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História do Direito Português

Duarte Canau
Periodificação:
Período Pluralista (1140-1415)- ​Várias Fontes de Direito
1- Justiça no pensamento jurídico medieval:
2- Direito Visigótico:
3- A relevância do Direito Canónico:
4-Costume e Direito Judicial:
5- Direito Prudencial:
6-Direito Penal Medieval:
7- Direito Outorgado e Pactuado
8-Direito suprapositivo
Período Monista (1415-...)- ​Estado Concentra em si o poder legislativo
9-Ordenações do Reino e o quadro fontes do direito
10-A Lei da Boa Razão
11- Estatutos da Universidade de Coimbra
Justiça no pensamento jurídico medieval:
Noção de Justiça no Pensamento Medieval:
No período medieval acreditava-se que a sociedade só poderia ser justa se
os indivíduos que a compunham fossem justos. É assim necessário
compreender que, para o homem medieval, a necessidade de “salvar almas”
é a maior prioridade, por ser esta o “bem comum”.
A salvação de almas só poderia ser concretizada através da virtude,
entendida com o hábito de praticar o bem, o vício será o inverso ( o hábito
de praticar o mal). A virtude era uma garantia da própria justiça pois, quem
praticasse o bem merecia mais o bem do que quem praticasse o mal.
Entende-se assim portanto que a Justiça será a “defesa do bem comum” e é
ainda vista como “habitus operativus bonus”, o hábito do bom orientado
para a ação;
A Justiça como causa, origem e fundamento do Direito:
A idade média não teorizou o direito como um complexo autônomo,
concebendo-o antes enquanto função de justiça. A justiça foi para os
homens dessa época o fundamento da vida social. Sem ela era impossível
uma convivência organizada, a manutenção de uma comunidade política, o
povo em forma de grupo humano
Esta sociedade era teológica( atribuía a tudo uma dimensão metafísica ou
espiritual), daí que a definição de justiça era mais importante que a noção
de direito, que se vê reduzido a uma mera ferramenta na obtenção da
justiça.
Referência à continuidade entre o pensamento greco-romano e o
pensamento judaico-cristão:
O hábito de praticar atos maus acaba por comandar o homem, constituindo
vícios que lhe deformam a vontade, assim a prática de atos virtuosos
fortalece-lhe a possibilidade de caminhar virtuosamente e tornar-se
perfeito. A ideia do homem justo como homem perfeito conduziu à
concepção de justiça enquanto virtude universal, esta era um conceção
conforme o pensamento greco-romano e o pensamento judaico-cristão,
como Santo António ensinava o culto da justiça era “ o supremo bem nesta
vida”;
A ordem social representava, a projeção comunitária a condição dos seus
membros. Sendo os homens justos , justa seria a sociedade. Os estóicos e
Platão haviam querido já o governo político na mão dos filósofos, podendo
se perguntar como se terá por perfeita a sociedade, nela havendo injustiça,
se todos os homens forem perfeitos. A perfeição identifica-se
necessariamente com a justiça; Para o próprio Platão quem praticava a
justiça podia se denominar de eticamente “são” e pelo contrário quem a
fere “ está doente”. Em Aristóteles, ligado com o seu trabalho sobre a ética,
a justiça já é mais difundida entendendo a justiça como a conformidade
com a lei ( é justo a quem se atribui somente aquilo a que tem direito), já
Cícero destaca que o esplendor da virtude é o máximo na justiça e por ela
os homens seriam chamados de bons
A justiça como virtude, caracterização da habitualidade e voluntariedade:
Da própria causa final da justiça resultava nela ínsita um elemento de
habitualidade. A prática de uma ato virtuoso constitui uma preparação para
o cometimento de um outro ulterior. O próprio Fernão Lopes diria que “ a
justiça é a virtude que dura sempre na vontade dos homens” , enfatizando a
necessidade de um procedimento constante para a realização da justiça . A
justiça formar-se-ia por tanto pela repetição voluntária de atos de ato
“nobre” ou “virtuosos”
Os vários tipos de justiça;
Justiça Universal​- Se o homem age com moderação, se deseja
racionalmente as coisas, agirá com virtude. Para Aristóteles a virtude é a
moderação de uma paixão, que estará o presente no ato em sua justa
medida . Daí surge a esta modalidade que é vista como um “exercício da
virtude completa por ser exercida pelo indivíduo em relação a si mesmo e
ao próximo; a justiça é sempre observa em relação ao outro, mesmo
partindo de uma perspetiva íntima, autocentrada que tem necessariamente
uma relação, uma contrapartida noutro ser humano”
Justiça particular​- Vista pela perspetiva de um indivíduo, era entendida
como a atribuição a cada um daquilo que lhe era devido ou “ a cada um o
seu”. Este seu não era visto de uma perspetiva material. O “seu” não seriam
bens terrenos, mas sim uma focalização no indivíduo do bem-comum, ou
seja a salvação da alma do indivíduo. O indivíduo virtuoso que praticasse o
bem, podia ou não se recompensado com o “céu”.
A justiça pressupõe, para a determinação do seu conteúdo, um ato
deliberativo que assenta na consideração do seu, como sendo algo ordenado
aos fins de alguém. O “ seu” seria tudo quanto necessário à realização do
fim do Homem ( físico ou metafísico), ditado pela Natureza respetiva e
tudo o que lhe é útil apenas lhe ser devido enquanto não prejudica os
demais. A natureza da justiça seria uma vontade constante e o propósito
desta a atribuição do seu a cada um.
Modalidades da justiça particular:
Para entender o que era devido a cada um os eclesiásticos dividiram a
justiça particular em várias modalidades:
Escolástica ( de influência Aristotélica):
- Comutativa: baseada na dependência recíproca dos indivíduos, afirmava a
necessidade de garantir o equilíbrio entre as pessoas, defender a igualdade
entre as pessoas e no seu tratamento;
-Distributiva: A justiça que tem em conta as desigualdades naturais entre as
pessoas;
Das Sete Partidas ( Código Castelhano):
- Espiritual ( prende-se com a salvação das almas);
- Política ( trabalho efetuado em prol da comunidade);
- Contenciosa ( ligada aos litígios judiciais);
De Álvaro Pais:
- Latria ( obediência com Deus);
-Obediência ( dever de acatar os mandamentos dos superiores);
-Disciplina ( respeito pelos inferiores);
- Dulia ( Respeito para com aqueles dignos de honra);
- Equidade ( respeito pelos iguais);
As Modalidades de Justiça (São Tomás de Aquino e Santo Agostinho);
São Tomás de Aquino: ​sublinha 3 aspetos sobre a justiça “o objeto da
justiça é o direito ou seja o que é exequível, o que é devido”; “ a justiça faz
relação a outro por isso o constitutivo essencial dessa virtude é a alteridade
( ninguém é justo consigo mesmo mas sim com os outros)” e que “ a justiça
se fundamenta na igualdade”. Produziu portanto o seu pensamento com
base em Aristóteles para o qual as normas foram as leis a julgar e a punir
por elas. Para além de fazer referência á justiça comutativa e distributiva
São Tomás apresenta a modalidade “Geral” ( aquela que diz respeito,
imediatamente ao bem comum, e mediatamente aos particulares
prendendo-se com o que é devido à sociedade pelos seus membros);
Santo Agostinho: ​“onde não há justiça não existe sociedade”, seguindo as
concepções de que a justiça é o hábito de alma ou a virtude pela qual uma
pessoa da a cada um o que lhe é devido, apresentado as suas noções por
exemplo de virtude (amor que é devido a Deus) fiando-se no Novo
Testamento, ou seja para “viver justamente” há que amar o próximo e
elucidá-los perante a virtude
A Justiça Objetiva:
Existe nos juristas da altura uma ideia de justiça, que se conforma com a
retidão plena e normativa ( modelo de conduta). Mas de onde provém esta
ideia de uma “ postura de reta conduta”? Esta provém do Direito Romano,
no qual o modelo a seguir seria a do homem médio, concretamente a do
bónus pater famílias, v​ isto como exemplo credível para as pessoas;
Noção de Direito Suprapositivo e os Vários tipos de lei (São Tomás de
Aquino e São Agostinho):
O Direito Suprapositivo era essencialmente o direito canónico, teorizado
pelos membros da igreja, que regulavam as relações entre os vários reinos
da república cristã e garantiam a supremacia cultural da igreja.
