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Poder Judiciário

JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária de Santa Catarina
1ª Vara Federal de Joinville
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AÇÃO PENAL Nº 5000214­57.2015.4.04.7201/SC


AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: GUILHERME KRIEGER
ADVOGADO: TASSO FERREIRA DA SILVA
RÉU: ARTUR KRIEGER
ADVOGADO: TASSO FERREIRA DA SILVA

SENTENÇA

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Artur Krieger


e Guilherme Krieger, imputando­lhes a prática das condutas tipificadas no artigo 337­A,
incisos I e III, na forma do art. 71, todos do Código Penal ­ CP, e no artigo 1º, inciso I, da lei
n. 8.137/90, na forma do art. 71 do CP, cumulando­se os delitos na forma do artigo 69 do
CP, narrando as condutas delituosas da seguinte forma:

"I – Do crime de sonegação de contribuição previdenciária – Autos de Infração


DEBCAD nº 37.281.439­5 e nº 37.281.438­7

Consta do inquérito policial em epígrafe, instruído com a Representação Fiscal para Fins
Penais (RFFP) nº 10920.004585/2010­99, oriunda da Delegacia da Receita Federal do
Brasil em Joinville, SC, que, no período compreendido entre janeiro de 2006 e junho de
2010, ARTUR KRIEGER e GUILHERME KRIEGER, na qualidade de sócios
administradores da empresa Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda., inscrita no CNPJ sob
o nº 03.359.107/0001­19, com sede na rua Bento Torquato da Rocha, nº 274, bairro Vila
Nova, em Joinville, SC, agindo de forma livre e consciente, sonegaram contribuições
sociais previdenciárias devidas por meio da omissão de informações em Guias de
Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência
Social (GFIP) acerca de remunerações pagas a quinze segurados empregados mantidos a
seu serviço, quatro destes sem o respectivo registro em Carteira de Trabalho e Previdência
Social (CTPS), e contribuintes individuais, todos listados na RFFP, no que se refere às
competências fiscais de 01/2006 a 06/2010, incluindo os décimos­terceiro salários dos anos
de 2006 a 2009, consoante apurado pela auditoria previdenciária mediante exame de
documentos e sistemas informatizados da Receita Federal do Brasil, tais como folhas de
pagamentos (FP), GFIP´s, Auto de Infração (AI) lavrado pelo Ministério do Trabalho e
documentos que o instruíram, ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do
Trabalho e reclamatórias ajuizadas por empregados em face da empresa.

Segundo restou apurado, ARTUR KRIEGER e GUILHERME KRIEGER constituíram e


mantiveram as empresas Neumatec Ltda., Krieger e Meurer Ltda. e WMM Metrologia e
Usinagem Ltda. de forma simulada, como empresas “de fachada”, as quais eram
beneficiárias da tributação pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e
Contribuições da Microempresa e das Empresas de Pequeno Porte (SIMPLES), a fim de
reduzir tributos federais efetivamente devidos pela empresa Arbeitec Tecnologia em
Usinagem Ltda., única empresa do grupo existente de fato e que remunerava os empregados
naquelas registrados, bem como gerava receitas e praticava atos de comércio e indústria,
sendo os sócios e empregados daquelas considerados segurados empregados da Arbeitec
Tecnologia em Usinagem Ltda., posto que a serviço desta laboravam.

Em virtude das citadas condutas houve a constituição de créditos previdenciários no


importe de R$ 1.033.880,00 (ref. Auto de Infração – DEBCAD nº 37.281.439­5) e R$
424.211,13 (ref. Auto de Infração ­ DEBCAD nº 37.281.438­7)1, atualizados em 24.11.2010,
incluídos os consectários legais de juros e multa, crédito esse inscrito pela Procuradoria
Seccional da Fazenda Nacional em Dívida Ativa haja vista a inexistência de impugnação ao
lançamento, inclusão do débito em regime de parcelamento fiscal ou o seu pagamento
integral, consoante fl. 430 da RFFP (Evento nº 1, OUT4) e ofício nº 336/2014 ­
SACAT/DRF/JOI/SC (fl. 15 do IPL).

A materialidade do sobredito crime está demonstrada nos mencionados Autos de Infração,


nos Relatórios Fiscal e Discriminativo dos Débitos, bem como nos demais documentos de
interesse fiscal que embasaram as autuações, todos constantes da inclusa RFFP (cf. Evento
nº 01, OUT2, OUT3 e OUT4).

A autoria do delito emerge nítida da condição de sócios administradores ostentada por


ARTUR KRIEGER e GUILHERME KRIEGER, o primeiro no período de 09.09.2005 a
24.10.2008 e o segundo a partir de 25.10.2008, e de suas efetivas atuações à frente da
empresa à época dos fatos, conforme se extrai dos documentos societários da pessoa
jurídica constantes da RFFP e das reclamatórias trabalhistas examinadas pela
Fiscalização, sendo certa a responsabilidade legal destes pelas informações prestadas ao
Fisco acerca da integralidade dos fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias
havidos nos respectivos períodos.

As condutas narradas, que configuram o crime do art. 337­A, incisos I e III, do Código
Penal, foram perpetradas de tal forma que, pelas condições de tempo (competências fiscais
sequentes, entre janeiro de 2006 e junho de 2010), lugar (ambiência diretiva da empresa,
sediada em Joinville, SC) e maneira de execução (conforme antes descrito), devem as
subsequentes serem consideradas como continuação da primeira.

Agindo em conluio e com unidade de intentos, ARTUR KRIEGER e GUILHERME


KRIEGER, de forma livre e consciente, praticaram o crime descrito no art. 337­A, incisos I
e III do Código Penal, por 136 vezes ­ número total de competências fiscais em que
ocorreram mencionadas condutas ­, na forma do art. 71, ambos do Código Penal, ausente
alguma justificante das condutas prevista no art. 23 do antedito codex e deles sendo
exigível, em cada situação concreta, comportamento diverso, é dizer, de observância à Lei.

2. Do crime contra a ordem tributária – Auto de Infração DEBCAD nº 37.281.440­9

Consta, mais, da mencionada RFFP nº 10920.004585/2010­99, oriunda da Delegacia da


Receita Federal do Brasil em Joinville, SC, que ARTUR KRIEGER e GUILHERME
KRIEGER, na condição de sócios administradores da referida empresa Arbeitec Tecnologia
em Usinagem Ltda ­ Me., com sede em Joinville, SC, suprimiram contribuições sociais
gerais da empresa destinadas ao financiamento de terceiros [SALÁRIO­EDUCAÇÃO,
INCRA, SENAI, SESI e SEBRAE] mediante a omissão de informações acerca de fatos
geradores em GFIP (remunerações pagas a quinze segurados empregados e contribuintes
individuais), no que se refere às competências fiscais de 01/2006 a 06/2010, incluindo os
décimos­terceiro salários dos anos de 2006 a 2009, consoante restou apurado por meio da
análise dos anteditos documentos e dos dados constantes dos sistemas informatizados da
Receita Federal do Brasil.

Como consequência das aludidas condutas houve a constituição de crédito tributário por
meio da lavratura do Auto de Infração ­ DEBCAD nº 37.281.404­9, no valor total de R$
246.519,33, já incluídos os consectários legais de juros e multa, crédito esse inscrito pela
Procuradoria Seccional da Fazenda Nacional em Dívida Ativa haja vista a inexistência de
impugnação ao lançamento, inclusão do débito em regime de parcelamento fiscal ou o seu
pagamento integral, consoante fl. 430 da RFFP (Evento nº 1, OUT4) e ofício nº 336/2014 ­
SACAT/DRF/JOI/SC (fl. 15 do IPL).
A existência material do crime em comento está demonstrada pelo antedito Auto de
Infração, pelos Relatórios Fiscal e Discriminativo de Débito, assim como pelos demais
documentos de interesse fiscal que embasaram a autuação, constantes da RFFP.

A autoria do delito emerge nítida da condição de sócios administradores ostentada por


ARTUR KRIEGER e GUILHERME KRIEGER, o primeiro no período de 09.09.2005 a
24.10.2008 e o segundo a partir de 25.10.2008, e de suas efetivas atuações à frente da
empresa à época dos fatos, conforme se extrai dos documentos societários da pessoa
jurídica constantes da RFFP e das reclamatórias trabalhistas examinadas pela
Fiscalização, sendo certa a responsabilidade legal destes pelas informações prestadas ao
Fisco acerca da integralidade dos fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias
havidos nos respectivos períodos.

As condutas descritas, que configuram o crime do art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, foram
perpetradas de tal forma que, pelas condições de tempo (competências fiscais sequentes,
entre janeiro de 2006 e junho de 2010), lugar (ambiência diretiva da empresa, sediada em
Joinville, SC) e maneira de execução (conforme antes descrito), devem as subsequentes
serem consideradas como continuação da primeira.

Assim, agindo em conluio e com unidade de intentos, ARTUR KRIEGER e GUILHERME


KRIEGER, de forma livre e consciente, praticaram o crime previsto no art. 1º, inciso I, da
Lei nº 8.137/90, por 69 vezes, na forma do art. 71, do Código Penal, ausente alguma
justificante de suas condutas previstas no art. 23 do antedito codex e deles sendo exigível,
em cada situação concreta, comportamento diverso, é dizer, conforme à Lei.

Em conclusão de todo o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia


ARTUR KRIEGER e GUILHERME KRIEGER como incursos no art. 337­A, incisos I e
III, do Código Penal (CP), por 136 vezes, e no art. 1º, inciso I, da Lei nº8.137/90, por 69
vezes, cada qual na forma do art. 71 do aludido codex, aplicando­seàs distintas cadeias de
delitos continuados o sistema de cúmulo material entre eles, nos termos do art. 69 do CP."
(evento 1 ­ DENÚNCIA2)

Ao final da exordial acusatória, arrolou uma testemunha: Antônio Pereira


Sobrinho, Auditor Fiscal da Receita Federal, lotado na Delegacia de Joinville/SC.

Em cota de introdução à denúncia, o Ministério Público Federal requereu a


vinda das certidões de antecedentes criminais em nome dos denunciados, bem como o
arquivamento dos fatos delituosos relativos à omissão de registro de vínculo empretatício
em CTPS, em tese, tipificados no artigo 297, § 4º, do CP, por entender que tais fatos
configuraram delito "de passagem" ou "crime meio", para a prática dos crimes narrados pela
denúncia (evento 1 ­ INIC1).

Determinou­se a intimação dos denunciados para, querendo, pagarem os


débitos descritos na denúncia, a fim de usufruírem do benefício da extinção da punibilidade,
bem como a expedição de ofício à Delegacia da Receita Federal e à Procuradoria Seccional
da Fazenda Nacional, para que informassem a situação atual dos débitos mencionados na
denúncia (evento 3).

A Delegacia da Receita Federal do Brasil informou que os Autos de Infração


n. 37.281.438­7, n. 37.281.439­5 e n. 37.281.440­9 foram encaminhados à Procuradoria
Seccional da Fazenda Nacional em Joinville em 10/06/2013 (evento 15).

