Você está na página 1de 26

A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA

A filosofia medieval foi desenvolvida na Europa durante o período da Idade


Média (séculos V-XV). Trata-se de um período de expansão e consolidação do
Cristianismo na Europa Ocidental. A filosofia medieval tentou conciliar a
religião com a filosofia, ou seja, a consciência cristã com a razão filosófica
e científica. Isto pode parecer paradoxal em nossa época, mas naquele tempo
era perfeitamente compreensível.
A filosofia da Idade Média pode ser considerada como o pensamento
filosófico ocidental que preencheu o espaço entre o fim do mundo antigo,
determinado pela queda do Império Romano do Ocidente (476), e pelo começo
dos tempos modernos, que têm seu início a partir da conquista de
Constantinopla (1453) ou do princípio da Reforma Religiosa em 1517.
A filosofia cristã representa um conjunto de ideias baseadas nos preceitos
de Jesus Cristo. Sua principal característica é a busca da explicação para a
existência de Deus por meio da ciência. A base do pensamento está na
tradição racionalista filosófica grega e romana em consonância com os dogmas
cristãos. O fundamento principal da filosofia cristã é justificar a fé tendo a razão
como instrumento. Essa corrente de pensamento empresta
da Metafísica grega a explicação científica para a existência de Deus
defendida no Cristianismo. Também são adaptados ao conceito para justificar a
fé, fundamentos do neoplatonismo, estoicismo e gnosticismo.

Principais doutrinas da filosofia cristã:

 Há separação entre material-corporal e espiritual-corporal

 Deus e o mundo material são separados

 Deus se manifesta em três pessoas distintas, a Santíssima Trindade


(Pai, Filho e Espírito Santo)

 O Pai é considerado o Ser do mundo, o Filho é a alma do mundo e o


Espírito Santo a inteligência

 A verdade está nas Escrituras (Bíblia Sagrada)

 Há no mundo: anjos, arcanjos, serafins e um reino espiritual

 A alma humana participa da divindade e é superior ao corpo

 A Providência divina governa todas as coisas

 Para ser perfeito, o homem precisa entregar-se à Providência divina e


abandonar os impulsos carnais
 É preciso crer em Cristo para ser santificado

 O mal é identificado com o demônio

 O mal age sobre a matéria, a carne, o mundo e o homem

Atualmente, depois das investigações de DeniEle, Ehrle, Bauemker, M. De


WUlf. Grabmann, MaNdoNNet, Gilson e outros, sabemos que as realizações
filosóficas pertinentes à Idade Média eram bem mais abrangentes,
interessantes e também individuais do que poderíamos imaginar. Além disso,
também para o homem medieval era livre o pensamento e a investigação.
Mesmo sem fazer grande uso da sua liberdade, o homem da Idade Média
seguiu as pressuposições e também a opinião pública. Condenar a Idade
Média, alegando o fato de ela não ser “isenta de preconceitos”, é um paradoxo.
Na realidade, em época alguma houve ausência de preconceitos. Porém,
existe o ideal ao qual devemos perseguir por amor à verdade, o que também
ocorreu na filosofia medieval, que buscou alcançar a verdade objetiva. Por isso,
não devemos subestimar a Idade Média; pois, quanto mais conhecemos
melhor o homem moderno na sua forma de pensar e de sentir, ele parece
muitas vezes mais medieval que a própria Idade Média.

Possui ainda a Idade Média algum significado do ponto de vista filosófico?


Com certeza, pois ela conservou os antigos pressupostos teóricos, incluindo
não apenas a ciência e a arte da antiguidade, mas também garantiu nas suas
escolas a continuidade do saber filosófico. Nesse aspecto, temas tão
fundamentais relativos à causalidade, à realidade, à finalidade, à
universalidade, à individualidade, à sensibilidade e ao mundo fenomenal, à
compreensão e à razão, à alma e ao espírito, ao mundo e a Deus foram
transmitidos aos filósofos modernos pela Idade Média.

A PATRISTICA

A filosofia cristã dos primeiros sete séculos foi denominada de patrística,


por ter sido elaborada pelos padres da Igreja, considerados como os primeiros
teóricos. Ela consiste no conjunto de doutrina das verdades da fé cristã e na
sua defesa contra os “pagãos” e os hereges. Esse conjunto foi responsável
pela defesa da fé e da criação dos costumes que decidiram os rumos da Igreja
no decorrer dos sete primeiros séculos do cristianismo. A patrística também se
ocupou da elucidação progressiva dos dogmas cristãos e daquilo que
chamamos de Tradição Católica. Quando o ocidentalismo, para defender-se de
ataques de outros povos, religiões e culturas, precisou esclarecer seus próprios
dogmatismos, a patrística mostrou-se como a expressão acabada da verdade
que a filosofia grega havia buscado, enquanto o próprio Deus não havia ainda
encarnado. Se, por um lado, se procura interpretar o cristianismo por
intermédio de conceitos tomados da filosofia grega; do outro, encontra-se o
significado que esta última dá ao cristianismo.
Os primeiros pensadores cristãos também se debateram com os
filósofos, Platão, Aristóteles, sobretudo com os estoicos e os epicureus. Sem
perder de vista os ideais da doutrina cristã, eles buscaram encontrar, frente à
filosofia e aos filósofos, o local adequado da reflexão filosófica e do
pensamento cristão. Vale lembrar que o cristianismo primitivo recebeu
influências de vários segmentos da filosofia grega, já citados anteriormente,
sem que se pudesse determinar com clareza a extensão provocada por esse
contato. Costuma-se dizer que os filósofos convertidos ao cristianismo
buscaram conferir à doutrina cristã um status filosófico, mas sem o cuidado de
salientar as fontes filosóficas. Entre os autores que se ocuparam dessa tarefa,
estão Justino, Tertuliano, Clemente de Alexandria, Orígenes, Gregório de
Nazianzo, Basílio de Cesareia e Gregório de Nissa.
Divisão didática
Podemos dividir a Patrística em três fases:
• até o ano 200, ocupou-se em defender o cristianismo contra seus
adversários (padres apologistas, como São Justino Mártir).
• até o ano 450, consolida-se o período em que surgem as primeiras
grandes teorias da filosofia cristã, como a de Santo Agostinho e a de Clemente
Alexandrino, entre outros.
• até o século VIII, são refeitas as doutrinas já formuladas e de cunho
original
Também é possível dividir a literatura patrística em três períodos, da
seguinte forma:
• Período ante-niceno – corresponde ao período anterior ao Concílio
Ecumênico de Niceia. Inclui todos os escritos surgidos entre o século I e o
início do século IV.
• Período niceno – faz menção ao período entre os anos anteriores até
aqueles posteriores ao Concílio Ecumênico de Niceia. Abrange os escritos que
surgiram entre o início e o fim do século IV.
• Período pós-niceno – trata-se do período compreendido entre os
séculos V e VIII
A patrística buscou unir a doutrina cristã com o conhecimento e as bases
filosóficas prévias desenvolvidas pela filosofia grega clássica. A razão, base do
pensamento filosófico grego, torna-se uma ferramenta para a justificação da fé.

