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Experiências de Aprendizagem Musical

Baseadas na Resolução de Problemas: Um


Estudo Exploratório em Sala de Aula
Music Education Experiences Based on Problem
Solving: A Scoping Study Inside the Classroom

Maria João Vasconcelos


Departamento de Educação e Psicologia – Universidade de Aveiro (Doutoranda)
Agrupamento de Escolas Nuno Gonçalves – Lisboa
mjvasconcelos@ua.pt

Helena Caspurro
Departamento de Comunicação e Arte – Universidade de Aveiro
INET-md (Instituto de Etnomusicologia – Centro de Estudos em Música e Dança) / Colaboradora do CESEM (Centro de
Estudos de Sociologia e Estética Musical)
caspurro@ua.pt

Nilza Costa
Departamento de Educação e Psicologia – Universidade de Aveiro
Centro de Investigação em Didática e Tecnologia na Formação de Formadores
nilzacosta@ua.pt

RESUMO
Tendo como objetivo geral desenvolver a aprendizagem musical no Currículo do Ensino Básico, o presente estudo
apresenta como objetivo específico desenvolver ideias e possibilidades de implementação prática sustentadas em
processos de resolução de problemas e construção de conhecimento. Pretendeu-se assim experienciar estratégias e
formas de atuação em atividades práticas em sala de aula, bem como avaliar a respetiva adesão dos alunos, nomeadamente
as percepções sobre o desenvolvimento da sua aprendizagem musical e a atuação da professora. O presente estudo
exploratório contou com a participação de 4 turmas do 8.º ano de escolaridade, que estiveram presentes na atividade
aqui exposta e responderam a um questionário final. Neste sentido, procedeu-se à avaliação da adesão dos alunos no que
respeita à atividade desenvolvida, tendo os resultados apontado para uma valorização da aprendizagem com pares (em
trabalho de grupo) e do caráter regulador do feedback prestado pela professora aos alunos.
Palavras-chave: Aprendizagem Musical; Construção da Aprendizagem; Feedback; Resolução de Problemas; Trabalho
de Grupo
ABSTRACT
With the overall purpose to develop music education in the Basic Education Curriculum, the current study presents
as specific purpose the development of ideas and possibilities for a practical implementation, supported by problem
solving processes and knowledge building. Having this in mind, we intended to try strategies and performing methods
in practical activities within the classroom, as well as evaluate the corresponding students’ adherence, namely the
perceptions regarding their music learning development and the teacher’s performance. The current scoping study relied
on the participation of 4 eighth grade classes, which participated in the activity described in this study and answered a

[21] RPEA
final questionnaire. From there, we proceeded to the evaluation of the student’s adherence regarding the activity done.
The results pointed toward a valorization of the learning with peers (in group work) and of the regulatory nature of the
feedback provided by the teacher to the students.
Keywords: Music Education; Construction of Learning; Feedback; Problem Solving; Group Work

