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CAPÍTULO 7

Marcos S. Buckeridge, Marco Aurélio S. Tiné, Miguel José Minhoto e Denis Ubeda de Lima

INTRODUÇÃO respirar, pois necessitam de energia, e, para respirar,


precisam de açúcares, que contêm a energia armaze-
A respiração e a fotossíntese são dois processos
nada pela fotossíntese.
fundamentais para a vida em nosso planeta. A maio~
Um dos principais problemas a serem resolvidos
ria dos organismos vivos tem que absorver oxigênio
pelas plantas é que nem todas as partes vivas da planta
molecular (Oz) e ser capaz, de alguma forma, de frag~
são capazes de fazer fotossíntese (raízes, por exemplo),
mentar compostos de carbono (carboidratos, lipídi~
enquanto todas as partes vivas respiram. Com isso, os
os e proteínas, por exemplo), além de utilizar a ener~
açúcares têm que ser transportados de seus pontos
gia contida nesses compostos para o desenvolvimen~
principais de produção (as folhas) para toda a planta,
to e manutenção de seus corpos. Em regra, os carboi~
onde há células vivas, para que estas sejam capazes
dratos são os compostos nos quais a energia é arma-
de se desenvolver e efetuar sua própria manutenção. )
zenada, e, de forma simples, o processo respiratório J
Há ainda um outro complicador: a fotossíntese
pode ser descrito da seguinte forma:
depende da luz e o período de luz é limitado ao dia, l-
C6H1206 + 0z ~ 6 COz + 12 HzO + energia enquanto todas as células vivas de um vegetal têm que i
respirar o tempo todo, inclusive à noite, ainda que •
Basicamente, a fotossíntese consiste em captar
COz e luz solar e sintetizar os açúcares, sendo às ve~
zes definida como o inverso da respiração (ver Capo
com variações de intensidade. Desse modo, os pro~
dutos da fotossíntese têm que ser armazenados por um
,
li
5, Fotossíntese). tempo e distribuídos de forma eficiente para todas as

° processo como um todo pode ser visto da seguin-


te forma:
demais células vivas o tempo todo e na medida certa
(ver Capo 6, Transporte no Floema).
J
»

FOTOSSÍNTESE
° processo respiratório ocorre em todas as células I
vivas dos vegetais, as quais possuem organelas espe~ t
energia solar + 6 COI + 12 H20 ~ CóH120ó + Oz ~ ciais, as mitocôndrias, que funcionam como usinas de I
6 COz + 12 HzO + energia química processamento e produção de compostos energéticos •
RESPIRAÇÃO (Fig. 7.1). Além de ser uma importante etapa na ge-
J
ração de energia, vários compostos intermediários da
Pode-se ver, pelo esquema mostrado, que os dois respiração podem ser desviados para vias de biossín-
I
processos, fotossíntese e respiração, são complemen- J
tares. ° metabolismo das plantas requer os dois pro~
tese, servindo de esqueletos carbônicos para polissa-
carídeos, ácidos nucléicos, aminoácidos e proteínas
cessos: para fazer fotossíntese, as plantas precisam e compostos do metabolismo secundário (Fig. 7.6). J
I
••

..
'
L
~
,.;...;.,
.. - ..
-"

:~~'
-,,/.

ResPiração 199

não é só o físico, mas também o biótico. É essencial,


portanto, que todos esses níveis se mantenham em
constante "comunicação", e isso tudo exige gasto cons-
tante de energia por todas as células de todos os teci-
dos de todos os organismos vegetais vivos na biosfera.
Este capítulo trata do processo de respiração e a abor-
dagem será a de mostrar os eventos mais relevantes re-
lacionados a esse processo nos diferentes níveis de orga-
nização, começando no nível celular e terminando na
relação das plantas com o ambiente biótico e abiótico.
Fig. 7.1 Fotomicrografia mostrando células de transferên-
Aspectos bioquímicos das diversas partes do processo
cia em cotilédones de LuPinus angustifolius. Nesse momen-
respiratório podem ser obtidos de livros de bioquímica.
to, os cotilédones estão mobilizando reservas e há grande
produção de sacarose e aminoácidos. Essescompostos têm Assim, neste capítulo, os aspectos bioquímicos e celu-
que ser transportados para a plântula em crescimento, pois lares foram expostos em equilíbrio com os aspectos fisi-
o cotilédone irá cair após a mobilização de toda a reserva. ológicos, de forma a permitir o uso das informações bi-
As células de transferência apresentam atividade metabó- oquímicas e celulares na apreciação da respiração junto
lica extremamente alta e um grande número de mitocôn- aos órgãos, planta inteira e em nível de ecossistema.
drias. CW - parede celular; mt - mitocôndria. A seta in-
dica material de transferência. (Foto = Marcos S.
Buckeridge & John S. Grant Reid.) o FLUXO DE CARBONO NA
CÉLULA
A usina processadora de açúcares nas células vege-
Basicamente, um composto de carbono é inicial- tais é a mitocôndria, que ocorre em diferentes quanti-
mente "desmontado" no citoplasma celular, e seus dades, dependendo da taxa respiratória do tecido (Fig.
produtos de degradação penetram nas mitocôndrias, 7.1). O processo respiratório completo é normalmen-
que, através de transformações desses fragmentos, irão te dividido com base na localização intracelular. A
produzir um único tipo de composto energético, o primeira etapa é a glicólise, que ocorre no citossolj a
A TP (adenosina trifosfato). Esse composto é utiliza- segunda é o ciclo dos ácidos tricarboxílicos (ou ciclo de
do pelas células em todos os processos de construção Krebs), que ocorre na matriz mitocondrial; e a terceira e
de moléculas, desde compostos fenólicos até as pro- última etapa, a cadeia de transporte de elétrons ou cadeia
teínas e DNA. Porém, para o desenvolvimento de um respiratória, ocorre nas cristas mitocondriais
(Fig. 7.2).
organismo vivo, não basta somente construir molé- Além da função básica de geração de energia, a
culas. Elas têm que ser utilizadas para construir estru- respiração gera esqueletos carbônicos para diversos
turas mais complexas, como, por exemplo, as própri- outros processos bioquímicos (Figs. 7.6 e 7.7). Essa
as mitocôndrias, e, para isso, as células também têm considerável interação com outros processos metabó-
que gastar energia, ou seja, consumir A TP. Como licos faz com que a respiração seja considerada como
sabemos, o processo não pára aí, pois as organelas têm um dos processos centrais do metabolismo.
que estar organizadas dentro das células, e estas, por
sua vez, têm que se comunicar de forma a produzir
Glicólise
tecidos e órgãos; estes últimos são ainda organizados
de forma a produzir o organismo inteiro. Geralmente, toma-se como início do processo respi-
Todos os níveis supracitados fazem parte de um pro- ratório a fosforilação da hexose (geralmente glicose) no
cesso extremamente complexo de desenvolvimento citossol. A origem dessa hexose pode variar de tecido
que resulta em um organismo que ainda tem que estar para tecido, mas isso está diretamente relacionado com
apto a responder adequadamente ao ambientej e este a alocação de recursos e balanço de carbono e será abor-
200 ResPiração

Lipídios Glicose
Balanço com valores
.~ aproximados de produção de
ATP na respiração
~] Citossol Glicólise 2 68
Rendimento
Etapa
2 ATPs Total do citossol
---- ---.----
2NADH+W

~ e-.t
i
'"
u:'"
~"í [;U,:'A""til..4

"O

o Mitocôndria
Cl.

