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Revolução Humana – volume 3 – nova partida

Ano novo de 1948

Ele sentia uma abundante vitalidade em seu corpo. Nada podia obstruir essa energia
vital. Ele acreditava ser natural que o poder da recitação do daimoku preenchesse
completamente o Universo.

Josei Toda voltou a si. Recitou por três vezes o daimoku final e concluiu o gongyo. Com
um sorriso no rosto, virou-se e encarou a fisionomia de todos. Os trajes eram pobres,
praticamente o mesmo de sempre, mas o rosto corado de todos estava reluzente,
levemente rosado. Os olhos de todos brilhavam vividamente.

— Feliz ano-novo!

Uns após outros, todos o cumprimentaram. Koichi Harayama acrescentou:

— Sensei, feliz ano-novo. Como sempre, neste ano também...

Josei Toda disse sorrindo:

— Feliz ano-novo. Mas, nada de “como sempre”. Se continuarmos fazendo o mesmo do


ano passado, o kosen-rufu vai acabar se deteriorando, não é mesmo? Harayama quer
continuar se movimentando no mesmo ritmo rastejante do ano passado?

Todos caíram na gargalhada.

— Se Mishima continuar resmungão, Konishi mal-humorado e Seki com rosto pálido de


preocupação, quem mais sofre sou eu.

As gargalhadas se intensificaram ainda mais.

— Entramos agora, no terceiro ano da reconstrução. Gostaria que vocês conduzissem


maravilhosamente a prática do shakubuku, levantando-se com poderosa fé e fazendo
melhor uso das características peculiares de cada um. Quero que esse ano seja dessa
forma. É preciso que haja uma grande mudança de todos.

O sorriso desapareceu do rosto de todos. Josei Toda enfatizava cada palavra como se as
repetisse.

...

Nesse ponto, ele deu uma pausa e parecia procurar as próximas palavras. Ele pensava
frequentemente em como fazer que cem pessoas avançassem um passo ao invés de uma
única pessoa avançar cem passos.

— No entanto, não estou dizendo em absoluto para que realizem atividades imitando
minhas palavras. O que eu quero dizer é que devem transmitir de coração, com base na
sua própria fé e convicção, esteja eu presente ou não. Já perceberam que a conversa de
vocês não é páreo para a convicção dos recém-convertidos que, mesmo sem entender a
teoria, estão animados com os benefícios conquistados por meio de sua forte fé?
Quando a organização se sistematiza, a inércia dos líderes começa. Porém, não
conseguem perceber isso por si próprios. Acham que estão se dedicando como sempre.
O problema é o “como sempre” que leva ao “andar em círculos”. Esse é o perigo.

Sem conseguir ficar em silêncio, Koichi Harayama manifestou:

— Sensei, as minhas palavras estavam erradas. Neste ano, vou mudar enormemente. Por
favor, conte comigo.

— Entendeu? Tudo no Universo, seja um corpo celeste, ou um único piolho, está em


constante mudança. Nada consegue ficar imutável nem por um instante. Pensar que
podem continuar “como sempre” é mera ilusão. Então, a questão maior é se mudam
para melhor ou pior. Quando não se percebe isso, as pessoas são levadas pela inércia.
Em outras palavras, elas ficam tranquilas sem ao menos perceber se estão mudando para
melhor ou para pior. Esse é o temeroso da inércia. Quando a fé cai na inércia, isso já é o
mesmo que abandoná-la. A fé é a ação prática para mudar a si positivamente em alta
velocidade. A força que possibilita a mudança de tudo a cada momento é a vida. Essa
força é conhecida como Aquele que Assim Chega, ou seja, o Buda. Nichiren Daishonin
a denominou de Nam-myoho-renge-kyo. De forma concreta, ele a revelou como o
Gohonzon da possessão mútua dos dez mundos.3 Essa é a base fundamental de tudo
que, ao ser ignorada, faz com que nossa fé deixe de existir. Seja no Universo em si, ou
em cada um de nós, minúsculos seres humanos, existe inerentemente a extraordinária
energia da vida, o Nam-myoho-renge-kyo. A pessoa que pratica esse budismo sem
conseguir se conscientizar disso acaba sendo prejudicada. É o mesmo que não ligar a
chave do motor, mesmo tendo oportunidade. É equivalente ao músico que se senta
diante de um piano e não toca suas teclas. Se acharem que é suficiente continuar
praticando nesse mesmo ritmo, não há sentido algum. Por outro lado, mesmo que
pensem que a atual condição de infelicidade continuará por toda a vida, isso não é
verdade, pois tudo se transforma. Por meio da prática da fé, infalivelmente a condição
de infelicidade mudará para felicidade. Esse é o princípio natural chamado de
transformação do destino. Ao contrário, se não houver essa prática da fé fundamental,
não será possível prever o momento em que a felicidade atual, que parece continuar
eternamente, se desviará em direção à infelicidade.