Os denunciados, regularmente intimados, deixaram transcorrer em branco o


prazo para realizarem o pagamento dos débitos descritos na denúncia (evento 18).

A Procuradoria da Fazenda Nacional, por sua vez, informou que os débitos


objeto dos DEBCAD's n. 37.281.439­5, n. 37.281.438­7 e 37.281.440­9 não foram quitados
e nem parcelados (evento 19).
Recebi a denúncia em 4 de maio de 2015, bem como acolhi o pedido de
arquivamento das investigações em relação aos fatos delituosos perpetrados que se
subsumiam, em tese, ao crime capitulado no art. 297, § 4º do Código Penal (evento 21).

Foram digitalizadas as certidões de antecedentes criminais dos réus (evento


27).

Os réus foram citados nos termos do artigo 396 do CPP (evento 37 ­ CERT1 e
evento 38 ­ CERT1), tendo ambos apresentado resposta à acusação, mediante procurador
constituído.

O réu Guilherme Krieger sustentou, preliminarmente: a) a nulidade do


processo a partir da citação, em razão do cerceamento de defesa, uma vez que o número de
chave fornecido no mandado de citação não teria disponibilizado ou permitido a consulta ao
inquérito policial em que se baseia a denúncia; b) a inépcia da denúncia, pois não teria sido
apontada de forma individualizada sua responsabilidade nos fatos, com violação ao disposto
no art. 41 do CPP e ao direito fundamental de ampla defesa; c) sua ilegitimidade para
figurar como réu nesta ação penal, porque nunca teria participado da administração de
forma direta ou indireta das empresas Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda, Neumatec
Ltda, Krieger e Meurer Ltda e WMM Metrologia e Usinagem Ltda, já que a direção destas
cabia exclusivamente ao seu pai; d) seu pai teria utilizado seu nome para compor o quadro
societário, pois era estudante universitário e residia na cidade de Itajaí/SC. Requereu, ao
final, o acolhimento das preliminares arguidas e o trancamento da ação penal.
Alternativamente, alegou que sua inocência será provada na instrução processual. Arrolou
duas testemunhas (evento 41).

O réu Artur Krieger, por sua vez, alegou, preliminarmente: a) a nulidade do


processo, em razão do cerceamento de defesa, uma vez que o número de chave fornecido no
mandado de citação não disponibilizou ou permitiu a consulta ao inquérito policial em que
se baseia a denúncia; e b) a inépcia da denúncia, porque não teria sido apontada de forma
individualizada sua responsabilidade nos fatos, com violação ao disposto no art. 41 do CPP
e ao direito fundamental de ampla defesa. Requereu, ao final, o acolhimento das
preliminares arguidas e o trancamento da ação penal. Alternativamente, alegou que sua
inocência será provada na instrução processual. Arrolou duas testemunhas (evento 42).

Rejeitei as questões preliminares arguidas pelos réus e, tendo em conta a


ausência de quaisquer das hipóteses legais de absolvição sumária (art. 397 CPP), determinei
o prosseguimento do feito, com a realização de audiência de instrução e julgamento para a
oitiva das testemunhas e interrogatório dos réus (evento 44).

Em 29/09/2015, realizei audiência de instrução, na qual foram inquiridas a


testemunha arrolada pela acusação Antônio Pereira Sobrinho, seguida das arroladas pela
defesa Eloar Antônio Lenzi, Carlos Alberto Zastrow e Daniel Eduardo Grano. Diante da
insistência quanto à oitiva da testemunha Jairo Santos, concedi à defesa o prazo de cinco
dias para informar o endereço da testemunha, sob pena de perda da oportunidade de
produção da prova (eventos 96).

A defesa insistiu na intimação da testemunha no endereço que já havia


indicado nos autos (evento 101).

Em 24/11/2015, em continuação à audiência de instrução anteriormente


realizada, presidi audiência na qual foi inquirida a testemunha de defesa Jairo Santos. Em
seguida, interroguei os réus Artur Krieger e Guilherme Krieger. Ao final da audiência, na
fase do art. 402 do CPP, oportunizei às partes o requerimento de diligências. O MPF nada
requereu. A defesa, por sua vez, requereu prazo para juntada de documentos, o que foi
deferido (evento 126).

A defesa acostou documentos (evento 131).

Os antecedentes criminais dos réus foram atualizados (evento 133).

Em sede de alegações finais, o Ministério Público Federal requereu a


condenação dos réus nos termos da denúncia, porque provada a materialidade, a autoria e a
culpabilidade (evento 136).

A defesa do réu Artur Krieger, por sua vez, sustentou a inconstitucionalidade


do crime previsto no artigo 337­A do CP, entendendo se tratar de mero inadimplemento
fiscal, que afronta o princípio constitucional da não prisão por dívidas (art. 5º, LXVII, da
CF). Alegou a existência de dificuldades financeiras como causa supralegal de exclusão da
culpabilidade. Afirmou que o réu agira, sem a intenção deliberada de não recolher os
tributos, uma vez que a a empresa passava por grave crise financeira. Defendeu, por outro
lado, que o artigo 337­A do CP revogara tacitamente o artigo 1º, I e II, da lei n. 8.137/90, no
que tange às contribuições previdenciárias e acessórios. Requereu, ao final, a absolvição do
réu com base na causa supralegal de exclusão de culpabilidade da inexigibilidade de
conduta diversa. E, em caso de condenação, requereu (i) a absolvição do réu da prática do
crime previsto no artigo 1º, I e II, da lei n. 8.137/90, em face da sua revogação pelo crime
do artigo 337­A do CP, (ii) a aplicação da atenuante da confissão espontânea, (iii) a
aplicação do crime continuado, e não do cúmulo material entre os delitos, (iv) a aplicação
do instituto da suspensão condicional do processo, (v) a fixação do regime inicial aberto e
(vi) a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme artigo
44 do CP (evento 148).

E a defesa do réu Guilherme Krieger sustentou, inicialmente, a tese de


negativa de autoria, afirmando que a prova coligida no curso da instrução denota que o réu
em momento algum exerceu atividades relacionadas à gestão ou administração da empresa,
figurando seu nome apenas formalmente no contrato social, razão pela qual deve ser
absolvido das imputações que lhe foram feitas na denúncia. De outro viés, defendeu a
inconstitucionalidade do crime previsto no artigo 337­A do CP, entendendo se tratar de
mero inadimplemento fiscal, que afronta o princípio constitucional da não prisão por dívidas
(art. 5º, LXVII, da CF). Alegou a existência de dificuldades financeiras como causa
supralegal de exclusão da culpabilidade. Defendeu, por outro lado, que o artigo 337­A do
CP revogou tacitamente o artigo 1º, I e II, da lei n. 8.137/90, no que tange às contribuições
previdenciárias e acessórios. Requereu, ao final, a absolvição do réu com base na causa
supralegal de exclusão de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa, bem como
por ter ficado demonstrado que o réu não concorreu para a prática das infrações penais. E,
em caso de condenação, requereu (i) a absolvição do réu da prática do crime previsto no
artigo 1º, I e II, da lei n. 8.137/90, em face da sua revogação pelo crime do artigo 337­A do
CP, (ii) a aplicação da atenuante da confissão espontânea, (iii) a aplicação do crime
continuado, e não do cúmulo material entre os delitos, (iv) a aplicação do instituto da
suspensão condicional do processo, (v) a fixação do regime inicial aberto e (vi) a
substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme artigo 44 do
CP (evento 149).

É o relatório.

Decido.
II. FUNDAMENTAÇÃO

II.A. DAS QUESTÕES PRELIMINARES E PREJUDICIAIS

1. Da inconstitucionalidade do crime do artigo 337­A do CP.

A discussão sobre a inconstitucionalidade de crime de sonegação


previdenciária, sob o fundamento de se constituir, por via transversa, modalidade de prisão
civil por dívida, não merece prosperar.

O Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade, foi instado sobre


a questão levando em conta o crime de omissão de recolhimento de contribuições
previdenciárias tipificado no artigo 168­A do CP, tendo asseverado que este crime é "figura
de caráter criminal inconfundível com a da prisão por dívida" (cf. STF, HC 78.234, Min.
Gallotti, 1ª Turma, DJ 02/02/99; STF, RE 391996 AgR/SC, Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ
25/11/2003; STF, HC 91.704/PR, Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJ 06/05/2008; STF, AI
675619 AgR/RS, Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJ 09/06/2009).

Vale destacar trecho do voto proferido pela Min. Cármen Lúcia, no AI­Agr n.
675.619 acima elencado, publicado em 09/06/2009, que sintetiza o entendimento da
Suprema Corte sobre a matéria:

"(...) quanto ao argumento do agravante de que estaria submetido à prisão civil por dívida, a
jurisprudência do Supremo Tribunal, como asseverado na decisão agravada, firmou­se no
sentido de que (...) em tema de crime decorrente de omissão no recolhimento de
contribuições previdenciárias, inaplicável é o Pacto de San José da Costa Rica, visto que
não se cuida de prisão civil, cuja finalidade é compelir o devedor de dívida alimentar ou o
depositário infiel a cumprir a sua obrigação, mas sim de prisão de caráter penal, que
objetiva a prevenção e a repressão do delito. Daí, também, a impertinência na alegação de
violação à Constituição Federal".

Não se está a olvidar que o caso dos autos é de sonegação de contribuições


sociais previdenciárias (art. 337­A CP), e não de omissão de recolhimento de contribuições
previdenciárias (art. 168­A CP).

Entretanto, se o Supremo Tribunal Federal consolidou sua jurisprudência no


sentido de que o crime tipificado no artigo 168­A do CP, que criminaliza a simples conduta
de deixar de repassar contribuição previdenciária, não viola o disposto no artigo 5º, LXVII,
da CF, menos razão há para o acolhimento da tese de que o crime do artigo 337­A do CP
afronta ao referido dispostivo constitucional.

É que a sonegação de contribuições previdenciárias ­ art. 337­A CP ­ se


distingue da omissão de recolhimento tipificada no 168­A do CP pelo fato de não se
consumar com a mera impossibilidade de pagamento das contribuições previdenciárias
declaradas ao Fisco, mas com a prática de fraude nas condutas de redução ou supressão de
contribuições previdenciárias tipificadas nos seus três incisos. Incrimina­se justamente a
utilização de ardil, de fraude, para sonegar informações do órgão fazendário e, por
consequência, diminuir a base de cálculo sobre a qual incidem as contribuições, causando,
assim, dano ao erário.

Não há se falar, portanto, que o crime de sonegação de contribuições


previdenciárias é mera criminalização da inadimplência de dívida de natureza civil, pois a
existência de fraude afasta a presução de que houve mera "inadimplência". Nesse sentido:
TRF4 ACR 2006.72.01.003053­8, Oitava Turma, Relator Pedro Carvalho Aguirre Filho,
D.E. 03/05/2012; e TRF4, ACR 5000999­48.2013.404.7214, Sétima Turma, Relatora p/
Acórdão Cláudia Cristina Cristofani, juntado aos autos em 22/02/2016.
Nessas condições, cumpre fincar que a norma do artigo 337­A do CP não
configura ameaça de prisão por dívidas ou mera cobrança de contribuições previdenciárias,
não havendo se falar, portanto, em violação ao disposto no artigo 5º, LXVII, da CF.