Santo agostinho dividiu o Direito em 3 níveis:
- Lei Eterna ( razão e vontade de Deus que manda conservar a ordem
natural proíbe que ela seja perturbada);
- Lei Natural ( inscrita por Deus no coração dos Homens);
- Lei Humana ( criada pelo Homem para resolver situações da vida
concreta),
São Tomás de Aquino defendia 4 níveis:
- Lei Eterna ( vontade de Deus e princípios que governam o mundo). Esta
estaria no topo da legislação universal, sendo que o Direito Divino e
Natural estavam dependentes desta;
- Lei Natural ( iluminação do homem pela lei eterna e adaptação do mesmo
para partes dela);
- Lei Divina ( versão positiva da lei eterna revelada aos homens através das
sagradas escrituras);
Direito Visigótico:
Evolução do Direito Visigótico e Menção aos Vários Monumentos
Jurídicos:
Antes do estabelecimento da nacionalidade houve um grande número de
Direitos que influenciaram o direito português, nomeadamente o Direito
Visigótico. Este direito tem 4 monumentos principais:
-Código Eurico (476): elaborado por rei Eurico ou pelo seu irmão, seria
fundamentalmente germânico;
- Breviário de Alarico (506): tinha como fontes principais as constituições
imperiais e obras dos juristas romanos como Gaio;
- Código de Leovigildo (572-586): obra do rei com o mesmo nome, sendo
uma revisão do Código de Eurico;
- Código Visigótico (654);
Tese da Personalidade vs Tese da Territorialidade
Territorialidade- os códigos foram aplicados sem distinção sobre os
romanos e os visigodos, desde que habitantes do reino;
Personalidade- enquanto o Còdigo de Eurico se aplicava aos visigodos, o
Breviário se aplicava aos habitantes hispano-romanos
Argumentos para as duas teses:
- Nenhuma das duas afirma o seu âmbito de aplicação, mas também
nenhuma das duas afirma que não era aplicado de forma dualista;
- Apesar do Código Eurico ter certas partes que afirmam a sua
aplicação em âmbito territorial, não se pode afirmar que era todo
assim
Várias formas do Código Visigótico e Estrutura
O Còdigo Visigótico teria como base os códigos anteriores
completando-os, este código teria sido aquele que maior influência teve no
Direito Português, tendo conhecido duas revisões, a primeira feita por
Ervígio e a segunda na qual em não sendo de caráter oficial e integrando
novas leis.
Vigência do Código Visigótico em Portugal:
Existem duas teses:
- Afirmação de que até ao séc. XII existem várias referências ao
Código, mas que a partir do século XIII se assiste um corte profundo
em relação à sua aplicação;
- Afirmação que até ao século XII foi frequentemente invocado, tendo
no séc.XIII perdido lentamente a importância visto surgirem as leis
régias;
Doutrina do Professor Braga Cruz:
O professor Braga Cruz entendia que este código vinha a ser citado em
Portugal no séc.XII da mesma forma que era citado anos antes em Castela,
mas isso já não acontecerá no sécu. XIII, com a tradução do código por
parte de castelhanos na forma de “Fuero Juzgo”. No entanto os argumentos
do professor têm de ser vistos restritivamente pois existem documentos que
comprovam a aplicação do Código Visigótico como há documentos que
provam o contrário.
A relevância do Direito Canónico:
Noção e Identificação do Direito Canónico como fonte de Direito no
período pluralista:
O direito canónico era um direito supra-estatal concebido inicialmente para
ordenar a vida eclesiástica, cedo superou o seu âmbito inicial. O relevo do
Direito Canónico neste período assume-se devido à sua natureza
“supra-estatal” ou seja a uma comodidade vista como algo no plano
superior ao dos reinos ou áreas políticas diferenciadas então existentes. Na
época a sua relevância podia ser vista face ao posicionamento intimo que
existia para com o Papado e a Coroa, visto que a Igreja pelo próprio ato
fundacional de Cristo representava uma sociedade distinta da sociedade
civil, tinha a sua disciplina jurídica própria. A monarquia portuguesa
retirou originariamente da auctoritas pontificia a sua legitimidade nos
quadros internacionais da época.
Contraposição do Direito Canónico com outras fontes de Direito e
importância para outros ramos de Direito:
A doutrina ( trabalho interpretativo dos juristas), era estendida para além do
“corpus iuris civilis” para o “corpus iuris canonici” , procurando fazer uma
síntese dos dois naquilo que se intitulava de “utumque juris”, direito que
surge da união do sagrado e do profano, de importância extrema para os
estudos legais atuais.
O direito canónico veio a ter influência para a formação de vários ramos do
Direito Moderno como: Direito da Família ( casamento, doutrina dos
impedimentos e respetiva liberdade), Direito das Obrigações ( através de
conceitos como a boa fé) e Direito Processual ( através da racionalização da
prova)
A aplicação do Direito Canónico em Portugal e as suas fontes de Direito:
O direito canônico teve várias fontes na sua elaboração:
Fontes ​essendi​ ( causas eficientes e essenciais do Direito Canónico)
- A ​Sagrada Escritura / Bíblia ​dividida em 2 fontes individuais:
O ​Antigo Testamento ​( onde se encontram preceitos cerimoniais, entendido
como os formalismos das cerimónias religiosas; preceitos judiciais
nomeadamente através da descrição de costumes judaicos; e finalmente os
preceitos morais);
O ​Novo Testamento ​( de onde se faz o decalque do direito divino, aquele
revelado diretamente por Deus; do Divino- Apostólico, que consiste no
desenvolvimento por parte dos apóstolos no espírito do sistema do Direito
Divino);
- A ​Tradição ​constituída por:
Um Saber translatício ( divido em 3 modalidades: ​inhesiva -​explícita nas
sagradas escrituras; declarativa- implícita nas escrituras; constitutiva- não
vem nas sagradas escrituras);
Verdade Aceite Pela Igreja;
- Costume ​( que deveria ser aceite pela razão, deter uma certa
antiguidade, ter racionalidade e reunir a consensualidade);
Fontes​ Cognosciendi​ ( visão normativa-legislativa do Direito canónico)

- Cânones
Cânone- determinação efetuada pelo Papa, quer em concílio ( assembleias
eclesiásticas de âmbito largo), quer através de uma cúria ( assembleias de
caráter restrito ao Papa e aos seus cardeais, em que se emitem leis com
força obrigatória para a Igreja)
O ​Corpus Juris Canonici e​ ram sucessivas compilações de cânones que se
efetuaram distintas em 2 modalidades: ​decretos (​feitas por iniciativa do
Papa através da cúria e que tinham como função eliminar os cânones
discordantes) e as ​decretais ​( elaboradas e organizadas pelos concílios,
embora que por iniciativa papal);
Ambos podiam ser organizados pela seguinte lógica:
- o âmbito de aplicação de cada um;
- lei posterior revoga uma anterior;
- regra geral podia ser contornada por regra especial;
- regra geral podia ser contornada por regra excecional;
A compilação dos cânones no ​corpus iuris canonici ​deu-se através de 5
momentos :
- Decretum ​de Graciano, elaborado em 1140 e primeira organização de
cânones discordantes
- ”Decretais”, cinco volumes elaborados por Gregório IX em 1234;
- Livro “ Sexto” recolha de decretais posteriores a 1234;
- As “ Clementinas”, decretais elaboradas até 1313;
- As “ Extravagantes”, conjunto de decretais que estavam dispersas do
âmbito de outras compilações;

- Concórdia e Concordata:
Estas foram pactos entre o monarca e o clero. A distinção deles deve-se ao
facto de as concórdias terem uma “natureza local”, sendo estabelecidas
entre o rei e o clero nacional, enquanto que as concordatas teriam uma
natureza internacional, sendo estabelecidas entre o rei e a Cúria Romana;
Referência à Cúria de Coimbra de 1211 ( várias interpretações para o
direito canónico medieval) e os Mecanismos de reação ao direito canónico
( nomeadamente do Monarca)
A penetração do direito canónico era tal que nas cortes ou cúria alargada de
1211 em Coimbra houve necessidade de hierarquizá-lo em relação ao
direito do rei. A ordenação estabeleceu-se segundo o entendimento geral a
prevalência deste em relação ao rei, com a supremacia eclesiástica, sendo
que todas as leis humanas encontrariam os seus limites e esferas de
competências circunstanciais pela ordem espiritual.
