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1) CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Infelizmente não acredito que tenhamos uma verdadeira reforma tributária no Brasil.
Não sem se promulgar uma nova Constituição.
Não quero aqui entrar nos meandros dos legalismos e expressões jurídicas que são
inerentes ao tema. Tampouco quero adentrar na discussão da vasta conceituação jurídica
inerente aos tributos e todas as suas espécies. Pretendo sim, de modo acessível e
objetivo (por mais longo que o texto possa ser) é trazer a luz as incongruências e
vicitudes do Sistema Tributário Brasileiro para, com isso, estabelecer as principais
premissas que, creio, devam nortear essa discussão há anos engavetada nos escaninhos
do Poder Público.
Exceção que me permito fazer à premissa acima está no conceito de tributo, o qual
reproduzo exatamente o quanto disposto no artigo 3 do Código Tributário Nacional.
Tributo, por assim dizer, significa: "toda prestação pecuniária, compulsória, em moeda
ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída
em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada."
O Sistema Tributário Nacional, tal como existe atualmente, foi criado buscando
harmonizar as relações da sociedade de forma a se atender aos seus princípios
fundamentais, como também de forma a se respeitar o pacto federativo sob o qual
vivemos.
Por falta de tempo para sistematizar, não foi possível levantar e sistematizar
informações relativas à Carga Tributária no Brasil numa série histórica, o que seria de
grande valia para avaliar o contexto das políticas públicas na história brasileira,
notadamente os sucessivos Planos Econômicos tendentes à acabar com a inflação e a
tendência do aprofundamento da injustiça tributária nacional, sobremaneira
potencializadas por ocasião do Plano Real.
Desde a Proclamação da República (salvo a Era Vargas entre 1937 e 1946) importante
notar que o Brasil, em tese, constitui-se numa Federação. Federação, por definição
significa a união de Estados que delegam sua soberania ao Estado Federal. Ou seja é
como se cada Estado Brasileiro fosse independente dos demais em sua formação sendo
que, em determinado momento da história, estes resolveram unir-se em torno de uma
centralidade de Poder.
Pois bem, desde que o Código Tributário Nacional foi sancionado em 1966, nele se
previu um sistema de harmonização das competências tributárias, onde buscou-se
atribuir, a cada Ente Federativo, a competência por legislar e administrar tributos sob
todas as categorias econômicas tributárias.
Assim é que, historicamente, a divisão das diversas espécies tributárias (por espécie e
categoria econômica) pelos entes federativos (União, Estados e Municípios)
praticamente permanece inalterada.
Há duas exceções a essa regra devem ser destacadas, ambas as quais demonstram o
processo de concentração do poder tributário da União Federal frente aos demais entes
federativos que veremos adiante.
A primeira se faz quanto aos tributos incidentes sobre a Renda, onde a partir de 1993 a
competência exclusiva sobre o poder de legislar sobre o mesmo restou à União Federal.
Isto se deu através da Emenda Constitucional 03 que alterou o artigo 155 da
Constituição, excluindo da competência dos Estados a possibilidade de legislar e cobrar
o Adicional de Imposto de Renda Estadual.
Entes União (artigos 153 e 154 Estados (art. 155 Municípios (art.
Federativos / CF) CF) 156)
Fatos
Geradores
- Contr. Previdenciária
- Contr. ao Seguro de
Acidente do Trabalho
- Contr. ao Salário
Educação
- Contr. ao Sistema S
- Imposto de Importação
(II) *
- Imposto Exportação
(IE) *
- Contr. Social da
Seguridade Social
(COFINS)
- Programa de Integração
Social (PIS)
- Contr. de Intervenção
do Domínio Economico
(CIDE)
De modo que, sob a ótica do poder soberano, facilmente se conclui que o pacto
federativo brasileiro é uma falácia, pois o poder político de se legislar sobre a
tributação, recurso financeiro necessário para custear as despesas decorrentes das
políticas públicas elaboradas sob o pacto da Constituição, está sob o pálio da União
Federal.
