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A obra Primeiros Cantos, embora pertença a primeira geração do

Romantismo no Brasil, apresenta, além do nacionalismo, do


indianismo e da religiosidade, uma diversidade temática, principalmente
na segunda parte.

O livro está dividida em três blocos: Poesias americanas com sete


poemas, Poesias diversas com 31 e Hinos com sete. Neste material,
você terá análise de todos os poemas da primeira e terceira parte
dessa coletânea, mais 18 poemas da segunda parte. Além disso, você
terá 30 questões com gabarito comentado.

Bons estudos!

Professora Faieth é graduada em Letras,


especialista em Literatura, Gramática e
Redação. Ministra Aulas no Ensino Médio
desde 2006. É criadora do canal ‘’Professora
Faieth” e do Blog Língua Portuguesa Truques e
Táticas.
Sumário
POESIAS AMERICANAS-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------4
Canção do exílio-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------4
O Canto do Guerreiro-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------5
O canto do piaga-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------7
O Canto do Índio-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------8
Caxias-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------9
Deprecação-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------10
O Soldado Espanhol -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------12
POESIAS DIVERSAS ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------13
A Leviana--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------13
A Minha Musa------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 14
Desejo------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------15
Seus Olhos -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------16
Inocência --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------18
Pedido ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------19
O Desengano --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------20
Tristeza ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------20
O Trovador ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------22
Epicédio ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------23
Sofrimento ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------25
A Escrava ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------27
Recordação ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------29
O Orgulhoso --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------30
Minha vida e meus amores --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------31
Amor! Delírio – Engano ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------34
O vate -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------36
O oiro ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------38
HINOS ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------39
O Mar ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------39
Ideia de Deus --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------41
O Romper d'Alva ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------44
A Tarde ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------46
O Templo -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------50
Te Deum -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------52
Adeus ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------54
QUESTÕES ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------58
GABARITO -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------73
POESIAS AMERICANAS

Canção do exílio Minha terra tem primores,


Minha terra tem palmeiras, Que tais não encontro eu cá;
Onde canta o Sabiá; Em cismar — sozinho, à noite —
As aves, que aqui gorjeiam, Mais prazer encontro eu lá;
Não gorjeiam como lá. Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores, Não permita Deus que eu morra,
Nossos bosques têm mais vida, Sem que eu volte para lá;
Nossa vida mais amores. Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Em cismar, sozinho, à noite, Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Mais prazer encontro eu lá; Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Há na 1ª estrofe a comparação entre a terra do sujeito lírico e o local onde ele se encontra. Os
advérbios “aqui” e “lá, cá, lá” são usados para mostrar esses dois espaços.
Na 2ª estrofe, o sujeito lírico mostra que o espaço é coletivo. Essa ideia é enfatizada pelo uso
da anáfora no início dos versos. Além disso, nessa estrofe, é evidente a supervalorização da
sua terra.
3ª e 4ª estrofes: solidão do sujeito lírico, que se encontra distante de sua terra. Os elementos
da natureza reaparecem para enfatizar as belezas naturais desse espaço idealizado.
Na 5ª estofe, temos o apelo do sujeito lírico, que se encontra distante de sua terra. As belezas
mais uma vez reaparecem para mostrar a superioridade em ralação ao local de exílio.
Esse poema traz características marcantes da primeira fase do Romantismo na poesia,
como o nacionalismo ufanista por meio da exaltação da pátria e da descrição da natureza, o
saudosismo e a religiosidade.

4
O Canto do Guerreiro [...]
I VI
Aqui na floresta Se as matas estrujo
Dos ventos batida, Co'os sons do Boré, .
Façanhas de bravos Mil arcos se encurvam,
Não geram escravos, Mil setas lá voam,
Que estimem a vida Mil gritos reboam,
Sem guerra e lidar. Mil homens de pé
— Ouvi-me, Guerreiros, Eis surgem, respondem
— Ouvi meu cantar. Aos sons do Boré!
II — Quem é mais valente,
Valente na guerra — Mais forte quem é?
Quem há, como eu sou? VII
Quem vibra o tacape Lá vão pelas matas;
Com mais valentia? Não fazem ruído:
Quem golpes daria O vento gemendo
Fatais, como eu dou? E as matas tremendo
— Guerreiros, ouvi-me; E o triste carpido
— Quem há como eu sou? Duma ave a cantar,
[...] São eles — guerreiros,
V Que faço avançar.
Na caça ou na lide, VIII
Quem há que me afronte?! E o Piaga se ruge
A onça raivosa No seu Maracá,
Meus passos conhece, A morte lá paira
O imigo estremece, Nos ares frechados,
E a ave medrosa Os campos juncados
Se esconde no céu. De mortos são já:
- Quem há mais valente, Mil homens viveram,
- Mais destro do que eu? Mil homens são lá.

5
IX
E então se de novo Estrugir: fazer estremecer
Eu toco o Boré; Boré: espécie de trombeta dos indígenas.
Qual fonte que salta Observe que a anáfora (repetição no início
De rocha empinada, dos versos) e a hipérbole (exagero, pois a
Que vai marulhosa, rapidez como que se preparam para a
Fremente e queixosa, guerra ao som do Boré) contribuem para a
Que a raiva apagada idealização do indígena.
De todo não é,
Tal eles se escoam
Aos sons do Boré.
— Guerreiros, dizei-
me,
— Tão forte quem é?

No poema O canto do guerreiro, o sujeito lírico convoca os guerreiros para ouvir o seu
cantar de autoexaltação. Nesse aspecto, observa-se o uso das funções emotiva
(evidencia a 1ª pessoa), conativa (apela para que os seus interlocutores ouçam o seu
cantar: — Ouvi-me, Guerreiros, — Ouvi meu cantar) e metalinguística (o título do poema
é O canto do guerreiro, e nas estrofes, o canto também expõe o próprio canto. Ao exaltar
a própria valentia, põe em destaque uma das principais características do Romantismo
da primeira geração, o indianismo. Nesse poema, o guerreiro canta os seus feitos
heroicos, toca o Boré como forma de anunciar a guerra e despertar os outros guerreiros
de sua tribo para a luta. Observe no poema o poder que o Boré do guerreiro tem sobre
os outros indígenas, é como se fosse uma força mágica. Além disso, em seu canto,
mostra-se invencível, pois ao perguntar “quem há como eu sou’’ deixa claro que sua
bravura é incomparável, até os elementos da natureza o temem.
O Indígena idealizado é algo comum na poesia de Gonçalves Dias. Na primeira geração
romântica, o indígena apresenta características de um cavaleiro medieval. Outra
característica marcante na poesia indianista desse autor é a musicalidade, pois os versos
desse poema em redondilha menor, ou seja, cinco sílabas poéticas, lembram cantos da
cultura indígena.

6
O canto do piaga Era feio, medonho, tremendo,
Ó GUERREIROS da Taba sagrada, Ó Guerreiros, o espectro que eu vi.
Ó Guerreiros da Tribo Tupi, Falam Deuses nos cantos do Piaga,
Falam Deuses nos cantos do Piaga, Ó Guerreiros, meus cantos ouvi!
Ó Guerreiros, meus cantos ouvi. [...]
Tu não viste nos céus um negrume
Esta noite - era a lua já morta - Toda a face do sol ofuscar;
Anhangá me vedava sonhar; Não ouviste a coruja, de dia,
Eis na horrível caverna, que habito, Seus estrídulos torva soltar?
Rouca voz começou-me a chamar. Não sabeis o que o monstro procura?
Não sabeis a que vem, o que quer?
Abro os olhos, inquieto, medroso, Vem matar vossos bravos guerreiros,
Manitôs! Que prodígios que vil Vem roubar-vos a filha, a mulher!
Arde o pau de resina fumosa,
Não fui eu, não fui eu, que o acendi! Vem trazer-vos crueza, impiedade -
Dons cruéis do cruel Anhangá;
Eis rebenta a meus pés um fantasma, Vem quebrar-vos a maça valente,
Um fantasma d'imensa extensão; Profanar Manitôs, Maracás.
Liso crânio repousa a meu lado,
Feia cobra se enrosca no chão. Vem trazer-vos algemas pesadas,
Com que a tribu Tupi vai gemer;
O meu sangue gelou-se nas veias, Hão-de os velhos servirem de escravos
Todo inteiro - ossos, carnes - tremi, Mesmo o Piaga inda escravo há de ser?
Frio horror me coou pelos membros,
Frio vento no rosto senti.

7
Fugireis procurando um asilo,
Triste asilo por ínvio sertão;
Anhangá de prazer há de rir-se,
Vendo os vossos quão poucos serão
Vossos Deuses, ó Piaga, conjura,
Susta as iras do fero Anhangá.
Manitôs já fugiram da Taba,
Ó desgraça! ó ruína!! ó Tupá
Nesse poema, o Piaga (o pajé) se mostra atormentado por Anhangá (espírito do mal).
Piaga, o sacerdote indígena, conta aos guerreiros todo o sofrimento que irá acontecer a
tribo, depois da chegada dos europeus. Ele pressente a vinda do mal que virá para
escraviza-los e sente a alegria de Anhangá em vê-los sofrer. Dessa forma, cumpre a
função de alertar o seu povo, como se observa nos versos: ‘’Ó guerreiros, meus cantos
ouvi”. Ele pede que os indígenas ouçam o seu canto de alerta contra o mal. É importante
observar ainda, nesse poema, a religiosidade e cultura indígenas.
Eis que os seus loiros cabelos
O Canto do Índio Pelas águas se espalhavam,
Quando o sol vai dentro d’água Pelas águas, que de vê-los
Seus ardores sepultar, Tão loiros se enamoravam.
Quando os pássaros nos bosques [...]
Principiam a trinar; Que importa? Esse falar deixou-me n’alma
[...] Sentir d’amores tão sereno e fundo,
O tacape fatal em terra estranha Que a vida me prendeu, vontade e força
Sobre mim sem temor veria erguido; Ah! que não queiras tu viver comigo,
Dessem-me a mim somente ver teu rosto Ó Virgem dos Cristãos, Virgem formosa!
Nas águas, como a lua, retratado.
Sobre a areia, já mais tarde,
Ela surgiu toda nua;
Onde há, ó Virgem, na terra
Formosura como a tua!?

8
[...]
Ah! que não queiras tu vir ser rainha
Aqui dos meus irmãos, qual sou rei deles!
Escuta, ó Virgem dos Cristãos formosa.
Odeio tanto aos teus, como te adoro;

Mas queiras tu ser minha, que eu prometo


Vencer por teu amor meu ódio antigo,
Trocar a maça do poder por ferros
E ser, por te gozar, escravo deles.

Em O canto do índio, há uma devoção do indígena à mulher branca e não a alguém de


seu povo. Por amor a ela promete vencer o ódio e tornar-se prisioneiro daqueles que
odeia.
Veja como até a natureza se rende à beleza da mulher amada. Nesse poema, observa-
se a idealização amorosa, algo semelhante à vassalagem amorosa cantada nas cantigas
de amor durante o Trovadorismo na Idade média. É importante notar que o
medievalismo se faz presente em vários poemas da obra Primeiros Cantos.
Observe nesse poema o uso de símiles, pois a mulher é comparada a elementos da
natureza. Além disso, é importante notar o uso da prosopopeia, como se observa nos
versos em que a água se enamora dos cabelos loiros dela e antíteses na última estrofe
em que ele vence por amor, o ódio e troca a força de sua arma pela escravidão.
Caxias
Quanto és bela, ó Caxias! - no deserto, Tu és a flor que despontaste livre
Entre montanhas, derramada em vale Por entre os troncos de robustos cedros,
De flores perenais, Forte - em gleba inculta;
És qual tênue vapor que a brisa espalha És qual gazela, que o deserto educa,
No frescor da manhã meiga soprando No ardor da sesta debruçada exangue
À flor de manso lago. À margem da corrente.

9
Em mole seda as graças não escondes,
Não cinges d’oiro a fronte que descansas
Na base da montanha;
És bela como a virgem das florestas,
Que no espelho das águas se contempla,
Firmada em tronco anoso.

Mas dia inda virá, em que te pejes


Dos, que ora trajas, símplices ornatos
E amável desalinho:
Da pompa e luxo amiga, hão de cair-te
Aos pés então - da poesia a c’roa
E da inocência o cinto.
Por meio de símiles e metáforas o sujeito, usando elementos da natureza, característica
marcante da primeira geração do Romantismo, mostra as belezas de Caxias, a
simplicidade e resistência. Segundo a voz lírica, a cidade vai perder suas belezas
naturais porque um dia haverá de se envergonhar dos trajes simples para se tornar
amiga do luxo e da pompa.
Observe a diferença entre símile ( comparação) e metáfora.
Exemplo de símile: És bela como a virgem das florestas.
Exemplo de metáfora: Tu és a flor que despontaste livre.

Deprecação
[...]
Anhangá impiedoso nos trouxe de longe
Tupã, ó Deus grande! teu rosto descobre:
Os homens que o raio manejam cruentos,
Bastante sofremos com tua vingança!
Que vivem sem pátria, que vagam sem tino
Já lágrimas tristes choraram teus filhos
Trás do ouro correndo, voraces, sedentos.
Teus filhos que choram tão grande mudança.

10
[...]
O Piaga nos disse que breve seria,
A que nos infliges cruel punição;
E os teus inda vagam por serras, por vales,
Buscando um asilo por ínvio sertão!