Cumpre, assim, refutar a pretensão deduzida nesta questão prévia.

II.B. MÉRITO (materialidade, autoria e tipicidade)

A materialidade dos fatos está demonstrada pelos elementos insertos na


Representação Fiscal para Fins Penais n. 10920.004585/2010­99 (evento 1 ­ doc. OUT2 a
OUT4, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201), notadamente pelos seguintes
documentos:

a) Auto de Infração DEBCAD n. 37.281.439­5 e seus componentes: Instruções para o


Contribuinte ­ IPC, Discriminativo de Débito ­ DD, Relatório de Documentos Apresentados
­ RDA, Relatório de Apropriação de Documentos Apresentados ­ RADA, Fundamentos
Legais do Débito ­ FLD, Relatório de Vínculos e Relatório Fiscal do Auto de Infração ­
REFISC, nos quais se verifica que houve a supressão indevida, pela empresa Arbaitec
Tecnologia em Usinagem Ltda., da contribuição previdenciária patronal incidente sobre a
remuneração dos empregados segurados e sobre a incapacidade laborativa decorrente dos
riscos ambientais do trabalho, no período de janeiro de 2006 a junho de 2010, totalizando a
importância R$ 1.033.880,00, dos quais R$ 523.269,91 refere­se ao valor principal
atualizado, R$ 125.870,09 referente à juros, R$ 329.434,62 referente à multa de ofício e R$
55.305,38 referente à multa de mora (cf. evento 1 ­ doc. OUT3, p. 27­86, do inquérito
policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201);

b) Auto de Infração DEBCAD n. 37.281.438­7 e seus componentes: Instruções para o


Contribuinte ­ IPC, Discriminativo de Débito ­ DD, Relatório de Documentos Apresentados
­ RDA, Relatório de Apropriação de Documentos Apresentados ­ RADA, Fundamentos
Legais do Débito ­ FLD, Relatório de Vínculos e Relatório Fiscal do Auto de Infração ­
REFISC, nos quais se verifica que houve a supressão indevida, pela empresa Arbaitec
Tecnologia em Usinagem Ltda., de contribuições previdenciárias dos segurados
empregados e contribuintes individuais não registrados, cuja retenção lha era obrigatória,
nos períodos de janeiro de 2006 a junho de 2010, totalizando a importância de R$
424.211,13, dos quais R$ 214.935,71 é referente ao valor principal atualizado, R$ 50.466,69
referente à juros, R$ 136.301,86 referente à multa de ofício e R$ 22.506,87 referente à multa
de mora (cf. evento 1 ­ doc. OUT3, p. 91­117, do inquérito policial n. 5008124­
72.2014.4.04.7201); e

c) Auto de Infração DEBCAD n. 37.281.440­9 e seus componentes: Instruções para o


Contribuinte ­ IPC, Discriminativo de Débito ­ DD, Relatório de Documentos Apresentados
­ RDA, Relatório de Apropriação de Documentos Apresentados ­ RADA, Fundamentos
Legais do Débito ­ FLD, Relatório de Vínculos e Relatório Fiscal do Auto de Infração ­
REFISC, nos quais se verifica que houve a supressão indevida, pela empresa Arbaitec
Tecnologia em Usinagem Ltda., da contribuição social devida a terceiros a título de
Salário Educação, INCRA, SENAI, SESI e SEBRAE, nos períodos de janeiro de 2006 a
junho de 2010, totalizando a importância de R$ 246.519,33, dos quais R$ 132.193,72 é
referente ao valor principal atualizado, R$ 31.650,08 referente à juros, R$ 64.765,67
referente à multa de ofício e R$ 17.909,86 referente à multa de mora (cf. evento 1 ­ doc.
OUT3, p. 151­184, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201).

De acordo com o ofício n. 062/15/PSFN/JOI, da Procuradoria­Seccional da


Fazenda Nacional em Joinville/SC, o montante consolidado do crédito tributário em voga,
atualizado até o mês de abril de 2015, para o Auto de Infração DEBCAD n. 37.381.439­5
era de R$ 1.823.065,07; para o Auto de Infração DEBCAD n. 37.281.438­7 era de R$
748.180,91; e para o Auto de Infração DEBCAD n. 37.281.440­9 era de R$ 444.828,72.
Informou­se também que não houve o pagamento integral dos débitos referidos ou a
inclusão destes em regime de parcelamento fiscal (evento 19).

Verifica­se que os lançamentos encimados foram formalizados pela Receita


Federal do Brasil após a realização de ações fiscais no grupo econômico formado pelas
empresa Arbaitec Tecnologia em Usinagem Ltda., Neumatec Ltda., Krieger & Meurer Ltda.
e WMM Metrologia e Usinagem Ltda. Essas ações fiscais foram deflagradas em razão de
requisição do Ministério Público do Trabalho que constatou indícios de fraude à relação de
emprego, simulação da condição de sócios e falta de registro de empregados nas referidas
empresas. Ao término dessas ações fiscais, concluiu­se que as empresas Neumatec Ltda.,
Krieger & Meurer Ltda. e WMM Metrologia e Usinagem Ltda. não possuíam existência de
fato, tendo sido mantidas apenas para dar suporte às operações da empresa existente de fato
Arbaitec Tecnologia em Usinagem Ltda., razão pela qual os lançamentos fiscais foram
realizados em nome desta última pessoa jurídica (cf. evento ­ OUT2, p. 3­7, do inquérito
policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201). Eis o que consignou a esse respeito o Auditor
Fiscal da Receita Federal no Relatório Fiscal do Auto de Infração DEBCAD 37.281.439­5
(evento ­ OUT3, p. 78­79, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201):

"116. Após descrição dos fatos e a subsunção destes às normas legais, e considerações
acerca de simulação, evação e elisão e do instituto do SIMPLES, podemos concluir que as
empresas NEUMATEC LTDA; KRIEGER & MEURER LTDA e WMM METROLOGIA E
USINAGEM LTDA:

a) Teriam sido constituídas e/ou mantidas tão somente no propóstio de se beneficiar­


se de sistema de tributação menos oneroso, quando optaram pelo sistema SIMPLES;

b) Não possuem endereços nem estruturas próprias, uma vez que ocuparam e ainda
ocupam o mesmo imóvel. Conforme os dados do CNPJ, o endereço da Rua Bento
Torquato da Rocha, 274, que atualmente se encontra fechado, teria sido o endereço
da ARBEITEC eda NEUMATEC e da KRIEGER & MEURER, que atualmente junto
com a WMM ocupam (todas), o endereço da Rua Alfredo Bachtold, 111.

c) São todas administradas pelo real sócio Sr. Artur Krieger, que utiliza­se do
procedimento de colocar seus sócios próprios empregados na condição de sócio e
com isto infringir a legislação previdenciária, deixando de recolher de forma correta
as reais contribuições previdenciárias;

d) As empresas estariam operando no sentido de dar cobertura fiscal às operações da


empresa ARBEITEC, que por sua vez estaria com atividade paralisada desde
dezembro/2008;

e) Diversas ações trabalhistas corroboraram de forma indubitável que as empresas


NEUMATEC LTDA; KRIEGER & MEURER LTDA e WMM METROLOGIA E
USINAGEM LTDA, não tem existência própria, portanto inexistindo de fato, sendo
mantidas tão somente no propósito de dar guarida às operações da empresa existente
de fato e de direito ARBEITEC TECNOLOGIA EM USINAGEM LTDA.

117. Desta forma, serão considerados ocorridos os fatos geradores das contribuições
previdenciárias, relativamente aos empregados formalmente registrados nas empresas
inexistentes de fato, NEUMATEC LTDA e KRIEGER & MEURER LTDA e WMM
METROLOGIA e USINAGEM LTDA para o correto enquadramento junto à empresa para a
qual os mesmos efetivamente laboraram, ARBEITEC TECNOLOGIA EM USINAGEM
LTDA, CNPJ 03.359.107/0001­19.

118. Esta Auditoria arbitrará os salários de contribuições dos fatos geradores ocorridos na
NEUMATEC LTDA; KRIEGER & MEURER LTDA e WMM METROLOGIA E USINAGEM
LTDA, com base nos valores declarados em GFIP's do mês de 06/2008 e projetados para
todo o período da ação fiscal, respeitadas as datas de emissões dos empregados, quando
conhecidas, para o correto enquadramento junto à empresa ARBEITEC TECNOLOGIA EM
USINAGEM LTDA, CNPJ 03.359.107/0001­19."

Assim, constatou­se na ação fiscal que o ludibrio perpetrado em face do Fisco


consistiu em criar e manter as empresas Neumatec Ltda., Krieger & Meurer Ltda. e WMM
Metrologia e Usinagem Ltda. de forma simulada, como empresas "de fachada", as quais
eram beneficiárias da tributação pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e
Contribuições da Microempresa e das Empresas de Pequeno Porte ­ SIMPLES, com a
finalidade de reduzir tributos federais devidos pela empresa Arbeitec Tecnologia em
Usinagem Ltda., única empresa do grupo existente de fato e que remunerava os empregados
naquelas empresas registrados, bem como gerava receitas e praticava atos de comércio e
indústria, sendo os sócios e e empregados daquelas considerados segurados empregados da
empresa Arbeitec Teconologia em Usinagem Ltda., uma vez que a serviço desta laboravam.

Mediante esse artíficio houve a omissão pela empresa Arbeitec Tecnologia em


Usinagem Ltda., em documento de informação previsto pela legislação previdenciária
(GFIP), dos seguintes fatos geradores de contribuições previdenciárias e contribuições
sociais: a) pagamentos de proventos de 15 (quinze) sergurados empregados mantidos a seu
serviço, sem o respectivo registro em CTPS, durante o período de 01/2006 a 06/2010,
incluindo os décimos­terceiros salários dos anos 2006 a 2009; b) remunerações pagas e/ou
creditadas à Cooperativa de Trabalho Unime de Joinville; e c) as remunerações pagas a
título de pro­labore. Os fatos relativos à fraude e às condutas omissivas perpetradas, os
quais geraram a supressão indevida de contribuições previdenciárias e contribuições sociais,
estão esmiuçados nos Relatórios Fiscais dos Autos de Infração DEBCAD n. 37.281.439­5,
37.281.438­7 e n. 37.281.440­9, acostados no evento 1, OUT3, p. 51­86, p. 112­117, e p.
174­177, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201.

