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COLÉGIO OBJETIVO

DISCIPLINA: LITERATURA
9º ANO DO ENSINO
FUNDAMENTAL
PROFESSSORA: CONCEIÇÃO NERI
A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE VIDAS SECAS

Nas décadas de 1930 e 40, o Brasil e o mundo viveram


profundas crises, e nesse contexto os romancistas
brasileiros começaram a analisar de maneira crítica e
denunciativa os problemas sociais.
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUAGEM NO ROMANCE VIDAS SECAS

 Nesse período destaca-se o Modernismo que, em sua segunda


fase, fortaleceu ainda mais as ideias divulgadas pela primeira
fase modernista. Os textos da segunda fase caracterizam-se
principalmente pelo regionalismo e pela relação do homem com
o meio social em que vive. Com base nas conquistas da primeira
fase, os autores da segunda resolveram dar um novo tom a
esse regionalismo, evidenciando ainda mais a realidade e os
problemas sociais da época. Dutra (2015) afirma:
 Os romances desta geração eram voltados principalmente para
as causas sociais, exercendo um papel de denúncia e crítica
social. Nessa época, a região da seca nordestina estava muito
visada e, por isso, tornou-se um tema bastante corriqueiro nas
obras. Por conta desse papel social, alguns especialistas
consideram essa fase como “neorrealista”, já que resgata ideais
consagrados pelos romances de Machado de Assis, como, por
exemplo, o condicionamento do caráter humano pelo meio em
que ele vive.

A obra-prima homônima de Graciliano Ramos, Vidas Secas, foi adaptada para a telona por
Nelson Pereira dos Santos. O filme, lançado em 1963, conta a história de uma família pobre da
região seca do Nordeste e sua luta diária por trabalho e comida para sobreviver e superar as
dificuldades do ambiente árido em que vive.
A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 Graciliano Ramos, romancista da segunda fase, escreveu


seu nome na história por meio de seu romance “Vidas Secas”,
publicado em 1938, que contribui de forma significativa para
esse período, através de denúncias dos problemas e injustiças
sociais da realidade vivenciada, assim como muitos autores da
época. Para Maria Helena Patto, Graciliano:
 [...] conheceu por dentro a barbárie das relações sociais e
“metamorfoseou em literatura” a experiência da injustiça e a
revolta contra ela. Publicado em 1938, Vidas secas faz parte do
projeto literário da “geração de 30”, de se valer da arte para
mostrar uma sociedade vincada de espoliação e opressão.
Valendo-se da linguagem oral e regional, Graciliano fala da
decepção política que sobreveio nas décadas de 1930-1940 e
não vê “conaturalidade entre o homem e o meio”, mas, em
cada personagem, “a face angulosa da opressão e da dor”.
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUAGEM NO ROMANCE VIDAS SECAS

 Vidas Secas traz o leitor para dentro da história, uma história


de contradições reais de uma vida que não vive: “nem vida,
nem morte, vidas secas” (PACHECO, 2014, p. 35). O interesse
de Graciliano é pelo homem, o homem da seca nordestina e
suas intempéries, o homem sertanejo que aparece agora
retratado na literatura.
 “Procurei auscultar a alma do ser rude e quase primitivo que
mora na zona mais recuada do sertão, observar a reação
desse espírito bronco ante o mundo exterior, isto é, a
hostilidade do meio físico e a injustiça humana.”
A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 Além da indignação com as questões sociais e opressões sofridas pelos


retirantes, acredita-se que a relação familiar com os pais e a família também
influenciou o pensamento do autor ao escrever os contos que formaram o
romance Vidas Secas. Nogueira Junior (2013) embasa que:
 Graciliano Ramos, nascido em 1892 (...) viveu sob o regime das secas e das
surras que lhe eram aplicadas por seu pai, o que o fez alimentar, desde cedo,
a ideia de que todas as relações humanas são regidas pela violência. Em seu
livro autobiográfico "Infância", assim se referia a seus pais: "Um homem sério,
de testa larga (...), dentes fortes, queixo rijo, fala tremenda; uma senhora
enfezada, agressiva, ranzinza (...), olhos maus que em momentos de cólera se
inflamavam com um brilho de loucura".

