicas longe das grandes fazendas? A sociedade
estava aberta a recebê-los em seu seio e reconhecê-los enquanto cidadãos com os
mesmos direitos e deveres que o “branco”? Não estaria a escravidão tão profun-
damente enraizada no interior da sociedade que, mesmo com o manifesto apoio
de muitos ao movimento abolicionista, ao concretizar-se a abolição, percebeu-se

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que o preconceito já era uma característica intrínseca a muitos indivíduos após
tanto tempo de existência da escravidão? Estes foram questionamentos que, ao
nosso entender, não receberam a devida atenção no momento em que se con-
firmou a abolição.

Após a abolição os escravos buscaram se fixar em locais longe dos centros


urbanos, sendo que, no início do século XX, com a política do branquea-
mento, eles foram levados para bairros ainda mais longe dos centros das
cidades.
Para conhecer um pouco mais da situação dos negros após a publicação
da Lei Áurea, acesse o conteúdo disponível em: <http://www.ipea.gov.br/
desafios/index.php?option=com_content&id=2673%3Acatid%3D28&Ite-
mid=23>. Acesso em: 10 abr. 2015.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


95

Os negros recém-libertos não encontraram seu lugar na sociedade imedia-


tamente após a abolição e, por essa razão, muitos acabaram permanecendo nas
fazendas onde viviam até então, não mais na condição de escravos, mas em troca
de salários tão baixos que se assemelhavam mais a um simbolismo da existência
de um trabalho livre e assalariado. Mesmo recebendo por seu trabalho um valor
meramente representativo, os que decidiam permanecer nas fazendas o faziam
em troca da garantia de moradia e de alimentação.
Aqueles que optavam por deixarem as fazendas e buscarem oportunidades
nas cidades exercendo qualquer tipo de ofício deparavam-se com a falta de habi-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

lidades que garantisse colocação no mercado de trabalho, ou ainda com uma


sociedade preconceituosa que ainda enxergava o negro como uma mercadoria,
como escravo. Aos que conseguiam estabelecer-se nas cidades e conquistavam
um emprego, recebiam em troca salários mais baixos que os demais emprega-
dos, o que dificultava seu perfeito estabelecimento nas cidades e proporcionava
a má garantia de sua sobrevivência.
Portanto, caro(a) aluno(a), a Lei Áurea garantiu ao negro a liberdade ape-
nas no papel, na teoria, porque, na prática, ele continuava preso a uma sociedade
que não conhecia outra maneira de enxergá-lo e que, mesmo tentando negar,
não conseguia deixar de demonstrar o quanto os mais de trezentos anos de exis-
tência da escravidão havia internalizado o preconceito racial. Levar-se-ia ainda
muitas décadas para que os negros pudessem exercer sua liberdade de fato e, ao
que parece, esse processo ainda hoje não se completou.

Atualmente existem pessoas que defendem a ideia de que o Brasil tem uma
dívida histórica com os negros. Por essa razão, busca-se desenvolver políti-
cas afirmativas que visam reparar os danos causados aos negros no passado.
E você, o que pensa a respeito?
Fonte: a autora.

O Movimento Abolicionista no Brasil Imperial


II

O MOVIMENTO REPUBLICANO E O FIM DA


MONARQUIA NO BRASIL

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Proclamação da República. Pintura de Benedito Calixto.
Fonte: Amaral (2014, p.13).

Já dissemos em vários momentos nesta unidade, caro(a) aluno(a), que a escravi-


dão era a base de sustentação da monarquia, na medida em que as bases políticas
e econômicas do país estavam ligadas à elite agrária, dependente da mão de obra
escrava. Por essa razão, ao abolir o regime escravocrata no Brasil, o governo,
representado nesse ato pela Princesa Isabel, abriu o caminho para o fortaleci-
mento das ideias de substituição do regime monárquico já, ideias essas em voga
no interior do país, que levaram ao consequente fim da monarquia brasileira.
Portanto, se por um lado o ato da Princesa Isabel libertou os escravos e colo-
cou o Brasil mais perto dos princípios liberais há tempos evocados por uma parte
da elite intelectual do país, por outro lado, criou condições para que a oposi-
ção ao governo de seu pai crescesse e, mais uma vez, as bases de organização do
país fossem repensadas.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


97

Ao analisar o fim da escravidão, Lilia Scwarcz destaca que


(...) a abolição definitiva gerava também perdas materiais e levava ao
desprestígio de uma minoria muito ativa e extremamente ligada ao tro-
no e que depressa se bandeou para o lado dos republicanos. Por mais
que a monarquia premiasse os proprietários rurais com títulos de ba-
ronato e alegasse o caráter inevitável da medida, a falta de indenização
selava o rompimento com o Estado. (...).

Divorciavam-se, portanto, nesse momento, duas instâncias de repre-


sentação. A monarquia, decadente em seus rituais, recuperava o imagi-
nário ao vincular-se ao ato mais popular do Império: a abolição. Mais
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

uma vez a “realeza política” era associada à “realeza mística”, senhora


da “justiça” e da “segurança”. Paradoxalmente, porém, ao afastar-se das
elites proprietárias o Império perdia seu esteio e distinguia-se de sua
versão mais institucional. Dessa forma, se na iconografia oficial era a
imagem popular que “aclamou Isabel nas ruas” que estará presente, nos
rumos políticos os caminhos eram bem mais tortuosos. Esse parecia
ser mesmo o último grande ato da monarquia. (SCHWARCZ, 1998,
p. 438).

A ideia de uma República no Brasil não surge apenas quando finda a escravidão.
As discussões sobre uma possível mudança no regime de governo esteve pre-
sente já no século XVIII, quando algumas manifestações contrárias ao governo
brasileiro – como foi o caso da Inconfidência Mineira e da Conjuração Baiana –
manifestaram o desejo da adoção de um regime republicano. No entanto, esses
movimentos não tiveram sucesso e mesmo após a ruptura com Portugal em 1822,
a forma de governo continuou sendo a monarquia.
Mesmo com a reafirmação da monarquia como regime político do Brasil, a
circulação das propostas de reforma política que incluíam a adoção do sistema
republicano continuou em voga no país e ganhou força em 1870, com a funda-
ção do Partido Republicano.
Embora haja controvérsia sobre as ideologias presentes no movimento
republicano e sobre o grau de envolvimento dos diversos setores da sociedade
brasileira, o que podemos afirmar é que a proclamação da República em 1889 foi
resultado das transformações políticas, econômicas e sociais pela qual o Brasil
passava, desde meados do século XIX, e da ineficiência do governo central em
administrar os conflitos ideológicos presentes no interior da sociedade.

O Movimento Republicano e o Fim da Monarquia no Brasil


II

Renato Lemos aponta que


Em uma perspectiva de longo prazo, tem-se a alternativa republicana
conectada ao processo de transformação estrutural da sociedade bra-
sileira. Mais precisamente, o sentido histórico de seu surgimento, im-
plantação e consolidação afirmou-se no período que se pode balizar
pelos anos de 1850 e 1900. Trata-se de um momento histórico marcado
por acontecimentos econômicos, sociais, ideológicos e políticos que se
associaram nas bases da sociedade brasileira: extinção do tráfico inter-
nacional de escravos, Lei de Terra, intensas migrações internas, Guerra
do Paraguai, movimento abolicionista, deslocamento do polo dinâmi-
co da cafeicultura do Vale do Paraíba para o oeste paulista, imigração

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
europeia, expansão do trabalho livre, renovação intelectual de vários
setores sociais pela absorção de variantes do liberalismo e do cientifi-
cismo, conflitos entre o Estado, a Igreja Católica e os segmentos mili-
tares, abolição da escravidão, derrubada da monarquia e implantação
da república, primeira crise de superprodução cafeeira, e estabilização
da ordem republicana nos termos da “política dos governadores”. (LE-
MOS apud GRINBERG e SALLES, 2009, v. 3, p. 405).

Portanto, caro(a) aluno(a), o fim da monarquia e a instalação do regime repu-


blicano no Brasil remonta a uma série de fatores que estiveram presentes no seio
da sociedade brasileira desde a sua formação enquanto Estado independente – e
até mesmo anteriormente – como é o caso da questão da escravidão, abordada
no tópico anterior. Mesmo após 1889, essas questões influenciaram a organiza-
ção do país sob os novos ideais que se delineavam e que não mais podiam ser
negligenciados.
Representando, para os adversários da monarquia, uma alternativa para a
solução da crise generalizada que havia se agravado no governo de D. Pedro II, o
movimento republicano conquistou adeptos e apoio de setores da sociedade que,
pelo menos até a abolição da escravidão, não pensavam na alteração do regime
político, como é o caso de indivíduos ligados à oligarquia cafeeira, desconten-
tes com os rumos que a discussão acerca da mão de obra das lavouras cafeeiras
estava tomando. O fim da escravidão se aproximava, disso já não restavam dúvi-
das, e as propostas de alternativas para a substituição do trabalho escravo ainda
não havia se concretizado. A experiência com a imigração estrangeira já estava
em curso, mas ainda não se apresentava viável para boa parte dos cafeicultores.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


99

Permeado por esse contexto de agitações, a ideologia republicana ganhou


espaço e partidos e clubes republicanos foram criados, com destaque para São
Paulo e Rio Grande do Sul. No restante do país, a adesão ao movimento repu-
blicano ocorreu de forma mais lenta e gradual, sendo que algumas províncias
não conseguiram organizar partidos republicanos até o fim da monarquia, como
o Amazonas e a Paraíba, por exemplo. Nas províncias do Ceará, Maranhão,
Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro, a fundação de Partidos
Republicanos ocorreu após a abolição da escravidão que possibilitou o apoio dos
senhores de escravos insatisfeitos com a Lei Áurea. (LEMOS apud GRINBERG;
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

SALLES, 2009, p. 414, ).


Emília Viotti da Costa, ao descrever o pensamento dos defensores da
República no Brasil, destacou que eles,
(...) lembrando as revoluções e pronunciamentos que, desde a Inconfi-
dência, tiveram por alvo instalar um regime republicano no Brasil, afir-
mam que a República sempre foi uma aspiração nacional. Esposando
uma ideia já enunciada no Manifesto Republicano de 1870, consideram
a Monarquia uma anomalia na América, onde só existem repúblicas.
Repetindo as críticas feitas durante o Império ao Poder Moderador,
afirmam que as liberdades foram cerceadas com grande prejuízo para
a nação. Apontam as deficiências de D. Pedro como estadista. Criticam
a centralização excessiva do governo monárquico, a vitaliciedade do
Senado, a fraude eleitoral que possibilita ao governo vencer sempre as
eleições, e consideram a República a solução natural para os problemas.
(COSTA, 2010, p. 389).

O Manifesto Republicano de 1870 deixou transparecer as vertentes que guiaram


o movimento republicano nos anos seguintes. A primeira vertente era com-
posta pelos indivíduos ligados às cidades, por políticos e por idealistas que não
se viam representados na monarquia. A segunda vertente estava representada
pelos fazendeiros, descontentes, sobretudo com a política da mão de obra a par-
tir da segunda metade do século XIX (FAORO, 1976). A esses grupos aliou-se
o Exército, descontente com o pouco apoio, pouco investimento e pouca valo-
rização por parte do governo monárquico, descontentamento que foi agravado
após a Guerra do Paraguai.

O Movimento Republicano e o Fim da Monarquia no Brasil


II

Raymundo Faoro evidenciou essa atmosfera de descontentamento com os


rumos que o Brasil estava tomando descritas pelos republicanos ao escrever que
Decepcionados da ascensão pelo sistema cooptativo, pela mão bene-
volente e carinhosa das influências de cima, apelam para os recursos
representativos, com a mobilidade de todos os postos, só dependentes,
para serem preenchidos, da vontade eleitoral, da soberania popular.
Este caldo psicológico responde a uma transformação mais profunda:
emerge, no quadro estamental e hierárquico, comunitariamente seleti-
va, progressivamente fechada, a sociedade de classes. O fazendeiro, o
fabricante de açúcar, os criadores de gado não se sentem mais senhores,
são apenas lavradores e pecuaristas; os poderosos não se aperfeiçoam

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
no título de barão ou visconde, mas percebem que seu privilégio de-
pende de assentos artificiais, sem futuro. A sociedade, ao se desmiti-
ficar, sofre a convulsiva pressão de elementos que, nunca postos em
debate e em dúvida, pareciam inexistentes. (FAORO, 1976, p. 537).

Como é possível observar, caro(a) aluno(a), a República vai se desenhando ao


longo da segunda metade do século XIX, surgindo, ao menos em teoria, como
a diretriz necessária e inevitável para o realinhamento das forças sociais e para
o estabelecimento de uma sociedade pautada em bases igualitárias.

A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

As transformações ocorridas na sociedade brasileira no Segundo Reinado, mais


precisamente a partir de 1850, fizeram com que vários setores do país questio-
nassem a política centralizadora do imperador, garantida pelo Poder Moderador.
Esses setores – dentre os quais destacamos a aristocracia prejudicada pelo
fim da escravidão e os indivíduos ligados às camadas urbanas, que necessitavam
de práticas políticas que não necessariamente alinhavam-se aos interesses da
elite agrícola – reivindicavam mudanças que lhes assegurassem a defesa de seus
direitos e interesses. Nesse sentido, a ideia de se estabelecer no Brasil um sistema
federativo, que possibilitaria maior autonomia às províncias e aos indivíduos,
parecia ser a melhor situação para se resolver o impasse no qual se encontrava
a sociedade brasileira.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


101

A ideia de um regime republicano no Brasil seguia três vertentes de pro-


postas de como esse modelo seria colocado em prática no país. A proposta dos
proprietários rurais, reunida no Partido Republicano Paulista, o mais organi-
zado do período, baseava-se na adoção de um modelo republicano nos moldes
da república americana, ou seja,
Convinha-lhes a definição individual do pacto social. Ela evitava o ape-
lo à ampla participação popular tanto na implantação como no gover-
no da República. Mais ainda, ao definir o público como a soma dos
interesses individuais, ela lhes fornecia a justificativa para a defesa de
seus interesses particulares. (...).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Convinha-lhes também a ênfase americana na organização do poder,


não apenas por estar na tradição do país, mas, principalmente, pela
preocupação com a ordem social e política, própria de uma classe de
ex-senhores de escravos. Convinha-lhes, de modo especial, a solução
federalista americana. Para os republicanos de São Paulo, Minas Gerais
e Rio Grande do Sul, três das principais províncias do Império, o fede-
ralismo era talvez o aspecto mais importante que buscavam no novo
regime. (CARVALHO, 1990, p. 24-25).

Esse modelo de República proposto pelos proprietários rurais não se enquadrava


nas ideias que partiam dos representantes dos setores urbanos, como os peque-
nos proprietários, jornalistas, profissionais liberais, professores e estudantes. Para
estes indivíduos, o ideal republicano fundamentava-se em aspectos abstratos da
liberdade, da igualdade, da participação e do controle de recursos do poder eco-
nômico e social, que lhes garantissem vantagens em um cenário de competição
livre (CARVALHO, 1990, p. 26).
A terceira proposta de organização de um Estado republicano tinha entre
seus defensores mais expressivos os militares. Essa vertente entendia que “o
Estado era o meio mais eficaz de conseguirem seus objetivos” (CARVALHO,
1990, p. 26) e, por essa razão, não eram contra o Estado, e sim contra o regime
monárquico. Para esse grupo, a República assentava-se em um Executivo forte
e intervencionista. Essa vertente do movimento republicano teve grande adesão
dos republicanos do Rio Grande do Sul, uma vez que “os republicanos gaúchos
formavam uma minoria que precisava de uma doutrina capaz de lhes dar forte
coesão e os habilitasse a lutar contra a corrente política tradicional, represen-
tada pelo partido Liberal” (FAUSTO, 1995, p. 245).

O Movimento Republicano e o Fim da Monarquia no Brasil


II

Enquanto as discussões sobre a implantação da República e de como esta


iria organizar-se corriam o país, os aliados da monarquia buscavam maneiras de
conter o movimento e garantir o Terceiro Reinado e a continuidade do regime
monárquico. Para tanto, o Visconde de Ouro Preto – presidente do Conselho
de Ministros do Império – propôs uma série de reformas em junho de 1889
que tinham por objetivo acalmar os ânimos dos liberais e conter o avanço do
movimento republicano. Entre as reformas propostas pelo ministro, destacam-
-se a ampliação da representação civil, a plena autonomia dos municípios e das
províncias, fim do senado vitalício, elaborar um Código Civil e fim do caráter

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
político do Conselho de Estado, preservando apenas seu caráter administrativo
(COSTA, 2010, p. 489).
As propostas de Ouro Preto não foram aceitas pelo Conselho de Estado e
pela Câmara, que consideraram o pacote de reformas apresentado radical e com
forte tendência republicana. Diante da decisão da Câmara, esta foi dissolvida em
17 de junho de 1889. A dissolução da Câmara acirrou os ânimos e intensificou
a crise e a indisposição contra o governo.
Entre junho de 1889 e novembro do mesmo ano, o movimento republicano
buscou reafirmar o apoio dos militares ao fim da Monarquia, explorando os boa-
tos de reformas que atingiriam o Exército de maneira desfavorável. No entanto,
o próprio exército precisava lidar com as diferenças em seu interior.
Fausto (1995, p. 246) aponta que os militares brasileiros estavam divididos
em dois grupos. No primeiro, sob a liderança do Marechal Deodoro da Fonseca,
encontravam-se os veteranos que lutaram na Guerra do Paraguai e cuja maio-
ria não havia frequentado a Escola Militar. Participaram do 15 de Novembro
no intuito de salvar o Exército e garantir que este tivesse maior representati-
vidade no novo regime, mesmo não possuindo uma ideia clara da República.
O segundo grupo reuniu-se em torno de Floriano Peixoto e era composto por
jovens militares que frequentaram a Escola Militar e que estavam sob a influên-
cia do positivismo francês e para os quais a República representava progresso,
traduzido na forma de crescimento industrial, expansão da comunicação e dos
conhecimentos técnicos.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


103

Durante muito tempo reproduziu-se nos livros de história a máxima de que


a Proclamação da República, feita em 15 de Novembro de 1889, foi obra do
Exército brasileiro, reforçando a ideia de um consenso entre os militares –
de todas as patentes – contra o regime monárquico e unidos em torno das
figuras de Marechal Deodoro da Fonseca e do tenente-coronel Benjamim
Constant, então protagonistas do fim da monarquia e início do período re-
publicano.
Para conhecer mais sobre o desenvolvimento dos ideais republicanos no
Exército brasileiro, acesse o conteúdo disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/
producao/dossies/FatosImagens/ProclamacaoRepublica>. Acesso em: 10
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

abr. 2015.

À parte das diferenças ideológicas em seu inte-


rior, o Exército brasileiro estabeleceu um consenso
em relação à monarquia, de que este regime não mais
satisfazia seus interesses ou oportunizava uma parti-
cipação maior na representação política do país. Por
essa razão, os republicanos entendiam que o apoio
do Exército seria crucial para a mudança do regime.
Desse modo, Benjamin Constant, Aristides Lobo,
Quintino Bocaiúva, Francisco Glicério e o coronel
Sólon tentaram convencer o Marechal Deodoro da
Fonseca a liderar o Exército e a derrubada da monar-
quia (COSTA, 2010, p. 491).
De acordo com a historiografia, Deodoro da
Fonseca convenceu-se da necessidade de intervir
Marechal Deodoro da Fonseca
junto ao movimento republicano diante dos boatos Fonte: Biblioteca da Presidência da
República (online).
de que o ministro Ouro Preto decretara sua prisão.
Dessa forma, segundo Lilia Schwarcz (1998, p. 458),
no dia 15 de Novembro de 1889, Deodoro da Fonseca invadiu o quartel-gene-
ral, prendeu o Ministro Ouro Preto e informou que ele mesmo comunicaria a
D. Pedro II – que se encontrava em Petrópolis – a formação do novo governo.
Extinguia-se a monarquia e tinha início a República no Brasil.

O Movimento Republicano e o Fim da Monarquia no Brasil


II

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), nesta unidade procuramos discorrer acerca do governo de D.


Pedro II, evidenciando as diretrizes de sua administração e os elementos que
desencadearam a crise da Monarquia e a evolução do movimento republicano
que culminou na Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889.
O Segundo Reinado compreende o período no qual as forças que contribuí-
ram para a consolidação da independência em 1822 buscam uma representação
maior no direcionamento político do Brasil, o que leva a uma acentuação das

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
divergências ideológicas presentes no interior dessas forças. Nesse sentido, a
unidade em torno do imperador e da própria monarquia torna-se um desafio.
Despido do espírito político e de liderança que caracterizaram seu pai, D.
Pedro II, muito mais ligado às questões relacionadas à arte, à cultura e às ciên-
cias, viu-se envolto em disputas pelo poder que contribuíram para fragilizar sua
imagem enquanto chefe do Estado brasileiro.
Nesse cenário o crescimento do movimento abolicionista e a promulgação de
leis que visavam o fim da escravidão suscitaram o debate acerca das prioridades
do governo e colocaram em xeque a capacidade do imperador e de seus minis-
tros de contornar a crise que se formava a partir dos encaminhamentos para a
abolição da escravidão. A assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel precipi-
tou os eventos que levaram ao fim da monarquia.
Após a abolição da escravidão em 1888, tornou-se cada vez mais difícil ao
imperador e a seus aliados controlar o avanço das forças contrárias à monar-
quia. O Exército, os fazendeiros do Oeste Paulista e os setores médios urbanos,
descontentes com a política de D. Pedro II, aproveitaram-se da falta de prestígio
que a monarquia conquistara nos últimos anos e fortaleceram o ideal republi-
cano, levando à mudança do regime por meio de um golpe liderado pelo Exército
em 1889.
O Brasil entrava em uma nova fase de sua história.

O SEGUNDO REINADO NO BRASIL:


105

1. D. Pedro II subiu ao trono do Brasil aos quinze anos de idade com a missão de,
nas palavras de Lilia Schwarcz (1998), “salvar a nação”. Analise os primeiros anos
do governo de D. Pedro II, discutindo a maneira pela qual o imperador esta-
beleceu sua forma de governo no início do Segundo Reinado.
2. No decorrer do Segundo Reinado, a produção cafeeira ocupou lugar de desta-
que na economia brasileira. Reflita sobre a importância que a exportação do
café teve para a economia brasileira, relacionando a publicação da Lei de
Terras de 1850 aos interesses dos cafeicultores brasileiro.
3. A questão do fim da escravidão esteve presente no Brasil desde o início do sécu-
lo XIX, quando a Grã-Bretanha ajudou na transferência da família real portugue-
sa para o Brasil e passou a insistir na adoção de uma política que colocasse fim à
instituição aqui no país. Com relação ao movimento abolicionista no Brasil e ao
processo que levou ao fim da escravidão no país, assinale a alternativa correta.
a) O fim da escravidão foi um projeto que sempre esteve presente nas diretrizes
políticas de D. João VI, o qual priorizou a questão durante seu reinado no Brasil.
b) Com a expansão da produção cafeeira, a mão de obra escrava cedeu lugar ao
trabalho livre e assalariado, facilitando o processo de abolição da escravidão.
c) A existência do regime de escravidão estava em consonância com os ideais libe-
rais difundidos na Europa e que influenciaram os intelectuais brasileiros.
d) A escravidão no Brasil contrastava com os princípios liberais em voga na Europa
e, por essa razão, a elite brasileira adaptou tais princípios para justificar a manu-
tenção da escravidão.
e) Intelectuais e aristocracia brasileira concordavam que o fim da escravidão era o
caminho correto a ser adotado no Brasil, uma vez que a instituição já havia che-
gado ao fim no restante da América.
4. A abolição da escravidão em 1888 influenciou diretamente o processo de procla-
mação da República no ano seguinte. Sobre o avanço do movimento republi-
cano no Brasil, leia as afirmações abaixo:
I. A escravidão era a base de sustentação da monarquia, na medida em que as
bases políticas e econômicas do país estavam ligadas à elite agrária, dependente
da mão de obra escrava.
II. O fim da monarquia e a instalação do regime republicano no Brasil remonta a
uma série de fatores que estiveram presentes no seio da sociedade brasileira
desde a sua formação enquanto Estado independente.
III. A proposta republicana representava o interesse da maioria da população bra-
sileira, sendo que as camadas sociais mais baixas e sem grande representação
política participaram ativamente das manifestações contrárias à monarquia.
IV. O Exército teve um papel secundário no processo de instalação do regime repu-
blicano no Brasil, uma vez que os principais líderes militares eram próximos ao
imperador D. Pedro II.
Assinale a alternativa correta:
a) Somente a afirmação I está correta.
b) Somente a afirmação III está correta.
c) Somente as afirmações II e IV estão corretas.
d) Somente as afirmações I e III estão corretas.
e) Somente as afirmações I, II e III estão corretas.
107

MACHADO DE ASSIS E A QUESTÃO DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO


“Bons dias!
Eu pertenço a uma família de profetas après coup, post factum, depois do gato morto, ou
como melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, e juro se necessário fôr, que tôda
a história desta lei de 13 de maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira,
antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um molecote que tinha, pessoa de seus
dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido por mil, perdido
por mil e quinhentos, e dei um jantar. (...).
No golpe do meio (coup du milieu, mas eu prefiro falar a minha língua), levantei-me eu
com a taça de champanha e declarei que acompanhando as idéias pregadas por Cristo,
há dezoito séculos, restituía a liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a
nação inteira devia acompanhar as mesmas idéias e imitar o meu exemplo; finalmente,
que a liberdade era um dom de Deus, que os homens não podiam roubar sem pecado.
Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os
pés. Um dos meus amigos (creio que é ainda meu sobrinho) pegou de outra taça, e pe-
diu à ilustre assembléia que correspondesse ao ato que acabava de publicar, brindando
ao primeiro dos cariocas. Ouvi cabisbaixo; fiz outro discurso agradecendo, e entreguei
a carta ao molecote. Todos os lenços comovidos apanharam as lágrimas de admiração.
(...).
No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza:
– Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais
um ordenado, um ordenado que…
– Oh! meu senhô! fico.
– …Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo; tu cres-
ceste imensamente. (...).
Pancrácio aceitou tudo (...).
O meu plano está feito; quero ser deputado, e, na circular que mandarei aos meus eleito-
res, direi que, antes, muito antes da abolição legal, já eu, em casa, na modéstia da família,
libertava um escravo, ato que comoveu a tôda a gente que dêle teve notícia; que êsse
escravo tendo aprendido a ler, escrever e contar, (simples suposições) é então professor
de filosofia no Rio das Cobras; que os homens puros, grandes e verdadeiramente políti-
cos, não são os que obedecem à lei, mas os que se antecipam a ela, dizendo ao escravo:
és livre, antes que o digam os poderes públicos, sempre retardatários, trôpegos e inca-
pazes de restaurar a justiça na terra, para satisfação do céu.
Boas noites”.
Fonte: Assis (online).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Título: As Barbas do Imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos.


Autor: Lilia Moritz Schwarcz
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: A autora aborda o período do governo de D. Pedro II no Brasil,
destacando os aspectos culturais que fizeram-se presentes na sociedade
brasileira nesse período. Sem deixar de lado as análises a respeito da
governabilidade de D. Pedro II, Lilia M. Schwarcz chama a atenção do
leitor para aspectos como a arte e o costume da sociedade brasileira,
evidenciando a maneira pela qual a cultura local mesclou-se com a
cultura europeia, presente nos hábitos e costumes da corte, como suas
construções palacianas, festas e rituais.

Título: Mauá, o Imperador e o Rei


Ano: 1999
Direção: Sérgio Rezende
Sinopse: O filme narra a história de Irineu Evangelista de Sousa (1813–
1889), o Barão e Visconde de Mauá, defensor da industrialização do
Brasil no século XIX e que, por essa razão, era contrário à escravidão.
Mauá aliou-se a empresários ingleses que influenciaram suas iniciativas
capitalistas no Brasil, contribuindo para que o barão se tornasse o
primeiro grande empresário do Brasil. Ao acompanhar a trajetória
do empresário, o filme mostra os contrastes da sociedade brasileira
no século XIX e o desafio do imperador D. Pedro II para equilibrar os
antagonismos políticos do país.

Título: HISTÓRIA DO BRASIL POR BÓRIS FAUSTO - REPÚBLICA VELHA (vídeo completo).

Sinopse: O historiador Bóris Fausto apresenta um panorama do início do período


republicano no Brasil, analisando os aspectos políticos, econômicos e sociais do Brasil,
destacando os significados do processo de transição do Império para a República no
país.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=XuiF0uzp22E>. Acesso em: 2 jul.


2015.
Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

III
DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE
1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA

UNIDADE
NO BRASIL E AS TRANSFORMAÇÕES NA
SOCIEDADE BRASILEIRA NO INÍCIO DO
SÉCULO XX

Objetivos de Aprendizagem
■■ Analisar o processo de consolidação do regime republicano no Brasil.
■■ Compreender o modelo político-administrativo instalado no Brasil na
chamada Primeira República.
■■ Verificar as transformações econômico-sociais do início da República.
■■ Discorrer acerca das conjunturas que levaram ao golpe de 1930 e o
início da chamada Era Vargas.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ República Velha ou República da Espada.
■■ Aspectos da imigração europeia e a consolidação do trabalho
assalariado: as transformações econômico-sociais na Primeira
República.
■■ O fim da República Oligárquica: o golpe de 1930.
111

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesse momento de nosso estudo vamos analisar a formação e


consolidação do regime republicano no Brasil, evidenciando as transformações
pelas quais a sociedade brasileira passou ao longo desse primeiro momento do
regime republicano.
Após o 15 de novembro de 1889, o Brasil entra em um novo momento, cujas
estruturas governamentais foram reformuladas e os efeitos dessa reformulação
foram sentidos por toda a população. Novamente teremos nesse momento refle-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

xões acerca da construção de uma identidade nacional para o povo brasileiro.


A elaboração de uma nova Constituição para o país trouxe à tona novamente
os temas que estiveram presentes no momento em que se pensava a Carta
Constitucional de 1824.
Ao findar-se 1889 havia um novo contexto político e social. O Brasil havia
se transformado em uma República, que ainda precisava definir e estabelecer
as bases sobre as quais iria fundamentar-se. Havia novos atores sociais em cena
como a massa de escravos libertos presentes nas cidades (sem uma política que
viabilizasse sua integração à sociedade), além dos imigrantes que chegavam ao
Brasil, sobretudo os europeus, nos primeiros momentos da transição do traba-
lho escravo para o trabalho assalariado.
Nos anos iniciais do regime republicano no Brasil, havia muitos interesses a
serem satisfeitos e, consequentemente, ao privilegiar-se um grupo em detrimento
dos interesses de outro, os conflitos e as agitações sociais novamente fazem-se
presentes no seio da sociedade, criando condições para a emergência de novos
ideais de mudanças. O golpe de 1930 que leva Getúlio Vargas à presidência do
Brasil deve ser entendido também dentro dessas conjunturas que marcaram os
primeiros anos da República no Brasil.
Um momento político, econômico e social importante para a história do
Brasil é o que discutiremos nesta unidade e, por essa razão, atenção e disciplina
nos estudos são essenciais.
Um ótimo trabalho!

Introdução
III

REPÚBLICA VELHA OU REPÚBLICA DA ESPADA

Derrubada a monarquia e ins-


talada a República no Brasil, era
preciso então definir as bases sobre
as quais ela se sustentaria. Deodoro
da Fonseca, considerado o líder do
movimento que colocou fim ao
regime monárquico, ao invadir o

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
quartel-general e declarar a inaugu-
ração de um novo modelo político,
assumiu o posto de primeiro presi-
dente da República do Brasil.
O governo de Deodoro da
Fonseca representava um governo
Notícia sobre a proclamação da República
de transição, uma vez que os par- Fonte: Memória da Administração Pública Brasileira (online).
tidos políticos não tinham força
suficiente para representar o elemento unificador e centralizador que o país pre-
cisava naquele momento. Esse papel foi dirigido ao Exército, na medida em que
comandou o processo de mudança do regime político-administrativo do Brasil.
A oligarquia e os proprietários rurais esperavam que o Marechal promovesse
as reformas necessárias para que as províncias e os munícipios conquistassem
maior autonomia, o que possibilitaria também uma maior liberdade de ação
para os proprietários, ainda se adaptando à alternativa de mão de obra livre e
assalariada. Além disso, não podemos nos esquecer dos trabalhadores urbanos,
operários das fábricas e primeiras indústrias do país, dos quais trataremos com
maior ênfase nesta unidade.
Com isso, entendemos que os proprietários rurais defendiam a adoção do
sistema federalista, proposta que favorecia seus interesses. Além disso, o federa-
lismo também significava que esse grupo estaria mais próximo do poder local,
possibilitando a sua ascensão política, fato que, como veremos, vai se confirmar
nos anos seguintes à instalação da República.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


113

Para os liberais, é imperativo o alinhamento político com os princípios libe-


rais, o que, de acordo com Faoro, permite
a valorização da livre concorrência, da oferta e da procura, das trocas
internacionais sem impedimentos artificiais e protecionistas. O pro-
dutor agrícola e o exportador, bem como o comerciante importador,
prosperam dentro das coordenadas liberais, favorecidos com a troca
internacional sem restrições e a mão-de-obra abundante, sustentada
em mercadorias baratas (FAORO, 1976, p. 592).

Preocupados em impedir a instalação de uma ditadura militar no país, os libe-


rais apontam para a necessidade da convocação de uma Assembleia Constituinte
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

para a elaboração de uma Constituição que substituísse a de 1824 e contemplasse


o novo momento político, econômico e social do Brasil (FAUSTO, 1995, p. 249).
No entanto, levou-se um tempo até que a elaboração da nova Constituição
fosse concluída, o que ocorreu em 1891 e, nesse período, entre a proclamação da
República e a promulgação da Constituição, foi Deodoro da Fonseca quem dire-
cionou a política no país. Foi ele quem indicou os governadores das províncias e
os ministros, além de alguns deputados e senadores que compunham a Assembleia
Constituinte, sendo todos os
indicados militares (FAORO,
1976, p. 641). Desse modo,
observamos que a represen-
tatividade popular no novo
governo – uma das promes-
sas da campanha republicana
– não se consolidou. Os mili-
tares assumiram o comando
do Brasil, representados por
Deodoro da Fonseca e dire-
cionaram sua administração,
vislumbrando estabelecer
©shutterstock

mais do que um governo


provisório.

República Velha ou República da Espada


III

Ao impor seu modelo administrativo, Deodoro da Fonseca acabou por gerar


insatisfações nas oligarquias provinciais, que não viam com bons olhos alguns
nomes de militares indicados para governador das províncias, visto que, como
dito anteriormente, buscavam uma representação maior por meio de uma par-
ticipação política mais incisiva. Portanto, o Marechal precisou conciliar e buscar
meios de amenizar as relações conflituosas com esse setor da sociedade, que ainda
não havia esquecido o fato de que um governo centralizador colocou fim à escra-
vidão sem pagar as indenizações e sem garantir qualquer tipo de auxílio para a
adoção da mão de obra livre. Essa camada social não estava disposta a mais uma

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
vez deixar-se prejudicar por um governo que não representava seus interesses.

A CONSTITUIÇÃO DE 1891

A primeira Constituição da República brasileira foi promulgada em 24 de feve-


reiro de 1891 e foi inspirada na Constituição dos Estados Unidos da América,
reafirmando o caráter liberal e federativo da nova organização do país.

Texto de Abertura da primeira Constituição do período republicano no Brasil


Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


115

Dentre os principais pontos dessa Constituição, destacam-se, como dito, o


estabelecimento do federalismo, sendo as Províncias transformadas em Estados
Unidos do Brasil e adquirindo relativa autonomia. Também houve a separa-
ção entre Igreja e Estado, a divisão dos poderes em Executivo – exercido pelo
presidente da República eleito para um mandato de quatro anos –, Legislativo
– composto pelos deputados e senadores, os quais passaram a ter um mandato
de nove anos e não mais vitalícios – e Judiciário. O Poder Moderador, símbolo
da centralização política do regime monárquico foi extinto, uma das premissas
do movimento republicano (FAUSTO, 1995, p. 250).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Texto da Constituição de 1891 que definiu a forma de governo no Brasil após a proclamação da
República
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A nova C onstituição também redefiniu os termos que designavam os cida-


dãos brasileiros, estabelecendo que
Art. 69. São cidadãos brazileiros:

1º Os nascidos no Brazil, ainda que de pae estrangeiro, não residindo


este a serviço de sua nação;

2º Os filhos de pae hrazileiro e os illegitimos de mãe brazileira, nasci-


dos em paiz estrangeiro, si estabelecerem domicilio na Republica;

República Velha ou República da Espada


III

3º Os filhos de pae brazileiro, que estiver noutro paiz ao serviço da


Republica, embora nella não venha domiciliar-se;

4º Os estrangeiros, que, achando-se no Brazil aos 15 de novembro de


1889, não declararem, dentro em seis mezes depois de entrar em vigor
a Constituição, o animo de conservar a nacionalidade de origem;

5.º Os estrangeiros, que possuirem bens immoveis no Brazil, e forem


casados com brazileiras ou tiverem filhos brazileiros, comtanto que re-
sidam no Brazil, salvo si manifestarem a intenção de não mudar de
nacionalidade;

6º Os estrangeiros por outro modo naturalisados (BRASIL, online).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Observando o que diz a Constituição acerca da definição do cidadão brasi-
leiro, chamamos sua atenção, caro(a) aluno(a), para o artigo 4º, exposto acima,
e para o artigo 72, o qual estabelece que “a Constituição assegura a brazileiros
e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes
á liberdade, á segurança individual e á propriedade nos termos seguintes (...)”
(BRASIL, online). Esses artigos evidenciam a importância de garantir aos estran-
geiros, sobretudo aos europeus que chegavam ao Brasil desde os tempos finais
do Império para substituir os escravos no trabalho nas lavouras e também nas
indústrias, a ideia de que o Brasil era um país no qual eles teriam assegurada a
liberdade para exercerem sua cultura e sua religião.
Ao definir os cidadãos brasileiros, a Constituição também determinou seus
direitos, dentre os quais o direito de voto e o direito de ser voltado. De acordo
com o documento,
Art. 70. São eleitores os cidadãos maiores de 21 annos, que se alistarem
na fórma da lei.

