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Centro de Convenções Ulysses Guimarães

Brasília/DF – 4, 5 e 6 de junho de 2012

CONSÓRCIOS PÚBLICOS EM SAÚDE


NO ESTADO DO CEARÁ: A QUEM
PRESTAR CONTAS?

Daniel do Vale Dantas


Giovana de Albuquerque Andrade
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Painel 22/079 Gestão e controle de consórcios

CONSÓRCIOS PÚBLICOS EM SAÚDE NO ESTADO DO CEARÁ:


A QUEM PRESTAR CONTAS?
Daniel do Vale Dantas
Giovana de Albuquerque Andrade

RESUMO

A Lei no 11.107/2005, juntamente com o Decreto no 6.017/2007, instituiu e


regulamentou os Consórcios Públicos. Todavia, a introdução da figura jurídica do
Consórcio no direito pátrio constitui até hoje um desafio ao controle externo cuja
missão é fiscalizar a aplicação dos recursos públicos. Surge, então, uma questão de
ordem prática: qual tribunal terá a competência do controle na hipótese de recursos
federais, estaduais e municipais estarem em questão? Desse modo, o trabalho
estuda a problemática da fiscalização dos Consórcios, objetivando propor medidas
que subsidiem os órgãos normativos responsáveis na busca de soluções para a
questão. Para isso, foi realizada pesquisa bibliográfica acerca dos normativos que
regem os Consórcios Públicos e daqueles que disciplinam acerca das competências
do TCU e dos Tribunais de Contas do Ceará. Ao final, foram propostas duas
alternativas: atribuir ao Tribunal de Contas vinculado ao Chefe do Poder Executivo,
representante legal do Consórcio, a competência (não exclusiva) para fiscalizar; e
atribuir a todos os Tribunais de Contas vinculados aos órgãos conveniados a
competência para fiscalizar. Todavia, faz-se importante ressaltar que o exercício
fragmentado e desarticulado do controle da gestão pública tem sido um dos
principais obstáculos à sua efetividade, sendo necessário, portanto, a
implementação de um controle associado de serviços públicos.
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1 INTRODUÇÃO

O processo histórico e as transformações de ordem política acabaram por


definir o Estado federal como forma de descentralizar não somente a função
administrativa, mas também o poder político, fato este que gerou a criação de várias
esferas dotadas desse poder. Para tanto, a Constituição deve definir claramente os
poderes atribuídos ao Estado federal ou às entidades federadas, pois este é o
sistema de partilha constitucional.
Quando foi instituída a República no Brasil pelo Decreto n o 1, de 15 de
novembro de 1889, o Governo Provisório, arrogando-se o poder constituinte, aboliu
a monarquia e optou pelo Estado federal. A federação brasileira é do tipo trivalente
(União, Estados e Municípios), logo, se torna necessário o padrão cooperativo entre
as entidades federativas.
A partir dessa premissa, a Constituição Federal (CF) de 1988 não tinha
alternativa senão a de instituir um detalhado sistema de partilha de competências
para a federação brasileira, sistema esse que dá espaço a inúmeros conflitos e
perplexidades, como seria de se esperar. As competências alinhadas, dentre outras
dispersas no texto, entre os arts. 21 a 24 e 30 da CF indicam a formatação básica de
nosso regime federativo e a carga dimensionada de poderes outorgados a cada
entidade que integra a federação.
O regime federativo cooperativo não se trata de mera escolha do
Constituinte Federal, mas de fator inerente à própria forma federativa e à
descentralização do poder que a caracteriza. Assim, a única forma de evolução
política e social do Estado federal é aquela através da qual as pessoas federativas
se associam para um fim comum: a evolução do próprio Estado e o bem-estar da
sociedade.
Sensível a essa necessidade, o art. 241 da Constituição, com o texto
introduzido pela Emenda Constitucional no 19/98, exortou a Administração em geral
a promover a gestão associada dos serviços públicos, para reduzir os males
oriundos do processo descentralizador próprio das federações.
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Tal dispositivo atribuiu a cada ente federado a competência para


disciplinar, por meio de lei própria, os Consórcios públicos, os convênios de
cooperação e a gestão associada de serviços públicos.
A formação de Consórcios é uma das alternativas de cooperação
federativa de apoio e de fortalecimento da gestão, para o desenvolvimento de ações
conjuntas e de objetivos de interesse comum, para melhoria da eficiência da
prestação dos serviços públicos. A dificuldade na sua implementação deveu-se à
falta de uma regulamentação, que garantisse segurança jurídica e estímulo à
formação de novas parcerias.
Nesse contexto, a União editou a Lei n o 11.107/2005, a qual é de normas
gerais de caráter nacional, ou seja, aplica-se a todos os entes da Federação. A
regulamentação deste diploma legal veio com o Decreto n o 6.017/2007 que teve o
mérito de esclarecer, razoavelmente, muitos pontos obscuros do texto legal.
Todavia, a introdução da figura jurídica do Consórcio Público no direito
pátrio constitui até hoje um desafio ao controle externo cuja missão é fiscalizar a
aplicação dos recursos públicos. A propósito, esse controle é o que se realiza por
outro Poder ou órgão, distinto daquele responsável pela execução das atividades
administrativas suscetíveis de controle e visa a comprovar a probidade
administrativa e a regularidade da guarda e do emprego dos bens, valores e
dinheiros públicos, bem como a fiel execução do orçamento.
Na esfera federal, esse controle foi consolidado no artigo 70, caput, da
Constituição, que determina que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial da União, será exercida pelo Congresso Nacional,
mediante controle externo. Esse controle, a cargo do Congresso Nacional, conta
com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU), que exerce diretamente essa
função fiscalizadora.
No âmbito do Estado do Ceará, seguindo o modelo jurídico heterônimo, o
controle externo é exercido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e pelo Tribunal
de Contas dos Municípios (TCM), os quais tem a competência de julgar as contas
dos administradores estaduais/municipais e demais responsáveis por dinheiro, bens
ou valores públicos da administração direta e indireta, bem como as contas daquelas
que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade que resulte dano ao erário
estadual/municipal.
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A maioria dos Consórcios Públicos cearenses é na área da saúde, sendo