Tupã, ó Deus grande! Descobre o teu rosto:


Bastante sofremos com tua vingança!
Já lágrimas tristes choraram teus filhos,
Teus filhos que choram tão grande tardança.

Descobre o teu rosto, ressurjam os bravos,


Que eu vi combatendo no albor da manhã;
Conheçam-te os feros, confessem vencidos
Que és grande e te vingas, qu’és Deus, ó Tupã!

No poema Deprecação, a voz lírica faz uma súplica a Tupã para que ele descubra o
rosto e veja o sofrimento do seu povo, que perde a liberdade, as suas terras e a própria
vida para os ambiciosos homens brancos, aqueles que manejam o raio cruento, ou
seja, as armas de fogo. Nesse texto a colonização é vista pelo indígena como uma
maldição de Anhangá, espírito do mal. A religiosidade, característica da primeira
geração se faz presente no texto. Isso pode ser comprovado com a presença de Tupã,
Anhangá e do pajé, elementos da religiosidade indígena.

Outra característica marcante nesse poema é o indianismo. Veja como na última


estrofe o pedido do sujeito lírico a Tupã é que ele faça ressurgir os bravos (os
indígenas) e que os europeus confessem vencidos, derrotados.

Il
O Soldado Espanhol [...]
O céu era azul, tão meigo e tão brando, “Dou-te o castelo soberbo
A terra tão erma, tão quieta e saudosa, E as terras do fértil Doiro,
Que a mente exultava, mais longe escutando Dou-te ginetes e pajens
O mar a quebrar-se na praia arenosa. E a espada de pomo d’oiro.
[...] [...]
E o espanhol muito amava “O teu marido é já morto,
A virgem mimosa e bela; Notícia dele não soa;
Ela amante, ele zeloso Pois desta gente guerreira
Dos amores da donzela; Bastos ceifa a morte à toa.
Ele tão nobre e folgando [...]
De chamar-se escravo dela! Num relance fugiu, minaz no vulto:
Como o raio que luz um breve instante,
E ele disse: - Vês o céu? - Sobre a terra baixou, deixando a morte.
E ela disse: - Vejo. sim;
Mais polido que o polido
Do meu véu azul cetim. -
Torna-lhe ele. .. (oh! quanto é doce
Passar-se uma noite assim!).

No poema O Soldado Espanhol, há uma volta ao passado medieval. Isso é perceptível


tanto pela musicalidade do texto, como também pelo uso de alguns elementos, como a
presença da donzela e de castelos. O longo poema narrativo conta uma história de
amor, traição e morte. O soldado e a donzela trocam juras de amor em contato com a
natureza, que é descrita de acordo com o estado de espírito dos personagens. No
entanto, depois que ele parte pra a guerra, a amada fica solitária e sem notícias do
soldado. Nesses momentos solitários, um outro cavalheiro aparece com propostas
grandiosas e canções de amor. Quando a donzela aceita viver um novo amor, o
espanhol volta e comete o assassinato do casal.

12
POESIAS DIVERSAS

A Leviana Mas não digas que és só minha!


És engraçada e formosa Passa asinha
Como a rosa, A vida, como a ventura;
Como a rosa em mês d’Abril; Que te não vejam brincando,
És como a nuvem doirada E folgando
Deslizada, Sobre a minha sepultura.
Deslizada em céus d’anil.
Tal os sepulcros colora
Tu és vária e melindrosa, Bela aurora
Qual formosa De fulgores radiante;
Borboleta num jardim, Tal a vaga mariposa
Que as flores todas afaga, Brinca e pousa
E divaga Dum cadáver no semblante.
Em devaneio sem fim.

És pura, como uma estrela


Doce e bela,
Que treme incerta no mar:
Mostras nos olhos tua alma
Terna e calma,
Como a luz d’almo luar
[...]
Nesse poema, a mulher amada é apresentada ao leitor por meio de símiles
(comparações). É importante notar também como a natureza se faz presente na
descrição do ser feminino para mostrar tanto sua beleza como sua volubilidade. Nas
estrofes finais, compreende-se o título do poema, pois o sujeito lírico pede a amada que
ela não diga que é só dele, já que a vida passa asinha (rapidamente) assim como passa
a ventura. Além disso o eu lírico se vê melancolicamente associado ao cadáver e à
sepultura, enquanto a amada leviana seria como a aurora e a mariposa.

13
A Minha Musa
Ela ama a solidão, ama o silêncio,
Minha Musa não é como ninfa
Ama o prado florido, a selva umbrosa
Que se eleva das águas - gentil -
E da rola o carpir.
Co’um sorriso nos lábios mimosos,
Ela ama a viração da tarde amena,
Com requebros, com ar senhoril.
O sussurro das águas, os acentos
De profundo sentir.
Nem lhe pousa nas faces redondas
Dos fagueiros anelos a cor;
D’Anacreonte o gênio prazenteiro,
Nesta terra não tem uma esp’rança,
Que de flores cingia a fronte calva
Nesta terra não tem um amor.
Em brilhante festim,
Tomando inspirações à doce amada,
Como fada de meigos encantos,
Que leda lh’enflorava a ebúrnea lira;
Não habita um palácio encantado,
De que me serve, a mim?
Quer em meio de matas sombrias,
[...]
Quer à beira do mar levantado.
[...] É triste a minha Musa, como é triste
O sincero verter d’amargo pranto
Não é como a de Horácio a minha Musa; D’órfã singela;
Nos soberbos alpendres dos Senhores E triste como o som que a brisa espalha,
Não é que ela reside; Que cicia nas folhas do arvoredo
Ao banquete do grande em lauta mesa, Por noite bela.
Onde gira o falerno em taças d’oiro,
Não é que ela preside. É triste como o som que o sino ao longe
Vai perder na extensão d’ameno prado
Da tarde no cair,
Quando nasce o silêncio involto em trevas,
Quando os astros derramam sobre a terra
Merencório luzir.

14
O poema A minha musa é construído por meio da metalinguagem, pois o tema é a
elaboração poética. A musa, ou seja, a poesia é apresentada ao leitor, que passa a
conhecer quais os elementos fazem, ou não, parte da sua construção. Há ainda
comparações com o fazer poético de grandes poetas, como Horácio e Anacreonte.
O sujeito lírico ao mostrar o que não lhe serve de inspiração, apresenta a sua
preferência temática pela tristeza, solidão, silencio, a natureza e a melancolia,
aproximando sua poesia da segunda geração romântica.

Desejo
Ah! que eu não morra sem provar, ao menos
Sequer por um instante, nesta vida
Amor igual ao meu!
Dá, Senhor Deus, que eu sobre a terra encontre
Um anjo, uma mulher, uma obra tua,
Que sinta o meu sentir;
Uma alma que me entenda, irmã da minha,
Que escute o meu silêncio, que me siga
Dos ares na amplidão!
Que em laço estreito unidas, juntas, presas,
Deixando a terra e o lodo, aos céus remontem
Num êxtase de amor!

Veja como características de destaque do Romantismo estão presentes no poema


“Desejo”.
1. Religiosidade
2. Sentimentalismo
3. Exaltação e idealização do amor
O desejo do eu lírico é encontrar um amor que seja igual ao seu, ou seja, um amor
correspondido, que esteja inteiramente ao seu lado na vida e para além da vida.

15
Seus Olhos
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir,
Estrelas incertas, que as águas dormentes
Do mar vão ferir;

Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,


Têm meiga expressão,
Mais doce que a brisa, - mais doce que o nauta
De noite cantando, - mais doce que a frauta
Quebrando a solidão.

Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,


De vivo luzir,
São meigos infantes, gentis, engraçados
Brincando a sorrir.
[...]

Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,


Assim é que são;
Às vezes luzindo, serenos, tranquilos,
Às vezes vulcão!

Às vezes, oh! sim, derramam tão fraco,


Tão frouxo brilhar,
Que a mim me parece que o ar lhes falece,
E os olhos tão meigos, que o pranto
umedece
Me fazem chorar.

16
[...]
Quer sejam saudades, quer sejam desejos
Da pátria melhor;
Eu amo seus olhos que choram sem causa
Um pranto sem dor.
Poema rico em figuras de linguagem. O sujeito lírico de forma apaixonada, concentra
sua atenção nos olhos da amada, descrevendo –os por meio de comparações,
metáforas, antíteses e paradoxo.
Observe alguns exemplos retirados do poema.
Símile:
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Têm meiga expressão,
Mais doce que a brisa, - mais doce que o nauta
De noite cantando, - mais doce que a flauta
Quebrando a solidão.
Metáfora:
Estrelas incertas, que as águas dormentes
Do mar vão ferir.
Antítese:
Às vezes luzindo, serenos, tranquilos,
Às vezes vulcão!
Anáfora: A repetição no início dos versos(seus olhos tão negros)
Pleonasmo:
Que a mim me parece que o ar lhes falece
Paradoxo
‘’Eu amo seus olhos que choram sem causa
Um pranto sem dor.’’
Características de destaque do Romantismo encontradas no poema:
Exaltação do amor, sentimentalismo e confessionalíssimo.

17
Inocência Corre a vida pressurosa,
Ó meu anjo, vem correndo, como a rosa,
Vem tremendo Como a rosa na corrente.
Lançar-te nos braços meus; Amanhã terás amor?
Vem depressa, que a lembrança Como a flor,
Da tardança Como a flor fenece a gente.
Me aviva os rigores teus.
Hoje ainda és tu donzela
Do teu rosto, qual marfim, Pura e bela,
De carmim Cheia de meigo pudor;
Tinge um nada a cor mimosa; Amanhã menos ardente
É belo o pudor, mas choro, De repente
E deploro Talvez sintas meu amor
Que assim sejas medrosa.
Por inocente tens medo
De tão cedo,
De tão cedo ter amor;
Mas sabe que a formosura
Pouco dura,
Pouco dura, como a flor.
No poema Inocência, a voz lírica tem pressa em concretizar o amor, pois embora
admire o pudor e a inocência da amada, tem consciência da brevidade da vida( pouco
dura como a flor) como se observa nos versos a seguir.
ATENÇÃO!
Por inocente tens medo
A figura de linguagem predominante no poema é a
De tão cedo,
comparação (símile)
De tão cedo ter amor; Corre a vida pressurosa,
Mas sabe que a formosura como a rosa,
Pouco dura, Como a rosa na corrente.
Pouco dura, como a flor. Amanhã terás amor?
Como a flor fenece a gente. Como a flor,
Como a flor fenece a gente

18
Pedido
Tu lhe falaste
Ontem no baile
Com voz tão doce!
Não me atendias!
Com voz tão doce,
Não me atendias,
Que me matava.
Quando eu falava.

Oh! não lhe fales,


De mim bem longe
Não lhe sorrias,
Teu pensamento!!
Se então só qu’rias
Teu pensamento,
Exp’rimentar-me.
Bem longe errava.

Oh! não lhe fales,


Eu vi teus olhos
Não lhe sorrias,
Sobre outros olhos!
Não lhe sorrias,
Sobre outros olhos,
Que era matar-me.
Que eu odiava.

Tu lhe sorriste
Com tal sorriso!
Com tal sorriso,
Que apunhalava.

O poema “Pedido” trata sobre o ciúme hiperbólico que o sujeito lírico sente da sua
amada. Veja que ele expõe o desejo de ter o pensamento, os olhares, os sorrisos e até
mesmo a fala dela direcionados somente a ele.
O uso de anáforas (repetições no início dos versos) enfatiza o sofrimento do sujeito
lírico. Observe ainda a sinestesia, ou seja, a fusão de sentidos (voz doce) na 5ª estrofe,
o verbo apunhalar no sentido metafórico e o uso da hipérbole na última estrofe. Essas
figuras de linguagem são importantes para a construção do sentido do poema, ou seja,
para mostrar a intensidade do ciúme.

19
O Desengano
Quão insensato fui! - busquei firmeza.
JÁ VIGÍLIAS passei namorado, Qual em ondas de areia movediça,
Doces horas d'insônia passei, Na mulher, - não achei!
Já meus olhos, d'amor fascinado, E da esp'rança, que eu via tão donosa
Em ver só meu amor empreguei. Sorrir dentro em minha alma, as longas asas
Doido e néscio cortei!
Meu amor era puro, extremoso, [...]
Era amor que meu peito sentia, Podes ir, que é desfeito o nosso laço,
Eram lavas de um fogo teimoso, Podes ir, que o teu nome nos meus lábios
Eram notas de meiga harmonia. Nunca mais soará!
[...] Sim, vai; - mas este amor que me atormenta,
Harmonia era ouvir sua voz, Que tão grato me foi, que me é tão duro,
Era ver seu sorriso harmonia; Comigo morrerá!
E os seus modos e gestos e ditos
Eram graças, perfume e magia. Tão belo o nosso amor! - foi só de um dia
Como uma flor!
Oh! que bem cedo o talismã quebraste
Do nosso amor!

Nesse poema, além das comparações, o sujeito lírico confessa o seu amor por meio de
construções metafóricas e antitéticas. Primeiramente, ele confessa a intensidade desse
sentimento, porém percebe que estava errado em relação a sua amada e a
responsabiliza pela quebra desse amor.
Depois da frustração, o sujeito lírico não alimenta mais nenhuma esperança em relação
a mulher amada, ele deseja a felicidade dela distante dele, já que ela não ofereceu a
firmeza que ele procurava.

