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EDUARDO LOURENÇO

PE55OA
REVISITADO
Leítura Estruturante d,o Drama em Gen

j \s
\

RIO DE JANEIRO
TINTA-DA-CHINA
MMXVII
I
CONSIDERAÇÔES POUCO
OU NADA INTEMPESTIVAS

0 que é precíso é compenettoníLo-tuos de que, na


leitura d,e tod,os os lirros, deeenos seguit o autor e

nõ,o querer que ele nos siga,

A. Mou

Le génie est une classe fonnée d'un seul ind,ieíd,u.


G. Becxrunn

O autor deste ensâio' toma â sério e em toda a sua exten-


são a ideia de que Pessoa é uma nâtureza genial. Quem
conhece a exegese suscitâda pela obra do Poetâ sâbe que ruruffiffi!t!fl
esta ingenuidade não é comum. Não ignorará também
que a aparente facilidade dessa âceitação não resolve

I
questão alguma. É só uma exigência, na verdade teme-
rosa, de suportar o peso dessa convicçâo e os encargos a
que obdgâ. Toda a nossa leitura não será outra coisa do
que reiteração permanente dessa ingenuidade basilar.
Ela signifrca que vemos no "verbo" de Pessoa, mormente
naquele que conhgurâ e plasma com mais irrecusável ful-
gor essa "genialidade", uma espécie de luz ou de fogo que

r A ideiâ centml dcst€ €nsaio, P€ssoo À€ur.6irodo, foi exposta pelo âutor numâ
conlerência do CiÍcuio Cervântes", deNice, €m Mâio de 196?. (X. do.4.)

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I
f,DUARDO LOUÂNNçO P!SSOA RTVISITÁDO

ilumina e transfrgurâ a realidade, tâl como ela se apre- Ou sobre estas:


sentâ antes e fora dessa iluminação. Altes mesmo de
saber com o máximo de plenitude o que os poemas de Súbita mào de algum fantâsma oculto
Pessoa sdo, aparecem nos orig.inalmente como a luz na Entre as dobras da noite e do meu sono
qual nos é dado ver o que até eles não úamos. Assim, os Sacode-me e eu acordo, e no abandono
poemas se instituem como em todos os grandes poe Da noile nào eru<ergo geslo ou !,ulto.
-
tas os guias de quem os comenta, pois é por eles serem
-
obra e acto de génio que o leitorse descobre leitorde poe- Mas um terror antigo, que insepulto
mas e passa da relativâ treva espiritual que lhe é própria à Trago no coraçâo, como de um trono
mais funda claridade. Ora um crítico nâo é nuncâ outrâ Desce e se afrrma meu senhor e dono
coisa que o leitor
- mesmo o crítico dos seus próprios Sem ordem, sem meneio e sem insulto
poemas de um verbo genial ou pela genialidade tocado.
O crítico que se não ilude sobre a natureza dos seus pode- E eu sinto a minha vida de repente
res, é antes de tudo o que distinguiu, e em seguidâ com- Presa por uma corda de Inconsciente
preendeu e integrou no horizonte que ihe convinàa, 'ã luz A gualguer mão nocturna gue me gura.
nova" que o genio representa. Em suma. e apenas. aquele
que foi descoberto e âberto por ela, e cujo dever, daí em Sinto que sou ninguém salvo uma sombra
diante, será o de a comunicar, de ser seu apóstolo, sem De umvulto que nâo vejo e que me assombra,
jamais esquecer a distância que dela o separa. Suponha- E em nada existo como a treva fria.3
mos um leitor que certo dia cai sobre estas linhas:
De duas uma: ou essa Ieitura não o subtrai à tranquilidade
Não meu, nâo meu é quanto escrevo molna da sua existência, inscrevendo-se apenâs nela
A quem o devo? como uma "informaçào" suplementâr, ressentida acâso
De quem sou o arauto nado? como uma banalidade; ou essa leitura arranca o espirito
da sua clarldade habitual, entenebrece-o, destilando um
Por que, enganado, parror feliz na falsâ infinltude da sua consciência sonâm-
Julguei ser meu o que era meu? bula. Só neste último caso o poema existe, abrindo em
Que outro mo deu?" nós avenidas para nenhum jardim, inundando de luz
nenhum espaqo que possa ser nomeado mas de tal modo
2 Obm Poétíca. p.96.Salvo indicaçào conrrária, rodas as citaçôes dos poemas de
Pessoâ são extmidas da ediçáo da sua Obrdpodrico, €ditoraAguitar, Rio deJaneiro,
r960, orgaDizàdâ por MariâAliere Dore6 Galhoz. Será designâda por O.p
3 o.P p 5?

