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ECONOMIA NO SETOR

PÚBLICO
AULA 6

Profª Pollyanna Gondin


CONVERSA INICIAL

Nesta aula, você irá investigar como avançou o sistema tributário no


Brasil ao longo dos anos. Depois da implementação do novo sistema tributário
pela Constituição democrática de 1988, houve um aumento considerável nos
tributos, no Brasil. Apesar do crescimento da carga tributária a partir dos anos
1990 no Brasil, não foram observados aumentos dos gastos públicos, mas sua
redução. Podemos concluir que uma grande parte dos tributos não estão sendo
destinados aos serviços que o governo presta, mas ao pagamento dos
encargos financeiros da dívida pública, o que foi verificado na aula 5.
Primeiramente, você irá conhecer os antecedentes da reforma tributária
de 1966 e as consequências desse sistema tributário. Na sequência, irá
verificar o sistema tributário atual, adotado em 1988 pela Constituição Federal
(Brasil, 1988), bem como suas características. Depois, será avaliado o debate
conhecido no Brasil a respeito da necessidade da realização de uma reforma
tributária no país, com base nos ajustes realizados nos anos 2000, e
identificados os principais temas incluídos na agenda da reforma tributária. No
quarto tópico, será discutida a ideia de política de incentivos fiscais e seus
impactos sobre a economia. Por fim, investigaremos os programas de incentivo
fiscal cidadão, que buscam engajar os indivíduos na fiscalização do pagamento
de impostos por parte de empresas e pessoas.

TEMA 1 – O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO DESDE O SÉCULO XIX ATÉ


A REFORMA TRIBUTÁRIA DE 1966

O sistema tributário brasileiro inicialmente era centrado quase que


exclusivamente sobre os tributos do comércio exterior. No período imperial, a
principal fonte de arrecadação do governo eram os impostos sobre importação,
que representavam 70% da fonte de renda pública (Toni, 2008).
A Constituição brasileira de 1891 distribuiu os tributos entre as esferas
de governo (União e estados federados). A União ficou encarregada dos
tributos sobre importação, taxas de telégrafos e correios, saída e entrada de
navios nos portos brasileiros. Já os estados eram encarregados de recolher os
impostos sobre exportação, sobre imóveis urbanos e rurais, sobre transmissão
de propriedade e sobre profissões e indústrias (Toni, 2008).

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Nos anos 1930, os estados receberam autorização para elaborar tributos
sobre vendas. Os estados perderam a atribuição de impostos interestaduais
sobre exportações acima de 10%. Os municípios ganharam mais liberdade
também para elaborar novos impostos (Toni, 2008).
Uma alteração feita pela Constituição de 1937 no sistema tributário
brasileiro foi a retirada da alçada dos estados do imposto sobre propriedades
rurais. A Constituição de 1946 implementou mudanças substanciais sobre a
carga tributária, com expansão do número de tributos a nível municipal, como o
sobre profissões e indústria. Aumentou, também, a participação dos municípios
sobre o imposto de renda (15%) e sobre o consumo (10%) (Toni, 2008).
De acordo com Riani (2014), o sistema tributário orquestrado em 1966
buscava oferecer ao governo recursos suficientes para coordenar o processo
de expansão do produto nacional bruto. Para tanto, esse sistema teve como
características o aumento substancial da carga tributária e a priorização do
capital, que seria a fonte de investimentos para o país, em contraposição ao
interesse do trabalhador, que sofria com mais impostos.
Segundo Machado e Balthazar (2017, p. 233), a reforma tributária de
1966 “é considerada por muitos juristas a mais ampla e profunda reforma
tributária já realizada na história do constitucionalismo pátrio, descortinando um
sistema tributário moderno, enxuto e eficiente”.
Um dos aspectos mais notáveis do sistema tributário de 1966 foi a
expansão substancial do número de contribuintes ao imposto de renda, que até
então não assegurava uma arrecadação suficiente. Entre 1965 e 1969 o
número de pessoas que contribuíam com o imposto de renda passou de 400
mil para 1,5 milhão. O Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM) foi
alterado e passou a ser adotado sobre o valor adicionado na produção, sendo
que todas as mercadorias pagariam a mesma taxa. Até 1966 cada estado
cobrava taxas diferentes, que variavam de 1,25% a 10%, provocando
diferenças regionais consideráveis.
Um dos elementos mais criticados do sistema tributário de 1966 foi a
mudança da distribuição dos tributos entre as esferas do governo. Ocorreu uma
centralização dos recursos na esfera federal, o que expandiu a dependência de
transferência do nível federal para os níveis estaduais e municipais, reduzindo
a margem de atuação a nível regional e local (Riani, 2014).