20
Observe exemplos das figuras de linguagem de destaque nas estrofes selecionadas
para análise.
METÁFORA:
Lavas de fogo
Notas de meiga harmonia
Nosso laço
O talismã
COMPARAÇÃO:
Tão belo o nosso amor! - foi só de um dia
Como uma flor!
CONSTRUÇÕES ANTITÉTICAS
Amor intenso (lavas de fogo) e suave (eram notas de meiga harmonia).
Firmeza x areia movediça

Tristeza
Que leda noite! - Este ar embalsamado,
Este silêncio harmônico da terra
Que sereno prazer n'alma cansada
Não espreme, não filtra, não difunde?
A brisa lá sussurra na folhagem
D'espessas matas, d'árvores robustas,
Que velam sempre e sós, que a Deus elevam
Misterioso coro, que do Bardo
A crença quase morta inda alimenta.
É esta a hora mágica de encantos,
Hora d'inspirações dos céus descidas,
Que em delírio de amor aos céus remontam.
[...]

21
O poema Tristeza, embora pertença a primeira fase do Romantismo, apresenta
características da segunda geração. A preferência é por imagens noturnas, a solidão,
o pessimismo e a melancolia.
Observa -se no poema também a religiosidade. Pois o sujeito lírico faz referência a
Deus, quer estar só com Deus, já que não confia nos homens.
Veja a prosopopeia em negrito na estrofe do poema Tristeza!
O Trovador
Numa terra antigamente
[...]
Existia um Trovador;
No meio do seu caminho
Na Lira sua inocente
Gentil donzela encontrou:
Só cantava o seu amor.
Canta - disse; e as cordas d'oiro
Vibrando, o triste cantou. [...]
Nenhum sarau se acabava
"Teu peito por amor, Donzel, suspira,
Sem a Lira de marfim,
"Que é de jovens amar a formosura;
Pois cantar tão alto e doce
"Mas sabe que a mulher, que amor te jura,
Nunca alguém ouvira assim.
"Dos lindos lábios seus cospe a mentira!
[...]
E quer donzela, quer dona,
Que sentira comoção
"Que triste que é neste
Pular-lhe n'alma, escutando
mundo
Do Trovador a canção;
"O fado dum Trovador!
De jasmins e de açucenas
"Pesar lhe dá sua Lira,
A fronte sua adornou;
"Dá-lhe pesar seu amor!"
Mas só a rosa da amada
E o Trovador neste ponto
Na Lira amante poisou.
A corda extrema arrancou;
E num marco do caminho
E o Trovador conheceu
A Lira sua quebrou:
Que era traído - por fim;
Ninguém mais a voz sentida
Pôs-se a andar, e só se ouvia
Do Trovador escutou!
Nos seus lábios: ai de mim.

22
O poema O trovador contém 33 estrofes. Aqui, foram selecionadas apenas algumas
como material de apoio para o comentário desse texto.
Esse poema, assim como outros da obra Primeiros cantos, propõe um retorno à cultura
medieval. Essa ideia é apresentada desde o título. Nas estrofes, o trovador é traído
pela sua amada. Esse fato conduz a sua forma de cantar e o seu estado de espírito. O
seu instrumento musical também muda gradativamente para acompanhar a sua
interioridade. A sua lira tinha, no início, cordas de ouro, depois de prata e bronze. No
final do poema, ele arranca as cordas e quebra a sua Lira. Esse ato sugere não só a
destruição do instrumento, mas também o dilaceramento daquele que antes da traição,
cantava alegremente.

Epicédio Que o anjo belo da morte


Seu rosto pálido e belo A par desse anjo baixou!
Já não tem vida nem cor! Trocaram brandas palavras,
Sobre ele a morte descansa, Que Deus somente escutou.
Envolta em baço palor.

Cerraram-se olhos tão puros,


Ventura, prazer, ledice
Que tinham tanto fulgor;
Duma outra vida contou;
Coração que tanto amava
E o anjo puro da terra
Já hoje não sente amor;
Prazer da terra enjeitou.
[...]

23
Depois o corpo engraçado
Sai da larva a borboleta,
Deixou à terra sem vida,
Sai da rocha o diamante,
De tênue palor coberto,
De um cadáver mudo e frio
- Verniz de estátua esquecida.
Sai uma alma radiante.
Não choremos essa morte,
E bela assim, como um lírio
Não choremos casos tais;
Murcho da sesta ao ardor,
Quando a terra perde um justo,
Teve a inocência dos anjos,
Conta um anjo o céu de mais.
Tendo o viver duma flor.

Foi breve! - mas a desgraça


A testa não lhe enrugou,
E aos pés do Deus que a criara
Alma inda virgem levou.

O poema Epicédio traz a temática da morte associada à idealização da figura feminina,


temas comuns na segunda geração romântica, o Ultrarromantismo. Observe que a
mulher é apresentada como anjo puro de olhos puros, que o prazer da terra enjeitou,
virgem e justa, teve a inocência dos anjos,
VEJA AS FIGURAS DE LINGUAGEM NESSES VERSOS!
Metáfora e antítese e eufemismo
Quando a terra perde um justo,
Conta um anjo o céu de mais.

Metáfora porque ele a chama de anjo;


Antítese (céu e terra);

Eufemismo porque a morte nesses versos é suavizada.

24
Sofrimento
Meu Deus, Senhor meu Deus, o que há O amor que eu tanto amava do imo peito,
no mundo Que nunca pude achar,
Que não seja sofrer? Que embalde procurei, na flor, na planta,
O homem nasce, e vive um só instante, No prado, e terra, e mar!
E sofre até morrer!
E agora o que sou eu? - Pálido espectro,
A flor ao menos, nesse breve espaço Que da campa fugiu;
Do seu doce viver, Flor ceifada em botão; imagem triste
Encanta os ares com celeste aroma, De um ente que existiu...
Querida até morrer.
Não escutes, meu Deus, esta blasfêmia;
É breve o romper d'alva, mas ao menos Perdão, Senhor, perdão!
Traz consigo prazer; Minha alma sinto ainda, - sinto, escuto
E o homem nasce e vive um só instante: Bater-me o coração.
E sofre até morrer!
[...] Quando roja meu corpo sobre a terra,
Já farto de viver, em meia vida, Quando me aflige a dor,
Quebrado pela dor, Minha alma aos céus se eleva, como o incenso,
Meus anos hei passado, uns após Como o aroma da flor.
outros,
Sem paz e sem amor.

25
E eu bendigo o teu nome eterno e santo,
Bendigo a minha dor,
Que vai além da terra aos céus infindos
Prender-me ao criador.

Bendigo o nome teu, que uma outra vida


Me fez descortinar,
Uma outra vida, onde não há só trevas,
E nem há só penar.

O poema Sofrimento, além de intensa religiosidade, antecipa características do


ultrarromantismo, segunda geração romântica. No início, a voz lírica se dirige a Deus
para falar da vida de forma pessimista e melancólica. Ao comparar a vida humana a flor,
põe em evidência o seu sofrimento, já que a flor, em sua brevidade, traz aroma, encanto
e prazer, enquanto o homem é sofrer até morrer.
Veja as figuras de linguagem que evidenciam a interioridade do sujeito lírico.
APÓSTROFE:
Meu Deus, Senhor meu Deus, o que há no mundo
Que não seja sofrer?
"Não escutes, meu Deus, esta blasfêmia;
Perdão, Senhor, perdão!"
METÁFORA
E agora o que sou eu? - Pálido espectro,
Que da campa fugiu;
Flor ceifada em botão; imagem triste
De um ente que existiu...
COMPARAÇÃO
Minha alma aos céus se eleva, como o incenso, como o aroma da flor.
CARACTERÍSTICAS DO ROMANTISMO PRESENTES NO POEMA:
Religiosidade, pessimismo, subjetivismo

26
A Escrava
Oh! doce país de Congo E ele às vezes me dizia:
Doces terras d'além-mar! - Minha Alsgá, não tenhas medo;
Oh! dias de sol formoso! Vem comigo, vem sentar-te
Oh! noites d'almo luar! Sobre o cimo do rochedo.
E eu respondia animosa:
Desertos de branca areia - Irei contigo. onde fores! -
De vasta, imensa extensão, E tremendo e palpitando
Onde livre corre a mente, Me cingia aos meus amores.
Livre bate o coração!
Ele depois me tornava
Onde a leda caravana Sobre o rochedo - sorrindo.
Rasga o caminho passando, - As águas desta corrente
Onde bem longe se escuta Não vês como vão fugindo?
As vozes que vão cantando!
[...] Tão depressa corre a vida,
Quando a noite sobre a terra Minha Alsgá; depois morrer
Desenrolava o seu véu, Só nos resta!... - Pois a vida
Quando sequer uma estrela Seja instantes de prazer.
Não se pintava no céu;
Os olhos em torno volves
Quando só se ouvia o sopro Espantados - Ah! também
De mansa brisa fagueira, Arfa o teu peito ansiado!...
Eu o aguardava - sentada Acaso temes alguém?
Debaixo da bananeira.
Um rochedo ao pé se erguia,
Dele à base uma corrente
Despenhada sobre pedras,
Murmurava docemente.

27
Assim praticando amigos
A aurora nos vinha achar!
Não receies de ser vista,
Oh! doces terras de Congo,
Tudo agora jaz dormente;
Doces terras d'além-mar!
Minha voz mesmo se perde
No fragor desta corrente.
Do ríspido senhor a voz irada
Rábida soa,
Minha Alsgá, porque estremeces?
Sem o pranto enxugar a triste escrava
Porque me foges assim?
Pávida voa.
Não te partas, não me fujas,
Que a vida me foge a mim!
Mas era em mora por cismar na terra,
Onde nascera,
Outro beijo acaso temes,
Onde vivera tão ditosa, e onde
Expressão de amor ardente?
Morrer devera!
Quem o ouviu? - o som perdeu-se
No fragor desta corrente.
Sofreu tormentos, porque tinha um peito,
Qu'inda sentia;
Mísera escrava! no sofrer cruento.
Congo! dizia.

A escrava fala em tom triste e saudosista, pois é evidente, tanto a saudade do amado
como do seu país, onde há belezas, cantos, alegrias e liberdade. Primeiramente, há a
descrição desse espaço, depois ela rememora momentos felizes ao lado do seu amado,
e os conselhos dele sobre a brevidade da vida e do tempo. Suas lembranças são
interrompidas pela voz do seu senhor, revelando ao leitor a sua condição atual. O
passado é de liberdade e alegrias em tuas terras, o presente de solidão e cativeiro.
ATENÇÃO!
O sujeito lírico desse poema também canta as belezas de sua terra com saudade
mostrando o contraste entre o seu país de origem e o espaço onde se encontra, entre o
passado e o presente. Nesse sentido, observa-se um diálogo entre esse poema e
Canção do exílio, primeiro texto da obra Primeiros cantos.

28
Recordação Volvo aos instantes de ventura, e penso
Quando em meu peito as aflições rebentam Que a sós contigo, em prática serena,
Eivadas de sofrer acerbo e duro; Melhor futuro me augurava, as doces
Quando a desgraça o coração me arrocha Palavras tuas, sôfregos, atentos
Em círculos de ferro, com tal força, Sorvendo meus ouvidos, - nos teus olhos
Que dele o sangue em borbotões golfeja; Lendo os meus olhos tanto amor, que a
Quando minha alma de sofrer cansada, . vida
Bem que afeita a sofrer, sequer não pode Longa, bem longa, não bastara ainda
Clamar: Senhor piedade; - e que os meus olhos Porque de os ver me saciasse!... O pranto
Rebeldes, uma lágrima não vertem Então dos olhos meus corre espontâneo,
Do mar d'angústias que meu peito oprime: Que não mais te verei. - Em tal pensando
De martírios calar sinto em meu peito
Tão grande plenitude, que a minha alma
Sente amargo prazer de quanto sofre.

Há no poema Recordação, uma sequência de orações adverbiais temporais para


expressar a interioridade do sujeito lírico. Veja o primeiro verso do poema ”Quando em
meu peito as aflições rebentam’’. Esse, e outros versos dessa estrofe, revelam o
momento de intenso sofrimento que o faz voltar o seu pensamento para o passado ao
lado do seu amor em momentos felizes. Nos últimos versos, percebe-se que as
recordações intensificam o seu sofrer. Poema que antecipa características da segunda
geração romântica no Brasil, o Ultrarromantismo.

29
O Orgulhoso
Eu o vi! - tremendo era no gesto, Quem ousaria resistir-lhe? - Apenas
Terrível seu olhar; Algum pobre ancião
E o cenho carregado pretendia Já sobre o seu sepulcro, desejando
O globo dominar. A morte e a salvação.

Tremendo era na voz, quando no peito Alguns dias apenas decorreram;


Fervia-lhe o rancor! E eis que ele se sumiu!
E aos demais homens, como um cedro à relva, E a laje dos sepulcros fria e muda
Se cria sup'rior. Sobre ele já caiu.

E o pobre agricultor, junto a seus filhos, E o bárbaro tropel dos que o serviam
Dentro do humilde lar, Exulta com seu fim!
Quisera, antes que os dele, ver um Tigre E a turba aplaude; e ninguém chora a morte
Os olhos fuzilar: De homem tão ruim.