§ 1º Não podem alistar-se eleitores para as eleições federaes, ou para as


dos Estados:

1º Os mendigos

2º Os analphabetos;

3º As praças de pré, exceptuando os alumnos das escolas militares de


ensino superior;

4º Os religiosos de ordens monasticas. companhias, congregações, ou


communidades de qualquer denominação, sujeitas a voto de obedien-
cia, regra, ou estatuto, que importe a renuncia da liberdade individual.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


117

§ 2º.São inelegiveis os cidadãos não alistaveis (BRASIL, online).

O documento de 1891 representou, por um lado e em certa medida, uma amplia-


ção ao direito de participação política por meio do voto dos brasileiros ao eliminar
das condições necessárias para exercer esse direito um limite de renda, expresso
na Constituição de 1824. Entretanto, por outro lado, determinou que o direito
de voto seria concedido aos maiores de 21 anos desde que não fossem analfabe-
tos, o que acabou por limitar a participação política a uma pequena parcela da
população brasileira. Além disso, às mulheres também não foi dado o direito
de voto, embora essa afirmação não apareça de maneira clara na Constituição.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Texto de conclusão da Constituição de 1891


Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

O ENCILHAMENTO E A CRISE DO GOVERNO DE DEODORO DA


FONSECA

A postura rígida de Deodoro da Fonseca, herança da sua formação militar,


levou-o a alguns conflitos com vários atores sociais e contribuiu para que logo
nos primeiros anos de seu governo sua presidência fosse contestada. Além disso,
o direcionamento econômico defendido pelo seu Ministro da Fazenda descon-
tentou boa parte da população brasileira.

República Velha ou República da Espada


III

O nome escolhido pelo primeiro presidente da República para o ministério


da Fazendo, um dos mais importantes do governo, foi o do intelectual liberal Rui
Barbosa, cuja estratégia adotada para impulsionar a economia brasileira, após
o conturbado fim do trabalho escravo e o surgimento de novas formas de tra-
balho, resultou na instalação de uma nova crise econômica que teve influência
direta no fim do governo de Deodoro da Fonseca.
As diretrizes econômicas de Rui Barbosa visavam ao fortalecimento da indús-
tria, segmento que representava o novo momento da história do Brasil e o único
capaz de levar o país ao desenvolvimento, ao progresso e à independência em

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
relação ao capital estrangeiro. Para o ministro,
o desenvolvimento da indústria não é somente, para o Estado, ques-
tão econômica: é, ao mesmo tempo, uma questão política. No regime
decaído, todo de exclusivismo e privilégio, a nação, com toda a sua
atividade social, pertencia a classes ou famílias dirigentes. Tal sistema
não permitia a criação de uma democracia laboriosa e robusta, que
pudesse inquietar a bem-aventurança dos posseiros do poder, verda-
deira exploração a benefício de privilegiados. Não pode ser assim sob
o sistema republicano. A República só se consolidará, entre nós, sobre
alicerces seguros, quando as suas funções só se firmarem na democra-
cia do trabalho industrial, peça necessária no mecanismo do regime,
que lhe trará o equilíbrio conveniente ( BARBOSA, 1889 apud FAORO,
2001, p. 609).

Esse investimento seria feito por meio da reforma do sistema financeiro do


país, iniciado já nos últimos anos do Império. Em 1888, o Visconde de Ouro
Preto criou uma lei a qual estabelecia que dividia a responsabilidade de emissão
de papel moeda do Tesouro Nacional com os bancos, em vista às necessidades
oriundas da introdução da mão de obra assalariada intensificada após a aboli-
ção da escravidão. O sucesso da medida criada por Ouro Preto levou à criação
do Banco Nacional do Brasil que seria a instituição, mediante contratos com o
Tesouro Nacional, responsável por controlar e por regularizar as emissões de
papel moeda.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


119

“A lei (Decreto n.º 3403, de 24 de novembro de 1888) assegura aos bancos a


emissão de bilhetes ao portador, conversíveis em moeda corrente, median-
te o depósito, na Caixa de Amortização, de igual valor em títulos da dívida
pública”.
Fonte: Faoro (2001, p. 594).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Cédula de trinta mil réis, emitida pelo Banco da República do Brazil entre 1892 e 1896
Fonte: Faber (online).

Com a instalação de uma crise que atingiu uma parcela significativa dos
proprietários rurais, os setores econômicos e produtivos dos centros urbanos
também viram seus interesses prejudicados, na medida em que boa parte da sua
clientela concentrava suas atividades no campo. Diante dessas conjunturas eco-
nômicas, quando Rui Barbosa assumiu o Ministério da Fazenda, a pressão por
reformas que atendessem e resolvessem o quadro de desestabilidade existente
veio tanto de setores ligados à produção agrícola quanto dos setores ligados à
indústria e ao comércio.

República Velha ou República da Espada


III

A política econômica adotada por Rui Barbosa, embora baseada em lei pro-
mulgada em outro contexto político, ia ao encontro dos interesses dos industriais
brasileiros, que tiveram suas esperanças renovadas diante da proposta do minis-
tro que acreditava que somente a indústria poderia elevar o Brasil ao status de
uma grande potência política e econômica.
Conforme demonstra Raymundo Faoro (2001), Rui Barbosa colocou em
prática a emissão de apólices da dívida pública no início de 1890, adotando tam-
bém medidas que visavam a impedir a especulação financeira, que já na época
do Império tinha sido responsável por uma alta na inflação. A lógica defendida

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
pelo ministro era que a emissão de papel moeda levaria ao desenvolvimento
da indústria, limitando cada vez mais a entrada do capital estrangeiro no país.
Desse modo, gradativamente, a riqueza deixaria de se concentrar nas proprie-
dades rurais e passariam a concentra-se nos centros urbanos, com a atividade
industrial. Nota-se aqui a intenção de anular o poder e a influência das oligar-
quias agrárias.
Com a aplicação das medidas econômicas de Rui Barbosa, o que se viu foi o
aumento da circulação monetária no país. Devido a essa grande quantidade de
dinheiro circulando no país, começaram a surgir empresas fictícias, criadas com
o objetivo de conseguir investimentos por parte do governo. Como resultado, o
que ocorreu foi uma ilusão de crescimento econômico, na medida em que cada
vez mais se observava o aumento da circulação de dinheiro. No entanto, a real
situação não demorou a aparecer, quando se percebeu que o volume de papel
moeda emitido não correspondia à realidade da produção industrial.
Dessa discrepância entre a liberação de crédito por parte do Banco da
República dos Estados Unidos do Brasil e a produção industrial resultou o
aumento da inflação e uma elevação dos preços das mercadorias produzidas no
país. Segundo Filomeno,

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


121

Assim, caiu-se num círculo vicioso: a emissão monetária exercia pres-


são sobre o câmbio, que se desvalorizava sob o impacto da escassez de
divisas, aumentando a inflação e o serviço da dívida externa em moeda
nacional, tornando ineficazes as medidas de correção dos desequilí-
brios financeiros, agravando o clima de insatisfação política e impli-
cando maiores gastos do governo e novas emissões monetárias. Desse
modo, o déficit orçamentário, o desequilíbrio das contas externas do
país e as emissões imoderadas provocaram uma rápida desvalorização
da moeda nacional. (FILOMENO, 2010, p. 159).

A oligarquia cafeeira acompanhava atenta as medidas adotas por Rui Barbosa e


que tinham por objetivo beneficiar o desenvolvimento industrial no país. O café
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

continuava sendo, ainda nos primeiros anos da República, o principal produto


da economia brasileira e, por essa razão, os proprietários rurais não viam com
bons olhos a política do Ministro da Fazenda.
Aos produtores de café do período não era interessante que os investimentos
nos setores urbano-industriais ultrapassassem os investimentos na agricultura
e quando a crise do encilhamento adveio, passaram a pressionar o Ministro da
Fazenda e o presidente da República. A alta dos preços de produtos essenciais
para a população, como os alimentos, por exemplo, também gerou insatisfação
nas camadas populares.
A crise econômica desencadeou uma crise política e o Ministro da Fazenda
Rui Barbosa renunciou ao cargo no início de 1891. O presidente Marechal
Deodoro da Fonseca também foi pressionado tanto pela oligarquia cafeeira
quanto pelos setores populares da sociedade a encontrar uma solução para a
crise que se instalara. Em desacordo com os membros da Assembleia e amea-
çado pela Marinha, Deodoro da Fonseca renunciou ao cargo de presidente no
final de 1891. O vice-presidente, Floriano Peixoto, assumiu então a presidência
do Brasil e juntamente com o novo Ministro da Fazenda, Rodrigues Alves, tinha
a difícil tarefa de solucionar a crise econômica e equilibrar as forças dissidentes
no interior da sociedade.

República Velha ou República da Espada


III

O FIM DA “REPÚBLICA DA ESPADA”

Floriano Peixoto assumiu a presidência do Brasil em meio a uma crise econô-


mica – o encilhamento – após a renúncia do presidente Marechal Deodoro da
Fonseca. Logo que assumiu a presidência, Floriano recebeu críticas por não res-
peitar a Constituição de 1891 ao aceitar o posto de presidente da República sem
convocar novas eleições, como determinava a Constituição em caso de o presi-
dente eleito ficar por menos de dois anos no comando do país.
Segundo Bóris Fausto (1995, p. 254), um governo de Floriano Peixoto não era

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
bem visto pelos fazendeiros, principalmente os reunidos no Partido Republicano
Paulista (PRP), que tinham uma visão diferente da visão do novo presidente sobre
como deveria organizar-se a República no Brasil. Segundo o autor, o Marechal
“pensava construir um governo estável, centralizado, vagamente nacionalista,
baseado, sobretudo no Exército e na mocidade das escolas civis e militares,
enquanto os fazendeiros desejavam uma República “liberal e descentralizadora”
e “viam com suspeita o reforço do Exército e as manifestações da população
urbana do Rio de Janeiro”.

Apesar das diferenças ideológicas, os fazendeiros representados pelo PRP e


o presidente estabeleceram um acordo de apoio mútuo, baseado no fato de
ambos os lados entendiam que esse apoio seria a única maneira de manter
o regime republicano no país.
Fonte: a autora.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


123

Embora tenha conseguido o apoio do PRP, Floriano Peixoto enfrentou a opo-


sição daqueles que contestavam o fato do Marechal assumir a chefia do Brasil sem
a convocação de novas eleições, conforme estabelecido pela Constituição. Para
enfrentar seus opositores, o presidente contou com o apoio do PRP, do Exército
e de representantes dos setores urbanos, satisfeitos com as medidas populares
do novo governo.
Entre os anos de 1891 e 1894, Floriano Peixoto precisou lutar para manter
seu governo. Em 1892 alguns generais do Exército assinaram um documento
denominado Manifesto dos Treze Generais, que contestava a presidência do
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Marechal e exigiam novas eleições. Floriano acusou os generais de insubordi-


nação e os condenou à prisão, sufocando o movimento.
Contrariada pelo desprestígio em comparação com as forças do Exército e
com a política populista de Floriano Peixoto – que representava um risco para a
permanência dos militares no poder – em 1893 a Marinha iniciou uma revolta
que tinha por objetivo forçar a convocação de novas eleições presidenciais,
como determinava a Constituição de 1891. Essa revolta, lideradas pelo almirante
Custódio José de Melo, ficou conhecida como Segunda Revolta da Armada e,
além dos vários oficiais da Marinha, contou com o apoio de pessoas ligadas à
Monarquia e que não aceitavam o fim do regime.

A Primeira Revolta da Armada ocorreu no governo do Marechal Deodoro da


Fonseca em virtude do encilhamento – crise resultante da política econô-
mica de Rui Barbosa – e da dissolução da Assembleia pelo então presidente
Deodoro. A Primeira Revolta da Armada contribuiu para que Deodoro da
Fonseca renunciasse ao cargo de presidente da República em novembro de
1891.
Fonte: a autora.

República Velha ou República da Espada


III

O presidente conseguiu conter os ataques da Marinha à cidade do Rio de


Janeiro no ano de 1894 com o apoio do PRP, do Exército e de nações estran-
geiras, que interviram no conflito, interessados em garantir a estabilidade da
República no Brasil. Segundo Pereira (2009, p. 6), o interesse de países como
Inglaterra, França, Itália, Portugal e Estados Unidos no fim da Segunda Revolta
da Armada residia no fato de que o conflito prejudicava as relações comerciais
entre esses países e o Brasil, na medida em que bloqueava o Porto do Rio de
Janeiro, na baía de Guanabara.
Simultaneamente à Segunda Revolta da Armada, ocorria no Rio Grande

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do Sul a Revolução Federalista, uma guerra civil entre os republicanos posi-
tivistas organizados no Partido Republicano Riograndense (PRR) e liderados
pelo presidente da província – como
eram chamados os governadores de
Estado na época – Júlio de Castilhos
e os liberais, organizados no Partido
Federalista, cujo líder era Silveira
Martins.
A Revolução teve início devido
às diferenças ideológicas entre os dois
partidos, que defendiam formas dis-
tintas de governo no Rio Grande do
Sul. A Constituição estadual do Rio
Grande do Sul, aprovada em 1891,
previa a instalação de um governo
centralizado e fundamentado nos
ideais positivistas, o que desagra-
dou os federalistas, que defendiam
a instalação de um regime parlamen-
tar (FAUSTO, 1995).

Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, 1894. Vê-se o tubo de um


canhão sendo suspenso para ser transportado
Fonte: Museu Histórico Nacional (online).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


125

“Castilhos liderou o grupo conhecido como pica paus. Ficaram conhecidos


desta forma, devido às listras brancas nos uniformes militares, e ao barulho
das armas. Mais tarde estes homens usaram o lenço branco, para diferir dos
maragatos. Os membros do Partido Federalista foram chamados por Júlio
de Castilhos, líder do Partido Republicano, de “maragatos” devido à migra-
ção dos moradores da região de Maragateria na Espanha, para a região de
fronteira entre Uruguai e Brasil. Posteriormente para os Pampas no Rio Gran-
de do Sul. A imagem de gaúcho que nos foi ensinada é originária dos ma-
ragatos: roupas largas, bombacha e lenço vermelho amarrado no pescoço.
Também são conhecidos pelo seu amor à liberdade, à religião e sua honra
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de cavaleiro. Os principais representantes maragatos eram Gaspar Silveira


Martins e Gumercindo Saraiva”.
Fonte: Castro e Rezende Filho (online).

A Revolução Federalista teve como objetivo maior tirar Júlio de Castilhos


da presidência da província rio-grandense para, em seu lugar, assumir Silveira
Martins. O conflito que inicialmente era local alcançou um âmbito maior na
medida em que os federalistas avançaram sob os territórios de Santa Catarina
e do Paraná. Nesse momento, conquistaram o apoio dos opositores de Floriano
Peixoto, uma vez que muitos dos revoltosos eram pessoas ligadas ao governo
federal.
Mesmo com esse apoio, os revoltosos não conseguiram alcançar seus obje-
tivos, pois Floriano Peixoto colocou-se ao lado de Júlio de Castilhos do PRR,
garantindo o apoio do Exército. Diante do apoio federal aos seus rivais, os fede-
ralistas renderam-se em 1895, já no governo de Prudente de Moraes. Como
resultado do conflito, o PRR conseguiu manter Júlio de Castilhos no cargo de
presidente da província do Rio Grande do Sul.
Após conter a Segunda Revolta da Armada e a Revolução Federalista, Floriano
Peixoto, mesmo com o apoio de parte da sociedade civil urbana, resolveu dei-
xar a presidência do Brasil e convocou novas eleições presidenciais em 1894. O
candidato eleito foi Prudente de Morais, que se tornou o primeiro presidente
civil do Brasil, colocando fim ao governo dos militares no país. Chegava ao fim
o período conhecido como República da Espada.

República Velha ou República da Espada


III

A ASCENSÃO DA OLIGARQUIA E O PERÍODO DA REPÚBLICA


OLIGÁRQUICA

Nas discussões sobre as eleições de 1894, articulavam-se estratégias para garan-


tir que não houvesse a continuidade do governo militar no Brasil e sim para que
os interesses dos Estados pudessem estar representados por meio de um candi-
dato de um partido federal. Na defesa desse ideário, em 1893 criou-se no Rio de
Janeiro o Partido Republicano Federal liderado por Francisco Glicério, ex-minis-
tro do governo de Deodoro da Fonseca e com o objetivo de “firmar a autoridade

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dos Estados, mantendo escrupulosamente os seus direitos, tão sagrados como
os da União” (FAORO, 1976, p. 663). Por trás do PRF, escondiam-se as mano-
bras da oligarquia, sobretudo a de São Paulo, para assumir o poder no Brasil.
O PRF constituiu-se como aglutinador dos interesses de todos os Estados e
teve o apoio, sobretudo de São Paulo. No entanto, os Estados de Minas Gerais
e do Rio Grande do Sul não participaram da convenção do partido que lan-
çou a candidatura do paulista Prudente de Moraes para presidente e do baiano
Manuel Vitorino para vice-presidente. Com a vitória de Prudente de Morais, a
oligarquia cafeeira paulista acreditou ter finalmente garantido sua hegemonia
no comando do país.
Prudente de Morais herdou o país ainda mergulhado na crise econômica
decorrente do encilhamento, além de ter que lidar com os conflitos entre “a elite
política dos grandes Estados e o republicanismo jacobino, concentrado no Rio
de Janeiro” (FAUSTO, 1995, p. 256). A realidade do contexto do governo de
Prudente de Moraes o adverte de que, para que consiga consolidar seu governo
ante a oposição que sofre dos apoiadores de Floriano Peixoto, mesmo após a
morte desse, seria preciso conciliar os interesses dos Estados que ajudaram a
elegerem-no e apaziguar o país, o que não seria tarefa fácil.
A Guerra de Canudos foi um dos eventos conflituosos que marcaram o
governo de Prudente de Morais e foi um exemplo do descontentamento das regi-
ões afastadas do centro político com a pouca atenção e pouco investimento por
parte do governo central pelos interesses e pelas necessidades dessas regiões. O
conflito desenrolou-se entre 1896 e 1897 no sertão da Bahia e constitui-se em
um ponto de oposição ao governo central que representava naquele momento

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


127

os interesses da oligarquia, sobretudo a oligarquia cafeeira paulista.


O Arraial de Canudos foi uma comunidade fundada em 1893 em uma fazenda
localizada no sertão baiano e que abrigava sertanejos que viviam diante de uma
realidade permeada por miséria, por fome, por carestia, por seca e por explora-
ção de mão de obra, situação essa decorrente do descaso do governo central e
da desestruturação da produção açucareira, que em outros tempos havia repre-
sentado a pujança da economia brasileira.
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Vista parcial de Canudos ao sul. Segundo o registro oficial do exército, foram contados 5200 casebres
no arraial de Antônio Conselheiro, 1897 (Flávio de Barros/Acervo Museu da República)
Fonte: História Ilustrada (online).

Esses sertanejos reuniram-se em Arraial de Canudos e sob a liderança de


Antônio Vicente Mendes Maciel, ou Antônio Conselheiro, organizaram uma
comunidade que buscava uma vida diferente e, mesclando interesses políticos,
econômicos e sociais com o fanatismo religioso, mostraram-se contrários à situ-
ação vigente, transformando-se em foco de oposição ao governo.

República Velha ou República da Espada


III

“A história da luta em Canudos mostra o encontro de dois brasis, como sa-


lientava Euclides da Cunha, o litorâneo, moderno, rico e educado, e o serta-
nejo, com o saber de experiência feito, como diria Camões, heroico, cabe-
çudo, bem entrosado com seu próprio meio e desejoso de ser respeitado e
reconhecido”.
Fonte: Mello (2014, p, 9).

Antônio Conselheiro e seus seguidores do Arraial de Canudos não aceitavam

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o fim da monarquia e as mudanças trazidas com a Proclamação da República
que, para eles, não contribuíam para o desenvolvimento daquela região do país
e não satisfaziam as necessidades da população mais pobre que sofria desde o
declínio do complexo açucareiro na região nordestina do país. Ao contrário do
que ocorria nas cidades, na comunidade liderada por Antônio Conselheiro, não
havia a cobrança de impostos e a produção era dividida entre as famílias que
compunham a comunidade e o excedente comercializado com outras cidades
(SOUZA, 2012).
Antônio Conselheiro e sua comunidade começaram a representar uma ame-
aça tanto ao governo da Bahia quanto ao governo federal, na medida em que a
comunidade crescia e a fama e as ideias de seu líder se espalhavam pelo sertão. Ao
questionar a legitimidade da República, as mudanças econômicas estabelecidas,
ao desafiar o coronelismo, ao divulgar a crença no Sebastianismo e declarar-se
um messias, Antônio Conselheiro transformou-se em alvo das lideranças esta-
duais, federais e também da Igreja Católica que não via com bons olhos a perda
de fiéis para a comunidade de Arraial de Canudos.
Para conter o fortalecimento da comunidade de Arraial de Canudos, o
governo federal iniciou uma guerra contra Antônio Conselheiro em 1896 enviando
tropas para destruir a comunidade. Foram necessárias quatro expedições mili-
tares para conseguir derrotar os jagunços e os sertanejos liderados por Antônio
Conselheiro. Somente em 1897 as tropas do governo federal conseguiram apri-
sionar os seguidores de Antônio Conselheiro, colocando fim à comunidade de
Arraial de Canudos em um conflito que dizimou a população.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


129
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Mulheres e crianças canudenses prisioneiras, este foi um dos poucos grupos de prisioneiros (apenas
algumas centenas de uma população de mais de 5 mil habitações) que não foi morto pelo exército, 1897
(Flávio de Barros/Acervo Museu da República).
Fonte: História Ilustrada (online).

POLÍTICA DOS GOVERNADORES

O sucessor de Prudente de Moraes na presidência do Brasil foi outro paulista,


Campos Sales, eleito em 1898, o que consolidou a República liberal, representante
da elite política dos grandes Estados, como São Paulo (FAUSTO, 1995, p. 258).
A base sobre a qual se assentará o governo de Campos Sales será um acordo
entre as elites políticas dos Estados com o objetivo de conciliar os interesses
dessas elites, o que, de acordo com Raymundo Faoro (1976, p. 673), significava
“apagar as dissensões que dividiam o Congresso e constituir nele uma unidade
forte, patriótica e decidida a prestar o seu concurso ao governo”.
Para alcançar seu objetivo, Campos Sales firmou um acordo com os Estados
que ficou conhecido como política dos governadores. Esse acordo consistia no
apoio dos Estados à política do presidente da República em troca do apoio dele
aos grupos dominantes de cada Estado (FAUSTO, 1995, p. 259). Para garantir o
sucesso do acordo entre o governo federal e os governos estaduais, Campos Sales
promoveu uma modificação no processo eleitoral para a Câmara dos Deputados,

República Velha ou República da Espada


III

que garantia que o presidente da Câmera fosse alguém de confiança do presi-


dente da República.

“Cada Estado terá seu dono, pessoal ou da família, de um chefe ou de um


grupo fechado”.
Fonte: Faoro (2001, p. 680).

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Com esse esquema político, garantiu-se a preservação dos interesses de um
pequeno grupo cujo domínio econômico determinou o domínio político. São
Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, as três maiores economias do Brasil,
organizaram-se de maneira a influenciar os rumos políticos do país, a partir do
estabelecimento da política dos governadores.
O êxito da política dos governadores dependia da vitória dos candidatos a
governador dos Estados e dos deputados eleitos para a Câmara. Os eleitos deve-
riam ser indivíduos afinados com o discurso e com as ideias do presidente. Para
tanto, as eleições realizavam-se em meio a fraudes e a coações, negando, mais
uma vez, a participação da população na vida política do país. A manipulação
da população e dos votos foi o elemento fundamental para a manutenção desse
sistema e para a consolidação da oligarquia no poder, principalmente para São
Paulo e para Minas Gerais, os dois Estados que comandaram o cenário político
até 1930, quando o Rio Grande do Sul, alijado do comando, impõe sua soberania.
Dentro desse contexto político permeado por acordos e por manipulação das
eleições, a figura dos coronéis ganhou destaque, na medida em que esses indiví-
duos eram responsáveis em grande parte pelas fraudes nas eleições por meio da
coação e da compra de votos em favor de determinado candidato.
O coronelismo – como foi chamada a influência dos coronéis no sistema
eleitoral da Primeira República – significou o apoio do qual dependia a política
dos governadores. Os coronéis garantiam os votos necessários para determinado

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


131

candidato em troca de favores que preservassem seus interesses e a manutenção


de seu status dentro do contexto social do período.
Conforme demonstra Leal,
“coronelismo” é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos
entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente in-
fluência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras.
Não é possível, pois, compreender o fenômeno sem referência à nossa
estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das manifestações
de poder privado ainda tão visíveis no interior do Brasil. (LEAL, 2012,
p. 23).
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Figura 2: Charge
Fonte: Portal do Professor (online).

República Velha ou República da Espada


III

POLÍTICA DO CAFÉ COM LEITE

São Paulo conseguiu manter sua hegemonia no cenário político federal por meio
da organização do PRP e do apoio de outros Estados, como Minas Gerais. Os
três primeiros presidentes civis da República foram paulistas, fato que legitimou
o poder e a influência da elite paulista nas esferas política e econômica do país.
Essa hegemonia foi fortemente contestada nas eleições de 1909, quando foi
escolhido o sucessor Nilo Peçanha, que assumiu a presidência em 14 de junho
de 1906 após a morte do presidente Afonso Pena, que havia sido eleito em 1906.

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O governo de Campos Sales chegou ao fim em 1902 e Rui Barbosa foi eleito
o novo presidente do Brasil para um mandato de 1902 a 1906. Dentre as
medidas de seu governo, destacamos a obrigatoriedade da vacinação da
população contra a varíola, atendendo a um pedido do médico sanitarista
Oswaldo Cruz, fato que originou a Revolta da Vacina, em 1904.
Para saber um pouco mais sobre a história da Revolta da vacina, acesse o
conteúdo disponível em: <http://www.ccms.saude.gov.br/revolta/revolta.
html>. Acesso em: 13 maio 2015.

Nas eleições de 1910, Minas Gerais apoiou o Marechal Hermes da Fonseca,


o candidato à presidência indicado pelo Rio Grande do Sul, que disputaria a elei-
ção com o candidato paulista Rui Barbosa. Hermes da Fonseca saiu vitorioso e
governou o país de 1910 a 1914.
Durante seu governo, Hermes da Fonseca enfrentou uma série de conflitos
– como a Revolta da Chibata em 1910 e a Guerra do Contestado em 1912 –
que o levaram a adotar medidas que nem sempre agradavam às oligarquias até
então acostumadas ao poder. Sua política intervencionista também desagradou
às forças políticas dos Estados e o colocou em conflito com várias regiões, como
Pernambuco, Bahia, Ceará e Alagoas.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


133

Diante da instabilidade do governo de Hermes da Fonseca, São Paulo e Minas


Gerais firmaram um acordo em 1913 no qual os dois Estados indicariam os pró-
ximos presidentes da República, que iriam se revezar no exercício do poder, com
o apoio mútuo dos dois Estados. Esse acordo resultou na política do café com
leite, uma vez que representava a defesa dos interesses da oligarquia cafeeira de
São Paulo e dos criadores de gado leiteiro de Minas Gerais.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Figura 3: Charge 2
Fonte: Portal do Professor (online).

República Velha ou República da Espada


III

A política do café com leite mais uma vez excluía do processo político os
demais Estados da República brasileira. Como nos mostra Renato Monseff
Perissinotto,
(...) a aliança entre os representantes políticos de Minas Gerais e os de
São Paulo teve como resultado político mais importante o domínio dos
centros de decisão do aparelho estatal pelos representantes desses dois
estados. Tanto o executivo federal, como é bastante conhecido, quan-
to o legislativo e as suas principais comissões (finanças, obras públi-
cas etc.) estavam sob seu controle. A contrapartida desse predomínio
político rigidamente controlado através do regime político oligárquico

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
foi, evidentemente, a exclusão freqüente dos interesses ligados às ou-
tras classes e frações dominantes desses mesmos centros de decisão, em
especial aquelas vinculadas à produção para o mercado interno, cujo
representante mais forte, o Rio Grande do Sul, ocupava a posição de
satélite em torno dos estados líderes. (PERISSINOTTO, 1996, p. 194).

A partir do estabelecimento desse acordo, São Paulo e Minas Gerais domina-


ram a cena política do país, utilizando-se do coronelismo como instrumento
para garantir a eleição dos candidatos por eles indicados. Esse sistema de reve-
zamento entre presidentes paulistas e mineiros existiu até 1930, quando um
golpe de Estado levou ao poder um representante do Rio Grande do Sul à pre-
sidência do Brasil.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


135
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ASPECTOS DA IMIGRAÇÃO EUROPEIA E A


CONSOLIDAÇÃO DO TRABALHO ASSALARIADO:
AS TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICO-SOCIAIS NA
PRIMEIRA REPÚBLICA

Acompanhamos até o momento, caro(a) acadêmico(a), algumas das mais rele-


vantes transformações políticas e estruturais pelas quais o Brasil passou desde
a Proclamação da República em 1889. Essas transformações trouxeram consigo
mudanças que se refletiram também na economia e no desenvolvimento social
do Brasil.
O crescimento e o desenvolvimento da produção cafeeira após 1822 em detri-
mento da produção açucareira no Nordeste fizeram com que o centro econômico
do país se deslocasse daquela região para o Sudeste, intensificando o desenvol-
vimento de cidades como São Paulo e Minas Gerais e Rio de Janeiro, bem como
da região do Vale da Paraíba.
Entre 1889 e 1930, período da República Velha ou Primeira República, não
só a economia agrícola passou por mudanças, mas também o setor industrial
e o comércio ganharam mais atenção do governo central, sobretudo a partir
do governo de Deodoro da Fonseca, quando Rui Barbosa, então Ministro da
Fazenda, iniciou uma política econômica voltada para o crescimento industrial.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

Nesse novo cenário econômico que se apresentava, os aspectos sociais tam-


bém se modificavam na medida em que novos atores entravam em cena. As
cidades evoluíram e a população brasileira aumentou, fato que contribuiu para
a chegada dos imigrantes europeus que vieram trabalhar nas lavouras de café e
nas indústrias, em substituição da mão de obra escrava, sobretudo após a pro-
mulgação da Lei Áurea em 1888.
O apoio das oligarquias aos governos federal e estadual e o domínio desse
setor no campo político e econômico abriram margem para alterações nas rela-
ções sociais não só no campo, como também nos centros urbanos, na medida

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em que as atividades comerciais internas dependiam também do sucesso eco-
nômico dos produtores rurais.
Desse modo, caro(a) aluno(a), devemos entender que os contextos político,
econômico e social estão interligados e uma alteração em qualquer um desses
aspectos afeta a organização do país na sua totalidade, sendo muito difícil estu-
dá-los isoladamente.

A SUBSTITUIÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO PELO TRABALHO


ASSALARIADO: A IMIGRAÇÃO EUROPEIA

Desde que a família real portuguesa trans-


feriu-se para o Brasil no início do século
XIX com o apoio da Inglaterra, houve uma
pressão deste país para que D. João VI aca-
basse com a escravidão na sua colônia.
Naquele momento, o então rei de Portugal
e do Brasil firmou o Tratado de Aliança
e Amizade pelo qual se comprometia a
extinguir o trabalho escravo no Brasil
nos anos seguintes. No entanto, durante ©shutterstock

muito tempo as promessas de D. João VI


à Inglaterra não saíram do papel.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


137

A monarquia brasileira era em grande medida sustentada pelo trabalho


escravo, uma vez que a economia do país e a elite que apoiava o regime eram
essencialmente agrárias e dependentes da mão de obra escrava. Acabar com a
organização escravocrata significava desestruturar e prejudicar a economia do
país e, consequentemente, perder o apoio de uma parte significativa da elite polí-
tica e intelectual do país. Até mesmo os padres jesuítas que viveram ao Brasil
reconheceram que a escravidão era um mal necessário.
Embora D. João VI tenha conseguido resistir durante um longo período à
pressão inglesa, conforme o século XIX avançava, as discussões acerca da exis-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tência de um regime escravocrata no Brasil ganharam corpo e tornaram-se mais


incisivos. Durante o processo de lutas pela emancipação política do Brasil e após
a proclamação da independência em 1822, os intelectuais responsáveis pelas
novas diretrizes de organização do país defendiam a formação de uma nação
pautada nos princípios liberais, revelando a influência dos eventos que se desen-
rolavam na Europa e na América do Norte. Entretanto, conforme já discutimos
anteriormente, no Brasil, o liberalismo defendido fora adaptado para conceber
a permanência de um regime cuja base residia na supressão das liberdades indi-
viduais, como a escravidão.
O regime escravocrata no Brasil conviveu, então, com a difusão dos ideais
liberais sem que esses ideais representassem a intenção de suprimir o alicerce
da economia naquele momento. Será apenas de maneira lenta e gradual que o
Brasil conseguirá superar a dependência do trabalho escravo.
Como foi dito, o debate acerca do fim da escravidão existia desde o início do
século XIX, mas somente em 1850 foi aprovada a primeira lei que de fato colo-
cou o país no caminho da abolição. A lei Eusébio de Queirós determinou o fim
do tráfico negreiro no Brasil e levou governos e proprietários rurais a buscarem
alternativas para a substituição do trabalho do escravo africano nos setores pro-
dutivos do país.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

A promulgação da Lei do Ventre Livre em 1871, da Lei dos Sexagenários em


1885 e o contexto político daquele período acirraram os debates acerca do fim
da escravidão e das alternativas para a substituição da mão de obra. Quando a
abolição da escravidão finalmente ocorreu – com a assinatura da Lei Áurea em
1888, pela Princesa Isabel – uma parte dos proprietários rurais e dos setores
urbanos já estava preparada para lidar com os infortúnios causados pela medida.
Mesmo tratando-se de um assunto complexo, visto que afetava a organiza-
ção do país como um todo, a abolição, a partir de 1850, tornou-se uma realidade
irreversível, sendo que seria uma questão de tempo até que ela se consolidasse.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O fato de ela ter ocorrido de maneira lenta deu aos proprietários de terras e de
escravos a possibilidade de buscarem, embora relutantes, uma alternativa para
o cultivo de suas terras com o menor prejuízo possível.
O emprego de mão de obra assalariada há muito tempo já era utilizada em
outros países e podemos considerar que, nessa questão, o Brasil estava atrasado
em relação aos países europeus. Além das questões relativas aos custos para o
emprego da mão de obra assalariada, no Brasil da primeira metade do século
XIX, havia ainda barreiras impostas pela falta de uma população livre suficiente
para suprir as necessidades das lavouras e também pelo fato de que os imigran-
tes europeus preferiam dirigir-se para os Estados Unidos. Conforme aponta
Emília Viotti da Costa,
A população dessas regiões onde a pressão para imigração atuava mais
fortemente era canalizada para os Estados Unidos. A organização de-
mocrática das colônias americanas do Norte, o progresso econômico
dessa região, a rede de transporte que ai se instalara precocemente, o
clima de liberdade religiosa, a relativa semelhança da paisagem ameri-
cana com a europeia, ambas dentro de uma mesma área de clima tem-
perado, a maior proximidade da Europa, o que significava passagens
mais baratas, tudo contribuía para dar aos Estados Unidos uma pri-
mazia absoluta entre os países americanos. Para lá se dirigia esponta-
neamente a corrente migratória. Nada que se lhe comparasse oferecia
o Brasil. Terra ignota, sobre a qual corriam lendas as mais extraordi-
nárias; terra distante, agreste, coberta de matas tropicais indevassáveis,
onde, sob um clima que se dizia causticante e incompatível com o ho-
mem branco, grassavam epidemias, o Brasil não oferecia condições
atraentes aos imigrantes (COSTA, 2010, p. 198).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


139

Diante desse quadro, até


meados do século XIX a imi-
gração foi pouco significativa
no Brasil. Não havia interesse
dos estrangeiros em seguir
espontaneamente para nosso
país e também não havia
ainda interesse suficiente
por parte do governo e dos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

proprietários rurais em esti-


©shutterstock

mular essa prática, uma vez


que a mão de obra escrava era abundante e suficiente tanto para o trabalho nas
lavouras quanto para as atividades das cidades.
A partir de 1850 com a proibição do tráfico negreiro, começou a vislumbrar-se
mais efetivamente a necessidade de se buscar meios para promover a substitui-
ção da mão de obra escrava. O emprego da mão de obra estrangeira suscitou os
debates e retomou-se a ideia de incentivar a vinda de europeus para o Brasil a
fim de que eles se dedicassem aos trabalhos antes desempenhados pelos escravos.
Segundo Emília Viotti,
A fórmula usada desde os tempos de D. João VI, cuja finalidade fora
especificamente servir a uma política demográfica, não era a solução
ideal para atender às necessidades da lavoura, que exigia braços para a
cultura de café e não núcleos coloniais de povoamento. Ideou-se, então,
o sistema de parcerias. A par dos núcleos coloniais oficiais ou particula-
res, organizados segundo o sistema tradicional de distribuição de terras
agrupadas em núcleos autônomos, surgiu um novo tipo de colonização
que visava a fixação dos colonos nas fazendas (COSTA, 2010, p. 205).

