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Unidade II

Unidade II
4 SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

Objetivos do módulo

Entende-se por sistema tributário o complexo orgânico


formado pelos tributos instituídos em um país ou região
autônoma e os princípios e normas que os regem.

5 Podemos concluir, então, que o Sistema Tributário Brasileiro


é composto dos tributos instituídos no Brasil, dos princípios
e das normas que regulam tais tributos. Entretanto, cabe
aqui contextualizarmos os principais conceitos do sistema
tributário que norteiam o Estado brasileiro e suas principais
10 características.

4.1 Os tributos no Brasil

O Sistema Tributário Brasileiro é composto pelos tributos


instituídos no Brasil, e pelos princípios e normas que regulam
tais tributos. No Brasil, adota-se o princípio da estruturalidade
orgânica do tributo, pelo qual a espécie tributária é determinada
15 pelo seu fato gerador.

Para estruturar este modelo, necessitamos entender a


distribuição da renda, como segue abaixo:
• funcional, que é a quantidade da renda privada que
assumirá a forma de salários, lucros, juros e aluguéis;
20 • pessoal, que é o percentual da renda (%Y) que ficará com
cada percentil da população;

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ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

• regional, que prioriza a forma como se distribuem os


recursos orçamentários entre as Unidades Federativas
(UF) e municípios;
• pública e privada, onde o Estado tributa o setor privado,
5 para definirmos qual parte será a pertencente ao
governo;
• federal, isto é, como e com qual grandeza a arrecadação
tributária será pactuada entre a União, os estados e os
municípios.

4.1.1 Dados históricos

10 O Plano de Metas, implantado a partir de 1957, representou


o primeiro grande esforço de planejamento pró-industrialização
do país. O plano priorizava o aprofundamento da estrutura
industrial e a construção da infraestrutura necessária para
tal objetivo. Ao Estado caberiam os investimentos no setor de
15 energia/transporte e em algumas atividades industriais básicas
como siderurgia e refino de petróleo, além dos incentivos aos
investimentos privados para a expansão e diversificação da
indústria de transformação, com ênfase nos setores produtores
de insumos básicos e de bens de capital.

20 Com tal processo de industrialização e ampliação de setores


fundamentais da economia brasileira como a agricultura e o
comércio, além da ampliação e ganho de importância do setor
de serviços, a economia interna foi sendo dinamizada e, junto
a ela, houve uma explosão demográfica nos centros industriais,
25 incrementando uma onda de novas necessidades sociais nas
áreas da educação, saúde, habitação e segurança. Simplificando,
o Estado teve a obrigação de expandir-se e aparelhar-se para
receber estas novas funções de cidadania.

Portanto, a reforma tributária nos anos 1960 buscava


30 aumentar a receita do Estado em face desta nova realidade,
e, diante de tal complexidade, solucionar o problema do

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déficit fiscal gerado por esta onda de crescimento que não


mostrava sinais de arrefecimento. Ainda que estivesse em
um plano inferior, tal reforma deveria, se a arrecadação
proporcionasse, possibilitar a continuidade de estímulo ao
5 crescimento econômico interno.

A reformulação do Sistema Tributário Brasileiro foi


estabelecida em cinco níveis, sendo quatro categorias de
impostos e um meio de receita extra:

• Tributação sobre o comércio exterior: a tributação


10 estadual passou para a esfera federal devido ao seu caráter
de política econômica (Macro).
• Tributação sobre o patrimônio e a renda: o somatório
do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) como
municipal,io Imposto de Transferência de Bens Imóveis
15 (ITBI) como estadual, o Imposto Territorial Rural (ITR) e o
Imposto de Renda (IR) como federais.
• Tributação sobre a produção e a circulação: além do
IPI e do ICMS, o Imposto sobre Serviço de Transportes
e Comunicação (ISTC) e o Imposto sobre Operações
20 Financeiras (IOF), ambos federais, e o Imposto sobre
Serviços (ISS), que é municipal, todos em substituição aos
impostos sobre indústrias e profissões.
• Impostos únicos: Imposto sobre Energia Elétrica (IUEE),
sobre combustíveis e lubrificantes (IUCL) e sobre minerais
25 (IUM), todos federais.
• Receitas extraorçamentárias: criação de fundos
para implantar ações pontuais, como as contribuições
do empregador para o FGTS e as contribuições para a
Previdência Social.

30 Impostos são tributos cobrados, cujo valor arrecadado não


tem um fim específico. São tributos cuja obrigação tem por
fato gerador uma situação independente de qualquer atividade

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estatal específica, relativa ao contribuinte. Os impostos se


caracterizam por serem de cobrança e não darem um retorno
ao contribuinte sobre o fato gerador. Por exemplo, um imposto
sobre posse de automóvel não necessariamente será revertido
5 em melhorias das condições das vias urbanas ou rodovias. Existe
uma distinção entre impostos indiretos e impostos diretos. Este
é pago diretamente pelo contribuinte (o Imposto de Renda, por
exemplo), enquanto aquele tem o preço embutido no valor da
transação. Um exemplo é o ICMS. Impostos indiretos também
10 não têm qualquer variação na renda do contribuinte.

Impostos gerais são aqueles que incidem amplamente sobre


determinado conjunto de transações. Especiais são impostos
cobrados sobre a compra e a venda de determinado bem ou
serviço. A estrutura da alíquota classifica os impostos gerais em
15 uniformes ou seletivos. Uniformes apresentam alíquotas únicas
e seletivos são aqueles que diferenciam a alíquota do imposto
conforme a natureza do produto. Os impostos especiais, por sua
natureza, são seletivos.

Taxas são tributos para manutenção do funcionamento


20 de um serviço dirigido a uma comunidade de indivíduos. As
taxas são tributos incidentes sobre um fato gerador e que são
aplicados em contrapartida a esse fato gerador. Uma taxa só
pode ser instituída por uma entidade tributante da mesma
competência. Por exemplo: taxas sobre iluminação pública só
25 podem ser cobradas pelos municípios. Não necessariamente
o pagante da taxa vai usar o serviço, apenas terá o serviço à
disposição.

Contribuições são tributos cujos recursos devem ser


legalmente destinados a finalidades preestabelecidas.

30 Contribuições de melhoria são tributos que têm


como fato gerador o benefício decorrente das obras
públicas. São cobradas somente na região beneficiada pela
obra. Não necessariamente essas contribuições refletem

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em “melhoria”, uma vez que algumas obras públicas em


determinadas regiões tendem a desvalorizar os imóveis
locais. O fundamental para o fato gerador é o benefício
decorrente da obra pública.

5 Contribuições especiais estão previstas nos artigos 149 e


149-A da Constituição Federal, sendo tributos cuja característica
principal é a finalidade para a qual é destinada sua arrecadação.
Podem ser: sociais, de intervenção no domínio econômico, de
interesse de categorias econômicas ou profissionais e para
10 Custeio do Serviço de Iluminação Pública (COSIP).

Empréstimo compulsório segundo o art. 148 da


Constituição Federal, a União poderá instituir, mediante lei
complementar, empréstimos compulsórios:

• para atender às despesas extraordinárias, decorrentes de


15 calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;
• no caso de investimento público de caráter urgente e de
relevante interesse nacional.

Uma crítica constante aos impostos “em cascata” ou


“cumulativos” são a consequente inibição à integração vertical da
20 produção e à perda de competitividade em termos internacionais.
Em face disto, grande importância tem sido dada ao Imposto
sobre o Valor Adicionado (IVA) em diversas economias do planeta.
Suas principais vantagens são a neutralidade e a dificuldade
de sonegação por concentrar a tributação no atacado, dentre
25 outras. Todavia, tal imposto permaneceria infringindo o conceito
da progressividade, como faz o atual ICMS.

Existem vários tipos de impostos sobre vendas de mercadoria


e serviços. Estes se diferenciam devido à amplitude de sua base,
ao estágio do processo de produção e comercialização onde
30 o tributo incide e à forma de apuração da base de cálculo do
imposto.

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O Imposto sobre Valor Agregado (IVA) tributa apenas o


valor adicionado em cada estágio da produção. Existe uma
equivalência entre o IVA e o Imposto sobre Vendas a Varejo
(IVV). Um imposto pode ser cobrado “por dentro” ou “por fora”.
5 O cálculo do imposto “por dentro” inclui o imposto na base
tributária do valor do mesmo, enquanto o cálculo “por fora”
exclui o imposto da fórmula.