os mesmos realizados para o gerenciamento das Policlínicas Regionais e dos
Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs). O tipo de associação
predominante de tais Consórcios é a de forma vertical, tendo nos CEOs
normalmente a participação da União, Estados e Municípios; e nas Policlínicas
Regionais predominando o rateio apenas entre o Estado e os Municípios.
Diante do exposto, surge uma questão de ordem prática: qual tribunal terá
a competência do controle na hipótese de recursos federais, estaduais e municipais
estarem em questão?
É nesse contexto, portanto, que o presente trabalho estuda a
problemática da fiscalização dos Consórcios públicos, objetivando propor medidas
que subsidiem os órgãos normativos responsáveis na busca de soluções para a
questão.
Para tanto, apresenta-se o seguinte problema que orientará o
desenvolvimento desta pesquisa: Consórcios públicos em saúde no Ceará, a quem
prestar contas?
Optou-se por abordar neste trabalho apenas sobre os Consórcios
públicos na área da saúde tanto pela sua representatividade quantitativa quanto pela
experiência dos autores na fiscalização de órgãos e entidades da área da saúde.
A metodologia empregada é a pesquisa bibliográfica, visto que aborda os
normativos que regulamentam os Consórcios Públicos, bem como aqueles que
disciplinam acerca das competências do Tribunal de Contas da União (TCU) e dos
Tribunais de Contas do Ceará. Por fim, expõe-se com detalhes acerca da
problemática em questão e propõe-se as alternativas que foram consideradas legais
e viáveis.

2 CONSÓRCIOS PÚBLICOS

O processo histórico e as transformações de ordem política acabaram por


definir o Estado federal como forma de descentralizar não somente a função
administrativa, mas também o poder político, fato este que gerou a criação de várias
esferas dotadas desse poder. Vale lembrar que, na classificação tradicional adotada
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pelos constitucionalistas, os Estados dividem-se em três grandes categorias: i) os


unitários, que centralizam o poder político; ii) os federais, que, embora unos,
comportam a descentralização do poder; e iii) os confederais, que representam mera
associação de Estados soberanos (CARVALHO FILHO, 2009).
As origens do Estado federal remontam ao século XVIII com a emissão, em
1776, da Declaração de Independência de treze colônias britânicas, que culminou
com os “Artigos de Confederação” produzidos em 1781. Tal fato influenciou
sobremaneira a promulgação da Constituição dos Estados Unidos em 1787,
originando, assim, o nascimento do Estado federal (CARVALHO FILHO, 2009).
Para que se cofigure o Estado federal, são tidas como imprescindíveis
certas características. A fundamental reside na descentralização política, o que
significa que, além do poder central e soberano, os entes integrantes são da mesma
forma dotados de capacidade e representação políticas. A soberania é exclusiva da
entidade federal, cabendo às unidades federadas certa liberdade dentro dos limites
constitucionais (autonomia); por isso, existe apenas um Estado. A Constituição deve
definir claramente os poderes atribuídos ao Estado federal ou às entidades
federadas, pois este é o sistema de partilha constitucional.
Durante toda a fase do Império (1822-1889), o Brasil adotou a forma de
Estado unitário. As regiões geográficas que compunham o território brasileiro eram
destruídas de capacidade política e tinham estreita margem de autonomia
administrativa (CARVALHO FILHO, 2009).
Quando foi instituída a República pelo Decreto n o 1, de 15 de novembro
de 1889, o Governo Provisório, arrogando-se o poder constituinte, aboliu a
monarquia e optou pelo Estado federal, à semelhança do que ocorrera no processo
político dos Estados Unidos da América. Segundo Carvalho Filho (2009, p. 3),
O desfecho político de ambas as nações atingiu o mesmo alvo: o regime
federativo. Não obstante, a origem do processo evolutivo foi diametralmente diversa:
enquanto naquele país americano a federação resultou de processo centralizador,
oriundo da precedente confederação (processo centrípeto ou federalismo por
agregação), no Brasil se originou de processo descentralizador, oriundo do anterior
regime unitário (processo centrífugo ou federalismo por segregação). A partir da
instituição da República, todas as Constituições brasileiras preservaram a forma de
Estado federal.
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A CF, nos termos do art. 18, consignou que os Municípios estão


compreendidos na organização político-administrativa da República. Sendo assim,
diferentemente da federação dual, dotada de dois graus de unidades, a brasileira
espelha federação de três graus (ou trivalente), o que se conclui à luz das esferas
que a compõem.
Se na federação dual já se torna necessário o padrão cooperativo entre
as entidades federativas, com maior razão devera ocorrer na federação de três
graus, adotada no regime pátrio.
A partir dessa premissa, a Constituição não tinha alternativa senão a de
instituir um detalhado sistema de partilha de competências para a federação
brasileira, sistema esse que dá espaço a inúmeros conflitos e perplexidades, como
seria de se esperar. As competências alinhadas, dentre outras dispersas no texto,
entre os arts. 21 a 24 e 30 da CF indicam a formatação básica de nosso regime
federativo e a carga dimensionada de poderes outorgados a cada entidade que
integra a federação.

2.1 Federalismo cooperativo

Apesar das ideias primitivas a respeito da federação, nos séculos XVIII e


XIX, se fundassem no dualismo, visto como instrumento de separação estanque das
esferas da União e dos Estados-membros, passou o federalismo, após a Primeira
Guerra Mundial, a assumir a feição de cooperativo, no qual o desiderato do sistema
seria a coordenação e a conjugação de esforços por parte dos integrantes da
federação (CARVALHO FILHO, 2009).
O regime federativo cooperativo não se trata de mera escolha do
Constituinte Federal, mas de fator inerente à própria forma federativa e à
descentralização do poder que a caracteriza. Se as entidades federativas ostentam
poderes definidos na Constituição a serem respeitados pelos demais entes, resulta
disso a notória possibilidade do surgimento de conflitos entre elas, dado que
inúmeros são os interesses em jogo, frequentemente conflitantes. Assim, a única
forma de evolução política e social do Estado federal é aquela através da qual as
pessoas federativas se associam para um fim comum: a evolução do próprio Estado
e o bem-estar da sociedade. Na cooperação todos se envolvem nos mesmos
objetivos e buscam a satisfação de todos os interesses.
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Sensível a essa necessidade, o art. 241 da Constituição, com o texto


introduzido pela Emenda Constitucional no 19/98 – conhecida por ter implantado o
que se denominou “Reforma Administrativa” -, exortou a Administração em geral a
promover a gestão associada dos serviços públicos, para reduzir os males oriundos
do processo descentralizador próprio das federações. Senão, vejamos o que dispõe
tal artigo.

Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


disciplinarão por meio de lei os Consórcios públicos e os convênios de
cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de
serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos,
serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços
transferidos (BRASIL, 1988).