Tal cenário também encontra reflexo quando analisamos o pacto federativo nacional sob
outras óticas, notadamente às competências legislativas (vide artigos 21 a 34 da
Constituição Federal) e das atribuições do Poder Executivo frente à Administração
Pública. Não quero me alongar muito sobre esses outros aspectos, pois não vinculados
ao tema do presente artigo.
O que importa para a presente análise é o fato de que há uma verdadeira concentração
do poder político e econômico da União Federal frente os demais entes federativos,
tolhendo-lhes a independência de auto determinação soberana e, conseqüentemente,
uma melhor aplicação dos recursos públicos e execução das políticas públicas frente às
necessidades regionais.
Quando tal cenário é analisado sob a ótica financeira, a afirmação ora apresentada fica
ainda mais evidente. É o que se extrai do quadro abaixo, o qual traz à efetiva
arrecadação dos tributos administrados por todos os entes federativos em 2009:
Ente Orçamento
%
Federativo Fiscal
A política pública tributária tão centralizada na União Federal - seja sob o primas do
poder de legislar, seja sobre a efetiva arrecadação - é uma afronta aos Direitos
Humanos, observados coletivamente, pois não permite tratar as desigualdades regionais
de forma a diminuí-las extingui-las.
Nem se diga que a repartição das receitas da União para com os Estados e Municípios e
dos Estados para com os Municípios - os chamados Fundos de Repartição das Receitas
Tributárias (vide artigos 157 a 161 da Constituição) - se prestam à garantir tal
independência.
Isso porque, de um lado, tais Fundos criam verdadeira burocracia entre os entes
federativos, gerando desconfianças e discussões judiciais sem fim sobre sua exatidão.
Por outro lado, de acordo com os artigos 157 a 161 da Constituição Federal, a repartição
de receitas tributárias está adstrita à arrecadação da União Federal com impostos,
excluindo-se às receitas provenientes das Contribuições em geral.
Ou seja, a repartição das receitas tributárias - ou melhor dos impostos - federais com os
demais entes federativos é, na verdade, mero afago ao conceito da regionalização e da
soberania dos Estados frente a União Federal.
90.05 38,336.1
Imposto
255,636.84 34.69% 47.59% 243,185.30 % 45.27% 8 79.28% 7.14% 537,158.32 50.90%
Taxa 4,989.17 0.68% 30.77% 7,938.36 2.94% 48.96% 3,285.89 6.80% 20.27% 16,213.42 1.54%
Contribuição
Previdenciária 202,200.54 27.44% 90.44% 17,127.42 6.34% 7.66% 4,246.11 8.78% 1.90% 223,574.07 21.18%
Contribuição
Social 212,853.11 28.88% 100.00% 0 0.00% 0.00% 0 0.00% 0.00% 212,853.11 20.17%
Outras
Contribuições 6,598.82 0.90% 100.00% 0 0.00% 0.00% 0 0.00% 0.00% 6,598.82 0.63%
Não
Tributário 54,725.95 7.43% 92.74% 1,795.29 0.66% 3.04% 2,487.99 5.15% 4.22% 59,009.23 5.59%
48,356.1
Total
737,004.43 270,046.37 7 1,055,406.97 100.00%
Por assim dizer, do total da arrecadação tributária nacional, verifica-se que os Impostos
correspondem à 51% do total arrecadado enquanto as demais Contribuições
correspondem à 42% do total.
Num calculo não preciso - pois não levantei os dados relativos à repartição das receitas
tributárias - mas não longe da realidade, vale dizer que a União Federal é destinatária de
50% das receitas tributárias, enquanto Estados e Municípios dividem os outros 50%
restantes.
Na prática, os recursos tributários partilhados pela União com Estados e Municípios e
dos Estados para com os Municípios, antes de chegar a cada cidadão como serviços
públicos, passa de mãos em mãos por uma verdadeira burocracia estúpida e
desarrazoada, gerando custos estrondosos (pessoal, sistemas, arquivos, fiscalizações e
auditorias entre outros).
