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HISTÓRIA

DO DIREITO

Marjorie de
Almeida Araujo
Revisão técnica:

Gustavo da Silva Santanna


Bacharel em Direito
Especialista em Direito Ambiental Nacional
e Internacional e em Direito Público
Mestre em Direito
Professor de Curso de Graduação
e Pós-graduação em Direito

A139h Abel, Henrique.


História do direito [ recurso eletrônico ] / Henrique Abel,
Marjorie de Almeida Araujo, Débora Cristina Holenbach
Grivot ; revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna. – Porto
Alegre: SAGAH, 2017.

ISBN ISBN 978-85-9502-171-6

1. Direito – História. I. Araujo, Marjorie de Almeida.


II.Grivot, Débora Cristina Holenbach. III.Título.
CDU 34(091)

Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin CRB-10/2147


Formas estatais
pré-modernas
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar formas estatais pré-modernas.


 Explicar as fontes da história do Direito.
 Distinguir a democracia clássica da contemporânea.

Introdução
Ao longo da história, as nações tiveram diferentes formas de organiza-
ção estatal e governamental, evoluindo, na maioria dos locais, para a
democracia, que parece ser o modelo de governo mais desejado pela
população. Toda essa evolução política levou à criação de normas jurí-
dicas, sendo necessário olhar para trás a fim de encontrar as fontes de
onde emana o Direito.
Neste capítulo, você vai ler a respeito das formas estatais pré-moder-
nas e das fontes do Direito, bem como diferenciar democracia clássica
de moderna.

Modelos estatais pré-modernos


O Estado moderno, tal como o conhecemos hoje, é a organização política
e jurídica de uma sociedade (na busca da manutenção de sua existência/
sobrevivência), que possui governo e território próprios, geograficamente
delimitados. Alguns estudiosos dizem que já estamos vivendo uma época
pós-moderna, o que recebe críticas de alguns autores, pois como poderíamos
estar na pós-modernidade se o moderno é o que há de mais atual?
De forma geral e prática, a sociedade sempre existiu e, ao longo da história,
tentou se organizar visando ao bem comum. Entretanto, para fins didáticos, o
termo Estado só pode ser utilizado a partir do século XVII. Na Antiguidade,
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não existia uma divisão bem definida entre política, família e religião. O líder
religioso era o governante que estava sob o poder divino e ditava as regras
segundo as normas religiosas.

Cidade-Estado (século VIII)


Na Grécia antiga, existiam as chamadas pólis gregas, que vinham a ser cidades-
-Estado com autonomia política e econômica, tendo, no seu entorno, uma
grande área rural na qual eram cultivados e produzidos os alimentos que
garantiam a sobrevivência e manutenção da pólis, tendo, ainda, uma zona
marítima bem próxima.
Havia certa democracia nas tomadas de decisões, pois os cidadãos par-
ticipavam da política, ficando de fora apenas os estrangeiros e escravos que
habitavam as cidades.

Estado Romano — Civitas Romanas


O Estado romano era organizado com base familiar, existindo as chamadas
civitas, que consistiam na união de grupos familiares, tendo privilégios os
descendentes dos fundadores do Estado.
Uma parte do povo, que era possuidora de terras, participava das decisões,
tendo mais peso a vontade dos que pertenciam às famílias de patriarcas,
cenário modificado com o tempo, ampliando-se, aos poucos, os direitos de
toda a população.
Com a ascensão do cristianismo e a propagação da ideia de liberdade
religiosa, findou o poderio romano, tendo o seu declínio no século V.

Existe diferença entre Estado e estado! Perceba que um inicia com letra maiúscula
e, o outro, com minúscula. Isso porque estado é um ente federativo e não possui os
atributos do Estado soberano.
Para que fique mais claro: no Brasil, temos os estados (Rio de Janeiro, Acre, Bahia, entre
outros), que fazem parte de um Estado (país), tendo este sim soberania e autonomia,
detendo o poder maior sobre os estados.
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Estado Medieval — Feudalismo