Analisando o dispositivo não resta dúvida que o Constituinte pretendeu


fomentar o regime cooperativo para que os serviços públicos sejam alvo de gestão
associada, significando esta o conjunto de ações e estratégias que envolvem todos
os entes interessados na execução de alguns serviços públicos comuns.

2.2 Base Legal

O preceito reproduzido pelo art. 241 da CF, citado anteriormente, atribuiu


a cada ente federado a competência para disciplinar, por meio de lei própria, os
Consórcios públicos, os convênios de cooperação e a gestão associada de serviços
públicos.
A formação de Consórcios é uma das alternativas de cooperação
federativa de apoio e de fortalecimento da gestão, para o desenvolvimento de ações
conjuntas e de objetivos de interesse comum, para melhoria da eficiência da
prestação dos serviços públicos. A dificuldade na sua implementação deveu-se à
falta de uma regulamentação, que garantisse segurança jurídica e estímulo à
formação de novas parcerias.
Nesse contexto, sete anos após a nova redação do art. 241 da CF, saiu
na frente a União com a edição da Lei n o 11.107, de 06 de abril de 2005. Entretanto,
mencionada lei é de normas gerais de caráter nacional, ou seja, aplica-se a todos os
entes da Federação. Seu art. 1°, caput, informa que a lei dispõe sobre “normas
gerais para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios contratarem
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Consórcios públicos para a realização de objetivos de interesse comum e dá outras


providências" (BRASIL, 2005).
Tal Lei foi regulamentada pelo Decreto n o 6.017/2007, que teve o mérito
de esclarecer, razoavelmente, muitos pontos obscuros do texto legal. O art. 2 o do
Decreto citado define Consórcio Público como

pessoa jurídica formada exclusivamente por entes da Federação, na forma


da Lei 11.107, de 2005, para estabelecer relações de cooperação
federativa, inclusive a realização de objetivos de interesse comum,
constituída como associação pública, com personalidade jurídica de direito
público e natureza autárquica, ou como pessoa jurídica de direito privado
sem fins econômicos (BRASIL, 2007).

Pela definição fica claro, desde logo, que é possível a existência de um


consórcio público que não tenha finalidade de realizar a gestão associada de
serviços públicos prevista no art. 241 da CF. Pode o consórcio público ter por objeto
qualquer outra relação de cooperação federativa que não seja, obrigatoriamente, tal
gestão associada.
Em outras palavras, pode-se dizer que os Consórcios públicos consistem
na união entre dois ou mais entes da federação, sem fins lucrativos, com a finalidade
de prestar serviços e desenvolver ações conjuntas que visem o interesse coletivo e
benefícios públicos (CEARÁ, 2009).
Pelo exposto, percebe-se que a personalidade jurídica do Consórcio pode
ser de Direito Privado, sem fins econômicos, ou de Direito Público, assumindo, nesta
última hipótese, a forma de associação pública. Independentemente da
personalidade jurídica, o Consórcio terá que atender às normas de Direito Público.

2.3 Formas de Associação

Os Consórcios públicos são celebrados entre entes federados de mesma


espécie ou não. Não haverá, entretanto, consórcio público constituído unicamente
pela União e municípios. Isso porque o art. 1°, § 2°, da Lei no 11.107 estatui que "a
União somente participará de Consórcios públicos em que também façam parte
todos os Estados em cujos territórios estejam situados os Municípios consorciados"
(BRASIL, 2005).
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De forma resumida pode-se dizer que os entes federados podem se


associar de duas formas (CEARA, 2009): (i) horizontal, quando são constituídos por
entes da mesma esfera de governo (Município-Município; Estado-Estado); e (ii)
vertical, quando constituído por entes de diferentes esferas de governo (Município(s)
e Estado(s); Estado e União; Município(s), Estado(s) e União).

2.4 Prerrogativas dos Consórcios Públicos

Os Consórcios dispõem de algumas prerrogativas que lhes proporcionam


maior flexibilidade em relação à Administração Direta, quais sejam:

 Celebrar contrato de gestão, nos termos e limites da legislação estadual


pertinente, contrato de programa ou termo de parceria, respeitados, no
último caso, os critérios e disposições da legislação federal aplicável;
 Licitar serviços e obras públicas visando a implementação de políticas de
interesse comum dos entes consorciados, desde que aprovado pela
Assembleia Geral;
 Dispor de maiores valores nos limites de licitação. Os valores são
contados em dobro quando o Consórcio é constituído por até 3 entes
federados, ou o triplo, se formado por um número acima de 3
consorciados;
 Firmar convênios, contratos e acordos;
 Receber auxílio, contribuição ou subvenção;
 Celebrar concessões, permissões e autorizações de serviços públicos;
 Gozar de maior flexibilidade no poder de compra, na remuneração de
pessoal e de pagamento de incentivos; e
 Ser contratado pela administração direta ou indireta, sem necessidade
de licitação (CEARÁ, 2009).

Os Consórcios podem atuar em diversas áreas de atividades, desde que


visem beneficiar a população, a melhoria do acesso e a qualidade da prestação de
serviços. Tais áreas podem ser: educação, saúde, pesquisa, estudos técnicos,
cultura, esporte, turismo, transporte público, segurança pública, resíduos sólidos,
saneamento básico, gestão ambiental, desenvolvimento
regional/urbano/rural/agrário, obras públicas, manutenção de equipamentos de
informática, entre outras.
No Estado do Ceará a maioria dos Consórcios Públicos celebrados é na
área da saúde, sendo os mesmos realizados para o gerenciamento das Policlínicas
Regionais e dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs).
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O tipo de associação predominante de tais Consórcios é a de forma


vertical, tendo nos CEOs normalmente a participação da União, Estados e
Municípios; e nas Policlínicas Regionais predominando o rateio apenas entre o
Estado e os Municípios.

