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Letras em dia, Português, 12 .

° ano Teste de Oralidade 1

Nome: N.º: Turma:

Avaliação: O(A) professor(a):

Vê atentamente o excerto do debate, no programa Quem fala assim... (RTP), apresentado por Maria
João Seixas, dedicado ao tema «O poeta é um fingidor», e que conta com a presença dos poetas David
Mourão-Ferreira, Manuel Alegre e Al Berto.

1 Nos itens que se seguem, seleciona a opção que permite obter uma afirmação correta.

1.1. Perante a questão colocada pela moderadora, se «o poeta é um fingidor», David Mourão-
-Ferreira
(A) comprova que a hiperverdade é, na verdade, a raiz da dor poética.
(B) sistematiza as principais diferenças entre um poeta e um não-poeta.
(C) defende que a capacidade de transformação do fingimento é, no fundo, o que distingue
um poeta de um não-poeta.
(D) afirma que quem finge apenas não tem acesso à verdade.

1.2. Perante a afirmação de que os poetas têm acesso à iluminação da própria verdade,
(A) o debate segue para uma reflexão sobre a origem da imaginação dos artistas.
(B) o debate segue para uma reflexão sobre a visão privilegiada dos artistas.
(C) a moderadora encontra a concordância parcial dos intervenientes.
(D) a moderadora não encontra a concordância dos intervenientes.

1.3. De acordo com as palavras de Manuel Alegre,


(A) a criação artística teve o seu início com as máscaras usadas pelos gregos.
(B) o desdobramento da alma e a heteronímia são inovações da escrita pessoana.
(C) a heteronímia e o fingimento poético relacionam-se com a própria natureza da criação
artística.
(D) Pessoa tem no verso de Rimbaud, «je est un autre», o espelho da sua heteronímia.

1.4. O texto de Rilke, lido por David Mourão-Ferreira,


(A) questiona a influência das memórias de infância na criação poética.
(B)
LDIA12DP © Porto Editora defende que é preciso entranhar todas as experiências de vida para se ser um bom
escritor.
(C) mostra que um poeta não pode verdadeiramente «sair» da sua vida e das suas
experiências pessoais.
(D) reflete sobre a função do conhecimento, das memórias e das experiências na criação
poética.

1.5. Na expressão «se erga a primeira palavra», o verbo «erguer» significa


(A) «intuir».
(B) «nascer».
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(C) «sugerir». LDIA12DP © Porto Editora

(D) «reconhecer».
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Transcrição do registo vídeo


Maria João Seixas – ... eu gostava muito de conversar convosco sobre o fingimento. E voltando à epígrafe
do programa, à introdução, e ao poema do Fernando Pessoa que afirma, começa por afirmar, que «O poeta
é um fingidor». O poeta é um fingidor, David?
David Mourão-Ferreira – Eu creio que o mais importante nesse poema não é o primeiro verso. Fingidores
todos nós somos. Poetas ou não.
Maria João Seixas – Mas nem todos temos a certeza de que sabemos alguma coisa.
David Mourão-Ferreira – O que é importante é o que vem depois, logo na primeira quadra: «Finge tão
completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente.» Ora, no fim de contas, este
fingimento em segundo grau, porque chega a fingir a dor que deveras sente, transforma o fingimento da
poesia numa hiperverdade, e, por consequência, aí é que é a diferença entre o poeta e o não poeta.
Maria João Seixas – Exatamente, os não poetas são os que não sabem, os que não têm acesso a essa
hiperverdade.
David Mourão-Ferreira – São aqueles que fingem apenas. Aliás, o Pessoa tem, em prosa, outras coisas a
esse respeito que podem ligar-se aos versos da Autopsicografia. Tem uma coisa, por exemplo, que diz «O
poeta menor diz o que julga que pensa».
Maria João Seixas – E a nós, comuns mortais, é apenas possível fingir sobre o que pensamos que é a
verdade, ao passo que os poetas talvez tenham acesso à iluminação da própria verdade.
David Mourão-Ferreira – Não, eu creio que isso não é bem assim.
Manuel Alegre – Eu penso que isso se liga também ao problema de... toda a criação artística é um
fenómeno de heteronímia, não é? A máscara já vem desde os gregos; Rimbaud já disse «Je est un autre.»
(Eu é um outro); Gide disse «A sinceridade deixou de me interessar desde o dia em que cheguei à
conclusão que cada um é aquilo que imagina que é.» Bom, e, aqui, é o problema do Pessoa: é-se e não se
é. E toda a criação artística parte do que se há e da imaginação do que se há, de tudo isso, do fenómeno de
heteronímia e do desdobramento, de máscaras, de persona.
Maria João Seixas – É um reino muito especial. Se me permitem interpretar aqui aquilo que é, penso eu, do
domínio público, as pessoas imaginam que sobre os poetas, no momento de inspiração, desce uma luz
especial que os leva ao verso, e eu pedi ao David, que teve a amabilidade de aceitar, que nos lesse um
texto d’Os Cadernos de Malte Laurids Brigge, do Rilke, sobre o qual gostaria que conversássemos a seguir.
David Mourão-Ferreira – Tenho muito gosto em ler o texto, mas depois tenho várias observações a fazer
sobre este mesmo texto.
Maria João Seixas – Venham elas.
David Mourão-Ferreira – Diz o Rilke: «Por amor de um verso, têm que se ver muitas cidades, homens e
coisas, têm que se conhecer os animais, tem que se sentir como as aves voam e que se saber o gesto com
que as flores se abrem pela manhã. É preciso poder tornar a pensar em caminhos em regiões desconhecidas,
em encontros inesperados e despedidas que se viram vir de longe, em dias de infância ainda não esclarecidos,
nos pais que tivemos que magoar quando nos traziam uma alegria e nós não compreendemos (era uma
alegria para outro), em doenças de infância que começam de maneira tão estranha com tantas transformações
profundas e graves, em dias passados em quartos calmos e recolhidos e em manhãs à beira-mar, no próprio
mar, em mares, em noites de viagem que passaram sussurrando alto e voaram com todos os astros, – e ainda
não
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© Porto bastante poder pensar em tudo isto. É preciso ter recordações de muitas noites de amor, das quais
nenhuma foi igual a outra, de gritos de mulheres no parto e de parturientes leves, brancas e adormecidas que
se fecham. Mas também é preciso ter estado ao pé de moribundos, ter ficado sentado ao pé de mortos no
quarto com a janela aberta e os ruídos que vinham por acessos. E também não é ainda bastante ter
recordações. É preciso saber esquecê-las quando são muitas, e é preciso ter a grande paciência de esperar
que elas regressem. Pois que as recordações mesmas ainda não são o que é preciso. Só quando elas se
fazem sangue em nós, olhar e gesto, quando já não têm nome e já se não distinguem de nós mesmos, só
então é que pode acontecer que, numa hora muito rara, do meio delas se erga a primeira palavra de um verso
e delas saia.»
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Soluções do Teste de Oralidade 1
1.1. (C); 1.2. (D); 1.3. (C); 1.4. (D); 1.5. (B).

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