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Aula 1 - Definições

AULA 5 – URBANIZAÇÃO EUROPÉIA


• Ao longo da história, a cidade existiu em diversos períodos e
modelos, como a cidade romana; os burgos no período do
Renascimento; a cidade medieval.

• Porém, nestes casos, o surgimento da cidade não era


decorrente de um processo planejado. Os planos e projetos
urbanos restringiam-se ao campo teórico e raramente eram
passíveis de serem executados. A cidade não partia de um
projeto reflexivo, consciente, que procurava sanear os
problemas da cidade, salvo raríssimas intervenções utópicas
que nunca foram executadas por completo.
• A urbanização como processo, e a cidade, forma concretizada deste
processo, marcam tão profundamente a civilização contemporânea,
que é muitas vezes difícil pensar que em algum período da História as
cidades não existiram, ou tiveram um papel insignificante.
PÓLIS GREGA

• A cidade dos gregos tinha uma ordenação, embora ainda não fosse
tão racionalizada e prevista como a Urbis dos romanos.
• A cidade dos gregos dava um tratamento distinto às construções
importantes, dedicadas à religião ou à prática da democracia. Estes
edifícios se localizam em uma área mais elevada da cidade, a
ACRÓPOLE, e eram dispostos de forma orgânica e não simétrica,
seguindo o relevo do local.
URBES ROMANA

• As cidades romanas, as urbes, eram relativamente bem planejadas.


• As urbes são normalmente orientadas em torno de uma piazza, ou
praça, circundada pelas fachadas das casas. Este espaço público era,
antes de mais nada, político: eram lá que os romanos se
encontravam para conversar, discutir, reunir.

• Os traçados da rua eram predeterminados e regulares, a cidade tinha


dimensões limitadas, delimitada por muralhas. A rua determinava o
desenho das quadras e a conseqüente instalação das edificações, que
são subordinados à trama viária.
• Os edifícios mais importantes eram localizados nas avenidas
principais
A cidade é projetada a partir do cruzamento de dois eixos principais (um de leste a oeste
– Decumanos; outro orientado no sentido norte-sul - Cardo).
Em Roma se aplica pela primeira vez a regulamentação urbanística
São nas cidades romanas que se coloca pela primeira vez, com pleno
sentido, a regulamentação urbanística.
Surgem regras, posturas, interdições e obrigações que visam regulamentar
o uso e ocupação do solo.
• A regulamentação urbanística, em forma de leis e normas de uso e
ocupação do solo e códigos de posturas;

• Infraestrutura urbana, em forma de obras de engenharia como o


abastecimento de água através dos aquedutos; saneamento básico e
captação de águas pluviais.

• Traçados urbanísticos racionais, com ruas dispostas ortogonalmente


a partir de dois eixos principais: o Cardo (norte-sul) e o Decumano
(leste-oeste).

• Uma série de edificações públicas que ocupam a parte central da


cidade, como a basílica, o fórum, os templos e demais edificações
públicas.
Plano urbanístico

• Um Plano urbanístico tanto em seu traçado, seu aspecto físico,


quanto em seu conjunto, constitui-se a partir de uma ideia de cidade,
funciona como guia, aponta para uma direção segundo a qual a
produção da cidade deve seguir.
• É um modelo ou ordenamento ideal que aporta sempre uma ordem
para a construção e transformação urbanas e que, finalmente,
expressa um acordo consensual para a ação.
• Segundo FRANÇOISE CHOAY, ao surgimento espontâneo de
agrupamentos humanos em cidades podemos dar o nome
de urbanificação.
• Este modo de crescimento espontâneo e sem
planejamento também pode ser designado como
orgânico.

• Já o termo urbanismo designa a disciplina que reflete e


age de modo projetual sobre as cidades, como processo
teórico-científico. É um modo de crescimento racional.
→ A relação dos monumentos como peças fortes da estrutura
urbana com o tecido habitacional envolvente, regular e uniforme;

→ a utilização da combinação de geometrias orgânicas com


quadrículas regulares;

→ os efeitos da monumentalidade sem recurso às perspectivas


axiais e a valorização do monumento através da leitura em
escorço, perspectiva oblíqua e seu posicionamento em cota
superior à do observador.