Deve citar-se que o “beneplácito régio” era a forma ou instituto a que orei
recorria para limitarem o poder do clero, justificando-as como uma maneira
de fiscalizar as leis para garantir que os princípios do direito divino e
natural são respeitados, conseguindo evitar que o clero se descontrolasse
quando usa-se os seus poderes. Este instituto teve o seu maior relevo
durante o reinado de D.Pedro I. A Igreja teve múltiplas tentativas de
revogar este instituto no entanto, apenas com D.João II conseguiu realizar
este desejo, não se sabendo ao certo o porquê, mas pressupondo-se que se
deveria ao contexto da política interna e internacional portuguesa e
necessidade de obter boas relações como o Papado devido à consolidação
interna da realeza e toda a política de expansão.
Aplicação do direito canónico nos tribunais ( Referência ao critério do
Pecado)
O direito canónico foi aplicado nos tribunais nacionais, não só nos
eclesiásticos. Era assim utilizado nos tribunais civis, onde determinavam
quem estava sujeito aos tribunais eclesiásticos por dois critérios:
- Matéria ( questão em disputa);
- Pessoa ( membros do clero só poderiam ser julgados em tribunais
eclesiásticos)
Nos tribunais civis foi utilizado inicialmente o direito preferencial,
passando depois apenas a ser aplicado em casos de pecado. Isto aconteceu
quando o direito canónico tomou uma posição mais subsidiária, não
prevalecendo sobre o direito nacional, sendo que se sobrepunha apenas em
casos de pecado;
Direito Canônico nas Ordenações e na Lei da Boa Razão
Na feitura das primeiras Ordenações, as Ordenações Afonsinas o Direito
canónico foi colocado no campo das fontes subsidiárias, sendo este
utilizado em matéria espiritual bem como nos casos em que o direito
romano não instituísse, desde que não fosse contrariado pelas grosas e
Doutores das Leyx. No entanto o professor Duarte Nogueira nega que o
direito canónico fosse direito subsidiário para além dos casos de matéria
espiritual e temporal. O que realmente está presente é que na omissão de
direito nacional ( presente nas Ordenações), decidir-se-ia conjuntamente
pelo Direito Romano e pelo Direito Canónico.
Até à feitura da Lei da Boa Razão ( 18 de Agosto de 1769), o Direito
Canónico manteve-se como fonte de direito subsidiário, no entanto nesta
estaria presente que deveria haver uma “separação definitiva” entre o
Direito Canónico e Pátrio, como forma a acabar com os conflitos entre a
utilização dos dois ordenamentos. O Direito Canónico passaria então a ser
usado apenas em 4 ocasiões: casos em que a lei civil o implicasse
explicitamente; preceitos utilizáveis em correção ao direito romano;
impossibilidade de recurso a outros ordenamentos; ministros dele devessem
conhecer para obviar à opressão;
Costume e Direito Judicial:
Noção de Costume:
O costume pode definir-se como a repetição habitual de uma conduta
havida por juridicamente vinculante, tendo sido muito importante nesta
época como visa a expressão “Costume he desy direito”.
Costume como Fonte de Direito na Época Medieval Portuguesa:
As fontes registam-no também no sentido do Direito não reduzido a escrito,
mas usado pelos homens durante muito tempo. Embora tudo isto a força do
costume não é mais autónoma visto que o Rei se arroga o direito de aprovar
e reprovar costumes, podendo os delegados do rei, os “corregedores” (
função de aprovação ou reprovação dos vários costumes do país) estar
encarregues disto.
Requisitos do Costume:
O professor Braga Cruz, diz que os costumes “per si” se devem formar
espontaneamente e sem resultar de qualquer tipo de processo legislativo.
Os motivos de prestígio do costume são os seguintes:
-Antiguidade ( período durante o qual a prática foi realizada);
-Consensualidade ( respeito dada à norma pela generalidade da população);
- Racionalidade ( correspondência do costume com o Direito Natural);
Valor Jurídico do Costume:
O costume era utilizado para integrar as lacunas de todas as outras fontes
do direito , colmatando as falhas do “Utumque Iuris”. Se tivermos em conta
o facto de a grande maioria da população deste período ser analfabeta,
entende-se a sua aplicação a nível local como de extrema importância pois
este era o direito conhecido por todos.
Costume nas Ordenações e na Lei da Boa Razão:
Após a realização das Ordenações Afonsinas o Costume continuou em
vigor como uma fonte de direito, sendo que o costume antigo era uma fonte
imediata de direito .
Foi em articulação com o Estilo que a lei positiva previu o direito
consuetudinário como fonte de direito comum. Nas Ordenações Afonsinas
refere-se apenas o seu caráter vinculativo ao lado da lei e do estilo, as
Manuelinas e Filipinas tão continuidade a isto exigindo no entanto a
verificação de certos requisitos.
O costume representa a força natural e dinâmica que conforme o
sentimento jurídico das comunidades em que se não exacerbam ainda os
individualismos dominadores. O problema pôs-se, logo que o renascimento
jurídico facultou ao monarca a possibilidade de brandir a lei como
elemento centralizador. Houve necessidade de conciliar inteligivelmente a
vigência simultânea dos dois. O costume tinha força de lei, considerando-o
a manifestação da vontade tácita do monarca. A explicação resultava da
tentativa de conciliar a realidade vivida ( o costume ), com outra fonte que
lhe faz concorrência.
Relação entre Costume e Direito Judicial:
O costume era também aplicado nos tribunais, nomeadamente na sua
organização. O costume judicial também veio a dar origem à
jurisprudência, que não assumiu a importância em Portugal que assumiria
nas regiões anglo-saxónicas.
Direito Judicial como fonte de Direito? ( Prof.Braga Cruz vs. Posição
Adoptada)
Convém referir que para o professor Guilherme Braga Cruz, o Direito
Judicial, mais propriamente as sentenças judiciais deste período
dificilmente podem ser olhadas como fonte jurídica de caráter autónomo,
dizendo que “ apesar do peso que possuíam no estabelecimento de
correntes jurisprudenciais e de se revestirem por vezes de força vinculativa
para a decisão de casos similares, eram só vistas como na definição
autorizada de costumes anteriormente vigentes e não como um modo
autónomo de criar direito novo”. Elas próprias entravam na ampla
percepção de costume da corte “costume he en casa d’El Rei”, para
designar a jurisprudência da cúria régia.
Modalidades de Costume:
O costume dimana da própria comunidade especificamente, o costume
judicial é produto de um órgão privativo e assume o nome de...
-Estilo: espécie de Direito não escrito, introduzido pelo nome de
determinado pretório. O estilo fundamenta-se com a prática de um tribunal,
identificando-se este também como “Norma Consuetudinária de Direito
Processual”
- Façanhas: entendidas numa tripla acepção
> Juízo sobre ação notável ( padrão normativo para o futuro, devido à
autoridade de quem praticou ou aprovou a sentença);
> Opinião controvertida;
> Própria ação de que decorre o juízo;
Ou simplesmente como “sentenças que valiam não só para o respetivo
processo, mas para todos os casos semelhantes, porque eram emitidos pelo
monarca”.
-Alvidros: juízes escolhidos pelas partes em contestação, agindo em nome
destes, colmatando lacunas através do costume ou da equidade. As suas
decisões podiam ser utilizados para completar as sentenças de casos
semelhantes.
Direito Prudencial:
Renascimento do Direito Romano Justinianeu:
O ressurgir do Direito Romano deve-se fundamentalmente ao trabalho dos
prudentes, mas também se deve a outros fatores de diversas ordens:
- Religiosas ( direito romano dava maior consistência ao direito
canónico, integrando as suas lacunas);
- Políticas ( com Carlos Magno a centralização do poder era favorável
à implantação dessa legislação);
- Culturais ( começa-se a esboçar o que viria a culminar com o
renascimento);
Com a expansão do Direito Romano, surge o “ius gentium”, direito novo
criado pelos romanos, para ser aplicado aos povos que tendo relações com
Roman, não fazem parte da cidadania romana. Pouco depois surge o direito
romano vulgar ( adulteração feita pelos povos autóctones do direito
romano), o direito romano visto da perspectiva dos povos que tinham
contacto com a cultura latina.