Em juízo, ouvido na condição de testemunha arrolada pela acusação, Antônio


Pereira Sobrinho, Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil que foi o responsável pela
realização da ação fiscal na empresa Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda. e nas
empresas coligadas Neumatec Ltda., Krieger & Meurer Ltda. e WMM Metrologia e
Usinagem Ltda., confirmou o que já havia relatado no procedimento administrativo­fiscal.
Isto é, que teve dificuldades para fazer contato com os representantes legais da empresa
Arbeitec, os quais, nas oportunidades em que se deslocou até o endereço da empresa, não
foram encontrados no local. Relatou também que não lhe foram apresentados todos os
documentos relativos à escrituração fiscal das empresas, razão pela qual teve que solicitar
documentos da Justiça do Trabalho e outros órgãos públicos e, assim, realizar lançamentos
por arbitramento. Esclareceu, por outro lado, que alguns documentos fiscais lhe foram
entregues diretamente na Receita Federal pelo réu Guilherme Krieger, que se identificou
como administrador da empresa Arbeitec. Asseverou que, no curso da fiscalização, pôde
observar que as demais empresas (Neumatec Ltda., Krieger & Meurer Ltda. e WMM
Metrologia e Usinagem Ltda.) que estavam instaladas no local eram, em sua maioria,
optantes do SIMPLES, mas seus funcionários prestavam serviços para a empresa Arbeitec.
Afirmou que, diante desse contexto, aliado ao fato de ter constatado a existência de
confusão patrimônial entre as empresas, chegou à conclusão de que havia um grupo
econômico formado em torno da empresa Arbeitec (evento 97 ­ VÍDEO1).

Cumpre observar que os Autos de Infração DEBCAD n. 37.281.439­5,


37.281.438­7 e n. 37.281.440­9 foram lavrados em 24/11/2010 e a notificação do
contribuinte ocorreu em 30/11/2010 (evento 1 ­ OUT3, p. 27, 91, 151, 190­191, 196, 203, e
OUT4, p. 5­6, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201), ficando cientificado do
prazo de 30 (trinta) dias para apresentação de defesa, não havendo notícia de apresentação
de impugnação ou recurso pelo contribuinte.
Assim, os créditos tributários foram lançados em autos de infração regulares e
os lançamentos, à míngua de impugnação e/ou recurso administrativo, não foram pagos e
nem parcelados, conforme atesta informação da Procuradoria da Fazenda Nacional (evento
19), transitaram em julgado na esfera administrativa (operando­se a constituição definitiva
do crédito tributário).

Nessas condições, cumpre afirmar que o Fisco constituiu legalmente os


créditos tributários contra a empresa Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda. no período de
01/2006 a 06/2010, e que os lançamentos fiscais vieram a se consolidar definitivamente na
esfera administrativa em 30/12/2010, consubstanciando, desse modo, a materialidade do
crime de sonegação de contribuições sociais previdenciárias praticado em série, o que, mais
adiante nesta sentença, merecerá a qualificação jurídica de crime continuado.

Cumpre agora examinar a autoria imputada aos réus.

Nos crimes societários, aí incluído evidentemente o ilícito penal retratado na


denúncia, para a aferição de sua autoria, é indispensável saber a quem pertenceu a
administração da empresa, sob a capa da qual se perpetraram os ilícitos. Tal concepção é a
expressão da autoria mediata, pois se responsabiliza, penalmente, quem tem o domínio final
do fato delituoso, decidindo sobre a sua ocorrência.

Este é, saliente­se, o posicionamento de Antônio Correa, relativamente ao


sujeito ativo do tipo penal previsto no artigo 1º, inciso III, da Lei n 8137/90 [Dos Crimes
contra a Ordem Tributária (Comentários à Lei nº 8137, 27­12­1990), Ed. Saraiva, 1994, pp.
106­108], em tudo aplicável, a esse respeito, ao crime de sonegação de contribuições sociais
previdenciárias:

"Consoante afirmativas anteriores, toda a empresa tem livros de escrituração obrigatórios


pelas leis comerciais e, ao mesmo tempo, deve escriturar outros, por determinação de
diplomas legais, assim considerados os decretos e instruções normativas que integram a
legislação tributária, em virtude de decisões e no interesse da fiscalização.

Algumas empresas procuram adotar um sistema moderno de administração, criando


departamentos que denominam "fiscal" ou simplesmente "contabilidade", contratando
pessoas para executarem as tarefas correlatas. Estas agem sob subordinação e dependência
e cuidam de elaborar a escrituração dos livros obrigatórios. A multiplicidade de atos
comerciais impede uma só pessoa de cumprir, diante do alto volume de lançamentos, o
registro integral de todos os acontecimentos diários de uma empresa.

Outras menores, confiam a escrituração geralmente a profissional habilitado, com diploma


de técnico em contabilidade ou ciências contábeis e administrativas ou ainda economia, os
quais, devidamente registrados no órgão fiscalizador classista, denominado Conselho
Regional de Contabilidade, habilitam­se a assinar os balanços.

A escrituração fiscal de uma empresa, tarefa que não se confunde com a de contabilidade,
dispensa a presença de profissional habilitado legalmente e registro no Conselho Regional
de Contabilidade.

Dessa forma, quanto à direção da empresa, pode esta ser exercida pelo próprio
comerciante, quando de responsabilidade ilimitada ou firma individual, como pelos
gerentes, sócios ou não, naquelas mistas de capital e pessoas, tais como as classificadas,
não sem alguma divergência na doutrina, como de responsabilidade limitada, e pelos
diretores, contratados ou controladores, como acionistas nas sociedades anônimas, os
quais comandam todos os negócios sociais e atribuem funções, atividades e serviços aos
seus colaboradores.
Neste caso o sujeito ativo do delito pode ser o titular da empresa, o sócio­gerente ou os
diretores que ordenem lançamentos inexatos por terceiros ou então a omissão de
lançamentos de fatos administrativos, com a finalidade de fraudar o fisco com a supressão
ou redução dos impostos, contribuições sociais e acessórios.

Mas a figura do empregado que executa a tarefa mediante subordinação e dependência


pode, em algumas circunstâncias, configurar a co­participação. Na maioria dos casos, ao
obedecer ordem, estaria desnaturado aquele princípio, discutido no início deste trabalho,
de que a ação é a finalista e somente com o dolo ou culpabilidade ligada ao tipo é que
surge a possibilidade de se imputar a prática do delito."

Assim, é imprescindível saber quem foi o administrador da empresa, mediante


a qual se praticou o ilícito penal societário.

Todavia, a administração da empresa, obviamente, não pode se resumir àquela


que consta no contrato social de uma sociedade por cotas de responsabilidade limitada,
materializada na cláusula contratual, que indica a quem cabe a gerência da sociedade. Tal
cláusula contratual, no máximo, enseja uma plausibilidade de autoria, a determinar, ao lado
da materialidade do crime de sonegação fiscal e/ou de contribuição previdenciária, a
existência de justa causa, para o processamento criminal do sócio­gerente indicado. É que,
sendo necessário, a teor da combinação dos artigos 13, 18 e 29, todos do Código Penal
brasileiro, que o agente tenha pretendido dar causa ao tipo penal, no caso dos crimes
dolosos, como ocorre com o crime vertente, então, o sócio­gerente, assim indicado no
contrato social da empresa, que não exerce de fato a administração, não quer, e, portanto,
não concorre, para a prática do crime omissivo em destaque. Basta, a esse propósito, citar o
exemplo da dona de casa, cujo nome consta, como sócia­gerente, do contrato social da
empresa, sob a capa da qual, praticou­se um crime dessa espécie.

Entendimento diverso seria a consagração da responsabilidade objetiva, no


direito penal positivo. E, aí, certamente, não estaríamos em um Estado Democrático de
Direito, mas sim em um Estado Totalitário, em nada compatível com a tutela dos direitos e
garantias individuais. E basta observar os princípios, fundamentos e objetivos da República
Federativa do Brasil, elencados nos primeiros artigos da Constituição de 1988, para ver que
o legislador constituinte não titubeou em adotar o primeiro modelo dos regimes de governo
recém­citados, como o vigente.

Este é, mais uma vez salientando, o posicionamento do Tribunal Regional


Federal da 4ª Região, como se vê no voto proferido pelo Juiz Manoel Lauro Volkmer de
Castilhos, referentemente ao crime de omissão de recolhimento das contribuições
previdenciárias descontadas dos salários dos empregados, em tudo aplicável ao caso
vertente (Apelação Criminal nº 96.04.46234­2/PR, 1ª Turma, DJU de 4.6.1997):

A responsabilidade penal do sócio, pela falta de recolhimento pela empresa, que reteve
descontando do salário dos empregados as contribuições destes, é questão difícil. A Lei
8.137 não tem regra a respeito mas a Lei 8212 estabeleceu no parágrafo 3º do art. 95 que o
sócio­gerente é pessoalmente responsável e essa disposição ou é altamente questinável ou
impõe aplicação criteriosa. Assim, parece razoável compreender essa responsabilidade
sempre dependente de um mínimo de prova que demonstre a conexão lógica da vontade do
administrador da empresa e o resultado criminoso denunciado, pena de responsabilização
objetiva inaceitável (RESP nº 19.925­0, STJ, RBCCrim 6/231), mesmo que se admita que
a denúncia nos chamados crimes societários não exija descrição miúda dos
comportamentos (v. por todos, mas com ressalva, HC 73.324­7­RJ, liminar, STF, DJ 06­
12­1995, p. 42459).

No caso concreto, está demonstrado que os réus Artur Krieger e Guilherme


Krieger, pai e filho, figuraram como sócios administradores da empresa Arbaitec
Tecnologia em Usinagem Ltda., na época dos fatos narrados pela denúncia. De acordo
com a cláusula dez da sexta alteração contratual da empresa citada (evento 1 ­ OUT2, p. 54­
61, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201), Artur Krieger constou como
administrador desta entre 09/11/2005, data em que houve o registro da alteração contratual
encimada na Junta Comercial do Estado de Santa Catarina ­ JUCESC, e 24/10/2008, data
em que houve o registro na JUCESC da sétima alteração contratual da empresa, que definiu,
em seu artigo oitavo, que a partir de então a administração desta passou para o réu
Guilherme Krieger (evento 1 ­ OUT2, p. 63­69, do inquérito policial n. 5008124­
72.2014.4.04.7201). A previsão estatutária de que a administração da empresa era de
competência do réu Guilherme Krieger permaneceu ao menos até a nona alteração do
contrato social da empresa, registrada na JUCESC em 09/06/2010 (cf. evento 1 ­ OUT2, p.
79­87, do inquérito policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201).

Nesse passo, tendo em conta apenas as alterações contratuais encimadas, é


possível verificar que, formalmente, o réu Artur Krieger figurou como administrador da
empresa Arbaitec Tecnologia em Usinagem Ltda. no período de 09/11/2005 a 24/10/2008,
ao passo que o réu Guilheme Krieger figurou como tal no período de 25/10/2008 a
09/06/2010.