-~ 8NADH+W CTE
CTE
CAT 2 2 2430
38
~ Oxalac€lato Total
Citrato
Total .~ ~
da organela
da respiração ----~~_._--
~ '"
2 2ATP
FADH2
;
U~4
~
.~~
2;-
)::: ::
'..i':;:'

z~ ~
CTE = Cadeia de Transporte de Elétrons
CA T = Ciclo dos Ácidos Tricarboxílicos

duzido nas demais etapas da respiração, cuja finalidade


H,O é essencialmente a produção de energia.
Na Fig. 7.3, é mostrada a seqüência de reações da
Pi + ADP ATP
glicólise com as respectivas estruturas químicas dos
Fig. 7.2 Visão bioquímica geral do processo respiratório. A compostos participantes. Veja que a glicólise (glico -
respiração é dividida em três fases: via glicolítica, ciclo do ácido açúcar; Use - quebra) é, essencialmente, um processo
cítrico (ou ciclo de Krebs) e cadeia de transporte de elétrons gradativo de degradação da glicose. O processo tem
e fosforilação oxidativa. O esquema ressalta o fato de que os início com uma molécula de 6 carbonos e atinge um
carreadores de elétrons são produzidos nas duas primeiras fa- estágio intermediário em que são formadas duas mo-
ses e utilizados na cadeia de transporte de elétrons onde ocor- léculas de 3 carbonos (o gliceraldeído 3 -fosfato).
re a maior produção de A TP e a redução do oxigênio.
Nessa fase, são gastas duas moléculas de A TP, que têm
a função de fornecer os fosfatos, os quais, no fim do
dado adiante. Na fase citossólica da respiração, deno- processo, acabam sendo distribuídos simetricamente
minada glicólise, a glicose é parcialmente degradada a na molécula de frutose 1,6-bisfosfato. Essa molécula
piruvato (Fig. 7.2). Essa degradação parcial pode ocor- simétrica, ao ser fragmentada, produz duas molécu-
rer tanto pela via glicolítica quanto pela via das pentoses las iguais de gliceraldeído 3-fosfato.
(Fig. 7.6), e, em ambos os casos, o balanço final é de duas A partir desse ponto, o processo consiste em transferir
moléculas de piruvato para cada glicose. Embora os dois os fosfatos de volta para o ADP, formando novamente
processos possam ocorrer em paralelo, a via glicolítica A TP. Mas o processo dá lucro, pois, além dos 2 A TPs
está diretamente ligada à produção de energia, sendo os produzidos, a primeira reação (formação do 1,3-
seus pontos de controle altamente regulados por indi- bisfosfoglicerato) permite a incorporação de mais um fos-
cadores do estado energético da célula, como, por exem- fato e a redução de um NAD (formação de NADH +H+).
plo, arazãoADPjATP (Tabela 7.2).A viadaspentoses Qualquer que seja o caminho percorrido pela
(ver Fig. 7.6), por outro lado, está mais associada à pro- hexose, duas moléculas de A TP são consumidas e
dução de compostos intermediários como a ribose para quatro são produzidas, de modo que, apesar de apre-
os nucleotídeos e redução de NADP, que será utilizado sentar um baixo rendimento energético (um saldo
em processos de biossíntese, ao contrário do NAD re- líquido de apenas 2 ATPs), a glicólise (etapa
ResPiração 201

Glicose
HO-CH

hH
H~ OH~H
Pi-O-CH ~ ..3 2
\
OH
t,-ATP
~ADP
\
/ /" ."
. OH Glicose 6-P
HO OH
~/L.--{)\H
OH 1~

Frutr::~
~ADP
Frutose 1,6-bisfosfato

1~
Gliceraldeido 3-P + Diidroxiacetona fosfato
o
Pi-O-CH =CH-C /
1 I
OH
H

NAD

l~Pi NADH+W

Pi-o-CH,-CH-C ~
I O-Pi
o
OH

1,3-biSfO~g~~:rato
~ATP o
2x 3-fosfogIicerato Pi-O-CH,-CH-C /
I
OH
'0-
1~ /0 Fermentação
HO-CH-CH-C
'I ' o
? o- H,C=CH-C'
Pi I 'o-
OH
24osfjf:.:to HC=C-C /0 Lactato
Fosfoenolpiruvato , I 'o-
?Pi
t,-AOP
~ATP
Piruvato H,C-C-C'O
o
Il 'o-
~ H,c=r
CO,
Etanol

Fig. 7.3 Via glicolítica da respiração em plantas. Ao lado dos nomes dos compostos, são apresentadas suas respectivas
fórmulas. Note que essa via consiste em fragmentar a glicose de modo a produzir compostos de 3 carbonos; no final, o
piruvato que entra na mitocôndria servirá de substrato para o ciclo de Krebs. Na falta de oxigênio, o piruvato pode ser
reduzido a lactato ou então descarboxilado, produzindo etanolj esse processo é chamado de fermentação.

r
••
202 ResPiração

citossólica) pode representar uma importante fonte glicólise. Isso porque este é o último composto for-
de energia em algumas situações (Tabela 7.1). mado no citoplasma e que será exportado para a mi-
tocôndria.
No ciclo dos ácidos tricarboxílicos (CA T), o
Ciclo dos ácidos tricarboxílicos (CAT)
ou ciclo de Krebs metabolizado. °
piruvato é importado pela mitocôndria, na qual é
CA T ocorre na matriz mitocondri-
Note que, na divisão artificial do processo respira- aI, e, nele, o ácido orgânico é oxidado completamente
tório, coloca-se o piruvato como o composto final da a CO2 (Fig. 7.4). Após sua importação, o piruvato

o
1I

H,C-C-SCoA

c;;ur
acetil-CoA
CoA
COo·
coa' I
I CH,
o=c I
I HO-C-COO·
CH,
I
CH,
I -
piruvato coo·
citrato , ~Hh-OHcoo·
NAOH+W I
HC-COO·
I
CH,
coo· I
I Coa'
c~o
I isocitrato
CH,
I .
coa·
oxalacetato
»>

COO'

HO-CH
iNAO'
~NAOH+W
COO'
I

I
CH,
I
c-o
I
fH,
CH
! '
COO·
t;;
~
I .
coa' a-cetoglutarato

NAO'

I
malato~coo'
HO
CH, co~ NAOH+H'
11'
, CH,
O,C /S-CcA CO.
I I
coo· CH.
I •
coa· CoA CH.
I I .
CM,
Coa·
I -
fumaratoFAO~2
~ \~ ~ succinil-CoA
FAO
fH, AOP+PI
coo·
succinato ATP

Fig. 7.4 Ciclo dos ácidos tricarboxílicos (ou ciclo de Krebs), importante para a produção de compostos redutores que
irão atuar na cadeia de transporte de elétrons e também na produção de esqueletos de carbono para a síntese de diversos
compostos celulares. O ciclo tem início com o piruvato produzido pela glicólise, e as reações subseqüentes ocorrem na
matriz mitocondrial (ver Fig. 7.5A). Os carbonos em vermelho são provenientes do acetil-CoA .


ResPiração 203

sofre uma descarboxilação (perda de COz)' gerando do indolil-3-acético (AIA), fitormônio com papel
um radical acetilligado à coenzima A (acetil-CoA). proeminente no desenvolvimento das plantas (ver
Esse composto, que possui dois carbonos, une-se a Capo 8, Auxinas).
uma molécula de oxaloacetato (de quatro carbonos), No que concerne à função energética do CA T, é
formando citrato (seis carbonos). Ao passar pelo importante salientar que alguns aspectos morfológi-
I CA T, dois carbonos são perdidos na forma de CO2,
regenerando novamente o oxaloacetato e, assim, fe-
cos das mitocôndrias são essenciais para entender sua
participação e seu acoplamento com o processo de
chando o CA T. Dessa forma, grande parte da ener- transporte de elétrons, que é o passo final que irá pro-

I gia química que estava armazenada no carboidrato é


transferida para moléculas de A TP, NAD e de FAD,
duzir, proporcionalmente,
energia para a célula.
a maior quantidade de

sendo as duas últimas reduzidas, no processo, a A mitocôndria possui duas membranas (Fig. 7.5),
NADH+H+ e FADHz' respectivamente (Fig. 7.3). o que possibilita a existência de um compartimento
O CA T tem pelo menos duas funções importan- entre elas, para onde os pró tons são bombeados, e
tes na célula. A primeira é produzir energia e/ou com- isso, como veremos adiante, é essencial para a pro-

