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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS V


LICENCIATURA PLENA EM HISTÓRIA

EDVALDO LUIZ DOS SANTOS

ECONOMIA POMBALINA EM JOÃO LUCIO DE AZEVEDO E KENNTH


MAXWELL: DIALOGOS DIVERGENTES SOBRE UM PERSONAGEM
EMBLEMÁTICO

SANTO ANTÔNIO DE JESUS – BA


2015
EDVALDO LUIZ DOS SANTOS
ECONOMIA POMBALINA EM JOÃO LUCIO DE AZEVEDO E KENNTH
MAXWELL: DIALOGOS DIVERGENTES SOBRE UM PERSONAGEM
EMBLEMÁTICO

Artigo apresentado ao Curso de Licenciatura Plena em História


da Universidade do Estado da Bahia – UNEB - Campus V para
obtenção do título de Licenciatura em História. Orientadora:

SANTO ANTÔNIO DE JESUS – BA


2015

EDVALDO LUIZ DOS SANTOS


ECONOMIA POMBALINA EM JOÃO LUCIO DE AZEVEDO E KENNTH
MAXWELL: DIALOGOS DIVERGENTES SOBRE UM PERSONAGEM
EMBLEMÁTICO

Artigo apresentado ao Curso de Licenciatura Plena em História


da Universidade do Estado da Bahia – UNEB - Campus V para
obtenção do título de Licenciatura em História.

____________________________________
Prof.:
(Orientadora)
(UNEB)

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Prof.:
(UNEB)

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Prof.:
(UNEB)
A compressão da política econômica do Marquês de Pombal nos exige
um cuidadoso trabalho de observação das forças em disputa na Europa da
segunda metade do século XVIII, bem como dos contrastes entre o resto do
chamado velho continente e as coroas Ibéricas. Estas últimas, encontradas no
centro da vida econômica do continente europeu, são também identificadas nas
duas biografias de Carvalho e Melo _ ora em estudo. Entendidas como
atrasadas em comparação com as nações europeias mais desenvolvidas, faz-
se necessário identificar as chaves interpretativas desse atraso, _ utilizadas
tanto por Kenneth Maxwell quanto por João Lúcio de Azevedo, _ haja vista que
esses autores apresentam interpretações bastante díspares quanto à obra de
Sebastião José de Carvalho e Melo.

Para intermediar o dialogo entre esses dois biógrafos, essa discursão se


apoia no clássico de Francisco José Calazans Falcon: A Época Pombalina,
texto de cunho teórico de grande contribuição para pensarmos tanto o período
quanto o personagem em estudo. É a partir do texto de Falcon que se
trabalha aqui a inserção da personagem e das coroas Ibéricas nos quadros da
ilustração, da monarquia absolutista, da economia mercantilista, da
modernidade europeia e da transição feudo-capitalista; transição entendida por
esse autor como todo o período que a tradição historiográfica ocidental
convencionou chamar de mercantilista.

Esses conceitos são de importância fundamental para se pensar o


Portugal do século XVIII e é a partir deles que tentaremos entender a
construção dos discursos sobre a economia pombalina, contidos em Maxwell e
em Azevedo, bem como as diretrizes interpretativas de um e outro autor.

Em Azevedo, esse esforço de interpretação está concentrado nas ações


propriamente ditas do ministro, com foco principal em três aspectos da gestão
pombalina: na guerra travada contra a Companhia de Jesus; no jogo
diplomático, e ao mesmo tempo perigoso, com a coroa britânica; e na
personalidade despótica de Pombal. Esses aspectos da gestão pombalina é
que dão o tom do discurso construído pelo autor de O Marques de Pombal e a
sua Época.
_ É a partir desses três pontos, que o escritor luso-brasileiro faz as
críticas à política econômica do Marquês de Pombal, traçando como aspecto
mais nocivo desta administração no campo da economia a falta e/ou ausência
do liberalismo econômico.

É um texto com fortes características de uma historiografia positivista, no


qual se assegura a veracidade dos fatos narrados, pela garantia de
documentação comprobatória, aspecto que não se entenda como um pecado
do autor, mas, como constructo de uma época. Assim, caso se opte pela
mesma perspectiva de João Lucio de Azevedo, guardasse-a para a História do
Portugal pombalino um período de terror, norteado por um despotismo
endêmico que tivera arruinado as finanças da coroa lusitana e provocado
distúrbios e calamidades entre os súditos de sua majestade D. José I.

Isso não quer dizer, que os aspectos do reformismo econômico sejam


negligenciados pelo autor, ao contrario, ele se vale de uma perspectiva
verídica, mas, pessimista para condenar a política dos monopólios pombalinos,
a perseguição aos jesuítas, as alterações no status-quo da sociedade lusitana,
a reforma tributária; que acabará com a isenção de impostos para nobres e
clérigos, e as reformas na administração que teria servido para o
enriquecimento privado em detrimento da coroa josefina.

O texto de Azevedo é resultado de um árduo trabalho de pesquisa em


fontes diretas com pouquíssimas citações de outros autores, e não conta com o
privilégio de uma revisão bibliográfica, de vasta literatura comparativa sobre o
assunto e sobre questões de cunho mais geral que enquadram o tema, a
exemplo _ da modernidade europeia, da situação das Coroas Ibéricas, da
influência da filosofia iluminista, do enquadramento de Portugal dentro da
economia mercantilista e do próprio processo de consolidação do Estado
monárquico absolutista. Aspectos sobre os quais só com o passar dos anos –
e depois de vários estudos – foi possível ter uma compreensão mais ampla,
talvez beneficiada pela distância no tempo entre esses estudos e o sujeito e o
objeto estudados.

Essas questões aparecem em Azevedo como marcadores do espaço


tempo em que se inserem o estudo e o personagem em foco, sem o devido
enquadramento desse personagem e da sociedade lusitana nesse contexto
mais geral que, segundo o autor, o Portugal de Pombal ainda não havia
alcançado. Como se os países Ibéricos fossem um corpo estranho dentro da
Europa moderna.

“O intelecto de Sebastião José de Carvalho não era, como o


d'esses, accessível ás ideais de liberdade mental e politica 1, já
então dominantes entre as classes ilustradas, lá fora. Não
tivera ele, como D. Luiz da Cunha e Alexandre de Gusmão, a
fortuna de sair da pátria em anos juvenis, quando o
entendimento, ainda maleável, facilmente se deixa vencer e
subjugar. O seu fora modelado por esse mesmo ensino
coimbrão [...]_ Acaso da aplicação de processos antiquados
resultou o malogro da sua obra [...] Dai resultou que a efêmera
revivescência da nação, no período pombalino, não passa de
um curto parêntese” [...] (AZEVEDO, 1922, p. 89)

D. Luiz da Cunha e o brasileiro Alexandre de Gusmão figuram entre as mentes


que tendo vivido fora de Portugal teriam se deixado moldar pelas ideias de
modernidade e liberdade, correntes nos ditos países desenvolvidos (Inglaterra
e França) e estariam entre os homens que bem discerniam os males da pátria,
assim como Antonio Ferreira Encerrabodes e Marco Antonio de Azevedo.
Pombal, embora tivesse tido contato com os mesmos princípios não os teria
assimilado, segundo o autor,_ por ter feito a sua experiência na Inglaterra e em
Viena de Áustria, quando já tinha uma mentalidade formada, e não em anos
juvenis como os outros citados.

A crítica de Azevedo é extensiva às coroas Ibéricas, e em particular à


sociedade lusitana como um todo, e não apenas à política e à pessoa de
Pombal. Nesse caso, a política pombalina representa a imagem de um atraso
que se estendia aos campos da administração, cultura e economia, cujas
intervenções do ministro, embora tenham causado a perturbação da ordem
vigente, não fora capaz de superar.

Em outra perspectiva, muito distinta da abordada por João Lucio de


Azevedo, o texto do Britânico Kenneth Maxwell busca inserir Pombal dentro
dos quadros do pensamento iluminista, tomando _ a necessidade de

1
“Não era acessível às ideias iluministas e liberais”, ideias com as quais o ministro havia entrado em
contato, nos anos de experiência dos consulados em Inglaterra e Viena.
fortalecimento do estado absolutista; a política mercantilista, comum às
principais coroas europeias; e o processo de modernização tardia da coroa
lusitana – irmanada com a coroa espanhola – como principais elementos para
sua análise.