IVA e IVV “por fora”


IVA IVV
Estágio 1
Valor adicionado pela firma A 100,00 100,00
Imposto recolhido por A 10,00 0,00
Preço de venda da firma A 110,00 100,00
Estágio 2
Valor adicionado pela firma B 50,00 50,00
Imposto recolhido por B 5,00 15,00
Preço de venda da firma B 165,00 165,00

Total de imposto recolhido 15,00 15,00

Fonte: Elaborado pelo autor (2009).

IVA e IVV “por dentro”


IVA IVV
Estágio 1
Valor adicionado pela firma A 100,00 100,00
Imposto recolhido por A 11,11 0,00
Preço de venda da firma A 111,11 100,00
Estágio 2
Valor adicionado pela firma B 50,00 50,00
Imposto recolhido por B 5,55 16,66
Preço de venda da firma B 166,66 166,66

Total de imposto recolhido 16,66 16,66

Fonte: Elaborado pelo autor (2009).

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4.2 Carga tributária brasileira

A carga tributária representa a soma de todos os impostos


cobrados pelas diferentes esferas públicas, municipal, estadual
e federal, sobre a renda nacional ou sobre o Produto Interno
Bruto (PIB).

5 Nos anos 1950, a carga tributária média era de


aproximadamente 18,7%; nos anos 1960, era 25%; e, nos anos
1980, era 26,5%. Já no período de 1990 em diante, a carga
tributária passou a subir para 29%, até alcançar, no ano de 2006,
o valor de 34,12% do PIB nacional.

Carga tributária no Brasil (% do PIB)


1971 25.2 1981 25.2 1991 24.4 2001
1972 25.9 1982 26.2 1992 25.0 2002
1973 25.6 1983 26.9 1993 25.3 2003
1974 25.1 1984 24.2 1994 27.9 2004
1975 25.2 1985 23.8 1995 28.0 2005
1976 25.1 1986 26.5 1996 28.6 2006
1977 25.6 1987 24.3 1997 28.9
1978 25.7 1988 23.4 1998 28.9
1979 24.7 1989 23.7 1999 29.5
1980 24.4 1990 29.6 2000 33.0
Fonte: Receita Federal e IBPT

Fonte: Receita Federal (2006).

10 Historicamente, o setor público brasileiro apresenta


necessidades de financiamento positivas (déficits nominais). O
setor público pode-se financiar (i) domesticamente, por meio
de dívida mobiliária, de dívida bancária ou da base monetária
(que é um passivo do Banco Central), entre outras formas; (ii)
15 externamente, via empréstimos; e (iii) pela redução de seus
ativos.

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Em 2006, até junho, fontes domésticas financiaram


integralmente as necessidades de financiamento do
setor público, havendo em contrapartida uma queda do
financiamento externo.

5 Composição da receita tributária (% PIB)

Discriminação da receita federal 1991 2006 Variação %


Imposto Importação 0,42 0,43 2,4
IPI 2,16 1,21 –44,0
IR 3,39 5,92 74,6
PF 0,16 0,37 131,3
PJ 0,84 2,42 188,1
Retido na fonte 2,39 3,13 31,0
Rendimento trabalho 1,53 1,69 10,5
Rendimento capital 0,55 0,92 67,3
Outros rendimentos 0,31 0,52 67,7
IPMF/CPMF 0 1,38 *
IOF 0,59 0,29 –50,8
COFINS 1,31 3,98 203,8
PIS/PASEP 1,06 1,05 –0,9
CSLL 0,28 1,21 332,1
CIDE – combustíveis 0 0,34 *
Outras receitas 0,86 1,09 26,7
Total de receitas administradas * 10,07 16,9 67,8
Receita INSS 4,59 5,32 15,9
ICMS Brasil 6,73 7,39 9,8

Fonte: Giambiagi, 2001.

4.3 Distribuição por nível de governo

Desde o final dos anos 1970 e início dos anos 1980 tem‑se
verificado no Brasil uma descentralização de recursos e de
poder. Este tópico focaliza a complexidade do sistema tributário,
da repartição de receita e da execução de gastos, objetivando
10 acomodar uma multiplicidade de demandas.

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As razões da descentralização decorrem de fatores:

• econômicos;
• culturais, políticos e institucionais;
• geográficos.

5 A receita do governo é objeto de várias discussões, tanto


na questão da carga tributária como em pontos da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF). A receita do governo está dividida
em Receita Tributária Bruta (RTB) e Receita Tributária Disponível
(RTD); para a União e as unidades federativas, a RTB é maior que
10 a RTD, e para os municípios, a RTB é menor que a RTD, devido a
receber repasses orçamentários das duas outras esferas.

No caso dos municípios, há uma questão bem particular, pois


na sua cesta de arrecadação, o IPTU responde por 25% de suas
receitas, sem as transferências federais e estaduais.

15 Os impostos que são federais (IR, IPI, importação e IOF), os


impostos estaduais (ICMS, IPVA, energia elétrica, entre outros)
e os impostos municipais (ISS e IPTU) perfazem a grande cesta
tributária brasileira. Do total arrecadado, estados, municípios e
União trocam repasses que são conhecidos tecnicamente como
20 Fundo de Participação Estadual (FPE) e Fundo de Participação
Municipal (FPM).

No que diz respeito à extrema centralização do sistema,


vale ressaltar a perda de autonomia dos estados e municípios,
não apenas no que diz respeito à queda do volume de recursos
25 transferidos pela União, mas também à imposição de vinculações
desses recursos e à interferência na geração e normatização dos
recursos próprios destes governos. O pequeno raio de manobra
quanto a ganhos de eficiência na arrecadação de tributos
próprios, assim como a pouca flexibilidade na formulação das
30 despesas trouxe grande dependência dessas unidades em
relação às transferências federais (Giambiagi, 2001).

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Principais impostos e participação por esferas de governo (%)


Esferas de Antes da Constituição de 1988 Depois da Constituição de 1988
governo Federal Estadual Municipal Federal Estadual Municipal
A. Federal
Imposto de 67 16 17 53 24,5 22,5
Renda
IPI 67 16 17 43 32 25
Imposto de 100 100
Importação
IOF 100 100
B. Estadual
ICMS 80 20 75
IUEE 30 50 20
IUCL 40 40 20
IUM 10 70 20
IUST 30 50 20
IUSC 100
IPVA 50 50 50 50
ITBI 50 50 100
IR Adicional 100
C. Municipal
ISS 100 100
IPTU 100 100

Fonte: Elaborado pelo autor (2009).

Na década de 1960, em plena ditadura militar, o governo


federal que já havia proposto uma reforma como mencionado
anteriormente no texto, ampliou ainda mais sua arrecadação
com o isolamento financeiro dos estados e municípios.

5 E este isolamento se deu pela redução dos repasses aos


fundos estaduais e municipais. Entretanto, no final de os
anos 1970, os repasses voltaram a ser ampliados de 6% para
9% por conta da crise internacional e da asfixia dos estados
e municípios, chegando em 1983 a 13,5% e, finalmente, em
10 1985 aos 16%.

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A perda de recursos disponíveis da União, decorrente da


expansão das transferências, bem como da eliminação de
cinco impostos, cujas bases foram incorporadas à do ICM
dando origem ao ICMS, requereria ajustes, o mais óbvio dos
5 quais – e compatível com o objetivo de fortalecer a Federação
– era a descentralização de encargos. A Constituição de 1988,
entretanto, não previu os meios legais e financeiros, para que
se desenvolvesse um processo ordenado de descentralização de
encargos. Além disso, a seguridade social e a educação, áreas
10 de atuação governamental onde há maior volume de atividades
descentralizáveis, foram contempladas com garantia de
disponibilidade de recursos no nível federal (Giambiagi, 2001).

4.4 Problemas e desafios do modelo brasileiro

O nível de taxação no Brasil é alto e representa um ônus


para um país de renda média. Em comparação com países
15 desenvolvidos, a carga tributária brasileira em percentual do
PIB estaria em um nível intermediário. Já em relação a países
subdesenvolvidos, o Brasil está entre os que têm maior carga
tributária, sendo expressivamente superior aos demais países da
América Latina.

20 No sentido de progressividade, seria suposto que a carga


tributária fosse maior em países de renda mais alta e vice‑versa.
Desta forma, considerando a renda per capita brasileira, a pressão
tributária é enorme.