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A Constituição que entrou em vigor em 1967 (Brasil, 1967) definiu os
tributos para cada nível governamental. Para o governo federal ficaram os
tributos sobre: i) importação; ii) exportação; iiii) propriedade territorial urbana;
iv) renda e proventos de naturezas variadas; v) produtos industrializados; vi)
operações de crédito, seguros, câmbio, valores imobiliários e títulos; vii)
serviços de comunicações e transportes; viii) lubrificantes e combustíveis; ix)
energia elétrica e x) minerais.
Aos estados foram destinados apenas os impostos sobre transmissão de
bens imóveis e sobre operações relativas à circulação de mercadorias. Já para
os municípios foram destinados somente os tributos sobre a propriedade
predial e territorial urbana (IPTU) e os serviços variados (ISS). Esses dados
evidenciam a centralização das fontes de receita na União (Riani, 2014, p.
191).
Uma consequência central do sistema tributário de 1966 foi a diminuição
da arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Esse
fenômeno foi consequência das crises pelas quais o Brasil passou desde os
anos 1980. Na década de 1980 o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF)
também teve sua participação reduzida no total de impostos, tendo
representado 5% do total da carga tributária em 1989, sendo que, antes de
1966, era o terceiro principal imposto do governo (Riani, 2014).

TEMA 2 – A CARGA TRIBUTÁRIA NO BRASIL A PARTIR DE 1988 E AS


CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

O sistema tributário brasileiro foi reformulado em 1988, após a


aprovação da nova Constituição. Buscou-se corrigir os problemas apontados
no sistema anterior, porém isso foi feito de modo restrito. Uma das prioridades
da reforma realizada em 1988 era buscar uma maior descentralização de
impostos entre os três níveis de governo (Brasil, 1988).
No contexto de mudança política, os estados e municípios se articularam
para aumentar sua participação na distribuição de recursos. A mudança foi
significativa, aumentando o número de tributos destinados a estados e
municípios, que passaram a ser oito, enquanto a União ficou com sete
impostos. Os tributos que ficaram a cargo da União foram: i) importação; ii)
exportação; iii) propriedade territorial rural; iv) renda e proventos de naturezas
variadas; v) produtos industrializados; vi) operações de crédito, seguros,

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câmbio, valores imobiliários e títulos e vii) grandes fortunas. A União ficou
encarregada também das seguintes contribuições sociais:

i) contribuições para o financiamento da seguridade social; ii)


contribuições para o Programa de Integração social e para o
Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público; iii)
contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas e iv)
contribuição sobre a folha de pagamento (empregado e empregador).
(Riani, 2014, p. 202)

Já os estados (incluindo o Distrito Federal) ficaram responsáveis por


recolher os seguintes tributos:

i) transmissão causa mortis e doação de bens ou direitos; ii) operação


sobre circulação de mercadorias e serviços, transportes
interestaduais e intermunicipais e de comunicação (ICMS); iii)
propriedade de veículos automotores (IPVA); iv) adicional do
pagamento à União sobre renda e outros proventos, incidindo sobre
ganhos, rendimentos de capital e lucros. (Riani, 2014, p. 203)

