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JUSTIÇA E RELIGIÃO

AGOSTINHO E TOMÁS DE AQUINO


Justiça e religião

Quando se discute direito e justiça, é imprescindível analisar a influência


que as Sagradas Escrituras produziram sobre a cultura ocidental.

Falar sobre a justiça é falar sobre um fenômeno multifacetado, o que


justifica deparar-se com abordagens diversificadas, tantas quantas sejam as
facetas do problema colocado em análise (faceta metafísica, faceta ética,
faceta técnica, faceta religiosa…). Apagar o capítulo das interpretações
religiosas acerca da justiça é apagar uma parte da saga humana.
Há, porém, que se ressaltar que a diversidade de religiões que se formaram ao
longo dos séculos com base nos ensinamentos cristãos denúncia que a Palavra
está sujeita a múltiplas interpretações. E é do sentido que se atribui à Palavra que
vivem e se orientam as comunidades religiosas. Isto está a confirmar o caráter
controvertido da justiça e de suas possíveis concepções, materialistas,
espiritualistas, ideológicas, racionais…
Leis humanas são leis circunstanciais, que se multiplicam exatamente em função
da diversidade de caracteres dos povos. As leis divinas, que presidem a ordem
divina das coisas, ou o Universo em sua totalidade, não podem estar maculadas
pela mesma especificidade, perecibilidade e circunstancialidade, que são as
características gerais das leis humanas. Assim, para além do que o ser humano
(legislador) institui como o justo e o injusto, existe uma justiça que se exerce de
acordo com regras espirituais, ou seja, de acordo com a lei divina. Esta se
distancia da lei humana no sentido de que aquela é universal, inexorável, perene,
irrevogável. Estas as suas características fundamentais.
O que se quer grafar é que a lei de amor e caridade são os preceitos segundo os quais se deve
pautar o comportamento humano.

Assim, o outro é tido em conta, por essa doutrina, como a única condição de salvação pessoal;
sem o outro não há caridade, que significa doação de si em proveito de outrem; sem o outro
não há amor, que também só se exerce dentro de uma relação humana… Em outras palavras,
somente por meio do outro é que se pode realmente praticar o amor e a caridade, de modo que
o outro é mesmo o mister para o alcance da perfeição de si.
A doutrina cristã trazida por Jesus veio introduzir novas dimensões à
questão da justiça. Tratando-se de uma concepção religiosa da justiça,
deve-se dizer que a justiça humana é identificada como uma justiça
transitória, por vezes um instrumento de usurpação do poder. Não é
nela que reside necessariamente a verdade, mas na Lei de Deus, que
age de modo absoluto, eterno e imutável. A lei humana, portanto, que
condenou o Cristo, o que foi feito com base na própria opinião popular
dos homens de seu tempo, é a justiça cega e incapaz de penetrar nos
arcanos da divindade. A ilusão medra entre os que veem somente dentro
dos estreitos limites do campo material de alcance de sua visão.
Características - Contextualização

- A igreja supriu o vácuo de poder político

- Adaptação das ideias filosóficas à religião cristã.

- Uma filosofia subordinada a teologia.


SANTO AGOSTINHO: A JUSTIÇA E O DAR A CADA UM O SEU

-Santo agostinho é uma das figuras mais importantes


na consolidação do cristianismo.

-Foi o responsável por adaptar a Filosofia de Platão.


Tendo em vista a difusão da filosofia e a expansão de seus postulados e contribuições na
história do pensamento, há que se dizer que a maior contribuição para a formação e o
desenvolvimento do pensamento medieval não foi romana, mas grega. De fato, foi da
síntese e da conciliação dos postulados religiosos com os postulados filosóficos
gregos que se iniciaram diversas correntes de pensamento no Medievo. Disso são
exemplo Aurélio Agostinho (séculos IV e V), na patrística, que perpetrou a fusão do
platonismo com o cristianismo, e Santo Tomás de Aquino (século XIII), na escolástica,
que, por sua vez, perpetrou a fusão do aristotelismo com o cristianismo.
De princípio, há que se notar que, em oposição à Antiguidade, o pensamento
medieval cuidou de proscrever do quadro de atividades humanas louváveis a
ação política (vita activa), invertendo-se, portanto, o modelo de educação
(paideia) cidadã construído pelos gregos e pelos romanos, concentrando
especificamente todos os rumos do saber para a vida contemplativa (vita
contemplativa). Se para os gregos era fundamental o papel da participação
político-social do cidadão, para os cristãos a especulação integraliza o contato
místico com a divindade.
O pensamento medieval, nesse sentido, é, em essência, teologizante da
natureza, e isto por mistificar todo o real com base na interpretação das
Escrituras; Deus está em tudo, Deus conhece a alma humana, Deus tudo
pode.
O ponto de partida da Filosofia política de
Agostinho é o mesmo da tradição clássica. O ser
humano é social por natureza e somente
associando-se com os demais, cada indivíduo
pode atingir sua perfeição.
Sabendo-se que os pressupostos com os quais discute o problema da
justiça são teológicos{...} O que há em Augustinus, no plano de
discussão dos problemas éticos, políticos e jus-filosóficos, que são os
que mais diretamente se deitam sobre a temática da justiça, é um
resgate da metafísica platônica, tudo sob os fortes influxos da
Palavra Evangélica.
A concepção agostiniana acerca do justo e do injusto floresce exatamente nesta
dimensão, ou seja, concebendo uma transcendência que se materializa na
dicotomia existente entre o que é da Cidade de Deus (lex aeterna) e o que é
da Cidade dos Homens (lex temporalem). O tema em Agostinho remete o
estudo do problema da justiça fundamentalmente à discussão da relação
existente entre lei humana (lex temporalem) e lei divina (lex aeterna), onde
está compreendido o estudo das diferenças, influências, relações etc. existentes
entre as mesmas.
Lex aeterna e lex temporalem