Não escapa à percepção deste juízo que a ação fiscal que culminou com a
lavratura dos créditos tributários em face da empresa citada ocorreu na época em que o réu
Guilherme Krieger era o seu administrador e que, nessa condição, este réu compareceu à
sede da Receita Federal do Brasil para tomar ciência do início do início do procedimento
fiscal e apresentar documentos. Eis o que foi relatado nos itens 16 e 17 do Relatório Fiscal
do Auto de Infração ­ DEBCAD n. 37.281.439­5 (evento 1 ­ OUT3, p. 53, do inquérito
policial n. 5008124­72.2014.4.04.7201):

"16. Após diversos contatos telefônicos sem sucesso, durante os dias 16 a 20/09/2010,
finalmente no dia 21/09/2010, atendeu o Sr. GUILHERME KRIEGER, que se prontificou a
tomar ciência do TIPF no endereço de seu escritório situado à RUA MARINHO LOBO, 512
­ Sala 38. Ao ali comparecer o mesmo informou que era filho do Sr. ARTUR KRIEGER e
que era o sócio gerente da empresa ARBEITEC.

17. Assim, no dia 21/09/2010, após haver sido devolvido pelos correios, tomou ciência do
início do procedimento fiscal da empresa ARBEITEC, o sócio Sr. GUILHERME
KRIEGER."

Esse fato foi confirmado em juízo pelo subscritor do relatório fiscal encimado,
o Auditor Fiscal Antônio Pereira Sobrinho. Não custa rememorar que este asseverou em seu
depoimento judicial que, embora não tenha logrado êxito em econtrar os gestores da
empresa Arbeitec nas oportunidades em que esteve na sede dela, o réu Guilherme Krieger
compareceu na Receita Federal para lhe apresentar alguns documentos, oportunidade em
que se identificou como administrador daquela empresa (evento 97 ­ VÍDEO1).

Cumpre observar que esses ­ e apenas esses ­ foram os elementos amealhados


no curso da instrução que associam o réu Guilherme Krieger à administração da empresa
Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda.

Assim, à luz do que foi consignado alhures, o fato de o réu Guilherme


Krieger constar como sócio administrador da empresa Arbeitec não é, por si só, elemento
pelo qual se pode deduzir a autoria do réu nos delitos narrados pela exordial acusatória. Não
custa repetir que a administração da empresa não pode se resumir àquela que consta no
contrato social de uma sociedade por cotas de responsabilidade limitada, materializada na
cláusula contratual, que indica a quem cabe a gerência da sociedade, ou por atos praticados
isoladamente para o efeito de demonstrar a regularidade de representação da empresa
perante repartições públicas ou orgãos de fiscalização. É, assim, imprescindível que outros
elementos de prova venham aos autos corroborar factualmente o que constou no
instrumento jurídico, isto é, que não só de direito, mas, sobretudo, de fato, que a
administração da pessoa jurídica era exercida pelo sujeito passivo indicado na exordial
acusatória.

E no caso dos autos, os elementos produzidos no curso da instrução processual


aclararam o fato de que a empresa Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda. sempre foi
administrada apenas pelo réu Artur Krieger, inclusive no período em que o réu Guilherme
Krieger figurou formalmente no contrato social da referida empresa como sócio
administrador.

Nesse sentido foram os depoimentos das testemunhas de defesa, que,


destaque­se, não se contrapuseram ao depoimento prestado em juízo pela testemunha de
acusação, o Auditor Fiscal da Receita Federal Antônio Pereira Sobrinho, cuja síntese foi
transcrita anteirormente nessas razões de decidir.

Eis o que asseveraram em juízo as testemunhas arroladas pela defesa:

Eloar Antônio Lenzi, advogado militante na cidade de Balneário


Camboriú/SC, asseverou, em suma, que o réu Guilherme Krieger foi estagiário no seu
escritórido de advocacia por aproximados dois anos, entre 2006 e 2008 ou entre 2007 e
2009, exercendo suas atividades de segunda à sexta­feira, no horário comercial. Afirmou
que só tomou conhecimento de que Guilherme fazia parte do quadro societário da empresa
Arbeitec mais tarde. Esclareceu, por outro lado, que prestou assessoria jurídica à empresa
referida, tratando das questões relativas à empresa diretamente com o réu Artur Krieger, pai
do réu Guilherme, ou com o chefe de recursos humandos da empresa. Asseverou que nunca
tratou dessas questões diretamente com o réu Guilherme, acreditando que este apenas
emprestou seu nome para compor o quadro social da empresa. Afirmou não se recordar
quando o réu Guilherme colou grau, embora tenha ido na cerimônia de colação, acreditando
que depois que colou grau, ele voltou a Joinville/SC, onde abriu um escritório de advocacia
com amigos dele, não se recordando a data da abertura desse escritório. Esclareceu ainda
que o réu Guilherme fez faculdade de Direito no campus da Univali de Itajaí/SC, morando
em Balneário Camboriú/SC, próximo ao escritório de advocacia do depoente (evento 97 ­
VÍDEO2).

Carlos Alberto Zastrow, que trabalhou na empresa Arbeitec no período entre


2003 e 2010, inicialmente no setor de recursos humanos e, depois, na parte administrativa,
asseverou, em suma, que a empresa Arbeitec era administrada pelo réu Artur Krieger, nunca
tendo a empresa sido administrada pelo réu Guilherme Krieger. O nome deste apenas foi
incluído no contrato social para fins de composição do quadro societário da empresa. As
decisões relativas à gestão da empresa eram tomadas pelo réu Artur Krieger, a quem o
depoente se reportava dentro da empresa. Afirmou que, quando ingressou na empresa, eta
tinha uma boa condição financeira. No entanto, depois que ela foi alvo de reclamatórias
trabalhistas e ações em decorrência de atrasos nas entregas de produtos, iniciou­se o período
de dificuldades financeiras. A prioridade da empresa então passou a ser o pagamento dos
salários dos empregados e dos profissionais que prestavam serviços para ela. Esclareceu que
foi funcionário da Arbeitec e, depois que se aposentou, foi contratado pela empresa
Neumatec, a qual exercia as atividades no mesmo local que a empresa Arbeitec. Esta, por
sua vez, teve suas atividades encerradas no ano de 2007, inclusive com baixa nos registros.
Afirmou que nunca trabalhou nas empresas Krieger & Meurer Ltda. e WMM Metrologia e
Usinagem Ltda., instaladas no mesmo local da empresa Arbeitec e Neumatec. Afirmou se
recordar que o réu Artur era o proprietário das empresas Arbeitec e Neumatec, bem como
que o réu Guilherme fez faculdade de Direito fora de Joinville (evento 97 ­ VÍDEO3).
Daniel Eduardo Grano, proprietário da empresa Climabus, que prestava
serviços para o grupo Buscar, asseverou que a empresa do réu Artur era fornececedora da
empresa Climabus até o ano de 2012, quando esta encerrou suas atividades. Esclareceu que
a empresa do réu Artur que prestava serviços para a Climabus era a Arbeitec, e que os
serviços foram prestados até o ano de 2011. Afirmou que todos os contatos que o depoente
fazia com a empresa Arbeitec eram realizados com réu Artur, nunca tendo mantido contato
comercial com o réu Guilherme Krieger. Asseverou que os contatos que manteve com as
empresas Krieger & Meurer Ltda., WMM Metrologia e Usinagem Ltda. e Neumatec
Usinagem Ltda eram feitos sempre por intermédio do réu Artur Krieger (evento 97 ­
VÍDEO4).

Jairo Santos, que foi colega de faculdade do réu Guilherme e, depois, sócio
deste em escritório de advocacia constituído por ambos na cidade de Itajaí/SC, asseverou
que cursou algumas matérias da faculdade com o réu Guilherme, na Univalli em Itajaí/SC,
nos anos de 2006 e 2007. Ambos concluíram o curso em agosto de 2008. Disse se recordar
que no curso da faculdade Guilherme estagiava em um escritório de advocacia em Balneário
Camboriú/SC, cidade esta em que o réu também residia. Afirmou que logo depois que o
depoente e Guilherme obtiveram a carteira da OAB, ambos montaram um escritório de
advocacia na cidade de Itajaí/SC, a partir do ano de 2009. Nesse período, o réu Guilherme
passou a residir com o depoente em um apartamento de propriedade deste na cidade de
Itajaí/SC. Asseverou, por outro lado, que prestou um serviço pontual de consultoria
tributária para a empresa Arbeitec ou Meurer, porque esta passava por dificuldades
financeiras, tendo, na oportunidade, tratado com réu Artur Krieger, que era o responsável
pela administração da empresa (evento 127 ­ VÍDEO1).

Vê­se que as testemunhas encimadas foram uníssonas ao imputar a


responsabilidade pela administração da empresa Arbeitec exclusivamente ao réu Artur
Krieger, pai do réu Guilherme Krieger. Dos depoimentos delas ­ notadamente os de Eloar
Antônio Lenzi, Carlos Alberto Zastrow e Jairo Santos ­ é possível extrair, dentre outras
questões, que o réu Guilherme Krieger, embora figurasse no contrato social da empresa
como administrador, fazia faculdade de direito na Univalli, em Itajaí/SC, inclusive residindo
na cidade vizinha Balneário Camboriú/SC, circunstâncias essas que indicam que ele,
efetivamente, apenas emprestou seu nome para compor o quadro social da empresa
administrada de fato pelo seu pai, o réu Artur Krieger.

Em seu interrogatório, Guilherme Krieger também asseverou que nunca


esteve à frente da administração da empresa Arbeitec. Disse que seu nome foi incluído no
contrato social da empresa a pedido de seu pai, o réu Artur Krieger. Esclareceu iniciou a
faculdade de Direito em Itajaí no ano de 2003. Em 2004 transferiu a faculdade para a
Associação Catarinense de Ensino ­ ACE, em Joinville. Estudou na ACE por um ano, entre
2005 e 2006. Depois transferiu a faculdade novamente para Itajaí, concluindo o curso no
ano de 2008. Logo após sua formatura, permaneceu advogando em Itajaí, montando um
escritório com Jairo Santos. Em 2010 ou 2011, regressou a Joinville, onde passou a advogar
(evento 127 ­ VÍDEO3).

O réu Artur Krieger, por sua vez, asseverou em seu interrogatório judicial
que deixou de recolher os tributos e contribuições porque a empresa entrou em crise
financeira, mas sustentou que fazia as declarações das contribuições e tributos em GFIP.
Disse que era a contabilidade da empresa que preenchia as GFIP's, não tento, portanto,
informações exatas sobre o cumprimento das obrigações tributárias da empresa (evento 127
­ VÍDEO2).
Diante desse contexto, e à míngua de outros elementos aptos a indicar que o
réu Guilherme Krieger exercia atos de gestão no grupo econômico formado pela empresa
Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda., cumpre reconhecer que, no caso concreto, o réu
Artur Krieger, e apenas ele, era responsável pela administração de fato da empresa referida
nos períodos narrados pela denúncia, detendo, assim, o domínio do fato na gestão dela.

