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VI SIMPODI

SIMPÓSIO SOBRE DIVERSIDADES


RELIGIÃO NO BRASIL: EM BUSCA DO
RECONHECIMENTO E DO RESPEITO ÀS DIVERSIDADES

SOLOMON L. GINSBURG E SUA PIONEIRA PRODUÇÃO MUSICAL NA


DENOMINAÇÃO BATISTA
LUI, Eduard Henry1

RESUMO

O presente artigo pretende apresentar o pioneiro missionário protestante Solomon L.


Ginsburg, um polonês de origem judia que veio ao Brasil no intuito de propagar sua
nova fé, a fé protestante. Fugido de sua casa e de sua cidade por adotar novas
práticas religiosas, o jovem Ginsburg chegou ao Brasil e se converteu à fé dos
batistas, tornando-se um propagador intenso dessa doutrina que há pouco se
apresentava no Brasil. Uma vez aqui estabelecido, ele teve participação inequívoca
na expansão do trabalho missionário denominacional caracterizado como
protestantismo de missão. Nesse contexto, Solomon Ginsburg foi um dos
responsáveis por tornar os batistas conhecidos, representados e legitimados perante
a sociedade brasileira. Não à toa é o mais expressivo representante batista, ainda
hoje reconhecido como missionário fundador do mais importante jornal da
denominação e reconhecido como o pai do Cantor cristão, livro com hinos caros ao
povo batista. O objetivo deste texto é explorar um panorama da música sacra
protestante em paralelo à vida e à obra de Ginsburg. Dessa forma, pretende-se
abordar relações históricas entre a narrativa, a arte e a cultura apresentadas na
trajetória desse missionário, verificar as contribuições dele na elaboração do primeiro
hinário para os cultos da denominação batista, articular temáticas e apresentar alguns
aspectos de sua visão nos hinos presentes no Cantor cristão.

Palavras-chave: Solomon Ginsburg; denominação batista; hinódia protestante.

INTRODUÇÃO

O presente artigo traz como proposta observar a produção musical do pioneiro


no trabalho evangelístico batista Solomon Luiz Ginsburg. Este tópico apresenta
brevemente a sua biografia e, na sequência, traz algumas considerações pertinentes
à sua contribuição na estrutura do hinário Cantor cristão, elaborado por Ginsburg para
os cultos batistas no início do século XX, um dos alicerces da fé batista no Brasil.

1
Doutorando, Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, Paraná, eduard.lui@ifpr.edu.br.

INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ


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Solomon L. Ginsburg (1867-1927) é um nome presente e constante nas


narrativas sobre a construção da identidade dos batistas no Brasil, juntamente a
outros cinco missionários: William B. Bagby (1855-1939), Zacaryas C. Taylor (1851-
1919), William Entzminger (1859-1930), Eurico Nelson (1862-1930) e James Taylor
(1855-1924). Foi o trabalho desses seis pioneiros que levou ao planejamento e à
criação da atual Convenção Batista Brasileira (PEREIRA, 1979, p. 92).
Dada a importância e relevância dos seis missionários pioneiros, Solomon L.
Ginsburg deixou marcas bastante profundas e permanentes, desde a construção de
escolas à elaboração de hinários. Solomon nasceu perto do município de Suwalki, na
Polônia, em agosto de 1867. Sua família era judia, e seu pai, especificamente,
desenvolvia funções de um rabino (GINSBURG, 1970, p. 21). Solomon converteu-se
ao protestantismo e, por isso, teve de deixar a sua casa. Próximo da doutrina
protestante, e já no Brasil, dissuadiu-se por abraçar os preceitos doutrinários dos
batistas. Em 1890, trabalhou como missionário em terras brasileiras e estabeleceu
residência em cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, além de ter
viajado por outros estados.
Devido ao seu projeto de evangelização, Solomon L. Ginsburg em pouco tempo
familiarizou-se com a língua portuguesa e, no Brasil, foi responsável pela construção
de dois expressivos sustentáculos da fé dos batistas: O jornal batista, do qual foi editor
e patrocinador em seus primórdios, e o Cantor cristão, primeira coletânea de hinos
dos batistas, do qual foi organizador.
Boa parte da cosmovisão de Solomon L. Ginsburg pode ser analisada por meio
da extensa obra que ele deixou na hinologia batista (OLIVEIRA, 2002, p. 78). No
Brasil, fundou um jornal evangélico com oficina própria e, posteriormente, doou essa
oficina à Convenção Batista Brasileira, dando início ao acervo da Casa Publicadora
Batista e à publicação d’O jornal batista, que começou a circular em 1901 e tem
edições até o presente.