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PXSSOA ntrVl SlraDo

que claramente percebemos que devimos ourro, quer seria absurdo não aplicar um princípio geral de exegese
dizer, o mesmo, mas como iluminado por dentro e sem poéticâ justamente àquelâ poesia cuja essência implica
fim. É a "joy for ever" de Keats, a existência do poema em no seu criadorum máximo de autocompreensão. Decerto,
nós e nós nele. Mas se assim é. se nós devemos uma mais como a toda a gente, a maquinaria fantástica dâ heteroní-
alta existência, ou existência outrâ, como dizia Bergson mia, a glosa superlativa e inconclusa de que foi alvo e que
â propósito da música, a essa realidade que nôs ârrâstâ confrscou em seu proYeito a âtenção devida à "poesia" de
para o seu círculo e nos domina libertando-nos, como Pessoa, como o sublinhou com irritação Casais Monteiro,
pretender jamais situar se num ponto que a domine a não deixou de criar perplexidâde. Mâs sempre Pessoa e
ela? Náo há génio crírÍco, mesmo o do critico de génio. o que se costuma considerar como as suâs "antinomias"
Que dizer dos que o não são? Por ser poema (na medida ou "contradições" ou paradoxos, ou mesmo aberrações,
em que realmente o é...) o poema tem sempre "razão", se nos pârecerâm mais luminosos que as considerações em
é a tentação de lha exigir cJue está em causa. Mas mesmo torno deles. Quanto a essa poesia mesma, poucos críti-
fora dele, o discurso daquele que noutra esfera se nos cos, talyez só dois (é verdade que poetas também) sou
revelou capaz de génio deve suscitar, quando se esboça a beram subtrair-se, ao menos em principio, ao alegado
tentaçâo de o declarar ininteligivel, incoerente ou nulo, caos da complexidade de Pessoa que é inteligivel e ao dos
um salurar reflexo de humildade. E sempre plausnel que comentadores que o é menos, declarando em suma que a
essas "razões", que tão caducas ou insólitas nos pare sua poesia é demasiad'o clara. José Régio oinsinuou sem-
cem, tenham razões que a nossa mais modesta razão de pre, como forma de a neutralizar e António Ramos Rosa
criticos desconhece. Uma obra de génio náo é um pasto com clara perspectivação a paftir de um horizonte cul-
todo preparado para a ruminaçâo obrigatória da "cul tural de mais radical hermetismo que aquele que serye a
tura". É um desafio, é âté um precipício para quem não Pessoa de matériâ poética mas não de obstáculo puro. De
tem asas para atravessar o natural abismo que ela repre- uma maneira geral, toda â poesia é a mais alta "claridade"
senta, como escreveu Nietzsche. E em princípio ninguém de uma época e no seu espelho é o restô que é obscuro'
as tem quândo o génio aparece, salvo os que consentem Mas Ramos Rosa quis apenas sublinhar que os comenta-
em o atravessar servindo se das asas dele. dores se perdiam numa complexidade secundária, pro-
Não temos nem queremos outro guia que o próprio curando nela a chave de uma outra, a poétíca, a qual não
Pessoa. Recentemente, um dos seus clássicos exegetas é precisamente complexa, se por tal se entende a arqui
admitiu a hipótese de ser ele o seu mais lúcido comen tectura e o corlo mesmo dessa poesia. Ramos Rosa tem
tador. É o que alguns sempre pensaram, em particular razão. Apoesia de um Sá Carneiro é bem mais irredutivel
Casais Monteiro e Jorge de Sena. que nâo por acaso sào e inexplicável que a de Pessoa e por isso mesmo um Régio
poetas e posteridade autêntica de Pessoa. Quanto a nós, a terá como superior a ela. A verdade é que não estão

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EDUAADO LOUBENçO Pf,SSOA RÃVISTTADO