I postos redutores para a cadeia de transporte de elé-


trons, e a segunda, igualmente importante, é produ-
zir esqueletos de carbono para o metabolismo celular
dução de ATP. O NADH+H+ e o FADHz' produ-
zidos pela oxidação do piruvato (ou seja, do CA T),
doam seus elétrons para um conjunto de complexos
em geral. protéicos presentes na membrana interna da mito-
A Fig. 7.6 descreve algumas das ligações do CA T côndria, levando ao terceiro e último passo da res-
com o metabolismo de compostos essenciais para as piração, conhecido como cadeia de transporte de
células, como, por exemplo, os ácidos nucléicos, li- elétrons.
pídios, proteínas e compostos secundários.
Através da via das pentoses, são produzidas molé-
Cadeia de transporte de elétrons
culas de açúcares de 5 carbonos (ribose e xilose, por
I exemplo), que são fundamentais para a síntese de A energia potencial armazenada em moléculas de
DNA e RNA e para polissacarídeos de grande impor- NAD e FAD reduzidos (ou seja, NADH + H+ e
tâncianos tecidos vasculares (xilanos). É dessa via que FADHz) produzidas nas etapas anteriores (glicólise e
I surgem as citocininas, que exercem papel crucial no ciclo de Krebs) será utilizada para a produção de A TP
desenvolvimento vegetal (ver Capo 9, Citocininas). no passo final da respiração, chamada cadeia de trans-
A acetil-CoA, serve de base para a síntese de lipí- porte de elétrons ou cadeia resPiratória. Esse processo
dios e também para as vias de biossíntese de ocorre nas cristas (membranas internas) mitocondri-
isoprenóides e terpenos, que, por sua vez, irão servir, ais (Fig. 7.5A).
respectivamente, de esqueletos básicos para a síntese N esse processo, os elétrons são transferidos para
dos hormônios vegetais giberelinas e ácido abscísico complexos protéicos que possuem potencial de óxi-
(ver Caps. 10, Giberelinas, e 11, Ácido Abscísico). do-redução cada vez mais baixos. Associado a essa
Mais à frente, no CA T, o a-cetoglutarato serve transferência de elétrons, há um fluxo de prótons
como base para a síntese de diversos aminoácidos, (H +) da matriz para o espaço entre as membranas da
bem como de esqueletos básicos para a síntese de com- mitocôndria (Fig. 7.5B). Ao final dessa cadeia de
postos vitais para as plantas, tais como as clorofilas e transporte de elétrons, cada par de elétrons é doado
o fitocromo. para um oxigênio (1/20z) junto com dois prótons
Outra parte dos aminoácidos é derivada do oxalo- (H+), formando moléculas de água. O gradiente de
acetato, o qual, juntamente com o fosfoenolpiruva- pH assim gerado, no espaço entre as membranas e a
to, serve de base para a chamada via do ácido matriz da mitocôndria, constitui uma reserva de ener-
chiquímico, da qual derivam os alcalóides, flavonóides gia potencial eletroquímica. Além dessas proteínas
e ligninas. É também nessa via que é produzido o áci- envolvidas no transporte de elétrons, a membrana
i
*


204 Respiração

A B
H'

,"
"
'+. tU, .Uto" l
'~j' ; I',t'
•.., I,O,+2lf' "
...
:::. I?l
H,O

Fig. 7.5 Cadeia de transporte de elétrons (B). Os compostos redutores produzidos nos outros passos da respiração (glicólise
e ciclo de Krebs) são utilizados por complexos protéicos que transferem os elétrons até a redução do oxigênio e a forma-
ção de água. Esse processo ocorre na membrana interna da mitocôndria (A). Em plantas, há uma via alternativa (AOX)
na qual a transferência de elétrons e a redução do oxigênio podem ser feitas diretamente, sem a passagem por dois dos
complexos e com conseqüente produção de calor (B).

interna da mitocôndria possui um complexo enzimá, Via da ubiquinona ou via alternativa


tico por onde os prótons podem voltar à matriz a fa-
de transporte de elétrons
vor do gradiente de concentração. Ao deixar passar
os prótons, esse complexo usa a energia liberada para As mitocôndrias das plantas possuem peculiarida-
fosforilar o ADP, produzindo A TP. des que não são comuns em outros organismos. Uma
A cadeia respiratória é a principal fonte de A TP propriedade importante delas é a presença de uma
das células. Embora seja difícil precisar o rendimen, rota alternativa de transporte de elétrons (Fig. 7.5B).
to do processo, cerca de dois ou três prótons são bom- A cadeia de transporte de elétrons pode ser inter-
beados ao espaço entre as membranas para cada elé, rompida por certos compostos químicos, como o
tron que flui pelo sistema (cada NADH + H+ oxida, cianeto, o monóxido de carbono e a rotenona. O
do). Isso corresponde a cerca de 3 A TPs para cada cianeto, por exemplo, é bem conhecido como um
NAD reduzido no ciclo do ácido tricarboxílico e 2 potente e perigoso agente que pode levar animais à
A TPs por FADHz' pois a oxidação deste último é li- morte rapidamente. No entanto, essa inibição não é
geiramente diferente. No final, o rendimento geral de tão evidente em plantas. As mitocôndrias das célu,
produção de A TP pela mitocôndria é de 12 a 17 A TPs las vegetais possuem uma proteína a mais na cadeia
por molécula de piruvato (ou 24 a 34 A TPs por mo- de transporte de elétrons (chamada de desidrogena-
lécula de glicose). se alternativa), que permite que o transporte de elé-
Na Tabela 7.1 é mostrado o balanço geral com trons ocorra sem a necessidade de uso de todos os
valores aproximados de produção de A TP nas dife, complexos protéicos presentes na cadeia respiratória.
rentes etapas do processo respiratório. Vale a pena Além disso, esse sistema ainda é capaz de efetuar a
ressaltar que a cadeia respiratória produz cerca de 90% redução do oxigênio. Um dos resultados dessa via
do A TP do processo respiratório como um todo. Por alternativa é a produção de calor. Quando os elétrons
outro lado, a parte do processo que não necessita de passam através da via alternativa, dois dos comple,
oxigênio (a glicólise) produz somente 2 A TPs, ou seja, xos protéicos de transporte são evitados e não há a
apenas 5% da energia do processo. formação de A TP. Com isso, a energia, que, nesses


Respiração 205

dois passos, seria armazenada no A TP é liberada em Informações importantes para


forma de calor. compreender a bioquímica da
Alguns estudos têm mostrado que, em certos casos, respiração
as plantas podem utilizar esse "artifício" de produção 1) Uma hexose contém 6 carbonos, e, portanto, sua
de calor para obter vantagens ecofisiológicas. Por degradação, na glicólise, gera dois compostos de 3
exemplo, a geração de calor por certas flores pode esti~ carbonos (piruvato):