Assim, tendo como objetivo geral desenvolver


Introdução a aprendizagem musical no Currículo do Ensino
Básico, apresenta-se como objetivo específico do
O estudo exploratório aqui exposto enquadra-se referido estudo desenvolver ideias e possibilidades
no âmbito do nosso projeto de Doutoramento, em de implementação prática sustentadas em proces-
curso no Departamento de Educação da Univer- sos de resolução de problemas e construção de
sidade de Aveiro (Portugal), traduzindo-se num conhecimento, tendo em vista, em última instância,
trabalho de investigação-ação, no contexto da a concepção de referenciais de avaliação alicerça-
disciplina de Música do 3.º ciclo do Ensino Básico. dos em modelos de aprendizagem governados pela
Presentemente, a disciplina de Música pode ter ideia de construir conhecimento em sala de aula.
lugar nos 7.º e 8.º anos de escolaridade, apresen- O estudo que aqui se relata, tendo um caráter
tando-se como oferta de escola. exploratório face ao propósito específico enuncia-
A problemática deste estudo reside na necessi- do e ao projeto de investigação em curso, atrás
dade por nós sentida de desenvolver o pensamento expostos, visou experienciar estratégias e formas
criativo-musical no currículo da referida disciplina, de atuação em atividades práticas em sala de
relevando o princípio “sound before symbol” ou “sou- aula, bem como avaliar a respetiva adesão dos
nd before sign” (Rodrigues, 2001; McPherson & Ga- alunos, nomeadamente as percepções sobre o
brielsson, 2002; Mills & McPherson, 2006) como desenvolvimento da sua aprendizagem musical e a
preparação e alicerce para o desenvolvimento da atuação do professor. Sublinhando o que entretan-
aprendizagem musical, e valorizando processos to referimos, esta intenção justifica-se pelo facto
apoiados sobretudo na resolução de problemas de as práticas de ensino em Educação Musical no
e construção de conhecimento em sala de aula. âmbito curricular em estudo, nomeadamente as
De facto, o documento “Música, Orientações de caráter performativo, terem, na nossa ótica,
Curriculares, 3.º Ciclo do Ensino Básico”, datado uma ligação mais forte no dia-a-dia escolar com
de 2001, apresenta-se de forma vaga e ambígua, atividades de natureza imitativa e reprodutiva,
sobretudo no que concerne a atividades concretas apesar do programa e literatura científica apontar
a dinamizar em sala de aula, nomeadamente para para dimensões de aprendizagem onde o papel
o desenvolvimento do pensamento criativo-musical, ativo e inter-agente do aluno são reforçados, como
considerando-se assim pertinente o tratamento adiante se explanará.
deste assunto, até pela escassa investigação en- Neste âmbito, ganha também forma o conceito
contrada, nomeadamente para o esclarecimento de professor-investigador e a atitude profissional
da ação dos professores. daqui decorrente: um intelectual que criticamente
RPEA [22]
questiona e se questiona, procurando, no confronto e o alicerce para o desenvolvimento da literacia
sistemático e intencional com as situações-proble- musical na qual cantar ou tocar com e sem no-
ma que averigua, a sua compreensão e posterior tação são encorajados (Hallam, 2006: 57; Mills &
resposta (Alarcão, 2001: 6), considerando-se o McPherson, 2006: 160).
“currículo como campo de acção do professor” e Historicamente, foram vários os pedagogos
“os professores como principais especialistas do a apontar para a importância da aprendizagem
currículo” (Roldão apud Alarcão, 2001: 5). musical “de ouvido”, através do som, referindo-se
Dividiremos o presente artigo em partes dis- aqui, por exemplo, John Curwen (Freire, 2008: 118),
tintas, seguindo-se um breve estado da arte, a Zoltán Kodály (Choksy, 1981: 7; Choksy, 1986: 70;
intervenção educativa (atividades realizadas), a Campbell & Scott-Kassner, 1995: 51; Houlahan &
metodologia, os resultados, a discussão dos mes- Tacka, 2015: 143), Jacques-Dalcroze (1916) e Carl
mos e as conclusões finais. Orff (Orff & Keetman, 1961-1974), estes últimos
destacando também o papel do movimento cor-
Princípios “sound before poral no desenvolvimento da percepção e com-
symbol” e “to think in sound” preensão musical. Registam-se também alguns
métodos de aprendizagem instrumental tendo por
É previsto que as competências específicas a base a audição, como, por exemplo, o de Shinichi
desenvolver em aulas de Música devam abranger Suzuki (1993) e de Edwin Gordon (2000). A ana-
aprendizagens baseadas em ações provenientes logia com o processo de aprendizagem da língua
dos domínios da composição, audição e interpre- materna é frequentemente reportada, inclusive na
tação, consubstanciando-se em experiências pe- investigação atual, para fundamentar tal princípio
dagógicas e musicais diversificadas, alicerçadas (Hargreaves, 1986; Cooper, 2003; Mills & McPher-
no pressuposto “o som e a música antes dos son, 2006), bem como o conceito de audiação,
símbolos e das notações” (ME, 2001: 3). cunhado por Edwin Gordon, enquanto processo
Remontando às ideias de pensadores como mental idêntico ao do pensamento realizado no
Comenius, Pestalozzi, Rosseau, Dalcroze e ao prin- âmbito da linguagem (Gordon, 2000).
cípio educativo de que a experiência deve preceder Contudo, no que concerne aos benefícios para