→ Facilmente podemos verificar, nas cidades gregas, alguns dos


pressupostos que dominarão a composição europeia até os
nossos dias, seja de modo evidente ou embrionário.
Com o surgimento do sistema feudal na Idade Média, o poder se
desloca para os castelos fortificados e a cidade gradativamente
perde sua função militar, embora permaneça entre muralhas para
se proteger de invasões.
Os exércitos eram recrutados somente em períodos ocasionais e
entre os homens do campo; e as atividades econômicas eram
ligadas à produção agropecuária no campo. No início, as cidades
apenas abrigavam os mercados que comercializavam esta
produção, não havia produção no interior das cidades; e também
serviam como ponto de encontro para as atividades religiosas que
aconteciam no entorno das grandes catedrais.
Somente entre os sécs. XII e XIII, com a gênese da cidade
“moderna”, é que as cidades passam a desempenhar uma função
mais central na região. Na França, por exemplo, há a instalação do
centro do reino em Paris. As cidades passam a desempenhar uma
função de produção também, e não apenas de comércio do que era
produzido nos campos ao redor.
Aos poucos, foram surgindo os primeiros prestadores de serviço
(trabalhadores), bem como as instituições culturais e educacionais.
Há o desenvolvimento do artesanato, das feiras, de atividades
como tecelagem e construção civil, e das primeiras máquinas de
beneficiamento produzidas no Ocidente: o moinho.
Além disso, vemos o surgimento de uma classe social ligada à vida
urbana, que frequentava escolas, viajava, adquiria conhecimento –
a burguesia.
As cidades Renascentistas
Nas imagens a seguir, vemos as propostas das cidades ideais
renascentistas, baseada no modelo descrito mas não desenhado de
Vitruvius (fig.1).
A principal característica destes modelos é seu caráter geométrico e
ordenado (nítido contraste com a cidade medieval).
Nos inúmeros discursos, tratados, esquemas e projetos dos arquitetos do
período, a forma da cidade é subordinada à unidade e à racionalidade.
Porém, o tamanho contido da cidade fechada medieval não permitia
possibilidades de intervenção em grande escala.
Das propostas ao lado, somente o projeto de Scamozzi foi executado
(figs. 7) na cidade de Palma Nuova, uma das novas cidades criadas por
motivos militares no período (1593).
(LAMAS, op.cit., p.168-169
De acordo com tratado De architectura de Vitruvius), os pintores renascentistas foram os
primeiros a criar cenários urbanos ideais, que posteriormente passaram a ser aplicados na
construção das cidades.
Estes espaços caracterizam-se por um grande eixo ladeado por edifícios nem sempre iguais
ou simétricos. A rua – percurso retilíneo – assume a função de eixo de perspectiva, portanto
é um elemento importante na composição da cidade.
Os edifícios singulares ocupam um ponto expressivo e proeminente na ocupação urbana,
normalmente fechando lados de praça ou perspectivas retilíneas (ponto focal). Os
monumentos também passam a ser incorporados como parte integrante do traçado urbano a
partir daí, compondo um elemento importante na cidade Renascentista e Barroca, que
consideram o espaço urbano um lugar de obras significantes e simbólicas.
PLANEJAMENTO URBANO NOS SÉCS. XVII-XVIII

O traçado urbano no período barroco é uma continuidade da morfologia que surge no


Renascimento. À mesma época que o Neoclassicismo começa a ganhar força na
Arquitetura, surgem também ambiciosas propostas urbanas que se vinculam sempre a
uma ideologia político-religiosa. Os monumentos como esculturas, obeliscos, arcos do
triunfo, fontes, serão utilizados como meio de embelezamento urbano ou como elementos
simbólicos religiosos, sociais, políticos e culturais (LAMAS, op.cit., p. 184)
Assim, da mesma forma os princípios urbanísticos que passam a ser aplicados no
redesenho da cidade tradicional ora servem para a ostentação do poder da realeza
absolutista, ora servem aos princípios revolucionários das novas repúblicas.
Começam a surgir os quarteirões, cumprindo uma função fundiária na divisão em lotes e
edificações e também delimitando a organização geométrica do espaço urbano. Os
quarteirões podem ganhar formas irregulares para gerar espaços regulares no tecido
urbano, acomodando praças, vias e monumentos.
O quarteirão é a unidade-base elementar para a composição das cidades.

Normalmente se adota a retícula ortogonal para o planejamento das vias retilíneas,


entrecortadas por avenidas em diagonal. Estas vias em diagonal frequentemente
formam “estrelas” onde se posicionam edifícios singulares, monumentos e praças verdes.
Plano de Christopher Wren para a reconstrução de Londres após o incêndio de 1666.