2.5 Etapas necessárias à constituição dos Consórcios

De forma resumida pode-se elencar as seguintes etapas para a


constituição de qualquer Consórcio:
1) Elaboração do Protocolo de Intenções;
2) Ratificação do Protocolo de Intenção pelo Poder Legislativo de cada
ente consorciado, o que o transforma na Lei do respectivo Consórcio;
3) Elaboração do Estatuto e/ou Regimento Interno;
4) Pactuação do Contrato de Programa, obrigações referentes a
encargos, serviços e bens necessários à implementação dos
Consórcios, transferência de bens, cessão de pessoal para o
Consórcio e outros compromissos não relacionados a recursos
financeiros;
5) Contrato de Rateio, cuja finalidade é estabelecer obrigações
financeiras, ou seja, os compromissos da aplicação dos recursos pelos
entes consorciados.
6) Definição da dotação orçamentária específica ou créditos adicionais
por cada ente consorciado para assumir os compromissos no
pagamento das despesas assumidas no contrato de rateio; e
7) Estruturação e organização do Consórcio (CEARÁ, 2009).
O Protocolo de Intenção é um dos principais documentos na constituição
do Consórcio. Por meio deste documento são estabelecidas as condições para o
seu funcionamento. O conteúdo mínimo deve obedecer ao que está previsto na Lei
no 11.107/2005 e no Decreto no 6.017/2007.
O Protocolo de Intenções, após sua elaboração, deve ser subscrito pelos
chefes do Poder Executivo (Prefeito(s), Governador(es) e Presidente da República)
dos entes participantes do Consórcio. Após a ratificação do Protocolo deve ser
convocado uma Assembleia Geral para elaborar e aprovar o Estatuto, que é um
instrumento que definirá a funcionalidade do Consórcio.
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A ratificação do Protocolo de Intenções se efetua por meio de Lei, na qual


o Poder Legislativo de cada ente consorciado aprova o protocolo de intenções, que
se transformará em Lei que irá reger o Consórcio-Contrato do Consórcio Público.
Os Estatutos e Regimentos são instrumentos que materializam a
existência da entidade e devem conter cláusulas que explicitem direitos e obrigações
entre as partes envolvidas. Cada entidade tem a liberdade de elaborar esses
instrumentos, de acordo com as condições previstas na Lei do Consórcio Público
(CEARÁ, 2009).
O Estatuto tem por finalidade dispor sobre a organização do Consórcio, a
estrutura administrativa, os cargos, as funções, atribuições e competências, forma
de eleição, de organização e demais regras para sua funcionalidade.
O Contrato de Programa é o documento que estabelece as obrigações de
prestação de serviços pelo Consórcio, forma de transferência total ou parcial dos
encargos, de pessoal ou bens necessários ao seu funcionamento (CEARÁ, 2009).
Dentre os elementos que devem constar no Contrato de Programa tem-
se: identificação dos bens transferidos, tipos de transferências e sua periodicidade,
indicação de quem arcará com o ônus, passivo do pessoal cedido e os recursos
necessários à efetividade dos serviços e a responsabilidade subsidiária de quem os
transferiu.
O Contrato de Rateio é o instrumento jurídico formal que define as
responsabilidades econômico-financeiras por parte de cada consorciado e a forma
de repasse de recursos de cada participante, para a realização das despesas do
Consórcio Público (CEARÁ, 2009).
Os consorciados são partes legítimas para exigirem o cumprimento das
obrigações previstas no Contrato de Rateio. Tal contrato deve ser formalizado
anualmente, para cada exercício financeiro, de acordo com a vigência das dotações
orçamentárias existentes. Faz-se necessário, portanto, garantir a programação
orçamentária da Lei Orçamentária Anual (LOA) de cada ente consorciado, em
conformidade com os Planos Plurianuais (PPA) e os Contratos de Programa.
Ressalta-se que e vedado aplicar recursos por Contrato de Rateio em
despesas de forma genéricas, sem as devidas especificações, inclusive as
transferências ou operações de crédito.
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Para a operacionalização do Consórcio, se faz necessária uma estrutura


mínima, constituída por:

I. Assembleia Geral – com representação de todos os entes consorciados;


II. Presidência – Representante legal do Consórcio;
III. Diretoria Executiva – constituída por um Diretor-Geral e um Diretor-
Administrativo-Financeiro, escolhidos pela Assembleia Geral; e
IV. Recursos Humanos – técnicos e pessoal administrativo (CEARÁ, 2009).

A Assembleia Geral é a instância máxima e soberana do Consórcio, com


poderes deliberativos sobre as questões pertinentes à gestão administrativa,
financeira e política dos Consórcios Públicos. É constituída pelos chefes do
Executivo dos municípios consorciados e por representantes do Estado. Todas as
suas decisões devem ser aprovadas pelo colegiado, como forma de assegurar a
representação de todos os entes consorciados.
O Presidente do Consórcio deverá ser eleito por unanimidade pela
Assembleia Geral, para representar legalmente o Consórcio, ordenar despesas e
assinar contratos e convênios. O mandato do Presidente é para um período de dois
anos, com recondução por mais um período (CEARÁ, 2009).
Ressalte-se que o representante legal do Consórcio, segundo o art. 4 o,
inciso VIII da Lei no 11.107/2005, sempre é, obrigatoriamente, um dos Chefes do
Poder Executivo dos entes participantes do Consórcio (BRASIL, 2005).
Já a Diretoria Executiva é uma estrutura formada por técnicos com
experiência profissional e competência para operacionalizar o Consórcio. Deverá ser
assumida por um Diretor-Geral e um Diretor-Administrativo-Financeiro, escolhidos
pela Assembleia Geral.

2.6 Gestão Financeira dos Consórcios

Os Consórcios serão remunerados pelos serviços que prestam e pelos


bens que fornecem, além outras fontes de recursos. Portanto, os recursos que
financiam a gestão dos Consórcios podem ser provenientes de:

I. Dos recursos repassados pela União, Estado e Municípios;


II. Dos recursos oriundos de convênios, contratos e/ou parcerias com outras
entidades;
III. Dos recursos de prestações de serviços técnicos;
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IV. Dos recursos eventuais que lhe forem repassados por entidades
públicas e privadas;
V. Das doações e transferências em geral; e
VI. Do produto de operações de crédito ou aplicações financeiras (CEARÁ,
2009).

Percebe-se, portanto, que hoje é possível a existência de recursos de seis


fontes diferentes. Ressalte-se que todas as transferências de recursos financeiros
para os Consórcios devem estar consignadas em fundos tendo em vista que não
podem ser feitos repasses diretamente ao Consórcio.

2.7 Consórcios Públicos em Saúde

A Carta Magna de 1988 reconheceu o Município como ente federativo.