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De acordo com Oliveira (2002), a organização de uma Convenção Batista


Brasileira foi ideia de Solomon L. Ginsburg. Ela se concretizou em 1907, com a adesão
de outros líderes batistas no Brasil. Ginsburg foi pioneiro em muitas atividades
relacionadas às práticas da fé batista no Brasil. De acordo com sua autobiografia, ele
foi o primeiro a pregar em praça pública, e a ser apedrejado. Também foi um árduo
defensor da instalação de escolas confessionais batistas, organizou o primeiro hinário
batista, o primeiro jornal, e, sobretudo, foi um grande organizador de igrejas. Em
Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Holanda (1995) afirma que o espírito de
organização e o sentido de planejamento estavam ausentes entre os ibéricos, mas
que eram uma característica dos povos protestantes. Isso se confirma, em parte, pela
ação de Ginsburg como missionário protestante no Brasil.
Para além de suas atividades missionárias, Ginsburg foi também um grande
articulador político. Na Primeira República do Brasil, constituída por uma maioria
significativa de católicos, Ginsburg transitou por diferentes círculos políticos nas
cidades por onde passou. Mas também criou desafetos: em São Fidélis, Rio de
Janeiro, chegou a ficar preso por 10 dias por “pregar o evangelho”. A cidade, no
entanto, tem atualmente mais de 30 igrejas batistas. Um fato que explica essa
mudança talvez seja sua relação com a Maçonaria, da qual foi membro ativo,
chegando a fundar uma loja maçônica nessa mesma cidade. O site da Loja Maçônica
Auxílio à Virtude anuncia que:

O então missionário “Solomon L. Ginsburg”, sentindo a necessidade


de difundir o cristianismo, foi o fundador e grande aglutinador para a
fundação da Loja, onde, juntamente com mais vinte e quatro Maçons
da cidade de Campos dos Goytacazes, todos pertencentes à Loja
Maçônica Progresso, reuniram-se e decidiram fundar a Loja Maçônica
Auxílio à Virtude, para, acima de tudo, amparar as ideias
evangelizadoras do Irmão Solomon L. Guinsburg. [...] Nas
dependências da Loja Auxílio à Virtude já funcionaram, dentre outras,
escola de ensino noturno em 1924 e escolas profissionalizantes em
1956. (SÃO FIDÉLIS, 2022)

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Ginsburg atuou basicamente no Rio de Janeiro, Pernambuco, Alagoas e São


Paulo, onde veio a falecer em 1º de abril de 1927. Sua trajetória pública pode ser
mapeada, principalmente, por três meios: sua autobiografia, suas composições para
o Cantor cristão e seus escritos n’O jornal batista. Considerado um “herói da fé” por
muitos batistas, a sua trajetória no meio maçônico ainda causa controvérsias 2. No
entanto, suas ideias e seus projetos estruturam algumas tradições da comunidade
batista em formação no Brasil.

OBJETIVOS GERAL E ESPECÍFICO

O objetivo geral desta proposta de pesquisa consiste em observar a vida e a


obra de Solomon Luiz Ginsburg a fim de traçar características peculiares da
comunidade evangélica de denominação batista que se formou a partir do final do
século XIX, início do século XX, no Brasil.
Este texto trata especificamente da produção musical de Ginsburg na
composição e adaptação de hinos. Busca também observar como a música entre os
batistas consagra ou reforça determinada cultura ou teologia, e verifica se as escolhas
de Ginsburg quanto aos temas de seus hinos reforçam a doutrina evangélica dos
batistas no Brasil.