A organização do sistema de colônias de parceria representou uma tentativa


de substituir gradativamente o trabalho escravo nas fazendas de café. O sistema
consistia na contratação de colonos europeus que teriam as despesas da viagem
até o Brasil e o transporte para as fazendas custeadas pelos fazendeiros interes-
sados em aderir às colônias de parceria. O proprietário rural também fornecia
uma quantidade de dinheiro para que o colono garantisse seu sustento até o iní-
cio do trabalho na lavoura.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

“(...) na região Sul não havia uma numerosa classe de grandes proprietários
demandando trabalhadores em grande número, de forma que os governos
provinciais e o governo imperial puderam implementar uma política de co-
lonização baseada na criação de estabelecimentos rurais de tamanho fami-
liar. Também se concederam estímulos pecuniários e outras vantagens aos
particulares dispostos a fundar colônias nas mesmas linhas das que foram
criadas pelo governo. Por volta de 1870, existiam milhares de famílias euro-
peias, principalmente alemãs, estabelecidas em pequenas propriedades em
diversas colônias públicas e privadas, produzindo excedentes apreciáveis de
gêneros alimentícios a serem vendidos para outras províncias”.

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Fonte: Corrêa do Lago (2014, p. 78).

Emília Viotti destaca também que cada família de colonos recebia uma parte
dos cafeeiros em concordância com sua capacidade de cultivar, e também lhes
era assegurado o direito de plantar os produtos necessários ao seu sustento, em
locais pré-estabelecidos pelo proprietário. Além disso, o acordo firmado entre
as duas partes estabelecia que parte do lucro líquido obtido com a venda da pro-
dução deveria ser entregue ao colono (COSTA, 2010, p. 208).

Na região Nordeste do país, a falta de mão de obra escrava agravou-se de-


vido a uma epidemia de cólera que atingiu de maneira mais grave a po-
pulação escrava na década de 1850. Por essa razão, os agricultores dessa
região aderiram ao trabalho livre e assalariado e, em 1870, o trabalho livre
já era predominante na região, principalmente nas fazendas dos criadores
de gado.
Fonte: Corrêa do Lago (2014, p. 77).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


141

Um olhar superficial sobre o estabelecimento das colônias de parceria e as


regras que regiam o contrato entre o proprietário da terra e o colono pode levar
a um erro de julgamento, ao induzir o leitor a acreditar nos benefícios que a
parceria garantia tanto a um quanto ao outro. No entanto, esse sistema demons-
trou-se vantajoso apenas para o proprietário da terra.
Todo o dinheiro investido pelos proprietários rurais no estabelecimento dos
colonos em suas terras eram depois cobrados do próprio colono. As despesas de
viagem e de instalação dos colonos eram pagas pelos fazendeiros na condição de
adiantamento dos lucros e dos salários pagos aos imigrantes. Sobre esse adianta-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

mento, eram cobrados juros de até 6%, os quais os colonos deveriam pagar assim
que recebessem as primeiras quantias resultantes da venda da produção. Desse
modo, a parte dos lucros da venda do café que correspondia aos imigrantes, vol-
tavam para as mãos e para os bolsos dos proprietários das fazendas, como parte
do pagamento da dívida adquirida com a transferência para o Brasil.

Estima-se que entre a década de 1850 e 1880, aproximadamente 430 mil


imigrantes europeus tenham entrado no Brasil em busca de novas oportu-
nidades. Para conhecer as razões que levaram esses imigrantes a deixarem
seus países de origem e virem para o Brasil acesse o conteúdo disponível
em: <http://acervo.estadao.com.br/noticias/topicos,imigracao,885,0.htm>.
Acesso em: 15 maio 2015.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Desembarque de imigrantes no Brasil
Fonte: História de São Paulo (online).

A sorte dos imigrantes que vieram para o Brasil para compor as colônias
de parceria ficou, então, nas mãos dos proprietários rurais. Para os imigrantes,
o sistema de colônias de parceria representou uma dependência econômica em
relação aos fazendeiros a qual não era possível vislumbrar o fim, na medida em
que até mesmo os produtos necessários para sua subsistência e manutenção de
sua casa e família tinham que ser adquiridos em locais indicados pelos fazendei-
ros de café, os quais geralmente eram de propriedade dos próprios fazendeiros
e onde o preço dos produtos estavam acima da média.
Aos colonos imigrantes não restavam muitas opções, haja vista que, de
acordo com o contrato que assinavam ainda na Europa, não podiam abandonar
o serviço nos cafezais ou mesmo deixar as fazendas a menos que conseguisse
quitar toda a dívida com os proprietários que os contrataram, o que se tornara
quase impossível.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


143

O sistema de colônias de parceria foi adotado, sobretudo na chamada re-


gião de maior concentração e produção cafeeira, composta pelo Rio de Ja-
neiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, onde a produção cafeeira ex-
pandia-se de maneira vertiginosa e a demanda por mão de obra mostrou-se
mais urgente.
Fonte: a autora.

O sistema de colônias de parceria logo começou a dar sinais de que não teria
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

longa duração. As condições impostas aos trabalhadores imigrantes por meio


de seus contratos e a situação em que viviam nas fazendas levaram-nos a decep-
cionar-se com a realidade encontrada nas fazendas de café, muito diferentes das
promessas feitas pelos agentes responsáveis por suas contratações na Europa.
Reclamava-se contra os pesos e medidas usados pelos fazendeiros e seus
representantes, que, segundo diziam, avaliavam a mercadoria sempre
em prejuízo do colono. Consideravam injusta a entrega de metade do
excedente de produção dos gêneros alimentícios. Apontavam-se como
desonestos a contagem dos juros e os cálculos da conversão da moe-
da. Suspeitava-se da ação da justiça, ligada aos interesses senhoriais e,
portanto, pouco inclinada em dar razão ao colono em caso de dissídio.
Queixavam-se ainda os colonos do peso excessivo das dívidas que reca-
íam sobre eles, já ao chegar nas fazendas, em virtude dos preços da via-
gem e transporte até a sede, muitas vezes distante do porto de Santos,
onde eram desembarcados. Sobre aqueles preços ainda eram cobrados
juros. Apontavam dificuldades de ordem religiosa. Chegava-se mesmo
a dizer que os colonos sujeitos a esse sistema de parceria não passavam
de “pobres coitados, miseravelmente espoliados, de perfeitos escravos,
nem mais nem menos, e que encontravam, às vezes, maior dificuldade
em se libertar do que os próprios pretos” (COSTA, 2010, p. 218-219).

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

“(...) na região amazônica, no início da década de 1870, a produção de bor-


racha já predominava sobre as outras atividades e continuava a se expandir
aceleradamente, levando a rápidos ganhos do trabalho livre em relação ao
escravo. Já era evidente, para os observadores da época, que a Abolição não
teria efeitos negativos substanciais sobre a economia da região, e a preocu-
pação no Pará e no Amazonas era obter, de outras regiões, trabalhadores
livres em número suficiente para explorar novas áreas de florestas”.
Fonte: Corrêa do Lago (2014, p. 77).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Diante dessa realidade e da falta de esperança de livrar-se do domínio dos
fazendeiros, muitos colonos entregaram-se aos vícios e deixaram de dedicar-se
aos cultivos da lavoura, gerando alguns prejuízos para os fazendeiros. Assim,
os proprietários também ficaram insatisfeitos e desgostosos com o sistema de
parceria. Alguns proprietários chegaram mesmo a demitir os colonos diante da
indisciplina e da baixa produtividade dos imigrantes.

Ao analisarmos o sistema de parceria percebemos que um dos fatores que


contribuíram para o seu fracasso foi que os proprietários rurais não haviam
compreendido as bases do trabalho livre e assalariado.
Fonte: a autora.

Apesar do fracasso das colônias de parceria em algumas regiões do país, sobretudo


na zona cafeeira de São Paulo, a imigração europeia continuou a ser incentivada
como forma de conseguir os trabalhadores necessários para manter a produção
nas lavouras e nas cidades. A partir da década de 1880, o governo de São Paulo,
diante da falta de interesse dos proprietários em arcar com as despesas de via-
gens dos imigrantes, passou ele mesmo a custear essas viagens, ocasionando um
novo impulso às imigrações (CORRÊA DO LAGO, 2014, p. 93).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


145
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

As transformações nos centros urbanos


Fonte: História de São Paulo (online).

A transferência da família real portuguesa para o Brasil e sua instalação no


Rio de Janeiro – que se tornou sede do governo monárquico e, posteriormente,
capital do Império e da República – representou o fortalecimento do processo
de urbanização no país com o reavivamento das cidades e das atividades a ela
relacionadas.
A vida na corte tornou-se o centro das atenções e os investimentos feitos
na cidade do Rio de Janeiro, a partir do século XIX, despertaram o interesse de
muitos indivíduos que, pouco a pouco, deixaram o campo e instalaram-se na
cidade. A criação de universidades no Rio de Janeiro, de Recife e de São Paulo
possibilitou a formação de intelectuais que desempenharam papeis importan-
tes em momentos decisivos da história política do Brasil.
O fim dos monopólios comerciais e a abertura dos portos brasileiros em
1810 contribuíram para que as atividades comerciais do país se desenvolvessem
e levassem ao desenvolvimento de outros setores, como o de construção de fer-
rovias e maiores investimentos nos portos por onde as mercadorias saiam com
destino ao mercado europeu.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, inaugurada em 1914
Fonte: Projeto Memória Ferroviária (online).

Entretanto, mesmo diante dessas mudanças nos centros urbanos nos primeiros
anos do século XIX, Emília Viotti da Costa chama nossa atenção para o fato de que
Não obstante as condições serem mais favoráveis ao processo de ur-
banização, a partir da independência as linhas gerais da produção
brasileira não foram alteradas. A exportação de produtos agrários
continuou a base da economia. Sobreviveram o latifúndio e o traba-
lho escravo (abolido apenas em 1888). A alta lucratividade da empresa
agrária, exportadora, o caráter limitado do comércio interno, a com-
petição estrangeira inibiram o desenvolvimento das manufaturas. As
elites no poder, beneficiando-se da produção agrícola, procuraram
manter intacta a estrutura tradicional de produção, revelando-se pou-
co simpáticas às empresas industriais. Dessa forma, as condições que
haviam inibido o desenvolvimento urbano no período colonial conti-
nuaram a atuar durante a primeira metade do século XIX. Por isso os
viajantes que percorreram o país nessa época continuaram a observar
o profundo contraste que havia entre as cidades portuárias mais movi-
mentadas, mais modernas, mais europeizadas e os núcleos urbanos do
interior que, na sua quase totalidade, viviam à margem da civilização,
meras extensões das zonas rurais (COSTA, 2010, p. 243).

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


147

A partir das palavras da autora, percebemos que o processo de urbanização


e de industrialização no Brasil, a partir do século XIX, teve maior intensidade
nas cidades litorâneas, sobretudo na região Centro Sul, impulsionado, dentre
outros fatores, pelo crescimento da economia cafeeira.
As cidades do período colonial e do Império estavam atreladas às proprie-
dades e às atividades rurais, sendo que somente nos primórdios da República
haverá uma mudança significativa nas suas estruturas, uma vez que a ideia de
europeização do Brasil ganhou força e buscou-se a modernização dos centros
urbanos e o refinamento da população. A parir de então assistiremos uma evo-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

lução nos centros urbanos que implicará em uma mudança tanto nos aspectos
políticos e econômicos do país como nos aspectos sociais e culturais.
A presença maciça dos estrangeiros, após a segunda metade do século XIX,
contribuiu para uma mudança na paisagem dos centros urbanos. Muitos imi-
grantes, sobretudo após o fracasso das colônias de parceria, deslocaram-se para
as cidades e dedicaram-se à atividades ligadas ao comércio e ao artesanato.
Além disso, havia ainda os estrangeiros que chegaram ao Brasil para trabalhar
nas nascentes fábricas e primeiras indústrias, estando as principais localizadas
nas regiões do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Minas Gerais e do Rio Grande
do Sul (COSTA, 2010, p. 259).
Segundo Bóris Fausto (1995, p. 288), as principais indústrias instaladas no
Brasil entre o final do século XIX e início do século XX foram as indústrias têx-
teis, de alimentação e de vestuário, sendo que as indústrias de base (cimento e
ferro, por exemplo) ainda levariam um tempo para aparecerem no país e, por
essa razão, mesmo em processo de industrialização, o Brasil continuou a depen-
der da importação de materiais de base.
Merece destaque em nosso estudo, caro(a) aluno(a), as transformações ocor-
ridas na cidade do Rio de Janeiro durante a Primeira República, inspiradas na
Belle Époque parisiense.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

“A Belle Époque se caracteriza pela expressão do grande entusiasmo advin-


do do trunfo da sociedade capitalista nas últimas décadas do século XIX e
primeiras, do século XX, momento em que se notabilizaram as conquistas
materiais e tecnológicas, ampliaram-se as redes de comercialização e foram
incorporadas à dinâmica da economia internacional vastas áreas do globo
antes isoladas. Época marcada pela crença de que o progresso material pos-
sibilitaria equacionar tecnicamente todos os problemas da humanidade.
Nesse contexto, as cidades assumiram redobrado valor como locus da ati-
vidade civilizatória, espaço privilegiado para usufruir o conforto material e
contemplar as inovações introduzidas pela modernidade. Para isso, as cida-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
des precisavam renovar suas feições de modo a se mostrarem modernas,
progressistas e civilizadas. As cidades modernizadas constituíram então a
maior expressão do progresso material e civilizatório de um período que se
convencionou chamar de Belle Époque”.
Fonte: Follis (2004, p. 15).

O Rio de Janeiro era a capital da República, mas os cortiços, as casas popu-


lares, a falta de uma infraestrutura básica que mantivesse a cidade limpa e com
as questões relacionadas à higiene em dia construíram uma visão pouco agradá-
vel da cidade. Diante disso, com as transformações políticas e econômicas pelas
quais o país passava entre o final do século XIX e o início do século XX, as auto-
ridades brasileiras sentiram a necessidade de submeter a capital da República a
uma transformação, visando moderniza-la e adapta-la à nova realidade do país.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


149

“As reformas urbanas do Rio de Janeiro ocorridas entre 1902 e 1906 mar-
caram um momento crucial por que passava o país: a passagem do meio
de produção mercantil para o capitalismo. É um momento em que se nota
de forma escancarada a ação do Estado em privilégio do capital, e de certo
modo a transferência de responsabilidades ao setor privado, ou seja, trata-
-se de um momento em que o Estado delega ao capital privado a função de
estruturar a cidade – tendência observada até hoje. Sem a intervenção es-
tatal, a lógica de crescimento da cidade passa a seguir a lógica do mercado,
que leva à valorização do solo nas áreas centrais e à periferização das classes
baixas, sem a criação de uma estrutura que permita sequer o deslocamento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

do morador da periferia até as áreas centrais da cidade, bem como um cres-


cente esvaziamento dos centros históricos. O Rio particularmente se notabi-
liza pela ocupação dos “vazios urbanos” por parte dessa população carente,
mas é importante ressaltar que a proximidade dessas ocupações não lhes
garante qualquer atenção do Estado. São áreas que fisicamente estão pró-
ximas dos grandes centros, mas que historicamente sempre estiveram na
periferia das prioridades do Estado”.
Fonte: Ruchaud (online).

Com esse objetivo, o prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos (1902-1906),


iniciou uma reforma na cidade que levantou a insatisfação da população mais
pobre da cidade. A proposta levada a cabo por Pereira Passos estabelecia medidas
como a transferência dos trabalhadores mais pobres do centro para a periferia
das cidades, a destruição dos cortiços, a derrubada de casas antigas, o alarga-
mento das ruas e a construção de avenidas.

Aspectos da Imigração Europeia e a Consolidação do Trabalho Assalariado


III

Reurbanização do Rio de Janeiro, no início do século XX

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Fonte: Suppia e Scarabello (online).

As medidas de Pereira Passos refletiam os interesses das novas categorias


sociais resultantes das mudanças político-econômicas do início da República no
Brasil. A oligarquia cafeeira enriquecida, a burguesia comerciante e industrial e
os banqueiros entendiam que era necessária uma reconfiguração da cidade do
Rio de Janeiro com o intuito de deixar a cidade mais adequada ao seu status e
afastar os perigos decorrentes do crescimento desorganizado, como a violência
e a proliferação de doenças.

A reforma promovida por Pereira Passos e apoiada pelo então presidente da


República Rodrigues Alves demonstrava o desprezo em relação às camadas
mais baixas da população brasileira, dentre as quais se encontravam os es-
cravos libertos, os imigrantes e brasileiros que não se destacavam economi-
camente dentro do contexto da República Oligárquica.
Fonte: a autora.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


151

FIM DA REPÚBLICA OLIGÁRQUICA: O GOLPE DE 1930


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Getúlio Vargas no Palácio do Catete em 31 de Outubro de 1930, alguns dias pós a Revolução de 1930.
Fonte: Netleland (online).

As primeiras décadas do regime republicano no Brasil caracterizaram-se


pela hegemonia da elite ligada à agricultura agroexportadora como detentoras
do poder político e econômico. Os investimentos no setor industrial, embora
tenham feito progredir a indústria e o comércio no Brasil, não foram suficien-
tes para fazer com que esses setores tomassem a dianteira do desenvolvimento
econômico do país.
Com o fortalecimento do setor agrícola do país, os proprietários de terra ocu-
param durante muito tempo um lugar de destaque na sistematização do cenário
político do país, influenciando a máquina administrativa do país. Nesse contexto,
estabeleceu-se o predomínio de um cenário político cujos donos do poder cria-
ram estratégias para garantirem a viabilização de seus interesses e manterem-se
no poder por meio de alianças entre as forças estaduais e federais, deixando à
margem da organização política, os demais indivíduos e setores que compu-
nham a sociedade brasileira.
As forças oligárquicas que comandavam o cenário político e econômico do
país, entre o final do século XIX e o início do século XX, encontraram resistência
ao modelo de administração implantado, uma vez que esse modelo mostrava-
-se incapaz de integrar os novos elementos que eram introduzidos na sociedade
– como escravo liberto, os imigrantes europeus e, posteriormente, os imigran-
tes asiáticos – e de assimilar as novas características que o país assumia a partir
do processo de industrialização e das reformas urbanas.

Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930


III

Movimentos como a Guerra de Canudos (1896-1897), os conflitos em


Juazeiro, no Ceará (1872-1924), a Guerra do Contestado (1912-1916) e os con-
flitos gerados devido à insatisfação dos primeiros imigrantes que chegaram ao
Brasil para trabalhar nas fazendas de café de São Paulo representaram o descon-
tentamento dos excluídos das principais discussões e decisões do país, decisões
essas que afetavam direta ou indiretamente a vida de todos os que aqui viviam.
Nas cidades, os investimentos, as reformas, o desenvolvimento e a presença de
novos atores sociais também desencadearam manifestações que externalizavam
o desejo por mudanças. A instalação de fábricas e de indústrias, o florescimento

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
das atividades comerciais e a presença dos estrangeiros possibilitaram a circulação
de ideias oriundas da Europa e que chegavam ao Brasil trazidas pelo imigrante
que aqui vinha instalar-se. Dentre essas ideias, destacavam-se as que fundamen-
tavam a luta dos trabalhadores e dos operários por melhores salários e condições.

Matéria de primeira página do Jornal A Capital, do dia 23/07/1917


Fonte: Laboratório de Ensino e Material Didático (online).

O avanço dos ideais socialistas na Europa, sobretudo após a Primeira Guerra


Mundial (1914-1918), propagou-se pelo Brasil e embasou os movimentos ope-
rários do início do século XX. De acordo com Bóris Fausto,

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


153

O número de greves cresceu muito, chegando entre 1917 e 1920, segun-


do os dados mais confiáveis, à casa dos cem, em São Paulo, e mais de
sessenta, no Rio de Janeiro, afora pequenas paralisações não registradas
pela imprensa. A sindicalização ganhou ímpeto, embora não existam
dados seguros da proporção de operários sindicalizados (FAUSTO,
1995, p. 300).

“A imagem sobre o movimento operário no Brasil relaciona-se diretamente


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

à vitória dos comunistas na Revolução Russa, aos diferentes fluxos de en-


tradas de imigrantes europeus para o país, a organização de associações de
bairro, ajuda mútua, clubes de futebol e recreação e às greves nos grandes
centros urbanos. Diferentes grupos de trabalhadores operários, tanto na Eu-
ropa, Brasil, como nos Estados Unidos da América do Norte, entre outros
locais, acreditavam no fim da exploração capitalista e na construção de um
homem e sociedade nova”.
Fonte: Schwartz (2010, p. 1).

O avanço do movimento operário no Brasil, nas primeiras décadas do século


XX, representava uma ameaça à ordem vigente e ao modelo político-econômico
existente no país. Na década de 1920, o setor industrial havia se desenvolvido
significativamente e os industriais procuravam cada vez mais conquistar o reco-
nhecimento da importância de suas atividades para a evolução econômica do
país e ter maior participação política.
Diante desse quadro, o que se percebe, caro(a) aluno(a), é que o sistema
oligárquico, na década de XX, representado pela política do café com leite, pas-
sou a enfrentar a pressão exercida pela burguesia industrial e na medida em que
caminhava para o fim desse período, os problemas oriundos do fim da Primeira
Guerra Mundial em 1918, começaram a ser sentidos mais sistematicamente no
Brasil, comprometendo a estabilidade e a hegemonia que o setor agroexportador
havia conquistado nas décadas anteriores. Para São Paulo e Minas Gerais, torna-
va-se mais difícil lidar com o descontentamento dos demais Estados brasileiros.

Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930


III

A CRISE DA REPÚBLICA OLIGÁRQUICA

No processo eleitoral de 1921, quando São Paulo e Minas lançaram como can-
didato à presidência o nome de Artur Bernardes, que disputaria as eleições com
Nilo Peçanha, apoiado pelas lideranças do Rio Grande do Sul, Pernambuco e
Rio de Janeiro, que formavam a Reação Republicana, houve o crescimento da
insatisfação dos Estados, dos setores e dos indivíduos menos privilegiados ou
beneficiados pela política dos governadores e pela política do café com leite,
que acirrou as disputas eleitorais da década de 1920. (FAUSTO, 1995, p. 306).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Nilo Peçanha, durante sua campanha, criticou abertamente o esquema de
revezamento no governo federal criado por São Paulo e Minas Gerais, os quais
estabeleceram um negligenciamento dos interesses das demais regiões do país,
uma vez que esse esquema visava, dentre outras coisas, proteger os interesses
das oligarquias desses dois Estados.
A candidatura de Nilo Peçanha contava também com o apoio da burguesia
industrial que reclamava uma política que beneficiasse seus investimentos e que
garantisse a proteção de seus interesses. Além disso, proprietários rurais com
uma expressividade menor no contexto político e econômico também aliaram-
-se à aliança liderada pelo Rio Grande do Sul, por meio de Borges de Medeiros.
Como podemos observar, caro(a) aluno(a), as críticas ao sistema do café
com leite intensificaram-se a partir da década de 1920 e tiveram como resultado
a organização da sociedade para fazer frente à realidade que se apresentava. A
Semana de Arte Moderna de 1922, a fundação do Partido Comunista do Brasil,
a Revolução de 1924, a Coluna Prestes e o Movimento Tenentista são exemplos
da reação à dominação das oligarquias de São Paulo e de Minas Gerais na esfera
política federal (FAGUNDES, 2010, p. 128).
Na eclosão de alguns desses movimentos, como a Revolução de 1824, a Coluna
Prestes e, como o próprio nome sugere, o Movimento Tenentista, o exército –
ou pelo menos uma fração dele – teve uma participação definitiva e, conforme
destaca Fagundes (2010, p. 128), “o Tenentismo passou a ser interpretado no
bojo do conjunto de episódios que marcaram a chamada ‘crise dos anos 1920’”.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


155

Os levantes militares que sacodem o Brasil, desde os eventos do Forte de


Copacabana, em 1922, até a insurreição integralista, em 1938, e de que são
responsáveis diretos os tenentes, se podem ser explicados, em parte, pelas
suas características militares – como ‘coisas de quartéis’ – sintetizam e ex-
pressam, no entanto, as contradições existentes em toda a sociedade. Parti-
lhando do controle de um dos instrumentos fundamentais do poder, isto é,
da força de coerção e da violência, relativamente organizados e possuidores
de uma cultura dos problemas nacionais acima da média da população em
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

geral, os tenentes, pressionados aparentemente por motivos profissionais,


com os suboficiais e os soldados aparecem como espécie de ‘mediadores in-
conscientes’ das demandas sociais e políticas dos cidadãos (TAVARES, 1985,
p. 62 apud BRAVO, 2011, p. 186).
Para conhecer mais sobre o Movimento Tenentista, acesse o conteúdo dis-
ponível em: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/
CrisePolitica/MovimentoTenentista. Acesso em: 21 maio 2015.

A influência do exército na organização dos movimentos que tinham por


base a crítica à República Oligárquica nos anos de 1920 é um indicativo da
relevância dessa instituição desde o momento da Proclamação da República
em 1889. E na atualidade, qual é o papel exercido pelo exército no cenário
brasileiro?
Fonte: a autora.

Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930


III

O GOLPE DE 1930

No processo eleitoral de 1921, a Reação Republicana, liderada pelo Rio Grande


do Sul, lançou o candidato Nilo Peçanha para concorrer com Artur Bernardes,
o nome que representava o acordo político de São Paulo e Minas Gerais. Apesar
do apoio significativo que o candidato da Reação Republicana recebeu, Artur
Bernardes venceu o pleito, reafirmando a força do esquema do café com leite,
assegurado por meio da fraude eleitoral. Embora não tenha conseguido colocar
fim à hegemonia política das duas maiores economias do país, o Rio Grande do

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Sul permaneceu com o objetivo de suplantar o sistema vigente e iniciar um novo
capítulo na história política do país.
Na década de 1920, o Rio Grande do Sul contava com um setor industrial
bem desenvolvido, fato que colocou o Estado como o terceiro mais produtivo do
país. Desse modo, tornou-se imprescindível para o Estado que o governo fede-
ral adotasse medidas que beneficiassem e protegessem os interesses não apenas
do setor agroexportador, mais precisamente do setor cafeeiro, mas que colabo-
rasse também para o desenvolvimento das atividades industriais. Buscando tais
objetivos, os gaúchos, ao longo da década de 1920, elaboraram estratégias que
modificaram as conjunturas políticas dominantes até então.
Como dito anteriormente, a década de 1920 representou um período de agi-
tações sociais que questionavam o modelo político existente e que colocou em
prova a força da política dos governadores e do café com leite. Associados às
questões internas do país, os eventos que sacudiam a Europa no mesmo período
– muitos deles resultado da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) – também
contribuíram para abalar as estruturas políticas, econômicas e sociais do Brasil.
Os presidentes que comandaram o país nesse período – Artur Bernardes (1922-
1926) e Washington Luiz (1926-1930) – precisaram lidar com as forças internas
e externas que ameaçavam a manutenção do poder constituído.
Mesmo diante de um cenário de agitações de ordem política, econômica
e social, a política do café com leite mantinha-se segura por meio das fraudes
nos processos eleitorais, garantindo o apoio às suas respectivas elites políticas
e econômicas. Nas eleições de 1930, no entanto, o presidente Washington Luiz
(representante do Estado de São Paulo) decidiu indicar e garantir a candidatura

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


157

de Júlio Prestes à sucessão presidência. Júlio Prestes também era paulista e sua
candidatura representava a ruptura do acordo estabelecido com Minas Gerais,
de onde deveria vir o próximo presidente do Brasil.
Segundo Bóris Fausto (1995, p. 319), não há um consenso ou uma opi-
nião definitiva sobre as razões que levaram Washington Luiz a romper o acordo
com Minas Gerais, colocando um fim à política do café com leite. O fato é que
a decisão do então presidente da República fez com que Minas Gerais se unisse
ao Rio Grande do Sul e apoiasse a indicação de um candidato gaúcho à presi-
dência do Brasil.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O candidato que concorreria com Júlio Prestes era Getúlio Vargas, sendo João
Pessoa seu candidato à vice-presidente. Getúlio Vargas e João Pessoa formaram
a Aliança Liberal e receberam o apoio da Paraíba e de uma parte da sociedade
paulista, enquanto Júlio Prestes recebeu o apoio de 17 Estados brasileiros, inclu-
sive de dissidentes do Partido Republicano Mineiro (FAUSTO, 1995, p. 319).

Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


III
159
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Carta de Antônio Carlos ao chefe político gaúcho Flores da Cunha em apoio à candidatura de Vargas,
1930. Juiz de Fora (MG). (CPDOC/GV 1930.06.16)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

As eleições ocorreram no início de 1930 e Júlio Prestes foi eleito presidente


do Brasil. A Aliança Liberal não concordou com o resultado das eleições e ques-
tionava o sistema eleitoral, acusando-o de fraudes. Diante do reconhecimento da
vitória de Prestes, a Aliança Liberal articulou uma estratégia para impedir Júlio
Prestes de assumir a presidência do Brasil.
Em julho de 1930 o candidato à vice de Getúlio Vargas, João Pessoa, foi
assassinado e a Aliança Liberal imediatamente acusou Júlio Prestes de ser o res-
ponsável pelo crime. Com essa justificativa, Getúlio Vargas e a AL iniciaram um
movimento revolucionário apoiado pela burguesia comercial e industrial, por
uma parte do exército e pelas oligarquias dissidentes. com o objetivo de impe-
dir a posse de Júlio Prestes.

Fim da República Oligárquica: O Golpe de 1930


III

Desse modo, as forças apoiadoras de Getúlio Vargas depuseram o presidente


Washington Luiz e entregaram a chefia do governo ao candidato gaúcho. Como
descreve Bóris Fausto,
Getúlio Vargas deslocou-se de trem a São Paulo e dai seguiu para o Rio,
onde chegou precedido por 3 mil soldados gaúchos. O homem que,
no comando da nação, iria insistir no tema da unidade nacional, fez
questão de fazer transparecer, naquele momento, seus traços regionais.
Desembarcou na capital da República em uniforme militar, ostentan-
do um grande chapéu dos pampas. O simbolismo do triunfo regional
se completou quando os gaúchos foram amarrar seus cavalos em um

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
obelisco existente na Avenida Rio Branco. A posse de Getúlio Vargas
na presidência, a 3 de novembro de 1930, marcou o fim da Primeira Re-
pública e o início de novos tempos, naquela altura ainda mal definidos
(FAUSTO, 1995, p. 325).

Nesse momento, tinha início a chamada Era Vargas, assunto de nossa próxima
unidade.

DA REPÚBLICA DA ESPADA AO GOLPE DE 1930: A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA


161

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), nesta unidade estudamos o processo de implantação da


República no Brasil, destacando as forças políticas, econômicas e sociais que
permearam a consolidação do regime republicano no Brasil. Por meio desse
estudo, pudemos compreender que, desde seu nascimento, a República do Brasil
alicerçou-se sobre a defesa dos interesses de alguns poucos cidadãos, negligen-
ciando as necessidades e os interesses da maioria de sua população.
Embora sobre a égide de um regime político novo, as forças políticas que
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

comandaram o Brasil até 1930 pouco se diferenciaram do período imperial. No


entanto, se no campo político e econômico a realidade brasileira levaria ainda
algum tempo para ser modificada, no que diz respeito às bases sociais e cultu-
rais do país a história seria diferente.
A incorporação de novos atores sociais no país possibilitou a modificação
da paisagem urbana e foi um elemento de inovação e até mesmo de renovação
da cultura e das ideais presentes na sociedade brasileira. As propriedades rurais
e os centros urbanos conheceram aspectos dos hábitos e da cultura europeia
tanto pela presença do imigrante europeu quanto a partir das reformas urbanas
promovidas por Pereira Passos no início do século XX. A ideologia estrangeira
somou-se ao contexto social interno – resultado do desenvolvimento do capita-
lismo e das relações conflituosas entre patrões e operários – e contribuiu para a
emergência de conflitos tanto no campo quanto nas cidades.
A ascensão de uma elite cujas atividades não se baseavam no uso da terra
acirrou a disputa pelo poder e provocou a desarticulação de um sistema político
alicerçado na aliança entre os Estados com maior representatividade econô-
mica. A chamada política do café com leite foi vítima de seus próprios anseios,
fato que deu margem para a organização de um golpe que mais uma vez provo-
cou mudanças significativas nas bases de organização da sociedade brasileira.