Esse processo foi acompanhado por uma intensa descentralização de políticas
públicas, de atribuições e de responsabilidades. No entanto, a capacidade técnica e
operacional dos municípios foi pouco fortalecida e as dificuldades financeiras
enfrentadas durante o processo de descentralização do setor saúde, influenciadas
pela reforma fiscal de 2000, ocasionaram diferenças e desigualdades na
implantação do Sistema único de Saúde (SUS) nas diversas regiões do País
(CEARÁ, 2009).
Apesar da primazia dos municípios na execução das políticas públicas,
nem todos os municípios possuem condições técnicas ou financeiras para executar
suas competências e responsabilidades em sua plenitude. As necessidades
enfrentadas pelos municípios, em especial os de pequeno e médio portes, são
imensas para programar as ações de saúde: falta de estrutura física, de materiais,
de recursos humanos, de acesso a novas tecnologias médicas, de apoio
diagnóstico, o que tem levado os municípios a buscarem parcerias para a melhoria
do processo de gestão e de organização dos sistemas de saúde para o atendimento
das demandas cada vez mais crescentes.
A área da saúde é o campo mais propício para a formação de Consórcios.
O município sozinho não tem condições de ofertar todos os serviços necessários à
população, cujo investimento e custeio são muito elevados. Dessa forma, o
Consórcio permite aos municípios a formação de parcerias para obtenção de maior
ganho de escala e melhorar a capacidade técnica, gerencial e financeira na
prestação de serviços públicos.
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Atualmente, o Estado do Ceará está responsável por construir e equipar


16 CEOs e 20 Policlínicas, se comprometendo, ainda, a repassar 40% do custeio
destas unidades (CEARÁ, 2009).

2.7.1 Base legal

No capítulo destinado à saúde, a Constituição consignou em seu art. 198


(BRASIL, 1988) que “As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único [...]”. Semelhante
sistema deve observar as diretrizes estabelecidas no art. 198, incisos I a III.

Art. 198 [...]


I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas,
sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III – participação da comunidade.

Além dessas diretrizes, a Constituição contempla vários princípios na área


de saúde. Destacam-se entre eles: i) o exercício da atividade pelo setor privado (art.
199); ii) a aplicação de recursos na área mediante a fixação de percentual mínimo
(art. 198, § 2o); iii) a implementação de políticas sociais e econômicas com o objetivo
de reduzir o risco de doenças e outras mazelas (art. 196); iv) a vedação de
transferência de recursos públicos para auxílios ou subvenções a entidades privadas
com fins lucrativos (art. 199, § 2o); v) a instituição de sistema de saúde
complementar (art. 199, § 1o) etc.
A regulamentação das normas constitucionais pertinentes à saúde foi
efetivada través da Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, a qual dispõe sobre as
condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o
funcionamento dos serviços de saúde. É da referida lei a definição no sentido de que
Sistema Único de Saúde (SUS) “é o conjunto de ações e serviços de saúde,
prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da
Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público”
(BRASIL, 1990).
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Ademais, com o advento da Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990, foi


disciplinada a participação da comunidade na gestão do SUS e das transferências
intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde.
Por fim, a Lei no 11.107/2005 estabeleceu, no § 3o do art. 1o, que os
Consórcios públicos na área da saúde deveriam observar os princípios, diretrizes e
normas que regulam o SUS.

2.7.2 Formação dos Consórcios em Saúde

A formação dos Consórcios envolve um conjunto de etapas a serem


seguidas e devem estar bem claras e definidas na lei da sua criação. Os Consórcios
podem ser constituídos para realização de objetivos comuns ou específicos, por
exemplo, implantar ou prestar determinados tipos de serviços de saúde, executar
projetos ou programas, viabilizar determinados tipos de exames de apoio e
diagnóstico, entre outros (CEARÁ, 2009).
O Estado do Ceará optou por estimular a formação de Consórcios em
saúde tomando por base os municípios localizados numa mesma microrregião de
saúde, visando facilitar o processo de estruturação de redes de atenção à saúde e
tendo como referência o Plano de Desenvolvimento Regional (PDR).
Com relação às etapas necessárias à constituição de tais Consórcios,
seguem-se todos os sete passos referidos no subitem 2.5 e mais dois: articulação
entre os gestores municipais e Coordenadorias Microrregionais de Saúde (CRES); e
elaboração de uma Programação Pactuada Consorcial (PPC).
A estrutura organizacional dos Consórcios em saúde segue os mesmo
padrões da estrutura referida também no subitem 2.5. Ressalte-se que os membros
da Diretoria Executiva poderão ser escolhidos entre os Diretores dos Centros de
Especialidades Médicas e dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO),
localizados nas respectivas bases geográficas de cada Consórcio.
16

3 COMPETÊNCIAS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

O Brasil adotando o Sistema de Tribunais de Contas é organizado da


seguinte maneira:
 Um Tribunal de Contas da União, com sede no Distrito Federal e
representação em todas as Unidades da Federação;
 Vinte e seis Tribunais de Contas Estaduais, sendo um em cada
Unidade da Federação;
 Quatro Tribunais de Contas dos Municípios, localizados nos Estados
da Bahia, Ceará, Pará e Goiás; e
 Dois Tribunais de Contas Municipais, localizados nos Municípios de
São Paulo e Rio de Janeiro.
Observa-se, portanto, que em quatro estados, além do Tribunal de Contas
do Estado, cuja jurisdição alcança apenas a administração pública estadual, existe
também um Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), responsável pelo controle
externo das administrações de todos os municípios do Estado.
Nos demais Estados, os Tribunais de Contas estaduais atuam na
fiscalização tanto da administração estadual, como da municipal, excetuando-se no
caso do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro e do Tribunal de Contas
do Município de São Paulo.
Convém observar que Tribunal de Contas Municipais não é a mesma
coisa que Tribunal de Contas dos Municípios. Tribunal de Contas Municipal é um
órgão municipal de controle externo encarregado de fiscalizar a atividade financeira
de um determinado Município, como, por exemplo, o Tribunal de São Paulo, que
fiscaliza, apenas, aquele Município. Já o Tribunal de Contas dos Municípios é órgão
estadual encarregado de fiscalizar os Municípios localizados em determinado
estado, como por exemplo, o Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará, que
responde pela fiscalização dos 184 municípios localizados naquele estado.
Feitas estas considerações iniciais, apresenta-se a seguir as
competências, pertinentes ao presente estudo, do Tribunal de Contas da União
(TCU) e dos Tribunais de Contas do Ceará: Tribunal de Contas do Estado (TCE) e
Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).
17

O art. 71 da Constituição Federal de 1988 estabelece as competências


próprias do TCU para o exercício do controle externo. Dentre elas, tem-se a seguinte
competência, in verbis:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido


com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
[...]
II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta,
incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder
Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou
outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público (BRASIL, 1988);