Noção de Direito Prudencial:
Tem origem no trabalho dos prudentes ( intérpretes dos textos legais e
jurídicos da época, criadores do direito, pois estão fora da esfera do poder
político). Baseiam-se fundamentalmente no direito romano justiniano (
corpus iuris civilis). Para efetuarem o seu trabalho os prudentes baseiam-se
em 2 faculdades:
- “Auctoritas”- saber socialmente reconhecido;
- “ Inventio”- capacidade de criar novo direito através da adaptação do
“Corpus Iuris Civilis” às realidades diferentes, através da glosa, e
mais tarde do comentário;
“Corpus Iuris Civilis”, Noção e Caracterização:
Do séc.VI até ao séc.XI predomina a utilização do direito contemporâneo,
embora viesse a ser elaborada pelo imperador Justiniano, o código
Justiniano também conhecido como “ Corpus Iuris CIvilis”, que se dividia
em:
- “Codex ( conjuntos de constituições imperiais anteriores a
justiniano);
- “ Digestum” ( doutrina de juristas romanos);
- Instituições ( conjunto de manuais escolares);
- Novelas ( constituições posteriores ao imperador justiniano);
Escolas Medievais:
Entre aqueles que analisaram o Direito ROmano podemos ver 3 Escolas:
-Escola dos Glosadores ( séc.XI- séc.XII)
Iniciou-se com o Monge Irnério, mas o seu maior vulto foi, Acúrsio e a sua
obra “ Magna Glosa” que constitui uma obra de referência para a História
do Direito Mundial.
Os glosadores limitavam-se à letra da lei, tendo em conta o “ Codex”, o “
Digestum” e as suas respetivas organizações não alterando as mesmas,
fazendo um simples trabalho e substituição de sinônimos para facilitar a
leitura . Acredita-se que na realidade interpretavam as leis, indo para além
do sentido literal, procurando o sentido real das leis
- Escola dos Pós-Acursianos ( séc.XII-séc.XIII)
Corrente que permitiu a transição entre glosadores e comentadores. O seu
nome deve-se à “ Magna Glosa” o expoente máximo do espírito glosador,
tendo a partir daí entrado em declínio essa escola de pensamento.
- Escola dos Comentadores
Os juristas mais importantes foram Jacques de Revigny e Bártolo.
Afirmava-se que estes autores faziam um trabalho de análise que apenas
tinha em conta o sentido dos textos, afirmando-se hoje que o seu trabalho
visava, antes de mais a adaptação do direito romano às realidades.
Método da Glosa e Método do Comentadores:
Tradicionalmente era pensado que a diferença entre os glosadores e os
comentadores residia no facto dos primeiros terem um respeito absoluto
pelo “ Corpus Iuris Civilis”, enquanto que os segundos preferiam proceder
à busca do espírito ou sentido real das normas jurídicas. De facto, os
doutores não procuravam só o sentido literal no seu trabalho, como também
elementos metaliterais, caso da moral, da analogia (elementos da vida
extraterrena) e a alegoria. As chamadas artes do “trivium”, método usado
na interpretação dos textos, como a gramática, a retórica e a dialética.
A única forma eficaz de distinguir as duas escolas será pelo contexto
político na qual se insere:
- Os glosadores procuraram um direito romano puro, visto se querer
fundar um novo império romano no Ocidente, pensando-se que o
código justiniano poderia ordenar tanto a esfera temporal, como
também espiritual, vendo a igreja como sucessora natural do império;
- Os comentadores surgem num período em que diversas cidades e
pequenos estados aspiram à independência. A ideia de haver um
imperador torna-se inconveniente, sendo a lei romana infiltrada pelo
direito local.
Metodologia analítico-problemática das universidades:
Há que ter em conta o facto de a maioria dos juristas que elaboravam o
Direito Prudencial, eram Professores Universitários. Havia um enorme
intercâmbio académico entre as várias universidades de direito da Europa,
possibilitando a população universitária europeia de falar o Latim. Assim o
direito prudencial foi fomentado pelas universidades, tendo sido nelas que
surgiu o “Utumque Ius”.
Nestas haviam vários géneros literários:
-​Glosa​:explicações singulares de termos, conceitos ou passos de escrita.
São tradicionalmente catalogadas segundo aspectos externos sem
correspondência formal em glosas:
interlineares​ « escritas entre as linhas do texto»,
marginais ​«escritas nas margens»,
técnicas​,
retóricas-dialéticas
declarativas​;
-​Apparatus​ ( série de glosas às palavras de um texto entre si ligadas pela
ordem assumida por aquelas e de forma a dar uma visão geral e uma
interpretação coerente);
- ​Quaestio:​ podia reportar-se a…
​ uaestio Facti ​( Um Facto)
>Q
​ uaestio Iuris (​ Interpretação do Direito)
>Q
Haveria um diálogo entre indivíduos em contradição.E é disputada numa
“​quaestio disputata​”, em que se toma duas posições reais:
​ aportata (​ mestre recolhia os argumentos melhores);
>R
​ eterminatio​ (​ mestre declarava depois um juízo);
>D
-​Commentarius ​( trabalhos feitos com o intento de estabelecer uma visão
sintética de um instituto feita sobre uma base lógica);
- ​Summulae (​ pequenos escritos onde se sumaria sistematicamente o
conteúdo de um livro);
-Summae (​ exposição sistemática, feita com propósitos compendiários e
tendencialmente integrais, de uma parte , de um título ou do “ Corpus Iuris
Civilis);
- Solutiones Contraritatuam;
- Brorcarda;
-Notabilia;
-Distinctiones;
-Quare;
-Casus;
- Disputationes;
-Tractatus;
- Consilia;
-Allegationes;
-Lectura;
Receção do Direito Romano em Portugal: causas e caracterização
Existem várias provas da aplicação do direito prudencial em território
português , sendo a mais conhecida o testamento do Bispo do Porto de
1185. O direito Romano conheceu uma recepção que se prolongou ao longo
de dois momentos distintos:
1- Dá-se início ao conhecimento do direito romano, sendo grande a sua
influência no país visto ser mais completo que o direito nacional;
2- Direito é aplicado nas ordenações de forma subsidiária, tendo em vista
colmatar as lacunas;
Com a fundação dos estudos gerais em Coimbra por D.Dinis, passou-se a
estudar em Portugal o “corpus iuris civilis”, entrando também neste país
pela mediação dos nossos vizinhos, visto as obras doutrinais castelhanas e
os textos das Partidas terem uma forte afluência em solo português.
Evolução ao Longo das Ordenações
Na feitura das ordenações Afonsinas resultaria que o Direito Romano era
visto como uma fonte subsidiária de Direito, utilizado nas coisas temporais,
excepto se contrariando o direito canónico fizesse incorrer em pecado;. O
professor Duarte Nogueira destaca que há que proceder a 1 restrição ao
âmbito de aplicação do Direito Canónico, a favor da Glosa de Acúrsio e da
autoridade de Bártolo. Na interpretação proposta utilizar-se-ia a Glosa e a
opinio i​ mediatamente na falta de “Corpus Iuris”, na falta de Direito
Nacional decidir-se-ia justamente pelo Direito Romano e Canónico
Fundamento da Vigência do Direito Romano: causas e caracterização (
Ratio Scripta / Iurisdictio Imperii)
Sendo a igreja vista como de certa forma “ a sucessora natural do império”,
era natural que todos os reis cristãos devessem aplicar nos seus territórios o
direito romano. A ​iurisdictio imperi​ era a supremacia universal do império
romano, o que levava a que se estipulasse que a legislação por ele criada
fosse aplicável a todo o mundo mesmo que que não fizesse parte do
império), muito diferente daquilo que era a ​ratio scripta​ que era asserção
comum contida na Europa em relação Direito Romano.
Houve por vezes conflitos entre a opinião comum e o direito régio
legislado. Estes eram resolvidos de forma simples, como o direito
prudencial seria algo de probabilístico , seria também dependente da
autoridade de quem omitiu o argumento ou meio de prova . Seria aceite se
fosse comprovado pela maioria.
O facto de a maioria dos juízes serem iletrados em latim fez com que
muitos dos textos normativos provenientes do Direito Prudencial fossem
ignorados. Em conjunto com isto o costume era visto como a fonte de
direito privilegiado.
Lei da Boa Razão e Afastamento do Direito Prudencial /”Usus Modernum
Pandectum”
No séc. XIII surgiram várias linhas de pensamento: a escola racionalista do
direito natural ( defendia a existência de 1 direito natural eterno e imutável,
baseado na razão humana), o​ usus modernus Pandectarum (​ partia da ideia
de que o Direito das​ Pandectas​, isto é o direito romano, devia ser utilizado
naquilo que tivesse de essencial à luz do direito natural) e o Iluminismo (
reconduz-se à luz da razão). Verney critica o ensino do Direito em
Portugal, repetindo as críticas dos humanistas contra Bártolo e a opinião
comum e ainda o excessivo romanismo dos juristas.
