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BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Unidade II
5 DESENVOLVIMENTO FARMACÊUTICO DE MEDICAMENTOS BIOLÓGICOS
(BIOFÁRMACOS)

Um biofármaco é qualquer medicamento farmacêutico fabricado, extraído ou semissintetizado de


fontes biológicas. Diferentes dos produtos farmacêuticos totalmente sintetizados, eles incluem vacinas,
sangue total, componentes do sangue, alergênicos, células somáticas, terapias genéticas, tecidos,
proteínas terapêuticas recombinantes e medicamentos vivos usados na terapia celular. Os produtos
biológicos podem ser compostos de açúcares, proteínas, ácidos nucleicos ou combinações complexas
dessas substâncias, ou podem ser células ou tecidos vivos. Eles, seus precursores ou componentes são
isolados de fontes vivas – humana, animal, vegetal, fúngica ou microbiana.

A terminologia em torno dos biofármacos varia entre grupos e entidades, com diferentes termos
que se referem a distintos subconjuntos de terapêuticas dentro da categoria biofarmacêutica geral.
Algumas agências reguladoras usam os termos medicamentos biológicos ou produto biológico
terapêutico para se referirem especificamente a produtos macromoleculares projetados como drogas
baseadas em proteínas e ácidos nucleicos, distinguindo-os de produtos como sangue, componentes do
sangue ou vacinas, que geralmente são extraídos diretamente de um fonte biológica. Os medicamentos
especiais, uma classificação recente de produtos farmacêuticos, são medicamentos de alto custo que,
em geral, são biológicos. A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) usa o termo medicamentos de
terapia avançada (ATMPs) para medicamentos para uso humano que têm como base genes, células
ou engenharia de tecidos, incluindo medicamentos de terapia genética, medicamentos de terapia com
células somáticas, engenharia de tecidos medicamentos e suas combinações.

Lembrete

Biofármaco é a designação dada a medicamentos originados a partir


de um processo biológico. Entre eles destacam-se aqueles obtidos por
meio de rotas biotecnológicas, em que o princípio ativo é extraído de
microrganismos ou células animais modificadas geneticamente.

Os medicamentos biológicos baseados em genes e células, por exemplo, frequentemente estão na


vanguarda da biomedicina e da pesquisa biomédica e podem ser usados para tratar uma variedade de
condições médicas para as quais nenhum outro tratamento está disponível. Em algumas jurisdições,
os produtos biológicos são regulados por órgãos diferentes de outras drogas de moléculas pequenas
e dispositivos médicos. Biofarmacêutica é a indústria farmacêutica que trabalha com biofármacos.
Biofarmacologia é o ramo da farmacologia que estuda biofármacos.

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Algumas das formas mais antigas de produtos biológicos são extraídas de corpos de animais,
especialmente de outros humanos. Alguns desses produtos biológicos importantes incluem:

• sangue total e outros componentes do sangue;

• transplantes de órgãos e de tecidos;

• terapia com células-tronco;

• anticorpos para imunidade passiva (por exemplo, para tratar uma infecção viral);

• células reprodutivas humanas;

• leite materno;

• microbiota fecal.

Alguns produtos biológicos que antes eram extraídos de animais, como a insulina, são agora mais
comumente produzidos por DNA recombinante.

5.1 Técnica de produção de proteínas recombinantes

A necessidade de medicamentos eficientes e complexos que não são possíveis de serem fabricados de
maneira sintética e em grande quantidade levou a comunidade científica a trabalhar em uma tecnologia
que culminasse em uma “fábrica biológica” de produção de hormônios, vacinas, testes de diagnósticos
ou outros biofármacos com elevado grau de pureza a um custo relativamente baixo.

A bioinformática levou a avanços significativos na escolha da proteína e do fragmento do gene que


irá gerar tal proteína, pois essa nova ciência reúne conhecimentos de informática, biologia, estatística e
matemática, que auxiliam no sequenciamento do genoma e de mutações, além de analisar a expressão
e a regulação de genes e suas respectivas proteínas. A partir desses resultados, o foco será o material
genético: RNAm e/ou DNA, cujas sequências nucleotídicas desejadas serão adicionadas a um vetor,
expressas em determinado sistema biológico, purificadas para uso humano. Por meio de técnicas de
biotecnologia, várias empresas estão focadas no desenvolvimento e no aprimoramento de organismos
que nos ajudarão a enfrentar doenças, entre outras finalidades.

Será possível um sistema de expressão como a bactéria E. coli, ou a levedura Saccharomyces cerevisiae
produzir uma proteína humana? A resposta é sim! Como explicado anteriormente, as principais etapas
para se obter um microrganismo que expressa uma proteína heteróloga (que não pertença a ele) são:

• escolher e isolar o gene de interesse, por meio da bioinformática, para desenhar o primer;

• amplificar o fragmento de DNA usando a técnica de PCR;

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• isolar o fragmento de interesse no gel de agarose;

• usar enzima de restrição e “cortar” o DNA;

• ligar o fragmento com o vetor usando DNA ligase;

• escolher o sistema de expressão, que pode ser procarioto ou eucarioto;

• inserir o DNA recombinante no hospedeiro;

• selecionar as células que contêm o DNA de interesse;

• sequenciar o DNA;

• expressar o gene no sistema escolhido, com a vantagem de se reproduzirem muito rapidamente.

As proteínas chamadas recombinantes, uma vez analisadas e vistoriadas, serão produzidas em


grande escala em biorreatores nas indústrias de biotecnologia, mas já existem centros de pesquisas
que pretendem utilizar plantas e animais geneticamente modificados para a produção em larga escala
de proteínas com papel biológico de fármacos, por exemplo, vacas leiteiras que possuem em seu leite
fármacos para câncer ou sementes de sojas com fator IX de coagulação.

A levedura S. cerevisiae é muito utilizada, pois como é um eucarioto, tal qual os seres humanos,
consegue fazer as modificações pós-traducionais necessárias para que seja reconhecida corretamente,
além de ser um microrganismo GRAS (generally recognized as safe) para produção de biofármacos –
fato que não ocorre com o uso da bactéria E. coli. Como alternativa, outra levedura vem sendo utilizada
em biotecnologia, Pichia pastoris, a qual apresenta uma região promotora muito forte que transcreve
genes heterólogos.

Mas o que determina a pesquisa e o desenvolvimento de clonagem de genes? A necessidade faz com
que haja a procura de uma saída melhor para a resolução do problema: doença, método diagnóstico,
agricultura etc. Para melhorar a qualidade de vida do diabético, foi criada a insulina recombinante e,
depois dela, outros hormônios, como o hormônio do crescimento (GH) para pessoas com ausência ou
pequena produção; para proteger as plantas do uso de inseticidas, é possível utilizar, por exemplo, a
toxina Bt, da bactéria Bacillus thuringiensis, letal para muitos insetos, que se degrada rapidamente
no ambiente e é atóxica para humanos e outros animais; para aumentar a produção de leite no gado
leiteiro, é administrada somatotrofina bovina recombinante; nos Estados Unidos, para pacientes com
doenças genéticas e fibrose cística, a terapia genética é usada fornecendo uma cópia normal do gene
para as células do corpo; para o tratamento de derrames, a prevenção de coágulos sanguíneos e ataques
cardíacos, há anticoagulantes recombinantes. Existem muitos outros exemplos além dos citados.

Acredita-se que, durante o desenvolvimento das técnicas, outros problemas, além dos citados,
serão sanados, como a preservação dos animais em extinção e o fim do tráfico clandestino de órgãos
pela utilização de células-tronco. No último caso, obviamente, esbarramos na parte ética, filosófica
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e religiosa, pois, após pesquisas sobre a clonagem de animais, como foi observado com o primeiro
mamífero clonado, a ovelha Dolly, que nasceu em 5 de julho de 1996, percebeu-se que os cientistas
quiseram “dar um passo à frente”, querendo clonar seres humanos (a chamada clonagem reprodutiva)
– fato ocorrido na China com a criação de crianças geneticamente modificadas. A comunidade
científica condenou o experimento porque não se sabe como as modificações irão afetar os órgãos,
pois na ovelha Dolly perceberam-se erros no DNA, e ela morreu após seis anos, em virtude de diversos
problemas de saúde.

Saiba mais

Para conhecer mais sobre a clonagem, sugerimos a leitura da


seguinte matéria:

OS CLONES estão entre nós. Estamos preparados? Pesquisa Fapesp,


2002. Disponível em: https://cutt.ly/lUKZqpl. Acesso em: 4 jan. 2022.

5.2 Medicamentos fabricados por DNA recombinante

Conforme já elucidado, o termo “biológicos” pode ser usado para se referir a uma ampla gama de
produtos biológicos na medicina. No entanto, na maioria dos casos, o termo “biológicos” é usado de forma
mais restritiva para uma classe de terapêuticas (aprovadas ou em desenvolvimento) que são produzidas
por meio de processos biológicos envolvendo tecnologia de DNA recombinante. Esses medicamentos são,
geralmente, de três tipos:

• Substâncias que são (quase) idênticas às proteínas-chave de sinalização do próprio


corpo. Exemplos são a proteína eritropoetina estimuladora da produção de sangue, o hormônio
estimulador do crescimento denominado (simplesmente) hormônio do crescimento e a insulina
humana biossintética e seus análogos.

• Anticorpos monoclonais. Estes são semelhantes aos anticorpos que o sistema imunológico
humano usa para combater bactérias e vírus, mas são “projetados sob medida” (usando
tecnologia de hibridoma ou outros métodos) e podem, portanto, ser feitos especificamente para
neutralizar ou bloquear qualquer substância no corpo, ou para atingir qualquer tipo específico
de célula. Exemplos de tais anticorpos monoclonais para uso em várias doenças são apresentados
no Quadro 3.

• Construções de receptor (proteínas de fusão), geralmente baseadas em um receptor de


ocorrência natural ligado à estrutura da imunoglobulina. Nesse caso, o receptor fornece a
construção com especificidade detalhada, enquanto a estrutura da imunoglobulina transmite
estabilidade e outras características úteis em termos de farmacologia.

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Os produtos biológicos, como uma classe de medicamentos nesse sentido mais restrito, tiveram
um impacto profundo em muitos campos médicos, principalmente reumatologia e oncologia,
mas também cardiologia, dermatologia, gastroenterologia, neurologia e outros. Na maioria dessas
disciplinas, os biológicos adicionaram opções terapêuticas importantes para o tratamento de muitas
doenças, incluindo algumas para as quais não havia terapias eficazes disponíveis e outras cujas terapias
anteriormente existentes eram claramente inadequadas. No entanto, o advento da terapêutica
biológica também levantou questões regulatórias complexas e preocupações farmacoeconômicas
significativas porque o custo das terapias biológicas é dramaticamente mais alto do que os
medicamentos convencionais (farmacológicos). Esse fator tem sido particularmente relevante, uma
vez que muitos medicamentos biológicos são usados para o tratamento de doenças crônicas, como
artrite reumatoide ou doença inflamatória intestinal, ou para o tratamento de câncer não tratável
durante o resto da vida.

Pacientes idosos que recebem terapia biológica para doenças como artrite reumatoide, artrite
psoriática ou espondilite anquilosante apresentam risco aumentado de infecção com risco de morte,
eventos cardiovasculares adversos e malignidade.

A primeira dessas substâncias aprovadas para uso terapêutico foi a insulina biossintética “humana”
produzida por meio de DNA recombinante. Às vezes referida como rHI, sob o nome comercial de
Humulin®, foi desenvolvida pela Genentech, mas licenciada para a Eli Lilly and Company, que a fabricou
e comercializou a partir de 1982. Os principais tipos de biofármacos incluem:

• fatores sanguíneos (fator VIII e fator IX);

• agentes trombolíticos (ativador do plasminogênio tecidual);

• hormônios (insulina, glucagon, hormônio do crescimento e gonadotrofinas);

• fatores de crescimento hematopoiéticos (eritropoetina fatores estimuladores de colônias);

• interferons (interferons-α, -β, -γ);

• produtos à base de interleucina (interleucina-2);

• vacinas (antígenos de superfície da hepatite B);

• anticorpos monoclonais (vários);

• produtos adicionais (fator de necrose tumoral, enzimas terapêuticas).

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Quadro 3 – Medicamentos obtidos por meio da biotecnologia

Metodologia de
Medicamento Aplicação Material biológico
produção
Penicillium notatum (penicilina),
Antibióticos Fermentação Tratamento de infecções
Streptomyces venezuelae
(cloranfenicol), Streptomyces griseus
(estreptomicina), entre outros
Técnica do DNA
Fatores de coagulação sanguínea Tratamento de hemofilia Células CHO
recombinante
Antitrombina (Atryn® foi
o primeiro medicamento Utilizado em pacientes com
Purificada do leite de
produzido com o uso de animais alteração hereditária da Cabra transgênica
animais transgênicos
geneticamente modificados produção de antitrombina
aprovado pelo FDA)
Insulina (Humulin® foi o primeiro
Técnica do DNA Tratamento do diabetes Escherichia coli
fármaco biotecnológico aprovado mellitus
recombinante
pelo FDA)
Tratamento de anemia
Eritropoetina (Procrit®, Epogen®, Técnica do DNA decorrente de doenças renais Células CHO
Eprex® e NeoRecormon®) recombinante crônicas, infecções por HIV e
câncer
Técnica do DNA Tratamento de câncer de Escherichia coli
IL-2 recombinante células renais
Tratamento de sarcoma
Interferon-α (Intron-A®, Técnica do DNA
Roferon-A® e Actimmume®) recombinante de Kaposi, hepatites B e C, Escherichia coli e Pichia pastoris
câncer de células renais
Tratamento de esclerose
Interferon-β (Avonex®, Rebif® e Técnica do DNA
Betaseron®) recombinante múltipla secundária Escherichia coli
progressiva
Técnica do DNA
Alfadornase (Pulmozyme®) Tratamento de fibrose cística Células CHO
recombinante
Dissolução de coágulos
Ativador de plasminogênio Técnica do DNA sanguíneos que podem
(Activase®) recombinante causar ataque cardíaco,
embolia pulmonar e derrame
OKT3 (primeiro anticorpo Tratamento contra rejeição
monoclonal a se tornar disponível Técnica do hibridoma Linfócito B e mieloma
de órgãos transplantados
para terapia em humanos)

Observação

Algumas fontes de medicamentos não eram consideradas


particularmente adequadas: os hormônios foliculoestimulante (FSH),
luteinizante (LH) e gonadotrofina coriônica humana (hCG) eram coletados
da urina de mulheres na menopausa ou grávidas; e o ancrodo, uma enzima
com atividade anticoagulante, era extraído do veneno da jararaca da Malásia
(Agkistrodon rhodostoma). Atualmente, essas substâncias são produzidas
principalmente a partir da tecnologia do DNA recombinante, minimizando
os impasses relacionados com a variabilidade entre lotes, disponibilidade de
doadores e periculosidade relativos ao processo de purificação.
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5.3 Biossimilares

Com a expiração de várias patentes de produtos biológicos de sucesso entre 2012 e 2019, o interesse
pela produção de biossimilares, ou seja, produtos biológicos de continuação, aumentou. Em comparação
com pequenas moléculas que consistem em ingredientes ativos quimicamente idênticos, os produtos
biológicos são muito mais complexos e consistem em uma infinidade de subespécies. Devido à sua
heterogeneidade e à alta sensibilidade do processo, os originadores e biossimilares de acompanhamento
exibem diversidade em variantes específicas ao longo do tempo; no entanto, a segurança e o desempenho
clínico dos biofármacos originadores e biossimilares devem permanecer equivalentes ao longo de seu
ciclo de vida. As variações do processo são monitoradas por ferramentas analíticas modernas (por
exemplo, cromatografia líquida, imunoensaios, espectrometria de massa etc.) e descrevem um espaço
de design exclusivo para cada produto biológico.

Assim, os biossimilares requerem uma estrutura regulatória diferente em comparação com os


genéricos de pequenas moléculas. A legislação do século XXI tratou disso, reconhecendo uma base
intermediária de testes para biossimilares. A via de arquivamento requer mais testes do que os genéricos
de pequenas moléculas, mas menos testes do que o registro de terapêuticas completamente novas.

Em 2003, a EMA introduziu uma via adaptada para biossimilares, denominados medicamentos
biológicos semelhantes. Esse caminho é baseado em uma demonstração completa de comparabilidade
do produto semelhante a um produto aprovado existente. Nos Estados Unidos, a Lei de Proteção do
Paciente e Cuidados Acessíveis de 2010 criou uma via de aprovação abreviada para produtos biológicos
que comprovadamente são biossimilares ou intercambiáveis com um produto biológico de referência
licenciado pela FDA. Uma grande esperança ligada à introdução de biossimilares é a redução de custos
para os pacientes e o sistema de saúde.

Lembrete

Biossimilares são produtos biológicos altamente semelhantes aos


medicamentos inovadores.

Produtos biológicos são aqueles produzidos a partir de um organismo


vivo, como células de bactérias.

5.4 Comercialização

Quando um novo biofármaco é desenvolvido, a empresa normalmente solicita uma patente, que é
uma concessão de direitos exclusivos de fabricação. Esse é o principal meio pelo qual o desenvolvedor
do medicamento pode recuperar o custo de investimento para o desenvolvimento do biofármaco.
As leis de patentes nos Estados Unidos e na Europa diferem um pouco quanto aos requisitos para
uma patente, sendo os requisitos europeus considerados mais difíceis de satisfazer. O número total de
patentes concedidas para biofármacos aumentou significativamente desde a década de 1970. Em 1978,
o total de patentes concedidas era de 30. Esse número subiu para 15.600 em 1995 e, em 2001, havia
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34.527 pedidos de patentes. Em 2012, os Estados Unidos tiveram a maior geração de IP (Propriedade
Intelectual) na indústria biofarmacêutica, gerando 37% do número total de patentes concedidas em
todo o mundo; no entanto, ainda há uma grande margem para crescimento e inovação no setor.
As revisões do sistema de IP atual para garantir maior confiabilidade para investimentos em P&D
(pesquisa e desenvolvimento) também é um tópico proeminente de debate nos Estados Unidos.

Os produtos derivados do sangue e outros produtos biológicos de origem humana, como o


leite materno, têm mercados altamente regulamentados ou de difícil acesso; portanto, os clientes
geralmente enfrentam uma escassez de fornecimento deles. As instituições que abrigam esses
produtos biológicos, designadas como “bancos”, muitas vezes não podem distribuir seus produtos aos
clientes de forma eficaz. Por outro lado, os bancos de células reprodutivas são muito mais difundidos
e disponíveis devido à facilidade com que os espermatozoides e os óvulos podem ser usados para o
tratamento de fertilidade.

5.5 Produção de biofármacos em cultura de células animais (hibridomas)

5.5.1 Cultura celular

A cultura de células envolve processos complexos de isolamento de células de seu ambiente


natural (in vivo) e subsequente crescimento em condição artificial em um ambiente controlado
(in vitro). Na primeira década do século XX, Ross Harrison desenvolveu as técnicas iniciais de cultura
de células in vitro.

Na verdade, no final do século XIX, Wilhelm Roux (1850-1924) demonstrou ser possível manter
células vivas (da placa neural de embriões de galinha) fora do corpo, em tampão salino, por alguns dias.
Ao mesmo tempo, Leo Loeb (1869-1959) conseguiu colocar em prática uma técnica que era conhecida
como “cultura de tecidos no corpo”. Ele colocou fragmentos de pele de embrião de cobaia em ágar e
soro coagulado, depois, os enxertou em animais adultos. Usando esse procedimento, Loeb obteve células
epiteliais em mitose. No entanto, a metodologia não foi considerada uma cultura clássica, pois envolvia
enxerto de tecidos e fluidos de animais vivos.

Em 1910, Montrose Burrows (1884-1947) visitou Harrison em Yale e adaptou o método de cultura
de células em uma gota em suspensão de forma a suprir as necessidades de seus próprios experimentos.
Burrows utilizou o plasma extraído de galinhas como meio de cultura. Este era muito mais fácil de
ser obtido e mais homogêneo em qualidade e, portanto, o processo de preparo acabava sendo mais
confiável. Então, com Alexis Carrel (1873-1944), no Rockefeller Institute for Medical Research, em Nova
York, eles estabeleceram culturas de células de tecidos embrionários e adultos (conjuntivo, periósteo,
cartilagem, osso, medula óssea, pele, rins e glândula tireoide) de muitas espécies (por exemplo, cão,
gato, galinha, porquinho-da-índia, rato) que podiam ser mantidas in vitro, devido ao “meio de cultura
de plasma” – plasma fresco oriundo da mesma fonte dos tecidos cultivados.

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Durante seus estudos, Burrows e Carrel avaliaram outros meios de cultura compostos de plasma
diluído com diferentes soluções de sal e soro. Usando meios complexos, eles foram capazes de
subcultivar e manter culturas por vários meses. Eles trabalharam não apenas com tecidos normais
de mamíferos adultos, mas com tecidos de células tumorais. Essas mudanças distinguiram as culturas de
Burrows e Carrel das de Harrison e lhes deram a ideia de uma cultura contínua. Dessa forma, eles
começaram novas culturas a partir das antigas, sem a necessidade de estabelecer culturas primárias
a partir dos tecidos. Os resultados obtidos por Carrel e Burrows foram publicados no Journal of the
American Medical Association em 1910, e o termo “cultura de tecidos” foi definido pela primeira vez
em 1911 como um meio plasmático inoculado com pequenos fragmentos de tecidos vivos. O termo
introduzido, “cultura de tecidos”, descreveu também o crescimento e a reprodução fora do corpo.

Atualmente, as culturas de células animais e humanas são ferramentas amplamente utilizadas


em muitos ramos da ciência. Diferentes variantes encontram aplicação como modelo de estudo de
doenças, na tecnologia da reprodução assistida, em pesquisa de células-tronco e câncer, na produção
de anticorpos monoclonais e proteínas terapêuticas e na medicina regenerativa.

Normalmente, o processo se inicia com uma cultura primária com o objetivo de atingir a confluência,
ou seja, a formação de uma monocamada de células em uma placa/frasco de cultura suplementado
com os nutrientes e fatores de crescimento necessários. Com a obtenção da confluência, as células são,
então, passadas ou subcultivadas da cultura primária para a secundária e, subsequentemente, para a
terciária, até que, em alguns casos, uma linhagem celular contínua seja estabelecida.

5.5.2 Cultura de células primárias

As células que foram retiradas diretamente de um corpo ou tecido são conhecidas como células
primárias. Elas podem ser obtidas por biópsia, cirurgia ou autópsia e cultivadas por um período finito
como culturas de células primárias.

Suponha que você tenha dado permissão para que uma amostra de suas próprias células fosse
coletada e cultivada em laboratório para fins de pesquisa. Seu médico faz a biópsia de determinado
tecido de seu corpo e estabelece uma cultura via explante. O explante corresponde ao fragmento
de tecido usado para iniciar a cultura de células. As células do explante devem ser separadas da matriz
extracelular, o que pode ser feito de maneira mecânica, macerando-as com auxílio de um almofariz e
pistilo ou por meio químico, digerindo-as com enzimas proteolíticas como a papaína, ou, ainda, pela
combinação das duas abordagens. Após a maceração/digestão, o tecido processado é colocado sobre
uma superfície de crescimento apropriada, coberto com meio de cultivo e incubado sem perturbações
por vários dias. Algumas células se desprendem dos amontoados de tecido, se aderem à superfície da
placa e começam a proliferar, conforme mostrado na figura a seguir.