Uma concepção sobre a justiça que recorre ao neoplatonismo como fonte


filosófica de inspiração só pode traçar delineamentos dicotômicos para o tema
da justiça e, mais que isto, identificar na justiça transitória a imperfeição e a
corruptibilidade dos falsos juízos humanos, e, na justiça eterna, a perfeição e a
incorruptibilidade dos juízos divinos. Assim é que se pode identificar nas lições
agostinianas a presença do dualismo platônico (corpo-alma; terreno-divino;
mutável-imutável; transitório-perene; imperfeito-perfeito; relativo-absoluto;
sensível-inteligível…), que corporifica radical concepção entre o que é e o que
deve ser. A justiça, portanto, pode ser dita humana e divina.
LEI

Eterna Humana
Lei Eterna- Lei em virtude da qual é justo que todas as
coisas estejam perfeitamente ordenadas.

Lei Humana - pode ser justa e, ao mesmo tempo, variar


no tempo e no espaço. Para ser justa ela deve ser
promulgada para promover o Bem comum

A lei eterna inspira a lei humana, da mesma forma que a


natureza divina inspira a natureza humana.
A obediência à Lei temporal não é garantia de
virtude: alguém pode seguir a lei por interesses
de outros além de ser justo, tal como utilidade ou
egoísmo.
A justiça humana é aquela que se realiza inter homines, ou seja, que se
realiza como decisão humana em sociedade. A justiça humana tem como
fonte basilar a lei humana, aquela responsável por comandar o
comportamento humano. Nesse sentido, o humano relaciona-se com
outros humanos e com o que o cerca; é no controle dessas relações
que se lança a lei humana. Não é, portanto, sua tarefa comandar o que
preexiste ao comportamento social.
Para que se possa pensar acerca do que preexiste, deve-se
recorrer à ideia de Deus, que, como origem de tudo, como
princípio unitário de todas as coisas, só pode ser o legislador
maior do universo. A tarefa divina no controle do todo é, aos
olhos humanos, irrealizável. É exatamente a ilimitação de poderes
de Deus que permite tudo conhecer, tudo saber, tudo coordenar.
Pelo contrário, é a limitação humana que faz do ser humano um
ser restrito ao que lhe está ao alcance mais imediato. A limitação
humana torna o campo de abrangência das leis no tempo e no
espaço igualmente restrito.
A sede da justiça é a República (pólis), mas a Justiça nunca pode ser,
de fato, nela encontrada. Ao contrário, é nas cidades que a injustiça
impera. Santo Agostinho sustenta que é preciso complementar a
justiça humana com uma forma superior e mais autêntica de justiça: a
justiça divina.
A justiça divina é aquela que a tudo governa, que a tudo preside dos
altiplanos celestes; de sua existência brota a própria ordenação das coisas em
todas as partes, ou seja, em todo o universo. A justiça divina baseia-se na lei
divina, que é aquela exercida sem condições temporais para sua execução,
não sujeita, portanto, ao relativismo sociocultural que marca as diferenças
legislativas entre povos, civilizações e culturas diversas. Mais que isso, a lei
divina, além de absoluta, imutável perfeita e infalível, é infinitamente boa e
justa
Grife-se que a lei divina não é somente a lei d’Ele, mas também a que
Ele produz nos homens; nesse sentido, e somente nesse sentido, a lei
dos homens também é divina, à medida que é dada por Deus.
A lei eterna inspira a lei humana, da mesma forma que a natureza divina
inspira a natureza humana. Sem dúvida nenhuma, a natureza humana
pode ser dita uma natureza divina, isto pois todo criado é fruto do
Criador. Nesse sentido, a lei humana também é divina, ou seja, também
participa da divindade. Em outras palavras, a fonte última de toda lei
humana seria a própria lei divina. Todavia, sua imperfeição, seus
desvios, sua incorreção derivam direta e francamente das
imperfeições humanas.
O que faz com que as leis humanas sejam imperfeitas, corruptas, incorretas,
e até mesmo injustas, não deriva da fonte de inspiração divina, mas da
própria pobreza de espírito humana. Nada além do pecado original, que
corrompeu a natureza humana, está por trás deste écran existencial, prenhe
de lamentos e de sofrimentos. O homem existe, e sua natureza é corrupta; é
nesse sentido que se pode dizer que o homem se desgarrou de sua origem.
Não há aí mero determinismo informando a teoria agostiniana, mas uma
profunda consciência de que o livre-arbítrio, sede da deliberação autônoma
do homem, é seu motivo maior de queda espiritual.
a lei escrita constitui recurso auxiliar na organização social. Sua
presença no sentido da regulamentação da conduta humana é
indispensável. De fato, trata-se de ajuda para os homens no governo das
coisas humanas, e, portanto, sua transitoriedade é manifesta, estando
sujeita a mudanças constantes. Essas mudanças podem vir, de um lado,
a favor da própria comunidade, pois o que era lei podia não ser justo, e o
que se tornou lei passou a instituir o justo, ou, de outro lado, em desfavor
da comunidade, ou seja, passando-se de um estado de justiça inscrita na
lei para outro estado de injustiça inscrita na lei.
Mais que isso, Agostinho está preocupado não só com o relacionamento
da lei eterna com a humana, de modo que a eterna se veja cada vez
mais presente e na realidade das leis humanas. Agostinho quer mesmo
salvaguardar a noção de que o Direito só possa ser dito Direito,
quando seus mandamentos coincidirem com mandamentos de
justiça. Conceber o Direito dissociado da justiça é conceber um conjunto
de atividades institucionais humanas que se encontram dissociadas dos
anseios de justiça.
A paz é a ordem da tranquilidade e sem ela
nenhuma sociedade pode subsistir.

