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Leitura dos Instrumentos

Linguísticos e Formação Docente


Profa. Dra. Adriana Viana Postigo Paravisine
Módulo 2 - As “gramáticas” na
escola
Unidade 1 - A gramática na sala de aula
A gramática e suas definições

● “Toda vez que se fala em GRAMÁTICA, é


necessário especificar-se muito claramente
de que é que se está falando, exatamente. É
possível ir desde a ideia de gramática como
‘mecanismo geral que organiza as línguas’
até a ideia de gramática como ‘disciplina’”
(NEVES, 2011, p. 29).
Fonte: Freepik

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A gramática e suas definições

[...] são múltiplos os tipos de ‘lições’ que uma gramática da língua pode
fornecer: no modelo normativo puro, a gramática como o conjunto de
regras que o usuário deve aprender para falar e escrever corretamente a
língua; no modelo descritivo ou expositivo, a gramática como conjunto
que descreve os fatos de uma dada língua; no modelo estruturalista, a
gramática como descrição das formas e estruturas de uma língua; no
modelo gerativo, a gramática como sistema de regras que o falante
aciona intuitivamente ao falar ou entender sua língua; e assim por diante.
(NEVES, 2011, p. 29).
A gramática e suas definições

● “Uma das questões fundamentais no estudo do


desenvolvimento das ‘lições’ gramaticais, entre nós, está na
implicitação que caracteriza a natureza normativa das obras
gramaticais do Ocidente, incluídas, aí, obviamente, as
gramáticas de língua portuguesa [...] as nossas gramáticas em
geral não podem ser acusadas de explicitamente
prescritivistas, já que, para citar dois pontos:” (NEVES, 2011, p.
30).
A gramática e suas definições

1. “São raras as marcas injuntivas da linguagem, isto é, não se diz


explicitamente ‘use isto e não aquilo’, ou ‘deve-se usar isto e não
aquilo’.”
2. “É evidente um desenvolvimento taxonômico das lições, apoiado
numa ‘definição’ lógica das entidades em exame”
(NEVES, 2011, p. 30).
A gramática e suas definições

“Entretanto, levantada a capa, exatamente nesses mesmos dois


pontos, tem-se a situação que esquematiza a seguir.”
1. “Em relação às marcas de injunção: o deôntico – o dever ser –
é necessariamente depreendido dos ‘exemplos’ oferecidos,
sempre pertencentes a textos consensualmente tidos como de
boa linguagem, e também está escandalosamente presente na
figura da exceção, talvez a maior chave da interpretação do
discurso da gramática tradicional” (NEVES, 2011, p. 30).
A gramática e suas definições

2. “Em relação ao desenvolvimento taxonômico das lições:


A taxonomia oferecida é, no fundo, paradigma, e isso em dois
sentidos.” (NEVES, 2011, p. 31).
A gramática e suas definições

a. “É paradigma como ‘esquema’ comparável aos esquemas que


organizam entidades na botânica ou na zoologia, por
exemplo: é neutro, é descritivo. E, afinal, há simplesmente o
quadro que explicita a organização de um sistema de
entidades. Resumindo: no fundo, diz aquilo que uma língua é.
Diz, por exemplo, que tal substantivo, em português, é
masculino” (NEVES, 2011, p. 31).
A gramática e suas definições

b. “É paradigma como ‘parâmetro’, já não neutro e descritivo, mas


modelar. Afinal, é um esqueleto comprometido, resultante do
desvestimento daquilo que ‘deve ser’ e de sua colocação em
termos de organização dos subsistemas. Então,
necessariamente exclui ‘o que não deve ser’. Resumindo: no
fundo, diz que a língua deve ser. Diz, por exemplo, que a
primeira pessoa do singular do pretérito perfeito do verbo fazer
é eu fiz, o que implica que não pode e não deve ser eu fazi”
(NEVES, 2011, p. 31).
A gramática e suas definições

“Não se pode ignorar a tensão que fica criada nos dois planos,
que são:

1. O plano da interpretação da linguagem das gramáticas, como


caracterizadas por:
a. Ausência de marcas de injunção
b. Exemplaridade de amostras” (NEVES, 2011, p. 31).
A gramática e suas definições

2. “O plano da interpretação do paradigma depreendido da


taxonomia, como

a. Um esquema neutro de organização de entidades


b. Um parâmetro que se oferece como modelo” (NEVES, 2011,
p. 31).
A gramática e suas definições

● “Praticamente os mesmos quadros que asseguram um lugar


em uma classe para cada uma das diversas formas da língua
constantes da gramática de Dionísio, o Trácio [1883], estão
nas nossas gramáticas tradicionais” (NEVES, 2011, p. 31).
A disciplina gramatical na atualidade

● “Por que as gramáticas


continuam a veicular padrões?
Literatura ameaçada não temos.
Língua em extinção não temos”
(NEVES, 2011, p. 34).