A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS
 Na obra em questão o cenário é a caatinga nordestina desolada
pela seca. É um romance cíclico, pois começa a partida de uma
família de retirantes nordestinos fugindo da seca e nela termina,
respectivamente, no primeiro e no último capítulo da obra:
Mudança e Fuga.
 Numa planície comida pelo sol, os juazeiros verdes. Em seguida, a
família, cansada e faminta; os pertences cabem num baú de
folha, que vai na cabeça, além de um aió, uma cuia e uma
espingarda sem munição. Buscam sombra, mas os juazeiros se
comportam à maneira de uma miragem [...]A descrição termina
com “o voo negro dos urubus” fazendo círculos em redor de
animais moribundos. A sobreposição de paisagem, homens, bichos
é ressaltada pela montagem que intercala a descrição do quadro
à das pessoas, e destas à dos moribundos e necrófagos, dando a
ver a violência generalizada num mundo apenas aparentemente
inabitado por outros homens, que deixaram estes à própria sorte.
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUEGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 A obra que possui 13 capítulos contempla a trajetória de uma


família de retirantes que necessita migrar de tempos em tempos para
fugir da seca, em busca de melhores condições de vida. “A partir de
uma situação de carência extrema, o romance movimenta uma família
sertaneja, tangida pela seca – Fabiano, sinha Vitória, o menino mais
novo, o menino mais velho e a cachorra Baleia” (REIS, 2012, p. 192).
No romance, as personagens, devido a vida sofrida, a opressão e as
injustiças sociais tornam-se rudes e ignorantes. “O destino é incerto, mas
a vontade de viver impõe a caminhada contra a morte, que espreita a
cada passo. A esperança renasce da nuvem que surge acima do
monte e anuncia o fim da estiagem, mas a promessa de renascimento
de plantas, animais e homens é tênue”.
A REALIDADE SOCIAL E ALINGUGEM NO ROMANCE VIDAS
SECAS

 Fabiano é bruto e duro como a terra seca do sertão e sua linguagem acompanha
isso, ele está sempre dividido entre a revolta e a passividade, sendo que predomina
a segunda devido à linguagem escassa que possui.
 Sinhá Vitória tem espírito inconformado, sonha em ter uma cama de couro
como a de um antigo patrão, pois dorme em uma cama de varas, é uma pessoa
queixosa e amargurada pela falta de perspectiva para a família, mas é a única da
família que consegue pensar com clareza.
 Os filhos não possuem nomes, são chamados de Menino Mais Novo e Menino
Mais Velho, se tornam a representação do anonimato dos meninos nordestinos; o
mais novo sonha em ser vaqueiro como o pai para impressiona-lo; o mais velho
deseja aprender as palavras, tinha um vocabulário tão minguado que era
comparado a um papagaio morto, valia-se de exclamações e gestos.
A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS
 E, finalmente, a personagem Baleia, a cadela de estimação: considerada como
um membro da família é a personagem mais humanizada, por sempre ter
disponibilidade de ajudar e dar carinho a todos.
 No decorrer da análise, Graciliano Ramos demonstra indignação ao
evidenciar as dificuldades sofridas pelos sertanejos. A narrativa denuncia as
condições de miséria e o desamparo social, retrata a seca do sertão nordestino, as
dificuldades sociais e comunicativas, as injustiças, os sonhos, as esperanças e
pequenas alegrias.
 Como crítica social, a obra trabalha as raízes da opressão no Brasil,
principalmente no campo brasileiro, para isso cria personagens opressoras e
oprimidas. Através das personagens mostra as dificuldades, tanto sociais como
discursivas, de forma que explora em conjunto a dimensão individual e social de
cada uma, com o objetivo de problematizar as questões sociais em um tom crítico
e denunciativo. A fome, a falta de moradia, a opressão do patrão e do Governo
são elementos que atingem Fabiano e sua família que são desamparados no
campo social e até mesmo no campo discursivo, pela deficiência de
comunicação entre as personagens integrantes da família.