Por consequência, cumpre absolver o réu Guilherme Krieger dos fatos que
lhe são imputados, com fundamento no artigo 386, V, do CPP, por não haver provas de que
ele concorreu para as infrações penais narradas pela exordial acusatória, porque as provas
amealhadas aos autos não foram suficientes a demonstrar que ele efetivamente concorreu
para administração empresa Arbeitec Tecnologia em Usinagem Ltda.

Volvendo ao réu Artur Krieger, faz­se necessário destacar que ele, na


qualidade de empresário, tinha ciência de que deveria efetuar corretamente a escrituração
fiscal e repassar as informações à Previdência Social. Portanto, como sócio e administrador
de fato, não pode ignorar as ilicitudes na escrituração fiscal da pessoa jurídica, sendo
inescusável o desconhecimento da lei. O administrador é o responsável pelos atos da
empresa, e ainda que não seja o executor direto das fraudes fiscais, presume­se tê­las
autorizado, pois nenhum ato acontece em uma empresa sem a ciência de seu administrador.

Nesse sentido:

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA.


MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. ERRO DE TIPO E ERRO DE
PROIBIÇÃO NÃO VERIFICADOS. 1. A materialidade, autoria e dolo decorrem da
constatação pelo Fisco de que a conduta praticada implica omissão de receita e, de
conseqüência, a supressão do pagamento de tributos, restando, assim, um prejuízo aos
cofres públicos. 2. Inexiste erro de tipo ou erro de proibição, pois o apelante tinha pleno
conhecimento de que deveria escriturar corretamente seus livros contábeis, bem como
deveria levar ao conhecimento do Fisco a receita auferida por sua empresa. (TRF4,
Apelação Criminal Nº 2009.72.07.000554­9, 7ª Turma, Des. Federal Tadaaqui Hirose, D.E.
06/05/2011).

Nessas condições, o réu Artur Krieger, e apenas ele, tinha o domínio dos
fatos relacionados à administração da empresa, de sorte que é dele a responsabilidade penal
dos fatos em comento.

Cito o ensinamento do ilustre magistrado José Paulo Baltazar Junior:

"(...) Deve ser responsabilizado o réu ou réus que detinham o domínio do fato, isto é, quem
detém em suas mãos o curso, o 'se' e o 'como' do fato, podendo decidir preponderantemente
a seu respeito; dito mais brevemente, o que tem o poder de decisão sobre a configuração
central do fato (...)" (O Crime de Omissão no Recolhimento de Contribuições Sociais
Arrecadadas, Lei n. 8.212/91, art. 95, "d". Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE,
2000).

Não há qualquer dúvida de que o réu Artur Krieger tinha o pleno domínio
sobre o que ocorreu na empresa nos períodos narrados pela denúncia. Destarte, reconhecida
a autoria pela sonegação de contribuições sociais previdenciárias, e sendo autor aquele que
tem o domínio do fato, que tem o poder de decisão sobre a realização do fato, o réu Artur
Krieger é o autor dos delitos que lhe são imputados pela exordial acustória.

Fincadas a materialidade e a autoria, remanesce o exame da adequação


das condutas perpetradas pelo réu e a qualificação jurídica delas atribuídas pela
acusação. E nesse ponto, entendo que há necessidade de reparos na classificação
jurídica dos fatos atribuída pela acusação.
Vinha decidindo em casos análogos ao dos autos que havia continuidade
delitiva entre os delitos de sonegação de contribuição previdenciária (art. 337­A CP) e
sonegação de contribuições sociais para terceiros (art. 1º da lei n. 8.137/90), quando
praticados sob o manto da mesma empresa, nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar,
modo de execução.

Contudo, não escapa à percepção deste juízo que a 8ª Turma do Tribunal


Regional Federal da 4ª Região modificou seu entendimento a respeito da tipificação dos
fatos relativos à sonegação das contribuições sociais para terceiros (FNDE, INCRA,
SEBRAE, SESC e SENAI), decidindo que, se tal conduta omissiva é perpetrada no mesmo
contexto da sonegação das contribuições previdenciárias, há crime único, o do artigo 337­A
do CP, e não concurso formal, por força dos princípios da especialidade e da vedação ao bis
in idem, ficando afastada, assim, a aplicação concomitante do tipo penal do artigo 1º, da lei
n. 8.137/90 aos fatos relativos às contribuições sociais dos terceiros.

Cumpre transcrever o excerto do acórdão de relatoria do Juiz Federal Nivaldo


Brunoni, convocado em substituição do Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos
Laus, proferido na sessão realizada pela 8ª Turma da nossa Colenda Corte Regional em
04/11/2015, nos autos da apelação criminal n. 5026530­61.2011.4.04.7100/RS, que
modificou a orientação da turma a respeito da matéria:

A propósito da quaestio, apresento breve resenha histórica do delito de sonegação de


contribuição previdenciária, hoje disciplinado no artigo 337­A do Código Penal.

O dispositivo legal em apreço foi introduzido no Estatuto Repressivo pela Lei 9.983, de 14
de julho de 2000, mas convém observar que os tipos penais nele contidos representam a
evolução de outros dispostos em leis anteriores.

De fato, a Lei 3.807, de 26 de agosto de 1960, com a redação dada pelo Decreto­Lei 66, de
21 de novembro de 1966, já tratava como crime de sonegação fiscal algumas das condutas
dos incisos I e II do artigo sub examine. Com efeito, o artigo 155, inciso I, da aludida lei
assim prescrevia:

"Art. 155. Constituem crimes:

I ­ de sonegação fiscal, na forma da Lei nº 4.739, de 15 da julho de 1965, deixar de:

a) incluir, na folha de pagamento dos salários, empregados sujeitos ao desconto das


contribuições previstas nesta lei, conforme determinação do item I do artigo 80;

b) lançar, em títulos próprios de sua escrituração mercantil, cada mês, o montante


das quantias descontadas de seus empregados e o da correspondente contribuição da
empresa, conforme estabelece o Item II do artigo 80;

c) escriturar nos livros e elementos discriminativos Próprios as quantias recolhidas a


título de 'Quota de Previdência' dos respectivos contribuintes." (Negritei.)

Após, a Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, também versou acerca dos crimes
previdenciários no Capítulo I ­ Dos Crimes Contra a Ordem Tributária, em alguns dos
incisos dos artigos 1º e 2º, cuja redação segue abaixo:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou


contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I ­ omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II ­ fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo


operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
(...)

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

I ­ fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou


empregar outra fraude, para eximir­se, total ou parcialmente, de pagamento de
tributo;(...)" (Frisei.)

Cumpre frisar que as normas penais supra­referidas, relativamente aos delitos


previdenciários, continuaram em vigor mesmo com o advento da Lei 8.212/91 ­ Lei
Orgânica da Seguridade Social ­, porquanto, embora tenha sido elencado novo rol de
condutas lesivas aos interesses da Previdência Social no artigo 95 desse diploma legal, não
foram previstas sanções penais em diversas de suas alíneas.

Nesse sentido, trago lição de Luiz Regis Prado:

"Com o advento da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, que instituiu a Lei Orgânica da
Seguridade Social, inseriram­se no seu artigo 95 tipos penais atinentes a condutas
atentatórias aos interesses da previdência social. Revelando, uma vez mais, o seu
despreparo quanto à tecnicidade peculiar à elaboração de uma norma penal, o
legislador se olvidou de estabelecer reprimendas para as condutas descritas nas
alíneas a, b, c, g, h, i e j,2 que por terem sido desqualificadas como normas penais,
ante a ausência da sanção ­ elemento essencial da norma penal incriminadora ­, não
se revestiram de qualidade suficiente para inovar o ordenamento penal.3 Tais normas
foram tratadas como 'meras declarações de intenção de mudança legislativa que
não logram obter efeito por absoluta inépcia do legislador',4 e, portanto, os
preceitos da Lei 8.137/90 relativos aos crimes previdenciários continuavam em
vigor." (Curso de direito penal brasileiro, volume 3: parte especial. 7. Ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2010 ­ grifei.)

Com efeito, somente após a edição da Lei 9.983/2000, que revogou o artigo 95 da Lei
8.212/91 na parte referente aos tipos previdenciários e acresceu diversas normas penais ao
texto do Estatuto Repressor, houve a derrogação dos tipos penais da Lei 8.137/90, no que
tange ao delito de sonegação de contribuição previdenciária, passando tal crime a ser
regido estritamente pelo artigo 337­A, caput, e seus incisos, do Codex Penal, in verbis:

"Art. 337­A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer


acessório, mediante as seguintes condutas:

I ­ omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações


previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário,
trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem
serviços;

II ­ deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa


as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo
tomador de serviços;

III ­ omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas


ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias:

Pena ­ reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa."

De todo o exposto, e tomando­se por referência a leitura conjugada de ambos os


dispositivos, sobressai o caráter especial do tipo penal do artigo 337­A do Estatuto
Repressivo em relação àquele inscrito no artigo 1º da Lei 8.137/90, em virtude do tributo
objeto de supressão/redução ­ contribuição social previdenciária ­, assim como,
notadamente, do maior grau de detalhamento das condutas elencadas em seus três incisos.

Feitas tais considerações, passo ao exame da hipótese dos autos.


In casu, o réu omitiu parte das remunerações pagas a segurados empregados e
contribuintes individuais das Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência
Social (GFIP), reduzindo contribuições sociais previdenciárias. Presentes, portanto, a
conduta, o resultado e o nexo causal, resta preenchida a hipótese normativa do artigo 337­
A, inciso III, do Estatuto Repressor.

Ocorre que tal conduta, inobstante se amolde perfeitamente ao referido inciso III, enseja,
necessariamente, a redução de contribuições sociais a entes autônomos ­ as quais não se
confundem com a espécie tributária contida no caput desse dispositivo­, porquanto a base de
cálculo de ambas as exações é a mesma, vale dizer, os valores pagos ou creditados a título
de remuneração a segurados. Na hipótese sub examine, foram reduzidas as contribuições
sociais para o FNDE, INCRA, SEBRAE, SEST e SENAT (evento 01, PROCADM12, fls. 18 e
19, da ação penal).

Entretanto, não se pode tomar apenas essa consequência ­ redução de contribuições sociais
a entes autônomos ­ como um novo delito, já que na omissão de remunerações pagas das
GFIP, ao agente não é facultada escolha acerca de qual tributo sonegar, considerando­se a
base de cálculo adotada e o modo de execução do crime. Logo, inexiste conduta de
sonegação fiscal, sob pena de ofensa aos princípios da especialidade e da vedação ao bis in
idem.

Outrossim, inadmissível a aplicação de instituto jurídico criado para favorecer o réu ­


concurso formal ­ nitidamente em seu desfavor.

Daí que, praticada tão­somente uma das condutas previstas no artigo 337­A do Código
Penal, como na situação dos autos (inciso III), remanesce atraída a incidência da norma
prevista no Estatuto Repressor, e afastada, à vista dos princípios da especialidade e da
proibição ao bis in idem, a aplicação do tipo penal do artigo 1º da Lei 8.137/90,
remanescendo configurada hipótese de crime único.