Direito e justiça são sinônimos: Não é possível


governar uma República sem a justiça, pois
onde não existe justiça, também não existe
direito e vice-versa
Agostinho quer dizer que o que se faz com direito se faz com justiça, e o
que se faz sem justiça não se pode fazer com Direito;

Ainda uma vez se diga, para Agostinho, o Direito não se concebe


dissociado da noção de justiça. Assim, Direito e justiça atrelam-se, ainda
que em meio à transitoriedade dos interesses humanos, andando de
mãos dadas.
Deus Governantes
Sabios

Razão Humana Súditos


Identifica-se de pronto que a filosofia agostiniana, ao
debruçar-se sobre a questão da justiça, vem sobretudo marcada
pela noção romano-ciceroniana de que o governo de direito é o
governo justo, em que a justiça é o dar a cada um o que é
seu.
Alma, justiça divina e livre-arbítrio

Sabendo-se que o homem é mais que corpo, e não simplesmente alma,


mas união de corpo e alma, o sentido a ser imprimido à vida humana
não deve ser outro senão o do cultivo da alma para a vida eterna.
A alma errática, após sua criação, e após o pecado original, desgarrada
de Deus, possui como parâmetro para sua conduta e comportamento
nada mais nada menos que a lei que se encontra inscrita em seu
coração (lei divina), e será o livre-arbítrio (liberum arbitrium) que
facultará à mesma escolher e decidir entre comportamentos conformes
ou desconformes aos preceitos de ordenação do universo.
É certo que a lei humana governa o comportamento humano, mas não é
esta lei que governa a alma humana, pois é incapaz de penetrar em
seus desígnios. O que realmente garante ao homem a segurança de que
o certo é o certo e de que o errado é o errado é a lei divina que se
encontra inscrita em seu coração, e de acordo com a qual se deve
pautar, na volição de alcançar a gnosis de si mesmo.
A justiça divina exerce-se, então, para Agostinho, em função do
livre-arbítrio, que pode atuar contra (matar, cometer adultério etc.) ou a
favor (não matar, não cometer adultério etc.) do que prescreve a lei
eterna (“Não matarás”; “Não cometerás adultério” etc.). O livre-arbítrio é o
que permite ao homem atuar segundo sua vontade, que pode estar a
favor ou contra a lei divina.
Preocupações com o Estado

Com isso não se quer dizer senão que o poder político deve estar
subordinado ao poder divino, ou seja, deve estar de acordo com o poder
divino, interpretado por seus legítimos representantes.