O pacto federativo que rege o Estado Brasileiro, portanto, está somente no papel - pois
tal conceito não está baseado nas raízes de nossa história, haja visto ter sido imposto
quando da Proclamação da República - e de fato, só pela ótica da legislação e
arrecadação tributária, já permite a conclusão de que há um desproporcional poder
político da União Federal frente aos demais entes federativos, limitando a Soberania dos
Estados e a autonomia dos Municípios.
Mais importante que a discussão sobre o pacto federativo é a carga tributária brasileira e
a desigualdade que esta ocasiona na distribuição do patrimônio nacional.
Sem maiores delongas, seja sob a ótica legislativa, seja sob a ótica da arrecadação, os
tributos brasileiros estão concentrados, por sua categoria econômica, na Renda e na
Atividade Econômica em detrimento do Patrimônio.
Trazendo isso para a nossa realidade, o tratamento das desigualdades pela política
tributária, sob a ótica da capacidade contributiva, sempre em tese, deve proporcionar
uma sociedade justa e sustentável. Uma sociedade em que todos tenham direito à
educação de qualidade, acesso a serviços públicos de saúde eficientes, ao transporte
acessível e pontual a qualquer localidade, entre tantos, tantos outras garantias
fundamentais previstas em nossa Constituição.
Claro que a política tributária não é a única política pública que traz a redistribuição de
riquezas, existem diversas outras, tais como a política de seguridade social, emprego,
crédito, economia interna e externa, entre outras. Contudo, a política tributária é o
instrumento direto e primaz do Estado e serve para financiar, direta e indiretamente,
todas as demais políticas públicas.
Pois bem, seguindo a mesma metodologia de análise - legislativo e arrecadação - é de se
concluir, categoricamente pela injustiça do Sistema Tributário Brasileiro.
Sob o aspecto legislativo, vale nota o fato de que há 10 tributos previstos na legislação
brasileira que incidem sobre qualquer atividade econômica dos quais 6 são impostos (4
de competência da União Federal, 1 dos Estados e 1 dos Municípios) e 4 são
contribuições sociais (todos eles de competência da União Federal).
E todos eles são tributos indiretos, ou seja, aqueles incidentes sobre a atividade
econômica, são recolhidas pelos detentores do capital e embutidas nos custos da
atividade econômica, sendo repassadas a nós, meros cidadãos mortais.
Este sistema, além de injusto, pois não respeita o princípio da igualdade, ou melhor
dizendo a capacidade contributiva, se presta para desinformar, desarticular a sociedade
de maneira a impedir que cada cidadão tenha a certeza de quanto está pagando de
tributos ao Estado e, por conseguinte, impede que o Estado seja cobrado por suas
responsabilidades e por serviços públicos inefetivos, indignos e de péssima qualidade.
Tal pratica é reflexo de um costume da sociedade brasileira que remonta aos primórdios
de nossa colonização, refletindo por conseguinte a maior desigualdade brasileira: a
riqueza que é o conhecimento.
Pela leitura do quadro abaixo, verificamos que 94% dos tributos nacionais referem-se à
tais categorias, onde 50,4% refere-se à renda e 43,97% sobre a atividade econômica.
R$ %
Atividade
464,016.36 43.97%
Economica
A abertura dos dados entre os entes federativos somente reforça o quanto afirmado no
capítulo anterior, onde à União cabe 95,99% dos tributos relacionados à renda (dos
quais 36,09% referem-se à Impostos e e 53.58% referem-se à Contribuições) dos
tributos relacionados à Atividade Econômica (dos quais 33,32% referem-se à Impostos
e 51,74% referem-se à Contribuições). Confira-se:
R$ % R$ % R$ % R$ %
511,433.6 95.99
Renda 3.21% 0.80%
5 % 17,127.42 4,246.11 532,807.18 50.48%
Atividade
217,634.1 46.90 48.28
Economic 224,027.7 22,354.4 4.82%
4 % %
a 4 8 464,016.36 43.97%
Verifica-se também que, ao se analisar os tributos por sua espécie, sua concentração
está na União Federal além do que grande parte dos mesmos relaciona-se à
Contribuições e não Impostos - renda (36,09% Impostos e 53.58% referem-se à
Contribuições); Atividade Econômica (33,32% Impostos e 51,74% Contribuições) -
contribuições estas que, na prática, são indiretas, sendo embutidas no custo da cadeia
econômica.
