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RESUMO

A ideia de cultura (Terry Eagleton)


Capítulo 3 – Guerras Culturais

A invenção das tradições (Eric Hobsbawm e Terence Ranger)


Introdução: A invenção das tradições, por Eric Hobsbawm

Mestrado em Letras – UFSJ


Disciplina: Teorias críticas da cultura
Professora: Suely Fonseca Quintana
Aluno: Alfredo da Costa Bastos

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No texto, Terry Eagleton ressalta o caráter político-ideológico que os
embates sobre alta cultura e baixa cultura trazem modernamente em seu bojo,
além de problematizar a suposta legitimação do poderio econômico do
Ocidente pelo viés da cultura, revelando que os enfrentamentos vão muito além
de contendas universitárias ou questões de gosto e preferências, mas sim a
definição de eixos geopolíticos. Além disso, o autor aponta a natureza
econômica na qual os bens culturais imiscuíram-se, citando, como exemplo, a
indústria do cinema. Diante de seu acesso “mais democrático”, a sétima arte
contribuiu para tornar tênue cada vez mais a linha que separa a alta cultura da
baixa cultura.

Em nome de uma suposta “civilidade” e a partir de certas obras, a


Cultura é tomada por valores que condizem apenas aos interesses de um
determinado grupo social em detrimento de outro, refém de mecanismos de
coerção moral, subjugado política e economicamente. O autor chama atenção
para o caráter histórico-contingencial da Cultura que demanda um locus para
se desenvolver, ao mesmo tempo em que poderá suplantar o particular não só
em direção a um conceito universal, mas, também, pelo fato de desvincular-se
de qualquer noção temporal e espacial. O mesmo sentido estético
historicizante que classifica determinada obra como de alta cultura, é também
aquele que eterniza uma civilização em relação a toda a humanidade, e a
mesma cultura que hoje é considerada menor, “bárbara”, poderá, com o tempo,
tornar-se Cultura, repetindo em seu pequeno universo o despotismo do qual
um dia foi vítima.

Eagleton salienta que, uma feição identitária pela cultura passará,


necessariamente, pelo particular coletivo, hostil ao indivíduo e mesmo ao
universal; por outro lado, sob a ótica da alta cultura irá se apropriar de
caracteres particulares como forma de torná-los essenciais ao duplo sentido
entre representante e representados. Deste modo, a Cultura partirá do
individual para o universal, e os particulares permanecerão sempre enraizados
em aspectos circunstanciais. Para o autor inglês, o cânone é um exemplo
crasso do individual que se universaliza como espírito da própria humanidade.
Esta metamorfose é alcançada de forma mais notória através da arte, e o que
era apenas ocasional, torna-se imprescindível, necessário.

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Tal necessidade verificou-se na instituição política do conceito de
Estado-nação, que nada mais é do que uma tentativa romântica coercitiva de
universalização do individual, onde culturas contingenciais tornam-se as bases
desse Estado formatador de identidade, ao mesmo tempo em que destroem
diversas manifestações de culturas genuinamente autênticas, mas, ao mesmo
tempo, contraditórias. O autor cita Marx ao comentar que o próprio Estado é
fruto desta contradição. Em A invenção das tradições (Paz e Terra, 1984), Eric
Hobsbawm observa que diversas instituições políticas, inclusive o próprio
nacionalismo, se viram obrigados à invenção de uma continuidade histórica
através da criação de um passado remoto, utilizando-se para isso a invenção
de tradições, a fim de que pudessem legitimar suas ações de coesão social.

Porém, segundo Eagleton, vale ressaltar que valores como Razão e


Liberdade não são exclusivos de fronteiras étnicas ou mesmo geográficas,
ainda que tenham se desenvolvido em culturas mais avançadas, de menor
grau de primitividade. Os conflitos entre a baixa e alta cultura se tornam
bastante nítidos quando observamos o cerceamento cívico que o Estado se vê
obrigado a realizar ante toda e qualquer forma de nacionalismo e
etnocentrismo, com o intuito de manter o seu controle e soberania.

Esta relação torna-se desconfortável, pois a nação, enquanto cultura é


intimamente ligada a conceitos de identidade “espiritual” de um povo, de uma
comunidade; enquanto que o Estado traz em si todo o arcabouço de valores
materiais, essencialmente terrenos. Além disso, Eagleton declara através de
viés marxista que o multiculturalismo e cosmopolitismo, frutos de um mesmo
sistema econômico, qual seja, o capitalismo transnacional, proporcionaram o
enfraquecimento das culturas “oficiais” dos Estados-nação. A partir dos
extremos de um cosmopolitismo “sem pátria” e um comunalismo
“fundamentalista”, as relações entre política e cultura geraram crises de
identidade ao mesmo tempo pós-colonialistas e pós-nacionalistas. A cultura
que até então se via à mercê da política, torna-se agora autônoma, criando e
gerindo espaços de real participação sócio-política para demandas
corporativistas e de minorias.

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Tais contestações são exemplos de que a cultura europeia, para
tomarmos esta como um suposto modelo de alta cultura, não é homogênea,
imune a contradições e aspectos nocivos. Ao mesmo tempo em que ela nos
ofereceu Shakespeare, Beethoven e Van Gogh, também produziu Auschwitz e
o Apartheid. Mais importante do que identificarmos as peculiaridades da cultura
como identidade, civilidade ou do tipo pós-moderna, é percebermos que será
tanto comercial quanto identitária ao considerarmos, por exemplo, o advento de
um “consumismo gay”. De fato, a valorização do “ter” em detrimento do “ser”,
sacramentada pela cultura pós-moderna, irá dialogar com as políticas de
identidade e com os descentramentos do indivíduo de seu meio social.

No entanto, os conceitos até aqui desenvolvidos vão tomando outras


formas, expandindo fronteiras. Em um mesmo instante que culturas de
identidade são identificadas como “locais”, serão também internacionais se se
tratarmos do islamismo ou de movimentos feministas. O que o autor inglês
procura enfatizar é muito mais a disputa entre a civilidade ocidental e “todo o
resto” do que entre o dodecafonismo austríaco e os trios elétricos de Olinda e
Recife. E como “todo o resto” leia-se tradição, nacionalismos ressentidos,
sentimentos populares e militâncias políticas exaltadas, querelas religiosas.
Além disso, devemos considerar também o transbordar de fronteiras entre as
civilizações ocidentais e orientais, elemento que se tornou caro para os
processos emancipatórios da própria modernidade.

O caráter emancipatório das nações pós-coloniais permanece tão


pertinente como nunca, a despeito de sua sorte ainda depender das
contingências do capital ocidental. Somado a isso, a cultura se mostra cada
vez mais importante como meio de afirmação para as minorias que procuram
seu lugar ao sol, idealizando um futuro dentro e fora das fronteiras nacionais,
em que pese alguns aspectos de seu atavismo criado por tradições (re)
inventadas e seus vieses de dominação.

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