Tendo a política humana esse compromisso com o divino, o Estado


passa a ser, portanto, o meio para a realização da lei eterna.
Justiça absoluta ------ bem supremo

Eterna e imutável

Caminho apontado por Santo Agostinho para os


homens se aproximarem da justiça é a justiça
cristã.
Há, na concepção agostiniana de justiça, a ideia
de equilíbrio entre a vida exterior e interior dos
homens, isto é, antes de ser uma virtude social,
a justiça realiza-se no interior dos humanos,
numa relação de obediência e submissão à
vontade divina.
O preceito divino do amor em relação ao homem
estabelece a conexão entre amor e justiça.
Tendo criado o homem à Sua imagem e
semelhança, como é apresentado no Gênesis, e
sendo Deus o Sumo Bem, a criatura não é má;
porém, como ser semelhante não é ser igual, o
ser humano é passível de corrupção. Quando se
perverte, o homem torna-se mau, tendendo
então à morte.
Para Santo Agostinho é por meio da própria
vontade, do ato consciente de suas escolhas
que os homens promovem o mal; toda vez que
dirigem sua vontade para algo que os afastam
do Sumo Bem, tornam-se maus.
A busca pelo Sumo Bem, segundo Santo Agostinho,
é a diretriz para uma vida reta, incitando o homem a
procurar o caminho para a redenção do mal,
caminho este revelado pela fé e que se dá a
conhecer pela inteligência. Neste trajeto, os
homens podem promover a ascensão da justiça
humana, temporal e mutável, acercando-se da
justiça absoluta, eterna e imutável.
A filosofia de Santo Tomás de Aquino (1225-1274) encontra-se estrutural e
visceralmente comprometida com os Sagrados Escritos, de um lado, e com o
pensamento aristotélico, de outro.

Sua doutrina converte-se num foco de dispersão de uma nova forma de conceber o
conhecimento, aliando fé e razão.
Nesse caso, o estudo dos conceitos de direito (iure) e de justiça (iustitia) faz-se como parte de um estudo
que se volta para o conjunto de interesses dos homens; esta pesquisa deixa de possuir qualquer remissão
mais aprofundada a discussões sobre a justiça metafísica, como o é a discussão sobre a justiça dos atos
de Deus. e outras implicações correlatas a este tema, que, para esta finalidade, será considerado lateral.

Perceber-se-á, com a análise a que se procederá, que as influências do aristotelismo e da jurisprudência


romanos só puderam favorecer o desenvolvimento do tema da justiça em Santo Tomás de Aquino como
problema ligado à ação humana, à práxis, à virtude que sabe atribuir a cada um o seu; aqui nada há
sobre uma justiça intangível.
Razão prática, sinderese e ética

O estudo da justiça consolida-se, na teoria tomista, dentro do estudo da lex, como diz Miguel
Reale. Estudar a justiça nessa teoria é debruçar-se sobre três acepções do termo lex: uma no
sentido humano, outra no sentido natural, outra no sentido divino.

Trata-se de identificar na teoria tomista a preocupação com a razão prática e com a ética.
Assim, em Santo Tomás, o homem é composto de corpo (corpus) e alma (anima),
sendo o primeiro a matéria perecível que colabora para o aperfeiçoamento da alma, esta
criada por Deus. Do mesmo modo como a potência está para o ato, a alma está para o
corpo; a alma é incorruptível, imaterial e imortal, enquanto o corpo é corruptível,
material e mortal. A alma, porém, preenche de vida não somente o homem; animais e
vegetais também possuem alma, e é esta que, com graus diferenciados, com potências e
faculdades diferenciadas, permite se diferenciem os seres entre si na escala natural.
Agnoseologia (teoria do conhecimento) tomista indica que o intelecto se constrói a
partir da experiência sensível. Em outras palavras, utilizando-se da definição
escolástica de conhecimento, pode-se dizer que nihil est in intelectu quod non prius
fucrit in sensu, ou seja, nada está no intelecto que primeiro não tenha passado pelos
sentidos.
Deus não determinou o homem como escravo de um destino absoluto, o que
oprimiria sua liberdade de ser, de decidir e de agir; ao contrário, na teoria tomista,
Deus lançou no homem, como motor universal que é (Motor Imóvel), a vontade para
que siga no sentido do Bem (o próprio Deus), podendo escolher livremente os meios
para a realização deste Bem.
A continuidade da sociedade, seu destino, sua fortuna, sua bem-aventurança…
dependem nada mais, nada menos, que da prudente governança instituída para
o direcionamento do que é comum a todos; a sociedade deve ser dirigida por
uma autoridade que deverá ser prudente na escolha dos meios que conduzirão ao
Bem Comum.
Já se disse que é sobre o agir (individual, familiar, social…), ou seja, sobre a razão
prática que a ética incide. Na filosofia tomista, esse conceito encontra-se sob a
denominação de sinderese (sinderesis), conjunto de conhecimentos conquistados
a partir da experiência habitual; é com base nesses conhecimentos extraídos da
vivência, da prática, que se podem cunhar os principais conceitos acerca do que é
bom e do que é mau, do que é justo e do que é injusto.
Sinderese e hábito
A sinderese (sinderesis) atua, para o ser agente, de modo que estabeleça o fim da razão
prática, ou seja, o Bem. No entanto, o que é o Bem que guia a ação como causa final?
O conceito, já definido anteriormente por Aristóteles, é: bonum est quod omnia
appetunt, ou seja, o bem é o que a todos agrada.