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Células primárias

Biópsia a partir do rim Seleção Células renais - cultura primária

Figura 18 – Estabelecimento de cultura primária. As células primárias extraídas de um órgão/tecido são utilizadas para
estabelecer uma cultura primária. Um explante, removido, por exemplo, de uma biópsia, é macerado e digerido com enzimas
para liberação das células de sua associação com os componentes da matriz extracelular (MEC). O tecido processado é
colocado em uma placa com meio de cultura para a proliferação celular. Quando o número de células se torna razoável, é
possível utilizar meios específicos para seleção das células desejadas. Na figura, é mostrado como uma cultura primária de
células renais pode ser estabelecida

Fonte: Kengla, Kidiyoor e Murphy (2017, p. 965).

Para acompanhar o desenvolvimento da cultura, utiliza-se um microscópio de luz ou contraste de


fase. As pilhas de tecido que ficam na vizinhança das células em crescimento devem ser gentilmente
removidas para evitar os efeitos adversos da degradação tecidual ou do produto da morte celular.
Quando o número de células se torna razoável, meios seletivos podem ser empregados para prevenir
o crescimento de tipos celulares indesejáveis. Lembre-se que o explante contém uma população
heterogênea de células representativas da área do tecido original.

À medida que a cultura se expande, esta pode ser transferida para novas placas. A passagem de
uma cultura significa que as células foram removidas (por meios químicos ou mecânicos) de um
recipiente de cultura e colocadas em um novo. Quando uma cultura primária é transferida uma vez,
a nova resultante é chamada de secundária, e esta representa a segunda passagem (p2).

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Tripsinização
(passagem das células de uma placa
confluente para uma nova placa)

Cultura secundária
(p2)

Cultura primária
(confluente)
Durante a tripsinização, interações das células
em cultura com a MEC, com a placa e com outras
células são desestabilizadas. Assim, partes delas
podem ser transferidas para outra placa
Crescimento até
atingir confluência 2
Tripsinização

Cultura terciária
(p3)

Cultura secundária
(confluente)
Ciclos de tripsinização finitos
Crescimento até
atingir confluência 5
4

Cultura terniária Depois de múltiplas


(confluente) passagens sequenciais,
a cultura entra em
senescência

Figura 19 – Subcultivo. A cultura primária pode ser subcultivada, por exemplo, quando, em dado momento, as células se
expandirem por toda a área de uma placa (confluência). Para isso, é necessário desestabilizar as interações das células
aderidas com a MEC, com a placa e, ainda, com outras células. Proteases como a tripsina podem ser usadas para esse
fim. A tripsinização permite a desadesão das células, que acabam se desprendendo do substrato e perdendo seu formato
característico em cultura (ficam circulares). Parte das células são replaqueadas, configurando a cultura secundária (ou
cultura de segunda passagem). As interações entre as células e a nova placa começam a ser reestabelecidas à medida
que a célula se adere ao substrato. Tal procedimento pode ser repetido um número limitado de vezes, pois essas células
apresentam capacidade de proliferação em cultura limitada (as células entram em senescência)

Fonte: Williams (2009, p. 5901).

O tempo de vida finito é a principal limitação do uso de células primárias, pois impede que um número
suficiente delas seja alcançado para aplicações práticas, dificultando a funcionalidade de longo prazo

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dessas culturas. Algumas abordagens para resolver esse problema envolvem a imortalização das células
primárias – processo que acontece quando a célula é capaz de se proliferar em um número ilimitado
de vezes. In vivo, esse fenômeno favorece a transformação maligna das células normais, corroborando
o desenvolvimento do câncer. No entanto, nos laboratórios, serve como ferramenta para aumentar o
tempo de vida útil da célula em cultura.

Células imortalizadas, como células cancerosas ou algumas linhagens estabelecidas, muitas


vezes, têm um agente chamado telomerase. A telomerase é uma enzima que adiciona sequências
teloméricas nas extremidades dos cromossomos cada vez que a célula se divide. No entanto,
nem todas as células imortalizadas expressam telomerase. Algumas contornam o problema de
encurtamento dos telômeros por uma via independente da telomerase conhecida como alongamento
alternativo dos telômeros (ALT). Tem sido mostrado que o mecanismo de alongamento dos telômeros
pode ser alternado entre um mediado pela telomerase (telomerase-positivo), e outro, em que a enzima
não esteja presente (telomerase-negativo). No entanto, uma regra geral normalmente é utilizada:
células somáticas, que possuem capacidade de replicação limitada, não apresentam telomerase,
enquanto células imortalizadas têm essas enzimas ativas.

O assunto do encurtamento do telômero foi bastante relevante para o caso da ovelha Dolly.
A despeito de ter sido o primeiro grande animal resultante de uma clonagem bem-sucedida, ela
viveu apenas seis anos. Ao nascimento aparentava ser uma ovelha comum, mas Dolly envelheceu
rapidamente. A razão para isso foi que o DNA da célula somática usada para clonar Dolly já tinha
passado pelo encurtamento dos telômeros. É como se aquele relógio celular já marcasse certo
número de divisões. Nas células reprodutivas, em contrapartida, esse relógio marca zero, e só começa
a contar a partir das replicações do zigoto. Assim, sabemos que as células diferenciadas apontam
horas tardias. Quando o DNA da célula somática usado para clonagem nuclear foi transferido para o
ovócito anucleado, embora o ovócito possa ser considerado uma célula “nova”, o material genético
nele transplantado já havia sofrido algum envelhecimento. Quando Dolly começou a crescer e se
desenvolver e suas células continuaram a se dividir, no entanto, elas continuaram a envelhecer do
ponto em que a célula somática original fora coletada.

5.5.3 Células tumorais

Existem dois fatores principais que determinam se uma célula é considerada somática “normal” ou
tumoral: mortalidade e inibição de contato. Acabamos de discutir que a mortalidade nessas células
consideradas “normais” pode ser induzida quando estas atingem um número máximo de divisão, que
ainda permite estabilidade genômica. As células tumorais, que, por sua vez, apresentam telomerase
ou alguma via alternativa ativada que permite a conservação do tamanho dos telômeros, assumem
potencial de imortalidade. No entanto, é preciso avaliar com cautela essa informação. Por exemplo, as
células-tronco embrionárias, que veremos em mais detalhes posteriormente, podem se proliferar por
períodos mais longos em cultura, porém essa característica não as qualifica como células tumorais.

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Células normais

Telômero

Cromossomo

Apoptose
Células tumorais

Telomerase
alongando a
extremidade do
cromossomo

Figura 20 – Imortalidade replicativa. As células tumorais geralmente exibem um aumento na atividade


da telomerase, o que as ajuda a se tornarem imortais, isto é, exibem a capacidade para se dividir
indefinidamente, desde que os requisitos nutricionais e de concentração de O2 sejam cumpridos. Nas
células “normais”, os telômeros não são restaurados a cada divisão e, por isso, apresentam-se números
finitos de replicações

Fonte: Mouche e Pedeux (s.d., p. 5).

Esclarecido que as células-tronco são distintas das tumorais, vamos entender agora o que seria o
segundo fator, a inibição de contato. Uma célula somática típica, em condições de cultura adequadas,
irá crescer, se dividir, e, eventualmente, migrar até que faça contato com outra célula ou com as bordas
da própria placa de cultura. À medida que mais células ocupam a placa, aumenta a probabilidade de
estas fazerem contato umas com as outras. Eventualmente, a célula ficará circundada por todos os
lados com outras células e/ou com as bordas, formando uma monocamada. Nesse momento, estas
param de migrar e de proliferar, mantendo a organização da monocamada. Se fôssemos avaliar a curva
de crescimento das células em monocamada, a cultura teria atingido a fase de platô, não por falta de
nutrientes, mas por falta de espaço. Circunstâncias semelhantes ocorrem em culturas tridimensionais (3D)
e no próprio corpo, e ajudam a explicar o porquê de normalmente não apresentarmos grandes massas
de tecido que crescem continuamente fora de nós.

Em contrapartida, uma célula tumoral é imortal e não é inibida por contato. Em uma cultura
bidimensional, após formar uma monocamada, e às vezes antes disso, as células tumorais começam
a crescer umas sobre as outras. Elas podem formar uma segunda camada ou crescer verticalmente,
ramificando-se e adquirindo uma estrutura que se parece com um cogumelo, uma bola ou uma
77
Unidade II

corrente. Essas estruturas podem se quebrar e liberar pequenos agregados de células vivas, que podem,
por sua vez, ser realocadas para outra área a fim de estabelecer uma nova colônia de células. Essa é uma
característica bastante comum entre culturas de células tumorais metastáticas.

O crescimento das células normais Várias camadas são formadas após


é inibido pelo contato, o que leva à proliferação de células tumorais em
formação da monocamada cultura. A proliferação não é inibida
pelo contato

Figura 21 – Padrão de crescimento das células tumorais em cultura. As culturas primárias formam
monocamadas nas placas, pois a proliferação celular é inibida pelo contato entre as células. As
culturas de células tumorais podem formar várias camadas. As células podem crescer verticalmente
e formar estruturas semelhantes a cogumelo, bola ou corrente. Células tumorais são capazes de
proliferar indefinidamente, e o crescimento não é inibido pelo contato

Fonte: Mouche e Pedeux (s.d., p. 9).

5.5.4 Linhagens celulares

As linhagens celulares são criadas no laboratório para exibir as principais características de uma
célula tecido-específica e, ao mesmo tempo, serem imortalizadas. As linhas celulares são de grande
valor porque permitem o estudo de células específicas sem a necessidade de retornar ao mesmo doador
repetidamente, conforme atingem a senescência. Elas também funcionam como uma fonte inesgotável
de células que podem ser usadas em vários laboratórios em todo o mundo, com pouca variação
entre culturas.

Elas podem ser produzidas de várias maneiras. Uma cultura primária que foi submetida a diversas
passagens pode espontaneamente passar por mudanças decorrentes desse cultivo. Eventualmente,
uma ou mais das células em cultura passarão por transformação, que consiste na mudança de uma
célula mortal para uma imortal. A transformação de uma célula no corpo pode significar câncer para
o indivíduo, mas a transformação de uma célula em cultura pode refletir o estabelecimento de uma
linhagem celular imortalizada. Como as células de uma cultura primária possuem limitação em relação
ao número de vezes que podem se replicar, é relativamente fácil identificar as células transformadas
conforme o número das passagens aumenta. As células que não se transformaram acabam se tornando
senescentes ou sofrem apoptose, enquanto aquelas transformadas sobrevivem.

Assim, em culturas de células, a transformação pode ocorrer espontaneamente, e o estabelecimento


de populações imortais foram observadas em muitos laboratórios desde o início dos anos 1940 até

78
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

o início dos anos 1960. Células imortais surgem espontaneamente de células normais, e culturas de
células murinas são especialmente propensas a esse processo.

Outra forma de estabelecer uma linhagem celular é por explante de uma biópsia de um câncer.
Nesses casos, as células já foram transformadas in vivo e são apropriadamente chamadas linhagens
celulares tumorais. A primeira linhagem de células humanas é conhecida como HeLa. Ela foi derivada de
um câncer de colo de útero de uma paciente conhecida como Henrietta Lacks.

Uma linhagem celular também pode ser estabelecida por meio da fusão de uma célula primária
com uma célula tumoral. A fusão pode ser realizada, por exemplo, colocando as células em contato
umas com as outras em polietilenoglicol e administrando corrente elétrica para causar perturbação
da membrana (hibridoma). Quando a corrente é interrompida, ocorre a fusão permanente de suas
membranas plasmáticas. Muitas células irão morrer como resultado desse protocolo, mas, em teoria,
é necessário que apenas uma delas sobreviva para se iniciar uma nova linhagem celular. Tal protocolo
tem como objetivo conseguir manter as características específicas de uma célula primária e a
imortalidade das células tumorais. No entanto, a formação do hibridoma leva à formação de células
com quantidade de cromossomos bastante variável, o que pode ter implicações consideráveis em
um estudo. Assim, a maioria das tentativas de fundir duas células não produz uma célula híbrida
viável. Quando uma célula viável é produzida, não carregará consigo todas as propriedades da
célula somática-mãe. Essa é uma grande desvantagem de usar essa estratégia para a criação de
linhagens de células.

O tempo de vida finito é a principal limitação do uso de células primárias. Algumas abordagens para
resolver esse problema envolvem a introdução de genes virais ou de pequenas moléculas para induzir a
proliferação celular e prevenir a senescência. Por exemplo, a linhagem celular HK-2 (human kidney 2),
tão popular quanto a HeLa, é derivada de células renais adultas normais. Foi estabelecida a partir da
cultura de células do túbulo proximal modificadas pela inserção dos genes E6/E7 do papilomavírus
humano (HPV 15). Os produtos proteicos desses genes são capazes de interagir com proteínas que
regulam o ciclo celular, como a p53 e a pRb, que atuam como supressoras de tumores, estimulando a
divisão. A linhagem HK-2 mantém algumas características do fenótipo das células do túbulo proximal,
como a produção de adenilato ciclase em resposta ao hormônio da paratireoide ao mesmo tempo em
que são irresponsivas ao hormônio antidiurético.

Então, as culturas de células podem ser seres transformados por vírus oncogênicos, como HPV e SV40,
mas outros mecanismos, como por radiação e carcinógenos químicos, também são bastante usados.
Para aplicarmos o que aprendemos sobre o limite de Hayflick, este mesmo pesquisador definiu o termo
imortalidade como uma forma de vida capaz de sobrevivência indefinida em condições em que nenhuma
mudança ocorreu na composição molecular de algum começo arbitrário. No quadro a seguir estão
destacadas as primeiras linhagens celulares estabelecidas, bem como os autores responsáveis por elas.

Embora as linhas de células sejam uma ótima ferramenta para pesquisa, os dados obtidos com elas
devem ser considerados com cautela, uma vez que não são capazes de mimetizar muitas das interações
complexas que acontecem dentro de um organismo.

79
Unidade II

Quadro 4 – Linhagens celulares comumente usadas

Nome Espécie e tecido Morfologia Autor e origem


Tecido conjuntivo de
L929 Fibroblasto Earle (1948)
camundongo
HeLa Colo uterino humano Epitelial Gay (1951)
CHO Ovário de hamster chinês Semelhantes a células epiteliais Puck (1957)
MDCK Rim canino Epitelial Madin e Darby (1958)
WI‐38 Pulmão humano Fibroblasto Hayflick (1961)
BHK‐21 Rim de hamster da Síria Fibroblasto Macpherson e Stoker (1961)
Vero Rim de macaco verde africano Epitelial Yasumura e Kawakita (1962)
NIH 3T3 Embrião de camundongo Fibroblasto Todaro e Green (1962)
MCR‐5 Pulmão humano Fibroblasto Jacobs (1966)
SH‐SY5Y Neuroblastoma humano Neuroblasto Biedler (1970)

5.6 Produção de fármacos

Um exemplo de biofármacos são os hibridomas. Hibridomas são linhagens celulares que foram
construídas para produzir determinado anticorpo (imunoglobulina) em quantidades infinitas.

Algum animal, possivelmente camundongos (principalmente da linhagem Balb/c), é inoculado com


determinado antígeno de duas a três vezes com intervalos de 14 dias. Após cerca de 45 dias da primeira
inoculação, ocorre sangria para analisar a mistura de anticorpos monoclonais (monoclonais, pois
foi inoculado apenas um antígeno) presentes no soro, cada um dos anticorpos reconhecendo uma parte
(chamada epítopo) desse antígeno. A diferença em relação ao anticorpo policlonal é que, no último,
seriam diferentes epítopos de uma mistura de diferentes antígenos.

Se o procedimento tiver sucesso, células B produtoras de linfócitos, que são produtores de anticorpos,
são isoladas do baço, colocadas no mesmo local (placa de Petri), onde crescem células de mieloma da
linhagem Sp2/0-Ag14 (ATCC CRL 1581 – desenvolvidos por Köhler e Milstein, em 1976), que são tumores
de linfócitos B ativados, com plasmócitos que crescem continuadamente.

Essas células de mieloma não secretam uma enzima HGPRT (do inglês, Hypoxanthine-guanine
phosphoribosyltransferase) nem anticorpos. Com a adição de polietilenoglicol ao meio de cultura, essas
células se fundem e formam o hibridoma, reproduzindo-se em cultura indefinidamente.

O meio de cultura que se coloca para o crescimento do hibridoma é o meio de cultura HAT (contém
hipoxantina, aminopterina e timidina – substâncias usadas para a fabricação de DNA pelas células).
Como as células de mieloma não têm a enzima HGPRT, não poderão fazer seu DNA e morrem nesse
meio. Os linfócitos B normais não conseguem sobreviver em meio de cultura além de uma a duas
semanas e morrem, mas, caso se unam, as células híbridas seguem imortais, pois apresentam o gene
para HGPRT do linfócito B. Após essa etapa, haverá a seleção dos hibridomas, pois cada um irá produzir
um tipo de anticorpo contra determinado epítopo do antígeno, sendo escolhido aquele que possui

80
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

melhor especificidade e avidez (força de ligação entre o antígeno e o anticorpo), podendo ser separados
por ensaios de radioimunoensaio (RIA) ou ensaio enzimático de imunoabsorção (ELISA).

6 NANOTECNOLOGIA: FUNDAMENTOS E APLICAÇÕES

O físico norte-americano Richard Feynman, em 1959, apresentou uma palestra com o título “There is
plenty of room down there – an invitation for a new field of Physics” (Há mais espaços lá embaixo – um
convite para um novo campo da física), onde usou a palavra “nanotecnologia” pela primeira vez e, por
isso, é chamado o pai da nanotecnologia. Nessa palestra, explicou que, com a ajuda da engenharia na
escala atômica, seria possível manipular os átomos para construir novos materiais. Feynman recebeu o
Prêmio Nobel de Física em 1965, pelos seus estudos sobre eletrodinâmica quântica.

O termo “nanotecnologia” ficou mais popular com a apresentação de Eric Dexler (1986) no livro Engines
of creation – the new era of nanotechnology (Máquinas de criação – a nova era da nanotecnologia).
A nanociência se relaciona com o estudo, em escala nanométrica, do comportamento de átomos,
moléculas e estruturas. Junto a ela, há a nanotecnologia (N&N = nanociência e nanotecnologia),
que se baseia no uso da nanociência para a produção de sistemas que trabalham com objetos entre
1 e 100 nanômetros, englobando física (instrumentação e física quântica), química (estrutura atômica
dos materiais), ciências da computação e nanossistemas) e biologia (processos biológicos e fármacos).

Escala
nanométrica

DNA

Anticorpo Célula
humana
Ouro
coloidal

1Å 5 nm 20 nm 1 µm

1 nm 10 nm 100 nm 10 µm

Molécula
de água
Proteína Vírus

Bactéria

Figura 22 – Esquema mostrando as substâncias e seus tamanhos, todas na escala nanométrica

Fonte: Apolinário et al. (2020, p. 213).

81
Unidade II

Saiba mais

Em 1989, o físico norte-americano Donald Eigler e seus colaboradores


chocaram o mundo quando apresentaram o logotipo da empresa de
computadores IBM (International Business Machines) sobre uma superfície
de níquel utilizando 35 átomos de xenônio. A letra I da sigla era formada por
9 átomos e possuía aproximadamente 5 nm, mostrando o desenvolvimento
da nova tecnologia de ponta: a nanotecnologia.

Para saber mais, leia MARQUES, E. F. Da nanociência à nanotecnologia.


Revista de Ciência Elementar, v. 2, n. 3, p. 58, 2014. Disponível em:
https://cutt.ly/0PSO41C. Acesso em: 4 jan. 2022.
Nanotecnologia é assim chamada por ter como base o uso do nanômetro, unidade de medida
que equivale a um bilionésimo do metro, ou seja, 1 nanômetro (nm) equivale a 0,000000001 m. Para
trabalhar nessa escala tão pequena, são necessários equipamentos e pessoas altamente treinadas
para esse grau de precisão. Com seu uso, aprimora-se cada vez mais a habilidade de manipular átomos,
criando materiais inovadores, como o grafeno.

Observação

O grafeno é a camada extremamente fina de grafite produzida por


nanotecnologia, 200 vezes mais resistente do que o aço, porém mais leve,
extremamente fino, transparente, elástico, com alta condutividade térmica
e elétrica que será usado no campo do agronegócio (impermeabilização e
vedação de telhados e silos de armazenagem de grãos), na indústria
têxtil (roupas inteligentes, conforto e isolamento térmico, resistência
e impermeabilidade), no meio ambiente (desintoxicação de água), em
eletrônicos (potencializar baterias de celular, energia solar e carros) e
alimentos (papel antibactérias).
O Brasil, até o momento, tem uma das maiores reservas do mineral
grafite e a maior fábrica de produção de grafeno em escala industrial da
América do Sul, UCSGRAPHENE, localizada em Caxias do Sul (RS), com
capacidade de produzir até cinco mil quilos com alta qualidade por ano.

A nanociência envolve a nanotecnologia que pode trabalhar com nanorobôs (processadores


extremamente pequenos) guiados para células mais profundas, que provavelmente não seriam atingidas
por substâncias presentes em uma injeção endovenosa e muito menos por medicamentos via oral,
otimizando a função do medicamento com menores efeitos colaterais para o paciente. É o que acontece
com os nanorobôs de DNA, que podem chegar às células doentes na medula óssea (leucemia) e com
sinais específicos podem induzi-las à autodestruição, sem que as sadias sejam afetadas.
82
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Saiba mais

No filme de ficção Bloodshot, Vin Diesel possui nanorobôs regenerativos


por todo o corpo, tornando-o praticamente imortal quando leva tiros ou
cai de prédios.

BLOODSHOT. Direção: Dave Wilson. Estados Unidos: Sony Pictures,


2020. 110 min.

O tratamento do câncer tem sido um dos alvos mais estudados pela nanotecnologia, pois acredita-se
que mudará o conceito de quimioterapia, tornando-a menos invasiva e evitando que o paciente fique
tão debilitado. Um exemplo são as nanostars, nano partículas com formato de estrela produzidas em
ouro que são direcionadas às células cancerígenas.

A nanofarmacologia ou nanotecnologia farmacêutica tem como alvo o uso da nanotecnologia


para melhoria do aproveitamento dos medicamentos pelo corpo humano. A drug delivery (entrega
de medicamentos) é um dos pontos mais importantes da nanofarmacologia, pois, além de tornar o
medicamento sítio específico, o transporta pelo corpo, mantendo a estabilidade e os níveis plasmáticos
constantes, previne a degradação do corpo e aumenta sua eficácia terapêutica. Além disso, a possibilidade
de formular a liberação controlada leva à diminuição da dose terapêutica e da toxicidade, por diminuir
a concentração máxima plasmática.

Os tipos de nanoestruturas mais utilizadas pela indústria farmacêutica são apresentados na figura
a seguir.