a teorização (Rodrigues, 2001: 3; McPherson & o desenvolvimento de competências de literacia
Gabrielsson, 2002: 101), que influenciou posterior- musical, o princípio “sound before symbol” tem por
mente vários educadores/metodólogos (Choksy, vezes sido subestimado, facto que se evidencia por
1986), o princípio “sound before symbol” (McPher- exemplo pela forma como, nas práticas de ensino,
son & Gabrielsson, 2002; Mills & McPherson, a execução e reprodução de música através de
2006) é relevado no presente estudo. Com efeito, leitura de notação são valorizadas – independen-
é com base nesse pressuposto que se defende temente das efetivas capacidades de leitura e
uma abordagem integrada da aprendizagem, onde descodificação sonora terem ou não sido manifes-
fazer música “de ouvido” constitui a preparação tadas, desenvolvidas e consolidadas pelos sujeitos
[23] RPEA
(Priest, 1998: 207; McPherson, 2005: 30; Mills & factos bem relatados na literatura científica.
McPherson, 2006: 155).
São vários os autores que apontam os pre- Aprendizagem
juízos de se aprender a tocar e a ler notação ao Baseada em Problemas e
mesmo tempo que se inicia a aprendizagem do
Pensamento Divergente
seu vocabulário, sua estrutura discursiva, comu-
nicação e oralidade, ou seja, do conteúdo do que Alicerçando-se remotamente nas ideias da
se está a ler. Neste quadro, poderá resultar não escola ativa, impulsionada por Dewey (1976), a
a compreensão do significado sonoro a decorrer aprendizagem baseada em problemas (ABP) fun-
da aprendizagem da leitura mas sim a ‘ativação’ de damenta-se, enquanto modelo filosófico, nos prin-
um outro mecanismo, de salvaguarda ou garantia, cípios sustentados pelos modelos construtivistas,
para cumprimento do objetivo capital de executar nomeadamente na aprendizagem centrada no
uma peça num instrumento, por exemplo. Este me- aluno, entre pares (em grupo), no papel do profes-
canismo é, na maioria dos casos, a memorização, sor como guia, orientador e facilitador da ação (ao
para que, como refere Sloboda (1993: 68), a per- invés de mero transmissor) e no desenvolvimento
formance deixe de depender o mais rapidamente holístico de competências (fazendo integrar e dialo-
possível dessa (frustrante) leitura: “This double task gar diferentes formas de conhecimento/ação). Em
[aprender a ler notação ao mesmo tempo que se última instância, e no contexto da sua aplicação no
aprende a executar um instrumento] can be an terreno educativo, a filosofia subjacente à ABP visa
intolerable burden which many solve by memori- o desenvolvimento e promoção do pensamento
zing each new piece at the soonest opportunity crítico e criativo, referindo-se assim aos proces-
so that performance does not depend upon their sos que incentivam o aluno a aprender pela via da
reading ability”. pesquisa, formulação de perguntas e procura de
Esta alusão à memorização da música, em vez soluções, valorizando-se o conhecimento, enquanto
de recursos mais alicerçados no pensamento so- substância ou matéria curricular, sobretudo pela
noro – “to think in sound” (Webster, 1991: 26; Hickey relação pragmática com a realidade e atualidade
& Webster, 2001: 21; McPherson & Gabrielsson, (Arends, 2008: 380; Caspurro, 2015).
2002: 102; Mainwaring apud Caspurro, 2007: A aplicação da ABP às disciplinas artísticas,
18) – e na sua efetiva compreensão, denunciando nomeadamente à aprendizagem musical, tem es-
em última instância paradigmas de ensino mais tado associada a práticas de desenvolvimento
focados na aprendizagem memorizada, de natu- do pensamento criativo em sala de aula, sendo
reza mecânica – isto é, no resultado performativo que este, apesar de abranger formas múltiplas
independentemente da qualidade do conhecimento de realização, é frequentemente associado aos
e da aprendizagem que ele traduz –, menos aten- processos cognitivos e performativos envolvidos
tos, portanto, às condições e papéis do sujeito na improvisação e composição, bem como ao de-
no processo de construção do próprio saber, são nominado pensamento divergente (Webster, 1991:
RPEA [24]
27; Weisberg, 2003: 227; Sternberg apud Caspur- de Educação Musical do Ensino Básico, e Paynter
ro, 2006: 66; Caspurro, 2015). O facto de estas apresenta estratégias de trabalho diversas, no-
competências se relacionarem intimamente com meadamente em Sound and Silence (1970), onde
formas de pensamento sonoro, o citado princípio podemos aliás encontrar, de uma forma implícita,
“to think in sound”, isto é, a modos de conheci- os princípios da ABP. Schafer (1972) e Dennis (1973;
mento e realização performativa mais próximos 1975) são outros dos autores que na segunda
das atitudes de procura, pesquisa, formulação de metade do século XX ocuparam, juntamente com
hipóteses e questionamento – qualidades e recur- Paynter, um lugar pioneiro no desenvolvimento de
sos menos presentes nas atividades de natureza abordagens educativas da música centradas na
mais reprodutiva, como a performance através de promoção do pensamento criativo, tendo deixado
leitura ou memorização – explica esta tendência. variadíssimos trabalhos centrados na composição
A relação destes aspetos com o que é invocado (Caspurro, 2015).
na literatura científica para definir metodologias de Na implementação da aprendizagem musical