As Coroas Ibéricas da segunda metade do século XVIII seriam de


acordo com quase toda a bibliografia consultada, os exemplos mais flagrantes
de permanência do status quo da sociedade medieval. Segundo Falcon,
Portugal e Espanha pareceram parar no tempo durante o processo de
modernização das nações da Europa,_ imobilidade que se revela nas
estruturas de organização social, nos códigos jurídicos, na manutenção do
direito canônico, na subordinação ao poder eclesiástico (católico) e
principalmente, nas estruturas administrativas e econômicas dos dois países.

A fixidez do mundo ibérico, após o dinamismo


vanguardeiro demonstrado durante a época áurea dos
descobrimentos e conquistas, constitui, sem sombra de dúvida,
um dos mais significativos paradoxos da Europa moderna.
(Falcon, 1982, p 167)

Há no texto de Maxwell um grande esforço teórico e metodológico para


interpretar a gestão pombalina à luz do pensamento iluminista da segunda
metade do século XVIII, considerando a inserção de Portugal no conjunto da
Europa como questão chave para o entendimento da política do ministro de D.
José I. Nesse sentido, Marquês de Pombal: Paradoxo do Iluminismo, longe de
romantizar a imagem do ministro, embora busque justificar suas ações, se
inclina numa perspectiva analítica _ ao retomar o movimento das luzes
identificando-o com o absolutismo monárquico e com a consolidação do estado
nacional burguês.

Maxwell é o contraponto de Azevedo nessa discussão, não apenas pela


divergência do discurso muito mais pró que contra a politica do ministério
pombalino, mas, sobretudo, por representar outra geração de historiadores já
inclinados a questionar documentos com o objetivo de construir outras
possibilidades de verdades, se enquadra dentro da máxima de que; se o fato
enquanto tal é inquestionável, os discursos sobre o/ou os fatos podem sim ser
muitos e múltiplos.
Se nos é permitido dizer que o texto de Azevedo é um texto de fortes
características da historiografia positivista do início do século XX, sobre
Maxwell fica as claras evidências da influência marxista já duramente
questionada, mas, que não nos permite atribuir ao autor o rotulo de marxista, é
um texto que goza do privilégio de uma vasta revisão bibliográfica e privilegia
aspectos múltiplos de análise dando ênfase não só no personagem, mas,
também na conjuntura política, nos aspectos econômicos e ideológicos no caso
da filosofia iluminista fundamental para entendemos o personagem e a época.

A história da administração do governo de Pombal é, por


consequência, um antídoto importante para a visão
excessivamente linear e progressiva do papel do iluminismo no
século XVIII na Europa e da relação entre o iluminismo e o
exercício do poder do Estado [...] Muitas vezes, também, no
discurso do século XVIII, presumimos que a liberdade é a serva
do progresso. Mas essa visão nem sempre se sustenta quando
examinamos a periferia da Europa. Aqui [...] a união mais
comum era “Ordem e progresso” e não a feliz aliança “ordem e
liberdade (MAXWELL, 1996, p. 171 – 172)

Para o autor, Pombal se valeu das teorias e práticas em voga e já adotadas por
outras nações para alavancar a economia lusitana, adotando medidas
protecionistas e buscando mecanismo para enfrentar o dilema da economia
mercantil. Economia apresentada como dilema, _ à medida que, na contramão
das demais nações da Europa, Portugal e Espanha precisavam de medidas
que lhes permitissem conter a saída de ouro e prata, ao passo que as outras
nações trabalhavam na perspectiva de atrair os dois metais preciosos.

Há que se considerar ainda os desafios da administração do vasto e


disperso Império português, com questões de ordem política, econômica,
diplomática, jurídica e administrativa. Era urgente, segundo o próprio Azevedo
levantar os créditos do país no estrangeiro, restaurar as finanças, reanimar a
indústria e reestabelecer a autoridade que se enfraquecerá nos anos finais do
reinado anterior com a doença de D. João V.

As questões de ordem diplomática havia muito estavam embaraçadas


com as questões de ordem econômica, tendo Portugal a Inglaterra como seu
principal parceiro comercial e político desde a restauração que pôs fim à União
das Coroas Ibéricas, em 1640. Desde então a coroa luza tornou-se dependente
do apoio das armas de sua majestade britânica, para garantia dos domínios
portugueses tanto na Europa quanto no ultramar. _ Segundo Fernando Novais,
“embora as raízes da aliança inglesa fossem antigas, foi a partir da delicada
situação da restauração que Portugal passou a trocar concessões comerciais
por apoio político militar.” (Apud, MENEZES E COSTA, 2012, p.1 de 11)

Entre os acordos comerciais está o tratado de Methuen, de 1703,


envolvendo os panos da Inglaterra e os vinhos de Portugal, parceria muito
questionada tanto no contexto em que foi firmada, quanto nos séculos que se
seguiram. Muitos historiadores atribuem a esse contrato a destruição e/ou
estagnação da indústria manufatureira de Portugal. Embora esse tratado
tivesse suscitado muitos discursos contrários, nunca fora para o ministro de D.
José I um mal negócio, teria sim, faltado aos lusitanos, mecanismos que não
permitissem que o acordo se tornar pernicioso para os portugueses. Curioso é
que, com relação a esse tratado, há no texto de Azevedo uma estima
disfarçada, à medida que se alega que as reformas pombalinas viriam a
empobrecer as províncias que o tratado de Methuen havia enriquecido.

A ironia com relação a essa afirmativa é que o próprio autor descreve


um quadro no qual a produção desenfreada de vinhos _ estava causando
sucessivas quedas no preço e na qualidade, o que, consequentemente,
diminuiria a competitividade do produto nos mercados internacionais. A criação
da Companhia Geral da agricultura das Vinhas do Auto-D’ouro, 1756
demarcando uma área especifica para a produção dos vinhos e instituindo o
controle de qualidade, é, segundo Maxwell, antes uma medida protetiva que
restritiva.

Nesse caso, caberiam e cabem as críticas ao aparato restritivo que


cerceou os pequenos produtores e pequenos comerciantes da participação
desse mercado, - e não ao conjunto geral das medidas que tinham como
objetivo garantir o mercado e a produção aos súditos da Coroa Portuguesa -,
que vinha sofrendo forte influência da participação dos comerciantes e do
capital Britânico.
No inicio do reinado de D. José I, em 1750, e do ministério Pombalino, o
ouro que fluía das minas do Brasil era um dos principais elementos que
contribuíam para o desequilíbrio da balança comercial portuguesa, com
favorecimento direto para a Inglaterra. É fato que não só os panos ingleses
eram pagos com o ouro que saía das minas, mas todo o luxo da nobreza
portuguesa que, baseada em uma riqueza do além mar, pouco incentivou a
indústria e agricultura da nação, deixando para comprar no estrangeiro aquilo
que poderia produzir em suas fronteiras.

Para agravo da situação, não era só a balança comercial desfavorável


que reclamava a atenção do novo ministro dos assuntos exteriores e da guerra,
Pombal, mas os desafios de fiscalizar e conter a saída clandestina via
contrabando do metal amarelo e dos diamantes. Diminuir o contrabando exigia
uma série de medidas que agitavam outros campos da economia, uma vez que
essa atividade era praticada com o apoio de colonos muitos dos quais
funcionários da Coroa.

A questão das minas no Brasil foi o primeiro dos negócios colocados sob
a tutela do ministro, mesmo não fazendo parte das questões que lhe cabiam
como ministro dos negócios estrangeiros e da guerra. Conter a saída de ouro
do Brasil foi, durante a gestão pombalina, uma batalha com várias frentes,
fosse pelo empenho em diminuir a influência e os privilégios de que dispunham
os comerciantes ingleses, fosse pela necessidade de se estancar o
contrabando que contou com a colaboração de muitos dos súditos de sua
majestade portuguesa.

