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PELE NEGRA, MASCARAS BRANCAS – FICHAMENTO DE CITAÇÕES

Frantz, Fanon. Pele negra, máscaras brancas. 2012.

Todo povo colonizado — isto é, todo povo no seio do qual nasceu um complexo
de inferioridade devido ao sepultamento de sua originalidade cultural — toma
posição diante da linguagem da nação civilizadora, isto é, da cultura
metropolitana. (p.34)
Um homem que possui a linguagem possui, em contrapartida, o mundo que
essa linguagem expressa e que lhe é implícito (p.34)
Quanto mais assimilar os valores culturais da metrópole, mais o colonizado
escapará da sua selva. Quanto mais ele rejeitar sua negridão, seu mato, mais
branco será. No Exército colonial, e especialmente nos regimentos
senegaleses de infantaria, os oficiais nativos são, antes de mais nada,
intérpretes (p.34)
Em um grupo de jovens antilhanos, aquele que se exprime bem, que possui o
domínio da língua, é muito temido; é preciso tomar cuidado com ele, é um
quase-branco. Na França se diz: falar como um livro. Na Martinica: falar como
um branco. (p.36)
O negro que entra na França muda porque, para ele, a metrópole representa o
Tabernáculo; muda não apenas porque de lá vieram Montesquieu, Rousseau e
Voltaire, mas porque é de lá que vêm os médicos, os chefes administrativos, os
inúmeros pequenos potentados — desde o sargento-chefe “quinze anos de
serviço”, até o soldado-raso oriundo da vila de Panissières (p.38)
E o fato de o negro recém-chegado adotar uma linguagem diferente daquela da
coletividade em que nasceu, representa um deslocamento, uma clivagem.
(p.40)
Aliás, há um fato extremo que é, no mínimo, cômico: recentemente um
martinicano me contou, enfurecido, que certos guadalupenses faziam-se
passar por martinicanos. Mas, acrescentou, percebe-se logo o erro, eles são
mais selvagens do que nós. Entenda-se: são mais distantes ainda do branco.
(p.41)
Mas podemos dizer desde já: o branco, ao falar petitnègre, exprime esta idéia:
“Você aí, fique no seu lugar (p.46)
Encontro um alemão ou um russo falando mal o francês. Tento, através de
gestos, dar-lhe as informações que ele pede, mas não esqueço que ele possui
uma língua própria, um país, e que talvez seja advogado ou engenheiro na sua
cultura. Em todo caso, ele é estranho a meu grupo, e suas normas devem ser
diferentes. No caso do negro, nada é parecido. Ele não tem cultura, não tem
civilização, nem “um longo passado histórico”. (p. 46)
Quando um preto fala de Marx, a primeira reação é a seguinte: “Nós vos
educamos e agora vocês se voltam contra seus benfeitores. Ingratos!
Decididamente, não se pode esperar nada de vocês”. E depois há ainda este
argumento-porrete do empresário agrícola europeu na África: “Nosso inimigo é
o professor” (p.48)
Falar uma língua é assumir um mundo, uma cultura. (p.50)
Mayotte ama um branco do qual aceita tudo. Ele é o seu senhor. Dele ela não
reclama nada, não exige nada, senão um pouco de brancura na vida. (p.54)
Compreendemos agora porque o negro não pode se satisfazer no seu
isolamento. Para ele só existe uma porta de saída, que dá no mundo branco.
Donde a preocupação permanente em atrair a atenção do branco, esse desejo
de ser poderoso como o branco, essa vontade
determinada de adquirir as propriedades de revestimento, isto é, a parte do ser
e do ter que entra na constituição de um ego. Como dizíamos há pouco, é pelo
seu interior que o negro vai tentar alcançar o santuário branco. A atitude revela
a intenção. (p.60)
Já dissemos que existem negrófobos. Aliás, não é o ódio ao negro que os
motiva. Eles não têm a coragem de odiar, ou não a têm mais. O ódio não é
dado, deve ser conquistado a cada instante, tem de ser elevado ao ser em
conflito com complexos de culpa mais ou menos conscientes. (p.61)
Antes de mais nada temos a negra e a mulata. A primeira só tem uma
perspectiva e uma preocupação: embranquecer. A segunda não somente quer
embranquecer, mas evitar a regressão. Na verdade, há algo mais ilógico do
que uma mulata que se casa com um negro? Pois é preciso compreender, de
uma vez por todas, que está se tentando salvar a raça. (p.63)
No dia em que o branco declarou seu amor à mulata, algo de extraordinário
deve ter acontecido. Houve reconhecimento, integração em uma coletividade
branca que parecia hermética. A menos-valia psicológica,* este sentimento de
diminuição, e seu corolário, a impossibilidade de ter acesso à limpidez,
desapareceram totalmente. De um dia para o outro, a mulata passou da casta
dos escravos para a dos senhores... (p.65)

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