A Reforma Pombalina orienta-se assim pelo jusnaturalismo racionalista,
dando lugar predominantemente ao Direito Natural e afastando o Direito
Prudencial.
Humanismo Jurídico
Este movimento surgiu nos fins do séc. XV e desenvolveu-se no séc. XVI,
por oposição ao Direito Prudencial, numa lógica de que o conhecimento só
seria verdadeiro se pudesse ser demonstrado.Este movimento defendia o
MOS GALLICUS, por oposição ao MOS ITALICUS que era o
conhecimento do Direito Prudencial. Para fazer vingar as suas teorias e,em
clara oposição aos prudentes,os humanistas jurídicos elencaram uma série
de críticas ao trabalho dos mesmos, nomeadamente
-Acusaram-nos de se terem limitado ao estudo do código justinianeu
quando este não continha certamente o melhor do direito romano. Por outro
lado esse estudo era incompleto porque não sabiam grego e o código
justinianeu tinha uma estrutura histórica grega.
-Acusaram-nos de não se ter preocupado com a veracidade das fontes
jurídicas e não jurídicas dos trabalhos que produziram, e, portanto de terem
efectuado um trabalho com base em fontes erradas, já que eles (humanistas
jurídicos) tinham constatado que as fontes do código justinianeu estavam
erradas​.
-Acusaram-nos de não terem técnicas de raciocínio jurídico, tais como a
filologia,e de, para ultrapassar tal defeito, se terem baseado na autoridade
dos doutores, quando o que se deve promover é a liberdade de pensamento.
Com efeito, os humanistas jurídicos defendiam que no estudo dos textos
romanos, deveria-se confirmar a autenticidade das fontes, fazer um estudo
filológico dos textos e substituir a autoridade pela liberdade de pensamento.
Direito Penal Medieval:
Caracterização:
Em Portugal, assiste-se essencialmente à autotutela, o que estava
constantemente em tensão com o poder central que se socorria do direito
canônico e romano. Gradualmente o estado veio a assegurar o monopólio
da punição. Por falta de aparelho central dotado de força vinculante visto a
nação estar emergida na reconquista, as comunidades adotaram formas
próprias de exercer a justiça. Sucedeu que veio a reinar entre nós a ​vindicta
privada (​ direito do lesado proceder À reparação do crime sem recurso à
justiça pública). A transição deste sistema decorreu assim:
1) A comunidade começa a estabelecer as condições em que a “vindicta
privada” pode ser exercida;
2) Exige-se que a própria vingança seja proporcional À ofensa
cometida;
3) A autoridade comunitária passa a propôr e depois a exigir que a
ofensa seja redimida através de 1 composição pecuniária ;
4) Estabelecimento de um regime de arbitragem
Identificação da perda de paz relativa e absoluta:
Perda de Paz Relativa:
A forma mais pira de auto-defesa é a vingança privada ou a perda de paz
relativa, apenas permitida para os delitos mais graves, aparece como
instituição jurídica regulada. Depois de desafiado, o preconizador gozava
de 1 trégua, finda a qual se procedia a 1 declaração de inimizade.
Decorriam desta declaração:
-1 sanção pecuniária;
- o desterro:
- a vingança;
A perda de paz relativa pode cessar pela composição que revestia várias
formas:
- o criminoso podia comprar a paz, através de 1 preço equivalente À
ofensa;
- composição moral, para casos em que o criminoso não tivesse bens,
sendo este agredido com um certo número de varadas;
Perda de Paz Absoluta:
Tinha como efeitos transformar o criminoso em inimigo público perdendo
todos os direitos, já que impendia sobre todos os membros o dever de o
perseguir e matar, sendo-lhe destruídos os bens e a casa. Tal situação recai
sobre delitos de extrema gravidade, ofensa contra o Rei e teve
consequência depois o surgimento da pena de morte.
Regulação e Publicização do Direito Penal
Os nossos reis, por influência do direito romano e canônico, procuraram
criar 1 legislação geral, reagindo contra as formas de autotutela. MAs
aconteceu, por vezes a situação da comunidade impor 1 série de penas
públicas. As penas pecuniárias são frequentes, não só na como autônomas
mas como subsidiárias
O direito estadual vai procurar reagir contra as formas de autotutela,
procurando monopolizar o poder punitivo. Para este efeito proíbe-se a
realização da vingança dentro da casa do inimigo; destruição dos seus bens
e que a vingança possa recair sobre os homens do inimigo.
Em 1325 uma lei vem estabelecer a ilicitude da vingança em geral,
ressalvando em certos casos a prevalência do costume, nomeadamente para
os fidalgos. Posteriormente o rei, vem reagir contra o costume,
estabelecendo a proibição geral da vingança, para todos os casos e todas as
classes, sob ameaça de morte. Perante a reação negativa dos fidalgos o rei
veio a ceder, por fim viria a considerar legítima a ​vindicta q​ uando o
ofensor, passados 60 dias sobre a data da ofensa, não se submeter a
julgamento ou solicitar carta de segurança. A luta contra esta figura
também passa pela defesa da justiça pública contra a resistência aos seus
ditames u oficiais, bem como pela punição a abusos de poder. Para este
efeito estabeleceram-se penas para os que não aceitassem uma pena após a
sentença final. Estabeleceu-se ainda a garantia de que ninguém poderia ser
acusado 2 vezes pelo mesmo crime.
Foram criadas diversas disposições legais que impunham aos juízes que
aplicassem convenientemente a justiça sem abusos de poder
Ordenações do Reino e o quadro fontes do direito
Conceito de Direito Comum ou Subsidiário:
A grande relevância das Ordenações Portuguesas é que elas marcam a
independência, pelo menos formal, entre o direito próprio do Reino de
Portugal e o “direito comum” – que com ele convivia paralelamente –
subalternizado então ao posto de fonte subsidiária frente ao primeiro.
Efetivamente, as primeiras Ordenações Portuguesas, as Afonsinas, datadas
de 1446 ou 1447, estabelecem uma hierarquia das fontes, com
preponderância para o direito nacional vis-à-vis o direito subsidiário
(romano, canônico, etc.). Essa coexistência de diversos sistemas jurídicos
explica em grande parte, inclusive, o surgimento das Ordenações, dada a
necessidade compilatória do confuso emaranhado de leis e regras jurídicas
que se sobrepunham à época.
Efetivamente, embora as Ordenações Afonsinas representassem aquele
citado esforço de compilação e organização relativa das fontes, de um lado,
e de concentração da produção normativa nas mãos do monarca até certo
ponto, de outro, claramente admitia a falibilidade do direito nacional em
resolver todas as possíveis disputas, e, portanto, a existência de lacunas a
serem colmatadas por outros sistemas jurídicos. Daí falar-se em direito
subsidiário nas Ordenações, ou seja, um sistema de normas jurídicas
chamado a colmatar lacunas de outro sistema (no caso, o direito pátrio).
Situação Anterior às Ordenações Afonsinas:
O alargamento da esfera da ação régia e como fortalecimento do poder do
príncipe
+
Desenvolvimento do Estado como noção e realidade em si própria e o
aparecimento do termo estado, como emergência de algo específico;
||||
\\//
Atividade legislativa a partir de Afonso III desenvolve-se sempre
progressivamente de modo a ser possível assinalar uma tendência da lei
para se impor a todas as demais fontes jurídicas.
Se a fragmentação política medieval principia a ser substituída por uma
tendência convergente do poder, também o pluralismo jurídico da Meia
Idade cede passo a passo uma linha unitária, de que a predominância da lei
é expressão.