situadâs no mesmo plano. A genialidade de Sá-Cameiro


nhia que nós com terror e alegria nos perdemos. Não são
situâ se ao nivel "ôntico", é a sua imaginaçâo deflagrada tais labirintos "literaturâ", e muito menos "de literatura",
colhendo em acto âs imagens fulgurantes nascidas do
e só exteriormente o são até de poesia que quando o é da
corpo â corpo com a realidade imediata da sua sensibi-
extremada forma que em Pessoa recebeu, é, na verdâde,
lidade ou dos desenhos dela na aresta dos dias. A de Pes-
aventura sem nome próprio.
soa situa-se imediatamente ao nivel do "ontológico" (é Não é necessário ser criador de poemas parâ serpoero
ontologia em acto), sendo como é, pura e interminável no sentido radical que nós lhe damos, e Pessoa lhe dava.
interrogação sobre o ser múltiplo dâs "verdades" ou das
Tomás de Aquino escrevendo milhares de páginâs de uma
"vivências" em que o pensar nelas as converte.
claridade soberânâ e considerando-as "palha" não está
O poeta é aquele que escolheu ter um ser através da longe de Rimbaud silenciândo âpós as queimaduras de
sua linguagem. Isso pressupôe que a linguagem possa
uma Soison en enfer. Fernend,o Pessoa, que muitos con-
dizer o ser. Por essência a poesia nunca duvidou disso, ou
sideram o maior dos nossos poetas modernos e um dos
duvidou afirmando-se através dessa dúvida. A suprema
maiores do século ro<, não pensou nunca que aquilo que
dúvida a êsse respeito chama-se Mallarmé mas nele rela-
ele buscava tivesse llnâlmente tomado forma nospoemos,
ciona se com a máxima exigência pedida à Poesia: ser em que nós, seus leitores, usufruimos aquela espécie de
"explicaçâo órfrca da Terra", quer dizer, verbo criador do
vítóría em q:ue ele não pôde nunca crer até ao fim. Pessoa
ser. No deserto desta dúvida e no esplendor futuro de a
negar, se situa a clara e míticâ âventurâ poética de Fer-
nando Pessoa. Se as poesias de Pessoa e a sua actividade
global nos parecem instílíras ou ininteligíveis ou contradi-
não escreveu para vencer qualquer coisa de nomeável,
mas para nomear aguilo mesmo que visionado determi-
nou o fabuloso Iracasso de que ospoenios sâo o lugar e o
ilLl
signo de uma redenção sem redentor.
tórias é porque nelas tem lugar efectivamente o combate A mesma âventurâ aconteceu aos grandes poetas
peio máximo de claridade de que a linguagem foi objecto
modernos. Pode pensar-se mesmo que a mod,emid,ad,e
entre nós - e não só entre nós e que a consciência do
- é precisamente o fracasso transfigurado, tâl como em lt
Poeta se fracciona e se une em funçâo desse desejo demo-
ordens diferentes Mallarmé e Rimbaud o encarnaram.
níaco ou celeste de uma total autotranspârência. Como
Somente, em Pessoa, a extensão do desastre atingiu a raiz
não conhecemos Lugar algu.m em que a autotransparên-
do projecto poético, impedindo-o, no sentido comum do
cia se tenha revelado sobretudo não a conhecemos sob ffiffiffi1t!tililt
termo, de ser urn poeta. O seu fracasso clamoroso - e sem
a forma "crítica" o mais prudente é consentir receber
exemplo - consistiu em se converter, por impotência, ao
do monstruoso combate de Pessoa por ela a luz propí- mesmo tempo ocultada e transcendida, em edríos poetas
cia para percorrer com algum sucesso labirintos que ele
responsáveis por visões do mundo à primeira üsta diver-
mostrou não serem só dele, pois é neles e na sua compa-
gentes, suscitadoras de formas igualmente distintas.

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?XSSOA RIVISITADO
EDUAADO LOURINçO

r.in digno das melhores peças de Pirandello, os primei-


Como é universalmente sabido, o próprio poeta crismou
roli intérpretes tentaram tudo o que estavâ em seu poder
â sua aventura d,e heteronírnia, distingrrindo - a, a justo
pura reduzir a esÍronheza desse desdobramento artístico.
titulo, da mais comum pseu donímia. Com efeito, a hete-
ronímia não se distingue da pseudonímia como o mais do liala red,uçdo tomou três direcções principais, mas frnal
rnente complementares: a primeira consistiu em encon-
menos. Há entre elas uma diferença de estâtuto, por con
trar na vrlda do Poeta, nâ sua psicologia real ou suposta, as
seguinte, de significação. O autor nâo esconde um mesrno
motivações dessa diversifrcação em poetas, característica
terto sob nomes diferentes: ele é çá,ríos ourores âpenas e
da sua criação literária; a segunda, em mostrar, através da
na medida em que é eó,rios tertos, isto é, textos que exiSem
análise de cada um dos poetas que Pessoa pretendeu ser,
vários autores. Tem sido o exame desta famosa heteroní
que a apregoada autonomia não resiste a um exame, nem
mia e da sua significação enquanto momento espectacu-
dos temas, nem das particularidades estilisticas; a ter-
lar da história da consciência moderna o que sobretudo
ceira. {rnalmente, reenvia essa estranàeza, diagnosticada
tem interessado a mais estruturada exegese de Fernando
como simples difracção de um comportamento histórico
Pessoa. A pontos de não poucas vezes a poesia ter ficado
absurdo caracteristico de uma classe sem futuro inteligi-
sepultada sob o coso, como sucedera outrora com Antero,
vel para essa mesma história de que é reflexo. Assim se
mas em escala âindâ superior. Alguns pensarão que é já
utilizaram as três perspectivas que, segundo o autor da
tempo de considerar essa poesia em si mesma, inde-
"Nova poesia portuguesa no seu aspecto psychologicoa"
pendentemente do modo da sua aparição e do jogo por
se impõem na análise de uma ol:ra: apsicológtca, à Líterd-
ela criado. Infelizmente, esse radicalismo, teoricâmente
rta, a socíológ'tca, respectivâmente representadas por João
possível, tem-se revelado, no caso de Pessoa e na fraca
Gaspar Simões, Jacinto do Prado Coelho e Mário Sacra-
medida em que foi tentado, uma fonte suplementar de
mento. Por maiores que sejam as diÍerenças entre elas
equivocos. A compreensão da poesia do autor de,4 Tabo-
(e cada uma participa em grau diverso das três perspec-
canio e a do jogo heteronimico vâo de par. E não é senão
tivas) uma coisa as uniftca: mau grado o contributo his-
por terem falhado ou unilateralmente terem compreen-
dido este último que os exegetas dâ primeira nos têm ofe-
tórico que cada uma representa e as inúmeras questÕes
que debateram ou resolveram em relaçâo à génese ou
recido uma interpretação global do universo de Pessoa
interpretação dos poemas, mau grado mesmo a subjec
que merece e deve ser "reüsitada", mau grado â contri-
bulção substancial e os pontos de vista já "clássicos" dos
tiva vontade de tentar erguer um monumento ao Poeta
(salvo Mário Sacramento), tido como "genial", o perfrl
mais conhecidos dentre eles.
Surpreendidos pelo fenómeno ,ürerdrio insó1ito de último que dâ suapoesio (e mesmo do homem) se destaca
umâ constelâçâo de poetas, reivindicando pela boca
do seu criador ou deles mesmos um direito à existên 4 In A/guio. :.'série, r9,2, p.86