R$ % R$ % R$ % R$ % R$ %
Imposto 192,315.02 18.22% 309,269.81 29.30% 35,573.49 3.37% 0 0.00% 537,158.83 50.
Contribuição
223,574.07 21.18% 0 0.00% 0 0.00% 0 0.00%
Previdenciária 223,574.28 21.
Contribuição
61,877.51 5.86% 148,462.36 14.07% 0 0.00% 0.00 0.00%
Social 210,340.07 19.
Outras
314.63 0.03% 6,284.19 0.60% 0 0.00% 2,513.24 0.24%
Contribuições 9,112.07 0.
Total 532,807.18 50.48% 464,016.36 43.97% 35,573.49 3.37% 23,009.94 2.18% 1,055,407.95 100.
Essa disparidade entre impostos e contribuições, para o nosso dia a dia, parece não nos
trazer muita implicação. Porém, além de justificar ainda mais a concentração de poderes
na União Federal, também nos traz uma situação peculiar, na medida em que sobram
menos recursos para gastos gerais do estado - tais como construção de escolas, creches,
postos de saúde, melhoria da infra-estrutura nacional - e conseqüentemente, menos
recursos para a repartição, já combalida, das receitas tributarias entre os entes
federativos.
Assim, para termos uma educação de qualidade, sob a ótica do processo político
tributário existente desde a década de 90, seria necessário criar e/ou aumentar a carga
tributária através de contribuições existentes (Contribuição ao Salário Educação) ou a
serem recriadas (CPMF) para que tenhamos serviços públicos de saúde e educação
minimamente adequados.
Veja-se que, de fato, a carga tributária incidente sobre o patrimônio é 3,37% do total de
tributos arrecadados pelos entes federativos. E não poderia ser diferente na medida em
que o acumulo de patrimônio pressupõe o fato de que o mesmo se dá somente após a
tributação sobre o rendimento, sendo este, em verdade, o lucro auferido por nossa
atividade laboral, qualquer que ela seja.
Além disso, poder-se-ia dizer, com certa propriedade, que o patrimônio, via de regra,
refere-se à moradia, aos imóveis em geral, que na ampla maioria dos casos servem
como habitação, garantia fundamental prevista em nossa Constituição.
De fato o grande acervo do patrimônio nacional constitui-se sobre bens imóveis - casas,
prédios, terrenos, áreas rurais - sendo que para a grande maioria da população este pode
ser seu único bem.
Neste sentido, de acordo com a PNAD 2008, há no Brasil 56,4 milhões de domicílios
particulares para uso para a habitação, dos quais 73,6% são próprios, 19,1% são
alugados e 6,8% cedidos.
Se considerarmos que, ainda de acordo com a PNAD 2008, 82% das famílias vive com
até 3 salários mínimos (R$ 1.620,00) seria possível a conclusão de que o fato da
arrecadação tributária sobre o patrimônio ser tão baixa seria reflexo de uma condição
natural da propriedade no Brasil, atendendo, por conseguinte, os fins da capacidade
contributiva.
Contudo, quando falamos de patrimônio, não podemos nos cingir somente à
propriedade de imóveis (base de cálculo do IPTU e do ITR), ou sua transmissão à título
de doação, herança e/ou venda (ITCMD e ITBI), mas também sobre outros bens, tais
como ações, fundos, automóveis, propriedade intelectual, entre tantos outros.
Alias, a inclusão do FGTS, das contribuições sociais (lucro, salário educação, sistema S)
e previdenciárias na classificação Renda é proposital, porquanto os salários são uma das
principais fontes de renda, dentre todas as possíveis.