conhecimento e ação subjacentes a desempenhos através da improvisação e composição, outra ideia
tidos como criativos fundamenta, por outro lado, que prevalece é o trabalho entre pares. Este é
a associação da improvisação e da composição, destacado sobretudo pelo valor que comporta no
enquanto processos e possibilidades de realiza- processo de construção do conhecimento para
ção e aprendizagem, ao que é caraterizado como além do circuito relacional professor-aluno, colo-
pensamento divergente. De um modo muito geral, cando os defensores deste modo de aprender na
em termos metodológicos, este encontra-se asso- linha do que é sustentado filosoficamente pelos
ciado mais ao campo da formulação de hipóteses, modelos sócio-construtivistas (Caspurro, 2015).
pesquisa e aferição de diversas possibilidades de O pressuposto de que o aluno enquanto sujeito
resposta para um mesmo problema, do que à ideia de aprendizagem tem um papel inter-agente face
de conhecer através de postulados, axiomas ou aos fatores e circunstâncias que o rodeiam, no-
soluções únicas (Hickey & Webster, 2001; Ster- meadamente o meio social – a que não escapa o
nberg & O’Hara, 2003; Caspurro, 2006 e 2015; microcosmos que constitui a sala de aula – é em
Odena, 2012). síntese o alicerce daquele modelo teórico, com
Autores como Paynter (1970), Kratus (1991), berço nas ideias de Vigotsky e, mais adiante, de
Burnard (2000), Gordon (2000), Hickey & Webs- Bandura (Shunk, 2000: 231; Custodero apud Cas-
ter (2001), Azzara (2002), Priest (2002) e Caspur- purro, 2013).
ro (2006), têm contribuído para a implementação Assim, indo ao encontro de autores como
da improvisação e composição no contexto, quer Wiggins (2001: 37) e Webster (2011: 52), pro-
da Educação Musical no ensino genérico, como das põe-se que no âmbito da música, concretamente
práticas instrumentais no ensino artístico. Também do nível curricular em estudo, o aluno participe
Wiggins (2001: 48) dá particular relevo à ABP, ativamente na sua própria aprendizagem, assu-
lançando pistas de trabalho para os professores mindo-se que quando toma parte de forma direta
[25] RPEA
na construção do conhecimento que adquire, se Participaram neste estudo 4 turmas do 8.º ano
não aprende melhor, pelo menos parece ampliar de escolaridade, considerando-se como partici-
e diversificar o modo como aprende, o que nos pantes 75 alunos, 18 de uma das turmas e 19 de
parece desde logo uma mais valia (Caspurro, 2015). cada uma das restantes, que estiveram presen-
Neste sentido, e sem retirar o devido valor às tes na atividade aqui exposta e responderam ao
estratégias de natureza imitativa, reprodutiva, de questionário final. Todas as turmas tinham como
memorização e modelagem – que, pelas mesmas docente de Música a professora-investigadora.
razões e até pela própria história com que se A atividade decorreu em 5 aulas de 50 minu-
vinculam à nossa cultura musical e educativa, não tos, desenvolvendo-se ao longo de um mês e uma
podem deixar de ter o seu lugar no processo de semana, dado que a disciplina tem lugar uma vez
aprender, sobretudo em âmbitos como o treino por semana. A quinta aula foi inteiramente dedi-
e aperfeiçoamento de desempenhos performati- cada ao questionário final aplicado aos discentes
vos ou em fases incipientes da aprendizagem de (Cf. Quadro 1).
diferentes conteúdos ou competências musicais Os objetivos educativos pretendidos nesta ex-
–, o que valorizamos aqui é a ideia, enraizada nos periência, enquadrando-se na intenção primordial
movimentos cognitivistas emergentes sobretudo da investigação a desenvolver – como vimos, a
a partir da obra de Piaget, Vigotsky e mais tarde promoção de aprendizagens que possibilitassem
Bruner, ou até mesmo Bandura, de que o sujeito, no construir conhecimentos através da resolução de
seu processo de desenvolvimento e aprendizagem, problemas – eram os seguintes: criar e compor
também constrói o conhecimento – suas repre- uma melodia que pudesse ‘vestir’ ou completar a
sentações, interpretações e significados (Shunk, estrutura rítmica pré-existente e memorizada.
2000: 229; Custodero apud Caspurro, 2013). Subjacente a estes objetivos, e paralelamente
Suspeitar que os mecanismos que governam a à ideia de trabalhar colaborativamente, estava
qualidade das relações estabelecidas pelos indiví- a intenção de manipular e aplicar organizações
duos com o seu campo de saber, as suas matérias melódicas familiares em novos contextos, através
de estudo – comummente associados na litera- da utilização expressiva de instrumentos próxi-
tura científica a constructos como o interesse, mos e ao seu alcance, assumindo-se que este é
motivação, compreensão, metacognição – podem um dos caminhos através dos quais os sujeitos
ser enriquecidos quando eles próprios atuam na poderão consolidar e ampliar a compreensão da
configuração do seu conhecimento e aprendizagem música, nomeadamente de vocabulário, formas
é, em síntese, o pressuposto teórico da nossa de organização e comunicação específicos. Nes-
pesquisa. te caso, e enquanto conteúdos, referimo-nos ao
modo maior, sua organização melódica e rítmica
Intervenção Educativa em estruturas e formas frásicas em compasso
– Atividades Realizadas quaternário: pergunta-resposta, secção, aba; em
termos de concepção e processo, tensão e dis-
RPEA [26]
Quadro 1 – Plano Didático