Ao lado:
Projeto da Catedral de São
Paulo por Wren, construído
entre 1673-1710, seguindo
pressupostos neoclássicos.
Vista atual do Jardim de Versalhes

Le Nôtre – plano da cidade e parque de


Versalhes (séc. XVII)

O urbanismo barroco também priorizava o


verde nas cidades. Na França, isso ocorreu
principalmente com os parques reais, que
passaram a ser parques e praças públicas.
Em 1746, a cidade de Paris contava com
19 places royales, muitas delas em forma
de estrela com ruas de acessos divergentes
em formas de raios.
(GONSALES, 2005)
“O Parque de Vaux, projetado por Le
Nôtre nos arredores de Paris, é uma
paisagem simétrica e regular até a
linha do horizonte (ver foto). Em
Versailles, o mesmo projetista ordena
um canal em forma de cruz de um
quilômetro e meio a partir do eixo de
simetria do palácio. Esta faixa de água
guia o olho desde o terraço central da
edificação até o ponto de fuga nas
colinas ao fundo a cerca de três
quilômetros de distância, resultando
em um controle rigoroso do ambiente
natural e artificial.
Nos planos barrocos, a transformação
do território é conseguida somente em
parte e não nas cidades habitadas mas
nos espaços vazios do campo. O
ambiente que daí resulta é um mosaico
de parques e intervenções pontuais
que não se interligam em organismos
contínuos.”
(GONSALES, idem)
Parque de Vaux, projetada por Le Nôtre no séc XVII
o quarteirão

1. Pugin: Gravuras representando


uma cidade cristã de 1440 a 1840.
Nota-se a proliferação das chaminés
na cidade densamente ocupada.
2. Schinkel: esboço de viagem: as
áreas industriais e portuárias de
Londres.
3. Área periférica de Londres,
loteada segundo as regras da bye
laws.
4. Sistemas de ocupação dos
logradouros e quarteirões nos
bairros de Manchester, segundo
desenho de Engels.

Fonte: LAMAS, op.cit. p. 205


As cidades industriais
Haussmann em Paris
Cerdá em Barcelona
A revolução industrial foi de fato um dos
elementos primordiais do acontecimento da
sociedade moderna. Na metade do século XVIII
começa o processo de industrialização na
Inglaterra que foi o primeiro país a iniciar com a
indústria.
O desafio da cidade INDUSTRIAL NO séc. XVIII e XIX

Com o surgimento das indústrias e o crescimento


demográfico ao longo do século XIX, as cidades tradicionais
europeias começam a entrar em crise.
A “cidade finita”, que ao longo de 500 anos existiu na
Europa sem grandes desafios, foi completamente
transformada dentro de um século (1800-1909), devido à
existência de uma série de fatores socioeconômicos e
técnico-científicos sem precedentes.
O entrelaçamento destes fatores levaram a um inchaço
urbano e ao surgimento de novas tipologias urbanas que
não puderam ser absorvidas pela forma de ocupação urbana
tradicional, sendo necessárias intervenções drásticas e
metodológicas de renovação urbana.
FRAMPTON (2004) enumera alguns destes fatores técnico-científicos na Grã-
Bretanha:

▪A produção em massa de trilhos de trem de ferro fundido, em 1767, por Abraham


Darby; o que levou à produção simplificada de trilhos em ferro forjado em 1784.
▪A locomotiva a vapor, que foi demonstrada nos trilhos de ferro forjado em 1804
por Richard Trevithick.
FRAMPTON (2004) enumera alguns destes fatores técnico-científicos na Grã-Bretanha:

