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O Tabernáculo: A Casa de Deus

Por L. Michael Morales em 10 out, 2018


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Série "10 estudos sobre o significado do Tabernáculo" | Clique e veja

o sumário
Quando a nuvem de Deus se moveu do cume do Monte Sinai para o
tabernáculo recém construído, cobrindo a casa de Deus e enchendo-a
com Sua glória (Êx 40.34), atingiu-se um ápice no relacionamento de
Deus com a humanidade. Nesta cena majestosa, o livro do Êxodo
termina com uma resolução, ainda que temporária e intermediária, da
história do exílio da humanidade do Éden narrada em Gênesis 3. Além
disso, o tabernáculo cheio de glória também prefigurava a solução
definitiva por parte de Deus, àquela expulsão, solução que viria pela
pessoa e obra de Jesus Cristo.

Ao considerarmos o significado do tabernáculo (e depois do templo)


nas Escrituras, será útil manter dois pontos em mente. Primeiro, o
tabernáculo era a casa de Deus, o lugar de sua morada. Cortinas azuis,
púrpura e com fios carmesim, uso abundante de ouro puro e um véu
dividindo suas duas salas definiam o tabernáculo como o palácio do
mais sagrado rei.

Segundo, o tabernáculo era também o caminho para Deus, os rituais


de sacrifício proporcionavam a expiação e a purificação necessárias
para habitar com Deus. Uma visão geral simplificada do sistema
sacrificial apresenta o caminho para Deus como envolvendo um
movimento triplo na presença de Deus, uma “jornada” traçada através
da ordem ritual de três sacrifícios primários. A adoração
frequentemente começava com a oferta de purificação, com sua
ênfase no sangue, ressaltando a necessidade de expiação pela
humanidade, isto é, ser perdoado e purificado por Deus. Então seguia-
se todo o holocausto que, com sua ênfase em queimar o animal inteiro
à parte de sua pele, simbolizava uma vida de total consagração a Deus.
A liturgia terminaria com uma oferta de paz na qual o adorador
banqueteava-se com uma refeição sagrada, juntamente com a família
e amigos, na presença de Deus. A expiação, então, como a jornada do
sacrifício ensina, leva à santificação, e a santificação produz
comunhão jubilosa com Deus.

Em suma, o relacionamento de Israel com Deus foi preservado e


cultivado pelo ritual sacrifical do tabernáculo, possibilitando que o
Criador do céu e da terra habitasse com seu povo em comunhão. Para
entender a profundidade e a maravilha de tal propósito, refletiremos
sobre o significado do tabernáculo primeiro dentro do propósito de
Deus para a criação e depois representando o coração da aliança de
Deus com o Seu povo – um propósito assumido e cumprido por Jesus
Cristo.

A Criação e o Tabernáculo
Provavelmente a ideia principal a respeito do papel e propósito do
tabernáculo comece com a compreensão de que, originalmente, o
próprio cosmos foi criado para ser a casa de Deus e onde a
humanidade desfrutaria de comunhão com ele. Somente quando
aquela casa foi contaminada pelo pecado e pela morte é que uma casa
secundária e provisória, o tabernáculo, se tornou necessária. Seria
portanto, esperada uma medida de correspondência entre o
tabernáculo e a criação, e é precisamente esse o caso.

O relato da criação de Gênesis 1.1-2.3 retrata Deus como um


construtor que faz uma casa de três andares (céu, terra e mares) em
seis dias e, depois de concluída, passa a residir nela desfrutando do
descanso do sábado. De fato, em toda a Escritura, o cosmos é
frequentemente retratado como a casa de Deus, seu santuário ou
templo. O salmista diz, por exemplo, que Deus estende os céus como
uma cortina e põe nas águas o vigamento de sua morada (Sl 104. 2-3;
cf. Is 40. 22). Os intérpretes antigos e contemporâneos também
notaram paralelos significativos entre os relatos da criação e os do
tabernáculo no Pentateuco, incluindo a linguagem de bênção e
santificação usada para descrever sua conclusão.

Também, enquanto a criação é relatada em sete parágrafos (por sete


dias), culminando no sábado, há, similarmente, sete discursos divinos
contando as instruções para o tabernáculo, (capítulos 25 a 31 de
Êxodo), o sétimo discurso culminando com a legislação do sábado
refere-se diretamente ao sábado de Deus em Gênesis 2. 1-3 (ver
Êxodo 31.12-8). O “Espírito de Deus” permite a construção tanto da
casa de Deus como o cosmos (Gn 1. 2) como da casa de Deus como
tabernáculo (Êx 31. 1-5).