As medidas adotadas para conter a saída do metal precioso incluíram


também a solução para o problema antigo, o da melhor forma da coleta de
impostos sobre a produção de ouro. Estabeleceu-se a quantia mínima de cem
arrobas anuais de ouro como imposto para a coroa sobre a extração, e a
derrama2, caso a quantidade não fosse alcançada; foram criadas as casas de
fundição, com o objetivo de fundir todo o ouro extraído das minas; confiou-se
essas casas aos proprietários locais mais abastados, nomeados por uma

2
O excesso, que em um ano se verificasse sobre o mínimo do ajuste, levava-se em conta,
como garantia de renda do ano seguinte; revertia, porém, á coroa, quando preenchido o limite
pela entrada regular da contribuição. (Azevedo,1922 p.102)
pluralidade de votos nas assembleias municipais _ aprovados pelo ouvidor da
coroa no distrito, e não mais pelos magistrados. Em 1751, os ourives foram
expulsos da capitania de Minas Gerais para dificultar as tentativas de fraude.

O brasileiro Alexandre de Gusmão [...] achava que o


esquema havia sido “fabricado com mais zelo do que
experiência em minas” e que fracassaria, como havia
fracassado todos os outros métodos para a prevenção do
contrabando e da fraude. Acreditava que o tributo recairia, na
verdade, somente sobre os mineiros, virtualmente isentando
eclesiásticos, homens do governo, magnatas locais e
comerciantes, os quais, [...] se apossavam da maior parte do
ouro dos mineiros em troca de mercadorias e alimentos. Via
um grande perigo no processo de derrama: a taxa individual
para completar a cota, que de novo acreditava ele, iria recair
pesadamente sobre os mineiros. [...] (MAXWELL, 1996, p. 56 –
57)

Embora não se valendo dos mesmos argumentos de Gusmão, Azevedo


não ver nas medidas adotadas elementos que pudessem apresentar solução
para a questão da contenção da saída clandestina do metal amarelo.

A quinta parte do ouro minerado tocava por direito á coroa;


pesado tributo, que absorvia o mais liquido da exploração [...]
As razões, que se invocavam contra a capitação, pareceram
aceitáveis a Carvalho, não pelo que podia afetar a propriedade
dos mineiros, mas para fazer rendoso o tributo [...] Sem que a
mudança obstasse aos contrabandos, aos quais o enorme
valor da imposição convidava, os colonos deram-se por
satisfeitos: o produto conhecido das minas aumentou; e a
fazenda real teve á sua parte muito mais do que a quantia
mínima, arbitrada na lei para cada ano. [...] (AZEVEDO, 1922,
p. 100,101 – 102)

Para o autor, as primeiras medidas adotadas garantiriam a fatia que


cabia à coroa na capitação de impostos, sem que isso surtisse efeito algum
sobre o contrabando que permanecerá sendo assunto em pauta durante toda a
gestão do ministro. -Ainda quanto às medidas adotadas de primeira hora, ele
alega que o aparato restritivo em torno das minas e a tributação sobre o
comércio legal eram verdadeiros incentivos ao contrabando.
Contudo, o aparato restritivo no entorno das minas, de acordo com
estudos mais recentes, era uma forma de tentar barrar os aproveitadores que
se valiam da incapacidade do Estado de bem fiscalizar, para tirar vantagem
com o contrabando e facilitar os muitos descaminhos do ouro extraído nas
minas, bem como buscar se valer de mecanismos que lhes permitissem
apossar-se de terras. SCARATO nos traz exemplos, um dos quais se relata
adiante, de como colonos poderiam tentar se aproveitar dessa inaptidão para
fiscalizar a região das minas. Em denúncia oferecida por João Carvalho de
Vasconcelos, morador do caminho novo das minas para o Rio de Janeiro,
contra Antônio Gonsalves e Constantino da Silva, narra-se uma dessas
tentativas:

[O denunciante], Através de carta enviada ao governador José


Antônio Freire de Andrade, em 19 de outubro de 1754, por
terem [os denunciados] aberto picadas na região entre Borba
do campo, atual Barbacena, e Simeão Pereira, na comarca do
Rio das Mortes. Num tom indignado, Vasconcelos afirmava que
as tais estradas logo seria lugar para transgressores de ouro e
diamantes, além de serem feitas com o objetivo de pedir as
terras em seu entorno como sesmarias, prejudicando a real
fazenda” (SCARATO,2008, p.229)

Abrir caminhos alternativos aos já conhecidos era uma das formas de


tentar burlar o fiscalíssimo pombalino3 sobre as minas e restringir a entrada de
pessoas nessas árias era a forma de tentar evitar tais astúcias, por tal motivo
se nos parece justificável o conjunto de restrições no terreno das minas, à
medida que quanto mais caminhos e pessoas transitando houvesse, mais
dispendioso para a coroa seria a já difícil fiscalização, ainda que as medidas
não contivessem elementos capazes de estancar o contrabando.
Por outro lado, a questão das minas não pode ser pensada separada da
questão mercantil, tão pouco essa pode ser compreendida à parte da
contenção do contrabando. O próprio Gusmão, nas críticas que tece ás
medidas, chama atenção, já em 1760 e passada uma década das medidas
adotadas de primeira hora, para o fato de que a maior parte da produção de
ouro das minas fugia à fiscalização oficial. -Provável é que saísse
clandestinamente com o aval e ajuda de comerciantes nacionais e estrangeiros
com autorização para transitarem na região das minas e pelos caminhos

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Para melhor controlar a área das minas o aparato restritivo coibia o transito e permanência de pessoas
sem ocupação constante e conhecida no local, motivo que muito explica por exemplo o fato de o
contrabando contar com o apoio de funcionários da coroa, comerciantes legais e religiosos.
O aparato restritivo incluía, as casa de fundição para onde deveria ser mandado todo o ouro minerado;
a expulsão dos ourives e o confisco de ferramentas, além de uma legislação repressiva com punição
severa contra os transgressores. As restrições no entorno das minas antecederam as medidas
pombalinas, tornaram-se apenas mais rígidas nesse período.
alternativos nos quais a fiscalização não se fazia presente, ou através de
colonos _que facilitavam o contrabando na defesa de interesses particulares.
Tanto _Maxwell quanto Russel-Wood nos apresentam o laço pernicioso
entre agentes legalmente vinculados ao comércio atlântico e a atividade ilícita
que permitia driblar a legislação se valendo das brechas do próprio sistema.

[...] Os comerciantes britânicos e outros estrangeiros


estabelecidos em Lisboa, protegidos por seus privilégios
especiais, fornecem o credito e as mercadorias que, nas mãos
de seus colaboradores portugueses (mercadores itinerantes
conhecidos como “comissários volantes”) sustentavam a
conexão do contrabando através do Atlântico e no itinerário do
Brasil. “Os comissários volantes” que traziam mercadorias para
a metrópole, vendiam-nas pessoalmente na América e
voltavam com o dinheiro apurado na venda, era um dos
elementos essenciais na conexão comercial transatlântica.
(Maxwell p.44.)

“Os dados dos registros dos envios de ouro do Brasil para


Portugal sugerem que, pela metade do século XVIII,
comerciantes na colônia estavam atuando em seu próprio
benefício ao invés de agirem segundo o expressamente
estabelecido pelas casas comerciais metropolitanas.” (Russel-
Wood 1997 p.53)

Nenhum dos casos acima citados considera, por exemplo: o que se


passava clandestinamente pelo Rio da Prata nas fronteiras com a América
Espanhola. Nesse sentido, vale destacar as observações da Laura de Melo e
Souza quanto aos conflitos de interesses entre a coroa portuguesa e seus
representantes na colônia, à medida que quase nunca as ordens de mando se
faziam aqui tal e qual pretendia o poder metropolitano. Segundo ela, as ordens
reais tendiam a se adequar ao espaço de forma a atender interesses muitas
vezes conflitantes. –Em O sol e a Sombra (2006, p. 11-15) a autora sugere
esse conflito de interesses não como elemento de impasse na administração,
mas do processo de formação de uma elite colonial, que tende a adequar as
ordens metropolitanas aos interesses locais.
Um desses conflitos residia no fato de que, com frequência, o que
representava prejuízos para a Coroa era, por seu turno, uma fonte particular de
lucros, baseada na troca de favores em nome de garantias que dependiam
muito mais das relações aqui construídas do que do poder que emanava da
metrópole. O ouro que saía clandestinamente sem o aval do fiscalíssimo
pombalino, ou cujos agentes da fiscalização facilitava, engrossava os cabedais
dos vassalos de sua majestade, D. José I, _e ia compondo a base estrutural de
funcionamento da economia atlântica, fundamentada tanto no comércio legal
quanto na atividade de contrabando. _Possivelmente, por este motivo podia
não parecer estranho que, engrossado o caldo do que cabia à administração
na cobrança de impostos, as medidas adotadas parecessem muito lógicas ao
entendimento do que se era possível fazer naquele contexto.
Com a criação do Erário Régio 1761, principal elemento das reformas
econômicas, e administrativas, tendo por objetivo, racionalizar e centralizar a
administração, foi instituído um conjunto de normas especificamente para a
região das Minas com o fim de combater as fraudes e minimizar o contrabando.