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XDUÂRDO IOURf,NçO PESSOA REVISITADO

é, paradoxalment e, negatíeos. De uma maneira, por âssim riu (liânte da instância crítica. É Pessoa qr"- deve prestar
dizer, Iatal, passou-se insensivelmente do campo da aná- rnntas â propósito da sra estraruheza, tid.a ü príori corno
lise da heteronímia ao do seu desmascaramento, já com rlualquer coisa de que o autor se deve justifrcar. Curiosa
forte coloraçâo pejorâtivâ e, em seguida, à desmistifrca- rnente (mas não é assim em toda a critica humanista?) a
çâo não só do jogo heteronímíco como do processo poético interrogaçâo literária subentende um horizonte demora-
que ele estrutura, frnalmente submetido a uma espécie de listas e é o niih,sm,o de Pessoa ou o que os seus críticos
d,esmítr,fi,caçd,o. Tudo se passa como se os criticos, incons üBtiim bâptizam - que deve responder diante do tribunal
cientemente, tivessem querido punir Pessoa de ter levado da Sinceridade, da Ordem Moral, da Ordem ldeológica.
consigo a chave de um labirinto onde eles se perdem. É possivel que a Poesia tenha de comparecer diante des-
A exegese psicologista, a quem se devem intuições capi- ses tribunais todos. Mas antes convém realmente sâber
tais, acabou desesperâdâ por englobar a criação inteira de se aquilo que ela é não os anula ou os torna inadequa-
Fernando Pessoa num processo de outomífirtcaçd,o; a arrá, dos. Talvez que antes de gu€sÍionor Pessoa e de ohrigá Io
lise estilística psicologista, mais cautelosa, contentou- a explicar se, se deva começar por aceitá lo na sua esrro
se com pôr em evidência as conúradiçôes inerentes a cada nheza, Íeal ou aparente, preferindo interrogârmo - nos a
um dos poeios que constituem Pessoa, distinguindo no respeito dessâ estrânheza, buscando compreendê-la no
jogo da sua criação, com real acuidade, camadas de rea que é e signifrca, em vez de querer, antes de tud.o, reduzí-
lidade e valores poéticos comuns; frnalmente, a análise -lo. Tanto mais que se trâta de poemos, por conseguinte
sociológica, hábil e por vezes âdmirável na discrimina- de uma palavra que tem em si mesma a sua plena e inteira
ção dos espeihismos provocados pelo jogo heteronímico, justifrcação, palavra por essência sem erterior diarúe do
assimlla o com excesso a um processo real e à manifesta- qual possa comparecer6. Que uma ciaçõ'o poética - tid.a
ção tópica de um'ãbsurdo" que por nele efectivamente se por tal pelo seu exegeta possa merecer o nome de auüo-
"jogar" já dele se separa. mistiftcaçõ,o, é um puro contra- sentido. Mas que a mesma
Na realidade, e por diversâs que sejam em profundi criaçâo possa relevar da contrad'íçõ,o ou do obsurdo nào é
dade, subtileza ou coerência, estas três formas de inter- mâis aceitável. A única contradiçáo ou absurdidade que
pretação, momeltos densos e estruturâdos de outras pode alectar uma produção poética é a da sua nulidade,
mâis correntes que as ecoam ou delas se distinguem mal, mas essa suprime a questão, todas âs questÔes.
têm algo de comum'. todas interroganu Pessoa, todas pôem Se Fernando Pessoa e os seus heterónimos nâo cons
ao poetâ e à sua criação quesúôes que sâo mâis delas que tituem, a não ser numa ópticâ meramente anedótica, o
dele, todas o convocam com um máximo de boa consciên- caso tero,tológico que â crítica humanista nos apresentou

S V. notâA no fimdo volune (p. a35). 6 V€rnota B. no frmdovolume (p.248)