A Filosofia de Agostinho

Aurélio Agostinho foi um padre que merece destaque entre os


representantes do clero, da mesma forma que Tomás de Aquino se diferenciou
entre os escolásticos. Enquanto Agostinho buscou inspiração na filosofia
platônica, Tomás de Aquino preferiu os pensamentos de Aristóteles para
elaborar a filosofia metafísica cristã. Por ser muito sensível e compreensivo,
Agostinho revelou ter em si a mesma essência da patrística grega, com o
caráter pragmático da patrística latina, mesmo que os problemas que o
preocupassem fossem sempre de natureza prática e moral, como o mal, a
liberdade e o destino.
Nascido em Tagasta, na Numídia, em 354, Agostinho pertencia a uma
família burguesa comandada pelo pai, que era pagão, tendo sido batizado
somente antes de morrer. No entanto, a mãe era uma cristã fervorosa que
influenciou muito o filho nesse aspecto. Ele foi para Cartago para
aperfeiçoar seus estudos e, ao terminá-los, abriu uma escola lá mesmo. Em
seguida, partiu para Roma e depois para Milão. Ele deixou de ensinar aos 32
anos, por motivo de saúde e de natureza espiritual. Após uma reflexão crítica e
madura das suas ideias, acabou abandonando o maniqueísmo, que é uma
filosofia religiosa sincrética e dualística fundada e propagada por Maniqueu,
filósofo heresiarca do século III, que divide o mundo simplesmente entre Bom,
ou Deus, e Mau, ou Diabo. A matéria é intrinsecamente má, e o espírito,
intrinsecamente bom e passou a adotar a filosofia neoplatônica, que
reconhece a existência de um só Deus e que tudo deriva desse ser divino. Ou
seja, toda a criação, homens, animais, todas as formas naturais são criadas a
partir de seu reflexo, isso lhe ensinou a espiritualidade divina, bem como a
negatividade do mal. Agostinho retirou-se do mundo durante meses, visando
ao isolamento, na companhia da mãe, do filho e de alguns discípulos, nos
arredores de Milão. Foi durante essa fase da sua vida que redigiu seus
diálogos filosóficos.
Logo após a conversão aos 33 anos, Agostinho deixou Milão, doou
tudo o que tinha para os pobres e fundou um mosteiro em uma de suas
propriedades. Foi ordenado padre em 391 e consagrado bispo em 395, tendo
governado a igreja de Hipona até a morte, aos 75 anos, durante o assédio da
cidade pelos vândalos em 430. Ele também se dedicou, em tempo integral, a
estudar a Bíblia e a redigir suas obras, especialmente as de caráter
filosófico. Entre elas, estão: Contra os acadêmicos, Os solilóquios, Sobre a
imortalidade da alma, Sobre a quantidade da alma, Sobre o mestre, Sobre
os costumes, Do livre arbítrio, Sobre as duas almas, Da natureza do bem.
De acordo com Agostinho, a filosofia poderia resolver o problema da
vida, a qual apenas o cristianismo poderia dar uma solução real. Nesse
sentido, seu grande interesse estava relacionado aos problemas de Deus e
da alma, por serem os mais importantes. No início, ele garantiu a certeza da
própria existência espiritual, de onde tirou uma verdade superior e imutável
como condição e origem de toda verdade individual.
Mesmo ao desvalorizar o conhecimento sensível em relação ao
conhecimento intelectual, alegava que os sentidos e o intelecto consistem
nas fontes de conhecimento. Como para ver algo com os olhos humanos, é
necessária a luz física, da mesma forma, para o conhecimento intelectual,
seria preciso uma luz espiritual que vem de Deus, sendo esta a Verdade e o
Verbo divino, para onde são levadas as ideias do pensamento platônico.
Com relação à natureza de Deus, Agostinho demonstrou uma noção
exata, ortodoxa e cristã, definindo-o como um poder racional infinito, eterno,
imutável, simples, espírito, pessoa, consciência. Para ele, Deus é ainda
ser, saber e amor, e, no tocante às relações mundanas, Deus é concebido
como criador.
Vale lembrar que o pensamento clássico grego concebia uma
dualidade metafísica. Já no pensamento cristão agostiniano, esse dualismo
persiste, mas agora incorporando a moral e os pecados dos espíritos que
se erguem contra Deus, preferindo o mundo a Ele. Portanto, no cristianismo,
o mal estaria, do ponto de vista metafísico, na negação e na privação.
Basicamente, Agostinho tratou do problema das relações entre Deus e o
tempo, uma vez que este último é considerado uma criatura de Deus, porque
passa a existir a partir da criação das coisas.
Ainda é possível afirmar que a psicologia de Agostinho encontrou
ressonância no seu platonismo cristão. Nesse sentido, o corpo não é mau
por natureza, uma vez que a matéria não pode ser essencialmente má, por
ter sido criada por Deus. No entanto, a união do corpo com a alma é acidental,
pois alma e corpo não formam a unidade metafísica, substancial, da doutrina
da forma e da matéria.
Entretanto, demonstrou indecisão entre o criacionismo e o
traducionismo, ou seja, se a alma é criada diretamente por Deus ou
provém da alma dos pais. A única certeza é que ela é imortal pela sua
simplicidade. Agostinho a classificou platonicamente em vegetativa, sensitiva e
intelectiva; mas destacou que estão todas forjadas na substância humana.
Dessa forma, a inteligência é divina em intelecto intuitivo, a razão consiste
em fruto da vontade. Enquanto no homem a vontade é amor, no animal
funciona como instinto, e nos seres inferiores está representada pelo apetite.
Sem sombra de dúvida, a moral agostiniana é cristã e transcendente.
A característica mais importante da sua moral está no voluntarismo, na ação
própria do pensamento latino, de forma oposta ao pensamento grego. Dessa
forma, a vontade não é determinada pelo intelecto, pois vem antes dele.
Para a filosofia agostiniana, como a vontade é livre, pode querer o mal; pois
se trata de um ser limitado, capaz de ir ao encontro da vontade de Deus. O
pecado, portanto, possui em si mesmo o dado estrutural da pena da sua
desordem e, como o homem não pode prejudicar Deus, acaba
prejudicando a si mesmo, dilacerado pela sua natureza. A teoria
agostiniana sobre a liberdade em Adão, antes do pecado original, consiste
justamente em poder não pecar. Depois do pecado original cometido, está em
não poder não pecar e nos bem-aventurados será não poder pecar. A
vontade humana parece impotente e sem graça. Já a questão da graça, que
perturbava Agostinho, apresenta um interesse filosófico, uma vez que trata de
conciliar a causalidade absoluta de Deus com o livre arbítrio do homem.
Com relação à família, Agostinho, assim como o apóstolo Paulo,
considerou o celibato superior ao matrimônio. Se o mundo terminasse por
causa do celibato, ele demonstraria alegria pela passagem do tempo para a
eternidade.
Quanto à política, ele possui uma concepção negativa da função
estatal, pois se não houvesse pecado e os homens fossem todos corretos, o
Estado de nada serviria. Na visão de Agostinho, a propriedade seria de direito
positivo, e não natural. Também a escravidão não seria de direito natural, e sim
uma consequência do pecado original, que sempre incomodou toda a
humanidade.
Agostinho foi profundamente perturbado pelo problema do mal, do
qual fornece uma rica fenomenologia, e também por muito tempo desviado
dessa questão pela solução maniqueísta que impediu seu acesso ao justo
conceito de Deus e à possibilidade da vida moral. Ele descobriu a solução para
esse problema na libertação e na sua concepção filosófico-teológica,
considerada como um marco fundamental entre o pensamento grego e
cristão. Inicialmente, ele refutou a realidade metafísica do mal, alegando ser
ela a privação do ser, da mesma forma que a escuridão consiste na ausência
de luz. Essa privação é necessária em qualquer criatura que não seja Deus. Já
ao mal físico, que atinge a perfeição natural dos seres, buscou explicá-lo
argumentando que o contraste dos seres contribuiria para a composição
harmônica do todo.
No que se refere ao “mal moral”, existe de fato a má vontade que
provoca livremente o mal; porém, ela não é causa eficiente, mas
deficiente, sendo o mal não ser, que pode vir do homem livre e limitado e não
de Deus, que é puro ser e cria apenas o ser. Como o mal moral chegou ao
mundo humano pelo pecado original e atual, a humanidade foi castigada com
todo tipo de sofrimento, incluindo a perda dos dons divinos.
Dessa forma, o mal físico tem outra explicação mais profunda, uma
vez que o mal moral foi remediado pela redenção de Cristo, Homem-Deus,
que devolveu à humanidade os dons divinos, bem como a possibilidade do
bem moral, mas deixou permanecer o sofrimento como consequência do
pecado, como meio de purificação e expiação.
Para explicar o mal moral e seus desdobramentos, Agostinho atestou
o fato de ser muito mais glorioso para Deus retirar o bem do mal, em vez de
simplesmente impedir o mal. De maneira resumida, a doutrina agostiniana
sobre o mal consiste basicamente na privação do bem ou devido a uma
natureza específica.