Objetivo principal Atividades


1.º Aprendizagem da estrutura rítmica (em pergunta/resposta);
Reproduzir, com exatidão, a estrutura rítmica de C. Orff, 2.º Apresentação da tarefa em forma de problema a resolver:
Aula 1 compreendendo o esquema frásico da mesma. criação de uma melodia para a estrutura rítmica aprendida;
3.º Formação de grupos de trabalho.
1.º Seleção de instrumentos musicais;
2.º Experienciação de melodias;
Criar uma melodia para a estrutura rítmica aprendida, em 3.º Abordagem da professora aos vários grupos;
Aula 2 grupo, considerando o seu esquema frásico. 4.º Criação de melodias;
5.º Nova abordagem da professora;
6.º Consolidação de melodias.
1.º Conclusão/revisão dos trabalhos da aula anterior;
Interpretar a melodia criada, em grupo, com postura adequada 2.º Preparação/ensaio das composições;
Aula 3 à ocasião. 3.º Apresentação das composições à turma e gravação
audiovisual das mesmas.

1.º Visionamento dos vídeos das composições apresentadas na


Aula 4 Refletir sobre os processos de trabalho e os resultados finais. aula anterior;
2.º Autoavaliações e heteroavaliações dos alunos.

Refletir sobre o desenvolvimento da aprendizagem musical dos 1.º Preenchimento do questionário relativo às atividades
Aula 5 alunos, considerando a atuação da professora como guia. desenvolvidas.

Avaliação
Procedimento interativo, associado aos processos de feedback, de autoavaliação e de heteroavaliação das aprendizagens.

tensão frásica (arsis e thesis), uso de repetição e A primeira aula foi maioritariamente dedicada à
contraste; textura tímbrica. aprendizagem da estrutura rítmica, tendo-se ini-
Recorreu-se ao Rondó Rítmico, para percussão cialmente processado em forma de pergunta-res-
corporal, de C. Orff e G. Keetman (1961-1974: 81) – posta/professora-alunos, a dois níveis corporais
extraído da Orff-Schulwerk dos mesmos autores (palmas/batimento de pés), conforme sugestão da
(trad. e adapt. de M. L. Martins) –, particularmente partitura, e com cumprimento da dinâmica indicada
à estrutura rítmica A correspondente ao Tutti (Cf. (crescendos). Foram posteriormente organizados 2
Figura 1).
Figura 1 – Parte A do Rondó Rítmico de C. Orff e G. Keetman