Lipossoma Nanocápsulas
Micelas
Nanopartículas NLS
metálicas CLN
1943 1978 1993 1994 1999

1857 1965 1990 1993 1996 2002

Dendrímero Nanoesfera
Microemulsão Polimerossoma
Nanoemulsão

Figura 23 – Principais tipos de nanocarreadores organizados por ordem cronológica de desenvolvimento.


NLS = nanocarreador lipídico sólido; CLN = carreador lipídico nanoestruturado

Fonte: Apolinário et al. (2020, p. 215).

Esta tecnologia pode ser usada na desobstrução de coágulos sanguíneos no cérebro de forma menos
invasiva, na reconstrução de tecidos humanos, a fim de minimizar a rejeição pelo organismo, e na
83
Unidade II

área de diagnóstico ultrassensível, com a ajuda de novos equipamentos que prometem a detecção
de metabólitos ou vírus específicos em questão de segundos, resultando em rapidez e eficácia dos
procedimentos, além de aprimorar a qualidade de exames de imagem e – como já explicado – de
tratamentos menos invasivos e mais precisos.
Quanto aos equipamentos que usam nanopartículas (NPs) como matéria-prima de fabricação,
podemos citar seringas, bisturis, produtos de linha têxtil e equipamentos hospitalares que usam óxido
de zinco e prata (nanoprata) em sua produção. Além de vários benefícios, já foi demonstrado que o
crescimento de contaminantes não ocorre, sendo por isso usadas em processos de descontaminação de
ambientes hospitalares, de materiais médicos e cirúrgicos.
Como as nanopartículas insolúveis podem se locomover sem problemas entre as células e se
acumular no cérebro ou no interior de outros órgãos, como os pulmões e o fígado, não importando
a forma farmacêutica (caso sejam inaladas como aerossóis ou ingeridas como cápsulas), a área da
nanotoxicologia estuda os riscos dos efeitos nocivos ao meio ambiente e à saúde, tentando resolver esse
impasse da decorrência da exposição aguda ou crônica de forma segura.

Nanopartículas internalizadas Cérebro (doenças neurológicas:


nas células Parkinson, Alzheimer)

Mitocôndria Nanopartículas inaladas


Núcleo
Citoplasma
Pulmão (asma, bronquite,
Membrana enfisema, câncer)
Vesículas
lipídicas
Sistema (aterosclerose, vasoconstrição,
circulatório trombos, hipertensão)
Ingestão de
nanopartículas

Coração (arritmia, doença cardíaca,


morte)
Sistema
gastrointestinal
(doença de Crohn,
câncer de cólon) (doença de etiologia
Outros orgãos desconhecida em rins, fígado)

Implante ortopédico e Sistema (podoconiose,


desgaste por partículas linfático sarcoma de Kaposi)

(doença autoimune,
dermatite, urticária, vasculite) (doença autoimune,
Pele dermatite)

Figura 24 – Possíveis locais de penetração das nanopartículas,


órgãos afetados e possíveis doenças associadas

Fonte: Buzea, Blandino e Robbie (2007, p. 223).

84
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

No primeiro workshop internacional em nanomedicina organizado pela EMA, em 2010, o FDA


discutiu a garantia e a qualidade desses nanoprodutos, no que diz respeito à sua potência e segurança,
enquanto a EMA discutiu riscos ligados à estabilidade desses produtos.

No Brasil, em 2014, foi instituído o Comitê Interno de Nanotecnologia (CIN), ligado à anvisa, que
coordena análises e avaliação de risco, normas, segurança do produto e processos sobre a área da
nanotecnologia, bem como realiza políticas regulatórias nesse sentido.

Com enfoque nas indústrias automotiva e aeronáutica, as nanopartículas são materiais mais leves
que podem ser usados na fabricação de pneus mais leves, recicláveis e de longa duração, tintas que não
riscam e são autolimpantes, plásticos não inflamáveis e mais baratos, e novos tipos de baterias de longa
duração e fáceis de recarregar.

Biossensores chamados “línguas e narizes eletrônicos”, usados em controle de qualidade de


alimentos e cosmética, são empregados na área da nanocosmecêutica ou nanotecnologia cosmética
e dérmica, cuja tecnologia supera os cosméticos convencionais, principalmente na manufatura de
protetores solares, cremes antirrugas, xampus e condicionadores, bem como de desodorantes com
nanocomponentes que têm maior penetração e espalhamento em pele ou cabelos.

6.1 Aplicação da nanotecnologia no desenvolvimento de vacinas

Milhares de anos atrás, percebeu-se que indivíduos que sobreviviam da infecção pela varíola eram
imunes a infecções subsequentes. A partir dessas observações, na China, no século X, originou-se a
prática de inocular indivíduos com material infeccioso das pústulas de varíola de pessoas infectadas,
técnica que ficou conhecida como variolação. Esse material infeccioso era injetado na pele ou introduzido
pela rota nasal. A infecção que se desenvolvia era geralmente mais branda, mesmo assim, a prática
não era livre de riscos. Algumas vezes, infecções fatais ocorriam, e como a varíola era contagiosa, as
infecções induzidas pela variolação poderiam levar a epidemias. Mesmo assim, a prática da variolação
para prevenção da varíola se disseminou para outras regiões, como Índia, África e Europa.

Como visto anteriormente, apesar de a variolação ter sido praticada por séculos, o médico inglês
Edward Jenner (1749-1823) é geralmente creditado pelo desenvolvimento do processo moderno de
vacinação. Jenner observou que o gado leiteiro desenvolvia uma doença semelhante à varíola, mas
muita mais branda. E, ainda, as camponesas que faziam a ordenha desse gado não desenvolviam a
forma severa da varíola. A partir disso, Jenner hipotetizou que a exposição a um patógeno menos
virulento poderia proporcionar proteção imune contra uma forma mais virulenta, sendo, portanto, uma
alternativa mais segura do que a variolação. Isso levou Jenner a testar sua hipótese pela obtenção de
amostras de uma lesão ativa de uma camponesa, que foi infectada pela varíola bovina, e injetar esse
material em um menino de 8 anos (nessa época, ainda não se discutiam aspectos éticos de pesquisa).
O menino desenvolveu uma infecção branda, com febre baixa, um desconforto na axila e perda de
apetite. Quando o menino foi infectado posteriormente com material infeccioso da varíola humana,
não desenvolveu a doença. Essa nova estratégia foi denominada vacinação, um nome derivado do uso
da varíola bovina (da palavra vacca, em latim).

85
Unidade II

O sucesso da vacinação de Jenner contra a varíola levou outros cientistas a desenvolverem vacinas
para outras doenças. Talvez o mais notável tenha sido Louis Pasteur, que desenvolveu vacinas contra
raiva, cólera e antraz. Nos séculos seguintes, diversas outras vacinas foram desenvolvidas contra doenças
causadas por vírus (caxumba, hepatite, sarampo, poliomielite e febre amarela) e bactérias (difteria,
pneumonia pneumocócica e tétano).

Além disso, é importante enfatizar que muitas vacinas podem prevenir certos cânceres. Por exemplo,
as vacinas contra o papilomavírus humano (HPV) protegem contra carcinoma cervical e a vacina contra
hepatite B tem um enorme impacto na redução do câncer de fígado induzido por esse patógeno.
A primeira vacina contra o HPV se tornou disponível em 2006, e atualmente diversos países a incluem em
sua rotina de vacinações, pelo menos para as meninas. O HPV é praticamente o único agente etiológico
do carcinoma cervical. Obviamente, ao se reduzir o número de infecções por HPV através da vacinação,
também haverá impacto sobre o número de mulheres que desenvolvem esse câncer.

Diferentemente de remédios, vacinas são usadas com a proposta de prevenir doenças. As vacinas são
ótimas ferramentas porque não previnem apenas infecções nas pessoas vacinadas, mas as complicações
que poderiam ser resultantes da doença. Além disso, se uma pessoa não contrai uma doença, não
transmitirá a outros indivíduos.

Dessa forma, as vacinas são capazes de eliminar a transmissão da doença em uma população que
desenvolveu imunidade de rebanho. Para algumas doenças, como a varíola, a imunidade de rebanho é
atingida quando pelo menos 90% a 95% da população é vacinada e a transmissão da doença é parada
em toda a população. Essa porcentagem pode variar dependendo da patogenicidade e da infectividade
de determinado agente etiológico.

Saiba mais

Com o propósito de conhecer com mais detalhes a imunidade de


rebanho, acesse:

INSTITUTO BUTANTAN. Imunidade de rebanho. São Paulo, [s.d.].


Disponível em: https://cutt.ly/1ULXy9k. Acesso em: 9 dez. 2021.

6.1.1 O que é vacina?

Vacina é uma formulação farmacêutica administrada para prevenir doenças causadas por
patógenos infecciosos. Vacinas que tratam doenças também existem, e falaremos um pouco sobre
elas posteriormente.

O objetivo da administração de uma vacina é mimetizar uma infecção, gerando resposta do sistema
imune adaptativo e formação de memória, sem, entretanto, causar doença. Dessa forma, se o agente

86
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

patogênico infectar um indivíduo que foi previamente vacinado, haverá uma resposta rápida e potente
de seu sistema imunológico, eliminando o patógeno antes que ele cause a doença.

Para mimetizar artificialmente a resposta imunológica induzida por uma infecção natural, as vacinas
precisam ativar tanto a imunidade inata quanto a imunidade adaptativa. As respostas inatas iniciarão
o processo, bem como influenciarão a natureza da resposta imune adaptativa induzida. A indução de
memória imunológica específica ao patógeno-alvo é essencial para a eficácia da vacina.

Estudos recentes indicam que as respostas imunes inatas induzidas pela vacinação ou pela infecção
primária possuem características semelhantes à memória, que pode exercer imunidade protetiva contra
infecções subsequentes. Isso ocorre via imunidade treinada, mecanismo que diferente da imunidade de
memória e da imunidade adaptativa.

Uma vacina eficaz é aquela que induz uma resposta imune sem causar doença. Dessa forma, as
vacinas agem induzindo efetores imunes. Os melhores efetores imunes conhecidos são os anticorpos
produzidos pelos linfócitos B.

E por que os anticorpos são tão importantes?

A maioria dos vírus e bactérias percorre a corrente sanguínea antes de atingir seus
tecidos‑alvo. Na circulação sanguínea, eles se replicam, causando viremia ou bacteremia. Nesse
estágio, patógenos extracelulares podem ser neutralizados pelos anticorpos circulantes. Outros
patógenos se replicam na mucosa e podem ser neutralizados pela presença de anticorpos locais.
Esses anticorpos de mucosas podem ser IgA, localmente produzido, ou IgG, que se difundiu a
partir do soro. A resposta imunológica contra o vírus influenza é um exemplo desse mecanismo
de proteção.

Em geral, anticorpos se ligam diretamente ao patógeno. No caso dos vírus, a replicação é


prevenida pelo bloqueio de sua entrada nas células-alvo. Anticorpos podem interferir principalmente
com a ligação do vírion (a forma infecciosa do vírus) ao receptor, na célula. No caso da bactéria, a
ligação do anticorpo pode bloquear diretamente a colonização. Patógenos que exercem seus efeitos
através da produção de toxinas podem ser neutralizados por anticorpos antitoxina. Vários outros
mecanismos aumentam o potencial dos fagócitos para ingestão e destruição de bactérias. Bactérias
extracelulares podem sofrer opsonização ou aglutinação, o que facilita sua eliminação. A ligação de
anticorpos aos patógenos também pode ativar o sistema complemento, o que levará à eliminação
dos patógenos pelos fagócitos. Os anticorpos também podem se ligar a células infectadas. As células
infectadas geralmente expressam proteínas em sua superfície. Os anticorpos circulantes podem se
ligar a essas proteínas. As células NK reconhecem e matam essas células recobertas por anticorpos.
Um resumo sobre o papel dos anticorpos pode ser encontrado na figura a seguir.

87
Unidade II

Neutralização Opsonização

Recrutamento de proteínas do complemento por anticorpos


Vírus Anticorpo
Proteínas do Complexos antígeno
complemento e anticorpo ativam a
via clássica do sistema
Vírus inativado complemento
Bactéria

Bactéria
Célula infectada
por vírus
Fagócitos reconhecem
anticorpos na superfície
Anticorpos se ligam e de bactérias
inativam vírus e toxinas
Fagócito

Figura 25 – Resumo do papel dos anticorpos na resposta imune. Os anticorpos atuam na


neutralização de patógenos e em sua opsonização. A opsonização favorece a fagocitose dos
patógenos pelos fagócitos e é capaz de ativar a via clássica do sistema complemento

6.1.2 Tipos de imunização

A imunização pode ser derivada de meios ativos ou passivos, que, por sua vez, podem ser de fontes
naturais ou artificiais. Fontes naturais são, por exemplo, exposição ao ambiente, humanos e animais. Por
outro lado, fontes artificiais são decorrentes de intervenções médicas.

A imunização passiva ocorre quando há transferência de anticorpos pré-formados para um indivíduo


não imunizado. Esse indivíduo desenvolveria, então, uma imunidade temporária a um organismo
específico ou toxina em decorrência da presença desses anticorpos pré-formados. Uma vez que
esses anticorpos tenham sido destruídos, o indivíduo não terá mais imunidade específica contra esse
microrganismo ou toxina.

A imunização passiva pode ocorrer tanto natural quanto artificialmente. Exemplos de imunização
passiva natural incluem a passagem de anticorpos maternos através da placenta para o feto ou de
anticorpos para o bebê através do leite materno.

Exemplos de imunização passiva artificial incluem a administração de soro antiofídico para neutralizar
a toxina do veneno da cobra. A imunização passiva, portanto, não gera memória imunológica. Falaremos
adiante sobre o processo de produção de soros.

A imunização ativa também pode ocorrer tanto natural quanto artificialmente. Um exemplo
excelente de imunização ativa natural é a exposição ao vírus influenza, após a qual o corpo inicia um
processo de desenvolvimento de uma imunidade de longo prazo ao vírus. Exemplos de imunização ativa
artificial incluem as vacinas.

88
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

6.1.3 Tipos de vacina

Atualmente, existe uma variedade de tipos de vacina em uso ou em desenvolvimento para prevenção
de doenças infecciosas. Sob condições ideais, as vacinas devem estimular o sistema imune inato e os dois
braços do sistema imune adaptativo. Entretanto, cada tipo de vacina possui vantagens e desvantagens
que podem afetar a estimulação do sistema imune e, dessa forma, limitar sua utilização.

Primeiramente, vacinas de patógenos vivos atenuados, como as do sarampo, da caxumba e da


catapora, contêm versões enfraquecidas dos agentes patogênicos originais. Portanto, elas produzem
uma resposta celular forte e tipicamente geram imunidade de longo prazo com uma ou duas
doses da vacina.

Em geral, é menos difícil criar vacinas vivas atenuadas a partir de vírus do que de bactérias, pois vírus
possuem menos genes e, portanto, é mais fácil controlar as características virais. Tipos mais recentes de
vacinas vivas atenuadas são aquelas nas quais as proteínas da membrana externa foram alteradas para
se ajustarem às cepas circulantes do patógeno. Elas são chamadas vacinas vivas remontadas. Entre os
exemplos, temos as vacinas orais, atualmente usadas contra o rotavírus.

Entretanto, uma vez que essas vacinas contêm microrganismos vivos, a refrigeração é necessária
para evitar reversão de virulência, que é uma possibilidade. Dessa forma, vacinas vivas não podem ser
administradas a indivíduos que possuem o sistema imune enfraquecido.

As vacinas inativadas, como as que combatem o vírus influenza, são produzidas pela destruição do
agente patogênico com químicos, calor ou radiação. Essa inativação dos microrganismos faz com que a
vacina seja mais estável. Tais vacinas não requerem refrigeração e podem ser liofilizadas para transporte.
Entretanto, elas produzem respostas imunes mais fracas e, portanto, a administração de doses de reforço
é necessária para manter a imunidade.

89
Unidade II

Recepção e controle
dos ovos embrionados

Inoculação e incubação

Colheita do líquido alantoico

Clarificação e
concentração do vírus

Purificação

Fragmentação e inativação viral

Filtração esterilizante

Suspensão monovalente

Formulação e envase

Vacina influenza trivalente

Figura 26 – Esquematização do processo de produção de vacinas de vírus inativados (por exemplo, a vacina contra
influenza). Os vírus vivos são inoculados em ovos embrionados de galinha. Os ovos são colocados em incubadora até que
a carga viral atinja o desejado. O líquido alantoico é coletado e purificado. Após a purificação, os vírus são inativados
com formaldeído e sofrem fragmentação. São obtidas suspensões para uma única variante do vírus, e essas suspensões
monovalentes são, então, misturadas para a obtenção da vacina influenza trivalente

Conforme sabemos, as vacinas de vírus vivos e inativados podem ser produzidas por dois processos
principais: cultura de células e inoculação em ovos embrionados.

Saiba mais

A vacina contra a gripe é feita de vírus inativados, mas ainda há quem


diga que ela causa a doença. Como uma vacina feita de vírus inativados
poderia fazer isso? Na verdade, ela não o faz! O que acontece é que,
dependendo da época em que a pessoa se vacina, ela pode já ter sido
infectada pelo vírus da gripe antes de se vacinar, e a vacina acaba por não
ter tempo hábil de fazer efeito. Veja mais informações em:

XAVIER, J. Entenda a vacina da gripe. IFF/Fiocruz, [s.d.]. Disponível em:


https://cutt.ly/kULRALW. Acesso em: 9 dez. 2021.

90
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

As vacinas de subunidades, exemplificadas pela vacina de hepatite B, incluem apenas epítopos


(partes específicas de antígenos) que estimulam o sistema imune. Uma vez que elas usam poucos
antígenos específicos, isso reduz a possibilidade de reações adversas. Por outro lado, tal especificidade
aumenta a dificuldade em se determinar quais antígenos deveriam ser incluídos na vacina.

As vacinas conjugadas, como a vacina contra Haemophilus influenzae tipo B, são um tipo
especial de vacinas de subunidades. O polissacarídeo da parede celular da bactéria encapsulada é
acoplado a uma proteína carreadora, que é mais facilmente reconhecida pelo sistema imune quando
comparada ao polissacarídeo sozinho. Todas as vacinas que têm por objetivo induzir proteção contra
bactérias encapsuladas, como pneumococos, meningococos e Haemophilus influenzae tipo B, foram
desenvolvidas como vacinas conjugadas.

As vacinas de toxoides, exemplificadas pelas vacinas contra a difteria e o tétano, são produzidas pela
inativação das toxinas bacterianas com formalina. Esses toxoides estimulam uma resposta imune contra
as toxinas bacterianas.

Saiba mais

O tétano é uma doença que pode ser fatal, mas é prevenível. Conheça
melhor sobre as vacinas contra a doença em:

FERNANDES, G. C.; AFFONSO, K. C.; CASTIÑEIRAS, T. M. P. P. Vacinas


contra o tétano. Centro de Informação em Saúde para Viajantes (Cives),
2006. Disponível em: https://cutt.ly/qULR4d9. Acesso em: 9 dez. 2021.

Já as vacinas de DNA nu (em inglês, naked DNA) ainda estão em fases experimentais de
desenvolvimento. Elas usam DNA de microrganismos específicos para estimular a imunidade. Esse
DNA seria administrado por injeção e as células o captariam, utilizando-o para a síntese de proteínas
(antígeno). O antígeno produzido seria, então, exposto na superfície dessas células, estimulando o sistema
imune. Essas vacinas produziriam uma resposta potente de anticorpos ao antígeno livre e uma resposta
celular potente ao antígeno apresentado na superfície das células. Além disso, elas são consideradas
relativamente fáceis e baratas de criar e produzir.

As vacinas de vetores recombinantes são experimentais e usam vírus atenuados para introduzir
DNA microbiano nas células do organismo. Essas vacinas virais mimetizariam uma infecção natural,
estimulando o sistema imune.

Bactérias atenuadas também poderiam atuar como vetores de DNA. Os antígenos do microrganismo
patogênico poderiam, então, ser exibidos na superfície de um microrganismo não patogênico,
mimetizando o patógeno e estimulando o sistema imune. Vacinas recombinantes que utilizam vírus ou
bactérias para HIV, raiva e sarampo estão em estágios experimentais.

91
Unidade II

Além disso, existem estudos que avaliam a possibilidade de melhorar adjuvantes de vacinas, atuando
sobre o sistema imune inato. Esses adjuvantes se enquadram em duas classes, sistemas de entrega (como
micropartículas catiônicas) ou potenciadores imunes (como citocinas). Os sistemas de entrega seriam
possivelmente usados para concentrar e apresentar antígenos em padrões repetidos para ajudar na
localização dos antígenos, enquanto os potenciadores imunes poderiam ser usados para ativar o sistema
imune inato diretamente.

6.1.4 Desenvolvimento de vacinas

Durante o desenvolvimento das vacinas, a escolha do antígeno correto é a etapa mais crucial.
A interação entre o antígeno da vacina e as células do sistema imune é o componente mais importante
da resposta imune. Geralmente, esses antígenos são encontrados na superfície do patógeno, como é o
caso da glicoproteína hemaglutinina do vírus influenza. Esse antígeno de superfície do vírus da gripe
interage com as células imunes humanas, sendo a invasão da célula hospedeira mediada por ele. Após
a vacinação, os anticorpos recobrem o antígeno hemaglutinina do vírus, resultando em sua eliminação
antes que ele invada as células e cause a doença.

Um exemplo interessante para entendermos a importância da escolha do antígeno apropriado


é o vírus da caxumba. Ele possui sete proteínas, das quais três estão em sua superfície externa:
hemaglutinina, proteína de fusão e proteína hidrofóbica pequena. Atualmente, a proteína hidrofóbica
pequena é usada para caracterizar as diferentes linhagens de vírus da caxumba quando há uma
epidemia e é importante em estudos epidemiológicos para rastrear a origem. Entretanto, o corpo
humano não produz anticorpos contra a proteína hidrofóbica pequena, mesmo esta estando na
superfície externa do vírus. Dessa forma, se novas vacinas contra caxumba fossem desenvolvidas, não
haveria por que incluí-las entre os antígenos. A proteína de fusão e a hemaglutinina são importantes
para a entrada no hospedeiro e de vital importância para produzir uma vacina que seja capaz de
neutralizar o vírus da caxumba.

Atualmente, uma análise ainda mais detalhada da estrutura do antígeno tem se tornado cada vez
mais importante. Isso se deve ao fato de um único antígeno conter diferentes epítopos. Estes possuem
propriedades e funções distintas na reação imunológica. Dessa forma, os antígenos são investigados por
análise molecular para a identificação dos epítopos que terão função no desenvolvimento de proteção
contra a doença.

Uma vez que a informação sobre o antígeno correto foi estabelecida, o desenvolvimento da nova
vacina pode continuar. Durante o desenvolvimento de uma vacina, a rota de entrega também precisa
ser estabelecida. Por quê?

A rota de administração tem impacto direto sobre a resposta imune, além de influenciar a
aceitabilidade da vacina ou o fato de poder ser usada em grandes populações.

