Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
net/publication/312894414
CITATIONS READS
0 846
1 author:
Allan Novaes
Centro Universitário Adventista de São Paulo
16 PUBLICATIONS 19 CITATIONS
SEE PROFILE
All content following this page was uploaded by Allan Novaes on 25 January 2017.
Introdução
1
Movimento protestante reformado do século 20 que rejeita o liberalismo teológico. O termo faz referência
particular ao pensamento de Karl Barth, mas também pode ser aplicado a Paul Tillich, Reinhold Niebuhr e outros. O
movimento é chamado neo-ortodoxia no sentido em que marca um retorno aos temas históricos da Reforma.
2
Única obra de Niebuhr traduzida no Brasil, foi publicada pela editora Paz e Terra em 1967 como Cristo e cultura.
Niebuhr iniciou sua carreira docente no Eden Theological Seminary, em St. Louis,
Missouri, em 1919. Os primeiros anos como professor de teologia renderam três publicações4,
nas quais é possível visualizar o despertar de Niebuhr para a relação igreja-sociedade, que
marcaria as obras The social sources of denominationalism, The kingdom of God in America e
Christ and culture. Um exame mais detido dessa trilogia indica a existência implícita de uma
espécie de teoria orgânica da sociedade, fruto do Evangelho Social 5, “na qual igreja e sociedade
não estão claramente diferenciadas” (FOWLER, 1974, p. 17). Em Yale a partir de 1922 por conta
de estudos doutorais, Niebuhr foi um pensador conhecido por estabelecer diálogos entre as ideias
dos teólogos protestantes norte-americanos e alemães (KLIEVER, 1997, p. 60). Dentre os autores
que fizeram parte do desenvolvimento do seu pensamento teológico, provavelmente o mais
influente deles tenha sido Ernst Troeltsch (FREI, 1965, p. 11 e 64; JOHNSON, 1996, p. xiv;
FOWLER, 1975, p. 22-24).
Ainda em 1924, Niebuhr tornou-se diretor do Elmhurst College, onde seu irmão Reinhold
e ele tinham estudado na adolescência. Em 1927 ele retornou como professor no Eden
3
Sandon Jr. (1971, p. 10) admite a dificuldade de se dividir a vida de Niebuhr em fases, uma vez que “há uma
fundamental consistência temática” em seus escritos. No entanto, sua sistematização não contradiz a descrição que
Niebuhr faz de sua própria trajetória intelectual (NIEBUHR, 1960), e nem as análises do desenvolvimento teológico
de Niebuhr feitas por alguns de seus principais biógrafos, entre eles Diefenthaler (1986) e Paeth (2014).
4
“An aspect of the idea of God in recent thought”, em 1920, “The alliance between labor and religion”, em 1921, e
“Christianity and the social problems”, em 1922.
5
O Evangelho Social é movimento teológico do século 20 que procurou aplicar os ensinamentos da fé cristã aos
problemas criados pelo capitalismo industrial. Um dos principais mentores do movimento foi Walter Rauschenbusch
(1861-1918), autor do livro Theology and the Social Gospel. Uma das grandes contribuições do Evangelho Social foi
imbuir nos teólogos da época forte preocupação com a dimensão social da fé cristã, fazendo com que igrejas
promovessem reformas de vários tipos, apoiassem projetos de assistência social e defendessem a democracia.
Nesse período, Niebuhr publicou The church against the world, em 1935, e The kingdom
of God in America, em 1937, trabalhos com carga sociológica robusta. Focado em analisar a
relação igreja-sociedade e insatisfeito com os resultados utilizados em seu primeiro livro,
Niebuhr escreveu em 1937 The kingdom of God in America7, clássico da historiografia do
cristianismo norte-americano (JOHNSON, 1996, p. xvi). Na obra, Niebuhr continua fazendo uso
de categorias tipológicas ao descrever um panorama da maneira como a ideia de soberania de
Deus mudou na história religiosa norte-americana8. Ainda nessa fase, já se percebia uma
preocupação muito grande do autor em introduzir crítica teológica em seus escritos e, com o
passar dos anos, ocorreria uma reorientação acadêmica: Niebuhr passaria “de um interesse
principal em abordagens sociológicas para uma preocupação primordial com a compreensão
teológica” (POPE, 1965, p. 6).
6
Foi a primeira vez que as tipologias de análise sociológica de Weber e Troeltsch foram aplicadas ao estudo da
tradição religiosa norte-americana (SANDON JR., 1971, p. 23).
7
Essa obra contém a frase mais citada de toda a obra niebuhriana e, de acordo com NOLL (2001, p. 841), a melhor
definição da teologia liberal já escrita: “A God without wrath brought men without sin into a kingdom without
judgment through the ministrations of a Christ without cross” (NIEBUHR, 1988, p. 193).
8
“Da soberania de Deus na época de Jonathan Edwards, para o reino de Cristo nos anos 1800, e finalmente o reino
vindouro para os liberais do século vinte” (NOLL, 2011, p. 841).