Nesse sentido, a Lei no 8.443, de 16 de julho de 1992, Lei Orgânica do


TCU, que regulamenta o dispositivo constitucional retrocitado, estabeleceu em seu
art. 1o, inciso I, a mesma competência para julgar tais contas.
Seguindo o modelo jurídico heterônimo, o art. 76 da Carta Estadual do
Ceará estabeleceu as competências próprias do TCE para o exercício do controle
externo. Dentre elas, tem-se que:

Art. 76. Compete ao Tribunal de Contas:


[...]
II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiro, bens e valores públicos da administração direta e indireta,
incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder
Público Estadual, e as contas daqueles que deram causa a perda, extravio
ou outra irregularidade de que resulte prejuízo à Fazenda Estadual;
(CEARÁ, 2004)

No mesmo sentido, a Lei no 12.509, de 6 de dezembro de 1995 – Lei


Orgânica do TCE -, regulamentando o dispositivo constitucional acima, estabeleceu
em seu art. 1o, inciso I, idêntica competência de julgamento de contas.
Assim como o fez para o TCE, a Carta Estadual disciplinou no art. 78 as
competências próprias do Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará (TCM). No
inciso II tem-se competência similar à exposta anteriormente para o TCE:

Art. 78. Compete ao Tribunal de Contas dos Municípios:


[...]
II – julgar as contas dos administradores, das Mesas das Câmaras
Municipais e demais responsáveis por dinheiro, bens e valores públicos da
administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades
instituídas e mantidas pelo Poder Público Municipal e as contas daqueles
que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte
prejuízo ao Erário; (CEARÁ, 2004)
18

Dessa forma, e não poderia ser diferente, a Lei n o 12.160, de 4 de agosto


de 1993 – Lei Orgânica do TCM -, que regulamenta o dispositivo constitucional
retrocitado, ratificou em seu art. 1o, inciso III, que o TCM teria tal competência para
julgar contas.
Apresentadas estas competências e, direcionando agora para a
obrigatoriedade dos Consórcios públicos apresentarem a prestação de contas para
os Tribunais de Contas, convêm evidenciar o disposto no art. 9 o, § único da Lei no
11.107/2005, que estabelece a abrangência de tal prestação. Senão vejamos:
o
Art. 9 A execução das receitas e despesas do consórcio público deverá
obedecer às normas de direito financeiro aplicáveis às entidades públicas.
Parágrafo único. O consórcio público está sujeito à fiscalização contábil,
operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas competente para apreciar
as contas do Chefe do Poder Executivo representante legal do consócio,
inclusive quanto à legalidade, legitimidade e economicidade das despesas,
atos, contratos e renúncia de receitas, sem prejuízo do controle externo a
ser exercido em razão de cada um dos contratos de rateio (BRASIL, 2005).

Por fim, do mesmo diploma legal, cita-se o art. 6o, inciso II, § 1o, o qual faz
referência ao posicionamento dos Consórcios públicos no âmbito da administração
pública. Tal dispositivo (BRASIL, 2005) dispõe que “O consórcio público com
personalidade jurídica de direito público integra a administração indireta de todos os
entes da Federação consorciados”.
Infere-se, portanto, das transcrições anteriores, que todos os Consórcios
públicos devem prestar contas de seus atos aos Tribunais de Contas competentes
tendo em vista os Consórcios serem entidades integrantes da Administração Pública
indireta de todos os entes participantes (União, Estados e/ou Municípios) e, como
tal, fazem parte do rol de entidades cujos administradores devem submeter suas
contas ao julgamento do TCU, TCE e TCM, nos termos dos dispositivos retrocitados
de suas respectivas Leis Orgânicas.
19

3.1 A problemática e as alternativas

Analisando as competências dos Tribunais anteriormente expostas,


percebe-se claramente que não há divergência entre suas Leis Orgânicas e,
portanto, não há empecilho jurídico para que os três Tribunais regulamentem,
individualmente, a exigência da prestação de contas aos Consórcios, mesmo
aqueles Consórcios que gerenciam simultaneamente recursos Federais, Estaduais,
Municipais recebidos através de contrato de rateio. Tem-se aqui caso de tripla
jurisdição.
Todavia, mesmo diante de tal dilema, em ambos os Tribunais (TCU, TCE
e TCM) ainda não houve uma regulamentação, quanto à competência, abrangência
e padronização para o recebimento das prestações de contas dos Consórcios
Públicos em saúde do Ceará.
Conforme já dito anteriormente, os Consórcios Públicos em saúde
celebrados pelo Estado do Ceará são para o gerenciamento das Policlínicas
Regionais (Ceará e Municípios) e dos Centros de Especialidades Odontológicas
(União, Ceará e Municípios). Em tais Consórcios observou-se que a prática que vem
ocorrendo é eleger como representante legal o Chefe do Poder Executivo Municipal,
ou seja, um Prefeito.
A problemática começa quando se lê a redação do § único, art. 9 o da Lei
no 11.107/2005 que diz “O consórcio público está sujeito à fiscalização [...] pelo
Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do Chefe do Poder
Executivo representante legal do consórcio [...]”. Deste dispositivo subtende-se até
hoje pelos consorciados que somente o TCM é competente para apreciar as contas
de tais Consórcios, tendo em vista que a fiscalização das contas de Prefeitos, a
priori, somente deve ser feita pelo TCM.
O texto desse dispositivo leva, portanto, a falsa leitura de que compete
exclusivamente ao Tribunal de Contas a que está vinculado o representante legal do
consórcio a tarefa de fiscalização das contas. Entretanto, tal entendimento ofende
flagrantemente o sistema de controle adotado na Constituição Federal posto que,
sendo os Consórcios Públicos integrantes da Administração Indireta de todos os
entes consorciados, não poderiam os outros Tribunais de Contas serem afastados
do controle, até porque cada ente federativo consorciado tem obrigações próprias
para com o Consórcio, muitas suscetíveis do referido controle.
20

