Paracoccidioidomicose (PCM) é micose sistêmica humana, cujo agente
etiológico é o Paracoccidioides brasiliensis fungo termodimórfico que promove uma doença inflamatória crônica granulomatosa. A PCM é endêmica na América Latina, tendo maior incidência no Brasil, e diagnosticada com maior frequência no Estado de São Paulo. A real incidência não é conhecida, porém, nas áreas endêmicas, acredita-se na ocorrência de 3 casos por 100 mil habitantes. A PCM infecção não privilegia gênero ou etnia; já a PCM doença afeta principalmente trabalhadores rurais adultos, do sexo masculino, em contato constante com a vegetação e solo, no período mais produtivo de suas vidas, o que implica em importante repercussão econômica para pacientes e dependentes. Trabalhadores rurais, geralmente, estão inseridos em estratos sociais de menor nível socioeconômico, têm higiene menos cuidadosa e apresentam maior grau de desnutrição. Além disso, tabagismo e consumo abusivo de álcool são hábitos comumente observados nesta população.Estes fatores são considerados condições de risco pré-existentes e exercem papel importante na transformação do estado de infecção para doença manifesta, uma vez que interferem nos mecanismos de defesa do hospedeiro com implicações na qualidade da formação do granuloma. Da mesma forma, observa-se em indivíduos imunossuprimidos pela infecção pelo HIV/Aids, ou iatrogenicamente, que o fungo adquire comportamento de agente oportunista, com evolução e aspectos clínicos distintos. Histórico
Há 100 anos, Adolpho Lutz , no Instituto Bacteriolígico de São Paulo,
descreveu pela primeira vez a paracoccidioidomicose (PCM), ao verificar em lesões bucais de dois pacientes a existência de fungos de natureza dimórfica distintas do Coccidioiddes immitis.
Em 1º de abril de 1908, o periódico Brazil-Médico publicava a primeira parte
dos resultados, fruto de minuciosos estudos iniciados em 1905 por Adolpho Lutz. No artigo "Uma mycose pseudococcidica localisada na bocca e observada no Brazil. Contribuição ao conhecimento das hyphoblastomicoses americanas", Lutz descreveu a paracoccidioidomicose como uma doença que se caracterizava por apresentar lesões muito graves, com presença de úlceras que tomavam conta da boca e destruíam a mucosa da gengiva e o véu palatino e dolorosa repercussão ganglionar, qualificando-a como micose pseudococcídica após identificar seu agente causal, bem como seu modo característico de reprodução. Ao verificar semelhanças morfológicas com micoses anteriormente descritas na Argentina e nos Estados Unidos, incluiu-a em um grupo por ele denominado e hifoblastomicoses americanas.
Após a descrição da doença, fatal na ocasião pela inexistência de terapia
específica, seguiu-se longo período de análise e estudo das lesões cutâneas e mucosas, freqüentemente relatadas pelos pacientes acometidos pela enfermidade, na tentativa de isolamento do agente causal. Em 1912, Alfonso Splendore classificou o agente etiológico da paracoccidioidomicose dentro do gênero Zymonema, propondo a denominação de Zymonema brasiliensis .
A classificação definitiva e consensualmente aceita foi feita por Floriano Paulo
de Almeida, graças a estudo comparativo realizado entre o granuloma coccidióico nos Estados Unidos e no Brasil, demonstrando que eram indiscutíveis e notáveis as diferenças entre ambas as patologias. Nesse estudo, confirmou os achados anteriormente descritos por Lutz estabelecendo, assim, as diferenças entre o agente etiológico da paracoccidioidomicose e o C. immitis, com o qual era freqüentemente confundido6. Em 1930, após diversos estudos, criou o gênero Paracoccidiodes dentro do reino Fungi, revalidando também a espécie brasiliensis, criada por Splendore.
Segundo Lacaz, com a observação e o relato de casos isolados da doença em
outros países da América do Sul, a mesma passou a ser chamada de blastomicose sul-americana, doença de Lutz, doença de Lutz-Splendore- Almeida, pois Splendore foi o primeiro a cultivar o patógeno e Almeida, o autor do primeiro estudo abrangente sobre a doença. Porém, a oficialização do termo paracoccidioidomicose foi estabelecida em 1971, em Medellín, Colômbia, durante reunião de micologistas do continente americano, sendo mundialmente aceita desde então. Etiologia
A paracoccidioidomicose (PCM) é causada por fungos termodimórficos de duas
principais espécies: Paracoccidoides brasiliensis (P. brasiliensis) e Paracoccidioides lutzii (P. lutzii). P. brasiliensis é composto por um complexo de pelo menos cinco agrupamentos geneticamente isolados, classificados como espécies filogenéticas: S1a, S1b, PS2, PS3 e PS4.2,3,4. As espécies filogenéticas S1a e S1b são predominantemente encontradas na América do Sul, especialmente no Sudeste e Sul do Brasil, na Argentina e no Paraguai. A espécie PS2 tem uma distribuição irregular, menos frequentemente identificada e, até agora, os casos humanos foram identificados na Venezuela e no Sudeste do Brasil.
As espécies de PS3 e PS4 são exclusivamente endêmicas da Colômbia e da
Venezuela, respectivamente. Por sua vez, P. lutzii abriga uma única espécie, predominantemente distribuída no Centro-Oeste e na Amazônia (Brasil e Equador). A incidência real de cada espécie filogenética e sua implicação na prática clínica é difícil de se estabelecer, devido à falta de estudos comparando as formas PCM e as manifestações clínicas com o perfil genético dessas entidades. A imunodifusão radial contra os exoantígenos comumente usados, contendo uma glicoproteína de 43-kDa (gp43), sugere que esses fungos apresentam uma grande variabilidade antigênica.9 De acordo com estudos filogenéticos, diferentes isolados de Paracoccidioides sp são distribuídos em diferentes genótipos, encontrados em várias áreas endêmicas de PCM na América Latina. Em particular, os da região central do Brasil (Mato Grosso e Rondônia) apresentam menor taxa de similaridade genética. Os isolados de P. lutzii apresentam alta variabilidade antigênica específica de espécies,já avaliada em estudos proteômicos.