É claro que todos gostariam de receber as vacinas de forma oral ou intranasal. Entretanto, mesmo
que as vacinas orais de patógenos vivos atenuados funcionem bem para doenças infecciosas do
trato gastrointestinal (TGI), como a poliomielite, a febre tifoide e o rotavírus, essa via não pode ser
92
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

generalizada para todas as vacinas. A rota mais comum de imunização para vacinas, atualmente, é a
intramuscular. Em bebês, as vacinas são dadas na parte anterior da coxa. A partir de um ano de idade,
elas são administradas no músculo deltoide, mas podem ser aplicadas na parte anterolateral da coxa em
adultos. As vacinas vivas são, geralmente, administradas de forma subcutânea no braço, porém podem
ser aplicadas de modo intramuscular. A injeção intradérmica não é muito utilizada, principalmente pela
dificuldade de aplicá-la exatamente abaixo da epiderme. Outra desvantagem é que esse tipo de injeção
promove mais reações locais, como dor, vermelhidão e inchaço, o que impacta sua aceitabilidade. Além
disso, as vacinas que usam adjuvantes não podem ser assim administradas.

As novas vacinas de DNA em desenvolvimento são geralmente administradas de forma intramuscular,


mas também requerem eletroporação para promover a entrada do DNA nas células.

Mas como saber se as vacinas realmente funcionam?

Essa robustez é avaliada por ensaios clínicos que comparam grupos vacinados e não vacinados, e a
porcentagem da redução da incidência da doença é calculada no grupo vacinado.

Durante a concepção da vacina, as etapas iniciais para pesquisa pré-clínica são definidas. Isso envolve
muito trabalho de laboratório e estudos em modelos animais para avaliar a imunogenicidade, bem como
avaliação de aspectos relacionados à segurança antes que sejam realizados estudos com seres humanos.
Os estudos em humanos são divididos em quatro fases:

• Fase I: tem por objetivo avaliar a segurança e, normalmente, envolve apenas poucos voluntários
saudáveis (entre 10 e 15). Caso os resultados obtidos na fase I mostrem que a vacina é segura,
parte-se para a fase II.

• Fase II: nela são avaliadas segurança e eficácia, e um número maior de participantes é necessário.
Se os resultados continuam a mostrar que a vacina é segura e, além disso, eficaz, dá-se início à
fase III, da qual um número ainda maior de pacientes participa.

• Fase III: uma vez que os resultados nesta fase mostrem que a intervenção tem eficácia e é segura
naquela amostra, o produto é registrado e a vacina passa a ser distribuída à população, dando
início à fase IV.

• Fase IV: nesta etapa, é possível avaliar se a vacina, de fato, funciona na população.

Recentemente, vacinas contra três doenças infecciosas se tornaram disponíveis. Elas foram
desenvolvidas contra infecções capsulares meningocócicas do grupo B, dengue e malária. O meningococo
é uma bactéria encapsulada com cinco diferentes tipos capsulares que causam doença em humanos,
denominadas A, B, C, W35 e Y. A doença meningocócica é um problema global, de epidemiologia
altamente variável e influenciada pela transformação natural e política de imunização. Dessa forma,
a doença meningocócica é temida devido à sua rápida progressão entre a ocorrência dos primeiros
sintomas e a doença severa, que pode ocorrer em menos de 24 horas. A taxa de mortalidade gira em

93
Unidade II

torno de 10% a 15%. Da mesma forma que outras doenças, o desenvolvimento da vacina é complicado
se a patogênese da doença não foi completamente compreendida.

As duas vacinas meningocócicas tipo B foram desenvolvidas por vacinologia reversa. Em


2000, o primeiro sequenciamento completo do genoma do meningococo foi descrito e usado
para identificação de uma grande quantidade de antígenos candidatos para uso em vacinas. Com
base nessa biblioteca e por meio da tecnologia de proteína recombinante, foram desenvolvidas as
vacinas quadrivalente e bivalente pelas empresas Bexsero e Trumenba, respectivamente. Ambas
as vacinas podem ser usadas em adolescentes, enquanto a quadrivalente também pode ser usada
para proteger crianças.

A dengue é uma doença causada por quatro diferentes tipos de vírus que ocorrem principalmente
em regiões tropicais e subtropicais. O vírus é transmitido pela picada do mosquito Aedes aegypti.
Anualmente, por volta de 1 a 2 milhões de pessoas são hospitalizadas com sintomas severos, e
0,1% a 5% morrem. O desenvolvimento de uma vacina contra a dengue tem se mostrado difícil,
tanto pelo conhecimento incompleto sobre a patogênese da doença quanto pelo fato de a vacina
precisar ser desenvolvida contra os quatro tipos de vírus que cocirculam na mesma área. Ainda,
a possível interferência entre as linhagens quando combinadas em uma mesma vacina complica
seu desenvolvimento. Atualmente, existe uma vacina disponível, a Dengvaxia, que é uma vacina
viva quimérica tetravalente. Esta foi desenvolvida por meio da tecnologia do DNA recombinante,
realizando-se a substituição dos genes estruturais do envelope e da pré-membrana do vírus da
febre amarela atenuado com aqueles das quatro linhagens da dengue. Após a introdução da vacina,
mostrou-se que em vários países onde as pessoas sem anticorpos circulantes contra a dengue foram
vacinadas tiveram uma forma mais severa da doença em comparação aos indivíduos que já tinham
anticorpos circulantes. A partir disso, foi necessário mudar a recomendação para vacinar apenas
pessoas que já tinham sido expostas a pelo menos uma linhagem do vírus da dengue confirmado
por um teste diagnóstico ou por histórico médico. Mesmo assim, isso ajudará no desenvolvimento de
outras vacinas contra dengue.

Por sua vez, a malária é uma doença também transmitida por picadas de mosquito, o Anopheles.
A malária humana é causada por cinco espécies de protozoário plasmodium: P. falciparum, P. vivax,
P. ovale, P. malariae e P. knowlesi. O ciclo de vida e a interação entre parasita e hospedeiro para cada
espécie determinam a severidade e a patogênese da doença. P. falciparum possui a maior taxa de
letalidade, especialmente em crianças, e a capacidade de o P. vivax permanecer dormente nas células
do fígado resulta em recaídas clínicas e contribui para a grande distribuição geográfica. A malária é
uma doença muito difícil de combater, uma vez que todas as suas espécies possuem um ciclo de vida
complexo, no qual o parasita precisa residir tanto em humanos quanto na fêmea do Anopheles, em
diferentes fases do ciclo.

Recentemente, uma estratégia direcionada a diferentes aspectos como controle ambiental,


inseticidas, mosquiteiros e quimioterapia tem permitido a alguns países a redução da incidência da
malária. Dessa forma, vacinas seguras e efetivas contra a doença ainda são necessárias. Atualmente,
uma vacina, chamada Mosquirix, está disponível contra a malária causada pelo P. falciparum. Ela é
baseada na proteína circunsporozoíta do protozoário, a principal proteína da superfície da forma
94
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

esporozoíta. A Mosquirix consiste em uma vacina quimérica de partículas semelhantes a vírus, construída
fundida à superfície do vírus da hepatite B. A vacina entrará em um grande estudo de fase IV em Gana,
Quênia e Malaui.

Há ainda muito trabalho a ser feito com relação ao desenvolvimento de vacinas, principalmente
quando consideramos os surtos de doenças infecciosas com possível alto impacto sobre a morbidade e
a mortalidade. Como exemplos, podemos citar a ocorrência de novos patógenos, como SARS e MERS,
ambos causados pelo coronavírus.

Saiba mais

Um grupo de pesquisa da Unifesp desenvolveu um estudo que utiliza


vacinas de células dendríticas como estratégia terapêutica para HIV e teve
resultados muito animadores. É possível conhecer melhor a respeito em:

COCOLO, A. C. Muito próximo da cura. Entreteses, n. 10, p. 51-53,


jul. 2018. Disponível em: https://cutt.ly/PULDHDs. Acesso em: 9 dez. 2021.

6.1.5 Aplicação da nanotecnologia no desenvolvimento de novas vacinas

Virus like particles (VLPs – partículas semelhantes a vírus) são nanopartículas que mimetizam um
vírus cujo capsídeo proteico guarda em seu interior material genético de algum vírus patogênico,
podendo ser usado como vacina com epítopos reconhecidos pelo sistema imune.

A primeira vacina construída dessa forma foi contra a hepatite B, em 1986, que apresenta HBsAg –
antígeno de superfície que estimula a produção de anticorpos pelas células CD4+ e de células TCD8+; a
segunda vacina foi contra o HPV.

Nanopartículas de peptídeos automontadas (SAPNs; em inglês, self-assembling protein nanoparticles)


são diferentes das VLPs por serem construídas em meio aquoso e formadas por duas bobinas helicoidais
unidas por um peptídeo, e já estão sendo testadas para vacinas contra malária e ebola.

O polietilenoglicol (PEG) é um polímero derivado do petróleo obtido a partir do etilenoglicol, muito


usado na nanotecnologia, pois a reação de PEGuilação das nanopartículas impede que sejam adsorvidas
por opsoninas. Essa característica permite que não sejam detectadas pelo sistema imunológico no início
do tratamento, aumentando o índice terapêutico de nanobiofármacos, mas, em compensação, algumas
pessoas podem produzir o anticorpo anti-PEG, e aumentar a quantidade de IgG e IgM, levando a reações
de hipersensibilidade, como anafilaxia.

95
Unidade II

Saiba mais

Até o momento, as vacinas contra covid-19 produzidas pelas indústrias


farmacêuticas Pfizer e Moderna utilizam o processo de nanopartículas
lipídicas (LNP) à base de polietilenoglicol (PEG) – PEGuilação – e carregam a
fita de RNAm da proteína da espícula (spike protein) do SARS-CoV-2. Quando
ocorre a inserção do RNAm no citoplasma das células dos hospedeiros, ele é
traduzido pelos ribossomos, sem entrar no núcleo nem modificar seu DNA.

Para mais informações, assista a este vídeo sobre vacinas:

THERE are four types of COVID-19 vaccines: here’s how they work. 2020.
1 vídeo (4 min). Publicado pelo canal Gavi, the Vaccine Alliance. Disponível
em: https://cutt.ly/YIr489N. Acesso em: 11 jan. 2022.

Sugere-se que pessoas que já tiveram processos alérgicos com outras vacinas que usam PEG possam
ter sido sensibilizadas por outros compostos que usam essa substância – como algumas pastas de dente,
cosméticos, xampus e amaciantes – e desenvolveram anticorpos que desencadeiam a reação anafilática
contra o polietilenoglicol, produzindo anticorpos anti-PEG, relacionados a reações adversas do tipo
alérgica nessas pessoas. Nos Estados Unidos, a FDA recomenda que apenas as pessoas que já tiveram
reações alérgicas graves a vacinas – ou aos ingredientes delas – devem evitar a imunização que utilizam
PEG, pois uma vez sensibilizadas, as reações subsequentes serão cada vez mais fortes e rápidas.

Para se ter ideia da gravidade das reações, durante o estudo clínico das vacinas da Pfizer e da
Moderna para covid-19, foram excluídas da fase III pessoas com histórico de alergias aos componentes
das vacinas, inclusive PEG, que tem como função principal minimizar interações com as opsoninas
(anticorpos, proteínas do complemento e lectina), aumentando o tempo de circulação no sangue.

7 TECNOLOGIAS DE PREPARAÇÃO DE SISTEMAS ORAIS DE LIBERAÇÃO MODIFICADA

As formas farmacêuticas orais sólidas convencionais, como comprimidos e cápsulas, isto é, de


liberação imediata (IR) apresentam problemas graves devido aos efeitos adversos que podem causar e à
falta de adesão aos pacientes. A fim de minimizar os efeitos colaterais, aumentar a eficácia e tornar os
produtos farmacêuticos mais toleráveis aos pacientes, formas farmacêuticas orais modificadas para a
liberação controlada começaram a ser amplamente desenvolvidas. As diferentes empresas farmacêuticas
investem em desenvolver vários novos medicamentos com estratégias de liberação modificada (MR).
Os produtos de MR são administrados por via oral e utilizam as técnicas mais recentes para modificar
a liberação das drogas. Os diferentes tipos de produtos de MR podem apresentar modos únicos de
liberação de drogas e perfis farmacocinéticos específicos.

Os tipos de medicamento de MR incluem liberação retardada (por exemplo, com revestimento


entérico), liberação estendida (ER), liberação direcionada e cápsulas de desintegração oral (ODT).
O termo “medicamento de liberação modificada” se refere aos produtos que alteram o momento
e/ou a taxa de liberação da substância medicamentosa. A liberação modificada é uma formulação em
96
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

que o medicamento altera características de tempo e/ou localização, escolhidas para cumprir objetivos
terapêuticos ou de conveniência não oferecidos pela dosagem convencional – formas tais como soluções,
pomadas ou de dosagem de dissolução imediata.

Vários tipos de medicamentos orais de liberação modificada foram desenvolvidos:

• Medicamentos de liberação prolongada: visam reduzir significativamente a frequência e a


dosagem para, pelo menos, metade das formas de dosagem convencionais. São exemplificados
por medicamentos de liberação controlada, liberação sustentada e ação prolongada.

• Medicamentos de liberação retardada: forma de dosagem que libera uma parte ou porções do
medicamento de uma só vez, exceto repentinamente, após a administração. Uma porção inicial
pode ser liberada imediatamente após a administração. Os medicamentos de liberação retardada
são mais bem exemplificados por formas de dosagem com revestimento entérico.

• Medicamentos de liberação direcionada: forma de dosagem que se destina a liberar a droga


em locais-alvo. Esses medicamentos podem ter as características do tipo de liberação imediata
ou estendida.

• Comprimidos de desintegração oral (ODT): projetados para se desintegrarem prontamente


na saliva após a administração oral, podendo ser ingeridos sem adição de água. A droga é dispersa
em saliva e engolida com pouca ou nenhuma água.

O termo “medicamento de liberação controlada” é usado para descrever vários tipos de forma de
dosagem oral de taxa de liberação prolongada, incluindo liberação sustentada, ação sustentada, ação
prolongada, ação longa, liberação lenta e administração de medicamento programada. “Liberação
retardada” é um termo mais antigo para um medicamento de liberação lenta. Muitos desses termos
adotados para medicamentos de liberação modificada foram introduzidos por empresas farmacêuticas
a fim de indicar um design especial para um medicamento de liberação prolongada.

Observação

As formas farmacêuticas de liberação prolongada caracterizam-se pela


liberação gradual do fármaco e pela manutenção de sua concentração
plasmática em níveis terapêuticos, durante um período prolongado.
Podem ser desenvolvidas como sistemas monolíticos ou multiparticulados,
empregando-se tecnologias como matrizes poliméricas, sistemas
reservatórios ou bombas osmóticas.

7.1 Projeto racional de sistemas de liberação modificada

A maior parte dos sistemas de liberação de drogas é baseada em polímeros que podem ou não
conter alguma tecnologia de liberação de drogas. A capacidade de um medicamento conseguir um
97
Unidade II

desempenho desejável em sua liberação é altamente dependente de vários importantes fatores, como a
dose, as propriedades físico-químicas, biofarmacêuticas, farmacocinéticas e farmacodinâmicas da droga,
bem como as propriedades adequadas de seleção de abordagem de formulação e projeto de formulação.

Cada sistema de liberação possui propriedades inerentes que requerem considerações específicas
para o medicamento e o sistema de administração. Assim, o desenvolvimento bem-sucedido da
forma de dosagem é, de fato, ditado pelas propriedades de um composto no contexto de restrições
fisiológicas/biológicas, em vez da plataforma de tecnologia. Essa conclusão é apoiada pelo fato de que
quase todos os produtos MR com a composição expirada de patentes de matéria foram incapazes de
manter exclusividade de mercado baseada exclusivamente na tecnologia de entrega.

São numerosos os exemplos em que o desempenho dos produtos de marca foi correspondido por suas
contrapartes genéricas com base em tecnologias de liberação controlada semelhantes ou diferentes. Os
principais são: Procardia XL, Cardizem CD, Concerta, Adalat CC, Wellbutrin XL, Ditropan XL, Glucotrol XL,
Glucophage XR, Asacol, e Toprol-XL.

Portanto, no primeiro estágio de concepção de uma liberação MR, o sistema deve conduzir a uma
avaliação de viabilidade técnica que integre uma justificativa clínica definida com as características do
medicamento. O segundo estágio é selecionar uma tecnologia MR apropriada com base nos aspectos
da forma de dosagem desejada e outras considerações de desenvolvimento. Mais especificamente, um
processo de design racional deve incluir os seguintes passos:

• Identificação da necessidade clínica e fixação de desempenho do produto-alvo in vivo.

• Estudo experimental a ser conduzido e analisado para estimar a praticabilidade da absorção


intestinal, os desafios e os riscos associados com entrega MR com base em:

— caracterização físico-química e biofarmacêutica, dose, absorção regional, disposição in vivo e


farmacodinâmica da molécula do fármaco;

— cálculo da taxa teórica de consumo de drogas e sua faixa necessária para produzir a
concentração plasmática desejada – perfil de tempo com base em parâmetros de disposição
in vivo e certas suposições;

— determinação das propriedades físico-químicas e de absorção características do medicamento


em cada segmento do TGI necessárias para a entrada de droga dentro do tempo de permanência
das formas de dosagem.

• Projetar e caracterizar as formulações, selecionando a apropriada tecnologia MR, a forma de


dosagem associada, o processo de fabricação e os métodos de teste in vitro.

A administração oral é a via mais popular devido à facilidade de ingestão, ausência de dor,
versatilidade e, o mais importante, aderência do paciente. Além disso, sistemas de liberação oral sólida
não requerem condições estéreis e são, portanto, mais baratos para manufaturar. Novas tecnologias para
98
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

administração oral estão disponíveis para tentar resolver alguns problemas de aspectos físico‑químico e
farmacocinético, melhorando a adesão do paciente.

7.2 Formas de dosagem oral de dispersão rápida

A nova tecnologia de formas de dosagem oral de dispersão rápida é conhecida como comprimidos
de dissolução rápida, derretimento rápido e desintegração rápida. No entanto, a função e o conceito de
todas essas formas de dosagem são semelhantes. Por definição, uma forma de dosagem sólida que
se dissolve ou desintegra rapidamente na cavidade oral, resultando em solução ou suspensão sem
a necessidade de água para a administração, é conhecida como uma forma de dosagem oral de
dispersão rápida.

A dificuldade em engolir (disfasia) é comum entre todas as faixas etárias, e, especialmente em


idosos, a administração das formas farmacêuticas convencionais torna-se mais árdua. Estima-se que
35% da população em geral e um adicional de 30%-40% dos pacientes idosos institucionalizados e
18%-22% de todas as pessoas em instituições de cuidados de longo prazo sofrem de disfasia. Esse
distúrbio está associado a muitas condições médicas, incluindo acidente vascular cerebral, Parkinson,
Aids, tireoidectomia, terapia de radiação de cabeça e pescoço e outros distúrbios neurológicos, incluindo
paralisia cerebral. Um estudo mostrou que 26% de 1.576 pacientes tiveram dificuldade em engolir
comprimidos. A reclamação mais comum era o tamanho, seguida por superfície, forma e sabor.
O problema de engolir comprimidos foi mais evidente em pacientes geriátricos e pediátricos, bem como
naqueles que podem não ter acesso imediato à água. As vantagens das formas de dosagem de dispersão
rápida orais incluem:

• administração a pacientes que não conseguem engolir, como idosos, vítimas de derrame e
pacientes acamados, pacientes que não devem engolir, como os afetados por insuficiência renal,
e aqueles que se recusam a engolir, como pacientes pediátricos, geriátricos e psiquiátricos;

• intervenção de terapia medicamentosa rápida;

• absorção mais rápida do medicamento;

• novas oportunidades de negócios, diferenciação de produtos, extensão de linha e gestão do ciclo


de vida, exclusividade da promoção do produto e extensão da vida da patente.

7.3 Liberação entérica modificada

Os produtos de liberação entérica são desenvolvidos para prevenir a liberação do medicamento no


estômago, enquanto os sistemas de liberação entérica são projetados para permitir que fração da dose da
droga seja liberada no estômago e o restante ocorra rapidamente após a passagem da forma de dosagem
para o intestino delgado. Esse padrão de liberação é particularmente adequado para drogas que têm
absorção específica do local na parte superior do TGI ou onde a administração de altas doses de drogas é
necessária. Tal padrão de liberação pode ser alcançado por meio de formadores de poros hidrofílicos em
revestimentos entéricos dependentes de pH.
99
Unidade II

7.4 Liberação pulsátil

O padrão de liberação pulsátil da droga é projetado para fornecer uma explosão da droga em um
ou mais intervalos predeterminados após um período de latência predeterminado. A liberação pulsátil
pode evitar a degradação da droga no estômago ou no metabolismo de primeira passagem, permitir
a administração de dois medicamentos diferentes ao mesmo tempo (liberados em locais diversos do
trato GI) ou ser adotado para distribuição cronoterapêutica de drogas. Como exemplo, a liberação
pulsátil pode ser alcançada através do revestimento de multipartículas com sistemas de revestimento
de membrana de barreira e/ou dependentes de pH, seguida por mistura das multipartículas para obter
os perfis de liberação desejados. Em geral, tais sistemas controlados por tempo podem ser classificados
como sistema de unidade única (comprimidos e cápsulas) ou unidades múltiplas (pellets).

7.5 Técnicas de formação de floss

A dosagem FLASHDOSE® (Fuisz Technologies) utiliza a tecnologia Shearform™ em associação com


a Ceform Tecnologia TI™ para mascarar o sabor amargo do medicamento. A tecnologia Shearform™ é
empregada na preparação de uma matriz conhecida como “fio dental”, que é feito de uma combinação
de excipientes, sozinho ou em combinação com drogas. O “fio dental” é um material fibroso semelhante
às fibras de algodão doce, comumente feitas de sacarídeos, como sacarose, dextrose, lactose e frutose.
No entanto, outros polissacarídeos, como polimaltodextrinas e polidextrose, podem ser transformados
em fibras em temperaturas 30%-40% mais baixas do que aqueles usados para a produção de fibra de
sacarose. Essa modificação permite a incorporação segura de medicamentos termolábeis na formulação.

7.6 Tecnologia de impressão tridimensional (3D) na preparação de sistemas


de liberação oral

A nova tecnologia de impressão 3D foi desenvolvida para resolver vários problemas associados a
mecanismos de liberação de drogas e taxas de liberação. A taxa de liberação de droga tende a diminuir
em um sistema de matriz em função da natureza e do método de preparação da forma de dosagem.
Vários métodos são empregados para abordar esses problemas por meio de configurações geométricas,
incluindo cilíndricas, método da haste e sistemas de rosca cilíndrica. O método 3D fornece várias
estratégias, além de possuir vantagens como a entrega de medicamentos, a liberação de droga em
gradiente de difusão padronizada por difusão de microestrutura técnica de barreira, e a liberação cíclica
de drogas e outros tipos de liberação de drogas.

A técnica é, muitas vezes, referida como fabricação sólida de forma livre, fabricação automatizada
por computador ou fabricação em camadas. O método 3D utiliza tecnologia de impressão a jato de tinta
para criar um objeto sólido, imprimindo um aglutinante em áreas selecionadas de camadas depositadas
sequencialmente de pó.