Que a um filho seu talvez quisera o nobre


Para um Executor;
Ou para o leito infesto alguma filha
Do triste agricultor.
No poema narrativo ‘’O orgulhoso’’, o sujeito lírico descreve o orgulho e a maldade do
nobre em contraposição à pobreza e humildade do agricultor. O poema faz lembrar do
regime de servidão na sociedade feudal. É importante observar também o final do poema,
momento de alegria para aqueles que o serviam.
‘’E o bárbaro tropel dos que o serviam
Exulta com seu fim!
E a turba aplaude; e ninguém chora a morte
De homem tão ruim. ‘’
COMPARAÇÃO:
“E aos demais homens, como um cedro à relva,
Se cria sup'rior.’’

30
Minha vida e meus amores Aquela outra sorria tristemente,
QUANDO, no albor da vida, fascinado Como um anjo no exílio, ou como o cálix
Com tanta luz e brilho e pompa e galas, De flor pendida e murcha e já sem brilho.
Vi o mundo sorrir-me esperançoso: Humilde flor tão bela e tão cheirosa,
- Meu Deus, disse entre mim, oh! Quanto é No seu deserto perfumando os ventos.
doce. - Eu morrera feliz, dizia eu d'alma,
Quanto é bela esta vida assim vivida! - Se pudesse enxertar uma esperança
Agora, logo, aqui, além, notando Naquela alma tão pura e tão formosa,
Uma pedra, uma flor, uma lindeza, E um alegre sorrir nos lábios dela.
Um seixo da corrente, uma conchinha A fugaz borboleta as flores todas
A beira-mar colhida! Elege, e liba e uma e outra, e foge
Sempre em novos amores enlevada:
Foi esta a infância minha; a juventude Neste meu paraíso fui como ela,
Falou-me ao coração: - amemos, disse, Inconstante vagando em mar de amores.
Porque amar é viver.
E esta era linda, como é linda a aurora amor sincero e fundo e firme e eterno,
No fresco da manhã tingindo as nuvens Como o mar em bonança meigo e doce,
De rósea cor fagueira; Do templo como a luz perene e santo,
Aquela tinha um quê de anelos meigos Não, nunca o senti; - somente o viço
Artífice sublime; Tão forte dos meus anos, por amores
Feiticeiro sorrir dos lábios dela Tão fáceis quanto indi'nos fui trocando.
Prendeu-me o coração; - julguei-o ao Quanto fui louco, ó Deus! - Em vez do fruto
menos. Sazonado e maduro, que eu podia
Como em jardim colher, mordi no fruto
Pútrido e amargo e rebuçado em cinzas,
Como infante glutão, que se não senta
À mesa de seus pais.

31
Dá, meu Deus, que eu possa Outra vez que lá fui, que a vi, que a medo
amar, Terna voz lhe escutei: - Sonhei contigo! -
Dá que eu sinta uma paixão, Inefável prazer banhou meu peito,
Torna-me virgem minha alma, Senti delícias; mas a sós comigo
E virgem meu coração. Pensei - talvez! - e já não pude crê-la.
Ela tão meiga e tão cheia de encantos,
Um dia, em qu'eu sentei-me junto dela, Ela tão nova, tão pura e tão bela. ..
Sua voz murmurou nos meus ouvidos, Amar-me! - Eu que sou?
- Eu te amo? - Ó anjo, que não possa eu
crer-te! Meus olhos enxergam, em quanto duvida
Ela, certo, não é mulher que vive Minha alma sem crença, de força exaurida,
Nas fezes da desonra, em cujos lábios Já farta da vida,
Só mentira e traição eterno habitam. Que amor não doirou.
Tem uma alma inocente, um rosto belo,
E amor nos olhos. . . - mas não posso crê- Mau grado meu, crer não posso, .
la. Mau grado meu que assim é;
Queres ligar-te comigo
Dá, meu Deus, que eu possa amar, Sem no amor ter crença e fé?
Dá que eu sinta uma paixão;
Torna-me virgem minha alma, Antes vai colar teu rosto,
E virgem meu coração. Colar teu seio nevado
Contra o rosto mudo e frio,
Contra o seio dum finado.

Ou suplica a Deus comigo


Que me dê uma paixão;
Que me dê crença à minha alma,
E vida ao meu coração.

32
Minha vida e meus amores
Nesse poema, o sujeito lírico expõe as fases de sua vida e a sua trajetória amorosa.
Na 1ª estrofe, é apresentada a infância com os encantos, brilho e doçura. Na 2ª e 3ª
estrofes, a juventude, momento de amores e de felicidade, mas também momento em
que o sujeito lírico começa a viver os efeitos desses amores e da sua inconstância
amorosa. Observe que na 4ª estrofe, ele confessa a sua volubilidade em relação ao
amor, já que a ânsia das aventuras o impedia de viver um sentimento firme e
verdadeiro.
No refrão, a religiosidade se manifesta, pois ele pede a Deus que purifique sua alma, a
fim de que esse amor verdadeiro possa ser vivido. Nas estrofes a seguir, ele encontra
uma alma pura, mas quando ela aparece em sua vida, ele já se encontra descrente em
relação ao amor que pode sentir por não se considerar puro. Então, ele pede a ela, que
juntos apelem a Deus para que Ele dê crença a sua alma e vida ao seu coração.
Exemplos de figuras de linguagem no texto Minha vida e meus amores.
A primeira estrofe é rica em metáforas
Símile (comparação) é a figura de linguagem predominante no poema.
Veja alguns exemplos!
“E esta era linda, como é linda a aurora
No fresco da manhã tingindo as nuvens
De rósea cor fagueira’’
‘’Aquela outra sorria tristemente,
Como um anjo no exílio, ou como o cálix
De flor pendida e murcha e já sem brilho.’’
“A fugaz borboleta as flores todas
Elege, e liba e uma e outra, e foge
Sempre em novos amores enlevada:
Neste meu paraíso fui como ela,
Inconstante vagando em mar de amores. ’’
Paradoxo
‘’Aquela outra sorria tristemente
Observe também o uso da anáfora( repetição no início dos versos)em várias estrofes.

33
Amor! Delírio – Engano Que de vezes, pensando a sós comigo,
Amor! delírio - engano... Sobre a terra Não disse eu entre mim: - Anjo
Amor tão bem fruí; a vida Inteira formoso,
Concentrei num só ponto - amá-la, e sempre. Da minha vida que farei, se acaso
Amei! - dedicação, ternura, extremos Faltar-me o teu amor um só instante;
Cismou meu coração, cismou minha alma, - Eu que só vivo por te amar, que
- Minha alma que na taça da ventura apenas
Vida breve d'amor sorveu gostosa. O que sinto por ti a custo exprimo?
Eu e ela, ambos nós, na terra ingrata No mundo que farei, como estrangeiro
Oásis, paraíso, éden ou templo Pelas vagas cruéis à praia Inóspita
Habitamos uma hora; e logo o tempo Exânime arrojado? - Eu, que isto disse,
Com a foice roaz quebrou-lhe o encanto, Existo e penso - e não morri, - não
Doce encanto que o amor nos fabricara. morro
Do que outrora senti, do que ora sinto
E eu sempre a via! ... quer nas nuvens d'oiro De pensar nela, de a rever em sonhos,
Quando ia o sol nas vagas sepultar-se, Do que fui, do que sou e ser podia!
Ou quer na branca nuvem que velava _ Existo; e ela de mim jaz esquecida!
O círculo da lua, - quer no manto Esquecida talvez de amor tamanho,
D'alvacenta neblina que baixava Derramando talvez noutros ouvidos
Sobre as folhas do bosque, muda e grave, Frases doces de amor, que dos seus
Da tarde no cair; nos céus, na terra, lábios
A ela, a ela só, viam meus olhos. Tantas vezes ouvi, - que tantas vezes
Em êxtase divino aos céus me
[...] alçaram,
- Que dando à terra ingrata o que era
terra

34
Minha alma além das nuvens transportaram. Ela, ídolo meu, a quem o orgulho,
Existo! como outrora, no meu peito A força d'homem, o sentir, vontade
Férvido o coração pular sentindo, Própria e minha dediquei, - sujeita
Todo o fogo da vida derramando À voz de alguém que não sou eu, - desperta,
Em queixas mulheris, em moles versos. Talvez no instante em que de mim se lembra,
Por um ósculo frio, por carícias
E ela!... ela talvez nos braços doutrem Devidas dum esposo!...
Com sua vida alimenta uma outra vida,
Com o seu coração o de outro amante, Oh! não poder-te,
Que mais feliz do que eu, inferno! a goza. Abutre roedor, cruel ciúme,
Ela, que eu respeitei, que eu venerava Tua funda raiz e a imagem dela
Como a relíquia santa! - a quem meus olhos, No peito em sangue espedaçar raivoso!
Receando ofendê-la, tantas vezes Mas tu, cruel, que és meu rival, numa hora,
De castos e de humildes se abaixaram! Em que ela só julgar-se, hás de escutar-lhe
Ela, perante quem sentia eu presa Um quebrado suspiro do imo peito,
A voz nos lábios e a paixão no peito! Que d'eras já passadas se recorda.
Hás de escutá-lo, e ver-lhe a cor do rosto
Enrubescer-se ao deparar contigo!
Presa serás também d'atros cuidados,
Terás ciúme, e sofrerás qual sofro:
Nem menor que o meu mal quero a vingança.

O sujeito lírico fala de seu amor, de sua dedicação total a uma única mulher, mas
quebrou o encanto para ela. Isso o leva ao delírio, pois a vê e a ouve em toda a parte. Ao
imaginá-la em outros braços, o seu sofrimento se torna ainda mais intenso, o ciúme o
dilacera “ abutre roedor, cruel ciúme...’’ O ciúme é tão intenso que o sujeito lírico deseja
que ela recorde dele, a fim de que isso cause sofrimento naquele que ela possa estar,
que o outro, assim como ele, também sinta ciúmes e sofra.
‘’Terás ciúme, e sofrerá qual sofro:
Nem menor que o meu mal quero vingança. ’’

35
Exemplos de figuras de linguagem no poema
Antítese
Eu e ela, ambos nós, na terra ingrata
Oásis, paraíso, éden ou templo
Metáfora
“Habitamos uma hora; e logo o tempo
Com a foice roaz quebrou-lhe o encanto,
Doce encanto que o amor nos fabricara’’

‘’Existo! como outrora, no meu peito


Férvido o coração pular sentindo,
Todo o fogo da vida derramando
Em queixas mulheris, em moles versos.’’

O vate "Vês tu Jerusalém como orgulhosa


Vate! Vate! que és tu? - Nos seus extremos "Campeã entre as nações, como no Líbano
Fadou-te Deus um coração de amores, "Um cedro a cuja sombra a hissope cresce?
Fadou-te uma alma acesa borbulhando "Breve a minha ira transformada em raios
Ardidos pensamentos, como a lava "Sobre ela cairá;
Que o gigante Vesúvio arroja às nuvens. "Um fero vencedor dentro em seus muros
"Tributária a fará;
Vate! vate! que és tu? - Foste ao princípio "E quando escravos seus filhos, sobre pedra
Sacerdote e profeta; "Pedra não ficará."
Eram nos céus teus cantos uma prece,
Na terra um vaticínio. E os réprobos de saco se vestiam,
E ele cantava então: - Jeová me disse, Em pó, em cinza envoltos;
Majestoso e terrível. E colando co'a terra os torpes lábios,
E açoitando cu'as mãos o peito imbele,
Senhor! Senhor! - clamavam.

30
36
E o vate entanto o pálido semblante
Meditabundo sobre as mãos firmara,
Suplicando ao Senhor do interno d'alma.
Foram santos então. - Homero o mundo
Criou segunda vez, - o inferno o Dante, -
Milton o paraíso, - foram grandes!

E hoje!... em nosso exílio erramos tristes,


Mimosa esp'rança ao infeliz legando.
Maldizendo a soberba, o crime, os vicio;:
E o infeliz se consola, e o grande treme.
Damos ao infante aqui do pão que temos,
E o manto além ao mísero raquítico:
Somos hoje Cristãos.

O poeta, ou seja, O vate é visto como poeta e sacerdote, pois Deus o deu coração
de amores e elevados pensamentos. Dessa forma, na terra e nos céus cantam sob
inspiração divina “Jeová me disse...”
Há, no poema, relação de intertextualidade com a Bíblia, a ira divina se manifesta
sobre a desobediência dos homens. Ele, o vate, teme a ira de Deus e por isso faz
súplicas a Ele mostrando a grandeza de grandes poetas como Homero, Dante e
Milton, confessa que eles, os poetas, hoje, agem de acordo com os ensinamentos
de Cristo “Somos hoje cristãos”

30
37
O oiro Então do meu Senhor me calam n'alma
Oiro, - poder, encanto ou maravilha D'amor ardente enlevos indizíveis;
Da nossa idade, - regedor da terra, Se tento às gentes redizer seu nome,
Que dás honra e valor, virtude e força, Queimadoras palavras se atropelam
Que tens ofertas, oblações e altares, - Nos meus lábios; - profética harmonia
Embora teu louvor cante na lira Meu peito anseia, e em borbotões se expande.
Vendido Menestrel que pôde insano Grandes, Senhor, são tuas obras, grandes
Do grande à porta renegar seu gênio! Teus prodígios, teu poder imenso:
Outro, sim, que não eu. - Bardo sem nome, O pai ao filho o diz, um sec'lo a outro,
Com pouco vivo; - sobre a terra, à noite, A terra ao céu, o tempo à eternidade!
Meu corpo lanço, descansando a fronte
Num tronco ou pedra ou mal nascido arbusto. Do mundo as ilusões, vaidade, engano.
Sou mais que um rei co'o meu dossel de nuvens Da vida a mesquinhez - prazer ou pranto -
Que tem gravados cintilantes mundos! Tudo esse nome arrasta, prostra e some;
Com a vista no céu percorro os astros. Como aos raios do sol desfeito o gelo,
Vagueia a minha mente além das nuvens, Que em ondas corre no pendor do monte,
Vagueia o meu pensar - alto, arrojado Precípite e ruidoso, - arbustos, troncos
Além de quanto o olhar nos céus alcança. Consigo no passar rompidos leva.