METODOLOGIA

Consideramos como recurso metodológico para pesquisa histórica o uso de


uma metodologia mista, com o uso da imprensa protestante como local de fala de
Solomon L. Ginsburg, conforme aponta Michel de Certeau (2011). Destacamos como
fonte periódica, portanto, O jornal batista, que acompanha a atividade das diversas
instituições batistas pelo país. Outra abordagem a ser utilizada é por meio da análise

2 Para muitos evangélicos, principalmente os mais puristas, era incompatível ser cristão evangélico e pertencer a
uma ordem maçônica. Temos, por exemplo, o apontamento de muitos comentaristas do meio evangélico
associando esse fato como elemento-chave para a divisão da Igreja Presbiteriana do Brasil e Igreja Presbiteriana
Independente.

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e das percepções de suas composições presentes no primeiro hinário dos batistas no


Brasil, o Cantor cristão, organizado por Ginsburg e que tem um enorme significado
afetivo para os batistas das primeiras gerações.
Ginsburg deixou registros em diversos acervos, que podem ser acessados em
seus respectivos formatos físicos ou virtuais, quer seja em jornais, revistas, ou nas
memórias autorreferenciais e na produção cultural de criação e tradução de hinos.
Este primeiro passo inicia-se analisando os hinos compostos e traduzidos por
Ginsburg, observando as principais referências de compositores e letristas e as
temáticas mais abordadas pelo missionário.
Foi criada uma tabela com o nome do hino e sua localização, considerando que
o Cantor cristão não é mais editado; também foi feita uma comparação com o novo
hinário utilizado nas celebrações batistas, o Hinário para o culto cristão (HCC).
A proposta é ampliar esta análise para verificar as estruturas musicais, ampliar
a discussão sobre as temáticas e traçar paralelos com as demandas presentes nos
editoriais do Jornal batista, também por ele escrito. Ao fim, são avaliados padrões
temáticos que se tornaram caros aos batistas ao longo do século e que os
caracterizam atualmente.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Ginsburg foi considerado o pai do Cantor cristão, uma coletânea de hinos e


músicas cristãs tradicionais de várias épocas, da Igreja Batista, criado em 1891, e que,
em sua primeira edição, continha apenas 16 hinos. As edições se sucederam, sendo
sempre acrescidas de hinos novos. Em 1921, na 17ª edição, a obra já contava com
571 hinos, dos quais 89 eram traduções feitas por Ginsburg e 13 de sua autoria. Em
sua maioria, as letras dos hinos compostos por Ginsburg tratavam de questões caras
à doutrina, como o batismo, a ceia e a evangelização.
Em 1914, foi anunciada a impressão do Cantor cristão com partitura, a ser
lançada na Assembleia da Convenção Batista Brasileira de 1915, mas, com o início

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da Primeira Guerra Mundial, os planos de Ginsburg foram limitados, e o hinário teve