Diante das fraudes maciças e dos escândalos consideráveis


que haviam agitado o antigo sistema de administração, Pombal
enviou contadores de Lisboa à Bahia para trabalharem com
Lavradio [...] Na principal região aurífera do Brasil, Minas
Gerais, a junta da fazenda estabelecida em 1765 recebeu
instruções minuciosas em 1769 e assumiu sua forma
administrativa final em 1771. (MAXWELL, 1996 p. 129)

As conflituosas relações comerciais e diplomáticas com a Grã-Bretanha


também fizeram parte das preocupações com a saída do metal precioso.
Principal parceira comercial de Portugal e principal beneficiária das atividades
de contrabando, a drenar as riquezas que deveriam favorecer à coroa
portuguesa, mas que serviu antes para enriquecer vossa majestade Inglesa.
O caminho encontrado por Pombal para atenuar a influência dos
ingleses sobre o comércio com Portugal foi a criação das companhias de
comércio, medida também fortemente questionada em Azevedo, condenada
pelos britânicos e rechaçada por parcelas significativas da população de
Portugal.
A relação entre os colaboradores portugueses e os estrangeiros
estabelecidos em Lisboa passa a ser um dos principais alvos das políticas do
Marquês de Pombal quando da instituição das companhias de comércio. O seu
principal objetivo era a nacionalização da economia portuguesa, minando a
influencia do capital inglês e diminuindo os espaços de atuação de
comerciantes estrangeiros e contrabandistas.
... As companhias, por seu lado, [...] revestem um caráter
de instrumentos tanto econômicos quanto políticos: a da Índia
recuperaria não só o comércio oriental, mas o próprio Estado
da Índia: a do Grão-Pará e Maranhão, além de coibir os abusos
dos jesuítas, tinha uma missão pioneira, desbravadora, isto é,
colonizadora no mais amplo sentido; a de Pernambuco e
Paraíba foi concebida como forma de recuperar uma situação
economicamente deteriorada. O lucro, curiosamente,
permanece sempre como alguma coisa apenas implícita,
subjacente. (Falcon, 1982 p. 307)

A atuação pombalina no campo econômico responde tanto às afirmativas


e defesas de Maxwell, quanto às interrogações e ironias de Azevedo, à medida
que é lugar comum em Azevedo os questionamentos quanto à lucratividade
das companhias de comércio – tomadas como aparelho da economia mercantil
elas estão muito distante de serem apenas fonte de lucro. Isso é o que nos
indicam os textos consultados.
Todavia, o autor de O Marquês de Pombal e a sua Época, que muito
ferrenhamente condena quase todos os aspectos da politica econômica
pombalina, sob o argumento de limitar a indústria produtiva individual e cercear
a livre iniciativa dos cidadãos, não reconhece a _importância das companhias
de comércio enquanto instrumento politico dentro dos quadros do
mercantilismo, questão quase unânime entre os autores consultados para a
construção dessa análise.
Maxwell e Falcon apontam a criação das companhias monopolistas
como artifício necessário para o desenvolvimento da economia portuguesa.
Nesses dois autores, garantir o monopólio aparece como uma tentativa de
equacionar as forças econômicas, principalmente com relação à Inglaterra, e
garantir maior participação dos agentes portugueses no comércio atlântico para
minar a influência do capital inglês.
A Criação da companhia viria resolver principalmente o
problema do comércio da Ásia e da África sendo condição para
sua organização a consulta a “homens verdadeiramente de
negócios” e a inclusão dos judeus os quais seriam autorizados
a se estabeleceram em Portugal, com inteira liberdade, pois,
“meteriam na Companhia os seus cabedais e a sua indústria,
visto que melhor que todos entendem o negócio” e também
comprariam ações fazendo entrar no reino grossas somas.
(FALCON, 1982, p. 250)
Essa é uma análise dos escritos de D. Luis da Cunha sobre a política
pombalina, presente no texto de Falcon para contrapor aos discursos da época
contra e a favor do ministro. Esse ponto trata especificamente da criação da
companhia de comércio das índias Orientais. Em sua análise, o autor de A
Época Pombalina sinaliza para o fato de as companhias terem sido
instrumentos não apenas econômicos mas, sobretudo, como já dito, político, à
medida que consolidaram e ampliaram a esfera de poder da coroa lusitana – e
buscaram nacionalizar a economia portuguesa minando a influência de agentes
externos e equilibrando a balança comercial.
Em Maxwell, as companhias criadas na gestão pombalina são
defendidas como modelo de uma política lógica de todos os pontos de vista, à
medida que considerava as dificuldades de Portugal, os limites entre a
diplomacia e as relações comerciais, o curto alcance da capacidade bélica do
país e observava os tratados comerciais firmados nas gestões anteriores.
Entre as muitas críticas às Companhias, está o fato de Pombal ter
cerceado a participação dos pequenos produtores e pequenos comerciantes,
para declarar apoio e privilégios aos grandes. Para o autor de O Marquês de
Pombal Paradoxo do iluminismo, a medida se explica diante da necessidade do
apoio de uma parcela da burguesia que pudesse competir com os
comerciantes ingleses. Dessa forma, segundo ele, os pequenos comerciantes,
assim como os pequenos produtores, a exemplo da Companhia de Agricultura
das Vinhas do Alto D’ouro, seriam elementos que atrapalhariam o processo de
nacionalização da economia, contribuindo muito mais com os comerciantes
estrangeiros (leia-se ingleses) do que com o projeto de economia proposto
para Portugal.
O monopólio era a tônica do estado nacional mercantilista burguês, usar
o protecionismo mercantil e a manipulação de taxas alfandegarias para garantir
o desenvolvimento da economia de seus domínios era o que cabia dentro
dessa lógica mercantilista que tem o protecionismo como regra.

É papel do estado absolutista encarnar esta “força superior,


reguladora necessária, racional. Cabe-lhe garantir o
funcionamento de um jogo econômico onde as regras eram a
proteção, o monopólio e o favorecimento de uns em detrimento
de outros.” (Lopes,1998, p.9)
O apoio que Pombal declarou aos grandes comerciantes e grandes
produtores se relaciona com o mesmo princípio reformador que, na sequência,
leva para dentro dos quadros da administração membros da burguesia
mercantil, e mexe com as estruturas da sociedade lusitana, ainda com fortes
características da organização estamental, o que vai lhe render posteriormente
o rótulo de liberal, pelo menos nos campos da política e administração, e uma
forte oposição em todos os setores da vida social, principalmente entre a
nobreza e o clero por conta dos ataque desfechado contra esses dois grupos.
Em Azevedo, nota-se o reconhecimento da importância de _algumas
das medidas tomadas por Carvalho e Melo para facilitar e melhor aproveitar o
comércio, porém, sempre com fortes questionamentos sobre _aspectos _que
ele mesmo relaciona muito mais com a personalidade, formação e cultura do
ministro do que com o objetivo da ação política. Fato que se pode notar com a
apreciação da análise feita por ele sobre os decretos de 16 e 27 de janeiro de
1751.
Não podia o ministro entender, e muito menos aceitar,
este princípio de absoluta liberdade, a que por temperamento
era infenso, tanto como por tradição e doutrina; mas dele
tomava o bastante para reconhecer que, desobstruídos os
canais da exportação e consumo, os produtos circulariam,
assumindo nas diversas praças, em face da procura universal,
o mesmo nível, por efeito de uma lei semelhante á que
determina o movimento dos líquidos, em vasos comunicando
entre si.
Foi isso o que realizou com os decretos de 16 e 27 de
janeiro de 1751, pelos quais diminuiu e tornou menos
dispendiosa a formalidade dos despachos; facilitou no porto as
baldeações, reduziu os direitos da entrada, e concedeu
abatimento de metade, aos que se destinassem para fora do
país. Com isto se estimulou o mercado, e a exportação,
favorecida, em breve fez desaparecer o excesso de produtos
acumulados, que trazia a ruína. (Azevedo, 1922, p.105)