mular a volatilização de compostos que irão servir para


H,,~/.0 O· O
sinalizar sua presença e posição para polinizadores. C
,,~
C
Desse modo, a respiração está sendo usada como meio I I
HC OH C=O
de comunicação entre certas plantas e animais.
I I
HO CH ::. 2x CH3
I
HC OH
Fermentação
I
H C OH
Em situações nas quais a disponibilidade de oxi~
I
gênio é baixa, a célula não pode completar as três fases CHpH
da respiração, pois a falta de oxigênio impede a oxi~
2) O ATP (adenosina trifosfato), quando utilizado
dação do citocromo, bloqueando todas as etapas an~ como fonte de energia, gera ADP (adenosina difosfato)
teriores da cadeia de transporte de elétrons. T aI im~ e fosfato inorgânico (Pi). Por outro lado, a produção de
pedimento é crucial para a produção de energia, pois, A TP pode ser feita pela reação inversa, através de
fosforilação do ADP, desde que haja uma fonte de
conforme já descrito, a cadeia de transporte de elé~
energia:
trons é a parte responsável pela produção da maior
quantidade de ATP (Tabela 7.2). A TP ~ ADP + Pi + energia
Essa situação pode ocorrer em raízes, quando o 3) A razão ADPjA TP é importante porque funciona
como um índice de disponibilidade de energia na célula.
solo é inundado, por exemplo. Nesses tecidos, o flu~
Caso haja uma grande disponibilidade de A TP na
xo de carbono é desviado no final da via glicolítica
célula, a taxa respiratória diminui e os intermediários da
e o piruvato é reduzido pela enzima desidrogenase via glicolítica são desviados para vias de
do lactato, produzindo lactato (Fig. 7.3). Esse esta~ arrnazenamento, como a síntese de amido ou de lipídios.
do metabólico, no entanto, não pode ser mantido
prolongadamente, pois o acúmulo de lactato leva à
acidificação do citossol e, eventualmente, à morte vez que, sem a cadeia de transporte de elétrons, ape~
da célula. Para evitar essa situação, o piruvato pode nas as duas moléculas de A TP produzidas na via
ser descarboxilado a acetaldeído e este reduzido a glicolítica são geradas para cada glicose, contra cer~
etanol (Fig. 7.3). Os problemas causados pelo acú~ ca de 38 produzidas na presença de oxigênio. Alguns
mulo de etanol são inferiores aos causados pelo acú~ processos fisiológicos possuem efeitos diretos sobre as
mulo do lactato, desde que não haja acúmulo de conseqüências da condição de hipoxia. A redução de
acetaldeído. nitrato, por exemplo, não só libera HO-, o que ajuda
Foi verificado que, em ervilha, por exemplo, a a minimizar a acidose do citossol, mas também oxida
concentração de etanol na seiva do xilema em solos NADH+H+, gerando NAD, que pode ser utilizado
inundados podia chegar a 90 mM. Caso a planta seja no ciclo do ácido tricarboxílico, minimizando o acú~
cultivada em laboratório em um substrato com eta~ mula de ácidos orgânicos na mitocôndria. Em plan~
nol (cerca de 4 mM, como encontrado em solos inun~ tas que se desenvolvem em solos permanentemente
dados), a concentração de etanol da seiva pode che~ alagados, no entanto, adaptações específicas, como
gar a 970 mM. Os problemas provocados pela fermen~ pneumatóforos, por exemplo, são necessárias para
tação, portanto, estão mais relacionados à baixa pro~ evitar a condição permanente de hipoxia e permitir
dução de A TP e suas conseqüências metabólicas, uma o desenvolvimento (ver adiante) .


206 ResPiração

Exportaçªol Amido Celulose

II /

-
Ácidos lmportaça~
sacarose
Nucléicos
ATP
ADP
NAD II
NADP NnclJtídeos
CoA
Citocininas Via das glucose 6-P ~

pentoses • II ~D;;d"'xi"'t.nn P
~gll""nldeíd. 3-P II
Alcalóides
Flavonóides II glicerolfosfato
Ligninal -,.--
AIAI
ehíqu.m".
áci?o. II
+--- fosfoenolpiruvato II
.
Protemas ~
~ 1 ~ ~Pí'"lr~~A ~
~C02~ Lipídios

aminoácidos acetil-CoA Isoprenóides


1l ~~COA
citrato
CoA
~ Terpenos
XW.:relinas
oxalacetato \

r i,.eT·to Proteínas

t \ "- .A,ut.,,\
J~~ 1l
CO, aminoácidos

Cloromas,/
Fitocromo

Fig. 7.6 Relações entre o processo respiratório e outras vias do metabolismo de carbono nos vegetais. Note que as prin-
cipais substâncias do metabolismo estão ligadas, direta ou indiretamente, ao metabolismo respiratório. Todos esses com-
postos têm que ser produzidos em maior ou menor intensidade durante o dia-a-dia da planta. Assim, em cada célula da
planta, o fluxo pode ser aumentado ou diminuído conforme a necessidade. Esse equilíbrio, que é dinâmico, faz parte da
homeostase da planta como um todo.

o fluxo respiratório varia com o estado das as células e que, portanto, a distribuição dos pro-
fisiológico da célula dutos da glicólise, CATe transporte de elétrons
(produtos intermediários, energia em forma de A TP
Pelo que foi visto até agora, as diferentes fases da e calor) sejam também constantes. No entanto, o
respiração podem dar uma idéia de que o fluxo do processo como um todo é extremamente dinâmico
carbono e energia no processo seja constante em to- e interligado por diversas vias, de forma que, depen-
ResPiração 207

dendo da função da célula em determinado órgão, das hexoses, cuja entrada no sistema ocorre por meio
alguns produtos podem se apresentar em maior da fotossíntese, mobilização de reservas e pelo uso
quantidade em um dado momento. A Fig. 7.7 mos' da energia contida na hexose para possibilitar a
tra o processo como um todo e suas principais in, manutenção e crescimento dos tecidos vegetais.

I! terligaçães. Nela é salientado o papel fundamental Assim, em determinado órgão, pode estar ocorren,

Importação
Reservas

ENERGIA-+

HEXOSES

lI:
+
==
i:l
z'<
Lactato // lJ?ermentaç~()M
Etanol '" J (Via anaeróbica)

Lipídios
Ci~lo'do ác~do~, Esqueleto de
tncarboxíhco L-, >' Carbono
(reduçã()de NAD) .

H20 ...- de Elétrons CRESCIMENTO Lipídios


Cadela de Transporte MANUTEJÃO {icidOS nucléicos

k':
membrana interna)
(oxidação d....
e NAD na 1 Compostos secundários
! , (via ATP~se) ",,- (ATP)
~ '> Fluxo de eletr?ns r:::l~ >ENERGIA
/ a favor do gradiente / (calor)

Respiração Insensível ao Cíaneto

Fig. 7.7 A figura ressalta as relações entre a respiração e a fotossíntese, por um lado, e os eventos ligados à manutenção
e crescimento, por outro. Embora o carbono entre na planta exclusivamente através da fotossíntese, nem todos os teci-
dos são fotossintéticos. Por isso, há a necessidade de acúmulo de reserva e de mecanismos de transporte (importação)
que possibilitem a respiração em tecidos não-fotossintéticos, fazendo com que haja um fluxo contínuo de hexoses no
sistema respiratório em toda a planta. Tal continuidade é crucial para a respiração de manutenção, que é vital para a
manutenção e funcionamento celular .