O problema no Brasil não é a questão de sua carga tributária


25 ser elevada (34,1% em 2006), mas sim o não retorno dessa
cobrança nas formas de bons sistemas de saúde, educação,
segurança, entre outros, pois, na Suécia, conforme Giambiagi
(2001), a carga tributária chega a 51,4% do PIB, entretanto, esse
país consegue levar para a população os benefícios econômicos
30 e sociais que justificam esse percentual cobrado.

Ao olhar os casos internacionais, percebe-se que há


sistemas tributários cuja maior base de arrecadação é a renda,

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ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

como nos EUA e no Japão. Sendo assim, temos que olhar três
pontos no sistema tributário para verificar a sua eficiência:

• taxação sobre a produção, a circulação e a renda;


• baixa equidade com a cobrança de impostos regressivos;
5 • competitividade.

Competitividade

No Brasil existe grande presença de tributos cumulativos


não passíveis de desoneração plena. Portanto, os preços
ficam inchados. As elevadas contribuições sobre folha salarial
10 aumentam o custo para as empresas, e mesmo o IPI e o ICMS,
que incidem sobre o valor agregado, possuem problemas devido
à enorme complexidade da legislação atual.

Exemplos: IPMF/CPMF, IOF, COFINS, PIS/PASEP, CSLL, INSS,


ISS.

15 Todavia, a União tem demonstrado preferência por tributos


de fácil arrecadação e não sujeitos à partilha, contrariamente a
muitos países nos quais os impostos são cobrados sobre o valor
agregado.

Portanto, os produtos brasileiros perdem competitividade


20 tanto no mercado externo como interno. Internamente,
os produtos tornam-se caros frente aos importados. E no
mercado externo, o mesmo produto enfrenta a concorrência de
produtos sem essa carga tributária. Essa figura contrasta com as
necessidades impostas pela abertura econômica.

Observação: o problema foi a falta de articulação entre


os recursos arrecadados e as despesas com os encargos,
resultando na deterioração da tributação, bem como dos
serviços públicos.

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Unidade II

Reforma

A reforma tributária que consiste em modificar o sistema


tributário existente sempre deve ter um objetivo de melhoria,
seja para aumentar a carga tributária para prestar serviços
5 melhores, seja para melhorar a qualidade da tributação.

Como visto no item anterior, a carga tributária no Brasil


é bastante alta, o que deve retirar da pauta a elevação
da carga existente. Segundo Giambiagi e Além (2001), a
reforma, então, deveria se pautar pela melhoria da qualidade
10 do sistema atual, o que pode ser entendido como a busca
de melhorar a equidade, a progressividade, a neutralidade
e a simplicidade.

Sendo assim, o objetivo seria corrigir os problemas do


sistema atual, citados no item anterior, sendo que para fazer
15 isso a proposta deve buscar:

• adaptar-se às tendências tributárias internacionais;


• simplificar o sistema de impostos, substituindo a variedade
de bases tributárias por um número reduzido de tributos
e reduzindo custos de administração;
20 • aumentar a participação dos impostos sobre a renda
e sobre a riqueza no Brasil, para trazer maior equidade
e progressividade, em detrimento dos tributos de má
qualidade, como os sobre consumo que não trazem
equidade e são regressivos;
25 • minimizar os efeitos sobre a competitividade dos
produtos nacionais, inserindo maior neutralidade ao
sistema; devem ser eliminados dos impostos de natureza
cumulativa (incidentes sobre faturamento, receita e
movimentações financeiras); pode ser introduzido o
30 IVA (Imposto sobre Valor Agregado), em substituição
aos impostos cumulativos sobre transações;

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ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

• eliminar todo o ônus tributário que afete a competitividade


dos produtos nacionais no mercado internacional (as
exportações);
• seguir a tendência internacional de redução das
5 contribuições incidentes sobre salário;
• reduzir a autonomia dos estados e municípios para legislar
em matéria tributária;
• promover harmonização fiscal;
• partilhar as competências entre os componentes da
10 federação.

Não devemos, porém, pensar em revoluções tributárias


como o imposto único, pois geraria descontinuidade e
resultaria em mudanças abruptas em todos os preços
relativos da economia, causando uma séria desorganização
15 social.

Há grande repercussão na mídia pelo fato de existirem


mais de 80 impostos no Brasil. Entretanto, a discussão sobre
essa quantidade exagerada de impostos não é tão pertinente
e importante, pois ela deve-se ao fato de poucos tributos,
20 dez aproximadamente, representarem a maior parte da
arrecadação.

Os demais não têm participação relevante na carga de


tributos, e suas contribuições e taxas são baseadas no princípio
dos benefícios, que não atinge o grosso da população. Ponto de reflexão

Você é capaz de dimensionar a


25 Exemplos: ITR, Fundo da Marinha Mercante, taxa de importância do ICMS nas contas
expedição de passaportes públicas do Brasil?

4.5 Resumo

Este módulo recuperou o conceito do Sistema Tributário


Brasileiro, que é composto pelos tributos instituídos no Brasil,

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Unidade II

e pelos princípios e normas que regulam tais tributos. Falamos


também que a carga tributária representa a soma de todos os
impostos cobrados pelas diferentes esferas públicas, municipal,
estadual e federal, sobre a renda nacional ou sobre o Produto
5 Interno Bruto (PIB).

Lembramos que desde o final dos anos 1970 e início dos


anos 1980 tem-se verificado no Brasil uma descentralização de
recursos e de poder, e que o problema no Brasil não é a questão
de sua carga tributária ser elevada (34,1% em 2006), mas sim
10 o não retorno dessa cobrança nas formas de bons sistemas de
saúde, educação, segurança, entre outros.

5 SISTEMA FEDERATIVO E A DESCENTRALIZAÇÃO


DO ESTADO BRASILEIRO

Objetivos do módulo

Atribui-se o nome de “federação” a um Estado composto


por diversas entidades territoriais autônomas dotadas de
15 governo próprio, geralmente conhecidas por “estados”.
Como regra geral, os estados (“estados federados”) que se
unem para constituir a federação (o “Estado federal”) são
autônomos, isto é, possuem um conjunto de competências
ou prerrogativas garantidas pela Constituição, que não
20 podem ser abolidas ou alteradas de modo unilateral pelo
governo central.

Entretanto, apenas o Estado federal é considerado soberano,


inclusive para fins de direito internacional. Normalmente,
apenas estes possuem personalidade internacional; os estados
25 federados são reconhecidos pelo direito internacional apenas
na medida em que o respectivo Estado federal os autorizar. O
sistema político pelo qual vários estados se reúnem para formar
um Estado federal, cada um conservando sua autonomia,
chama-se federalismo.

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ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

5.1 Conceituando a federação

Dá-se o nome de “federação” a um Estado composto por


diversas entidades territoriais autônomas dotadas de governo
próprio, geralmente conhecidas como “estados”. Como regra geral,
os estados (“estados federados”) que se unem para constituir a
5 federação (o “Estado federal”) são autônomos, isto é, possuem
um conjunto de competências ou prerrogativas garantidas pela
Constituição que não podem ser abolidas ou alteradas de modo
unilateral pelo governo central.

Entretanto, apenas o Estado federal é considerado soberano,


10 inclusive para fins de direito internacional. Normalmente,
apenas estes possuem personalidade internacional; os estados
federados são reconhecidos pelo direito internacional apenas na
medida em que o respectivo Estado federal os autorizar.

O sistema político pelo qual vários estados se reúnem para


15 formar um Estado federal, cada um conservando sua autonomia,
chama-se federalismo.

O federalismo (do latim: foedus, foedera, “aliança”, “pacto”,


“contrato”) é a forma de governo que consiste na reunião de
vários estados num só, cada qual com certa independência e
20 autonomia interna, mas obedecendo todos a uma constituição
única.

Países federados do mapa mundi

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Unidade II

São exemplos de Estados federais: a Alemanha, a


Austrália, o Brasil, o Canadá, os Emirados Árabes Unidos, a
Índia, a Malásia, o México, a Nigéria, a Rússia, a Suíça e os
Estados Unidos.

5 Quanto à forma de Estado, as federações contrapõem-se aos


Estados unitários e distinguem-se também das confederações.
Existe um certo contraponto entre o sistema de federação e o de
confederação. Numa confederação, os estados têm soberania,
ou seja, autonomia para sair ou não, quando quiserem, da
10 confederação. De forma diversa, numa federação, a distribuição
de poderes e encargos é realizada, mas não é possível a separação
de nenhum estado federado.