▪A abertura do primeiro serviço ferroviário público entre Stockton e


Darlington em 1825, o que foi rapidamente seguida pelo
desenvolvimento da infraestrutura ferroviária: em 1860, a Grã-Bretanha
já tinha cerca de 16.000km de trilhos de trem.
▪A invenção da máquina de semear para o cultivo de culturas agrícolas
em fileiras por Jethro Tull, adotadas em 1731, o que possibilitou a
implantação do sistema de rotação de culturas de Charles Townshend.
Isso levou a um incremento da produção de alimentos necessários para
alimentar a crescente população, e a melhoria nutricional contribuiu
para baixar os níveis de mortalidade, junto com os avanços na área
médica.
Do ponto de vista quantitativo, a revolução industrial é quase
imediatamente seguida por um impressionante crescimento demográfico
das cidades, por uma drenagem dos campos em benefício de um
desenvolvimento urbano sem precedentes. O aparecimento e a
importância desse fenômeno seguem a ordem e o nível de industrialização
dos países. A Grã-Bretanha é o primeiro teatro desse movimento, sensível
desde os recenseamentos de 1801; na Europa, a França e a Alemanha
seguem-se a partir dos anos 1830.” (CHOAY, 2000, p. 3-4)
→ Londres:
1801: 864.845 hab.
1841: 1.873.676 hab.
1891: 4.232.118 hab.

→Número de cidades com mais de 100.000 habitantes (1800 e 1895)


Inglaterra: 2 → 30
França: 3 → 12
Alemanha: 2 → 28
Estados Unidos: 0 em 1800; 6 em 1850 (pop. total: 1.393.338 hab.);
e 28 em 1890 (pop. total: 9.697.960 hab.)

fonte: CHOAY, idem.


A cidade de Manchester no séc. XIX – fábricas na cidade

A Revolução Industrial
Para acomodar tamanho inchaço demográfico, a cidade precisou se
expandir para além dos limites dos muros das cidades medievais.

Começam a surgir os subúrbios, primeiro como fuga dos burgueses (os


proprietários das indústrias que enriqueciam) para bairros mais
ordenados e salubres, geralmente ajardinados conforme os princípios das
utopias urbanas do período.
No entanto, com a instalação das indústrias nas periferias das grandes
cidades, contingentes da população operária passaram a se deslocar para
bairros afastados do núcleo urbano, porém próximos dos seus locais de
trabalho.
A cidade perde sua delimitação definida
pelos muros medievais, o subúrbio
descola-se do centro urbano, torna-se uma
entidade à parte e representa grande parte
da massa urbana.
→ em 1861, o subúrbio de Londres correspondia
a 13% de todo o aglomerado urbano; em Paris,
em 1896, o subúrbio representava 24% de toda
a cidade. (CHOAY, 2000)

→Surgimento de favelas e cortiços:


transformação dos antigos bairros em cortiços,
abrigando dezenas de famílias operárias em
condições precárias de salubridade e higiene.
Costumavam se localizar próximos aos locais de
trabalho devido à precariedade e distância do
(alguns proletários chegavam a caminhar mais
de 3 km até as indústria em que trabalhavam)
As crianças também trabalhavam como operárias nas fábricas. Nesta fotografia, uma fila de
pequenos operários pobres na fila da sopa em Manchester, séc. XIX
As condições precárias de moradia e a degradação da cidade tradicional – que passou a ser
inadequada para a circulação dos novos sistemas de transporte velozes e para o escoamento
da produção das fábricas – passou a incomodar os pensadores na época.
Surgem então diversas propostas de remodelamento urbano, porém no início tratavam-se
apenas de modelos utópicos, sem aplicação prática.

Pré-urbanismo
Duas vertentes:
a) descritiva (Legoyt e Levasseur; Adna Ferrin Weber)
b) polêmica
1) Humanitários (médicos, higienistas, homens da Igreja, dirigentes municipais)
2) Políticos (Proudhon, Carlyle, Marx, Engels, Ruskin, Morris, etc.)

Friedrich Engels: A situação da classe trabalhadora na Inglaterra (1845)


Pesquisas feitas nos cortiços e favelas das grandes cidades
britânicas como Londres, Edimburgo, Glasgow, Manchester
→ relatórios de polícia, artigos de jornal, relatórios das
Comissões Reais.
Projeto de Ledoux para a
cidade utópica de Chaux

→ Arc-et-Senans, Salinas Reais


(1774-1779)
URBANISMO NO SÉC. XIX

O séc. XIX é bastante complexo, no urbanismo, é caracterizado pela


continuidade da cidade clássica e barroca – espaços urbanos definidos
pelos quarteirões e delimitados pelas construções – e pelo
aparecimento de novas tipologias urbanas que vão preparando a
cidade moderna.