As marcas principais do período medieval são o cristianismo, a invasão dos
bárbaros e o feudalismo. A importância do cristianismo foi na propagação
da ideia de que todos possuíam, teoricamente, o mesmo valor e a mesma im-
portância. Alguns acreditam que esse foi um meio utilizado pela Igreja para
atrair a simpatia e, assim, controlar a população, trazendo mais adeptos ao
cristianismo. Isso porque, na prática, era evidente a diferenciação que tanto a
Igreja quanto os poderosos faziam entre os componentes da sociedade.
O feudalismo teve início nas invasões bárbaras, no Império Romano Oci-
dental, no século V, existindo um poder soberano, concentrado nas mãos do
imperador, e, ao mesmo tempo, um poder descentralizado, que se encontrava
espalhado sob o comando dos senhores feudais.
O que movimentava a economia era a agricultura, dominada pelos grandes
proprietários de terra que utilizavam o trabalho dos servos, os quais recebiam
um pedaço de chão para cultivo próprio, garantindo, assim, o sustento da
sua família. Em contrapartida, entregavam aos donos das terras parte da sua
produção, estando submissos às regras impostas por estes.
O ápice do feudalismo foi do século VIII ao século XI, época em que se
iniciou o seu declínio, sendo definitivamente sepultado no século XV, quando
os servos começaram a se revoltar, migrando para outras regiões e exigindo
mudanças nas formas de servidão. Outro fator que corroborou para que tais
mudanças acontecessem foi o cenário de crescimento contínuo do comércio,
o que levou ao surgimento das primeiras organizações que regulavam a cir-
culação, a compra e venda de produtos e as relações de trabalho.
Em meio a todas essas transformações atreladas à forma confusa de distri-
buição de poder, riquezas e territórios em que sucumbia o feudalismo, surge, no
final do século XV, o Estado moderno, com a devida delimitação de população
(povo), território limitado e governo (centralização de poder).
Concluímos, portanto, que o Estado moderno é produto da evolução das
formas de Estados da Antiguidade e da Idade Média, levando à constatação
de que estamos sempre em constante evolução.
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Na Idade Média, durante o sistema feudal, a sociedade era dividida em estamentos, e


as camadas da sociedade eram distribuídas da seguinte forma:

No topo, a Igreja, que representava o poder maior e garantia a eficácia dessa divisão.
Grandes proprietários de terras, reconhecidos e intitulados pela Igreja como nobres,
também eram considerados guerreiros, pois garantiam a proteção do clero. Os trabalha-
dores garantiam o sustento das classes superiores, estando submissos às demais classes.

Democracia
A democracia é uma forma de governo que sofreu modificações quanto à sua
concepção ao longo dos tempos, como poderemos observar na fundamentação
adiante exposta.

Democracia clássica
A democracia nasceu na Grécia antiga no século V, quando as cidades-Estados,
tendo como precursora Atenas, instituíram uma forma de governo por meio da
qual os cidadãos poderiam eleger os seus governantes, sendo excluídos dessa
decisão as mulheres, os estrangeiros e os escravos. Eram consideradas sociedades
democráticas pelo fato de permitirem a participação da população na tomada
de decisões; porém, uma parte bem restrita do povo podia exercer esse direito.
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Democracia moderna
Somente no século XVII passaram a existir as primeiras expressões filosóficas
e estudos sobre o tema, pois antes ela se dava de forma bem natural e menos
organizada.
Na democracia moderna, a concepção é de que toda a população pode
participar das decisões, não devendo ser excluída qualquer pessoa desse pro-
cesso, seja por sua raça, cor, credo, sexo ou preferências políticas e filosóficas.
A palavra democracia é derivada do grego demokratía, sendo a junção de
dois vocábulos: demos (povo) e kratós (poder). Assim, a ideia é de que, nessa
forma de governo, o poder de decisão está nas mãos do povo. Na concepção
atual, na localidade onde impera a democracia, todos os cidadãos são iguais,
livres e cooperam pelo bem comum.
A democracia pode ser direta ou indireta. Ela é direta quando as decisões
são tomadas diretamente pelo povo; já na indireta ou representativa, o povo
estabelece os seus representantes para que tomem as decisões de acordo com
os interesses da coletividade, como é o caso do Brasil, conforme se encontra
disposto no preâmbulo da Constituição da República Federativa redigida em 1988.