Cada peça é construída sobre uma plataforma localizada em um suporte de pistão PIN. O leito de
pó inicialmente espalhado sobre a plataforma por um rolo é impresso seletivamente com a cabeça
de impressão a jato de tinta por um aglutinante para fundir os pós nas áreas desejadas. O pistão
desce para acomodar camadas de impressão adicionais. O processo é repetido até que o design esteja
100
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

completo. As instruções para cada camada são derivadas de representação de desenho auxiliado por
computador (CAD) do componente. O instrumento 3D consiste em uma cabeça de dispersão de pó
acionada reciprocamente ao longo do comprimento do leito de pó. Uma cabeça de impressão a jato
de tinta imprime o aglutinante no leito de pó, produzindo seletivamente jatos de aglutinante líquido
(material para ligar o material em pó em regiões específicas). Esse processo é repetido para construir o
dispositivo camada por camada.

7.7 Tecnologia de deposição eletrostática para revestimento farmacêutico em pó

Quanto à fabricação de formas farmacêuticas sólidas, embora tenha havido muito desenvolvimento
em matérias-primas e processos, o princípio fundamental permanece igual. Novas tecnologias surgiram
envolvendo processos de fabricação a seco para o revestimento em pó de ingredientes farmacêuticos
ativos em várias superfícies por deposição direta eletrostática. Essa abordagem revolucionária elimina
os procedimentos tradicionais de fabricação de pós de mistura, granulação, secagem, lubrificação,
compressão e revestimento no desenvolvimento de produtos farmacêuticos e processos de fabricação.
O processo tem menor dependência do operador, é contínuo e consideravelmente mais rápido.

7.8 Vantagens e desvantagens da liberação modificada

A administração por via oral pode gerar algumas preocupações quanto à absorção. O tempo
de absorção se baseia no tempo total de permanência no TGI. Além disso, certas drogas podem ser
absorvidas apenas em locais específicos dentro do TGI e, portanto, o tempo total de permanência pode
não representar seu tempo correto para absorção. O desenvolvimento de drogas com sistema de liberação
gastrorretentiva é limitado por alguns fatores fisiológicos, como pH gástrico e motilidade gástrica, e seu
desempenho também depende da complacência do paciente e do uso correto. Por exemplo, o ciclo
de motilidade interdigestiva e as taxas de esvaziamento gástrico são interrompidos pela alimentação.
Geralmente, as taxas de esvaziamento gástrico para as formas de dosagem tomadas antes das refeições
são muito mais rápidas do que as tomadas após refeições. Se a absorção da droga ocorrer mais no
estômago e menos no intestino, a retenção gástrica prolongada pode melhorar a biodisponibilidade, a
eficácia, a terapia direcionada e diminuir os efeitos colaterais dentro do cólon, bem como a dose pode
ser reduzida. Drogas que tendem à degradação e possuem pouca solubilidade em soluções alcalinas
poderão alcançar seu benefício terapêutico se formuladas como gastrorretentivas.

Para formulações com alta dosagem, o sistema de liberação entérica modificada aumenta o tempo
de retenção gástrica e pode liberar a droga próximo do momento da próxima administração, resultando
em potencial overdose de pacientes. Para evitar isso, foi desenvolvida a tecnologia multiparticulada na
forma de unidades múltiplas (cápsulas ou comprimidos), que permite a entrega de duas ou mais unidades
de grânulos revestidos, permitindo o ajuste da variabilidade farmacocinética e a melhora na liberação.
Com base na natureza de tais formulações, cada partícula ou grânulo pode possuir diferentes taxas de
liberação. Formulações multiparticuladas para liberação no intestino têm uma grande vantagem sobre a
unidade única convencional, uma vez que são menos suscetíveis de serem afetadas pelos alimentos. Eles
também mostram absorção consistente e capacidade de distribuição uniforme da droga para regiões
específicas do TGI.

101
Unidade II

No entanto, há incerteza sobre a localização específica em que o revestimento pode se dissolver


no TGI. Além disso, um revestimento entérico pode se dissolver de forma imprevisível em diferentes
pacientes com variados estados de doença, levando à liberação prematura do medicamento dentro do
intestino delgado. Alternativamente, algum revestimento entérico pode não se dissolver devido a certos
estados de doença que levam a implicações de eficácia.

Outro sistema MR, o push-pull, consiste em um comprimido de duas camadas: uma camada pull com
a droga misturada e uma camada push. O sistema contém um orifício que é perfurado por meio de um
laser para fornecer liberação de droga. A liberação da droga desse sistema é geralmente independente
de fatores fisiológicos dentro do TGI, como pH, força iônica e agitação. Várias desvantagens dos sistemas
push-pull foram documentadas, incluindo tempos de atraso curtos e taxas de entrega lentas, resultando
em entregas direcionadas abaixo do ideal.

Muitas empresas farmacêuticas têm estudado sobre a otimização de tais sistemas de liberação.
Desenvolvimentos de formulação recentes têm, portanto, como objetivo resolver os problemas de
absorção e melhorar a composição de revestimentos de liberação retardada, bem como a taxa de liberação
da droga no cólon. Uma das maneiras é modificar a composição do revestimento entérico externo via
incorporação de um composto hidrofóbico que poderia impedir o influxo de fluidos, particularmente
durante o trânsito da forma farmacêutica pelo estômago. As fórmulas baseadas em azopolímeros são
relativamente estáveis no TGI superior; no entanto, a degradação de tais polímeros por enterobactérias é
lenta. Além disso, essas formulações não são recomendadas para uso em longo prazo por causa de suas
limitações no que diz respeito à toxicidade.

Lembrete

Os comprimidos de liberação controlada são formas farmacêuticas


que não liberam imediatamente todo o fármaco, fazendo-o de forma
gradual e contínua em diferentes tempos e locais. Representam uma das
fronteiras da ciência, a qual envolve diferentes aspectos multidisciplinares
e pode contribuir muito para o avanço da saúde humana. Os sistemas de
liberação controlada oferecem inúmeras vantagens e desvantagens quando
comparados a outros de dosagem convencional.

7.9 Nanotecnologia aplicada aos cosméticos inteligentes

A nanotecnologia é considerada a tecnologia mais eminente do século XXI e um grande avanço na


indústria cosmética. O termo “nanotecnologia” é a combinação de duas palavras: tecnologia e nano,
numérico grego que significa “anão”. Assim, a nanotecnologia é considerada a ciência e a tecnologia
utilizada para desenvolver ou manipular as partículas na faixa de tamanho de 1 nm a 100 nm. Desde
1959, a nanotecnologia surgiu em diferentes campos, como engenharia, física, química, biologia e
ciência, e já faz quase 40 anos desde que ela entrou no campo dos cosméticos, em produtos para a
saúde e preparações dérmicas. Durante o ano de 4000 a.C., o uso da nanotecnologia foi registrado por
egípcios, gregos e romanos, com o conceito de preparação de tintura para cabelos.
102
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Membro fundador da sociedade norte-americana de químicos cosméticos, Raymond Reed, cunhou


o termo “cosméticos” no ano de 1961. Os cosméticos podem ser definidos como os produtos que
amplificam a aparência, intensificam a limpeza e promovem a beleza da pele. Conforme relatado, o
uso de cosméticos foi atribuído aos egípcios por volta de 4.000 a.C. e, posteriormente, gregos, romanos,
chineses, japoneses e norte-americanos começaram a usá-los. No final do século XIX, o uso de cosméticos
era feito secretamente pelas mulheres e no século XX, eles já eram produzidos sem disfarce. No século
XXI, os cosméticos estão sendo amplamente utilizados, e formulações cosméticas inovadoras estão
sendo desenvolvidas pela incorporação das tecnologias mais recentes.

Os cosmecêuticos são produtos cosméticos que incorporam ingredientes biologicamente ativos com
benefícios terapêuticos na superfície aplicada utilizados como cosméticos, pois pretendem melhorar
a aparência. Os cosmecêuticos são um abismo entre os produtos farmacêuticos e os produtos de
higiene pessoal, têm eficácia terapêutica mensurável na pele, pois os medicamentos e as formulações
se diversificaram em pele, corpo e cabelo, e são usados para o tratamento de várias condições, como
danos nos cabelos, rugas, fotoenvelhecimento, ressecamento da pele, manchas escuras, tez irregular,
hiperpigmentação, e assim por diante.

Os cosméticos são considerados o segmento de crescimento mais rápido da indústria de cuidados


pessoais, cujo mercado está crescendo enormemente. Apesar dos significativos benefícios das
nanopartículas, pouco se sabe sobre os efeitos de curto e longo prazos na saúde, no meio ambiente e
nos organismos. As preocupações em relação à segurança foram levantadas devido à toxicidade relatada
e a possíveis perigos dos nanomateriais.

A seguir, revisaremos as diversas classes de nanocarreadores, como lipossomas, niossomas,


nanopartículas de lipídios sólidos, carreadores de lipídios nanoestruturados, nanoemulsão, e assim por
diante, que estão sendo usados para a entrega de nanocosmecêuticos. Além disso, serão apresentados
os principais produtos comercializados e os aspectos positivos e negativos dos nanocosméticos.

Os nanocosméticos possuem diversas vantagens, entre elas:

• Proporcionam a liberação controlada de substâncias ativas, controlando a liberação do fármaco


dos transportadores por vários fatores, incluindo interação física ou química entre os componentes,
composição do fármaco, polímero e aditivos, proporção e método de preparação.

• São utilizados em preparações capilares, como no tratamento da queda e para evitar que os fios
fiquem grisalhos. Exemplos: Identik Masque Floral Repair, xampu para reciclagem de cabelos e
xampu antiqueda Nirvel.

• Podem fazer com que as fragrâncias durem mais e tornar as formulações de cuidados com a pele
mais eficazes, aumentando a eficácia dos filtros solares e melhorando a proteção contra os raios
ultravioleta. Exemplos: Allure Parfum e Allure Eau Parfum spray, da Chanel.

103
Unidade II

• Pelo fato de as partículas terem tamanho muito pequeno, a área de superfície é aumentada, o
que permite o transporte dos ingredientes ativos para a pele. A oclusão proporciona aumento da
penetração e da hidratação da pele.

• Os cosmecêuticos têm alta eficiência de aprisionamento e boas propriedades sensoriais, além de


serem mais estáveis do que os cosméticos convencionais.

A maioria das nanopartículas é adequada para a administração de drogas lipofílicas e hidrofílicas.


Os nanomateriais são amplamente utilizados na preparação de cremes antirrugas, cremes hidratantes,
cremes clareadores da pele, xampus reparadores, condicionadores e soros para os cabelos.

Como regra da natureza, cada coisa neste universo possui aspectos positivos e negativos. Algumas
das desvantagens associadas aos nanocosméticos são as seguintes:

• Devido à produção de um grande número de espécies de oxigênio, nanopartículas podem causar


estresse de oxidação e inflamações, bem como danos ao DNA, a proteínas e a membranas.

• Alguns nanomateriais ultrafinos, como nanotubos de carbono, fulerenos baseados em carbono,


TiO2, nanopartículas de cobre e nanopartículas de prata podem ser tóxicos para tecidos e
células humanos.

• Foi demonstrado que o dióxido de titânio encontrado nos filtros solares causa danos ao DNA e ao
RNA, bem como produção de gorduras dentro das células.

• Nenhum escrutínio rigoroso foi imposto pelas agências reguladoras para a aprovação e a
regulamentação dos nanocosméticos.

• Os nanocosméticos também podem ser prejudiciais ao meio ambiente.

• Nenhum ensaio clínico foi necessário para a aprovação dos nanocosmecêuticos, levantando uma
preocupação de toxicidade após o uso.

Para a liberação de nanocosméticos, é empregada uma tecnologia de transporte que oferece uma
abordagem inteligente para a entrega de ingredientes ativos, conforme veremos a seguir.

7.9.1 Lipossomas

Quando se coloca fosfolipídios em presença de água, eles se agrupam por suas características
anfipáticas (ou seja, substância com parte polar e parte apolar), formando grupamentos circulares
chamados micelas, como mostrado na figura a seguir. Caso sejam colocadas outras substâncias junto
aos fosfolipídios, por exemplo, fármacos, podem ser encapsulados. Essas estruturas são os primeiros
nanossistemas carreadores, chamados lipossomas, que podem ser administrados por vias intravenosa,
intraperitoneal e subcutânea. Algumas das vantagens do uso dessas nanopartículas são:

104
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

• quando livre, o medicamento que está em seu interior é tóxico; quando no interior da partícula,
o conjunto é biocompatível com as células;

• alguns fármacos são pouco solúveis;

• a liberação é lenta, semelhante à infusão contínua; e

• a penetração nos lipossomas é boa e protege o fármaco contra a degradação.

A Água B Óleo

Água
Óleo Água Óleo

Água Óleo
Óleo

Figura 27 – Estrutura das micelas em meio aquoso e em meio lipídico

Adaptada de: Houshmand et al. (2020, p. 5).

As nanoemulsões (NEs) geram os lipossomas que são usados nas indústrias cosmética, farmacêutica
e de alimentos. Veiculam ativos hidrofílicos e lipofílicos por meio de solubilização ou retenção na
nanopartícula, conjugação ou adsorção, aumentando a biodisponibilidade de fármacos e podendo
vetorizar (indicar o caminho a seguir) para a liberação nas células-alvo, por exemplo, revestindo a
superfície dos lipossomas com antígenos ou anticorpos correspondentes ao local, dirigindo os fármacos
seletivamente a determinada célula.

Entre alguns medicamentos lipossômicos aprovados pela agência sanitária norte-americana FDA,
podemos citar como via de administração:

• Intravenosa (IV): AmBisome® – lipossoma que contém anfotericina B, eficaz para leishmaniose
visceral; DaunoXome® – com daunorrubicina para sarcoma de Kaposi; Definity® – com perfluten,
um agente de contraste; e Marqibo® – com sulfato de vincristina, para leucemia linfoide aguda.

• Intratraqueal: Survanta® – contém beractanto, para síndrome do desconforto respiratório; e


Curosurf® – com alfaporactante, para síndrome do desconforto respiratório (SDR).

105
Unidade II

• Parenteral: DepoDur® – com sulfato de morfina, para tratamento de dor crônica.

• Dermocosméticos: Liporeductyl® – ativo anticelulite; Vanistryl® – ativo antiestrias; e Vecorexin®


– ativo para os cabelos.

Lipossomo convencional Droga Lipossomo para terapia e diagnóstico


hidrofóbica Ligante de
direcionamento
Lipídio positivamente
carregado
Lipídio negativamente
carregado
Droga Substância para
hidrofílica imagem

PEG
PEG
Molécula pequena
Carboidrato
Peptídeo
Anticorpo
Proteína
Lipossomo recoberto com PEG Lipossomo direcionado por ligante

Figura 28 – Diferentes lipossomos e suas aplicações. Observe a bicamada lipídica ao redor do interior
hidrofílico. A adição de polietilenoglicol (PEG) é uma estratégia utilizada para aumentar a meia-vida
do lipossomo na corrente sanguínea

Adaptada de: Houshmand et al. (2020, p. 5).

Os lipossomas são mais amplamente usados para as preparações cosméticas. Eles são estruturas
vesiculares com um núcleo aquoso envolvidas por uma bicamada lipídica hidrofóbica. O principal
componente da bicamada lipídica do lipossoma são os fosfolipídios, que são ingredientes GRAS
(geralmente reconhecidos como seguros), minimizando, portanto, o risco de efeitos adversos. Para
proteger a droga da degradação metabólica, o lipossoma encapsula a droga e libera ingredientes ativos
de maneira controlada. Os lipossomas são adequados para a distribuição de compostos hidrofóbicos e
hidrofílicos. O tamanho deles varia de 20 nm a vários micrômetros, e podem ter estrutura multilamelar
ou unilamelar.

Antioxidantes como carotenoides, CoQ10 e licopeno, além de componentes ativos, como vitaminas
A, E e K, têm sido incorporados aos lipossomas, a fim de amplificar suas estabilidades física e química
quando dispersos em água.

A fosfatidilcolina é o componente-chave dos lipossomas que tem sido usado em várias formulações
de cuidados com a pele, como cremes hidratantes, e produtos para os cabelos, como xampus e
condicionadores, devido às suas propriedades amaciantes e condicionantes. Por causa de sua
106
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

natureza biodegradável, não tóxica e biocompatível, os lipossomas são usados em uma variedade de
cosmecêuticos, pois encapsulam a porção ativa. Os fosfolipídios vegetais são amplamente usados para
aplicações tópicas em cosméticos e dermatologia devido ao seu alto teor de ácidos graxos essenciais
esterificados. Para aplicações tópicas em cosméticos e dermatologia, os fosfolipídios vegetais estão
sendo amplamente utilizados por apresentarem alto teor de ácidos graxos essenciais esterificados. Após
a aplicação do ácido linoleico, em um curto período a função de barreira da pele aumenta e a perda de
água diminui. Fosfolipídios vegetais e fosfolipídios de soja são usados por causa de sua capacidade
de formar lipossomas e de sua atividade de superfície. O transporte do ácido linoleico para a pele é
feito por esses fosfolipídios. Em estudo clínico, foi comprovado que os lipossomas flexíveis auxiliam na
redução das rugas e apresentam efeitos como diminuição das eflorescências no tratamento da acne e
aumento da maciez da pele.

Os lipossomas estão sendo desenvolvidos para a entrega de fragrâncias, vegetais e vitaminas de


formulações anidras, como antitranspirantes, sprays corporais, desodorantes e batons. Eles também
estão sendo usados em cremes anti-idade, cremes hidratantes profundos, protetores solares, cremes de
beleza e tratamentos para queda de cabelo.

7.9.2 Niossomas

Os niossomas são definidos como vesículas com estrutura em bicamada constituídas por
automontagem de tensoativos não iônicos hidratados, com ou sem incorporação de colesterol ou
outros lipídios.

Os niossomas podem ser vesículas multilamelares ou unilamelares nas quais uma solução aquosa de
soluto e componentes lipofílicos é totalmente envolvida por uma membrana que é formada quando as
macromoléculas do surfactante são organizadas em bicamadas. O tamanho varia de 100 nm a 2 nm de
diâmetro. O tamanho de pequenas vesículas unilamelares, vesículas multilamelares e grandes vesículas
unilamelares varia de 0,025 µm a 0,05 µm, ≥ 0,05 µm e 0,10 µm, respectivamente. Os principais
componentes dos niossomas incluem colesterol e surfactantes não iônicos como spans, tweens, brijs,
alquilamidas, éster de sorbitano, éster de coroa, éter alquílico de polioxietileno e surfactantes ligados a
esteroides, que são usados para sua preparação.

Os niossomas são adequados para a distribuição de compostos hidrofóbicos e hidrofílicos. Como


um novo sistema de entrega de drogas, eles podem ser usados como um veículo para drogas pouco
absorvíveis. Fornecem encapsulamento ao medicamento, devido ao qual o medicamento permanece na
circulação sistêmica por período prolongado e a penetração é aumentada no tecido-alvo.

Os niossomas superam os problemas associados aos lipossomas, como questões de estabilidade,


preço alto e suscetibilidade à oxidação. São usados em cosméticos e aplicações de cuidados com a pele,
uma vez que a penetração dos ingredientes nela é aumentada porque possuem a propriedade de reduzir
reversivelmente a resistência da barreira da camada córnea, permitindo que o ingrediente alcance os
tecidos vivos em maior velocidade. Há maior estabilidade dos ingredientes aprisionados e melhora na
biodisponibilidade de ingredientes mal adsorvidos.

107
Unidade II

Existem muitos fatores que afetam a formação e o tamanho dos niossomas, como a natureza e a estrutura
dos surfactantes, a natureza do fármaco encapsulado, a composição da membrana e a temperatura de
hidratação. Os niossomas especializados são chamados proniossomas, que são vesículas de surfactante
de base não iônica, hidratadas imediatamente antes do uso para produzir dispersões de niossoma
aquoso. Para melhorar a administração de drogas, além dos niossomas convencionais, os proniossomas
também são utilizados.

Os niossomas foram desenvolvidos pela L’Oreal no ano de 1970, pela pesquisa e desenvolvimento
de lipossomas sintéticos, e foram patenteados pela L’Oreal no ano de 1987 com o nome comercial de
Lancôme. Atualmente, vários preparados cosméticos niossomas estão disponíveis no mercado, como
cremes antirrugas, cremes hidratantes e branqueadores da pele, xampus reparadores e condicionadores.

7.9.3 Nanocristais

Os nanocristais são produzidos por moagem de alta energia, com poliestireno altamente ramificado
e tensoativo como estabilizador, o qual permite obter partículas de tamanho inferior a 1.000 nm.
Essas estruturas, por apresentarem a área da superfície do fármaco maior, aumentam a solubilidade
e a biodisponibilidade oral de fármacos, permitindo que estes sejam administrados por via oral ou
parenteral, sem necessidade de o paciente estar em jejum ou alimentado. Como exemplos de nanocristais,
podemos citar o medicamento em forma de comprimido sirolimus (o imunossupressor Rapamune®, da
Wyeth Pharmaceuticals), fenofibrato (Tricor®, da Abbott), verapamil (Verelan®, da Alkermes Pharma) e
metilfenidato (Ritalin LA®, da Novartis).

7.9.4 Nanopartículas lipídicas sólidas (SLN)

Um sistema carreador não convencional, nanopartículas lipídicas sólidas (SLN), foi desenvolvido no
início da década de 1990 sobre os carreadores lipoidais convencionais, como emulsões e lipossomas.
A faixa de tamanho das nanopartículas de lipídios sólidos é de 50 nm a 1.000 nm.

O SLN é composto de uma única camada de conchas, e seu núcleo é de natureza oleosa ou lipoidal.
Os lípidios sólidos ou as misturas de lípidios estão presentes no fármaco da matriz, que está disperso
ou dissolvido na matriz do núcleo sólido. As cadeias hidrofóbicas dos fosfolipídios estão embutidas na
matriz de gordura. Esses fosfolipídios são preparados a partir de misturas complexas de glicerídeos,
triglicerídeos purificados e ceras; o lípido líquido é substituído por lípido sólido ou mistura de lípido
sólido, que é sólido em temperatura corporal e ambiente, bem como estabilizado por surfactantes ou
polímeros. Ingredientes ativos lipofílicos, hidrofílicos e pouco solúveis em água podem ser incorporados
em SLNs que consistem em lipídios fisiológicos e biocompatíveis. Com o uso de compostos biocompatíveis
para a preparação de SLN, problemas de toxicidade são evitados. Dois métodos principais para a
preparação de SLNs são o método de homogeneização de alta pressão e o método de precipitação.
A liberação controlada e a liberação sustentada dos ingredientes ativos são possíveis; SLN que tem
núcleo enriquecido com droga leva a uma liberação sustentada, enquanto SLN com casca enriquecida
com droga mostra liberação rápida.

108
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Os SLNs são populares em cosmecêuticos e farmacêuticos, pois são compostos de lipídios


biodegradáveis e fisiológicos que apresentam baixa toxicidade. Seu tamanho pequeno garante que
estejam em contato próximo com o estrato córneo, o que aumenta a penetração dos ingredientes ativos
através da pele.