Além disso, embora se percam nas traduções, o relato da criação usa a


terminologia do tabernáculo, particularmente no relato do quarto dia
descrito em Gênesis 1: 14-19. A palavra hebraica para “luzes”,
referindo-se ao sol e à lua, planetas e estrelas, é a mesma palavra para
as “lâmpadas” que em outras partes do Pentateuco sempre se referem
às lâmpadas do candelabro do tabernáculo. Da mesma forma, a
palavra hebraica usada para “estações”, para as quais as luzes ou
lâmpadas funcionam como marcadores, é um termo que no
Pentateuco se torna sinônimo de festas de Israel ou festivais de culto.

Essas características, juntamente com o dia de sábado que conclui o


relato, servem para retratar o cosmos como um grande templo no
qual a humanidade tem o privilégio sacerdotal de se aproximar de
Deus em adoração e comunhão – juntamente com toda a criação,
incluindo o sol, a lua e as estrelas – servindo como uma convocação
para a adoração. O cosmos como a casa de três andares, formados
pelo céu terra e mares, é espelhado na estrutura tríplice do
tabernáculo, com o Santo dos Santos correspondendo à sala celestial
do trono de Deus. O propósito da criação, então, é que Deus e a
humanidade habitem na casa de Deus em comunhão. Assim Como o
“fim principal” da humanidade, a comunhão do dia do Senhor com
Deus é realçada, já que o sétimo dia é o único que foi, em todo o livro
de Gênesis, santificado por Deus (Gn2. 3).

Nas narrativas do Éden (Gn 2. 4–4.16), as imagens do tabernáculo se


desenvolvem ricamente com o jardim do Éden retratado como o
Santo dos Santos original. A exuberância do Éden é capturada na
plenitude da vida associada ao tabernáculo, incluindo o candelabro,
uma árvore estilizada que alguns compararam à árvore da vida do
Éden (a visão do templo de Ezequiel inclui também um rio da vida em
Ez 47.1-12). A presença do Senhor no Éden, descrita como “andar”, é
apresentada similarmente ao tabernáculo (Gn 3. 8; Lev. 26. 11-12). Além
disso, a descrição da obra de Adão no jardim, melhor traduzido como
“adorar e obedecer” (Gn 2.15), é usado em outros lugares para
descrever exclusivamente a obra dos levitas no tabernáculo (Nm 3. 7-
8). Até mesmo a linguagem para a vestimenta que Deus fez para Adão
e a mulher reaparece mais tarde, nas roupas com as quais Moisés
veste os sacerdotes (Gn 3.21; Lev 8.13).

Possivelmente, mais explicitamente, o jardim do Éden fosse orientado


para o leste, e após a expulsão de Adão e Eva, querubins – criaturas
com aparência intimidadora – foram posicionados para guardar a
entrada do jardim (Gn 3.24), características que no mundo antigo
comumente marcavam a entrada de um santuário. O único lugar, no
Pentateuco, além de Gênesis, onde os querubins aparecem
novamente é em conexão com as cortinas e o propiciatório do
tabernáculo (Êx 25. 18-21; 26. 1; 26. 31), que também era orientado para
o leste (Êx 27. 9-18; Nm. 3:38).

O ponto principal desses paralelos é que a estrutura do tabernáculo


(incluindo móveis, o sacerdócio, sacrifícios, calendários e rituais),
como um presente de Deus, deveria recapturar o ideal de Deus para a
criação, reafirmando sua intenção de habitar com a humanidade. O
movimento da nuvem de glória sobre o tabernáculo em Êxodo 40.34,
portanto, representou uma nova criação cheia da glória de Deus, com
Arão e sua linhagem servindo ao papel de um novo Adão nessa
“criação”. Teologicamente, então, dizer que o cosmo era o
tabernáculo original de Deus, é entender que o tabernáculo foi criado
para refletir a criação, que o Santo dos Santos representou o jardim
do Éden, e que o sacerdócio atuava como uma humanidade renovada.
Em outras palavras, o sistema do tabernáculo era como um “globo de
neve”, um microcosmo dentro do cosmos, um modelo cerimonial da
criação completo com sua humanidade exclusiva, onde os sacerdotes
deveriam ser saudáveis e fisicamente perfeitos (Lv 21. 17-23) e abster-
se de lamentar e de guardar luto (Lv10. 6; 21:1–3), por exemplo, fazia
parte da função do sacerdote retratar como seria a vida da
humanidade com Deus no Éden.