O mal, portanto, na teoria tomista, não é fim de uma ação, pois o mal representa
somente a simples privação do bem. Em verdade, Santo Tomás de Aquino nega uma
ontologia ao mal, fazendo deste um estado de ignorância do Verdadeiro Bem, este
sim fim de toda ação.
Todo o conjunto de experiências sinderéticas, ou seja, de experiências hauridas pela
prática da ação, é capaz de formar um grupo de princípios, de conceitos… que
permitem a decisão por hábitos (bons, maus; justos, injustos…). Isso quer dizer que
os hábitos não são inatos, mas conquistados a partir da experiência; é esta a base
das operações da razão prática.
O governo de si para o homem será guiar-se por princípios extraídos da experiência,
que formam o que se pode chamar de uma lei natural, verdadeiro hábito interior.
Esta lei natural apresenta características básicas, a saber:
(a) trata-se de uma lei racional: rationis prima regula est lex naturalis, uma
vez que é fruto da razão prática e sinderética do homem;
(b) trata-se de uma lei rudimentar: só pode ser considerada como princípio
norteador ou origem do direito, não correspondendo a sua totalidade;
(c) trata-se de uma lei insuficiente e incompleta: necessita da lei humana
(positiva), para a qual representa uma diretriz, para efetivar-se. Isso já permite
dizer que a lei natural, atuando somente como forma de governo do homem por
si mesmo, não basta.

Em outras palavras, ética não é a única forma de controle e regramento do


comportamento em sociedade. Assim, de uma relação de débito recíproco entre o
homem, seu semelhante e a comunidade, surge a justiça dentro da comunidade
civil
Definição de justiça

Santo Tomás de Aquino, seguindo as lições do Philosophus, faz o conceito de justiça


emergir do seio dos conceitos éticos; éthos, em grego, significa hábito, reiteração de atos
voluntários que se destinam à realização de fins (justiça é uma virtude). Assim, o pensador
cristão não despreza as lições gregas, sobretudo aristotélicas, mas, pelo contrário, delas
comunga, fazendo com que a elas se una a noção de justiça tal qual concebida pelos juristas
romanos (justiça é uma vontade perene de dar a cada um o que é seu, segundo uma razão
geométrica).
Assim, se a discussão sobre o justo e o injusto se situa no âmbito dos
conceitos éticos, é possível dizer que a justiça é uma virtude, ou seja, um meio
(medium) entre extremos opostos, ao qual os gregos chamavam de mesotés, ou
seja, a justa medida entre algo por excesso e outro algo por carência.
Todavia, as ambiguidades que a expressão dar a cada um o seu gera tornam
necessária a introdução de uma explicação acerca “do que seja o próprio de
cada um”. Com isso, o ato de justiça torna-se o ato habitual de dar, com
vontade perpétua e constante, a cada um o que lhe pertence, nada a mais e
nada a menos. Mais que isso, a igualdade aqui não é uma igualdade entre
coisas, ou de coisas com pessoas, mas entre pessoas; a justiça é uma relação
de igualdade entre pessoas.
Direito e justiça
O direito é objeto da justiça, e o estudo do tema da justiça na teoria do Aquinatense
deve ser ladeado do estudo do direito. O direito tem a ver com a justiça, à medida que é
assim chamado porque é justo

Em meio às demais virtudes, é a virtude da justiça que cuida da conduta exterior do


homem; a temperança, a prudência…entre outras virtudes, estabelecem parâmetros para
a conduta interior. A justiça, em sendo da exterioridade, afina-se com o tema do direito.
Nas palavras de Santo Tomás:

“Dentre as outras virtudes, é próprio à justiça ordenar os nossos atos que dizem respeito a
outrem. Porquanto, implica uma certa igualdade, como o próprio nome o indica; pois, do que
implica igualdade se diz, vulgarmente, que está ajustado. Ora, a igualdade supõe relação com
outrem. Ao passo que as demais virtudes aperfeiçoam o homem só no referente a si próprio.”