....Com base em uma correta visão histórica e em uma inequívoca filosofia, Josei Toda
fazia uma apreciação crítica de tudo e se colocava em ação. Seu futuro reluzia sempre
com os raios da primavera.

Na sala fria, os primeiros raios solares do ano-novo penetravam. Na rua, finalmente os


primeiros movimentos de pessoas eram notados.

— À luz dos princípios do budismo, não é possível que essa condição persista por tanto
tempo. Além disso, foram dados os primeiros passos do kosen-rufu. Quanto maior o
avanço do kosen-rufu, mais rápida será a libertação da situação presente. O kosen-rufu
de um país corresponde à transformação do seu destino por meio da concretização do
rissho ankoku4( estabelecer o ensino para pacificação da terra) deste país. É um
empreendimento que, na história da humanidade, nunca foi realizado. Pensem bem.
Mesmo uma excelente ideologia ou filosofia tem uma dificuldade enorme de salvar um
único ser humano. E, quando consegue algo, é no máximo um conforto espiritual.
Nunca aconteceu de conseguir salvar um país pela raiz. Apesar disso, as pessoas não se
cansam de sonhar com uma sociedade ideal. Talvez por terem sempre vivido na
infelicidade. Afirmo que é absolutamente possível realizar o que ninguém conseguiu até
hoje. Isso porque Nichiren Daishonin nos dá garantia absoluta. Até onde eu, um
discípulo indigno, sei, nunca aconteceu de as palavras de Nichiren Daishonin terem
falhado. ....O budismo é rigoroso. E, por ser rigoroso, tenho que falar sobre isso com
vocês. A partir da expressão “como sempre, esse ano também”, a conversa se estendeu
demasiadamente. Para mim, uma simples expressão permite compreender plenamente o
verdadeiro aspecto do coração de vocês. Isso se chama fé. A vida não possui forma nem
cor, mas manifesta-se solenemente no aspecto real. Não devem ser mesquinhos e achar
que estou capturando-os pelas palavras. O “verdadeiro aspecto”5 reflete-se em “todos os
fenômenos” e “todos os fenômenos” são o “verdadeiro aspecto”.

O espírito vigoroso dele fez tremular o coração dos discípulos. O ambiente da sala
estava envolto por uma tensa seriedade. O olhar deles fitava Josei Toda vividamente.
Em meio ao piso desgastado de cor marrom escuro, às paredes cheias de fuligem, e ao
teto manchado, parecia que do semblante de Josei Toda irradiava um feixe de luz
similar a um flash da cor de platina. Era rigorosa e genuína, mas ao mesmo tempo,
infindavelmente calorosa.

— A conversa acabou se tornando difícil logo no ano-novo. Mas quero que entendam
que esse ano será difícil. Finalmente recebemos uma época em que precisarei treiná-los
exaustivamente. Isso, também, é uma questão de época. Não devem manifestar
insatisfação de que só falo coisas desagradáveis, sem ao menos entender a época. Não
há ninguém que tenha caminhado uma existência grandiosa sem receber treinamento. O
mesmo acontece no mundo da arte, da tecnologia, dos negócios e da política. Devem
entender que, em uma revolução sem precedentes, é natural que haja um treinamento
rigoroso. Não digo tudo isso com ódio de vocês. De que adianta odiá-los? Estou
pensando seriamente na existência de vocês por toda a vida. Não devem me entender
erroneamente.

Josei Toda considerou ter dito tudo que era necessário. Ele sentia um enorme afeto
pelos discípulos que o ouviam muito tensos. Voltando ao seu olhar gentil, disse com
enorme sorriso no rosto:

— Desculpem-me por ter reclamado tanto... É ano-novo. Vamos então ao saquê de ano-
novo.

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