A analogia entre o tabernáculo e a criação leva a três observações


importantes. Primeiro, os rituais encontram seu significado em
relação à criação e, particularmente, nas primeiras narrativas do
Gênesis. No Dia da Expiação, especialmente, encontramos a história
da expulsão da humanidade do Éden invertida: como uma figura de
Adão, o sumo sacerdote viajaria para o oeste através da entrada
vigiada por querubins no jardim do Éden, isto é, através do véu
bordado com querubins até ao santo dos santos levando o sangue da
expiação. Neste santo dia de outono, os pecados do povo de Deus
eram evidentemente removidos “quanto dista o oriente do ocidente”
(Sl 103.12), quando o bode expiatório era levado para longe do Leste, o
próprio tabernáculo, como morada de Deus e modelo do cosmos, era
purificado ritualmente da impureza dos pecados de Israel.

Segundo, a analogia entre o tabernáculo e a criação também deixa


claro que o drama de rituais como o Dia da Expiação, que purificava
somente o modelo do cosmos, precisaria ocorrer no cenário da
própria criação, em prol da casa original de Deus, o cosmos. Isso é
parte da mensagem do livro de Hebreus, cujo autor transforma o
escândalo de Jesus não ter uma linhagem levítica, excluindo-o do
ministério sacerdotal, em uma necessidade lógica: Se Jesus fosse um
levita, seus sacrifícios e ministério teriam sido limitado ao modelo do
cosmos (isto é, o templo). Jesus, no entanto, realizou o verdadeiro Dia
da Expiação ao entrar, não no modelo do paraíso celestial (o Santo dos
Santos), mas na realidade, de fato, ele entrou no “próprio céu”, e isto
não com o sangue de touros e cabras que representaram a vida da
humanidade, mas com o seu próprio sangue (Hb 9. 11-15; 23-28).

Terceiro, quando Deus introduzir os novos céus e a nova terra, tendo


a criação sido limpa pela obra expiatória de Cristo e renovada pelo
fogo do Espírito Santo, não haverá mais necessidade de um templo –
pois o povo de Deus habitará com Deus na própria casa de Deus que
será a nova criação. O tabernáculo e o templo eram provisórios para a
era entre a criação e a nova criação.

A aliança e o templo
Para entender o significado do tabernáculo na história, é necessário
olhar – através da Escritura – para fora da criação e do tempo, para
uma determinada vontade de Deus, uma vontade revelada na
promessa da aliança repetida com frequência: “Andarei entre vó e
serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo”. Esse sentido triplo é
recorrente, no todo ou em parte, por toda a Escritura, como o
coração da aliança, o objetivo da criação e da redenção. De fato, o
tabernáculo repleto de glória no final do livro de Êxodo já havia sido
antecipado justamente por tais declarações da promessa da aliança: “E
me farão um santuário, para que eu possa habitar no meio deles.” (Êx
25. 8) e “E habitarei no meio dos filhos de Israel e serei o seu Deus. E
saberão que eu sou o Senhor, seu Deus, que os tirou da terra do Egito,
para habitar no meio deles; eu sou o Senhor, seu Deus.” (29. 45 – 46).
Mais tarde os profetas usariam o templo como um símbolo para esse
relacionamento de aliança, declarando que Deus realmente redimiria
e santificaria seu povo e moraria com ele (ver, por exemplo, Ezequiel
36. 26 – 27). Na aliança davídica, o papel do templo no plano de
redenção de Deus eleva-se à proeminência singular.

Depois que Deus escolheu o Monte Sião como sua morada


permanente, Davi expressou seu desejo de estabelecer uma casa
permanente para Deus, isto é, construir um templo para ele (2Sam 7).
Embora Davi tenha sido declarado incapaz de construir o templo
devido ao seu derramamento de muito sangue, essa proibição foi dada
dentro do contexto de suas guerras de conquista (1Rs 5. 3; 1Cr 22. 8;
28. 3). Uma vez que a transição da habitação móvel de Deus para o
templo permanente pretendia transmitir a ideia de estabilidade, era
mais apropriado que o filho e herdeiro de Davi, Salomão, cujo reinado
refletia a estabilidade da sucessão dinâmica (em vez da conquista),
construísse o templo. Mais profundamente, a resposta do Senhor a
Davi sugere que, em última análise, um filho diferente de Salomão
estava em mente, bem como uma casa diferente do edifício de
Salomão. A língua hebraica usa o mesmo termo tanto para “casa”
como para “lar” (no sentido de um agregado familiar), então os
intérpretes deveriam avaliar o contexto para discernir qual ideia se
deve transmitir.