A lei passará a ser definida especialmente como preceito autoritário, como
norma ou regra obrigatória imposta pela vontade superior ( abrange os reis,
príncipes)
Em relação às leis, há que distinguir as cartas, alvarás, provisões, decretos,
cartas régias resoluções, avisos e portarias.Sobre estes diversos de tipo de
lei contrapunham-se na duração , as diferenças relativas à duração sofriam
na prática excepções, muitos alvarás continham determinações cujo efetivo
devia durar mais do que um ano. Os decretos distinguiam-se das leis e
alvarás por não levarem o princípio o nome do rei. As cartas régias
principiaram pelo nome da pessoa a quem se dirigiam, ao que em regra se
seguia um formulário variável segundo a graduação da pessoa. Dava-se o
nome de provisões aos diplomas expedidos pelos tribunais
A elaboração da lei devia obedecer a vários requisitos: observância do bem
comum ; a lei deve ser honesta, justa e possível, conforme à natureza; o fim
da lei há-de ordenar-se para o bem comum; quanto ao agente, não pode
exceder a autoridade do legislador; no que concerne à matéria, não deve
proibir a virtude ou preceiturar o vício; em relação à forma, terá de fazer-se
de modo a que na concessão das honras e na imposição dos encargos a lei
guarde aquela proporção que se observa nos súbditos em relação à
república.
Uma nova lei não devia ser promulgada excepto quando estritamente
necessário- a fim de não se afetar a estabilidade do sistema jurídico.
Existiam institutos específicos da problemática da lei neste período tem a
maior importância o da dispensa ( dispensatio legis). Se a lei é uma
manifestação da vontade do príncipe com força vinculante, este pode
insentar ou dispenasar do seu cumprimetno certas pessoas. Cedo se
procedeu à recolha das leis, para o período agora em causa deve citar-se as
Ordenações de D.Duarte, estas representam um intento de sistematização
que prenuncia a passagem da mera compilação de leis à codificação, que
terá as Ordenações Afonsinas o seu primeiro marco em Portugal.
Contexto elaboração e Sistematização Vigência das Ordenações Afonsinas
A insegurança jurídica motivada pela dispersão de leis existentes no reino
levou a nobreza e o povo solciitarem a D.João I, em Cortes que mandassse
fazer uma compilação das mesmas. Então D.João I encarregou a ordenação
das leis o corregedor da corte João Mendes. Falecido João Mendes no
reinado de D.Duarte , incumbiu então este processo ao Doutor Rui
Fernandes, que veio a concluir a obra em Julho de 1446.
Estas estão repartidas por 5 livros que se subdividem em títulos, os quais
geralmente se desdobram em parágrafos. O ​primeiro​ livro ocupa-se dos
cargos públicos; o ​segundo​ do que concerne à Igreja, clérigos, direitos do
rei, fisco, donatarias, nobreza, judeus e mouros; o ​terceiro​ do processo
civil; o ​quarto ​do direito civil e o ​quinto​ de direito penal.
As Ordenações Afonsinas ocupam na galeria das fontes do direito
português um lugar importantíssimo pelo intuito a que obedeceram e pelo
significado que revestiu a tentativa de reduzir o direito pátrio a um corpo
devidamente sistematizado e ordenado.
Quanto à vigência real do corpo de leis de D.Afonso V, há que considerar,
por um lado a resistência suscitada em torno de tudo o que se ligasse ao
infante D.Pedro, por outro lado, a dificuldade de reprodução múltipla e a
disseminação de tão extensa obra, numa época em que não existia ainda
imprensa. Nestes termos, pode questionar-se quando começou a vigência
Fontes subsidiárias:
O direito português não abarcava todos os casos possíveis e todas as
matérias jurídicas. Daí a necessidade de utilizar, para preenchimento das
lacunas, uma forma de integração através de recurso a outras ordens
jurídicas. A partir de D.João I o sistema de fontes subsidiárias vai sofrer um
processo de redefinição. O Rei começa por explicar as medidas tomadas
para obter a unificação jurisprudencial, havendo já determinado que as
causas fossem julgadas por uma tradução ou traslado das leis do código de
Justiniano, entendidas elas conforme a interpretação conferida pelas Glosas
de Acúrsio e pelas conclusões. Há quem entenda que o Código Justiniano,a
Glosa de Acúrsio e os comentários de Bártolo seriam mera fonte
subsidiária. Como há quem defenda que houve força vinculativa à Glosa,
mas quanto a Bártolo apenas uma tradução do seu comentário.
Distinguiam-se assim as fontes imediatas de direito a lei do reino, o estilo
da corte e o costume antigo; como fonte subsidiárias ,hierarquicamente:
- Direito Romano nas coisas temporais, exceto se, contrariando o
direito canónico, fizesse incorrer em pecado;
- Direito Canónico, em matéria espiritual, bem como nos casos em que
o direito romano instituísse, desde que não fosse contrariado pelas
grosas e Doutores das Leyx ( hipótese em que se remeteria para a
resolução do rei );
- Glosa de Acúrsio;
- Opinião de Bártolo;
Para o professor Duarte Nogueira, há que proceder a 1 restrição ao âmbito
de aplicação do Direito Canónico, a favor da Glosa de Acúrsio e da
autoridade de Bártolo. a interpretação proposta, utilizar-se-ia a Glosa e a
opinio i​ mediatamente na falta de “ Corpus Juris” e nega que o direito
canónico fosse direito subsidiário para além dos casos de matéria de
matéria espiritual.
O que se estabelece é que na falta de Direito Nacional, se decide
conjuntamente pelo Direito Romano e o Direito Canónico, só depois e na
falta de lei do reino ou costume se recorreria às Glosas de Acúrsio e à
Opinião de Bártolo. Temos então de concluir que o Direito Canónico era a
fonte subsidiária, antes de Acúrsio e Bártolo ( só recorridos depois de
esgotadas todas as possibilidades se recorreria).
Ordenações Manuelinas:
A invenção da imprensa constitui meio de comunicação das leis de
extraordinária importância ​.​ Foi utilizada para a difusão das leis e das
Ordenações, por se reconhecer a necessidade de uma revisão da compilação
afonsina, D. Manuel confiou a vários jurisconsultos o encargo de as
reformar e ampliar. Em 1512/1513 Valentim Fernandes imprimiu o livro
primeiro e segundo das Ordenações , mas estes textos deixam D.Manuel a
desejar e ordenou uma revisão definitiva que foi impressa em 1521, cujos
autores referidos têm sido Rui Boto, Rui de Grã e Cristovão Esteves. A
sistematização das Ordenações Manuelinas segue a data da anterior
compilação. A divisão interna das 2 é idêntica. A principal diferença de
forma reside no estilo decretório ou legislativo das Ordenações manuelinas.
Relativamente ao conteúdo, houve alterações no tríplice sentido de
eliminações, acrescentos e mudanças.
Há quem entenda que se trata de 1 compilação onde as leis surgem como
determinações novas, ainda quando, na verdade, proviessem de reinados
anteriores, se está perante 1 código. As Ordenações Manuelinas
representam um progresso do ângulo da técnica jurídica, mas perdem
interesse como fonte histórica do ordenamento jurídico precedente. Existe
um compromisso com o humanismo jurídico, frente ao bartolismo. A
adoção da opinião comum como critério retor subsidiário representava-se
uma limitação da Opinião de Bártolo.
Ordenações Filipinas:
No reinado de D.Filipe I, verificou-se 1 larga atividade renovadora no
campo do direito, de que são símbolos a criação da Relação do Porto, a lei
da Reformação da Justiça e a reforma das Ordenações. As ordenações
foram terminadas em 1595 e mandaram cessar todas as leis extravagantes,
exceto as Ordenações da Fazenda e os Artigos das Sisas. Estas Ordenações
tiveram uma sistematização idêntica às outras, elas todavia nem sempre
resultam felizes visto o trabalho dos compiladores haver sido, por vezes,
pouco claro e não raro isento de contradições. A despeito de todos os
filipinos, as Ordenações de 1603 tiveram longa duração como mais
nenhuma logrou em Portugal.
Elas conservaram na íntegra o sistema de fontes de direito subsidiário
estabelecido nas Ordenações anteriores, embora deslocando a matéria para
outra sede. Segundo o professor Braga Cruz, só agora se rompeu a última
amarra que prendia o problema do direito subsidiário à ideia inicial dum
conflito de jurisdição entre o poder temporal ( direito romano e
eclesiástico). Pode dizer-se que o Bartolismo atinge no período da HDP 1
dos momentos senão o momento de maior intensidade
Direito Outorgado e Pactuado
Segundo os professores Ruy e Martim de Albuquerque, no âmbito do
Direito outorgado e pactuado constam as cartas de privilégio, as cartas de
povoação, as cartas de foral (forais) e os foros, costumes ou estatutos
municipais.
Outorgar vem do latim “auctoricare” cujo significado é essencialmente
consentir, conceder, estipular ou declarar.