A REALIDADE SOCIAL E A LINGUGEM NO ROMANCE VIDAS
SECAS
 No romance nota-se que a linguagem verbal não é parte predominante do cotidiano das
personagens, como consequência é utilizada como arma de opressão pelas outras
personagens da trama sobre a família de Fabiano, colocando-os na condição de seres
oprimidos e marginalizados. Nota-se o pensamento inferiorizado e confuso do protagonista
da obra no capítulo 11 - O soldado amarelo:
 Aprumou-se, fixou os olhos nos olhos da polícia, que se desviaram. Um homem. Besteira
pensar que ia ficar murcho o resto da vida. Estava acabado? Não estava. Mas para que
suprimir aquele doente que bambeava e só queria ir para baixo? Inutilizar-se por causa de
uma fraqueza fardada que vadiava na feira e insultava os pobres! Não se inutilizava, não
valia a pena inutilizar-se. Guardava a sua força.
 Vacilou e coçou a testa. Havia muitos bichinhos assim, havia um horror de bichinhos assim
fracos e ruins. Afastou-se, inquieto. Vendo-o acanalhado e ordeiro, o soldado ganhou
coragem, avançou, pisou firme, perguntou o caminho. E Fabiano tirou o chapéu de couro.
 - Governo é governo.
 Tirou o chapéu de couro, curvou-se e ensinou o caminho ao soldado amarelo. (RAMOS,
2002, p. 107)
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 A linguagem adotada por Graciliano é fundamental para entender a


obra. É uma linguagem sucinta e sem sentimentalismo, adequada à seca,
um estilo seco que diz muito com poucas palavras; as falas das personagens
são reduzidas, mas no decorrer do romance aparecem alguns diálogos, a
maioria sem conexão, ou seja, sofrem também com a carência na
articulação verbal, consequência das adversidades naturais e sociais.
 A ausência do entendimento do discurso é notória nas relações entre as
personagens e suas ações, onde a comunicação pode ser comparada no
mesmo nível dos animais. Graciliano trabalha a pobreza da fala das
personagens também como crítica a opressão sofrida pelos sertanejos, é tão
grande que lhes tira até mesmo o direito de falar.
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 Observa-se que a realidade vivida por Fabiano e sua família não retrata
somente as dificuldades diante da seca, mostra também o desamparo
social das famílias do Nordeste, as injustiças sofridas pelas camadas menos
favorecidas e oprimida pela miséria e o descaso político. Segundo Rosa
(2002, apud Victor Coelho, 2008), “além do desamparo social (acesso a
moradia, saúde, educação, segurança) está o desamparo discursivo
(formação de valores e ideais), fato que dificulta o sujeito de posicionar-se
e ter voz nas relações de poder e contribui mais ainda para o processo de
exclusão social”.
A REALIDADE SOCIAL E LINGUAGEM NO ROMANCE VIDAS
SECAS

 No decorrer da trama as personagens secundárias contribuem para


a ideia de opressão e desigualdade constantes no livro. A família é
vítima da seca, mas seus problemas também estão no meio social
onde vivem. O patrão de Fabiano representa a repressão política,
pois se aproveita da ignorância do vaqueiro para subtrair o lucro do
funcionário; já o soldado amarelo assume o papel da repressão das
instituições, age de maneira oportunista e corrupta quando se
aproveita da patente, bate e prende Fabiano de forma injusta e
desonesta.
A REALIDADE SOCIAL E ALINGUGEM NO ROMANCE VIDAS
SECAS

