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SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO ASHBELL GRENN SIMONTON

PÓS-GRADUAÇÃO EM COSMOVISÃO CRISTÃ


RESENHA ANALÍTICA

Giovanni Roberto Casimiro da Costa

Gonçalves, Cláudio. O Uso Social da Riqueza em João Calvino: O trabalho, o dinheiro, a


propriedade, os juros e o diaconato na época da Reforma Protestante SEBI, 2019.

INTRODUÇÃO

O professor Cláudio Gonçalves trás-nos em sua obra um estudo bem acurado não apenas
do uso da riqueza em João Calvino, mas também nos proporciona uma re exão sobre o
pensamento económico do reformador de Genebra. A obra o Uso social da riqueza em João
Calvino é composta por três capítulos. Primeiro, o nosso autor avalia a economia social no
pensamento de João Calvino salientando sobre a economia social nos tempos bíblicos, a
economia social no tempo de Calvino e sobre a construção do pensamento de João Calvino. No
segundo capítulo, nosso autor se dedica a avaliar o conceito de riqueza de Calvino. Destacando
o pensamento do reformador sobre o trabalho, o dinheiro, a propriedade e os juros. No terceiro e
último capítulo, nosso autor discorre sobre a responsabilidade social de João Calvino, referindo-
se sobre o rico e o pobre, a bene cência e o diaconato.

RESENHAS DAS PRINCIPAIS PARTES

No primeiro capítulo dedicado à economia social no pensamento de João Calvino, nosso


autor começa por re ectir sobre como funcionava a economia nos tempos bíblicos. A premissa
central é o facto de que Deus como criador é o proprietário de todas as coisas, o ser humano
nada tem, sendo apenas o co-regente da criação. Por ocasião da queda, surge a necessidade de
se estipular leis e costumes para que se assegura-se os frutos do trabalho. Israel por ter bem
presente esse pensamento, foi estruturado com base nas diversas leis da colheita.
O autor nos mostra também, que nos tempos bíblicos as pro ssões eram diversas e os
estudiosos “sugerem que dentre as pro ssões mais exercidas no tempo de Jesus, podemos
destacar os: fabricantes de pregos, comerciante de linho, padeiro, fabricante (ou comerciante) de
cevadinha, curtidor, copista, fabricante de sandálias, arquiteto, comerciante de betume, alfaiate
“(p. 33 edição kindle). Além destas, o autor destaca que em Israel também havia lavadeiras,
barbeiros, médicos etc. O autor destaca três classes sociais: os ricos, a classe média e os
pobres. Salienta que em Israel os ricos eram os que faziam parte da corte, os altos negociantes,
grandes proprietários de imóveis; a classe média era composta pelos comerciantes, artesãos e
os que exerciam algum trabalho no Templo. Já os pobres, poderiam ser divididos em dois
grupos, os que trabalhavam para garantir alguma subsistência e os que viviam da mendicância.
O autor tece um comentário interessante sobre a classe pobre dos Escribas declarando o
seguinte:

Uma característica peculiar em Jerusalém eram aqueles que viviam, totalmente ou em


parte, de ajuda alheia. Estes representavam a maioria da população. Dentre estes estavam
os escribas, “era-lhes proibido receber qualquer remuneração pela sua atividade.”.
Entretanto, estes mestres não ministravam suas aulas gratuitamente, também não
cobravam salários; mas, recebiam dos alunos uma quantia que era revertida para o
guardião da “escola”. Por isso que alguns escribas também exerciam outras pro ssões
paralelas. (p.39)

Os Escribas nos evocam a gura dos levitas que eram total dependentes das ofertas e
dízimos para seus sustentos, além deles também os mendigos de Jerusalém formados pelos
coxos, aleijados e todos os que padeciam de alguma enfermidade. Todos eles dependiam do