-A justiça (iustitia) e o justo (iustum) interessam ao estudo do direito; mais ainda, o direito (ius) interessa
ao estudo da justiça e do justo.
Afinal, deve-se dizer que o ius não se reduz à lex, no sentido de lei positiva; o ius
abrange o que está posto, e algo mais, que advém da razão divina e da razão natural.
Acepções do termo justiça

A lei não possui um único sentido, mas vários, e isto porque a teoria tomista admite
várias dimensões de leis. Então, a lei ou é eterna, ou é natural,ou é das gentes, ou é
humana. É essa classificação basilar para a compreensão dos desdobramentos do
tema da justiça na teoria tomista.
Assim, de maneira sucinta, quando se fala em lex podem-se detectar as seguintes categorias:
• lei eterna: é a lei promulgada para Deus e que tudo ordena, em tudo está, tudo rege;

• lei natural: trata-se de uma lei comum a homens e animais; lei comum a todas as gentes:
trata-se de uma lei racional, extraída da lei natural, no entanto, comum somente a todos os
homens;

• lei humana: trata-se de uma lei puramente convencional e relativa, assim como altamente
contingente, e que deve procurar refletir o conteúdo das leis eterna e natural.
A ordem universal é dada pela lei eterna. Trata-se de uma lei eterna, porque promulgada por Deus,
e, assim, não está sujeita às vicissitudes a que as leis humanas estão. E, nessa dimensão, para
tudo há uma diretriz, que reside na lei eterna; a ordem existe e é imperativa, regente do todo, a
partir da razão divina, que a tudo inspira. A lei eterna é o princípio e o fim do todo universal, uma vez
que, como diz Santo Tomás: “todo o conjunto do universo está submetido ao governo da razão
divina”.
A lei natural (lex naturalis) representa, na teoria tomista, uma participação racional na lei eterna (lex
aeterna)[...] Assim, um justo natural forma-se, não porque foi declarado pelo legislador, mas
simplesmente porque na natureza existe; é nela que residem os princípios de justiça natural.

O jusnaturalismo tomista não vislumbra na natureza um código imutável incondicionado e


absoluto, mas uma justiça variável e contingente como a razão humana.

E é a partir das leis naturais, apreendidas pelo homem, em sua variabilidade, que surge a
chamada justiça das gentes, ou seja, como uma derivação racional da lei natural comum a
todos os povos.
A lei humana, por sua vez, é fruto de uma convenção; não possui força por si só, mas a
adquire a partir do momento em que é instituída. Representa, assim, a concretização da lei
natural; mais que isso, é o que é indiferente até quando seja declarado como vinculativo
pela vontade do legislador.

Nesse sentido, o que é contrário à lei natural, se positivado, transforma-se num aparato de
direito injusto, ilegítimo, iníquo.

No entanto, o simples fato de uma lei positiva não estar de acordo com a lei natural não
justifica a desobediência ao que foi criado pelo homem; a desobediência só se justifica,
para Tomás de Aquino, quando houver um entrechoque entre a lei humana e a lei eterna
O homem, no convívio social, necessita de regras convencionais positivas
para que possa garantir a pacificidade dessa interação no meio social. O
direito natural, que pela experiência natural o homem conhece, é
insuficiente, necessitando de leis positivas complementares, leis que
tornam concreto o que na natureza reside (lex, o direito escrito); essas
acompanham as variações da natureza humana, suas imperfeições e as
contingências oriundas da limitação do saber racional.
A justiça legal é aquela que diz respeito, imediatamente, ao Bem
Comum (convívio pacífico na sociedade civil) e,
mediatamente, aos particulares. É assim que verificamos a
importância da existência do justo legal para “ordenar os bens
particulares ao bem comum”
Categoria de relevo, ainda, a par a divisão que já se deu de lei (eterna,
natural, das gentes, humana), dentro da doutrina tomista, é aquela atinente à
diferenciação entre justiça comutativa e distributiva. A primeira é
responsável pela regulação das relações entre particulares, entre as partes
individuais componentes da esfera maior da sociedade. A segunda coordena
o relacionamento da parte com o todo, de modo que atribua a cada parte o
que lhe é devido segundo seu mérito, capacidade ou participação dentro da
sociedade.
Em ambos os casos, a justiça encontra-se presente como meio de equilíbrio
na interação, estabelecendo a igualdade entre aqueles que se relacionam. No
entanto, os critérios de igualdade diferem em um e outro caso. Destarte, na
justiça comutativa, das trocas, o critério de igualdade utilizado é o da média
aritmética, ou seja, divisão em quantidade no exato meio.
Por exemplo, numa compra e venda, se o comprador, após efetuada a negociação,
permanecer com seis unidades de referência e o vendedor com quatro, existirá
desigualdade que será mediada pela justiça comutativa de modo que cada um
receba cinco unidades, valores idênticos segundo uma média aritmética.

Na justiça distributiva, consistente na repartição dos bens dentro da coletividade


segundo a maior ou menor participação meritória de cada qual, o critério de
igualdade é a proporcionalidade, ou ainda, a proporção geométrica Todavia, a
proporção geométrica não consente que, por meio desse tipo de justiça, se faça
acepção de pessoa
Regime das leis

O que é mais conveniente para a comunidade civil, estar sob um regime de leis
ou de homens?