Ou seja, a tributação direta sobre o que se entende por renda, pois o salário é um de seus
elementos formadores, mas não o único - dos quais destacam-se a distribuição de lucros,
ganhos de capital e financeiros, entre outros - tem um percentual baixíssimo, menos de
20% sobre o total, enquanto a tributação indireta, ou seja aquela que incide sobre a
atividade econômica, corresponde a 43,97%!.
O IRRF incide tanto para pessoas físicas como para empresas, pois em verdade é um
empréstimo compulsório, um adiantamento de um tributo futuro e incerto que incide
sobre quaisquer operações - desde o pagamento de salários, honorários, até mesmo
sobre os ganhos financeiros.
Tal lei, tramitou no Congresso Nacional de forma espúria e foi publicada na calada da
noite, mais precisamente no dia 26 de dezembro de 1.995, válida já a partir de 1o. de
janeiro de 1996!
Enquanto a maioria da população, que labuta todos os dias de sol a sol para obter um
salário suado no final do mês, tem tungado do mesmo entre 11% e 38,5% de seu
salário[3] (somando-se as alíquotas da contribuição previdenciária e as faixas possíveis
de IR), os donos do capital estão lá, tendo rendimentos totalmente isentos de tributação,
permitindo um acumulo ainda maior de capital livre de quaisquer impostos.
Vejam que se tomou o cuidado de não se utilizar a expressão “isenção” e a partir daí
criou-se uma propaganda oficial, apoiada pela mídia, para se criar um senso comum de
que tributar dividendo ou lucro seria o mesmo que bi-tributar.
O que não é o caso pois são pessoas distintas que estão sendo tributadas.
Como a presente análise não tem o escopo de buscar discutir os diferentes conceitos
jurídicos sobre as normas tributárias, somente para ilustrar tal afirmação, vale lembrar
que nos Estados Unidos, a meca do capitalismo de consumo mundial, a grande celeuma
sobre a tributação está diretamente relacionada à carga tributária incidente sobre a
distribuição de lucros e dividendos[4]!
Não encontrei análises sobre o total de lucros, dividendos e juros sobre capital próprio
distribuídos no Brasil em um determinado ano para trazer um parâmetro de comparação.
Porém numa conta perversa, mas que atende aos fins da presente análise, considerando
que o total pago à título de IRPJ foi de R$ 79 bilhões em 2009, por uma simples regra
de 3, isso significa dizer que a Renda auferida pelas empresas foi de R$ 300 bilhões,
considerando-se a alíquota máxima de 25% (o que com certeza não é o caso, pois nesse
número se incluem as empresas sujeitas ao regime de tributação pelo lucro presumido).
Excluindo-se o total de R$ 42 bilhões arrecadados à título de CSL, poderíamos afirmar
que, em tese, R$ 258 bilhões de reais foram objeto de distribuição de lucros e
dividendos!
Essa injustiça no sistema tributário se reflete ainda mais quando analisamos que a
alíquota para ganhos financeiros e de capital, salvo raríssimas exceções, é de 15%, o
mesmo patamar daqueles que ganham entre R$1.500 a R$2.200 reais!
Ou seja, o governo ao pagar os juros sobre os Títulos da Dívida Pública - os quais na
maioria dos casos está atrelada à taxa SELIC (Sistema Especial de Liquidação e
Custódia) - atualmente em 11% ao ano, mas que entre 94 e 98 chegou a patamares de
quase 50%, transferem a riqueza nacional aos detentores do capital dando aos mesmos
uma rentabilidade anual absurda, deduzindo meramente 15% sobre seus ganhos.
Enquanto 82% das familias brasileiras labutam com todo o rigor e tem descontados de
11% para obterem renda bruta de até R$ 17.000,00 por ano, uma pessoa com R$
200.000,00 aplicados numa aplicação de renda fixa aufere a mesma quantia já livre de
impostos sem sair do sofá!
Ainda vale notar que os R$ 121 bilhões arrecadados das empresas entre IRPJ e CSL, tal
custo é efetivamente repassado à sua cadeia econômica correspondente, não por serem
tais tributos indiretos, porque não o são, mas sim por cálculos financeiros para a
composição dos preços dos produtos e serviços oferecidos à sociedade. Ou seja, mais
uma vez é a massa de 82% das famílias brasileiras que arcam, efetivamente com tal
carga tributária.