A ESCOLÁSTICA
A escolástica possui um significado mais limitado quando comparada
às disciplinas ministradas nas escolas medievais, entre elas a gramática, a
retórica e a dialética; a aritmética, a geometria, a astronomia e a música,
embora contemple uma conotação mais ampla ao se reportar à linha filosófica
adotada pela Igreja na Idade Média. Esse modo de pensar essencialmente
cristão buscava respostas que justificassem a fé na doutrina ensinada
pelo clero, considerado como o guardião das verdades espirituais. Essa
escola filosófica prevaleceu do princípio do século IX até o final do século XVI,
época que representou o declínio da era medieval, sendo a escolástica o
resultado de estudos mais profundos da arte dialética, assim como a
radicalização dessa prática. No início, ela foi disseminada nas catedrais e nos
monastérios para depois chegar às universidades.
Com isso, a filosofia da antiguidade clássica adquiriu características
judaico-cristãs, já esboçadas a partir do século V, com a necessidade urgente
de fazer um mergulho profundo em uma cultura espiritual que estava se
desenvolvendo rapidamente, para assimilar a esses princípios religiosos
uma essência filosófica capaz de introduzir o cristianismo no campo da
filosofia. A partir dessas tentativas de racionalização do pensamento cristão,
surgiram os dogmas católicos, que se infiltraram na mentalidade clássica
dos conceitos gregos, como ‘providência’, ‘revelação divina’, ‘criação
proveniente do nada’, entre tantos outros.
A tarefa dos escolásticos consistia, portanto, em harmonizar ideais
platônicos com fatores de natureza espiritual, inseridos do cristianismo
vigente ocidental. Mesmo quando Aristóteles é contemplado no pensamento
cristão por Tomás de Aquino, o neoplatonismo adotado pela Igreja ainda é
preservado, fazendo com que a escolástica seja permanentemente
atravessada por dois universos distintos, o da fé herdada da mentalidade
platônica e a razão aristotélica. No caso de Agostinho, havia o clamor pelo
predomínio da fé em detrimento da razão, ao passo que, em Tomás de
Aquino, se acreditava na independência da esfera racional na busca de
respostas mais apropriadas, embora não houvesse rejeição à primazia da
fé sobre a razão.
O método adotado pela Escolástica se deu por meio do ensino,
fundamentado no mestre com o domínio da palavra e também no debate
livre entre o professor e seu discípulo. Além disso, também houve as formas
literárias e, entre elas, predominam os comentários, nascidos das discussões,
dos quais se originam as summas, que permitem ao autor se ver um pouco
mais livre dos textos. Uma das summas mais renomadas é a Summa
Theologica de São Tomás. A Opuscula é igualmente usada pelos
escolásticos, representando um caminho mais autônomo para se abordar uma
questão.
Vale ressaltar que a escolástica foi nitidamente influenciada pela
Bíblia Sagrada, pelos filósofos da antiguidade e também pelos padres da
Igreja, escritores do primeiro período do cristianismo oficial, que dominavam a
fé e a santidade. Ela ainda pode ser considerada como o último período do
pensamento cristão.
Junto com essa instrução, ainda existe, na Idade Média, uma educação
militar, ministrada por militares para militares. Também a Igreja preocupa-se
no sentido de conferir ao seu sistema educacional um sentido ético, religioso
e católico. Pode-se afirmar que a história da filosofia escolástica começou
com o nome de João Scoto Erígena, que nasceu na Irlanda, em 874. Ele foi
chamado à corte culta de Carlos, o Calvo, para presidir e ministrar aulas na
escola palatina. Sua obra principal consiste Da Divisão da Natureza,
dividida em cinco livros. Por apresentar características neoplatônicas, o
esquema especulativo da obra traz a descida da unidade à multiplicidade, bem
como o retorno da multiplicidade à unidade. A valorização conceitual das
ideias, problema que tanto despertou o interesse da escolástica, foi
solucionado de maneira radical no pensamento escotista.
As soluções oferecidas pela escolástica podem ser basicamente
divididas em três: a solução chamada de realismo transcendente, a
solução do realismo moderado e a solução nominalista.
Após a decadência cultural que se seguiu à renascença, começou a
se manifestar nos séculos XI e XII um renascimento especulativo,
incluindo a luta dos teólogos e dos místicos, contra a ciência filosófica
por eles considerada um resíduo pagão e uma distração mundana contra
os filósofos e os dialéticos que a cultivavam. Também é importante
destacar sua posição crítica com relação à pesquisa filosófica, pois a dúvida
nos leva à investigação, e a investigação nos leva à ciência.