-

208 Respiração

do fermentação (em caso de inundação, por exem~ RESPIRAÇÃO NOS TECIDOS E


pIo), uso da via alternativa insensível ao cianeto ÓRGÃOS
para a produção de calor, ou ainda a produção de
Quando consideramos a respiração na planta, ge-
grandes quantidades de carboidratos e proteínas caso
ralmente nos referimos às trocas gasosas realizadas
esteja ocorrendo armazenamento de reservas em
sementes. O sistema pode, em dado momento, es~ pelos órgãos, e não ao processo molecular de oxida-
tar voltado para a produção de compostos do meta~ ção da glicose. A taxa respiratória é variável de acor-
bolismo secundário, como, por exemplo, no caso de do com o tipo de órgão, idade, ambiente, estação etc.
ataque de um patógeno. Cada órgão vegetal respira independentemente e re-
Essa flexibilidade de resposta aos ambientes in~ cebe, via de regra, carboidratos (geralmente sacarose)
terno e externo é fundamental para a sobrevivên~ para "queimar", no processo de respiração celular. A
da da planta, sendo o controle homeostático do seguir, serão apresentadas as características do proces~
metabolismo extremamente complexo, com meca~ so respiratório em cada órgão da planta.
nismos de controle de diversos tipos. O controle de
determinada via pode ser feito diretamente por ini~ Raízes
bição ou ativação de uma enzima por um co~fator,
pelo próprio substrato da enzima ou complexo en~ As raízes são órgãos que respiram muito e intensa~
zimático, ou, ainda, pela ação de fitormônios que mente. O substrato utilizado no processo é constitu~
podem levar a alterações na transcrição de genes, ído por carboidratos vindos da parte aérea pelo floe-
alterando as demandas de compostos por determi~ ma, a partir das folhas, que são os órgãos responsáveis
nada via. pela fotossíntese (ver Caps. 6, Transporte no Floema,
É importante salientar que o processo respiratório e 18, Tuberização).
como um todo não apresenta um único ponto de con~ A energia que é liberada pela respiração radicular é
trole. A integração das outras vias metabólicas com utilizada para a síntese dos componentes celulares, para
a respiração compreende um grande número de pon~ formação das estruturas secundárias (quando houver),
tos de controle que trabalham de forma integrada e nos processos de absorção e acúmulo de nutrientes
equilibrada. Embora se tenha um conhecimento ra~ minerais e também de reserva alimentar. Raízes primá-
zoável sobre o funcionamento das vias metabólicas rias e raízes jovens respiram muito mais intensamente
que formam o processo respiratório das plantas, as do que as raízes com crescimento secundário. A expli~
formas de integração com outros processos ainda são cação para tal fenômeno é simples: raízes primárias e
pouco conhecidas e deverão, em parte, ser elucidadas jovens têm meristemas em contínuo processo de alon-
através de estudos mais aprofundados de modelagem gamento e diferenciação, processos esses dispendiosos
e simulações computacionais com algoritmos mate~ do ponto de vista energético. Raízes em crescimento
máticos. secundário também têm as células meristemáticas do
Pode~se concluir, a partir do esquema da Fig. 7.6, câmbio e as anexas que respiram intensamente.
que o processo respiratório é central e fundamental Nas raízes, o oxigênio necessário para o processo
para toda a célula, estando relacionado, direta ou respiratório advém principalmente do próprio solo,
indiretamente, com todo o metabolismo celular. podendo vir também da parte aérea. No primeiro caso,
Há, porém, um outro nível de integração que não há a necessidade de o solo apresentar boa aeração, o
foi contemplado nas apreciações já feitas: a integra~ que facilita as trocas gasosas com a raiz. Quando a ati-
ção entre células e órgãos. A seguir, serão descritas vidade respiratória é intensa, o oxigênio pode vir tam~
as características do processo de respiração nos dife~ bém da parte aérea. A proporção entre uma fonte ou
rentes órgãos das plantas, procurando mostrar que o outra depende exclusivamente da espécie vegetal.
processo respiratório é dinâmico também em nível dos Plantas de manguezais ou de pântanos retiram oxigê~
órgãos vegetais. nio do ar, devido à baixa quantidade de oxigênio
ResPiração 209

dissolvido na água ou presente no solo. Para tanto,


desenvolveram uma estrutura especial para as trocas
gasosas denominada pneumatóforos (ex.: Avicenia
nitida e Rhizophora mangle). Outras plantas podem
apresentar respiração anaeróbica (ex.: Nuphar).
Raízes aquáticas apresentam um tipo de parênqui~
ma adaptado à função de reserva de ar - o aerênquima
- que, além de permitir a flutuação da planta, retém
oxigênio para o processo respiratório (ex.: Ludwigia
sp.). A formação de aerênquima nas raízes pode ser
induzida em uma planta não adaptada à anoxia atra~
vés do alagamento, quando ocorre a indução de uma
enzima denominada celulase (que digere a celulose
das paredes celulares) em regiões específicas do teci~
do radicular, de forma a aumentar os espaços inter~
nos do tecido.

Fig. 7.8 Lenticela (seta) do caule de sabugueiro (Sambu~


Caule cus). Tal estrutura facilita a entrada e a conseqüente che-
gada do oxigênio às células do câmbio vascular (cv), que
Os caules verdes, suculentos, que apresentam es~ se dividem intensamente durante o crescimento secundá~
trutura primária, fazem trocas gasosas com o meio rio. Na parte em vermelho à direita, a abertura central
através da epiderme, enquanto, naqueles com cres~ (seta) é tida como um local de entrada de oxigênio. (Foto
cimento secundário, geralmente o 0z é proveniente = Solange Mazzoni~Viveiros.)
das folhas. Nesses caules, a respiração é mais intensa
na região do câmbio vascular e felogênio, onde no~
vas células estão se formando, crescendo e diferenci~ (Fig. 7.9) são as estruturas responsáveis pela maior
ando. As trocas gasosas nos caules com crescimento parte das trocas realizadas pelo órgão. A liberação de
secundário são muito baixas, e, por isso, o 0z se di~ COz pelas folhas é determinada pela razão COz/cmz
funde pelas células caulinares. Alguns tipos de caule da área foliar e é praticamente constante desde o iní~
podem apresentar estruturas conhecidas como cio da sua formação até a morte. Em folhas de feijão,
lenticelas (Fig. 7.8), que facilitam as trocas gasosas com por exemplo, a taxa respiratória de manutenção chega
o meio. Em cactáceas, porém, as trocas gasosas só a ser 10 vezes mais alta no período inicial de desen~
ocorrem à noite, com a abertura dos estômatos (ver volvimento, baixando drasticamente conforme as
Plantas MAC no Capo 5, Fotossíntese). folhas se expandem. Ao mesmo tempo, a taxa respi~
Em caules subterrâneos, o 0z difunde~se de célula ratória relacionada ao crescimento tem um pico du~
a célula, como no caso de Allium cepa (alho) e Sola~ rante o intervalo de taxas máximas de expansão foli~
num tuberosus (batata). Os caules aquáticos apresen~ ar, voltando gradativamente aos patamares iniciais.
tam grande quantidade de aerênquima, que, além da Em alguns vegetais, quando a folha está próxima da
flutuação, acumulam 0z para facilitar a respiração abscisão, há um aumento expressivo na taxa respira~
(ex.: Nymphaea, Victoria amazonica). tória que diminui algum tempo antes de a folha cair.
Esse fenômeno está possivelmente relacionado com
a reabsorção de compostos (por exemplo, íons, ami~
Folhas
noácidos e açúcares), com o seu armazenamento
De todos os órgãos vegetais, as folhas são os que como reserva caso a planta esteja adaptada a ambi~
mais realizam trocas com o ambiente. Os estômatos entes com variações sazonais (biomas de regiões tem~


-

210 ResPiração

A manutenção da taxa respiratória nessas condi-


ções pode ser explicada pela degradação de outras
substâncias, como as proteínas. Além disso, há a via
pentose-fosfato (Fig. 7.6), que é muito importante
quando a folha atinge expansão máxima, pois é uma
via essencial, por exemplo, para a síntese de ácidos
nucléicos e carboidratos. Essa via, além de produzir
COz, ainda regenera alguns carboidratos que podem
voltar à glicólise e, posteriormente, ser degradados no
ciclo de Krebs. A pentose-fosfato (ribose-5-fosfato)
ainda pode dar origem a um outro açúcar, a eritrose-
4-fosfato, que não produz COz' mas origina pigmentos
presentes em pétalas e frutos, colorindo-os.