A divisão de poderes segue uma tripartição elaborada na


França, colocada em prática pela primeira vez durante a Revolução
15 Francesa. São as funções destes: legislar (Poder Legislativo),
administrar (Poder Executivo), e garantir o cumprimento das
leis (Poder Judiciário), além de garantir uma fiscalização efetiva
entre eles, evitando que desandem ou que abusem da autoridade
(teoria dos freios e contrapesos).

5.2 Estrutura federalista

20 A configuração do sistema financeiro-tributário é parte da


definição essencial do pacto federativo. É, também, instrumento
da política econômica que, direcionado para o estabelecimento
da divisão espacial do poder onde as forças políticas são
tangenciadas por condicionamentos impostos pelo contexto
25 histórico-institucional, compromete-se com determinados
objetivos públicos.

O federalismo fiscal constitui a forma pela qual a economia


do setor público é repartida nas diversas esferas federadas de
competência, espelhando, de um ponto de vista substantivo,
30 compromissos e objetivos assumidos pelo Estado com
determinadas forças sociais, políticas e econômicas.

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ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

5.2.1 O poder e a política

De acordo com a Constituição de 1988, o Brasil é uma


república federativa presidencialista, inspirada na forma de
Estado norte-americano, diferindo no sistema legal, no qual
segue a tradição romano-germânica.

5 Também o federalismo no Brasil não é exatamente igual ao


federalismo estadunidense. O Poder Executivo é exercido pelo
presidente, que acumula as funções de chefe de Estado e chefe
de governo, eleito quadrienalmente. Concomitantemente às
eleições presidenciais, vota-se para o Congresso Nacional, sede
10 do Poder Legislativo, dividido em duas casas parlamentares: a
Câmara dos Deputados, que têm mandato de quatro anos, e o
Senado Federal, cujos membros possuem mandatos de oito anos
e elegem-se em um terço e dois terços, alternadamente, a cada
quatro anos.

15 Embora o peso de cada voto individual seja o mesmo


no sufrágio para o Poder Executivo, o mesmo não ocorre
com o Poder Legislativo. Por um lado, há três senadores
representando cada unidade da federação (atualmente 26).
Por outro, a se considerar o modelo federativo clássico, a
20 representação do povo pelos deputados deveria ser consoante
à população de cada unidade da federação; seu número é,
entretanto, limitado a no mínimo oito e no máximo setenta.
De qualquer forma, adota-se o sistema majoritário para a
eleição dos senadores e o proporcional para os deputados.

25 Finalmente, há o Poder Judiciário, cuja instância


máxima é o Supremo Tribunal Federal, responsável por
zelar e “guardar” a Carta Magna da nação. Composto de
onze ministros indicados pelo presidente, sob aprovação
do Senado, dentre indivíduos de renomado saber jurídico.
30 Sabe-se, no entanto, que a composição dos ministros do
Supremo Tribunal Federal não é completamente renovada
a cada mandato presidencial, pois o presidente somente

65
Unidade II

indica um novo ministro quando um deles se aposenta ou


vem a falecer.

Há ainda o Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior


do Trabalho, Tribunal Superior Eleitoral e o Superior Tribunal
5 Militar. Todos julgam em última instância as matérias de suas
competências.

5.3 A descentralização de fato

Com a promulgação da Constituição de 1988 houve uma


expressiva descentralização na distribuição dos recursos
tributários e do poder político no Brasil, como já demonstramos
10 no módulo anterior. A Constituição resultou do compromisso
com a institucionalização de valores democráticos, em que a
descentralização assumiu papel relevante. No entanto, após
a promulgação da Constituição, o papel do Estado como
provedor de políticas econômicas e sociais passa por diversas
15 reformulações, ao mesmo tempo em que se enfatiza a
importância dos mecanismos de mercado.

Completando esse ciclo “liberal” de transformações, reformas


econômicas, especialmente as voltadas para o controle da
inflação, reduziram a ação do governo federal na provisão de
20 infraestrutura e de serviços públicos locais e regionais.

Na esfera federal, os resultados da descentralização são


bastante visíveis:

• a União tem sido particularmente afetada por dificuldades


financeiras e tem encontrado obstáculos, embora não
25 intransponíveis, para a montagem e sustentação de
coalizões parlamentares que lhe permitam governar;

• na esfera subnacional, todavia, os resultados da


descentralização apresentam alto grau de heterogeneidade
devido às desigualdades regionais existentes no país.

66
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

Os efeitos da descentralização sobre o federalismo e sobre


a formulação e implementação de políticas públicas no Brasil,
especialmente a relação entre o governo federal e os estados,
expõem questões de desigualdade regional, que introduzem
5 novas tensões no arranjo federativo desenhado pela Constituição
de 1988 e pactuado no processo de democratização.

Argumenta-se que a experiência brasileira de descentralização


tributária e política tem favorecido a consolidação da democracia
e tornado o Brasil um país mais “federal” pela emergência de
10 novos atores no cenário político e pela existência de vários
centros de poder soberanos que competem entre si.

Governadores dos estados economicamente mais fortes e


prefeitos das capitais transformaram-se em um dos principais
centros de poder, forçando o governo federal a negociar políticas
15 públicas nacionais com as esferas estaduais.

Por outro lado, a experiência brasileira tem mostrado não


só os limites da descentralização e do federalismo em países
onde as disparidades regionais e sociais são muito profundas,
mas também que a descentralização dificulta a redução das
20 referidas desigualdades regionais pelo enfraquecimento político
e financeiro do governo federal, o que coloca novos desafios e
tensões para o enfrentamento de velhos problemas, como o das
disparidades regionais.

Não existe um modelo ideal para a descentralização, pois


25 cada país possui características diferentes. Contudo, existem
dois modelos básicos que veremos mais adiante. Veremos antes
os motivos para ser feita uma descentralização em um país.

Razões para a descentralização

Giambiagi e Além (2001) classificam três fatores como


30 motivos da descentralização: (1) fatores econômicos, (2) fatores
culturais, políticos e institucionais e (3) fatores geográficos.

67
Unidade II

Fatores econômicos

A descentralização por fatores econômicos refere-se à busca


da alocação de recursos mais eficientes e significa determinar
qual das esferas do governo (federal, estadual ou municipal)
5 pode administrar de forma mais eficiente os impostos, os
gastos, as transferências, a regulação e outras funções públicas.
Definem-se quais bens e serviços públicos devem ser fornecidos
de forma centralizada (União) e quais devem ser fornecidos de
forma descentralizada (estados e municípios).

10 Os defensores da descentralização afirmam que o governo


central deve ficar com as responsabilidades de fornecer os bens
públicos nacionais, aqueles cujos benefícios atinjam ao país
como um todo, ou que a produção esteja sujeita a importantes
economias de escala, como segurança nacional e infraestrutura
15 de transportes. Nesse caso, os recursos devem ser obtidos
nacionalmente.

Já as esferas subnacionais devem ser responsáveis pelos


bens e serviços públicos cujos benefícios são limitados
geograficamente, isto é, beneficiam principalmente a população
20 local. São exemplos: iluminação pública, corpo de bombeiros,
administração e controle do trânsito, manutenção de parques
etc. Nesse caso, é desejável que os recursos sejam obtidos pelas
esferas locais.

Contudo, caso houvesse superposição de responsabilidades


25 entre as esferas governamentais, como na saúde e educação,
o financiamento dos recursos deveria ocorrer por meio de
transferências do governo central.

Fatores culturais, políticos e institucionais

Em relação aos fatores culturais, políticos e institucionais,


30 a maior autonomia dos governos subnacionais levaria a uma
maior participação política da população local e desconcentraria

68
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

o poder político no governo central. Dessa forma, busca-se


fortalecer a governabilidade e as instituições democráticas,
com envolvimento dos cidadãos na determinação dos rumos da
comunidade.

5 Isso reduz os perigos que os excessos de centralização do


poder podem trazer às liberdades individuais, como demonstra
a experiência internacional. Em muitos casos, a descentralização
surgiu em contraposição à excessiva centralização como nos
casos de ditadura.

10 Fatores geográficos

No que diz respeito aos fatores geográficos, quanto maior for


a área territorial da nação, os ganhos de eficiência promovidos
pela descentralização tenderão a ser maiores. Desse ponto de
vista, certamente é mais fácil governar o Uruguai do que o Brasil,
15 pois aquele possui um território muito menor do que o brasileiro.
Para o Brasil, a administração dos recursos será mais eficiente
com uma descentralização maior que a do Uruguai. Para grandes
territórios, é mais fácil de os governos subnacionais atenderem
às demandas locais do que para um governo centralizado.

