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A mais recente avaliação anual da economia pelo FMI indica que, embora as taxas de
crescimento em 2014 tenham ascendido a 9,2%, os índices de pobreza na RDC ainda estão
entre os mais altos do mundo. E, conquanto o relatório assinale algumas melhorias no plano
social, como o melhor acesso à educação, é pouco provável que o país alcance qualquer um
dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio.
Numa entrevista ao Boletim do FMI, Norbert Toé, chefe de missão do FMI para a República
Democrática do Congo, discorre sobre como as autoridades estão a trabalhar para o aumento
e a melhor distribuição das receitas públicas originárias do sector mineiro.
Boletim do FMI: O que salta aos olhos ao ler este relatório é como o país conseguiu
manter uma das mais elevadas taxas de crescimento do mundo e, em simultâneo, um dos
piores ambientes de negócios, segundo as Nações Unidas. Como isso é possível?
Toé: Uma coisa que se deve ter em mente é que o crescimento elevado ao longo dos últimos
anos foi impulsionado principalmente pelo sector mineiro ou, em termos mais gerais, o sector
de recursos naturais, porque além da mineração do cobre, diamantes, ouro, etc., a RDC
também exporta petróleo. Então o crescimento económico é, de modo geral, movido pelo
sector mineiro, que é um sector de enclave intensivo em capital. Assim, ele não emprega um
grande número de pessoas no sector formal.
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Toé: Sim, definitivamente. O governo adotou um código para o sector, o Código Mineiro de
2002, que muitos consideram por demais generoso com o sector em termos de medidas
tributárias e segurança do regime tributário. Quando os investidores estrangeiros trazem
capital, o ambiente é estabilizado em benefício deles. Isso atraiu um volume substancial de
investimentos diretos estrangeiros para o país.
Boletim do FMI: Parece que grande parte da riqueza e dos lucros que estão a ser
produzidos no sector dos produtos de base não se traduziu ao longo dos anos em
benefícios para a população em geral. As taxas de pobreza ainda são extremamente
elevadas. E, mesmo com alguns avanços em termos de acesso à educação, por exemplo,
o relatório indica que nos últimos 10 anos a pobreza quase dobrou. Por que as pessoas
não conseguem sair da pobreza por seus próprios meios?
Toé: Como eu disse antes, o sector das minas, em particular, e o sector dos recursos naturais,
de modo geral, atuam como um enclave. O capital entra, eles exploram e exportam os
recursos naturais, repatriam os lucros. O que resta ao país, basicamente, são os impostos que
o governo recolhe. Mas, repito, o Código Mineiro de 2002 é excessivamente generoso, então
o que o Estado recebe não é muito.
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E, para piorar a situação, temos a questão da transparência na gestão dos recursos naturais.
Como foi assinalado, parte da receita pública do sector das minas foi destinada à educação, e
parte ao sector da saúde. Então houve progressos, mas não o suficiente. E, como foi dito, as
taxas de pobreza ainda são elevadas.
Boletim do FMI: O relatório mostra que a queda dos preços dos produtos de base em
todo o mundo é um risco para a taxa de crescimento do país, mas indica também que as
próximas eleições gerais no país agravarão as pressões sobre um orçamento que é muito
limitado. A eleição geral é de facto um passivo financeiro?
Toé: Sim, é isso mesmo: o orçamento é limitado. A RDC, um país de grandes dimensões,
tem um orçamento anual de cerca de USD 5 mil milhões. O custo das eleições, segundo a
Comissão Eleitoral Independente, é de USD 1,1 mil milhões, ou seja, cerca de um quinto do
orçamento de USD 5 mil milhões. Então é fácil imaginar a pressão que isso representa sobre
os recursos limitados do governo.
Boletim do FMI: Voltando à queda dos preços dos produtos de base — sobretudo o
cobre, que é muito importante na RDC — qual a gravidade do impacto sobre o país?
Porque sabemos que a maioria dos congoleses dirá que, enfim, nunca beneficiaram dos
preços elevados desses produtos. O que se pode fazer para transformar os abundantes
recursos naturais da RDC em algo que beneficie a maioria dos congoleses?
Toé: Duas coisas me ocorrem. O novo código das minas, porque, como já disse, o Código
Mineiro de 2002 era por demais generoso, e por isso o governo está a estudar um novo
código. E nós do FMI temos prestado aconselhamento ao governo para garantir que o novo
código de minas esteja alinhado com as melhores práticas internacionais e abrace a
transparência, porque a governação e a transparência na gestão dos recursos naturais figuram
entre os principais problemas que as autoridades congolesas estão a enfrentar.
Estimamos que, mesmo sem contar a generosidade do Código Mineiro de 2002, o governo
poderia ter acumulado mais recursos se tivesse fortalecido a governação do sector e se a
gestão dos recursos naturais fosse mais transparente; esse é o segundo elemento. Então a
queda dos preços dos produtos de base naturalmente vai reduzir parte da receita pública.
Contudo, se o governo garantir que o novo código das minas seja transparente e alinhado
com as melhores práticas internacionais, ele poderia obter mais recursos e transformar esta
vasta riqueza em desenvolvimento, em benefício de toda a população.
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