• numa sociedade ampla, existe a necessidade de que os juízes sejam


numerosos, para que exista a verdadeira efetivação da justiça. Destarte, é
muito mais fácil que se encontrem poucos bons legisladores do que muitos
juízes que possam ser considerados bons para o exercício do cargo;
• O legislador (legislatoris), ao exercer sua função legiferante, procura
prever os casos acessíveis à capacidade humana em momento anterior ao
da ocorrência dos fatos. O juiz, por sua vez, irá analisá-lo no momento de
sua emergência. Se o juiz estiver submisso à lei, irá apenas executá-la;
• o juiz (iudex), diante do fato, pode envolver-se subjetivamente no
caso, sendo conduzido e deixando-se cegar pelo amor, pelo ódio,
pelas paixões... deixando de existir a objetividade necessária à
segurança de um julgamento apropriado. O legislador produz o corpo
legislativo em abstrato, estando distante da ocorrência dos fatos que
poderiam influenciá-lo.
O objeto da justiça é o direito que, por sua vez, é o efeito da lei. O ato da
justiça é o ato de julgar. Verificamos que o julgamento é algo imprescindível
para a administração da justiça entre os homens, desde que: proceda de uma
inclinação justa, do contrário será injusto; proceda de uma autoridade
competente e instituída para o desempenho da função judicante caso
contrário será usurpada a sentença; seja proferida a sentença de acordo com a
recta ratio(proporção direta/sistema de linha), que guia a prudência do juiz, pois
senão estaremos diante de uma sentença temerária.
A lei justa de ordenação do convívio social é produzida pelo legislador, obedecendo a um
complexo de atos que possam conferir-lhe o caráter de vinculatória, por ter força natural. Numa
primeira fase, chamada intencional, o legislador atua por meio do intelecto especulativo,
escolhendo e elegendo, por um juízo da razão, o meio mais adequado para que se alcance a
meta colimada.

Na fase executória, orientado pelo intelecto prático ou agente, ordena aos súditos a execução ou
efetivação da intenção eleita primariamente por um ato de imperium(governo), aplica a lei de acordo
com seu fim (usus). Não se pode omitir a promulgação como fase importantíssima para que se dê
publicidade ao preceito legislativo.
Justiça, lei e atividade do juiz

A atividade do juiz consiste na efetivação da justiça; é ele dito a justiça encarnada, ou a justiça
viva, não por outro motivo.

“A sentença do juiz é como uma lei particular aplicada a um fato particular. E, portanto, assim
como a lei geral deve ter força coativa, como claramente diz o Filósofo, assim também a sentença do
juiz deve ter força coativa para obrigar ambas as partes a lhe obedecerem; do contrário ela não seria
eficaz.”

O ato por meio do qual o juiz decide aplicando justiça chama-se julgamento; é lícito ao juiz
exercê-lo na medida e nos limites de seu poder. O ato de julgar é ilícito àqueles que não estão
revestidos de poder para tanto. Aí há uma atividade recriminável. O juízo ou julgamento é o ato por
meio do qual se estabelece o que é justo ou direito.
Mais que isso, o julgamento de um juiz consiste no estabelecimento concreto da igualdade, de
alguma forma rompida anteriormente, fato que reclama sua intervenção para o reequilíbrio das
partes. Nesse sentido, restabelecer o equilíbrio é retomar a igualdade rompida; no julgamento, no
entanto, não deve haver acepção de pessoa, mas um julgamento que satisfaça às necessidades de
justiça reclamadas pelo caso. O juiz deve dar a cada um o seu (suum cuiquetribuere/seu
devido).Deve-se dizer também que, para que o julgamento seja classificado como um julgamento
conforme aos mandamentos de justiça, é mister a reunião dos seguintes requisitos: proceder de
uma inclinação justa; ser dado por uma autoridade investida de poder para tanto; estar
inspirada pela prudentia.
O julgamento do juiz é legítimo à medida que não espelha um julgamento que procede de
sua escolha pessoal, mas que se baseia em conhecimentos decorrentes de sua experiência
profissional, em testemunhas, em provas…

O procedimento básico de efetivação da justiça feito pelo juiz parte do que dizem as leis; se
essas são omissas, o juiz deve valer-se das provas, das testemunhas, da experiência…

Se, porém, esses dados forem insuficientes, deve o juiz absolver o julgado por carência de
elementos de juízo. Se julgar baseado nas alegações verossímeis, são os acusadores e
testemunhas que o condenam.
Injusto e vícios da justiça

Para que se cometa a justiça ou injustiça, é necessário o concurso da vontade do agente


praticante do ato; o ato involuntário pode ser justo ou injusto, mas o agente que o comete não
pode ser definido de homem justo ou injusto se não tem a prática da justiça ou da injustiça como
ato voluntário e reiterado.