Flores e frutos

Fig. 7.9 Fotomicroscopia mostrando a superfície abaxial


° processo de floração envolve normalmente
uma grande demanda respiratória em plantas. Além
(inferior) de uma folha de jatobá (Hymenaea courbaril L.). da necessidade de construir os tecidos florais, após
Em amarelo são as células da epiderme e, em azul-escuro,
o desenvolvimento da flor, há diversos processos
as células-guardas dos estômatos, tendo ao lado de cada
relacionados à polinização, que envolvem, em
uma células levemente esverdeadas, chamadas de células
muitos casos, a "comunicação" com animais poli-
companheiras. Nas folhas, as trocas gasosas ocorrem pre-
nizadores.
dominantemente nos estômatos. (Foto = Paula F. Costa,
Solange Mazzoni-Viveiros e Marcos S. Buckeridge.) Em muitas espécies, devido à estratégia ecoló-
gica de produção de grande número de flores, que,
ao final do processo, são abortadas em sua maio-
peradas e no cerrado, por exemplo), ou pode ser di- ria, a demanda de energia é bastante elevada. Nes-
retamente incorporado em outras partes da planta se caso, parece haver, durante o período reprodu-
caso a sazonalidade seja menor. tivo, uma priorização da energia para esse proces-
Os mecanismos de senescência e abscisão foliar so em detrimento de outros processos de desenvol-
estão relacionados à atividade de uma série de hor- vimento.
mônios vegetais, tais como as citocininas, auxinas e Em regra, a conseqüência do sucesso da fecunda-
o ácido abscísico, que, direta ou indiretamente, pro- ção resulta na formação de frutos. Estes apresentam
movem um aumento da taxa respiratória relaciona- uma alta taxa respiratória logo no início da sua for-
da ao crescimento até a queda foliar. mação, ou mesmo antes de serem formados. Ainda
Quando a expansão foliar atinge o máximo, taxas durante a formação do tubo polínico, ocorre um au-
elevadas de assimilação de COz (fotossíntese) são mento nos teores de AIA no ovário da flor. Conco-
também atingidas. Esperava-se, nesse momento, que mitantemente, há um aumento da taxa respiratória
a taxa respiratória diminuísse para não haver queda que está possivelmente relacionado à intensificação
na incorporação de COz e, portanto, produção me- da atividade metabólica no ovário. Após a fecunda-
nor de carboidratos. Mas isso não acontece: a libera- ção, a necessária translocação de nutrientes das fo-
ção de COz é mantida constante devido à taxa respi- lhas vizinhas para o ovário envolve um gasto energé-
ratória de manutenção da fotossíntese, de forma que, tico considerável. Uma vez formado o fruto, a
em geral, só há decréscimo quando a folha já está alocação de nutrientes e a produção dos diversos ti-
praticamente morta. pos celulares que armazenam esses nutrientes passam
ResPiração 211

a apresentar taxa respiratória mais baixa. No proces- mo celular é reativado. Essa reativação metabólica
so de amadurecimento de certos frutos ocorre um provoca uma série de mudanças fisiológicas (ver
aumento rápido e intenso da taxa respiratória chama- Capo 17, Germinação). Uma das conseqüências é o
do de dimatério. Nos frutos climatéricos (abacate, aumento da taxa respiratória, associado à necessi-
maçã, banana, entre outros) ocorre a produção de dade da utilização das reservas energéticas existen-
etileno (outro hormônio vegetal), acelerando o ama- tes no endosperma ou nos cotilédones. Nesse perío-
durecimento (hidrólise de amido, síntese de pigmen- do, há a hidrólise de óleos por l3-oxidação, produ-
tos etc.) e senescência. Tratamentos com etileno ção de açúcares, fitormônios e diversas enzimas hi-
aceleram o amadurecimento de frutos climatéricos, drolíticas (proteases, l3-galactosidases, a-amilases,
sendo esse procedimento comumente utilizado para l3-glucanases, nucleases etc.). Como conseqüência,
fins cOmerciais. Outros frutos não apresentam o amido ou outros polissacarídeos de reserva, proteí-
climatério e, mesmo adicionando-se etileno, não nas e aminoácidos são utilizados-em parte na respi-
ocorre tal fenômeno. Isso pode ser observado em la- ração, cuja taxa elevada deve-se ao crescimento do
ranja, abacaxi, uva etc. eixo embrionário.
° efeito da temperatura sobre a taxa respiratória Para que o processo respiratório ocorra, há a ne-
cessidade de 0z disponível no solo, já que a grande
dos frutos também pode ser facilmente observado, isto
é, baixas temperaturas retardam a senescência dos maioria das sementes germina em boas condições
frutos, fazendo com que a taxa respiratória se mante- aeróbicas. Durante a germinação, as sementes utili-
nha baixa. Por outro lado, temperaturas elevadas, zam, como fonte inicial de carbono na respiração, a
principalmente à noite, aumentam a taxa respirató- sacarose e oligossacarídeos da série rafinósica (feijão,
ria e aceleram o amadurecimento de frutos. Baixas lentilha e ervilha). Estes já se encontram estocados
concentrações de 0Z' sob redução da temperatura quando da maturação da semente e são degradados
ambiente, podem estimular a respiração anaeróbica, rapidamente à medida que a taxa respiratória aumen-
mais precisamente a fermentação, enquanto altas ta. A vantagem para as sementes em armazenar esses
concentrações de COz inibem a produção de etileno compostos é o acesso rápido, uma vez que são solú-
pelo fruto, retardando o amadurecimento. Na esto- veis e estão presentes no citoplasma e disponíveis para
cagem de frutos (pós-colheita), combina-se a redu- uso imediato. Com isso, logo após a embebição, a se-
ção da temperatura e de 0z com um aumento na con- mente perde massa, libera COz' produzindo a ener-
centração de COZo Os três fatores, atuando juntos, gia necessária para o desenvolvimento inicial da nova
mantêm as taxas respiratórias do fruto em níveis su- planta. Essa reserva inicial é crucial para a germina-
ficientemente baixos, retardando assim o amadure- ção e, dependendo da estratégia de estabelecimento
cimento. Sob condições favoráveis de armazenamen- da plãntula, os cotilédones podem ainda possuir gran-
to, frutos como maçã, colhidos em março-abril (no des quantidades de reservas de carbono (jatobá) que
Brasil), podem manter suas propriedades inalteradas serão utilizadas também na produção de energia pela
por até um ano. via respiratória.
A classificação dos frutos em climatéricos e não- Alguns tipos de sementes germinam com pouco
climatéricos não é rígida, pois muitos frutos apresen- oxigênio ou mesmo na ausência de oxigênio dispo-
nível, como é caso do chamado arroz de várzeas, onde
tam liberação irregular de COz' como, por exemplo,
a jaca (Artocarpus integrifolia) e o jambo (Eugenia as condições de germinação são praticamente anae-
malecensis) . róbicas e a obtenção de energia se dá através do pro-
cesso de anaerobiose (fermentação). Sementes de
plantas de manguezais utilizam também a fermenta-
Sementes
ção para a germinação, sendo esse processo anaeró-
Durante o processo de germinação, com o aumen- bico a única alternativa para essas sementes libera-
to da entrada de água por embebição, o metabolis- rem H+ dos NADH + H+ acumulados.
212 ResPiração

CONTROLE DA RESPIRAÇÃO NAS de reserva pode ser observada através do quociente


PLANTAS POR FATORES respiratório (Tabela 7.3).
Em sementes, a degradação das reservas ocorre
INTERNOS
rapidamente, e isso aumenta, intensamente e de for-
Disponibilidade de substrato ma transitória, a disponibilidade de substrato para a
respiração. Isso permite um maior consumo de ener-
Os principais substratos do processo respiratório gia durante o desenvolvimento inicial da plântula.
são carboidratos e lipídios. Esses substratos se origi- Um processo similar pode ocorrer em plantas herbá-
nam, direta ou indiretamente, do processo fotossin- ceas do cerrado que possuem órgãos subterrâneos de
tético (ver Capo 5, Fotossíntese). Apesar de as taxas reserva. Em plantas da família das asteráceas, por
respiratórias em diferentes órgãos em fases distintas exemplo, os órgãos subterrâneos podem armazenar
de desenvolvimento poderem variar dentro de deter- quantidades substanciais de frutanos (polissacaríde-
minados limites, todas as células têm que manter os compostos principalmente de frutos e ). Plantas que
constante (ou, pelo menos, dentro de limites mais adotam essa estratégia de estabelecimento e adapta-
estreitos) a taxa respiratória de manutenção. Qual-
quer fator que influencie na diminuição das quanti-
dades desses substratos e sua produção ocasionará uma
diminuição da taxa respiratória do órgão ou, mesmo, Quociente respiratório
da planta inteira. Portanto, a taxa respiratória não Quociente respiratório é a relação entre a
pode estar diretamente ligada à fotossíntese, pois esse quantidade de moléculas de gás carbônico liberada pela
processo é extremamente variável e dependente de oxidação de um substrato no processo respiratório e a
quantidade e moléculas de oxigênio consumidas para
condições ambientais cíclicas (luz e temperatura).
oxidar esse substrato. Por exemplo, a completa
Nesse sentido, a solução parcial para o problema da degradação de uma molécula de glicose no processo ~
disponibilidade contínua de substrato é o armazena-
mento de açúcares de reserva para que seja possível
respiratório
moléculas de
consumido
consome seis moléculas de O2 e libera seis
CO2• A razão entre o COz liberado e o
é o quociente respiratório, que, no caso, é
O2 •
-'fr
·Y.