No poema O oiro, o sujeito lírico fala sobre o material, o terreno, a ambição versus a
simplicidade e o espiritual.
Na terra, faz-se altar ao ouro, ao poder. Ele, o sujeito lírico, no entanto, com pouco
vive e também se sente mais que um rei ao contemplar a natureza e elevar seus
pensamentos a Deus, já que sabe que grande mesmo são as obras do Senhor, pois
o material, como se vê no poema por meio da comparação, será destruído como o
gelo pelos raios do sol. A religiosidade e a preferência por elementos da natureza
estão presentes no poema.

38
HINOS
O Mar Da voz de Jeová um eco incerto
Oceano terrível, mar imenso Julgo ser teu rugir; mas só, perene,
De vagas procelosas que se enrolam Imagem do infinito, retratando
Floridas rebentando em branca espuma As feituras de Deus.
Num polo e noutro polo, Por isto, a sós contigo, a mente livre
Enfim... enfim te vejo; enfim meus olhos Se eleva, aos céus remonta ardente, altiva,
Na indômita cerviz trêmulos cravo, E deste lodo terreal se apura,
E esse rugido teu sanhudo e forte Bem como o bronze ao fogo.
Enfim medroso escuto!
Férvida a Musa, co'os teus sons casada,
Glorifica o Senhor de sobre os astros
Donde houveste, ó pélago revolto,
Co'a fronte além dos céus, além das nuvens,
Esse rugido teu? Em vão dos ventos
E co'os pés sobre ti.
Corre o insano pegão lascando os troncos,
E do profundo abismo
Chamando à superfície infindas vagas,
O que há mais forte do que tu? Se eriças
Que avaro encerras no teu seio undoso; A coma perigosa, a nau possante,
Ao insano rugir dos ventos bravos Extremo de artifício, em breve tempo
Sobressai teu rugido. Se afunda e se aniquila.
Em vão troveja horríssona tormenta; És poderoso sem rival na terra;
Essa voz do trovão, que os céus abala, Mas lá te vais quebrar num grão d'areia,
Não cobre a tua voz. - Ah! donde a houveste, Tão forte contra os homens, tão sem força
Majestoso oceano? Contra coisa tão fraca!

Ó mar, o teu rugido é um eco incerto Mas nesse instante que me está marcado,
Da criadora voz, de que surgiste: Em que hei de esta prisão fugir p'ra sempre
Seja, disse; e tu foste, e contra as rochas Irei tão alto, ó mar, que lá não chegue
As vagas competiste. Teu sonoro rugido.
E à noite, quando o céu é puro e limpo, Então mais forte do que tu, minha alma,
Teu chão tinges de azul, - tuas ondas correm Desconhecendo o temor, o espaço, o tempo,
Por sobre estrelas mil; turvam-se os olhos Quebrará num relance o circ'lo estreito
Entre dois céus brilhantes. Do finito e dos céus!

39
Então, entre miríades de estrelas,
Cantando hinos d'amor nas harpas d'anjos,
Mais forte soará que as tuas vagas,
Mordendo a fulva areia;
Inda mais doce que o singelo canto
De merencória virgem, quando a noite
Ocupa a terra, - e do que a mansa brisa,
Que entre flores suspira.

Há nas primeiras estrofes desse poema, a descrição do mar, visto pelo eu lírico como
indomável e furioso. A seguir, é evidente a esfera religiosa que faz referência à criação
do universo e a passagem do eu lírico para o espaço celestial, como se observa em
vários versos. Veja alguns exemplos: ‘’Da criadora voz, de que surgiste:
Seja, disse; e tu foste, e contra as rochas
As vagas competiste”
[...]
Da voz de Jeová um eco incerto
Julgo ser teu rugir; mas só, perene,
Imagem do infinito, retratando
As feituras de Deus.
[...[
‘’Então mais forte do que tu, minha alma,
Desconhecendo o temor, o espaço, o tempo,
Quebrará num relance o circ'lo estreito
Do finito e dos céus!”
Veja que esse mesmo mar, tão forte, sem rival na terra, se quebra em um grão de areia
e será mais frágil que o eu lírico quando sua alma se elevar aos céus. O sujeito lírico
expressa o desejo de fuga (Irei tão alto, ó mar, que lá não chegue teu sonoro rugido)
Assim, ele será mais livre e mais forte, já que a sua alma estará longe do terror marítimo.
Nos últimos versos a morte do eu lírico, por meio de eufemismo, ganha um tom lírico e
sublime.

40
ATENÇÃO PARA AS FIGURAS DE LINGUAGEM NO POEMA O MAR!
APOSTROFE, METÁFORA E PROSOPOPEIA
‘’Ó mar, o teu rugido é um eco incerto
Da criadora voz’’. Apostrofe (Ó mar), metáfora( o teu rugido é um eco), prosopopeia( o
rugido do mar).
EUFEMISMO E METÁFORA
Mas nesse instante que me está marcado,
Em que hei de esta prisão fugir p'ra sempre
Irei tão alto, ó mar, que lá não chegue
Teu sonoro rugido.
Os versos fazem referência à morte do sujeito lírico como fuga do mar (prisão)

COMPARAÇÃO
‘’E deste lodo terreal se apura,
Bem como o bronze ao fogo.’’

‘’Inda mais doce que o singelo canto


De merencória virgem, quando a noite
Ocupa a terra, - e do que a mansa brisa,
Que entre flores suspira.”

Ideia de Deus
I Luziu no espaço a lua! sobre a terra
À voz de Jeová infindos mundos Rouqueja o mar raivoso,
Se formaram do nada; E as esferas nos céus ergueram hinos
Rasgou-se o horror das trevas, fez- Ao Deus prodigioso.
se o dia, [...]
E a noite foi criada.

41
A morte, as aflições, o espaço, o Ai da perversa, da nação maldita,
tempo, Cheia de ingratidão,
O que é para o Senhor? Que há de ela mesma sujeitar seu colo
Eterno, imenso, que lh'importa a A justa punição.
sanha
Do tempo roedor? Ou já terrível peste expande as asas,
Bem lenta a esvoaçar;
Vai de uns a outros, dos festins conviva,
Como um raio de luz, percorre o
Hóspede em todo o lar!
espaço,
E tudo nota e vê -
Ou já torvo rugir da guerra acesa
O argueiro, os mundos, o universo, o
Espalha a confusão;
justo;
E a esposa, e a filha, de tenor opresso,
E o homem que não crê.
Não sente o coração.
E ele que pode aniquilar os mundos,
E o pai, e o esposo, no morrer cruento,
Tão forte como ele é,
Vomita o fel raivoso;
E vê e passa, e não castiga o crime,
- Milhões de insetos vis que um pé gigante
Nem o ímpio sem fé!
Enterra em chão lodoso.
Porém quando corrupto um povo
E do povo corrupto um povo nasce
inteiro
Esperançoso e crente.
O Nome seu maldiz,
Como do podre e carunchoso tronco
Quando só vive de vingança e roubos,
Hástea forte e virente.
Julgando-se feliz;
II
Oh! como é grande o Senhor Deus, que os
Quando o ímpio comanda, quando o
mundos
justo
Equilibra nos ares;
Sofre as penas do mal,
Que vai do abismo aos céus, que susta as
E as virgens sem pudor, e as mães
iras
sem honra.
Do pélago fremente,
E a justiça venal;
[...]

42
Cujo poder, que é sem igual, excede O Deus que manda ao infeliz que espere
A hipérbole arrojada! Na sua providência;
Oh! como é grande o Senhor Deus dos mundos, Que o justo durma, descansado e forte
O Senhor dos prodígios. Na sua consciência!
III
Ele mandou que o sol fosse princípio, Que o assassino de contínuo vele,
E razão de existência, Que trema de morrer;
Que fosse a luz dos homens - olho eterno Enquanto lá nos céus, o que foi morto,
Da sua providência. Desfruta outro viver!
[...]
Oh! como é grande e bom o Deus que manda
Oh! como é grande o Senhor Deus, que rege
Um sonho ao desgraçado,
A máquina estrelada,
Que vive agro viver entre misérias,
Que ao triste dá prazer; descanso e vida
De ferros rodeado;
À mente atribula.
Ideia de Deus, poema que trata sobre a criação do universo por Deus e exalta o seu
poder sobre tudo o que existe e a sua justiça, que favorece os justos e pune os injustos.
Há nesse texto, uma clara relação de intertextualidade com a Bíblia Sagrada. Observe
que os que sofrem injustiças serão recompensados enquanto os corruptos sofrerão as
consequências da desobediência ao Criador.
ATENÇÃO PARA AS FIGURAS DE LINGUAGEM NO POEMA IDEIA DE DEUS
ANTÍTESE
Rasgou-se o horror das trevas, fez-se o dia,
E a noite foi criada.
PROSOPOPEIA OU PERSONIFICAÇÃO
Rouqueja o mar raivoso,
E as esferas nos céus ergueram hinos
Ao Deus prodigioso. COMPARAÇÃO
“Como um raio de luz, percorre o espaço,
PROSOPOPEIA E METÁFORA
E tudo nota e vê”
Eterno, imenso, que lh'importa a sanha
‘’Como do podre e carunchoso tronco’’
Do tempo roedor?
Hástea forte e virente

43
O Romper d'Alva
Como és linda! - Como dobras
Do vento o rijo sopro as mansas ondas
Da vida a força e do amor!
Varreu do imenso pego, - e o mar rugindo
- Que tão bem luz dentro d'alma
As nuvens se elevou com fúria insana;
Teu luzir encantador!
Enoveladas vagas se arrojaram
Ao céu co'a branca espuma!
No teu ameno silêncio
Raivando em vão se encontram soluçando
A tormenta se perdeu,
Na base d'erma rocha descalvada;
E do mar a forte vida
Em vão de fúrias crescem, que se quebra
Nos abismos se escondeu!
A força enorme do impotente orgulho
Na rocha altiva ou na arenosa praia. _
Porque assim de novo agora
Da tormenta o furor lhe acende os brios,
Que o vento o não vem toldar,
Da tormenta o furor lh'enfreia as iras,
Parece que vai queixoso
Que em teimosos gemidos se descerram,
Mansamente a soluçar?
Da quieta noite despertando os ecos
Além, no vale humilde, onde não chega
Porque as ramas do arvoredo,
Seu sanhudo gemer, que o dia abafa.
Bem como as ondas do mar,
Sem correr sopro de vento,
Mas a brisa sussurrando
Começam de murmurar?
A face do céu varreu,
Tristes nuvens espalhando,
[...]
Que a noite em ondas verteu.
O arvoredo nessa língua
Que diz, por que assim sussurra?
[...]
Que diz o cantar das aves?
Branda luz, que afaga a vista,
Que diz o mar que murmura?
De que se ama o céu tingir,
Quando entre o azul transparente
Parece alegre sorrir;

44
- Dizem um nome sublime, Tu pacificas minha alma,
O nome do que é Senhor, Quando se rasga com pena,
Um nome que os anjos dizem, Como a noite que se esconde
O nome do Criador. Na luz da manhã serena.

Tão bem eu, Senhor, direi Tu és a luz do universo,


Teu nome - do coração, Tu és o ser criador,
E ajuntarei o meu hino Tu és o amor, és a vida,
Ao hino da criação. Tu és meu Deus, meu Senhor.

Quando a dor meu peito acanha, Direi nas sombras da noite,


Quando me rala a aflição. Direi ao romper da aurora:
Quando nem tenho na terra - Tu és o Deus do universo,
Mesquinha consolação; O Deus que minha alma adora.
Tu, Senhor, do peso insano
Livras meu peito arquejante, Tão bem eu, Senhor, direi
Secas-me o pranto que os olhos Teu nome - do coração,
Vertendo estão abundante. E ajuntarei o meu hino
. Ao hino da criação.
O amanhecer é descrito pelo eu lírico como belo, silencioso, capaz de fazer a forte vida
do mar se esconder nos abismos, já que a sua fúria se desfaz ao romper d’alva. Nesse
clima de silêncio e belezas, a natureza e o sujeito lírico se voltam ao Criador,
enfatizando a religiosidade presente no texto, como se observa nos versos a seguir.

‘’- Dizem um nome sublime,


Tão bem eu, Senhor, direi
O nome do que é Senhor,
Teu nome - do coração,
Um nome que os anjos dizem,
E ajuntarei o meu hino
O nome do Criador.
Ao hino da criação."