>> >> >>


Palmas  œ œ œ œ œ œ œ œ œœŒ  œœœœœœœœ œœŒ  œ œ œ Œ œ œ œ Œ œœœœœœœœ Œ œ œ 
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Tutti
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4
Palmas

4 ∑  . œ ∑ . œ œœœ‰ œœœ‰ œ‰Œ  ŒŒ 


Bater os pés
J J J
> > >
[27] RPEA
grandes grupos, atribuindo-se a linha superior, das grupo terem decorrido conforme previsto, nem
palmas, a um deles, e a parte inferior, das palmas todos os grupos conseguiram terminar as suas
e batimento de pés, ao outro. Após o domínio composições em tempo útil, sobretudo por dificul-
interpretativo da estrutura rítmica por parte dos dades na gestão do tempo e, em casos pontuais,
alunos, foi apresentada a tarefa principal, em forma alguma falta de entendimento entre elementos
de problema a resolver: “cada grupo de trabalho do grupo. Foi assim dada a possibilidade aos alu-
deverá criar e aplicar uma melodia à estrutura nos de terminarem os seus trabalhos no início da
rítmica aprendida (que é apenas percussiva), ou aula seguinte, verificando-se a necessidade de um
seja, ‘vestir’ a mesma estrutura através da uti- tempo mais alargado para a concretização deste
lização de, pelo menos, um instrumento musical tipo de tarefas.
de altura definida ou voz”. A última parte da aula Na terceira aula, os vários grupos tiveram
serviu ainda para a formação de grupos de trabalho oportunidade de terminar as suas composições
(4/5 alunos por grupo). e, em jeito de ensaio, preparar a apresentação
A segunda aula foi inteiramente dedicada ao das mesmas à turma, o que se seguiu, grupo a
desenvolvimento dos trabalhos em grupo, nomea- grupo. Os trabalhos apresentados foram filmados
damente à seleção de instrumentos pelos alunos e para posterior análise, tendo sido consideradas as
experienciação/criação de melodias. Com 4 grupos autorizações necessárias para o efeito.
de alunos por turma, as equipas foram distribuídas Na quarta aula, foram revistas as composições
pelos 4 cantos da sala, de forma a interferirem o realizadas, através do visionamento dos vídeos
mínimo possível com as composições de umas e efetuados na aula anterior. De seguida, procedeu-
de outras e possibilitar uma maior concentração -se à autoavaliação dos trabalhos, por grupos, e
nas tarefas. À medida que foram desenvolvendo heteroavaliação dos mesmos, com reflexão sobre
as atividades, fomos abordando os vários grupos os pontos fortes e fracos de cada um, e propostas
com a ideia subjacente de que as aprendizagens de avaliações pelos alunos.
dos alunos deverão decorrer de possibilidades Na quinta aula, os alunos procederam ao preen-
geradas pelo professor, enquanto facilitador e guia chimento do questionário relativo às atividades
para a descoberta, ação e construção pelos alunos, desenvolvidas, tendo sido cumpridas mais uma
e portanto não apenas do que passivamente são vez as burocracias necessárias.
dirigidos a reproduzir. Estas visitas aconteceram Quanto à avaliação das aprendizagens realiza-
cerca de 2 vezes em cada grupo, a primeira das das, tratou-se aqui de um procedimento interativo,
quais tendo servido sobretudo para esclarecer associado aos processos de feedback, de autoava-
questões sobre a tarefa a cumprir, tirar dúvidas, liação e de heteroavaliação, instrumentos que con-
etc. Em restantes abordagens, os alunos foram sideramos fundamentais para o desenvolvimento
exibindo vontade em mostrar os trabalhos que de competências, nomeadamente no âmbito de
iam desenvolvendo, pedindo igualmente o nosso práticas artísticas. Com um carácter dialogan-
feedback. Apesar de, no geral, os trabalhos de te, proporcionaram aos alunos e professora não
RPEA [28]
apenas saber em que ponto de desenvolvimento outras, àquele tipo de pressupostos e modos de
se encontravam, como também reorientar as aprender, procurámos aqui desenvolver ideias e
diferentes possibilidades de trabalho de acordo possibilidades de implementação prática tendo
com os níveis detetados (ME, 2001: 45). em vista as intenções do estudo.
Para tal, importou experienciar caminhos e for-
Metodologia mas de atuação em atividades práticas em sala
de aula, assim como registar e avaliar a respetiva
O presente estudo exploratório foi realizado adesão dos alunos – suas percepções sobre o
no terceiro período do ano letivo 2013-2014, so- desenvolvimento da aprendizagem vivenciada bem
bretudo durante o mês de maio de 2014, ante- como a atuação da professora. Este propósito
cedendo um trabalho de investigação-ação que foi concretizado através do preenchimento de
se visa desenvolver, como relatámos. Vista como um questionário composto por duas perguntas
metodologia de referência nas práticas educativas, de resposta aberta, após a seguinte introdução:
este modelo insere-se no paradigma sócio-críti- “Este questionário destina-se a ajudar a tua Pro-
co, podendo associar-se à ideia de mudança de fessora a pensar sobre a forma como lecionou a
práticas para melhorar o significado do ensino e disciplina de Música de forma a melhorar a sua práti-
consequentemente das aprendizagens (Coutinho ca. As tuas respostas não serão assim classificadas
et al, 2009: 359). de certas ou erradas e o que é importante é que
O processo gerado através da investigação- respondas de forma mais sincera possível. Muito
-ação, descrito aliás por vários autores – Kolb, obrigada pela tua colaboração.”
Carr & Kemmis, entre outros – materializa-se na As questões foram apresentadas da seguinte
forma de uma espiral, que contempla um conjunto forma:
de fases que basicamente se podem resumir na “Por favor reflete sobre as tuas aulas de Música
sequência planificação, ação, observação/avaliação no presente ano letivo. Conforme pudeste presenciar,
e reflexão/teorização (Coutinho et al, 2009: 366). neste 3.º período as aulas contemplaram novas ativi-
Residindo a problemática deste estudo na ne- dades (atividades de grupo, com regras previamente
cessidade por nós sentida de desenvolver formas estabelecidas e desafios a resolver – ex: atividade de
de conhecimento musical mais próximas do que composição melódica).
é designado como pensamento criativo, no cur- 1 – Comparativamente aos períodos letivos an-
rículo da disciplina de Música; constatando, pela teriores, consideras que a realização deste tipo de
bibliografia pesquisada, que estratégias baseadas atividades contribuiu mais para o desenvolvimento da
na resolução de problemas podem otimizar tais tua aprendizagem musical? Justifica a tua resposta.
processos; constatando, ainda, que, no domínio da Ao longo das atividades de grupo, a Professora foi
aprendizagem musical, atividades de composição dando feedback (indicações e sugestões) aos alunos
governadas e orientadas por objetivos expressos sobre o trabalho que estavam a realizar.
em problemas específicos, se aproximam, entre 2 – Consideras que este feedback ajudou a me-
[29] RPEA
lhorar a qualidade do trabalho do grupo e a avaliação (referido por 16 alunos sendo que 7 destes men-
do trabalho realizado? Justifica a tua resposta.” cionaram a possibilidade de experienciar vários
Conforme Vala (2003: 107), “sempre que o instrumentos musicais, 4 o contributo para o seu
investigador não se sente apto para antecipar desenvolvimento rítmico no que toca ao sentir do
todas as categorias ou formas de expressão que tempo ou pulsação, 3 o contributo para o desen-
podem assumir as representações ou práticas volvimento da coordenação motora – 1 destes
dos sujeitos questionados, recorrerá a pergun- referindo ainda aspetos como o entendimento
tas abertas sendo as respostas depois sujeitas frásico – e 1 o contributo para a melhoria do
à análise de conteúdo”. Foi também neste quadro reconhecimento auditivo);
que procedemos à análise de conteúdo dos ques- – por estas terem tido um caráter prático,
tionários, da qual resultou, dados os padrões de proporcionarem uma participação ativa nas aulas
resposta verificados, o conjunto de categorias que e os alunos “aprenderem fazendo” (referido por
abordamos de seguida (Cf. Quadro 2 e Quadro 3). 10 alunos);
– por estas terem sido divertidas e assim
Resultados potenciadoras da aprendizagem (referido por 7
alunos).
Da análise das respostas dos 75 alunos partici- Outras ideias foram ainda mencionadas, a sa-
pantes, relativamente à primeira questão, resulta- ber: ter sido mais fácil (2 alunos); terem aprendido
ram os seguintes dados (Cf. Quadro 2): 74 alunos coisas novas (2 alunos); ter promovido o empenho
responderam afirmativamente, considerando que e a concentração (2 alunos), a organização e a
a realização deste tipo de atividades contribuiu criatividade (1 aluno), e a autonomia (1 aluno).
mais para o desenvolvimento da sua aprendiza- De forma mais genérica, 1 aluno justificou ainda
gem musical; 1 aluno respondeu negativamente, a sua resposta referindo que as aulas de música
justificando esta posição com o facto de não ter são muito educativas e outro que as atividades
conseguido realizar o trabalho proposto com êxito. estimularam a aprendizagem no geral.
Dos 74 alunos que consideraram que a realiza- Onze alunos, apesar de terem considerado que
ção deste tipo de atividades contribuiu mais para a realização deste tipo de atividades contribuiu
o desenvolvimento da sua aprendizagem musical, mais para o desenvolvimento da sua aprendiza-
emergiram as seguintes justificações para este gem musical, não desenvolveram uma justificação
benefício: respetiva à primeira pergunta.
– por estas se realizarem em grupo (referido Relativamente à segunda questão, resultaram
por 20 alunos sendo que 7 destes concretiza- os seguintes dados (Cf. Quadro 3): 71 alunos res-
ram ainda a ideia mencionando a oportunidade de ponderam afirmativamente, considerando que o
aprenderem com os colegas); feedback da professora ajudou a melhorar a quali-
– por estas terem contribuído para o desen- dade do trabalho do grupo e a avaliação do trabalho
volvimento de aprendizagens técnico-musicais realizado; 2 alunos responderam negativamente,
RPEA [30]
Quadro 2 – Síntese das respostas à questão 1 do questionário aplicado aos alunos