É para além do discurso opositor, o vocabulário utilizado por esse autor


que nos permite atribuir à sua análise um sentido personalista, que mesmo
quando considera a importância das ações políticas de Carvalho e Melo, não
deixa de buscar elementos para desqualificar ou mesmo tecer
questionamentos sobre os quais a historiografia mais recente tende a fazer
ponderações, haja vista considere a necessidade de pensar a administração
pombalina dentro da lógica e do conjunto da economia e administração das
demais nações europeias.
A política de monopólio, por exemplo, é o sustentáculo e principal
elemento do sistema colonial desde séculos anteriores, e as companhias de
comércio da coroa lusitana antecedem em muito o reinado de D. José I, basta
observarmos as datas de criação e finalidade de algumas delas:

Restrições ao comércio do Brasil foram impostas aos súditos e


monarcas cujos países estivessem em guerra com as nações
ibéricas. As décadas que se sucederam [à restauração]
assistiram ao estabelecimento de medidas restritivas ao
comércio Atlântico e aos navios engajados neste trato, em
razão de questões comerciais e militares. Estas incluíam a
criação das companhias de comércio monopolistas
ultramarinas (Companhia do Brasil, 1649; Companhia do
Maranhão, 1679; companhias pombalinas do Grão Pará e
Maranhão, 1755; e de Pernambuco e Paraíba, 1759), as frotas
anuais e comboios, e medidas visando impedir o domínio do
comércio e do contrabando por estrangeiros6. (Russel-
Wood.1998 p.7)

As companhias do período pombalino se inserem em uma lógica muito


semelhante à das companhias criadas no século XVII, após a restauração, e
perfeitamente de acordo com as práticas econômicas comuns ao período.
Junto com as medidas para facilitar o trânsito dos gêneros produzidos no
Brasil, principalmente o tabaco e o açúcar, ambos de grande importância para
a economia colonial e metropolitana, foram criadas também as casas de
inspeção desses dois gêneros com o fim de controlar a qualidade, a quantidade
e estabelecer limites de preços. Na verdade, tratava-se de um mecanismo para
que a coroa pudesse melhor controlar as atividade que envolviam os principais
gêneros da economia colonial. Sobre essas disposições, o biógrafo luso
brasileiro destaca a violação das leis econômicas e a direta ofensa aos
interesses individuais.

Estas disposições, violando as leis económicas, eram por sua


vez desatendidas. Surgiam protestos e resistências, e as penas
da transgressão, agravadas por leis posteriores, raras vezes
impediam que o justo interesse individual, por elas ofendido,
readquirisse, por meio da fraude, seus direitos. (AZEVEDO
p.105)
Há no discurso desse biógrafo uma preocupação com os direitos
individuais e com a manipulação perniciosa do estado para ferir direitos e
interesses alheios, questões que se atenuam no texto do biógrafo britânico,
mas, que não são exclusividades nem de Portugal nem de Pombal, tão pouco
que possam se confundir com a ação política objetiva de garantir a
nacionalização da economia e o fortalecimento do Estado no que tange à
autonomia que se consolida no descasamento entre Portugal e a Cúria
Romana, questão sobre a qual essa discussão não pretende se inclinar.

Sem embargo da fama em contrario, a gestão económica de


Pombal foi quase sempre infeliz. Providencias, em que fundava
seguras esperanças, davam afinal precário resultado, depois
de haverem introduzido graves perturbações na vida
económica, generalizado o descontentamento, arruinado não
poucas fortunas. Logo em seguida á Companhia do Grão-Pará,
Pombal, tomando gosto, fundara a do Alto Douro. Em 1759 a
de Pernambuco e Parnaíba; em 1773 a Companhia geral das
reais pescas do Algarve. Fontes de opulência para alguns
poucos favorecidos, todas elas foram para o povo maldição.
(AZEVEDO, 1922, p. 328)

Severo crítico da política do Marquês de Pombal, o biógrafo luso-


brasileiro no início de seu estudo deixa entrever que muito do que se pratica
em Portugal no terceiro quartel do século XVIII é resultado do que o ministro
aprendera nos tempos de consulado em Londres e Viena, estudando os
motivos da prosperidade das nações desenvolvidas, principalmente a
Inglaterra, pela sua prosperidade no campo da economia, da navegação e das
manufaturas.
As companhias de comércio por sua vez, tendiam ainda a direcionar
para os monopolistas todas as possibilidades de transações comerciais
garantindo desde os créditos para os produtores e comerciantes, o
armazenamento, o transporte, a facilidade no acesso à mão-de-obra vinda da
África e o mercado garantido pelas conexões transatlânticas dos navios;
também propriedades das companhias.
Maxwell Informa que a companhias de Pernambuco fora planejada para
estimular a importação de mão-de-obra africana e segundo os dirigentes da
companhia, com a fundação dela, (da companhia) o comércio fraudulento que
muitos estragos fizeram com outros portos do Brasil, havia cessado em
Pernambuco e que passada uma década: uma frota comerciante de 43.400
toneladas com 124 embarcações transportava mercadorias ao longo de rotas
de comercio que abrangiam Bissau, Angola, Europa, o litoral brasileiro e o
Oceano Índico.
No arriscado campo da diplomacia é que o ministro de D. José I se
mostrou astuto e eficaz quando da difícil situação de se manter neutro diante
dos conflitos envolvendo aliados e inimigos, ocasião em que manipulou
estratégias que lhe permitissem alcançar os objetivos propostos pela política
econômica.

Em seguida à Paz de Paris, Pombal aspirava alcançar os


objetivos de excluir os estrangeiros [da exploração do comércio
da América portuguesa], operando mudanças importantes nas
conexões marítimas e estimulando novas exportações de
produtos primários. Os portos do Brasil que a muito constituíam
um ponto de parada para os transportes europeus com destino
à Ásia, seriam fechados aos navios estrangeiros, salvo por
razões humanitárias de extrema urgência [...] Para estimular a
frota mercante portuguesa, Pombal aboliu o sistema de frotas
para o Rio e a Bahia em 1765 e permitiu que os navios
zarpassem conforme lhes fosse conveniente... A abolição das
frotas serviu para facilitar o acesso dos produtos brasileiros aos
mercados europeus e para aumentar sua competitividade ao
evitar as longas demoras do antigo sistema. (Falcon 1982,
p.132-133)

As companhias de comércio desenvolveram um papel preponderante,


que foi a garantia dos créditos para o desenvolvimento da indústria
manufatureira quando da oportunidade, de não mais poder pagar o luxo que se
comprava no estrangeiro com o ouro que fluía das minas, serviram para
financiar a construção de novos engenhos de açúcar e recuperar outros tantos
arruinados, bem como para incentivar o cultivo de novos produtos para
exportação a exemplo do café, do arroz, do cacau, do algodão; que com o
desenvolvimento da indústria manufatureira de Portugal se mostrou uma
alternativa ao tratado de Methuen que tinha como objetivo o comércio de
tecidos de lã. No campo de mineração, observa-se as experiências na
exploração do ferro com a descoberta das primeiras minas do metal na
capitania de São Paulo, cuja primeira amostra de ferro fundido fora enviada a
Pombal em 1765.
Em Portugal, as companhias serviram para fornecer os créditos que
possibilitaram um surto manufatureiro que atendeu à demanda do mercado
interno quando da retração da exploração do ouro das minas com que se
pagava produtos importados. Por outro lado, a crise provocada pela escassez
do ouro contribuiu para o consumo dos produtos nacionais diminuindo a
necessidade dos estrangeiros.
Diminuído o raio de influência dos comerciantes estrangeiros com a
criação das companhias, o processo de fortalecimento da economia
portuguesa aos pouco se consolida pela escolha perspicaz de incentivar a
economia do Norte do Brasil onde se instalou as companhias do Grão-Pará e
Maranhão e as de Pernambuco e Paraíba, uma região que fica fora do alcance
dos tratados de comércio, evitando assim futuros desentendimentos com a
Inglaterra, à medida que a ação dos comissários volantes e agentes ingleses
nessa área compunha o conjunto de atividades ilegais ou livres do fiscalismo
pombalino.