Os SLNs têm propriedades de resistência aos raios ultravioleta e atuam como filtros solares físicos
por conta própria, portanto, a fotoproteção aprimorada com efeitos colaterais reduzidos pode ser
alcançada quando são combinados com protetor solar molecular. Nanopartículas lipídicas sólidas
como carreadoras para filtro solar de 3,4,5-trimetoxibenzoilquitina e vitamina E são desenvolvidas para
aumentar a proteção ultravioleta (UV). Os SLNs possuem propriedade oclusiva que pode ser utilizada
para aumentar a hidratação da pele, ou seja, o teor de água da pele. As formulações de perfume também
têm SLNs, pois atrasam a liberação da fragrância por um período mais longo. Eles também são ideais
para uso em cremes utilizados durante o dia.

Os SLNs apresentam melhor estabilidade de coalescência quando comparados aos lipossomas,


pois são de natureza sólida e a mobilidade das moléculas ativas é reduzida, o que evita o vazamento
do carreador.

A seguir, apresentamos exemplos de vias de administração e nomes de nanopartículas lipídicas sólidas:

• Via intravenosa (IV): Abraxane® – nanopartículas conjugadas à albumina com paclitacel


encapsulado, para câncer de mama e pulmão; Copaxone® – com acetato de glatirâmer, para
esclerose múltipla.

• Subcutânea: Eligard® – com acetato de leuprolida, indicado para câncer de próstata avançado.

• Via oral (VO): Renagel® – com cloridrato de sevelâmer, para hiperfosfatemia.

• Tópica ou transdérmica: cremes anestésicos de prilocaína e cremes para alopecia com finasterida
já possuem formulações com nanopartículas poliméricas, inclusive para filtros solares, como
Photoprot® (Biolab), Nanoserum® (O Boticário) e Revitalift® (L’Oreal).

7.9.5 Nanopartículas superparamagnéticas e magnéticas

As nanopartículas superparamagnéticas são produzidas com óxido de ferro e muito usadas em


meios de contraste em exames por ressonância magnética (RM). Já as nanopartículas magnéticas são
utilizadas em tratamento de câncer. Nesse caso, as nanopartículas são atraídas ao local em questão
(geralmente, cérebro e próstata), por intermédio de um campo magnético externo que, ao mudar de
frequência, produz hipertermia (cerca de 43 ºC), que leva à morte das células cancerosas, não ocasionando
problemas para as células sadias.

109
Unidade II

Como exemplos de fármacos e vias de administração podemos citar:

• Via intravenosa (IV): partículas de óxido de ferro, como FerahemeTM, para tratamento de anemia
ferropriva; e Feridex®, como agente de contraste fígado.

• Via oral (VO): Fosrenol®, com carbonato de lantânio, para doença renal grave.

7.9.6 Nanopartículas metálicas

As nanopartículas metálicas não reagem em fluidos biológicos e geralmente são produzidas com
ouro e prata. São utilizadas, pincipalmente, na área de diagnóstico, como em testes para gravidez, os
quais detectam a proteína gonadotrofina coriônica humana (hCG) presente na urina, que, com a reação
do hormônio, se liga à nanopartícula revestida por anticorpos anti-hCG, mudando a coloração.

As nanopartículas de prata podem ser usadas como curativos, pois se aderem bem ao local e têm
feito antisséptico, como Acticoat®, Silverlon® e SilvaSorb®. Como exemplos de fármacos e vias de
administração podemos citar:

• Via intravenosa (IV): Sucrofer® – sacarato de hidroxidrodoferrico, usado em deficiência de ferro.

• Via oral (VO): Fosrenol® – carbonato de lantânio, usado em doença renal.

• Parental: NanoTherm®, usado no tratamento de câncer.

Um exemplo de nanopartículas metálicas com aplicação terapêutica que está em fase avançada de
estudo é o Aurimmune®, que é um composto de nanopartículas de ouro revestidas de polietilenoglicol
e de um fator de necrose tumoral (TNF-α). Esse medicamento tem sido investigado no tratamento
de diversos cânceres metastáticos avançados que não respondem mais ao tratamento usual. As
nanopartículas do Aurimmune® são capazes de se acumular ao redor do tumor, e sua ação em outros
tecidos é muito reduzida devido à especificidade do TNF-α.

As nanopartículas de ouro (AuNP), aprovada pela FDA, também podem ser usadas para determinar
a sensibilidade de fármacos e mutações genéticas por screening genético, como no caso de genes
relacionados com trombofilia.

7.9.7 Nanoesferas

Nanoesferas são partículas esféricas que exibem uma estrutura núcleo-casca. O tamanho varia de
10 nm a 200 nm de diâmetro. Nelas o fármaco é aprisionado, dissolvido, ligado ou encapsulado à
matriz do polímero, e o fármaco é protegido da degradação química e enzimática. O fármaco é física
e uniformemente disperso no sistema de matriz do polímero. A natureza das nanoesferas pode ser
cristalina ou amorfa. Esse sistema tem grande potencial e é capaz de converter a substância ativa
biologicamente instável e pouco absorvida e a substância ativa pouco solúvel no fármaco propício para
ser administrado. O núcleo das nanoesferas pode ser delimitado por diversas enzimas, genes e drogas.
110
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

As nanoesferas podem ser divididas em duas categorias: nanoesferas biodegradáveis e nanoesferas


não biodegradáveis. As nanoesferas biodegradáveis incluem nanoesferas de gelatina, nanoesferas de
amido modificado e nanoesferas de albumina, enquanto as nanoesferas não biodegradáveis incluem
ácido polilático, que é o único polímero aprovado.

Em cosméticos, as nanoesferas são usadas em produtos para a pele a fim de fornecer ingredientes
ativos às camadas profundas da pele e proporcionar seus efeitos benéficos à área afetada da pele
de forma mais precisa e eficiente. Esses fragmentos microscópicos desempenham um papel favorável
na proteção contra o envelhecimento actínico. O uso de nanoesferas está aumentando no campo da
cosmética, especialmente em produtos para a pele, como cremes antirrugas, hidratantes e antiacnes.

7.9.8 Dendrímeros

O termo “dendrímero” surge de duas palavras gregas: dendron, que significa árvore, e meros, que
significa parte. Os dendrímeros são altamente ramificados, unimoleculares, globulares, nanoestruturas
micelares e nanopartículas multivalentes cuja síntese, teoricamente, proporciona compostos
monodispersos. Um dendrímero é tipicamente construído a partir de um núcleo no qual uma ou
várias séries sucessivas de ramos são enxertados de forma arborescente e frequentemente adota uma
morfologia tridimensional esférica. A geração do dendrímero é determinada pelo número total de séries
de ramos: se ele tem uma série de ramos, então é o dendrímero de primeira geração; se tiver duas séries,
é a segunda geração; e assim por diante. Eles são extremamente pequenos em tamanho, com diâmetros
na faixa de 2 nm a 20 nm. Suas outras propriedades, como monodispersidade, polivalência e estabilidade,
o tornam um carreador ideal para administração de medicamentos com precisão e seletividade. Para
anexar substâncias biologicamente ativas para fins de direcionamento, grupos terminais são modificados.
Os dendrímeros fornecem liberação controlada do núcleo interno e os medicamentos são incorporados
no interior, além de serem fixados na superfície.

Os dendrímeros são uma nova classe de arquitetura macromolecular e também estão sendo usados
como cosmecêuticos baseados em nanotecnologia para várias aplicações, como em cuidados com o
cabelo, a pele e as unhas. Além disso, têm utilidade em vários produtos cosméticos, como xampus,
protetores solares, géis para modelar o cabelo e produtos antiacinos.

7.9.9 Nanotubos de carbono

No campo da nanotecnologia, os nanotubos de carbono são representados como uma das invenções
mais exclusivas. Nanotubos de carbono (CNTs) podem ser descritos como grafeno laminado com
hibridização SP2. Esses nanotubos são fibras ocas cilíndricas sem costura, compostas de paredes formadas
por grafeno como uma rede hexagonal de carbono, que são enroladas em ângulos “quirais” específicos
e discretos. Nanotubos de carbono individuais se alinham naturalmente em “cordas“ mantidas juntas
por empilhamento π. O diâmetro varia de 0,7 nm a 50 nm com comprimentos na faixa de 10 mícrons.
Os nanotubos de carbono são extremamente leves. Estes são mais de três tipos: CNTs de parede simples,
CNTs de parede dupla e CNTs de paredes múltiplas.

111
Unidade II

Os CNTs de parede única são feitos de folha única de grafeno, que é enrolada sobre si mesma com
diâmetro de 1 nm a 2 nm; os CNTs de parede dupla são compostos de dois nanotubos de carbono
concêntricos; e os CNTs de paredes múltiplas consistem em múltiplas camadas de tubos de grafeno com
diâmetros que variam de 2 nm a 50 nm.

Os principais métodos de produção de nanotubos de carbono consistem em descarga de arco, ablação a


laser, deposição de vapor químico, síntese de chama e solução de silano. Várias patentes de nanopartículas
de carbono foram depositadas no campo de cosmecêuticos, como colorações para cabelo e composições
cosméticas, compreendendo nanotubos de carbono e corantes de cabelo, nanotubos de carbono à base de
peptídeo, e seu uso em composições cosméticas e corantes de cabelo.

7.9.10 Cubossomos

Os cubossomos são partículas nanoestruturadas avançadas que têm como características serem
cristalinas líquidas discretas, submicrônicas e automontadas de surfactantes com proporção adequada
de água, o que as fornece propriedades únicas. São formados por estruturas automontadas de sistemas
aquosos de lipídios e surfactantes quando misturados com água e microestrutura em certa proporção.
Cubossomos são fases líquidas cúbicas bicontínuas, que englobam duas regiões separadas de água –
divididas por bicamadas controladas por surfactante e envolvidas em uma superfície de três dimensões,
periódica e mínima, formando uma estrutura fortemente compactada.

Consistem em uma estrutura em forma de favo de mel (cavernosa) e aparecem como pontos
que são ligeiramente esféricos na estrutura. Eles exibem uma faixa de tamanho de 10 nm a 500 nm
de diâmetro, e têm a capacidade de encapsular substâncias hidrofílicas, hidrofóbicas e anfifílicas.
Os cubossomos têm métodos de preparação relativamente simples; eles processam agentes bioativos
com liberação controlada e direcionada, possuem biodegradabilidade lipídica e possuem alta área de
superfície interna com diferentes modalidades de carregamento de drogas. São uma escolha atraente para
cosmecêuticos, portanto, por esse motivo, vários gigantes da cosmética estão investigando os cubossomos
e diversas patentes foram registradas em relação às suas aplicações cosméticas de cubossomos.

Saiba mais

O filme de ficção científica Viagem fantástica, de 1966, baseado no


livro de Isaac Asimov (1980), apresenta a história de pessoas que foram
miniaturizadas e podiam entrar na corrente circulatória para dissolver um
coágulo. Foi uma história extraordinária para época.

VIAGEM fantástica. Direção: Richard Fleischer. Estados Unidos: 20th


Century Studios, 1966. 100 min.

112
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

8 NANOTECNOLOGIA NA ÁREA FARMACÊUTICA: APLICAÇÕES

8.1 Medicamentos biológicos no tratamento do diabetes

A insulina é um hormônio secretado pelas células β das ilhotas de Langerhans, grupos específicos
de células do pâncreas. Trata-se de uma proteína que consiste em duas cadeias polipeptídicas, uma de
21 resíduos de aminoácidos, e a outra, de 30, unidas por duas pontes dissulfeto. Foi isolada em 1921, e
seu primeiro uso clínico ocorreu em 1922.

A insulina é preparada com diferentes técnicas; em uma delas, o hormônio é isolado de animais, e
em outra, é a preparação biotecnológica por meio de técnicas de DNA recombinante. Ela tem um papel
importante no controle do metabolismo intermediário e causa profundos efeitos no metabolismo de
carboidratos e lipídios. Além disso, tem influência significativa no metabolismo de proteínas e minerais.

O método tradicional e mais previsível de administração de insulina é por meio de injeções


subcutâneas. Esse método é frequentemente doloroso e, portanto, impeditivo para a adesão do paciente,
especialmente para aqueles que requerem injeções de doses múltiplas quatro vezes ao dia. Além disso,
houve relatos de episódios de hipoglicemia após injeções de múltiplas doses de insulina.

Várias novas abordagens para o método foram adotadas para diminuir o sofrimento dos pacientes
diabéticos, incluindo o uso de injetor supersônico, bomba de infusão, agulhas afiadas e canetas. Algumas
vias de entrega de insulina são uma forma problemática, por exemplo, a oral. A administração oral elimina
a dor causada pela injeção e as barreiras psicológicas associadas a várias injeções diárias, mas como
terapia não invasiva para o diabetes mellitus (DM) ainda é um desafio para a tecnologia de entrega de
drogas, pois a insulina é degradada pelas enzimas no ambiente ácido do estômago. A via transdérmica
é uma forma muito popular de administração de insulina, mas existem algumas desvantagens, por
exemplo, tamanho molecular da insulina e problemas de aplicação. Embora alguns desses métodos
aliviem a dor encontrada pelos pacientes diabéticos, oferecem uma conveniência incompleta. Mesmo que
o objetivo final seja eliminar a necessidade de fornecer insulina exogenamente e recuperar a capacidade
dos pacientes de produzir e usar a própria insulina, novos conceitos são explorados atualmente para
fornecer esse hormônio por vias oral, pulmonar, nasal, ocular e retal.

O sucesso da via de administração é avaliado com base em sua capacidade de provocar uma redução
eficaz e previsível do nível de glicose no sangue e, portanto, minimizar o risco de complicações do
diabetes. É óbvio que várias dificuldades têm de ser superadas com o uso da tecnologia de formulação
e aplicação de dispositivos. As várias rotas exploradas serão revisadas mais adiante. Por outro lado, este
item é uma tentativa de ilustrar o uso da administração de insulina e sua rota corporal no tratamento
do diabetes, a fim de beneficiar muitos pacientes diabéticos com adesão promissora do paciente.

Diabetes mellitus é um distúrbio metabólico caracterizado por hiperglicemia crônica (aumento


dos níveis sanguíneos e de glicose hepática) com distúrbios no metabolismo de carboidratos, gorduras
e proteínas resultante da secreção diminuída de insulina, ação prejudicada da insulina ou ambos.
Espera-se que os casos de diabetes mellitus aumentem de 171 milhões em 2000 para 366 milhões
até o ano 2030, conforme previsto pela OMS, de modo que continuará a aumentar em prevalência
113
Unidade II

e se tornará uma séria ameaça à saúde da humanidade. As injeções de insulina continuam a ser a
abordagem preferida para o tratamento de diabetes mellitus insulino-dependente (DMT1) e para muitos
pacientes com diabetes mellitus não insulino-dependentes (DMT2). Pessoas com diabetes mellitus tipo 1
apresentam destruição autoimune mediada pelas células-beta das ilhotas pancreáticas e deficiência
de insulina. O DM1 geralmente ocorre em crianças e adultos jovens, e requer a administração diária de
insulina por injeção ou bomba de insulina para que o indivíduo sobreviva. Por outro lado, a resistência
à insulina (que está associada à produção excessiva de glicose pelo fígado e à utilização prejudicada da
glicose pelos tecidos periféricos, principalmente muscular) é observada no DM2. Portadores de DM2 têm
secreção endógena de insulina prejudicada para lidar com o aumento do nível de glicose no sangue, e
a maioria precisa de medicamentos antidiabéticos orais. Conforme a doença progride, o pâncreas perde
sua capacidade de produzir insulina e a necessidade de terapia com insulina aumenta.

A hiperglicemia, a recorrência de ampla flutuação dos níveis de glicose no sangue e a resistência à


insulina podem levar a complicações de longo prazo, como micro e macrovasculares. É bem conhecido que
o controle metabólico melhorado reduz significativamente as complicações microvasculares (retinopatia,
nefropatia e neuropatia) ou macrovasculares (doença cardiovascular, acidentes cerebrovasculares e
doença vascular periférica) no diabetes. O desenvolvimento de complicações é uma causa de morbidade
considerável e aumenta a incapacidade e a mortalidade para o indivíduo com diabetes.

Observação

O tratamento inicial dos pacientes com diabetes mellitus costuma ser


feito com dieta e exercícios. Se essas medidas não forem suficientes para o
controle glicêmico, pode-se prescrever hipoglicemiantes orais, agonistas do
receptor do peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1) injetáveis, insulina
ou uma combinação desses fármacos.

As farmacoterapias convencionais atualmente disponíveis para o tratamento de diabetes tipo 2


incluem sensibilizadores de insulina (metformina e tiazolidinedionas), secretagogos de insulina
(sulfonilureias e glinidas), inibidores de alfa-glicosidase, insulina e análogos de insulina. Os agonistas do
peptídeo semelhante ao glucagon (GLP-1) e os inibidores da dipeptidil peptidase (DPP-4) são as terapias
que melhoram o controle glicêmico e foram recentemente desenvolvidas. Essas terapias são propostas
para tratar as principais anormalidades metabólicas associadas ao DM1 e ao DM2 e minimizar os efeitos
colaterais observados com as terapias convencionais.

Também em desenvolvimento, existem terapias adicionais que têm efeitos sobre os rins para
promover a excreção de glicose. O túbulo renal proximal (SGLT-2) tem alta capacidade de transporte
para reabsorção de aproximadamente 90% da glicose filtrada, principalmente. Os inibidores de SGLT-2
impedem a reabsorção de glicose no túbulo renal proximal, fazendo com que a glicosúria leve a um
declínio no nível de glicose plasmática. Uma ampla variedade de inibidores do SGLT-2 está atualmente
em desenvolvimento; a dapagliflozina, a canagliflozina e a empagliflozina são as substâncias mais
avançadas. A excreção de aproximadamente 40% da glicose filtrada se traduz em perda de 50 g a
100 g de glicose todos os dias. O consequente declínio da glicose em jejum e pós-prandial leva a uma
114
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

redução da HbA1c de aproximadamente 0,8%. A perda de substrato energético reduz o peso corporal
em aproximadamente 3 kg.

A terapia atual para diabetes mellitus por meio de antidiabéticos orais e administração subcutânea
de insulina apresenta sérias desvantagens, como abandono do paciente e hipoglicemia ocasional. Além
disso, essas abordagens não imitam o destino fisiológico normal da liberação de insulina e não fornecem
melhor homeostase da glicose. Na fisiologia humana normal, quando o nível de glicose no sangue
aumenta, a insulina é liberada do pâncreas, atinge a veia porta hepática e vai para o fígado, que é
seu principal local de ação. A administração subcutânea de insulina move primeiramente os tecidos
periféricos e pode produzir hiperinsulinemia periférica. A fim de superar os problemas associados à
administração parenteral de insulina, um progresso substancial foi feito para a via da insulina, como
ocular, vaginal, retal, oral, pulmonar, transdérmica, intranasal e outras. As barreiras para atingir a corrente
sanguínea são físicas, como má absorção nas superfícies da barreira, ou químicas, como inativação do
pH e degradação enzimática.

A entrega de insulina por via ocular foi testada em modelos animais em combinação com
diferentes intensificadores de absorção, com particular atenção à toxicidade, pois os polímeros
foram adicionados para superar a baixa absorção. As vias vaginal e retal da insulina também foram
avaliadas, mas a taxa de absorção e a biodisponibilidade são fracas devido às espessas camadas
da mucosa nesses tecidos. Muitos intensificadores de absorção (sais biliares, agentes quelantes,
surfactantes, ciclodextrinas e diidrofusidato) foram usados, mas não conseguiram evitar reações
locais com complicações graves.

A administração nasal também foi avaliada devido ao fácil acesso, à alta vascularização e à grande
área de absorção associada a essa via. Infelizmente, a depuração mucociliar altamente ativa no nariz
impediu a ação prolongada do medicamento, resultando em baixa biodisponibilidade. A administração
de insulina por via bucal e sublingual proporciona melhores resultados devido aos baixos níveis de
atividade enzimática proteolítica, à alta vascularização do tecido, à grande área de superfície para
absorção e à facilidade de administração. Ao contrário de outras rotas de entrega, o intestino é a via
natural de absorção de nutrientes na circulação. O fato de o intestino apresentar a maior superfície de
absorção de todas as vias proporciona melhor eficácia. No entanto, as múltiplas camadas de células
epiteliais orais representam uma barreira significativa à penetração do medicamento, o que, juntamente
com o fluxo contínuo de saliva, leva a uma eficácia pobre.

Levando tudo isso em conta, a administração oral é considerada a mais segura e conveniente, pois
leva o fármaco diretamente ao fígado por meio da circulação portal, onde inibe a produção hepática
de glicose. Portanto, por administração oral em maior extensão, a via fisiológica natural da insulina
pode ser imitada. O ambiente altamente ácido no estômago e a presença de enzimas proteolíticas
causam instabilidade estrutural da liberação oral de proteínas e peptídeos, inclusive no ambiente hostil
do sistema gastrointestinal. Esses medicamentos devem superar várias barreiras gastrointestinais, como
químicas, enzimáticas e de absorção, para obter biodisponibilidade adequada. Diferentes formulações
de polímeros para entrega de insulina, como lipossomas, microesferas, microemulsão e nanopartículas,
foram investigadas para contornar essas barreiras do TGI.

115
Unidade II

Entre essas abordagens, os sistemas nanoparticulares têm atraído especial interesse por fornecer
proteção ao meio altamente ácido do estômago – o que evita a degradação enzimática –, prolongando o
tempo de residência intestinal, aumentando a permeabilidade dos fármacos para a circulação sistêmica
(consequentemente, aumentando a absorção) e proporcionando liberação controlada das propriedades
das drogas encapsuladas. Para a medicina convencional, é bem compreendido que o tamanho
nanométrico, juntamente com outras características, desempenha um papel importante, como fica
evidente pela melhoria da biodisponibilidade/disponibilidade farmacológica. Devido à alta relação entre
área de superfície e volume de nanopartículas, a janela de absorção também é alta em comparação
com micropartículas – o que representa uma vantagem adicional para melhorar a biodisponibilidade do
medicamento administrado.

8.1.1 Vias de administração da insulina

8.1.1.1 Via oral

A terapia com insulina é usada com eficácia no tratamento do diabetes mellitus. A insulina é um
elemento-chave na redução dos níveis de glicose no sangue para o diabetes tipo 1 e também necessária
em estágios posteriores em pacientes com diabetes tipo 2. A via amplamente aceita para a entrega de
insulina é por administração parenteral, mas geralmente requer pelo menos três ou quatro injeções
diárias de insulina para um bom controle glicêmico. Consequentemente, diferentes vias de distribuição
de insulina mais aceitáveis têm sido pesquisadas para diminuir o sofrimento por desconforto, dor local,
irritação, infecção, reações imunológicas e lipoatrofia no local da injeção de insulina. A administração
oral de insulina liberaria a droga diretamente no fígado por meio da circulação portal e poderia limitar
o destino fisiológico da insulina secretada endogenamente. No entanto, polipeptídeos, como a insulina,
são degradados no pH do estômago e sofrem proteólise por enzimas no TGI. Além disso, a mucosa
gastrointestinal tem baixa permeabilidade para grandes peptídeos hidrofílicos.

Para superar os problemas associados à administração parenteral de insulina, várias estratégias


baseadas na nanotecnologia foram desenvolvidas para aumentar a absorção intestinal de diferentes
proteínas e peptídeos. Nanopartículas consistem em polímeros biodegradáveis de ocorrência natural e
são amplamente estudados a esse respeito. Eles surgiram como potenciais portadores de vários agentes
terapêuticos para a entrega controlada de drogas, bem como a via oral da insulina. Vários polímeros
hidrofílicos e hidrofóbicos naturais usados como transportadores de insulina oral, como quitosana,
alginato, sulfato de dextrano etc. são comumente usados para preparar nanopartículas.