Considerações Finais
1. Ao instalar-se a República no Brasil, o quadro geral do país apresentava uma
diversidade de interesses e ideais, os quais esperavam ser contemplados com
o novo sistema político. No entanto, a adoção de um regime político diferente
não resultou necessariamente em uma ruptura da hegemonia de alguns grupos
políticos e econômicos. Com base no que foi estudado nesta unidade, analise o
contexto político e econômico da sociedade brasileira nas primeiras déca-
das do regime republicano e aponte os interesses defendidos pelos setores
responsáveis pela organização da Primeira República no Brasil.
2. A abolição da escravidão em 1888 influenciou o aumento da entrada de imigran-
tes europeus no Brasil entre o fim do século XIX e o início do século XX. Discorra
acerca da maneira como a chegada do trabalhador europeu contribuiu para
as transformações sociais e culturais da sociedade brasileira no início do
século XX.
3. O trabalho livre foi implantado no Brasil a partir da utilização da mão de obra
estrangeira. Com relação a esse processo, leia as afirmações abaixo e assinale
a alternativa correta.
a) Desde meados do século XIX, a imigração foi amplamente incentivada no Brasil,
na medida em que havia forte interesse dos estrangeiros em seguir espontane-
amente para nosso país.
b) O emprego da mão de obra estrangeira nas lavouras de café no Brasil seguiu um
rígido sistema de organização, o qual garantiu o sucesso do sistema em todas as
regiões do país.
c) A relação entre os cafeicultores e os imigrantes europeus desenvolveu-se de ma-
neira tranquila, uma vez que foram fornecidas aos trabalhadores recém chega-
dos todas as oportunidades de crescimento e enriquecimento.
d) A organização do sistema de colônias de parceria representou uma tentativa de
substituir gradativamente o trabalho escravo nas fazendas de café e organizou-
-se de maneira diversa nas regiões do país.
e) Com o fracasso das colônias de parceria, os proprietários rurais foram gradativa-
mente substituindo as atividades agrícolas pelas atividades comerciais e indus-
triais, deslocando-se para os centros urbanos.
163

4. Leia o documento a seguir: “Prezados amigos – Segue esta carta por porta-
dor especial, afim de levar-lhes a sciencia de que as nossas combinações no Rio
tiveram aqui integral aprovação. A palavra de honra por mim empenhada será
honrada pelo Rio Grande todo, nos precisos termos da acção por nós assentada.
Envio-lhe meu afectuoso abraço”. (Bilhete de Lindolfo Collor e Oswaldo Aranha
confirmando o dia 3 de outubro como data da deflagração do movimento revo-
lucionário, 1930. Porto Alegre (RS). CPDOC/PEB 1930.09.25). Analise as afirma-
ções abaixo:
I. Na década de 1920, o Rio Grande do Sul encontrava-se atrasado no seu desen-
volvimento industrial se comparado ao Estado de São Paulo, devido à forte pre-
sença de uma elite proprietária de terra.
II. A década de 1920 representou um período de agitações sociais que questiona-
vam o modelo político existente e que colocou em prova a força da política dos
governadores e do café com leite.
III. Getúlio Vargas e João Pessoa formaram a Aliança Liberal e receberam o apoio da
Paraíba e de uma parte da sociedade paulista, enquanto Júlio Prestes recebeu o
apoio de 17 Estados brasileiros.
IV. A vitória de Getúlio Vargas nas eleições de 1930 representou a vitória da burgue-
sia industrial e comercial do país.
Estão corretas as alternativas:
a) I.
b) I e IV.
c) II e IV
d) IV.
e) II e III.
SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922
Mal começado, o ano de 1922 guardava inusitadas surpresas aos paulistanos. Primeiro,
um tremor atingiu a capital. De pequena magnitude, gerou uma série de matérias na
imprensa, detalhadas explicações científicas e algumas analogias bem humoradas. Uma
nota no Jornal do Comércio de 31 de janeiro comparava o abalo sísmico a crises histéri-
cas de esposas que sofriam dos nervos.
Pouco depois, a fuga de presos da cadeia pública situada à avenida Tiradentes causaria
pânico entre os habitantes da cidade. Aproveitando-se do descuido da sentinela, os de-
tentos evadiram-se pelos fundos misturando-se a operários que trabalhavam no local.
O choque maior, porém, ainda estava por vir. Perdidos entre as páginas dos jornais de
fevereiro, pequenos “reclames” anunciavam o Festival de Arte Moderna, abrilhantado
pelo “concurso” de Guiomar Novais e Heitor Villa-Lobos.
Mas quem se dispôs a desembolsar 186 mil-réis que davam direito às três récitas levou
um susto. Ao transpor os treze degraus de acesso ao Teatro Municipal, os cavalheiros de
fraque e cartola, acompanhados por damas elegantemente vestidas, paravam estarreci-
dos. E não era para menos. Convertido em museu improvisado, o suntuoso hall apresen-
tava pinturas e esculturas que, com raras exceções, desdenhavam de todos os cânones
artísticos até então ensinados nas melhores academias de arte do país e d` além-mar.
À direita da escadaria interna, um desfigurado homem amarelo padecia severamente
do fígado. Adiante, um Cristo de tranças escarnecia o penitente catolicismo do público,
que se benzia indeciso defronte o painel Ao pé da cruz, de Di Cavalcanti. Sem culpa nem
explicações, um sem-fim de sacrilégios religiosos e artísticos penalizavam os incautos
visitantes. Quadros sem perspectivas, cores berrantes, figuras deformadas, manchas
indecifráveis e paisagens sombrias viravam pelo avesso as normas básicas da estética
convencional. E pouco adiantava correr atrás de coerência ou rima nos versos a serem
declamados no palco. Ali, uma enxurrada de desatinos literários feria sensibilidades re-
fratárias a experimentalismos linguísticos. Delírios poéticos sobre aeroplanos, estradas
da Via láctea, sapos e guerra provocavam os expectadores, que revidaram numa bem
orquestrada vaia regida pelos estudantes do alto das galerias.
Abrindo ruidosamente as comemorações do Centenário da Independência, a Semana
de 22 vinha alvoroçar o universo artístico e literário da Paulicéia. Sob a genérica denomi-
nação de “os novos”, mas também apelidados de “futuristas”, seus artífices articulariam
um movimento cultural que teve o primeiro ato público naquela Semana de Arte Mo-
derna – em verdade, três noitadas de conferências, audições musicais, leitura de poemas
e uma exposição de artes aberta de segunda a sábado no saguão do Teatro Municipal,
cuja imponência contrastava com a tônica irreverente dos vanguardistas.
165

Derivados de modernus, vocábulo de origem medieval ironicamente cunhado com o


propósito de desviar a atenção das novidades e depreciá-las em relação a épocas mais
antigas e mais sábias, o modernismo surgiu em meados do século XIX na Alemanha.
Percorreria a Europa e os Estados Unidos até chegar à América espanhola, ganhando ali
conotações múltiplas, derivadas das circunstâncias históricas, econômicas, sociais e cul-
turais de cada lugar, ampliando e fortalecendo seu domínio. Em termos gerais, aplica-se
aos vários movimentos artísticos e literários, como cubismo, expressionismo, futurismo,
vorticismo, construtivismo russo, dadaísmo, etc., que, entre fins do século XIX e prelúdio
do século XX, essencialmente na Europa, questionaram e desconstruíram os sistemas
estéticos da arte consagrada.
Fonte: CAMARGOS (2002, p. 17-19).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Título: Os Sertões
Autor: Euclides da Cunha
Editora: Francisco Alves
Sinopse: Euclides da Cunha aborda neste livro, cuja primeira edição é
de 1902, a Guerra de Canudos, a qual acompanhou como jornalista do
jornal O Estado de São Paulo. O livro é dividido em três partes – A Terra,
O Homem e A Luta – e pode ser considerado um misto de literatura e
história, no qual o autor oferece um retrato do Brasil no final do século
XIX.

Título: Eternamente Pagú


Ano: 1987
Direção: Norma Benguell
Sinopse: O filme retrata a vida da escritora e jornalista
Patrícia Rehder Galvão, uma ativista política contrária ao
governo de Getúlio Vargas. Amiga de vários artistas que
participaram da Semana de Arte Moderna de 1922, Patrícia
– que adotou o apelido Pagú – foi casada com Oswald de
Andrade e foi uma figura polêmica para sua época devido
ao seu engajamento político. Por meio do filme é possível
conhecer o cenário político e cultural da primeira metade
do século XX e entender a efervescência que tomou conta
do país naquele momento.

Para saber mais sobre as revoluções ocorridas na década de 30, assista “1930 tempo de
revolução”, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=vOPeTl3fzd>. Acesso
em 06 jul. 2015.
Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

IV
A ASCENÇÃO DOS REGIMES
AUTORITÁRIOS NO BRASIL

UNIDADE
E A SUPRESSÃO DA “DEMOCRACIA”
BRASILEIRA: DA ERA VARGAS À
DITADURA MILITAR

Objetivos de Aprendizagem
■■ Verificar as conjunturas do primeiro período do governo de Getúlio
Vargas (1930-1937).
■■ Analisar o período do Estado Novo (1937-1945) e as diretrizes
políticas da ditadura getulista.
■■ Verificar o processo de redemocratização do país após o fim do
Estado Novo.
■■ Analisar o contexto político, econômico e sociocultural que permeou
a instalação da ditadura militar no Brasil.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Os primeiros anos do governo de Getúlio Vargas (1930-1937).
■■ A ditadura de Vargas: o Estado Novo (1937-1945).
■■ Enfim a democracia? As esperanças renovadas e o novo golpe: início
da ditadura militar no Brasil.
169

INTRODUÇÃO

O golpe de 1930 levou ao poder uma das figuras mais polêmicas e controversas
da história política do Brasil, Getúlio Vargas. Comandando as forças contrárias à
política oligárquica, o político gaúcho ascendeu ao poder representando a espe-
rança dos setores até então relegados à margem do processo governamental de
conquistar um espaço maior no encaminhamento da vida política do país. Essa
esperança em breve seria derrotada. Ao assumir a presidência do Brasil, Getúlio
Vargas mostrou que não tinha a intenção de dividir o comando do país.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Nesta unidade vamos estudar as diretrizes que fundamentaram o estado getu-


lista e que contribuíram para que Getúlio Vargas se mantivesse no poder por 15
anos ininterruptos, sendo amado por alguns e odiado por outros. Vamos enten-
der também porque mesmo após estabelecer uma ditadura no Brasil, Getúlio
Vargas reassumiu o posto de presidente do Brasil em 1950, cinco anos após dei-
xar o cargo e por meio das vias democráticas.
Neste momento de nosso estudo, caro(a) aluno(a), percorreremos também o
caminho que levou à instalação da ditadura militar no Brasil, verificando as con-
junturas que marcaram a organização do país após o fim do segundo governo de
Getúlio Vargas (1950-1954) até o golpe de 1964. Nosso objetivo neste momento
é refletir sobre um período da história brasileira que deixou marcas indeléveis
na sociedade e que se fazem muito presentes em nossa atualidade.
Discutir e analisar o período da ditadura militar brasileira é imprescindível
para que possamos entender o significado e a importância dos eventos que se
seguiram a esse período e compreender o sentido da palavra democracia, mui-
tas vezes esquecido. Com a análise proposta nesta unidade esperamos que você,
caro(a) aluno(a), tenha discernimento para refletir sobre o momento político e
social que se apresenta, procurando não repetir um discurso pautado na falta
de conhecimento do passado histórico brasileiro e que contribui para a repeti-
ção de erros anteriores. Por que, o que de antemão podemos afirmar, é que esse
passado não deve ser esquecido por representar um retrocesso em nossa histó-
ria e uma afronta à liberdade e à democracia.

Introdução
IV

OS PRIMEIROS ANOS DO GOVERNO DE GETÚLIO


VARGAS (1930-1937)

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Getúlio Vargas
Fonte: Universidade de São Paulo (online).

Quando Getúlio Vargas assumiu a presidência do Brasil em 1930, teve o apoio


das oligarquias que não eram privilegiadas pela política do café com leite, de
setores do Exército e da burguesia industrial e comercial. O que esses setores
esperavam de Getúlio Vargas era que ele conduzisse o processo de transição de
um governo pautado na defesa dos interesses e privilégio de alguns para um
governo que garantisse a ampliação da participação política e consolidasse o
exercício da democracia no Brasil.
No entanto, o que os apoiadores de Getúlio Vargas assistiram durante a
Revolução de 1930, após a vitória do golpe em novembro de 1930, foi o fim de suas
expectativas e o início de um governo fundamentado na supressão da democracia,
levado a cabo por um discurso que manipulava parte da população e a colocava
a seu favor, mesmo diante de medidas autoritárias. Desse modo, Getúlio Vargas
conseguiu manter-se no poder ao longo de 15 anos, embora tenha, logo no iní-
cio desse período, perdido o apoio daqueles que o ajudaram a chegar no poder.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


171

Em 1930 o Brasil passava por um momento conturbado, influenciado – além


do contexto interno – pelos acontecimentos internacionais. O fim da Primeira
Guerra Mundial, o avanço das ideias socialistas e a crise norte-americana de 1929
afetaram de maneira considerável os países europeus e o Brasil.
Com o fim da Primeira Guerra, os países europeus depararam-se com uma
realidade permeada por crises econômicas oriundas dos gastos e dos investimen-
tos no conflito. Mesmo os países considerados vencedores da Primeira Guerra,
ao fim do embate, eles estavam endividados e a população sofria com a desor-
dem política, as crises de abastecimento, o desemprego e a carestia. A exceção
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

a esse quadro eram os Estados Unidos, que em meio ao caos provocado pela
Primeira Guerra conseguiu, terminado o conflito, manter o desenvolvimento e
o fortalecimento de sua economia.
A euforia norte-americana manteve-se até o final de 1929, quando a que-
bra da bolsa de Nova Iorque jogou o país em uma crise econômica que teve um
efeito global devido às relações existentes entre os E.U.A e os países europeus.
Dessa forma, a crise dos países europeus acirrou-se, afetando diretamente a eco-
nomia brasileira.
De acordo com o que estudamos nas unidades anteriores, a economia bra-
sileira do século XIX e início do século XX tinha um caráter agroexportador,
sendo o café o principal produto de exportação do país. A valorização do café
no mercado internacional foi responsável pelo avanço econômico do Brasil e
também teve grande influência no contexto político do país, conforme apon-
tado nas discussões anteriores.
Com a crise política, econômica e social que assolava a Europa desde o fim
da Primeira Guerra Mundial e que se intensificou no final da década de 1920, a
economia brasileira também entrou em colapso. As exportações do café foram
reduzidas, uma vez que os países europeus eram os principais consumidores
do produto brasileiro, fazendeiros foram arruinados, nas cidades o movimento
operário ganhou força a partir do avanço das ideias socialistas, a produção indus-
trial também foi afetada, acarretando a elevação na taxa de desemprego. Esse foi
o contexto que Getúlio Vargas encontrou ao assumir o comando do Brasil no
final de 1930. Portanto, cabia ao novo presidente a tarefa de reorganizar a socie-
dade brasileira e colocar o Brasil novamente no caminho do desenvolvimento.

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

O GOVERNO PROVISÓRIO E A CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA

Ao que parece, para alcançar a estabilidade política, econômica e social do país,


para Getúlio Vargas, eram necessárias medidas drásticas. Por essa razão, logo no
início de seu governo, que deveria ser apenas provisório, adotou medidas que
lhe garantiram o controle total do país.
Desde novembro de 1930, Getúlio vinha governando por decreto, após
suspender a Constituição Federal, dissolver o Congresso, as Assem-
bleias Legislativas e as Câmaras municipais, destituir prefeitos e gover-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
nantes dos estados, eliminar as prerrogativas individuais e instituir um
tribunal de exceção para julgar crimes políticos. Autoatribuindo-se po-
deres discricionários, o Governo Provisório, originário do movimento
civil-militar que conduzira o político gaúcho ao Catete, também apo-
sentara compulsoriamente, por “imperiosas razões de ordem pública”,
seis ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), considerados com-
prometidos com o antigo regime (NETO, 2013, p. 7).

Desse modo, o novo presidente estabeleceu um governo centralizador, uma


demonstração do que pretendia Getúlio Vargas: governar sem a interferência
externa. Nos Estados, após demitir os governadores, nomeou interventores alia-
dos para impedir a insurreição contra seu governo autoritário.
Para combater a crise econômica do país no início da década de 1930, Getúlio
Vargas adotou uma política de valorização do café – ainda o produto de maior
expressão da economia brasileira – elaborando estratégias para garantir o preço
do produto no mercado nacional e internacional, afetado pela crise mundial
desencadeada a partir de 1929.
Para tanto, Getúlio determinou que o governo federal combateria a crise de
superprodução do setor cafeeiro comprando o excedente do produto que não
fosse comercializado no mercado internacional. Dessa maneira, garantiria o
valor do produto, minimizando os prejuízos dos cafeicultores. O excedente da
produção comprado pelo governo federal seria queimado, reduzindo a oferta
do produto e assegurando o seu valor (FAUSTO, 1995, p. 334).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


173

Além de defender os cafeicultores, Vargas procurou elaborar estratégias que


mantivessem sob controle os setores que representavam uma ameaça à consoli-
dação do seu governo. Dessa forma, criou em 1930 o Ministério do trabalho, por
meio do qual estabeleceu uma série de reformas trabalhistas que colocavam as rela-
ções de trabalho sob a tutela do governo federal. De acordo com Cláudio Recco,
O Estado criou fórmulas diversas para garantir o controle e apoio dos
sindicatos. A política assistencialista e algumas leis, como a nova Lei de
Férias; o novo Código de Menores; a regulamentação do trabalho femi-
nino, e o estabelecimento de convenções coletivas de trabalho. Durante
a década de 1930, foram criados institutos de aposentadoria e pensões
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

de várias categorias como industriários, comerciários, bancários e fun-


cionários públicos (RECCO, 2010, p. 65).

Além disso, segundo o mesmo autor,


Em dezembro de 1930 foi decretada a Lei de nacionalização do traba-
lho, pela qual as empresas eram obrigadas a empregar pelo menos dois
terços de brasileiros entre os seus funcionários. Dessa maneira Vargas
reforçou seu discurso nacionalista, eliminou parte dos trabalhadores
de origem imigrante – que eram mais conscientes politicamente e mais
organizados – e criou um novo setor operário, que chegou aos postos
de trabalho “graças ao governo” (RECCO, 2010, p. 65).

Com a criação dessa legislação trabalhista, Vargas pretendia conter o avanço


dos movimentos sindicais e a oposição ao seu governo, manipulando os tra-
balhadores. Essa tendência do governo varguista será uma característica que o
acompanhará ao longo de todo seu governo e que será um dos motivos a con-
tribuir para sua eleição em 1934 e em 1950.
A centralização praticada por Getúlio Vargas desagradou antigos aliados e
o colocou em confronto com as forças oposicionistas ao golpe de 1930. O con-
flito entre a política intervencionista de Vargas e a elite de São Paulo gerou um
dos eventos mais importantes desse primeiro período do governo Vargas.

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

A nomeação de um interventor que não era paulista para comandar o Estado


de São Paulo acirrou a oposição das elites dessa região, contrárias às medidas
adotadas pelo novo governo federal. O Partido Republicano Paulista e o Partido
Democrático uniram-se à porção do Exército que não participara da revolução
de 1930 e deflagraram um movimento revolucionário que tinha por objetivo
forçar a convocação de uma Assembleia Constituinte para elaborar uma nova
Constituição para o país, uma vez que o documento de 1891havia sido revogado
por Getúlio Vargas (SKIDMORE, 2003, p. 156).
A Revolução Constitucionalista, como foi chamado o movimento revo-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
lucionário, desenrolou-se entre julho e outubro de 1932 e foi liderada pelo
Exército. Sem o apoio de outros Estados, a Revolução Constitucionalista não
obteve sucesso, sendo as forças do Exército paulista derrotadas pelas forças do
Exército federal (SKIDMORE, 2010, p. 157). No entanto, embora fracassada, a
Revolução de 1932 mostrou ao governo central que era o momento de estabe-
lecer o fim do governo provisório e garantir, por meios legais, a permanência
de Getúlio Vargas à frente do Estado brasileiro. Com esse propósito, em maio
de 1933, foram convocadas eleições para a Assembleia Constituinte, que atuou
entre 1933 e 1934 na elaboração da nova Constituição do país.

De novembro de 1933 a julho de 1934 o país viveu sob a égide da Assem-


bleia Nacional Constituinte encarregada de elaborar a nova Constituição
brasileira que iria substituir a Constituição de 1891. Foram meses de intensa
articulação e disputa política entre o governo e os grupos que compunham
a Constituinte. Para o primeiro, a futura ordenação jurídica do país deve-
ria incorporar o conjunto de mudanças que vinham sendo promovidas nos
campos social, político e econômico. Essas posições também eram defendi-
das por lideranças tenentistas eleitas para a Constituinte. Para a Igreja Cató-
lica, o momento era de afirmação e de maior intervenção na vida política do
país. Já para os grupos oligárquicos, a nova Constituição deveria assegurar
aos estados um papel de relevo. O maior desafio dos constituintes foi tentar
encontrar caminhos capazes de atender a essa gama variada de projetos e
interesses.
Fonte: A ERA Vargas (online)

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


175
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Cartão Postal do MMDC, 1932. São Paulo (SP). (CPDOC/ CDA Roberto Costa)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Após a derrota da Revolução de 1932, São Paulo sentiu a necessidade de for-


mar uma nova elite capaz de contribuir para o aperfeiçoamento do governo
e para a melhoria do país. Com esse objetivo um grupo de empresários fun-
dou a Escola Livre de Sociologia e Política (ELSP), em 1933, e o interventor
Armando Sales criou a Universidade de São Paulo (USP), em 1934. Como
disse Sergio Milliet, “de São Paulo não sairão mais guerras civis anárquicas”,
e sim “uma revolução intelectual e científica suscetível de mudar as con-
cepções econômicas e sociais dos brasileiros”. A busca de conhecimentos
aplicáveis à vida do país vinha reforçar a crítica à cultura bacharelesca e à
formação deficiente das escolas de direito.
Fonte: Criação da Universidade de São Paulo (online).

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

O GOVERNO CONSTITUCIONAL (1934-1937)

A nova Carta Constitucional do Brasil ficou pronta em julho de 1934 e, segundo


Thomas Skidmore (2003, p. 157) “era uma mescal de liberalismo político e refor-
mismo socioeconômico”. O novo documento, em linhas gerais, reforçava a política
nacionalista empreendida por Getúlio Vargas desde o início de seu governo,
reconhecia a autoridade do Executivo – cujo representante seria eleito para um
mandato de quatro anos – mas defendia a redemocratização do país por meio
da retomada do sistema federativo e a instalação de um poder Judiciário mais

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justo e imparcial (SKIDMORE, 2003, p. 158).
A Constituição de 1934 determinava que novas eleições presidenciais fos-
sem realizadas, as quais foram vencidas por Getúlio Vargas, uma vez que o
documento estabelecia que a primeira eleição realizada após sua promulgação
seria por meio do voto indireto, ou seja, o novo presidente seria escolhido pelos
membros da Assembleia Constituinte, que eram, na sua maioria, partidários de
Getúlio Vargas.
Nessa nova fase de seu governo, Getúlio Vargas deveria ter suas prerrogativas
políticas limitadas pela Constituição, governando em conjunto com o Congresso.
No entanto, o acirramento das disputas entre as ideologias presentes no interior
do Brasil levaram o presidente a buscar alternativas de garantir sua autonomia
em relação ao Congresso e às forças regionais. As ideologias citadas referem-
-se, principalmente, aos modelos de governo defendidos pela Ação Integralista
Brasileira (AIB) e à Aliança Nacional Libertadora (ANL).
Criada em 1932 e com inspiração no fascismo italiano – embora o elemento
racista não fizesse parte da ideologia integralista – a Ação Integralista Brasileira
era liderada por Plínio Salgado, escritor, jornalista e ex-deputado estadual pelo
PRP. Era composta por indivíduos das classes média e alta, oficiais da Marinha,
membros do clero, intelectuais, profissionais liberais, funcionários públicos e
militares (RECCO, 2010, p. 68), que defendiam a criação de um “Brasil cristão
baseado numa sociedade disciplinada com pouca tolerância para a ação revo-
lucionária da esquerda” (SKIDMORE, 2003, p. 159). O lema da AIB era Deus,
Pátria e Família.
Segundo o historiador João Fábio Bertonha,

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


177

A base do pensamento de Plínio Salgado era a oposição entre mate-


rialismo e espiritualismo, concepções antagônicas em conflito desde o
início dos tempos. No mundo dos anos 20 e 30, Salgado identificava
uma vitória do materialismo e do individualismo e afirmava que, para
vencê-los, deveria haver uma revolução espiritual.

Essa revolução deveria ter como alvos o capitalismo liberal, fortemente


injusto e desigual, e principalmente o comunismo, visto como o auge
da civilização materialista e ateísta. Para Salgado, o Brasil estava sob o
domínio do materialismo, mas haveria um fundo espiritualista – espe-
cialmente no interior do país, não contaminado pelas idéias estrangei-
ras – que um movimento renovador poderia captar. Esse movimento
seria o integralismo.
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Nessa perspectiva, Plínio Salgado propunha a defesa da nacionalidade,


a ordem, a disciplina, a organização corporativa e hierárquica dos bra-
sileiros em um Estado integral, como forma de garantir a prosperidade
geral e o retorno a um estado de espiritualidade. Este geraria a gande
civilização integralista, de repercussões mundiais (BERTONHA, 2004,
p. 64).

Fonte: Beier (online).

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

A ideologia oposta ao modelo defendido pela AIB era representada pela


Aliança Nacional Libertadora (ANL), que era uma extensão do Partido
Comunista Brasileiro (PCB), fundado em 1922. A ANL foi criada em 1935 e
seu líder era Luiz Carlos Prestes, a quem Getúlio Vargas havia oferecido, anos
antes, o comando militar da Revolução de 1930 (SKIDMORE, 2003, p. 158).
Luiz Carlos Prestes vivia em Moscou, onde viveu intensamente o comunismo,
retornando ao Brasil clandestinamente em 1935, com o objetivo de promover
a revolução comunista no Brasil e instalar um governo baseado nas ideias da
Internacional Comunista.

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A proposta de governo defendida pelos membros da ANL – dentre os quais
estavam os “comunistas, socialistas, os ‘tenentes liberais e católicos’” (RECCO,
2010, p. 68) – baseava-se na organização dos trabalhadores urbanos como forma
de ação revolucionária para instalar um governo democrático e nacionalista. Suas
principais propostas consistiam na suspensão do pagamento da dívida externa,
no combate ao nazi-fascismo, na reforma agrária, na nacionalização das empre-
sas estrangeiras, na garantia das liberdades populares e na constituição de um
governo popular (FAUSTO, 1995, p. 359).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


179

A história da Internacional Comunista remonta a 1864, quando foi criada a


Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), integrada por organiza-
ções operárias de diversos países europeus. O mentor e principal líder da
AIT era Karl Marx. A repressão e as crescentes divergências internas enfra-
queceram a organização, que acabou sendo extinta em 1876. Treze anos
depois, em 1889, foi criada em Paris a II Internacional dos Trabalhadores.
Sua direção seguia a doutrina marxista, mas encontravam-se presentes em
seu interior diferentes correntes do movimento operário. Até a eclosão da
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Primeira Guerra Mundial em 1914, a luta contra a guerra foi uma das prin-
cipais bandeiras da Internacional. Com o desenrolar do conflito, entretanto,
as divergências vieram à tona e terminaram por enfraquecer a unidade da
associação. Em 1919, logo após a vitória dos comunistas na Revolução Rus-
sa, foi criada a III Internacional, ou Internacional Comunista, ou ainda Ko-
mintern. Seu principal objetivo era criar uma União Mundial de Repúblicas
Socialistas Soviéticas.
Fonte: Internacional Comunista (online).

A ANL fundamentava sua ideologia na organização dos trabalhadores urba-


nos, mas na década de 1930 o Brasil ainda era um país agrário e os operá-
rios brasileiros ainda não possuíam uma consciência de classe desenvolvida
como os operários europeus comunistas.
Fonte: a autora.

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

As divergências ideológicas entre a AIB e a ANL contribuíram para o aumento


da tensão política do Brasil na década de 1930. A organização da ANL em torno
dos operários gerou desconfiança e medo na sociedade, que temia uma revolu-
ção e um novo golpe que colocasse o país nas mãos dos comunistas.
Diante do avanço das ideias comunistas no Brasil, em 1935 foi aprovada a Lei
de Segurança Nacional e a ANL foi considerada ilegal. Mesmo com a pressão
do Congresso, a ANL continuou desenvolvendo suas atividades na clandestini-
dade até que, após uma tentativa de instaurar um golpe em novembro de 1935
e derrubar o governo Vargas, a organização foi vencida pelas forças do governo

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federal e acabou, por fim, desarticulada.

Rebeldes do 3º RI a caminho do presídio da Ilha Grande, 1935. (Rio de Janeiro). (CPDOC/ CDA Vargas)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


181

A Ação Integralista Brasileira teve uma vida mais longa, sendo extinta apenas
em 1938 após uma tentativa frustrada de golpe de Estado, no qual os membros da
AIB atacaram o palácio presidencial no Rio de Janeiro, acreditando que teriam
o apoio da população civil e do Exército. No entanto, o Exército manteve-se fiel
a Getúlio Vargas e a organização integralista foi formalmente eliminada por
Vargas (BERTONHA, 2004, p. 63).
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Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

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Carta de presos comunistas a Getúlio Vargas em apoio ao esmagamento da intentona integralista


ocorrida na capital federal no dia 11 de maio, 1938. Rio de Janeiro (RJ). (CPDOC/ GV 1938.05.13)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A partir da atuação da AIB e da ANL no cenário político do Brasil, Getúlio


Vargas aproveitou-se do fato de o Congresso ter se afastado das decisões polí-
ticas e tentou retomar o modelo de governo centralizador dos seus primeiros
anos à frente do país.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


183

A ELABORAÇÃO DO GOLPE DE 1937

A Constituição de 1934 previa que as eleições presidenciais marcadas para 1938


ocorreriam por meio do voto secreto e direto. Dessa foram, já em fins de 1936
os interessados em concorrer ao pleito começaram a se organizar para desen-
volver suas respectivas campanhas.
Os candidatos que concorreriam às eleições de 1938 eram Armando de Salles
Oliveira, que concorreria pelo Partido Constitucionalista, Plínio Salgado, can-
didato pela Ação Integralista – convertida em partido político em 1936 – e José
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Américo de Almeida, que era o candidato oficial de Getúlio Vargas (RECCO,


2010, p. 69).
O cenário imposto pelo avanço das ideias comunistas no Brasil, por meio da
ação das forças integralistas, permitiu que Getúlio Vargas manipulasse o medo
da sociedade da instalação de um governo comunista a fim de adotar medidas
repressivas que o ajudariam a reforçar o seu poder como chefe do Estado brasi-
leiro. Após um levante coordenado pelo PCB que atacou Natal, Recife e o Rio de
Janeiro em 1935, Getúlio Vargas, com a desculpa de combater a ameaça comu-
nista no Brasil e com o apoio do Congresso, decretou estado de emergência e
suspendeu os direitos civis estabelecidos pela Constituição de 1934.
Conforme destaca Lira Neto, após os levantes comunistas de 1935,
(...) Getúlio continuou abraçando a tese oficialesca de que os legalistas
foram eliminados de forma torpe, enquanto dormiam. “A reação do es-
pírito público contra os rebeldes e as crueldades praticadas está a exigir
um castigo exemplar”, registrou em seu diário. “A Constituição, porém,
não permite várias medidas aconselhadas. Só suspendendo parcial-
mente os efeitos da própria Constituição”. Aquelas anotações, tomadas
no calor da hora, eram apenas o prenúncio do ciclone político e institu-
cional que muito em breve assolaria o país (NETO, 2013, p. 204).

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

Esse contexto de agitação tomou conta do Brasil e, entre 1936 e 1937, determinou
os rumos da conjuntura política brasileira. Com o decreto de estado de emer-
gência, Getúlio Vargas iniciou uma caça a seus inimigos, lotando as delegacias
e cadeias do país com indivíduos acusados de compactuar com o comunismo
e contra o governo. Com a intenção de anular as eleições previstas para janeiro
de 1938 e continuar no cargo de presidente, Getúlio Vargas elaborou um plano
que lhe garantiu a permanência no poder.
O chamado Plano Cohen serviu de pretexto para que Getúlio Vargas colo-
casse em prática o golpe de Estado que permitiria que ele continuasse como

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presidente do Brasil. De acordo com a historiografia, em 1937 foi apresentado
ao presidente um plano elaborado pela Ação Integralista Brasileira, o qual esta-
belecia a
(...) mobilização dos trabalhadores para a realização de uma greve ge-
ral, o incêndio de prédios públicos, a promoção de manifestações po-
pulares que terminariam em saques e depredações e até a eliminação
física das autoridades civis e militares que se opusessem à insurreição
(RECCO, 2010, p. 70).

Hoje é sabido que esse plano foi uma farsa criada por Getúlio Vargas para legiti-
mar suas ações centralizadoras e ditatoriais, mas em 1937, quando o presidente
do Brasil divulgou por meio de uma transmissão de rádio a existência de um
plano comunista à população, a veracidade do documento não foi questionada.
Com a divulgação do Plano Cohen, Getúlio convenceu o Congresso a decre-
tar o estado de guerra, o que garantia ao presidente em exercício a suspensão da
Constituição por noventa dias. Com plenos poderes em mãos, Vargas suspen-
deu as eleições de 1938 e dissolveu a Câmara dos Deputados e o Senado. Em 10
de novembro de 1937, decretou que o Brasil entrava em uma nova fase política.
Tinha início o Estado Novo (FAUSTO, 1995, p. 364).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


185
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Trecho do diário manuscrito de Getúlio Vargas, 07/11/1937. (CPDOC/ GV remsup 30-10-03 vol.16)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Os Primeiros Anos do Governo de Getúlio Vargas (1930-1937)


IV

A DITADURA DE VARGAS: O ESTADO NOVO


(1937-1945)

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Constituição de 1937
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Ao decretar o Estado Novo, Getúlio apresentou à população brasileira uma nova


Constituição que tinha caráter autoritário e ditatorial, inspirada nas Constituições
dos regimes ditatoriais em voga na Europa e que concedia ao presidente pode-
res ilimitados no comando do país. As instituições do Poder Legislativo foram
dissolvidas e o estado de emergência foi declarado em todo o país por tempo
indeterminado, o que significava a suspensão dos direitos civis e a possibilidade
do presidente governar por meio de decretos-leis até que fossem realizados um
Plebiscito para legitimar a nova Constituição e as novas eleições para a Assembleia
Legislativa. O plebiscito e as eleições nunca aconteceram (FAUSTO, 1995, p. 365).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


187

O Estado Novo foi instaurado no Brasil ao mesmo tempo em que uma onda
de transformações varria a Europa, instalando governos autoritários e refor-
çando a versão de que a democracia liberal estava definitivamente liquida-
da. Mussolini chegou ao poder na Itália em 1922 e aí implantou o fascismo;
Salazar se tornou primeiro-ministro (presidente do Conselho de Ministros)
de Portugal em 1932 e inaugurou uma longa ditadura; Hitler foi feito chan-
celer na Alemanha em 1933 e tornou-se o chefe supremo do nazismo. A
guerra civil espanhola, que se estendeu de 1936 a 1939, banhou de sangue
a Espanha antes que Franco começasse a governar o país com mão de ferro.
Fonte: Estado Novo e Facismo (online).
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Nesse período inicial do Estado Novo, Vargas conseguiu controlar a oposi-


ção de seus inimigos por meio da intensificação da censura – levada a cabo pelo
DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) –, da perseguição e da prisão
de seus inimigos. Desde o levante organizado pela ANL em 1935, Getúlio ado-
tou uma postura de perseguição aos seus inimigos que, de acordo com Neto
(2003), eram presos e torturados nos porões das delegacias. O autor relata que,
a partir de 1935,
Estava dada a senha para uma campanha sistemática de prisões arbitrá-
rias e de perseguição a jornalistas, professores e intelectuais. Entre os
prisioneiros do regime, logo se incluiria o nome do escritor Graciliano
Ramos, que legou à posteridade um eloquente testemunho do obscu-
rantismo político em que então vivia o país, nos dois volumes de seu
já clássico Memórias do cárcere. “Começamos oprimidos pela sintaxe
e acabamos às voltas com a Delegacia de Ordem Política e Social”, de-
plorou Graciliano.

A médica Nise da Silveira, uma das pioneiras no tratamento humani-


tário de esquizofrênicos e de outros pacientes com distúrbios psiqui-
átricos no país, também foi mandada para a cadeia, denunciada por
participar da União Feminina do Brasil e por possuir livros marxistas
em sua biblioteca particular. O escritor Jorge Amado, que havia lan-
çado seu quarto romance, Jubiabá, foi outro a ser preso. O professor e
pedagogo Anísio Teixeira, um dos maiores nomes da história da edu-
cação no país, terminou afastado do cargo de secretário de Educação e
Cultura do Distrito Federal por suspeita de ligação com os comunistas.
O cronista Rubem Braga, para continuar a sobreviver como jornalista,
recorreu a pseudônimos, disfarces e esconderijos na casa de amigos e
parentes (RECCO, 2013, p. 209).

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

A ideologia defendida por Getúlio Vargas e seus aliados durante o Estado


Novo tinha por base a superação das práticas liberais, uma vez que as turbu-
lências econômicas vividas pelo país desde o fim da década de 1920 e início da
década de 1930 foram causadas por esse sistema político e econômico, o qual
cabia agora ao presidente combater. A partir de 1937, Getúlio poderia concluir
o projeto político que tinha em mente para o Brasil e que começou a implantar
após o golpe de 1930, mas que foi interrompido pela promulgação da Constituição
de 1934, que tinha um caráter liberal.
Os países europeus que viviam sob a égide dos regimes totalitários viram

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com bons olhos a instituição do Estado Novo no Brasil, de acordo com Neto,
Na Alemanha, a imprensa nazista saudou Getúlio e dedicou generosos
espaços ao assunto, traçando perfis simpáticos do presidente brasileiro,
ilustrados com fotografias fornecidas pelo serviço diplomático. (...). O
ministro italiano do Exterior, Galeazzo Ciano, genro de Mussolini, fi-
cou tão entusiasmado com as notícias recebidas da embaixada de seu
país no Rio de Janeiro que imaginou a adesão imediata do governo bra-
sileiro ao Pacto Anti-Komintern, selado originalmente no final de 1936
entre Japão e Alemanha — e, naquele final de 1937, também referen-
dado pela Itália, dando origem ao grupo de nações que ficaria conheci-
do como as Potências do Eixo. (...). De Washington, Oswaldo Aranha
escreveu telegrama confidencial a Getúlio para lastimar os rumos que
o governo havia tomado e, por consequência, para informar sua re-
núncia ao cargo de embaixador nos Estados Unidos. Uma entrevista
concedida por Francisco Campos a jornalistas estrangeiros, publicada
pelo New York Times, constrangera Oswaldo. Entre outros pontos, o
ministro da Justiça sugerira aos correspondentes internacionais que a
“ignorância do povo brasileiro” era o principal impeditivo à prática da
democracia no país teria sido plasmada em moldes intervencionistas e,
portanto, autoritários (NETO, 2013, p. 258).

O Estado Novo caracterizou-se pelo corporativismo e o intervencionismo estatal


– justificado pelo entendimento de que apenas o Estado seria capaz de manter
a união do país e estabelecer a ordem e o desenvolvimento da sociedade –, pelo
alto investimento na industrialização do país, simbolizando a aproximação entre
o governo central e a burguesia industrial, além da aliança com o Exército como
forma de garantir a estabilidade social e o controle da oposição (FAUSTO, 1995).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


189

O nacionalismo também seria marcante no regime do Estado Novo. Entre


1937 e 1940 Getúlio Vargas criou uma série de decretos que regulamentavam
a vida dos brasileiros sob o novo regime e estabelecia as novas diretrizes sob as
quais deveriam assentar-se o trabalho e a participação social dos estrangeiros no
Brasil. Não obstante, foi também por meio da promulgação de um decreto-lei em
1937 que Getúlio determinou a extinção dos partidos políticos, demonstrando
que não admitiria oposição ou mesmo a intenção de promover um retorno à
democracia.
Embora o caráter ditatorial da fase do governo Vargas denominada de Estado
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Novo tenha representado um golpe na democracia brasileira – que, ao nosso


entender não havia até aquele momento existido em sua plenitude – é inegável
o avanço promovido no aspecto econômico. O fortalecimento do setor indus-
trial e a passagem de uma economia essencialmente agrária para uma economia
pautada no desenvolvimento industrial possibilitaram o crescimento e a valori-
zação de outros setores, como foi o caso, por exemplo, da educação, visto que,
durante o Estado Novo, foram criadas instituições com o fim de qualificar a
mão de obra para o setor industrial, como o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (SENAI).
Para garantir o desenvolvimento da indústria brasileira, Vargas levantou a
bandeira do nacionalismo, pressionando as indústrias estrangeiras que haviam
no país a se tornarem nacionais e investiu no desenvolvimento da indústria de
base, que conquistou um avanço considerável com a criação da Usina de Volta
Redonda em 1940 e os primeiros encaminhamentos para a fundação da Petrobrás,
que foi criada apenas no segundo governo de Vargas (1950-1954).
Os avanços alcançados pelo setor industrial no Estado Novo – sobretudo
no que diz respeito à indústria siderúrgica, considerada essencial para o desen-
volvimento do país – contribuiu para o aumento da massa trabalhadora, que
no regime do Estado Novo mereceu uma atenção especial de Getúlio Vargas.
Nesse período, Vargas adotou uma política trabalhista voltada para o bem-estar
do trabalhador, que aproximou o presidente da classe trabalhadora e permi-
tiu o controle e a manipulação desse setor da sociedade brasileira, em favor do
regime autoritário.