Em 2Samuel 7. 1 – 7, Davi anseia construir uma casa para Deus. A


resposta de Deus a Davi, no entanto, muda o significado do termo de
“casa” para “lar”: o Senhor “fará de você um “lar” (v.11), como em uma
casa real ou dinastia. Então Deus prometeu que o filho de Davi seria
aquele que construiria “uma casa ao o meu nome” (v.13). A questão
intrigante aqui é como o termo deve ser usado neste versículo: como
“casa” ou “lar”? Dada a recente transformação do termo, por parte do
Senhor, de uma “casa de pedra” para uma “casa de filhos”, sem
mencionar suas relativamente indiferentes observações em relação à
primeira (vv. 5-7), haveria um certo anticlímax na conclusão da
história se consideramos que o filho de Davi construiria meramente
uma casa de pedra.

Em vez disso, o rico jogo de palavras permite o cumprimento inicial,


no templo de Salomão (1Rs 8), como um evento que apontou para uma
realidade mais maravilhosa: Jesus Cristo, o Filho de Davi, que
edificaria a igreja como um templo de pedras vivas. uma casa como a
morada de Deus pelo Seu Espírito (Ef 2.19-22). O Novo Testamento
retrata a salvação como homens sendo trazidos para a casa de Deus,
tornando-se em filhos de Deus, sendo-lhe dado o nascimento celestial
pelo seu Espírito (Jo 1.12-13; 3. 3-8; 1Jo 3.1). O povo de Deus é a sua
casa e o seu lar.

Cristo e o templo
A transição da criação para a nova criação e do templo como casa
para o templo como lar está centrado na pessoa e obra do Senhor
Jesus Cristo. No prólogo do evangelho de João, lemos que o Filho se
tornou carne e “habitou” entre nós, manifestando a sua glória (Jo 1.14,
tradução do autor). Através da encarnação, o Eterno Filho se torna um
templo, sua humanidade é a morada de Deus. Como templo, Jesus
também é o caminho para Deus. Seu auto sacrifício na cruz da agonia
expia nossos pecados, cumprindo o ritual sacrificial do antigo Israel.
Muito apropriadamente, a crucificação de Cristo resultou em Deus
rasgando o véu do templo (Mc 15.38), através do véu da carne de
Jesus, o “novo e vivo caminho” para Deus foi aberto (Hb 10. 19-22).

Através de sua ressurreição e ascensão, Jesus levou a humanidade ao


paraíso celestial, primeiro, através de sua própria natureza humana, e
depois pela nossa união com ele, por meio do Espírito. Jesus é, de fato,
a pedra que os construtores rejeitaram, mas a quem Deus vindicou
como a principal pedra angular de seu templo vivo (1Pe 2. 4–10; Sl.118.
22). Pelo Espírito derramado, o povo de Deus, como pedras preciosas
escolhidas, é levado à união com Cristo para formar a casa e o lar de
Deus. Maravilhosamente, a igreja, o povo de Deus reunido para o culto
comunitário, tornou-se o templo de Deus em quem habita o Espírito
de Deus (1Co 3.16). Inevitavelmente, então, o tema do templo nas
Escrituras chega à doutrina da união com Cristo.

Finalmente, o templo representa o propósito eterno e profundo de


Deus em habitar em comunhão com o seu povo na criação. A morte
de Jesus Cristo demonstra a “profundidade” divina de tal propósito e a
união com Cristo a “altura” desse propósito, o amor que excede todo
entendimento (Ef 3.17-19). Através da lente da criação e da aliança, o
tabernáculo cheio de glória direciona os olhos da fé para a visão de
João onde a igreja que desce do céu, é descrita como uma cidade-
templo, a nova Jerusalém (Ap 21). A mesma glória alerta os ouvidos da
fé para que ouçam a clara voz celestial dizendo: “Eis o tabernáculo de
Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos de
Deus, e Deus mesmo estará com eles” (Ap 21. 3). Dentro da casa de
uma nova criação, o Senhor Deus Todo-Poderoso e o Cordeiro serão
o templo da igreja, e a igreja, o povo de Deus de todas as épocas e
nações, será o templo de Deus. Então conheceremos a plenitude da
vida com Deus na casa de Deus.

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