Os municípios recolheriam os seguintes impostos: i) propriedade


territorial e urbana (IPTU); ii) transmissão inter vivos, por ato oneroso de bens
imóveis e de direitos reais sobre imóveis; iii) vendas de combustíveis gasosos e
líquidos; iv) serviços de todas as naturezas (Riani, 2014, p. 203).
Os estados passaram a recolher o adicional do imposto de renda, além
de receberem os tributos únicos dentro do ICMS (que é o antigo ICM). Porém,
tiveram que conceder aos municípios os impostos sobre transmissão de bens
intervivos, que fazia parte do tributo sobre transmissão de bens (Riani, 2014).
O ICMS passou a ser variável, com alíquotas diferenciadas para
algumas regiões, sendo menores para Norte e Nordeste, com o objetivo de
reduzir as desigualdades regionais. Essa decisão aumentou a receita sobre o
ICMS para os estados mais pobres, reduzindo a concentração das receitas.
Após a mudança no sistema tributário em 1988, houve uma
descentralização dos impostos, sendo que a União diminuiu sua participação
na arrecadação total de 75% em 1988 para 67% em 1998.
Todavia, a partir de 1996, houve novamente um processo de
centralização de tributos a nível federal. Isso foi resultado de vários fenômenos,
entre eles o aumento das contribuições sociais, que são recolhidas pela União.
Outra causa foi a diminuição do recolhimento do ICMS pelos estados, devido à
isenção sobre produtos primários exportados. Ademais, houve aumento de
receitas federais que não são divididas com outros níveis de governo, como a
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que foi criada

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para financiar a saúde e extinta em 2007 e a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (Cofins) (Riani, 2014, p. 219).
Concluímos que, embora tenha havido um aumento da carga tributária
após 1988, este não foi consequência de mudanças nos tributos, sendo que
houve alterações na distribuição desses impostos entre os níveis de governo.
Ou seja, a reforma não alterou as características do sistema tributário e nem
promoveu sua simplificação, que seria necessária. Surge um debate sobre a
necessidade de uma nova reforma no sistema tributário vigente, que pudesse
combater a alta regressividade do sistema de tributação brasileiro, isto é, a
situação em que as pessoas de classes mais baixas pagam mais impostos em
proporção a sua renda do que as de classes mais altas.

TEMA 3 – O DEBATE SOBRE A REFORMA TRIBUTÁRIA NO BRASIL

A partir dos anos 1990 surge um debate, marcado pelo neoliberalismo,


sobre como deve ser um sistema tributário ideal. Nos países mais ricos, houve
uma preferência por impostos diretos, que incidem sobre a renda e a riqueza
dos indivíduos e rendas, que promovem menos distorções e uma equidade
maior na economia. Os tributos indiretos tendem a sobrecarregar mais as
classes mais baixas, pois não há distinção entre pessoas com mais ou menos
renda: todos pagam a mesma alíquota (Brami-Celentano; Carvalho, 2007).
Já para os países em desenvolvimento, o preceito neoliberal defendia
um sistema tributário baseado na neutralidade, ou seja, na composição de um
sistema não centrado em nenhum dos dois tipos de imposto, pois os indiretos
promovem concentração de renda e desigualdade social e os diretos reduzem
o incentivo à produção, por incidirem sobre o lucro (Brami-Celentano; Carvalho,
2007).
A partir dos anos 2000 as propostas de uma reforma tributária foram
baseadas na seguinte visão: focados em promover geração de tributos para
garantir a estabilidade de preços na economia, solucionar as disputas entre os
estados federados e reduzir a importância do imposto de renda (Brami-
Celentano; Carvalho, 2007).
O sistema tributário vigente no Brasil é regressivo, se concentrando
sobretudo nos impostos indiretos. Nos anos 2000, não houve muitas mudanças
em relação às propostas de reforma de governos de direita, mantendo a
regressividade do sistema. Para assegurar a progressividade do sistema, foram