A região norte ocupou a partir do Consulado Pombalino um dos


espaços privilegiados do Império Português. A política
pombalina colonial tinha objetivo de "defender os interesses
fiscais da Coroa no tráfico dos demais países e assegurar aos
comerciantes nacionais o efetivo usufruto do monopólio do
comércio colonial". Neste contexto, a região Amazônica era
especial, pois ao mesmo tempo em que se constituía num
espaço inexplorado, que se imaginava pródigo, era uma região
em disputa com outras metrópoles. Apresentava-se como uma
das possibilidades de reestruturar o Império Português que
havia perdido espaço para outras potências europeias,
principalmente para a França e a Inglaterra. (Lopes, 1998, p.
22)

Segundo a mesma autora, é com o declínio da produção do ouro que se


intensificam as medidas fomentadoras, visando a revalorização de produtos
agrícolas para sustentar a economia mineira, com a inserção de novos
produtos no campo agrícola e explorando inclusive novos metais. O incentivo à
plantação de algodão se insere como antídoto inconteste para minimizar os
efeitos do tratado de 1703, além de passar a ser um importante produto para
exportação para Lisboa e reexportação, abastecendo os mercados da França,
Roterdã, Hamburgo, Genova, Ruão, Marselha e Londres.
Esta Viragem da política econômica é extremamente
significativa na medida em que as relações capitalistas para se
desenvolverem revolucionando as relações do antigo regime
careciam da iniciativa particular livre acumulando capitais em
vez do sistema pombalino de monopólios industriais e de
apoios preferenciais em créditos; assistimos mesmo
esporadicamente no período até 1775 a uma ou outra unidade
de particulares passar para o Estado (caso da fabrica de seda
do rato que surgira por iniciativa particular em 1734 (Castro
1982).

É nessa mesma guinada da economia portuguesa que a coroa lusitana


experimenta um surto manufatureiro entre os anos finais do reinado de D. José
I e os anos iniciais do reinado seguinte. No entanto, há quem questione a
relação da empresa manufatureira mercantil com o Estado Fiscalista, dado as
bases de seu desenvolvimento que em muito se assemelha ao casamento
entre o estado e as companhias de comércio.
O que CASTRO chama de viragem econômica não pode ser descolado
de uma profunda crise na economia luso-atlântica que é minimizada no texto
de Maxwell, à medida que o autor tende a elencar um conjunto de
prosperidades econômicas logo depois do detalhamento dos efeitos da crise,
que se abatia sobre a economia portuguesa desde o final do reinado anterior.
Um mal estar econômico que responde a um eventual insucesso das
companhias de comércio do período pombalino.
Azevedo é taxativo na insistência de que no final do reinado de D. José
a economia portuguesa e o Erário Régio estavam agonizando, o que se explica
com o processo de escassez do ouro das minas, as sucessivas quedas no
preço do açúcar - em queda por conta da concorrência com o açúcar produzido
nas ilhas francesas e inglesas do Caribe 4, - e o dispendioso conflito de Portugal
com Espanha, que vinha exigindo recursos no momento em que Portugal ficara
sem a sua principal moeda de troca.
O ouro das minas era o equivalente geral de troca da coroa portuguesa,
e a queda na produção desse minério pode ser comparada à falência
monetária de uma nação que não mais dispõe de capital financeiro para
investimentos. Há autores que defendem que o incremento de novos gêneros
agrícolas e a política de fomento, implementada no período pombalino, tenham

4
Para melhor compreensão desse processo ver: LOCKHART, /SCHWARTZ; A América Latina na época
colonial. 2010 Cap. 10 O Brasil na época do ouro e do absolutismo.
ajudado no processo de reequilíbrio das contas de Portugal. Entretanto, é
importante salientar que em um contexto de transição econômica 5, a passagem
do feudalismo ao capitalismo, não dispor de capital se revela um problema
grave, e era o que Portugal estava vivendo.
Isso não quer dizer que houvesse necessariamente um erro no
direcionamento da economia como coloca Azevedo. Ainda que se respeite a
pertinência de algumas das críticas desse autor, a explicação dele para a ruina
do Estado português tende a se distanciar do que mostram estudos mais
recentes, que concordam com a conclusão sobre o período, que de fato a
economia não ia bem, mais que não apontam a condução da política do
ministro como causa dessa ruína.
O Prolongado mal-estar econômico que afligiu Portugal e o
Brasil durante as décadas de 1760 e 1770 constitui uma crise
mais profunda e mais duradoura que a representada pelo
conflito entre o estado e os jesuítas, e os remédios foram muito
mais difíceis de encontrar6. (Aldren, 2004, p. 548)

Retomando o questionamento de Castro, quanto ao apoio que o Estado


português vinha oferecendo ao desenvolvimento da indústria - quando a
perspectiva nas economias centrais da Europa era de incentivar a iniciativa
particular-, essa análise corresponde a uma percepção mais global e menos
específica do processo de transição feudo-capitalista e tende a desconsiderar
que dentro desse processo, Portugal estava adotando tardiamente medidas
que lhe permitissem alcançar o nível de desenvolvimento das nações
desenvolvidas, que por sua vez já haviam superado a fase inicial do processo
de industrialização. Ainda considerando as peculiaridades de Portugal, não se
pode deixar de evidenciar o fato de que tanto a burguesia mercantil, quanto a
burguesia industrial só se auto afirma enquanto grupo de poder político e
econômico em Portugal, graças ao apoio e às benesses das políticas do

5
Segundo Falcon, todo o período que identificamos como mercantilista pode ser também identificado
como período de transição feudo-capitalista, seja essa identificação no nível econômico ou ideológico, o
que o autor nos apresenta é que o espaço tempo que se utiliza para pensarmos o mercantilismo tende a
ser dilatado caso pensemos uma época mercantilista. “Os limites históricos da época mercantilista
correspondem grosso modo aos da transição feudo-capitalista, ou seja, da “ crise dos séculos XIV/ XV”
ao final do século XIX... Ficam assim o Mercantilismo e a sua época balizados por duas viragens decisivas
da história do Ocidente: a grande crise da final da Idade Média e as revoluções industriais e liberais, que
constituem a revolução democrático-burguesa no Ocidente.” (Falcon, 1982, p. 24)
6
Alden; Daurio
ministério pombalino. Este cumpriu, como afirma Falcon a função que lhe
cabia.

A empresa manufatureira, burguesa, necessita o


consentimento e os favores do Estado absolutista o qual, ainda
que a braços com perdas sensíveis em seus rendimentos, deve
atender sempre em primeiro lugar aqueles interesses fiscalista
que representam a forma objetiva de sua própria existência.
(Falcon, 1982, p. 239)

Logo, ainda que consideradas as críticas de João Lucio de Azevedo,


sobre os privilégios de poucos em detrimento de muitos, cabe-nos observar e
contrapor antes os dados e conclusões feitas pelo autor para justificar sua
aversão às políticas e às práticas do marquês de Pombal. Há no texto de
Azevedo várias passagens, que em tese justificam a eficácia nula ou
inconstante que ele atribuía aos direcionamentos econômicos de Carvalho e
Melo. Como não cabe aqui elencar cada uma delas, comêssemos pela questão
dos diamantes que não fora colocada quando das questões que envolveram a
mineração e que fora objeto de monopólio sobre o comércio e extração das
ditas pedras.