O PENSAMENTO DE TOMÁS DE AQUINO

Podemos afirmar que o tomismo ou a doutrina escolástica de Tomás de


Aquino, adotada oficialmente pela Igreja Católica, caracteriza-se,
principalmente, pela tentativa de conciliar a filosofia de Aristóteles com o
cristianismo, desfazendo-se das doutrinas que não estavam enquadradas de
acordo com os princípios aristotélicos.
Coube a Tomás de Aquino a tarefa de mostrar a solução definitiva para
o conflito existente nas relações entre a razão e a fé. Estamos falando de
duas ciências, a filosofia e a teologia, sendo que a primeira baseia-se no
exercício da razão humana, enquanto a segunda, na revelação divina. Apesar
de serem independentes, apresentam, por vezes, os objetos de estudo
comuns, como a existência de Deus, a essência da alma, entre outros. Por
esse motivo, a distinção entre essas ciências tem origem mais do objeto formal,
pois a teologia estuda o dogma pelo método da autoridade ou da revelação, e a
filosofia o analisa pela demonstração científica ou pela razão. Portanto,
teologia e filosofia não são ciências contraditórias, pois ambas procuram a
verdade, e esta é uma só. Na hipótese de uma contradição entre a razão e a
revelação, o erro não será jamais da teologia, mas sim da filosofia, pois
nossas limitações do ponto de vista do conhecimento racional desviaram-se e
não conseguiram atingir a verdade.
Para Tomás de Aquino, nada está na inteligência que não tenha
estado antes nos sentidos, motivo pelo qual não podemos ter de Deus, de
pronto, uma noção imediata. Com o objetivo de provar sua existência, Tomás
procede a posteriori, ou seja, não da ideia de Deus, mas sim dos efeitos por
Ele proporcionados. Dessa forma, ele utiliza o mundo sensível, cuja
existência é dada pelos sentidos como ponto de partida, bem como a
metafísica de Aristóteles, para demonstrar a existência de Deus de cinco
modos, mais conhecidos como as famosas cinco vias:
1) A do “Movimento” – trata-se do argumento aristotélico do primeiro
motor, que afirma “não ser possível admitir uma série infinita de seres que se
movem, movendo por sua vez outros seres; logo, é preciso chegar a um
motor que mova sem ser movido”. Portanto, o movimento existe e é uma
evidência para nossos sentidos. Tudo aquilo que se move é movido por
outro motor; e se esse motor, por sua vez, é movido, vai necessitar de um
motor que o mova, e assim por diante de forma infinita, o que é impossível, se
não houver um primeiro motor imóvel, que move sem ser movido, que é
Deus.
2) A da “Concatenação das Causas” – tudo está sujeito à lei de causa
e efeito. Portanto, existe uma série de causas e efeitos ao mesmo tempo.
Sendo assim, torna-se impossível remontar indefinidamente na série das
causas. Logo, há uma causa primeira, não causada, que é Deus.
3) A da “Contingência” – todos os seres conhecidos são finitos, pois
não possuem em si próprios a razão de sua existência. São e deixam de ser.
Se são todos mortais, em um prazo de tempo deixariam de ser e nada
mais existiria, o que é absurdo. Portanto, os seres contingentes implicam o
ser necessário, ou seja, Deus.
4) A dos “Graus de Perfeição” – todas as perfeições possuem graus,
que se aproximam mais ou menos da perfeição absoluta. Deve, pois, haver
um ser supremo perfeito, que é Deus.
5) A da “Ordem Universal” – todos os seres tendem para uma ordem,
não de forma aleatória, mas por uma inteligência que os guia. Isso significa
que há um ser inteligente que ordena a natureza e a impulsiona para seu
fim. Esse ente é Deus.
A partir desses conceitos, Tomás de Aquino concluiu o quanto podemos
conhecer sobre a natureza e as virtudes de Deus. No entanto, observou que
esse conhecimento é imperfeito, pois sabemos que “Deus é”, mas não “O
que é”. Mesmo assim, podemos compreender que Deus é eterno, infinito e
onipotente em suas relações com o mundo, além de ser Criador e
Providência.
Nesse sentido, a doutrina tomista acredita que a alma, como princípio
espiritual, une-se ao corpo, como princípio material, para constituir uma
substância. Dessa forma, possuem alma as plantas, sendo a “alma
vegetativa” a responsável pelas funções de alimentação e reprodução. No
caso dos animais, é a “alma sensitiva” que responde às funções anteriores,
mais à sensação e à mobilidade. Para o homem, juntam-se todas as
funções anteriores, acrescentando-se a racional.
No que diz respeito às propriedades da alma humana, ele admite o
livre-arbítrio, que é estudado sob todos seus aspectos, e os problemas dele
derivados são resolvidos com seriedade e rigidez. Tomás de Aquino considera
a inteligência como a faculdade mais perfeita da alma humana.
Por intermédio dos seus princípios éticos, ele também adapta a
doutrina de Aristóteles aos princípios cristãos. Dessa forma, a ética passa
a ser o “movimento da criatura racional para Deus”, que busca a bem-
aventurança e consiste na contemplação imediata de Deus.
Para Tomás de Aquino, o conhecimento tem dois momentos: o
sensitivo e o intelectual. O conhecimento sensitivo do objeto está fora de
nós e acontece mediante a sensação, que consiste na impressão do
objeto material em nossa consciência. Ela processa-se pela assimilação das
sensações do sujeito com o objeto conhecido. Já o conhecimento intelectual
depende do conhecimento sensitivo; mas ultrapassa-o por meio da
abstração e da generalização na busca da formulação de conceitos.
Considerado o maior representante da escolástica, Tomás de Aquino
elaborou um sistema filosófico sintético, coerente e fundamentado em
Aristóteles, reformulando, assim, todo o pensamento cristão e adquirindo
plena consciência dos poderes racionais, o que permite ao cristianismo
ser visto como uma filosofia. Assim, podemos atribuir a Tomás de Aquino o
pensamento escolástico, bem como o pensamento patrístico, que teve seu
ápice em Agostinho, repleto de elementos helenistas e neoplatônicos, incluindo
a herança da revelação judaico-cristã. A ele, deve-se diretamente o
pensamento helênico na sistematização do pensamento de Aristóteles,
que chega a Tomás de Aquino acrescido pelas influências de outras
culturas.
Diferentemente do agostinianismo, e em sintonia com o pensamento
aristotélico, Tomás de Aquino considerava a filosofia como uma disciplina
para resolver o problema do mundo e totalmente distinta da teologia, mas
sem ser oposta a ela. Pelo contrário, diversamente de Agostinho, ela estaria
em harmonia com a aristotélica, por ser empírica e racional, sem intervenções
divinas.
É importante salientar que, na filosofia de Tomás de Aquino, a espécie
inteligível é o meio pelo qual a mente entende as coisas extramentais, e
isso corresponde perfeitamente aos dados do conhecimento, que nos assegura
conhecermos coisas e não ideias. Contudo, as coisas podem ser
conhecidas somente por meio das espécies e das imagens; mas sem
entrar fisicamente no cérebro. Nesse aspecto, o conceito tomista de verdade
encontra-se em harmonia com a concepção realista do mundo, justificando-se
pela experiência prática e pela razão. Portanto, a verdade lógica encontra-se
na adaptação entre a coisa e o intelecto.
A metafísica geral tem por finalidade o ser em geral, as atribuições e as
leis relativas, enquanto a metafísica especial busca estudar o homem em
suas grandes especificações, entre elas Deus, o espírito e o mundo. Nesse
sentido, a base do tomismo está na especificação do ser em potência e
ato, significando este a realidade e a perfeição, enquanto a potência
representa o oposto. Nesse contexto, o princípio de potência e ato vale para
qualquer realidade material, sendo o princípio da matéria aquele que interessa
à cosmologia tomista.
Além da matéria e da forma como causas constitutivas, os seres
materiais possuem duas outras causas – a eficiente e a final. A causa
eficiente é responsável pelo surgimento de um ser na realidade,
sintetizando aquela matéria com a forma por ela determinada. Já a causa final
determina a ordem observada no universo. Em outras palavras, todo ser
material existe por causa do cruzamento de quatro causas – material,
formal, eficiente e final, que constituem o ser na realidade e na ordem com os
demais seres vivos pertencentes ao universo.
Como o princípio da vida está dentro do ser, sendo denominado de
alma, possuem uma alma também as plantas e os animais. Porém, para a
psicologia racional, que se ocupa com o homem, interessa somente a alma
racional. A alma racional desempenha as funções da alma vegetativa e
sensitiva, compreendendo e desejando; pois, na visão de Tomás de Aquino,
existe uma forma só e, consequentemente, apenas uma alma para cada
indivíduo. No homem, existe uma alma espiritual, unida com o corpo, que o
transcende. A atividade intelectual, por exemplo, está direcionada para
entidades imateriais, como os conceitos. No caso da vontade humana, ela
é livre e indeterminada, enquanto o mundo material segue regido por leis
fundamentais. Assim sendo, a vontade apresenta-se como um princípio
imaterial e espiritual da alma racional, que é imortal, por ser imaterial e
espiritual.
Diferentemente do dualismo platônico-agostiniano, Tomás de
Aquino afirma que a alma, mesmo espiritual, está junto do corpo material,
que é a sua forma. Desse modo, como o corpo não pode existir sem a alma,
também a alma, mesmo imortal, não pode viver em sua plenitude sem o
corpo, que lhe serve como uma ferramenta crucial. Ao contrário da doutrina
agostiniana, que pretendia ser Deus conhecido imediatamente por
intuição, Tomás de Aquino ressalta que Deus pode ser conhecido apenas
pela demonstração sólida e racional, sem que seja necessário recorrer a
argumentações a priori, mas unicamente a posteriori, partindo da experiência
que, sem Ele, seria contraditória.

A FILOSOFIA MODERNA

O Renascimento, ocorrido nos séculos XIV e XV, é nitidamente


demarcado pela redescoberta da arte e da literatura grega, abrangendo o
humanismo, com ênfase na colocação do homem no centro da realidade, o
repensar da política, o estilo de governo influenciado pelas obras de Maquiavel,
o estudo científico e a filosofia moderna, com destaque para o poder racional
do homem, sinalizando um retorno às raízes do pensamento racional e à
renúncia do controle do conhecimento pelo misticismo e pela Igreja
Católica. Nesse contexto, a sabedoria não é mais vista como algo sagrado e
místico, uma vez que, por meio do pensamento e do raciocínio, o homem tem
poder para traçar seu próprio destino e caminhar rumo ao conhecimento.
Para começar, é importante lembrar que a filosofia da Idade Moderna
nasceu por causa dos trabalhos dos grandes mestres do renascimento
cultural e científico dos séculos XIV e XV, entre eles Nicolau Copérnico e
Leonardo da Vinci, e dos esforços de cientistas e pensadores como Galileu
Galilei, Francis Bacon, René Descartes e Emanuel Kant nos séculos seguintes.
A filosofia moderna teve início, de fato, com a Teoria do Conhecimento de
René Descartes.
O Renascimento trouxe uma renovação da ciência e a necessidade de
uma nova definição do ser humano e seu lugar no mundo. A chamada Idade
da Razão surgiu para redefinir os padrões científicos e filosóficos já
existentes. Descartes, na declaração “penso, logo existo”, descobre o homem
como um ser racional por natureza, com a capacidade de alcançar o
conhecimento e, mais que do isso, sua existência é definida pelo ato de
pensar. As obras de Descartes formaram a base sobre a qual os racionalistas
desenvolveram seus trabalhos e formularam suas hipóteses.
O Iluminismo como movimento dentro da modernidade e mantendo a
ênfase na racionalidade possui características próprias, como a liberdade e o
fim da opressão. Influenciou os responsáveis pelos movimentos de libertação
no século XVIII, e seu efeito foi sentido de forma muito especial na França,
sendo um dos fatores que levaram à Revolução Francesa. A burguesia,
geradora de riqueza, estava presa sobre o jugo da aristocracia, da monarquia
absolutista e da Igreja, dominantes desde a Idade Média, sendo obrigada a
pagar impostos para sustentar o luxo de poucos, e ansiosa por uma sociedade
livre.
René Descartes: O Racionalismo