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adotados “programas de transferência de renda, os quais são financiados
basicamente pela tributação indireta que afeta os mais pobres” (Brami-
Celentano; Carvalho, 2007, p. 47).
A reforma tributária realizada em 2003 não expandiu a equidade e a
justiça social do sistema e não tocou em dois pontos centrais, que são a
reforma do ICMS e do federalismo fiscal.
Não houve outro debate importante, que costuma emergir na agenda
dos governos mais à esquerda, como a tributação sobre grandes fortunas
(renda e patrimônio), a diminuição dos tributos sobre consumo de bens
essenciais à população e a redução dos impostos sobre a folha de pagamento
(salários). Desse modo, a reforma realizada por Lula reafirmou a ideia
neoliberal de neutralidade e não combateu a lógica de onerar as classes mais
baixas e as médias com tributação indireta e sobre salários (Brami-Celentano;
Carvalho, 2007).
Conforme indicam Machado e Balthazar (2017, p. 223), apesar da
utilização da expressão reforma tributária não ser nova, “a reforma tributária
tem sido frequentemente invocada e simbolizada como a solução de muitas
das mazelas da sociedade brasileira na atualidade”. Conforme Carvalho (2010
citado por Machado; Balthazar, 2017), o sistema tributário brasileiro não é
falho, pois o recolhimento de impostos ocorre corretamente e é eficiente, porém
isso não significa que ele esteja baseado nos princípios adequados.
Por outro lado, há analistas, como Bernard Appy, que defendem que o
sistema tributário precisa ser reformado de forma urgente, pois o sistema atual
impede o crescimento do produto interno bruto (PIB), por sua complexidade e
carga tributária elevada.
Rezende (2016, citado por Machado; Balthazar, 2017) também sustenta
a necessidade de uma reforma no sistema tributário nacional, que deveria ser
baseado nos seguintes princípios: a simplicidade, a flexibilidade e a eficiência.
Para o autor, além da arrecadação exagerada no Brasil, existem outras
fragilidades ainda mais graves no sistema, como o número excessivo de
impostos, a falta de transparência, a insegurança jurídica e o não respeito aos
direitos do contribuinte (Resende, 2016, citado por Machado; Balthazar, 2017).
Embora não haja um consenso sobre a necessidade ou não de uma
reforma ampla no sistema de tributação brasileiro, é unânime o pensamento de
que é preciso adequar alguns elementos desse sistema, a fim de auxiliar no

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processo de redução da desigualdade socioeconômica no Brasil (Machado;
Balthazar, 2017).
Machado e Balthazar (2017) pontuam que reformar representaria
reestruturar, demandando uma emenda constitucional para promover as
mudanças necessárias na tributação. Podemos destacar que “o problema mais
alardeado quando se fala em reforma fiscal no Brasil é, sem sombra de
dúvidas, o da tributação sobre os bens e serviços” (Machado; Balthazar, 2017,
p. 241).
De acordo com Machado e Balthazar (2017), há muitas alternativas para
a reforma do sistema tributário brasileiro, mas com pouca vontade política para
realizá-la. Uma das propostas mais discutidas na atualidade sobre a reforma
tributária é a apresenta pelo deputado Luís Carlos Hauly, que se baseia em um
parâmetro europeu, estabelecendo um tributo federal, outro sobre valor
agregado e um tributo seletivo por estado e, por fim, impostos municipais sobre
o patrimônio. Essa proposta afetaria os poderes do governo federal.
Sempre haverá grupos que irão ser prejudicados com a reforma. É
preciso pensar em um sistema tributário mais eficiente e igualitário, porém há
muitos interesses em jogo e normalmente os dos mais poderosos predominam.
Embora haja dificuldade em promover uma reforma profunda e ampla no
sistema de tributação, conforme Machado e Balthazar (2017, p. 244), é
imprescindível promover mudanças pontuais, como reduzir a regressividade do
sistema. Temos um dos sistemas tributários que mais penaliza os mais pobres
e privilegia os mais ricos. Esse é um ponto pouco tocado no debate, o do
aumento da progressividade, pois se fala muito de “redução do tamanho da
carga, e não da melhor distribuição entre as suas bases de incidência”
(Machado; Balthazar, 2017, p. 245). De acordo com esses autores, o Brasil “é o
paraíso fiscal dos super-ricos”, devido à “isenção de tributos sobre os lucros e
dividendos, concedida no ano 1995, durante o Governo do ex-Presidente
Fernando Henrique Cardoso” (Machado; Balthazar, 2017, p. 245).