Por sua vez, diz se que algo foi pactuado quando foi alvo de um ajuste ou
foi combinado
Cartas de Privilégio:
Estas entendem-se, no sentido lato, por documentos que concedem
prerrogativas, liberdades, franquias e isenções de qualquer ordem com
índole muito variada. Porém, todas têm como característica comum o facto
de traçarem um regime jurídico específico para um dado território ou
comunidade.
Há diversos exemplos de cartas deste tipo, entre as quais: a carta de
liberdade de uma povoação, a carta de doação, a carta de franquia, e por
vezes, nelas também se inseriram as cartas de povoação, os forais e os
foros.
Cartas de Povoação:
As cartas de povoação, derivadas do latim charta ​populationis​, definiram o
regime jurídico concreto para cada terra, assim como as condições de
exploração da mesma, tendo um pendor económico pois nestas cartas se
estabeleciam as prestações pecuniárias a que os povoadores ficavam
vinculados, assim como os meios de detenção e ligação à terra. Sendo
assim, o rei ou senhor que as outorgaram fixava um conjunto de normas
que definiam o estatuto dos futuros colonos. Consequentemente, depreende
se que estas cartas têm como fim atrair população para um determinado
território que se encontraria despovoado ou escassamente habitado.
As cartas de povoação constituem um ato unilateral ou outorgado
unilateralmente revestido até de uma forma imperativa, que nem assumia
uma forma contratual, ditando regras para o futuro, constando do domínio
senhorial.
No entanto, os professores Ruy e Martim de Albuquerque consideram que
todos estes pontos não obstam totalmente à natureza contratual das cartas,
defendendo que a essência do contrato não reside propriamente na
liberdade de estipulação, como na autonomia da vontade (ajuste ou não aos
termos que são propostos no contrato)
Forais:
Este tipo de cartas é muitas vezes confundido com as cartas de povoação,
pois as linhas divisórias entre estes dois tipos de diplomas não são assim
tão nítidas.
Como forma de as distinguir, é possível afirmar que os forais são muito
mais extensos do que as cartas de povoação, abarcando também um maior
número de matérias. Em segundo lugar, as cartas de povoação visavam
reger as condições de assentamento nas terras. Já os forais, para além disso,
continham preceitos ou disposições de vários âmbitos do direito
(processual, militar, fiscal, penal e administrativo), acompanhados de
regras de direito privado.
As normas constitutivas destas cartas têm origem muito diversa: nas cartas
de privilégio e de povoação, nos costumes e no direito judicial, nos foros de
outras localidades, no direito comum, no direito prudencial, entre outros. É
de se destacar que o direito geral acompanha as normas dos forais como
direito subsidiário, integrando as disposições foraleiras, muito suscetíveis a
lacunas.
Os forais eram outorgados quer pelo monarca, por um senhor eclesiástico
ou secular ou por uma instituição religiosa. Como meio de dar mais força
ao ato, este vinha, por vezes, confirmado pelo monarca e pela sua
respectiva família.
Os forais, primeiramente eram redigidos em latim e só mais tarde é que
passaram a ser feitos em português.
Foros:
A primeira característica diferenciadora entre os foros e as cartas de foral
tem por base a sua dimensão. Os foros contêm um maior número de
normas, sendo assim possível abarcar um maior acervo de disposições de
direito privado, abrangendo, dessa forma, uma gama mais vasta de áreas.
O segundo ponto diferenciador entre os foros e as restantes cartas reside no
âmbito temporal, uma vez que os foros surgem mais tardiamente. Por
consequência, estes afloram na sua composição reminiscências e
prolongamentos de antigos ordenamentos.
Alexandre Herculano considera os foros como monumentos históricos que
melhor nos fazem conhecer, além das relações jurídicas da vida civil, as
usanças, hábitos e ideias, o grau de civilização moral e material do primeiro
período da nossa Idade Média.
Direito suprapositivo
Definição de Direito Suprapositivo na Idade Média:
O direito positivo era o direito produzido pelo homem. O direito
suprapositivo resulta de alguém que o produz e que está acima do homem.
No período pluralista os ordenamentos que tinham supremacia sobre o
direito positivo e portanto estavam acima deste eram o Direito Divino e o
Direito Natural(concepção teológica).Com efeito, no período pluralista
(sec. XIII e XIV) não havia uma grande diferença entre o direito natural e o
direito divino, porque as fontes dessa altura eram utilizadas arbitrariamente.
Distinção Direito Divino e Natural:
Todavia, alguns autores, dos quais se destacam ​São Tomás de Aquino ​e
Santo Agostinho​, distinguiram o direito natural do direito divino, embora
sem grande rigor. ​São tomás de Aquino ​era um representante da
escolástica medieval e desenvolveu a designada teoria tomista da lei eterna,
escudada num método de ensino livresco que não permitia a discórdia, em
respeito ao princípio da “​magister dixit​” (o professor disse e por isso não
se pode discordar do que vem no livro).
Com efeito, os secs. XII e XIII, foram muito marcados pelo pensamento de
São Tomás de Aquino​, cuja construção assentava em 4 leis,
designadamente, a ​lei eterna​, da qual derivam a ​lei natural ​e a ​lei divina​,
as quais, por sua vez, serviam de base à ​lei humana​:
1)​Lei eterna ​correspondia à razão e à vontade de Deus e era a lei
governadora do mundo. Não era escrita e tinha a ver com algo
transcendente.
2)​Lei natural ​resulta da participação da lei eterna no homem, que lhe
permite distinguir o bem do mal, o que é e não é devido. O homem
necessitava dum ser superior para o orientar.
3)​Lei divina ​deriva da participação da lei eterna e corresponde à revelação
da palavra de Deus ao homem, através da Sagrada Escritura, revelando o
que se deve e não deve fazer.
4). ​Lei Humana ​resulta da confluência das anteriores leis e para ser boa
essa confluência tem de ser harmoniosa.
Santo Agostinho ​defende uma teoria muito parecida e segue a mesma
divisão de leis, embora não fale expressamente na lei humana.​Santo
Agostinho ​sustenta que a lei natural é a lei inscrita no coração dos homens.
Com efeito, o ​direito natural ​já na época medieval tinha várias
concepções, dado que não era e continua a não ser um conceito unívoco,
tendo, no entanto, uma ideia convergente, a de que é algo inerente ao
homem.O homem é um ser social e, como tal, necessita de obedecer a
princípios que lhe são anteriores e regem a vivência em sociedade. Esses
princípios correspondem ao ​direito natural​.
A grande discussão nas concepções do direito natural do ​período
pluralista​, começou com a interpretação das versões de Gaio e Ulpiano,
defendendo o primeiro que o direito natural era racional, e o segundo que
era irracional.Apesar de se tender para a versão de Gaio, isto é, que o
direito natural era racional, a par dessa discussão surgiu uma nova corrente,
com uma dupla concepção, a ​profana​(que defendia que o direito natural
era a razão que se encontrava no próprio homem, que é fruto da natureza de
Deus) e a ​sacral​(que defendia que era no direito natural que se encontrava
a resposta para alguém que se revia em Deus).
Características:
No estudo do ​direito natural ​e do ​direito divino ​há que ter em conta dois
princípios, nomeadamente, o ​princípio da imutabilidade ​e da
inderrogabilidade​, que têm a ver com o grau de valoração dos conteúdos,
sustentando-se que historicamente tais conteúdos não sofreram, e não
devem admitir alterações. Porém, na realidade, a evolução histórica levou a
que tanto o direito natural como o direito divino se atualizassem, embora os
princípios básicos não tenham sofrido alterações (direito à vida, direito à
propriedade).
Sobre esta matéria, isto é, a evolução do direito natural e do direito divino,
São Tomás de Aquino ​defende que
”O ​direito natural ​assenta em :
-preceitos primários​(auto evidentes, de fácil percepção que não
comportam, em momento algum, qualquer possibilidade de alteração–por
ex: direito à vida);
-​preceitos secundários​(exigem um esforço de raciocínio,por parte do
homem comum, para os perceber, e, como tal, admitem a possibilidade de
alteração–por ex:usucapião) e
-preceitos terciários​(exigem um esforço adicional de raciocínio para os
perceber,o que só está ao alcance dos sábios.Admitem também a
possibilidade de alteração)
No ​direito divino​, só os ​preceitos móveis​(que correspondiam aos
secundários e terciários do direito. natural)admitiam a mudança, pelo que
os ​preceitos imóveis​(correspondentes aos primários do direito natural) não
admitiam alterações, pois tratavam-se de princípios de Deus que impunham
proibições ou comportamentos.Um último aspecto que importa referir
sobre a temática do direito natural e do direito divino, tem a ver com a
dispensa desse direitos, o que era da competência exclusiva do Papa, como
representante da vontade de Deus.