De todo o exposto, inexiste concurso formal na situação dos autos. Contudo, a redução das
contribuições sociais a tais entes, por conservarem relação direta com a prática delitiva,
apresentam natureza de consequências do delito, devendo ser valoradas de tal modo.

Nesse sentido, mutatis mutandis:

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME


CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SUPRESSÃO DE MAIS DE UM TRIBUTO.
CONCURSO FORMAL. INOCORRÊNCIA. CRIME ÚNICO. 1. No crime de
sonegação fiscal o bem jurídico tutelado não é o patrimônio ou erário de cada pessoa
jurídica de direito público titular de competência para instituir e arrecadar tributos ­
fiscais (entes federativos) ou parafiscais (entidades autárquicas) ­ mas, sim, a ordem
jurídica tributária como um todo. 2. A conduta consistente em praticar qualquer
uma ou todas as modalidades descritas nos incisos I a V do art. 1 da Lei nº 8.137/90
(crime misto alternativo) conduz à consumação de crime de sonegação fiscal
quando houver supressão ou redução de tributo, pouco importando se atingidos um
ou mais impostos ou contribuições sociais. 3. Não há concurso formal, mas crime
único, na hipótese em que o contribuinte, numa única conduta, declara Imposto de
Renda de Pessoa Jurídica com a inserção de dados falsos, ainda que tal conduta
tenha obstado o lançamento de mais de um tributo ou contribuição. 4. Recurso
improvido." (STJ, REsp 1.294.687, 6ª Turma, Rel.ª Ministra Maria Thereza de Assis
Moura, DJe 24­10­2013 ­ destaquei)

Dessa forma, estando comprovada a atividade fraudulenta do acusado e devidamente


constituído o crédito tributário, entendo ser típica a conduta praticada pelo réu nos estritos
termos do artigo 337­A, inciso III, do Código Penal, afastada a tipicidade quanto à
sonegação fiscal, e restando prejudicada a tese defensiva de insignificância penal neste
crime.

Esse mesmo entendimento foi reiterado pela 8ª Turma nos seguintes julgados:
TRF4, ACR 5048490­73.2011.404.7100, Oitava Turma, Relator p/ Acórdão Victor Luiz dos
Santos Laus, juntado aos autos em 23/11/2015; TRF4, ACR 0000071­27.2009.404.7214,
Oitava Turma, Relator Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. 01/03/2016; e TRF4, ACR
5016890­72.2013.404.7000, Oitava Turma, Relator p/ Acórdão Leandro Paulsen, juntado
aos autos em 15/03/2016.

Considerando que o caso dos autos é análogo aos casos que serviram de
substrato fático para os precedentes encimados, tenho por bem aderir ao entendimento
firmado 8ª Turma da nossa Colenda Corte Regional, para o efeito de reconhecer a
atipicidade da sonegação das contribuições sociais ao entes autônomos, não havendo, assim,
a subsução das condutas omissivas relativas a tais contribuições no artigo 1º, I, da lei n.
8.137/90.

Afinal, à semelhança do entendimento fincado nos julgados encimados, no


caso dos autos a omissão de informações pelo réu em Guias de Recolhimento do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP) a respeito de
remunerações pagas a quinze segurados empregados mantidos a seu serviço e a
contribuintes individuais, bem como de informações sobre incapacidade laborativa de
segurados empregados decorrente dos riscos ambientais do trabalho, ocasionou a redução
fraudulenta de contribuições sociais previdenciárias, condutas essas tipificadas nos artigos
337­A, I e III, do CP.

Essas mesmas condutas, ensejaram, necessariamente, a redução de


contribuições sociais a entes autônomos (FNDE, INCRA, SEBRAE, SESC e SENAI), uma
vez que estas e as contribuições previdenciárias possuem a mesma base de cálculo, qual
seja, os valores pagos ou creditados a título de remuneração a segurados. E na linha dos
precedentes encimados, não se pode tomar apenas essa consequência ­ redução de
contribuições sociais a antes autônomos ­ como um novo crime, uma vez que na omissão de
remunerações pgadas das GFIP's, ao agente não é facultada escolha sobre qual o tributo que
irá sonegar, tendo­se em conta a base de cáculo adotada e o modo de execução do crime.
Por tais razões, cumpre reconhecer a ausência da sonegação fiscal relativamente às
contribuições sociais dos entes autônomos.

Ainda na linha dos precedentes citados, cumpre reconhecer que a redução das
contribuições sociais a tais entes, por conservarem relação direta com a prática delitiva,
apresentam natureza de consequências do delito de sonegação de contribuição
previdenciária, razão pela qual será valorada de tal modo, mais adiante, nesta sentença, nas
circunstâncias judiciais, como consequências do delito.

Configuradas, pois, a materialidade e a autoria do delito tipificado no artigo


337­A, incisos I e III, do CP, bem como reconhecida a atipicidade das condutas tipificadas
no artigo 1º, I, da lei n. 8.137/90, passo a analisar as teses defensivas.

O réu, em seu interrogatório, e a defesa constituída, em alegações finais,


sustentaram que a sonegação das contribuições sociais previdenciárias ocorreram em razão
de dificuldades financerias, não havendo, assim, dolo, sendo, por outro lado, aplicável ao
caso a causa supralegal de exclusão de culpabilidade da enexigibilidade de conduta diversa.

A alegação de que não houve comprovação do dolo de sonegar tributos na


conduta do réu, pela situação de insolvência financeira, é improcedente. Isso porque não se
praticam as condutas narradas pela denúncia sem a intenção de fraudar o fisco. Ademais, a
jurisprudência já sedimentou entendimento no sentido de que o elemento subjetivo exigido
pelo tipo previsto no art. 337­A do Código Penal é o dolo genérico, caracterizado pela
vontade dirigida ao propósito de reduzir ou suprimir a contribuição previdenciária (TRF4,
ACR 0001277­64.2008.404.7003, Sétima Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, D.E.
04/02/2013; TRF4, ACR 0014830­96.2004.404.7108, Oitava Turma, Relator Victor Luiz
dos Santos Laus, D.E. 03/10/2013; e TRF4, ACR 0007308­47.2001.404.7100, Oitava
Turma, Relator Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. 22/08/2013). Desnecessário, assim,
indagar se o réu pretendia, pelas condutas omissivas perpetradas, locupletar­se
patrimonialmente.

De qualquer modo, ainda que viável a aplicação da dirimente, as dificuldades


financeiras devem importar necessariamente na absoluta insolvência da empresa. Ainda,
exige­se a insolvência patrimonial do próprio responsável, segundo iterativos julgados do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região (cf. Apelação Criminal nº 1998.04.01.028203­0­RS,
1ª Turma, Juiz Relator Fábio Bittencourt da Rosa). Convém, a esse propósito, transcrever o
voto­condutor do acórdão recém­citado, proferido pelo Juiz Fábio Bittencourt da Rosa, na
parte que respeita à absoluta insolvência, de sorte a configurar a causa de exclusão de
culpabilidade em exame:

Entende­se que apenas a situação de absoluta insolvência da empresa, plenamente


comprovada no processo, é capaz de acarretar um juízo absolutório, diante da gravidade do
delito imputado.

Por isso, as dificuldades financeiras afastam a culpabilidade do agente quando


não só os bens da empresa encontram­se onerados, mas também, os dos sócios
administradores devem estar comprometidos com a crise financeira da firma, seja por meio
de penhoras em reclamatórias trabalhistas (onde exsurge um potencial prejuízo ao crédito
trabalhista ­ art. 186 do CTN) ou processos de execução, seja, por fim, pela arrecadação de
bens pelo juízo falimentar.

Vale ressaltar, uma vez mais, que a tese defensiva de causa supralegal de
excludente de culpabilidade, calcada em invencíveis dificuldades financeiras, somente se
aplica ao crime de omissão de recolhimento de contribuições previdenciárias. Ao passo que
o réu está sendo julgado nesta sentença pelo crime de sonegação de contribuições sociais
previdenciárias. Ora, neste tipo de crime, diversamente daquele, o dolo de pretender fraudar
e/ou ludibriar o Fisco afasta a dirimente. Por certo, não é a dificuldade financeira, ainda
invencível, que exculpará o réu de falsear a realidade dos fatos geradores do tributo
sonegado. Aliás, justamente pelo modus operandi, vale dizer, pela utilização de meios
fraudulentos para suprimir ou reduzir o tributo, é que não se aplica a exculpante em questão
nos casos de sonegação de contribuição previdenciária. Nesse sentido: TRF4, ACR
0001277­64.2008.404.7003, Sétima Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, D.E.
04/02/2013.

E mesmo que se admitisse a aplicação da mencionada exculpante aos fatos


tipificados no artigo 337­A do CP, o que foi admitido pela nossa Colenda Corte Regional a
caso concreto excepcional (TRF4 5003508­84.2010.404.7107, Quarta Seção, Relatora p/
Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, D.E. 21/01/2013), cumpre reconhecer que as graves
dificuldades alegadas não ficaram sobejamente comprovadas de modo a possibilitar o
reconhecimento dessa causa de isenção de pena.

Não custa repisar que a defesa não acostou cópias das declarações de imposto
de renda do réu, nem as da empresa em questão. Também não vieram aos autos cópias de
balanços e relatórios bancários e fiscais da empresa.

Dessa maneira, não há prova concreta das dificuldades financeiras, de modo


que não há substrato apto a fundamentar a aplicação da causa supralegal de isenção de pena.

­ Arremate.
Por todas as considerações desenvolvidas, conclui­se que o réu Artur
Krieger, na condição de administrador de fato e de direito da empresa Arbeitec Teconologia
em Usinagem Ltda., de forma livre e consciente, suprimiu contribuição social
previdenciária, mediante a omissão de informações em Guias de Recolhimento do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP) acerca de (i)
remunerações pagas a quinze segurados empregados mantidos a seu serviço, quatro destes
sem o respectivo registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), e
contribuintes individuais, todos listados no processo administrativo­fiscal que integra a
vestibular acusatória, e de (ii) informações sobre incapacidade laborativa de segurados
empregados decorrente dos riscos ambientais do trabalho, no que se refere às competências
fiscais de 01/2006 a 06/2010, incluindo os décimos­terceiro salários dos anos de 2006 a
2009. O réu, portanto, praticou o crime do artigo 337­A, I e III, do CP.

III. FUNDAMENTO DO DISPOSITIVO

Embora tenha admitido em juízo que lhe competia a administração da


empresa, mas pelo fato de ter negado que houve a sonegação das contribuições
previdenciárias, asseverando, ao contrário, que apenas deixou de repassar as contribuições
previdenciárias que tinham sido regularmente escrituradas em razão de dificuldades
financeiras, o que não se coaduna com a prova amealhada aos autos, entendo inaplicável ao
réu a atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, III, alínea "d", do Código
Penal.