A despeito da proteção régia, afirmada em violentas medidas


de vigilância e repressão, a empresa da mineração no Brasil
não prosperou. As despesas eram enormes, e, a cada remessa
para o reino, o tesouro tinha de adiantar fundos aos caixas,
para o pagamento dos saques. Agora que já não existiam as
causas encontradas nos meneios de [Francisco] Salvador7 ou
na improbidade de Brant, o monopólio da mesma forma não
dava os resultados prometidos. Em 1771, Carvalho resolveu
transferir ao Estado a exploração. Para isso tomou conta das
casas, ferramentas e escravos, pertencentes ao arrematante,
organizou os serviços locais, e entregou a gerência superior á
Inspetoria Geral dos Diamantes, anexa ao Erário, e
subordinada, portanto, diretamente ás suas ordens.( Azevedo,
p. 1922, 113)

Os contratos de diamantes - que já haviam sofrido fortes intervenções no


sentido de se fiscalizarem a sua extração e comércio, bem como conter o
contrabando, assim como acontecerá com o ouro extraído das minas-,
considerando as especificidades da extração das pedras, foram passados às

7
Francisco Salvador era um Judeu comerciante dos diamantes da África e da Ásia com forte influência
no marcado das pedra preciosas, (no Mediterrâneo) que, segundo Carvalho, teria trabalhado para
dificultar o comercio das pedras do Brasil. O tom irônico de Azevedo sugere que as suspeitas do ministro
não passe das manias de perseguição que o autor atribui ao biografado.
mãos de três concessionários monopolistas, um dos quais Brant, acusado de
improbidade na administração do monopólio. Porém, segundo o autor, - todos
teriam alegado os mesmos motivos para abdicarem da concessão: os prejuízos
gerados com os custos de extração e transporte das pedras preciosas.

Embora não justificassem os motivos pelos quais os contratos não


estavam gerando para a coroa e para os concessionários os lucros esperados,
o mesmo não se pode dizer da fluência do comércio das pedras, que segundo
Maxwell seguiu em ascendência depois das medidas 8 adotadas por Carvalho e
Melo para regular o mercado, no entanto, fica a interrogação sobre como
justificar os prejuízos dos primeiros contratos.

O que está colocado em Maxwell é que o ministro teria forçado um risco


muito grande ao entrelaçar as oligarquias coloniais de modo tão próximo da
estrutura administrativa. Fosse na gerencia das minas, na qual se inclui a
extração de diamantes, fosse na estrutura administrativa ou nos negócios
comerciais.

Os descaminhos das pedras se assemelhavam aos descaminhos do


ouro, o contrabando funcionava dentro das redes de favores particulares e
enriquecimentos privados, a utilização de escravos para sentar praça e tomar
conta das áreas de mineração, subordinada a magnatas locais, donos dos
escravos teria sido outro equivoco à medida que o status social dos escravos
não lhes permitia desenvolver plenamente as funções de guardas militares a
serviço da Coroa, uma vez que escravos respondiam a seus donos.

Quando o monopólio passa à Coroa sob supervisão do próprio Carvalho


e Melo, os então contratantes se apresentavam com pouca prosperidade e o
custo se mostrava pouco rendoso para a coroa e, segundo a citação da pagina
anterior, prejudicial para o tesouro. Embora estejam registradas as quedas
progressivas de preços dos diamantes,9 na mesma página, em nota de rodapé
8
Quando o monopólio passa à responsabilidade da Fazenda, Carvalho institui um conjunto de medidas
coibindo o comércio e a extração das pedras; para regular o mercado estava vedado o comércio das
pedras sem autorização regia, assim como, orientou-se quem tivesse as ditas pedras como garantia de
penhora as vendessem direto para a coroa, e que o transporte fosse feito exclusivamente em cofres da
coroa lusa, acompanhado de autorização para serem comercializados.
9
A estatística da exportação [nos apresenta os seguintes números]: Primeiro período: 1753 a
55, arrematantes Bristow Ward e C. 121.814 3/4 quilates, valor 1.188:348$425. Segundo
período: 1757 a 60, João Gore e Josué Van-Neck, 115.659 quilates, valor 1.067:198$ 850.
aqui também transcrita, não se explica as causa reais dos prejuízos. Azevedo
faz referencia às pedras concorrentes, comercializadas pelos judeus, que
inundavam o mercado de Amsterdã, principal mercado europeu das pedras
preciosas. Mas o que parece óbvio é que faltam elementos convincentes para
justificar os prejuízos com o comercio de um artigo tão precioso, uma das
possibilidade que se nos parece crível pelo conjunto do sistema, é que tenha
acontecido com os concessionários dos diamantes o mesmo que acontecia
com outros artigos produzidos na América portuguesa: as pedras do Brasil
podem ter servido para enriquecimento pessoal em detrimento do Erário Régio.
Brant, já citado, personagem arrematante de monopólio, figura como um dos
exemplos que teria alegado insucesso no comércio das pedras e ao mesmo
tempo acumulado vultuosa fortuna.

O que temos como informação é apenas o fato de que o valor das


pedras se mostra inversamente proporcional à quantidade extraída, o que pode
ser justificado pela lei de oferta e procura, alvo das medidas adotadas quando
a extração e controle das pedras passou às mãos da coroa, mas que não
enumera nem explica necessariamente os prejuízos alegados.

Se passarmos à condenação que o autor faz às companhias de


comércio, o quadro parece de fato preocupante.

Por efeito desta violência, da perturbação geral dos negócios,


proveniente do monopólio, muitas casas se despenharam na
ruína. O trafico com o Brasil diminuirá consideravelmente, e as
próprias Companhias, apesar dos seus privilégios e das
restrições em que se amparavam, arrastavam difícil existência.
A do Grão-Pará, de 1766 em diante, nunca mais distribuiu
dividendos. Na colónia queixavam-se negociantes e
agricultores. (Azevedo,1922 p. 329)

De mesma forma, é notório no texto de Azevedo, o pouco zelo com os


gastos supérfluos, atribuídos a sua majestade D. José I. Quando a gerência do
tesouro esteve sob a tutela de Pombal, os dados apresentados pelo autor
põem interrogações quanto à exaltada boa administração do ministro,
defendida por Maxwell. E justifica as críticas quanto ao estado do Erário.

Terceiro período: 1760 a 71, Daniel Gil de Meester 925.589 3/4 quilates, valor 8.144:165§537.
Deducção Compendiosa, cit.
Essas afirmativas contrastam com o que está colocado em Maxwell,
Lopes e Arruda, na medida em que estes autores destacam o papel que as
companhias tiveram ainda no ministério pombalino, como instrumento
fomentador, e auxiliando a administração com folhas de pagamentos, com
recursos para a construção de fortificações, na defesa de territórios e na defesa
das colônias portuguesas na África, nas ilhas de Cabo Verde e Costa da Guiné,
das quais Portugal também tinha o monopólio de comércio e que se
constituíam em grandes fornecedoras de escravos para o Brasil.

LOCKHART e SCHWARTZ, ressaltam é que:


a época não foi gentil com Pombal e suas reformas. Durante
todo o período, o Brasil enfrentou uma depressão econômica
consequência da queda da produção do ouro e do baixo preço
dos produtos agrícolas, que medidas fiscais não podiam
superar. A pesar de tudo que pombal podia fazer, as
exportações brasileiras em 1776 foram apenas 40% do que
tinha sido em 1760. Esta redução foi ainda mais grave por
causa da crescente despesa militar (2010, p. 451)

É possível ainda que o auxílio das companhias, extensivo a tantos


outros campos que não só o comercial, tenha minado a capacidade dessas
companhias de comércio e afetado gravemente as suas margens de lucros. No
entanto, considerando as dificuldades pelas quais vinha passando a Economia
portuguesa, não há nos textos consultados elementos que nos permitam
concordar com Azevedo no que se refere à condenação da politica econômica,
mesmo que se concorde com o quadro de crise e com o estado de
precariedade de Erário Régio.