sua utilização durante o período em que a fotossínte-


QR = 1,0 para a glicose. Isso acontece porque, na
".
se não está ativa. Nas folhas, as plantas armazenam
amido durante o período fotossintético e o mobilizam
para processos respiratórios, de forma que variações
molécula de glicose, o número de átomos de oxigênio é
igual ao de átomo de carbono .
~,
.~

"

,•
muito intensas nas taxas respiratórias possam ser
minimizadas. Nesse caso, a reserva pode ser conside- QR= 6C02
)
rada de curto prazo, pois o processo inteiro leva um
60=1,0
2
~
1:.

único dia.
Quando o substrato degradado possui um número de
Há outras formas de armazenamento de reserva por átomos de oxigênio inferior ao número de átomos de
um prazo mais longo para o processo respiratório re- carbono, o resultado do QR será um valor menor do que
1,0, como ocorre no caso de uso de lipídios ou proteínas .~
lacionado ao desenvolvimento da planta como um
todo ou de parte dela. Assim, por exemplo, em semen-
na respiração. Como exemplo, temos o ácido esteárico:
:.••
tes que armazenam grandes quantidades de amido,
polissacarídeos de reserva de parede celular ou lipí- .~
.t
18C02 =0,69
dios, tais compostos são degradados após a germina- QR= 2602

r'-
fi

,
ção e, devido ao fato de seus produtos de degradação
Quando o QR é maior do que 1,0, há indicação de que
gerarem compostos distintos (sacarose no caso de o substrato ou é rico em oxigênio (ácido oxálico - 2
carboidratos, aminoácidos no caso das proteínas e C2H204 - QR = 4,0), ou está ocorrendo respiração
acetil-CoA no caso dos lipídios), a existência de res- anaeróbica, já que, em anaerobiose, o consumo de

piração ligada à mobilização de diferentes compostos


oxigênio é nulo!
·t

t
ia
ResPiração 213

ção podem perder a parte aérea durante o inverno, para as células. Durante as horas de exposição à luz,
quando há baixa disponibilidade de água no cerrado. tecidos fotossintéticos produzem 02 e, ao mesmo tem-
Na primavera, ocorre a degradação do polissacarídeo, po, consomem parte dele na respiração. À noite, não
produzindo frutos e livre que acaba sendo metaboli- há produção de 02' mas este é difundido no interior
zada a sacarose, a qual é transportada para os órgãos da planta através dos espaços intercelulares. Mesmo
em crescimento que utilizam os açúcares no processo com os estômatos fechados, o 02 difunde-se para o
respiratório, com taxas mais elevadas devido ao pro- interior do vegetal através da cutícula, que não é to-
cesso de desenvolvimento em curso. talmente impermeável ao gás, cuja resistência à en-
trada é compensada pela concentração na atmosfera

Quantidade de oxigênio de 02' muito maior que dentro do vegetal.


A disponibilidade de oxigênio é mais crítica para
A concentração de O2 no ar (21 % de oxigênio) é as raízes, pois o 02 disponível no solo é utilizado tam-
de aproximadamente 265 ILM. Por outro lado, a Kn1 bém por fungos, bactérias, protozoários e animais que
da enzima que usa o oxigênio, a oxidase do citocro- aí vivem. Durante e após as chuvas, o ar do solo é
mo c, é de aproximadamente 1 ILM. Portanto, como substituído pela água e, nesse momento, a quantidade
a afinidade da enzima é muito maior que a concen- de oxigênio torna-se baixa, podendo causar hipoxia
tração atmosférica de 02' poder-se-ia supor que a res- ou chegar a uma anoxia da raiz. Muitas raízes e semen-
piração não apresentasse dependência da concentra-
tes conseguem sobreviver por algum tempo a expensas
ção de oxigênio atmosférico.
apenas da respiração anaeróbica, porém esta não é
Porém, há um outro problema. Ao entrar no teci-
suficiente para manter o crescimento, e, se o período
do vegetal, o oxigênio passa de uma fase gasosa para
de anoxia for muito longo, certamente muitos indi-
uma fase líquida, em que a sua taxa de difusão é cerca víduos morrerão.
de 10 mil vezes menor do que no ar. Nesse caso, a taxa
Um exemplo de planta que pode crescer por um
de difusão pode ser um problema, pois sabe-se que
longo período com baixa disponibilidade de oxigênio
tensões de oxigênio menores do que 5% podem ser é o arroz. Tubérculos, como os de batata, ou raízes
limitantes para a respiração.
tuberosas, como a da cenoura, não apresentam desen-
Aparentemente, as plantas solucionaram esse pro-
volvimento satisfatório na ausência de respiração ou
blema desenvolvendo rotas gasosas de difusão atra-
mesmo sob baixas taxas de respiração anaeróbica.
vés de espaços intercelulares. Nesse caso, a limitação
Câmbios vasculares de troncos, em geral, podem apre-
de difusão deixa de ser importante e permite que o
sentar hipoxia; entretanto, muitas árvores contêm
oxigênio difunda pelos espaços intercelulares dos te-
lenticelas, que permitem trocas gasosas e a difusão de
cidos vegetais, garantido que este chegue em abun-
02 através de uma quantidade maior de espaços in-
dância ao seu local de consumo.
tercelulares.
De um modo geral, as plantas não são tão ativas
quanto os animais, satisfazendo-se com baixas con-
centrações de oxigênio, entre 1 e 2%, as quais são Temperatura
suficientes para a manutenção das taxas respiratórias A temperatura é um fator de grande influência na
do vegetal. A concentração de 02 na atmosfera é es- respiração, principalmente durante os estágios inici-
tável e, portanto, não é a causa responsável pelas ais de desenvolvimento da planta. A parte aérea do
variações na taxa respiratória. No entanto, essas va- vegetal, em qualquer estágio de desenvolvimento,
riações ocorrem devido à disponibilidade de oxigênio num período de 24 horas, está sujeita a grandes e rá-
pidas mudanças de temperatura, o que não acontece
na mesma proporção com as raízes.
[Constante de Michaelis, que mede a afinidade de uma enzima Na maioria dos tecidos, um aumento de 10°C, na
por seu substrato - quanto menor a K"" maior a afinidade. faixa entre 5 e 25°C, dobra a taxa respiratória devi-