45
[...]
Direi nas sombras da noite,
Direi ao romper da aurora:
- Tu és o Deus do universo,
O Deus que minha alma adora.”
FIGURAS DE LINGUAGEM
ANTÍTESE
Direi nas sombras da noite,
Direi ao romper da aurora
METÁFORA
Tu pacificas minha alma,
Quando se rasga com pena
COMPARAÇÃO
Como a noite que se esconde
Na luz da manhã serena.
PROSOPOPEIA é a figura de destaque no poema, pois está presente em várias estrofes.
VEJA O EXEMPLO NA ESTROFE ABAIXO.
Mas a brisa sussurrando
A face do céu varreu,
Tristes nuvens espalhando,
Que a noite em ondas verteu.
A Tarde
Ó tarde, oh bela tarde, oh meus amores,
Mãe da meditação, meu doce encanto!
Os rogos da minha alma enfim ouviste,
E grato refrigério vens trazer-lhe
No teu remansear prenhe de enlevos!
Em quanto de te ver gostam meus olhos,
Enquanto sinto a minha voz nos lábios,
Enquanto a morte me não rouba à vida,
Um hino em teu louvor minha alma exale,
Oh tarde, oh bela tarde, oh meus amores!

46
I
É bela a noite, quando grave estende III
Sobre a terra dormente o negro manto Homem que vivo agro viver de corte,
De brilhantes estrelas recamado; indiferente olhar derrama a custo
Mas nessa escuridão, nesse silêncio Sobre os fulgores teus; - homem do mundo
Que ela consigo traz, há um quê de horrível Mal pode o desbotado pensamento
Que espanta e desespera e geme n'alma; Revolver sobre o pó; mas nunca, oh nunca!
Um quê de triste que nos lembra a morte! Há de elevar-se a Deus, e nunca há de ele
No romper d'alva há tanto amor, tal vida, Na abóbada celeste ir pendurar-se,
Há tantas cores, brilhantismo e pompa, Como de rósea flor pendente abelha.
Que fascina, que atrai, que a amar convida;
Homem da natureza, esse contemple
Não pode suportá-la homem que sofre,
De púrpura tingir a luz que morre
Órfãos de coração não podem vê-la.
As nuvens lá no ocaso vacilantes!
[...]
Só tu, feliz, só tu, a todos prendes!
IV
A mente, o coração, sentidos, olhos,
Sócia do forasteiro, tu, saudade,
A ledice e a dor, o pranto e o riso,
Nesta hora os teus espinhos mais pungentes
Folgam de te avistar; - são teus, - és deles
Cravas no coração do que anda errante.
Homem que sente dor folga contigo,
Só ele, o peregrino, onde acolher-se,
Homem que tem prazer folga de ver-te!
Contigo simpatizam, porque és bela,
Não tem tugúrio seu, nem pai, nem 'spôsa,
Qu'és mãe de merencórios pensamentos, Ninguém que o espere com sorrir nos lábios
Entre os céus e a terra êxtasis doce, E paz no coração, - ninguém que estranhe,
Entre dor e prazer celeste arroubo. Que anseie aflito de o não ver consigo!
II Cravas então, saudade, os teus espinhos;
A brisa que murmura na folhagem, E eles, tão pungentes, tão agudos,
As aves que pipilam docemente, Varando o coração de um lado a outro,
A estrela que desponta, que rutila, Nem trazem dor, nem desespero incitam;
Com duvidosa luz ferindo os mares, Mas remanso de dor, mas um suave
O sol que vai nas águas sepultar-se Recordar do passado, - um quê de triste
Tingindo o azul dos céus de branco e d'oiro;
Que ri ao coração, chamando aos olhos
Perfumes, murmurar, vapores, brisa,
Estrelas, céus e mar, e sol e terra,
Tudo existe contigo, e tu és tudo.

47
Tão espontâneo, tão fagueiro pranto, O exilado! esse não; tão só na vida,
Que não fora prazer não derramá-lo. Como no passamento ermo e sozinho,
E quem - ah tão feliz! -- quem peregrino Sente dores cruéis, torvos pesares
Sobre a terra não foi? Quem sempre há vista Do leito aflito esvoaçar-lhe em torno,
Sereno e brando deslizar-se o fumo Roçar-lhe o frio, o pálido semblante,
Sobre o teto dos seus; e sobre os cumes E o instante derradeiro amargurar-lhe.
Que os seus olhos hão visto à luz primeira Porém, no meu passar da vida à morte,
Crescer branca neblina que se enrola, Possa co'a extrema luz destes meus olhos
Como incenso que aos céus a terra envia? Trocar último adeus com os teus fulgores!
Tão feliz! quando a morte envolta em pranto Ah! possa o teu alento perfumado,
Com gelado suor lh'enerva os membros, Do que na terra estimo, docemente
Procura inda outra mão co'a mão sem vida, Minha alma separar, e derramá-la
E o extremo cintilar dos olhos baços, Como um vago perfume aos pés do Eterno.
De um ente amado procurando os olhos,
Sem prazer, mas sem dor, ali se apaga.
No poema A Tarde, o eu lírico a exalta. Esse é o momento de encantos e a ela ele dedica seu
canto. É importante observar que a noite e o amanhecer também são descritos no poema, mas
é a tarde que a voz lírica louva. A noite, embora bela, há um quê de horrível. E o amanhecer,
mesmo fascinante, é insuportável ao coração dos solitários (órfãos do coração). Somente a
tarde a todos prende como se observa nos versos a seguir.
Só tu, feliz, só tu, a todos prendes!
A mente, o coração, sentidos, olhos,
A ledice e a dor, o pranto e o riso,
Folgam de te avistar; - são teus, - és deles
Homem que sente dor folga contigo,
Homem que tem prazer folga de ver-te!
Contigo simpatizam, porque és bela,
Qu'és mãe de merencórios pensamentos,
Entre os céus e a terra êxtases doce,
Entre dor e prazer celeste arroubo.
Há ainda no poema, a religiosidade, porém de forma mais sutil que nos outros poemas desta
parte da coletânea.

48
O texto A tarde é rico em figuras de linguagem.
ANTÍTESE
“Enquanto a morte me não rouba à vida”
Um quê de triste que nos lembra a morte!
“No romper d'alva há tanto amor, tal vida”
A ledice e a dor, o pranto e o riso,
METÁFORA
“O negro manto
De brilhantes estrelas recamado;’’

Cravas então, saudade, os teus espinhos;


E eles, tão pungentes, tão agudos,
Varando o coração de um lado a outro,
PROSOPOPEIA OU PERSONIFICAÇÃO
A brisa que murmura na folhagem.
Observe como a SINESTESIA ( fusão de sentidos) é construída nessa estrofe.
A brisa que murmura na folhagem,
As aves que pipilam docemente,
A estrela que desponta, que rutila,
Com duvidosa luz ferindo os mares,
O sol que vai nas águas sepultar-se
Tingindo o azul dos céus de branco e d'oiro;
Perfumes, murmurar, vapores, brisa,
Estrelas, céus e mar, e sol e terra.

Veja também o paradoxo na segunda estrofe, pois a noite bela traz um quê de horrível.
Mais exemplo de paradoxo encontrado no poema.
“...um quê de triste
Que ri ao coração, chamando aos olhos
Tão espontâneo, tão fagueiro pranto”

49
O Templo
I o amor! - podia eu senti-lo ao menos;
Estou só neste mudo santuário, Quando eu via a desdita de bem perto
Eu só, com minha dor, com minhas Co'um sorriso infernal no rosto esquálido,
penas! Com fome e frio a tiritar demente,
E o pranto nos meus olhos represado, Acenando-me infausta? - quando vinda
Que nunca viu correr humana vista, Minha honra já sentia, em que os meus
Livremente o derramo aos pés de Cristo, lábios,
Que tão bem suspirou, gemeu sozinho, Tremendo de vergonha, soluçassem
Que tão bem padeceu sem ter conforto, Ao f'liz com que eu na rua deparasse,
Como eu padeço, e sofro, e gemo, e De mãos erguidas: Meu Senhor, piedade!
choro. Eis por que sofro assim, por que assim
Remorso não me punge a consciência, gemo,
Vergonha não me tinge a cor do rosto, Por que meu rosto pálido se encova,
Nem crimes perpetrei; - porque assim Por que somente a dor me ri nos lábios,
choro? Por que meu coração já todo é cinzas.
E direi eu por quê? - Antes meu berço,
Que vagidos de infante vividouro,
Os sons finais de um moribundo ouvisse!
Que esperanças que eu tinha tão
formosas,
Que mimosos enlevos de ternura,
Não continha minha alma toda amores!
Esperanças e amor, que é feito delas?
Um dia me roubava uma esperança,
E sozinho, uma e uma, me deixaram.
Morreram todas, como folhas verdes
Que em princípios do inverno o vento
arranca.

50
II
Menti, Senhor, menti! - porque te adoro.
Quem me dera nas asas deste vento,
No altar profano de beleza esquiva
Que agora tão saudoso aqui murmura,
Não queimo incenso vão; - tu só me Agitando as cortinas, que me encobrem
ocupas Do teu rosto o fulgor, que me não cegue,
O coração, que eu fiz hóstia sagrada, Subir além dos sois, além das nuvens
Apuro de elevados sentimentos, Ao teu trono, ó meu Deus; ou quem me desse
Que o teu amor somente asilam, nutrem. Ser este incenso que se arroja em ondas
Quando ao sopé da cruz me chego aflito, A subir, a crescer, em rolo, em fumo,
Sinto que o meu sofrer se vai minguando, Até perder-se na amplidão dos ares!
Sinto minha ama que de novo existe, Não qu'ria aqui viver! - Quando eu padeço,
Sinto meu coração arder em chamas, Surdez fingida a minha voz responde;
Arder meus lábios ao dizer teu nome. Não tenho voz de amor, que me console,
Assim a cada aurora, a cada noite. Corre o meu pranto sobre terra ingrata,
Virei consolações beber sedento E dor mortal meu coração fragoa.
Aos pés do meu Senhor; - virei meu peito Só tu, Senhor, só tu, no meu deserto
Encher de religião, de amor, de fogo, Escutas minha voz que te suplica;
Que além de infindos céus minha alma Só tu nutres minha alma de esperança;
exalte. Só tu, ó meu Senhor, em mim derramas
Torrentes de harmonia, que me abrasam.

51
Qual órgão, que ressoa mavioso, Eflúvios desse canto, que me guia
Quando segura mão lhe oprime as teclas, No caminho da vida áspero e duro.
Assim minha alma, quando a ti se achega, Assim por muito tempo reboando
Hinos de ardente amor disfere grata: Vão no recinto do sagrado templo
E, quando mais serena, inda conserva Sons, que o órgão soltou, que o ouvido escuta
.
O Templo
Poema de intensa religiosidade no qual o eu lírico assume suas dores e sua solidão, não
aos humanos, mas a Cristo, como se observa nos versos;
“E o pranto nos meus olhos represado,
Que nunca viu correr humana vista
Livremente o derramo aos pés de Cristo.”
É importante observar que o eu lírico vê em seu sofrimento semelhanças com o
sofrimento de Cristo. Ao relatar as suas dores, diz que não cometeu crimes, mas chora
porque se encontra moribundo depois de ter perdido as esperanças gradativamente.
É importante notar ainda, nos primeiros versos da terceira estrofe, como o eu lírico diz
renunciar o que é profano e se ocupar somente de Cristo e somente nele encontrar
consolação para as suas dores. É perceptível também o seu desejo de subir ao trono de
Deus, na imensidão dos ares. Como foi citado na primeira linha. Esse poema enfatiza a
religiosidade, característica de destaque do Romantismo, sem deixar de lado a
subjetividade e a evasão, que nesse texto, ocorre por meio da fé.

EXEMPLOS DE FIGURAS DE LINGUAGENS ENCONTRADAS NO POEMA.


COMPARAÇÃO
“Morreram todas, como folhas verdes
Que em princípios do inverno o vento arranca’’
‘’Qual órgão, que ressoa mavioso’’ POLISSÍNDETO
METÁFORA Como eu padeço, e sofro, e gemo, e
‘’Por que meu coração já todo é cinzas. ’’ choro.
METÁFORA E PROSOPOPEIA
“Torrentes de harmonia, que me abrasam.” Quem me dera nas asas deste vento,
“Sinto meu coração arder em chamas’’ Que agora tão saudoso aqui murmura

52
Te Deum És tu que do oceano à fúria insana
Senhor Deus Sabaot, três vezes santo, Pões limites e cobro, - és tu que a terra
Imenso é o poder, tua força imensa, No seu vôo equilibras, - quem dos astros
Teus prodígios sem conta: - e os céus e a terraGovernas a harmonia, como notas
Teu ser e nome e glória preconizam. Acordes, simultâneas, palpitando
E o arcanjo forte, e o serafim sem mancha, Nas cordas d'Harpa do teu Rei Profeta,
E o coro dos profetas, e dos mártires Quando ele em teu louvor hinos soltava,
A turba eleita - a ti, Senhor, proclamam Qu'iam, cheios de amor, beijar teu sólio.
Senhor Deus Sabaot, três vezes santo.
Santo! Santo! Santo! - teus prodígios
Na inocência do infante és tu quem falas; São grandes, como os astros, - são
A beleza, o pudor - és tu que as gravas imensos,
Nas faces da mulher, - és tu que ao velho Como areia delgada, em quadra estiva.
Prudência dás, - e o que verdade e força
Nos puros lábios, do que é justo, imprimes. E o arcanjo forte, e o serafim sem mancha,
E o coro dos profetas, e dos mártires
Es tu quem dás rumor à quieta noite, A turba eleita - a ti, Senhor, proclamam,
És tu quem dás frescor à mansa brisa, Senhor Deus Sabaot, três vezes grande.
Quem dás fulgor ao raio, asas ao vento,
Quem na voz do trovão longe rouquejas.