O momento de crise em Portugal é também o momento de equilíbrio na


balança comercial com a Inglaterra; objetivo central das intervenções
pombalinas e segundo Arruda, momento de grandes prosperidades no conjunto
da economia.

Paradoxalmente, o colapso na exploração de metais,


equivale ao período em que a balança se equilibra e, nos finais
de século, torna-se mesmo superavitária em relação aos
ingleses. Um efeito histórico... [isso foi possível com] uma nova
articulação nas relações metrópole-colônia. A continuidade da
política pombalina, o seu caráter integrado, no qual indústria,
agricultura e comércio são objetos da ação governamental
definindo-se um amplo espaço de ações politicas com elevado
grau de unidade. (Arruda, 2000, p. 177)

Sem negar os aspectos que podem justificar o estado de penúria do


Erário Régio Português, descrito por Azevedo, que certamente não pode ser
explicado pelas interferências na política econômica, e sim por um quadro que
se agravou com a queda na produção de ouro, Arruda reitera o quadro de
prosperidade descrito por Maxwell, apesar de considerar a complexidade da
crise; Outro grave problema de uma economia em dificuldades fora as
despesas com o luxo e as futilidades da coroa, cuja receita vinha sofrendo
sucessivas quedas.
Nisso, há quase uma unanimidade entre os autores aqui trabalhados,
inclusive Azevedo e Maxwell. A coroa portuguesa, em momento algum da
gestão pombalina, conseguiu abdicar do luxo que outrora se pagava com o
ouro que fluía das minas, aumentando o hiato entre a receita e as despesas. É
estranho ainda que nem Azevedo nem Maxwell tentem explicar o quanto foram
10
onerosas para Portugal as duas guerras com a Espanha pelo controle das
vastas fronteiras da região sul à altura da colônia do sacramento Que se
estendiam de São Pulo, à margem Norte do Rio da Prata, e a necessidade
sempre constante de controle, fortificação e vigilância da parte norte, fonte da
cobiça de inimigos e aliados.
O cerne de boa parte das reformas de Carvalho e Melo era a diminuição
da influência britânica no comércio Sul-Atlântico, o que em dada medida foi
alcançado. No entanto, as dependências do capital britânico continuaram a se
fazer sentir tanto em Portugal quanto em suas possessões, uma vez que, ao
fim do reinado de D. José I, o peso da influência britânica ainda era algo a ser
tolerado e bem quisto, diante das ameaças de outros inimigos como a França e
Espanha. O maior e melhor exemplo dessa dependência talvez seja a fuga da
corte portuguesa em 1807, sob a proteção da esquadra britânica, proteção
barganhada com a abertura dos portos brasileiros em 1808.

Se é consenso que houve amplo desenvolvimento de vários setores da


economia no período: a indústria, a produção de algodão, de arroz, a produção
de lona no Brasil, o incentivo à produção de novas culturas, e a inserção de

10
Para melhor entendimento e análise dessa questão ver Dauril Alden, In: História da América latina:
América Latina Colonial v. II p. 540 – 592
novos produtos na economia, é também fato que os dividendos desse
desenvolvimento esteve muito mais a serviço de enriquecimentos privados do
que da coroa lusitana. O que explica o fato de o Erário Régio Português
agonizar num quadro no qual alguns setores da economia não pareciam ir tão
mal.

Além disso, o envolvimento do comércio e capital ingleses eram tão


fortes em Portugal e seus domínios que, mesmo despojados de pontos chaves
desse negócio, em momento algum se viram apartados das atividades
comerciais. Continuaram a dispor de grossa fatia do comércio de Lisboa e em
momento algum se ausentaram por completo do comércio ilegal da região
Norte do Brasil, principalmente devido às relações que tinham com as
províncias de Salvador e Rio de Janeiro – então capital da colônia –, para as
quais as reformas de Carvalho e Melo não se concretizou em nome da
diplomacia e dos acordos comerciais com a Inglaterra. O projeto de Carvalho
de instituir companhias de comércio para a Bahia e o Rio de Janeiro, fora
abortado diante das pressões que os comerciantes ingleses vinham fazendo
perante sua majestade britânica, alegando os prejuízos causados pelas
companhias já instituídas e os possíveis e infindáveis outros prejuízos que
adviriam da instituição de uma companhia para as províncias centrais da
economia luso portuguesa.
Que há um paradoxo entre a fluência da economia como tá orientado em
Arruda e em Maxwell e o estado das contas públicas, bem como do tesouro
real, tal qual posto em Azevedo, disso não parece restar duvidas, mas, uma
observação perspicaz do conjunto da historiografia contida nesta discussão,
levando em conta os objetivos de consolidação da monarquia absolutista, a
orientação mercantil do conjunto da Europa, a força da oligarquia pombalina e
principalmente as contribuições de Alden, Lockhart/Schwartz; parece razoável
considerar que muito da fluência do comércio do período em estudo, servil
antes para o enriquecimento de particulares que para o favorecimento da
coroa, o que nos permite evidenciar novamente o estudo da Laura de Melo e
Souza11 ao tratar dos conflitos de interesses, por exemplo, entre as diretrizes

11
O Sol e a Sombra
metropolitanas e as adequações que muito se fizeram dessas diretrizes nas
terras coloniais.

O que manteve Pombal no ministério por vinte e sete anos foi para além
da competência e do espirito laborioso, isso não se há de negar, fora a vontade
do monarca D. José I, que contra a vontade de autos quadros da Nobreza, do
Clero e de parcelas significativas dos demais estratos sociais, permitiu que seu
ministro conduzisse o Império português com diretrizes e impulsos que sempre
pareceram muito mais pombalinos que Josefinos.

A Morte do Rei em 1777, levou à ansiosamente esperada quedo do


ministro todo poderoso, mas, não significou nem uma completa ruptura, nem
uma reformulação das reformas instituídas, ainda que não se pretenda tratar
aqui dos vários outros campos da atuação pombalina, cabe considerar que o
Marquês de Pombal, não só instituiu as reformas que julgava necessárias ao
Portugal da século XVIII, como buscou mecanismos à luz da Ilustração,
segundo Maxwell, para formar uma classe de homens que pudessem dar
continuidade a sua obra.

As reformas no campo da educação entre outras coisas, buscou esse


fim; o Colégio dos Nobres fora pensado com a função de formar uma classe de
homens apitos à arte do comercio e administração. O grupo que Maxwell
denominou de oligarquia pombalina muitos dos quais egressos da burguesia,
estava imbricado com múltiplos setores tanto da administração do Império
português, quanto da economia, ao ponto de conseguirem manipular a
estrutura muito bem montada do Estado em Beneficio próprio. Logo, seriam
muitas penadas para se reverter meio século de pombalismo, cujo alcance se
estende para muito além do campo econômico.

Ao contrário de Maxwell e diferente de Falcon, Azevedo busca identificar


Carvalho e Melo como um homem do seu tempo com os vícios do seu tempo,
dotado de uma personalidade despótica, cuja tirania teria sido a marca mais
forte de administração. Em Falcon, encontramos a figura do homem do
presente enredado pelas transformações e ideias de uma modernidade que se
apresenta tardiamente para os países da península ibérica, mas que é ele
Pombal, um dos precursores em Portugal das ideias e práticas já comuns ao
resto da Europa. Em Maxwell, temos a construção da figura no seu tempo
presente que realizou para a coroa lusitana o que era possível naquele
momento, considerando os limites políticos, diplomáticos, econômicos e
geográficos do contexto.

Caso houvesse tempo, disposição e fôlego para tal empreitada,


poderíamos nos debruçar sobre as fontes utilizadas por Maxwell e Azevedo
para melhor compreender as divergências interpretativas entre um e outro.
Todavia, como nosso foco de análise são as obras, e não as fontes, se nos
impõe por hora a “crença” de uma certa resistência de Azevedo à figura do
Marquês de Pombal, justificada pelas feridas que o então ministro teria deixado
para parte da sociedade lusitana e cujo latejar ainda se fazia sentir no espaço
de tempo de um século, o que pode ter contribuído para a aversão claramente
expressa no discurso do autor sobre o Marques de Pombal.

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