• Polímeros usados como matrizes para a administração oral de insulina: nas últimas
décadas, cada vez mais atenção tem sido dada ao uso de nanopartículas poliméricas hidrofílicas
ou hidrofóbicas como transportadores para a entrega de insulina. Os polímeros hidrofílicos são
de particular interesse devido aos seus polímeros não tóxicos, biocompatíveis, biodegradáveis e
naturais. Entre eles, a quitosana é amplamente utilizada devido à sua facilidade de modificação
química e propriedades biológicas promissoras.

— Polímeros hidrofílicos – quitosana (CS): CS é um copolímero de ocorrência natural conhecido


por beta ligado a N-acetil glucosamina, geralmente encontrado na casca de crustáceos
116
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

(caranguejos, camarões e lagostas) e em alguns fungos ou leveduras. É um polímero hidrofílico


natural biodegradável, biocompatível, não tóxico, não alérgico, facilmente absorvível, que
resultou em uma ampla gama de aplicações em pesquisas biomédicas e de distribuição de
drogas. Além disso, prolonga o tempo de residência intestinal, o que mostra sua propriedade
mucoadesiva. Também foi mostrado como um intensificador da permeabilidade paracelular
ao interagir com as proteínas TJ que obstruem o ZO-1 e abre as junções estreitas entre as
células epiteliais. Além dessas propriedades, aumenta a estabilidade das nanoesferas e facilita a
encapsulação eficaz de proteínas e drogas que o tornam um material transportador adequado.

CS tem sido amplamente usado para desenvolver novos polímeros derivatizados de quitosana:

- CS combinado com poli (ácido γ-glutâmico) (γ-PGA) nanopartículas de insulina


com base: usados como polímeros hidrofílicos para entrega oral de insulina. Estudos
in vivo dessas formulações com uma dose de 30 UI/kg em modelos de ratos diabéticos
induzidos por estreptozotocina (STZ) mostraram aumento da absorção intestinal
de insulina de nanopartículas γ-PGA. Tem efeito hipoglicêmico de longa duração e 15% de
biodisponibilidade relativa em comparação com a injeção subcutânea. A mesma formulação
em cápsulas com revestimento entérico foi ainda melhor na mesma dose, apresentando
20% de biodisponibilidade oral. Além disso, a insulina aspártica (monomérica, três vezes
mais rápida do que a normal) é encapsulada no mesmo CS-γ-PGA e tem 15,7% de
biodisponibilidade oral.

- Nanopartículas carregadas de insulina com quitosana carboxilada e polimetil


metacrilato (PMMA): desenvolvidas para melhorar a entrega de insulina via oral. Um dos
polímeros mais amplamente investigados para a entrega de peptídeo são os acrilatos, que
têm alto interesse por causa de sua sensibilidade ao pH e grupos carboxila para aumentar
a bioadesividade, alterar a junção apertada e quelar o Ca2+, inibindo a atividade proteolítica
de proteases.

A capacidade de reduzir os níveis de glicose no sangue em ratos diabéticos foi avaliada,


cujos experimentos in vivo resultaram na redução dos níveis de glicose no sangue em 67%
com uma dose de 100 IU/kg, e a biodisponibilidade farmacológica de 25 IU/kg, com uma
dose de nanopartículas de PMMA, foi de 9,7%.

- Quitosana com alginato de sódio: este é outro produto de nanopartículas carregadas de


insulina usado para melhorar a capacidade de carga e manutenção da atividade. É observado
que, quando nanoesferas carregadas de insulina (25, 50 e 100 IU/kg) são administradas via
oral a ratos diabéticos, elas reduzem a glicemia a depender da dose. Suas disponibilidades
farmacológicas são 7,1%, 6,8% e 3,4%, respectivamente.

- Ftalato de hidroxipropilmetilcelulose (HPMCP): polímero sensível ao pH desenvolvido


como um material de revestimento entérico. Ele reduz a liberação do fármaco em
condições ácidas e melhora a estabilidade coloidal das partículas. A liberação de insulina
de nanopartículas de CS/HPMCP foi significativamente reduzida em pH ácido e mesmo
117
Unidade II

após seis horas diminuiu cerca de 25%, apenas. A insulina foi protegida da degradação
enzimática, no caso de CS/HPMCP, em comparação com partículas de quitosana nativa.
A quitosana carregada com insulina e as nanopartículas de HPMCP foram administradas
via oral a ratos wistar diabéticos. A disponibilidade farmacológica foi de 3,02% e 8,47%,
respectivamente, para a quitosana e as nanopartículas modificadas. Em comparação com
a solução de insulina oral, o efeito hipoglicêmico foi aumentado em 2,8 e 9,8 vezes para a
quitosana e as nanopartículas modificadas, respectivamente.

- Sulfato de dextrana: é um polímero diferente, não tóxico e altamente solúvel em água,


usado como matrizes para administração oral de insulina. A vitamina B12 demonstrou ser
um ligante para aumentar a absorção de nanopartículas de dextrana e sua translocação
através do TGI para alta biodisponibilidade. Insulina conjugada a nanopartículas de
dextrana-vitamina B12 para ratos diabéticos que tinham a menor quantidade de reticulação
foi considerada mais eficaz na redução dos níveis de glicose no sangue (70%-75%) em ratos
diabéticos induzidos. Além disso, o efeito hipoglicêmico durou 54 horas. Essa modificação
apresentou o maior efeito hipoglicêmico com disponibilidade farmacológica de 29,4%.

— Polímeros hidrofóbicos – poli (lactídeo-co-glicolídeo) (PLGA): as partículas que


consistem em PLGA têm sido amplamente estudadas como veículos de distribuição
terapêutica devido às suas partículas biodegradáveis e biocompatíveis. A natureza hidrofóbica
das matrizes PLGA geralmente as torna incapazes de aprisionar a insulina solúvel em água.
A administração intragástrica de nanopartículas de PLGA carregadas de insulina (20 UI/kg) a
ratos diabéticos reduziu os níveis de glicose no plasma em jejum para 57,4% nas primeiras
oito horas de administração. A biodisponibilidade relativa da insulina após a administração
oral de nanopartículas foi de 7,7% em comparação com a injeção subcutânea de sua solução.
Nanopartículas de PLGA com ramificação em estrela (β-ciclodextrina-PLGA) são altamente
promissoras para mitigar o efeito de explosão e prolongar a liberação de insulina. Outro
estudo tentou evitar a liberação repentina de insulina no estômago usando um derivado de
celulose (ftalato de hidroxipropilmetilcelulose – HPMCP) para preparar nanopartículas
de PLGA. Essa modificação reduziu a liberação inicial de NPs de PLGA no fluido gástrico
simulado de 50% para 20%, e sua biodisponibilidade relativa em ratos diabéticos foi de
aproximadamente 6,2%.

- Ácido polilactídeo (PLA): PLA exibe uma forte afinidade para o intestino delgado devido
aos seus blocos de óxido de polietileno (PEO) e a alta capacidade de permeação para a
membrana celular devido à sua propriedade anfifílica. Quando tratados por via oral com
nanopartículas de PLA vesiculares carregadas com insulina para camundongos diabéticos
(50 UI/kg), a maior redução de glicose no sangue foi alcançada em 4,5 horas. Embora esse
efeito tenha durado pelo menos 18,5 horas adicionais, o aumento da concentração de
insulina para 100 IU/kg não aumentou esse efeito hipoglicêmico (que durou 23 horas).

- Poli-ε-caprolactona (PCL): nanopartículas preparadas com PCL e uma forma monomérica


de análogo de insulina (insulina aspártica). Seus resultados demonstraram que essa
formulação permite a preservação das atividades biológicas da insulina, o aumento dos
118
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

níveis séricos de insulina e a melhora da resposta glicêmica. O efeito máximo de redução da


hiperglicemia foi encontrado 8 horas após a administração oral, que foi mais pronunciado
com nanopartículas carregadas de insulina aspártica (52%) na dose de 50 UI/kg.

— Polímeros lipídicos (NPs de lipídios sólidos – SLN): estudos anteriores demonstraram que
a nanoencapsulação de proteínas em SLNs prolonga seu tempo de permanência no sangue,
modifica sua biodistribuição e melhora sua biodisponibilidade. Na administração de insulina
oral com SLNs a ratos diabéticos, sua biodisponibilidade farmacológica relativa foi de 5,1%
em comparação com a injeção SC de insulina; um efeito hipoglicêmico considerável também
foi observado durante 24 horas. Para facilitar o transporte de partículas através das barreiras
celulares, em outro estudo a biodisponibilidade relativa aumentou para 7,1%. Esse estudo
também sugeriu que o aumento da eficiência de aprisionamento da droga e a utilização de
inibidores de protease em SLNs podem aumentar ainda mais a biodisponibilidade da insulina.

8.1.1.2 Via nasal

A administração nasal tem atraído muito interesse como uma via altamente eficiente para a
distribuição sistêmica de insulina. É bem conhecido que o perfil farmacocinético da insulina intranasal
se assemelha ao padrão pulsátil da secreção de insulina endógena em voluntários saudáveis durante as
refeições. Além disso, é considerada uma via promissora pelas seguintes razões:

• o nariz possui uma área de superfície relativamente grande (150 cm2) de absorção, por causa
de numerosas microvilosidades e da camada subepitelial altamente vascularizada, que passa
diretamente para a circulação sistêmica, evitando a perda de droga por metabolismo de primeira
passagem no fígado;

• alta permeabilidade da membrana epitelial nasal;

• menor atividade enzimática em relação ao TGI.

Embora a administração nasal de insulina tenha muitas vantagens, também existem algumas
barreiras que limitam a absorção intranasal de insulina, por atuarem como barreiras:

• a depuração macociliar das formulações da cavidade nasal;

• a baixa permeabilidade da mucosa nasal a grandes moléculas; e

• a baixa biodisponibilidade da insulina.

Para superar as várias barreiras pela via nasal, os pesquisadores estudaram uma ampla gama de
intensificadores, como sais biliares e derivados, lauril sulfato de sódio, fosfolipídios, ciclodextrinas,
quitosana e inibidores de enzimas.

119
Unidade II

8.1.1.3 Via pulmonar

A administração pulmonar é uma das vias alternativas mais promissoras de absorção de insulina.
Os pulmões oferecem uma área de superfície grande e altamente vascularizada para a absorção do
fármaco, de aproximadamente 80 a 140 m2. Os alvéolos são recobertos por um epitélio monocamada
muito fino (0,1 a 0,2 mm), que permite a rápida absorção do medicamento. Os alvéolos podem ser
efetivamente direcionados para a absorção de drogas pela administração como um aerossol, com
diâmetro aerodinâmico médio de massa inferior a 5 µm. O metabolismo de primeira passagem não
ocorre nessa via, nem o metabolismo do sistema gastrointestinal. Embora as enzimas metabólicas sejam
encontradas nos pulmões, suas atividades e vias podem ser diferentes daquelas encontradas no TGI, o
que torna a rota pulmonar de diversas proteínas e peptídeos terapêuticos muito promissora.

Existem vários dispositivos de inalação, como inaladores dosimetrados ou inaladores de pó de


drogas, como o AERx® Insulin Diabetes Management System, desenvolvido pela Novo Nordisk, que
fornece aerossol de insulina humana, e o Exubera®, desenvolvido pela Nektar/Pfizer, que usa uma
formulação de pó seco.

Os inaladores de pó seco são atualmente os dispositivos mais comumente usados devido à sua
estabilidade e esterilidade para desenvolver insulina pulmonar. Os surfactantes, sais biliares e ácidos
graxos têm sido avaliados como potencializadores de absorção que aumentam a permeabilidade dos
fármacos através das membranas epiteliais. No entanto, o éter oleílico de polioxietileno (PE) apresentou
uma boa intensificação, e o trioleato de sorbitano exibiu capacidade moderada de intensificação. Os
efeitos intensificadores do trioleato de glicerol, oleato de etila, álcool oleílico, ácido palmítico e ácido
esteárico foram muito baixos. Em contraste, os lipossomas são potenciadores de absorção pulmonar
muito eficazes para drogas peptídicas e proteicas. Eles têm fosfolipídios biogênicos e propriedades
naturais biocompatíveis, biodegradáveis e não imunogênicas.

8.1.1.4 Via bucal

A insulina fornecida por via bucal é por meio de um spray de aerossol na cavidade oral. É absorvido
pela parte interna das bochechas e na parte de trás da boca. A mucosa bucal é perfeitamente acessível
com área de superfície de aproximadamente 100-200 cm2, menor risco de traumatismo e permeabilidade
e perfusão relativamente boas. Várias formulações e fatores sozinhos ou em combinação podem
influenciar as propriedades de liberação do sistema de entrega de insulina bucal. Estas formulações
devem conter potencializadores de absorção (como surfactantes, sais biliares, quelantes, lauril sulfato
de sódio ou ácidos graxos) para aumentar a permeabilidade da membrana, inibidores de enzimas para
proteger a droga da degradação, inibidores de protease (aprotinina e glicocolato de sódio) para funcionar
a permeação da droga através mucosa, modificações de lipofilicidade (conjugação com polímeros),
sistemas de administração com bioadesivos (géis, filmes, adesivos) e formulações lipossomais. O ácido
lisalbínico, que é aplicado como um intensificador da absorção, mostrou aumentar significativamente a
permeabilidade da mucosa bucal à insulina. Este ácido é um produto da hidrólise alcalina da albumina
do ovo e não tem efeito irritante ou sensibilizante no uso bucal. A coadministração de ácido lisalbínico
e proteínas relativamente pequenas, como a insulina, pode aumentar a permeabilidade da insulina da
mucosa da bochecha.
120
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Nos últimos anos, um novo sistema inovador foi desenvolvido pela Generex Biotechnology
Corporation (Toronto, Canadá). É baseado em uma formulação líquida (Oral-Lyn®) de insulina humana
recombinante, intensificadores de absorção (que encapsulam e protegem as moléculas de insulina) e
dispositivo Rapid Mist® (tecnologia avançada de administração oral de drogas). Este dispositivo envia
rapidamente pequenas partículas de um spray aquoso para a cavidade oral. Isso permite uma rápida
absorção de insulina. Oral-Lyn® foi avaliado em pessoas saudáveis ​​e diabetes tipo I. Ela aparece na
circulação em 10 minutos, o tempo para atingir o pico da concentração de insulina é em torno de
25 minutos. Observou início de ação mais rápido e ação hipoglicêmica menos prolongada. Vários
estudos em pacientes com diabetes tipo 1 e 2 demonstraram que essa insulina oral pode ser eficiente
no controle dos níveis de glicose pós-prandial.

8.1.1.5 Via transdérmica

A administração transdérmica de insulina é uma alternativa atraente para a via parenteral invasiva
de administração e outras vias alternativas de insulina, como as vias pulmonar e nasal, porque a pele
oferece as vantagens de um acesso fácil e uma área de superfície muito grande (1-2 m2). Ela melhora
a adesão do paciente e evita o metabolismo de primeira passagem do fígado e a degradação de drogas
no TGI. A pele também representa importante interface indolor para a administração sistêmica de
medicamentos. Apesar dessas vantagens, a pele humana limita a permeação de compostos estranhos,
especialmente moléculas hidrofílicas grandes como a insulina. O estrato córneo; que é a camada
superior causa impermeabilidade da pele por sua matriz rica em lipídios. Várias tentativas foram feitas
para superar a barreira da pele e permitir a transferência de grandes drogas como a insulina. Eles podem
ser divididos em métodos químicos (lipossomas e intensificadores químicos) e físicos (principalmente
iontoforese e sonoforese).

8.1.1.6 Via ocular

A administração ocular é outra promissora e desafiadora via para peptídeos e proteínas


oftalmologicamente ativos para o tratamento de doenças oculares. As vantagens da entrega ocular
são: menos desenvolvimento de reações imunológicas nos tecidos oculares, menos efeitos colaterais,
sem tolerância e evitação do metabolismo hepático de primeira passagem. Embora os intensificadores,
como saponina, dodecilmaltosídeo, tetradecilmaltosídeo, ácido fusídico e glicocolato, aumentem a
absorção sistêmica de insulina em animais, também podem aumentar a toxicidade ocular. Uma série de
alquilglicosídeos, incluindo tetradecil-, tridecil-, dodecilmaltosídeo e dodecilsacarose, foram potentes
estimuladores da absorção de insulina após administração ocular tópica em ratos anestesiados quando
usados em concentrações tão baixas quanto 0,125%. Estes são os reagentes alquilglicosídeos mais
hidrofóbicos e foram os mais eficazes em aumentar a absorção sistêmica de insulina. Além disso, o
cocoato de sacarose, um excipiente farmacológico de preparação cosmética e dermatológica, foi usado
para determinar seu possível intensificador de absorção na administração ocular de drogas. Quando a
insulina foi administrada ocularmente na presença de cocoato de sacarose a 0,5%, os níveis de insulina
no plasma aumentaram significativamente e os níveis de glicose no sangue foram reduzidos. Devido a
essa observação, o lipossoma que contém insulina foi preparado para prolongar o tempo de retenção da
formulação na área pré-córnea e sua formulação carregada positivamente diminuiu os níveis de glicose
no sangue de 65% a 70%.
121
Unidade II

Mais recentemente, Gelfoam®, uma esponja de gelatina absorvível, e dispositivos oculares foram
desenvolvidos como transportadores de insulina para administração sistêmica de insulina. Embora
Gelfoam® com 0,2 mg de insulina tenha demonstrado absorção sistêmica prolongada de insulina
dentro dos níveis terapêuticos desejados, ele também pode causar toxicidade de longo prazo, bem como
diminuir a produção de lágrimas. Devido a essa toxicidade, foram desenvolvidos dispositivos oculares de
insulina de sódio e insulina de zinco. Gelfoam® e esses dispositivos foram suficientes para controlar os
níveis de glicose no sangue (60% do inicial) por mais de 8 horas.

8.1.1.7 Via vaginal

Nos últimos anos, vários estudos provaram que a vagina tem um rico suprimento de sangue e grande
área de superfície, o que significa boa permeabilidade, e pode ser uma rota potencial para entrega
sistêmica a uma ampla gama de compostos. As principais vantagens da via vaginal do medicamento
são: evitar o metabolismo de primeira passagem, facilidade de administração e boa permeabilidade para
medicamentos de baixo peso molecular. Para a distribuição sistêmica de sais biliares, diidrofusidato,
ciclodextrinas, surfactantes e agentes quelantes foram testados como potencializadores para facilitar a
taxa de absorção vaginal, mas às vezes eles induziram várias reações locais.

8.1.1.8 Via retal

A via retal de administração foi testada logo após a descoberta da insulina, mas vários pesquisadores
encontraram problemas de absorção através da mucosa. A vantagem promissora desta administração
é a possibilidade de evitar, até certo ponto, o metabolismo hepático de primeira passagem. Promotores
de absorção e surfactantes foram usados para fornecer o maior efeito hipoglicêmico na aplicação de
insulina retal. O polioxietileno-9-lauril éter (POELE) ou salicilato de sódio mais eficaz para aumentar a
absorção retal foi usado em supositórios de insulina em cães diabéticos. Foi investigado que o efeito
hipoglicêmico pode ser alcançado em cerca de 50% a 55%.

8.2 O microambiente tumoral como estratégia de direcionamento de


nanopartículas

Uma das maiores preocupações em saúde pública é o câncer, que pelo mau funcionamento das
células afetadas leva o órgão afetado a sofrer consequências drásticas, como perda de sua função,
além de prejudicar outros órgãos que dependem do órgão afetado, acarretando um grupo de
doenças interligadas.

Mas como podemos atacar essas células tão maléficas? Um ponto importantíssimo é o estudo do
microambiente tumoral, que propicia a progressão do crescimento e a proteção das células tumorais.

O câncer promove muitas alterações ao seu redor, levando a um “microambiente tumoral” que
envolve a matriz extracelular (MEC) das células tumorais: células endoteliais e seus percursores, células do
músculo liso, pericitos, fibroblastos, miofibroblastos, linfócitos T e B, neutrófilos, eosinófilos, mastócitos,
basófilos, células natural killer (NK), células dendríticas, macrófagos, proteínas, como citocinas (por
exemplo, interleucina-8), peptídeos inflamatórios, como cininas e hormônios, e outros fatores, como
122
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

o vascular endothelial growth factor (VEGF), o fator de crescimento fibroblástico básico (FGF-b), o
fator de crescimento transformante alfa (TGF-α), o fator de necrose tumoral (TNF), enzimas líticas,
como as da família de metaloproteases de matriz, além de causar disfunção linfática no interstício
do tumor, causando hipertensão intersticial e condições físico-químicas como hipóxia e acidificação do
microambiente tumoral (por causa da fermentação lática).

Essas células transformadas são fracamente aderidas à matriz pelas moléculas de adesão, como as
integrinas, o que causa um desprendimento destas e, chegando ao sangue, as chamadas circulating
tumor cells (CTC) podem colonizar outros locais, em um processo que se chama metástase.

Como as células de câncer conseguem resistir a várias formas de eliminação, como na quimioterapia
e na imunoterapia, pois são capazes de bombear fármacos anticancerígenos para seu exterior, a cirurgia e
a radioterapia podem não afetar determinadas neoplasias malignas. A nanotecnologia surgiu como
uma esperança concreta em seu tratamento, por ser biocompatível e poder direcionar ou vetorizar o
medicamento quimioterápico mais efetivo na quantidade e no local correto, resultando na alteração do
microambiente tumoral e sua não sobrevivência.

Essas alterações no microambiente tumoral podem estimular apoptose e desaparecimento do tumor


ou sua proteção, dependendo do estímulo. Um tipo celular que pode ter esse comportamento dúbio é o
dos macrófagos associados a tumores (TAMs), classificados como do tipo I (M1), que, quando ativados,
fagocitam e destroem microrganismos e produzem elevados níveis de citocinas pró-inflamatórias,
eliminando células tumorais, e os macrófagos do tipo 2 (M2) – os quais, quando ativados, induzem a
angiogênese pela liberação de VEGF, estimulando a progressão do tumor.

Para que o tratamento seja eficaz, o diagnóstico precoce é imprescindível, mas métodos tradicionais
detectam o tumor quando já há muitas células. A nanotecnologia vem se destacando nessa área,
colocando-se como método diagnóstico do futuro, fato já observado quando se usa nanopartículas
de óxidos metálicos revestidas com anticorpos específicos como contraste em imagens de RM ou na
tomografia computadorizada (TC), que são direcionadas para células cancerosas a fim de proporcionar
visualização ainda em estágios iniciais.

Um dos alvos terapêuticos para que haja a remissão da doença é a alteração do microambiente
tumoral, que, apesar de diferir de tumor para tumor, pode apresentar características biológicas, físicas
ou químicas em comum que podem ser alvos terapêuticos, diminuindo, dessa forma, a resistência às
drogas e a metástase.

Ligantes como anticorpos monoclonais podem ser adsorvidos na superfície dos nanocarreadores,
que são, então, reconhecidos por células cancerosas-alvo, pois expressam em sua membrana proteínas
específicas que os atraem, o que em células normais não ocorre.

