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Morte e luto em perspectivas teóricas

Bom dia, pessoal, dando continuidade, agora vamos falar um pouquinho sobre como algumas
das principais abordagens lidam com a ideia de morte e de luto.

TCC

Cognições sobre a morte

Partindo da postulação da TCC, da ideia de que ao longo de nossas vidas são construídas e
adquiridas cognições sobre si mesmo, sobre o mundo e sobre o futuro, não raro as pessoas
tendem a fazer interpretações errôneas acerca das situações. Através desses erros de
pensamento, acaba-se proporcionando sofrimentos emocionais, físicos e psicológicos. De
acordo com os autores Dattilio e Freeman (2004), dentre os eventos ameaçadores e críticos,
situações de crise e situações da perda de um ente querido podem ser situações ativadoras
dessas crenças disfuncionais. (Ex: Fulano faleceu por minha causa).

Estratégias e técnicas para ajudar o paciente enlutado

A TCC fornece algumas estratégias e técnicas essenciais para ajudar o enlutado a produzir uma
resposta saudável, utilizando mecanismos e comportamentos que possam ser aprendidos e/ou
modificados. (Vale lembrar que tanto as estratégias quanto as técnicas terapêuticas, foram
listadas aleatoriamente, e não exigem, necessariamente, uma ordem específica, pois isso tende a
variar de acordo com cada paciente).

Estratégias:

* Automonitoramento: Recomenda-se que, diante de uma situação aversiva, o paciente


identifique o que está fazendo, pensando, sentindo. É o pensar sobre o pensamento: "Fulano
adoeceu e faleceu por minha causa, já que não lhe dei atenção como deveria [...]. Se esse
pensamento fosse verdade, como me sentiria?".

* Estratégias de Coping: o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptarem-se
a circunstâncias adversas, ou seja, uma resposta cognitiva e comportamental ao estresse, com
objetivo de suavizar características aversivas. Indica-se o levantamento de outros eventos
adversos na vida dos enlutados e quais estratégias foram úteis para amenizar os sintomas
gerados: "Quando você se encontrou numa situação difícil, como você lidou com ela?"; "Se uma
pessoa amiga estivesse na mesma situação na qual você se encontra, que conselho daria a ela?".

* Restruturação Cognitiva: numa colaboração entre paciente e terapeuta, identifica-se


pensamentos disfuncionais e catastróficos, exame das evidências favoráveis e contrárias aos
pensamentos distorcidos, a fim de avaliar e perceber outros pensamentos mais adaptativos
(Beck, 1997).

* Prevenção e Recaída: psicoeducar o enlutado quanto ao seu funcionamento, suas


dificuldades e também sua autoeficácia (Beck, et al., 1979). Retomar estratégias e habilidades
aprendidas ao longo da terapia e como elas poderiam servir de recursos para enfrentar possíveis
problemas.

Técnicas: Psicoeducação: momento em que o terapeuta explica ao paciente o modelo da


terapia e também o funcionamento disfuncional do paciente, para promover a compreensão
deste perante a perda sofrida (Garner, 1997).
Registro de Pensamentos Disfuncionais (RPD): o RPD é um instrumento bastante utilizado
para verificar quais pensamentos passaram pela mente do paciente diante de uma determinada
situação.

Role-play (simulação de evento): O paciente dramatiza o que diria para alguém que estivesse
na mesma situação e o mesmo problema que ele, tentando mostrar a disfuncionabilidade da
crença da pessoa (Beck, 1997).

Descoberta Guiada: esta técnica, como o próprio nome diz, busca descobrir significados mais
profundos com base na informação dada pelo paciente. O que ele atribui, pensa e entende
perante uma situação. Perguntas como: "O que significa isso para você?", "Se isso fosse
verdade, o que quer dizer de você?" são utilizadas para evocar as crenças centrais (Beck, 1997).

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872011000100007

Psicanálise

Quando se fala na questão da morte a partir da teoria psicanalítica, a associação com o


conceito de pulsão de morte (Tânatos) é inevitável. Entretanto, a relação entre a ideia da morte e
a pulsão de morte não é tão direta como às vezes costumamos pensar.

Pensar a questão da morte na teoria psicanalítica deve partir de sua possibilidade de


representação, ou seja, a possibilidade de significação da morte no psiquismo e, mais
propriamente, no inconsciente. Já temos aqui uma complicação, pois Freud (1915/1996) afirma
veementemente que o inconsciente não retém representações negativas, ou seja, não seria
possível falar de uma representação propriamente direta da morte, uma vez que esta deveria
significar ausência da vida. Não tendo a experiência da morte, seria, a princípio, impossível ter
uma memória dela. Assim, embora possamos afirmar que haja um componente de pulsão de
morte em jogo nos desejos destrutivos e, principalmente, na agressividade auto-dirigida, a
pulsão de morte não é suficiente para compreender a dinâmica de fantasias envolvida no desejo
de morrer. Ela está sempre combinada em maior ou menor grau com as pulsões de vida, de onde
extraímos a ideia de que a libido será sempre uma fusão de componentes eróticos e tanáticos.