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sistema bem organizado de bene cência estruturado em Israel, desde as esmolas e a
organização de bene cências das comunidades religiosas a exemplo dos Essênios.
Ao tratar sobre a economia social no tempo de Calvino, o professor Gonçalves destaca
que depois da queda do Império Romano, a Europa acabou por regredir socialmente, se
tornando quase que totalmente agrícola isso durante boa parte da idade média.
No segundo capítulo, o autor trabalha em torno do entendimento de Calvino sobre a
riqueza, descortinando o assunto em torno de quatro tópicos: o trabalho, o dinheiro, a
propriedade e os juros.
Quanto ao pensamento de Calvino sobre o trabalho, destaca que a reforma protestante
cria uma ruptura ao entendimento da época sobre o trabalho. Houve assim a quebra da
dicotomia da idade média. Para o reformador “todo trabalho honesto é louvável, pois Deus o
criou. É o meio para se adquirir riquezas; e manter a humanidade”. Contudo, nossa visão de
trabalho não deveria ser desligada da história da redenção, e no caso devemos levar em conta
que “o trabalho do homem foi corrompido por causa do pecado e, desligado da obra de Deus,
torna-se fonte de problemas, ansiedade, injustiça e opressão”.
Calvino sobre as pro ssões entendia “que as Escrituras proíbem qualquer diferença social
ou preconceito entre os homens, pois não há ocupações indignas. De forma clara e objetiva, ele
evidencia a participação do trabalho humano na obra divina conferindo ao labor humano
dignidade e valor espiritual” (p.81). Assim, a reforma elevou a dignidade de todas as pro ssões a
senso de chamado ou vocação.
Sobre o tópico do dinheiro, Gonçalves diz que “o dinheiro, na doutrina de Calvino, é um
valor diretamente ligado à fé cristã e intrinsecamente associado à vida espiritual – em oposição ao
antagonismo pagão milenar entre os valores espirituais e materiais. O dinheiro, a riqueza e os bens
econômicos são colocados à disposição do ser humano para a organização de sua vida e da
sociedade, o qual é “solidariamente responsável”. Nosso autor mostra que Calvino foi distinto em
sua teologia do dinheiro, já que na idade média o pensamento comum era de se fazer voto de
pobreza para se dedicar a uma vida contemplativa. Calvino dizia que o pecado não estava no
dinheiro, mas no amor extremado a ele, por isso os ricos deveriam precaver-se do orgulho e da
falsa segurança que o dinheiro proporcionava.
Sobre o tópico da propriedade e juros, Gonçalves diz que Calvino entendia que o Estado
deveria intervir na esfera económica quando necessário, buscando a restauração parcial dessa
ordem no conjunto da sociedade, não tanto como produtor de bens e serviços, mas como
regulador de trocas económicas. Salienta ainda que o reformador diz que “o Estado deveria
“garantir a propriedade privada a m de que haja ordem na sociedade. Mas, de outros deve velar
para que a propriedade não se constitua em detrimento da propriedade de outrem e ela sirva
também à colectividade como um todo”.
Quanto à questão dos juros, este foi um assunto muito discutido deparando-nos com
diversas opiniões. Alguns, a exemplo do período escolástico baseados na teoria da
improdutividade de Aristoteles, consideravam ilícita a obtenção de juros sobre dinheiro
emprestado; outros como Tomás de Aquino entendiam que o lucro comercial em si não era moral
nem imoral e o comerciante poderia desfrutar comedidamente tendo algum recurso próprio para
praticar a caridade como recompensa de seu trabalho; Para Calvino era importante diferenciar
banqueiros de usurários. Para Gonçalves, Calvino “defende a legalização da taxa de juros,
defendendo que o comércio do dinheiro deve ser facilitado de acordo com a necessidade de
desenvolvimento da indústria e do comércio”. Salienta também que Calvino classi ca a usura
ilícita na mesma categoria de criminalidade que o homicídio. Assim, o empréstimo a juros deveria
ocorrer desde que o lucro não fosse excessivo.
No terceiro capítulo da obra, relacionado à responsabilidade social de Calvino, Gonçalves
nos leva a entender o pensamento de Calvino sobre o rico e pobre, a bene cência e a obra do
diaconato. O autor esclarece da visAo cristã de que não existe separação entre o material e
espiritual, pois são aspectos interligados. Assim, conforme salientou, Calvino entendia que as
bênçãos materiais do rico deveriam ser utilizadas não apenas para proveito próprio, mas como
um meio para auxílio das necessidades sentidas do próximo. A riqueza só é legítima quando
posta a serviço dos que tÊm falta dela. Por seu turno, o pobre tem alguma vantagem espiritual
sobre o rico pois está menos seduzido pelas riquezas, uma pedra de tropeço para muitos.
Calvino não entendia que a riqueza era má em si, mas apenas que muitas vezes ela se tornava
um instrumento de idolatria. Assim, a vocação do rico era de ser um bom despenseiro de seus
bens. Quanto ao pobre, deveria aprender a disciplina do contentamento con ando na provisão
de Deus e não ambicionando o que não recebeu. É por esta razão que a bene cÊncia deveria
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fazer parte das disciplinas espirituais do cristão “negligenciar os santos, quando necessitam de
nosso socorro, é algo mais do que apenas ausência de bondade; é usurpá-lo daquilo que lhes é
devido.” (p. 146)
Sobre o Diaconato, nosso autor começa por salientar que “o ministério material da igreja
está intrinsecamente ligado com sua vida espiritual e vice versa. Enquanto os anciãos se
dedicam exclusivamente ao ensino da Palavra, os diáconos devem se ater à assistência aos
pobres. É uma tentação muito grande para as igrejas e pastores deixarem o ministério da Palavra
para se ocuparem na obra de assistência social. Não quer dizer que os apóstolos no Novo
Testamento queriam isentar-se do cuidado dos pobres, mas sabiam eles das responsabilidades e
diligências de seu ofício. Não conseguiriam atender aos dois ofícios, ao mesmo tempo, com a
mesma perfeição”(p.153).
Vemos assim que Calvino teve uma preocupação acentuada com a vida social de sua
cidade. Por meio de sua visão Genebra tornou-se um centro de inspiração para outras regiões. A
academia de Genebra foi um grande centro de estudos, os hospitais serviram de auxilio aos
necessitados da cidade e refugiados de diversas partes do mundo.
Em suma, nesta obra vemos um pequeno relato da dimensão deste grande reformador.
De facto sua in uência é expansiva, tem um impacto para cada esfera da vida

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