De modo que, não obstante a carga tributária total sobre a Renda ser da ordem de R$
192 bilhões, pode-se afirmar com certeza que sobre a Renda efetiva somente é
arrecadado 113 bilhões (13 IRPF + 100 IRRF), sendo que a maior parte do IRRF
arrecadado refere-se ao imposto incidente sobre o seu salário.
Por isso mesmo que pode-se concluir que a política tributária sobre a renda, da forma
como ela está posta, é totalmente injusta na medida em que somente retro alimenta o
acumulo de patrimônio por aqueles que já detém grande parte da riqueza brasileira.
No que tange aos tributos relacionados à Atividade Econômica (IPI, II, IOF, ICMS, ISS,
PIS, COFINS, CSL, CIDE), estes são conhecidos como tributos indiretos. Ou seja, seu
ônus é transferido junto à cadeia econômica, sendo que o destinatário final assume o
ônus de tais tributos de forma integral.
Isto decorre tanto de seu regime de apuração previsto em lei - sistema crédito X débito
onde o tributo é calculado sobre o saldo financeiro da operação - quanto por cálculos
financeiros utilizados pelas empresas no cálculo do custo final do preço do bem que
circula economicamente (a expressão circulação aqui pode lembrar o ICMS, porém sob
a análise pretendida, também cabe ao serviços).
Claro que há exceções, ainda que não totalmente verdadeiras, como é o caso do IOF
(cujo valor é destacado pelos Bancos nos demonstrativos de suas operações de crédito),
ou até mesmo do PIS e da COFINS, aos quais em 2003 e 2004 foi instituído o regime da
cumulatividade e o da não cumulatividade, regime este de opção das empresas em razão
das peculiaridades de sua atividade econômica.
Mesmo assim, a máxima de que, financeiramente falando, tais custos são repassados na
cadeia econômica ainda é verdadeira, pois repise-se, o custo financeiros destes tributos
acima destacados, sem sombra de dúvidas, são observados na composição do preços ao
destinatário final de determinado produto e/ou serviço.
Não obstante a injustiça deste sistema, pois como já dito, se presta a iludir e enganar o
cidadão comum, poderia se dizer tal sistema seria justo pois paga mais quem consome
mais. Ledo engano.
Para comprovar isto, socorro-me mais uma vez a uma conta perversa, mas não muito
longe da realidade.
Para tanto, comparemos essa família com uma família que ganha mais de 20 salários
Mínimos (R$ 10.375) de acordo com os percentuais indicados na tabela 8 do referido
Estudo. Eis os resultados:
Quadro 07 A - Percentuais de despesas de acordo com Tabela 8 "Pesquisa de
Orçamentos Familiares 2008-2009 - Despesas, Rendimentos e Condições de Vida"
Até R$ Mais de
830 R$10375
% R$ % R$
Outras despesas (vestuário, lazer ICMS 18%, PIS 1,65% COFINS 7.2%,
etc) IPI 5%
As alíquotas acima foram utilizadas somente para efeitos de comparação e podem não
corresponder à realidade praticada por Estados e Municípios. Também não foram
incluídos outros tributos, sejam relacionados à renda, sejam relacionados à atividade
econômica, na medida em que os acima indicados são os principais tributos incidentes
sobre a atividade econômica.
% R$ % somado R$
% 16.27%
% R$ % somado R$
% 12.00%
E isso, não obstante a igualdade de alíquotas para uma mesma compra, a diferença
reside na necessidade para uma vida minimamente digna. Por isso que o peso da
alimentação sobre a renda bruta familiar é maior para a familia que vive com R$ 830,00
(27,8%) do que para a familia que vive com 10.375 (8,5%). Sem analisar a qualidade,
com essa diferença, aqueles que possuem maior rendimento podem investir tanto em
educação (300% de diferença na comparação acima) como também no acumulo de
riquezas.
4) CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES
Em 2009, o PIB brasileiro foi de R$ 3,004 trilhões de reais. Como podemos pretender
um melhor desenvolvimento econômico se a principal tributação - aquela incidente
sobre a atividade econômica - equivale a 29,42% do PIB (R$ 464 de tributos sobre a
atividade econômica e R$ 420 Bilhões de tributos sobre a renda que são repassados
financeiramente ao custo dos produtos e serviços).
Não nego que, principalmente nos últimos 8 anos, essa questão foi finalmente
enfrentada, ainda que timidamente, com a instituição de novas faixas de alíquotas para o
Imposto de Renda e os regimes do PIS e da COFINS alterados entre 2003 e 2004.
Porém tais avanços foram insignificantes, haja visto não terem alterado a estrutura
tributária vigente de forma sistêmica.
Quanto às recomendações que faço para a reforma tributária, a meu ver os princípios
dos Direitos Humanos e Democráticos devem estar acima de tudo. O respeito aos 4
pilares fundamentais previstos em nossa Constituição - Igualdade ou Capacidade
Contributiva, Liberdade, Legalidade e Anterioridade devem pautar efetivamente toda a
reestruturação do Sistema Tributário Nacional.
Por sua vez, de forma a permitir uma verdadeira compreensão dos cidadãos quanto a
carga tributária, o legislador deve primar pela simplicidade e objetividade. Expressão
dessa recomendação é a necessidade de se evitar legislar por exceção, de forma a
atender interesses específicos. Ou seja, o trinômio Fato Gerador, Base de Cálculo e
Alíquota devem estar preceituados de forma clara e concisa, sem quaisquer exceções
escondidas de forma subterfugia em textos legislativos confusões e conflitantes editados
na calada da noite.
Deve-se evitar a concentração de Poder junto à União Federal, caso seja mantida a
opção pela manutenção do Federalismo, de forma a que a arrecadação tributária seja
descentralizada e desburocratizada e traga efeitos práticos sensíveis aos cidadãos de
cada cidade.
Com relação à carga tributária relativa à renda deve-se adotar um sistema de faixas de
alíquotas que valham para toda a população indistintamente - sejam rico ou pobre,
pessoa jurídica ou física - não se permitindo quaisquer exceções, porém respeitadas as
características conceituais do que vem a ser renda e lucro.
No que tange aos tributos sobre a atividade econômica deve-se estabelecer a sistemática
do Imposto sobre Valor Agregado, com a unificação de todos os tributos existente sobre
o mesmo, onde o valor do tributo somente será efetivamente suportado no final da
cadeia de consumo, de forma destacada ao preço apresentado.
Não quero parecer ser simplista, mas em resumo, estas são as premissas que acredito
trazerem uma verdadeira justiça tributária para nosso país.
De qualquer forma, sem muitas esperanças de que seja atendido, insto esse novo
Governo que ora se inicia a romper com uma estrutura tributária arcaica, injusta e
criminosa sob a ótica dos Direitos Humanos, de forma a fazer valer os valores
constantes em nossa Constituição.
Com certeza esse será um processo longo e que trará acalorados debates. Porém ele
deve ser enfrentado de forma transparente, sob o pressuposto da conscientização da
população - isso mesmo dos 190 milhões de brasileiros - de forma a garantir sua
participação ativa, cuja decisão final deva ser referendada por todos e não a cargo de
meros 513 deputados e 81 senadores, os quais em 45 anos de vida política,
reiteradamente quedaram-se silentes quanto ao tema.
[1] A contribuição de melhoria é aquela decorrente de obra pública que, diretamente, traga acréscimo de
valor (melhoria) ao patrimônio de um cidadão ou conjunto de cidadãos devidamente identificados.
[2] Exceção à regra das contribuições são as contribuições previdenciárias, onde é defeso aos Estados e
Municípios a cobrança de contribuição previdenciária para custear a aposentadoria de seus servidores
públicos.
[3] 11% para aqueles que ganham até 1.499,15 mensais pois este é o limite de isenção do IR, 38,5%
para aqueles que ganham acima de R$ 3743,19 mensais
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-70772009000100004