O Decreto no 6.017/2007, talvez “sentindo” tal problemática, expressou-se


melhor, em seu art. 12, ao substituir a expressão “Chefe do Poder Executivo” por
“representante legal”. A redação traz que “O consórcio público está sujeito à
fiscalização [...] pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do seu
representante legal [...]”.
Por tudo exposto, a interpretação em conformidade com a CF que se
deveria ter dos dispositivos retrocitados, é a de que o Tribunal de Contas ao qual
compete apreciar as contas do Chefe do Executivo representante legal do consórcio
é o órgão de controle diretamente envolvido com o consórcio em virtude da
representação legal, todavia os demais Tribunais continuam a ter sua competência
constitucional controladora, pois que, além do ente federativo sob sua tutela, o
consórcio também se sujeita a controle por integrar a administração indireta de todos
os entes.
Apesar da falta de clareza da parte do texto retrocitada do § único, art. 9 o
da Lei no 11.107/2005, é de se notar, também, a redação final deste dispositivo
quando diz que o consórcio está sujeito a fiscalização do Tribunal de Contas
competente “sem prejuízo do controle externo a ser exercido em razão de cada um
dos contratos de rateio”. Logo, ao final, fica mais claro que a fiscalização das contas
do Chefe do Poder Executivo – o Prefeito – pelo TCM não afasta o controle externo
a ser exercido pelo TCU e pelo TCE em razão de cada um dos contratos de rateio.
Também sobre tal disposição, o Decreto veio melhor se expressar, no
mesmo art. 12, quando substituiu a expressão “contratos de rateio” por “contratos”.
De fato, não é somente o contrato de rateio que, por conter obrigações financeiras,
viabiliza o controle. Além do contrato de rateio, podem outros contratos ser
celebrados entre a pessoa consorciada e o consórcio com a integração de cláusulas
financeiras. Não há razão, portanto, para descartá-los da fiscalização. E última
análise, todo contrato suscetível de controle sob os aspectos contábil, financeiro,
operacional e patrimonial estará sujeito à fiscalização dos órgãos competentes.
Assim sendo, resta claro que, no caso em apreço, independentemente da
fiscalização do TCM, órgão competente para apreciar as contas do Chefe do Poder
Executivo (representante legal) dos Consórcios em voga, tais contas, no que diz
respeito aos recursos repassados pelo Tesouro da União e do Estado, também se
sujeitam à fiscalização do TCU e do TCE.
21

Constatando em seus apontamentos a existência de vários Consórcios


inadimplentes, a Inspetoria de Controle Externo do TCE responsável por fiscalizar os
órgãos de saúde do Estado elaborou, no início de 2012, diversas representações
direcionadas aos Consórcios de saúde celebrados pelo Estado, no intuito de solicitar
a apresentação das prestações de contas pendentes. Entretanto, tais
representações ainda se encontram em fase de análise.
Alguns consorciados até entendem que o TCM não poder ser o único
Tribunal de Contas a fiscalizar as prestações de contas e acabam por enviar o
processo de prestação também para o TCE. Entretanto, sem quaisquer orientações
e regulamentações mais específicas sobre o tema, enviam prestações de contas
idênticas.
Caso os dois Tribunais de Contas analisem, integralmente, as contas de
um determinado consórcio, além de termos o desperdício de tempo e custo no
serviço público (pois a mesma prestação de contas estaria sendo duas vezes
analisada), ter-se-ia ainda o risco de ocorrer dupla punição para o gestor referente
ao mesmo ato praticado. Problemática de tal magnitude merece no mínimo uma
regulamentação mais precisa por parte dos órgãos normativos responsáveis.
Para tanto, visando subsidiar tais órgãos acerca de possíveis medidas a
serem adotadas em relação à problemática, o presente trabalho propôs duas
alternativas, conforme exposto nos itens a seguir.

3.1.1 Atribuir ao Tribunal de Contas vinculado ao Chefe do Poder Executivo,


representante legal do Consórcio, a competência para fiscalizar

A primeira alternativa legal seria atribuir ao Tribunal de Contas


competente para apreciar as contas do Chefe do Poder Executivo representante
legal dos Consórcios, a competência para fiscalizar a gestão dos Consórcios, desde
que não compreendida como competência exclusiva. No caso do Ceará, este
Tribunal seria o TCM.
Dessa forma, ter-se-ia o seguinte arranjo: o controle rotineiro da gestão
dos recursos públicos exercidos por meio de instrumentos diversos tais como a
análise da prestação de contas anual, o exame da legalidade dos atos de gestão de
pessoal, a requisição periódica de informações e de documentos, bem como a
realização de auditorias ficariam a cargo do TCM, órgão a qual o Prefeito,
representante legal dos Consórcios, deve prestar contas.
22

Tal arranjo não obsta o estabelecimento de obrigações de prestar


informações a apresentar relatórios periódicos aos entes consorciados e aos
demais Tribunais de Contas competentes. Tal obrigação deverá ser detalhada no
Estatuto do consórcio e/ou nos acordos de cooperação celebrados pelos órgãos de
controle competentes.
Esta alternativa demandaria uma maior integração do TCM com o TCU e
o TCE caso fosse detectada alguma irregularidade com recursos repassados pela
União ou pelo Estado do Ceará, tendo em vista que o TCM não tem competência
para imputar sanções ao gestor por irregularidades cometidas com recursos que não
sejam oriundos dos Municípios.
Ademais, caso essa alternativa fosse adotada, o TCM se veria
sobrecarregado de prestações de contas para analisar tendo em vista, conforme
exposto anteriormente, que a prática no Estado do Ceará é eleger o Chefe do Poder
Executivo Municipal como representante legal dos Consórcios em saúde.
Portanto, interessante mesmo seria que fosse adotado algum critério
relevante para a escolha do representante legal dos Consórcios, de forma que nem
sempre fosse escolhido o Chefe do Poder Executivo Municipal. Um critério
plausível poderia ser, por exemplo, escolher como representante legal do
consórcio o Chefe do Poder Executivo que ficou responsável por repassar o maior
volume de recursos públicos.

3.1.2 Atribuir a todos os Tribunais de Contas vinculados aos órgãos conveniados a


competência para fiscalizar

A segunda alternativa seria a fiscalização dos Consórcios por todos os


Tribunais competentes para fiscalizar os recursos envolvidos. Essa medida
demandaria que os Consórcios quando da realização das despesas,
demonstrassem qual a fonte de financiamento (fonte de recursos) das mesmas,
estabelecendo-se a interligação entre a receita e a despesa.
23

Tal desmembramento seria de suma importância aos Tribunais de Contas


para a identificação do que foi realizado com os recursos federais, estaduais e
municipais de forma individualizada. Feito isso, quando fosse detectada alguma
irregularidade, não correria o risco do Consórcio ser punido três vezes pela mesma
ocorrência, tendo em vista que as despesas estariam identificadas por origem de
recursos, possibilitando ao único Tribunal de Contas competente julgar a
irregularidade.
De toda forma, é importante ressaltar que o exercício fragmentado e
desarticulado do controle da gestão pública tem sido um dos principais obstáculos à
sua efetividade, razão pela qual os novos arranjos institucionais para a prestação de
serviços públicos requerem também a implementação de um sistema integrado de
controle externo que garanta ao mesmo tempo a autonomia inerente ao Estado
Federal e a criação de um espaço comum de ação, ou, melhor dizendo, a
implementação de um controle associado de serviços públicos.