Respostas positivas Respostas negativas


74 1

Justificações Ocorrências Justificações Ocorrências


Trabalho de grupo 20 Insucesso na tarefa 1
Aspetos técnico-musicais 16
Caráter prático 10
Diversão 7
Facilidade da tarefa 2
Novas aprendizagens 2
Empenho e concentração 2
Organização e criatividade 1
Autonomia 1
Outras (genéricas) 2
Sem justificação 11

justificando esta posição com as ideias de que a oportunidade de corrigirem ou melhorarem aspe-
professora ao prestar ajuda a um grupo de alunos tos diversos no mesmo (referido por 10 alunos);
deixou de estar atenta aos restantes, tendendo – pela sua importância na coordenação/orien-
assim a esquecer-se deles, e de que os alunos são tação dos trabalhos e contributo para o funcio-
os únicos responsáveis pela sua aprendizagem, namento dos grupos, nomeadamente no auxílio
independentemente da intervenção da professora; ao estabelecimento de consensos (referido por
e 2 alunos mostraram-se indecisos, considerando 10 alunos);
porém que o feedback prestado a alguns grupos – pela sua pertinência no esclarecimento de
de trabalho não foi suficiente. dúvidas sobre o trabalho (referido por 7 alunos);
Dos 71 alunos que consideraram que o feedback – por partir de uma pessoa extra grupo, trazen-
da professora ajudou a melhorar a qualidade do do assim uma visão exterior (referido por 3 alunos);
trabalho do grupo e a avaliação do trabalho rea- – pelo seu contributo para o desenvolvimento
lizado emergiram as seguintes justificações para de aspetos musicais específicos, tais como a di-
este benefício: versificação de instrumentos musicais e a criação
– pela importância do ‘saber docente’ (ex. “a de frases melódicas consistentes (referido por 2
opinião da professora ajuda sempre”) ou reco- alunos);
nhecimento do ‘saber do professor’ (referido por – por ter sido importante para a qualidade das
12 alunos); aprendizagens e sua avaliação (referido por 2 alu-
– pelo seu caráter regulador, de possibilidade de nos);
perceberem pontos fortes e fracos no trabalho e – por ter dado oportunidade à revisão de apren-
[31] RPEA
Quadro 3 – Síntese das respostas à questão 2 do questionário aplicado aos alunos

Respostas positivas Respostas negativas/indecisas


71 4

Justificações Ocorrências Justificações Ocorrências


‘Saber docente’ 12 Atenção insuficiente aos grupos 1
Caráter regulador 10 Alunos como únicos responsáveis 1
Função coordenadora 10 Feedback insuficiente 2
Esclarecimento de dúvidas 7
Visão exterior 3
Aspetos musicais 2
Pertinência do feedback 2
Revisão de aprendizagens 1
Justificação não especificada 19
Justificação descontextualizada 5

dizagens de aulas anteriores (referido por 1 aluno). dizagens técnico-musicais, o caráter prático da
Dezanove alunos consideraram que o feedback atividade e o facto de os alunos se terem divertido
da professora ajudou a melhorar a qualidade do durante a sua realização (apresentando-se aqui
trabalho do grupo mas não especificaram as ra- este dado como possível fator de ordem motiva-
zões para a sua opinião afirmativa. Cinco alunos cional). Ainda reportando-se às tarefas empreendi-
também reconheceram a ajuda deste feedback das, constatámos um conjunto de respostas com
ainda que não o justificando de uma forma clara. referência específica aos benefícios para o desen-
volvimento de aprendizagens musicais concretas.
Discussão Quanto às percepções dos alunos relativamente
ao feedback da professora, destacaram-se ideias
Tendo em conta os resultados atrás expostos, sobre as suas possibilidades reguladoras e coor-
no que concerne à avaliação da adesão dos alunos denadoras no desenvolvimentos dos trabalhos de
a este tipo de atividades, a grande maioria conside- grupo, bem como o reconhecimento da importância
rou que contribuíram mais para o desenvolvimento do ‘saber docente’ para a orientação das aprendi-
da sua aprendizagem musical, entendendo também zagens. Neste sentido e diferenciando-se portan-
que o feedback da professora ajudou a melhorar to das percepções relativas à questão anterior,
a qualidade do trabalho do grupo e a avaliação do encontramos nesta questão o reconhecimento
trabalho realizado. do ‘saber docente’ como primordial na orientação
Para tal, emergiram diversas justificações, des- dos trabalhos dos alunos, bem como no auxílio ao
tacando-se a dinamização dos trabalhos em grupo, esclarecimento de dúvidas e à tomada de decisões.
o contributo para o desenvolvimento de apren- Da análise de conteúdo efetuada às justificações
RPEA [32]
dos alunos dadas a ambas as questões e numa 3) é ainda aqui relevada a importância destas
tentativa de interpretar e sistematizar os dados atividades para o desenvolvimento de diversas
obtidos, foi possível organizar um conjunto de ideias “competências transversais”, tais como a autono-
ou categorias que a seguir se apresentam. mia, a concentração, a organização e a criatividade
Assim e no que concerne à primeira pergunta, dos alunos.
a maioria dos alunos justificou evidenciando implí- Já no que se reporta às justificações dadas pe-
cita e explicitamente na sua resposta os aspetos los alunos à questão 2, destacámos as seguintes
seguintes (Cf. Fig. 2): ideias-chave (Cf. Fig. 3):
Figura 2 – Justificações dos discentes relativas à questão 1 Figura 3 – Justificações dos discentes relativas à questão 2