t

(


214 Respiração

do ao aumento da atividade enzimática. Abaixo de Pesquisas têm mostrado que as oscilações na taxa
soC, há uma diminuição drástica da taxa respirató- respiratória de determinado órgão podem estar rela-
cionadas com a quantidade, bem como com o tipo de
ria, enquanto, ao redor de 30°C, ocorre um aumento
considerável, porém não tão rápido como na faixa de substrato disponível para a respiração. ° quociente
S-2SoGTal resultado é interpretado como decorrên- respiratório (razão entre COzliberado e 0z consumi-
cia do fato de o 0z não se difundir com eficiência do - ver Tabela 7.3) pode ser um bom indicador do
nessa temperatura. Temperaturas iguais ou superio- tipo de substrato predominantemente utilizado. A
res a 40°C diminuem a eficiência da respiração devi- variação da disponibilidade de substrato é uma das
do ao comprometimento ou danos à maquinaria en- vias para entender a maneira pela qual a respiração
zimática ou em conseqüência do rompimento das responde à demanda de energia metabólica (utiliza-
membranas de organelas. ção de A TP). No entanto, ainda não se sabe ao certo
se a oscilação da respiração de dado órgão é causa
ou conseqüência da oscilação paralela da disponi-
Ferimentos e lesões
bilidade de substratos presentes. Obviamente, exis-
Qualquer dano mecânico ou ataque de microorga- tem muitas situações nas quais certos compostos pro-
nismos sofrido por uma planta gera um aumento da duzidos como agentes de proteção contra organis-
sua taxa respiratória. Esse aumento pode ser devido à mos externos, por exemplo, são também inibidores
atividade do meristema de cicatrização ou à produ- ou desacopladores da cadeia de transporte de elétron
ção de substâncias de defesa da planta, uma vez que e, portanto, afetam indiretamente a respiração do te-
o tecido terá que produzir substâncias do metabolis- cido.
mo secundário relacionadas à defesa e também sin- Quando se pensa em controle da respiração, as
tetizar macromoléculas relacionadas à construção dos idéias de demanda de energia, disponibilidade de subs-
novos tecidos durante a cicatrização. Os mecanismos trato e taxa respiratória se sobrepõem. Sob baixos
de comunicação interna que levam à resposta dos níveis de substrato (carboidratos e ácidos orgânicos),
tecidos à injúria envolvem uma reação inicial de hi- a atividade respiratória pode estar limitada por esse
persensibilidade, seguida pela produção de substân- déficit. Quando os níveis de substrato aumentam, a
cias que irão alterar o metabolismo dos tecidos adja- respiração pode exceder a demanda por energia me-
centes (hormônios, por exemplo) e, conseqüente- tabólica. Nessas condições, a atividade da rota alter-
mente, aspectos quantitativos e qualitativos do pro- nativa do metabolismo respiratório (cianeto-resisten-
cesso respiratório. te) é aumentada. Como visto anteriormente, essa via
alternativa permite a oxidação dos substratos, redu-
ção dos agentes redutores (NAD[P]H, FADHz) sem,
RESPIRAÇÃO NA PLANTA
no entanto, produzir grandes quantidades de A TP.
INTEIRA
Considerando a planta como um todo, a taxa de
As alterações no metabolismo respiratório de uma respiração depende de três processos principais que
planta podem ocorrer diariamente (sob condições de requerem energia: manutenção da biomassa, cresci-
estresse de temperatura, umidade, luminosidade, ata- mento e transporte de íons (Fig. 7.7). Estima-se que
que de patógenos, entre outros), ao longo de sua o custo para a respiração de manutenção seja de 20 a
ontogenia (germinação, florescimento, frutificação) 60% dos fotoassimilados produzidos por dia, sendo a
ou sazonalmente (mudanças de estações). Tais mu- maior parte dessa energia direcionada para a renova-
danças na taxa respiratória podem ser observadas na ção de proteínas e para manutenção do gradiente de
planta como um todo, mas principalmente nos órgãos íons através da membrana. A respiração de crescimen-
mais expostos às variações, como no sistema radicu- to está relacionada com os processos biossintéticos
lar em condições de solo alagado, folhas atacadas por (produção de biomassa). Esse tipo de respiração re-
fungos ou frutos durante o climatério. quer grande consumo de carboidratos para gerar ener-
ResPiração 215

gia (A TP e NAD[P]H) e esqueletos de carbono. Em A ECOFISIOLOGIA E A


tecidos heterotróficos, a produção de energia é depen-
RESPIRAÇÃO
dente exclusivamente da respiração, enquanto, em
tecidos fotossintetizantes, tais compostos podem ser A ecofisiologia pode ser definida como uma ciên-
obtidos diretamente da fotossíntese. Alguns trabalhos cia experimental cujo objetivo é estudar e descrever
demonstraram que a respiração de crescimento sofre os mecanismos fisiológicos que determinam o que se
observa na ecologia. Por isso, compreender as conse-
um decréscimo significativo ao longo do ciclo de vida
das plantas, enquanto a respiração de manutenção se qüências das alterações, controle e aspectos fisioló-
mantém constante. Obviamente, essas alterações gicos da respiração em plantas tem grande relevân-
ocorrem devido à diminuição dos processos biossin- cia para a ecofisiologia vegetal. Para compreender
téticos e com a contínua taxa de renovação de vários melhor as conseqüências ecológicas do que foi expos-
compostos. Finalmente, o transporte de íons e molécu- to até aqui, é necessário refletir sobre como o proces-
las através da membrana pode ocorrer por canais ou so respiratório ocorre na planta inteira considerando
carreadores, e esses processos também requerem ener- ainda sua inserção no ecossistema.
gia metabólica oriunda da respiração. Assim, a plan- Como já mencionado, um dos fatores que influ-
ta tem que lançar mão do sistema respiratório para enciam a respiração na planta inteira é a idade. Plan-
absorver os macro e micronutrientes fundamentais tas jovens apresentam taxa respiratória elevada em

I para a construção de seus corpos. Além disso, após a


construção das moléculas fundamentais que com-
relação a plantas mais velhas. Em plantas jovens, a
respiração relacionada aos tecidos em desenvolvi-
põem esses corpos (açúcares, lipídios, proteínas e áci- mento é de 3 a 10 vezes maior que a taxa respirató-
dos nucléicos), as células têm que se manter em cons- ria relacionada à manutenção. Com isso, é possível
tante "comunicação" através do transporte de açúca- inferir que as taxas respiratórias do conjunto de plan-
res (principalmente a sacarose) e hormônios vegetais. tas em dado bioma (floresta, cerrado etc.) em rege-
Tudo isso faz parte do sistema dos gastos energéticos neração apresentem uma taxa respiratória mais alta
referidos, na introdução, como do sistema de comu- como um todo. Para que o saldo seja positivo e o
nicação interno das plantas. Para compreender me- balanço de massas do sistema seja favorável duran-
lhor o funcionamento desses sistemas de comunica- te o processo de sucessão ecológica, as taxas respi-
ção, é importante conhecer os mecanismos de sina- ratórias mais altas devem ser compensadas por ta-
lização disparados pela luz ou por hormônios. xas fotossintéticas ainda mais altas. Em experimen-
Além dos fatores limitantes para respiração já co- to recente, os meteorologistas calcularam que, no
mentados, existem outras situações de estresse cerrado, por exemplo, o conjunto de plantas apre-
(bióticas e abióticas) que também podem causar al- sentou, durante um ano, um saldo de apenas 0,1
terações nas taxas respiratórias e, conseqüentemen- tonelada de carbono fixado por hectare em relação
te, afetar o crescimento da planta. Em geral, as con- às estimativas de respiração. Isso explica o lento
dições de estresse levam a um aumento inicial na res- crescimento observado, em conjunto, das plantas no
piração devido a um aumento na demanda por ener- bioma de cerrado.
gia (ou maior disponibilidade de substrato tempora- No contexto ecofisiológico, é importante contras-
riamente) ou pela ativação da rota alternativa tar a importância da respiração com a da fotossín-
(cianeto-resistente), podendo, em longo prazo, haver tese pelas plantas. Um fator-chave para qualquer
queda no processo respiratório em função de meno- planta é a manutenção de sua taxa de crescimento.
res taxas de assimilação de carbono e no metabolis- A idéia de que essa taxa esteja diretamente relacio-
mo em geral, associados a um crescimento mais len- nada à taxa de fotossíntese é tentadora, mas há evi-
to dos organismos submetidos a tais condições (por dências de que isso não ocorre sempre e em todos os
exemplo, estresse salino, déficit hídrico e ataque de casos. É certo que parte do carbono assimilado é
patógenos, altas concentrações de COz)' transformado em carboidratos e irá servir como subs-

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