Canto de louvor a Deus, Sabaot, Deus dos exércitos, quem controla todas as coisas: a
inocência da criança, o pudor da mulher, a prudência do velho, a força nos lábios puros
e justos e toda a natureza. Poema de intensa religiosidade, exaltação ao poder de Deus.
É importante observar como essa característica é enfatizada na terceira parte desta
obra.
COMPARAÇÃO POLISSÍNDETO E APOSTROFE
Santo! Santo! Santo! - teus prodígios E o arcanjo forte, e o serafim sem mancha,
São grandes, como os astros, - são imensos, E o coro dos profetas, e dos mártires
Como areia delgada, em quadra estiva. A turba eleita - a ti, Senhor, proclamam,
”...como notas
Senhor Deus Sabaot, três vezes grande.
Acordes, simultâneas, palpitando...”

53
Adeus

Meus amigos, Adeus! Já no horizonte


O fulgor da manhã se empurpurece:
É puro e branco o céu, - as ondas mansas,
- Favorável a brisa; - irei de novo
Sorver o ar puríssimo das ondas,
E na vasta amplidão dos céus e mares
De vago imaginar embriagar-me!
Meus Amigos, Adeus! - Verei fulgindo
A lua em campo azul, e o sol no ocaso
Tingir de fogo a implacidez das águas;
Verei hórridas trevas lento e lento
Desceram, como um crepe funerário
Em negro esquife, onde repoisa a morte;
Verei a tempestade quando alarga
As negras asas de bulcões, e as vagas
Soberbas encastela, esporeando
O curto bojo de ligeiro barco,
Que geme, e ruge, e empina-se insofrido
Galgando os escarcéus, - bem larga esteira
De fósforo e de luz trás si deixando:
Generoso corcel, que sente as cruzes
Agudas de teimosos acicates
Lacerarem-lhe rábidas o ventre.

54
E eu parti! - Não chorei, que do meu pranto
A larga fonte jaz de há muito exausta;
Há muito que os meus olhos não gotejam
O repassado fel d'acre amargura;
E o pranto no meu peito represado
Em cinza o coração me há convertido.
É assim que um vulcão se torna fonte
De linfa amarga e quente; e a fonte em ermo,
Onde não crescem perfumadas flores,
Nem tenras aves seus gorjeios soltam,
Nem triste viajor encontra abrigo.

Rasgado o coração de pena acerba,


Transido de aflições, cheio de mágoa,
Miserando parti! tal quando réprobo,
Adão, cobrindo os olhos co'as mãos ambas,
Em meio a sua dor só descobria
Do Arcanjo os candidíssimos vestidos,
E os lampejos da espada fulminante,
Que o Éden tão mimoso lhe vedava.
Porém quando algum dia o colorido
Das vivas ilusões, que inda conservo,
Sem força esmorecer, - e as tão viçosas
Esp'ranças, que eu educo, se afundarem
Em mar de desenganos; - a desgraça
Do naufrágio da vida há de arrojar-me
A praia tão querida, que ora deixo,
Tal parte o desterrado: um dia as vagas
Hão de os seus restos rejeitar na praia,
Donde tão novo se partira, e onde
Procura a cinza fria achar jazigo.

55
Inda uma vez, Adeus! Curtos instantes
De inefável prazer - horas bem curtas
De ventura e de paz frui convosco:
Oásis que encontrei no meu deserto,
Tépido vale entre fragosas serras
Virente derramado, foi a quadra
Da minha vida, que passei convosco.
Aqui de quanto amei, do que hei sofrido,
De tudo quanto almejo, espero, ou temo
Deslembrado vivi! - Oh! quem me dera
Que entre vós outros me alvejasse a fronte,
E que eu morresse entre vós! Mas força oculta,
lrresistível, me persegue e impele.
Qual folha instável em ventoso estio
Do vento ao sopro a esvoaçar sem custo;
Assim vou eu sem tino, - aqui pegadas
Mal firmes assentando - além pedaços
De mim mesmo deixando. Na floresta
O lasso viandante extraviado
Por todo o verde bosque estende os olhos,
E cansado esmorece, - cai, medita,
Respira mais de espaço, cobra alento,
E nas solidões de novo ei-lo se entranha.
Vestígios mal seguros sopra o vento,
Ou nivela-os a chuva, ou relva os cobre:
Talvez que folhas ásperas de arbusto
Mordam velos da túnica, e denotem
(Duvida o viajor, que os vê com pasmo)
Que errante caminheiro ali passasse.

56
No poema Adeus, o eu lírico relembra os momentos de prazer como oásis no seu deserto
e isso o leva ao desejo de morrer entre os amigos, como se observa nos versos:
“Oh! quem me dera
Que entre vós outros me alvejasse a fronte,
E que eu morresse entre vós!’’ É perceptível a melancolia do eu lírico com a partida:
‘’Assim vou eu sem tino, - aqui pegadas
Mal firmes assentando - além pedaços
De mim mesmo deixando.’’

Apesar da dor e do pranto contido, o eu lírico admite que ainda guarda esperanças, mas
quando essas naufragarem em mar de desenganos, o naufrágio da vida há de jogá-lo à
praia de onde ele parte. Observe que no final do poema a morte das esperanças se
confunde com a morte do sujeito lírico, proporcionando uma dupla interpretação.
FIGURAS DE LINGUAGEM
APÓSTROFE
“Meus amigos, Adeus’’
METÁFORA
‘’De vago imaginar embriagar-me! “ COMPARAÇÃO
“Tingir de fogo a implacidez das águas.” Desceram, como um crepe funerário
As negras asas de bulcões, e as vagas Em negro esquife, onde repoisa a morte.
PROSOPOPEIA
Generoso corcel, que sente as cruzes O curto bojo de ligeiro barco,
Agudas de teimosos acicates Que geme, e ruge, e empina-se insofrido
Lacerarem-lhe rábidas o ventre.
Qual folha instável em ventoso estio
‘’Em cinza o coração me há convertido’’
Do vento ao sopro a esvoaçar sem custo
‘’Em mar de desenganos’’
“Oásis que encontrei no meu deserto’’
...”pedaços
De mim mesmo deixando’’
“O repassado fel d'acre amargura’
‘’Rasgado o coração de pena acerba’’
“Do naufrágio da vida’’

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QUESTÕES
1. Leia a primeira estrofe do poema O canto do Piaga
“ Ó GUERREIROS da Taba sagrada,
Ó Guerreiros da Tribo Tupi,
Falam Deuses nos cantos do Piaga,
Ó Guerreiros, meus cantos ouvi’’.

As vírgulas foram usadas para isolar


A) o vocativo
B) o aposto
C) o adjunto adnominal
D) o adjunto adverbial
E) o agente da passiva

2.No poema O canto do guerreiro, a repetição Ó guerreiros, meu canto ouvi, centrada
nos ouvintes com a intenção de convencê-los do seu canto, é exemplo da função
A) emotiva
B) conativa
C) fática
D) referencial
E) metalinguística
3.A partir da leitura do poema O canto do guerreiro, é possível concluir sobre os
instrumentos, que
A) O toque do Boré funciona como um ritual de convocação dos guerreiros fortes a
superar os obstáculos e defender a tribo.
B) O toque do Boré anuncia a morte dos guerreiros da tribo rival.
C) O maracá é instrumento de luta, já que serve para o pajé alertar sua tribo.
D) O tacape vibra servindo de alerta ao índio guerreiro.
E) A frecha anuncia o momento de luta entre as tribos.

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4.Leia a estrofe a seguir do poema O canto do Piaga.

Tu não viste nos céus um negrume


Toda a face do sol ofuscar;
Não ouviste a coruja, de dia,
Seus estrídulos torva soltar?

Nessa estrofe ocorre o uso simultâneo da visão e da audição sugerindo maus


presságios. Essa mistura de sensações relacionadas aos sentidos dá nome a seguinte
figura de linguagem:
A) Metáfora
B) Hipérbole
C) Sinestesia
D) Aliteração
E) Assonância

5Leia a estrofe a seguir do poema O canto do índio.

‘’Eis que os seus loiros cabelos


Pelas águas se espalhavam,
Pelas águas, que de vê-los
Tão loiros se enamoravam. ’’

Na voz lírica, as águas se enamoram dos cabelos da amada. O recurso de expressão


utilizado nessa estrofe para sugerir que o sujeito lírico está enamorado é
A) Prosopopeia
B) metáfora
C) metonímia
D) hipérbole
E) comparação

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6. Leia as estrofes do poema “Caxias” da obra Primeiro cantos de Gonçalves Dias.

Em mole seda as graças não escondes, Mas dia inda virá, em que te pejes
Não cinges d'oiro a fronte que descansas Dos, que ora trajas, símplices ornatos
Na base da montanha; E amável desalinho:
És bela como a virgem das florestas, Da pompa e luxo amiga, hão de cair-te
Que no espelho das águas se contempla, Aos pés então - da poesia a c'roa
Firmada em tronco anoso. E da inocência o cinto.

O conectivo mas pode ser substituído sem alteração de sentido por


A) que
B) porém
C) portanto
D) pois
E) e
7.Leia as estrofes do poema Romper d´alva.

Quando a dor meu peito acanha, Tu, Senhor, do peso insano


Quando me rala a aflição. Livras meu peito arquejante,
Quando nem tenho na terra Secas-me o pranto que os olhos
Mesquinha consolação; Vertendo estão abundante.

Nessas estrofes, a primeira é construída por orações adverbiais que exercem em relação
aos versos da segunda estrofe circunstância de
A) causa
B) consequência
C) tempo
D) proporção
E) comparação

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8.Observe o recurso de expressão na estrofe seguir.
Porque as ramas do arvoredo,
Bem como as ondas do mar,
Sem correr sopro de vento,
Começam de murmurar?
Nota-se que, às ramas dos arvoredos, foi atribuída a ação humana de murmurar. A
figura de linguagem em questão é
A) metáfora
B) sinestesia
C) prosopopeia
D) metonímia
E) hipérbole
9.Leia os versos abaixo do poema tarde que está na última parte da obra primeiros
cantos.
‘’Um quê de triste que nos lembra a morte!
“No romper d'alva há tanto amor, tal vida”
A ledice e a dor, o pranto e o riso’’

A figura de linguagem que aproxima palavras opostas, como se observa nos versos
acima é
A) antítese
B) metáfora
C) prosopopeia
D) metonímia
E) eufemismo
10.Leia os versos abaixo do poema tarde que está na última parte da obra Primeiros
cantos.
Cravas então, saudade, os teus espinhos;
E eles, tão pungentes, tão agudos,
Varando o coração de um lado a outro,
Nem trazem dor, nem desespero incitam;

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Mas remanso de dor, mas um suave
Recordar do passado, - um quê de triste
Que ri ao coração, chamando aos olhos
Tão espontâneo, tão fagueiro pranto,
Que não fora prazer não derramá-lo.
O mas auxilia no tom paradoxal dos versos. Esse conectivo tem valor de
A) oposição
B) conclusão
C) explicação
D) adição
E) alternância

11. Leia os versos do poema O templo.

‘’Estou só neste mudo santuário,


Eu só, com minha dor, com minhas penas!
E o pranto nos meus olhos represado,
Que nunca viu correr humana vista,
Livremente o derramo aos pés de Cristo,
Que tão bem suspirou, gemeu sozinho,
Que tão bem padeceu sem ter conforto,
Como eu padeço, e sofro, e gemo, e choro.’’

O polissíndeto usado no último verso sugere:


A) a intensidade do sofrimento do eu lírico
B) o conformismo em relação a dor
C) o sofrimento de Cristo
D) uma comparação ao sofrimento de Cristo
E) revolta do eu lírico em relação ao sofrimento

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12.No poema “Desengano” da obra “Primeiros cantos de Gonçalves Dias’’, há
construções antitéticas que sugerem a frustração amorosa do sujeito lírico. Destaque a
alternativa onde esse recurso foi utilizado.
A)” Harmonia era ouvir sua voz,
Era ver seu sorriso harmonia”
B)” Tão belo o nosso amor! - foi só de um dia,
Como uma flor!
C)” Quão insensato fui! - busquei firmeza.
Qual em ondas de areia movediça”
D) “Por que tão cedo o talismã quebraste
Do nosso amor?”
E) " E o que era o teu amor, que me embalava
Mais do que meigos sons de meiga lira?”

13.Leia a estrofe do poema “ O soldado espanhol” da obra “Primeiros cantos” de


Gonçalves Dias.

- Por entre os vidros pintados


D'igreja antiga, a luzir
Não vês luz? - Vejo. - E não sentes
De a veres, meigo sentir?
- É doce ver entre as sombras
A luz do templo a luzir!
Nessa estrofe, observa-se as seguintes figuras de linguagem:
A) sinestesia e antítese
B) prosopopeia e metáfora
C) eufemismo e prosopopeia
D) metonímia e antítese
E) metonímia e paradoxo

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14.Leia as estrofes do poema “ Pedido” da obra “Primeiros cantos” de Gonçalves Dias.
Tu lhe sorriste
Com tal sorriso!
Com tal sorriso,
Que apunhalava.