Outros ligantes não imunogênicos são também capazes de ser adsorvidos na superfície das
nanopartículas. Ácido fólico ou ferro podem ser ligados à superfície das nanopartículas para interagir
com os receptores de transferrina e folato, que são superexpressos nos tumores sólidos. Nanopartículas de
sílica revestidas por folato carregadas com fármaco para câncer de próstata não chegam rapidamente
123
Unidade II

a essas células, pois têm cerca de 200 vezes mais receptores de folato em sua superfície do que as
células saudáveis.

Outro exemplo de nanopartículas usadas no tratamento de câncer são as nanopartículas com


PEG (lipossomas PEGuilados). Elas não são captadas pelo sistema mononuclear fagocítico (MPS),
aumentando sua meia-vida. Como a drenagem linfática está lenta, leva medicamentos anticâncer,
por exemplo, de doxorrubicina, vincristina e paclitaxel, que passam a ser acumuladas nesse
ambiente tumoral.

No processo de formulação de sistemas de entrega de fármacos, como os lipossomas e as


nanopartículas poliméricas contendo fármacos antineoplásicos lipofílicos e/ou hidrofílicos, pode-se
programar para que sejam sensíveis a pH. Como sabemos que o microambiente tumoral apresenta pH
ácido, essas nanopartículas são atraídas ao local por apresentarem anticorpos específicos na superfície
para determinado órgão e, após fundir-se com as membranas-alvo, por causa do baixo pH, liberam o
fármaco diretamente na célula, o que deixa a quimioterapia menos agressiva para as células saudáveis
de outros órgãos, melhorando a qualidade de vida e a baixa sobrevida do paciente.

Outra forma de liberação de fármaco pelos lipossomas é deixá-los sensíveis à luz e à temperatura,
caso se utilizem fármacos fotossensibilizadores, como os usados em fototerapias pouco invasivas, por
exemplo, fotodinâmica (PDT) e fototérmica (PTT).

Na PDT, ocorre liberação do fármaco após o local ser irradiado por laser, que absorve
determinado comprimento de onda, enquanto na PTT acontece abertura e liberação do antineoplásico
em temperaturas altas (acima de 42 ºC), que, além de induzir apoptose, estimula a destruição sem
remoção do tecido (coagulação, ablação e até carbonização) por aquecimento no local em virtude
de um campo magnético.

Atualmente, o termo medicina teranóstica está sendo usado para designar um método de
diagnóstico e de tratamento de câncer conjunto, uma vez que nanocarreadores com quimioterápicos
chegam às células-alvo porque são vetorizadas ou encaminhadas ao local estrategicamente estudado.
Ao mesmo tempo, será realizado o diagnóstico por imagem, que será confirmado com a extração
das células para análise do diagnóstico molecular (genótipo e fenótipo), e pode-se liberar o fármaco
diretamente no local de estudo – o que mostra que cada vez mais a medicina será individualizada para
que a terapia seja efetiva, diminuindo a resistência da terapia antineoplásica.

Nanopartículas com perfluorcarbono têm sido estudadas para tratamento de tumores vasculares,
pois agem como contraste para ultrassom e RM, e podem liberar fármacos na região do câncer.

Nanopartículas de óxido de ferro superparamagnéticas têm vantagem em RM nuclear e em


comparação com o gadolínio, pois o ferro é encontrado normalmente em nosso corpo, e o gadolínio,
não. Outra vantagem é que permitem a detecção de tumores com liberação de medicamento, recurso
até então inviável em outras técnicas.

124
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

8.3 Medicamentos biológicos para o tratamento de doenças raras

Produtos biológicos (derivados de vírus, toxinas, soros terapêuticos, proteínas, antitoxinas,


sangue, vacinas, produtos alergênicos e compostos orgânicos de arsênio trivalentes) têm se mostrado
historicamente difíceis de estudar, purificar e fabricar em grande escala. Porém, novos conhecimentos
e avanços tecnológicos nos últimos 25 anos posicionaram os produtos biológicos como importantes
elementos na indústria farmacêutica.

Os produtos biológicos mais populares atualmente são projetados para tratar doenças graves
e crônicas, como diabetes, câncer e artrite reumatoide. Esses produtos incluem o anti-inflamatório
Humira (Adalimumabe), da AbbVie. Esse produto, o biológico mais vendido atualmente, foi lançado
em 2002 e inclui indicações para o tratamento de artrite reumatoide, artrite psoriática, psoríase em
placas, doença de Crohn, colite ulcerosa e espondilite anquilosante. Como resultado dessas múltiplas
indicações, a população de pacientes para esse medicamento é enorme. Só em 2017, o Humira gerou
US$ 18,4 bilhões em vendas globais.

Mas e as doenças raras? Embora muitas vezes igualmente devastadoras, as doenças raras com
pequenas populações de pacientes têm sido tradicionalmente alvos muito menos atraentes do ponto de
vista financeiro para os desenvolvedores de medicamentos do que as doenças comuns.

A população afetada por cada doença rara (DR) é normalmente inferior a 200 mil pessoas.
No entanto, coletivamente, elas afetam cerca de 20 a 30 milhões de pessoas nos Estados Unidos e mais de
350 milhões de pessoas em todo o mundo. A carga significativa de doenças e o impacto social destas
exigem um crescimento contínuo na pesquisa translacional e no desenvolvimento de medicamentos órfãos.
Nas últimas duas décadas, a indústria farmacêutica foi incentivada a desenvolver medicamentos
órfãos. A legislação sobre medicamentos órfãos, a simplificação dos procedimentos de autorização de
comercialização e a extensão da pesquisa de exclusividade de mercado são alguns dos incentivos que
estimularam o crescimento constante no campo. Em 2020, 53 novos medicamentos foram aprovados
pela FDA nos Estados Unidos, a segunda maior contagem em mais de duas décadas.

O progresso nos tratamentos farmacológicos para doenças raras foi aprimorado por desenvolvimentos
nas seguintes áreas principais:

• Terapias de moléculas pequenas: moléculas pequenas são agentes terapêuticos ideais por
várias razões. Eles são estáveis, permitem múltiplas vias de administração e tendem a custar
menos do que outras plataformas terapêuticas. No desenvolvimento de medicamentos órfãos,
pequenas moléculas permitem o uso de telas direcionadas e melhor modelagem de doenças.
Em 2020, várias terapias de pequenas moléculas foram aprovadas pelo FDA:

— Zeposia (ozanimod – Bristol-Myers Squibb), foi aprovado em março de 2020 para o tratamento
da esclerose múltipla.

— Orladeyo (berotralstat – BioCryst Pharmaceuticals), um inibidor da calicreína plasmática, foi


aprovado em abril de 2020 para a prevenção de angioedema hereditário.
125
Unidade II

— Isturisa (osilodrostat – Novartis), um inibidor da síntese de cortisol, foi aprovado em junho de


2020 para o tratamento da doença de Cushing em adultos.

— Evrysdi (risdiplam – Roche), um modificador de splicing SMN2, foi aprovado em agosto de


2020 para o tratamento de atrofia muscular espinhal (AME).

— Zokinvy (lonafarnib – Eiger BioPharmaceuticals), um inibidor da farnesiltransferase, foi aprovado


para o tratamento da síndrome de Hutchinson-Gilford progeria em novembro de 2020.

— Koselugo (selumetinibe – AstraZeneca), foi aprovado em novembro de 2020 para


neurofibromatose tipo 1, uma doença genética que causa o crescimento de tumores nos nervos.

No geral, as moléculas pequenas oferecem uma vantagem sobre as plataformas terapêuticas


emergentes devido à vasta experiência científica e clínica que já existe nesse campo.

• Terapias com anticorpos: desde a aprovação do primeiro anticorpo monoclonal (MAb) em 1986,
esta classe de terapêutica tem crescido continuamente. As terapias baseadas em MAb aprovadas
para doenças raras têm sido, principalmente, no campo da oncologia, embora essa plataforma
terapêutica tenha mostrado potencial na segmentação de proteínas associadas a doenças.

— Eculizumab (soliris – Alexion Pharmaceuticals), uma terapia com anticorpos que foi inicialmente
aprovada para hemoglobinúria paroxística noturna, agora também foi aceita para síndrome
urêmica hemolítica e miastenia gravis. Outra terapia com MAb (canakinumab) (Ilaris – Novartis),
que foi inicialmente aprovada para artrite reumatoide, agora foi reconhecida para síndromes
periódicas associadas à criopirina.

A alta especificidade das terapias baseadas em MAb minimiza os riscos de toxicidade fora do alvo,
o que é frequentemente observado ao usar terapias de moléculas pequenas. Outro ponto forte das
terapias com MAb é sua estabilidade in vivo, o que torna possível ter esquemas de dosagem infrequentes,
como mensais ou bimensais. Algumas das terapias de anticorpos aprovadas para doenças raras em
2020 incluem:

• Uplizna (inebilizumab-cdon – Viela Bio), também foi aprovado para neuromielite óptica em
agosto de 2020.

• Enspryng (satralizumab – Roche), um mediador da interleucina (IL)-6, também foi aprovado para
neuromielite óptica em novembro de 2020.

• Danyelza (naxitamab – Y-mAbs Therapeutics), foi aprovado em novembro de 2020 para o


tratamento de neuroblastoma, um câncer raro que afeta crianças.

126
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Terapias de reposição de proteínas – doenças raras associadas à perda da função de uma proteína
específica têm se beneficiado do uso de terapias de substituição de proteínas. Os avanços nesses tipos
de terapias cresceram significativamente nas últimas décadas.

A terapia de substituição de proteínas mudou de produtos derivados de plasma para proteínas


recombinantes e ainda progrediu para proteínas de engenharia recombinante. Isso levou ao
desenvolvimento de características terapêuticas melhoradas em terapias recentes, como o emicizumabe
(Chugai Pharmaceuticals), para o tratamento da hemofilia.

O foco da maioria das terapias de reposição enzimática tem sido as doenças genéticas ligadas a
enzimas ausentes ou com mau funcionamento. Até o momento, várias terapias de substituição de
proteínas foram aprovadas para doenças raras, incluindo doença de Gaucher, doença de Fabry,
Hurler‑Scheie, síndrome de Hunter, doença de Pompe, doença de Batten, síndrome de Morquio A e
doença de Sly.

As terapias com oligonucleotídeos têm demonstrado eficácia em condições neurológicas raras,


que, com sua força são capazes de atingir alvos que são inacessíveis com as terapias tradicionais.
As terapias com oligonucleotídeos também têm alta especificidade, o que ajuda a reduzir a toxicidade
fora do alvo. Algumas terapias de oligonucleotídeos notáveis aprovadas pelo FDA em 2020 incluem:

• Oxlumo (lumasiran – Alnylam Pharmaceuticals), indicado para o tratamento da hiperoxalúria


primária tipo 1 (aprovado em novembro de 2020).

• Viltepso (viltolarsen – Nippon Shinyaku), uma terapia de salto do éxon 53 para o tratamento da
distrofia muscular de Duchenne (aprovado em dezembro de 2020).

Apesar dos recentes desenvolvimentos em medicamentos órfãos, continua a haver uma grande
lacuna a preencher no tratamento de doenças raras. Um dos principais desafios nessa área continua
a ser uma grande tendência para algumas doenças raras. As indicações oncológicas, por exemplo,
continuam a constituir a maioria das aprovações de medicamentos órfãos. Isso significa que as
doenças raras fora da oncologia ainda não estão recebendo a atenção necessária. Com esse desafio
está uma oportunidade para a indústria farmacêutica colaborar com outras partes interessadas a fim
de buscar terapias com medicamentos órfãos para indicações não oncológicas.

Outra oportunidade no desenvolvimento de medicamentos órfãos está em encontrar características


comuns entre doenças raras específicas ou suas variantes alélicas. Isso envolveria o desenvolvimento
de terapias direcionadas a mecanismos moleculares e fisiopatológicos compartilhados por várias
doenças raras. Isso tem o potencial de facilitar o progresso rápido, permitindo que vários distúrbios
sejam tratados com terapias idênticas ou semelhantes.

127
Unidade II

Resumo

Nesta unidade, foram abordados assuntos relacionados ao desenvolvimento


de medicamentos biológicos, nanotecnologia aplicada a farmácia, cosmética
e medicamentos utilizados para tratamento de doenças raras.

Os medicamentos biológicos são produzidos a partir da purificação


de fluidos biológicos e/ou tecidos de origem animal, ou por processos
biotecnológicos em que células vivas mantidas em laboratório atuam como
fábricas em linha de produção. Ambos os processos requerem cuidados
especiais para garantia da qualidade. Produtos biológicos purificados de
origem animal são produzidos por tecidos e/ou órgãos, sem que exista um
controle restrito no processo de fabricação da substância farmacológica, e,
por isso, devem ser adequadamente purificados. A produção de biológicos
a partir de linhagens celulares é um processo inicialmente complexo mais
bem controlado, e justamente por isso um pouco mais acessível no quesito
de garantia de qualidade. Contudo, não exclui a necessidade de um bom
processo de purificação. Esses processos diferem substancialmente dos
empregados na produção química convencional. São também exclusivos
a cada produção, o que gera por vezes dificuldades e questionamentos de
avaliação de segurança e eficácia.

A nanotecnologia farmacêutica é a área das ciências farmacêuticas


envolvida em desenvolvimento, caracterização e aplicação de sistemas
terapêuticos em escala nanométrica ou micrométrica. Estudos de tais
sistemas têm sido realizados ativamente no mundo com o propósito de
direcionar e controlar a liberação de fármacos. A microencapsulação é
bastante utilizada nas indústrias alimentícia, têxtil, farmacêutica e cosmética
por permitir a proteção de substâncias lábeis e voláteis, o controle da
liberação do fármaco, contribuindo para a melhoria na biodisponibilidade e
a redução da dose terapêutica e toxicidade.

As doenças raras são caracterizadas por uma ampla diversidade de


sinais e sintomas, e variam não só de doença para doença, mas também
de pessoa para pessoa acometida pela mesma condição. O conceito de
doença rara, segundo a OMS, é a doença que afeta até 65 pessoas em
cada 100 mil indivíduos, ou seja, 1,3 para cada 2 mil pessoas. Na União
Europeia, por exemplo, estima-se que 24 a 36 milhões de indivíduos têm
doenças raras. No Brasil, há estimados 13 milhões deles, segundo pesquisa
da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma).

128
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Exercícios

Questão 1. Examine a figura e leia o texto a seguir.


Átomo DNA Bactéria Grão de sal Laranja

10-10 10-9 10-8 10-7 10-6 10-5 10-4 10-3 10-2 10-1

Faixa da
nanotecnologia

Figura 29

Disponível em: https://cutt.ly/OUNWJcb. Acesso em: 24 set. 2021.

Partículas de tamanho extremamente pequeno, com dimensão entre 1 nm e 100 nm, estão presentes
na natureza há milhares de anos. Apesar disso, os primórdios da nanociência são referidos à década de
1950. A nanotecnologia nada mais é do que explorar e aprimorar as capacidades que as nanoestruturas
possuem e lhes atribuir novas finalidades. Compreende design, caracterização, produção e aplicação de
estruturas, dispositivos e sistemas por meio do controle da forma e do tamanho em escala manométrica.

Adaptado de: Disner e Cestari (2016, p. 71-76).

As informações dadas fazem referência a uma área da ciência que tem tido, cada vez mais, papel
importante na indústria mundial e nas inovações em diferentes áreas. Mas como é a relação entre a
nanociência e a farmácia? Avalie as afirmativas a seguir sobre esse contexto.

I – A nanociência tem causado uma revolução na indústria farmacêutica ao apresentar alternativas


muito mais precisas de tratamentos do que os medicamentos tradicionais (intravenosos ou orais).
Exemplos disso são os nanorobôs de DNA usados para o tratamento da leucemia.

II – Uma área dos estudos farmacêuticos em que a nanotecnologia é muito aguardada, mas ainda não
consegue se desenvolver, é a de vacinas. Segundo os especialistas, a grande complexidade de bactérias
e vírus impede que nanopartículas sejam usadas para combatê-los.

129
Unidade II

III – Da integração entre os dois ramos da ciência, nasceu a nanofarmacologia focada, com o uso
da nanotecnologia para otimizar o aproveitamento dos medicamentos pelo organismo. Nanoestruturas
estão sendo desenvolvidas para transportar e entregar medicamentos em locais específicos (por exemplo,
células e órgãos), o que torna o tratamento eficiente, de ação rápida e com menos efeitos colaterais.

Assinale a alternativa correta.

A) Apenas a afirmativa I é correta.

B) Apenas a afirmativa II é correta.

C) Apenas as afirmativas I e III são corretas.

D) Todas as afirmativas são corretas.

E) Nenhuma afirmativa é correta.

Resposta correta: alternativa C.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

Justificativa: de fato, a revolução na indústria e nos laboratórios farmacêuticos já começou.


A nanociência/nanotecnologia desenvolve e utiliza nanorobôs (agentes extremamente pequenos), que
podem ser guiados para células específicas, melhorando a função dos medicamentos e com pouco ou
nenhum efeito colateral.

II – Afirmativa incorreta.

Justificativa: a afirmativa não é correta porque a nanociência também está sendo empregada na
produção de vacinas. Por exemplo, vacinas contra o papilomavírus humano (HPV) e contra a hepatite B
usam nanopartículas semelhantes a vírus (VLPs). Até vacinas contra covid-19 já estão surgindo com
essa tecnologia, usando nanopartículas lipídicas (LNP).

III – Afirmativa correta.

Justificativa: a integração entre a farmácia e a nanotecnologia tem sido muito auspiciosa,


desenvolvendo tratamentos cada vez mais eficientes. A chamada drug delivery (ou entrega de
medicamentos) torna o medicamento sítio específico, ou seja, ele é transportado pelo corpo e chega
diretamente aos locais onde têm que agir. Com isso, o medicamento se mantém estável, com níveis
constantes no plasma e mais eficaz.

130
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

Questão 2. Leia o infográfico e o cartaz de divulgação a seguir.

Figura 30

Disponível em: https://cutt.ly/9Ir5bBy. Acesso em: 24 set. 2021.

Figura 31

Disponível em: https://cutt.ly/LIqLjvm. Acesso em: 24 set. 2021.

131
Unidade II

Considerando as informações dadas, é possível perceber que o diabetes é uma doença importante
no Brasil e no mundo porque afeta grande parcela da população. Contudo, os cartazes de divulgação
e de conscientização da doença concentram-se nos sintomas, e não no tratamento. Com base nessas
informações e em seus conhecimentos sobre a doença, assinale a alternativa incorreta.

A) Diabetes mellitus caracteriza-se por um distúrbio metabólico que gera hiperglicemia crônica e
afeta o metabolismo de carboidratos, gorduras e proteínas. É causado pela diminuição na produção de
insulina ou por algum tipo de prejuízo na ação desse hormônio.

B) Para um tratamento de sucesso, deve-se levar em conta a via de administração, uma vez que a
via escolhida deve ser capaz de reduzir de maneira eficiente e controlada a glicemia, combatendo o
diabetes. Nesse contexto, o uso da tecnologia de formulação e a aplicação de dispositivos corretos têm
papel fundamental.

C) A insulina é o hormônio envolvido na causa do diabetes, e o tratamento dessa doença baseia‑se


na administração de insulina, que é obtida por diferentes técnicas, como o isolamento a partir de
animais ou a preparação por meio de técnicas de DNA recombinante.

D) Para o tratamento do diabetes, a maneira mais tradicional de administração de insulina é por


injeções subcutâneas. Entretanto, há diferentes alternativas que incluem o injetor supersônico, a bomba
de infusão, a administração oral e canetas.

E) A vacina contra diabetes foi desenvolvida a partir da tecnologia das nanopartículas, em que
nanorobôs se dirigem ao pâncreas e passam a ativar e controlar as células desse órgão, responsáveis
pela produção de insulina.

Resposta incorreta: alternativa E.

Análise das alternativas

Ao avaliarmos as alternativas, devemos ter em mente que o enunciado solicita que seja assinalada
a informação incorreta.

A) Alternativa correta.

Justificativa: de fato, o diabetes mellitus é um distúrbio metabólico que causa aumento dos níveis
sanguíneos de glicose e de glicose hepática, afetando o metabolismo de carboidratos, gorduras e
proteínas. Entre suas causas está a redução da produção de insulina devido ao mau funcionamento
do pâncreas. Alternativamente, pode haver produção de insulina, mas sua ação torna-se prejudicada
por algum motivo. Estimativas dão conta de que a doença aumente de 171 milhões (em 2000) para
366 milhões (em 2030), vindo a se tornar uma séria ameaça à saúde da humanidade. No diabetes tipo 1,
há destruição autoimune mediada das células-beta das ilhotas pancreáticas e deficiência de insulina e,
geralmente, ocorre em crianças e adultos jovens. No diabetes tipo 2, há resistência à insulina associada à
produção excessiva de glicose pelo fígado e à utilização prejudicada da glicose pelos tecidos periféricos,
132
BIOTECNOLOGIA FARMACÊUTICA

principalmente musculares. Conforme a doença progride, o pâncreas perde sua capacidade de produzir
insulina, e a necessidade de terapia com insulina aumenta.

B) Alternativa correta.

Justificativa: pensando na via de administração de um medicamento, é possível listar várias opções,


como vias oral, anal, subcutânea e intravenosa. Cada uma tem suas particularidades. No caso do diabetes,
essa via de administração deve ter a capacidade de provocar uma redução eficaz e previsível do nível de
glicose no sangue, diminuindo o risco de complicações da doença. É claro que várias dificuldades têm
de ser superadas com o uso da tecnologia de formulação e aplicação de dispositivos.

C) Alternativa correta.

Justificativa: a insulina é secretada pelas chamadas células β das ilhotas de Langerhans, localizadas
no pâncreas. Quimicamente, é uma proteína que consiste em duas cadeias polipeptídicas, uma de
21 resíduos de aminoácidos, e a outra, de 30, unidas por duas pontes dissulfeto. Foi isolada em 1921
e, no ano seguinte, usada clinicamente. Sua obtenção pode ser feita a partir de animais ou por uma
técnica de biologia molecular chamada DNA recombinante.

D) Alternativa correta.

Justificativa: de fato, o método tradicional e mais previsível de administração de insulina é por meio
de injeções subcutâneas. Contudo, muitos pacientes reclamam por ser muito doloroso, especialmente
para os casos em que são exigidas doses múltiplas várias vezes ao dia. Outro fato associado é de
ocorrência de hipoglicemias após injeções de múltiplas doses de insulina. Para contornar essa situação,
foram criadas aplicações por vias alternativas que acabaram diminuindo o sofrimento dos pacientes
diabéticos, mas que também trouxeram novos desafios aos tratamentos. Entre essas alternativas, está o
uso de injetor supersônico, bomba de infusão, agulhas afiadas e canetas.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: embora haja inúmeros progressos no campo da nanotecnologia que auxiliam


o tratamento de muitas doenças, ainda não existe uma vacina para diabetes que tenha sido criada
seguindo tal metodologia. Além disso, deve-se lembrar que diabetes não é causada por patógeno; é uma
doença originada por mau funcionamento do próprio organismo.

133
REFERÊNCIAS

Audiovisuais

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