TEMA 4 – POLÍTICA DE INCENTIVOS FISCAIS ÀS EMPRESAS

Uma das políticas mais adotadas como instrumento de estímulo à


indústria na economia é a de concessão de incentivos fiscais. Por meio da
isenção de impostos a empresas e indústrias o governo pode promover a
geração de renda e também de emprego. Contudo, para poder garantir esses

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incentivos, isto é, para que eles sejam autorizados, o Estado precisa provar
que essas isenções não irão afetar os recursos disponíveis para fornecer os
demais serviços à sociedade.
As políticas de incentivos fiscais “praticadas pelos Estados são uma
característica do sistema federativo, a qual tem como forma de organização
territorial de poder a dupla soberania, em um único Estado. Os incentivos
ocorrem independentemente da existência de mecanismos que presumem sua
regulamentação” (Goularti, 2014, p. 12).
Existe uma série de conceitos na lógica de incentivos fiscais, que são:
“isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira,
tributária e creditícia” (Silva, 2007, p. 126). Segundo Silva (2007, p. 126), o
primeiro deles e mais conhecido são as isenções, que são “estímulos
concedidos pelo governo com intuito de assegurar regularidade na cobrança
dos tributos e/ou viabilizar o desenvolvimento do setor econômico”.
Na primeira reforma tributária brasileira, em 1966, foram desenvolvidos
incentivos fiscais relacionados ao imposto de renda e ao imposto sobre
produtos industrializados, que eram bastante abrangentes. Para compensar
essa situação de excesso de incentivos fiscais, a partir da segunda reforma
tributária, em 1988, foram criadas contribuições como o Programa de
Integração Social (PIS), que é recolhido das empresas.
Em 1988, como visto nesta aula, o sistema tributário se tornou mais
descentralizado, aumentando a autonomia dos municípios e estados em
relação às políticas de incentivos fiscais. Isso gerou uma competição entre
estados para atrair empresas, que é a denominada guerra fiscal (Goularti,
2014).
Na década de 1990, com a política neoliberal e de abertura de mercado,
houve uma expansão das competições entre os estados para atrair empresas,
sobretudo multinacionais do mercado automobilístico, a exemplo de Peugeot,
Renault, Volkswagen e BMW (Goularti, 2014).
Em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Brasil, 2000) teve como um
de seus objetivos evitar a guerra fiscal entre as unidades da federação, que só
poderiam fazer incentivos, ou seja, abrir mão de parte da arrecadação, se
criassem mecanismos para compensar a perda da receita com esses impostos
isentos. Lembramos que uma política de incentivo fiscal é uma forma de
transferir receita do setor público para o privado e, por isso, deve ser

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compensada de alguma forma, para que o governo não se endivide para pagar
o incentivo. Contudo, a maioria dos estados não deu importância a essa
decisão, não estabelecendo compensação mediante aumento de alíquotas
(Goularti, 2014).
Assim, as políticas de incentivos fiscais, sobretudo as isenções, fazem
parte de todo regime federativo, assim como as guerras fiscais entre estados
federados, que servem, entre outros motivos, para aumentar a renda de certa
região, mediante atração de empresas ao território do estado (Goularti, 2014).