René Descartes nasceu em 1596 em La Haye, rebatizada com o nome


de Descartes em sua homenagem, no sul de Tours, na França. Integrou o
exército do príncipe Maurício de Orange e, em 1619, durante uma viagem pela
Europa, decidiu aplicar os métodos da matemática à metafísica e à ciência.
Para isso, foi morar nos Países Baixos em 1628, onde tinha mais
possibilidades de se libertar das influências e das perseguições da Igreja
Católica.
Também conhecido como Renatus Cartesius (forma latinizada),
Descartes ganhou fama por seu trabalho revolucionário na filosofia e na
ciência; mas também obteve reconhecimento matemático por sugerir a
fusão da álgebra com a geometria, o que deu origem à geometria analítica e
ao sistema de coordenadas cartesianas. Além disso, foi um dos pensadores
mais importantes na Revolução Científica. Muitas vezes chamado de
“fundador da filosofia moderna” e “pai da matemática moderna”, ele
passou para a história como um dos pensadores mais influentes do
pensamento ocidental, que serviu de modelo e inspiração para várias
gerações de filósofos que viriam depois. Boa parte da filosofia escrita a partir
da época em que viveu foi uma reação às suas obras ou a autores
supostamente influenciados por ele.
Ele acreditava ser um iluminado cuja missão consistia em unificar
todos os conhecimentos humanos a partir de bases sólidas atestadas
pela ciência para edificar um modo de pensar centrado na verdade e, por
isso mesmo, permeado apenas pelas certezas racionais. Como matemático e
filósofo francês, ele refutou todos os pressupostos e ideias que vinham da
natureza subjetiva dos sentidos, o que o levou a escrever a máxima “penso,
logo existo”. Para ele, todo o universo material poderia ser explicado em
termos físicos e matemáticos, o que o levou a criar a geometria analítica
como forma de definir e manipular as formas geométricas por meio de
expressões algébricas. Deu origem ainda às coordenadas cartesianas, a forma
por intermédio da qual os pontos são representados nesse sistema, que
marcaram para sempre seu nome na história da humanidade.
No Discurso do método, Descartes declarou sua decepção não com o
ensino da escola em si, mas com a forma de pensamento baseada na cultura
e na tradição que era fundamentalmente escolástica, cujo conhecimento
científico achava-se confuso, obscuro e nem um pouco prático. Ele criticou
ainda as escolas da Companhia de Jesus, fazendo com que os mestres
jesuítas o considerassem um filósofo deficiente. Nessa mesma época,
escreveu também Larvatus prodeo (Eu caminho mascarado).
O pensamento de Descartes pode ser considerado revolucionário para
uma sociedade feudalista, na qual a influência da Igreja ainda era muito
forte e quando ainda não existia uma tradição da produção de conhecimento
científico. Ele viajou muito e viu que sociedades diferentes possuíam
crenças diferentes e até mesmo contraditórias. Aquilo que numa região era
tido como verdadeiro, era considerado ridículo e desprovido de bom senso em
outros lugares. Descartes constatou que os costumes, a história de um
povo, bem como sua tradição cultural, determinavam a forma como as
pessoas pensam naquilo em que acreditam, o que o levou a entender a
cultura como inimiga da razão. Por isso, o método cartesiano consiste
basicamente no ceticismo metodológico, que duvida de tudo que pode ser
duvidado. Esse pensamento vai de encontro ao dos gregos antigos e dos
escolásticos, que acreditavam que as coisas existem simplesmente porque
precisam existir, ou porque assim deve ser.
Ele também concebeu o método na realização de quatro tarefas
básicas:
1) verificar se existem evidências reais e indubitáveis acerca do
fenômeno ou da coisa estudada;
2) analisar, ou seja, dividir ao máximo as coisas em suas unidades de
composição, fundamentais, e estudar essas coisas mais simples que
aparecem;
3) sintetizar, agrupar novamente as unidades estudadas em um todo
verdadeiro; e
4) enumerar todas as conclusões e princípios utilizados para manter a
ordem do pensamento.
Quanto à ciência, desenvolveu uma filosofia que influenciou muitos
cientistas até ser passada pela metodologia de Isaac Newton. Ele acreditava
que a matéria não possuía qualidades inerentes, sendo apenas o material
bruto que ocupava o espaço, dividindo a realidade em res cogitans
(consciência, mente) e res extensa (matéria). Para Descartes, Deus criou o
universo como um perfeito mecanismo de moção vertical, que funcionava
de forma determinista e sem a intervenção divina. Ele instituiu a dúvida,
alegando que seria possível dizer que existe apenas aquilo que pode ser
provado.
Em 1641, lançou sua obra filosófica e metafísica mais importante:
Meditações sobre a filosofia primeira, juntamente com os primeiros seis
conjuntos de Objeções e Respostas. Em 1643, o cartesianismo foi condenado
pela Universidade de Utrecht, enquanto Descartes publicava Os princípios da
filosofia, obra que faz uma síntese dos seus princípios filosóficos para a
formação da ciência. Em 1649, a convite da Rainha Cristina da Suécia,
escreveu e publicou o Tratado das paixões, dedicado à princesa Elizabete da
Boêmia, com quem mantinha uma amizade afetuosa. Morreu de pneumonia em
1650 em Estocolmo, onde estava trabalhando como professor. Por ser católico
em um país protestante, foi enterrado em um cemitério de crianças não
batizadas, em Adolf Fredrikskyrkan. Durante a Revolução Francesa, seus
restos foram desenterrados para serem deslocados para o Panthéon, ao lado
de outras grandes figuras ilustres da França. Em 1667, a Igreja Católica
Romana colocou suas obras no Índice dos Livros Proibidos.

David Hume: O Empirismo

Considerado um dos mais importantes filósofos da Grã-Bretanha do


século XVIII, David Hume nasceu em Edimburgo, na Escócia, em maio de
1711. Voltou para a propriedade rural de sua família em 1737, depois de
estudar na França, e lá permaneceu até a morte, em 1776. Assim que
regressou, providenciou a publicação de sua obra mais famosa, o Tratado,
composta por três livros, publicados no anonimato em duas etapas, antes de
completar 30 anos.
Embora seja conhecido também por seus ensaios e obras históricas,
Hume é reconhecido por seus escritos filosóficos, principalmente aqueles
dedicados ao empirismo e aos fundamentos do conhecimento humano.
David Hume é autor da obra “Tratado da Natureza Humana”,
publicada entre 1739 e 1740. No livro, Hume aproxima o raciocínio
experimental dos temas e assuntos filosóficos. No entanto, a obra não teve
grande aceitação entre os pensadores da época.
Em 1748, Hume publica um resumo de seu “Tratado”, intitulado
“Investigações sobre o entendimento Humano”. De maneira objetiva e mais
clara, o filósofo apresenta toda sua teoria filosófica.
Hume é conhecido por seu ceticismo e empirismo extremos. O
filósofo questionava até fatos e elementos que pareciam já ter sido
esclarecidos pela ciência e pela filosofia. Com os diversos questionamentos
e dúvidas, Hume buscava descobrir as origens e construções das crenças
humanas e não apenas a superficialidade da existência de fatos e elementos.
Defensor do empirismo, o escocês afirma que todo processo de
entendimento inicia-se com impressões. Não seria possível desvincular o
pensamento das sensações. O autor define que as sensações são as
únicas capazes de serem comprovadas. A percepção a partir das nossas
sensações é a única realidade que os seres humanos são capazes de
conhecer.
Hume discorda da tradição científico filosófica ao questionar o
princípio da causalidade. O princípio define a relação entre eventos, de
forma que um é a causa e o outro o evento dessa mesma causa. De
acordo com Hume, a filosofia não deveria tentar entender a relação entre
causa e efeito e nem a eficiência desse conceito na vida humana, mas sim a
força que o conceito exerce no cotidiano e na sociedade.
Para entender o conhecimento adquirido pelos indivíduos, Hume define
que podemos entender o mundo de duas maneiras: através das
impressões ou através das ideias.
Impressões: as impressões são as sensações mais fortes, mais vivas e
de certa forma, mais recentes.
Ideias: as ideias podem ser definidas como as memórias, como as
lembranças, portanto, sensações mais distantes e menos vívidas.
As ideias podem ser divididas em simples e complexas.
Ideias Simples: são as cópias diretas das impressões. Por exemplo, um
brinquedo, roupa ou objeto que o indivíduo possuía enquanto criança. A
impressão antiga de fato existiu, e na vida adulta é retomada como uma ideia
simples, uma lembrança de algo existente, porém distante.
Ideias Complexas: são objetos da nossa imaginação. O exemplo
clássico de uma ideia complexa é o do Pégaso, um cavalo com asas.
Para Hume, a imaginação manipula ideias simples e gera ideias
complexas. A junção de um cavalo e um pássaro, alimentam a imaginação
e transformam as duas figuras em um cavalo alado, resultado da
imaginação. Segundo o filósofo, ideias simples e complexas podem se mesclar,
formando uma terceira ideia ainda mais complexa, como um cavalo alado
colorido.
A partir dos conceitos de impressões e ideias, Hume formula a ideia do
Princípio da Cópia, que define que todas as ideias são de alguma forma,
cópia das impressões. Não é possível formular cópias sem que haja
sensações e impressões. Os indivíduos nunca poderão produzir cópia de
impressões que nunca tiveram.
No desenvolvimento de todas as suas obras filosóficas, Hume defende
o empirismo como forma de se atingir o conhecimento. O conceito de
empirismo foi definido pela primeira vez em 1690, por John Locke, filósofo que
foi grande influenciador das obras de Hume.
Os empiristas creem que as experiências e sensações humanas são as
únicas capazes e responsáveis pela formação de ideias. A razão, por sua vez,
é responsável pela organização dos conhecimentos obtidos a partir das
sensações.
Para que o indivíduo atinja o conhecimento é preciso que primeiro,
passe por experiências sensoriais. Posteriormente, o pensador deve
submeter o objeto a diversas análises, testes, experiências e observações para
garantir ou não a veracidade daquilo que pesquisa. Por fim, os resultados e
conhecimentos obtidos a partir das experiências, observações e testes são
organizados.
Para Hume, os conceitos do empirismo servem para a construção do
princípio da causalidade. De acordo com ele, os eventos não seguem uma
relação de causa e consequência. O filósofo não reconhece a existência de
conexões causais entre os fatos.
A organização dos fatos é temporal e a partir dessa temporalidade é
que ela deve ser analisada. De acordo com essa quebra de uma visão
filosófica histórica, Hume reforça a ideia da necessidade de toda evidência ser
empírica, ser, portanto, ligada às sensações.
No ensaio Da superstição e do entusiasmo, coloca a superstição e
o entusiasmo como exemplos falsos de religião, uma vez que a alma
humana pode alcançar um estado de espírito negativo e imaginar objetos,
atribuindo poderes a algo inexistente. Outro tipo de estado de espírito conduz
ao entusiasmo e, nele, a imaginação flui, enquanto o mundo material perde a
sua grandeza. Hume também acredita que sentimentos como a esperança
e o orgulho, além da imaginação, são fontes do entusiasmo e parte para
criticar os membros do clero, chamando-os de tiranos.
De forma resumida, o ceticismo de Hume está na negação não da
crença, mas da evidência. É a conclusão filosófica de que o homem é mais
uma criatura de percepção sensível e prática que de razão. O que ele diz é
que somente existe nossa experiência de que uma coisa se segue à outra, que
os padrões de uma experiência passada se repetem e passam a ilusão de
causa e efeito. Ele não observa nenhuma relação causal entre os dados dos
sentidos “externos” porque, quando o homem considera quaisquer eventos
como causalmente relacionados, tudo que faz e pode observar é que eles
frequentemente caminham juntos. Nesse tipo de associação, é um fato que a
impressão ou ideia de um evento traz com ele a ideia do outro. O trabalho da
associação do hábito fixa-se na mente e passa a ser sentido como compulsão.
Com esse sentimento, Hume conclui ser a única fonte da ideia de causalidade