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O papel da linguística na atual
disciplina gramatical

→ Os estudos variacionistas.

→ Os estudos sobre oralidade.

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A sustentação de um padrão modular

● “Os homens, apesar de toda a retórica da igualdade, apreciam


a diferença. Tanto é verdade que, quando ela não existe,
inventam-na. A etiqueta tem esse papel. Não é à toa que o
compartimento mais cultuado da língua seja a correção,
porque falar correto é um índice marcante de pertinência ao
grupo social de mais prestígio” (SAVIOLI, 2000, p. 323).
A questão vista no contexto de uma
teoria sobre o funcionamento da
linguagem
● “[...] o desenvolvimento dos estudos da sociolinguística governa
um olhar sobre os usos linguísticos dos falantes que não se
esgota na análise superficial das expressões linguísticas. Afinal.
Usar a linguagem não constitui um fato puramente linguístico,
mas cada instância de comunicação é, em primeiro lugar, um
evento humano, e, a partir daí, social e cultural” (NEVES, 2011, p.
37).
A pretensa “normatividade” da
gramática escolar tradicional

● “O exemplo prático que se pode invocar para as reflexões que


aqui se fazem refere-se à natureza dos enunciados linguísticos
que são trazidos às aulas de gramática nas nossas escolas, haja
vista que nos oferecem os livros didáticos mais em uso” (NEVES,
2011, p. 37).
Seleção de enunciados para análise

● Assim, nenhuma lição escolar manda – e acredito que não


mandaria:
1. Classificar o sujeito, em:
Paris eu fico na casa de um amigo.
Ou em:
Esse Agileu também vou te contar
(NEVES, 2011, p.81-82)
Seleção de enunciados para análise

● 2. Classificar o termo sintaticamente grifado na frase:


Isso facilita horrores a amizade entre um homem e uma mulher.
Ou na frase:
Amelinha gostava disso, mas sofria barbaridade pelos outros.
(NEVES, 2011, p.82)
Seleção de enunciados para análise

● 3. Classificar a oração subordinada, em:


Todos, embora gritando, examinam-me dos pés à cabeça
Ou em:
Ainda que mal comparando, o selecionado de 1958 era uma
espécie de Senado do futebol brasileiro.
(NEVES, 2011, p.82)
Seleção de enunciados para análise

● 4. Grifar a oração principal e classificar a oração condicional em:


Ah, se fosse sempre assim!
Ou em:
E assim continuava, não fosse a discussão que acabei de ter com
Dona Leonor
(NEVES, 2011, p.82)
Seleção de enunciados para análise

● 5. Classificar a palavra grifada na frase:


Eu disse que dava os cem pacotes e dou, claro! Mas dou, porém,
com uma condição.
Ou na frase:
Aí está Minas: a mineiridade. Mas, entretanto, cuidado.
(NEVES, 2011, p.82)
Seleção de enunciados para análise

● 6. Dizer se o advérbio “modifica” o verbo, o adjetivo ou outro


advérbio, no enunciado:
O problema, lamentavelmente, vem de muitos anos.
Ou no enunciado:
Eu, francamente, não achava lá muita graça nas piadas de tio
Angelim.
(NEVES, 2011, p.82)
Concluindo…
● “Adquirimos nossa língua (e, portanto, a “gramática” que a
organiza) sem nunca termos tido aulas, e essa aquisição
refere-se especialmente à capacidade que todo falante tem de,
jogando com as restrições de sua língua materna, proceder a
escolhas comunicativamente adequadas, operando as variáveis
dentro do condicionamento ditado pelo próprio processo de
produção. Isso significa dizer que não há discurso sem
gramática, mas que também não há gramática sem discurso”
(NEVES, 2011, p. 85).
● “É lamentável a concessão do espaço da escola para o
tratamento da gramática como mera transmissão e registro de
paradigmas, dos quais se pode, sem medo de errar, dizer que são
a recorrência de esquemas mudos, de esqueletos inexplicados,
que a seguir se vestem com a carne de alguns exemplos que se
adaptem – seja – como for – ao talhe do defunto, oferecendo-se,
então, o produto” (NEVES, 2011, p. 85).
Referências

NEVES, Maria Helena de Moura. Que gramática estudar na escola?: norma e uso na língua portuguesa. ed. 4.
São Paulo: Contexto, 2011. ISBN 9788572442268.

SAVIOLI, F. P. Nem tudo que escandaliza é aberração: “error communis facit jus”. São Paulo: Alfa, 2000. v. 44,
p. 309-330.
Obrigada!

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