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EDUARDO LOURENçO Pf,SSOÁ ÀXVI SITÂDO

espécie de bezerro de cinco patas da criação poética lnfelizmente, e na aparência com justifrcâdos moti
a verdade é que o universo que constituem é sufrcien vos ou natural tentâção, o objecto p meiro da exegese
temente insólito para que nos interroguemos a seu res- de Pessoa nào foi a sua poesio múltipla, mas a reldçõ,o
peito. Mas devemos fazê-lo sem minimizar a dificuldade d,essa múltipla poesiü com os seus mítícos (e reaís) autores,
buscando numa vida mal inventada ou mal sonhada. o que mergulhou toda a critica numa miragem criadora
as câusas e as motivações que uma vez descobertas nos de miragens, fonte de uma perplexidade insolúvel e sem
poriam ao abrigo desse insólito em funçáo da qual as cessar renascente. O que foi tomado realmente a sério (e
buscámos. Do mesmo modo, devemos resistir à tenta- isto perpetuará até ao juízo fi.nal o sorriso mudo do Poeta)
ção de nos desembaraçar da singularidade do mundo de nâo loi â silcnciosa a u lono mia dos poemas no seu coniunlo
Pessoa oferecendo-lhe como espelhô a luz trivial e cega com o jogo que entre si constituem, mas Alberto Caeíro e
de uma visão de boa companhia, onde justamente não Reis e Campos, considerados corr,o üutores reoís dos poe-
há lugar nem para â sua compreensào nem para a rom- mas que Pessoa a justo título lhes atribui (e só ele o podia
preensáo de coisa alguma. Não temos de alinhar obri- fazer... mais a mais tendo explicado até à saciedade qual
gâtoriamente Pessoa pelos seus criticos, baste-nos ô era o género de cordão umbilical que os ligava ao "sujeito
aproximarmo-nos da sua própria luz, a única que jus criador" de todos). Como ourores reais seriâm dotados
tifica a nossa rlémarche e cuja estranheza - umâ vez de uma personalidade e de uma vocação cuja coerência
que se trâtâ de Poesia e nâo de outra coisâ nâo pode se devia exprimir nos poetnas que cada qual subscreve.
ser estranha, em sentido banal, senâo à superfície. Se Daí nasceu um teatro em segundo grau (personalizando
"estranheza" há nela e bem a desejariamos poder cir na pura arbitrariedade um "drama em gente" assim des
-
cunscrever aqui é uma estranheza objectíva, quer dizer, locado para sempre do seu centro próprio) conYertendo
que se lê e recorta no mundo da cultura ou a ele reenvia, os âutores ficticios em críadores d,e Poemas quando só os
não somente porque Pessoa é grande poeta, mas por poemâs são os cniodores dos autores f,ctícíos. Na exegese
que â suâ aventura tem dentro dela um perfil incomum. universal de Pessoa os poemas-Caeiro, Reis, Campos são
A soluçâo que Pessoa encontrou para as suas difrculda sombro de seus ficticios pais quando só o inverso é evi
des pessoais, espirituais e literárias - a famosa prolife- dente. Aberto Caeiro, Reis, Campos, mas igualmente
raçdo em poetas só nos interessa na medida em que é, Fernando Pessoa "ele mesmo" são só (e que outrâ coisa
de principio a hrr,, críaçõ,o poéttca. lsto basta para nos poderiam ser?) os seus poemas. As biografras imaginárias
libertar do dever imaginário de ter que julgar e muito (mas de modo algum arbitrárias) que o seu criador com
menos justifrcar â estranheza e o insólito inerentes ao tanta aplicâçâo e gozo íntimo lhes atribuiu prolongam o
seu caso, uma vez que, seriamente falando, só a Poesia acto criador dos poemas, com ele se relacionam' mas dele
]Íf,es,Írando é estranha. se destacam como leitura desses poemas já de{rnitivamente

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I
f,DUÂÀDO LOUÀENÇO Pf,SSOA AEVI SITÂDO