Quando a Carta Magna brasileira versa sobre direitos, deveres, princípios e garantias
fundamentais, é possível perceber, pela profundidade do texto, as características que
definem uma real democracia e como ela deve ser.

A democracia puramente direta praticamente já não existe e provavelmente


seria insustentável em uma sociedade tão populosa; porém, na maioria dos
países, até mesmo o modelo de democracia representativa perdeu sentido, pois
os representantes eleitos pelo povo parecem não atuar mais de acordo com os
interesses daqueles que lhe confiaram essa função.
Atualmente, alguns países da Europa ainda tentam conservar uma de-
mocracia semidireta, na qual algumas decisões locais são tomadas de forma
direta pelo povo por meio de plebiscito e referendos. Em algumas pequenas
comunidades, o povo até se reúne em praça pública para decidir — isso
ocorre em pequenas localidades e para discutir assuntos que só dizem res-
peito àquela comunidade.
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Vejamos a seguir parte do texto da Constituição Federal de 1988 para


entender o modelo de uma democracia:

PREÂMBULO
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional
Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar
o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supre-
mos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a
solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a
seguinte Constituição da República Federativa do Brasil. [...] Art. 5º Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (BRASIL, 1988).

Como visto, a Constituição Federal, no seu preâmbulo e no caput do art. 5º,


revela a forma de Estado e de governo a que o Brasil está submetido, mostrando,
ainda, os princípios pelos quais deve se desenvolver a política brasileira.

Acesse o link a seguir e veja, na íntegra, o texto da nossa


Constituição Federal (1988):

https://goo.gl/zaRrL

Fontes do Direito
Não existe a possibilidade de se falar sobre a evolução das formas estatais sem
falar da história do Direito, uma vez que o Direito nasce e evolui de acordo
com o contexto histórico da sociedade.
Falar sobre as fontes do Direito é abordar a origem do Direito, ou seja,
de onde e como as normas jurídicas surgem em uma sociedade. Conhecer a
fonte possibilita uma melhor e correta interpretação e adequação do Direito.
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Podemos dizer que as fontes do Direito se dividem em três espécies:

Material — diz respeito a todas as pessoas, grupos, entidades públicas ou


situações que podem levar à criação das normas. São exemplos: economia,
geografia, moral, Poder Legislativo, entre outros.

Formal — são os meios pelos quais as normas se manifestam, qual sejam: as


leis e os costumes. É a norma em si; a expressão dela.

Histórica — ao longo do tempo, a sociedade muda e, com ela, as relações entre


os indivíduos passam a ter necessidades que variam e necessitam de normas
jurídicas diferentes, a fim de garantir o bom convívio social naquela geração.
Olhar para a fonte histórica de uma norma nada mais é do que buscar entender
o motivo da necessidade e a partir de que momento ela se tornou imprescindível
naquela localidade, analisando exatamente o seu contexto histórico.
Paulo Nader distingue as espécies de fontes do Direito dessa forma, mas existem
autores que acreditam que a fonte histórica já se encontra inserida na fonte material.
As fontes históricas mais conhecidas são: as XII tábuas, as ordenações
portuguesas, o Código de Hamurabi, a Lei Mosaica, entre outras.
Para a teoria tradicional, apenas a Lei Mosaica, os costumes, a jurispru-
dência e a doutrina são fontes do Direito. Para os juspositivistas, apenas as leis
são fontes de Direito. Quanto a essas divergências, vejamos o que destacou
Paulo Nader (2003, p. 137):

Entre os cultores da Ciência do Direito, há uma grande diversidade de opiniões


quanto ao presente tema, principalmente em relação ao elenco das fontes.
Esta palavra provém do latim, fons, fontis, e significa nascente de água. No
âmbito de nossa ciência é empregada como metáfora, conforme observa Du
Pasquier, pois “remontar à fonte de um rio é buscar o lugar de onde as suas
águas saem da terra; do mesmo modo, inquirir sobre a fonte de uma regra
jurídica é buscar o ponto pelo qual sai das profundidades da vida social para
aparecer na superfície do Direito.