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

Ângela de Castro Gomes defende a ideia de que a crise econômica enfrentada


pelo Brasil desde o início da década de 1930 mostrou a necessidade de proteger
e promover o bem-estar do trabalhador, uma vez que dependia desse bem-es-
tar para a reestruturação econômica e social do país. De acordo com a autora,
Os anos 30 inauguraram-se sob esse legado, e as medidas que então se
implementam são bem uma demonstração da intensidade e atualidade
do problema que se enfrentava. É a partir desse momento, demarcado
pela Revolução de 30, que podemos identificar de forma incisiva toda
uma política de ordenação do mercado de trabalho, materializada na
legislação trabalhista, previdenciária, sindical e também na instituição

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da Justiça do Trabalho. É a partir daí que podemos igualmente detectar
— em especial durante o Estado Novo (1937-45) — toda uma estra-
tégia político-ideológica de combate à “pobreza”, que estaria centrada
justamente na promoção do valor do trabalho. O meio por excelên-
cia de superação dos graves problemas sócioeconômicos do país, cujas
causas mais profundas radicavam-se no abandono da população, seria
justamente o de assegurar a essa população uma forma digna de vida.
Promover o homem brasileiro, defender o desenvolvimento econômico
e a paz social do país eram objetivos que se unificavam em uma mesma
e grande meta: transformar o homem em cidadão/trabalhador, respon-
sável por sua riqueza individual e também pela riqueza do conjunto da
nação (GOMES, 1999, p. 55).

A análise proposta pela autora citada permite uma ampliação da compreensão


da legislação trabalhista criada por Vargas, na qual as teorias tradicionais enfa-
tizam o seu caráter manipulador, demonstrado por meio da adoção de medidas
que visavam à valorização do trabalho e do trabalhador e ao controle das ati-
vidades sindicais, com o objetivo – não declarado – de evitar conspirações e
agitações sociais que pudessem perturbar seu governo. Dentre essas medidas,
estavam a regulamentação do salário mínimo, da jornada de trabalho e das férias
remuneradas, medidas organizadas a partir da criação da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT) em 1943. A legislação trabalhista e a política trabalhista de
Vargas, de maneira geral, inauguraram a fase do populismo no Brasil.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


191
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Consolidação das leis do trabalho


Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A instauração do Estado Novo permitiu a Vargas levar adiante e sistematizar,


à sua maneira, a política social iniciada no começo da década de 1930. Re-
tiraram-se de cena as forças político-sociais que nos anos que antecederam
o golpe de 1937 lutavam no Congresso e nos sindicatos contra a tutela do
Ministério do Trabalho e seu projeto de unidade sindical. Novas leis foram
editadas, com o objetivo de consolidar no país uma estrutura sindical base-
ada no corporativismo. Fortaleceu-se enfim o Ministério do Trabalho, que,
com o decorrer do tempo, se transformou em um órgão político estratégico
para a construção da imagem de Vargas como o “pai dos pobres”, amigo e
protetor dos trabalhadores.
Fonte: Diretrizes do Estado Novo (1937 - 1945) > Direitos sociais e trabalhis-
tas (online).

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

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Manifestação de apoio às medidas trabalhistas de Getúlio Vargas
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL


(1939-1945)

Desde o início de seu governo em 1930, Getúlio Vargas procurou estabe-


lecer relações comerciais tanto com os Estados Unidos – sobretudo após a sua
recuperação econômica depois da crise de 1929 – quanto com países europeus,
como a Alemanha, a qual entendeu o golpe de 1937 e a instalação do Estado
Novo como algo positivo no cenário brasileiro e procurou estreitar os laços
comerciais com o país. Para o Brasil, a consolidação dos acordos comerciais era
determinada pelos tipos de vantagens que o país poderia obter com a negocia-
ção. Dessa forma, ora o Brasil aproximava-se dos Estados Unidos, ora estreitava
os laços com a Alemanha.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


193

Essa característica da política externa brasileira manteve-se até a eclosão da


Segunda Guerra Mundial em 1939. A partir da emergência do conflito, Getúlio
buscou o fortalecimento das relações comerciais com os Estados Unidos, uma
vez que o poderio econômico norte-americano mostrou-se mais vantajoso aos
interesses de Vargas e às necessidades do país. Conforme relata Lira Neto,
Com o objetivo de ganhar de vez o Catete para a causa aliada, os Es-
tados Unidos ultimaram um generoso pacote de concessões econômi-
cas e militares ao Brasil, discutidas pelos dois países em uma comissão
mista de trabalho. Além do empréstimo destinado ao projeto side-
rúrgico, Roosevelt prometeu ampliar a compra de algodão nacional,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

estabelecer cotas favoráveis para o café brasileiro no mercado norte-


-americano e importar ao país toneladas de minérios considerados
estratégicos em tempos de guerra, como manganês, níquel, bauxita e
cromo. Por intermédio do chamado Lend-Lease Act — programa de
ajuda de fornecimento de armas e suprimentos bélicos para as nações
aliadas —, Washington se comprometia ainda a remeter nada menos de
100 milhões de dólares em equipamentos bélicos para o Brasil (NETO,
2013, p. 318).

Diante do alto investimento no Brasil e do cenário desenvolvido após a entrada


das forças norte-americanas no conflito em 1941, Vargas aderiu ao discurso
defendido pelos Estados Unidos de promover a defesa das Américas a partir da
liderança estadunidense e se empenhou em desenvolver estratégias de apoio aos
Aliados (FAUSTO, 1995).
A declaração de guerra do Brasil às forças do Eixo aconteceu em 1942 após
cinco navios brasileiros serem afundados por submarinos alemães. A partir de
então, o Brasil passou a colaborar mais ativamente com os Aliados e em 1944
os soldados da Força Expedicionária Brasileira (FEB) foram enviados para lutar
contra o Eixo, liderados pelo general Mascarenhas de Moraes (JAMBEIRO,
2004, p. 101).

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Unidades do 2° Escalão da FEB desembarcam na Itália. Nápoles, 1944. (CPDOC/ HB foto 062/18)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Estados


Unidos e dos Aliados contribuiu para o crescimento da oposição à ditadura de
Getúlio na medida em que colocou em xeque a contradição entre seu sistema
de governo baseado nas influências fascistas e o apoio às nações cujos modelos
de governo assentavam-se na democracia.
Segundo Thomas Skidmore,
O ingresso do Brasil na guerra tinha uma importante implicação para
a política interna. A decisão de unir-se às democracias era um golpe
contra os autoritaristas que alegavam que a democracia não tinha lugar
no Brasil, e supunham que Getúlio concordava com eles. Este e seus
generais, ao questionarem essa suposição, estavam montando o cená-
rio para um debate que iria terminar com o fim da ditadura getulista
(SKIDMORE, 2003, p, 171).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


195

O Estado Novo parece ter nascido, vivido e morrido sob a égide das trans-
formações mundiais. Se o florescimento de regimes autoritários na Europa
encorajou o presidente Vargas a instaurar no país um regime político auto-
ritário, esse mesmo regime conheceu o apogeu e a queda sob a influência
da Segunda Guerra.
Fonte: Fatos & Imagens > Estado Novo (online)

O FIM DO ESTADO NOVO


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Ao decretar o início do Estado Novo em 1937, Getúlio havia prometido realizar


novas eleições presidenciais em 1943. Porém, sob o pretexto dos desdobramen-
tos dos acontecimentos internacionais, Vargas alegou que não seria possível a
realização das eleições antes do fim da guerra, devido à instabilidade e às incer-
tezas que o processo eleitoral traria para o país, afetando, consequentemente,
as relações internacionais do país naquele momento (SKIDMORE, 2003, 174).
Com essa medida, os opositores ao Estado Novo entenderam que Getúlio
não estava disposto a deixar o cargo de presidente. Conforme aponta Neto,
Para um herdeiro da tradição castilhista-borgista do Rio Grande do
Sul, não havia dúvida de que o voto continuava sendo um ritual ques-
tionável, se aplicado ao contexto brasileiro. A justificativa de que éra-
mos um país socialmente imaturo, e que o povo precisava ser educado
o suficiente para só depois conseguir a efetiva emancipação, continuava
a servir de discurso legitimador ao regime (NETO, 2013, p. 323).

As críticas crescentes ao Estado Novo partiam de diversos setores, conforme des-


taca Othon Jambeiro (2004). Em 1943 um grupo de intelectuais e de profissionais
liberais de Minas Gerais lançaram o Manifesto Mineiro, no qual enfatizavam a
luta do governo brasileiro contra os regimes autoritários na Europa ao mesmo
tempo em que procurava perpetuar a ditadura no Brasil. Com isso, defendiam
o fim do Estado Novo e a redemocratização do país (RECCO, 2010, p. 74).
Além da elite mineira, São Paulo também representava um foco de oposição
ao governo de Getúlio Vargas, mesmo sendo esse Estado um dos maiores bene-
ficiados com os investimentos no setor industrial promovidos durante o Estado
Novo. De acordo com Lira Neto,

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

A unidade federativa que mais viria a se beneficiar com a política de in-


dustrialização inaugurada pelo Estado Novo mantinha uma atitude de
desconfiança permanente em relação ao governo. Desafiando a rigidez
da censura, o jornal O Estado de S. Paulo se tornara um dos únicos por-
ta-vozes da oposição. Fato que levou o diretor Júlio de Mesquita Filho
a ser preso catorze vezes em dois anos, antes de seguir para o exílio na
França (NETO, 2013, p. 320).

Bóris Fausto (1995, p. 383) enfatiza que afora os movimentos pela redemocrati-
zação do país que partiram de setores da sociedade brasileira, a desarticulação
no interior do próprio governo foi fundamental para a crise do governo getu-

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lista e para o seu consequente fim. Oswaldo Aranha, ministro das Relações
Interiores no Estado Novo foi a figura mais empenhada em reestabelecer as
liberdades democráticas no país. Góis Monteiro, um dos principais aliados de
Getúlio Vargas desde o golpe de 1930, também abandonou o governo quando
percebeu que Getúlio não conseguiria manter o regime por muito mais tempo.

A situação política se tornou cada vez mais tensa e os jornais oposicionis-


tas mais ferrenhos, como o Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, a Folha da
Manhã, de São Paulo, e os Diários Associados, de Chateaubriand, se constitu-
íram em porta-vozes dos anseios populares contra o Estado Novo. O golpe
decisivo foi desferido pelo Correio da Manhã, no dia 22 de fevereiro de 1945:
ao publicar entrevista de José Américo de Almeida ao jornalista Carlos La-
cerda, reivindicando democracia plena, desencadeou o processo de derro-
cada do Estado Novo.
Fonte: Jambeiro (2004, p. 103).

Diante dessa oposição, a qual o DIP não mais conseguia reprimir, em 1945
Vargas adotou medidas que significaram os primeiros passos rumo à redemo-
cratização, como a promulgação do Ato Adicional à Constituição de 1937, que
previa a convocação de novas eleições num prazo de noventa dias, liberdade de
associação, consistia em anistia aos presos políticos (JAMBEIRO, 2004, p. 103).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


197

Com a liberdade de associação restabelecida, os diversos setores da socie-


dade organizaram-se visando as eleições presidenciais. A União Democrática
Nacional (UDN) reunia os liberais contrários a Vargas representantes da classe
média e alta e também membros do Exército. A UDN lançou a candidatura de
Eduardo Gomes à presidente. O Partido Social Democrático (PSD) também se
formou nesse período e contava com antigos aliados de Getúlio Vargas, que apoia-
vam a candidatura do general Eurico Gaspar Dutra. Outro partido criado nesse
momento com vistas às eleições de dezembro de 1945 foi o Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB) cujos membros pertenciam aos sindicatos financiados e con-
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trolados por Vargas. Esses também defendiam a candidatura de Dutra.


O Partido Comunista Brasileiro que, mesmo na ilegalidade continuou sua
atuação durante todo o período do governo Vargas, diante dos acontecimentos
nacionais internacionais, divulgou seu apoio a Getúlio Vargas, em uma manobra
surpreendente – e influenciada por Luiz Carlos Prestes em acordo com as dire-
trizes comunistas elaboradas em Moscou – diante da história da relação entre
o presidente e o partido.
O PCB apoiou e instigou a parte da população que defendia a continuidade
de Getúlio Vargas no poder, embora com a convocação de uma Assembleia
Nacional Constituinte. Esse movimento popular apoiado pelo PCB ficou conhe-
cido com Querenismo devido ao grito de ordem do movimento “queremos
Getúlio!”. Segundo Neto,
Por volta de oito horas da noite, a vaga humana que se formou no largo
da Carioca, no centro do Rio, resolveu seguir em direção à rua Senador
Dantas, a caminho da Glória. O número de manifestantes era tão gi-
gantesco que, quando os primeiros começaram a tomar conta da praça
Paris, quase dois quilômetros adiante, ainda havia centenas de pessoas
assumindo lugar na cauda da passeata, no local original da concen-
tração. A caravana ganhou volume ainda mais impressionante ao en-
contrar outro contingente que descia a rua da Lapa, caminhando em
idêntico sentido. Comprimidos em um bloco compacto, os dois grupos
rumaram então pela rua do Catete, rumo à sede do governo. Nos es-
tandartes, bandeiras, faixas e cartazes, uma frase se destacava entre as
demais: “Queremos Getúlio!”.

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

Ao tomar conhecimento de que o presidente estava no Guanabara, a


multidão rumou para as Laranjeiras, tomando caminho pela rua Pais-
sandu. Minutos depois, o mar de gente se concentrou na rua Pinheiro
Machado, até que os portões do palácio fossem abertos de par em par.
Os jardins ficaram tomados pela aglomeração em questão de segundos.
Passava pouco das nove da noite quando Getúlio Vargas apareceu nas
escadarias, acenando para o público. De todos os lados pipocaram vi-
vas e aplausos.

Que-re-mos Ge-tú-lio! Que-re-mos Ge-tú-lio! Que-re-mos Ge-tú-lio!”,


ouvia-se, em ritmo cadenciado. (...).

As folhinhas com o retrato oficial do presidente, distribuídas pelo DIP,

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indicavam a data de 30 de agosto de 1945. Não era a primeira vez, nem
seria a última, que multidões ganhariam as ruas do Rio de Janeiro em
eventos semelhantes, para exigir a permanência de Getúlio Vargas no
Catete. A palavra de ordem “Queremos Getúlio” deu origem ao apelido
do movimento que logo se espalhou como uma catapora política pelo
país: “queremismo” (NETO, 2013,p. 387).

Queremistas recebidos por Vargas no Palácio Guanabara, 1945. Rio de Janeiro (RJ). (CPDOC/ CDA
Vargas)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


199

O movimento queremista preocupou as oposições do Estado Novo, que


temiam um novo golpe de Getúlio Vargas para manter-se no poder, preocupação
que se acentuou quando da publicação de um decreto que estabelecia as eleições
estaduais e municipais para o mesmo dia das eleições presidenciais. A altera-
ção na data das eleições estaduais e municipais representava para os opositores
de Getúlio uma tentativa de manipular o pleito e garantir a sua permanência no
poder. (JAMBEIRO, 2004, p. 104). Assim, crescia a desconfiança em torno das
intenções de Getúlio Vargas.
O clima de desconfiança ganhou força quando Vargas nomeou seu irmão
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Benjamim Vargas para o cargo de chefe de Polícia do Distrito Federal, gerando


boatos de que ele pretendia prender todos os que se opunham ao regime var-
guista. A nomeação de Benjamim Vargas foi o motivo que a oposição esperava
para depor o presidente Getúlio Vargas. O general Góis Monteiro, antigo aliado
de Getúlio Vargas, exigiu a revogação da nomeação de Benjamim Vargas, o que
Getúlio se recusou a fazer.
Diante da recusa de
Getúlio Vargas de revogar
a nomeação de seu irmão a
chefe de Polícia do Distrito
Federal, Góis Monteiro,
apoiado por Eurico Gaspar
Dutra e por mais uma par-
cela do Exército, decidiram
impor a renúncia ao presi-
dente da República.
Bustos de Getúlio Vargas sendo retirados das ruas, 1945. (CPDOC/
GV foto 148)
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

A Ditadura de Vargas: O Estado Novo (1937-1945)


IV

Às nove da noite, Cordeiro de Farias chegou ao Guanabara como


representante dos generais, acompanhado de Agamenon Magalhães,
que finalmente pudera sair do Ministério da Guerra. Não havia mais
perigo de reação. O Exército já providenciara a mudança de guarda,
e a segurança do palácio estava submetida a forças favoráveis ao
golpe. Uma unidade motorizada, sob o comando do tenente-coronel
Ulhôa Cintra, ocupara os jardins. Tanques de guerra apontavam as
armas para o edifício. O único oficial leal ao governo e em condições
de oferecer alguma espécie de resistência armada em todo o Rio de
Janeiro, o general Renato Paquet, comandante da Vila Militar, recebera
um telefonema do colega Firmo Freire, chefe do Gabinete Militar da
Presidência da República, com um recado categórico.

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“Paquet, o Dr. Getúlio manda dizer que não quer nenhuma escaramuça
e que você largue a Vila de mão.”

O general Odílio Denys, comandante da Polícia Militar e admirador do


presidente, recebera as mesmas instruções.

Quando viu Cordeiro subir as escadarias, Bejo cutucou o sobrinho Lu-


tero:

Vamos assistir ao que este sujeito vai dizer ao Getúlio. Se faltar ao res-
peito, não sei o que farei.”

Cordeiro de Farias chegou vestido com uma capa de chuva, apesar de


não haver nenhum indício de nuvem no céu. Mantinha a mão direita
o tempo todo sob a capa, segurando o revólver, que não hesitaria em
usar se necessário. Encontrou Getúlio sentado atrás da escrivaninha.
De pé, em cada um dos cantos da mesa, posicionavam-se Bejo e Lutero.
O general, sempre com uma das mãos oculta, entregou ao presidente
uma minuta da declaração de renúncia, rabiscada de próprio punho
por Góes Monteiro.

Getúlio passou os olhos no papel sem demonstrar maior interesse e o


entregou a Luiz Vergara, para que o secretário tirasse uma cópia datilo-
grafada, em papel timbrado, e depois a trouxesse para ele assinar.

Preferia que os senhores me atacassem, porque eu me defenderia. Mas


já que se trata de um golpe branco, não serei eu o elemento perturba-
dor. Pode dizer a eles que não sou mais presidente”, disse Getúlio, que
pediu o prazo de 48 horas para deixar o Palácio.

Precisava encaixotar seus objetos pessoais e selecionar alguns papéis


particulares antes de ir embora, justificou. Assinou então o termo de
renúncia e nomeou Agamenon Magalhães como seu representante
para se entender com os integrantes do novo governo.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


201

Tinha uma última mensagem para Cordeiro de Farias transmitir a


Góes, Dutra e Eduardo Gomes.

Informe a seus amigos que desejo apenas ir para o Sul. Eles que fiquem
mexendo esse mingau (NETO, 2013, p. 401-402).

Chegava ao fim o Estado Novo e a Era Vargas.


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ENFIM DEMOCRACIA? AS ESPERANÇAS RENOVADAS


E O NOVO GOLPE: INÍCIO DA DITADURA MILITAR NO
BRASIL

O processo eleitoral ocorrido em 2 de dezembro de 1945 foi vencido por Eurico


Gaspar Dutra, candidato do PSD. Dutra e os demais eleitos para o Congresso
tomaram posse em janeiro de 1946 e a primeira missão dos novos representan-
tes do Brasil era elaborar uma nova Constituição para o país, para substituir a
Constituição de caráter autoritário vigente no período do Estado Novo.
A nova Carta Constitucional
ficou pronta em 18 de setembro
de 1946 e sua principal caracte-
rística era a ênfase na defesa das
liberdades civis e políticas e na
democracia. Dentre outros pontos,
a Constituição de 1946 estabele-
cia “uma rotina democrática para
as instituições republicanas, com
eleições diretas para os postos do
governo no âmbito do Executivo
e do Legislativo e nas três esfe-
ras da federação – União, estados
Presidente Castello Branco
e municípios” (SCHWARCZ; Fonte: 50 anos... (online).
STARLING, 2015, p. 396).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

A nova organização política do Brasil, após o fim da Era Vargas em 1945,


inseriu-se no contexto de reorganização mundial pós Segunda Guerra Mundial.
Ao fim do conflito em 1945, o cenário político internacional encontrava-se divi-
dido em dois blocos ideológicos distintos. De um lado, liderados pelos Estados
Unidos, encontravam-se os países estruturados sobre a égide do liberalismo e
do capitalismo. Do outro, sob a liderança da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas estavam os países cujo comunismo e socialismo determinavam as
diretrizes de organização da sociedade.
O Brasil estava ao lado dos Estados Unidos e, no governo do presidente Dutra,

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os comunistas não puderam desenvolver suas atividades com liberdade. Após
uma declaração de Luiz Carlos Prestes de que o Partido Comunista Brasileiro
ficaria ao lado da URSS em um possível confronto entre as duas nações, Dutra
intensificou a perseguição aos comunistas e novamente o Partido Comunista foi
posto na ilegalidade (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 398).
A política econômica do governo Dutra seguia as diretrizes liberais e parecia
submeter-se aos desígnios norte-americanos, com o favorecimento das impor-
tações. De acordo com Bóris Fausto (1995, p. 403), o liberalismo econômico
adotado por Dutra possibilitou o desenvolvimento da produção para o mercado
interno e a industrialização do país. De acordo com o autor, entre 1947 e 1950,
o PIB brasileiro cresceu 8%.

Em 1948 Eurico Gaspar Dutra lançou o Plano Salte, cuja sigla era formada
pelas iniciais dos setores que seriam beneficiados pelas novas medidas eco-
nômicas do seu governo: Saúde, Alimentação, Transporte e Energia, e que
representou uma tentativa do governo em resolver os problemas oriundos
do aumento das importações.
Fonte: adaptado de Schwarcz e Starling (2015).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


203

O desenvolvimento da indústria e o crescimento do PIB apontados por Bóris


Fausto não vieram acompanhados do aumento dos salários, o que gerou a insa-
tisfação dos operários e provocou o aumento das greves e das manifestações
contrárias à política econômica de Dutra. As correntes ideológicas representa-
das pelos liberais – que defendiam o encaminhamento político e econômico de
Dutra, baseado na abertura ao capital estrangeiro – e pelos defensores de um
governo nacionalista – entre estes os membros do PCB – levaram as discussões
ao extremo e contribuíram para que a perseguição aos comunistas se intensifi-
casse (JAMBEIRO, 2004).
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Embora a Constituição de 1946 defendesse a liberdade e a democracia, a


caça do presidente Dutra aos comunistas exibia a contradição entre a teoria
presente no texto constitucional e a prática social.
Fonte: a autora.

O SEGUNDO GOVERNO VARGAS

As eleições para escolher o sucessor de Dutra na presidência do Brasil deve-


riam ocorrer em 1949, mas as articulações políticas começaram a desenhar-se
já em 1947. Getúlio Vargas, após deixar a presidência em 1945 foi eleito Senador
e procurou desfrutar de mandado discreto, participando pouco das discussões
políticas do período que se seguiu ao fim do Estado Novo.
A postura pouco evidente de Getúlio Vargas após 1945 não fora resultado
de uma falta de compromisso político ou decepção com os acontecimentos que
marcaram o fim do Estado Novo. Na verdade, Getúlio preparava-se para dispu-
tar novamente as eleições e reassumir o comando do país, dessa vez pelas vias
democráticas. Dessa forma, no período entre 1945 e 1950, Getúlio e seus aliados
buscaram definir as estratégias que conduziriam sua campanha e desenvolver as
estratégias para um novo governo.

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

A política trabalhista adotada por Getúlio nos anos de seu primeiro governo
garantiu o apoio dos trabalhadores. Além deste setor, era necessário conquistar
a confiança de antigos desafetos e daqueles que não se beneficiaram do seu pri-
meiro programa de governo. Além disso, era imprescindível mudar a imagem de
ditador construída ao longo dos anos do Estado Novo e que não cabia na nova
realidade do país ou mesmo do contexto internacional do pós Segunda Guerra.
Para alcançar seu objetivo, Vargas fundamentou seu programa de governo
no desenvolvimento e no bem-estar social. Além disso, firmou acordos e alianças
com nomes importantes no cenário político como Góis Monteiro, o governa-

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dor de São Paulo, Ademar de Barros, Café Filho – que combateu o Estado Novo
e fora membro da ANL – e as lideranças do PSD e do PTB. Conforme aponta
Lilia Schwarcz e Heloisa Starling,
A estratégia de alianças de Vargas tinha um viés imediatista, era arris-
cada, e cobraria dele um preço alto na hora de governar o país, mas a
curto prazo funcionava: sua candidatura não se apresentou identificada
cm um único partido e sim como uma fórmula suprapartidária que
combinava novas e velhas lideranças políticas e regionais, e misturava
os empresários interessados nos benefícios da industrialização com a
força eleitora dos operários, dos trabalhadores e dos setores de baixa
classe média, em expansão nas grandes cidades (SCHWARCZ; STAR-
LING, 2015, p. 400-401).

Com essa rede de apoio construída ao longo dos cinco anos que se manteve afas-
tado do governo central, Getúlio Vargas venceu as eleições disputadas em 03 de
outubro de 1950 com 48,7% dos votos. Dessa forma, Getúlio Vargas voltou a
ocupar a cadeira de presidente da República no Brasil.
O modelo político adotado por Vargas nesse segundo mandato rompia com
o liberalismo e apostava no nacionalismo e no intervencionismo para promover
a industrialização do país e o seu consequente progresso. Com esse programa de
governo em mente, Getúlio montou uma equipe de governo com representantes
dos diversos partidos políticos, a fim de garantir apoio e minar a oposição à sua
eleição. Os que apoiavam o modelo nacionalista e intervencionista de Getúlio
eram chamados de nacionalistas e os que eram contrários a esse modelo foram
chamados de entreguistas (FAUSTO, 1995, p. 407). Essas eram as principais
correntes ideológicas que Vargas precisou conciliar no seu segundo mandato.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


205

Os nacionalistas entendiam que cabia ao Estado regular os investimentos e o


desenvolvimento da economia do país, concentrando-se na ampliação dos seto-
res petrolíferos – haja vista a dependência do Brasil dos produtores estrangeiros
–, de siderurgia, de transporte e de alimentação, visando à autonomia do país
e à limitação da entrada de capitais estrangeiros. Já os entreguistas defendiam
a participação do capital estrangeiro como forma de promover o desenvolvi-
mento econômico, o qual não dependia do avanço industrial, mas sim dessa
aliança entre economia brasileira e capital estrangeiro (FAUSTO, 1995, p. 407).
Fundamentado no nacionalismo, Vargas investiu na industrialização e criou
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a Petrobrás – projeto que tinha desde 1930 e que finalmente pôde concluir em
1954 –, a Eletrobrás – que entrou em funcionamento apenas em 1962 –, o Banco
Nacional do Desenvolvimento (BNDE) e ampliou a capacidade de produção da
Usina Siderúrgica de Volta Redonda (JAMBEIRO, 2004, p. 151).
Segundo Schwarcz e Starling (2015, p. 404), o modelo nacionalista de Getúlio
Vargas entrou em crise já em 1952 motivado tanto pelas questões internas quanto
externas do período. Internamente, as forças políticas que se aliaram a Vargas
nas eleições de 1950 começaram a distanciar-se da figura do presidente e a ado-
tar uma postura oposicionista. Externamente, a retirada do apoio financeiro
norte-americano aos projetos brasileiros e a cobrança vinda do Banco Mundial
pelos empréstimos feitos ao Brasil e já vencidos levou a um descontrole na eco-
nomia brasileira que gerou o aumento da inflação, o aumento do custo de vida
e a redução dos salários.
A partir desse momento, o governo de Vargas passou a enfrentar uma série
de movimentos operários que tinham por objetivo mostrar ao presidente que
o apoio dos trabalhadores estava condicionado à manutenção das condições de
vida e das prerrogativas trabalhistas. Para enfrentar a série de manifestações, de
paralisações e de greves que ocorreram em todo o país naquele momento, Getúlio
nomeou João Goulart como Ministro do Trabalho. A escolha de Jango para o
Ministério do Trabalho intensificou a oposição a Getúlio, visto que a nomeação
foi entendida como uma forma de manipular o movimento operário para justifi-
car a instalação de uma república sindicalista, o que desarticularia o movimento
sindical e o colocaria novamente sob a tutela do Estado.

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

Vargas passou a ser atacado mais efetivamente pela UDN e pela imprensa,
cujo jornalista e deputado federal Carlos Lacerda era a maior expressão. Lacerda
no início dos anos de 1930 era comunista e apoiou a candidatura de Luiz Carlos
Prestes nas eleições para presidente da ANL em 1935. No entanto, ao longo dos
anos passou a combater sua antiga ideologia transformando-se em um grande
opositor do avanço comunista no Brasil (FAUSTO, 1995, p. 414). Lacerda nos
anos de 1950 iniciou uma campanha contra o governo de Vargas e por meio de
seus jornais, o Tribuna da Imprensa, exigia a renúncia do presidente, acusan-
do-o de corrupção e de defender o comunismo.

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À campanha oposicionista da UDN, juntaram-se os oficiais do Exército,
insatisfeitos com a desvalorização representada pela falta de investimentos na
instituição. Ficava cada vez mais evidente para o presidente que as alianças cons-
tituídas para garantir a vitória nas eleições de 1950 não se consolidaram e manter
a estabilidade de seu governo tornava-se uma tarefa cada dia mais difícil.
A crise política do governo de Vargas agravou-se com o atentado ao jorna-
lista Carlos Lacerda em agosto de 1954, no qual morreu o major da Aeronáutica
Rubens Vaz, que estava com Lacerda no momento do atentado. As acusações
sobre o atentado e o assassinato do major recaíram sobre Getúlio, quando o chefe
de sua guarda pessoal foi preso pelo crime (SKIDMORE, 2003).
Esse evento representou o auge da crise do segundo governo de Vargas e
abriu as bases para o afastamento do presidente. A oposição exigia a renún-
cia de Getúlio sob a ameaça de um golpe militar. A resposta de Getúlio veio de
maneira dramática. Na manhã do dia 24 de agosto de 1954, Getúlio Vargas sui-
cidou-se com um tiro no peito. Deixou uma carta na qual culpava seus inimigos
pela situação do país e pela sua morte.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Trecho da 1ª página da carta-testamento


Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

O suicídio de Getúlio fez com que a popu-


lação se comovesse com a sua morte e se
colocasse contrária aos seus inimigos.
Dessa forma, a morte de Getúlio foi um
golpe para os planos de seus opositores,
que não conseguiram derrubar a imagem
deixada pelo presidente após sua morte.

Manchete noticiando a morte de Getúlio Vargas


Fonte: Portal Brasil (online).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

O GOVERNO DE JUSCELINO KUBITSCHEK E A POLÍTICA DOS “50


ANOS EM 5”

Após o suicídio de Getúlio Vargas, o vice-presidente Café Filho assumiu a pre-


sidência com o desafio de amenizar os efeitos da crise acentuada com a morte
de Getúlio. Para isso, contou com o apoio da UDN, de onde saíram os políticos
que compuseram o novo quadro ministerial. Café Filho também assegurou a
realização das eleições presidenciais marcadas para outubro de 1955 (FAUSTO,
1995, p. 418).

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Para a disputa eleitoral de 1955, o PSD e o PTB lançaram a candidatura do
ex-governador de Minas Gerais Juscelino Kubitschek para presidente e do ex-Mi-
nistro do Trabalho João Goulart para vice-presidente. A UDN lançou como
candidato o general Juarez Távora e o PSP apoiou a candidatura de Adhemar de
Barros. Plínio Salgado concorreu à presidência pelo PRP.
As eleições foram vencidas por Juscelino e Jango, o que desagradou a UDN,
que elaborou um golpe para impedir a posse dos candidatos eleitos. Em meio a
esse cenário político conturbado, o presidente Café Filho afastou-se do governo
devido a problemas de saúde e em seu lugar assumiu o presidente da Câmera
dos Deputados, Carlos Luz. O general Henrique Teixeira Lott, Ministro da
Guerra, apoiado pelo Congresso, depôs Carlos Luz da presidência, que ficou sob
o comando do vice-presidente do Senado, Nereu Ramos.
A deposição de Carlos Luz e a ascensão de Nereu Ramos à presidência colo-
cou o país em estado de sítio, situação que impedia Café Filho de retornar ao
posto de presidente da República. Essa manobra política, conhecida como golpe
preventivo, orquestrada pelo general Lott com apoio dos oficiais do Exército,
garantiu a posse dos candidatos eleitos Juscelino Kubitschek e João Goulart.
Juscelino foi eleito com um percentual baixo, se comparado à aprovação
conquistada por Getúlio Vargas no seu segundo governo (49%) e por Eurico
Gaspar Dutra em 1945 (55%). Isso demonstrou que o novo presidente não era
consenso entre a população e que teria que adotar uma postura cautelosa para
superar a desconfiança e enfrentar a forte oposição de seus adversários políticos.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


209

O slogan da campanha política de Juscelino Kubitschek era “50 anos em 5”,


ou seja, sua meta era investir no desenvolvimento econômico para levar o Brasil
progredir 50 anos em apenas 5. Sua meta era audaciosa, visto a evolução econô-
mica do país nos últimos anos, e para alcançá-la ele criou o Plano de Metas, que
visava acelerar o desenvolvimento de vários setores da economia brasileira, por
meio da união do Estado e dos setores privados, que promoveria a aceleração da
industrialização e a construção da infraestrutura para sustentá-la (SKDIMORE,
2003, p. 203).
Segundo Recco (2010, p. 94), o Plano de Metas de Kubitschek “deveria elimi-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nar os principais pontos de estrangulamento do sistema econômico brasileiro”,


possibilitando o avanço dos setores de “energia, transportes, alimentação, indús-
trias de base e educação”. Além disso, o Plano de Metas estabelecia a construção
de uma nova capital para o país e sede do governo central, a cidade de Brasília.

Plano de governo de Juscelino Kubstchek


Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

A intenção de Juscelino era, além de promover o progresso do Brasil, derrotar


a oposição ao seu governo promovendo o crescimento e o desenvolvimento de
todos os setores. Para tanto, criou ou substituiu entidades e instituições públicas
que representavam obstáculos à execução de seus planos. Com esses objetivos,
Juscelino criou a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e
valorizou o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). Além disso, Juscelino
deixou sob a responsabilidade do economista Celso Furtado o desenvolvimento
de um trabalho conjunto entre o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico
(BNDE) e a Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) com a finali-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dade de elaborar as diretrizes do programa de desenvolvimento a ser implantado
no Brasil.

“A expressão nacional-desenvolvimentismo, em vez de nacionalismo, sinte-


tiza pois uma política econômica que tratava de combinar o Estado, a em-
presa privada nacional e o capital estrangeiro para promover o desenvolvi-
mento, com ênfase na industrialização”.
Fonte: FAUSTO (1995, p. 427).

Com seu Plano de Metas, Juscelino conseguiu fazer com que o setor indus-
trial brasileiro crescesse de maneira vertiginosa entre 1956 e 1960. No entanto,
se por um lado esse desenvolvimento, coroado com a inauguração de Brasília
em 1961, obteve resultados satisfatórios, por outro lado esse crescimento indus-
trial também trouxe consequências negativas para o país. Nos cinco anos de
governo JK, a inflação voltou a crescer chegando a 30%, o poder aquisitivo dos
trabalhadores urbanos diminuiu e a concentração fundiária e de rendas agra-
vou a situação dos trabalhadores rurais (RECCO, 2010, p. 95).

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


211

Para conseguir estabilizar a economia e equilibrar os contrastes resulta-


dos do seu Plano de Metas, Juscelino considerou recorrer ao Fundo Monetário
Internacional (FMI), o que gerou grande insatisfação da oposição, que o acu-
sou de subordinar o desenvolvimento do Brasil aos interesses norte-americanos.
Diante da oposição ao acordo entre o Brasil e o FMI e já preocupado com os
rumos da sucessão presidencial, em 1959, Juscelino decidiu romper com o FMI,
mesmo que esse rompimento colocasse em risco a continuidade de seus ideais
desenvolvimentistas. A decisão garantiu a ele o apoio do PTB, da ala esquerda,
do Exército e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FAUSTO,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

1955, p. 435-436).