/oro do seu criador. É um segundo estádio de distancia- vnl. É a partir dela que Casais Monteiro formula ques-
mento em relação ao que deu oligem aos poemas-Caeiro, lôcs como estâ: "Mas esses poetas nâo existem? Ou que
Reis, Campos e por isso mesmo cada um dos heteróni_ oriotência é â deles? Bem, não existem, e o problema está
mos não pode ser utilizado como objectivação cómoda (e prccisamente agora em sabermos se Fernando Pessoa
ainda por cima com a chancela de pessoa) da consciência
lcria escrito as obras por eles assinadas no caso de eles
ciadora dos poemas, servindo como serviu para julgar nâo existirem. É de notar que nenhum deles nos dá teste-
ou compreender 6 poemas na sua luz póstuma e fatal_ munhos, nos poemâs que âssinâÍâm, de qualquer tempo
mente distinta deles como jogo sobre eles que é. Casais oujo correr â obra espelhe, de qualquer evolução que tes-
Monteiro foi o primeiro crítico que se espantou e que tcmunhes." Depois de tão agudamente ter posto o dedo
estigmatizou a confusão, ou antes, inversão de relaçôes,
na feridâ vemo-lo prisioneiro do que denunciou epronto
escrevendo, emlora timidamente, que os retratos (de o assínalar estra,nhezds, óbçias em obras d,e poetas reaís,
Caeiro, Reis e Campos) foram feitos para as obras e não noquelas que ele mesmo d,esr,gna ímplicitam,ente corno obra
estas para aqueles: "Parece-me gue competiriâ ao crítico
em segundo grau. Quer dizer, e à parte o seu instinto de
Íazer incidir antes a sua investigaçâo sobre uma contradi_ poeta que nunca lhe consentiria seryir-se dessas obser-
ção de que nâo fala, e de que ninguém, creio, falou ainda; vaçôes pâra fazer o processo dos poemas, vemo-lo enre-
com efeito, mesmo com todas as desconfianças, não dado num tipo de exegese como o dos criticos que tanto
houve quem pusesse em dúyida a legitimidade da identt_ censurou e obrigado como eles â justificar, embora com
ficaçd,o retrato e bíografi,a d,os heterónimos com. as respec_
d,o
extrema lucidez, o fantasma do artífuio integral da poe-
tivas obrast." E muito justamente sugere que se desconfie
sia de Pessoa. Não é sintomático que um tâo grande poetâ
antes de famigeradas "biografias", que diz sumárias, de e crítico venha a escrever, como qualquer dos clássicos
Caeiro, Reis e Campos, do que das suos obras. Sublinha- intérpretes que ele recusou, frases como esta: "Caeiro
mos suos porque, mau grado estas lúcidas observações, ao identifrca-se com a natureza. Por isso a sua poesia é âfir-
fim e ao cabo, o próprio Casais Monteiro não pôde desen_ mativa, positiva, e evidente, como um fruto"e?
vencilhar se da teia que a confusào por ele denunciada já Esta "queda" obriga â reflectir. As perplexidades de
havia criado. A sua perplexidade vai deslocar-se da rela- Casais Monteiro provam que não é sufrciente denun-
çào Caeiro- "poemas- Caeiro" e congéneres, por ele sus- ciar o ingénuo realismo que consiste em atribuir con-
peitada, para a de Pessoa e os mesmos autores-Í-rctícios, sisrêncio à Írcção em terceiro grau que sâo Caeiro e os
reconstituindo â outro nível a mesma tramâ inextricá_ outros heterónimos enquanto "personâgens". A ficção em tffi[[[ffi[[ililil

? Adollo Casais Monreiro, Estud.os sobre a poesia de Femand,o pessoa, ed.


Agoiar,
Rio deJan€iro.1958, p. r89. Os itáiicos são nossos. Ot€xtode Casais
cluido nos ,srudos
Montei; in B Á. C. M-, oà. .ir.. p- Bz
á d€ r 9 S,: E. P. e a Crítica.
9 Id., iôid., p. 96.

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I
XDUARDO IOUBTNçO PESSOÂ REVlSITÂDO