No luto, nada existe de inconsciente a respeito da perda, ou seja, o enlutado sabe


exatamente o que perdeu. Além disso, o luto é um processo natural instalado para a elaboração
da perda, que pode ser superado após algum tempo e, por mais que tenha um caráter patológico,
não é considerada doença (se mal elaborado pode se tornar uma), sendo assim, interferências
tornam-se prejudiciais.

A ideia é que o trabalho normal do luto envolve a redistribuição da libido antes


investida no objeto de amor perdido. O trabalho de simbolizar e elaborar a perda, reencontrando
novos caminhos para o desejo, leva certo tempo e envolve algum pesar. É por meio desse
percurso que esses objetos de amor podem ser desinvestidos e o sujeito passa a encontrar novos
substitutos. Evidentemente, esse processo não é tão simples, pois envolve não apenas encontrar
um objeto substituto, mas elaborar as fantasias conscientes e inconscientes que são ativadas com
a perda de objeto. O processo de luto é, portanto, um redimensionamento das fantasias e defesas
do psiquismo, em busca de um novo equilíbrio de forças. (Essa é a perspectiva de Freud acerca
do tema, mas existem as perspectivas de outros psicanalistas como Bowlby e Klein).
https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/135159/ISSN1984-9043-2013-12-01-13-
24.pdf?sequence=1&isAllowed=y

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
88092013000200007#:~:text=O%20trabalho%20de%20luto%20consiste,representam%20seus
%20objetos%20bons%20internalizados.

Abordagem centrada na pessoa

Segundo Kovács (2008), a perda é um dos processos mais desorganizadores na


existência humana, pois não se limita apenas a pessoas, mas a todo processo de
mudança de vida. São consideradas pequenas mortes, por significarem o desaparecimento de
uma condição antiga e conhecida para uma passagem obrigatória para uma nova e desconhecida
fase. Ela é vivenciada conscientemente, por isso é, muitas vezes, mais temida do que a própria
morte. Como esta última não pode ser vivida concretamente, a única morte experienciada é a
perda, seja concreta ou simbólica.

O processo de luto, por definição, é um conjunto de reações diante de perdas


irreversíveis, sendo consideradas perdas as relações nas quais existia um vínculo significativo,
ou seja, um investimento afetivo (KOVÁCS, 1992). A fenomenologia, um dos pilares da
Abordagem Centrada na Pessoa (ACP), não vê o luto como algo superável, apenas passageiro.
O enlutado não quer que a sua dor seja vista como insignificante, passageira, mas deseja que o
seu sofrimento e a memória de seu ente querido sejam respeitados. (CECCON, 2017). A
Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) não olha o luto como uma doença, pelo contrário,
entende ser o luto uma situação normal, ou seja, um sentimento válido e que está relacionado ao
vazio que é sentido devido à perda. Ainda, considera necessária uma ressignificação de seu
mundo, a fim de poder lidar bem com esta perda, independentemente do tempo. (SANTIAGO,
2017).

Na clínica da ACP, o terapeuta não pode deixar de observar os fenômenos que se


mostram nas reações do cliente em sua narrativa verbal e não verbal, pois pode estar ocorrendo,
no processo do luto, reações significativas em relação à perda, e a escuta congruente, a
aceitação incondicional positiva, e a compreensão empática possibilitará a emergência de
uma reorganização de mundo, de uma nova maneira de vivenciar o mundo e principalmente um
“tornar-se pessoa” em razão desse ambiente psicológico facilitador. (ROGERS, 2009).

Para Rogers (2009) o “indivíduo tem dentro de si amplos recursos para a


autocompreensão, para alterar seu autoconceito, suas atitudes, seu comportamento
autodirigido”, resumindo, uma auto regulação psíquica. Desse modo, quando o terapeuta
dispensa uma atenção incondicional, uma autenticidade congruente e uma compreensão
empática, sem julgamento, possibilita ao cliente um espaço de tomada de consciência de si e de
seu mundo, e de novas possibilidades de vivências e ressignificações. Assim, nessa condição de
ressignificação, descobrirá que há nele a capacidade de adaptação para qualquer situação que a
vida possa lhe impor, novas possibilidades de percepção frente às situações da vida, uma
potência atualizadora, mesmo que seu modo de ver o mundo esteja entorno daquilo que perdeu.

https://periodicos.unoesc.edu.br/apeusmo/article/view/29781/17174

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