“Criado em 1946 como agência especializada da ONU, o FMI é constituí-


do por um conjunto de Estados membros que contribuem com uma cota
correspondente a seu potencial econômico. Seus objetivos expressos são
promover a cooperação monetária internacional, a expansão do comércio e
a estabilidade cambial; prestar assistência provisória aos Estados- membros
em dificuldades em seu balanço de pagamentos. Em si mesmo, o FMI não
dispõe de grandes recursos, mas tem papel fundamental como auditor, que
dá sinal verde ao vermelho aos credores públicos e privados no tratamen-
to com os países devedores. O sinal verde significa a possibilidade de que
grandes bancos americanos, europeus e japoneses, assim como seus gover-
nos, concedam a um determinado devedor, novos créditos, novos prazos
de pagamentos de juros e do principal, financiamento para exportações e
importações, etc”.
Fonte: Fausto (1995, p. 434).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

O BREVE GOVERNO DE JÂNIO QUADROS

Juscelino Kubitschek encerrou seu mandato em 1961 e o seu sucessor foi Jânio
Quadros, eleito com o apoio da UDN e com João Goulart novamente como vice-
-presidente. Segundo Lilia Schwarcz e Heloisa Starling, a campanha presidencial
de Jânio Quadros fundamentava-se em
[...] ataques à corrupção, à inflação, à alta do custo de vida, ao desperdí-
cio de dinheiro com as obras monumentais de Brasília, acompanhados
de promessas de crescimento econômico, austeridade pública e conten-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ção de gastos. Jânio jamais explicou de maneira convincente como iria
superar os limites do governo de Kubitschek ou atacar os problemas
fundamentais ao desenvolvimento brasileiro. Sua mensagem era anti-
política. Ele se apresentava como um candidato acima dos partidos,
e expressava profundo desdém pelos políticos tradicionais e por seu
estilo de atuação (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 429).

Com esse discurso, Jânio Quadros conquistou a população e elegeu-se presidente


com 48% dos votos, derrotando seu adversário, o general Lott. Ao assumir a pre-
sidência, tinha o desafio de consolidar as promessas feitas durante a campanha
e conciliar os interesses dos diversos setores e partidos políticos, desafios para
os quais mostrou que não estava preparado.
Jânio iniciou seu mandato criticando publicamente o governo de Juscelino e
responsabilizando-o pela crise econômica, moral e social pela qual o país passava,
irritando, dessa maneira, os parlamentares de oposição e que haviam partici-
pado ativamente dos eventos que marcaram a política econômica do governo
Juscelino (LOUREIRO, 2009, p. 190).
Além da falta de habilidade para lidar com o cenário político e firmar alian-
ças para conseguir colocar em prática seus projetos de governo, Jânio Quadros
teve inabilidade administrativa enquanto esteve no comando da presidência do
Brasil. De acordo com Schwarcz e Starling (2015, p. 431), “Jânio era político de
província. Conhecia mal as lideranças partidárias nacionais, e desdenhou da pos-
sibilidade de montar uma base parlamentar própria, embora seu governo não
tivesse maioria no Congresso”.
Com sua postura política pouco inclinada para a democracia e que enxergava
a Constituição de 1946 um obstáculo para o seu pleno exercício da presidência,

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


213

Jânio entrou em conflito com o Congresso, com setores da sociedade e com o


próprio vice-presidente João Goulart. Todos esses conflitos poderiam ser evita-
dos ou superados se Jânio Quadros abrisse espaço para o diálogo. O que nunca
aconteceu.
Um dos episódios mais polêmicos do governo de Jânio Quadros foi a con-
decoração do ministro da Economia cubana, Ernesto Che Guevara, em agosto
de 1961. Externamente, a condecoração colocou o Brasil na mira dos Estados
Unidos, que suspeitava de uma tendência à aproximação entre o Brasil e Cuba.
Internamente, o gesto de Jânio irritou a UDN e o Exército. Mesmo Carlos Lacerda,
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agora governador da Guanabara e que havia comandado o apoio da UDN à


candidatura de Jânio Quadros, considerou que a atitude do presidente feria os
interesses brasileiros e condenou sua intenção de estabelecer acordos com os
países comunistas (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 433).
Diante da crescente oposição à sua forma de governo e sem condições de
reverter a situação por meio de diálogos e acordos partidários, no dia 25 de agosto
de 1961, o então presidente comunicou aos ministros militares que estava deixando
o comando do país e que eles deveriam organizar uma junta para governar o país.

A CONSTRUÇÃO DO GOLPE DE 1964

Com a renúncia de Jânio Quadros, o vice-presidente João Goulart deveria assumir


a presidência. Jango encontrava-se ausente do Brasil durante esses aconteci-
mentos, pois estava em visita à China, país comunista. Durante sua ausência,
o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzili assumiu provisoria-
mente a presidência.
Por conta do passado político de Jango, ao longo do qual fora construída
a ideia que ele ansiava colocar em prática uma república sindicalista, desde os
tempos em que era Ministro do Trabalho do segundo governo de Getúlio Vargas
(1950-1954), a sua posse como presidente da República não era bem vista,
sobretudo pelos militares. Além disso, o fato dele estar em viagem para um país
comunista abriu caminho para associar seu governo à possibilidade dos comu-
nistas chegarem ao poder no Brasil.

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

Contra a manifesta intenção dos militares de impedir a posse de Jango,


ergueu-se o um movimento contrário aos militares liderado pelo governador
do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola. O movimento tinha apoio de uma parte
do Exército rio-grandense e incitava a população como um todo a mobilizar-se
contra o golpe militar (REIS FILHO, 2014, p. 30-31).
A conjuntura política do Brasil tomou ares de guerra civil, o que de fato não
chegou a acontecer, uma vez que foi estabelecida uma negociação entre as forças
lideradas por Brizola e os militares a qual resultou em uma mudança no sistema
do governo central brasileiro. A partir desse momento o parlamentarismo subs-

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tituía o presidencialismo e garantia a presidência à João Goulart, que governaria
com poderes limitados, uma vez que, pelo parlamentarismo, o Poder Executivo
seria exercido de fato por um primeiro-ministro.
Jango tomou posse em 07 de Setembro de 1961 e durante o seu governo os
movimentos populares se intensificaram, com a organização dos trabalhadores
rurais, da União Nacional dos Estudantes (UNE) e com o maior envolvimento
da igreja nas questões políticas e sociais. Diante desse cenário, elaborou-se as
Reformas de Base, que abrangiam as discussões sobre reforma agrária, reforma
urbana, reforma eleitoral, reforma do estatuto do capital estrangeiro e a reforma
universitária.
Para garantir a aprovação do seu programa de reformas e conseguir colocá-
-lo em prática, Jango precisava recuperar os plenos poderes de presidente. Em
1963 aconteceu um plebiscito para decidir entre a continuidade do sistema par-
lamentar ou a volta ao presidencialismo. A opção presidencialista saiu vencedora
e Jango recuperou o direito de exercer a presidência de forma plena.

A partir da divulgação do programa de reformas de base instalou-se um for-


te debate na sociedade. Para saber mais sobre o reformismo do governo
Jango, acesse o conteúdo disponível em: <https://cpdoc.fgv.br/producao/
dossies/Jango/artigos/NaPresidenciaRepublica/As_reformas_de_base>.
Acesso em: 01 jun. 2015.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


215

Com os poderes presidenciais recuperados, Jango, com a ajuda do seu minis-


tro do Planejamento Celso Furtado, elaborou o Plano Trienal, o qual tinha por
objetivo restabelecer o equilíbrio econômico do país. Entretanto, o Plano Trienal
foi rejeitado por todos os setores da sociedade e acabou sendo deixado de lado.
Desde então, João Goulart não tinha mais um plano de governo e o país encon-
trava-se mergulhado no caos (REIS FILHO, 2014, p. 36).
A postura de João Goulart após o fracasso do Plano Trienal representou uma
mudança na sua política conciliatória, adotada desde o início de seu governo.
Jango optou por fazer valer seus poderes de presidente e levar o programa de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

reformas adiante, mesmo sem o apoio do Congresso ou da sociedade. A radica-


lização de Jango acirrou as críticas ao seu
governo e fez crescer o movimento que
desejava sua saída do cargo de presidente
do Brasil. O avanço do comunismo e do
socialismo na América Latina também
contribuiu para o desgaste da imagem
de João Goulart, sempre associado ao
ideal comunista.
No dia 19 de março de 1964, qua-
tro dias após um comício realizado pelo
presidente no Rio de Janeiro, no qual
anunciou o início do plano reformista,
realizou-se em São Paulo a primeira
Marcha da Família com Deus pela
Liberdade, organizada pelas associações
das senhoras católicas ligadas à Igreja
conservadora, apoiadas pelos setores de
direita alvoroçados por conta das agita-
ções políticas (REIS FILHO, 2014, p. 41).

Campanha pela restauração dos plenos poderes ao


presidente da República
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

A crise do governo de Jango agravou-se quando um acontecimento envol-


vendo a Marinha e as forças do Exército criou uma divisão nas forças militares.
A Associação dos Marinheiros há tempos organizava-se para combater a des-
valorização da profissão e, em 24 de março de 1964. o Ministro da Defesa Silvio
Mota mandou prender os dirigentes da associação sob a acusação de indisci-
plina e insubordinação.
No dia seguinte à ordem de prisão, os marinheiros e os dirigentes da asso-
ciação reuniram-se para comemorar o aniversário da instituição e elaborar novas
reivindicações. O ministro solicitou a ajuda do Exército para reprimir o movi-

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mento, que acabou chegando a um acordo com os marinheiros, apaziguando
a situação. O ministro Silvio Mota não gostou do resultado das negociações e
entregou o cargo, para o qual Jango nomeou o brigadeiro Paulo Rodrigues que,
ao determinar que os marinheiros não seriam acusados ou punidos por insubor-
dinação, contrariou os oficiais das altas patentes da Marinha que o acusaram de
incentivar a rebeldia e a falta de respeito à hierarquia (FAUSTO, 1995, p. 460).
Com esse acontecimento, Jango possibilitou o aprofundamento da oposi-
ção do Exército em relação ao seu governo. A essa altura, diante das conjunturas
apresentadas, o golpe para afastar João Goulart da presidência da República já
se encontrava amplamente articulado. Na madrugada de 31 de Março de 1964,
o general Mourão Filho deslocou as tropas sob seu comando de Minas Gerais
para o Rio de Janeiro com o objetivo de ocupar o Ministério da Guerra e depor
o presidente (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 446).
As tropas de Mourão Filho não encontraram resistência. João Goulart havia
deixado o Rio de Janeiro com destino a Porto Alegre e seus aliados ou os que não
concordavam com um golpe militar também não organizaram uma estratégia de
defesa. No dia 2 de Abril, o presidente do Senado Auro de Moura Andrade decla-
rou, em sessão secreta no Congresso Nacional, que a presidência da República
estava vaga. Era o fim do governo de João Goulart e o fim das liberdades demo-
cráticas do país.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


217
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Notícia do jornal O Lince sobre a deposição de João Goulart


Fonte: Brandão (online).

Enfim Democracia? As Esperanças Renovadas e o Novo Golpe: Início da Ditadura Militar no Brasil
IV

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caros(as) alunos(as), nesta unidade debatemos um período importante na histó-


ria do Brasil e que nos permite repensar a trajetória política do país, dispensando
uma maior atenção às discussões relacionadas com o exercício da democracia
ao longo da formação do país.
Nos trinta e quatro anos de história política brasileira abordada nesta unidade
(1930-1964), vimos como os direitos dos cidadãos brasileiros foram manipula-
dos de acordo com os interesses de figuras políticas como Getúlio Vargas, que

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usou da situação difícil em que vivia a maioria da população brasileira no iní-
cio dos anos de 1930 para articular uma estratégia de governo que garantisse a
sua permanência no poder quase vinte anos, somados os dois períodos em que
esteve na presidência do Brasil.
Dono de um discurso que conquistou os setores mais baixos da sociedade e
fundamentando-se em uma política populista – que na verdade diz mais sobre
sua vontade de permanecer no poder do que sobre sua verdadeira preocupação
com a população –, Getúlio deixou sua marca na história política do país ao tirar
a própria vida em 1954 e levar a população a chorar sua morte como se fosse a
morte de um ente próximo e querido.
Ao que parece, para os menos comprometidos com os discursos e com as
análises históricas, ao suicidar-se Getúlio redimiu-se de seu passado ditador
deixando na lembrança a imagem do “pai dos pobres”. No entanto, lembrem-
-se caro(a) estudante, nós, enquanto historiadores e professores de história, nos
preocupamos com os discursos e as análises e, portanto, devemos ir além da
imagem deixada por Vargas após a sua morte.
Com isso em mente, podemos compreender melhor as heranças deixadas por
Getúlio e que influenciaram os rumos políticos nos anos seguintes à sua morte.
Anos que trouxeram a renovação da esperança ao mesmo tempo em que cria-
ram as condições para que o Brasil mergulhasse nos anos de terror da ditadura
militar, instalada a partir do golpe de 1964 que acabamos de estudar.
Os 21 anos que marcaram o período da ditadura militar no Brasil será o
assunto de nossa próxima unidade.

A ASCENÇÃO DOS REGIMES AUTORITÁRIOS NO BRASIL


219

1. Em 1930 o Brasil passava por um momento conturbado, influenciado – além do


contexto interno – pelos acontecimentos internacionais. O fim da Primeira Guer-
ra Mundial, o avanço das ideias socialistas e a crise norte-americana de 1929 afe-
taram de maneira considerável os países europeus e o Brasil. Após a leitura desta
unidade, estabeleça a relação entre a crise econômica desencadeada com
a quebra da bolsa de Nova Iorque e a crise nos setor agrário-exportador
brasileiro.
2. Em 1937 Getúlio Vargas deu um golpe de Estado e decretou o início do Estado
Novo. Descreva de maneira sucinta o que os anos em que o Estado Novo
esteve vigente significaram para a democracia brasileira.
3. A postura pouco evidente de Getúlio Vargas após 1945 não fora resultado de
uma falta de compromisso político ou decepção com os acontecimentos que
marcaram o fim do Estado Novo. Na verdade, Getúlio preparava-se para dispu-
tar novamente as eleições e reassumir o comando do país, dessa vez pelas vias
democráticas. Dessa forma, no período entre 1945 e 1950, Getúlio e seus aliados
buscaram definir as estratégias que conduziriam sua campanha e desenvolver as
estratégias para um novo governo. Leia as alternativas abaixo referentes ao
segundo governo de Getúlio Vargas e assinale a alternativa correta.
a) Após 1945 Getúlio Vargas afastou-se do cenário político brasileiro devido ao des-
contentamento com os rumos que o país estava tomando. Seu retorno em 1950
foi possível mediante um acordo entre ele e seus opositores, que lhe garantiu o
exercício de um governo nos mesmo moldes do Estado Novo.
b) Entre 1950 e 1954 Getúlio Vargas não enfrentou grandes oposições ao modelo
político-econômico implantado, uma vez que o presidente conseguiu conciliar
os interesses dos nacionalistas e dos entreguistas.
c) Como tinha conseguido conquistar o apoio do movimento dos trabalhadores ao
longo do primeiro governo (1930-1945), Getúlio não teve dificuldades em lidar
com a base operária na sua segunda previdência, evitando conflitos e greves.
d) O modelo político adotado por Vargas nesse segundo mandato rompia com o
liberalismo e apostava no nacionalismo e no intervencionismo para promover a
industrialização do país e o seu consequente progresso.
e) Getúlio Vargas encerrou precocemente seu segundo mandato por acreditar que
dessa forma seus ideais políticos seriam levados adiante, uma vez que seus opo-
sitores teriam que enfrentar as forças populares para promover as mudanças que
desejavam.
4. Com o fim do Estado Novo acreditava-se que o país enfim gozaria da liberdade e
a democracia poderia finalmente florescer no Brasil. Leia as alternativas abaixo
sobre os anos que se seguiram ao fim do Estado Novo e em seguida assinale
a alternativa que representa a resposta correta.
I. Juscelino Kubitschek foi eleito com um percentual baixo, o que demonstrava
que o novo presidente não era consenso entre a população e que teria que ado-
tar uma postura cautelosa para superar a desconfiança e enfrentar a forte oposi-
ção de seus adversários políticos.
II. Kubitschek elaborou o Plano de Metas, que visava acelerar o desenvolvimento
de vários setores da economia brasileira, por meio da ampliação da participação
estrangeira nas atividades econômicas no país.
III. Jango tomou posse em 1961 e elaborou as chamadas Reformas de Base, que
abrangiam as discussões sobre reforma agrária, reforma urbana, reforma eleito-
ral, reforma do estatuto do capital estrangeiro e a reforma universitária.
IV. A postura de João Goulart após o fracasso do Plano Trienal representou uma
mudança na sua política conciliatória, adotada desde o início de seu governo.
5. Estão corretas as alternativas:
a) I.
b) II e IV.
c) I e III.
d) III.
e) I, III e IV.
221

A EXPRESSÃO CULTURAL NO ESTADO NOVO


A Cultura era entendida como assunto de Estado, e a ditadura fez uso disso para se apro-
ximar de escritores, jornalistas e artistas. Entre o ministério Capanema e o DIP abriu-se
um mercado de cargos destinados a intelectuais que desejassem se inserir nos espaços
privilegiados do serviço público, e formou-se uma larga roda de convívio entre intelectu-
ais e artistas e o núcleo decisório do governo. Ainda que alguns entre eles antagonizas-
sem, com sua produção, a ordem estabelecida, uma expressiva parcela dos intelectuais
brasileiros ao centro, à direita e à esquerda do espectro político aceitou demandas que
lhe faziam as agências do Estado Novo: poetas, como Carlos Drummond de Andrade,
Mário de Andrade, Cassiano Ricardo, Rosário Fusco e Menotti Del Picchia; intelectuais,
como Gilberto Freyre, Alceu Amoroso Lima, Nelson Werneck Sodré; ou escritores, como
Graciliano Ramos. É bem verdade que havia uma vontade de transformação atravessan-
do o campo da cultura e projetando, em escala nacional, uma estética, uma imaginação
e um pensamento que já não estavam circunscritos aos regionalismos. O Estado Novo
forneceu régua e compasso a esse esforço de construção de uma nacionalidade triun-
fante, sustentada, numa ponta, pela crença na autenticidade da cultura popular e, na
outra, pela mistura heterogênea de elementos culturais originários de várias regiões do
país. Um turbante de baiana aqui, ali um pandeiro ou um tamborim pinçados do morro
carioca, acolá um toque de berimbau e um passo de capoeira, mais adiante um mulato
de voz macia que resume todos os brasileiros – ao sul do equador nada é puro, e tudo
estaria misturado. Na representação vitoriosa dos anos 1930, o brasileiro nasce, portan-
to, onde começa a mestiçagem. A mistura deixou de ser desvantagem para tornar-se
elogio, e diversas práticas regionais associadas ao popular – na culinária, na dança, na
música, na religião – seriam devidamente desafricanizadas, por assim dizer. Transfor-
madas em motivo de orgulho nacional, foram aclamadas, e são até hoje, consideradas,
marcas da originalidade cultural do país.
Fonte: Schwarcz e Starling (2015, p. 378).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Título: 1964: o golpe que derrubou um presidente, pôs fim ao regime


democrático e instituiu a ditadura no Brasil.
Autor: Jorge Ferreira e Ângela de Castro Gomes
Editora: Civilização Brasileira
Sinopse: O livro discute o processo desencadeado com a chegada
de Jango à presidência do Brasil e a pressão militar para impedir a
sua posse. Elaborado de maneira clara e objetiva, a obra permite a
compreensão por parte do grande público dos acontecimentos que
levaram à instalação do regime militar no Brasil.

Título: Olga
Ano: 2004
Direção: Jayme Monjardim
Sinopse: O filme retrata a vida de Olga Benário, que nasceu na
Alemanha e tornou-se militante comunista. Ao ser perseguida pelas
forças de Hitler, fugiu para Moscou, onde recebeu treinamento militar
e recebeu a missão de acompanhar o brasileiro Luiz Carlos Prestes de
volta ao seu país. No Brasil, lutam contra o governo de Getúlio Vargas
e planejam a Intentona Comunista, ao mesmo tempo em que se
envolvem e se casam. A história aborda aspectos da vida da militante
comunista no Brasil, destacando aspectos importantes do momento
histórico vivido pelo Brasil durante o Governo de Getúlio Vargas.

Título: Golpe Militar 1964 - Documentário


Sinopse: O documentário aborda o desenvolvimento do golpe de 1964 que afastou o
presidente João Goulart e instalou o regime militar no Brasil, analisando o apoio dos
Estados Unidos na consolidação do golpe, enfatizando suas razões e as consequências
do período da ditadura militar no Brasil.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=UqgpnC42Caw>. Acesso em: 13
jul. 2015.
Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira

OS ANOS DE CHUMBO: A DITADURA

V
UNIDADE
MILITAR NO BRASIL E O LONGO
PROCESSO DE REDEMOCRATIZAÇÃO

Objetivos de Aprendizagem
■■ Analisar os anos iniciais da ditadura militar e o desenvolvimento do
aparato administrativo militar.
■■ Discorrer criticamente acerca das medidas autoritárias adotadas pelo
regime militar a partir da fase de “endurecimento” do regime.
■■ Debater sobre a organização dos diversos setores da sociedade na
luta contra a ditadura, analisando as formas de resistência à repressão
e à adoção da tortura.
■■ Analisar o desenvolvimento do processo de redemocratização do
país e a sua organização pós-ditadura.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A consolidação do golpe de 1964 e a organização do Estado militar
■■ O “endurecimento” do regime e a resistência popular: manifestações
e organizações populares contra a repressão
■■ As esperanças renovadas: o longo caminho da redemocratização do
país
225

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), chegamos em um momento muito rico da história do Brasil,


rico porque nos permite conhecer a fundo o período onde a supressão dos direitos
civis, das liberdades e da democracia atingiu seu ápice. Como vimos na unidade
anterior, durante os anos de 1937 e 1945, sob o comando de Getúlio Vargas, o
Brasil também estava sob um regime ditatorial. No entanto, o que ocorreu no
Brasil a partir de 1964 deixou marcas na sociedade que jamais serão esquecidas
e que não devem ser esquecidas.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Ao longo deste livro vimos como o Brasil buscou construir uma identidade
após a ruptura com Portugal em 1822. Desde esse momento, os brasileiros luta-
ram para conquistar o reconhecimento enquanto cidadãos e terem seus direitos
respeitados. Vimos que, durante muito tempo, as vozes dos que não estavam no
poder foram caladas por meio da repressão e da coação, sendo eles impedidos
até mesmo de escolher livremente seus representantes nas esferas municipais,
estaduais e federal.
A organização dos setores populares demorou a ser construída e demorou-se
mais ainda para que esses setores tivessem seus direitos e interesses defendidos e
respeitados por aqueles que estavam no poder. Por vários momentos, só foram
levados em consideração no contexto político e econômico quando vistos como
manipuláveis e úteis aos interesses alheios.
Quando os brasileiros à margem do poder alcançaram notabilidade e pude-
ram fazer parte de fato do contexto político e econômico do país, quando tiveram
seus direitos de cidadãos respeitados e quando puderam, enfim, debater e com-
preender o sentido das palavras liberdade e democracia, um novo golpe provocou
mudanças profundas na sociedade e, mais uma vez, os brasileiros viram essas
palavras perderem seus sentidos e significados.
Os 21 anos em que o país esteve sob o comando dos militares devem ser
lembrados e analisados a fundo para que os erros do passado não se repitam.
Porque, caro(a) aluno(a), a ditadura militar fez com que os brasileiros enten-
dessem o real significado da liberdade e da democracia, uma vez que lhes fora
proibido até mesmo pensar por si próprios, sob o risco de serem submetidos a
castigos que feriram o corpo e a alma.

Introdução
V

A CONSOLIDAÇÃO DO GOLPE DE 1964 E A


ORGANIZAÇÃO DO ESTADO MILITAR

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O Exército nas ruas durante o regime militar
Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).

Após o golpe que tirou João Goulart do comando do Brasil, o que se esperava
era o estabelecimento de um governo provisório até a realização das próximas
eleições, marcadas para 1965. Ninguém imaginava que o que aconteceria era a
instalação de um regime político que duraria 21 anos e seria baseado na supres-
são dos direitos constitucionais, das liberdades políticas e civis e da democracia.
Nem mesmo os que apoiaram o golpe esperando conter a “ameaça comunista”
poderiam imaginar a realidade que seria imposta ao país a partir daquele 31 de
Março de 1964.
É inegável que o golpe militar e civil foi empreendido sob bandeiras de-
fensivas. Não para construir um novo regime. O que a maioria desejava
era salvar a democracia, a família, o direito, a lei, a Constituição, enfim,
os fundamentos do que se considerava uma civilização ocidental cristã.
Do ponto de vista das Forças Armadas, tratava-se de garantir a hierar-
quia e a disciplina, ameaçadas pelos protestos crescentes de graduados
e de marinheiros. Finalmente, outra referência acionada com boa acei-
tação, em especial entre as classes médias, era o combate à corrupção,
pervasiva, segundo os conservadores, desde os últimos anos JK (REIS
FILHO, 2014, p. 48).

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
227

Entre os que apoiaram o golpe que tirou João Goulart da presidência esta-
vam os liberais conservadores – corrente formada por Carlos Lacerda, Ma-
galhães Pinto, a UDN, a imprensa jornalística representada pelos jornais O
Estado de São Paulo, Jornal do Brasil e o Correio da Manhã e os que defen-
diam a retomada da vocação agrária do país –, os legalistas e os nacional-
-estadistas.
Fonte: Reis Filho (2014).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Quando Moura Andrade declarou vaga a presidência da República, o próprio


exército ainda não havia definido por completo as novas direções políticas do
país. Os que já sabiam, já haviam planejado que essa nova diretriz não incluía a
participação popular. De acordo com Élio Gáspari,
A unidade militar proclamada sobre os escombros do governo Goulart
era tão falsa quanto aquela que Golbery oferecera no texto de seu mani-
festo na manhã de 1º de abril. Contudo, se os generais podiam divergir
a respeito de muitas coisas, numa estavam de acordo: dispunham-se a
utilizar a força contra o que restava do governo civil. Queriam isso não
só porque achavam necessário o expurgo – “limpeza da casa”, como
diziam –, mas também porque ele se transformaria imediatamente em
fonte de poder e legitimidade burocrática (GÁSPARI, 2014, p. 121).

Os militares, assim que assumiram o comado do país, adotaram medidas que


tinham por objetivo limitar e até eliminar as entidades e as manifestações con-
trárias ao novo regime. Desse modo, para garantir a vitória do golpe iniciado
em março de 1964 e as realizações pretendidas pelo novo regime, era necessário
controlar o Congresso Nacional e reduzir a força da oposição no âmbito polí-
tico. Para tanto, em 09 de Abril de 1964, ou seja, quase imediatamente à tomada
do poder, foi anunciado o Ato Institucional número 1 (AI-1).

A Consolidação do Golpe de 1964 e a Organização do Estado Militar


V

O AI-1 foi elaborada por Carlos Medeiros Silva – o mesmo homem que redi-
giu e revisou a Constituição de 1937 – e continha onze artigos que, em síntese,
limitava o poder e a autonomia do Congresso Nacional, além de conceder ao
presidente da República poderes para cassar mandados e suspender os direitos
políticos de qualquer político brasileiro pelo prazo de dez anos (GÁSPARI, 2014,
p. 124-125). Talvez o ponto mais significativo da instituição do AI-1foi a nome-
ação de uma junta composta
pelas lideranças das forças
militares do país para assu-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
mir o Comando Supremo
da Revolução. Com esse
ato, o golpe adquiriu cará-
ter revolucionário, o que
trazia implícito a suprema-
cia da Revolução no poder
sobre os demais órgãos e ins-
tituições do país, inclusive, a
Constituição (REIS FILHO, Ato institucional foi decretado
2014, p. 51). Fonte: Univesp TV (online)

Para você, qual é o sentido da palavra revolução?


Fonte: a autora.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
229

Além da restrição do poder e da autonomia do Congresso Nacional, o novo


regime impôs uma forte repressão aos movimentos sociais de oposição. Em 1º de
abril de 1964, os militares incendiaram a sede da União Nacional dos Estudantes
no Rio de Janeiro e colocaram a organização estudantil na clandestinidade.
A ilegalidade da UNE foi apenas uma das medidas tomadas pelo regime
militar a partir de 1964 para controlar a oposição. No decorrer dos primeiros
meses do novo regime, uma série de leis foram criadas a fim de subordinar os
movimentos populares ao governo central. No caso do movimento estudan-
til, no lugar da UNE, foram criados os Diretório Nacional de Estudantes e os
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Diretórios Estaduais de Estudantes. Esses órgãos estavam sujeitos a um estatuto


definido pelo governo central, o qual tirou deles o caráter de movimento político
e os reduziam às atividades administrativas e à promoção de eventos recreativos.
Dessa forma, o movimento estudantil perdia sua essência e identidade.
O mesmo aconteceu com o movimento trabalhista. Os sindicatos não foram
extintos, mas passaram à tutela do Estado, a exemplo do que já ocorrera em outros
momentos da história política do Brasil. Uma lei de 1º de junho de 1964 regula-
mentou o direito de greve no país, considerando ilegais as greves do setor público
e/ou que tivessem um caráter político, religioso ou social. Com isso, restringiu-
-se significativamente o poder de organização dos trabalhadores, obrigando-os
a submeter-se às medidas políticas e econômicas que, por diversas vezes, mos-
traram-se desfavoráveis a esse setor da sociedade.
O instrumento que legitimava as ações repressivas do novo governo era
representado pelos Inquéritos Policiais Militares (IPM), responsáveis pela inves-
tigação dos casos de subversão ao regime. Por meio dos IPM, inúmeras pessoas
foram perseguidas, presas e torturadas já no início do governo militar. A tortura
foi o meio pelo qual os militares que estiveram no comando do país no período
da ditadura militar buscaram reprimir as manifestações contrárias ao modelo
político implantado. Voltaremos a discutir esse instrumento da administração
militar em momento oportuno.

A Consolidação do Golpe de 1964 e a Organização do Estado Militar


V

O AI-1 estabelecia que um novo presidente deveria ser eleito por meio do
voto indireto do Congresso Nacional e para um mandato que iria até janeiro de
1966. Em 11 de abril de 1964, o Congresso – já rechaçado devido às cassações
realizadas após a instituição do AI-1 – elegeu para presidente o general Castelo
Branco, o qual, no entender dos que comandavam a “revolução”, personificava
os interesses tanto dos militares quanto das correntes civis que apoiaram o golpe.
Conforme destaca Daniel Aarão, Castelo Branco
Fora chefe do Estado-Maior do Exército, nomeado por Jango, porém
notabilizara-se pela firmeza com que combatera a radicalização do

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reformismo nacional-estatista, consolidando prestígio entre os pares.
Ex-oficial da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália, colega
apreciado e amigo de militares estadunidenses, ninguém tinha dúvida
sobre seu decidido anticomunismo. Por outro lado, considerado um
militar culto e civilista na tradição dos militares-políticos, tão típica
da República brasileira, dispunha de trânsito e conexões com o Ipês e
entre políticos e empresários de diferentes orientações (REIS FILHO,
2014, p. 53).

Castelo Branco foi o responsável por criar as bases que fundamentaram o apare-
lho estatal durante o governo dos militares. Ao assumir a presidência, prometeu
respeitar a Constituição – com as modificações impostas pelo AI-1 – e realizar as
eleições presidenciais marcadas para 1965 (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p.
448). As promessas não foram cumpridas e o que se assistiu durante o governo
de Castelo Branco foi o prelúdio de reformas políticas que durante o longo perí-
odo do militarismo no Brasil levaram ao extremo o domínio sobre os indivíduos.
A criação do Serviço Nacional de Informação (SNI), criado originalmente para
investigar as denúncias de torturas dos “inimigos do regime”, foi, talvez, o pri-
meiro órgão de manipulação da verdade e de controle dos cidadãos, uma vez
que serviu de instrumento para perseguições e prisões arbitrárias.
O programa político de Castelo Branco refletia os interesses de parte daque-
les que participaram da derrubada de Jango. Esse programa político foi um dos
motivos para a elevação da insatisfação dos setores ligados à radicalização do
regime. Conforme aponta Daniel Aarão,
O seu internacionalismo pretendia romper com as ambições autono-
mistas do nacional-estatismo, propondo um alinhamento estratégico
com os Estados Unidos. Tratava-se de integrar o Brasil no chamado

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
231

mundo ocidental, reconhecendo a liderança desempenhada por Tio


Sam. Ao mesmo tempo, o seu liberalismo queria promover uma re-
dução drástica do Estado e uma abertura radical aos fluxos do capital
internacional, revogando as limitações políticas e econômicas formula-
das pelo governo deposto (REIS FILHO, 2014, p. 55).

Para resolver os problemas econômicos herdados do governo de Jango e que se


prolongavam por anos devido ao insucesso dos planos econômicos adotados pelos
últimos governos, o presidente Castelo Branco adotou um programa denominado
de Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), que seria coordenado
pelos Ministros da Fazenda Otávio Gouveia de Bulhões e do Planejamento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Roberto Campo.

Foi no governo de Castelo Branco que foi criado o Fundo de Garantia por
tempo de Serviço, um instrumento usado para substituir o sistema de esta-
bilidade no emprego para aqueles que permanecessem num mesmo em-
prego por mais de dez anos. A criação do FGTS teve por objetivo aliviar as
despesas das empresas e liberar o capital empregado para respeitar a regra
de estabilidade para que fosse usado na modernização das empresas.
Fonte: adaptado de Reis Filho (2014).

O PAEG tinha por base o objetivo de “reformar o sistema econômico capi-


talista, modernizando-o como um fim em si mesmo e como forma de conter a
ameaça comunista” (FAUSTO, 1995, p. 470). Dentre as medidas estabelecidas
pelo PAEG para a estabilização da economia brasileira, encontravam-se “cortes de
gastos públicos, contenção do crédito, arrocho dos salários” (REIS FILHO, 2014,
p. 55). Além disso, um dos pontos-chave do programa de Campos e Bulhões foi
o incentivo às exportações, o que contribuiu para o desenvolvimento produtivo
do Brasil (FAUSTO, 1995, p. 470-471).

A Consolidação do Golpe de 1964 e a Organização do Estado Militar


V

Essas medidas, embora inicialmente tenham causado o aumento do custo


de vida e a contenção dos salários, contribuíram para que a economia brasileira
avançasse, superando, ao menos em parte, os problemas deixados pelos gover-
nos anteriores, como a alta da inflação que, no governo de Castelo, começou a
retroceder.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O sucesso do PAEG só foi possível porque o Brasil vivia sob o regime militar,
um modelo político-administrativo que cortou o direito que as massas po-
pulares tinham de manifestar-se contra as medidas que as prejudicavam.
Fonte: adaptado de Fausto (1995).

Uma parte dos que participaram do golpe de 1964 não estava satisfeita com
a política desenhada por Castelo Branco, considerada por estes como uma pos-
sibilidade de os que se declararam contra o regime militar conseguir derrubar o
governo e assumir o poder, sobretudo depois que as eleições de 1965 colocou no
comando dos principais Estado brasileiros governadores contrários ao regime
militar. Para conter os ânimos, Castelo enrijeceu sua atuação política e enterrou
de vez a Constituição de 1946.
Em 17 de outubro de 1965, o presidente Castelo Branco promulgou o Ato
Institucional 2 (AI-2), cujas medidas mais significativas eram o estabelecimento de
eleições indiretas para presidente da República e governadores com voto aberto,
o fechamento do Congresso Nacional por alguns períodos e o fim do multipar-
tidarismo com a extinção dos partidos políticos existentes e a criação de apenas
dois partidos, a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) – partido que abri-
gava os favoráveis ao regime instalado em 1964 – e o Movimento Democrático
Brasileiro (MDB) – partido da oposição. Em fevereiro de 1966 Castelo promul-
gou o AI-3, que estabelecia o voto indireto para as eleições municipais.
O último lance do governo de Castelo Branco foi a implantação do AI-4 que,
dentre outros pontos, previa a reabertura do Congresso Nacional em novembro

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
233

de 1966 para a aprovação da nova Constituição do Brasil. A Constituição entrou


em vigor em janeiro de 1967 e reforçava as medidas de fortalecimento do poder
Executivo e do regime militar.