llnnlrtr' nos-ia, pois, trâtar cada um dessespo€'as como


é
segundo grau que são os poernds que levâm o nome deles
vezes
tem a consistência necessária para relançar uma ques- hôhito trâtar âs/o ses ot fllaneiras diferentes, tantâs
tão na aparência suprimida. Casais Monteiro suspeitou lrruonciliáveis, de muitos poetas que nunca pretenderam
e bem (mas apenas de viés) a relação óbvia segundo a ra!r 9órúos. Assim economizaríamos uma questão que tantâ
geral crítica entre os heterónimos mitos e os respec- í tÀo equivocada tinta tem feito correÍ, a dahetercnímío"
tivos poemas pârâ assim desdramatizar e se possível cor- A verdade é que se adoptássemos tão razoável ponto de
tar pela raiz o espelhismo de que a questâo obsessivâ da virta arriscar- nos -iamos nâo só a falhar a possível com-
heteronimia tem constituído. Há um só Poeta, autor de preensão dos rnunrios Poéticos qru,e são
"Caeiro", "Reis"'
poemas de apârência diversa gue como tais devem ser
t'Cr-po."'", como a perder sem remédio o sentido global
tomados e compreendidos, e acâbou se. Que a questão da aventura criadora de Pessoa. Não é possivel, ou seria
resiste e muda de aspecto mas nâo de essência já nós o complicar inutilmente uma tarefa já imensa, alinhar num
ümos, mostrando o autor de "Voo sem pássaro dentro" mesmo nivel as diversas manifestações de Pessoa, nem
esquecido de que Caeiro é sô os poemas e neles incluso, pô-las lado a lado para as comparar como se no mesmo
e essencial, o lâço gue os prende, e permite lê-los na luz nlvel estivessem, pela simples razâo de que constituem
que por isso mesmo exigem (laço dialéctico e irónico) tm puzzle, mas um "puzzle" singular, orientado e estru-
ao seu críadot qte nã,o é evidentemente Caeiro, mas a turado fora das duas dimensões habituais Uma dimen-
voz que articula "O guardador de Rebanhos" a quâl como são de precedência ontológica e de algum modo de ordem
veremos está muito longe de "se identifrcar com â Natu- temporâl e por isso irreversíveL, comanda e organiza do
reza". É altamente significativo que um espirito como interior o sistemâ inteiro. À sua maneira, cada uma das
Casais Monteiro não tenha podido ater-se a essa ideia, criticâs mencionadas já se apercebera que não havia lei-
na aparência aceitável, da rejeição coerente dos heteró tura, autónon1a de cada uma dessas manifestaçôes hete
nimos, tomando a sério o que a sério deve ser tomado, ronimicas. Nem podiam não â ter visto, pois é assim
a saber, que esses heterónimos não têm outra realidade que Pessoa âs apresenta. Mas essa constatação náo foi
que a poesía que sd,o. Nâ verdade, à primeira vista, nada suficiente para organizar a leítura global que implicam'
parece impedir que nos contentemos com a apreensão e muito menos para discernir a d,ialéctica interior que
das diversas faces d,e w úníco Pessoa, tomando-as como comanda as relaçô esnõ,o uníeocas Írem re'ersíeeís entre os
elas devem ser tomadas, quer dizer, como poemas e não heterónimos. O "puzzle" foi apercebido na sua imediata
comopoetas. Em suma, não teríâmos de entrar no próprio realidade de "unidade fragmentada" de molde a deixar
jogo de Pessoa, emprestando aos diversos mundos poé
ã heteroDimia
ticos subscritos por Caeíro, Beis, Campos, esse género de ro Acâso o único Processo de corÉtruirum di§curso coerent€ sobre
o de escrever senp.e o§ heteródmos" com aspas e os pseudo âutores
Êejâ Poerlâs
autoruornia poétíca que o seu irónico criador lhes atribuiu. sm ela6. rus recuámos diante dâ ü§âo tipográÊcâ criàda por tâl decisão- '

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I
XDUAÀDO LOURINçO PESSOA RÍVISIlADO

entrever as linhas de força de ordem psicológica ou esti r,lrrt:itlaçâo pertinente, ou pelo menos, formalmente plau-
listica que permitem reconstituí-la, o que só é possíyel na xiv r:l , da génese da heteronímía , toda a leitura de Pessoa que
(está) hipotecada'
hipótese de situar os heterónimos num espaço de estm- lxrr tê-la ori$inado nos interessa, fica
turâ reversivel, por assim dizer, de idêntico peso onto- (llalo que entendemos essa "génese" de maneira bem
lógico. A esse preço, a aparência de dialéctica que pôde rlivcrsa da já tentada, com maior ou menor sucesso, pelas
âlcânçar-se não ultrapassou o nível de uma exterioridade vias da psicologia bânal ou profunda, embora não seia sem
essencial. Viu-se o que aproxima ou apârtâ Caeiro de inleresse receber dela alguma luz incidente ou confrrma-
(para nós) é a que nos conduz dos
Campos ou Campos de Reis ou Reis de Caeiro mas não o çâo". A "génese" óbvia
nexo orgdníco que os afiicula numa totalidade que os não Lc:ttos Pessoa anteriores à criaçào heteronímica aos tertos
deixa ler na sua ideal autonomia, mas sem a presença da lftLet onímícos. Génese que nos conduz dos primeiros aos
qual nem a autonomia aparente é susceptível de leitura, ltcgundos, mas igualmente nos reconduz dos segundos aos
O equívocooriginal- e sem cessar reassumido, mesmo primeiros e com mais necessário impulso, pois é neles
descontando a assimilação "personagens poemas" que (foi neles) que primeiro descobrimos essa rupturo' cujo
nunca Íoi total consistiu em tomar Caeiro, Campos e esclarecimento constitui questâo.
Reis comoy'agrruentos de uma totalidade que conveniente Não é aqui lugar para detalhar o processo desse escla
mente interpretados lidos permitiriam reconstituí la ou
e recimento genético, levado a cabo em mâis vasta obra a
pelo menos entrever o seu per{rl global. A verdade é mais publicar. Esse esclarecimento repousa lundamental-
simples: os heterónimos sdo a totalíd.ad"e fragmentad,a e mente sobre a préviâ e ingénua aceitação das múltiplas
nenhuma exegese por mâis hábil ou subtil a pode recons- auto explicações de Pessoa e em pafticular do celebér-
tifuir a partir deles. Por isso mesmo e por essência não rimo Íragmenlo da sua carta a Casais Monteiro acerca da
têm leitura Índiuídual. mas igualmente náo têm d"íaléctica "génese da heteronímia e da criaçâo dos heterónimos"'"'
senâo na luz dessa totalidade cle que não são parr€s, mas
plurais e hierarquizadas maneiras de uma única e deci-
rr Lenbrar€mos enpanicLrlar' pelâ hnura e pela Prio ridade, âsque Casai§ I'{on
siva frâgmentâção. Da clara percepção do fenómeno se teiro (en r942) e loel serrào (en r944) propuseram. um no prerácio à suâ hi§tóri
ca Antologa de Pessoa Gà. Confluê ncia) , ourro no prelãcio à CorresPonddnc'o
P€ssoo-
deve esperar o frm dos espelhismos falsamente pirânde-
Ilianos a que a heteronimia se tem prestado. A totâlidade Esle ensâio ile releitura de Pes§oã supÔe, naiuralmente. o conhecimento das
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fragmentada que os heterónimos sdo nào e uma quimera outms leinrrâs e não só dâs lrês princ rpâi§ já me ncio nadas enire elas as de Casais