Tu lhe falaste
Com voz tão doce!
Com voz tão doce,
Que me matava.

As figuras de linguagem usadas nas estrofes acima são;


A) metáfora, sinestesia, paradoxo e hipérbole.
B) anáfora, metáfora sinestesia e hipérbole.
C) eufemismo, prosopopeia, anáfora e metáfora.
D) metonímia, antítese, sinestesia e anáfora.
E) metonímia, antítese, sinestesia e hipérbole.

15.Leia o fragmento do poema “Seus olhos” de Gonçalves Dias e responda à questão.

Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,


De vivo luzir,
Estrelas incertas, que as águas dormentes
Do mar vão ferir.

No terceiro verso a figura de linguagem predominante é:


A) hipérbole
B) metáfora
C) pleonasmo
D) antítese
E) eufemismo

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16.Leia a estrofe do poema “A leviana para responder à questão abaixo.

“Tu és vária e melindrosa,


Qual formosa
Borboleta num jardim,
Que as flores todas afaga,
E divaga
Em devaneio sem fim.”

Ao comparar a amada com a borboleta no jardim, o sujeito lírico põe em evidência um


a sua
A) beleza
B) delicadeza
C) fragilidade
D) inocência
E) volubilidade

17. Em “A minha musa”, o sujeito lírico faz referência a própria poesia. A função da
linguagem que cumpre esse papel de, no texto, falar do próprio texto é:
A) referencial
B) metalinguística
C) fática
D) conativa
E) poética

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18.Leia o poema ‘’Pedido’’ para responder à questão.
Ah! que eu não morra sem provar, ao menos
Sequer por um instante, nesta vida
Amor igual ao meu!
Dá, Senhor Deus, que eu sobre a terra encontre
Um anjo, uma mulher, uma obra tua,
Que sinta o meu sentir;
Uma alma que me entenda, irmã da minha,
Que escute o meu silêncio, que me siga
Dos ares na amplidão!
Que em laço estreito unidas, juntas, presas,
Deixando a terra e o lodo, aos céus remontem
Num êxtase de amor!

Nesse poema, destacam-se características de destaque do Romantismo, EXCETO:


A) idealização da mulher C) frustação amorosa
B) exaltação do amor D) sentimentalismo
E) religiosidade
19. O poema O canto do índio está em Poesias americanas, primeira parte da obra
Primeiros cantos. Leia as estrofes abaixo

Ah! que não queiras tu vir ser rainha Mas queiras tu ser minha, que eu prometo
Aqui dos meus irmãos, qual sou rei deles! Vencer por teu amor meu ódio antigo,
Escuta, ó Virgem dos Cristãos formosa. Trocar a maça do poder por ferros
Odeio tanto aos teus, como te adoro; E ser, por te gozar, escravo deles.

Tendo em vista as estrofes acima transcritas, é correto afirmar que em alguns versos,
a submissão do índio a uma mulher branca se dá por meio de
A) hipérbole
B) prosopopeia D) metáfora
C) antítese E) eufemismo

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Poema para as questões 20 e 21
Deprecação Já hoje não caçam nas matas frondosas
A corça ligeira, o trombudo quati...
Tupã, ó Deus grande! cobriste o teu rosto A morte pousava nas plumas da frecha,
Com denso velâmen de penas gentis; No gume da maça, no arco Tupi!
E jazem teus filhos clamando vingança
Dos bens que lhes deste da perda infeliz!
[...]
Tupã, ó Deus grande! descobre o teu
Tupã, ó Deus grande! teu rosto descobree:
Bastante sofremos com tua vingança!
rosto:
Já lágrimas tristes choraram teus filhos Bastante sofremos com tua vingança!
Teus filhos que choram tão grande mudança. Já lágrimas tristes choraram teus filhos,
Teus filhos que choram tão grande
Anhangá impiedoso nos trouxe de longe tardança
Os homens que o raio manejam cruentos, .
Que vivem sem pátria, que vagam sem tino Descobre o teu rosto, ressurjam os
Trás do ouro correndo, voraces, sedentos. bravos,
Que eu vi combatendo no albor da
E a terra em que pisam, e os campos e os rios manhã;
Que assaltam, são nossos; tu és nosso Deus : Conheçam-te os feros, confessem
Por que lhes concedes tão alta pujança,
vencidos
Se os raios de morte, que vibram, são teus?
Que és grande e te vingas, qu'és Deus, ó
Tupã!
Tupã, ó Deus grande! cobriste o teu rosto
Com denso velâmen de penas gentis;
E jazem teus filhos clamando vingança Em Deprecação o sofrimento do indígena
Dos bens que lhes deste da perda infeliz. se dá em razão
A) da maldade de Tupã.
Teus filhos valentes, temidos na guerra, B) da chegada do homem branco.
No albor da manhã quão fortes que os vi! C) da maldição de Anhangá.
A morte pousava nas plumas da frecha, D) Do desejo de vingança
No gume da maça, no arco Tupi! E) Do medo de Anhangá
[...]

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O sujeito lírico desse poema acredita que
A) as armas de fogo usadas pelos europeus são raios de Tupã
B) que Tupã tornou –se frágil coma presença dos europeus.
C) que Tupã não pode deter os europeus
D) que os indígenas não são mais capazes de lutar.
E) que a força do europeu se sobrepõe a do indígena.

22. Leia a primeira estrofe do poema O soldado espanhol.


O céu era azul, tão meigo e tão brando,
A terra tão erma, tão quieta e saudosa,
Que a mente exultava, mais longe escutando
O mar a quebrar-se na praia arenosa.

Os adjetivos atribuídos ao céu e a terra sugerem o enlace amoroso e a partida do


soldado. A figura de linguagem usada nessa estrofe é:
A) prosopopeia
B) metáfora
C) hipérbole
D) símile
E) metonímia
23.Leia a estrofe do poema Seus olhos.

Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,


Assim é que são;
Às vezes luzindo, serenos, tranquilos,
Às vezes vulcão!

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Os olhos da amada, nessa estrofe, apresentam ora serenidade, ora intensidade.
O recurso de expressão usado para sugerir essa ideia é
A) símile
B) metáfora
C) prosopopeia
D) antítese
E) hipérbole

24. Observe os últimos versos da estrofe abaixo.


Quer sejam saudades, quer sejam desejos
Da pátria melhor;
Eu amo seus olhos que choram sem causa
Um pranto sem dor.

Nesses versos se destaca a seguinte figura de linguagem:


A) hipérbole
B) paradoxo
C) metáfora
D) ironia
E) comparação

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25. Leia o poema Canção do exílio de
Minha terra tem primores,
Gonçalves Dias.
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
Onde canta o Sabiá.
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Nosso céu tem mais estrelas,
Sem que desfrute os primores
Nossas várzeas têm mais flores,
Que não encontro por cá;
Nossos bosques têm mais vida,
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Nossa vida mais amores.
Onde canta o Sabiá.

Em cismar, sozinho, à noite,


Coimbra - Julho 1843.
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

A partir da leitura desse poema, é possível inferir que


A) o sujeito lírico exalta a sua terra de forma individualista, enfatizando essa ideia com o
uso do possessivo em primeira pessoa.
B) A melancolia do sujeito lírico se dá pela desesperança, já que ele não acredita na
possibilidade de retorno ao espaço de belezas.
C) O sujeito lírico, ao enfatizar os seus sentimentos e as belezas inigualáveis da terra
distante, oscila entre o individual e o coletivo.
D) A ideia de exílio não está clara no poema, já que o sujeito lírico somente canta as
belezas de sua terra.
E) Embora haja a supervalorização da terra distante, o que fica em primeiro plano no
poema é a interioridade do sujeito lírico.

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26. Observe a função sintática do termo destacado no verso abaixo.
"As aves, que aqui gorjeiam"
O termo que exerce a mesma função sintática está destacado no verso
A) Em cismar, sozinho, à noite.
B) Nosso céu tem mais estrelas,
C) Minha terra tem primores
D) Nossa vida mais amores.
E) Não gorjeiam como lá.

27. Observe a oração em destaque


As aves, que aqui gorjeiam,
A oração destacada acima é:
A) oração coordenada explicativa
B) oração substantiva apositiva
C) oração adjetiva explicativa
D) oração substantiva objetiva

28. Leia a estrofe abaixo.

Nosso céu tem mais estrelas,


Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

A repetição no início dos versos é um recurso de expressão chamado


A) polissíndeto
B) anáfora
C) hipérbole
D) metáfora
E) assonância

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29. A estrofe abaixo pertence ao poema Minha vida e meus amores.

A fugaz borboleta as flores todas


Elege, e liba e uma e outra, e foge
Sempre em novos amores enlevada:
Neste meu paraíso fui como ela,
Inconstante vagando em mar de amores.

A comparação, nessa estrofe, sugere


A) a beleza da natureza
B) a leviandade do sujeito lírico
C) a beleza da mulher amada
D) a fugacidade da borboleta
E) semelhança entre a amada e as flores

30. Observe as orações destacadas na estrofe abaixo.

E eu sempre a via! ... quer nas nuvens d'oiro


Quando ia o sol nas vagas sepultar-se,
Ou quer na branca nuvem que velava _
O círculo da lua, - quer no manto
D'alvacenta neblina que baixava
Sobre as folhas do bosque, muda e grave,
Da tarde no cair; nos céus, na terra,
A ela, a ela só, viam meus olhos.
As orações destacadas são:
A) adjetiva restritivas e adverbiais
B) alternativas adjetivas explicativas
C) alternativas adjetivas restritivas
D) alternativas adjetivas substantivas
E) adjetivas restritivas e aditivas

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GABARITO
1 (A) O piaga se dirige diretamente aos guerreiros. Trata-se, portanto de um vocativo,
que é o termo que expressa, chamamento, invocação. O vocativo sempre vem isolado
por vírgula.
2. (B) Conativa- função centrada na segunda pessoa do discurso, com verbo no modo
imperativo
3. (A) O toque do Boré funciona como um ritual de convocação dos guerreiros fortes a
superar os obstáculos e defender a tribo.
4.(C) Sinestesia, pois essa é a figura de linguagem que faz a fusão de sentidos. Na
estrofe, ocorre o uso simultâneo da visão e da audição.
5. (A) Prosopopeia – observe que sentimentos humanos foram atribuídos as águas
para sugerir que o sujeito lírico está enamorado.
6. (B) O mas marca uma oposição em relação ao sentido da estrofe anterior. Esse
conectivo só pode ser substituído por outro de valor também adversativo.
7 (C) Os três primeiros versos apresentam circunstancias de tempo. Trata-se,
portanto, de orações subordinadas adverbiais temporais.
8 (C)Prosopopeia é uma recurso de expressão muito usado na conotação. Nessa
figura de linguagem, ações e sentimentos humanos são transferidos para outros
elementos
9 (A) antítese – observe a construção com palavras opostas.
10(A) OPOSIÇÃO, já visto na questão 6.
11(A) Como eu padeço, e sofro, e gemo, e choro.’’ A repetição do e mostra a
intensidade do sofrimento do sujeito lírico.
12(C) Observe a contraposição (” Quão insensato fui! - busquei firmeza.
Qual em ondas de areia movediça”)
13. (A) Há no poema a aproximação de sentidos, isto é, visão e paladar. E a antítese (
luz e sombra).
14.(B) anáfora, metáfora sinestesia e hipérbole. Anáfora é a repetição no início dos
versos; a forma verbal apunhalava foi usada no sentido metafórico; sinestesia é a
fusão de sentidos (voz doce); e a forma verbal matava expressa um exagero.

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15.(B) metáfora – os olhos são estrelas incertas.
16(E) volubilidade – observe que a borboleta afaga todas as flores e permanece sem
pouso certo.
17. (B) O poema fala sobre a construção poética
18. (C) O sujeito lírico idealiza um amor. Não há no poema referência a frustração
amorosa.
19. (C) Antítese- observe a oposição (Odeio tanto aos teus, como te adoro)
20. (B) O poema faz referência à colonização.
21 (A) O sujeito lírico desse poema acredita que as armas de fogo usadas pelos
europeus são raios de Tupã( o deus do trovão dos indígenas)
22(A) Prosopopeia (o céu era meigo e a terra saudosa)
23(D) Antítese - Tranquilos se opõe a vulcão.
24(B) Paradoxo (chorar um pranto sem dor)
25 (C) O sujeito lírico, ao enfatizar os seus sentimentos e as belezas inigualáveis da
terra distante, oscila entre o individual e o coletivo.
26(C) O que retoma o antecedente as aves, sujeito da oração. Portanto o termo
destacado que também exerce a função de sujeito é minha terra.
27(C) A oração é adjetiva explicativa. Isso mostra que todas as aves de lá não
gorjeiam como as de sua terra. Observe ainda o uso do pronome relativo que usado
para retomar um antecedente.
28(B) Anáfora é a repetição no início dos versos.
29(B) O sujeito lírico se vê leviano assim como a borboleta.
30(C) Alternativas e adjetivas restritivas

@professorafaieth
ronyfaieth@hotmail.com

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