Assim, simplesmente praticar um ato de injustiça não torna a pessoa injusta; o ato de
injustiça, se reiterado e consciente, torna o homem injusto.

Além do que já se disse, deve-se esclarecer que ninguém pode ser vítima e autor da injustiça
ao mesmo tempo. Pode-se, porém, optar por sofrer voluntariamente a justiça praticada por
outrem, ou seja, a injustiça se pode sofrer voluntariamente, quando se aceita ser prejudicado
numa reação.
Há maior injustiça quando esta é realizada contrariando o bem maior da sociedade, ou
seja, a lei que estabelece a ordem em seu interior; os malefícios que gera são
acentuadamente danosos. É certo que o mal acontece também quando se perturba a
harmonia e a igualdade de uma relação particular, porém a escala dos efeitos negativos é
menor.
Justiça e sua prática

Como decorrência natural de uma variação imensa de conclusões retiradas das


premissas gerais do pensamento do Doutor Angélico, encontram-se, ainda, outras
aplicações inevitáveis do conceito de justiça depreendido da forma como foi elucidado.
Ademais:
1. só o Estado tem o direito de matar em prol da sanidade do corpo
social (ius vitae ac necis), amputando-lhe o membro degenerado;
2. a legítima defesa é consentida desde que haja uma proporcionalidade
entre reação e ameaça e, também, desde que a pretensão seja a autodefesa e
não o assassínio da outra parte;
3. o roubo e o furto não são considerados pecados, quando o indivíduo
encontrar-se em uma situação de necessidade, ou seja, quando sua vida estiver
dependendo do objeto do roubo;
4. é lícito, por motivo de correção, ao pai açoitar o filho, e ao senhor o
escravo;
5. a prisão é legítima desde que exercida pela sociedade, por meio
de uma autoridade;
6. até mesmo a amputação de membros é legítima, na hipótese
anterior;
7. o advogado não pode patrocinar causas que sabe claramente
injustas, mas se for enganado, nem por isso comete pecado;
8. a usura e a fraude são dois abusos inaceitáveis e recrimináveis.
Conclusões

Sua contribuição reside em seu jusnaturalismo, sendo que sua teoria admite uma lex
naturalis mutável, e que, portanto, não se encontra nos ombros estreitos do que é
absoluto. Ademais, sua concepção transcende para a lei divina, da qual faz derivar tudo o
que foi gerado por força da razão divina. Nesse sentido, todo conteúdo de direito positivo
deve-se adequar às prescrições que lhe são superiores e fontes de inspiração: o direito
natural e o direito divino. Nesse sentido, o ius transcende à lex scripta; a lei posta pela
autoridade não exaure o Direito.
Revisão
• Em seu Tratado de Justiça, Tomás de Aquino,
inicialmente, analisa o direito como objeto da justiça.
Traz à lume a justiça como virtude, em que a ação deve
conduzir, necessariamente, à retidão.

• O Direito positivo deve refletir o Direito natural.


• Justiça é o hábito [modo constante agir] pelo qual cada
um, com vontade constante e perpétua, dá a cada um o
[que é] seu [por] Direito.
• A novidade da reflexão jusfilosófica de São tomás de
Aquino consiste na síntese e na articulação entre a noção
de Direito e a noção de Justiça. São Tomás sublinha 3
aspectos que se integram na virtude da justiça política:
a) o objeto da justiça é o direito [subjetivo], ou seja, o que é
exigível; o que é devido a cada um;
b) a justiça se produz naquelas coisas que dizem respeito
ao outro. Logo, o constituinte essencial a justiça política é a
alteridade - ninguém é justo consigo mesmo do ponto de
vista da justiça política, mas é justo para com os outros.
c)a justiça se fundamenta no restabelecimento da
igualdade anterior ao ato que violou essa mesma
igualdade.
• A justiça trata de dar a cada um o que é seu por direito
que tutela a sua propriedade. Na visão tomista, a justiça
esta baseada no Direito e não o Direito na justiça.

• Assim, para são Tomás, o tratado sobre o Direito predece


o tratado sobre a justiça. Em primeiro lugar estão os
direitos individuais e a conduta que se humaniza com os
direitos dos outros é a que constitui a virtude da justiça.
Acepções do termo justiça

• A lei não possui um único sentido, mas vários, e isto


porque a teoria tomista admite várias dimensões de leis.
Então, a lei ou é eterna, ou é natural, ou é das gentes,
ou é humana.
lei eterna: é a lei promulgada para Deus e que tudo ordena,
em tudo está, tudo rege;
lei natural: trata-se de uma lei comum a homens e animais;
lei comum a todas as gentes: trata-se de uma lei racional,
extraída da lei natural, no entanto, comum somente a todos
os homens;
lei humana: trata-se de uma lei puramente convencional e
relativa, assim como altamente contingente, e que deve
procurar refletir o conteúdo das leis eterna e natural.

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