4 CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou estudar a problemática da fiscalização dos


Consórcios públicos, objetivando propor medidas que subsidiem os órgãos
normativos responsáveis na busca de soluções para a questão.
Primeiramente foram analisadas as Leis Orgânicas do TCU, TCE e TCM,
bem como os diplomas legais que disciplinam sobre os Consórcios públicos, ou seja,
a Lei no 11.107/2005 e seu Decreto regulamentador no 6.017/2007, e inferiu-se que
todos os Consórcios públicos (inclusive os de saúde) devem prestar contas de seus
atos aos Tribunais de Contas competentes tendo em vista os Consórcios serem
entidades integrantes da Administração Pública indireta de todos os entes
participantes (União, Estados e/ou Municípios) e, como tal, fazem parte do rol de
entidades cujos administradores devem submeter suas contas ao julgamento do
TCU, TCE e TCM, nos termos dos normativos retrocitados e de suas respectivas
Leis Orgânicas.
24

Percebeu-se, também, que não há divergência entre as Leis Orgânicas do


TCU, TCE e TCM e, portanto, não há empecilho jurídico para que os três Tribunais
regulamentem, individualmente, a exigência da prestação de contas aos Consórcios,
mesmo aqueles Consórcios que gerenciam simultaneamente recursos Federais,
Estaduais, Municipais recebidos através de contrato de rateio. Tem-se aqui caso de
tripla jurisdição.
Todavia, mesmo diante de tal dilema, em ambos os Tribunais (TCU, TCE
e TCM) ainda não houve uma regulamentação, quanto à competência, abrangência
e padronização para o recebimento das prestações de contas dos Consórcios
Públicos em saúde do Ceará.
Portanto, para a problemática exposta neste trabalho, foram propostas
duas alternativas: atribuir ao Tribunal de Contas vinculado ao Chefe do Poder
Executivo, representante legal do Consórcio, a competência para fiscalizar; e atribuir
a todos os Tribunais de Contas vinculados aos órgãos conveniados a competência
para fiscalizar.
A primeira alternativa legal seria, portanto, atribuir ao TCM a competência
para fiscalizar a gestão dos Consórcios em saúde cearenses, desde que não
compreendida como competência exclusiva.
Dessa forma, ter-se-ia o seguinte arranjo: o controle rotineiro da gestão
dos recursos públicos exercidos por meio de instrumentos diversos tais como a
análise da prestação de contas anual, o exame da legalidade dos atos de gestão de
pessoal, a requisição periódica de informações e de documentos, bem como a
realização de auditorias ficariam a cargo do TCM, órgão a qual o Prefeito,
representante legal dos Consórcios, deve prestar contas.
Tal arranjo não obsta o estabelecimento de obrigações de prestar
informações a apresentar relatórios periódicos aos entes consorciados e aos
demais Tribunais de Contas competentes. Tal obrigação deverá ser detalhada no
Estatuto do consórcio e/ou nos acordos de cooperação celebrados pelos órgãos de
controle competentes.
25

Esta alternativa demandaria uma maior integração do TCM com o TCU e


o TCE caso fosse detectada alguma irregularidade com recursos repassados pela
União ou pelo Estado do Ceará, tendo em vista que o TCM não tem competência
para imputar sanções ao gestor por irregularidades cometidas com recursos que não
sejam oriundos dos Municípios.
Para que o TCM não ficasse sobrecarregado de prestações de contas
para analisar seria interessante que fosse adotado um critério relevante para a
escolha do representante legal dos Consórcios cearenses, de forma que nem
sempre fosse escolhido o Chefe do Poder Executivo Municipal. Um critério plausível
poderia ser, por exemplo, escolher como representante legal do consórcio o Chefe
do Poder Executivo do ente que ficou responsável por repassar o maior volume de
recursos públicos.
A segunda alternativa demandaria que os Consórcios, quando da
realização das despesas, demonstrassem qual a fonte de financiamento (fonte de
recursos) das mesmas, estabelecendo-se a interligação entre a receita e a despesa.
Tal desmembramento seria de suma importância aos Tribunais de Contas
para a identificação do que foi realizado com os recursos federais, estaduais e
municipais de forma individualizada. Feito isso, quando fosse detectada alguma
irregularidade, não correria o risco do Consórcio ser punido três vezes pela mesma
ocorrência, tendo em vista que as despesas estariam identificadas por origem de
recursos, possibilitando ao único Tribunal de Contas competente julgar a
irregularidade.
De toda forma, é importante ressaltar que o exercício fragmentado e
desarticulado do controle da gestão pública tem sido um dos principais obstáculos à
sua efetividade, razão pela qual os novos arranjos institucionais para a prestação de
serviços públicos requerem também a implementação de um sistema integrado de
controle externo que garanta ao mesmo tempo a autonomia inerente ao Estado
Federal e a criação de um espaço comum de ação, ou, melhor dizendo, a
implementação de um controle associado de serviços públicos.
26

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília: Senado, 1988.

_____. Lei n. 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a


promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Brasília, 20 set. 1990.

_____. Lei n. 11107, de 06 de abril de 2005. Dispõe sobre normas gerais de


contratação de Consórcios Públicos e dá outras providências. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, 7 abr. 2005.

_____. Decreto n. 6017, de 17 de janeiro de 2007. Regulamenta a Lei n o 11.107, de


06 de abril de 2005, que dispõe sobre normas gerais de contratação de Consórcios
Públicos. Diário Oficial do Estado do Ceará, Fortaleza, 18 jan. 2007.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Consórcios Públicos. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2009.

CEARÁ. Constituição (1989). Constituição do Estado do Ceará 1989. Fortaleza:


Inesp, 2004.

_____. Consórcios Públicos em Saúde no Ceará – estratégias para o


fortalecimento da regionalização da saúde. Secretaria da Saúde do Estado do
Ceará, 2009.

___________________________________________________________________

AUTORIA

Daniel do Vale Dantas – Analista de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Ceará.
Endereço eletrônico: daniel.dantas@tce.ce.gov.br

Giovana de Albuquerque Andrade – Analista de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado


do Ceará.
Endereço eletrônico: giovana.andrade@tce.ce.gov.br

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