5.3.1 Modelos de descentralização

20 Existem dois modelos para a condução de descentralização:


(1) o do principal agente e (2) o da eleição pública local. Contudo,
o mais comum é encontrar modelos híbridos, os quais conciliam
os interesses de cada nação.

Modelo do principal agente

25 Nesse modelo existe uma espécie de contrato entre os


governos central e subnacionais, ficando a cargo do governo
central estabelecer as responsabilidades de cada unidade
subnacional. Por sua vez, estes governos recebem as transferências
do governo central e têm que prestar contas ao mesmo. Neste

69
Unidade II

caso específico surge um problema, pois este sistema provoca a


falta de autonomia dos governos locais.

Modelo da eleição pública

Este modelo enfatiza o processo de decisão por parte dos


5 cidadãos, por meio da eleição dos governos locais. Pressupõe
maior autonomia dos governos subnacionais que devem
financiar a maior parte de suas despesas com recursos próprios,
gerados pelos tributos locais. A responsabilidade fiscal dos
governos subnacionais é reforçada pela avaliação da população
10 que premiará ou castigará o governante por meio do voto nas
eleições.

O problema desse sistema é que ele pode prejudicar a


execução de alguns objetivos nacionais, como, por exemplo, o
tratamento de doenças especializadas como do coração, para
15 o qual os governos locais (municipais) não possuem recursos
suficientes para realizá-lo.

No caso brasileiro, portanto, concluímos que usamos uma


combinação desses dois modelos, pois os governos estaduais e
municipais recebem as transferências da União, como já vimos
20 antes, e também porque usamos a eleição para eleger o Poder
Público local.

5.3.1.1 Caso brasileiro

Desde a descoberta do Brasil, a evolução política brasileira foi


marcada por movimentos de centralização e descentralização.
As próprias capitanias hereditárias foram uma forma de
25 descentralização.

Nossa descentralização, iniciada nos anos 1970, foi marcada


pela motivação política de forma a redemocratizar o país em
reação ao antigo governo militar. Não houve uma motivação
para criar-se um plano nacional de descentralização, o que

70
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

resultou em um processo marcado pela desordenação, por


distorções e conflitos.

O principal aspecto da descentralização no Brasil foi a


tendência municipalista, na qual esses membros da federação
5 foram postos em condições de igualdade com estados em termos
de direitos e deveres. Tal fenômeno foi realçado pela dimensão
territorial do Brasil.

Tal processo nos levou a duas tendências opostas, que


precisaram e ainda precisam ser conciliadas:

10 • desejo de integração nacional;


• tendências regionalistas que precisam ser reconhecidas,
embora ainda subordinadas ao Governo Federal.

Tal conciliação não impede a existência de conflitos entre o


Governo Federal e os governos subnacionais, além dos conflitos
15 entre as regiões Sul e Norte do país. Mas apesar desses conflitos,
a unidade nacional tem persistido por três fatores: a existência de
uma língua comum; a ausência de divisões de fundos religiosos
ou étnicos; e a inexistência de movimentos separatistas que
tenham perdurado.

20 Vejamos, então, como a Federação Brasileira é constituída:



Ponto de reflexão
Federação Brasileira
(1) Distrito Federal Apesar das considerações sobre o
tema neste módulo, você seria capaz de
(26) estados
argumentar contra a descentralização.
(5.564) municípios Em qualquer resposta, positiva ou
negativa, justifique sua posição.
5.4 Resumo

Você ficou sabendo que o sistema político pelo qual vários


estados se reúnem para formar um Estado federal, cada um
conservando sua autonomia, chama-se federalismo. E que o

71
Unidade II

federalismo fiscal constitui a forma pela qual a economia do


setor público é repartida nas diversas esferas federadas de
competência, espelhando, de um ponto de vista substantivo,
compromissos e objetivos assumidos pelo Estado com
5 determinadas forças sociais, políticas e econômicas. Giambiagi
e Além (2001)classificam três fatores como motivos da
descentralização: os fatores econômicos; os fatores culturais,
políticos e institucionais; e por fim os fatores geográficos.

Soube também que os efeitos da descentralização sobre o


10 federalismo e sobre a formulação e implementação de políticas
públicas no Brasil, especialmente a relação entre o governo federal
e os estados, expõem questões de desigualdade regional, que
introduzem novas tensões no arranjo federativo desenhado pela
Constituição de 1988 e pactuado no processo de democratização.
15
GASTO PÚBLICO E FALHAS DO GOVERNO

6 SEGURIDADE SOCIAL

Objetivos do módulo

Neste módulo, exploraremos os conceitos da Seguridade Social,


em que a Previdência Social (no Brasil) consiste num conjunto de
políticas sociais, cujo fim é amparar e assistir o cidadão e a sua
família em situações como a velhice, a doença e o desemprego.

Já a Previdência Social, é uma política pública integrante


da seguridade social e, portanto, não deve ser entendida como
Seguridade Social. Segundo a legislação brasileira, Seguridade
é muito mais do que a palavra expressa, é o conjunto de ações
envolvendo não só a Previdência, mas também a saúde pública
e a própria assistência social.

No entanto, é bom que você saiba que a previdência é um


seguro social mediante contribuições previdenciárias, utilizada
para substituir a renda do trabalhador quando o mesmo tenha
efetiva perda de sua capacidade de trabalho.

72
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

6.1 Seguridade Social

A Previdência Social (no Brasil) consiste num conjunto de


políticas sociais cujo fim é amparar e assistir o cidadão e a sua
família em situações como a velhice, a doença e o desemprego.
5
Segundo a Constituição de 1988, artigo 194, a Seguridade Social:

Compreende um conjunto integrado de ações de


iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade,
destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde
10 pública, à previdência e à assistência social.

A contribuição é efetuada via recolhimento compulsório


(obrigatório, forçado). O governo adota este tipo de
contribuição a fim de tentar amenizar as ocorrências dos
problemas citados abaixo:

15 • alguns indivíduos poderiam não contribuir para a


previdência, preferindo consumir ao longo de seu ciclo de
vida uma parcela maior de seus recursos;

• dadas as incertezas ao longo da vida, as pessoas


poderiam ser levadas a avaliar de maneira incorreta suas
20 necessidades na velhice, subpoupando durante sua vida
ativa os recursos empregados em seu sustento quando
não estiverem mais trabalhando.

A Previdência Social é uma política pública integrante da


Seguridade Social e, portanto, não deve ser referida como
25 Seguridade Social, pois segundo a legislação brasileira, Seguridade
seria o conjunto de ações envolvendo não só a Previdência, mas
também a saúde pública e a assistência social.

A previdência é seguro social, mediante contribuições


previdenciárias, e serve para substituir a renda do trabalhador,
quando da perda de sua capacidade de trabalho.

73
Unidade II

A importância da Previdência Social em três notas:

1. Social: proteção e dignidade, com redução da pobreza.

2. Econômica: em mais de 67% dos municípios brasileiros


os recursos pagos pela previdência são maiores do que os do
5 fundo de participação dos municípios.

3. Política: paz social.

A Previdência é originalmente uma competência do Poder


10 Público, mas também é comumente oferecida por iniciativa
de organizações não governamentais (Ongs) e organizações
religiosas. Muitas entidades privadas, particularmente,
instituições financeiras, também oferecem planos de previdência
complementar, também chamada de previdência privada.

15 No Brasil, a Previdência Social é administrada pelo Ministério


da Previdência Social, e as políticas referentes a esta área
são executadas pela autarquia federal denominada Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS). Todos os trabalhadores
formais recolhem, diretamente ou por meio de seu empregador,
contribuições previdenciárias para o fundo de previdência.
20
No caso dos funcionários públicos brasileiros é devido abono
de permanência àqueles que, apesar de já reunirem todos os
requisitos para a aposentadoria, optaram por continuar em
atividade. O artigo 201 da Constituição Federal Brasileira prevê
o Regime Geral da Previdência Social.

Os benefícios são em caso de aposentadoria:


25
• por invalidez;
• por idade;
• especial;
• por tempo de contribuição;

74
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

• em caso de auxílio;
• auxílio doença;
• auxílio acidente;
• auxílio reclusão;
5 • salário-maternidade;
• salário-família;
• pensão por morte.