O GOVERNO DE COSTA E SILVA

O sucessor de Castelo Branco na presidência da República foi o ex-ministro da


Guerra, Arthur da Costa e Silva (ARENA), eleito indiretamente pelo Congresso
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Nacional em março de 1967. Costa e Silva foi o primeiro presidente militar da


chamada linha dura, ou seja, que defendiam um governo pautado em medidas
mais repressivas.
Ao descrever a figura de Costa e Silva e sua participação no golpe de 1964,
Élio Gáspari relata que
No dia 1º de abril de 1964, na farda sempre amarrotada do velho gene-
ral, acordou o jovem capitão Costa e Silva. Negaceara com a insurrei-
ção, mas uma vez na cadeira de ministro da Guerra, fechou o tempo. In-
titulou-se comandante do Exército, desacatou governadores, humilhou
o presidente Ranieri Mazzilli dizendo que não lhe devia subordinação.
Foi o primeiro chefe a buscar uma legitimidade histórica para o golpe
engatando-o na composição ideológica dos movimentos militares dos
anos 1920. Percebeu desde o primeiro momento as características do
processo de anarquia militar e, como ninguém, utilizou-se da energia
que ele continha. Enquanto Castello procurava manter uma ordem
constitucional e se chocava com o radicalismo, Costa e Silva valia-se
dele. Castello se considerava um presidente eleito pelo Congresso, Cos-
ta e Silva se dizia comandante revolucionário. Castello recuava, Costa e
Silva avançava. Chegava a ser descortês com o colega. Chamava-o pelas
costas de “o pequenino”. Em maio de 1964, durante uma recepção ofe-
recida pelo presidente alemão Heinrich Lübke no Copacabana Palace,
aproximou-se do visitante e, apontando para a casaca de Castello, disse:
“Quem devia estar com essa casaca era eu, mas não quis”. O presidente
ouviu calado (GÁSPARI, 2014, p. 270).

Por meio desse relato, é possível perceber que a personalidade de Costa e Silva
demonstrava uma tendência para um governo mais rígido e com características
mais próximas de um movimento revolucionário. Essa tendência confirmou-se
no breve governo de Costa e Silva, entre 1967 e 1969, conforme veremos a seguir.

A Consolidação do Golpe de 1964 e a Organização do Estado Militar


V

Para auxiliá-lo em seu governo, Costa e Silva chamou o Secretário da Fazenda


de São Paulo, Delfim Netto, para ocupar o Ministério da Fazenda. A estratégia
econômica de Delfim Netto baseava-se na ênfase da “queda dos juros e amplia-
ção d crédito e dos incentivos aos investimentos e às exportações, revogando,
na prática, as opções dos gestores anteriores da economia, Roberto Campos e
Otávio Gouveia de Bulhões” (REIS FILHO, 2014, p. 66). A estratégia de Delfim
Netto obteve resultados positivos e a economia brasileira cresceu nos dois anos
seguintes, alavancada pelo crescimento industrial.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Os resultados satisfatórios da política econômica de Delfim Netto foram
resultado de um contexto interno e externo favoráveis. Internamente, me-
didas governamentais como a ociosidade do parque industrial, a deman-
da reprimida e o saneamento financeiro executado pelo governo anterior
contribuíram para o desenvolvimento entre 1967 e 1968. Externamente, a
reação do mercado internacional pós Segunda Guerra e o crescimento do
comércio mundial entre 1967 e 1973 apresentavam uma conjuntura vanta-
josa para o desenvolvimento da produção brasileira.
Fonte: Reis Filho (2014, p. 67).

Se por um lado o governo de Costa e Silva alcançou um bom desempenho,


incentivando a produção do Brasil e promovendo o seu desenvolvimento, por
outro lado, no campo político, o general, com sua postura mais radical quando
comparada ao governo de Castello Branco, contribuiu para que o cenário social
se alterasse e as manifestações contrárias ao regime militar se transformassem
em conflitos armados.
A agitação social que tomou conta do país durante o governo de Costa e
Silva levou à instalação de um estado de guerra entre governo e sociedade e que,
diante das medidas autoritárias mais incisivas adotas pelo presidente, criou um
dos períodos mais conturbados da história do Brasil.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
235

O “ENDURECIMENTO” DO REGIME E A RESISTÊNCIA


POPULAR: MANIFESTAÇÕES E ORGANIZAÇÕES
POPULARES CONTRA A REPRESSÃO
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Os conflitos entre a sociedade civil e a polícia eram constantes durante o período da ditadura militar
Fonte: O Golpe... (online).

Mesmo diante da arrancada econômica a partir da política econômica adota


por Delfim Netto, o país viva sob um clima de insatisfação, gerado pelos abusos
cometidos pela ditadura no que diz respeito à limitação dos direitos civis. Esse
clima de insatisfação possibilitou a organização da oposição com representações
em diversos setores da sociedade.
Conforme ressalta Élio Gáspari,
Havia quatro anos a política brasileira estava torta, deformada pela di-
tadura e pelas consequentes pressões que eram exercidas à direita e à
esquerda pelas dissidências do regime e da oposição. (...). O país san-
grava em virtude das punições de 1964 e das mutilações eleitorais de
1965. As cassações desmoralizaram a representação política, e a supres-
são das eleições diretas cortara o caminho para o exercício da cidadania
(GÁSPARI, 2014, p. 276).

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

Com o cenário político e social que se apresentava, a sociedade caminhava


para o confronto com o regime que lhe fora imposto, na tentativa de promover
o reestabelecimento da ordem democrática. No campo político a organização da
oposição caracterizou-se na formação da Frente Ampla em 1967, organização
liderada por Carlos Lacerda, Juscelino Kubitschek e João Goulart com o objetivo
de lutar pelos direitos dos trabalhadores. Em 1968 o chefe do Gabinete Militar, por
meio da Exposição de Motivos 15-2R/68, colocou a organização na ilegalidade.
A grande imprensa também manifestava sua desaprovação com o regime por
meio dos jornais – que ainda podiam manifestar suas opiniões – O Estado de São

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Paulo, Correio da Manhã e Jornal do Brasil. Setores da Igreja católica também
passaram a criticar o governo, denunciando a violação dos direitos humanos e
da democracia (REIS FILHO, 2014, p. 67).
Em 1968 a morte do estudante Edson Luis de Lima Souto fez explodir o
movimento estudantil. Edson Luis foi morto em um confronto entre estudan-
tes e a polícia durante uma manifestação que reivindicava melhores instalações
e melhor qualidade da alimentação oferecida pelo restaurante Calabouço, local
onde vários estudantes que não tinham onde comer se reuniam. Um tiro no peito
disparado por um policial militar acertou Edson Luis, estudante secundarista e
sem envolvimento político.
A morte do estudante foi o estopim para a radicalização do movimento
estudantil, insatisfeito com o regime militar desde 1964, quando a UNE foi
desarticulada pelos golpistas e sua sede incendiada em 1º de abril daquele ano.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
237

Em 1968 as manifestações ganharam ímpeto. 1968 não foi um ano qual-


quer. Em vários países, os jovens se rebelaram, embalados pelo sonho de
um mundo novo. Nos Estados Unidos houve grandes manifestações contra
a Guerra do Vietnã; na França, a luta inicial pela transformação do sistema
educativo assumiu tal amplitude que chegou a ameaçar o governo De Gaul-
le. Buscava-se revolucionar todas as áreas do comportamento, em busca da
liberação sexual e da afirmação da mulher. As formas políticas tradicionais
eram vistas como velharias e esperava-se colocar “a imaginação no poder”.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Esse clima, que no Brasil teve efeitos visíveis no plano da cultura em geral e
da arte, especialmente da música popular, deu também impulso à mobiliza-
ção social. Era um árduo caminho colocar “a imaginação no poder”, em um
país submetido a uma ditadura militar.
Fonte: Fausto (1995, p. 477).

Todo esse movimento organizado entre 1966 e 1968 em torno de uma crítica
ao governo que se instalara em 1964 refletiu em uma mobilização que reuniu os
vários setores da sociedade insatisfeitos em uma passeata realizada no dia 25 de
junho de 1968, conhecida como Passeata dos Cem Mil. Os participantes saíram
às ruas do Rio de Janeiro para pedir a redemocratização do país.
O clima que se instalou a partir da Passeata dos Cem Mil contribuiu para
que outros setores se manifestassem contra a ordem vigente. Desse modo, o
movimento operário também começou a reagir e a lutar por seus direitos. Em
Minas Gerais e em São Paulo, os trabalhadores realizaram greves importantes
que, mesmo sendo vencidas, reascenderam a motivação desse setor a brigar por
melhores salários e condições de vida.

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Manifestação popular pelo fim do regime militar no Brasil
Fonte: Associação nacional de pós-graduação (online)

A repressão sofrida pelos movimentos oposicionistas e o fato de algumas orga-


nizações de oposição estarem na ilegalidade trouxe para a cena a questão da luta
armada, defendida por alguns setores da oposição desde 1964. No contexto de
agitação social de finais da década de 1960 no Brasil e diante da influência de
movimentos guerrilheiros de outros países da América Latina – como Colômbia,
Venezuela e Peru, um grupo de dissidentes do PCB criou a Aliança de Libertação
Nacional (ANL), em 1967. No mesmo ensejo de promover a luta armada con-
tra a ditadura, surgiram o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8)
e a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).
A organização desses grupos que defendiam a luta armada aumentou o clima
de tensão no Brasil, uma vez que, para alcançar seus objetivos, praticaram atos
que instauraram um clima de insegurança no país, como atentados às institui-
ções associadas ao governo militar, assaltos para conseguir fundos para financiar
suas atividades e o sequestro de personalidades políticas importantes que eram
usadas como instrumento de troca na negociação pela liberdade de presos polí-
ticos (SKIDMORE, 2003).
Como podemos observar, caro(a) aluno(a), durante o governo de Costa e
Silva, a insatisfação contra o governo ganhou força e as manifestações e organiza-
ções populares se intensificaram. A falta de liberdade, o desrespeito às instituições
democráticas, a repressão e as denúncias de torturas que ocorriam desde o
governo de Castello Branco contribuíram para que um clima de tensão se ins-
talasse no país no final da década de 1960.O presidente Costa e Silva reagiu à

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
239

insurreição da sociedade dando o “golpe de misericórdia” nas esperanças daque-


les que sonhavam com a abertura política.
Após o discurso do deputado Márcio Moreira Alves, no qual ele condenou
a brutalidade da força policial em uma invasão à Universidade de Brasília, acu-
sou e condenou os abusos de poder do regime militar, demonstrados por meio
da adoção da tortura como prática nas suas investigações, incitou a população
a boicotar o desfile comemorativo de 07 de setembro e sugeriu que as mulheres
não namorassem militares que apoiassem as atitudes repressoras e violentas do
regime, as Forças Armadas exigiram a abertura de um processo criminal contra
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

o deputado (FAUSTO, 1995, p. 479). O processo dependia do parecer favorável


do Congresso Nacional, o qual se recusou a aceitar o pedido das Forças Armadas.
Diante da atitude do Congresso, Costa e Silva baixou quase que imediatamente
o Ato Institucional nº 5, o famoso AI-5.
Conforme ressaltam Lilia Schwarcz e Heloisa Starling,
O AI-5 era uma ferramenta de intimidação pelo medo, não tinha pra-
zo de vigência e seria empregado pela ditadura contra a oposição e a
discordância. Apesar disso, não foi o único instrumento de exceção
criado pelas Forças Armadas nem significou u, “golpe dentro do golpe”
aplicado por facções intramilitares radicais para garantir a expansão
do arbítrio e da repressão política. O AI-5 fez parte de um conjunto
de instrumentos e normas discricionárias mas dotadas de valor legal,
adaptadas ou alto conferidas pelos militares. Eles despenderam grande
esforço para enquadrar seus atos num arcabouço jurídico e construir
um tipo de legalidade plantada no arbítrio – uma legalidade de exceção
–, capaz de impor graves limites à autonomia dos demais poderes da
União, punir dissidentes, desmobilizar a sociedade e limitar qualquer
forma de participação política (SCHWARCZ e STARLING, 2015, p.
456).

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Notícia sobre o AI-5 publicada no Jornal do Brasil
Fonte: AI5 (online).

O AI-5 foi o mais rígido dos atos institucionais promulgados durante a dita-
dura militar e mostrou que os militares não estavam dispostos a retrocederem
em suas atitudes ou mesmo reformar o sistema de governo adotado desde 1964.
Ao contrário, com o AI-5 Costa e Silva abriu caminho para que o país mergu-
lhasse na fase mais dura e cruel da ditadura militar.

A CENSURA E A PRODUÇÃO INTELECTUAL DO BRASIL

A partir do momento em que o AI-5 entrou em vigor, em 13 de dezembro de


1968, o governo passou a controlar de maneira mais incisiva os movimentos
populares e toda a produção intelectual e cultural do país, numa clara tentativa
de reprimir a oposição, evitando que qualquer tipo de crítica ao momento polí-
tico do país fosse propagado.
Segundo Élio Gáspari,
As emissoras de televisão, as rádios e as redações de jornais foram ocu-
padas por censores recrutados na polícia e na Escola de Aperfeiçoa-
mento de Oficiais. Carlos Lacerda, que quatro anos antes agradecera
a Deus a chegada dos tanques, foi levado preso para um quartel, por
ordem do general Jayme Portella, para desagrado do comandante do I
Exército, Syseno Sarnento, que acabara de encarcerar o ex-presidente

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
241

Juscelino Kubitschek, capturado quando descia as escadas do Teatro


Municipal. JK foi levado para uma unidade da Baixada Fluminense,
onde o deixaram num alojamento sujo, com privada sem tampo, sofá
rasgado e goteira (GÁSPARI, 2014, p. 343).

Tinha início uma fase onde o direito de pensar e de expressar-se livremente


foram rapidamente limitados; um período no qual a perseguição e a prisão dos
“inimigos do regime” fez com que grande parte dos intelectuais brasileiros ficas-
sem impedidos de exercer suas profissões ou mesmo fossem obrigados a deixar
o país para não terminarem nos “porões da ditadura”. De acordo com Gáspari,
O governo que começara sinalizando um interesse na volta dos intelec-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tuais e cientistas exilados expulsaria das universidades 66 professores,


entre eles Caio Prado Júnior (que não tinha cargo, mas só o título de
livre-docente da USP), Fernando Henrique Cardoso (que conquista-
ra a cátedra de Ciência Política poucos meses antes) o sociólogo Flo-
restan Fernandes, a historiadora Maria Yedda Linhares, o físico Jayme
Tiomno e o médio Luiz Hildebrando Pereira da Silva, que deixara uma
posição no Instituto Pasteur, em Paris, para organizar o Departamento
de Parasitologia da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto
(GÁSPARI, 2014, p. 344).

A produção intelectual e artística do país ficou seriamente comprometida a par-


tir da instituição do AI-5, que determinou o controle da imprensa e impôs às
manifestações culturais um rígido sistema de controle das produções. O público
só teria conhecimento das produções que o governo considerasse “inofensiva” à
manutenção da ordem. Dessa foram, peça de teatro, programas de rádio e televi-
são, letras de músicas, enfim, todo tipo de manifestação artística e cultural estava
condicionado à liberação e à classificação do governo militar.

Quais são os prejuízos de se viver em uma realidade onde a liberdade de


expressão não existe e a produção intelectual e cultural são condicionados
e pré-determinadas?
Fonte: a autora.

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Música Cálice, de autoria de Chico Buarque, vetada pela censura
Fonte: Palmar (online).

Além de intelectuais, vários artistas brasileiros também partiram para o exí-


lio durante a ditadura para fugir da censura e da perseguição do governo
central. Caetano Veloso, Chico Buarque de Holanda, Gilberto Gil, Ferreira
Gullar, Raul Seixas e Geraldo Vandré são alguns dos inúmeros artistas, de
todas as áreas culturais que, devido às críticas contidas em suas produções,
precisaram deixar o país durante o regime militar.
Para conhecer mais personalidades brasileiras que foram exiladas do Brasil
durante o regime militar, acesse o conteúdo disponível em: http://oglobo.
globo.com/infograficos/golpe-militar-50-anos-exilados/. Acesso em: 09 ju-
nho 2015.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
243

Nos “porões da ditadura”: a tortura


Fonte: Goulart (online)

Os presos eram dez. Entre eles, seis rapazes do Colina. Foram tirados
das celas, postos em fila e escoltados até um salão. No caminho ouvi-
ram uma piada de um cabo: “São esses aí os astros do show?”. A pla-
teia, sentada em torno de mesas, chegava perto de cem pessoas. Eram
oficiais e sargentos, tanto do Exército como da Marinha e Aeronáutica.
Numa das extremidades do salão havia uma espécie de palco, e nele
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

o “tenente Ailton” presidia a sessão com um microfone e um retro-


projetor: “Agora vamos dar a vocês uma demonstração do que se faz
clandestinamente no país. [...].

Os presos foram enfileirados perto do palco, e o “tenente Ailton” iden-


tificou-os para os convidados. Tinha três sargentos por acólitos. Com a
ajuda de slides, mostrou desenhos de diversas modalidades de tortura.
Em seguida os presos tiveram de ficar só de cuecas. Maurício Vieira
de Paiva, 24 anos, quintanista de engenharia, foi ligado a um magneto
pelos dedos mínimos das mãos. Era a máquina de choques elétricos.
Depois de algumas descargas, o tenente-mestre ensinou que se devem
dosar as voltagens de acordo com a duração dos choques. Chegou a
recitar algumas relações numéricas, lembrando que o objetivo do in-
terrogador é obter informações e não matar o preso.

Murilo Pinto da Silva, 22 anos, funcionário público, ficou de pés descal-


ços sobre as bordas de duas latas abertas. Pedro Paulo Bretas, 24 anos,
terceiranista de medicina, foi submetido ao esmagamento dos dedos
com barras de metal. Outro preso, um ex-soldado da Polícia Militar,
apanhou de palmatória nas mãos e na planta dos pés. “A palmatória
é um instrumento com o qual se pode bater num homem horas a fio,
com toda a força”, explicou o tenente. No pau-de-arara penduraram
Zezinho, que estava na PE por conta de crimes militares. Ailton expli-
cou — enquanto os soldados demonstravam — que essa modalidade
de tortura ganhava eficácia quando associada a golpes de palmatória ou
aplicações de choques elétricos, cuja intensidade aumenta se a pessoa
está molhada. “Começa a fazer efeito quando o preso já não consegue
manter o pescoço firme e imóvel. Quando o pescoço dobra, é que o
preso está sofrendo”, ensinou o tenente-professor.

O Exército brasileiro tinha aprendido a torturar (GÁSPARI, 2014, p.


363-364).

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

A descrição acima apresenta alguns dos métodos de tortura utilizados pelo


governo para conseguir informações sobre as organizações consideradas crimi-
nosas e seus membros, opositores do governo. Milhares de pessoas foram presas
e torturadas ao longo da ditadura militar. O Estado, ao admitir que torturou os
presos durante o regime militar, justificou a prática como única forma de erra-
dicar de vez o terrorismo instalado no Brasil a partir da formação dos grupos
revolucionários que partiram para a luta armada.
O governo militar adotou a prática da tortura desde que Castello Branco
assumiu a presidência do Brasil e esta atingiu seu ápice como política do Estado

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
entre 1969 e 1978. Lilia Schwarcz e Heloisa Starling (2015, p.460) ressaltam que
o uso dos métodos de tortura pelo Estado no período da ditadura militar contou
com uma ampla rede de instituições e de indivíduos que legitimaram a prática
por meio da falsificação de depoimentos, julgamentos, relatórios de autópsias e
exames de corpo de delito. As autoras ainda destacam que a prática da tortura
no Brasil “era uma máquina de matar concebida para obedecer a uma lógica
de combate: acabar cm o inimigo antes que ele adquirisse capacidade de luta”
(SCHWARCZ; STARLING ,2015, p. 461).

Os métodos de tortura usados pelo Estado ditatorial do Brasil entre 1964 e


1978 mataram milhares de pessoas. Como a ditadura não confirmava oficial-
mente a prática, os torturadores sumiam com os corpos dos mortos durante
as sessões de tortura e, por essa razão, muitas famílias ainda hoje não sabem
ao certo o que aconteceu com familiares desparecidos durante o regime
militar.
Para ter acesso a mais informações, documentos, imagens e depoimentos
relacionados a esse tema, acesse o conteúdo disponível em: <http://www.
documentosrevelados.com.br/>. Acesso em: 09 jun. 2015.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
245

A tortura foi institucionalizada no regime militar como prática de interro-


gatório devido a sua eficácia. Muitos guerrilheiros e articuladores contrários ao
regime militar foram presos a partir das confissões obtidas nas sessões de tor-
turas. Os interrogatórios dos presos “suspeitos” de tramar contra os militares
aconteciam em locais distantes da agitação social, uma vez que a maneira como
eram conduzidos os interrogatórios não devia ser de conhecimento público.
Os militares criaram vários órgãos cuja função era monitorar, controlar e con-
ter o avanço dos movimentos políticos e sociais contrários ao regime. Essa rede
de controle criada pelo governo era composta pelo Centro de Informações da
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Marinha (CENIMAR), a Operação Bandeirantes (OBAN), o Destacamento de


Operações e Informações e o Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-
CODI), além do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), a polícia
política do regime militar.No momento de maior agitação social, exigia-se que
o candidato a uma vaga de emprego apresentasse um documento fornecido
pelo DOPS atestando que ele não estava envolvido com atividades considera-
das subversivas.

O “Endurecimento” do Regime e a Resistência Popular


V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Relatório do Departamento de Ordem Política e Social do Estado de São Paulo sobre práticas
consideradas subversivas
Fonte: Palmar (online).

A sede do DOPS no Rio de Janeiro foi inaugurada em 05 de Novembro de


1910 e serviu como sede para os principais departamentos de polícia dos
vários governos do Brasil.
Para conhecer um pouco mais da história do DOPS e de outros departamen-
tos e instrumentos utilizados durante o período da ditadura militar para
investigações e a prática dos interrogatórios com o uso da tortura – como
o DOI e a Casa da Morte, acesseo conteúdo disponível em: <http://www.
cartografiasdaditadura.org.br>. Acesso em: 09 junho 2010.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
247

AS ESPERANÇAS RENOVADAS: O LONGO CAMINHO


DA REDEMOCRATIZAÇÃO DO PAÍS

Em 1969 Costa e Silva sofreu um derrame e se afastou da presidência. De acordo


com a Constituição, o vice-presidente deveria assumir o comando do país em seu
lugar. Entretanto, os militares não permitiram que o vice, Pedro Aleixo, tomasse
posse, uma vez que ele era civil e contrário ao AI-5. Para impedir a posse de
Aleixo, os militares promulgaram o AI-12, em agosto de 1969, determinando que
a presidência da República fosse ocupada por uma junta militar, formada pelos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

ministros Lira Tavares, do Exército, Augusto Redemaker, da Marinha e Márcio


de Sousa e Melo, da Aeronáutica (FAUSTO, 1995, p. 481).
A Junta Militar aumentou a repressão intensificando as torturas por meio da
criação do AI-13, que determinava o banimento de qualquer indivíduo que repre-
sentasse uma ameaça ao governo, e do AI-14, que estabeleceu a pena de morte
em caso de guerra externa, psicológica ou subversiva (RECCO, 2010, p. 118).
Em outubro de 1969 a Junta Militar marcou para o dia 25 do mesmo mês as
eleições para presidente e vice-presidente do Brasil. A escolha dos nomes que
ocupariam os respectivos cargos de 25 de outubro de 1969 até 15 de março de
1974 seria feita de maneira indireta, por meio do voto do Congresso Nacional.
O candidato escolhido para
assumir a presidência foi o
general Ernesto Garrastazu
Médice. Seu vice era o ex-mi-
nistro Augusto Redemaker.
Médice iniciou seu
governo com uma nova
Constituição que significou
uma limitação ainda maior
às liberdades e aos direitos
civis. De acordo com Elio
Gáspari (2014, p. 134)

Sessão do Congresso que elegeu o pemedebista Tancredo Neves à


presidente da República
Fonte: Porto (online).

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

à natureza ditatorial do regime, Médice acrescentou a blindagem da


máquina de comando da Presidência. Já na primeira reunião do mi-
nistério informou aos seus colaboradores que o SNI funcionaria como
supervisor ostensivo da administração.

O “MILAGRE ECONÔMICO”

Entre 1968 e 1973 a economia brasileira cresceu vertiginosamente, mostrando que


as diretrizes econômicas elaboradas pelo ainda Ministro da Fazenda Delfim Netto

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tinham alcançado seus objetivos. Na década de 1970, embalados pela conquista
do tricampeonato pela sele-
ção brasileira de futebol na
Copa do Mundo realizada no
México, os brasileiros viviam
um momento de euforia,
embalados pelos versos de
Pra frente Brasil, que repre-
sentava o bom momento
econômico do país.

Presidente Médici segurando a taça da Copa do Mundo de 1970,


vencida pela seleção brasileira
Fonte: COPA DE 1970... (online).

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
249

Segundo José Pedro Macarani


O ano de 1970 iniciou-se trazendo sinais incômodos em matéria de
inflação: de janeiro a março, enquanto o ICV acumulou alta de 4,4%
(contra 5,6% em igual período de 1969), o IPA registrou forte acele-
ração, atingindo 5,5% (oferta global – 2,5% em 1969) e 4,7% (dispo-
nibilidade interna – 2,3% em 1969). A perspectiva de manutenção do
patamar inflacionário suscitava inquietação em certos setores: volta e
meia, pleitos em favor da adoção de um tratamento de choque seriam
veiculados. Delfim os rejeitou sucessivas vezes ao longo do ano (MAS-
CARANI, 2005).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

No início da década de 1970, a inflação foi controlada e estabilizada em 20% ao


ano. As exportações voltaram a crescer, registrando um aumento de 23% em
relação ao final dos anos 1960, condicionados pelo incentivo do governo à ativi-
dade exportadora. Os setores da construção civil e da indústria automobilísticas
alcançaram índices inéditos e o Brasil transformou-se na décima economia mun-
dial (GÁSPARI, 2014, p. 212).
Além da alta nos índices de exportações e do crescimento industrial ocor-
rido nesse período, o Brasil contou também com o desenvolvimento de setores
importantes para sustentar e para acompanhar esses índices, como destaca
Daniel Aarão:
Mais do que aumentos quantitativos, promoviam-se mudanças quali-
tativas: o aparecimento de uma indústria petroquímica; o desenvolvi-
mento das telecomunicações, integrando o país; a expansão das rodo-
vias e do complexo hidrelétrico; a constituição de um sistema bancário
comparável ao que havia de mais sofisticado no mundo. No campo, o
projeto reformista fundamentado na distribuição da terra e na agricul-
tura familiar cedera lugar, com estímulo do governo, a grandes unida-
des agrícolas mecanizadas – aumentando a produção e possibilitando
o aparecimento de novas culturas, como a da soja, campeã das expor-
tações, e a dos cítricos. No comércio internacional, para além do já re-
ferido crescimento, a introdução de uma proporção cada vez maior de
manufaturados na pauta de exportações, fato amplamente divulgado
nas propagandas governamentais (REIS FILHO, 2014, p. 80).

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

O direcionamento econômico adotado por Delfim Netto no governo Médice


baseava-se na intervenção do Estado no desenvolvimento, a partir da regula-
ção e da associação do capital estrangeiro. O resultado foi positivo e o governo
Médice aproveitou o bom momento econômico do país para divulgar a ima-
gem da ditadura como promotora do progresso e do desenvolvimento do Brasil.
O governo Médice vendeu a ideia de um Brasil grande, transformado em
grande potência, país do melhor futebol do mundo. A imprensa, com poder de
atuação limitado pela censura, foi utilizada como instrumento de propaganda
da prosperidade assegurada pela ditadura. A censura imposta à imprensa pelo

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
AI-5 determinava que
Não deverão ser divulgadas notícias que possam:

-propiciar o incitamento à luta de classes (...)

-comprometer no exterior a imagem ordeira e econômica do Brasil

-tumultuar os setores comerciais, financeiro e de produção (...)

-veicular atividades subversivas, greves ou movimentos operários (RE-


SISTÊNCIA, 1969 apud GÁSPARI, 2014, p. 216).

A mensagem era clara: somente seria divulgado o que o governo militar jul-
gasse não ser uma ameaça ao regime ou à imagem de progresso e de desen-
volvimento do Brasil. A imprensa estava amordaçada, a serviço do governo.
E hoje, a imprensa continua a serviço dos governos?
Fonte: a autora.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
251

Diante da euforia gerada pelo desenvolvimento econômico entre o fim da


década de 1960 e o início dos anos 1970, escondiam-se as contradições da reali-
dade brasileira. O avanço na área econômica não foi acompanhado por melhorias
no setor social, como próprio presidente Médice reconheceu, a economia ia bem,
mas o povo ia mal (REIS FILHO, 2014, p. 85).
Enquanto a classe média alta conseguiu aumentar seu poder de consumo,
as camadas populares viram os salários ser comprimidos e o poder aquisitivo
diminuir, percebendo-se uma nítida concentração de renda no período e a ele-
vação da desigualdade social. Além disso, os investimentos não se refletiram
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

em áreas básicas como saúde, educação e alimentação, setores essenciais para o


desenvolvimento humano.

O GOVERNO DE ERNESTO GEISEL

O general Ernesto Geisel assumiu a presidência da República em 1974 e pos-


suía um perfil mais próximo do ex-presidente Castello Branco, ou seja, não fazia
parte da corrente linha dura dos militares que ocuparam a presidência depois
de Castello. Em seu governo, Geisel deu os primeiros passos para a redemocra-
tização do país, fato que levaria ainda muitos anos para se consolidar, mas que
o general pretendia conduzir, estabelecendo uma “democracia conservadora”
(FAUSTO, 1995, p. 490).
Em 1974, nas eleições para o Congresso Nacional, o MDB conquistou a maio-
ria das cadeiras, uma derrota significativa para a ARENA. Conforme destaca
Daniel Aarão (2014, p. 107), “a oposição legal, nove anos depois da instauração
do bipartidarismo, passara a ter voz na cena política, e suas concepções sobre a
distensão, seu sentido e ritmos, não eram as mesmas do governo presidido por
Geisel”.

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

Manchetes na imprensa sobre as eleições para o Congresso Nacional em 1974


Fonte: Jornal do Senado (online).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A vitória do MDB no Congresso trouxe novo ânimo para as camadas popu-
lares e para os que há anos eram reprimidos ou esquecidos pelo regime militar,
pois representou a esperança de que o confronto direto, na esfera política, ame-
nizasse os efeitos do regime na esfera social.
Ao longo de seu governo, Geisel adotou uma postura que ora parecia defen-
der a liberalização do regime ora reforçava o seu caráter autoritário e ditatorial.
Em 1975 suspendeu a censura imposta ao jornal O Estado de São Paulo, sob a
direção de Júlio de Mesquita Neto – embora outros veículos da imprensa conti-
nuassem contando com a presença dos censores em suas redações. Entretanto,
no mesmo ano, as denúncias das prisões e das torturas alcançaram números alar-
mantes (GÁSPARI, 2014). Para tentar conter as acusações por conta das torturas
– vindas inclusive de outros países – Geisel buscou meios para limitar o uso da
tortura como prática da polícia, o que não significa dizer que ela deixou de existir.
Em outra ocasião, em 1977, Geisel apresentou o Pacote de Abril, um conjunto
de mudanças que tinha por objetivo impedir o crescimento da oposição no cená-
rio político – como ocorreu em 1974 e 1976 nas eleições estaduais e municipais
– e assegurar o poder nas mãos dos militares. No entanto, em 1978, o presidente
iniciou um diálogo com líderes do MDB, da Academia Brasileira de Imprensa
(ABI) e com a CNBB cuja intenção era discutir o caminho a ser seguido na con-
dução da restauração das liberdades políticas. Outra medida importante também
no governo Geisel foi a suspensão do AI-5 em 1979, por meio da ementa cons-
titucional nº 11(FAUSTO, 1995, p. 493).

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
253

A revogação do AI-5 foi um importante passo na direção da redemocrati-


zação do país, uma vez que a liberdade de organização da oposição e da
imprensa foram recuperadas, mesmo que o fantasma da repressão ainda
pairasse sobre a sociedade.
Fonte: a autora

O cenário econômico herdado por Geisel era representado pelos reflexos da


crise do petróleo ocorrida em 1973, quando os países árabes, grandes produtores
do produto, elevaram os preços da matéria-prima numa tentativa de conquistar
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

o apoio do Ocidente, dependentes da produção petrolífera do Oriente, contra os


avanços expansionistas de Israel. Com o chamado primeiro choque do petróleo,
o Brasil viu sua economia, em franca expansão até então, se retrair.
A postura do governo Geisel foi de continuar investindo no crescimento do
país, incentivando o desenvolvimento dos setores ligados ao petróleo, ao aço,
ao alumínio e aos fertilizantes para garantir a autonomia do Brasil. O II Plano
Nacional de Desenvolvimento, nome dado à política econômica do governo
Geisel e que se baseava na substituição das importações, mostrou-se arriscado
e não obteve os resultados esperados a longo prazo, devido ao contexto interna-
cional e à elevação das taxas de juros (FAUSTO, 1995, p. 495).

O GOVERNO FIGUEIREDO: CRISE ECONÔMICA E ABERTURA POLÍTICA

O general João Baptista Figueiredo assumiu a presidência da República em 1979


e foi o último presidente militar do Brasil, conduzindo o processo de redemo-
cratização do país.
A primeira medida que merece atenção no governo de Figueiredo e que repre-
sentou um passo importante no caminho da recuperação das liberdades civis foi
a Lei da Anistia, promulgada em agosto de 1979. Por essa lei, todos os crimes
políticos cometidos por cidadãos brasileiros foram perdoados (SKIDMORE,
2003, p.259). A partir da Lei da Anistia, os exilados dos tempos mais repressi-
vos da ditadura puderam retornar ao país. Além disso, os beneficiados pela lei
recuperaram os seus direitos políticos.

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

A Lei da Anistia de 1979 concedeu o perdão aos presos políticos e aos exila-
dos do período da ditadura, inclusive aos acusados pelos crimes de tortura.
Fonte: a autora.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A Comissão Nacional da Verdade no ano de 2014 pediu a revisão da Lei de
Anistia de 1979 por considerar que ela viola leis internacionais e impede
a punição daqueles que cometeram crimes contra os direitos humanos no
período da ditadura militar no Brasil.
Para saber mais acesseo conteúdo disponível em: http://www.cartacapital.
com.br/sociedade/comissao-da-verdade-pede-a-revisao-da-lei-da-anis-
tia-3171.html. Acesso em: 09 jun. 2015.

O caminho percorrido por Figueiredo para levar o Brasil à redemocratização


não foi fácil. A corrente linha dura das Forças Armadas não concordava com
sua visão e impuseram obstáculos à sua conclusão. Uma série de atentados e
sequestros contra jornais, instituições ou indivíduos da oposição ao regime foram
cometidos entre 1979 e 1981, numa tentativa de conter o avanço oposicionista.
Em 1979 Figueiredo conseguiu aprovar no Congresso a Nova Lei Orgânica
dos Partidos, que extinguia a ARENA e o MDB e determinava que as novas
organizações partidárias acrescentassem em sua nomenclatura a palavra Partido
(FAUSTO, 1995, p. 506). Essa lei representou um avanço no cenário político bra-
sileiro, visto que possibilitou a retomada do sistema de multipartidarismo e a
organização da oposição de acordo com as diferentes correntes ideológicas que
existiam em seu seio.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
255

Com a publicação da nova lei, os antigos partidários da ARENA – militares


e civis que apoiavam o governo e a linha dura da ditadura – organizaram-se sob
a legenda do Partido Democrático Social (PDS) e o MDB transformou-se no
Partido do Movimento Democrático do Brasil (PMDB). Foram criados ainda o
Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido
Democrático Trabalhista (PDT) e o Partido Popular (PP).
Nesse cenário de multiplicação dos partidos políticos, ocorreram eleições para
o Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais. A novi-
dade das eleições desse ano foi o voto direto para a escolha dos governadores, e
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

mesmo com a pluralidade partidária, os partidos que antes eram representados a


ARENA e o MDB conquistaram a maioria dos votos (REIS FILHO, 2014, p. 140).
Embora o PDS tenha recebido a maioria dos votos na Câmara dos Deputados,
somados os votos dos outros partidos, ele aparecia em desvantagem. De acordo
com Daniel Aarão (2014, p. 141), esse quadro mostrava
O inegável deslocamento dos votos a favor das oposições, pelo menos
nos centros mais importantes do país. Ele exprimia a crítica às heranças
da ditadura e a formas diversas de autoritarismo e a inquietação frente
à incapacidade do governo de lidar com as condições econômicas ad-
versas (REIS FILHO, 2014, p. 140).

As condições econômicas a que se refere o autor dizem respeito à crise herdada


por Figueiredo do governo anterior e agravada com o advento o segundo cho-
que do petróleo, em 1979. Segundo Bóris Fausto,
Um segundo choque do petróleo, com a consequente elevação de pre-
ços, agravou o problema do balanço de pagamentos. As taxas interna-
cionais de juros continuaram subindo, complicando ainda mais a situ-
ação. A obtenção de novos empréstimos era cada vez mais difícil e os
prazos para pagamentos se estreitavam (FAUSTO, 1995, p. 502).

O resultado dessa crise foi a dura crítica ao governo de Figueiredo decorrente do


aumento exorbitante da dívida externa e a redução da taxa de crescimento, oca-
sionando o aumento da inflação e do desemprego (REIS FILHO, 2014, p. 141).

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

A CAMPANHA PELAS DIRETAS JÁ!