Modificações sociais importantes determinam profundas


transformações nas cidades e a sua adaptação a necessidades de
infraestruturas, equipamentos, habitação e novas exigências espaciais.
Isso é notável nas grandes intervenções urbanas que começam a
acontecer a partir de 1850 em cidades como Paris e Barcelona.
No entanto, há na morfologia urbana do séc. XIX uma continuidade das
regras tradicionais de composição do espaço e do relacionamento entre os
elementos: a rua; a praça; a avenida; as relações entre edifício –
fachada - espaço urbano; utilização de quadrículas e traçados, etc.

RUPTURA: A cidade deixa de ser uma entidade física delimitada e passa


a se espalhar pelo território indefinidamente, ao contrário da
“cidade finita” anterior.
Os subúrbios
É a partir do final do séc. XVIII que surgem os subúrbios ou bairros periféricos nas grandes
cidades industriais.
Inicialmente concebidos como uma fuga à baixa qualidade da vida urbana, que se degradava
de forma acelerada, os novos bairros invadiam o espaço anteriormente destinado ao campo, e
se contrapondo à densidade das áreas urbanas centrais.
As classes mais abastadas habitavam em meio a bosques e parques, em grandes residências
unifamiliares. A fachada delimitando o espaço privado no alinhamento da rua. As casas são
afastadas, centralizadas no lote, em meio à vegetação. Como forma de delimitar o espaço
privado do público (rua), surgem os muros.

Os novos meios de transporte vão permitir essa ligação dos centros urbanos e locais de
emprego às áreas suburbanas. A rua passa a ser um mero percurso, e a praça deixa de ser um
espaço de encontro. O quarteirão também é trocado por novas formas.
Desenho de Detalhes, Red House, Philip
Speakman Webb, 1859. Museum no. E.64-1916.
Arts and Crafts architecture was, like the
movement itself, ...
Red House
Philip Speakman Webb - 1859
Já os bairros destinado à ocupação das
classes trabalhadoras, são gerados em
contextos diferentes.

O contexto de desequilíbrio entre oferta


e procura de alojamento abre caminho à
sobreposição dos interesses econômicos de
especulação fundiária sobre o desenho
urbano. Os processos de loteamento e
edificação desligam-se da arte urbana e da
arquitetura.

É neste período que surgem grandes


extensões de loteamentos que repetem
quadrículas até a exaustão, sem a menor
preocupação urbanística ou estética. O tecido
habitacional produzido é monótono, de ruas A luta contra a destruição da cidade a partir
extensas e muitas vezes feias. desta visão meramente utilitária, fruto de
especulação fundiária e que cresce sem
Por toda parte, é comum a dificuldade dos ordenação ou controle, passa a ser um dos
planos urbanísticos de serem postos em principais objetivos dos urbanistas.
prática diante da força dos interesses Além disso, nascem novas formas e
econômicos e do desinteresse dos elementos urbanos em respostas às
governantes em regularizar esta prática propostas da cidade clássica e barroca, a base
especulativa. do urbanismo moderno.
HAUSSMANN
Plano para Paris
O principal objetivo da reforma urbana idealizada pelo
Barão Georges-Eugène Haussmann para Paris, é o de
adaptar Paris às novas exigências sócio-econômicas e
militares da época. Foi prefeito em Paris, indicado por
Napoleão III, e o executor da grande remodelação da
cidade que inspirou as intervenções urbanas ao redor do
mundo por décadas.

A grande transformação da cidade ocorre em um terço do


tecido da cidade, incidindo principalmente no casco velho
da cidade medieval. Para Haussmann, “a arquitetura é um
problema administrativo” e só deve visar os interesses de
Napoleão, interesses esses, de cunho estritamente
militares.

A nova Paris de Haussmann é entendida por todos como


um símbolo de modernidade, irradiando sua influência
ao redor do mundo. No Brasil, podemos afirmar que a
reforma urbana do Rio de Janeiro, de Pereira Passos; e o
plano da cidade de Belém, são inspirados neste modelo.
Planta de Paris em 1853, antes dos trabalhos de Haussmann.
Fonte: Livro História da Cidade, Leonardo Benevolo.
Higiene e Infraestrutura Urbana

O foco principal é a melhoria da circulação, o acesso rápido a toda a cidade como visão
estratégica, estabelecendo uma imagem geral de modernidade. Esta mudança de
imagem envolve também a questão da insalubridade. Para isso são eliminados bairros
considerados degradados, as ruas são arborizadas e recebem sistema de iluminação à gás.
Paris era, à época, a cidade mais populosa da Europa e uma das mais insalubres. A
intenção higienista de Haussmann era clara.