RPPS - Regimes Próprios de Previdência dos Servidores


Funcionários públicos Militares federais
estatutários Obrigatório, público, nível
Obrigatório, público, níveis federal, estadual e municipal,
federal, estadual e municipal, benefício definido = última
benefício definido. remuneração
Administrado pelos Administrado pelo governo
respectivos governos federal
Repartição simples/Capitalização
em alguns estados e municípios

RGPS - Regime Geral de


Previdência Social

Trabalhadores do setor privado


e funcionários públicos celestiais
Obrigatório, nacional, público,
subsídios sociais, benefício definido:
teto de R$ 3.038,99

Administrado pelo INSS

Repartição simples

75
Unidade II

Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico


e trabalhador avulso, para pagamento de remuneração a partir de 1º de
março de 2008
Aliquota para fins de recolhimento
Salário de contribuição (R$) ao INSS (%)
até R$ 911,70 8,00
de R$ 911,71 a R$ 1.519,50 9,00
de R$ 1.519,50 a R$ 3.038,99 11.00
Portaria nº 77 de 12 de março de 2008.
Fonte: Ministério da Previdência Social (2008).

6.1.1 Programas sociais

Saúde pública: é caracterizado pelas ações cujo foco é


o bem-estar físico e mental dos indivíduos. Ações que visem
a reduzir os riscos de doenças e seus agravamentos. A relação
entre os pagamentos feitos e os serviços utilizados não é direta,
5 visto que a população pode ou não utilizar os serviços na mesma
proporção em que contribui.

Assistência social: refere-se aos programas de cunho


distributivo, seja por meio de recursos, seja em espécie. Sua
função é transferir renda dos grupos mais ricos para os menos
10 privilegiados.

Art. 203. “A assistência social será prestada a quem dela


necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social.”

A assistência social provê o atendimento das necessidades


15 básicas traduzidas em proteção à família, à maternidade,
à infância, à adolescência, à velhice e à pessoa portadora de
deficiência, bem como a reintegração ao mercado de trabalho
daqueles que necessitarem.

Visa a garantir meios de subsistência às pessoas que não


20 tenham condições de suprir o próprio sustento, dando especial
atenção às crianças, idosos e deficientes.

76
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

A Previdência Social tem por fim assegurar aos seus


beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo
de incapacidade, idade avançada, tempo de serviço, desemprego
involuntário, encargos de família e reclusão ou morte daqueles
5 de quem dependiam economicamente.

Existe certa semelhança entre Previdência Social e contrato


de seguro, uma vez que a pessoa contribui e tem cobertura de
certos eventos, entretanto, devemos lembrar que o seguro traz
a ideia de contrato ligado ao direito privado, enquanto que a
10 previdência social é eminentemente pública.

6.2 Sistemas previdenciários

Existem dois tipos de sistema previdenciário: o regime de


repartição e o regime de capitalização.

Eles são definidos pela forma de administração dos recursos


e, portanto, pela taxa de retorno da previdência social – que é
15 a taxa que iguala os valores presentes entre as contribuições
(feitas durante a vida ativa) e os benefícios (recebidos durante o
período de inatividade).

Regime de repartição: as contribuições dos trabalhadores


em um determinado período são utilizadas no mesmo período
20 para o pagamento das aposentadorias aos inativos. Este processo,
no qual cada geração financia os benefícios da geração anterior,
é chamado de solidariedade intergeracional compulsória ou
transferência intergeracional.

A escolha do regime de repartição é um reflexo do processo


25 histórico de escolha, feito com base em condições econômicas e
demográficas particulares.

A Previdência Social também pode ser entendida como


uma forma de poupança obrigatória durante a vida ativa,
cuja alíquota mínima é definida pelo Estado. Logo, como toda

77
Unidade II

aplicação, possui uma determinada taxa de retorno, a qual pode


ser expressa com base na seguinte equação:

1+ r = (1+ w) (1+ n)

Onde:
r é a taxa de retorno (ou remuneração)
w é a taxa de crescimento salarial
n é a taxa de crescimento populacional

Regime de capitalização: as contribuições de cada indivíduo


são aplicadas e capitalizadas a cada período, visando a formar
5 um fundo que custeará sua própria aposentadoria, quando
passar para a inatividade.

O valor da aposentadoria é função direta do montante


contribuído pelo indivíduo durante sua vida ativa e da taxa de
juros que remunera este estoque de ativos. É imediato notar que
10 o retorno obtido corresponde à taxa de juros da economia.

No regime de capitalização nota-se que não há solidariedade


intergeracional.

Dados os parâmetros previdenciários básicos, como


expectativa de vida, alíquota de contribuição, taxa de juros
15 e duração da vida ativa, na média, o valor presente das
contribuições deve ser igual ao valor presente dos benefícios
recebidos pelos indivíduos. Valendo essa condição, o regime
de capitalização pode ser qualificado como atuarialmente
justo.

20 Transferência intergeracional: é aquela ocorrida entre


indivíduos de gerações diferentes, ou seja, quando as pessoas
são jovens, as contribuições por elas efetuadas financiam os
benefícios dos idosos.

78
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

Dessa maneira, o montante das contribuições depende de


características como a taxa salarial, o número de trabalhadores
e a alíquota de contribuição. Já o valor dos benefícios recebidos
depende dessas mesmas características.

5 Portanto, se quaisquer variáveis que afetam as contribuições


de uma geração se modificarem, a geração anterior será afetada,
dado que sua taxa de retorno irá sofrer uma alteração.

Transferência intrageracional: é aquela que ocorre entre


indivíduos de uma mesma geração, de forma que os benefícios
10 são transferidos de um beneficiário a outro. Portanto, os
indivíduos que têm uma vida mais longa, recebem implicitamente
uma transferência de renda daqueles (da mesma geração) que
viveram por menos tempo, dado que esses últimos receberam
seus benefícios por um período menor.

15 Para ficar mais bem esclarecido, podemos pegar o salário


maternidade, pago pelo INSS, como exemplo de distribuição
intrageracional.

Como tal benefício obviamente não está ao alcance dos


homens, fica evidente que uma parte dos recursos gerados por
20 suas contribuições é empregada para pagar o benefício das
mulheres que engravidam.

Observação 1: mulheres têm maior expectativa de


vida do que os homens, e dentro de uma distribuição
intrageracional, temos transferência de renda do sexo
masculino para o sexo feminino.

Outro exemplo de transferência intrageracional são os


benefícios pagos pela previdência rural:

Existe um grande número de trabalhadores rurais que


25 não contribuem para o INSS, pois muitas vezes trabalham na
informalidade. Porém, os benefícios destinados aos trabalhadores
rurais correspondem a quase um terço do total de benefícios

79
Unidade II

pagos pelo INSS, o que mostra que há distribuição intrageracional


no sentido urbano-rural.

Obviamente, tais políticas de distribuição de renda têm


forte impacto na redução da pobreza na área rural; porém,
5 isto representa um custo. Os dispêndios com benefícios rurais
são, dentre outros, um dos grandes responsáveis pelo aumento
do déficit no INSS, dado que o valor das contribuições rurais
são bastante reduzidos diante do montante de benefícios
recebidos.

6.2.1 Causas do déficit previdenciário

10 Seguem alguns exemplos para explicar a existência do


déficit previdenciário do Brasil, de acordo com cada sistema
(RPPS e RGPS).

Sistema RPPS

Até 1998, quando foi aprovada a Emenda Constitucional


15 nº 20, não havia idade mínima para a concessão da aposentadoria
dos RPPSs, o que gerava a aposentadoria precoce. Desta forma,
acontecia um menor tempo de contribuição para a previdência
e um maior tempo de concessão de benefícios, gerando o déficit
previdenciário.

20 Este problema foi solucionado somente com a reforma de


1998, quando foi sancionada a EC nº 20, que instituiu uma idade
mínima de aposentadoria. A EC nº 20 limitou a idade mínima
para aposentadoria em 53 anos (homens) e 48 anos (mulheres),
além de exigir 35 anos de contribuição para os homens e 30
25 para mulheres.

Até o ano de 2003, quando foi aprovada a Emenda


Constitucional nº 41, os RPPSs tinham direito à aposentadoria
integral e com paridade, ou seja, eles se aposentavam com o
salário integral e com direito aos mesmos reajustes, bonificações
30 e aumentos dados aos funcionários ativos – vale lembrar que a
integralidade e a paridade valiam para os aposentados e também
para os pensionistas.