Com efeito, só o Papa, perante um determinado caso concreto que lhe fosse
apresentado, poderia dispensar alguém da observância duma norma de
direito natural ou direito divino, e fazer aplicar outra.Porém, esse alguém
não era qualquer cidadão, pois, apenas o monarca, em certas situações que
não pusessem em causa o bem comum, poderia pedir a dispensa das leis de
direito natural ou direito divino. A dispensa da lei poderia revestir duas
formas: através da ​magna causa ​ou ​justa causa​, ou através da ​causa
probabilis​. Há, no entanto, autores que defendem que o monarca, no uso
de poderes concedidos pelo Papa, também poderia dispensar os seus
súbditos da observância da lei.
A Lei da Boa Razão
Racionalismo:
Este movimento surgiu no séc. XVIII e corresponde à manifestação jurídica
do iluminismo, realçando a importância da razão, mas uma razão humana
diferente da que era considerada no séc. XII.A razão que deveria ser
considerada era a reta razão, iluminada pelo conhecimento humano e não
pelo divino.As principais manifestações desta razão encontravam-se
descritas numa obra de Luís António Verney, onde o mesmo critica a
opinião de Bártolo e a metodologia dos prudentes, adiantando ainda que os
prudentes não tinham aprofundado a história do Direito Romano,
escondendo essa falha grave com a imposição da sua autoridade.Os
racionalistas do Direito Natural defendiam a existência de um direito
natural eterno e imutável assente na razão humana, a que chamava “​recta
ratio​”.
Em suma, o racionalismo jurídico é uma corrente de pensamento
profundamente nacionalista, que pretende afastar o Direito Romano e
substituí-lo pelo Direito Nacional
Iluminismo Jurídico:
No século das luzes, mantém se a vontade do monarca, mas pretende-se
substituir o ​utumque ius ​pela razão, sendo o Rei e a Razão as 2 possíveIs
fontes de Direito, tomando medidas quanto ao estilo ( passa a só poder ser
usado se aprovado por Assento da Casa de Suplicação) e ao costume.
Também o direito canónico não resiste à reforma iluminista, aponta a lei o
“erro manifesto” de se supor que no foro tempora ( se pode conhecer dos
pecados que só pertencem ao nosso interior), por esse motivo era o direito
canónico proscrito do foro temporal.A Lei da Boa razão é um diploma
característico da segunda metade do século XIX, constitui a primeira
manifestação clara no domínio legislativo das ideias jusracionalistas do
Iluminismo, conhecidas em Portugal pelas mão de Luís Verney que
propunha:
- submissão da jurisprudência aos princípios do direito absoluto;
- recepção crítica do Direito Romano, utilizado o “usus modernus
pandectarum” ( distinção do que seria utilizável na atualidade)
- valorização das leis em vigor nos países europeus mais avançados,
sobretudo nas áreas ou nos setores da vida em que se verificavam
maiores inovação e evolução
Reformas do racionalismo em Portugal: Lei da Boa Razão
Trata-se de uma Lei de ​18 de Agosto de 1769​, inicialmente identificada,
como os restantes diplomas da época, pela simples data. Só no séc. XIX
recebeu o nome de ​Lei da Boa Razão ​e assim ficou conhecida para o
futuro.Esta Lei visava impedir irregularidades em matéria de utilização
assentos e de utilização do direito subsidiário, fixar normas precisas sobre a
validade do costume e fixar os elementos a que o intérprete podia recorrer
para o preenchimento das lacunas.Esta Lei veio assim consagrar as bases
principais da legislação portuguesa e revela uma profunda influência
racionalista ao sujeitar a validade de qualquer fonte de direito, incluindo o
costume, ao critério da conformidade à “Boa Razão”.As soluções que a lei
consagrou foram:
-os casos deveriam ser julgados pelas leis pátrias e pelos estilos da corte;
-Estatui expressamente que o costume teria de estar conforme à boa razão,
não contrariar a lei e ter mais de 100 anos;
oEm casos omissos, isto é, na falta de direito pátrio, caberia recurso ao
direito subsidiário, ou seja ao direito romano se trabalhado,moderno,
conforme a boa razão (direito natural e direito das gentes)e reconhecido
pelas nações europeias cristãs;
o No caso de lacunas sobre matérias políticas, econômicas, mercantis ou
marítimas era permitido o acesso directo às leis das “Nações Cristãs,
Iluminadas e Polidas”, sendo o direito romano liminarmente posto de lado;
oA aplicação do direito canónico é relegada para os tribunais eclesiásticos,
pelo que aquele direito deixou de ser fonte subsidiária;
o Proibição da alegação e aplicação em Juízo das glosas de Acúrsio,das
opiniões de Bártolo e da opinião comum dos doutores.Bártolo é expulso
porque não se conforma com as boas razões
Humanitarismo Jurídico:
Este movimento surgiu nos fins do séc. XVIII e desenvolveu-se no séc.
XIX, na sequência do Iluminismo, caracterizando-se por defender uma
atenuação das penas cruéis e das penas infamantes.Com efeito, em
Portugal, no séc. XIX, o Direito Penal era o que estava contido no Livro V
das Ordenações do Reino, sendo certo que era um direito de aplicação
desproporcional e, na prática, retroactivo.O Humanitarismo Jurídico
defendia um Direito Penal que consagra o princípio da legalidade,o
princípio da humanidade e o princípio da proporcionalidade na aplicação
das penas, condenando as penas cruéis e infamantes dos Ordenamentos
anteriores, bem como a pena de morte.
Estatutos de Coimbra:
Referência ao Método Antecedente:
Com efeito, o direito romano vinha gradualmente a perder a sua
importância no direito português, situação que se agravou na Lei da Boa
Razão, onde era aceite como fonte subsidiária, mas, ainda assim, para ser
válido, tinha de ser actual e concordante com a recta razão.Porém, não
obstante esse facto, o Direito Romano continuava a ser a principal
disciplina nos estudos universitários, designadamente dos dois cursos
jurídicos que existiam à época, o Curso de Leis e o Curso de Cânones,
sendo certo que o direito pátrio, já com alguns séculos de existência e
utilização,não fazia parte dos programas de ensino.Urgia Então uma
verdadeira reforma do ensino.
Caracterização do Novo Método Universitário:
Esta reforma surge na sequência da Lei da Boa Razão e reflecte a influência
das correntes doutrinárias europeias dos secs. XVII e XVIII já aludidas
anteriormente, vindo mesmo, depois de efectuada, a esclarecer alguns
aspectos da aludida Lei da Boa Razão.
Em 1770, foi nomeada uma comissão, com o nome de Junta de Providência
Literária, incumbida de emitir parecer sobre as causas da decadência do
ensino universitário e de obter propostas adequadas à sua reforma.Essa
comissão apresentou no ano seguinte (1771) um relatório circunstanciado,
com o título de Compêndio Histórico da Universidade de Coimbra, onde
criticou de forma implacável a organização do ensino existente e propôs a
aprovação dos novos estatutos, também denominados de ​Estatutos
Pombalinos​,os quais havia elaborado e que vieram efectivamente a ser
aprovados por uma ​Carta de Lei de 28 de Agosto de 1772.
Criação de Novas Disciplinas:
As profundas alterações consistiram na introdução das disciplinas de
História do Direito e Direito Pátrio no Curso de Leis e na introdução da
disciplina de Direito Natural (que integravam Direito Público Internacional
e o Direito das Gentes)nos dois cursos, de Leis e de Cânones.
Introduziu-se também uma mudança do método de ensino, que passou do
método da escolástica (​Lecture)​ para um método
sintético,demonstrativo,compendiário.
O método sintético-demonstrativo-compendiário consistia em fornecer
primeiramente aos estudantes um conspecto geral de cada disciplina,
através de definições e da sistematização das matérias. Depois, seguindo
uma linha de progressiva complexidade, passar-se-ia de umas proposições
para outras até se chegar ao esclarecimento científico, sendo certo que tudo
isto deveria ser acompanhado de manuais adequados, sujeitos até a
aprovação oficial.

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