Monte,ro. iorg. dÊ Sen.. Joel §P'r;o. PiêrrP HurrcádP Mar l"l"gr' ' Oscdr Lop'('
destinada a introduzir coerência num "puzzle" que tem
Octávio Paz, L.S. Picchio, Georg Lind. Ildefotlso Mãnuel Gil. Robtí Bréchon' An
resistido a ela. É opoesuo de Pessoa nnrenor ao surgimento tó nio Quâdros, tumând Guibet. Alaii Bosquet C. Be'nârdell i, T' Vasconcelos'
etc
Mas supÕe, anles de tudo, o conhecimento já hànalizado do§ principâi§ rextos do
de Caeiro, Campos e Reis. É o mistério dessa ruprrrra que
Poetâ. Por isso nào transcrevemos a sua carta a Câsãis Monteiro que é acessivel e
é necessário esclarecer e esclarecer concretamente. Setrr. a está emtodas as memóriâs.

4l

I
f,DUARDO LOURXNçO

Não que eles sejam a efectiva resposta ao que nos importâ


compreender o sentíd,o e o conteúd,o concreto da ruptura
segund,o as formas que tomou, bem fitais interessante
e d,eci-
sivo que a apreensã,o psícológica d,o processo ja erplorad,a
em 2
abund,ô,ncía sern resuhad,os concludentes mas porque _ A CURIOSA SINGULARIDADE
representam com relevo mitológico o movimento mesmo
DE "MESTRE CAEIRO"
da imaginação de Pessoa, descrito por ele, na Carta sobre
a génese, com a precisão e o fulgor de um âutêntico
sonho
acord,ado't. E no espaço desse ,.sonho acordado" que
é Que uma arte seja irugénua é, por consegu,írlte, uíttua
possível ler e colher o espessuro e a d,ensidad,e quase pal_
contrad,içõ,o; mo,s, repraentar a ingenuid,ad,e numa
páveis, não só de cada afloramento heteronímico, como
pessoct, i,magr,nad,a, é arte possíoel e bela, embora rara,
as das relaçôes recíprocas e as de todos com
o cenüro apa_ l<^Nr , Crítica d,o juízo
rentemente misterioso de onde surgem. Sem â aceitação
voluntária e ingénua dessa narrativa mítica, â possibili A alnú portw&sa
sua obra é o mainr qúe 6 teÍL feíto.
dade de apreender e compreender em detalhe o sentido
R. Rrrs
da mptura que ela celebra, seria aleatória. As,.explica_
ções" de Pessoa não nos dizem por que râzão Caeiro ou Mas os pastores d.e WrgíLio, coitados, sã.o Virgílio
Campos (os poemas) sd,o o que sdo, e coni,o sdo o que
o processo concreto do seu sur6imento lúrerórúo
- só Ea naturuza é bela e aruti$a.
elucida A. C,c.xrno
mas descrevem como só um criador o pode fazer,
o espaço
ea função das encarnações poéticas imaginárias que cada
Do relato de Pessoa uma evidência universâl se impôs:
um i. Nenhuma indicação dos preciosos textos é supér_
a da importânciâ síngula,r de Caeiro. Primeiro nâ ordem
flua, e bem presumiram da sua clarividência os criticos
da génese, primeiro sobretudo na ordem ontológicâ fic-
gue as dispensaram ou julgaram mais urgente, possivel e
ticia, Caeiro concentrou bem cedo as atenções privile-
oportuno, submetê-los'â questão,, ou suspeitá_los, abo_ giadas da crÍticâ'. Não foi por acaso que teve trâtamento
lindo com tal gesto a entrada no reino da compreensão cuidado e à parte, bem ântes dos outros heterónimos. Mas
heteronimica.
cedo, igualmente, se operou uma osmose fatâl entÍe o que
ele d,íz e o que ele é. Mais do que tudo, a evocação que Pes-
13 Casais Monreiroêmpre8ou oconce o(p. soa (Campos, o que não é a mesma coisa...) lhe consagrou,
?9dâobracÍada) nums€ntidoeslé
tico-lirerário que só em parte recob.€ o do nosso. Nós empregamo_lo
no sentido
próprio, de origem iün8iaüa. uritirâdo por R. Desoi
e, avtotÁe b nêve E ei e el
Psychorhérupie, PUF.
ry45. r V notaCno Írm dovolume (p.249).

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