80
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

Sistema RGPS

A quantidade de trabalhadores que ainda hoje trabalham na


informalidade torna-se uma potencial demanda reprimida de
benefícios assistenciais no futuro, acentuando o desequilíbrio
5 orçamentário da previdência. Ou seja, o valor arrecadado para a
previdência não supre os valores que são concedidos por meio
de benefícios.

Outra grande responsável pelo déficit do INSS é a área rural,


onde menos de 10% dos beneficiários contribuíram com a
10 previdência.

Arrecadação Benefícios Resultado


Ano Clientela líquida previdenciários (b) (a-b)
Total 8.897 14.150 (5.253)
2006 Urbano 8.623 11.501 (2.878)
Rural 273 2.649 (2.375)
Total 9.986 13.880 (3.894)
2007 Urbano 9.621 11.185 (1.494)
Rural 294 2.695 (2.400)
Total 11.207 16.296 (5.089)
2008 Urbano 10.888 13.085 (2.196)
Rural 318 3.211 (2.893)

Arrecadação líquida e pagamento de benefícios, segundo


a clientela urbana e rural – Janeiro/2008 – RGPS.
18,00
16,00
14,00 13,08
12,00
10,89
R$ Bilhões

10,00
8,00
6,00
4,00 0,21
2,00
0,32
-
Arrecadação Pagamento de Arrecadação Pagamento de
líquida benefícios líquida benefícios
Urbana Rural

Fonte: Ministério da Previdência Social (2008).

81
Unidade II

Valor médio real pago pelos benefícios da Previdência


Social de janeiro de 2001 a setembro de 2008 (Inclui
apenas os benefícios previdenciários e acidentários).
670,00

650,00 641,12
638,33
630,00 624,73

610,00

590,00
R$

567,63
570,00 560,10 Ponto de reflexão
550,00 Você seria capaz de dimensionar os
535,00 526,29
530,00 524,58 “custos de transição” da Previdência
Social, caso houvesse uma mudança
510,00
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 nos regimes atuais?

Fonte: Ministério da Previdência Social (2008).

6.3 Resumo

Neste módulo você ficou sabendo que a Previdência Social


5 (no Brasil) consiste num conjunto de políticas sociais cujo fim é
amparar e assistir o cidadão e a sua família em situações como a
velhice, a doença e o desemprego, e que a assistência social provê
o atendimento das necessidades básicas traduzidas em proteção
à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice e
10 à pessoa portadora de deficiência, bem como a reintegração ao
mercado de trabalho daqueles que necessitarem.

E que existem dois tipos de sistema previdenciário: o regime


de repartição e o regime de capitalização, que são definidos pela
forma de administração dos recursos e, portanto, pela taxa de
15 retorno da previdência social – que é a taxa que iguala os valores
presentes entre as contribuições (feitas durante a vida ativa) e
os benefícios (recebidos durante o período de inatividade).

E, por fim, revelamos a você que existe um grande número


de trabalhadores rurais que não contribuem para o INSS, pois
20 muitas vezes trabalham na informalidade. Porém, os benefícios
destinados aos trabalhadores rurais correspondem a quase um

82
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

terço do total de benefícios pagos pelo INSS, o que mostra


haver distribuição intrageracional no sentido urbano-rural.

7 DEMOCRACIA E ACCOUNTABILITY

Objetivos do módulo

Accountability é um termo ligado à gestão pública moderna,


5 que está relacionado à responsabilidade social e à ética da boa
gestão ou, ainda, à gestão cidadã.

Os políticos que fazem parte da área executiva dos governos,


passaram a ser obrigados a relatarem suas práticas e filosofias
de gestão através da contabilidade social. É isso aí, podemos
10 chamar esta palavra xenófoba de prestação de contas social. Ao
olharmos a construção dessa palavra, percebe-se que o account
vem de conta, que sugere confiança, e o ability, a questão da
habilidade, isto é, os políticos passam a ter que incorporar o
papel da confiança e da habilidade técnica para executar as
15 propostas colocadas em seus planos de governo.

7.1 Governo e democracia

Os organismos internacionais têm defendido e disseminado


a ideia de que para alcançar o desenvolvimento não basta
canalizar capitais para investimentos em economias emergentes.
São necessárias reformas institucionais que reduzam a
20 ineficiência na alocação de recursos por parte dos governos
e possibilitem maior controle dos governantes, reduzindo ou
eliminando os problemas de corrupção e clientelismo que
afetam o desempenho econômico.

É a partir dessa preocupação que a problemática de


25 accountability democrática emerge no contexto da chamada
segunda geração de reformas do Estado, que objetiva tornar
os governos não só mais eficientes no provimento de suas
políticas públicas, mas também mais responsivos às demandas
dos eleitores.

83
Unidade II

Democracia pode ser entendida pela busca de três ideais,


tomados como princípios orientadores:

• o governo deve emanar da vontade popular, que se torna


a principal fonte de soberania;
5 • os governantes devem prestar contas ao povo,
responsabilizando-se perante ele, pelos atos ou omissões
cometidos no exercício do poder;
• o Estado deve ser regido por regras que delimitem seu
campo de atuação em prol da defesa de direitos básicos
10 dos cidadãos, tanto individuais quanto coletivos.

Por seu turno, existem três formas de garantir a accountability,


ou seja, a responsabilização política ininterrupta do Poder
Público em relação à sociedade:

• o processo eleitoral, garantidor da soberania popular;


15 • o controle institucional durante os mandatos, que
fornece os mecanismos de fiscalização contínua
dos representantes eleitos e da alta burocracia com
responsabilidade decisória;
• criação de regras estatais intertemporais, pelas quais
20 o poder governamental é limitado em seu escopo de
atuação, a fim de garantir os direitos dos indivíduos e da
coletividade que não podem simplesmente ser alterados
pelo governo de ocasião.

Formas de Instrumentos Condições


accountability
Pluralismo de
Sistema eleitoral ideias (crenças
Processo eleitoral e partidário ideológicas e
religiosas)
Mecanismos
Controle institucional Comissão Parlamentar de controle do
durante o mandato de Inquérito (CPI) Poder Público

Garantias de direitos
Regras estatais básicos pela Constituição
intertemporais (cláusulas pétreas)

Fonte: Abrucio; Loureiro, 2003.

84
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

Formas de accountability Instrumentos


Financiamento de
Processo eleitoral campanhas eleitorais
CPI
PPA
Controle institucional LDO
durante o mandato LOA
Orçamento Participativo
Regras de restrição
orçamentária e de
Regras estatais responsabilidade fiscal.
intertemporais Limites de endividamento
público.
Metas inflacionárias.

Fonte: Abrucio; Loureiro, 2003.

7.1.1 Financiamento de campanhas eleitorais

1. Consolidação do horário eleitoral gratuito.


2. Reforço do papel dos tribunais eleitorais e das leis de
moralização das campanhas, de maneira que, nos últimos
anos, aconteceram pela primeira vez em nossa história,
5 cassações de mandato vinculadas ao abuso do poder
econômico.
3. Desde 1993, todos os candidatos são obrigados a fazer,
ao final da eleição, uma declaração detalhada das
contribuições de campanha.

7.1.2 Processo orçamentário e prestação de contas por


parte do Poder Executivo

10 1. Limitação do número de emendas.


2. Fixação de valor máximo para cada uma.
3. Criação de relatorias.
4. Exigência de reuniões de bancada.
5. Instituição de audiências públicas.

85
Unidade II

6. Incentivo à rotatividade dos membros da Comissão Mista


do orçamento, para evitar o controle dos recursos públicos
por determinados indivíduos ou grupos.

7.1.3 Mecanismos de restrição orçamentária e accountability,


com destaque para a LRF

1. Limitação de gastos com pessoal, estabelecendo não


5 somente o quanto pode ser gasto por cada nível de
governo em relação à receita líquida, mas também – e
aí está a sua novidade – o percentual equivalente a cada
um dos poderes, eliminando, assim, a distorção existente
anteriormente, em especial nos governos estaduais.
10 2. Reafirmação dos limites mais rígidos para o endividamento
público estabelecidos pelo Senado Federal, com a
retenção de transferências constitucionais e a proibição
de empréstimos e de convênios com o governo federal.
3. Definição de metas fiscais anuais e exigência de apresentação
15 de relatórios trimestrais de acompanhamento.
4. Estabelecimento de mecanismos de controle das finanças
públicas em anos eleitorais.
5. Proibição de socorro financeiro entre os níveis de governo,
reduzindo o risco moral entre agentes públicos e desses
20 com os privados.