1) as “caraterísticas pedagógicas” da atividade 1) o “caráter regulador” da intervenção da pro-


apresentam-se claramente como benéficas para fessora apresentou-se claramente como benéfico
o desenvolvimento da aprendizagem musical dos para o desenvolvimento dos trabalhos, também
alunos, nomeadamente quando relacionadas com quando associado a ideias de revisão, clarifica-
a aprendizagem em grupo (com os pares), e com a ção, orientação, conciliação e apoio a questões
sua natureza prática (o referido “aprender fazen- específicas;
do”), motivadora (a mencionada “diversão” obtida 2) o “saber docente” é valorizado por vários
durante a realização dos trabalhos) e, de certa alunos como justificação suficiente para o reco-
forma, acessível (a também referida “facilidade” nhecimento da utilidade do feedback da professora;
de concretização das tarefas propostas); 3) a “visão exterior” proporcionada pelo feedback
2) a pertinência deste tipo de atividades é tam- da professora é igualmente mencionada como
bém aqui associada ao desenvolvimento de “com- aspeto importante no desenvolvimento deste tipo
petências específicas”, particularmente apren- de atividades.
dizagens técnico-musicais concretas, relativas Um dado a mencionar na análise dos resultados
a técnicas instrumentais, no âmbito do ritmo/ é o facto de um número significativo de alunos não
melodia, do reconhecimento auditivo e da coor- ter desenvolvido uma justificação, apesar de ter
denação motora; considerado benéfica a atividade de resolução de
[33] RPEA
problemas empreendida e vivenciada, bem como ficando assim sublinhada, mais uma vez pela voz
a atuação da professora no desenvolvimento da dos próprios educandos que participaram na expe-
mesma – facto que inviabiliza uma discussão mais riência, a ideia do professor enquanto facilitador e
consistente sobre o assunto. guia para a descoberta, tão amplamente difundida
na literatura científica e pedagógica. A importância
Conclusões do saber docente e a visão exterior do feedback
proporcionado caraterizam, por fim, as mais valias
Com o presente estudo era nosso propósito encontradas neste estudo.
desenvolver ideias e possibilidades de implemen- Considerando o papel duplo da professora-
tação prática de processos de resolução de pro- -investigadora, questões se colocam quanto às
blemas e construção de conhecimento, bem como vantagens e constrangimentos daí advindos –no-
experienciar estratégias e formas de atuação em meadamente o preenchimento do questionário que
atividades práticas em sala de aula. A respetiva exigiu ponderar possíveis efeitos de desejabilidade.
adesão dos alunos, nomeadamente as percepções Pela literatura, sabemos que o assunto não acolhe
sobre o desenvolvimento da sua aprendizagem consenso. Se, para alguns, tal facto poderá tra-
musical e a atuação do professor, era também duzir-se num défice de objetividade, para outros,
uma preocupação efetiva, facto que justificou a a “objectividade desapaixonada não tem lugar na
aplicação do questionário apresentado. observação da sala de aula” (Burnaford apud Má-
A ideia de que o aluno parece enriquecer o modo ximo-Esteves, 2008: 109). Sendo a educação um
como interpreta e aprende a realidade, neste caso palco complexo de subjetividades e intersubjetivi-
musical, quando toma parte de forma direta na dades, talvez este assunto dificilmente encontre,
construção do conhecimento que adquire, presen- aqui ou noutra qualquer experiência, uma efetiva
te como vimos na literatura científica, ficou para solução.
nós assim mais clara, associando-se ao trabalho Tendo em vista por fim a construção de referen-
em grupo, à atividade de composição realizada, ciais de avaliação, o propósito do nosso trabalho a
bem como ao caráter prático da intervenção aqui desenvolver posteriormente, a experiência direta
exposta. As percepções dos alunos sobre a sua com ferramentas de intervenção no terreno, tal
própria aprendizagem, consumadas num conjunto como foi implementada, ainda que tendo um cará-
de explicitações que modelaram suas respostas, ter exploratório, permitiu confirmar a necessidade
nomeadamente em torno do que reportaram como de refletir sobre modos e processos de aprender
aprendizagens musicais concretas, competências música, bem como, decorrente disto, repensar que
transversais, autonomia, concentração, organiza- os critérios sobre os quais a avaliação é sustenta-
ção e criatividade, possibilitaram verificar e con- da são inseparáveis de conceitos ou paradigmas
solidar no terreno tais pressupostos. teóricos. Efetivamente, o que aceitamos definir
O caráter regulador do professor no empreendi- como aprendizagem musical, reflete-se não ape-
mento da intervenção foi igualmente reconhecido, nas na qualidade do que ensinamos, como do que
RPEA [34]
da sintaxe harmónica no desenvolvimento da
julgamos constituir elemento, resultado ou produto improvisação (Dissertação de Doutoramento
de avaliação. Ainda que práticas de ensino, possam não publicada). Aveiro: Universidade de Aveiro.
exigir, pela sua natureza, critérios sustentados Caspurro, H. (2007). “Audição e Audiação. O Contributo
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samento sonoro e reflexivo, a análise e (re)criação Caspurro, H. (2013). “Palco maior – da escola para a
musical através de resolução de problemas, sendo boca de cena: uma reflexão sobre experiências
educativas migradas para o contexto do
igualmente pertinentes e válidas, redimensionam espetáculo” em PERFORMA – Encontros de
de forma decisiva o nosso olhar sobre o que, como Investigação em Performance, 302-10.
e quando devemos avaliar em música. Afinal de Caspurro, H. (2015). “Improvisação e composição como
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