TEMA 5 – PROGRAMAS DE INCENTIVO À CIDADANIA FISCAL

Além do incentivo fiscal, no sentido de concessão de isenções e abonos


às empresas, existem programas que buscam engajar mais os contribuintes no
trato com os impostos e no controle sobre o pagamento de impostos, os
chamados programas de incentivo à cidadania fiscal. Esses programas de
incentivo à fiscalização por parte da população sustentam-se na ideia de “uma
resposta das autoridades fiscais a uma nova percepção dos contribuintes como
clientes que precisavam de serviços” (Mattos; Rocha; Toporcov, 2013, p. 100).
Dessa forma, o governo busca incorporar os contribuintes como
parceiros no momento de fiscalizar o pagamento de impostos e para controlar a
evasão fiscal, que é altíssima no Brasil. Para tanto, são fornecidos incentivos
financeiros, prêmios, bem como a realização de campanhas, demonstrando as
vantagens do pagamento dos impostos e evidenciando os malefícios do não
pagamento de tributos (Mattos; Rocha; Toporcov, 2013).
Para garantir mais transparência e menos evasão fiscal, em 2004 foi
implementada a nota fiscal eletrônica, com o objetivo de substituir as notas em
papel, que eram de difícil controle. A partir disso, o estado passou a controlar
mais o pagamento do ICMS e do IPI e reduzir a sonegação de impostos por
parte das empresas.
O programa de incentivo à cidadania fiscal pioneiro na concessão de
auxílios financeiros ao contribuinte, que passa a exigir a nota das empresas, foi
o Nota Paulista, implementado em 2006, o qual devolve 30% do ICMS pago ao
contribuinte que tiver identificado na nota seu CPF ou CNPJ.
Esse programa foi copiado e transferido para outros estados, a exemplo
do Paraná, onde se chama Nota Paraná e engaja o consumidor no controle
sobre a emissão de notas fiscais. No Distrito Federal esse programa foi

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adotado em 2008 e chama-se Nota Legal, enquanto no Tocantins chama-se Tô
Legal e foi iniciado em 2017. Os programas implementados depois foram
inspirados no primeiro, o Nota Paulista, com base em sua experiência bem-
sucedida.
O contribuinte concorre também a prêmios e sorteios em dinheiro, o que
é mais um incentivo ao controle por parte do cidadão. Assim, esse tipo de
programa “corresponde a um mecanismo de incentivo para que os
consumidores peçam ao estabelecimento comercial o documento fiscal no
momento em que realizam as compras” (Mattos; Rocha; Toporcov, 2013, p.
101).
O que podemos verificar com os programas já implementados até o
momento é que, à medida que o consumidor se sente beneficiado, ao receber
um valor financeiro de retorno do imposto e até prêmios, ele se engaja mais na
solicitação de notas, tornando o sistema tributário e de declaração de impostos
mais transparente e coibindo a evasão fiscal.

NA PRÁTICA

Leia o artigo a seguir, sobre os programas de incentivo fiscal cidadão,


que estuda de modo específico os efeitos do Nota Paulista. A partir da leitura,
você considera que esses tipos de programas, como o Nota Paraná, promovem
uma redução da sonegação fiscal? Você já participou de algum desses
programas?
MATTOS, E.; ROCHA, F.; TOPORCOV, P. Programas de incentivos fiscais são
eficazes? Evidência a partir da avaliação do impacto do programa Nota Fiscal
Paulista sobre a arrecadação de ICMS. RBE, Rio de Janeiro, v. 67, n. 1, p. 97-
120, jan./mar. 2013.

FINALIZANDO

Nesta aula você pôde conhecer a evolução do sistema tributário


brasileiro, desde as primeiras Constituições. Antes de 1966 não podemos dizer
que existia um sistema tributário consolidado, porque a carga tributária era
concentrada essencialmente nos impostos sobre o comércio exterior.
Na primeira parte da aula, estudamos os aspectos relacionados ao
sistema tributário antes de 1966 e após a reforma instituída pela Constituição