7.1.4 Tribunal de contas

Neste particular aspecto, existe uma forte influência de


indicações políticas para a composição e provimento dos
membros dos tribunais de contas. Por sua vez, a vitaliciedade
não significa garantia de dedicação, eficiência e moralidade
25 pública por parte dos nomeados, pois acaba funcionando como
aposentadoria para políticos, mantendo o sentido que Getúlio
Vargas atribuía a essa instituição: “um armário onde se arquivam
os amigos”.

86
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

7.1.5 Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs)

Visam ao aumento da transparência e da accountability do


Poder Público, reforçando a vigilância sobre a classe política,
podendo chegar à punição dos infratores ou, ao menos, alterando
a distribuição do Poder Público.

5 Têm sido um instrumento pelo qual o Poder Legislativo


obriga o Poder Público a prestar contas à sociedade, não
necessariamente por intermédio da punição de envolvidos nas
irregularidades constatadas. Constitui hoje o melhor mecanismo
de accountability horizontal existente no Brasil, o que não
10 significa dizer que estejam livres de problemas vinculados à falta
de transparência e ao abuso de poder legar, tal como ocorreu na
CPI do Banestado.

7.1.6 Orçamento Participativo (OP)


Ponto de reflexão
Trata-se de um instrumento de controle social, por meio Você poderia apontar um conflito
do qual a população participa da discussão e deliberação sobre “clássico” que o processo de
15 a distribuição dos recursos públicos durante o mandato dos accountability pode evitar ou ajudar a
mediar?
governantes.

7.2 Resumo

Neste módulo você aprendeu que são necessárias reformas


institucionais que reduzam a ineficiência na alocação de recursos
por parte dos governos e possibilitem maior controle dos
20 governantes, reduzindo ou eliminando os problemas de corrupção
e clientelismo que afetam o desempenho econômico.

Aprendeu também que é a partir dessa preocupação que a


problemática de accountability democrática emerge no contexto
da chamada segunda geração de reformas do Estado, que objetiva
25 tornar os governos não só mais eficientes no provimento de suas
políticas públicas, mas também mais responsivos às demandas
dos eleitores.

87
Unidade II

8 TEORIA DE ESCOLHA PÚBLICA

Objetivos do módulo

Neste módulo observaremos como uma das falhas de


governo, batizada de corrupção e com dimensões desastrosas
sobre a eficiência econômica dos Estados, transforma as relações
5 impessoais em relações pessoais, conduzindo, como tais, para a
“teoria da escolha pública”.

Inspirada como uma disciplina independente, ou quase


independente da economia política, James Buchanan9 a
define como uma perspectiva do campo político que emerge
10 de uma extensão da aplicação de ferramentas e métodos
econômicos para decisões coletivas ou tomada de decisões
fora do mercado. Em resumo, a escolha pública não é nada
mais do que a aplicação de ferramentas econômicas à
política.

8.1 Corrupção e a figura do rent seeking

15 É prático e histórico a corrupção transformar relações


impessoais em relações pessoais, refutando um dos pressupostos
básicos da ética e do modus operandis do Estado, isto é, tornando
um bem público em bem privado.

A corrupção é tratada dentro da teoria dos caçadores de


20 renda, também conhecidos como rent seeking, sendo estes
aqueles agentes econômicos que buscam lucros positivos a
longo prazo, dentro de um ambiente repleto de regras falíveis
e falhas institucionais.

O lucro, nestas circunstâncias, poderá ser maximizado


25 com ou sem estas regras, e as transferências de recursos
podem ser feitas dentro da sociedade e consumar toda
forma de privilégios.
9
James M. Buchanan Jr. nasceu em Murfreesboro, Tenessee, no dia
3 de outubro de 1919. Esteve vinculado durante a maior parte de sua vida
acadêmica a George Mason University, no estado de Virginia, onde foi diretor
do Center for the Study of Public Choice. Foi laureado com o Prêmio Nobel
de Economia em 1986.

88
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

8.2 Teoria de escolha pública (public choice)

A escolha pública aplica métodos econômicos para analisar


o comportamento das pessoas com capacidade de tomar
decisões políticas, o que envolve um estudo interativo de todo
o processo. A escolha pública difere da escolha constitucional.
5 Enquanto a primeira faz uma análise positiva, a última faz
uma análise normativa. A análise da escolha pública revela
que a reforma ou o aperfeiçoamento dos resultados políticos
são possíveis com a mudança nas regras e nas restrições, em
nível constitucional, segundo as quais, as escolhas são feitas,
10 dificultando as mudanças ocasionais implementadas por
políticos oportunistas.

Segundo Dias (2008), a “teoria da escolha pública” testou para


os políticos e burocratas - com base nos princípios elementares
da ciência econômica, aceitos desde os tempos de David
15 Hume e Adam Smith - a mesma hipótese de comportamento
individualista válida para a maior parte da espécie humana.

Afinal, como é tênue a pressão exercida pelos eleitores sobre


seus representantes, principalmente em democracias pouco
maduras, políticos e burocratas estão livres para cuidar apenas
20 de suas vantagens pessoais (pecuniárias e ideológicas) e dos
interesses de lobbies que se organizam na busca de privilégios,
sem temer a represália das urnas.

Buchanan enumera dois elementos distintos da perspectiva


da escolha pública: o primeiro elemento é a abordagem
25 generalizada da Catalaxia aplicada à economia; o segundo é o
postulado do homo economicus.

A abordagem da Catalaxia (ciência das trocas) à economia


chama a atenção para os processos de troca, acordos, ou
contratos. Esta abordagem redireciona a ênfase do campo
30 econômico para além do mercado, ou seja, para todo o processo
de acordo voluntário entre as pessoas.

89
Unidade II

A perspectiva da escolha pública estuda o processo político


de uma maneira diferente da ciência política. Enquanto esta
estuda os processos políticos sob o ponto de vista do poder e
da força, aquela considera os processos de troca que emergem
5 dentro de um processo político.

Ainda de acordo com Dias (2008), o postulado do homo


economicus diz que os indivíduos agem conforme os seus
próprios interesses no sentido de maximizar a sua utilidade, de
acordo com as restrições que eles encontram. Este postulado
10 tem guiado os economistas, desde o século XVIII, na análise
do comportamento das pessoas nos mais variados mercados.
Entretanto, somente quando a política deixou de ser vista como
uma relação exclusivamente pautada pela coerção e o postulado
do homo economicus passou a ser combinado com o paradigma
15 da catalática, que surgiu a teoria econômica da política. De
acordo com esta teoria, todas as escolhas são privadas.

Logrolling

Trocas legislativas ou (logrolling) é a ideia básica de que o


indivíduo pode “vender” seu voto em determinado ponto da
20 agenda, assegurando, em contrapartida, os votos de outros
indivíduos em temas de seu próprio interesse.

O Congresso seria, portanto, o locus onde a motivação


econômica no comportamento político tornar-se-ia mais evidente
para Buchanan, a dimensão forte da barganha sustentar‑se‑ia na
25 pressuposição de que as intensidades diferenciadas das preferências
devem prevalecer no cômputo das decisões.
Ponto de reflexão
Resumindo, o resultado da corrupção em termos de custos,
poderá resultar na redução do crescimento econômico, na Você acha justo que um homem
público, eleito pelo voto democrático,
medida em que privilegia a alocação equivocada de recursos realize escolhas privadas em detrimento
30 em atividades pouco produtivas, provocando custos elevados do interesse público?
de operacionalização, pois empresas e investidores optam por
investimentos em países com menor índice de corrupção.

90
ECONOMIA E GESTÃO DO SETOR PÚBLICO

8.3 Resumo

O módulo que se encerra, visitou o conceito da corrupção


tratada dentro da teoria dos caçadores de renda, também
conhecidos como rent seeking, sendo estes aqueles agentes
econômicos que buscam lucros positivos a longo prazo,
5 dentro de um ambiente repleto de regras falíveis e falhas
institucionais.

Apresentou também a escolha pública, que aplica métodos


econômicos para analisar o comportamento das pessoas com
capacidade de tomar decisões políticas, o que envolve um estudo
10 interativo de todo o processo.

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