Immanuel Kant: O Apriorismo e o Conhecimento

O crítico da razão e da moral, nascido em 1724 no seio de uma família


protestante em Königsberg, atual Kaliningrado, Emmanuel Kant teve educação
rígida em uma escola de princípios pietistas, ou seja, reacionária contra o
protestantismo dogmático. Na primeira fase da vida adulta, era apenas um
metafísico menor numa universidade prussiana; mas foi então que uma crise
existencial o atormentou, sendo possível afirmar que isso teve forte influência
na suas convicções posteriores como filósofo e pensador.
O filósofo dedicou-se na abordagem de questões sobre moralidade,
natureza do tempo e espaço, aquisição do conhecimento, política, metafísica,
ciência cognitiva e do conhecimento e filosofia da psicologia.

Kant foi o primeiro filósofo a solucionar o debate promovido entre


racionalistas e empiristas, por isso é considerado um dos mais importantes
filósofos de seu tempo. O autor é reconhecido também como um entusiasta do
iluminismo europeu, que foi influenciador de algumas de suas obras.

A principal contribuição da filosofia kantiana ocorre quando o


filósofo reúne conceitualmente o racionalismo de Descartes e
o empirismo de Hume, relacionando assim a razão humana e a relevância da
experiência na aquisição do conhecimento. A união desses conceitos é
chamada na filosofia de Revolução Copernicana.

Os racionalistas cartesianos acreditavam que toda origem do


conhecimento verdadeiro deriva da razão, a partir de categorias inatas,
chamadas de a priori, que significa antes da experiência. Os empiristas, por
sua vez, acreditavam que o homem era uma tábula rasa e todo conhecimento
provinha de sensações.

Kant soluciona o debate promovido entre cartesianos e empiristas ao


questionar se o próprio conhecimento é possível, ou seja, a razão faz críticas a
si mesma, a razão é, portanto, questionada.

O filósofo critica a ideologia da razão ao apresentar uma série de


conceitos e princípios que são capazes de possibilitar o pensamento
humano. Para o filósofo os homens não tem condições de conhecer a
realidade pura das coisas, ou seja, as coisas como realmente elas são. Na
filosofia idealista kantiana a existência dos objetos depende da observação do
sujeito, no entanto, nem sempre a observação leva ao conhecimento puro
sobre o objeto.

O mundo chamado por ele de coisa em si, não pode ser conhecido
plenamente através do entendimento ou sensibilidade, pois tudo que o homem
conhece não é a realidade verdadeira. É o que Kant chama de fenômeno, que
caracteriza os objetos na medida em que eles são apresentados, entendidos e
organizados pelo pensamento. Com isso, Kant explica que a realidade não
está relacionada ao sujeito, por isso torna-se impossível conhecê-la.

O debate é então solucionado quando Kant apresenta que o


conhecimento obtido através da experiência pode ser organizado em
categorias e instituições a priori, Kant faz então a conciliação entre
empirismo e racionalismo aproximando os conhecimentos a priori, tidos
como racionalistas e os conhecimentos a posteriori, classificados como
sendo empíricos. A teoria sobre o conhecimento está descrita no livro Crítica
da Razão Pura, de 1791.

Outras ideias também aparecem na filosofia kantiana e completam sua


obra e seu modo de pensar e fazer filosofia. Em ética destaca-se o conceito
de imperativo categórico, que é o dever que cada ser humano tem de agir
conforme os princípios desejados para todos os seres humanos. Isso é, uma lei
de ação geral da natureza humana.

No campo da filosofia política Kant apresenta a ideia de Paz Perpétua,


como sendo o resultado da história e garantida através da cooperação
internacional. Kant defende a existência de Estados organizados pela lei e com
a existência de governos republicanos. Kant faz duras críticas a democracia, já
que a definição de um Estado governado por todos, não abrange de fato,
todos.

Na obra Crítica da Razão Prática de 1788 Kant apresenta seu tratado


sobre a moral humana e diz que a moralidade é conseguida através de juízos,
bem como o conhecimento é atingido a partir da junção dos conhecimentos a
priori e a posteriori. Existem para Kant três juízos capazes de garantir os
princípios de ação moral.

 Juízo Sintético: Trata da experimentação para garantir o conhecimento


verdadeiro. Não se pode alcançar a verdade apenas pela análise de
suas proposições.
 Juízo Analítico: Fundado no princípio da identidade. Para Kant o
predicado apresenta atributos contidos no sujeito, ao se negar o sujeito,
nega-se também o predicado.
 Juízo estético: É o juízo ligado ao ato de estabelecer o conceito de
belo.

Hegel: o Idealismo Alemão

O pensador das contradições, George Wilhelm Friedrich Hegel, filósofo


nascido em 1770, é considerado o expoente máximo do idealismo alemão do
século XIX, que acabou provocando um impacto profundo no materialismo
histórico de Karl Marx. Aos 18 anos, ingressou no seminário protestante de
Tubingen, para estudar teologia, onde conheceu Schelling e Holderlin. O
pietismo, uma das correntes gnósticas do protestantismo, influenciou
profundamente seu pensamento. Hegel foi um ilustre professor universitário de
filosofia que iniciou suas atividades em Berna, na Suíça, entre 1793 e 1796;
depois lecionou em Frankfurt, de 1797 a 1800. Foi também mestre de
conferências na Universidade de Iena, professor e reitor em um colégio de
Nuremberg, professor em Heidelberg e, finalmente, em Berlim, onde
permaneceu até a morte.
Hegel dedica boa parte da vida aos estudos da dialética, compreensão do
homem em sua totalidade e o funcionamento do Estado. Leciona na faculdade
de Heidelberg até o ano de sua morte, em 1831.
Bom conhecedor da filosofia clássica grega, no decorrer da vida
Hegel desenvolve seus próprios métodos filosóficos, influenciado
principalmente pelos pensamentos clássicos gregos e escritos de pensadores
alemães contemporâneos.