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de 1967 (Brasil, 1967). Esse novo sistema tributário buscou suprir o Estado de
mais recursos para o financiamento de suas atividades. Foi considerado
exitoso nesse objetivo, ao expandir a arrecadação e formular um sistema
tributário eficiente. Contudo, provocou a centralização da arrecadação a nível
federal.
Na segunda parte da aula analisamos as mudanças geradas pela
reforma tributária de 1988, que se concentraram em combater os erros do
sistema anterior. Foram reduzidos os impostos da União e distribuídos entre as
outras esferas de governo, o que contribuiu para uma maior descentralização
tributária. Verificou-se que a reforma de 1988 não expandiu o número de
impostos, mas também não contribuiu para simplificar o sistema ou torná-lo
menos regressivo.
No Tema 3 da aula foi discutido o debate atual sobre a necessidade de
uma nova reforma no sistema tributário. A reforma feita nos anos 2000 não
combateu os erros da carga tributária, mantendo a regressividade e onerando
os mais pobres. Os temas que continuam aparecendo de modo central no
debate pela reforma do sistema tributário são: a busca por uma maior
progressividade e a questão da tributação sobre bens e serviços. Verificamos
que, embora haja alternativas para a reforma sendo discutidas no Legislativo,
há baixa vontade política para realizá-la.
Na quarta seção foi investigada a política de incentivos fiscais
implementada pelos governos, especialmente a nível estadual, por meio da
adoção de isenções fiscais e subsídios com vistas a atrair empresas para suas
regiões. O principal impacto dessas iniciativas é a redução dos recursos do
governo, que poderiam ser usados para oferecer melhores serviços públicos.
Por fim, no Tema 5, apresentamos a discussão sobre os inovadores
programas de incentivo à cidadania fiscal, que buscam engajar o cidadão na
fiscalização do pagamento de impostos, com o objetivo de diminuir a evasão
fiscal. Pudemos verificar que a iniciativa pioneira foi a Nota Paulista, que, aos
poucos foi sendo copiada por outros estados e teve bons resultados, ao
devolver uma parte do imposto ao cidadão, fazendo-o concorrer a prêmios
quando inclui seu CPF nas notas fiscais.

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REFERÊNCIAS

BRAMI-CELENTANO, A.; CARVALHO, C. E. A reforma tributária do governo


Lula: continuidade e injustiça fiscal. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, n.
1, p. 44-53, jan./jun. 2007.

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953, 24 jan. 1967. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1960-1969/constituicao-1967-24-
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_____. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Diário Oficial da União, Brasília, seção 1, p. 1, 5 out. 1988. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1988/constituicao-1988-5-outubro-
1988-322142-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em: 25 jul. 2018.

_____. Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000. Diário Oficial da


União, Brasília, p. 1, 5 maio 2000. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp101.htm>. Acesso em: 25 jul.
2018.

GOULARTI, J. G. Incentivos fiscais, acumulação e desenvolvimento


desigual em Santa Catarina. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento
Regional) – Fundação Universidade Regional de Blumenau, Blumenau, 2014.

MACHADO, C.; BALTHAZAR, U. Reforma tributária como instrumento de


efetivação da justiça distributiva: uma abordagem histórica. Sequência,
Florianópolis, n. 77, p. 221-252, nov. 2017.

MATTOS, E.; ROCHA, F.; TOPORCOV, P. Programas de incentivos fiscais são


eficazes? Evidência a partir da avaliação do impacto do programa Nota Fiscal
Paulista sobre a arrecadação de ICMS. RBE, Rio de Janeiro, v. 67, n. 1, p. 97-
120, jan./mar. 2013.

RIANI, F. Economia do setor público: uma abordagem introdutória. Rio de


Janeiro: LTC, 2014.

SILVA, B. J. Economia do setor público. Palhoça: UnisulVirtual, 2007.

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TONI, J. de. Economia do setor público: texto de apoio. Maio 2009.
Disponível em: <https://jacksondetoni.files.wordpress.com/2012/04/detoni-
econ-set-publico-20083.pdf>. Acesso em: 31 jul. 2018.

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