O agravamento da crise econômica e o desgaste com os anos do regime militar


contribuíram para que, no final dos anos de 1970 e início dos anos 1980, os mili-
tares fossem perdendo o apoio de indivíduos de seu próprio universo. As novas
gerações de oficiais, formadas a partir de 1964, tinham uma linha de pensamento
diferente do alto comando das Forças Armadas e que controlavam a máquina
administrativa do país nas últimas décadas. Esses oficiais chocavam-se com as
denúncias de prisões arbitrárias e com os relatos de tortura e preocupavam-se

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
com a imagem que tinham no país (SKIDMORE, 2003, p. 260).
Em 1983, a população brasileira, sob a liderança do PMDB e do PT, foi às ruas
exigir o restabelecimento do
voto direto para presidente
da República. O movimento
pelas Diretas Já, como ficou
conhecida a manifesta-
ção liderada pela oposição
a Figueiredo, entrou para a
história como a maior mobi-
lização cívica da República
no Brasil (SCHWARCZ;
STARLING, 2015, p. 482).

Manifestação popular na campanha pelas Diretas Já.


Fonte: Bernardo (online).

A campanha das Diretas Já tinha dimensão cívica, natureza republicana e


jeito de festa. Foi concebida toda em amarelo, ideia do editor Caio Graco
Prado – filho do historiador Caio Prado Jr. – que apostava numa mobilização
alegre como um girassol e sustentada pela criatividade. Acertou em cheio.
Fonte: Schwarcz; Starling (2015, p. 483).

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257

A liderança do movimento era representada pelos principais nomes da opo-


sição naquele período: Ulysses Guimarães, Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando
Henrique Cardoso, Tancredo Neves e Franco Montoro, entre outros. Essas lide-
ranças realizaram inúmeros comícios no país, apoiados por intelectuais como
Celso Furtado, Antônio Cândido e Lygia Fagundes Telles; personalidades do meio
artístico como Chico Buarque de Holanda, Maria Bethânia, Juca de Oliveira, Fafá
de Belém, Paulinho da Viola e jogadores de futebol como Sócrates e Reinaldo
(SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 484).
Mesmo com a intensa mobilização da sociedade, a emenda que garantia o
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

voto popular e direto para as eleições presidenciais – batizada de emenda Dante


de Oliveira – não foi aprovada, pois, embora tenha recebido a maioria dos votos
no Congresso, não alcançou a quantidade de dois terços dos votos válidos.
Após a derrota no Congresso Nacional, articulou-se uma estratégia para lan-
çar a candidatura do governador de Minas Gerais, Tancredo Neves. Para tanto,
organizou-se a Aliança Democrática, formada por dissidentes do PSD que for-
maram O Partido da Frente
Liberal (PFL). Os membros
desse partido eram anti-
gos apoiadores do regime
militar, como José Sarney,
Antônio Carlos Magalhães
e Marco Antônio Maciel. O
partido lançou a candida-
tura de Tancredo Neves a
presidente com José Sarney
(PMDB) como vice-presi-
dente (REIS FILHO, 2014,
p. 145-146).
Artistas como Gilberto Gil e Chico Buarque apoiavam a
campanha das Diretas Já
Fonte: Jobim (online).

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

O programa político
de Tancredo Neves tinha
por objetivo concreti-
zar a redemocratização do
país, assegurando as elei-
ções diretas em todos os
níveis, a convocação de
José Sarnei e Tancredo Neves
uma Assembleia Nacional Fonte: Fundação Getúlio Vargas (online).
Constituinte e a promulgação

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
de uma nova Constituição. Com um programa de governo fundamentado em
um discurso que destacava uma mudança no governo, e não uma ruptura do
sistema político, Tancredo Neves conseguiu o apoio político que precisava para
conseguir se eleger e, em 15 de janeiro de 1975, ele foi eleito presidente do Brasil
(SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 486).
Embora tenha vencido a eleição com uma diferença esmagadora em relação
ao seu oponente, Paulo Maluf, Tancredo Neves nunca assumiu a presidência. Na
véspera de ser empossado, Tancredo Neves foi internado no Hospital de Base
em Brasília e submetido a uma cirurgia de emergência. Ele morreu no dia 21
de Abril de 1985.

A DEMOCRACIA ESTÁ DE VOLTA: A PRESIDÊNCIA DE JOSÉ SARNEY,


CRISE ECONÔMICA E A NOVA CONSTITUIÇÃO

Devido à doença de Tancredo Neves, o vice José Sarney tomou posse como pre-
sidente provisório, cargo que se tornou definitivo após a morte de Tancredo.
A posse de Sarney gerou certa frustração na sociedade, uma vez que ele sem-
pre estivera ao lado do regime militar, mudando de lado apenas nas vésperas
das eleições presidenciais. Por essa razão, os rumos que o país iria tomar a par-
tir daquele momento ainda eram incertos. De acordo com Daniel Aarão (2014,
p. 147), “saiu João Figueiredo, entrou Sarney, mas a prioridade da política eco-
nômica continuava a mesma: conter a inflação e refinanciar a colossal dívida
externa para evitar a moratória, um esforço que parecia perdido”.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
259

Para enfrentar a crise econômica, Sarney anunciou o Plano Cruzado e a cria-


ção de uma nova moeda, o Cruzado, que substituía a moeda anterior, o Cruzeiro.
Segundo Fabrício Augusto de Oliveira (1987, p. 13),
O diagnóstico governamental foi de ser a inflação brasileira, àquela al-
tura, de natureza predominantemente inercial. Em outras palavras, isto
significava que a inflação presente explicava-se pela inflação passada,
que se reproduzia através da existência de mecanismos formais e infor-
mais de indexação da economia. Nesse sentido, a causa da inflação era
a própria inflação. Para eliminar esse componente de caráter inercial
da inflação, dois pontos se tornaram nucleares no Plano: a desmonta-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

gem dos mecanismos de indexação da economia e o congelamento de


seus preços. Mas, para seu êxito, exigia-se que os fatores primários da
inflação, refletidos sob a forma de choques de oferta ou de demanda,
estivessem sob controle, de forma a não exercerem pressões altistas de
preços. A este respeito, a avaliação do governo foi bastante favorável.

Portanto, o Plano Cruzado consistiu no congelamento dos preços e das taxas


de juros por prazo indeterminado. Foi concedido um reajuste de 20% nos salá-
rios, o que causou euforia nos trabalhadores, que viram seu poder de comprar
aumentar. Além disso, a temida inflação foi reduzida a 2% ao mês (SKIDMORE,
2003, p. 272).
Para Oliveira (1987, p. 15),
A euforia consumista que se seguiu após o Plano deixou antever sérios
problemas de abastecimento que, entretanto, acreditava-se, passíveis de
correção, à medida que terminassem as negociações sobre as margens
de descontos nas vendas a prazo que percorriam o elo fornecedores
de matérias-primas/indústria/varejo; que as empresas retomassem seus
investimentos expandindo a oferta; e que o consumo arrefecesse, per-
dendo seu ímpeto inicial. A permanência dessa situação de desequilí-
brio entre a oferta e a demanda por mais tempo mostrou, entretanto,
que nem tudo era róseo no Plano Cruzado e que algumas correções
eram inadiáveis.

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

O Plano Cruzado apresentou os sinais de que não correspondia às reais


necessidades da economia brasileira nove meses depois de entrar em vigor. O
congelamento dos preços fez com que as mercadorias fossem comercializa-
das abaixo da tabela, isto é, sem margem de lucro para os comerciantes. Com o
aumento do consumo, os comerciantes contornaram o congelamento dos preços,
camuflando os reajustes necessários. Essa realidade criou o ágio, “uma quantia
cobrada por fora, acima do preço da tabela” (FAUSTO, 1995, p. 523), cobrado
principalmente nos produtos que começavam a desaparecer do mercado por
conta da demanda.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Além dos problemas causados pelo congelamento dos preços, outros fato-
res que contribuíram para o fracasso do Plano Cruzado foram a falta de controle
dos gastos públicos por parte do governo e o aumento considerável das impor-
tações em detrimento das exportações. Diante desse quadro, a inflação voltou a
crescer, atingindo índices que passavam dos 1000% ao ano.
Se no aspecto econômico o governo de José Sarney mostrou-se ineficiente,
no que diz respeito ao seu compromisso com a redemocratização do país ele con-
seguiu completar o longo processo iniciado no governo Geisel.
José Sarney iniciou seu governo mantendo algumas das propostas defendi-
das por Tancredo. Revogou as eleições indiretas, estabelecendo o voto direto para
todos os níveis e manteve para os ministérios os nomes escolhidos anteriormente
por Tancredo Neves. Além disso, Sarney ampliou o direito de voto para os anal-
fabetos e determinou a legalização de todos os partidos, permitindo que o PCB e
o PC do B saíssem da ilegalidade e atuassem livremente (FAUSTO, 1995, p. 519).
Mesmo comandando avanços importantes no processo de restauração das
liberdades e dos direitos civis, Sarney ainda demonstrava aspectos característicos
dos anos ao lado do regime militar. Ao assumir o comando do país, estabeleceu
a prorrogação de seu mandato presidencial para cinco anos e entrou em con-
flito com o Congresso Nacional durante o processo de elaboração da nova carta
constitucional do país.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
261

A nova Constituição do Brasil – em vigor até os dias atuais – foi entregue em


05 de outubro de 1988. Com ênfase em seu caráter nacionalista, reestabelecia os
direitos civis, assegurava as liberdades individuais e encerra de vez a ditadura.
Por deixar evidente o compromisso com a democracia, por meio da criação de
instituições sólidas capazes de enfrentar os períodos de instabilidade, assegu-
rando os direitos e liberdades do cidadão, a Constituição de 1988 foi chamada
de Constituição Cidadã (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 488).
O presidente da Assembleia Nacional Constituinte, deputado Ulysses
Guimarães, no discurso de promulgação do texto, salientou que a nova
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Constituição não era perfeita, mas seria pioneira.


Não é a Constituição perfeita, mas será útil, pioneira, desbravadora.
Será luz, ainda que de lamparina, na noite dos desgraçados. É cami-
nhando que se abrem os caminhos. Ela vai caminhar e abri-los. Será re-
dentor o caminho que penetrar nos bolsões sujos, escuros e ignorados
da miséria (GUIMARÃES, Ulysses. Disponível em: http://memoria.
ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-10-04/em-25-anos-constitui-
cao-cidada-foi-modificada-80-vezes. Acesso em 09 de junho de 2015).

O presidente da Assembleia Nacional Constituinte, deputado Ulysses Guimarães, no discurso de


promulgação do texto constitucional de 1988
Fonte: Arquivo Agência Brasil (online).

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

A SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA

O período que marca a consolidação da redemocratização do Brasil – a promul-


gação da Constituição de 1988 – está influenciado pela ascensão dos movimentos
sindicais, com o Partido dos Trabalhadores (PT) na dianteira da luta pelos direi-
tos dessa camada popular e pela emergência de novas ideias e projetos políticos
para a organização do país depois de um longo período nas mãos dos militares
e distantes da liberdade do exercício da cidadania plena.
O contexto internacional também se faz presente na realidade brasileira

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
nesse momento e o advento de teorias que acompanham as mudanças nas socie-
dades europeias refletem no Brasil, permitindo um diálogo entre os contrastes
das sociedades que possibilita a emergência e/ou a adaptação de teorias para a
realidade interna.
Entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX, emergiu na
Europa o conceito da social-democracia, uma ideologia que defendia a ideia de
que o capitalismo pode adquirir aspectos do socialismo, na busca pelo desenvol-
vimento de nações e de indivíduos. No Brasil, essa teoria foi a base ideológica
que fundamentou a criação do PSDB, logo no final da década de 1980.
A Constituição de 1988 levou um ano e oito meses para ficar pronta e ser
entregue ao Brasil, afastando de vez o fantasma da ditadura militar. Os debates
foram intensos e levou a uma cisão no partido do governo. O PMDB dividiu-se
entre os Progressistas e o Centro Democrático, ou Centrão, que agrupou uma
parte significativa da bancada no Congresso. Os que tinham tendências esquer-
distas dentro do PMDB formaram um novo partido, intitulado Partido da
Social Democracia Brasileira (PSDB), que contava com oito senadores e qua-
renta deputados representantes de dezessete Estados (SCHWARCZ; STARLING,
2015, p. 489).

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
263

De acordo com Thomas Skidmore,


O novo PSDB se definia como um partido social-democrático na tradi-
ção da Europa ocidental. Seus fundadores miravam-se no exemplo de
Felipe Gonzáles, o então bem sucedido primeiro-ministro da Espanha
que havia conduzido a transição do país à democracia. Eles também
admiravam os socialistas portugueses que finalmente haviam conse-
guido a mesma transição depois da queda da ditadura. Grosso modo,
aceitavam o capitalismo brasileiro, mas queriam moderar seus excessos
por meio de reformas governamentais. Como símbolo de seu partido,
escolheram o tucano, a colorida ave brasileira de enorme bico, um sím-
bolo que deliciou os cartunistas (SKIDMORE, 2003, p. 301).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Embora o PSDB nascesse sob a insígnia da social-democracia europeia, faltava a


ele fortalecer os laços com a classe trabalhadora, característica do regime europeu,
cujas influências encontram-se na ideologia socialista. Sua composição diversa
refletia-se na elaboração de suas bases ideológicas, que defendia
a consolidação da democracia brasileira, defesa do parlamentarismo,
reforma do Estado de modo a torná-lo ágil, transparente e acessível
ao controle público, privatização de determinadas empresas estatais,
abertura controlada ao capital internacional e enfrentamento do atraso
tecnológico do país em vários e diferentes setores da economia – em
especial, na indústria microeletrônica (SCHWARCZ; SATARLING,
2015, p. 489).

“Fundada, entre outras, nas ideias de Proudhn, na França, Robert Owen, na


Inglaterra, e, depois, de Marx, a social-democracia, com esse nome, nasceu
na Alemanha, com a fundação do SDAP – Partido dos Trabalhadores Social-
-Democratas (Sozial-Demokratische Abeiter Partei), em 1869”.
Fonte: Poggi (online)

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

“(…) é justamente na forma de definir o interesse público que uma nova


esquerda, se souber retomar os ideais e a tradição de tolerância da social-
-democracia, pode oferecer caminhos inovadores, porque inspirados numa
utopia viável. Nesta utopia, a esquerda não apenas descobre os movimen-
tos sociais, mas cria espaços públicos e institucionaliza mecanismos revita-
lizados de democracia participativa, que conciliam direitos e motivações
individuais com o fato de os indivíduos viverem situações comuns, coletivas
e também com o fato de que valores comuns devem ser a base das necessá-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
rias soluções de justiça social”.
Fonte: Cardoso (online).

O BRASIL NOS ANOS DE 1990: INSTABILIDADE ECONÔMICA,


IMPEACHMENT E UM NOVO PLANO ECONÔMICO

No final de seu governo, José Sarney contava com uma rejeição significativa,
devido ao fracasso de sua política econômica. Os brasileiros estavam ansiosos
pelas próximas eleições, que aconteceriam em 1989 e seriam as primeiras a deci-
direm-se pelo voto direto, depois de anos de votação indireta.
A esperança de renovação e de estabilidade econômica e social recaiu sobre
o candidato Fernando Collor de Mello (PRN), governador de Alagoas. Embora
desconhecido no cenário político nacional, Collor conquistou a população bra-
sileira com seu discurso de combate aos marajás. Seu principal concorrente nas
eleições de 1989 era o presidente do PT Luiz Inácio Lula da Silva, o Lula.
Em uma eleição apertada e que contou com a influência maciça da grande
mídia e com a manipulação de fatos e de informações sobre a vida política e
pessoal de Lula, Fernando Collor foi eleito presidente em 1989 e assumiu a presi-
dência no início de 1990, para um mandato de quatro anos e do qual só cumpriu
dois. Fernando Collor de Mello seria o primeiro presidente do Brasil a sofrer um
processo de impeachment.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
265

O governo de Collor foi uma decepção para o Brasil e significou o agrava-


mento da crise econômica. O plano econômico adotado por Collor, o Plano Collor
– anunciado pela ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello –, determinou
o bloqueio das “contas-correntes, das aplicações financeiras e das cadernetas de
poupança” (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 493). O dinheiro seria devol-
vido aos cidadãos dezoito meses depois, em parcelas dividas em doze vezes.
O pacote econômico trazia de volta o Cruzeiro e estabelecia ainda o congela-
mento dos salários e o aumento das tarifas dos serviços públicos. As tarifas das
importações brasileiras foram reduzidas, afetando os industriais que não tinham
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

condições de competir com o mercado internacional (SKIDMORE, 2003, p. 305).


O caos instalou-se no país diante da queda do poder aquisitivo, do consumo e
do aumento do desemprego.
As medidas de Collor não tiveram resultados e a inflação voltou a crescer.
Sua falta de vontade em dialogar com o Congresso contribuiu para o desgaste de
sua imagem entre a oposição e os movimentos de oposição cresceram. Em 1992
surgiram denúncias de que alguns grupos particulares eram beneficiados com
liberação de grandes somas de dinheiro do governo. Durante as investigações,
descobriu-se um forte esquema de corrupção dentro do governo, encabeçado
por Fernando Collor e seu ex-tesoureiro de campanha, Paulo César Farias
(SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 494).
As denúncias contra PC Farias e o presidente Collor ganhavam força e as
investigações mostravam atividades irregulares como a cobrança de propinas.
O próprio irmão de Fernando Collor, Pedro Collor, concedeu uma entrevista a
uma revista de grande circulação denunciando o esquema montado pelo irmão
e por seu tesoureiro.
Diante da comprovação das denúncias e da grande manifestação popular que
tomou conta das ruas do Brasil pedindo a cassação do mandato do presidente, o
Congresso Nacional instalou o processo de impeachment contra Fernando Collor.

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

A população que saiu às ruas em 1992 reivindicando o impeachment de


Fernando Collor foi chamada de “caras- pintadas”, devido ao fato de que a
grande maioria pintou o rosto com as cores da bandeira nacional.
Fonte: a autora.

Em 29 de dezembro de
1992, o Congresso Nacional
considerou Fernando Collor

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culpado e suspendeu seus
direitos políticos por oito
anos. Após o afastamento
de Fernando Collor, o vice-
-presidente Itamar Franco
assumiu a presidência,
completando os dois últi-
mos anos do mandato para
o qual havia sido eleito junto
Movimento dos caras pintadas
com Collor.
Fonte: Dutra (online).

Acusado e condenado por crime de corrupção, acusado de lavagem de di-


nheiro, uso de drogas, crime de extorsão e envolvimento com prostituição,
o ex-presidente Fernando Collor foi eleito Senador pelo Estado de Alagoas,
cargo que ocupa até os dias de hoje.
Fonte: a autora.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
267

Diante da crise econômica que assolava o Brasil, Itamar Franco chamou para
ocupar o cargo de Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, que tinha
a difícil tarefa de recolocar a economia brasileira no caminho do crescimento.
Fernando Henrique Cardoso e sua equipe elaboraram uma estratégia eco-
nômica que, de acordo com Skidmore,
Primeiro, descartou qualquer tratamento de choque, como o congela-
mento de preços ou salários. Segundo, delineou um orçamento equili-
brado para 1994 que o Congresso aprovou. Terceiro, criou uma tran-
sição em dois estágios para uma nova moeda (SKIDMORE, 2003, p.
311).
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A transição do Cruzeiro para o Real – precedida pela introdução da Unidade


Real de Valor (URV) ocorreu de maneira tranquila, mesmo diante da descon-
fiança dos brasileiros, já acostumados às turbulências e aos fracassos dos planos
econômicos anteriores. O chamado Plano Real obteve os resultados esperados e
a inflação começou a ser reduzida, caindo de 929% em 1994 para 22% em 1995
(SKIDMORE, 2003, p. 312).
A população perdeu o receio ante as novas medidas mostrando-se mais oti-
mista diante de uma moeda estável e de uma economia que voltava a crescer,
sem danos para os trabalhadores. A preocupação do governo sobre o futuro do
Plano Real foi dissipada ante o controle da economia nos meses subsequentes
à sua implantação.
No bojo do sucesso do Plano Real, Fernando Henrique Cardoso afastou-se
do ministério da Fazenda para concorrer às eleições presidenciais de 1994. Foi
eleito com 54% dos votos. Em 1997 o então presidente FHC criou uma emenda
constitucional que tornou possível a reeleição e foi eleito novamente para a pre-
sidência da República em 1998.

As Esperanças Renovadas: O Longo Caminho da Redemocratização do País


V

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro(a) aluno(a), nesta unidade buscamos percorrer o longo caminho dos anos
negros da história do Brasil até a restauração das liberdades e da democracia.
Nosso objetivo aqui foi apresentar a você como um país que se propunha ser
grande e austero mergulhou em um período de 21 anos de autoritarismo, de ter-
ror, de manipulação e de cassação dos direitos civis.
O período da ditadura militar no Brasil não deve ser esquecido. Deve estar
sempre na memória dos brasileiros para que possamos valorizar as conquistas

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
democráticas que alcançamos ao preço das lágrimas e do sangue daqueles que
não sobreviveram ao regime e não puderam desfrutar novamente da liberdade.
Que as marcas deixadas pelos anos do regime militar não nos deixe come-
ter erros de análise e nos permita olhar para os momentos de crises sem o desejo
de buscar soluções radicais ou que em outros momentos mostraram-se equivo-
cadas. Que os breves avanços do passado não nos faça esquecer que os fins não
justificam os meios.
Recuperar o direito de exercer a cidadania como um todo foi uma grande
vitória para o povo brasileiro, e mesmo que as conjunturas políticas, econômi-
cas e sociais ainda não sejam as sonhadas e nem as mais adequadas, o fato de
hoje podermos discordar do sistema, expressar nossas opiniões e lutar pelo que
achamos correto nos ajuda a refletir sobre o que significou os 21 anos de silên-
cio que os militares impuseram ao Brasil.
Enquanto futuro professor de História é seu dever impedir que os fantas-
mas do passado ameacem nosso futuro, levando o conhecimento para sua sala
de aula e instigando o desenvolvimento de um pensamento crítico.

OSANOSDECHUMBO:ADITADURAMILITARNOBRASILEOLONGOPROCESSODEREDEMOCRATIZAÇÃO
269

1. Entre 1964 e 1985 o Brasil viveu sob o signo da Ditadura Militar, um período no
qual a democracia sofreu um duro golpe com supressão dos direitos e das li-
berdades individuais. Após a leitura do livro que se apresenta, discorra sobre o
significado que as palavras liberdade e democracia representa para você.
2. Leia o depoimento de Fernando Palha Freire um comerciante que atualmente
trabalha na cantina do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ (IFCS), e
que foi militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN) durante a ditadura: “Lá
no DOI-CODI comia tudo, choque, pau-de-arara, afogamento, pancada. Lá que
eu descobri esse termo, que fulano virou presunto, né? Porque você fica igual a
um presunto mesmo, porque eles te dão pancadas localizadas” (DESTACAMEN-
TO...). Fundamentando-se nas análises propostas pelo material apresenta-
do, elabore um texto de no máximo 10 linhas discorrendo acerca de suas
opiniões e concepções sobre os métodos de investigação e de repressão
adotados pelo regime militar no Brasil.
Resposta Pessoal
3. Entre 1968 e 1976 a economia brasileira cresceu vertiginosamente, mostrando
que as diretrizes econômicas elaboradas pelo ainda Ministro da Fazenda Delfim
Netto tinham alcançado seus objetivos. Com relação ao período do “milagre eco-
nômico”, assinale a alternativa correta.
a) O “milagre econômico” refere-se ao período em que o presidente Castello Branco
adotou medidas que elevaram o desenvolvimento econômico por meio do cha-
mado neoliberalismo.
b) A euforia gerada pelo desenvolvimento econômico ocorrido entre o fim da déca-
da de 1960 e o início dos anos 1970 era o reflexo da ascensão das camadas mais
baixas da sociedade, beneficiadas pelas novas medidas econômicas.
c) A participação do Brasil na Copa do Mundo do México em 1970 foi usada como
propaganda pelo governo Médice para divulgar o enriquecimento da população
como um todo.
d) A imprensa brasileira teve liberdade para mostrar a realidade do Brasil diante
dos resultados das medidas econômicas adotadas por Delfim Netto durante o
governo Médici.
e) O direcionamento econômico adotado por Delfim Netto no governo Médici ba-
seava-se na intervenção do Estado no desenvolvimento, a partir da regulação e
da associação do capital estrangeiro.
4. Em seu governo, Geisel deu os primeiros passos para a redemocratização do
país, fato que levaria ainda muitos anos para se consolidar no Brasil. Acerca dos
fatos que marcaram o processo de redemocratização do Brasil, leia as alterna-
tivas abaixo.
I. Ao longo de seu governo, Geisel adotou uma postura que ora parecia defender a
liberalização do regime ora reforçava o seu caráter autoritário e ditatorial.
II. A primeira medida que merece atenção no governo de Figueiredo e que repre-
sentou um passo importante no caminho da recuperação das liberdades civis foi
a Lei da Anistia, promulgada em agosto de 1979.
III. Em 1983, a população brasileira, sob a liderança do PMDB e do PT, foi às ruas
exigir o reestabelecimento do voto direto para presidente da República.
IV. A redemocratização do país só foi concluída no governo FHC, com a implantação
do Plano Real, que beneficiou toda a população, acabando com as desigualda-
des sociais.
Estão corretas as alternativas:
a) I.
b) II e IV.
c) I e III.
d) II.
e) I, II, III.
271

A DITADURA, AS ARTES E A CULTURA


Entre a ditadura, que não foi um monólito mudando segundo as circunstâncias, e a cul-
tura, extraordinariamente diversa no caso do Brasil e também mutante, as relações fo-
ram muito complexas.
Em seu primeiro governo a ditadura pareceu tolerar ou negligenciar a cultura de protes-
to (música, cinema, literatura, artes plásticas) elaborada por artistas e intelectuais que,
através de sua arte e de seu humor, criticavam a censura e o regime, incentivavam a re-
beldia e denunciavam o terrorismo cultural. No momento seguinte, no entanto, no agita-
do ano de 1968, embora o gênero florescesse, acirrou-se a censura e apareceram grupos
paramilitares de direita ameaçando e, às vezes, atacando manifestações artísticas. Com o
AI-5, diminuíram drasticamente, embora não fossem extintas as margens para este tipo
de arte comprometida com as lutas sociais e os programas políticos derrotados em 1964.
Houve, contudo, manifestações culturais, outras extraordinariamente populares que
não tiveram senão problemas secundários com a ditadura e seus censores. A Jovem
Guarda e os grupos nacionais de rock’n roll, com ritmos e temáticas que pareciam longe
da dimensão política; a música sertaneja, que preservou e aumentou sua audiência e
que também frequentava pouco as ásperas trilhas dos embates contra a ditadura; os
programas humorísticos televisivos, ouvidos e vistos por milhões de pessoas; as novelas
que, sobretudo a partir de Beto Rockfeller (o anti-herói que só queria subir na vida), tor-
naram-se um ingrediente essencial da cultura popular nacional.
Ao longo dos anos 1970 e cada vez mais, a vitória do projeto de modernização conserva-
dora, a urbanização e a industrialização intensas do País, a revolução nas comunicações,
a integração nacional pelas redes de televisão, entre outros fatores, iriam suscitar temá-
ticas, abordagens e polarizações (moderno X arcaico) que pareciam distanciar o Brasil
do período anterior ao golpe de 1964.
Neste quadro houve a possibilidade de convergências e alianças imprevistas, como a de
autores de tradição de esquerda criarem e divulgarem seus trabalhos (novelas) através de
redes televisivas notórias adeptas do regime ditatorial, mesmo que, eventualmente, tives-
sem dificuldades com a censura governamental. É que, no caso, embasavam a aliança afi-
nidades comuns tecidas em torno de valores modernos e progressistas, compatíveis com
a sociedade que emergia como resultado dos alucinados anos do milagre econômico.
O mesmo aconteceu com o cinema, onde a Embrafilme, agência estatal, não se privou
de financiar filmes nestas mesmas bases explorando as relações pessoais, dramas ínti-
mos ou as questões dos costumes, às vezes abordadas de ângulos inovadores.
A cultura de protesto não desapareceu. Permaneceu nas margens e tornou a aflorar nos
últimos anos da ditadura, sobretudo com o fim da censura, mas sem a relevância que
fora a sua logo depois da vitória do golpe. Mudara o País, e radicalmente ensejando no
mesmo movimento a mudança dos padrões culturais.
Fonte: Reis Filho e Rollemberg (online).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Coleção: Ditadura
Títulos: A Ditadura Envergonhada; A Ditadura
Escancarada; A Ditadura Derrotada; A Ditadura
Encurralada.
Autor: Elio Gápari
Editora: Intrínseca
Sinopse: Nessa coleção o autor faz uma análise minuciosa
do período em que o Brasil viveu sob a égide do regime
militar. A coleção apresenta embasamento histórico e
conta com documentos como depoimento de alguns dos
personagens do período.

Título: Zuzu Angel


Ano: 2006
Direção: Sérgio Rezende
Sinopse: Zuzu Angel retrata a história da estilista brasileira
que entre os anos 1960 e 1970 tivera um grande sucesso
tanto no Brasil quanto no exterior, chegando a exibir sua
coleção em Nova Iorque. O filme aborda a luta de Zuzu para
recuperar o corpo de seu filho, o estudante de economia
e militante Stuart Jones que havia sido preso, torturado e
morto pela ditadura militar. Em busca da verdade sobre o que
aconteceu com seu filho e pela recuperação de seu corpo,
Zuzu entrou em conflito com o regime militar.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Título: O que é isso companheiro?


Ano: 1997
Direção: Bruno Barreto
Sinopse: O filme foi lançado em 1997 e dirigido por Bruno Barreto
aborda a organização de grupos guerrilheiros no Brasil durante a
ditadura militar. No filme é retratado o sequestro do embaixador dos
Estados Unidos no Brasil pelo grupo de guerrilheiros que é usado para
negociar a libertação de presos políticos.

Título: Geraldo Vandré quebra o silêncio após 37 anos e fala da Ditadura


O cantor e compositor Geraldo Vandré, que no período do regime militar virou ídolo
de uma geração com a composição da música Pra Não Dizer que não Falei das Flores,
expõe suas ideias e reflexões sobre o período militar, além de fazer uma análise sobre a
evolução político-econômica do país pós ditadura. O compositor também fala sobre as
características culturais do país na contemporaneidade.
Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=OpUcFX2qVFA>. Acesso em: 14
jul. 15.

Material Complementar
275
CONCLUSÃO

Caro(a) aluno(a), chegamos ao fim de mais uma jornada de estudos, que nos per-
mitiu viajar pela história do Brasil, conhecer e analisar as circunstâncias e as conjun-
turas que permearam o processo de formação e de evolução da nossa sociedade.
Ao nos debruçarmos sobre o período que abrange o momento da emancipação
política do Brasil em relação a Portugal até o momento em que o então Ministro
da Fazenda Fernando Henrique Cardoso (PSDB) assume a presidência do Brasil na
década de 1990, nosso objetivo foi guia-los e orientá-los no estudo e na análise da
evolução histórica do Brasil, levando-o a perceber as rupturas e as continuidades
presentes em nossa história.
Nas unidades I e II, abordamos o período imperial brasileiro, destacando os preâm-
bulos da construção de uma identidade nacional, uma vez que os antigos laços po-
líticos com Portugal foram rompidos, mas os aspectos culturais daquele país mistu-
ravam-se aos costumes brasileiros. Aliás descobrir quem eram os brasileiros daquele
período consistiu-se em uma tarefa longa e muitas vezes injusta para os indivíduos
daquele momento.
No final da unidade II e ao longo da unidade III, discorremos sobre as conjunturas
políticas, econômicas, sociais e culturais que marcaram o nascimento e a consoli-
dação da República no Brasil, uma República nascida da complexa combinação de
um discurso baseado nos ideais europeus do iluminismo e liberalismo com a manu-
tenção do regime escravocrata, o qual se caracterizava por privar o homem de sua
liberdade.
Na unidade IV, vimos como, mesmo com o fim da escravidão, a democracia e a liber-
dade no Brasil ainda não eram para todos. Assistimos a insurreição de líderes que
manipularam e que cercearam direitos fundamentais dos brasileiros, conquistados
a duras penas, e, na unidade V, vimos como os conceitos de democracia e de liberda-
de foram cortados da vida dos brasileiros ao longo de duros 21 anos, no momento
em que os militares estiveram no poder.
Esperamos, caro(a) aluno(a), que a vontade de se aprofundar nos temas discutidos
ao longo do curso leve você ao caminho da pesquisa, da busca incansável pelo co-
nhecimento, para o seu crescimento e daqueles que com você aprenderá!
277
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291
GABARITO

UNIDADE I
1. O que podemos observar das discussões ocorridas na Assembleia Constituinte
sobre o tema, é que a parcela dos brasileiros que não correspondiam aos euro-
peus ou a seus descendentes foram excluídos do processo de constituição do
Estado brasileiro, em uma negação da cultura dos povos que aqui já se encon-
travam antes da chegada do branco europeu – como os índios – bem como a
negação da heterogeneidade que caracterizava a sociedade brasileira.
2. Internamente eclodiram manifestações e motins contrários ao governo de D.
Pedro I e à repressão sofrida por aqueles que se opunham à administração do
imperador. A situação de descaso com a maioria dos brasileiros, os de camadas
mais inferiores e a concessão de privilégios a portugueses imigrados distancia-
vam D. Pedro I da população local. Além disso, o seu amplo poder conquistado
por meio da criação do Poder Moderador e sua política externa não agradavam
a elite da época. Externamente, a influência da Inglaterra ao longo de todo o
Primeiro Reinado gerou desconfiança e preocupações por parte das elites bra-
sileiras, que temiam que o imperador cedesse à pressão inglesa pelo fim da es-
cravidão no Brasil, fato que prejudicaria essa camada social, colocando em risco
seus interesses e privilégios.
3. A alternativa correta é a D.
4. A alternativa correta é a D.

UNIDADE II
1. Espera-se que o(a) aluno(a) destaque as forças conflitantes, que estavam por trás
do início do governo de D. Pedro II, representadas na formação dos Partidos Li-
beral e Conservador, com as quais o imperador recém-coroado precisou lidar
e equilibrar os antagonismos presentes em ambos os partidos. Deve destacar
também que o imperador manteve-se distante dos acontecimentos e agitações
políticas do Brasil, exercendo seu comando por meio da nomeação de ministros
a quem confiava a direção do país, supervisionando seus atos.
2. A publicação da Lei de Terras em 1850 significou o alinhamento da política cen-
tral com o novo contexto econômico do Brasil, caracterizado pela desestrutura-
ção do complexo agroexportador açucareiro e a ascensão da atividade cafeeira,
com o consequente deslocamento do centro econômico da região Nordeste
para o Sudeste do país. Nesse sentido, a lei de 1850 veio ao encontro dos interes-
ses da aristocracia cafeeira, representando uma forma de proteger seus investi-
mentos no desenvolvimento da produção das tentativas ou das possibilidades
de indivíduos de outras camadas sociais terem acesso à terra.
3. A alternativa correta é a D.
4. A alternativa correta é a E.
GABARITO

UNIDADE III
1. A oligarquia e os proprietários rurais defendiam reformas que possibilitassem
que as províncias e os munícipios conquistassem maior autonomia, o que ga-
rantiria uma maior liberdade de ação para os proprietários, ainda se adaptando à
alternativa de mão de obra livre e assalariada. Além disso, os proprietários rurais
defendiam a adoção do sistema federalista, proposta que favorecia seus interes-
ses e que representava também a possibilidade de uma maior aproximação com
o poder local, favorecendo sua ascensão política. Já aos liberais, era imperativo o
alinhamento político com os princípios do liberalismo.
2. A presença maciça dos estrangeiros após a segunda metade do século XIX con-
tribuiu para uma mudança na paisagem dos centros urbanos. Muitos imigrantes,
sobretudo após o fracasso das colônias de parceria, deslocaram-se para as cida-
des e dedicaram-se a atividades ligadas ao comércio e ao artesanato, contribuin-
do para o crescimento e para o desenvolvimento, ainda que desordenado, das
cidades. Além disso, o elemento estrangeiro permitiu a circulação de ideias em
voga na Europa que influenciaram na organização dos movimentos operários
do século XX.
3. A alternativa correta é a D.
4. A alternativa correta é a E.

UNIDADE IV
1. Com a crise política, econômica e social que assolava a Europa desde o fim da
Primeira Guerra Mundial e que se intensificou no final da década de 1920, a eco-
nomia brasileira também entrou em colapso. As exportações do café foram re-
duzidas, uma vez que os países europeus eram os principais consumidores do
produto brasileiro, fazendeiros foram arruinados. Nas cidades, o movimento
operário ganhou força e, a partir do avanço das ideias socialistas, a produção
industrial também foi afetada, acarretando a elevação na taxa de desemprego.
2. Ao decretar o Estado novo, Getúlio impôs ao Brasil um sistema de governo com
inspirações fascistas e que, portanto, limitava o exercício da democracia e sus-
pendia os direitos civis, deixando a população à mercê de seus interesses.
3. A alternativa correta é a D.
4. A alternativa correta é a E.
293
GABARITO

UNIDADE V
1. Resposta Pessoal.
2. Resposta Pessoal.
3. A alternativa correta é a E.
4. A alternativa correta é a E.

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