Em suas obras, Hegel procura entender o homem em sua totalidade e


explicar que toda a vivência humana acontece através de um único sistema.
Ou seja, para Hegel todo o universo, incluindo o tempo e a história, é
entendido como um único organismo em constante mudança. O homem é
então apenas uma parte desse sistema, e não necessariamente a parte mais
importante.

Na concepção sistêmica o Estado funcionaria de forma mecânica, como


uma engrenagem da qual os homens fazem parte. A organização estatal e os
homens funcionando em conjunto, na visão de Hegel, é algo necessário para o
convívio dos homens em sociedade.

Para a construção do hegelianismo, o alemão usa ideias e concepções


filosóficas distintas, tanto dos clássicos gregos quanto de alguns filósofos
europeus contemporâneos. As principais ideias influenciadoras do pensamento
hegeliano são:

 Heráclito de Éfeso: Hegel toma a ideia da dialética como estrutura da


realidade e do pensamento;
 Aristóteles: faz uso da noção dos três capitais. O capital
universal, imanente e não transcendente. O capital do
movimento, como passagem do que possa vir a ser para algo que, de
fato, será. E por fim, a relação entre razão e experiência, que marca a
importância do pensamento racional como forma de suprir necessidades
internas;
 René Descartes: a principal contribuição está ligada ao racionalismo
cartesiano. Hegel toma as ideias sobre a racionalidade do real, da coisa
pensante e a racionalidade ligada às coisas materiais;
 Baruch Spinoza: Hegel usa a ideia spinoziana de que qualquer
afirmação é uma negação;
 Immanuel Kant: colabora com a distinção entre o entendimento e a
razão e a lógica transcendental, que remete a origem de todo o
conhecimento;
 Johann Fichte: faz uso da dialética como processo de afirmação,
negação e síntese;
 Friederich Schelling: Idealismo objetivo, ao ligar a identidade tanto do
sujeito quanto do objeto a consciência do absoluto.

A partir do pensamento desses autores Hegel desenvolveu a filosofia


hegeliana, uma das mais expressivas dos séculos XVIII e XIX, e que serviu
posteriormente de base para o desenvolvimento de teorias no século XIX e XX,
como as desenvolvidas por Marx e Engels.

Influenciado pelo conceito de dialética de Johann Fichte, Hegel aprimora


o conceito, afirmando que a dialética pode ser entendida como uma lei, uma
regra que estabelece a auto afirmação de uma outra ideia absoluta.

Hegel afirma que trata-se de um movimento em que uma ideia, a tese,


sai de si mesma e transforma-se em uma outra ideia, a antítese, uma ideia que
pode ir contra a tese (anti tese) ou ser favorável a primeira ideia, e por fim,
esse conjunto torna-se concreto, sintetizado. Em outras palavras:

Tese + anti tese = síntese


Hegel entende a dialética não apenas como um método, mas é ela
mesma um próprio sistema filosófico, uma vez que não é possível a separação
do objeto e do método. A dialética hegeliana foi a principal influência para a
construção da dialética marxista, que compreende o mundo como a sucessão
de ideias, ideias contrárias e alcance da verdade, em outras palavras, o mesmo
conceito de tese e antítese dando origem a uma síntese.

A filosofia de Hegel foi redescoberta no século XX, graças à volta da


perspectiva histórica que ele projetou em tudo, e também ao reconhecimento
cada vez maior do valor da sua metodologia dialética. Nesse sentido, o
renascimento de Hegel também colocou em evidência a importância
fundamental das suas obras iniciais, publicadas antes da Fenomenologia do
espírito. Porém, não foram apenas os teóricos da escola de Frankfurt que viram
reviver o vigor e a profundidade da filosofia hegeliana na contemporaneidade.

Marx: O Materialismo Histórico

O pai do materialismo dialético, Karl Heinrich Marx nasceu no seio de


uma família judia de classe média em Tréveris, na Alemanha. Era filho de mãe
judia holandesa e de um pai advogado que teve de se converter ao
cristianismo, quando Marx tinha 6 anos de idade, em virtude das restrições
impostas à presença de membros judeus nas atividades públicas. Aos 17 anos,
ingressou na Universidade de Bonn para estudar Direito; mas, logo depois,
transferiu-se para a Universidade de Berlim, onde a influência de Hegel ainda
era bastante sentida no início da sua obra. Com os interesses voltados para a
filosofia, ele participou ativamente do movimento dos jovens hegelianos.
Doutorou-se em Jena, em 1841, com a tese sobre as Diferenças da filosofia da
natureza em Demócrito e Epicuro. Nesse mesmo ano, concebeu a ideia de um
sistema que combinasse o materialismo de Ludwig Feuerbach com a dialética
idealista de Hegel.
Impedido de seguir uma carreira acadêmica, tornou-se, em 1842,
redator-chefe da Gazeta Renana, mas por causa do fechamento do jornal pelos
censores do governo prussiano, em 1843, Marx foi para a França. Com a
Revolução de 1848 e o exílio que se seguiu a ela, foi obrigado a abandonar o
jornalismo na Alemanha e tentar ganhar a vida na Inglaterra. Durante a maior
parte da vida, conseguiu seu sustento escrevendo artigos, que publicava
de forma esporádica em jornais alemães e norte-americanos, além do auxílio
financeiro que recebia do amigo e principal colaborador de seu
pensamento, Friedrich Engels, economista alemão. Juntos, eles sintetizaram
a experiência de muitos séculos de lutas de classes oprimidas contra seus
opressores, criando a doutrina do socialismo científico como uma
transformação revolucionária que inaugurou uma nova época no
desenvolvimento do pensamento social.
Por essa razão, analisar a trajetória da sociedade humana sem se
referir a Marx é uma tarefa praticamente impossível, dada sua importância à
constituição histórica do século XX, que se deve, em maior ou menor escala,
às influências da sua produção intelectual, apesar da grande polêmica gerada
até hoje pelos seus pressupostos teóricos. Foi diretamente influenciado por
Ludwig Feuerbach, que antevia uma visão invertida do materialismo de
Hegel. Marx evoluiu dessa ramificação, que já superava o idealismo
revolucionário dos jovens hegelianos de cujo movimento ele mesmo fez parte.
Seu pensamento, nitidamente engajado com as lutas proletárias, teve como
base uma síntese de três correntes distintas: a economia política inglesa, o
socialismo francês e a filosofia alemã. Da união dessas ideias, ele construiu
um raciocínio inédito que ficou conhecido como “materialismo dialético
histórico”. Estudar parágrafos 4 e 5
Essa teoria consiste no desenvolvimento mais elevado sobre a
interpretação materialista e dialética da evolução histórica do homem. Para
Marx, a realidade material será sempre a grande responsável por todas as
condições de vida capazes de expor ao ser humano sua condição
existencial, sendo que dela devem partir todas suas formas de ideologia,
ou seja, as visões de mundo.
Diante dessa formulação, pode-se deduzir que não é a ideia que
produz a realidade, mas sim a realidade que produz as ideias, que acabam
se correlacionando de forma dialética para modelar as constituições sociais.
Inserido no contexto do pensamento alemão que deu origem ao racionalismo
(idealismo lógico) e ao romantismo (idealismo sensível), resultando no
“materialismo contemplativo”, Marx defendia a prática de um materialismo
ativo.
No entanto, seu materialismo não pode ser encarado de forma
empírica, porque Marx acreditava que o racionalismo era ainda muito
abstrato quando comparado ao materialismo dialético, uma vez que
matéria e ideia são categorias opostas que se interrelacionam, mantendo uma
espécie de unidade.
Seu pensamento político criticou todas as correntes socialistas por não
ter um caráter decididamente transformador, somente reformador. Ainda que
para Marx a evolução e a revolução são dialéticas e cada partido operário, ao
realizar suas metas curtas, se torna inútil. Enquanto posição, ele defendia o
socialismo científico em oposição a um socialismo romântico, ou o comunismo
(revolucionário, para se opor ao mero reformismo).