Haussmann propõe um bem-sucedido modelo de saneamento básico, instalando uma rede


de esgoto e abastecimento de águas, com a implantação de um sistema de aquedutos.
Esta rede é a mesma em operação ainda nos dias atuais.

A antiga cidade medieval, com traçado orgânico e ruas estreitas, é cortada por grandes
eixos e contornada por um anel viário. São criadas praças com monumentos que servem
como ‘cenário’. Os monumentos mais antigos conservados pelo plano de Haussmann, são
revalorizados e destacados ao serem reenquadrados em pontos focais ao fim de eixos
viários.
Novos elementos viários
“Haussmann retalha a cidade segundo traçados que partem em feixes de praças ou
cruzamentos. No essencial, este desenho continua as tradições barrocas do século XVIII
(...) Haussmann trabalha a cidade existente numa sucessão de intervenções que,
embora sem plano prévio, revelam grande coerência final” (LAMAS, op.cit, p. 214)

São criados vários boulevards que unem pontos da cidade (gare a gare, bairro a
bairro, etc.). Muitas delas se encontram em um novo elemento urbano, o carrefour
(rotatória), que organiza o cruzamento de vários traçados. Neste ponto de confluência
de vias se localizam praças e monumentos notáveis. Essas intervenções regularizam o
traçado não aproveitando o existente, transfigurando a cidade.

“Napoleão e Haussmann conceberam as novas vias e artérias como um


sistema circulatório humano. Tais imagens, lugar-comum hoe, eram altamente
revolucionárias para a vida urbana do século XIX. Os novos bulevares
permitiram ao tráfego fluir pelo centro da cidade e mover-se em linha reta, de
um extremo ao outro – um empreendimento quixotesco e virtualmente
inimaginável até então” (BERMAN, op.cit., p. 180)
Esquema de trabalhos de Haussmann em Paris.
Em linhas mais grossas são as novas ruas, O tracejado quadriculado representa os
novos bairros. O tracejado horizontal, os dois grandes parques periféricos: o Bois de
Boulogne (à esquerda) e o Bois de Vincennes (à direita)
A estética de Haussmann: os bulevares Champs-Elysées e a Avenida de Iena. (LAMAS, op.cit.)

“O bulevar parisiense foi a mais espetacular


inovação urbana do século XIX, decisivo
ponto de partida para a modernização da
cidade tradicional” (BERMAN, 2007, p. 180)
Os quarteirões

No plano de Haussmann o quarteirão é determinado pelo sistema viário – neste caso o


quarteirão é residual, configurado a partir do que ‘sobra’ depois de definido o traçado viário,
tornando-se um elemento complexo formado por lotes de formato irregular. Os quarteirões
podem ser poligonais, retangulares, triangulares ou se aproximam de um padrão “bloco”,
porém com uma abertura no seu interior, como um “pátio” central.

São definidas leis de ocupação:


→ cada lote é perpendicular à rua e não tem a mesma medida padrão;

→ os edifícios passam a ter leis de padronização para as fachadas; a tipologia


urbana segue um catálogo pré-definido, passam a ter unicidade arquitetônica.

“A tipologia edificada de Haussmann tem uma unidade que concorre par a alta qualidade
formal da cidade: na organização das fachadas e coberturas, nos materiais e elementos
construtivos – portas, janelas, cantarias, cornijas e outros pormenores. Sem esta unidade
arquitetônica, Paris seria bem diferente e não teria a força e a coerência de uma das mais
belas cidades do mundo” (LAMAS, op. Cit., p. 214)

Os quarteirões podem ser rasgados pelas galerias e passagens passam a ter função comercial
– multifuncionalidade do quarteirão e abrigam cafés e lojas. São definidas áreas especiais para
as estações ferroviárias.
Os tipos de quarteirões
resultantes do traçado diagonal
das ruas e as formas de
ocupação dos lotes.

O tipo-padrão da construção
estipulada no projeto de
Haussmann.
A Avenida Champs-Elysées hoje.
A Île de la Cité se transforma
no coração da cidade, passando
a ser uma área militar e
administrativa.
Na reforma de Paris, foram
destruídos 49km de ruas
estreitas antigas, construídos
165k, de novas vias, foi
implantado o sistema de esgoto
(considerado até hoje um dos
melhores do mundo e que
atende à cidade toda.
Nas estrelas formadas pelos
encontros dos bulevares em
diagonal, são situados ou
mantidos os monumentos
considerados importantes,
como os arcos do triunfo ou a
Catedral de Notre Dame.