Em 1951, Niebuhr publica Christ and culture, último dos livros a trabalhar primariamente
com tipos ideais, e que seria sua obra mais influente e renomada. Nela, Niebuhr constrói uma
tipologia quíntupla de matriz weberiana-troeltschiana, para descrever a postura do cristianismo
em relação à cultura de seu tempo9. Em 1960, afastando-se das abordagens históricas e
sociológicas dos anos anteriores, Niebuhr lançou Radical Monotheism and Western Culture, seu
livro mais filosófico até então, no qual se debruçou sobre a metafísica. No início dos anos 1960,
Niebuhr planejava sua última grande obra sobre teologia e ética. Ele tinha a intenção de concluí-
la após sua aposentadoria, mas, infelizmente, sofreu um ataque cardíaco fulminante em sua casa
de verão em Rowe, Massachusetts, no dia cinco de julho de 1962. Aquela que poderia ter sido
sua magnum opus, coroando as incursões de toda uma vida nas áreas de teologia, ética, história e
sociologia, acabou sendo publicada postumamente de forma fragmentada nos livros The
responsible self, de 1963, e Faith on Earth: an inquiry into the structure of human Faith, em
1989, ambos editados por seu filho Richard R. Niebuhr.
Reflexões
O legado que Niebuhr deixou o qualifica como um dos mais influentes e polivalentes
teólogos de sua geração: “sua teologia confessional e não-apologética” e sua “compreensão não-
defensiva da cultura” (FREI, 1965, p. 89) fazem dele um autor relevante atualmente, cujas obras
deveriam ser consultadas por todos que se debruçam sobre o problema igreja-sociedade. Como se
viu, por conta de seu background teológico formativo, pode-se resumir a carreira acadêmica de
Niebuhr como tendo sido marcada por três características: (1) intercâmbio conceitual e
metodológico entre a teologia e a sociologia; (2) ênfase nas facetas da relação do cristianismo
com a sociedade e com a cultura; e (3) o uso de tipologias de matriz weberiana-troeltschiana. E, a
partir dessas características de sua biografia intelectual, pode-se vislumbrar colaborações ao
estudo da religião, em especial aos campos da teologia e da sociologia.
9
Os tipos são: “Cristo contra a cultura”, “Cristo da cultura”, “Cristo acima da cultura”, “Cristo e a cultura em
paradoxo” e “Cristo, transformador da cultura” (NIEBUHR, 1967).
10
“Em The social sources of denominationalism ele enfatizou a determinância social da vida religiosa na América.
Em The kingdom of God in America ele desenvolveu o significado de uma persistente ideia ética e religiosa para o
movimento cristão. The meaning of revelation foi a tentativa de um teólogo de lidar com o relativismo histórico e
cultural. Christ and culture contém uma importante tipologia para entender os problemas teológicos da fé cristã em
relação a sua configuração cultural, assim como uma breve interpretação da própria posição de Niebuhr. [...] Muitos
dos escritos desconhecidos de Niebuhr também lidaram com facetas particulares de uma teoria social do
cristianismo” (GUSTAFSON, 1965, p. 119 e 120).
11
Perry Jr. (1996, p. 154) afirma que a mente de Niebuhr “funciona” na forma de polaridades, daí boa parte de suas
tipologias apresentarem uma estrutura binomial.
DIEFENTHALER, Jon. H. Richard Niebuhr: A Lifetime of Reflections on the Church and the
World. Macon, Georgia: Mercer University Press, 1986.
FOWLER, James. The theological vision of H. Richard Niebuhr. Eugene, Oregon: Wipf and
Stock Publishers: 1974.
FREI, Hans. “Niebuhr’s theological background”. In: RAMSEY, Paul (ed.). Faith and ethics: the
theology of H. Richard Niebuhr. New York: Harper and Row, 1965. p. 9-64.
GARRET, William. “The sociological theology of H. Richard Niebuhr. In: SWATOS JR.,
William”. Religious sociology: interfaces and boundaries. Contributions on sociology, n. 4. New
York: Greenwood Press, 1987. p. 41-55.
GUSTAFSON, James. “Christian ethics and social policy”. In: RAMSEY, Paul (ed.). Faith and
ethics: the theology of H. Richard Niebuhr. New York: Harper and Row, 1965. p. 119-139.
HIEBERT, Danny. Can we talk? Achieving dialogue between sociology and theology. Christians
Scholar’s Review, v. 37, n. 2, 2008, p. 119-214.
JOHNSON, William (ed.). H. Richard Niebuhr: Theology, history and culture: major
unpublished writings. New Haven: Yale University Press, 1996.
KLIEVER, Lonnie. H. Richard Niebuhr: makers of the modern theological mind. Waco: Word
Books, 1977.
NIEBUHR, H. Richard. Radical Monotheism and Western Culture: with supplementary essays.
New York: Harper & Brothers, 1960.
NOLL, Mark. “Niebuhr, Helmet Richard (1894-1962)”. In: ELWELL, Walter (ed.). Evangelical
dictionary of theology. Grand Rapids: Baker Academy, 2001. p.841.
PAETH, Scott. The Niebuhr brothers to armchair theologians. Louisville, Kentucky: Westminter
John Knox Press, 2014.
PERRY JUNIOR., Leo. A critical and comparative analysis of “ideal” types in the ethics of
Ernst Troeltsch, H. Richard Niebuhr, Eldin Villafañe and Pete Paris. Tese. Doutorado em
Teologia, Lutheran School of Theology at Chicago. Chicago: 1996.