Uma de suas teses centrais afirma que os grandes agentes


transformadores da sociedade - em diversos aspectos - são as condições
econômicas e a luta de classes. A concepção materialista por ele
desenvolvida atesta que, enquanto a burguesia se esforça para manter-se
como classe dominante atrelada ao poder, as camadas mais baixas da
população, principalmente o proletariado, precisam se movimentar para
ultrapassar barreiras e garantir seus direitos.
Nessa relação está baseada a luta de classes, considerada por Karl
Marx o grande motor da História, a relação central da sociedade moderna.

Outro conceito importante desenvolvido por esse teórico foi o de “mais-


valia”, que consiste basicamente no lucro que os patrões obtém a partir da
intensa exploração da mão-de-obra do proletariado. Dessa forma, o modo
de produção capitalista é baseado no aumento da riqueza da burguesia
proporcional à exploração do trabalhador.

Dessa forma, Marx se empenhou na busca por teorizar acerca de formas


novas de produção e distribuição de renda, com o objetivo final de equiparar as
condições materiais e sociais de todos os indivíduos, libertando-os do que
chamava de “alienação”, uma vez que considerava que os trabalhadores eram
alheios ao próprio trabalho, pois nada do processo de produção lhes pertencia
e eles nem o dominavam por completo.

O socialismo científico, desenvolvido por Marx e Engels, consiste,


portanto, em uma teoria sobre as desigualdades sociais, a ordem capitalista, a
sociedade burguesa e ideias sobre como superá-las.

Em 1848, ambos os intelectuais escreveram juntos o Manifesto


Comunista, pelo qual defendem que os operários são parte fundamental da
sociedade, por produzirem a maior parte da riqueza presente no Estado, e,
ainda assim, são excluídos do acesso à riqueza que produzem. Por isso, uma
nova ordem precisaria ser instaurada, o comunismo, garantindo um Estado
mais justo e a melhor distribuição de riquezas.

As teorias e ideias de Marx, em profunda consonância, diálogo e


produção com as teorias socialistas e comunistas, ficaram conhecidas
como marxismo e foram desenvolvidas por vários teóricos que posteriores à
Marx.

Algumas das ideias fundamentais são, portanto:

 a luta pelo fim da opressão das classes populares;


 a criação de um Estado mais justo e igualitário;
 a extinção do trabalho forçado e do trabalho infantil;
 o fim da propriedade privada.

Augusto Comte: O Positivismo

Auguste Comte nasceu em Montpellier, na França, a 19 de janeiro de


1798, filho de um fiscal de impostos. Suas relações familiares foram sempre
conflituosas e, por isso, explicam o desenvolvimento de sua vida e até mesmo
do conteúdo de suas obras. Com frequência, culpava os pais por sua
situação econômica instável. Tão complexos eram os laços familiares,
rompidos por Comte, que lhe deixaram marcas profundas.
Aos 16 anos, ingressou na Escola Politécnica de Paris, o que teria
significativa influência na orientação posterior do seu pensamento filosófico.
Embora tenha permanecido apenas dois anos nessa escola, Comte recebeu a
influência do trabalho intelectual de cientistas como o físico Sadi Carnot, o
matemático Lagrange e o astrônomo Pierre Simon de Laplace. Na
mecânica analítica de Lagrange, Comte teria encontrado inspiração para
abordar os princípios de cada ciência segundo uma perspectiva histórica.
Em 1816, Comte deixou a Politécnica e, apesar da insistência da família,
resolveu continuar na França. Nesse período, sofreu influências dos
chamados “ideólogos”, como Destutt de Tracy, Cabanis e Volney.
Também leu os teóricos da economia política, como Adam Smith e Jean-
Baptiste Say, filósofos e historiadores como David Hume e William
Robertson. No entanto, o fator mais decisivo para a formação de seu
pensamento filosófico foi o estudo do esboço do Quadro histórico dos
progressos do espírito humano, de Condorcet, ao qual se referiria, mais
tarde, como “meu imediato predecessor”. A obra de Condorcet traça um
retrato do desenvolvimento humano, no qual os descobrimentos e as
invenções científicas e tecnológicas desempenham um papel preponderante,
fazendo o homem caminhar rumo a uma era em que a organização social e
política seria o produto final das luzes da razão, ideia que iria se
transformar em um dos pontos cruciais da filosofia comtiana.
Logo após o idealismo que predominou na primeira metade do século
XIX, surge o positivismo, que ocupa a segunda metade do mesmo século,
espalhado em todo o mundo civilizado. Trata-se de um pensamento que
representa uma reação contrária ao apriorismo, ao formalismo, ao
idealismo, priorizando o estudo da experiência prática e dos dados positivos.
Podemos considerar como a diferença fundamental entre idealismo e
positivismo o fato de que o primeiro procura uma interpretação, uma
unificação da experiência mediante a razão, enquanto o segundo, pelo
contrário, quer limitar-se à experiência imediata, pura, sensível, como já
havia ocorrido com o empirismo. Vem desse aspecto sua superficialidade
filosófica, mas também seu valor como descrição e análise da experiência por
meio da história e da ciência, considerando o idealismo, que altera a
experiência, a ciência e a história.
O positivismo também ganha impulso graças ao grande progresso das
ciências naturais, em especial das biológicas e fisiológicas do século XIX.
Tenta-se aplicar os princípios e os métodos daquelas ciências à filosofia, como
forma de solucionar os problemas do mundo e da vida, com o intuito de
conseguir bons resultados. O positivismo ainda ganhou força devido ao
desenvolvimento dos problemas econômicosociais que predominaram no
século XIX. Por ser altamente valorizada a atividade econômica, que
produz bens materiais, é compreensível que se busque uma perspectiva
filosófica positiva, naturalista e materialista para as ideologias no campo das
atividades econômico-sociais.
Grosso modo, o positivismo admite, como fonte única de
conhecimento e de critério de verdade, a experiência, os fatos positivos,
além dos dados sensíveis. Nenhuma metafísica, portanto, como
interpretação, justificação transcendente ou imanente da experiência, possui
espaço nesse campo de reflexão. Nesse sentido, a filosofia é reduzida à
metodologia e à sistematização das ciências, e a lei, única e suprema,
domina o mundo concebido positivisticamente, promovendo a evolução
necessária à energia naturalista. O nome de Auguste Comte está
indissociavelmente ligado ao positivismo, corrente filosófica fundada por ele
com a intenção de reorganizar o conhecimento humano, que teve grande
influência no Brasil. O lema da Bandeira do Brasil, “Ordem e Progresso”,
foi influenciado pelo positivismo.
Comte também é considerado o grande sistematizador da sociologia.
Vale destacar que ele viveu em um período da história francesa em que se
alternavam o despotismo e as revoluções, o que levou a sociedade a uma
turbulência e a um desencanto geral com a política e a uma crise dos valores
tradicionais.
Ele buscou dar uma resposta a esse estado de ânimo pela união de
elementos da obra de pensadores anteriores a ele e também de alguns
contemporâneos, o que resultou em uma teoria denominada por ele de
positivismo. “Ele reviu as ciências para definir o que, nelas, decorria da
realidade dos fatos e permitia a formulação de leis naturais, que orientariam os
homens a agir para modificar a natureza”, diz Arthur Virmond de Lacerda,
professor da Faculdade Internacional de Curitiba.
Um dos fundamentos do positivismo está na ideia de que tudo o
que diz respeito ao homem pode ser sistematizado de acordo com a
adoção de princípios como o critério de verdade para as ciências exatas e
biológicas. Isso deveria ser aplicado também aos fenômenos sociais, que
seriam reduzidos a leis gerais como as da física ou da matemática.
Para Comte, a análise científica aplicada à organização social é o
centro da questão sociológica, cujo objetivo seria o planejamento da
organização social e política. De acordo com os positivistas, só é possível
afirmar que uma teoria é correta se ela puder ser comprovada por intermédio
de métodos científicos válidos, em detrimento dos conhecimentos relacionados
às crenças, à superstição ou a qualquer outro que não reúna condições de ser
comprovado cientificamente. Para eles, o progresso da humanidade depende
unicamente dos avanços da ciência.

 Traduz-se como um método sociológico, científico e político.


 Inspirou seus ideais no Iluminismo francês.
 Foi promovido por Auguste Comte, concomitantemente à criação da
Sociologia.
 Corrente filosófica que determinou a disciplina, a ordem e o rigor sociais
e políticos como necessários ao progresso da humanidade.
 Serviu de inspiração para a promulgação da República no Brasil e para
a formulação de seus ideais políticos.
 Progresso da humanidade aliado ao avanço científico.

Você também pode gostar