A Paris de Haussmann, é a
Paris que vemos hoje.
CerdÀ
Plano de Barcelona
O plano para Barcelona
do engenheiro espanhol
Ildefonso Cerdà, aprovado
inicialmente em 1859,
apresenta uma
intervenção
completamente diferente.
Os dois traçados
urbanísticos básicos na
época, a quadrícula e o
radial – neste caso o
segundo subordinado ao
primeiro – eram
sintetizados em um
grande retângulo de
sessenta por vinte
módulos, localizado no
espaço livre deixado entre
a cidade medieval
amuralhada e os
povoados vizinhos e
cortado por duas
diagonais.
Como um dos primeiros tratadistas de arquitetura e urbanismo a reivindicar a
salubridade das habitações de maneira radical e efetiva como a condição primeira a
satisfazer na criação da nova cidade, Cerdá considerava a moradia como suporte
fundamental da qualidade de vida. Emprega grande esforço na formulação das
“ilhas tipo” e, a partir do reconhecimento da quadrícula como o traçado que reúne
tanto vantagens de ordem circulatória, topológica, construtiva, jurídica como
urbanística, chega ao módulo quadrado de 113 metros de lado com um chanfro de 20
metros como o mais adequado.

Ao compreender a necessidade de compactação da cidade industrial, abre mão de


qualquer exemplo de habitação unifamiliar com jardim, ideais no seu pensamento,
mas procura manter o máximo de qualidade ambiental propondo ilhas abertas com
dois blocos – três e até quatro blocos na versão de 1863.

Com isso, a combinação destas ilhas-tipo formassem um tecido urbano variado,


permitindo uma enorme diversidade de espaços. “Os quarteirões organizar-se-iam
com centros cívicos próprios, contendo igreja e escola, de certo modo antecipando as
‘unidades de vizinhança’ [de Le Corbusier].” Os equipamentos seriam distribuídos de
forma uniforme por todo o tecido urbano, evitando diferenças em bairros.
Com estas variações, tornando o espaço no interior das quadras público, Cerdá rompe
com a visão anterior de um distinção entre rua e quarteirão.
Cerdà escreverá mais tarde em sua Teoría General de la Urbanización, publicada
em 1867, que “a urbanização reside tão somente na associação do repouso e do
movimento”. Nesta obra, Cerdá expõe sua metodologia, seu pensamento urbanístico e
suas preocupações de caráter sociológico.

“Cerdá será o ‘primeiro urbanista’ no sentido moderno do termo, na medida em


que consegue coordenar os aspectos espaciais e físicos com preocupaçoes
funcionais, sociológicas, econômicas e administrativas, tratando pela primeira
vez a cidade como um organismo complexo e integrador de vários sistemas”
(LAMAS, op.cit., p. 216)

A presença dos dois conceitos diretores, a habitação e a circulação, que hoje mais do
que nunca continuam sendo os dois pólos operacionais do urbanismo estão presentes, no
plano de Barcelona no cuidado com a habitação e no projeto cuidadoso de uma rua
realmente racional, com 20 metros de largura e separação entre os meios de locomoção.
Ao contrário de Paris, a trama ortogonal, homogênea e igualitária não caracteriza uma
Barcelona monumental, mas ambos planos dão corpo às palavras de ordem do desenho
urbano no final do século XIX e começo do XX: saneamento e embelezamento.
Bibliografia

BERMAN, Marshall. Tudo o que é sólido se desmancha no ar. São Paulo: Companhia das
Letras, 2007.

CHOAY, Françoise. O urbanismo. São Paulo: Perspectiva, 2000. 5a edição.


FRAMPTON, Kenneth. A Critical History of Modern Architecture. New York: Thames &
Hudson, 2004.

FRANSCINA, Francis (et al.) Modernidade e modernismo. São Paulo: Cosac & Naify
Edições, 1998.

GONSALES, Célia Helena C. Cidade moderna sobre cidade tradicional: movimento e


expansão (parte 2). In: Portal Vitruvius – Arquitextos. Edição 059, texto especial 292, abril
2005. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp292.asp

LAMAS, José M. R. G. Morfologia urbana e desenho da cidade.

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