o lançamento adiado para 1924. Ao longo do século XX, foram lançadas várias
edições. O hinário passou por diversas revisões e foram acrescidos novos hinos. A
última versão, a 37ª edição, contém 581 hinos. Os principais autores que contribuíram
com hinos para o Cantor cristão foram Solomon L. Ginsburg, com 105 hinos, sendo
que 81 são traduções, 10 são adaptações de letras de outros autores e 14 são de sua
autoria; William E. Entzminger, com 72 hinos, sendo que 16 são originais e 56 são
traduções ou adaptações de outros hinos; Henry Maxwell Wright contribuiu com 61
hinos; o pastor Manuel Avelino de Souza é responsável por 29 hinos; e Ricardo
Pietrowsky contribuiu com 23 hinos.
Entre os 105 hinos que foram trabalhados por Ginsburg, é importante ressaltar
a constante presença de temas relacionados ao avivamento, a adoração e louvor,
apelos evangelísticos e chamadas à evangelização. Ele também contribuiu com hinos
que reforçam a identidade dos batistas como o próprio batismo e a ceia do Senhor.
Um dos compositores presente nos hinos traduzidos e adaptados por Ginsburg
é Ira Sankey, mas a maioria é do compositor James McGranahan, um músico
americano considerado muito talentoso e culto que viveu de 1840 a 1907. Ele era
dotado com uma voz de tenor rara e estudou durante anos com professores eminentes
que o incentivaram a se preparar para uma carreira nas óperas; no entanto, acabou
se dedicando principalmente à composição de hinos cristãos.
Com letristas, Ginsburg teve como sua principal fonte os hinos escritos por
Fanny Jane Crosby, uma famosa compositora cega, que tinha mais de oito mil
poemas, a maioria não musicado. Ela foi muito influente com músicas que se
eternizaram na memória dos protestantes. Nascida nos Estados Unidos, a
compositora ficou cega com pouco mais de um mês de vida. Seu testemunho de vida
era frequentemente apresentado em campanhas evangelísticas. Pelo Rev. Moody,
conheceu Ira Sankey, que musicou alguns de seus poemas. Gisnburg traduziu e
adaptou 14 hinos de Fanny.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As músicas compostas e traduzidas por Ginsburg fazem parte de uma memória


afetiva dos batistas no Brasil. O Cantor cristão, embora não mais publicado, é ainda
muito citado nos púlpitos pelos pastores e sempre suas músicas ganham novas
roupagens musicais.
No meio batista, o Cantor cristão foi substituído pelo Hinário para o culto cristão
(HCC), no ano de 1991. Esse hinário teve como proposta atualizar os hinos caros aos
batistas em questões gramaticais e adaptações para uma linguagem mais adequada
aos tempos atuais. Além de trazer novos compositores – mais contemporâneos –, a
proposta foi de incrementar o hinário agrupando leituras e músicas de acordo com
temáticas selecionadas, facilitando a utilização nos cultos batistas.
O Hinário para o culto cristão trouxe 441 hinos, desses, 179 são oriundos do
Cantor cristão. Desses 179 hinos, 30 são de Solomon Luís Ginsburg, o que demonstra
a permanência dos valores e conceitos do missionário. Como dito anteriormente, há
uma proximidade afetiva muito intensa dos batistas com o Cantor cristão, a ponto de
muitas igrejas batistas no Brasil manterem durante anos a recomendação aos seus
fiéis para que utilizassem o HCC mas que continuassem levando para o culto o Cantor
cristão.
O tema trabalhado ainda tem muito a ser desenvolvido. Essas são apenas
algumas observações realizadas com base em uma análise sobre os hinos que foram,
de certa forma, contribuições de Solomon Luíz Ginsburg para a formação da
identidade batista no Brasil.

REFERÊNCIAS

CERTEAU, Michel. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011.

CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA. Cantor cristão. 4. ed. Rio de Janeiro: Juerp,


1971.

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CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA. Acervo digital “O jornal baptista”.


Disponível em: http://acervo.batistas.com/visualizar.html. Acesso em: 25 mai. 2022.

GINSBURG, Solomon. L. Um judeu errante no Brasil. Rio de Janeiro: Casa


Publicadora Batista, 1970.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras,
1995.

OLIVEIRA, Paulo de Sousa. Música evangélica: o que devemos cantar e tocar?. São
Paulo: Edições Sete, 2002.

PEREIRA, José dos Reis. Breve história dos batistas. Rio de Janeiro: Casa
Publicadora Batista, 1979.

SÃO FIDÉLIS. História da Maçonaria em São Fidélis. Disponível em:


www.saofidelisrj.com.br/historia-da-maconaria-em-sao-fidelis/. Acesso em: 24 jun.
2022.

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