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Neuroplasticidade: Como o cérebro se

adapta à situações adversas?


Até pouco tempo acreditava-se que o cérebro era um órgão fixo e imutável, sendo incapaz de
gerar novas conexões e células [3]. Entretanto, sabe-se por meio das pesquisas atuais que o
sistema nervoso (SN) tem a capacidade de alterar a sua morfologia e fisiologia de acordo com
os estímulos internos e externos que sofre diariamente. Esse processo é chamado
Neuroplasticidade ou plasticidade neuronal [1, 3, 4].

A neuroplasticidade pode ser definida como a capacidade que o SN tem de se moldar às


adversidades do meio em que se apresenta [1, 3]. Para tanto, promove alterações biológicas,
bioquímicas, fisiológicas e morfológicas nas células nervosas, em especial, nos neurônios, com
a finalidade de se adaptar aos estímulos [1, 3]. Pode apresentar-se de várias maneiras:
regenerativa, axônica, sináptica, somática e dendrítica. Esse fenômeno ocorre em condições
fisiológicas e patológicas, permitindo a formação de novas redes e circuitos neurais.

Segundo Ramón y Cajal (1913), “nos adultos, os caminhos nervosos são algo fixo, finalizado e
imutável. Tudo pode morrer, nada pode ser regenerado” [1, 3]. Don Santiago Ramón y Cajal foi
um dos primeiros pesquisadores a estudar sobre a possibilidade do SN se moldar ao ambiente.
Suas descrições renderam um livro, cujo tema “Estudios sobre la degeneración y regeneración
del sistema nervioso”, publicado em 1913 na cidade de Madrid na Espanha, relatam descrições
sobre as incertezas, questionamentos e expectativas futuras referentes ao sistema mais
importante do corpo humano. Neste livro, Cajal sugeriu que o SN era fixo e imutável, entretanto
a neuroplasticidade era algo possível de acontecer, mas seria demonstrado apenas nas futuras
gerações.

Apenas em 1909 que o termo neuroplasticidade foi empregado pela primeira vez por Minea [6]
para atribuir à capacidade em que as células nervosas têm de se adaptar ao meio em que se
encontram. Até aquele momento não havia nada comprovado, mas 60 anos depois dos
postulados de Ramón y Cajal serem publicados, Jhon Eclans em 1973, pôde encontrar
evidências convincentes sobre tais descrições.

A neuroplasticidade está presente em ambos os casos, durante processos patológicos e lesões


no SN, bem como, faz parte da fisiologia normal do nosso corpo desde a ontogenia
(embriologia) até a vida adulta e morte [5]. Na maioria dos casos, atribuímos neuroplasticidade
ao processo de adaptação do SN em caso de traumas [1, 2, 4]. Nas lesões, a neuroplasticidade
surge na tentativa de promover reparação ou regeneração tecidual, com finalidade de
restabelecer as funções normais dos neurônios, a exemplo, podemos citar as lesões no SN,
como lesão medular e lesão no nervo ciático. Neste caso, chamamos de neuroplasticidade
regenerativa, que pode ser axônica, dendrítica ou somática [5].

No entanto, deve-se compreender que a neuroplasticidade constitui um processo fisiológico


intrínseco do ser humano, no qual o cérebro se adapta às condições externas e internas, sendo
fundamental para o processo neuroquímico da aprendizado e memória [5, 3], pois eles se fazem
mediante a formação de novas conexões cerebrais.
A neuroplasticidade tem atividade máxima durante o período crítico [5]. Durante essa fase o SN
é mais plástico e mais suscetível às mudanças no meio externo. O período crítico ocorre no
desenvolvimento do SN durante a fase embrionária. Após o nascimento a atividade plástica
cerebral diminui consideravelmente, mas nunca deixa de existir. O que implica que até mesmo
os idosos apresentam plasticidade neuronal, no entanto, reduzida. Esse fator também explica o
motivo pelo qual crianças têm mais facilidade de aprendizado do que os adultos e os idosos.
Pois, apresentam maior plasticidade neuronal. Suas sinapses e conexões são feitas mais
rapidamente e em caso de lesão no SN tendem a regenerar com mais facilidade.

O microambiente ambiente extracelular também influencia no processo de regeneração do


nervo [2]. Estudos mostram que o microambiente pode contribuir para a plasticidade
morfológica, que se caracteriza pelas alterações na árvore dendrítica, formação de novos
circuitos neurais em virtude das alterações dos trajetos das fibras nervosas, alterações no
número das sinapses e modificações nas espinhas dendríticas [5].

A região neuronal na qual é afetada também influencia a neuroplasticidade regenerativa. Os


prolongamentos como os axônios e dendritos têm maior facilidade para serem restaurados e
recuperados, no entanto, caso a lesão seja a nível somático, ou seja, no corpo celular do
neurônio, a regeneração se torna impossível levando a morte neuronal [5].

Portanto, ao contrário do que os cientistas acreditavam no passado, o SN não é fixo e imutável.


O SN apresenta capacidade de regeneração, algumas regiões são mais fáceis de serem
regeneradas do que outras, isso ocorre em virtude da presença ou ausência de fatores
estimulantes e inibidores. Adicionalmente, a neuroplasticidade está também atribuída ao contato
com estímulos. Hábito da leitura, praticar atividades físicas, alimentação saudável, aprender
outros idiomas, aprender instrumentos musicais, são fatores que estimulam a sinaptogênese e
neurogênese (neuroplasticidade em geral) permitindo com que esse indivíduo tenha uma
capacidade e habilidade mais rápido de aprendizado [1,2,5,6]. No entanto, se uma pessoa não
tem o hábito de leitura ou de conhecer novas habilidades e atividades, as suas conexões
nervosas tendem-se a atrofiar provocando assim maior dificuldade no aprendizado.
Vale salientar que mudanças permanentes estruturais e fisiológicos geradas a partir da
exposição constante a estímulos externos podem promover alterações comportamentais e
psicológicas. Portanto, exposição constante de indivíduos a condições de estresse e ansiedade
crônica, podem gerar alterações comportamentais [1] que levam a quadros depressivos.
Denominamos, para tanto, plasticidade comportamental [5].

Referências:

1. Eberhard Fuchs, E.; Flügge, G. Adult Neuroplasticity: More Than 40 Years of


Research. Neural Plasticity, 2014.

2. Knvul Sheikh. How the Brain Can Rewire Itself After Half of It Is Removed. 2019

https://www.nytimes.com/2019/11/19/health/brain-removal-hemispherectomies-scans.html
3. Kania, B. F.; Wrońska, D.; Zięba, D. Introduction to Neural Plasticity Mechanism.
Journal of Behavioral and Brain Science, 2017.
https://www.scirp.org/pdf/JBBS_2017020615374293.pdf

4. Sobrinho, J. B. R. Neuroplasticidade e a Recuperação da Função após lesões


Cerebrais. Acta Fisiátrica 2(3): 27-30, 1995.

5. Lent, R. 100 bilhões de neurônios. Conceitos Fundamentais de Neurociências.


Atheneu, 2001.

6. Yochim, R.; Woodhead, E. Psychology of Aging: A Biopsychosocial Perspective.


Springer Publishing Company, 2017.

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Autor: Tamara Nunes

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