De outro viés, observo que há notícia de que o réu Artur Krieger foi
condenado à pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, pela prática do crime
previsto no artigo 168­A, em combinação como o artigo 71, ambos do CP, nos autos da ação
penal n. 2005.72.01.002584­8, tendo ocorrido o trânsito em julgado para a acusação em
16/09/2008 e para a defesa em 26/01/2009. Essa pena foi cumprida nos autos da execução
penal n. 2009.72.01.002706­1, tendo sido extinta pelo cumprimento em 21/01/2014 (cf.
evento 133 ­ CERTANTCRIM1). Como a condenação encimada é anterior aos fatos
apurados nestes autos, entendo aplicável na segunda fase da dosimetria da pena a agravante
da reincidência, prevista no artigo 61, I, do CP.

Por fim, observo que o réu Artur Krieger praticou a conduta de sonegação de
contribuições sociais previdenciárias por 58 (cinquenta e oito) vezes, no período de 01/2006
a 06/2010, incluindo nesse cômputo os décimos­terceiros salários dos anos de 2006 a 2009.
Nesse passo, não merece prosperar a pretensão acusatória de reconhecimento de prática de
136 (cento e trinta e seis) condutas de sonegação previdenciária, uma vez que nesse cálculo
houve o somatório indevido de competências dos AI's n. 37.281.439­5 e n. 37.281.438­7,
que são relativos ao mesmo período de 01/2006 a 06/2010, divergindo um e outro apenas a
respeito da natureza de rubricas que lhes constituíram o objeto. Assim, cumpre reconhecer
que foram apenas 58 (cinquenta e oito) competências e cada uma delas correspondendo a
um crime. Ademais, como as condutas foram praticadas em diversas competências, todas
próximas, e, em cada uma delas, mediante o mesmo método, cabe aplicar para a série o
concurso do crime continuado.

Nessas condições, impõe­se a majoração do crime continuado, e na esteira da


orientação firmada sobre a aplicação do crime continuado no Tribunal Regional Federal da
4ª Região, para os crimes de omissão e de sonegação de contribuição previdenciária
(Embargos Infringentes nas Apelações Criminais n(s 2000.04.01.140654­9/RS e
2000.04.01.140655­0/RS, 4ª Seção, Desembargador Relator Wolkmer de Castilho, Data de
Julgamento: 19/02/03), e, tendo em conta que foram 58 (cinquenta e oito) crimes, aplicarei a
majoração de 2/3 (dois terços) na terceira etapa da individualização da pena.
IV. DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva para:


a) absolver o réu Guilherme Krieger, preambularmente qualificado, dos crimes
tipificados no atigo 337­A, incisos I e III, do CP e no artigo 1º, I, da lei n. 8.137/90, que
lhe foram imputados na denúncia, e o faço com fundamento no artigo 386, inciso V, do
CPP; b) absolver o réu Artur Krieger, preambularmente qualificado, do crime
tipificado no artigo artigo 1º, inciso I, da lei n. 8.137/90, que lhe foi imputado pela
exordial acusatória, e o faço com fundamento no artigo 386, inciso III, do CPP; e c)
condenar o réu Artur Krieger, preambularmente qualificado, nas sanções do artigo
337­A, incisos I e III, na forma do artigo 71, todos do CP.

Passo à individualização da pena do réu Artur Krieger.

Nos autos, não há notícia de maus antecedentes do réu. Destaque­se que a


condenação anterior do réu a que fiz menção no tópico "III. Fundamentos do
Dispositivo" será valorada como reincidência, na segunda fase da aplicação da pena.
No que diz respeito à personalidade e à conduta social, não há nada que desfavoreça o
réu. Os motivos e as circunstâncias são próprios do crime de sonegação de
contribuições previdenciárias. As consequências do crime, por sua vez, extrapolam os
elementos caracterizadores do delito, uma vez que a sonegação perpetrada pela
empresa administrada pelo réu causou um prejuízo aos cofres públicos no valor de R$
870.399,34 [esse valor foi composto pelo somatório dos valores principais atualizados
dos AI's n. 37.281.439­5 (R$ 523.269,91), n. 37.281.438­7 (R$ 214.935,71) e n.
37.281.440­9 (R$ 132.193,72)], consolidado em 24/10/2010, excluídos desse valor a
multa de mora, a multa de ofício e os juros. Vê­se, portanto, que esse montante é muito
superior à R$ 100.000,00, que é o patamar estabelecido pela nossa Corte da 4ª Região
como divisor de águas para a valoração negativa desta circunstância judicial (cf.
TRF4, ENUL 2003.71.07.011261­1, Quarta Seção, Relator Paulo Afonso Brum Vaz,
D.E. 02/07/2010).

A culpabilidade do réu, assim, enseja a incidência de um grau, pelo


menos, razoável acima do patamar normal de reprovação social. É orientação da
Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que nesta etapa da
dosimetria, se faça um termo médio de culpabilidade que é a metade da soma das
penas máxima e mínima abstratamente cominadas para o tipo penal. Depois, que se
diminua desse termo médio a pena mínima abstratamente prevista. E o resultado se
divide pelo número de circunstâncias judiciais, que são oito, em partes iguais,
alcançando­se o peso idêntico para cada uma delas (cf. ACR n. 2007, Rel. Des. Néfi
Cordeiro, publicado em 22/06/2005). Nesse sentido, e considerando as penas cominadas
abstratamente para o tipo do artigo 337­A do CP, 2 (dois) a 5 (cinco) anos, acha­se o
peso de 2 (dois) meses e 7 (sete) dias para cada circunstância judicial.

Contudo, não se pode invariavelmente se fazer essa operação, sob pena de


se transformar a dosimetria em mera operação aritmética, desprovida de qualquer
valor ético, e, mesmo de um sentido de proporcionalidade sempre necessário ao cálculo
da pena. Nessas condições, e considerando que a situação que deu causa à valoração
negativa da vetorial da consequência do crime extrapola pelo menos sete vezes o
patamar fixado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região em casos análogos, tenho
por bem sopesar essa circunstância judicial acima do valor resultante da aplicação do
critério matemático, fixando­a, portanto, em 06 (seis) meses.

Por essas razões, e como incide somente essa circunstância judicial


negativa, a PENA­BASE resta fixada em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
Na segunda etapa, está presente a agravante da reincidência (art. 61, I,
CP), em razão da condenação com trânsito em julgado em face do réu, proferida na
ação penal n. 2005.72.01.002584­8, pela prática do crime previsto no artigo 168­A, em
combinação com o artigo 71, ambos do CP (cf. o tópico III ­ Fundamentos do
Dispositivo supra), razão pela qual agravo a pena em 05 (cinco) meses. Inexistem
circunstâncias atenuantes.

Assim, fixo a PENA PROVISÓRIA em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de


reclusão.

Na terceira fase, não incidem causas de diminuição da pena. Por outro


lado, cumpre majorar a reprimenda corporal em razão da continuidade delitiva (cf.
tópico III desta sentença), à razão de 2/3 (dois terços).

Desse modo, fixo a PENA DEFINITIVA em 04 (quatro) anos, 10 (dez)


meses e 10 (dez) dias de reclusão.

O regime inicial de cumprimento da pena será o fechado, pois o réu é


reincidente em crime doloso, o que impossibilita o início do cumprimento da pena no
regime semiaberto, conforme se extrai do artigo 33, § 2º, do CP.

Quanto à pena de multa, na fixação da quantidade de dias­multa, cumpre


observar a simetria entre a quantidade de dias­multa e a pena privativa de liberdade
estabelecida, e, nessa ótica, tendo em conta que a pena definitiva de reclusão imposta
ao réu é 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias e os termos abstratos de
sanção do crime de sonegação de contribuição previdenciária são de 2 (dois) anos
(mínimo) a 5 (cinco anos) (máximo), e os termos abstratos da quantidade de dias­
multa, que são de 10 dias­multa (mínimo) a 360 dias­multa (máximo), e aplicando a
regra de 3, condeno­o ao pagamento de 343 (trezentos e quarenta e três) dias­multa.
Em face da situação econômica do réu na atualidade (disse em juízo auferir renda
mensal aproximada de R$ 1.200,00 ­ cf. evento 126 ­ TERMOAUD3), fixo o valor do
dia­multa em 1/20 (um vinte avos) do salário mínimo, segundo o valor vigente na data
do último fato, que é junho de 2010, observada a correção monetária prevista no artigo
49, parágrafo 2º, do CP. Deverá pagá­la, no prazo de 10 (dez) dias, contados do
trânsito em julgado desta sentença, sem prejuízo das disposições do artigo 50 do CP.

No tocante à possibilidade de SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA


DE LIBERDADE por penas restritivas de direitos, cumpre observar que o réu Artur
Krieger não preenche os pressupostos objetivos previstos no artigo 44, I, do CP,
porque foi condenado a uma pena privativa de liberdade superior a 04 (quatro) anos.
Desse modo, o réu não tem direito à substituição da pena privativa de liberdade que
lhe está sendo imposta nesta sentença e, tampouco, direito à suspensão condicional
dessa mesma pena, nos termos do artigo 77 do CP.

­ PROVIMENTOS FINAIS

Deixo de fixar o valor de reparação de dano, ao revés do que prevê o


artigo 387, IV, do CPP, na esteira de entendimento pacífico do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, segundo o qual é desnecessária essa espécie de provimento
jurisdicional em sentença condenatória de crimes de sonegação previdenciária,
considerando que a União possui corpo próprio capacitado para buscar a reparação
mediante execução fiscal (cf. Apelação Criminal n. 0029466­86.2007.404.7100/RS, 8ª
Turma, Desembargador Relator Luiz Fernando Wowk Penteado, Data de Julgamento
em 13 de março de 2013). Acrescento que a certidão de dívida ativa já produz a
eficácia legal atribuída à sentença penal condenatória, que é consubstanciar título apto
a aparelhar a execução fiscal. Neste caso, aliás, como fincado na fundamentação, no
tocante ao exame da materialidade, o Fisco está executando os créditos tributários
descritos na denúncia.

É direito do réu permanecer em liberdade na etapa recursal.

Custas processuais pelo réu.

Transitada em julgado esta sentença, determino, com fundamento no


artigo 335, do provimento n. 17, de 2003, da Corregedoria do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, as seguintes providências: i) remessa dos autos à Contadoria
Judicial para calcular os valores devidos a título de custas processuais e multa; ii)
expedição de ficha individual do condenado; iii) distribuição do processo de execução
penal ou, se for o caso, o encaminhamento da ficha individual ao juízo da execução
penal prevento e iv) alteração da situação de parte do réu Artur Krieger nesta ação
penal para arquivado, bem como da situação de parte do réu Guilherme Krieger para
absolvido.

Publique­se. Registre­se. Intimem­se.

Documento eletrônico assinado por ROBERTO FERNANDES JÚNIOR, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso
III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A
conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico
http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador
720001248458v323 e do código CRC dd9eb655.

Informações adicionais da assinatura:


Signatário (a): ROBERTO FERNANDES JÚNIOR
Data e Hora: 12/05/2016 17:25:49

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