Os juristas brasileiros distribuem de diferentes e inesgotáveis formas as


fontes do Direito. Por isso, vamos nos limitar à corrente tradicional:

Lei — é a forma mais moderna de expressão do Direito, sendo estabelecida


pelo Poder Legislativo, de acordo com os interesses da população.
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Costumes — é um direito que surge naturalmente durante a história de um povo, a


forma como regulam habitualmente as suas ações e relações; mesmo não sendo lei
ou não estando escrito, sente-se uma obrigatoriedade quanto ao seu cumprimento.
Geralmente, muito tempo depois, tornam-se leis, mas percebe-se que já eram
utilizados e respeitados pela sociedade há algum tempo. Possuem validade junto
aos órgãos públicos ou perante o judiciário, desde que devidamente comprovados.

Jurisprudência — é o conjunto de decisões proferidas pelos juízes ou tribunais


sobre uma determinada questão. Significa dizer que, quando reiteradamente
juízes decidem de forma semelhante sobre algum assunto, aquela decisão já
pacificada na prática do judiciário torna-se um modelo de decisão e proce-
dimento para todos os processos que versarem sobre a mesma questão, não
obtendo êxito quem se aventura na contramão. Assim, posteriormente, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) acaba por emitir súmulas vinculantes a fim
de que fique formalizada uma espécie de modelo padrão de decisão.

Há alguns anos, o sistema de telefonia fixa no Brasil era medido por pulsos, mas, por
se tratar de um sistema falho, os pulsos eram consumidos até mesmo se o telefone
estivesse fora da sua base. Por isso, na época, muitos cidadãos e advogados ganha-
ram um dinheiro considerável com as ações indenizatórias por pulsos excedentes. A
empresa não tinha como comprovar a utilização dos pulsos, mas cobrava um valor
por excederem o limite do pacote contratado.
Depois de um curto período, os juízes deixaram de oferecer indenização por danos
morais nesses processos, entendendo que muitos se aproveitavam dessa oportunidade
não para resolver o problema, mas simplesmente para lucrar. Com isso, qualquer um
que ingressasse com uma ação para tratar do mesmo problema tinha a cobrança
indevida suspensa, mas não recebia mais indenização por danos morais.

Doutrina — geralmente os grandes doutrinadores são juízes, professores


renomados ou pessoas de carreira pública, já possuindo uma boa aceitação
e visibilidade quanto à veracidade das suas teses. Os juristas, assim também
chamados, são grandes pesquisadores que embasam, de forma muito substan-
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cial, as suas produções, lutando, por meio da função que exercem na sociedade,
para conseguirem o apoio para suas afirmações. Por isso, as suas explicações
são muito utilizadas para fundamentar processos administrativos e judiciais,
tendo um poder de persuasão bem grande ao propósito ao qual se destina.
A doutrina interpreta o Direito, existindo uma variação na forma de inter-
pretação de cada autor, valendo-se das brechas no texto da lei para chegar ao
seu objetivo. De acordo com a corrente majoritária, ela não produz o Direito,
mas ajuda a interpretá-lo e esclarecê-lo, tornando-se rapidamente ultrapassado
com a rapidez pela qual as leis são modificadas. Por esse motivo, o doutrinador
Miguel Reale discorda que essa seja uma fonte do Direito.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 27 set. 2017.
NADER, P. Introdução ao estudo do Direito. 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

Leituras recomendadas
CERQUEIRA, D. T.; CARLINI, A. (Org.). 180 anos de ensino jurídico no Brasil. Campinas:
Milennium, 2008.
LINS, R. D. Fontes do Direito: conceitos jurídicos. 2010. Disponível em: <http://www.
webartigos.com/artigos/fontes-do-direito-conceitos-juridicos/31003/>. Acesso em:
27 set. 2017.
LOPES, A. L. Noções de teoria geral do Estado: roteiro de estudos. 2010. Disponível em:
<http://domtotal.com/direito/uploads/pdf/1627aa4f30ef0e7c1b149fccd97700c2.
pdf>. Acesso em: 27 set. 2017.
PINTO, L. de T. et al. Vade Mecum. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
PIRES, N. R. Feudalismo. [2000?]. Disponível em: <http://www.coladaweb.com/historia/
feudalismo>. Acesso em: 27 set. 2017.
REALE, M. Lições preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
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