 Em Vidas Secas, os meios de opressão não eram apenas das condições


naturais. Fabiano é considerado sem terra, comparado a um nômade, mas
suas andanças não se devem apenas à seca. O protagonista vivencia a
opressão do homem através das relações de poder, que estão presentes em
vários capítulos da obra. No capítulo 10 – Contas – vemos que a
permanência da família na fazenda foi negociada mediante a exploração
do patrão:
 Fabiano recebia na partilha a quarta parte dos bezerros e a terça dos
cabritos. Mas como não tinha roça e apenas se limitava a semear na
vazante uns punhados de feijão e milho, comia da feira, desfazia-se dos
animais, não chegava a ferrar um bezerro ou assinar a orelha de um cabrito.
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUAGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 Se pudesse economizar durante alguns meses, levantaria a cabeça. Forjara planos. Tolice,
quem é do chão não se trepa. Consumidos os legumes, roídas as espigas de milho, recorria
à gaveta do amo, cedia por preço baixo o produto das sortes. Resmungava, rezingava,
numa aflição, tentando espichar os recursos minguados, engasgava-se, engolia em seco.
Transigindo com outro, não seria roubado tão descaradamente. Mas receava ser expulso
da fazenda. E rendia-se. Aceitava o cobre e ouvia conselhos. Era bom pensar no futuro,
criar juízo. Ficava de boca aberta, vermelho, o pescoço inchando. De repente estourava:
 - Conversa. Dinheiro anda num cavalo e ninguém pode viver sem comer. Quem é do
chão não se trepa.
 Pouco a pouco o ferro do proprietário queimava os bichos de Fabiano. E quando não
tinha mais nada para vender, o sertanejo endividava-se. Ao chegar a partilha, estava
encalacrado, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia. (RAMOS, 2002, pag. 92)
A REALIDADE SOCIAL E A LINGUGEM NO ROMANCE
VIDAS SECAS

 O romance foi escrito em 1938, mas se comparado com a realidade


atual brasileira, pode ser considerado atualíssimo. O Brasil é um país onde
as desigualdades sociais e a corrupção crescem gradativamente,
aumentando a exclusão e as injustiças sociais das populações mais
carentes. Em Vidas Secas, o autor torna evidente a realidade injusta,
desumana e desigual do sertão do Nordeste, mas essa realidade,
atualmente, atinge muitas regiões brasileiras também esquecidas,
marcadas por exclusão social, constituídas por milhares de famílias que
vivem abandonadas pelo governo e pela sociedade.
PROBLEMÁTICA E PRINCIPAIS TEMAS

O principal tema é, sem dúvida, a seca. Esse


fenômeno climático é a fonte principal das
preocupações das personagens, que lutam contra
o meio agreste e procuram a sobrevivência a
qualquer custo, o que reflete em seus corpos e sua
alma.
OUTROS TEMAS

* A problemática da marginalização social( A miséria e o


êxodo rural).
O pressão versus submissão.
A incomunicabilidade e a incompreensão nas relações
familiares.
A desumanização das personagens.
A impotência do homem diante da seca.
A revolta contra as injustiças sociais.
A solidão do homem.
Qual o problema social que permeia o livro
Vidas Secas?

Vidas secas trata da constante caminhada dos


retirantes nordestinos, tomando a região Nordeste
como um lugar que não acompanhou o
desenvolvimento do capitalismo brasileiro, é a
crítica sobre a realidade histórica nordestina-
brasileira- universal.
Qual o problema social que permeia o livro
Vidas Secas?

Vidas secas trata da constante caminhada dos


retirantes nordestinos, tomando a região Nordeste
como um lugar que não acompanhou o
desenvolvimento do capitalismo brasileiro, é a
crítica sobre a realidade histórica nordestina-
brasileira- universal.
Qual a importância da obra de Vidas Secas
para a sociedade?

O romance Vidas Secas, publicado em 1938,


consegue a proeza de apresentar de maneira
sintética uma visão da sociedade brasileira em seus
níveis mais profundos. Há a dimensão social da
exploração e da opressão política.

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